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2020

Título: Guia Prático em Cirurgia Geral


Editor: Guilherme Melo
Projeto gráfico: Bruno Brum
Diagramação: caixadedesign.com
Capa: Mateus Machado
Revisão ortográfica: Lindsay Viola
Conselho Editorial: Caio Vinicius Menezes Nunes, Paulo Costa Lima, Sandra de Quadros
Uzêda | Silvio José Albergaria Da Silva
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo-SP)

B238g Barbosa, Leonillson Joanh Paullo Vilarinho.


Guia Prático em Cirurgia Geral / Leonillson Joanh Paullo Vilarinho Barbosa, Talita de Lima
Aquino Nogueira, Vilarinho e Tamires Guimarães Cavalcante Carlos de Carvalho.–
1. ed.- Salvador : Editora Saúde, 2020. 512 p.
ISBN 978-65-86246-24-7
1. Cirurgia Geral. 2. Guias. 3. Medicina. 4. Saúde. I. Título. II. Assunto. III. Barbosa,
Leonillson Joanh Paullo, Vilarinho. IV. Vilarinho, Talita de Lima Aquino Nogueira.
V. Carvalho, Tamires Guimarães Cavalcante Carlos de.
CDD 617.9
CDU 616-089

ÍNDICE PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO


1. Medicina: Cirurgias ( técnicas, equipamentos, material ).
2. Medicina: cirurgias diversas.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
BARBOSA, Leonillson Joanh Paullo Vilarinho; VILARINHO, Talita de Lima Aquino Nogueira;
CARVALHO, Tamires Guimarães Cavalcante Carlos de. Guia Prático em Cirurgia Geral. 1. ed.
Salvador, BA: Editora Sanar, 2020.
Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Pedro Anizio Gomes CRB-8 8846

Editora Sanar Ltda.


Rua Alceu Amoroso Lima, 172
Caminho das Árvores
Edf. Salvador Office e Pool, 3º andar.
CEP: 41820-770 – Salvador/BA
Telefone: 0800 337 6262
sanarsaude.com
atendimento@sanar.com
Sumário

Parte 1: Princípios Básicos da Cirurgia Geral


01. Cirurgia segura
02. Nomenclatura e terminologia em cirurgia
03. Ambiente cirúrgico e seus profissionais
04. Resposta endócrina e metabólica do trauma
05. Distúrbios hidroeletrolíticos e ácido-base
06. Nutrição em cirurgia
07. Cicatrização de feridas
08. Cuidados pré operatórios e risco cirúrgico
09. Antibioticoprofilaxia e antibioticoterapia em cirurgia
10. Complicações da ferida operatória
11. Cuidados com Drenos e sondas

Parte 2: Principais Temas Teóricos da Cirurgia Geral


12. Abdome agudo
13. Hérnias da parede abdominal
14. Afecções da vesícula e via biliar
15. Neoplasias colônicas malignas
16. Neoplasias gástricas benignas e malignas
17. Tumores eabscessos hepáticos
18. Doenças diverticulardos cólons
19. Pancreatite aguda e crônica
20. Doenças inflamatórias intestinais
21. Apendicite aguda
22. Tumores pancreáticos e neuroendócrinos
23. Doença do refluxo gastroesofágico
24. Câncer de esôfago
25. Doença ulcerosa péptica
26. Nódulos tireoidianos

Parte 3: Procedimentos Básicos da Cirurgia Geral na Prática


27. Os anestésicos locais
28. Agulhas e fios
29. Nós e suturas
30. Punção venosa periférica e central
31. Procedimento de Pressão Arterial Invasiva (PAI)
32. Acesso intraósseo
33. Paracentese
34. Punção lombar
35. Toracocentese
36. Drenagem torácica
37. Pericardiocentese
38. Intubação orotraqueal
39. Cricotireoidostomia
40. Traqueostomia
41. Técnica em Sondagem nasogástrica e nasoenteral
42. Sondagem de alívio e vesical de demora
43. Cistostomia
Agradecimentos

A ideia e produção do livro “GUIA PRÁTICO EM CIRURGIA GERAL” demonstra o desejo de


levar aos profissionais de saúde alguns dos tópicos mais relevantes dentro de patologias
com abordagem e segmento cirúrgico.
Esperamos, após a conclusão deste livro, que o leitor tenha uma ferramenta do
conhecimento a qual possa dar-lhe uma percepção mais abrangente no campo da cirurgia
geral.
Agradecemos a todos os profissionais envolvidos no processo de produção deste livro,
acreditamos que apenas com um estudo adequado e continuado podemos melhorar como
profissionais, e, portanto, oferecer um tratamento mais adequado para aqueles que são o
foco principal dos nossos esforços: os pacientes
Que este livro estimule os leitores.

Talita de Lima Aquino Nogueira Vilarinho - Coordenadora

À Deus,
Por ter criado nossa moradia nesse universo e ter me permitido habitar e evoluir nele.
Agradecimento especial por sempre me iluminar com a Sua presença.
Aos meus pais Dr. Taniusmar e Rosimary,
Expresso a minha eterna gratidão, por estarem comigo nessa jornada terrena e por
partilharem o conhecimento, generosidade, sabedoria, amor, virtudes diversas e me
apoiarem em todos os momentos de minha vida.
Aos meus irmãos, Dr. Deyvid, Dr. Rodrigo e Dr. Diego,
Pelo companheirismo, amor e proteção eterna.
Aos familiares,
Meus agradecimentos. Meu tio Dr. Wilmar e minha tia Lêda, extraordinários e sábios
seres humanos a quem amo e tenho enorme carinho.
Agradeço, também, à ótima e esforçada equipe que me acompanhou na construção e
disseminação dessa ferramenta de conhecimento.

Tamires Guimarães Cavalcante Carlos de Carvalho - Coordenadora


Apresentação

“Guia prático em cirurgia geral” é um livro idealizado para os estudantes e profissionais


de saúde com o intuito de nortear alguns dos principais tópicos dessa área médica.
A construção deste livro envolveu vários profissionais empenhados em dar ao leitor uma
experiência ampla, profunda e agradável durante a sua leitura.
Trata-se de um conjunto de temas da área cirúrgica, organizados em capítulos teóricos
e práticos, escolhidos baseados na prevalência e relevância com que se apresentam nas
emergências hospitalares.
Esperamos que o leitor possa usar este material de maneira prática e intuitiva, seja por
leitura “do início ao fim”, seja por pesquisas direcionadas. O objetivo é permanecer em
constante aprendizado, buscando sempre melhorar seus conhecimentos em prol dos
pacientes.
Desejo-lhes empenho, sede de conhecimento e, a partir de agora, uma boa leitura.

Leonillson Joanh Paullo Vilarinho Barbosa


Talita de Lima Aquino Nogueira Vilarinho
Tamires Guimarães Cavalcante Carlos de Carvalho
Autores Coordenadores
Leonillson Joanh Paullo Vilarinho Barbosa
Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará – UFC (2007-2013). Cirurgião Geral pela
Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2017-2019).
Especialização em Saúde da Família pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós Graduação da UFC (2014-
2016). Experiencia Profissional: Cirurgião Geral do Hospital Regional Norte - HRN. Cirurgião Geral
da Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS. Médico do Serviço de Atendimento Móvel de
Urgência – Samu/Sobral. Instrutor do Prehospital Trauma Life Support – PHTLS.

Talita de Lima Aquino Nogueira Vilarinho


Médica Formada pela Universidade Federal do Ceará /Sobral – UFC (2010-2016). Cirurgiã Geral
pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2017-2019).
Experiência Profissional: Cirurgiã Geral do Hospital Regional Norte - HRN. Cirurgiã Geral da Santa
Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS. Médica do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência –
Samu/Sobral. Médica Emergencista do Hospital da Unimed. Médica do Serviço de Procura de
Órgãos e Tecidos da Santa Casa de Misericórdia de Sobral – OPO/SCMS. Preceptora da Graduação
e do Internato do Curso de Medicina do Centro Universitário Inta- Uninta.

Tamires Guimarães Cavalcante Carlos de Carvalho


Interna do curso de medicina da Universidade Nove de Julho. Integrou a diretoria e a coordenação do
Centro Acadêmico César Timo-Iaria (C.A.C.T.I.) nos anos de 2017, 2018 e 2019. Foi coordenadora
geral do XIV Congresso Médico Acadêmico da Universidade Nove de Julho e diretora do V
Congresso Acadêmico de Neurociências. Atuou nas Ligas acadêmicas de: Neurologia e
Neurocirurgia, Ginecologia e Obstetrícia e Oncologia, sendo diretora desta. É membro acadêmico da
American Academy of Neurology desde 2018. Atual coordenadora local de estágios e vivências
(CLEV Sul 2). Tem interesse nas áreas cirúrgicas, de neurociências e educação.

Autores Colaboradores
Adriana Santos de Oliveira
Médica formada pela Universidade de São Paulo (2006-2011). Cirurgiã geral (2014-2016) e cirurgiã
de Cabeça e Pescoço (2016-2018) pela Universidade de São Paulo.
Aldenir Rocha de Oliveira Filho
Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará /Sobral – UFC (2009-2015). Residente de
Clínica Médica pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral- SCMS (2019-2021). Mestrando em
Ciências da Saúde pela Universidade Federal do Ceará – UFC (2019-2020). Pós - Graduado em
Medicina de Família pela Universidade Federal do Ceará- UFC (2016-2017). Experiência
Profissional: Médico Emergencista Clínico do Hospital Regional Norte - HRN.

Alessandra Marques Figueira Muoio Gonzalez


Graduação em Medicina pela Universidade de Mogi das Cruzes (2000). Atualmente é professora na
Universidade Nove de Julho. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Cirurgia Geral,
Cirurgia do Trauma e Cirurgia Plástica (mais especificamente cirurgia reconstrutora). Doutoranda no
Departamento de Biofotônica Aplicada à área da Saúde na Universidade Nove de Julho, iniciado no
primeiro semestre de 2019. Atuação como docente da Faculdade de Medicina da Universidade Nove
de Julho nas unidades curriculares de Cirurgia Geral e suas Especialidades, Técnica Operatória e
Propedêutica Cirúrgica.

Alexandre Araújo Aguiar


Médico pelo Centro Universitário Christus -Unichristus (2010-2016). Residente de Cirurgia Geral na
Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2019 - 2021).
Experiência Profissional: Médico do Pronto Atendimento Clínico e Cardiológico Prontocárdio (2017-
2018). Médico do Pronto Atendimento do Hospital São Raimundo (2017-2018). Médico do Pronto
Atendimento Hapvida (2018-2019). Médico do Pronto Atendimento do Hospital Central Freelife
(2017-2019). Médico do Programa de Saúde da Família de Caucaia (2017-2018). Médico Generalista
da Marinha do Brasil desde 2018. Médico Regulador do Cresus Macro Fortaleza e sobral.

Ana Cristina Fiuza De Albuquerque


Médica Formada pela Universidade Técnica Privada Cosmo – UNITEPC (1997-2003). Cirurgiã
Geral pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2010-2012).
Experiencia Profissional: Cirurgiã Geral do Hospital Regional Norte - HRN. Cirurgiã Geral da Santa
Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS. Preceptora da Graduação e do Internato do Curso de
Medicina do Centro Universitário Inta- Uninta.

Ana Dimitria Gomes Ponte


Médica Formada pela Universidade Federal do Ceará /Sobral – UFC (2010-2015). Cirurgiã Geral
pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2017-2019).
Experiencia Profissional: Cirurgiã Geral do Hospital Regional Norte - HRN. Cirurgiã Geral da Santa
Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS.

Anderson José Vieira Da Silva


Médico Formado pela Escola Latino Americana – ELAM (2002-2008). Cirurgião Geral pela Santa
Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2018-2020). Experiência
Profissional: Médico do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência – Samu/Ceará. Coordenador
Médico da Emergência do Hospital Ana Lima, Maracanaú – Ceará. Médico Chefe de Equipe Upa
Canidezinho e Upa Messejana.

Antônio Robson Gomes Ximenes


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará /Sobral – UFC (2009-2014). Cirurgião Geral
pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2016-2018).
Experiência Profissional: Cirurgião Geral do Hospital Regional Norte - HRN. Cirurgião Geral da
Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS

Arnaldo Paula Pessoa Azevedo Júnior


Residência em Clínica Médica HPS 28 de Agosto/UNL De Manaus - AM. Residência em
Endoscopia pelo Hospital Oncológico Ophir Loiola da Universidade Estadual do Pará-Uepa.
Membro da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva – SOBED. Experiência Profissional:
Médico Endoscopista no Hospital da Unimed de Sobral. Médico Endoscopista do Hospital Regional
Norte – HRN. Médico da Endogastro de Sobral.

Artur Guimarães Filho


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará – UFC (1977-1982). Cirurgião Geral Pelo
Hospital Geral de Fortaleza/Universidade Federal do Ceará – UFC (2017-2019). Titular do Colégio
Brasileiro de Cirurgia – TCRC. Mestrado em Cirurgia pela Universidade Federal do Ceará- UFC.
Doutorado em Cirurgia pela UFC. Ex Coordenador da Residência de Cirurgia Geral da Santa Casa de
Misericórdia de Sobral- SCMS. Experiencia Profissional: Presidente da Comissão e Controle de
Infecção do Hospital da Unimed Sobral. Professor Titular do Curso de Medicina da Universidade
Federal do Ceará – UFC. Cirurgião Geral da Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS.
Cirurgião Geral do Hospital da Unimed Sobral. Autor do Livro Pesquisa Rápida em Enfermaria
Cirúrgica.

Breiner Rodrigues de Almeida Ferro


Médico formado pela Universidade Federal de Goiás - UFG (2008-2013); Cirurgião Geral pela
Universidade de Brasília - UnB (2014-2015); Urologista pelo Hospital Geral de Goiania- HGG (2017
- 2019); Experiência profissional: Cirurgião Geral do hospital regional do gama-df (HRG)

Breno Alexander Bispo


Interno do curso de Medicina do Instituto e Centro de Pesquisas São Leopoldo Mandic Campinas
(SP). Ex presidente da Liga de Cirurgia Geral São Leopoldo Mandic - LCSLM (2019); Diretor
Científico e de estágios da Liga de Neurologia e Neurocirurgia São Leopoldo Mandic - LANN
(2019); Membro Fundador da Liga Acadêmica de Anatomia Humana São Leopoldo Mandic -
LAANATO (2017); Diretor de Marketing da IV Gestão do Centro Acadêmico André Ricardo Ribas
Freitas - C.A.A.R.R.F. (2017); Presidente e Organizador do 1º Congresso “Inovações em Cirurgia:
Para onde Vamos?” (2018); Idealizador e Organizador do Curso: “Imersão em Cirurgia Plástica para
o Cirurgião Geral” (2019). Observership em Neurocirurgia na Technischen Universität Dresden -
Department of Neurosurgery (2020).
Cádmo Silton Andrade Portella
Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará – UFC (1981-1987). Cirurgião Geral pelo
Hospital César Cals em Fortaleza (1988-1989). Formado em Administração Hospitalar pela
Universidade Estadual do Ceara – UECE (1985). Formado em Medicina do Trabalho pela UFC.
Formado em Endoscopia Digestiva pelo Instituto Nacional do Câncer – Inca (1995). Experiência
Profissional: Cirurgião Geral da Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS. Cirurgião Geral do
Instituto José Frota – IJF/Fortaleza. Professor Concursado do Curso de Medicina da Universidade
Federal do Ceará/Sobral.

Caio Plácido Arcanjo


Médico Formado pela Universidade de Fortaleza– UNIFOR (2011-2017). Cirurgião Geral pela Santa
Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2018-2020). Experiencia
Profissional: Médico Emergencista do Hospital Regional Norte - HRN.

Danilo Frota Guimarães


Médico Formado pela Universidade de Fortaleza. Cirurgião Geral pelo Hospital Ana Nery pela
Universidade Federal da Bahia- UFBA (2013-2014) Residência em Endoscopia pelo Hospital
Universitário Walter Cantídio/Universidade Federal do Ceará – HUWC/UFC (2015-2016). Membro
da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva – SOBED. Experiência Profissional: Cirurgião e
Endoscopista no Hospital da Unimed de Sobral. Médico Endoscopista do Hospital Regional Norte –
HRN. Médico da Endogastro de Sobral.

Diego De Aragão Bezerra


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará – UFC/Sobral (2001-2006). Cirurgião Geral
pelo Hospital Geral César Cals-/Universidade Federal do Ceará -HGCC /UFC (2009-2011),
Cirurgião Oncológico pelo Instituto do Câncer do Ceará – ICC/UFC- (2011-2014) Mestre em
Ciências da Saúde pela UFC /Sobral. Doutorando pelo Departamento de Cirurgia - UFC. Experiência
Profissional: Cirurgião Geral do Hospital Regional Norte - HRN. Cirurgião Oncológico na Santa
Casa de Misericórdia de Sobral - SCMS. Professor Efetivo de Oncologia do Curso de Medicina da
UFC /Sobral.

Eduardo Fausto de Andrade Filho


Médico formado pela Universidade do Vale do Sapucaí (1990). Mestrado em Cirurgia Plástica
Reparadora pela Escola Paulista de Medicina (1999). Membro Titular da Sociedade Brasileira de
Cirurgia Plástica e Craniomaxilofacial. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em
Cirurgia Plástica e Restauradora, atuando principalmente no seguinte tema: Cirurgia reparadora pós
ressecção de tumores. Atualmente é Professor Assistente da Disciplina de Cirurgia Plástica do
Instituto e Centro de Pesquisas São Leopoldo Mandic de Campinas/SP e Coordenador da Liga
Acadêmica de Cirurgia Plástica São Leopoldo Mandic– LACIRPL-SLM.

Elson Arruda Linhares


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará – UFC (1978-1983). Cirurgião Geral pelo
Hospital Geral Cesar Cals/Universidade Federal do Ceará – UFC (1986-1988). Experiencia
Profissional: Diretor Clínico do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Sobral. Diretor Clínico do
Hospital da Unimed. Coordenador da Residência de Cirurgia Geral da SCMS. Cirurgião Geral da
Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS. Cirurgião Geral do Hospital da Unimed.

Eneivaldo Soares Mororó


Médico Formado pela Universidade Estadual Do Piauí – UESPI (2003-2010). Cirurgião Geral pela
Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2011-2013). Cirurgião
Cabeça e Pescoço pela Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza - SCMF/Universidade Federal do
Ceará – UFC (2014-2015) Experiência Profissional: Cirurgião Geral da Santa Casa de Misericórdia
de Sobral – SCMS. Cirurgião Cabeça e Pescoço do Serviço de Oncologia da SCMS. Preceptor do
Internato do Curso de Medicina da Universidade Federal do Ceará – UFC. Preceptor do Internato do
Curso de medicina do centro Universitário Inta- Uninta. Preceptor da Residência em Cirurgia Geral
da SCMS.

Erika Silva Spessirits


Médica Formada pelo Centro Universitário do Pará (2010-2016). Cirurgiã Geral pela Santa Casa de
Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2018-2020). Experiência
Profissional: Médica Plantonista do Hospital da Unimed Sobral. Médica Plantonista do Hospital
Dom Walfrido.

Fábio Goussain Labat


Graduação em medicina pela USP em 1992. Residencia médica em cirurgia geral pela USP no
Hospital das Clínicas de SP. Médico preceptor da Residência médica em cirurgia geral e do aparelho
digestivo no hospital do Mandaqui desde 1997.
Professor facilitador do internato em cirurgia geral da Uninove desde 2007. Médico coordenador do
serviço de cirurgia geral e do aparelho digestivo no CHM.

Fábio José Bonafé Sotelo


Cirurgião Vascular com títulos MEC/AMB, Doutorado pela Universidade Federal de São Paulo,
UNIFESP, Coordenador da Disciplina de Cirurgia Cardiovascular da Universidade Nove de Julho,
Diretor do Departamento de Cirurgia do Hospital Ipiranga UGA-II São Paulo, Coordenador do
Programa de Residência Médica em Cirurgia Vascular do Hospital Ipiranga UGA-II São Paulo, Vice-
diretor De Defesa Profissional da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular da regional
de São Paulo (SBACV – SP), Vice-Presidente do COREME do Hospital Ipiranga UGA-II São Paulo,
Membro Internacional da Society for Vascular Surgery (SVS), Revisor Convidado da Revista
Einstein e Clinics, Diretor da Clínica Sotelo São Paulo.

Felipe Barbosa Rios


Médico Formado pela Universidade Federal do Acre – UFAC (2012-2017). Cirurgião Geral pela
Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2018-2020).
Experiência Profissional: Médico Emergencista do Hospital Regional Norte – HRN.

Francisco Wendel De Sousa Arruda


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará /Sobral – UFC (2005-2010). Cirurgião Geral
pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2011-2013).
Coloproctologia pelo Hospital Universitário Walter Cantídio/Universidade Federal do Ceará – UFC
(2014-2017). Endoscopia Digestivopelo Hospital Geral de Fortaleza/Escola de Saúde Pública do
Ceará (2017-2018). Experiência Profissional: Pronto Socorro Hospital Unimed Sobral (2012-2013).
Samu e Outros Atendimentos Pré-Hospitalares (2012-2015). Cirurgião Geral em Hospitais Públicos e
Privados (2013-2019). Preceptoria em Cirurgia Geral (2013-2019). Serviço de Endoscopia do
Hospital Regional Norte - HRN.

Gabriel Bernardo Rena


Interno do curso de Medicina do Instituto e Centro de Pesquisas São Leopoldo Mandic Campinas/SP.
Recebeu bolsa para pesquisa científica da FAPESP. Apresentou trabalho científico no congresso
American Association for Cancer Research em Austin/TX.Foi monitor do curso de Medicina do
Instituto e Centro de Pesquisas São Leopoldo Mandic Campinas/SP na cadeira de Habilidades
Médicas I e II.

Geterson Bezerra Moreira


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará /Sobral – UFC (2001-2006). Cirurgião Geral
pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2007-2009).
Especialista em Endoscopia Digestiva pela Faculdade de Ciências Médicas de Juiz De Fora (2014-
2015) com Certificado de Área de Atuação em Endoscopia Digestiva pela SOBED/AMB.
Especialista em Doenças Funcionais e Manometria do Aparelho Digestivo pelo Hospital Israelita
Albert Einstein. Experiência Profissional: Cirurgião Geral da Santa Casa de Misericórdia de Sobral –
SCMS. Professor do Curso de Medicina do Uninta. Supervisor do Programa de Residência Médica
em Cirurgia Geral da SCMS/UFC. Atuou como Cirurgião Geral no Centro de Especialidades
Médicas, Policlínica Bernardo Félix e Hospital Regional Norte. Endoscopista da Clínica Geterson
Moreira.

Gilberto Sadala Mendes


Formado pela Faculdade Estadual de Medicina do Pará (1987-1992), Médico Anestesiologista pelo
Cet Integrado De Santos / Hospital da Beneficiência Portuguesa de Santos, Título de Especialista em
Anestesiologia pela SBA, Preceptor de Anestesiologia pela Uninove

Giovana Battaglia
Estudante do quinto ano de Medicina da Universidade Nove de Julho, campus Vergueiro.

Guilherme Pinho Mororó


Graduando do 9 Semestre do Curso de Medicina da Universidade Federal do Ceará – UFC.

Gustavo Nader Guidoux


Médico formado pela Universidade José do Rosário Vellano - UNIFENAS (2000-2005). Cirurgia
geral no Hospital Belo Horizonte (2006-2009). Pós Graduação em Videolaparoscopia (2009-2010).
Especialista em Cirurgia Geral pelo Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Professor da Faculdade de
Medicina do IMEPAC - Araguari. Cirurgião Geral do Hospital Santa Genoveva - Uberlândia-MG.

Higor Chagas Cardoso


Cirurgião vascular e Ecografista - SBAC/CBR/AMB. Professor mestre - Faculdade de Medicina
UFG/UniEVANGÉLICA

Isabela Alcântara Rocha


Estudante do 6º ano de Medicina, em formação pela IMEPAC - Com interesse especial em
anestesiologia e também nas áreas de terapia intensiva e medicina de urgência e emergência

Ivan Kirche Duarte


Médico pela Universidade Nove de Julho (UNINOVE) - campus Vergueiro (2010-2015), cirurgião
geral pelo Conjunto Hospitalar do Mandaqui (2016-2018), residente de Urologia pelo Hospital
Edmundo Vasconcelos (2020-2023).

Jackeline Ribeiro Oliveira Guidoux


Médica formada pela Universidade José do Rosário Vellano - Unifenas, Alfenas, MG (1999-2004).
Cirurgião geral pelo Hospital Universitário Alzira Velano, Alfenas/MG. Mastologista pelo Hospital
Mater Dei, Belo Horizonte/MG. Título de especialista em Mastologia -TEMA, pela Sociedade
Brasileira de Mastologia. Mestre em Ciências da Saúde pela UFG. Docente do curso de Medicina do
Imepac Centro Universitário, Araguari/MG. Docente do curso de Medicina do Imepac Itumbiara.

Janiel Carvalho Ponte


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará /Sobral – UFC (2004-2010). Cirurgião Geral
pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2011-2013).
Experiência Profissional: Cirurgião Geral do Hospital Regional Norte - HRN. Cirurgião Geral da
Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS. Médico do Serviço de Atendimento Móvel de
Urgência – Samu/Sobral. Cirurgião Geral do Hospital da Unimed. Preceptor da Graduação e do
Internato do Curso de Medicina do Centro Universitário Inta- Uninta. Preceptor da Residência
Médica de Cirurgia Geral da SCMS.

Janssen Loiola Melo Vasconcelos


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará – UFC/Sobral (2008-2013). Cirurgião Geral
pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2014-2016).
Cirurgião Oncológico pelo Instituto do Câncer do Ceará – ICC/UFC- (2017-2019). Experiência
Profissional: Cirurgião Geral do Hospital Regional Norte - HRN. Cirurgião Oncológico na Santa
Casa de Misericórdia de Sobral- SCMS. Cirurgião Geral da Santa Casa de Misericórdia de Sobral –
SCMS. Cirurgião Geral do Hospital da Unimed Sobral.

Joannillson Taygon Vilarinho Barbosa


Médico Formado pela Universidade Federal do Cariri – UFCA (2012-2018). Experiência
Profissional: Diretor Clínico e Plantonista do Hospital Municipal Antônio Ribeiro da Silva. Prescritor
da Clínica Médica no Hospital Municipal Dr. Abelardo Gadelha da Rocha.

João José Da Ponte Portela


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará – UFC (1982-1988). Cirurgião Geral pelo
Hospital Geral de Fortaleza/Universidade Federal do Ceará – UFC (1988-1989). Urologista pelo
Hospital Geral de Fortaleza (1990-1992). Experiencia Profissional: Cirurgião Geral e Urologista da
Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS. Cirurgião Geral e Urologista do Hospital da Unimed.
Preceptor da Residência Médica de Cirurgia Geral da SCMS. Cirurgião Geral e Urologista da
Secretaria de Saúde de Fortaleza.

João Paulo Ribeiro Silva


Médico Formado pela Estácio FMJ – Juazeiro do Norte (2006-2012). Cirurgião Geral pelo Hospital
Universitário Walter Cantídio HUWC/UFC-Fortaleza (2012-2014). Título de Especialista pelo
Colégio Brasileiro de Cirurgiões – CBC. Experiência Profissional: Cirurgião Geral Emergencista no
Hospital Regional Norte – HRN. Cirurgião Geral pela Secretaria de Saúde de Fortaleza. Preceptor da
Graduação e do Internato do Curso de Medicina do Centro Universitário Inta- Uninta.

João Victor Maretti


Interno do curso de Medicina da Universidade Nove de Julho (UNINOVE - campus Vergueiro). Foi
membro do Centro Acadêmico César Timo-Iaria (C.A.C.T.I.) e vice-presidente do XIII Congresso
Médico Acadêmico UNINOVE. Atuou na Liga de Neurologia e Neurocirurgia, tendo permanecido
também como membro titular da Liga de Cirurgia Oncológica da mesma instituição.

José Alberto Guilherme Frota Júnior


Médico Formado pela Universidade De Fortaleza – UNIFOR (2013 – 2018). Residente de Cirurgia
Geral na Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2019 - 2021).

Juarez Jucá De Queiroz Neto


Médico Formado pela Unichristus (2013 – 2018). Residente de Cirurgia Geral na Santa Casa de
Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2019 - 2021). Experiência
Profissional: Médico Emergencista do Hospital da Unimed de Sobral.

Karla Orlany Costa Gomes Aires


Nutricionista pela Universidade Federal do Piauí – UFPI (2009-2014). Especialista com Residência
Multiprofissional em Urgência e Emergência pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS
(2015-2017). Especialista em Terapia Nutricional e Nutrição Clínica pelo Instituto GANEP (2016-
2018). Experiência Profissional: Nutricionista da Unimed Medicina Preventiva em Sobral-CE.
Nutricionista do NASF em Sobral-CE.

Laís Siqueira de Magalhães


Estudante de Medicina da Universidade Nove de Julho (UNINOVE) - Campus Vergueiro (2015-
2020). Intercambista em programas de pesquisa científica (Universidad Autónoma de Nuevo León,
Monterrey, México - 2017), de estágio hospitalar (Semmelweis University, Budapeste, Hungria -
2018) e de trabalho voluntário (ONG Volunteering Solutions, Cusco, Peru - 2019). Participou da
organização de congressos acadêmicos, bem como apresentou trabalhos em congressos de âmbito
nacional.

Lara Ranulfo de Mendonça


Graduanda em Medicina na Universidade de Rio Verde campus Aparecida de Goiânia. Fundadora e
Diretora da Liga Acadêmica do Aparelho Digestivo, membro da Liga do Aparelho Digestivo e
membro da Liga de Cirurgia Geral. Afinidade pelas áreas de Cirurgia, Infectologia e de Medicina
Integrativa.

Larissa Miranda Rocha


Interna de medicina do IMEPAC Centro Universitário, Araguari/ MG

Leandro do Couto Aguiar


Graduado em Medicina pela UFG (Universidade Federal de Goiás). 7/1/2010 Especialista em
Cirurgia Geral e Cirurgia do cirurgia plastica pela universidade federal de São Paulo UNIFESP- EPM
fev/2011-marco/2016. Especialização (fellowship) em rinoplastia estruturada funcional e estética por
2 anos. Mar 2016-fev 2018. Fellowship em reconstrucao de mama por 1 ano. Marc2017-mar 2018.
Membro titular da sociedade brasileira de cirurgia plastica - SBCP. Professor da Habilidades medicas
(TO e ambulatorio de cirurgia) pela UNiRV. Corpo clínico de Cirurgia Plástica do Hospital Órion-
Einstein.

Leticia Maria Casagrande de Oliveira


Graduanda do curso de medicina do 5° ano na Universidade Nove de Julho campus Vergueiro.
Interessada em cirurgia geral, especialmente emergência e trauma.

Mariane de Castro Michielin


Interna do curso de Medicina do Instituto e Centro de Pesquisas São Leopoldo Mandic Campinas/SP.
Atual Vice-Presidente da Associação Brasileira das Ligas de Cirurgia Plástica – ABLCP, braço
acadêmico da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica – SBCP. Membro Acadêmico da Sociedade
de Medicina e Cirurgia de Campinas – SMCC. Ex-Presidente da Liga Acadêmica de Cirurgia Plástica
São Leopoldo Mandic – LACIRPL-SLM (2018-2019). Fez parte da Diretoria de outras ligas
acadêmicas, como Vice-Presidente da Liga de Dermatologia São Leopoldo Mandic – LADERM-
SLM (2018) e Diretora de Marketing da Liga de Anatomia Humana – LAANATO-SLM (2017).
Organizou congressos e cursos na área de Cirurgia Plástica e Dermatologia, com destaque ao “V
Encontro Nacional da SBCP e ABLCP” (2020) e Curso de Extensão: “Imersão em Cirurgia Plástica
para o Cirurgião Geral” da SLM – Presidência (2019), e campanhas nacionais voluntárias de
promoção à saúde. Além disso, realizou diversas produções científicas e apresentações de trabalhos
no âmbito da Cirurgia Plástica e Dermatologia.
Marina Rodrigues Lima
Interna do Curso de Medicina do Centro Universitário Uninta.

Octavio Henrique Arcos Campos


Médico pela Universidade de Brasília (2002-2008). Cirurgião Geral pela Unesp (2010-2011).
Urologista pelo HSPM (2012-2015). Membro Titular da SBU, possui Certificação em Cirurgia
Robótica. Urologista Assistente do HSPM e Professor de Urologia da UniNove.

Patrick Teles Frota Capote


Médico Formado pela Universidade Federal Do Maranhão – UFMA (2000-2006). Cirurgião Geral
pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2010-2012).
Endoscopia Digestivo pelo Hospital Geral de Fortaleza/Escola de Saúde Pública Do Ceará (2014-
2015). Experiência Profissional: Cirurgião Geral da Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS.
Cirurgião Geral do Hospital da Unimed. Preceptor do Internato do Curso de Medicina do Centro
Universitário Inta- Uninta. Preceptor da Residência Médica de Cirurgia Geral da SCMS.
Coordenador do Serviço de Cirurgia do HRN. Coordenador do Serviço de Endoscopia do Hospital da
Unimed /Sobral. Médico do Serviço de Endoscopia do HRN.

Paula Daher Rassi Guimarães


Acadêmica de medicina da UniEVANGÉLICA. Ex-presidente da Liga Acadêmica de
Gastroenterologia de Anápolis. Com interesse em pediatria e gastroenterologia.

Petrônio Fonteles Andrade


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará (2013 – 2018). Residente de Cirurgia Geral na
Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2019 - 2021).
Experiência Profissional: Médico Emergencista do Hospital da Unimed de Sobral.

Rafael Aires de Castro


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará /Sobral – UFC (2009-2015). Cirurgião Geral
pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal Do Ceará – UFC (2016-2018).
Residente de Cirurgia Vascular do Hospital da Restauração - UPE/Recife. Experiência Profissional:
Cirurgião Geral do Hospital Regional Norte - HRN. Cirurgião Geral da Santa Casa de Misericórdia
De Sobral – SCMS.

Rafael Azeredo Bastos


Interno do 6 ano de medicina da Universidade Nove de Julho

Rafael Bernardo Da Silva


Médico Formado pela Universidade Estadual do Ceará– UECE (2005-2010). Pediatra pelo Hospital
Infantil Albert Sabin (2012 -2014). Cirurgião Geral pela Santa Casa de Misericórdia de
Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2018-2020). Experiencia Profissional: Médico
Emergencista do Hospital Geral de Fortaleza – HGF. Emergencista Pediátrico do Hospital Regional
Norte – HRN.

Raimundo Nonato Araújo


Médico Formado pela Universidade Federal do Ceará – UFC /(1988). Médico Cirurgião Geral da
Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS. Médico Cirurgião Geral e do Serviço de
Ultrassonografia do Hospital da Unimed de Sobral.

Renato Kátrio Policarpo Carvalho


Médico Formado pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG (2004-2010). Cirurgião
Geral pela Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal Do Ceará – UFC (2017-
2019). Experiência Profissional: Cirurgião Geral do Hospital Regional Norte - HRN. Cirurgião Geral
da Santa Casa de Misericórdia de Sobral – SCMS.

Rhuce Pedrosa Carvalho


Médica Formada pela Unichristus (2013 – 2018). Residente de Cirurgia Geral na Santa Casa de
Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2019 - 2021). Experiência
Profissional: Médica Emergencista do Hospital Ana Lima – Rede Hapvida e Hospital Infantil de
Fortaleza. Médica Emergencista do Pronto Atendimento de Forquilha – CE.

Ricardo Pagrion Neto


Estudante do 5 ano de medicina pela Universidade Nove de Julho- Vergueiro. Interessado em
Cirurgia Geral, seguido de Urologia.

Roberto Salvador Martins


Médico formado pela Faculdade de Medicina de Botucatu - Universidade Estadual Paulista – UNESP
(1991 a 1996). Pediatra e Intensivista Pediátrico formado na Faculdade de Medicina de Botucatu -
Universidade Estadual Paulista – UNESP (1997 a 1999), Titulado pela AMIB em 2000. Mestre em
Farmacologia pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP em 2017. Experiência
profissional: Foi Referência Técnica da UTI Pediátrica de 2002 a 2018, é Médico Assistente da UTIP
do Hospital Municipal Dr. Mário Gatti desde o ano 2000. Docente da Faculdade de Medicina São
Leopoldo Mandic de Campinas/SP, no curso de Medicina, desde 2013. Instrutor dos cursos PALS,
BLS e ACLS – American Heart Association.

Rogério Fortunato de Barros


Formado em Medicina pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Concluiu a
residência de Cirurgia Geral no Hospital Municipal de Campinas Dr. Mario Gatti em 2005. Concluiu
a residência de Cirurgia Infantil na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas)
em 2008. Concluiu Doutorado da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em 2012. Trabalha
no Hospital Universitário de Jundiaí com vínculo municipal obtido por concurso público como
Cirurgião Infantil. Professor voluntário da Faculdade de Medicina de Jundiai, realiza cirurgias
semanais com os residentes e internos da Faculdade. Trabalhou 7 anos na PUC-Campinas como
Cirurgião Infantil assistente e foi coordenador da residência médica 3 anos (2011-2014). Trabalha no
Hospital Dr Mário Gatti com vínculo municipal obtido por concurso público como Cirurgião Infantil.
Atualmente é professor coordenador da disciplina de cirurgia pediátrica da faculdade de Medicina
São Leopoldo Mandic. Desde janeiro de 2015 assumiu a coordenação do departamento de cirurgia
pediátrica da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Campinas (SMCC). Coordena com o apoio da
SMCC o site Pedline (www.pedline.org.br) em projeto filantrópico de prevenção precoce de doenças
na infância. Coordena a Liga de Cirurgia da Faculdade de Medicina São Leopoldo Mandic. Em Julho
de 2017 assumiu a coordenação das ligas acadêmicas da Faculdade de Medicina São Leopoldo
Mandic.

Saulo Pinto Nunes


Médico Formado pela Universidade Federal da Paraíba (2011-2017). Residente de Cirurgia Geral na
Santa Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2019 - 2021).
Experiência Profissional: Médico Chefe de Equipe da Upa /Sobral

Tárcilla Pinto Passos Bezerra


Médica Formado pela Universidade Federal do Ceará - UFC/Sobral (2001-2006). Residência em
Clínica Médica pelo Hospital Universitário Walter Cantídio – HUWC/UFC (2010-2011), Pós-
graduação em Cuidados Paliativos (2013-2014). Experiência Profissional: Professora Efetiva de
Semiologia e Clínica Médica do Curso de Medicina da UFC/Sobral. Médica Diarista da Unidade de
Cuidados Especiais do Hospital Regional Norte – UCE /HRN.

Thais Vasconcelos
Médica Formada pela Universidade Federal do Piauí – UFPI (2011-2017). Cirurgiã Geral pela Santa
Casa de Misericórdia de Sobral/Universidade Federal do Ceará – UFC (2018-2020). Experiencia
Profissional: Médica Plantonista do Hospital da Unimed Sobral. Médica Plantonista do Hospital
Dom Walfrido.

Thales Resende Damião


Médico formado pelo Centro Universitário Barão de Mauá (2000 - 2005). Anestesiologista (TEA -
Título de Especialista em Anestesiologia) pelo Hospital de Base de São José do Rio Preto -
H.B/FAMERP - FUNFARME (2006 - 2008). Médico Anestesiologista do Hospital de Clínicas de
Uberlândia-MG. Médico Anestesiologista da CLINEST LTDA Araguari-MG. Professor de
Anestesiologia do IMEPAC Araguari-MG

Victor Costa Monteiro


Acadêmico do curso de Medicina do Instituto Master de Ensino Presidente Antônio Carlos em
Araguari - MG, monitor de técnica cirúrgica e semiologia médica desde 2018. Fundou a Liga
Acadêmica de Nutrologia (LANUT) e integrou a diretoria das ligas acadêmicas de: Cirurgia,
Cardiologia e Pediatria. Fundador do Projeto de Práticas Estudantis Cirúrgicas (PROPEC) da
respectiva instituição. Criador do aplicativo “MINHA SAÚDE APP” que está disponível
gratuitamente para a população.
Parte 1: Princípios Básicos da Cirurgia Geral

Parte 1 | Capítulo 1

Cirurgia segura
Autora: Tamires Guimarães Cavalcante Carlos de Carvalho
Coautor: Dra. Alessandra Muoio

1. COMO ERA E COMO É


“O que as drogas não curam, a faca curará; o que a faca não cura, o cautério curará; o que o
cautério não cura, deve ser considerado incurável.” Desde o tempo em que esse trecho do
Corpus Hippocraticum foi escrito (por volta de 450 a.C.), a cirurgia se atrelou ao campo de
guerra. As batalhas culminavam com inúmeros feridos que necessitavam de uma
intervenção médica rápida, não raramente em condições precárias.
A cirurgia, em grande parte da história, foi uma conduta aterrorizante. Sem a assepsia e a
anestesia adequadas, ser submetido a uma intervenção cirúrgica era quase um instrumento
de tortura, além de uma possível sentença de morte. Hoje em dia, com o advento de
diversas tecnologias, podemos avançar as expectativas em relação a uma cirurgia. Nossas
expectativas são de cura e, muitas vezes, de resolução definitiva do adoecimento.
Dessa maneira, a medicina atual está preparada para ser o mais segura e eficaz que
puder. Nesse sentido, erros evitáveis devem ser observados de perto com o intuito de serem
extinguidos. A segurança do paciente deve ser prioridade.

2. Fatores humanos
No período da década de 1970 e começo dos anos 1980, os acidentes aéreos de grande
porte eram comuns (ao menos dois por ano). Só em 1977 foram oito casos registrados,
somando cerca de 980 mortos. E, à medida que o número de voos comerciais crescia,
aumentava também a frequência dos desastres. Investigações apontavam que a maior
parte das ocorrências era devida a falhas humanas. Erros que, segundo investigadores da
época, poderiam ser evitados eliminando ambientes hostis dentro das cabines de comando
e possibilitando o trabalho em equipe, com a tripulação envolvida ativamente na solução
dos problemas a bordo.
3. O que a aviação nos ensinou
As estatísticas forçaram as autoridades da época a repensar a segurança do setor. Em
1979, a Nasa criou o sistema de formação profissional e compartilhamento de informações
conhecido por Gerenciamento de Recursos da Tripulação (CRM, na sigla em inglês, de Crew
Resource Management ), hoje utilizado em todas as escolas de aviação. Divisor de águas, o
programa de treinamento instituiu mudanças nos comportamentos da equipe de voo,
tripulação e demais integrantes das companhias que operam na terra. Com a medida, a
frequência de acidentes envolvendo aviões comerciais se reduziu drasticamente, colocando
o veículo entre os mais seguros do mundo. Hoje, para cada 100 mil milhas viajadas, a média
de morte é de 0,01, enquanto que de trem e carro esse número sobe para 0,04 e 0,94,
respectivamente.
Tendo sua origem no programa de pesquisa de fatores humanos da NASA, o CRM tem
como meta o uso eficaz de todos os recursos disponíveis para garantir segurança e
eficiência nas operações aéreas. Seu treinamento busca a mudança nas atitudes e nos
comportamentos da tripulação, da equipe de voo e de todos os integrantes das companhias.
A discussão em torno do modelo de segurança da aviação aplicado aos cuidados na
saúde já tinha sido levantada pelos órgãos ligados ao setor há alguns anos. Em 1999, o
Institute of Medicine (IOM) publicou o relatório “Errar é Humano”, constatando que falhas do
trabalho em equipe e comunicação respondiam por 75% dos erros médicos nos EUA. E
ainda nos anos 1990, a Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ) criou o
MedTeams Project, tomando como modelo o TeamSteps da aviação. Hoje, a Joint
Commission on Accreditation of Healthcare Organizations (JCAHO) recomenda às
instituições que solicitam a acreditação incorporar cursos de teamwork e comunicação a
seus programas de educação profissional.

4. Protocolo de cirurgia segura


O protocolo de cirurgia segura do Ministério da Saúde em parceria com a ANVISA e
FioCruz é o principal guia para uma cirurgia segura no Brasil. Ele está descrito da seguinte
maneira:
A Lista de Verificação divide a cirurgia em três fases:
I – Antes da indução anestésica
II – Antes da incisão cirúrgica
III – Antes de o paciente sair da sala de cirurgia

Cada uma dessas fases corresponde a um momento específico do fluxo normal de um


procedimento cirúrgico. Para a utilização da Lista de Verificação, uma única pessoa deverá
ser responsável por conduzir a checagem dos itens.
Em cada fase, o condutor da Lista de Verificação deverá confirmar se a equipe completou
suas tarefas antes de prosseguir para a próxima etapa. Caso algum item checado não esteja
em conformidade, a verificação deverá ser interrompida e o paciente, mantido na sala de
cirurgia até a sua solução.

I – Antes da indução anestésica


O condutor da Lista de Verificação deverá:
• Revisar verbalmente com o próprio paciente, sempre que possível, sua
identificação, para que esta seja confirmada

• Confirmar que o procedimento e o local da cirurgia estão corretos


• Confirmar o consentimento para cirurgia e a anestesia
• Confirmar visualmente o sítio cirúrgico correto e sua demarcação
• Confirmar a conexão de um monitor multiparâmetro ao paciente e seu
funcionamento

• Revisar verbalmente com o anestesiologista o risco de perda sanguínea do


paciente, dificuldades nas vias aéreas, histórico de reação alérgica e se a
verificação completa de segurança anestésica foi concluída

II – Antes da incisão cirúrgica (pausa cirúrgica)


Neste momento, a equipe fará uma pausa imediatamente antes da incisão cirúrgica para
realizar os seguintes passos:

• A apresentação de cada membro da equipe pelo nome e pela função


• A confirmação da realização da cirurgia correta no paciente correto, no sítio
cirúrgico correto

• A revisão verbal, uns com os outros, dos elementos críticos de seus planos para a
cirurgia, usando as questões da Lista de Verificação como guia

• A confirmação da administração de antimicrobianos profiláticos nos últimos 60


minutos da incisão cirúrgica

• A confirmação da acessibilidade dos exames de imagens necessários


III – Antes de o paciente sair da sala de cirurgia
A equipe deverá revisar em conjunto a cirurgia realizada por meio dos seguintes passos:
A conclusão da contagem de compressas e instrumentais

• A identificação de qualquer amostra cirúrgica obtida


• A revisão de qualquer funcionamento inadequado de equipamentos ou questões
que necessitem ser solucionadas

• revisão do plano de cuidado e as providências quanto à abordagem pós-


operatória e da recuperação pós-anestésica antes da remoção do paciente da sala
de cirurgia

IV – Definições

• Lista de Verificação: lista formal utilizada para identificar, comparar e verificar um


grupo de itens/procedimentos

• Demarcação de lateridade: demarcação de local ou locais a ser operados. Essa


demarcação é particularmente importante em casos de lateralidade (distinção
entre direita e esquerda), estruturas múltiplas (p. ex., dedos das mãos e dos pés,
costelas) e níveis múltiplos (p. ex., coluna vertebral)

• Condutor da Lista de Verificação: profissional de saúde (médico ou profissional da


enfermagem) que esteja participando da cirurgia e seja o responsável por conduzir
a aplicação da lista de verificação, de acordo com diretrizes da instituição de saúde

• Segurança anestésica: conjunto de ações realizadas pelo anestesiologista, que


visa à redução da insegurança anestésica por meio da inspeção formal do
equipamento anestésico, da checagem dos medicamentos e do risco anestésico do
paciente antes da realização de cada cirurgia. Esse procedimento deve seguir as
orientações contidas no Manual para Cirurgia Segura da OMS, traduzido pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA

• Equipe cirúrgica: equipe composta por cirurgiões, anestesiologistas, profissionais


de enfermagem, técnicos e todos os profissionais envolvidos na cirurgia

V –Ampliações
Atualmente há uma discussão em torno da ampliação do checklist de cirurgia segura
para outras áreas da medicina. Dentre elas, o checklist de parto seguro está ganhando
atenção especial.
A lista de verificação, desenvolvida e testada em parceria com a Ariadne Labs, um centro
conjunto do Brigham and Women’s Hospital e do Harvard T.H. Escola de Saúde Pública Chan,
apoiada pela Fundação Bill & Melinda Gates, sintetiza as Diretrizes e as Recomendações da
OMS existentes baseadas em evidências em uma ferramenta prática e única, com o objetivo
de melhorar a aderência às melhores práticas, incluindo comunicação adequada no
momento do parto.
A lista de verificação identifica quatro pontos de pausa correspondentes a um período
específico no fluxo normal de trabalho de um profissional de saúde: quando a mãe é
internada, imediatamente antes da expulsão (ou antes da cesariana), dentro de 1 hora após
o nascimento e antes da mãe e do recém-nascido receberem alta.
Esse checklist foi usado em plano piloto em nove países da África e da Ásia, com
resultados significativos. O próximo passo é explorar a viabilidade de usar a lista de
verificação em diversos contextos em todo o mundo.

Referências
1. CAIRUS, Henrique. Da natureza do homem Corpus hippocraticum. História, ciências, saúde-Manguinhos, v. 6, n. 2,
p. 395-430, 1999.
2. HAYNES, Alex B.; BERRY, William R.; GAWANDE, Atul A. What do we know about the safe surgery checklist now?.
Annals of surgery, v. 261, n. 5, p. 829-830, 2015.
3. HELMREICH, Robert L.; MERRITT, Ashleigh C.; WILHELM, John A. The evolution of crew resource management
training in commercial aviation. The international journal of aviation psychology, v. 9, n. 1, p. 19-32, 1999.
4. MAHAJAN, Ravi P. The WHO surgical checklist. Best Practice & Research Clinical Anaesthesiology, v. 25, n. 2, p.
161-168, 2011.
5. MCCONAUGHEY, Edie. Crew resource management in healthcare: The evolution of teamwork training and
MedTeams®. The Journal of perinatal & neonatal nursing, v. 22, n. 2, p. 96-104, 2008.
. MOREY, John C. et al. A transition from aviation crew resource management to hospital emergency departments:
the MedTeams story. In: Proceedings of the 12th international symposium on aviation psychology. Wright State
University Press Dayton, OH, 2003. p. 14-17.
7. Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo desafio global para a segurança do paciente. Cirurgias Seguras
Salvam Vidas. Tradução Nilo MS, Duran IA. Rio de Janeiro: Organização Panamericana da Saúde (OPAS); 2009.
. PIZZI, Laura; GOLDFARB, Neil I.; NASH, David B. Crew resource management and its applications in medicine.
Making health care safer: A critical analysis of patient safety practices, v. 44, p. 511-519, 2001.
Parte 1 | Capítulo 2

Nomenclatura cirúrgica
Autora: Paula Daher Rassi Guimarães
Coautor: Dr. Higor Chagas Cardoso

• Termos para indicar um determinado procedimento cirúrgico.


• Termos:
• Sinônimos → diferente grafia, mas mesmo significado:
enxerto autólogo = autoenxerto.

• Epônimos → nome da técnica ou instrumental ao nome de


quem descobriu/popularizou:
Incisão de McBurney
Técnica de Milligan-Morgan
Afastador de Farabeuf
Gastrectomia Billroth II

• Termos híbridos→ associação de duas palavras ou línguas


para formar uma palavra:
Apendicite, radioterapia, hipertensão

• Afixação→ associa a determinada raiz ou radical um


prefixo ou um sufixo:
Prefixo + raiz ou raiz + sufixo
Alguns radicais:
Entero → intestino
Nefro → rim
Oofor → ovário
Hístero → útero
Orqui → testículo
Salpinge→ trompa
Rino → nariz
Osteo→ osso
Procto → reto
Cisto → bexiga
Cole → vesícula
Colo → cólon
Colpo → vagina
Adeno → glândula
Sufixos:
Tomia → abertura
Centese → punção de uma cavidade
Ectomia → retirada
Stasia → parar
Anastomose → união
Stomia (proteger, desviar, alimentar) → exteriorizar
uma estrutura através de outra, podendo ser o próprio
órgão (colostomia) ou algum artifício (traqueostomia)
Plastia→ altera a forma do órgão sem mudar a
função (cardioplastia→ criar válvula/bolsa na cardia
para diminuir refluxo)
Dese → fixar/amarrar (artrodese de coluna → colocar
placas de titânio
Pexia → fixar órgão no sítio original ou trazer para
local correto
Síntese → sutura
Rafia → sutura
Tripsia → quebra (litotripsia → quebrar cálculo)
Scopia → olhar no interior

Nomes:

• Papilotomia → abertura da papila duodenal.


• Toracotomia → abertura da parede torácica.
• Drenagem → toracotomia + toracostomia fechada em selo
d’água.

• Flebotomia → dissecção (individualização e cateterismo) da


veia.

• Cistostomia →abertura na bexiga → drenagem de urina


• Coledocostomia →abertura no colédoco →dreno de Kehr
• Colostomia →abertura no cólon → através da parede
abdominal

• Gastrostomia →abertura no estômago (sonda/parede abd.)


• Histeropexia →suspensão e fixação do útero
• Nefropexia → suspensão e fixação rim
• Orquiopexia (orquidopexia) → abaixamento e fixação do
testículo em sua bolsa

• Salpingoplastia → plastia da trompa


• Piloroplastia → plastia do piloro
• Colporrafia → sutura da vagina
• Gastrorrafia → sutura do estômago
• Herniorrafia → sutura da hérnia
• Tenorrafia→ sutura do tendão

Referências
1. GOFFI, Fábio Schimidt et al. Técnica Cirúrgica: Bases
Anatômicas. Fisiopatológicas e Técnicas da Cirurgia. 4ª Ed, São
Paulo, Atheneu, v. 822, 2004.
2. MARQUES, Ruy Garcia. Técnica operatória e cirurgia
experimental. Grupo Gen-Guanabara Koogan, 2000.
3. TOWNSEND, Courtney et al. Sabiston Tratado de Cirurgia: a base
biológica da prática cirúrgica moderna. Elsevier Brasil, 2014.
Parte 1 | Capítulo 3

Ambiente cirúrgico e seus


profissionais
Autora: Leticia Maria Casagrande de Oliveira
Coautora: Dra. Adriana Santos de Oliveira

1. Introdução
O ambiente cirúrgico tem grande importância para o sucesso da
realização de seus procedimentos, seja qual for o porte cirúrgico.
Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)¹ na
série de segurança do paciente de 2013 as infecções relacionadas ao
sítio cirúrgico ocupam a terceira posição entre todas as infecções em
serviços de saúde, sendo 14% a 16% das encontradas em pacientes
hospitalizados.
A manutenção desse espaço conta com o preparo dos
profissionais envolvidos, do sítio cirúrgico e com a qualidade dos
instrumentos utilizados. A grande relevância da metodologia
empregada está no risco que a ruptura com a esterilidade pode
representar aos pacientes cirúrgicos.

1.1 Paramentação e segurança


A paramentação do sítio cirúrgico e dos profissionais cria uma
barreira de segurança biológica de contato direto entre o paciente e
os profissionais, materiais, equipamentos e o restante do ambiente.
Ela é feita de forma a evitar o máximo de interferências negativas ao
paciente e para a proteção individual do profissional.
1.1.1 Preparo das mãos
A lavagem das mãos vem antes da paramentação com roupas
específicas e é de extrema importância para a manutenção do
ambiente cirúrgico adequado. O preparo das mãos mudou de fato a
história da medicina e sua intenção é reduzir ao máximo infecções.
Não é permitido o uso de anéis, relógios, unhas compridas e
unhas artificiais.
A lavagem das mãos tem como objetivo retirar a população
transitória de bactérias enquanto que preserva a população
permanente (população fisiológica).

Deve ser realizada sempre em local adequado antes de se iniciar


o procedimento. Após a lavagem será realizado o calçamento das
luvas estéreis, ou seja, a lavagem das mãos não significa a
esterilização destas, uma vez que só estará de fato estéril com a
luva.
A lavagem deve ocorrer em lavatório com acionamento de água
tratada sem as mãos, com uso de escovas com material degermante
e por meio de uma rotina adequada que deve durar em média 5
minutos.
As rotinas de lavagem podem variar, contudo, devem sempre
respeitar as seguintes regras:

• Deve-se inicialmente espalhar o produto pela pele, pelas mãos


e pelo antebraço.

• A lavagem das mãos, do antebraço e do cotovelo deve ser


realizada com a parte mais macia da escova cirúrgica
(esponja).

• O início deve ser na parte distal (dedos) e seguir para


proximal (antebraço e cotovelo), não se devendo voltar a parte
distal após lavagem da proximal.

• As duas mãos devem ser lavadas antes de se seguir para os


antebraços e, por sua vez, esses dois devem ser escovados
antes de se passar para o cotovelo; ou seja, só depois dos dois
lados derem lavados é que se passa para o próximo estágio.

• Não deve ser deixada nenhuma parte dos dedos até o


antebraço sem escovação.

• A lavagem das unhas deve ser feita com o uso da região


plástica mais dura da escova cirúrgica (escova).

• Deve-se enxaguar os membros no mesmo sentido da


escovação, ou seja, de distal para proximal.

• Não chacoalhar e abanar as mãos, o antebraço e os


cotovelos após a lavagem.

• Após a lavagem não abaixar as mãos abaixo da cintura até o


fim do procedimento cirúrgico.
Imagens da lavagem de mãos World Health Organization²

A secagem das mãos vem logo após a lavagem e precede a


colocação do avental cirúrgico. Ela deve ocorrer dentro da sala
cirúrgica com compressas ou material adequados e para essa
finalidade.
A secagem e a lavagem seguem sempre a sequência de distal
para proximal; à diferença que um membro inteiro deve ser secado
para só após isso se dobrar a compressa e passar para o outro
membro.
De acordo com ANVISA, a duração do procedimento deverá ser de
3 a 5 minutos para a primeira cirurgia e de 2 a 3 minutos para as
cirurgias subsequentes (sempre seguir o tempo de duração
recomendado pelo fabricante do degermante).

1.1.2 Roupas específicas


Fazem parte da roupa específica dos profissionais no centro
cirúrgico: calça e camisa (roupa privativa), máscara, gorro, propé,
avental cirúrgico (jaleco cirúrgico, capote), luva estéril e proteção
ocular.

2. Roupa Privativa
Consiste na calça e na camisa que devem ser utilizados dentro do
ambiente do centro cirúrgico. Por ser apenas limpo, o uniforme não
pode tocar em superfícies estéreis.
A camisa precisa cobrir todo o tronco, do final do pescoço até o
início da pélvis. Devido a riscos de contato dos braços com fluidos
orgânicos, deve ter manga mais longa. Isso também protege contra a
liberação de microrganismos das axilas. A calça precisa cobrir
totalmente os membros inferiores, protegendo o trabalhador e
também evitando a liberação ao ambiente da flora de suas pernas e
seu períneo.
Alguns estudos sugerem calças com fechamento nos tornozelos
como as mais adequadas para impedir a liberação dessa flora.
Sua função é evitar a liberação de microrganismos da pele, do
tronco e dos membros.

3. Máscara
Deve ser utilizada dentro da sala cirúrgica, sempre que algum
instrumento estéril esteja exposto ou se a cirurgia estiver em
qualquer fase de andamento.
A máscara deverá cobrir totalmente a boca e o nariz.
Sua função visa proteção tanto do paciente quanto do profissional
de saúde. Ela evita a liberação de microrganismos oriundos do nariz
e da boca dos profissionais, protegendo o cliente de contaminação.
Do lado do profissional, protege suas mucosas de respingos de
sangue e outros fluidos do cliente.
Caso no ato cirúrgico ocorra da máscara cair é papel do circulante
arrumá-la.

4. Gorro
Deve ser utilizado desde a entrada no centro cirúrgico. Deverá
cobrir por completo o
couro cabeludo, cabelo, costeletas e orelhas. Sua função é
prevenir queda de partículas e/ou cabelos no sítio cirúrgico.

5. Propé e/ou sapato privativo


Justificado na prevenção de contaminação do chão de áreas
críticas por micro-organismos que são carreados nas solas dos
sapatos e podem ser liberados ao ambiente. Porém, sua eficácia no
controle de infecções tem sido questionada em vários estudos que
revelam:5, 6,7

• Diferença não significativa de contaminação do chão entre


calçados comuns e propés;

• Não é habitual a troca de propés, mesmo após pisotear


secreções orgânicas presentes no chão, que se disseminam
por todas as áreas do centro cirúrgico;

• O ato de caminhar é a mais importante causa da dispersão


bacteriana do chão do que o tipo de cobertura de sapatos
utilizados;

• Micro-organismos do chão dificilmente se dissipam ao ar


ambiente e não são aqueles causadores de infecção do sítio
cirúrgico;
• A chance de contaminação de uma ferida com micro-
organismos oriundos do chão se dá antes pela sua veiculação
e por contato do que pela sua disseminação do chão para o ar
ambiente.8
Mesmo assim, coberturas de sapatos ou sapatos privativos
continuam sendo recomendados nos EUA para proteção do
trabalhador contra contaminação com fluidos.9 Entretanto, há que se
atentar também para a sua eficácia como barreira, uma vez que
esses dispositivos atualmente utilizados (tamancos com orifícios
para transpiração e propés) não evitam ferimento dos pés com
objeto perfurocortante.
Nesse caso, o ideal seriam sapatos privativos fechados, pois os
modelos anteriormente citados não contribuem para o controle de
infecções e ainda determinam custos desnecessários.
No Brasil o uso é facultativo de acordo com as diretrizes da
Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina
(agosto de 2001).8,9,10

6. Avental Cirúrgico (jaleco, capote)


Pode ser descartável ou de pano reutilizável lavado e estéril. Os
descartáveis têm uma camada plástica que os tornam impermeáveis,
os de pano não têm.
O avental cirúrgico também desempenha dupla função: proteção
do paciente e do profissional da saúde. Em relação ao profissional:
protege a pele do corpo da exposição à sangue e a outros fluidos
orgânicos oriundos do paciente. Do ponto de vista do paciente, o
avental cirúrgico o protege da contaminação de micro-organismos
provenientes do corpo do profissionais
O avental deve ser utilizado dentro da sala cirúrgica segundo os
seguintes passos:

• Com as mãos e o antebraço devidamente escovados e


lavados deve-se segurar o avental pela parte superior longe de
locais em que este possa chocar-se;
• Deixar que o avental se desdobre pela ação da gravidade;
• Sem tocar na face externa do avental introduzir os braços na
manga do lado correspondente;

• Pedir a um auxiliar que este amarre as tiras do pescoço;


• Amarrar as tiras da cintura também com auxílio de um
assistente
O lado externo não deve tocar em superfícies não estéreis. É
retirado pelo avesso, sendo tocado somente em seu lado interno,
dessa vez, para proteger o profissional contra contaminação ocorrida
do lado externo.

7. Luva estéril
Tem dupla função, protegendo tanto o paciente quanto quem
realiza o procedimento.
É o que efetivamente deixa as mãos estéreis, contudo, mesmo
assim é necessário o preparo das mãos antes de seu uso, bem como
sua correta colocação.
Deve ser calçada logo após a escovação adequada de mãos e
antebraço, secagem adequada e a colocação do avental cirúrgico. Só
calçar as luvas estéreis após o ajuste total do avental. Deve seguir os
seguintes paços de colocação:

• Abrir o envelope de modo que os punhos fiquem voltados para


a pessoa que vai calçar;

• Verificar se as luvas vieram pré-dobradas de forma adequada;


• Calçar a luva da mão não dominante segurando com a mão
dominante, tomando cuidado para segurar na parte dobrada
do punho sem contaminar o lado estéril;

• Calçar a luva da mão dominante com o auxílio da mão não


dominante, com os dois dedos da mão não dominante na
dobra do lado estéril;

• Puxar ambos os punhos para cobrir o punho do avental.


• Caso no ato cirúrgico ocorra trauma da luva estéril o próprio
médico, ou quem está realizando o procedimento, deve trocar
a luva por uma nova.

8. Protetor ocular
Recomendado especialmente para proteção dos trabalhadores.
Seu modelo deve evitar o contato da mucosa ocular com sangue e
outros fluidos.

8.1 Instrumental cirúrgico

A instrumentação cirúrgica deve ser sistemática, sua organização


tem grande importância no sucesso dos procedimentos que ocorrem
na sala cirúrgica. O trabalho de instrumentação cirúrgica deve ocorrer
desde a contagem de compressas até a instrumentação ao cirurgião
responsável.
O instrumental cirúrgico varia de acordo com cada intervenção a
ser realizada, mas sua base se mantém. É necessário conhecer o
instrumental bem como seus nomes e suas funções, sua disposição
na mesa e sua utilização em cada tempo cirúrgico.
A abertura do instrumental cirúrgico deve ocorrer o mais próximo
possível do ato cirúrgico, após as portas da sala de cirurgia serem
fechadas.
A montagem da mesa com os instrumentais cirúrgicos deve
obedecer a disposição em 4 regiões: diérese, homeostasia, síntese e
especiais.
A mesa deve ser disposta de tal forma que a categoria diérese
esteja o mais próxima do instrumentador, permitindo assim a
passagem facilmente entre este e o cirurgião.
Pode-se ou não utilizar gazes para auxiliar no posicionamento dos
instrumentos.

ESPECIAIS SÍNTESE
INSTRUMENTADOR CIRURGIÃO
DIERESE HOMEOSTASIA
8.2 Diérese
O termo diérese diz respeito a corte e separação, sendo, portanto,
necessários para a dissecção de estruturas durante o procedimento

• Bisturis
a. Cabo de bisturi número 3
b. Cabo de bisturi número 4

• Tesouras de Metzenbaum

tesoura de metzenbaum reta

a.Tesoura de Metzenbaumreta
b.Tesoura de Metzenbaumcurva

• Tesoura de Mayo

tesoura de mayo curva

a.Tesoura de Mayo reta


b.Tesoura de Mayo curva

8.3 Homeostasia
São os instrumentos necessários para o controle do sangramento
do paciente

• Pinça hemostática de Halsted


a. Pinça hemostática de Halstead reta
b. Pinça hemostática de Halstead curva

• Pinça hemostática de Kelly: pinça na qual os sulcos são pela


metade; na prática quando se pede a pinça de Kelly em geral
está se referindo à curva
a. Pinça hemostática de Kelly reta
b. Pinça hemostática de Kelly curva

• Pinça de Crile
a. Pinça de Crile reta
b. Pinça de Crile curva

• Pinça de Rochester
a. Pinça de Rochester reta
b. Pínça de Rochester curva

• Pinça de Kocher
a. Pinça de Kocher reta
b. Pinça de Kocher curva

• Pinça de Mixter
8.4 Síntese
• Pinça de Adson: pinça fina para estruturas mais delicadas
a. pinça de Adson com dente
b. pinça de Adson sem dente

• Pinça anatômica
a. pinça anatômica com dente
b. pinça anatômica sem dente

• Porta-agulha
8.5 Especiais
São instrumentos utilizados propriamente durante o procedimento
para auxiliar e acessar mais facilmente o paciente.

• Afastador de Farabeuf

• Afastador de Doyen

• Afastador de Finochietto

• Afastador de Gosset
• Pinça de Collin Coração

• Pinça de Allis

8.6 Antissepsia do sítio cirúrgico


A antissepsia diz respeito à inibição e à remoção de
microrganismos patogênicos e impurezas de tecidos vivos por meio
de degermação e antissepsia de forma sistemática. Pode ser
realizada por meio químico e físico.4
O meio químico é o desinfetante antisséptico e é considerado
adequado quando tem atividade germicida mesmo na presença de
sangue, soro, muco ou pus sem irritar pele e mucosas do paciente.
Em geral usa-se álcool, iodo e hexaclorofeno. Sua atuação ocorre por
meio da escovação do paciente.

• Os álcoois mais usados na antissepsia do sítio cirúrgico são


o etílico e o isopropílico em associação com glicerina por
ressecarem a pele; sua ação é bactericida, fungicida e virucida.

• O iodo é bactericida, fungicida e tem ação relativa sobre


vírus; sendo seu composto mais usado com álcool iodado,
uma vez que é pouco solúvel em água.
O meio físico diz respeito a calor e radiação e também são
usados para conseguir esterilização.

Conclusão
De fato é indiscutível a necessidade de um ambiente cirúrgico que
esteja adequadamente preparado, do preparo de instrumentos e do
paciente para um procedimento bem-sucedido.
Busca-se cada vez mais aprimorar técnicas e instituir práticas
pragmáticas de atuação. O futuro das cirurgias e seu sucesso até o
momento está amplamente relacionado a essas práticas, seja desde
o preparo das mãos, uma prática clássica e institucionalizada até
limpeza dos tecidos vivos, com práticas e substâncias inovadas com
frequência.
Este capítulo tem grande importância para qualquer profissional
da área de saúde que pretenda atuar em procedimentos cirúrgicos,
uma vez que dá a base desses procedimentos e seus instrumentos
respectivamente necessários.
O que se deve levar de aprendizado são as técnicas e os
procedimentos de paramentação da equipe, sempre dando a devida
atenção ao preparo das mãos e colocação adequada dos
equipamentos de segurança, a importância de se saber nomes e
localização dos instrumentos cirúrgicos. Por fim, é necessário saber
a boa utilização de meios químicos de antissepsia, suas atuações e
suas limitações.

Referências
1. Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Critérios diagnósticos de infecção
relacionada à assistência à saúde. Série Segurança do Paciente e Qualidade em
Serviços de Saúde; 2013.
2. WHO, World Health Organization, First Global Patient Safety Challenge Clean Care.
3. AMB – Associação Médica Brasileira. Prevenção da infecção hospitalar. Sociedade
Brasileira de Infectologia; 2001. Ago 2001 [acesso em 2020 jan 7].
4. Moriya T, Módena JLP. Assepsia e antissepsia: técnicas de esterilização.
Medicina (Ribeirão Preto). 2008;41 (3): 265-73 [acesso em 2020 jan 7].
5. Ayliffe GA, Lilly H. Cross-infection and its prevention. J.Hos p. Infect., 1985: 6: 47-57.
Suppl. B.
. Carter R. Ritual and risk. Nurs.Times, 1990; 8(13):63-4.
7. Coop G. et al. Footwear practices and operating room contamination. Nurs. Res., 1987;
36(6):366-9.
. Garner JS. CDC Guideline for prevention of surgical wound infections. Today’s OR
Nurse, 1986; 8(3):33-40.
9. Garner JS. Guideline for isolation precautions in hospitals. Inf.Cont.Hosp.Epidem.,
1996; 17(1): 50-80.
10. Gaya H. Is it necessary for staff and visitors in an intensive care unit to wear masks,
hats, gowns and overshoes? Nurs. Times, 1990; 86(13): 63-4.
Parte 1 | Capítulo 4

Resposta Endócrina, Metabólica e


Imunológica ao Trauma (REMIT)
Autores: Antonio Robson Ximenes e Juarez Jucá de Queiroz Neto

1. INTRODUÇÃO
Sempre que ocorre uma agressão ao organismo humano, qualquer que seja a causa ou
mecanismo, desencadeia-se um complexo conjunto de respostas que são iniciadas
imediatamente, necessárias para manter a homeostase e a vida. Se o processo que levou à
lesão tecidual é de pequena intensidade, a resposta endócrina e imunológica tende a ser
temporária e a restauração da homeostase metabólica e imune prontamente ocorre. No
entanto, em pacientes vítimas de trauma extenso, a resposta à agressão sofrida pode ser
exacerbada, causando disfunção orgânica e aumentando os riscos de mortalidade.
É necessário, portanto, que o cirurgião esteja familiarizado com os eventos endócrinos,
metabólicos e imunológicos que ocorrem no organismo do paciente submetido a
intervenções cirúrgicas e indivíduos que sofreram grandes traumas, para que esses
eventos possam ser evitados ou manejados corretamente.
Para que a resposta ao trauma ocorra é necessária a integração e a sincronização de
três elementos fundamentais: o Sistema Nervoso Autônomo, o Hipotálamo e a Hipófise. A
porção aferente Sistema Nervoso Autônomo capta o estímulo dos nociceptores e leva a
informação até o Hipotálamo que será o grande coordenador da REMIT. Por sua vez, a
porção eferente, após a resposta do hipotálamo, será responsável pelo estímulo da
produção de hormônios contrarreguladores que ajudarão a gliconeogênese.

2. RESPOSTA METABÓLICA
A resposta metabólica pode ser dividida em três fases: Fase Ebb, Fase Flow e Fase
Anabólica.
A fase EBB, segundo a literatura, ocorre imediatamente após o trauma, caracterizando-
se por uma franca instabilidade hemodinâmica, representada por hipovolemia, hipotensão,
diminuição do fluxo sanguíneo, aumento da resistência vascular sistêmica, além de
aumento da insulina, de catecolaminas, e de gluco e mineralocorticoides circulantes,
esgotamento do glicogênio hepático, distúrbios no transporte de oxigênio para as células, e
aumento do consumo de oxigênio. Nessa fase, apesar do aumento nos hormônios
contrarreguladores, é marcada por hipometabolismo.
Após esse período, inicia-se a segunda fase. A fase Flow, simbolizada por uma retenção
hídrica, aumento da permeabilidade vascular, diminuição da resistência vascular, sistêmica,
com aumento crescente das catecolaminas, glicocorticoides, produzindo hiperglicemia e
proteólise. Nessa fase o hipermetabolismo é encontrado.
Após o término da fase Flow, inicia-se a fase anabólica que, dependendo da intensidade
do trauma ou do procedimento cirúrgico pode levar meses para ser concluída. Os
hormônios que estavam elevados voltam gradativamente aos níveis séricos normais.
Ocorre o anabolismo proteico, seguido do anabolismo lipídico. Os pacientes nessa fase
tendem a recuperar o seu peso habitual que foi perdido durante a fase catabólica.

CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS DAS FASES EBB E FLOW

FASE EBB FASE FLOW

Aumento da resistência Redução da resistência


vascular sistêmica vascular sistêmica

Hipovolemia Hipervolemia

Hipometabolismo Hipermetabolismo

Diminuição da insulina Aumento da insulina

Aumento das catecolaminas Aumento das catecolaminas

3. RESPOSTA ENDÓCRINA
A resposta hormonal ao trauma tem como um de seus principais objetivos o estímulo a
gliconeogênese por meio do estímulo da produção de cortisol, catecolaminas, hormônio
antidiurético (ADH), hormônio do crescimento (GH), entre outros. Esses hormônios, além de
auxiliarem a formação de glicose, promovem alterações fisiológicas no organismo do
paciente.
Após a injúria, o organismo do paciente traumatizado necessita de uma grande
demanda de glicose para que a restauração da homeostase ocorra. A glicose armazenada
no fígado, dependendo da extensão da lesão, pode ser consumida nas primeiras 12 horas
pós-trauma. Por essa razão, processo de gliconeogênese é iniciado.
A glicose será formada por meio de substratos não glicídios: as proteínas musculares e
os lipídios que, após a proteólise e lipólise, serão transformados em aminoácidos, ácidos
graxos e glicerol. Esse processo, estimulado pelo cortisol, pode ser exacerbado em
pacientes vítimas de traumas extensos. A proteólise descontrolada leva a um
comprometimento da musculatura diafragmática, fenômeno que traz prejuízo a dinâmica
respiratória, e a perda de proteínas viscerais.
A insulina, hormônio essencialmente anabólico, tem sua secreção reduzida e tem sua
resistência periférica aumentada para aumentar o aporte sérico de glicose. A importância
do sistema insulina-glucagon no controle do nível de glicose sanguínea está no fato de que
o cérebro utiliza apenas glicose como fonte energia, portanto, é essencial que a glicose
seja sempre mantida acima dos níveis críticos.
A produção das catecolaminas pela medula adrenal, além de auxiliarem o processo de
gliconeogênese, estimulam a taquicardia para aumentar o débito cardíaco durante a
primeira fase da REMIT, promovem taquipneia para aumentar o aporte de 02 para os
tecidos, aumento da atividade plaquetária e fibrinólise. Os níveis séricos de adrenalina e
norepinefrina apresentam-se elevados por 12-24h, dependendo do tamanho do trauma.
A aldosterona é estimulada pelo Sistema Nervoso Autônomo e pelo aumento do
potássio liberado com a lesão celular causada pelo trauma. Esse hormônio contribui para a
retenção hídrica e diminui a excreção de sódio, além de aumentar a excreção de potássio, a
fim de normalizar seus níveis séricos e de H+. Sendo assim, existe no pós-operatório uma
tendência natural a alcalose metabólica.
O hormônio antidiurético (ADH), nos casos de grandes traumas, sua secreção chega a
elevar, segundo estudos, 50 vezes. Suas ações são osmorreguladoras, vasoativas e
metabólicas. Provoca reabsorção de água livre dos túbulos distais e coletores dos rins.
Sendo assim, podemos encontrar oliguria e edema no pós-operatório.
Além dos citados acimas, o hormônio do crescimento (GH) também está presente na
REMIT. Apesar de ser um hormônio anabólico, o GH, no trauma, estimula a lipólise e,
consequentemente, auxilia na produção de glicose para o organismo.

HORMÔNIOS AÇÕES

Mobilização de aminoácidos – Facilita ação das


CORTISOL
catecolaminas

Inibe secreção de insulina – Aumento da contratilidade


CATECOLAMINAS
cardíaca

ALDOSTERONA Retenção de água – Aumento de volemia

Reabsorção de água – Gliconeogênese


ADH
Hepática

GH Estimula a lipólise – Promove anabolismo proteico

4. RESPOSTA IMUNOLÓGICA
Durante a fase aguda do trauma os macrófagos, linfócitos e leucócitos, além de
migrarem para o local lesado, promovem a síntese de citocinas. Essas substâncias atuam
como hormônios e podem ter ações a distância. Essas ações tanto podem ser benéficas
ao organismo quanto maléficas.
O TNF-a, IL-1, IL-2 causam anorexia, atraso na cicatrização, pois podem desencadear
uma resposta inflamatória exacerbada no trauma. Além disso, elevação de PCR e
fibrinogênio também pode ser encontrado.
5. MANEJO DA REMIT EM CIRURGIAS
ELETIVAS
Pacientes candidatos a cirurgias eletivas podem ter uma Resposta ao Trauma
controlada. A avaliação pré-cirúrgica, a decisão na técnica a ser utilizada e o manejo
correto do jejum pré-operatório devem ser estimulados. É sabido que o jejum prolongado
pode levar um estado catabólico. Por esse motivo, a hidratação com Soro Glicosado 5%
deve ser realizada a fim de minimizar as chances de hipermetabolismo.
Além disso, sempre que possível, as técnicas cirúrgicas laparoscópicas devem ser
priorizadas. Pacientes submetidos a estas técnicas, apresentam um grau menor de
complicações pós-operatórias devido à menor agressão tecidual e, por consequência,
apresentam uma menor resposta endocrinometabólica ao trauma.
A ansiedade pré-operatória também é conhecida por aumentar a liberação de
catecolaminas pelo paciente. Como explicado anteriormente, isso resultará em aumento da
pressão arterial, aumento da frequência cardíaca e uma maior chance de arritmia. Por essa
razão, estudos mostram que o uso de benzodiazepínicos no pré-operatório para controlar a
ansiedade dos pacientes é benéfico e deve ser estimulado.

REFERÊNCIAS
1. Lemos MF et al . A informação no pré-operatório reduz a ansiedade pré-operatória em pacientes com câncer
submetidos à cirurgia: utilidade do Inventário Beck de Ansiedade. Rev. Bras. Anestesiol., Campinas, 2019;
69(1): 1-6. [acesso em 2019 out. 5].
2. Sousa JAG Programa de Autoavaliação em Cirurgia – Perspectivas Atuais em Videolaparoscopia – Colégio
Brasileiro de Cirurgiões.
3. Nunes JM. Resposta Neuroendócrina e Metabólica ao Stress.
4. Basile-Filho A, Suen VMM, Martins MA, Coletto FA, Marson F. Monitorização da resposta orgânica ao trauma e à
sepse. Medicina, Ribeirão Preto, 2001; 34: 5-17
5. Silva APA, Freitas BJ, Oliveira FLC, Piovacari SMF, Nóbrega FJ. Terapia nutricional em queimaduras: uma
revisão. Rev Bras Queimaduras, 2012; 11(3):135-141.
. Medeios AC, Dantas Filho AM. Metabolic Response to Trauma. Rio Grande do Norte: Federal University of Rio
Grande do Norte, 2017.
7. Melo REVA, Vitor CMA, Silva MBL, Luna LA, Firmo ACB, Melo MMVA. Resposta hormonal no paciente
politraumatizado. International Journal of Dentistry, Recife, 2005 Jan/Jun; 4(1):31-36.
Parte 1 | Capítulo 5

Distúrbios hidroeletrolíticos e ácido-


base
Autores: Renato Kátrio Policarpo Carvalho e Aldenir Rocha de
Oliveira Filho

1. INTRODUÇÃO
O Equilíbrio Ácido-Base (EAB) e hidroeletrolítico é a base
molecular pela qual a vida se mantém e sua monitoração inicia-se
com a avaliação dos parâmetros ácido-base séricos, a maioria dos
doentes portadores desses desequilíbrios necessitam de cuidados
intensivos, qualquer que seja a patologia de base. A avaliação é um
instrumento fundamental, pois, além dos desvios do equilíbrio
acidobásico, acaba fornecendo outras informações de dados sobre
a função respiratória e as condições de perfusão tecidual. Os
sistemas orgânicos enfrentam dois desafios básicos para a
manutenção do EAB. O primeiro desafio é a distribuição nos
espaços orgânicos da cota fixa de ácidos, ingerida na dieta diária, o
segundo é o destino dado ao CO2 (dióxido de carbono) gerado pela
respiração celular como produto final do metabolismo aeróbio. O
organismo lança mão de uma série de mecanismos bioquímicos
para manter o pH dentro dos limites compatíveis com os processos
vitais, podemos destacar o papel desempenhado pelo chamado
sistema tampão, sendo fundamental para o entendimento do
equilíbrio acidobásico.1
Nos procedimentos invasivos do organismo como as cirurgias,
esse equilíbrio ácido-base pode ser muito afetado, como no
processo da hiperventilação intraoperatória pode causar alcalose
respiratória, e esta aumenta a afinidade da hemoglobina pelo
oxigênio com bloqueio parcial da glicólise aeróbica com
consequente acúmulo de ácido lático; cessada a hiperventilação, ao
término da cirurgia, pode ocorrer hipoventilação por depressão do
centro respiratório, ainda na presença do mecancimos
compensatórios da hiperventilação, o que exacerba metabolismo
anaeróbio iniciado durante a anestesia resultando em acidose
metabólica, isso adiociona mais gravidade a eventuais
complicações pós-operatórias aumentando o risco de disfunção
orgânica Nos estudos do pós-operatório, temos diversos fatores que
podem surgir para possíveis complicações como a depressão
respiratória na reversão anestésica, favorecem o aparecimento de
acidose, em contradição com outros que sugerem que toda cirurgia
não complicada em paciente metabolicamente sadio tende a
provocar alcalose metabólica.3
Em momento da intervenção cirúrgica, os pacientes podem
apresentar alterações do Equilíbrio Hidroeletrolítico (EHE), além das
complicações no Equilíbrio Ácido-Base (EAB). No período pré-
operatório essas alterações podem decorrer da própria doença de
base ou de problema clínicos associados. Durante a cirurgia as
alterações são proporcionais ao tempo e ao porte da cirurga,
orientando ,assim, quais procedimentos deve-se ter mais atenção e
maior controle pelo anestesista, sobretudo em pacientes
predispostos. No pós-operatório os distúrbios hidroeletrolíticos
estão condicionados à magnitude das alterações hormonais da
resposta orgânica ao trauma e ao tempo de duração da hidratação
endovenosa, necessária enquanto as vias oral e enteral não forem
factíveis. Em qualquer momento, antes, durante ou após a cirurgia,
todo ato relacionado à prescrição de hidratação deve ser precedido
do correto diagnóstico do estado de hidratação do paciente.2
O manejo de hidratação do paciente no pré-operatório busca a
restrição hídrica, visando respeitar a oliguria e a retenção de sódio
em resposta à maior liberação de aldosterona e hormônio
antidiurético (ADH) desencadeada pelo trauma cirúrgico. Outro tipo
de hidratação, baseada no balanço hidroeletrolítico diário, visa a
reposição de água e eletrólitos segundo as perdas diárias, o que
subentende que a administração está condicionada à reação
orgânica ao trauma. Já a hidratação com sobrecarga hidrossalina
tem o objetivo de bloquear ou reduzir a liberação de ADH e
aldosterona interferindo na resposta do organismo à cirurgia.4
A figura 1 (a seguir) demonstra os diversos mecanismos ativados
durante um trauma cirúrgicos que podem atuar modificando o EAB
de um paciente cirúrgico.
A alcalose é uma alteração muito frequente no pré-operatório
imediato. A acidose respiratória, metabólica ou mista é a alteração
mais comum na hora que sucede o término do ato operatório. Do 1º
ao 3º dia do pós-operatório a alcalose metabólica é a alteração
predominante do equilíbrio ácido-base. A hidratação com
sobrecarga hidrossalina reduz a incidência de alcalose metabólica
no pós-operatório, predispondo a acidose, quando comparada com
os outros métodos de hidratação.3
Figura 1
Fonte: MEDEIROS, A.C.5

Para o entendimento da perda de alguns componentes


hidroeletrolíticos e ácido-base é preciso deixar claro que no
organismo existe três grandes compartimentos hídricos, o
intracelular, intravascular e extravascular, sendo que as reações
enzimáticas ocorrem no meio intracelular, e que em circunstâncias
especiais ocorre uma perda interna de água, eletrólitos e proteínas,
isotônico com o plasma ou ligeiramente hipotônico para o meio
extravascula (intersticial), na forma de edema na área traumática,
cirúrgica ou não, edema do peritônio e do mesentério, derrame
pleural, ascite, sucos digestivos estagnados nas alças intestinais,
tais coleções são consequências de desequilíbrios AB e HE gerando
meios de cultura para patógenos e para possíveis complicações
médicas as quais podem necessitar de procedimento cirúrgico no
curso terapêutico. Esse quadro retrata tembem o “sequestro hídrico”
podendo corresponder a uma perda de vários litros de água, por
exemplo, na peritonite generalizada por úlcera péptica perfurada ou
por pancreatite aguda, na obstrução intestinal ou ainda nas cirurgias
de grande porte em que a área de dissecção for muito extensa. A
perda é, em princípio, provisória e a água sequestrada retorna para o
compartimento intravascular à medida que há resolução da
patologia que originou a coleção.2

2. ALTERAÇÕES DO EQUILÍBRIO
HÍDRICO E ELETROLÍTICO
As alterações hidroeletrolíticas serão discutidas em sequência, é
importante ressaltar que as alterações hidroeletrolíticas se iniciam
sempre no compartimento extracelular, no intravascular e podem ou
não repercutir em alterações do intracelular.

• Desidratação
A desidratação decorre da deficiência de entradas e/ou excesso
de perdas de água. Pode ser classificada, de acordo com a
tonicidade do espaço extracelular, em: isotônica, hipotônica e
hipertônica. As causas mais frequentes de desidratação são:
falta de ingestão ou perdas extraordinárias pelas vias ordinárias
(via cutânea, pulmonar, poliúria, diarreia) ou por vias
extraordinárias (vômitos, aspiração gastrointestinal, íleo
adinâmico, fístulas digestivas). A desidratação caracteriza-se
clinicamente por sede, oliguria, perda de peso, secura da língua,
olhos encovados, diminuição da elasticidade da pele, rolete
muscular, hipotensão postural, taquicardia, pulso fraco,
obnubilação, febre e coma. A desidratação pode levar também à
alteração de exames laboratoriais, tais como: aumento na taxa
de hemoglobina, hematócrito, proteínas totais, ureia, creatinina,
redução da volemia e aumento da densidade urinária e da
concentração da ureia na urina.6

• Desidratação isotônica
As causas estão relacionadas com as perdas não compensadas
de líquidos isotônicos, como perdas digestivas agudas (vômitos,
diarreia, fístulas digestivas), sequestro no terceiro espaço (íleo
adinâmico, peritonite, grandes áreas de dissecção cirúrgica),
paracentese. O quadro clínico inclui os sintomas e sinais da
desidratação em geral, sobretudo os relacionados à diminuição
do volume circulatória efetivo referente ao espaço intravascular
(oliguria e em casos graves choque hipovolêmico). O
comportamento dos espaços hídricos caracteriza-se pela
retração exclusiva do extracelular, que, por ser isotônica, não
favorece trocas extraordinárias com o intracelular. O tratamento
da desidratação isotônica consiste na administração de
soluções isotônicas.6

• Desidratação hipotônica
As causas se devem a administração insuficiente de água e
sobretudo de sais ou à perda não compensada de maior
quantidade de sais do que água, como exemplo: perdas
digestivas crônicas isotônicas (vômitos, diarreia, fístulas)
tratadas com soluções hipotônicas, hipoaldosteronismo
primário e perda salina em nefropatas.6
Os sintomas dependem da redução do espaço extracelular
(choque hipovolêmico, oliguria), da expansão do intracelular
(sialorreia, diarreia, vômitos) e da redução das taxas de Na+ e de
CI- (astenia, tremores, íleo adinâmico, choque). A escolha da
solução a ser ministrada depende do grau de hipotonicidade do
líquido extracelular. Se a hiponatremia é leve a correção é feita
apenas com solução isotônica; se a hipotonicidade é acentuada
com Na+ plasmático abaixo de 120 mEq/l e, principalmente, se
a manifestação clínica é importante, inicia se o tratamento com
solução hipertônica de NaCI a 3%, pode ser usada a fórmula de
Androgue para o cálculo da reposição, e, a seguir, complementar
a correção da desidratação com solução salina isotônica, ter
cuidado com a correção pois alterações brusca da natremia
podem ocasionar a mielinólise pontina, quadro grave e
irreversível

• Desidratação hipertônica
As causas mais comuns são a perda de líquido hipotônico na
ventilação pulmonar acentuada, sudorese, diabete insípido,
diurese osmótica por hiperglicemia e a oferta insuficiente de
líquido durante nutrição enteral ou parenteral.6
Além dos sintomas e sinais da desidratação em geral, com sede
intensa e oliguria acentuada, os pacientes podem apresentar
febre, agitação psicomotora, confusão mental e coma. Para a
correção dos diferentes tipos de desidratação a quantidade de
água a ser ministrada é a necessária para o retorno da
normalidade do estado hídrico, estimada pelo desaparecimento
dos sintomas e sinais de desidratação, e pelo restabelecimento
do volume urinário horário normal, entre 30 a 60 mEq/l no
adulto. Recomenda-se ofertar K+ (potássio) na forma de KCL (
CLORE TO DE POTASSIOA ) somente após diurese mínima de
800 ml, apresentando densidade urinária maior ou igual a 1018.6

• Super-hidratação
Desenvolve-se, teoricamente, na vigência de oferta exagerada
e/ou perda insuficiente de água. Na prática, porém, o rim normal
e não sujeito à ação hormonal é capaz de eliminar o excesso de
oferta de água e a super-hidratação resulta sempre por perda
insuficiente. A super-hidratação acompanha-se do aumento da
volemia, diluição do plasma, com redução relativa das taxas de
hemácias, de hemoglobina, do hematócrito e de proteínas totais
no plasma. Na prática clínica não se percebe a super-hidratação
hipertônica, somente possível se iatrogênica pela administração
exagerada de líquido hipertônico em paciente com perda hídrica
insuficiente.4
• Super-hidratação isotônica
As causas mais comuns são: cardíaca, renal e hepática. Existe
aumento do líquido extracelular que, por ser isotônico, se
mantém restrito a esse compartimento. O quadro clínico
corresponde a sintomas e sinais de retenção hídrica e da
doença de base (insuficiência cardíaca, renal ou hepática).
Assim, podem estar presentes edema subcutâneo, derrame
pleural, ascite, estertores pulmonares, dispneia, oliguria,
aumento do peso corpóreo, icterícia, alterações neurológicas. O
tratamento, além de medidas restritivas, pode incluir, na medida
da gravidade e da etiologia da super-hidratação, dieta
hipossódica, diuréticos, cardiotônicos e mesmo diálise
peritoneal ou hemodiálise com perdas. Não se deve dar
diuréticos até que seja analisada a causa do edema. Os
diuréticos usados sem critério podem induzir a distúrbios
eletrolíticos, coma hepático, azotemia e arritmias cardíacas.4

• Super-hidratação hipotônica
A causa é a excessiva oferta de água na presença de baixa
diurese. A fonte de água pode ser a ingestão oral, ou, mais
frequentemente, é a excessiva administração parenteral de água
com glicose. Os pacientes com doenças crônicas debilitantes,
como câncer, insuficiência cardíaca congestiva ou insuficiência
hepática ou renal, são propensos a ter expansão do espaço
extracelular com hipotonicidade antes de se submeterem à
cirurgia; no período pós-operatório tendem a expandir e diluir
mais o espaço extracelular.4
Os achados laboratoriais incluem rápida queda na concentração
do Na+ sérico e na osmolaridade plasmática. A urina pode
conter quantidade substancial de Na+ que, na presença de baixa
concentração plasmática, indica inapropriada liberação de Na+
decorrente do excesso de volume do líquido extracelular,
afastando outras causas como, doença renal e insuficiência
adrenal.4
O tratamento da super-hidratação hipotônica baseia-se na
restrição hídrica, reposição de Na+ mediante administração de
solução salina hipertônica em pequenas quantidades, uso
cuidadoso de diurético osmótico (Manitol) e administração
lenta de glicose hipertônica.4

• Alterações do Sódio
O Na+ é o principal cátion do LEC em que apresenta taxa de
concentração entre 138 e 145 mEq/l, com média de 142 mEq/l.
Hiponatremia absoluta pode desenvolver se por ingestão
insuficiente (dieta hipossódica recomendada para nefropatas)
ou por perdas renais e extrarrenais exageradas como poliúria,
diarreia crônica e aspiração gastrointestinal; nefropatias
perdedoras de Na+, frequentemente associadas a drogas e
infecção, o uso abusivo de diuréticos e insuficiência adrenal são
situações que acarretam perda importante de Na+,
condicionando a hiponatremia.7
Considera-se hiponatremia grave quando a concentração de
Na+ plasmático for igual ou menor que 120 mEq/l. Os sinais e
sintomas mais comuns são astenia, oliguria, dificuldade na
concentração mental, alterações da personalidade, taquicardia,
tendência a choque circulatório, confusão, delírio e coma. No
tratamento da hiponatremia absoluta (depleção de Na+) a
reposição pode ser calculada pela fórmula de Androgue,
administrando Na+ para a correção do desequilíbrio
hidroeletrolítico. Calcula-se o déficit de Na+ com base no
volume de água extracelular (20% do peso corporal), onde está a
maior parte do Na+ e que corresponde ao valor estimado
laboratorialmente. A reparação pode ser feita parceladamente,
por exemplo, em 2 dias. Em casos de intoxicação hídrica, o
tratamento visa sobretudo à eliminação do excesso de água
mediante uso de diurético osmótico (Manitol); reposição de Na+
somente em casos com concentração de Na+ abaixo de 110
mEq/l ou paciente sintomáticos.7
Hipernatremia, decorrente de perda de água proporcionalmente
maior que a de Na+ (diabetes insípido, diabete mellitus, febre,
insolação, hiperventilação), reposição insuficiente de perdas
hídricas (redução da ingestão hídrica por náuseas, vômitos ou
incapacidade física), administração excessiva de solutos em
pacientes renais (sal na alimentação por sonda, diuréticos
osmóticos, diálise peritoneal),ou excesso de esteroides.
Considera se hipernatremia grave quando o Na+ alcança 160
mEq/l. O quadro clínico é caracterizado por sede, oliguria,
mucosas secas, febre, taquipneia e alterações neurológicas que
podem ser variadas, incluindo tremor, hiper-reflexia profunda,
confusão mental, alucinações e coma agitado. Trata-se a
doença de base, suprime-se temporariamente a entrada de Na+
e faz-se a reposição hídrica mediante infusão de solução
hipotônica. A reposição muito rápida pode complicar com
edema cerebral.4

• Alterações do Cloro
O cloro é o principal ânion do espaço extracelular, com taxa de
concentração entre 95 e 105 mEq/ l e média de 103 mEq/l. As
alterações do CI- geralmente acompanham as do Na+. A perda
de CI- pode ser causada por dietas prolongadas sem ou com
pouco sal, por vômitos ou por aspiração gástrica pode associar-
se à alcalose metabólica por perda concomitante de H+. A
hipocloremia dilucional (intoxicação hídrica) pode desenvolver
se por administração excessiva de água em pacientes anúricos
ou oligúricos.7
A hipocloremia é grave quando a concentração do cloro
plasmático está abaixo de 80 mEq/l. A deficiência de cloro
caracteriza-se por redução do tônus da fibra muscular lisa,
principalmente do intestino e dos vasos, pelo que se manifesta
clinicamente por íleo adinâmico e tardiamente por hipotensão
arterial. O tratamento da depleção de cloro tem também como
base o tratamento da intoxicação hídrica, semelhante ao da
depleção de sódio.
Hipercloremia tem as mesmas causas que a hipernatremia, por
perda exagerada de água ou por entrada excessiva de sais em
pacientes renais ou com rim submetido à ação hormonal por
estresse (pós-operatório imediato). O quadro clínico caracteriza-
se pela presença de sede, oliguria, contrações musculares,
tremores, confusão mental, estupor, febre em geral moderada. A
hipercloremia é grave quando atinge valores acima de 125
mEq/l no plasma. Além da resolução da doença de base, o
tratamento envolve os mesmos conceitos da correção da
hipernatremia.7

• Alterações do Potássio
O potássio é o principal cátion do compartimento intracelular.
No compartimento extracelular sua concentração é baixa,
variando normalmente entre 3,5 e 4,5 mEq/l. Hipocalemia tem
como etiologia entrada insuficiente (geralmente por hidratação
parenteral inadequada), perdas excessivas por poliúria (período
poliúrico da insuficiência renal aguda ou por ação de diuréticos)
ou por diarreia e fístulas digestivas; doença de Cushing,
síndrome de Conn, desvio iônico (alcalose) também podem
levar à queda do K+ plasmático.2
A fibra muscular é a mais afetada pela carência de K+; a
hipocalemia origina hipotonia da musculatura lisa e estriada. O
quadro clínico dependente principalmente da hipotonia
muscular, caracteriza-se por astenia, fraqueza muscular,
parestesias, paralisias, íleo adinâmico, irritabilidade, letargia,
com arritmias cardíacas tipo bigeminismo e/ou trigeminismo, e
risco de parada cardíaca em sístole. O miocárdio pode
apresentar alterações de repolarização, que se manifestam no
traçado eletrocardiográfico sob a forma de prolongamento e
depressão do espaço QT e diminuição da amplitude da onda T,
que se achata com base mais ampla, chegando eventualmente
a se inverter.2
A hipocalemia é leve quando a concentração de K+ plasmático
está entre 3,5 e 3 mEq/l, moderada entre 3 e 2,5 mEq/l e grave
abaixo de 2,5 mEq/l. O tratamento é a administração de K+, por
via oral (KCI xarope ou drágeas, ascorbato de K+ em
comprimidos efervescentes) ou por via endovenosa
(aumentando se a concentração de K+ nas soluções
eletrolíticas usuais ou na forma de solução polarizante). A
reposição do K+ faz-se de maneira empírica, sendo um
esquema usual a administração de 40 a 60 mEq/l por via
endovenosa a velocidades não maiores que 30 a 40 mEq/hora.
Recomenda se não ultrapassar: 0,5 mEq/min, 40 mEq/h, 100
mEq/dia. Os pacientes cirróticos são especialmente suscetíveis
a complicações da hipocalemia e devem ser tratados
agressivamente na reposição do K+.2
A insuficiência renal é a causa mais frequente da hipercalemia.
Doença de Addison, desvio iônico na acidose, transfusões e
hemólise, lesões por esmagamento, grandes queimaduras,
grandes traumatismos e outras causas de degradação de
proteínas aumentam o K+ no plasma se a função renal for
insuficiente. As manifestações clínicas são tardias e incluem
principalmente alterações sensoriais como parestesias (face,
língua, pés e mãos), paralisia flácida, arritmias cardíacas; o
maior risco, contudo, é a morte súbita por parada cardíaca em
diástole. As manifestações eletrocardiográficas são
caracterizadas por ondas T elevadas, pontiagudas,
prolongamento do intervalo PR e do QRS e ondas S profundas. O
tratamento preferencial da hipercalemia é a diálise, porém,
medidas outras podem ser usadas quando esta não é possível.2
As medidas terapêuticas possíveis são: supressão da entrada
de potássio, ação antagônica do cálcio (o cálcio pode ser
administrado lentamente por via venosa na forma de cloreto ou
gluconato de cálcio 10%, na dose de 10 ml, para neutralizar a
ação do K+ sobre o músculo cardíaco), bicarbonato de sódio
pode ser administrado nos pacientes com acidose metabólica
para favorecer a entrada do K+ para o espaço intracelular e
reduzir a ação do K+ no músculo cardíaco. Redistribuição do
potássio, a administração de solução polarizante (glicose e
insulina) sem K+ favorece a redistribuição do K+ forçando a
migração do íon do compartimento extracelular para o
intracelular. Extração do K+ das secreções intestinais: resinas
de trocas iônicas (Na+ ou Ca++ por K+), por via oral ou,
preferencialmente, por via retal, na forma de enema de retenção,
retiram K+ a partir de secreções digestivas. Extração do K+ do
líquido extracelular mediante diálise peritoneal ou extracorpórea
(hemodiálise) com rim artificial.2
Na figura 2, exibimos os diversos mecanismos de ativação de
citocinas e mediadores inflamatórios envolvidos em lesão
orgânica que podem interferir e gerar distúrbios
hidroeletrolíticos em um paciente submetido a um insulto
cirúrgico.
Figura 2

Fonte: BASILE FILHO, A. et al.8

3. HIDRATAÇÃO DO PACIENTE
CIRÚRGICO
O paciente cirúrgico pode apresentar alterações do equilíbrio
hidroeletrolítico (EHE) em qualquer período relacionado à
intervenção cirúrgica. No período pré-operatório essas alterações
podem decorrer da própria doença de base ou de problema clínico
associado. Durante a cirurgia as alterações são mais frequentes e
mais intensas nas operações mais demoradas e nas de grande
porte, que requerem mais atenção e maior controle pelo anestesista,
sobretudo em pacientes predispostos. No pós-operatório os
distúrbios hidroeletrolíticos estão condicionados à magnitude das
alterações hormonais da resposta orgânica ao trauma e ao tempo
de duração da hidratação endovenosa, necessária enquanto as vias
oral e enteral não forem factíveis.5
Pacientes hígidos, bem hidratados, candidatos à cirurgia eletiva
de pequeno porte, não necessitam, em geral, de fluidoterapia prévia.
Para pacientes a serem submetidos à cirurgia eletiva de médio ou
grande porte, principalmente nos que se prevê área extensa de
dissecção, recomenda se o início da hidratação 2 a 4 horas antes da
operação mediante a oferta de 800 a 1500 ml de solução salina, de
acordo com o tempo de jejum e, em princípio, o suficiente para
manter volume urinário de 30 a 60 ml por hora; este débito urinário é,
nessa situação, indicativo de boa perfusão renal e sugestivo de
hidratação adequada.2
A hidratação sustentada, mediante administração de água e sal
nos períodos pré, intra e pós operatórios, visa à compensação
adequada das perdas externas e internas, e constitui o método de
eleição para as grandes cirurgias, principalmente quando as perdas
para o terceiro espaço são significativas.2
Não é possível na prática estimar com precisão, durante o ato
operatório, as perdas pela exposição de vísceras nem a perda
interna no terceiro espaço, o que prejudica a estimativa do volume
da solução a ser administrada. Infunde-se, geralmente, de 2 a 10 ml
de solução isotônica por kg/hora, o que pode induzir erros,
resultando em desidratação ou super-hidratação, sobretudo em
pacientes criticamente doentes; esses limites são menores no idoso
e nos pacientes com lesão renal.2
Nas operações de grande porte, o balanço hidroeletrolítico diário,
pode evitar erros grosseiros na fluidoterapia, principalmente entre os
pacientes nos quais o terceiro espaço é pequeno, associado a
dosagens séricas periódicas dos eletrólitos e do hematócrito, e
densidade urinária, variando os intervalos de acordo com a situação
clínica e o estado hidroeletrolítico. No paciente bem hidratado, a
necessidade de água no pós-operatório corresponde
aproximadamente a 30 – 35 ml/kg de peso corpóreo, o que em um
paciente de 70 kg equivale a 2100 a 2450 ml/dia. A necessidade
média de sódio é de 100 mEq/ dia, de cloro de 80 mEq/dia e de
potássio de 60 mEq/ dia.2
A necessidade mínima diária de calorias varia com a idade e
peso corporal. Cada grama de glicose ou de proteína fornece 4 kcal
e cada grama de gordura fornece 9 kcal. Um grama de glicose
hidratada fornece 3,4 kcal, portanto 2000 ml de solução glicosada
5% ou 1000 ml de solução glicosada 10% equivalem a 340 kcal e
suprem as necessidades mínimas de calorias de um paciente de 60
kg. A administração de 100 g de glicose são suficientes para evitar a
cetose do jejum e reduzir pela metade o catabolismo proteico.2
Na figura 3 evidenciamos a distribuição da composição corpórea
do organismo humano entre os componentes moleculares que o
compõem, permitindo uma melhor compreensão da importância do
EAB e dos eletrólitos para a perfeita fisiologia dos sistemas
orgânicos necessários para a sobrevivência de qualquer indivíduo.

CONCLUSÃO
As reações ao estresse cirúrgico são desencadeadas por vários
componentes, tais como perda sanguínea, lesão tecidual, ansiedade
e dor. A infecção e o jejum prolongado são fatores que podem
contribuir para reiniciar ou agravar os eventos da resposta orgânica
do organismo. A extensão e a magnitude da resposta dependem da
intensidade da patologia, da imunidade do organismo, dos
procedimentos corretos e da capacitação dos profissionais, logo
podemos observar como as alterações dos componentes
hidroeletrolíticos e ácido-base são essenciais e determinantes para
os resultados do sucesso ou o fracasso de uma operação.
Essas alterações no organismo podem acarretar na amplificação
do estresse cirúrgico, sendo muitas vezes negligenciado em termos
de mortalidade, morbidade e custos. Todos os anos são realizadas
centenas de milhões de intervenções cirúrgicas, e dependendo do
país e da instituição, temos um número alarmante de complicações
graves que aumentam o número de mortalidade de pacientes no
pós-operatório.
Acreditamos ser estritamente necessário o fino manejo e a
condução adequada perante a presença desses distúrbios
mencionados, tão recorrentes no exercício da medicina, para que
aconteça um maior entendimento desses parâmetros, já que as
estimativas são que 50% dessas mortes ocasionadas por
complicações inerentes podem ser evitáveis.

REFERÊNCIAS
1. EVORA, et al. Distúrbios do equilíbrio hidroeletrolítico e do equilíbrio acidobásico.
Medicina, v. 32, n. 4, p. 451-69, 1999.
2. CENEVIVA R, VICENTE, Y. V. A. Equilíbrio hidroeletrolítico e hidratação no paciente
cirúrgico. Medicina, v. 41, n. 3, p. 287-300, 2008.
3. MORIYA, T. et al. Hidratação e equilíbrio ácido-base em pacientes cirúrgicos. Acta
Cirúrgica Brasileira, São Paulo, v.15, n. 2, 2000.
4. MOORE, F. D. Resposta metabólica à lesão. In Manual de cuidados pré e pós-
operatórios. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan; cap. IV, p. 53, 1969.
5. MEDEIROS, A. C. DANTAS FILHO, A. M. Resposta metabólica ao trauma. Jornal
Cirurgia na Pesquisa Clínica, v. 8, n. 1, p. 56-76, 2017.
. ROTELLAR E. ABC dos transtornos eletrolíticos. Rio de Janeiro: Atheneu; 1968.
7. BIDANI A. Distúrbios eletrolíticos e ácido-básicos. Clin. Méd. Am. Norte, v. 70, p. 293-
317, 1986.
. BASILE FILHO, A. Monitorização da resposta orgânica ao trauma e à sepse. Medicina,
Ribeirão Preto, v. 34, p. 5-17, 2001.
Parte 1 | Capítulo 6

Nutrição em cirurgia
Autores: Rafael Aires de Castro e Karla Orlany Costa Gomes Aires

1. INTRODUÇÃO
Em um estudo realizado pelo o Inquérito Brasileiro de Avaliação
Nutricional Hospitalar (IBRANUTRI) cerca de metade dos pacientes
internados (48,1%) encontram-se com certo grau de desnutrição e
que o tempo de internação prolongado contribui negativamente no
desfecho do paciente. Segundo Studley, em 1936, que descreveu a
perda de peso como risco para complicações em pacientes
cirúrgicos, mostrou que os pacientes que perderam mais de 20% do
peso habitual apresentaram risco de óbito em comparação com um
risco para aqueles que perderam menos de 20%.1
Nos últimos anos, é perceptível a importância da triagem e
avaliação pré-operatória. Nesse sentido o peso corporal, aliado ao
IMC, a queda da condição geral do paciente e a ingestão inadequada
semanas antes do procedimento cirúrgico influenciam nas taxas de
complicações no pós-operatório; como: dificuldade no reparo
tecidual, retardo na cicatrização de feridas, aumento de infecções,
maior permanência hospitalar e consequentemente maior risco de
mortalidade.2
É importante destacar que em alguns centros hospitalares, os
protocolos nutricionais e cirúrgicos são negligenciados, e o olhar
mais sensível diante das fragilidades já presentes no paciente são
mascarados. Assim, o preparo da equipe de assistência deve possuir
uma visão crítica de qualidade diante das condições nutricionais e
prospectivas do paciente.
Portando, a nutrição em cirurgia torna-se pertinente quando
analisamos e demonstramos fatos e dados que evidenciam níveis
críticos de desnutrição, influenciando fortemente os resultados
cirúrgicos, mesmo para pacientes abordados eletivamente.

2. AVALIAÇÃO DO PACIENTE
CIRÚRGICO
Na admissão de pacientes pré-operatórios, deve-se estabelecer
como rotina a triagem e a avaliação nutricional, preferencialmente a
ser realizada nas primeiras 24 horas após a internação. Dentro desse
contexto, não só nutricionistas, mas também médicos e enfermeiros
devem trabalhar em conjunto no sentido de identificar a condição
nutricional do paciente.3

• Triagem de Risco Nutricional (TRN)


No âmbito hospitalar, faz-se necessário identificar e captar
indivíduos em risco de desnutrição ou desnutridos a partir de
uma triagem nutricional eficaz, permitindo que o profissional
capacitado venha a intervir de forma precoce na questão
nutricional do paciente e saiba estabelecer melhor a alocação de
recursos.4
Dentre os diferentes métodos apresentados na literatura para
este método de triagem, a recomendada pelas diretrizes da
European Society for Clinical Nutrition and Metabolism (Espen)
em 2002 para pacientes hospitalizados é a Nutritional Risk
Screening – 2002 (NRS-2002), reconhecida e utilizada pelo
Projeto Acerto.
A NRS-2002 é composta por questões que compõem a Triagem
inicial, seguida de uma Triagem Final, em que o examinador
deverá avaliar a condição nutricional e a gravidade da doença,
conforme descrito na tabela a seguir.
Fonte: Adaptado de NRS-2002.

Se a resposta for afirmativa para qualquer das questões acima,


seguir triagem na Etapa 2. Se a resposta for negativa para todas as
questões, o paciente deve ser retriado no intervalo de 1 semana.
No caso de pacientes escalados para cirurgias de grande porte,
faz-se um plano nutricional preventivo para evitar deterioração do
estado nutricional e complicações no pós-operatorio.3
Fonte: Adaptado de NRS-2002.

O NRS-2002 permite o pronto estabelecimento de uma medida


preventiva e de um plano nutricional paralelo ao acompanhamento
para monitorar a morbidade e a mortalidade relacionadas com o
risco nutricional.5
Portanto, de acordo com a triagem do risco nutricional, deve-se
ter conhecimento dos seguintes passos:
1. TRN < 3: Retriar 7 dias após;
2. TRN < 3, cirurgia de grande porte: Terapia Nutricional
preventiva pré-operatória;
3. TRN ≥ 3: submetido a Avaliação do Estado Nutricional e
prescrever Terapia Nutricional preventiva no pré-operatório
Fonte: Adaptado de Espen, 2002.6

• Avaliação do Estado Nutricional (AEN)


Deverá ser realizado nas primeiras 24 horas após a admissão e
após a triagem nutricional. Dentre as finalidades desse tipo de
avaliação é importante a identificação de pacientes com alto
risco de desenvolverem complicações ligadas ao estado
nutricional e avaliar a eficiência da intervenção dietoterápica.7
Tendo em vista aspectos objetivos e subjetivos, a avaliação
nutricional destaca-se, pois leva em consideração diversas
medidas e parâmetros que podem definir o estado nutricional
atual do paciente.8
Dentro desse contexto, a Avaliação Subjetiva Global (ASG)
destaca-se como principal ferramenta na avaliação de pacientes
cirúrgicos, que leva em consideração a história e condição
clínica do paciente e das alterações avaliadas a partir do exame
físico detalhado. Ainda que possam ocorrer diversas situações
clínicas e patologias crônicas como nefropatas e hepatopatas,
portadores de neoplasias diversas, imunodeprimidos e idosos, a
ASG tem sua eficácia garantida a partir de modificações que
possam atender essas particularidades.7
A tabela 1, a seguir, representa o formulário utilizado para a
avaliação subjetiva global do estado nutricional adaptada de
Detsky et al., 1987.9
Fonte: Adaptada de Detsky et al., 1987.

Após aplicação deste formulário, tem-se a classificação do


paciente segundo o grau de nutrição: ASG-A bem nutrido; ASG-B
desnutrido moderado ou em risco de desnutrição; ASG-C desnutrido
grave.
A classificação nutricional obtida de acordo com a ASG permite
ao examinador estabelecer os parâmetros a serem avaliados e
estabelecer a dieta, independentemente da via (oral, enteral ou
parenteral) o mais precoce possível, afim de reduzir complicações
cirúrgicas e aumento da mortalidade.10
A Intervenção Nutricional Imediata (Internuti) foi criada pelo
Projeto ACERTO com o objetivo principal de definir a melhor via de
nutrição, se Oral, Enteral ou Parenteral. Tem como objetivo a nutrição
precoce, permitindo a melhor preparação para o estresse cirúrgico.
10

Legenda: Classificação Nutricional de Acordo com a Avaliação


Subjetiva Global, Parâmetros Avaliados e INTERNUTI

Fonte: Adaptada de ACERTO: Acelerando a Recuperação Total Pós-


Operatória.

3. TERAPIA NUTRICIONAL
As altas taxas de desfecho negativo em procedimentos cirúrgicos,
com maiores taxas de morbidade e mortalidade, estão diretamente
relacionadas a uma terapia nutricional inadequada. É importante
salientar que pacientes bem nutridos, comparados a pacientes em
risco nutricional ou desnutridos, geralmente apresentam maior
capacidade de tolerar cirurgias de grande porte. A má nutrição está
associada com uma alta incidência de complicações operatórias, de
morbidade e de morte.11
Para uma melhor e mais rápida recuperação após o procedimento
cirúrgico, deve-se estabelecer um suporte nutricional pré-operatório
adequado e eficiente que assegure uma boa função muscular, imune
e cognitiva, bem como a manutenção de um balanço proteico
positivo. Sendo assim, devemos considerar as taxas de morbidade,
mortalidade e tempo de internamento como parâmetros para
avaliação de uma terapia eficaz.8

• Terapia Nutricional no Pré-Operatório


Segundo o conceito de Internuti, a TN deverá ser iniciada tão logo
seja identificado o diagnóstico nutricional do paciente.
A melhor via de administração da dieta varia de acordo com o
estado nutricional do paciente, levando também em consideração
sua capacidade de ingerir alimentas via oral ou não, e sua situação
clínica atual. Podemos preparar o paciente para administração de
dietas por via Oral, Enteral ou Parenteral, a depender dos fatores de
cada paciente individualmente.10

• Via Oral
A dieta Via Oral deve ser a primeira escolha, observando o grau
de desnutrição, o tipo de cirurgia a ser realizada, as
preferências e a tolerância de cada paciente. Em pacientes
com o trato gastrintestinal íntegro, livre de patologias e apto a
receber nutrientes, bem como apetite preservado, dá-se
preferência para dieta conforme as suas necessidades. No
entanto, para aqueles que não são capazes de alcançar suas
necessidades energéticas e proteicas diárias por meio da dieta
convencional, lança-se mão de Suplementos Nutricionais Orais
(SNO) no período pré-operatório.8
O profissional da saúde, seja ele médico, enfermeiro ou
nutricionista, deve estar atento quanto a possíveis distúrbios
no trato digestório, como diarreia, constipação, distensão
abdominal, náuseas e vômitos, em que a dieta oral precisa ser
modificada ou até mesmo substituída.10

• Via Enteral
O suporte nutricional artificial de primeira escolha, tendo em
vista ser mais fisiológica e oferecer menores taxas de
infecção, caracteriza-se pela nutrição enteral com
suplementação nutricional oral (SNO) ou simplesmente a
alimentação por sonda, seja ela nasogástrica, nasoenteral etc.
Porém, em situações de estresse agudo como obstrução
intestinal ou íleo paralítico, choque severo e isquemia
intestinal, o suporte nutricional deverá ser individualizado e
definido para cada situação.8
A opção por um suporte nutricional artificial torna-se benéfico
quando atua em pelo menos umas das situações a seguir:8
1. Desnutrição Severa.
2. Doentes em que se espera uma incapacidade de
alimentação por via oral num período superior a 7 dias
pós-operatório.
3. Doentes que não conseguem manter a ingestão até 60%
das recomendações diárias por mais de 10 dias.
Em doentes com neoplasia submetidos à cirurgia abdominal, é
recomendada Nutrição Enteral enriquecida com compostos
imunomodeladores durante 5 a 7 dias, independentemente do
seu risco nutricional, verificando-se um importante papel na
redução das comorbidades e no tempo de internamento após
a cirurgia abdominal.12 Já os pacientes desnutridos e
candidatos a tratamento de câncer do aparelho digestivo e
cabeça e pescoço devem receber TN pré-operatória por 7 a 14
dias com imunonutrientes.14
A preferência e a maior aceitação da dieta enteral em relação a
nutrição parenteral devem-se a estudos que indicam redução
na incidência de complicações infecciosas sem impacto na
mortalidade.14 No entanto, deve-se considerar que o paciente
poderá evoluir com aceitação parcial da dieta enteral, sendo
assim, deve-se fazer a associação de vias. Ou seja,
complementar a via enteral com a via parenteral.10

• Via Parental
A Nutrição Parenteral Total (NPT) pré-operatória basicamente
limita-se a pacientes com sinais de gravidade do ponto de
vista nutricional, acrescidos de outras indicações específicas.11
Diversos estudos trazem recomendações que indicam a
utilização da NPT em doentes com desnutrição grave e
naqueles pacientes impossibilitados de alimentar-se por via
oral ou enteral.8
A NPT também deve ser vista como uma forma de terapia
nutricional adicional para determinados tipos de pacientes que
são incapazes de atingir os seus requisitos nutricionais
completos por meio da nutrição enteral, bem como a terapia
de escolha nos pacientes que venham a apresentar algum tipo
de contraindicação à alimentação enteral.13
É importante identificar os principais riscos relacionados a
este tipo de suplementação, seja do ponto de vista infeccioso,
com necessidade de acesso venoso central e possibilidade de
complicações infecciosas, seja do ponto de vista metabólico,
com maior taxa de hiperglicemia e rigoroso controle glicêmico;
as formulações hipercalóricas e imunodepressivas.13
Outro aspecto importante em relação à dieta parenteral seria
na existência de complicações operatórias ou de situações
traumáticas que impossibilitem a alimentação digestiva, com
tempo superior a cinco dias. Nesses casos, a terapia
nutricional parenteral atua na diminuição de complicações
pós-operatórias e, consequentemente, no tempo de internação
hospitalar.14
O fluxograma abaixo, auxilia na definição da melhor via de
nutrição, seja ela por via oral, enteral ou parenteral, de acordo
com o conceito de Internuti:
Fonte: Adaptada de ACERTO: Acelerando a Recuperação Total Pós-
Operatória.

• Jejum pré-operatório
Quando as técnicas anestésicas ainda eram rudimentares,
preconizava-se que nenhum alimento deve ser permitido via oral por,
no mínimo, 6 horas antes da cirurgia. Outros livros textos do século
XX preconizavam jejum de 8h a 12h, sejam para cirurgias de urgência
ou procedimentos eletivos. Nesse contexto, é importante que o
estômago esteja vazio de alimentos no momento da cirurgia para
evitar o perigo de aspiração de vômitos durante a indução da
anestesia ou no despertar dela (Síndrome de Mendelson).11,15
Com o decorrer dos anos, as rotinas impostas pelas sociedades
de anestesiologias foram sendo modificadas e os jejuns prolongados
tem sido questionados por diversos autores. Em 1999, a American
Society of Anesthesiologists (ASA) passou a recomendar regras mais
liberais com relação ao jejum.15
Fonte: Adaptada de Anesthesiology, 1999.

Numa recente revisão sistemática da Cochrane, envolvendo 22


estudos, trouxe a evidência de que a ingestão de líquidos de duas a
três horas antes do procedimento cirúrgico tem nível de segurança
adequado e que, em pacientes sob protocolos tradicionais de jejum,
observou-se que o risco de aspiração, regurgitação e de mortalidade
hora pacientes é mínimo.16
Além disso, podemos citar os benefícios analisados por diversos
outros estudos, como exemplo os resultados de uma meta-análise
envolvendo 27 estudos e 1976 participantes, que não mostraram
nenhum caso de aspiração ou pneumonia com a abreviação do jejum
pré-operatório para 2h-3h.17
Além disso, foi observado melhora de parâmetros metabólicos,
especialmente com a redução da resistência insulínica,
imunomodulação com menor reação inflamatória, e incremento da
capacidade funcional no pós-operatório. Alguns estudos mostram
ainda redução no tempo de internação em operações de maior porte;
redução da ansiedade, sede e fome e redução de náuseas e vômitos
no pós-operatório.13
• Terapia Nutricional no pós-operatório
A TN precoce em comparação à tardia diminui a morbidade
infecciosa e o tempo de internação em pacientes cirúrgicos.18 Do
mesmo modo, a aplicação de protocolos envolvendo a abreviação do
jejum pré-operatório para 2 horas e retorno tão logo possível da
realimentação pós-operatória, além da redução da hidratação venosa,
tem sido associada a menores taxas de complicações pós-
operatórias.7
Segundo recomendações para reintrodução de dieta no pós-
operatório segundo o Projeto Diretrizes, têm-se que:13

• A TN nutricional deve ser planejada para início precoce no


pós-operatório, quando é possível prever que o paciente
ficará por mais de sete dias sem conseguir se alimentar ou
se não conseguir ingerir 60% de suas necessidades por sete
a 10 dias;

• A reintrodução da dieta no pós-operatório deve ser realizada


precocemente (12h-24h), na maioria dos procedimentos
cirúrgicos.

• Em pacientes eletivos, submetidos a operações com


ressecção parcial do estômago, intestino delgado ou grosso,
recomenda-se a reintrodução da dieta por via oral ou enteral
de 12h-24 h após a operação.

• Pacientes submetidos a operações de ressecções de


neoplasias de cabeça e pescoço, ressecções esofágicas ou
gastrectomia total devem receber TN por SNE ou por
jejunostomia também de modo precoce, em 12-24 horas
após a operação. Nesses casos, a realimentação oral é
possível após sete dias da operação.
Outro aspecto a ser considerado e que influencia na adesão ao
reestabelecimento alimentar precoce por parte de profissionais
médicos, especialmente cirurgiões, seria o maior receio de que essa
conduta favorecesse maior possibilidade de deiscências
anastomóticas. Deve-se salientar que esse tipo de complicação está
diretamente ligado ao estado nutricional no pré-operatório, da técnica
cirúrgica, comorbidades, e terapia imunossupressora.
Sendo assim, no pós-operatório, a dieta deve ser iniciada logo,
independentemente da via para nutrição. O objetivo é nutrir o mais
rápido possível quando houver estabilidade hemodinâmica.13
Importante salientar que a via oral permanece a via preferencial
para a terapia no pós-operatório, no entanto, deve-se ter em mente
que a quantidade e o tipo de dieta oral a ser aplicada vai depender da
condição clínica do paciente, da tolerância individual e as condições
do trato gastrintestinal (TGI).
Quando a nutrição oral não pode ser iniciada, com especial ênfase
em doentes com neoplasia submetidos a cirurgias maior do TGI
superior (cabeça e pescoço) ou gastrointestinal, com trauma severo
e com desnutrição severa, utilização de sonda de alimentação pode
ser adotada nesses doentes, segundo recomendação da ESPEN.19
Por sua vez, a Nutrição Parenteral pode ser considerada em
doentes gravemente desnutridos com complicações pós-operatórias
ou incapazes de receber as quantidades adequadas pela via oral ou
por sonda num período superior a 7 dias.

Conclusão
Devemos sempre ter em mente de que a terapia nutricional
adequada advém de um bom julgamento clínico inicial, observando-
se aspectos relevantes que corroboram com a melhor avaliação do
estado nutricional. Cabe ao profissional de saúde o papel
fundamental de perceber sinais e sintomas que indicam que
determinado indivíduo venha a necessitar de cuidados e de
acompanhamento não somente durante sua permanência hospitalar,
como também em seu acompanhamento ambulatorial.
A cada dia surgem novas recomendações e novas diretrizes, com
novos conceitos e aspectos inerentes à realidade atual. Cabe ao
profissional o estudo diário e a capacidade de se permitir mudanças
pelo bem do seu paciente.
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chronic peptic ulcer. 1936. Nutr Hosp. 2001; 16(4): 141-3.
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Parte 1 | Capítulo 7

Cicatrização de Feridas
Autora: Mariane de Castro Michielin
Coautor: Gabriel Bernardo Rena
Orientador: Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho

1. INTRODUÇÃO
1.1. Estrutura e Função da Pele
A pele é o maior e mais visível órgão do corpo humano, possuindo
uma área de cerca de 7.620 cm². Ela possui diversas funções
essenciais para manter a homeostase corporal, dentre as quais
podemos citar: a proteção contra infecções (barreira física contra a
invasão de micro-organismos), evitar a desidratação e manter o
equilíbrio hidroeletrolítico.
Podemos estratificar a pele em 3 camadas: epiderme, derme e
hipoderme.
Figura 1: Ilustração das três camadas da pele
Fonte: Van De Graaff KM.¹

1.1.1. Epiderme
É a camada mais superficial e mais fina da pele e sua espessura
pode variar entre 0.04mm (pálpebras) e 1.6mm (região plantar dos
pés), possuindo um turnover (renovação) a cada 28 dias. As células
mais presentes nesta camada são os queratinócitos, responsáveis
pela produção de queratina, uma proteína essencial que garante a
proteção da pele. Podemos encontrar também os melanócitos,
células responsáveis pela pigmentação e proteção da pele contra os
raios ultravioleta. As células de Langerhans também estão presentes
nesta camada, e atuam no processo imunológico, enquanto as
células de Merkel estão ligadas às terminações nervosas, garantindo
sensibilidade a estímulos mecânicos, em especial, a pressão.
Podemos subdividir a epiderme em:

• Estrato basal ou estrato germinativo, onde estão situadas as


células-tronco da epiderme, com alta atividade mitótica. É
nessa região que estão situados os melanócitos e as células
de Merkel.

• Estrato espinhoso ajuda na resistência da epiderme, pois


possui curtas projeções ligadas por desmossomos, fazendo a
adesão entre as células adjacentes.

• Estrato granuloso, que possui importante barreira


impermeável à água, atuando na prevenção à desidratação.

• Estrato córneo é a região mais externa e renovada da pele,


atuando na proteção, prevenção da perda de líquidos e
manutenção do equilíbrio hidroeletrolítico.

1.1.2. Derme
Camada intermediária da pele e sua espessura pode variar entre
0.3mm (pálpebras) e 3mm (dorso). Nesta camada podemos
encontrar 3 importantes estruturas: glândulas sudoríparas,
responsáveis pela termorregulação e por secretarem peptídeos
antimicrobianos, folículos pilossebáceos, que secretam serosidade e
os músculos piloeretores que reagem aos estímulos externos.

1.1.3. Hipoderme
Muitos autores na literatura consideram que a hipoderme está
intimamente relacionada à camada dérmica, não havendo uma
separação entre elas. No entanto, para uma melhor abordagem
didática, podemos defini-la como uma camada independente. É a
camada mais profunda da pele onde podemos encontrar o tecido
adiposo ou subcutâneo.
2. CICATRIZAÇÃO DA PELE
A cicatrização da pele é um processo com múltiplos níveis de
complexidade, envolvendo um conjunto de eventos sincronizados e
integrados decorrentes de uma lesão com a finalidade de restaurar a
integridade tecidual. O objetivo final cursa com a formação de um
tecido fibroso, que possui estrutura, textura e elasticidade diferentes
do tecido, ou seja, uma cicatriz nunca apresentará as mesmas
características de uma pele não lesada. Quando o paciente apresenta
uma lesão cutânea, há perda da integridade da pele, podendo
predispor a infecções, desidratação e distúrbios hidroeletrolíticos.
Existem 3 tipos de cicatrização que serão abordados mais
adiante: a cicatrização por primeira, segunda e terceira intenção. Este
processo se dá de forma ocorrendo em 3 fases principais
(inflamatória, proliferativa e de maturação) que serão abordadas em
maiores detalhes neste capítulo.

2.1. Fases da cicatrização


O processo da cicatrização das feridas pode ser dividido
didaticamente em três fases: inflamatória, proliferativa e de
maturação ou remodelagem. No entanto, essas etapas podem se
complementar e ocorrer de modo simultâneo dependendo do tecido
em que há a lesão.
Figura 2: Evolução do número relativo de células sanguíneas e
fibroblastos nas fases sequenciais do processo de cicatrização.
Fonte: Van De Graaff KM.¹

2.1.1. Fase inflamatória


A fase inflamatória tem início imediatamente após o trauma,
podendo durar em média 6 dias após a lesão. Ela engloba respostas
vasculares e celulares, que dependem da atuação de certas células
inflamatórias como neutrófilos, macrófagos e linfócitos, para realizar
a restauração da região lesada. Apresenta como prioridade a
hemostasia da região, gerando um infiltrado inflamatório agudo
resultante.
A hemostasia é considerada a primeira etapa da fase inflamatória,
com objetivo de estancar o sangramento por meio de algumas
etapas. Primeiro ocorre a exposição da camada subendotelial,
gerando uma resposta vasoconstritora e a consequente formação de
um coágulo composto por um agregado de plaquetas e fibrina.
Em seguida, ocorre a adesão plaquetária pela exposição de
substâncias tromboblásticas, principalmente subendoteliais com
ativação do sistema de coagulação-complemento. Subsequentes
isso ocorre a degranulação plaquetária, com a liberação de
substâncias vasoativas e quimiotáxicas, como leucotrienos, cininas,
prostaglandinas, tromboxane, histamina, serotonina, leucotaxina e
fatores de crescimento como TGF-Beta, PDGF e EGF. Essas
substâncias levam ao aumento da permeabilidade vascular e à
migração de neutrófilos para o local da lesão, células essas
responsáveis pela formação de exsudato na ferida e a presença de
sinais clínicos da inflamação como: calor, rubor, tumor e dor.
Os neutrófilos são as células responsáveis por fazerem a retirada
de corpos estranhos da ferida, restos celulares e bactérias,
realizando uma espécie de “limpeza inicial”. Além disso, elas são os
primeiros a migrarem para o local de lesão (diapedese), seguidos dos
monócitos, macrófagos e linfócitos.
A vasodilatação ocorre pelo aumento da bradicinina que gera um
consequente aumento da permeabilidade capilar, o que pode ser
explicado pela ativação do fator Hageman, ou fator XII da cascata de
coagulação. Concomitantemente, temos a ativação do sistema de
coagulação que leva à hemostasia pela conversão da protrombina
em trombina, a qual por sua vez converte fibrinogênio em fibrina,
criando uma rede que serve como alicerce para a migração de
macrófagos e fibroblastos na região.
Em média de dois a três dias após a lesão, os monócitos e
mastócitos iniciam sua migração dos vasos. Os monócitos se
transformam em macrófagos, quando atraídos pelos produtos de
degranulação plaquetária (TGF-Beta e PDGF), sendo assim
considerados os “maestros da cicatrização”. Os macrófagos são os
responsáveis pela realização de uma limpeza local mais completa,
coordenando a migração e a ação dos fibroblastos e da angiogênese
por meio da secreção dos fatores de crescimento (TNF-alfa, FGF,
TGF-Beta).
Ao final da fase inflamatória, notamos a ação dos linfócitos, onde
se supõe que essas células são responsáveis pela regulação da
enzima colagenase, que modula a quantidade de colágeno que será
produzido na próxima fase da cicatrização. Além disso, também
estão relacionadas à modulação da inflamação e a melhora do
ambiente da ferida, que se apresenta acidótico, hipóxico,
hipoglicêmico, hipercalêmico, hipercárbico e rico em ácido lático.
Figura 3: Ilustração da fase inflamatória da cicatrização, com
destaque às células atuantes e fatores de crescimento.

Fonte: Singer AJ, Clark RAF. 3

2.1.2. Fase proliferativa


A fase proliferativa é caracterizada por fibroplasia, granulação,
contração e epitelização. Tem início no quarto dia após o trauma e
se encerra por volta da terceira semana. Podemos dividi-la em
quatro etapas.

2.1.2.1. Formação da matriz extracelular


Nessa etapa da fase proliferativa, ocorre principalmente o
envolvimento dos fibroblastos. Essas células são atraídas por
mediadores das plaquetas, leucócitos e macrófagos, em um
fenômeno conhecido como fibroplasia.
Além de realizarem a reposição da matriz extracelular da ferida,
os fibroblastos são conhecidos por secretarem colágeno, que é um
componente fundamental da matriz extracelular. O colágeno é
formado por cadeias peptídicas de tripla hélice, as quais apresentam
dois aminoácidos exclusivos: a hidroxiprolina e a hidroxilisina.
A hidroxiprolina tem como ação a hidroxilação da prolina, que é
fundamental para a molécula do colágeno assumir sua forma de
tripla-hélice e ser exportada da célula, por meio da ação da enzima
prolina-hidroxilase. É importante salientar que o ácido ascórbico,
ferro, oxigênio e alfa-cetoglutarato são cofatores dessa enzima e a
ausência de algum deles ocasiona uma cicatrização deficiente.
Quando o colágeno está em sua forma de tripla-hélice, ele é
exportado das células e passa a ter o nome de protocolágeno, que,
por sua vez, sofre ação da protocolágeno-peptidase, eliminando as
porções terminais que impediam a polimerização, ou seja, a
aderência de várias moléculas de colágeno.
A hidroxilisina tem papel essencial nas ligações inter e
intramoleculares responsáveis pela estabilização e rigidez do
colágeno. A quantidade dessas ligações aumenta com o passar dos
anos, portanto os pacientes idosos tendem a apresentar uma pele
mais firme e menos elástica, devido à maior rigidez da molécula de
colágeno. A falta da hidroxilisina pode levar à síndrome de Ehlers-
Danlos, que pode ocorrer em vários graus de intensidade,
caracterizada pela falta de estruturação da pele e excesso de
elasticidade, dilatando grandes vasos com potencial para a formação
de aneurismas. Algumas drogas interferem na síntese da
hidroxilisina, como a D-penicilamina e a beta-aminopropionitrila,
levando a fragilidade cicatricial.
Ainda nesta etapa da fase proliferativa da cicatrização, os
fibroblastos produzem uma matriz provisória de fibronectina e ácido
hialurônico sob o local da ferida, o que facilita a migração
fibroblástica devido ao alto teor de água. Na medida em que essas
células vão se espalhando na lesão, secretam hialuronidase que
digere a matriz provisória, sendo substituída por moléculas maiores e
mais estruturadas. Concomitantemente, um novo colágeno vai sendo
depositado na ferida de forma desordenada, resultando na formação
da cicatriz.
O colágeno presente na matriz extracelular da pele e da cicatriz é
do tipo I e do tipo III, geralmente em uma proporção de 4:1.
Inicialmente o tipo III está aumentado, porém nunca está superior ao
tipo I no tecido cicatricial, visto que esse último é o mais abundante
no organismo humano (90% do colágeno do corpo).

2.1.2.2. Formação do tecido de granulação


O tecido de granulação se dá quando temos uma densa
concentração de vasos sanguíneos, macrófagos e fibroblastos
embebidos na matriz extracelular provisória frouxa, que é composta
de fibronectina, ácido hialurônico e colágeno. Quando esse tecido
está presente, sabemos que a ferida está pronta para enxertia, uma
vez que terá um ambiente adequado à sua integração.

2.1.2.3. Contração da ferida


Nesta etapa teremos uma redução do tamanho da ferida cirúrgica,
ocorrendo de forma centrípeta, diminuindo a quantidade de cicatriz
desorganizada.
Podemos encontrar uma fase de contração mais intensa na
região do períneo e no tronco, intermediária na cabeça e pescoço, e
menor nas extremidades do corpo. Uma importante célula nesta fase
é o miofibroblasto ou protomiofibroblasto, que aparece tanto no
tecido de granulação como em cicatrizes com maior tensão. Ele
possui capacidade contrátil, semelhante à musculatura lisa,
realizando a aproximação das bordas da ferida, como também pode
levar a distorções e sequelas.
É importante ressaltar que a contração tecidual é diferente de
contratura cicatricial, sendo que esta segunda ocorre quando uma
cicatriz excessiva ultrapassa a contração normal da ferida, gerando
um quadro de limitação funcional.

2.1.2.4. Epitelização
Nesta última etapa da fase proliferativa, os queratinócitos (células
mais comuns da epiderme) se multiplicam e migram de forma
centrípeta, sendo inibido este processo assim que uma célula entra
em contato com a outra.
Em seguida, ocorre o processo de diferenciação, no qual há o
restabelecimento das camadas epiteliais da camada basal até o
extrato córneo, após a conclusão da migração. E os queratinócitos e
fibroblastos secretam laminina e colágeno do tipo IV para formar a
membrana basal.
Figura 4: Ilustração da fase de epitelização da cicatrização, com
destaque às células atuantes.

Fonte: Singer AJ, Clark RAF. 4

Um grande problema que pode surgir com a proliferação


excessiva dos queratinócitos é a úlcera de Marjolin, lesão maligna
agressiva que geralmente surge na periferia de uma cicatriz crônica.
Possui morfologia infiltrativa com bordas endurecidas e elevadas. O
tratamento na maior parte dos casos é a ressecção ampla, com
margem cirúrgica de pelo menos 2 cm, e realização de enxertos ou
retalhos para cobrir o local.
Figura 5: Lesão úlcero-vegetante em panturrilha direita,
exemplificando a úlcera de Marjolin.
Fonte: Vieira RRBT, Batista ALE, Batista ABE, Rosa JVS, Diniz ACO,
Leite GF, et al. 5

2.1.3. Fase de maturação ou remodelagem


A fase de maturação se inicia cerca de 3 semanas após o trauma
e pode permanecer de 1 a 2 anos. É basicamente o processo de
modulação da matriz extracelular.
Temos grande atividade da colagenase, que está presente a partir
do décimo dia e pode continuar agindo por anos. Ela é responsável
pela realização da colagenólise, que é o processo de destruição do
colágeno para que possa ocorrer a remodelação da ferida, gerando
uma aparência, textura e elasticidade diferente da pele sã.
A cicatriz precisa aumentar sua força tênsil visando chegar o
mais próximo da pele normal. Ela aumenta de forma muito
acentuada entre a primeira e a sexta semana, porém continua
crescendo até 1 ano. Mesmo que a cicatrização ocorra sem
problemas, a força tênsil máxima atingida pela cicatriz é de 80% da
força da pele sã.
É importante ressaltar que a qualidade da cicatriz pode ser
diretamente influenciada pelos cuidados intra e pós-operatório,
principalmente pela posição da incisão cirúrgica, orientada em
relação às linhas de força da pele que são perpendiculares à força de
tração muscular.
Figura 6: Representação das linhas de força da pele ou linhas de
Langer.
Fonte: Cátedra de Cirugía I. 6
3. TIPOS DE CICATRIZAÇÃO
Podemos dividir a cicatrização em três tipos que nos permitem
uma facilidade maior na abordagem terapêutica das feridas.

3.1. Cicatrização por Primeira Intenção


Ocorre quando há uma aproximação dos tecidos com material de
sutura ou fitas adesivas após a ocorrência de uma lesão. Nesse tipo,
a cicatrização é mais rápida, gerando uma menor produção de
colágeno e consequentemente a formação de uma cicatriz mais fina
e com melhor qualidade estética. Podemos dizer, nesse caso, que a
cicatriz é linear e esteticamente adequada. Alguns exemplos práticos
são a cicatriz do parto cesariana ou de uma cirurgia de mamoplastia.
Figura 7: Representação da cicatrização por primeira intenção.

Fonte: Rodrigues T. 7

3.2. Cicatrização por Segunda Intenção


Há uma cicatrização espontânea do ferimento, não havendo
aproximação das bordas com material de sutura ou fita adesiva. Os
tecidos são fechados naturalmente, ocorrendo assim uma maior
produção de colágeno e um tempo de epitelização prolongado. Além
disso, também temos uma grande ação dos miofibroblastos que são
responsáveis pela contração da pele na geração da cicatriz, que
acaba por ser esteticamente desfavorável.
Figura 8: Representação da cicatrização por segunda intenção.

Fonte: Rodrigues T. 8

3.3. Cicatrização por Terceira Intenção ou Primeira


Intenção Tardia
Nesse tipo de cicatrização, os tecidos são deixados abertos por
dias e fechados com suturas se considerados então limpos e
assépticos. É indicada para feridas contaminadas. O exemplo disso é
o ferimento por mordedura de cães.
Figura 9: Representação da cicatrização por terceira intenção ou
primeira intenção tardia.

Fonte: Rodrigues T. 8
4. FATORES QUE ALTERAM A
CICATRIZAÇÃO
Alguns fatores podem levar à uma mudança no desenvolvimento
cicatricial, podendo ser externos e internos.
Dentre os fatores externos temos:

• Infecções: As infecções diminuem o aporte de nutrientes e


oxigênio para a ferida, levando ao retardo e à má qualidade da
cicatrização.

• Tabagismo crônico: A nicotina, princípio ativo do tabaco,


produz alterações sobre os macrófagos, que são células
importantes na imunização e limpeza da ferida. Sendo assim,
possibilitam um atraso na cicatrização e aumentam as
chances de infecções.

• Irradiação: A irradiação é conhecida por inibir a divisão


celular, o que ocasiona a vasculite e consequente fibrose local.

• Mecanismos do trauma: O trauma tecidual pode gerar


diferentes qualidades de cicatrizes, assim como poder causar
danos funcionais. Em alguns estudos observados na literatura,
notamos que a cicatrização fetal é capaz de reagir ao trauma
com restauração total do tecido, acarretando em cicatrizes de
melhor qualidade, até o início do último trimestre da gestação.
Dentre as hipóteses envolvidas nesse processo, a que se
destaca é a contribuição do líquido amniótico presente.

• Ação de fármacos: os fármacos podem alterar a


cicatrização, principalmente os corticoides e retinoides, como
a isotretinoína. Os corticoides são conhecidos por gerarem
uma atrofia cutânea e formação de estrias, alterando o perfil
da cicatriz. Outro exemplo é a D-penicilamina, um quelante de
cobre, que age inibindo a polimerização das células de
colágeno e consequentemente levando à piora cicatricial.
Dentre os fatores internos podemos ter:

• Desnutrição: Relacionada principalmente às carências


vitamínicas. Podemos destacar o déficit de vitamina C (como
no escorbuto), que favorece a má cicatrização e cria uma
tendência à deiscência ou alargamento da cicatriz. Já a
vitamina A, por ser uma estabilizadora de membrana celular,
age como antídoto aos corticoides, levando à reversão da
ação maléfica dos mesmos sobre a cicatrização.

• Presença de patologias prévias: Uma doença muito


frequente e de importante destaque é o diabetes mellitus,
responsável por prolongar o tempo de cicatrização pela
vasculopatia envolvida na patogênese da doença.

• Anemia: A anemia ocasiona uma baixa distribuição de


oxigênio para a região da lesão pela baixa quantidade de
hemoglobina, contribuindo para uma pior cicatrização.

CONCLUSÃO
Com base em tudo o que foi abordado neste capítulo podemos
afirmar que a pele é um órgão de vital importância e que o processo
de cicatrização é extremamente complexo. Este envolve uma grande
variedade de células e substâncias, que, de forma harmônica e
ordenada, farão com que uma ferida possa ser cicatrizada,
garantindo assim a integralidade e as funções da pele.

REFERÊNCIAS
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7. Rodrigues T. Cicatrização. Apresentação de Slideshare, 2016. [acesso em 2020 mar. 8].
. Rodrigues T. Cicatrização. Apresentação de Slideshare, 2016. [acesso em 2020 mar. 8].
9. Rodrigues T. Cicatrização. Apresentação de Slideshare, 2016. [acesso em 2020 mar. 8].
Parte 1 | Capítulo 8

Cuidados pré-operatórios e risco


cirúrgico
Autores: Elson Arruda Linhares e Petrônio Fonteles de Andrade

1. INTRODUÇÃO
Aos cirurgiões e todos aqueles que almejam se destacar e
exercer a arte cirúrgica é essencial que saibam executar a
propedêutica pré-operatória, avaliar, indicar e contraindicar exames
complementares para o paciente em questão.
Conforme estudo conduzido entre 2008 e 2017 pelo Insper houve
aumento de 130% de demandas judiciais relacionadas à saúde.
Dentro desse contexto de aumento importante dos casos de
judicialização das questões de saúde que, associada ao aumento da
disponibilidade de métodos complementares, acabam por conduzir
muitos profissionais a solicitarem exames desnecessários a
despeito da falta de indicação clínica ou sintomatologia que os
justifiquem, se faz necessário reforçar as premissas que guiam as
condutas no pré-operatório.
É necessário lembrar que o período atual de desenvolvimento
científico não é compatível com práticas que fujam da medicina
baseada em evidências, portanto, os cuidados pré-operatórios e
classificação de risco cirúrgico devem seguir primordialmente
anamnese e exame físico detalhados, com investigação
complementar individualizada associada a esclarecimento pleno do
paciente quanto ao procedimento cirúrgico a ser realizado, seus
riscos, benefícios e possíveis complicações peri e pós-operatórias.
2. ANAMNESE E EXAME FÍSICO
A abordagem inicial ao paciente que vai se submeter a
procedimento cirúrgico passa mandatoriamente por anamnese e
exame físico detalhados, com especial enfoque na doença que
necessita de terapêutica cirúrgica, suas manifestações,
complicações e sinais de gravidade. A seguir, alguns tópicos que
devem ser abordados cuidadosamente na anamnese de uma
avaliação pré-cirúrgica.
- Doenças prévias e medicações em uso.
- Alergias.
- Histórico cirúrgico e suas possíveis complicações (incluindo
dificuldades de controle de sangramento, necessidade de
transfusão, dificuldade de intubação e reações adversas às drogas).
- Performance física (durante exercício e afazeres diários).
- Uso de drogas lícitas e ilícitas (com mensuração e data de
cessação se houver).
Durante o exame físico devem ser buscados fatores que podem
complicar a abordagem cirúrgico-anestésica, estigmas de doenças
graves descompensadas e desnutrição. A seguir citaremos alguns
tópicos importantes a serem procurados.
- Cicatrizes prévias.
- Possibilidade de acesso venoso de fácil obtenção.
- Estigmas de doenças das vias aéreas e sistema pulmonar, tais
como dispneia, estridores, taquipneia, tosse, aumento do diâmetro
anteroposterior do tórax, desvio da traqueia, assimetria de
expansibilidade e anormalidade na ausculta.
- Estigmas de doenças do sistema cardiovascular, tais como
turgência jugular, sopros cardíacos e/ou carotídeos, edema de
membros inferiores, insuficiência arterial e/ou venosa periférica e
alterações de ritmo cardíaco.
- Estigmas de doenças hematológicas tais como, equimoses,
hematomas e mucosas hipocoradas.
Se encontradas, algumas dessas condições podem requerer
compensação clínica com especialista antes do procedimento
cirúrgico para que se obtenham melhores resultados, diminuição
dos riscos de complicação e até diagnóstico de doenças até então
desconhecidas.
Abaixo exemplificaremos algumas perguntas práticas que podem
ser utilizadas para mensuração da capacidade funcional durante
anamnese e o grau de evidência científica das diferentes formas de
coleta de história clínica.
AVALIAÇÃO DE CAPACIDADE FUNCIONAL METS*

Consegue vestir-se, alimentar-se e banhar-se? 2,75

Consegue caminhar uma ou duas quadras no plano? 2,75

Consegue caminhar em aclive ou subir um lance de escadas? 5,5

Consegue correr curtas distâncias? 8,0

Consegue manter atividade sexual? 5,25

Consegue participar de atividades esportivas, como tênis, natação ou futebol? 7,5

Consegue fazer trabalhos domésticos pesados, como lavar o piso ou deslocar


8,0
móveis pesados?

Consegue participar de atividades recreacionais moderadas, como dançar e


6,0
jogar boliche?

*Valores menor que 4.0 METS são considerados como baixa


capacidade funcional.

GRAU DE GRAU DE
ESTRATÉGIA
RECOMENDAÇÃO EVIDÊNCIA

Coletar informações da histórica clínica


diretamente com paciente que está sendo
I C
avaliado para determinação de risco
operatório

Coletar informações de modo sucinto, objetivo


e direcionado considerando somente dados
IIa B
relevantes para o algoritmo de estratificação
utilizado.

Coletar dados do paciente com familiares,


conhecidos ou com profissional de saúde que IIa C
acompanha o paciente

Não coletar história clínica do paciente na


III C
avaliação pré-operatória.
3. AVALIAÇÃO COMPLEMENTAR
Exames complementares no contexto pré-operatório devem visar
encontrar e estadiar condições que aumentarão os riscos dos
procedimentos, principalmente no tocante ao sistema
cardiopulmonar. Portanto, a solicitação deve ser realizada de forma
individualizada e com base nas informações colhidas durante
anamnese e exame físico.
Ilustraremos a seguir as indicações dos principais exames
complementares a serem solicitados de forma mais rotineira com
seus respectivos graus de evidência e recomendação.
PARA QUEM SOLICITAR GRAU DE GRAU DE
ELETROCARDIOGRAMA? RECOMENDAÇÃO EVIDÊNCIA

História ou anormalidade ao exame físico


I C
sugestivos de doença cardiovascular

Paciente submetido a operações


intracavitárias, transplantes de órgãos sólidos,
I C
cirurgias ortopédicas de grande porte ou
vasculares arteriais

Alto risco de evento estimado pelo algoritmos


I B
de risco

Presença de diabetes mellitus I C

Obeso IIa C

Idade superior a 40 anos IIa C

PARA QUEM SOLICITAR GRAU DE GRAU DE


RADIOGRAFIA DE TÓRAX? RECOMENDAÇÃO EVIDÊNCIA

Historia ou exame físico sugestivo de doença


I C
cardiorrespiratória.

Idade superior a 40 anos. IIa C

Intervenções de médio a grande portes,


IIa C
principalmente intratorácicas e abdominais.

PARA QUEM SOLICITAR GRAU DE GRAU DE


HEMOGRAMA COMPLETO? RECOMENDAÇÃO EVIDÊNCIA

Suspeita clínica de anemia ou doença crônica I C


associada a anemia.

História de doenças hematológicas ou


I C
hepáticas.

Intervenção de médio e grande porte, com


previsão de sangramento e necessidade de I C
transfusão.

Idade superior a 40 anos IIa C

PARA QUEM SOLICITAR GRAU DE GRAU DE


TESTE DE COAGULAÇÃO? RECOMENDAÇÃO EVIDÊNCIA

Paciente em uso de anticoagulação com


I C
varfarina.

Paciente com insuficiência hepática. I C

Portadores de distúrbios de coagulação ou


I C
história de sangramento.

Intervenções de médio e grande porte. I C

PARA QUEM SOLICITAR DOSAGEM DE GRAU DE GRAU DE


CREATININA SÉRICA? RECOMENDAÇÃO EVIDÊNCIA

Portadores de nefropatia, diabetes mellitus,


hipertensão arterial sistêmica, insuficiência
I C
hepática ou insuficiência cardíaca, se não já os
houver realizado nos últimos 12 meses.

Intervenções de médio e grande porte. I C

Todos os pacientes com idade superior a 40


IIa C
anos.

Outros exames complementares podem ser solicitados no


contexto de estratificação de doença preexistente, investigação
aprofundada de anormalidades encontradas nos exames de rotina e
estabelecimento de risco cirúrgico a depender do escore utilizado.
Eletrólitos como o potássio sérico podem ser solicitados em
indivíduos com uso de diuréticos, doença renal e diabetes mellitus.
Espirometria é um exame interessante nos casos que envolvam
doença pulmonar crônica ou abordagens cirúrgicas com
planejamento de ressecção pulmonar. Não há indicação para
solicitação de sumário de urina em pacientes assintomáticos e
glicemia em paciente sem fatores de risco para diabetes ou doença
estabelecida.
Conforme já citado anteriormente a solicitação deve ser
realizada de forma racional e sempre guiado com base na
individualidade clínica de cada paciente.

4. JEJUM
O tempo de jejum se tornou uma preocupação constante nos
casos de cirurgia, principalmente no que se refere às cirurgias
eletivas, uma vez que nos casos de urgência sempre é assumido
que o paciente esteja de estômago cheio e, portanto, o anestesista
deve tomar as medidas cabíveis para evitar episódios de
broncoaspiração.
Historicamente, os tempos de jejum se iniciaram prolongados,
muitas vezes chegando próximo às 12 horas para cirurgias eletivas,
já que a consequência de um episódio de broncoaspiração nesses
casos costumeiramente tem consequências dramáticas para o
paciente, levando a complicações importantes no peri e pós-
operatório, incluindo chance de óbito no próprio momento do
evento. Atualmente se assume que o período de jejum deve ser
justamente o adequado, a depender do tipo de dieta ingerida de
forma que não haja descompensação de doenças crônicas
preexistentes, como diabetes mellitus, início antecipado da resposta
endocrinometabólica ao trauma e aumento do desconforto do
paciente no pré-operatório. Uma boa estratégia para se evitar os
malefícios citados é o uso de carboidratos de alto índice glicêmico
(p. ex. maltodextrina ou dextrose) diluídos em líquidos claros que
podem ser administrados até 2 horas antes do ato operatório.
Admitem-se os seguintes tempos de jejum para as citadas
dietas:
DIETA INGERIDA TEMPO DE JEJUM

Líquidos claros (sem resíduos) 2 horas

Leite materno 4 horas


Leite não humano 6 horas

Fórmulas infantis 6 horas

Refeição leve (torrada e líquidos claros) 6 horas

Refeição sólida (carnes e frituras) 8 horas

5. MANEJO DE DOENÇAS E DROGAS DE


USO CRÔNICO
Com o aumento da expectativa de vida dos indivíduos de forma
geral, tornou-se cada vez mais frequente a presença de múltiplas
comorbidades no paciente que vai se submeter a procedimento
eletivo. Manejar bem as medicações de uso crônico a ponto de não
fragilizar o paciente em sua condição patológica prévia e nem
prejudicar o sucesso do ato cirúrgico é essencial. Discutiremos
brevemente sobre as principais condições crônicas encontradas e
como se deve manejar as medicações envolvidas.

• Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS)


Os pacientes hipertensos devem ter seus valores pressóricos
controlados e terapêutica otimizada em tempo hábil até o
procedimento cirúrgico de forma que essas medicações devem ser
mantidas, inclusive os inibidores da conversão de angiotensina
(IECA), até o dia da cirurgia sendo reintroduzidas no pós-operatório
da forma mais ágil possível. Durante todo o período da cirurgia deve-
se manter volemia otimizada e os episódios de hipocalemia devem
ser corrigidos antes do procedimento.
Caso não haja tempo hábil para compensação dos níveis
pressóricos, deve-se preferir o uso de beta-bloqueador de curta ação
(esmolol) ou clonidina nos casos em que haja contraindicação para
a droga de escolha citada.

• Insuficiência Cardíaca (IC)


O paciente com tal doença deve ter suas doses e condições
clínicas otimizadas antes de se proceder com o ato cirúrgico, de
forma que está claro em literatura que nos casos de IC de início
recente e sem terapêutica otimizada deve-se adiar intervenção
operatória por no mínimo 3 meses.
Todas as medicações devem ser mantidas, inclusive no dia da
cirurgia, e reintroduzidas o mais brevemente possível. Inclusive
aventando a possibilidade de uso de sonda nasoenteral ou via
parenteral para os dessas medicações caso a via oral esteja
impossibilitada. No período perioperatório não se deve introduzir
beta-bloqueadores com altas doses em pacientes que não os
utilizavam anteriormente.
Os antiagregantes plaquetários e anticoagulantes devem ser
estudados conforme sua ação, dose e categoria para avaliar a
necessidade e período de suspensão prévio até o dia da cirurgia. O
ácido acetilsalicílico, por exemplo, deve ser suspenso 7 dias antes
do procedimento cirúrgico não cardíaco nos casos em que é usado
para prevenção primária. No entanto, se é utilizado para prevenção
secundária, a recomendação é de não suspender a droga, usando-a
na dose máxima de 100mg ao dia. A seguir, citamos na tabela as
principais drogas anticoagulantes e as recomendações em relação a
cada uma.
QUANDO
DROGA QUANDO SUSPENDER
REINICIAR

Procedimento de
Procedimento de Procedimento de
risco
alto risco baixo risco
intermediário

5 dias, INR
Varfarina 5 dias, INR normal 5 dias, INR normal 24 horas
normal

Heparina EV 4 horas 4 horas 4 horas 02 horas

Heparina SC 8 a 10 horas 8 a 10 horas 8 a 10 horas 02 horas

4 horas para
Heparina de baixo baixo risco; 12
peso molecular – 12 horas a 24h para
12 horas 12 horas
Profilaxia médio e alto
riscos

Heparina de baixo 24 horas 24 horas 24 horas 4 horas para


peso molecular – baixo risco; 12
Tratamento a 24h para
médio e alto
riscos
Clopidogrel 7 dias 7 dias Não 12 a 24 horas

Cilostazol 2 dias Não Não 24 horas

Rivaroxabana 3 dias 3 dias Avaliar Risco 24 horas

• Diabetes Mellitus
Todos os pacientes com diabetes devem ter solicitados glicemia
de jejum e hemoglobina glicada (HbA1c) na sua avaliação pré-
operatória, de forma que os valores devem estar entre 90 e
130mg/dl para o glicemia de jejum, até 180mg/dl 2h após
alimentação e menor que 7,0% para HbA1c. Por vezes, quando fora
das metas citadas, o endocrinologista pode ser acionado para
melhor compensação antes da intervenção cirúrgica. O paciente
diabético deve receber preferência para ser operado no primeiro
horário do dia visando a menor chance de hipoglicemia decorrente
do jejum.
O manejo das insulinas é um cuidado importante visando o
sucesso do ato operatório. A insulina NPH deve ser alterada apenas
no dia da cirurgia, sendo utilizada dois terços da dose diurna se
cirurgia pela manhã, metade da dose se cirurgia a tarde e um terço
da dose se cirurgia a noite.
Seguem tabelas acerca do uso da insulina regular no ambiente
intra-hospitalar e recomendação de sugestão de drogas.
GLICEMIA CAPILAR
CONDUTA SUGERIDA
(MG/DL)

160 – 180 01 UI

181 – 200 02 UI

201 – 250 03 UI

251 – 300 04 UI

Insulina endovenosa em bomba ou adiar cirurgia até


>300
controle.

<100 Infundir glicose endovenosa em 5 a 10g/hora.

<70 Bolus de 60ml de glicose a 25% endovenosa, aporte


endovenoso de glicose 10g/hora, repetir glicemia capilar a
cada 15 minutos até glicemia > 80mg/dL.

TEMPO DE SUSPENSÃO ANTES


CLASSE DROGA
DA CIRURGIA

Biguanidas Metformina 24 a 48 horas

Sulfonilureias
Clorpropamida 48 a 72 horas
(1ª Geração)

Sulfonilureias Glicazida, Glibenclamida,


No dia
(2ª Geração) Glimepirida e Glipizida

Acarbose Acarbose 24 horas

Tiazolidinedionas Pioglitazona No dia

Sitagliptina, Saxagliptina, Podem ser


Inibidores de DPP4
Linagliptina, Alogliptina mantidas no jejum

Demais classes de
No dia
drogas

6. RISCO CARDIOVASCULAR
Existem muitos escores que se propõem a quantificar o risco
cardiovascular dos pacientes submetidos às mais variadas
condições e tipo de cirurgias, no entanto, não existem estudos
claros em que se estabeleça superioridade entre eles. Apesar da
baixa acurácia todos os escores se provaram melhores que o acaso
na predição de eventos cardiovasculares adversos no intra ou pós-
operatório, justificando, assim, sua utilização.
Dentre os diversos escores utilizados discutiremos sucintamente
o escore de ASA, que leva em consideração apenas as condições do
paciente e suas comorbidades, o escore de Fleisher et al., em que se
correlaciona risco combinado de morte e Infarto Agudo do
Miocárdio não fatal com cirurgias não cardíacas e o algoritmo de De
Lee, em que há soma de critérios referentes tanto ao paciente
quanto ao porte cirúrgico para predição de eventos cardiovasculares
adversos.
CLASSIFICAÇÃO DESCRIÇÃO MORTALIDADE
Ó
PERIOPERATÓRIA

ASA 1 Paciente sadio sem alterações orgânicas. 0,06 – 0,08%

Paciente com alteração sistêmica leve ou


ASA 2 0,27- 0,47%
moderada.

Paciente com alteração sistêmica grave com


ASA 3 1,8 – 4,4%
limitação funcional.

Paciente com alteração sistêmica grave que


ASA 4 7,8 – 23,5%
representa risco de vida.

Paciente moribundo que não é esperado


ASA 5 9,4 – 51%
sobreviver sem intervenção cirúrgica.

Paciente com morte encefálica declarada,


ASA 6 cujos órgãos serão removidos com Não se aplica
propósito de doação

Acrescentar a letra E a qualquer classe para


E
cirurgias de emergência.

ELEVADO RISCO (>5%) INTERMEDIÁRIO RISCO (<5%) BAIXO RISCO (<1%)

Cirurgias extensas de Endarterectomia de carótidas, Procedimento


emergência cirurgia de cabeça e pescoço endoscópico

Procedimentos
Cirurgias de aorta e vasculares Cirurgias
cirúrgicos
superficiais extensas intraperitoneais
intratorácicos

Cirurgias vasculares periféricas Cirurgias ortopédicas Cirurgia de catarata

Cirurgias prolongadas com


grande mobilização de líquidos Cirurgias de próstata Cirurgia de mama
e/ou perda sanguínea

RISCO DE EVENTOS
CLASSE DE RISCO
CARDIOVASCULARES MAIORES*

I (nenhuma variável) 0,4%

II (uma variável) 0,9%

III (duas variáveis) 7,0%

IV (três ou mais variáveis) 11,0%


Algoritmo de De Lee. *Infarto agudo do miocárdio, edema pulmonar,
fibrilação ventricular ou parada cardíaca primária, e bloqueio
completo até o 5º dia pós-operatório.

7. Variáveis a serem consideradas:


- Operação intraperitoneal, intratorácica ou vascular
suprainguinal;
- História de doença arterial coronariana;
- História de insuficiência cardíaca;
- História de doença cerebrovascular;
- Diabetes mellitus com insulinoterapia;
- Creatinina pré-operatória > 2,0mg/dL.

CONCLUSÃO
Apesar de tidas como cirurgias programadas e de risco menor, as
cirurgias eletivas devem passar por criteriosas avaliação para que
não haja aumento de desfecho inesperado para os pacientes que se
submetem a elas. O guia para todas as condutas deve ser a
premissa de individualização de cada tratamento e as evidências
disponíveis para embasar as condutas propostas.

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Parte 1 | Capítulo 9

Antibioticoprofilaxia e
antibioticoterapia em cirurgia
Autores: Ana Dimitria Gomes Ponte e Thais Vasconcelos

1. INTRODUÇÃO
O primeiro pensamento que devemos ter como cirurgião é que
todo ato cirúrgico é um trauma, ou seja, rompemos barreiras de
proteção natural do corpo e ativamos uma série de cascatas de
resposta metabólica e imunológica no nosso paciente. Isso faz com
que esse paciente esteja exposto a uma gama de patógenos que
pode ocasionar infecções tanto no sítio cirúrgico como a distância.
Para minimizar o risco de exposição e de complicações advindas
dessas infecções devemos conhecer quais patógenos são esses e
quando indicarmos corretamente a antibioticoprofilaxia e
antibioticoterapia, para não expormos nosso paciente a antibióticos
desnecessários que podem levar a uma resistência bacteriana e
uma infecção ainda mais grave.

2. O QUE UM CIRURGIÃO DEVE


SABER
2.1. Antibiotiprofilaxia
Para sabermos quando está indicado a antibioticoprofilaxia
devemos primeiramente classificar o ato cirúrgico em limpo, limpo-
contaminado, contaminado e infectado.

TABELA 1: CLASSIFICAÇÃO DE FERIDAS

TIPOS DE FERIDAS CARACTERÍSTICAS

Cirurgias eletivas, em que não houve


quebra da técnica cirúrgica, sem invasão
dos tratos respiratórios, gastrointestinais
I) LIMPA ou genitourinários.
Exemplos: cirurgia ortopédica, plástica,
neurológica, cardíaca, herniorrafias,
tireoidectomia.

Cirurgias que entram no trato


gastrointestinal, genitourinário ou
respiratório, de forma controlada, com
II) LIMPA-CONTAMINADA mínimo extravasamento de conteúdo.
Exemplos: cirurgias urológicas, de
orofaringe, de esôfago, das vias biliares,
gastrojejunais, histerectomia, cesariana.

Cirurgias onde ocorrem quebra maior da


técnica, com extravasamentos
significativos de conteúdos dos tratos
respiratório, gastrointestinal ou
genitourinários, ou quando houver saída
III) CONTAMINADA
de qualquer quantidade e esta encontra-
se infectada e cirurgias pós-trauma.
Exemplos: apendicectomia em fases
iniciais e colecistectomia em quadro de
colecistite aguda.

Paciente infectado previamente à cirurgia,


vísceras perfuradas prévias à cirurgia,
cirurgia pós-trauma com presença de
IV) INFECTADA
tecido desvitalizado, corpo estranho ou
contaminação fecal, cirurgias com
presença de coleções purulentas.

Com base na tabela anterior, indicaremos antibioticoprofilaxia


para toda cirurgia limpa-contaminada e contaminada. As exceções
são as cirurgias limpas com uso de próteses e telas e aquelas em
que qualquer infecção poderia ser catastrófica (neurocirurgias e
cirurgias cardíacas) onde também se indica profilaxia e a
colecistectomia videolaparoscópica, para a qual, apesar de ser
classificada como cirurgia limpa-contaminada, não está indicado o
uso de antibiótico. As cirurgias infectadas deverão ser sucedidas de
antibioticoterapia.
A antibioticoprofilaxia, para ser eficaz, deverá ser realizada de
forma mais direcionada para os patógenos do sítio cirúrgico e seus
níveis séricos deverão estar adequados no início da cirurgia. Por
isso preconiza-se que o antibiótico deve ser administrado 60
minutos antes da incisão cirúrgica e repetido a dose de acordo com
a meia-vida da medicação utilizada.
Na tabela 2 poderemos visualizar os antibióticos mais utilizados
na profilaxia de acordo com o tipo de cirurgia, porém, isso pode
variar de acordo com a flora hospitalar e deve ser guiada pela
comissão de controle de infecção hospitalar de cada instituição.

TABELA 2: ANTIBIOTICOPROFILAXIA POR TIPO


DE CIRURGIA

TIPO DE PATÓGENOS MAIS ANTIBIOTICOPROFILAXIA


CIRURGIA COMUNS

Bacilos gram-negativos
Trato biliar entéricos, enterococos e Cefazolina
clostridia.

Bacilos gram-negativos
Trato gastrointestinal
entéricos, cocos gram- Cefazolina
superior
positivos.

Colorretal / Bacilos gram-negativos


Apendicectomia não entéricos, anaeróbios, Cefazolina + Metronidazol
perfurada enterococos.

Bacilos gram-negativos
Genitourinária Ciprofloxacina
entéricos, enterococos.

Bacilos gram-negativos
Ginecológicas entéricos, anaeróbios, Cefazolina
estreptococos, enterococos.

Obs.: Para pacientes alérgicos a penicilinas e cefalosporinas, alternativas viáveis são:


ciprofloxacina, levofloxacina, aztreonam ou clindamicina com gentamicina.

3. ANTIBIOTICOTERAPIA
O cirurgião deve estar apto para indicar o antibioticoterapia não
somente para infecções dos sítios cirúrgicos, mas para qualquer
infecção que possa acometer seu paciente cirúrgico. As infecções
mais comuns nesses pacientes são as próprias infecções dos sítios
cirúrgicos, bacteremias associadas ao uso de cateter venoso
central, pneumonias nosocomiais e infecções do trato urinário.
Todo paciente com suspeita de infecção no qual você iniciará
antibiótico de forma empírica deve ter uma cultura obtida, sendo 2
amostras de hemocultura e, se for o caso, uma amostra do local da
infecção (por exemplo, no caso de infecção de sítio cirúrgico), antes
do início do tratamento, e assim que o resultado for obtido o
esquema deve ser modificado de acordo com o resultado do
antibiograma.
Para a escolha do antibiótico empírico a ser iniciado deve-se
pautar no patógeno mais provável de causar a infecção, da flora
bacteriana hospitalar e de tratamentos prévio aos quais o paciente
já foi submetido, evitando assim antibióticos de largo espectro que
poderiam promover multirresistência bacteriana.
Quanto ao patógeno mais provável podemos nos guiar pelo tipo
de infecção mais provável de estar acometendo nosso paciente de
acordo com a clínica que o mesmo apresenta e por exames
complementares realizados, como hemograma, sumário de urina,
raio X e tomografias.
A seguir, uma tabela em que se apresenta os patógenos mais
comumente envolvidos nos principais tipos de infecções que
encontramos nos nossos pacientes, sempre lembrando que isso
pode se modificar de acordo com a flora hospitalar de cada
instituição.
Quanto aos principais agentes bacterianos utilizados para iniciar
uma terapia empírica, apresentamos a tabela a seguir de acordo
com os patógenos, porém, isso pode variar para cada instituição
devendo idealmente ser guiado pela comissão de controle de
infecção hospitalar dessa instituição.
TABELA 3: PRINCIPAIS PATÓGENOS DE ACORDO COM O TIPO DE INFECÇÃO

Staphylococcus aureus sensível a meticilina


Pneumonia associada a ventilação
Streptococcus pneumoniae
precoce (< 5 dias após a intubação)
Haemophilus influenzae

Staphylococcus aureus resistente a meticilina


Pneumonia associada a ventilação tardia (MRSA)
(> 5 dias após a intubação) Pseudomonas aeruginosa
Acinetobacter spp.

Infecções do sítio cirúrgico Cocos gram-positivos


Bacilos gram-negativos (incisões infrainguinais
e cirurgias intracavitárias)
Anaeróbios (faringe, trato gastrointestinal baixo
de trato genital feminino)

Escherichia coli, Enterococcus spp. e leveduras


Infecção do trato urinário Bacilos gram-negativos multirresistentes
(Relacionado à sonda vesical de demora)

Staphylococcus epidermidis resistente a


meticilina (MRSE)
Infecção de cateter venoso central
MRSA
Enterococos

Infecção intra-abdominal Polimicrobiana

O tratamento com antibiótico deve perdurar pelo menor tempo


possível; tratamentos prolongados estão relacionados ao aumento
de morbidade e mortalidade dos pacientes. Então, assim que o
resultado da cultura for obtido, o tratamento deve ser direcionado
para aquele agente patógeno e mantido apenas pelo período
suficiente para morte bacteriana.

TABELA 4: ANTIBIÓTICOS PARA USO EMPÍRICO

Glicopeptídeo (Vancomicina)
Gram-positivos Lipopeptídeo (Daptomicina)
Oxazolidinona (Linezolida)

Cefalosporina de 3ª geração (não Ceftriaxona)


Gram-negtivos Monobactâmicos
Polimixinas (Polimixina B, colistina)

Metronidazol
Carbapenêmicos
Antianaeróbicos
β-Lactâmicos com inibidores da β-Lactamase
Tigeciclina

Piperacilina-tazobactam
Cefepima, ceftadizima
Imipenem-cilastatina, meropenem, doripenem
Antipseudomonas
Ciprofloxacina, levofloxacina
Aminoglicosídeos
Polimixinas (Polimixina B, colistina)

Piperacilina-tazobactam
Espectro amplo Fluoroquinolonas
Tigeciclina + agente antipseudomonas

Anti- mrsa Ceftarolina


Daptomicina (exceto quando pneumonia)
Linezolida
Telavancina
Tigeciclina
Vancomicina
Quando o antibiótico é usado de forma eficaz, a morte bacteriana
é rápida e os tratamentos podem ser mantidos às vezes por cinco
dias ou menos. Esse tempo de tratamento deve ser pautado na
melhora clínica e laboratorial do paciente e discutido com a
comissão de controle de infecção hospitalar do serviço.

CONCLUSÃO
O conhecimento a respeito das principais infecções a que um
paciente cirúrgico está susceptível é essencial não apenas para
tratá-las, mas também e principalmente para preveni-las.
A resistência bacteriana é uma ameaça cada vez mais comum e
cabe a nós como prestadores de cuidado ao paciente indicarmos de
forma mais assertiva o antibiótico correto, na dose adequada e pelo
período ideal, a fim de diminuirmos a seleção da flora bacteriana.
É um trabalho em conjunto da equipe cirúrgica, da enfermagem e
da comissão de controle de infecção hospitalar, que começa ao
lavar a mão corretamente e termina ao dar alta com o paciente no
momento certo.

REFERÊNCIAS
1. Levin AS et al. Guia de utilização de anti-infecciosos e recomendações para a
prevenção de infecções relacionadas à assistência à saúde. 7. ed. 2018. São Paulo
2. Townsend C et al, Beauchamp, Evers. Mattox. Sabiston Tratado de Cirurgia: a base
biológica da prática cirúrgica moderna. Elsevier Brasil; 2019.
Parte 1 | Capítulo 10

Complicações das feridas operatórias


Autora: Mariane de Castro Michielin
Coautores: Gabriel Bernardo Rena e João Victor Maretti
Orientador: Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho

1. INTRODUÇÃO
Conforme abordado no capítulo anterior, as lesões decorrentes
do ato cirúrgico obedecem uma história natural compatível no
processo cicatricial e estão intimamente ligadas a uma reação
inflamatória decorrente da resposta metabólica ao trauma
provocado. Dessa forma, o paciente deve ser frequentemente
reavaliado clinicamente a fim de detectar precocemente quaisquer
alterações que surgirem ou eventos adversos decorrentes desse
processo natural. Primeiramente, devem ser acompanhados durante
as evoluções diárias de cada profissional e, mais tardiamente, sob
regime ambulatorial pelo tempo e periodicidade decorrentes ao grau
de invasão provocado e ao tipo de procedimento, assim como o
diagnóstico e a terapêutica sob os quais o doente foi submetido.
Os fatores de risco para uma cicatrização anormal devem ser
investigados clinicamente nas avaliações pré-operatórias por meio
de uma boa anamnese e um exame clínico detalhado e bem
executado. Tais características são frequentemente identificadas ao
questionar os antecedentes pessoais (sobretudo a presença de
doenças crônicas ou cirurgias prévias), hábitos, vícios,
medicamentos de uso contínuo e estado nutricional. Dentre os
principais fatores de risco para complicações de feridas operatórias
podemos citar a idade avançada, imobilização, diabetes mellitus,
obesidade, tabagismo, desnutrição, deficiência de vitaminas e
minerais, exposição à radiação ionizante e uso de medicamentos
como a doxorrubicina e glicocorticoides. Vale ressaltar que tais
fatores podem alterar patologicamente o curso natural do processo
cicatricial e, dessa forma, associados ao trauma cirúrgico, serem
responsáveis por eventos adversos da ferida cirúrgica, como
infecção, hematoma, deiscência, necrose local, ferida crônica,
cicatriz hipertrófica e queloides.

2. COMPLICAÇÕES DAS FERIDAS


OPERATÓRIAS
2.1. Infecção Da Ferida Operatória
A infecção do sítio cirúrgico é uma complicação, mas também
pode ser considerada como um processo inflamatório exacerbado
da ferida no qual haja drenagem de secreção purulenta, com ou sem
cultura positiva. De acordo com seus aspectos clínicos, pode se
estender além dos limites da ferida, acometer estruturas adjacentes
ou ficar limitada à incisão.
Figura 1: Infecção da ferida operatória com saída de secreção
purulenta.

Fonte: Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho. 1

Sua ocorrência representa elevado impacto sobre taxas de


morbidade e mortalidade do paciente, ao prolongamento de
internações e maiores custos ao Sistema de Saúde. Dados dos
Estados Unidos da América reportaram que, no ano de 2014,
ocorreram 20.916 casos de infecção de ferida operatória de um total
de 2.417.933 procedimentos cirúrgicos. A literatura ainda aponta
que essa complicação é responsável por aumentar o tempo de
internação hospitalar em 6,5 dias, o que implicou custos dobrados
ao hospital. Por esses e outros motivos, cada vez mais instituições
vêm desenvolvendo e aprimorando diretrizes a fim de prevenir a
frequência dessa complicação.
Idade avançada, diabetes, obesidade, tabagismo, etilismo,
imunossupressão, desnutrição, cirurgias decorrentes de trauma,
tempo cirúrgico prolongado, extensão da ferida, nova abordagem
operatória e técnica inadequada (antissepsia pessoal e da sala) são
os principais fatores associados à infecção da ferida operatória.
Isso se dá pela maior exposição do paciente a patógenos que
colonizam o ambiente, associado a um importante déficit sobre o
sistema imunológico desse paciente, seja inerente ao trauma
cirúrgico ou atribuível a fatores de risco identificados. O processo
infeccioso prolonga a fase inflamatória da cicatrização e interfere
negativamente sobre os processos de epitelização, contração e
deposição de colágeno – ocorre ainda liberação de enzimas como
as colagenases, que contribuem para a degradação dessa proteína e
destruição de tecidos adjacentes. De qualquer forma, a ferida não
cicatrizará por nenhum meio, seja por primeira intenção ou enxertia
até que o processo infeccioso esteja resolvido.
Clinicamente a infecção evidenciará descarga purulenta, sinais
flogísticos, como edema, eritema, calor e dor, além da presença de
febre e demais apresentações sindrômicas, dependendo do sítio
cirúrgico. Pode estar ou não associada a outras complicações,
como a deiscência.
Identificada a condição infecciosa, a equipe hospitalar deve ser
informada para que seja determinada a conduta. Exames gerais e
culturas com antibiograma, como hemocultura e cultura da secreção
da ferida, podem e devem ser solicitados para determinar o
patógeno e a sua sensibilidade e resistência a antimicrobianos. Em
geral, a abordagem inicial é feita por meio de uma antibioticoterapia
empírica até que os resultados das culturas com antibiograma
estejam disponíveis. O uso empírico e racional de antimicrobianos
deve considerar as características da microbiota do local da lesão e
os patógenos colonizadores do serviço de saúde, os quais devem
ser apontados pelas comissões de infecção hospitalar (conhecidas
como comissões de controle de infecção hospitalar – CCIH). Após
resultado das culturas, estabelece-se a antibioticoterapia
personalizada, escalonando a classe do antimicrobiano adequado. O
paciente deve permanecer internado até que suas características
clínicas e laboratoriais sejam favoráveis e a ferida operatória esteja
de bom aspecto.
Quanto à prevenção da infecção do sítio cirúrgico, é bem-
estabelecido que técnica adequada de antissepsia, esterilização do
ambiente operatório, paramentação correta, antibioticoprofilaxia
bem indicada, boa técnica cirúrgica e manutenção do curativo são
os principais pontos a serem abordados e observados na prática da
equipe médica e também por outros profissionais do meio. Um
controle pré-operatório das condições que predispõe a ocorrência da
infecção (como diabetes e o tabagismo) é medida que deve ser
realizada e orientada aos pacientes para minimizar o risco
infeccioso.

2.2. Hematoma
O hematoma pode ser definido como coleção de conteúdo
hemático sob a pele na ferida cirúrgica e geralmente de evolução
mais tardia. Seus principais fatores de risco incluem hemostasia
inadequada no ato cirúrgico, uso de drogas (como antiagregantes
plaquetários, anticoagulantes e antagonistas de vitamina K) ou
doenças de base do paciente que promovam distúrbios da
coagulação.
Apresenta-se clinicamente com flutuação da ferida (tumefação
macia localizada com descoloração azul-purpúrica da pele
sobrejacente) e desconforto por compressão local. A infiltração
sanguínea em tecidos adjacentes constitui um risco maior para
ocorrência de infecções pela obstrução de linfáticos e capilares,
além de promover afastamento das bordas da ferida – o que
predispõe a deiscência.
Figura 2: Presença de tumefação ao redor da ferida operatória, de
coloração arroxeada, caracterizando o hematoma.
Fonte: Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho. 2

Curativo oclusivo, cessação do tabagismo, interrupção à critério


médico do uso de medicamentos moduladores da coagulação antes
da cirurgia, boa técnica cirúrgica e rastreamento pré-operatório de
condições que prejudiquem a coagulação são fundamentais na
profilaxia dessa ocorrência. Os pacientes que apresentam INR
superior a 1,5 podem ainda receber antes de qualquer procedimento
vitamina K (1 a 2 mg via oral) para prevenir o sangramento.

2.3. Deiscência
A deiscência constitui separação de planos previamente unidos
por sutura ou primeira intenção, no início do curso pós-operatório. É
classificada como parcial, cursando com eventração, ou total,
cursando clinicamente com evisceração – forma mais grave. Pode
ocorrer em até 3% dos pacientes submetidos a cirurgias abdominais
e tem sua maior ocorrência por volta do sétimo ao décimo dia do
pós-operatório.
Em geral, essa complicação está associada à inadequada técnica
cirúrgica, fechamento incompleto dos planos cirúrgicos, infecção do
sítio operatório, presença de hematoma, obesidade, idade avançada,
desnutrição, tabagismo, diabetes mellitus, imunossupressão e
cirurgias emergenciais, além de outras condições que favoreçam
aumento da pressão intra-abdominal.
Clinicamente a deiscência pode ser visualizada pela eventração
ou pela evisceração, o que torna o diagnóstico certeiro – o paciente
pode referir dor e sensação de afastamento das margens cirúrgicas.
Pode ser melhor investigada com o toque de dedo enluvado no local
da deiscência, e, uma vez diagnosticada, a equipe cirúrgica deve ser
imediatamente notificada para conduta individualizada para o caso.
Figura 3: Deiscência parcial com exposição de tecido subcutâneo.

Fonte: Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho. 3

Quanto à sua prevenção, é importante ressaltar que uma técnica


operatória adequada e, principalmente, o controle das condições
clínicas modificáveis do paciente podem oferecer menor risco da
ocorrência, assim como o controle do tabagismo, diabetes e
desnutrição.
Figura 4: Deiscência total com exposição de tendões.
Fonte: Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho. 4

2.4. Necrose Local


A necrose local ocorre principalmente como consequência de
uma inadequada vascularização arterial, ou mesmo venosa, da
ferida operatória, geralmente a nível capilar, levando a uma
desvitalização do tecido, mas ainda é uma complicação menos
frequentemente encontrada. A literatura mostra que quando
relacionada a outros tipos de intervenções além do ato cirúrgico
isolado, sua frequência aumenta. No caso, por exemplo, de
pacientes submetidos à radioterapia, injeções de substâncias como
silicone industrial, polimetilmetacrilato (PMMA), tabagismo, bem
como o uso de fármacos pelo paciente como a varfarina.
O tratamento de escolha deve ser a realização de desbridamento
químico e/ou mecânico do local necrosado, preservando a máxima
quantidade de tecido viável, mas ao mesmo tempo retirando o
tecido desvitalizado necessário, para evitar a infecção associada.
Medidas de higiene e de melhoria do fluxo sanguíneo por meio de
fármacos por via oral ou no local podem evitar um
comprometimento maior e facilitar a cicatrização e recuperação do
tecido.

Á
Figura 5: Área enegrecida em região abdominal inferior,
caracterizando a necrose tecidual, em cicatriz de abdominoplastia.

Fonte: Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho. 5

2.5. Ferida Crônica


Feridas crônicas são aquelas onde não há cicatrização completa
entre 30 a 90 dias após o procedimento cirúrgico. São mais
encontradas nos seguintes grupos de pacientes: uso de corticoide
sistêmico em altas doses, tratamento quimioterápico ou
radioterápico para neoplasias, desnutridos, obesos mórbidos ou que
apresentam deiscência da sutura cirúrgica. De modo geral, a ferida
fica coberta por um tecido de granulação áspero ou excessivo, ou
com áreas de exsudação purulenta. Temos altos níveis de fatores
inflamatórios como IL-1, IL-6 e TNF-alfa. Acredita-se que há uma
degradação proteolítica da matriz extracelular, impedindo a correta
cicatrização, caracterizadas por um aumento de metaloproteinases
(MMP).
Figura 7: Lesão com cicatrização incompleta após procedimento
cirúrgico.
Fonte: Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho. 7

O tratamento das feridas crônicas envolve o desbridamento e a


tentativa de acelerar o processo de cicatrização, podendo para isto
utilizar enxerto cutâneo fenestrado ou dispositivos à vácuo próprios
para lesões. Outras medidas podem incluir a redução das doses de
corticoides e a utilização do fator de crescimento epidérmico.
Como prevenção dessas lesões podemos citar: evitar realizar
incisões em locais que já passaram por radioterapia, orientar a
perda de peso pré-cirúrgico para pacientes obesos, garantir o aporte
nutricional adequado para cada paciente antes da cirurgia e orientar
o cessar do tabagismo.

2.6. Cicatriz Hipertrófica e Queloides


As cicatrizes hipertróficas e os queloides são desordens
fibroproliferativas que ocorrem na derme, como consequência de
traumas ou infecções. Historicamente, eram frequentes em tribos
indígenas com a finalidade de ascendência social, onde a mutilação
era o fator predisponente para o desenvolvimento dessas
alterações. Essas cicatrizes podem ocorrer espontaneamente,
principalmente em regiões ventromediana e pré-esternal, como
resultado de uma cicatrização patológica.
O fenômeno principal envolvido na patogênese das cicatrizes
hipertróficas e dos queloides é a deposição excessiva do colágeno e
de fibras elásticas na matriz extracelular, assim como a degradação
da enzima colagenase, que tem como função a destruição do
colágeno. Dessa forma, temos uma deficiência na degradação da
matriz associada a uma síntese exagerada de colágeno. Além disso,
também ocorre o prolongamento da fase inflamatória e proliferativa
da cicatrização, que, por sua vez, estimula ainda mais a produção do
colágeno pela ação dos fibroblastos.
Na histologia dessas desordens podemos observar a deposição
das fibras colágenas em espirais ou em forma de nódulos com
crescimento gradual. Na região central de uma cicatriz hipertrófica e
de um queloide não notamos diferença, no entanto, ao avaliarmos a
periferia dessas alterações em transição com a pele normal,
percebemos que a estruturação em espiral das cicatrizes
hipertróficas se torna paulatinamente normais ao se aproximar da
pele sã, com fibras orientadas paralelamente à superfície cutânea, o
que não ocorre no queloide, que continua com aspecto espiral.
Ademais, sabemos que a cicatriz hipertrófica e o queloide possui um
número de mastócitos cerca de 4 vezes maior do que o presente em
uma cicatrização normal, o que justifica a clínica de prurido e
eritema.
Na imuno-histoquímica também podemos diferenciar as duas
alterações, pela presença ou não de fibroblastos alfa-SMA positivos.
Nas cicatrizes hipertróficas, encontramos muitas destas células, em
contraste às cicatrizes queloidianas que possuem uma quantidade
nula ou insignificante.
Essas desordens fibroproliferativas possuem fatores que
influenciam seu aparecimento, como:

• Etnia negroide e mongoloide: os indivíduos dessas etnias


apresentam um risco maior para desenvolvimento das
cicatrizes hipertróficas e queloidianas. Algumas pesquisas
indicam a prevalência em indivíduos negros em comparação
com caucasianos em uma variação de 6:1 até 19:1.

• Hereditariedade: é um fator verificado, porém sem padrões


bem estabelecidos. O histórico familiar positivo para essas
alterações é uma propensão maior para o seu
desenvolvimento.
• Idade: os adolescentes e os adultos jovens são os mais
acometidos, o que é explicado pela maior produção de
colágeno presente nesta fase da vida, sendo mais raro em
crianças e idosos.

• Regiões: região deltoide e face são as mais acometidas. Na


face temos um maior predomínio nos lóbulos auriculares, não
havendo relatos na literatura atual da presença de queloides
na região palpebral. Na área pré-esternal e do deltoide
também são bem frequentes, pois são locais de maior
movimentação.

• Fatores locais: alguns fatores cirúrgicos locais podem


contribuir para o surgimento das cicatrizes patológicas. Como
técnica inadequada de síntese, tensão nas bordas das feridas,
manipulação excessiva das margens da ferida, além da
orientação das incisões sem seguir as linhas de força da pele,
ocasionando uma maior tensão e tração das suturas. Além do
mais, fatores como o surgimento de infecções no sítio de
lesão no pós-operatório podem levar à cicatrização
exagerada.

2.6.1. Cicatrizes hipertróficas


As cicatrizes hipertróficas possuem uma superfície elevada,
geralmente pruriginosas, de coloração avermelhada e
frequentemente dolorosas. As cicatrizes podem se transformar em
hipertróficas em média de 40 dias após o ato cirúrgico.
O crescimento sempre respeita os limites das lesões ou
ferimentos que as originaram e possuem tendência à regressão,
mesmo parcial, em intervalos de tempo variáveis (podendo chegar
até 1 ano), durante a fase de maturação da cicatrização.
Figura 8: Lesão com cicatrização incompleta após procedimento
cirúrgico.
Fonte: Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho. 8

O tratamento envolve métodos de compressão, como malhas e


placas de silicone em gel, já que a compressão provoca uma
diminuição da oxigenação no tecido e desidratação local, com
menor produção do colágeno, melhorando o perfil cicatricial. É
necessário o uso por um período mínimo em média de 9 meses para
uma boa evolução. As placas de silicone em geral podem estar
associadas às malhas de compressão para melhor eficácia,
distribuindo a tensão acima da cicatrização patológica. Nesse caso
é recomendado o uso inicial durante 12 horas ao dia, com a
finalidade de evitar possíveis processos alérgicos, e, com o passar
do tempo, aumentar para 24 horas por dia.
Figura 9: Ilustração de placa de silicone em gel.
Fonte: Lemos C. 9

Figura 10: Ilustração de malha compressiva em braço.


Fonte: Ortoponto Comércio de Produtos de Ortopedia, Saúde e
Recuperação Ltda. 10

Outro método de tratamento bastante utilizado é a corticoterapia


intralesional, com o uso de triancinolona. O mecanismo de ação é a
redução da enzima alfa 2, inibidora da colagenase, além de outros
mediadores inflamatórios. Esse recurso altera a solubilidade do
colágeno, tornando-o mais susceptível à ação das enzimas
colagenolíticas. Para o esquema terapêutico utiliza-se geralmente
10 mg/ml com um intervalo de 4 semanas entre as aplicações. As
desvantagens relacionadas ao método são: dor excessiva na
aplicação, às vezes inviabilizando as sessões necessárias, mesmo
com o uso de diluição com lidocaína, além de poder provocar o
surgimento de cicatrizes alargadas e deprimidas caso haja
aplicação excessiva do produto, bem como o aparecimento de
cicatrizes hipocrômicas decorrentes da diminuição de produção da
melanina.
Figura 11: Aplicação da corticoterapia intralesional.

Fonte: Broetto J. 11

A betaterapia, ou radioterapia local, também é uma opção


terapêutica utilizada ocasionando a destruição dos fibroblastos e
inibindo a síntese de colágeno. Deve ser utilizada em um período de
no máximo 48 horas após a ressecção cirúrgica e pode ter como
intercorrências queimaduras ao redor da área tratada ou gerar
efeitos hiperpigmentantes.
Figura 12: Ilustração de uma placa de betaterapia.
Fonte: Betaclin ®. 12

2.6.2. Queloides
As cicatrizes queloidianas ou queloides apresentam formato
tumoral e são conhecidas por ultrapassarem os limites do trauma
ou inflamação que as originaram, não respeitando a linha de incisão
original. Elas não apresentam tendência à regressão, em oposição
às cicatrizes hipertróficas, e em alguns casos chegam a ser
pediculadas. Além disso, possuem coloração avermelhada, sendo
geralmente pruriginosas e muito dolorosas, com alta tendência à
recidiva.
Figura 13: Queloide em região auricular.
Fonte: Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho. 13

O tratamento se baseia no uso de métodos de compressão e


corticoterapia intralesional, da mesma forma que são
recomendados nas cicatrizes hipertróficas. Entretanto, a betaterapia
não é uma opção eficaz nos casos de cicatrizes queloidianas
estabelecidas, pelo fato dos fibroblastos já terem produzido todo o
colágeno da cicatriz e é necessário que se faça a ressecção da
cicatriz queloidiana antes da betaterapia.
A cirurgia é uma possibilidade muito empregada nos casos de
queloides. Devemos nos basear nos princípios das técnicas
atraumáticas, realizando a excisão intralesional, ou seja, a retirada
do tecido cicatricial deixando as margens livres para evitar recidivas.
Ademais, devemos remover todos os pontos inflamatórios que
podem desencadear a formação da cicatriz queloidiana, como
trajetos fistulosos, cistos e outros. Outro fator importante a ser
levado em consideração é que a ressecção da cicatriz deve ocorrer
quando a fase inflamatória (com sinais flogísticos) das margens da
lesão não estiver presente, pois o índice de recidiva fica mais
elevado nesses casos.
Figura 14: Aspecto após retirada cirúrgica de queloide em região
auricular.

Fonte: Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho. 14

Sendo assim, é de fundamental importância a associação dos


tratamentos para maximizar a possibilidade terapêutica.

2.7. Seroma
O seroma é um acúmulo líquido alojado no tecido subcutâneo
sob o local de incisão, pelo extravasamento de plasma sanguíneo e
linfa. Em seu quadro clínico temos edema localizado, com
desconforto frente à pressão, podendo ter saída de material líquido
de coloração amarelo-clara. Sua frequência depende muito do tipo
de cirurgia e da técnica utilizada. Um estudo mostrou que em
abdominoplastias realizadas com bisturi frio tiveram menos
coleções líquidas (4.89%) quando comparadas ao uso de
eletrocautério (8.75%). Essa formação líquida ocorre com maior
frequência quando se cria um grande descolamento de pele, como
vistos após mastectomias, hérnias grandes ventrais e dissecções
axilares. (Figura 15)
Figura 15: Seroma localizado em região de fossa ilíaca esquerda.

Fonte: Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho. 15

Muitas vezes, quando o seroma é pequeno, podemos deixar com


que o próprio organismo absorva o líquido. Caso o seroma seja
maior, o tratamento básico a ser instituído consiste na retirada do
líquido, por meio de um dreno ou pela utilização de seringas
aspirativas. Caso o líquido se acumule novamente após várias
aspirações, podemos realizar a abertura da incisão, lavagem local
utilizando gaze embebida com solução salina e a colocação de tela
sintética, quando necessário. Caso o seroma esteja infectado,
devemos realizar a drenagem aberta e antibioticoterapia.
Para prevenção dessa lesão devemos utilizar drenos e evitar o
espaço morto abaixo ao retalho de pele (principalmente em áreas
pós-linfadenectomias), tema que será no capítulo seguinte deste
Manual.

CONCLUSÃO
Com este capítulo podemos concluir que as feridas operatórias
podem sofrer complicações mesmo quando há a realização correta
das técnicas cirúrgicas. Algumas medidas específicas podem ser
realizadas para cada tipo de cirurgia, visando a redução de
complicações. Desse modo, torna-se fundamental que o profissional
tenha conhecimento dos tipos de complicações com maior
probabilidade de ocorrência, e, quando possível, utilize ações para
prevenir esses eventos.
É também de extrema importância a orientação do paciente
acerca dos tipos de complicações possíveis na cirurgia, destacando
os sinais de alerta para a procura do atendimento médico e assim
possibilitando uma resposta terapêutica adequada ao caso.

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CRÉDITOS DAS IMAGENS


1. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
2. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
3. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
4. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
5. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
7. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
9. Lemos C. Cirurgia de Quelóide. Claúdio Lemos Cirurgia Plástica, 2016. [acesso em
2020 mar. 8].
10. Ortoponto Comércio de Produtos de Ortopedia, Saúde e Recuperação Ltda.
Braçadeira Elástica de Compressão para Linfedema Advance 20-30mmHg Sigvaris
com Polegar. [acesso em 2020 mar. 8].
11. Broetto J. Quelóide ou Cicatriz hipertrófica?. Dra. Júlia Broetto – Cirurgia Plástica,
Cirurgia Reparadora, Correção de Cicatrizes, Quelóides. [acesso em 2020 mar. 8].
12. Betaclin ®. Betaterapia – Perguntas e Respostas. Betaterapia Dermatológica e
Fototerapia, 2018. [acesso em 2020 mar. 8].
13. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
14. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
15. Acervo pessoal de Dr. Eduardo Fausto de Andrade Filho.
Parte 1 | Capítulo 11

Cuidados com drenos e sondas


Autor: João Victor Maretti
Orientador: Dr. Fabio Goussain Labat

1.DRENOS
1.1. O que são?
Drenos cirúrgicos são dispositivos tubulares ou laminares
capazes de remover diversos fluidos corporais e gases de uma ferida
cirúrgica, permitindo que o conteúdo possa escapar de uma cavidade
corporal específica. Podem ser profiláticos, como na prevenção de
hematoma de ferida cirúrgica, ou ainda terapêuticos, como no caso
da drenagem de tórax. Isso permite ao paciente melhor conforto e
segurança no pós-operatório e ademais, constituem uma via
terapêutica. É importante frisar que a utilização de drenos deve ser
bem indicada e o tipo adequado a cada circunstância, de modo a
realizar sua função sem retardar a alta hospitalar ou prejudicar o
paciente.

1.2. Tipos de dreno


Os drenos podem ser subdivididos em dois grandes grupos de
acordo com o seu tipo de sistema: fechado ou aberto. Um dreno de
sistema fechado é aquele que seus conteúdos não são expostos à
atmosfera e podem ainda ser subdivididos em drenos a vácuo e
drenos não vácuo. Por sua vez, um dreno de sistema aberto atua de
maneira oposta e seus conteúdos entram em contato com a
atmosfera. Outros autores classificam os drenos como ativos ou
passivos – os drenos ativos atuam através de pressão negativa, isto
é, exercem em seu interior uma pressão inferior à encontrada na
cavidade ao qual foi implantado, o que de fato faz com que haja
movimento de fluidos. Drenos passivos, entretanto, funcionam
apenas como canais que viabilizam a passagem de seus conteúdos
por maior pressão na cavidade, capilaridade e pela ação da
gravidade. Em seguida, serão apresentados os drenos mais
comumente encontrados na prática cirúrgica.

Drenos de sistema fechado a vácuo


São constituídos por um sistema de drenagem por pressão
negativa sem contato com o meio externo, o que facilita o contato
entre os diferentes tecidos, colaborando com o processo de
cicatrização. Apresentam eficácia na prevenção de seroma e
hematoma. Serão mostrados abaixo os principais exemplares.

Dreno Redivac®
É baseado em um sistema de pressão negativa por meio de tubos
flexíveis que levam os fluidos a um reservatório transparente tipo
garrafa de tamanho único, embora diversos tamanhos de tubo
estejam disponíveis no mercado. Seu ponto negativo é que uma vez
que o reservatório esteja cheio, este deve ser substituído. Um
reservatório limpo permite a aferição diária de fluido drenado. A
presença de vácuo pode ser vista de fora por meio de um tubo
colorido, o qual deve se encontrar retraído. Caso haja perda de vácuo
e o reservatório está vazio, este pode ser restabelecido pela conexão
do sistema a uma bomba de sucção. Importante ressaltar que,
durante sua remoção ou troca de reservatório, o vácuo deve ser
liberado em primeiro lugar por meio de um clipe – caso contrário, a
pressão negativa em contato com tecidos pode causar dor ao
paciente. Seu uso é amplo.
Exemplo de dreno Redivac. Fonte: B. Braun.1

Dreno Jackson-Pratt®
O dreno Jackson-Pratt, popularmente conhecido como “dreno JP,”
é composto por um tubo de silicone flexível e fenestrado conectado a
um reservatório em forma de bulbo com pressão negativa em menor
intensidade quando pressionado e fechado. Uma vez que o
reservatório esteja cheio, não é necessário que este seja descartado -
por meio de uma segunda luz é possível desprezar o fluido ou ainda
coletá-lo para análises. É muito usado na cavidade abdominal e em
cirurgias da face e do pescoço, bem como mastectomias. O fato de
ser fenestrado é importante para reduzir complicações como
perfuração ou isquemia de alças intestinais, uma vez que essas não
são sugadas diretamente ao tubo.
Exemplo de dreno Jackson-Pratt. Fonte: Enfermagem Novidade.2

Dreno Portovac®
O dreno Portovac® ou Hemovac® é mais um dreno de pressão
negativa em baixa intensidade. É composto por um tubo flexível
conectado a um sistema com reentrâncias em seu corpo,
semelhante a uma sanfona. Possui uma única luz e sua pressão
negativa é exercida por uma pressão sobre seu corpo antes de ser
conectado ao sistema fechado. Uma vez cheio o reservatório, a
secreção pode ser desprezada, mantendo o frasco. Causa menos dor
e, por ser de baixa pressão negativa, dificilmente o dreno pode ser
obstruído por estruturas como o omento. Amplamente utilizado na
cavidade abdominal.
Ilustração dreno Portovac. Fonte: Assessment Technologies
Institute.3

Curavac®
O Curavac® constitui um curativo a vácuo, indicado para feridas
abertas e extensas da pele. Embora sejam muito semelhantes a um
curativo, atuam como um dreno de superfície, o que previne infecção
local e colabora com a cicatrização. São compostos por uma esponja
estéril a qual é posicionada sobre a ferida e um filme envoltório com
um conector para um tubo o qual é ligado a uma bomba a vácuo
específica. Podem permanecer sobre a pele por até 48 horas sem
que haja necessidade de troca.
Funcionamento do Curavac. Fonte: Made-In-China.4

Drenos de sistema fechado sem vácuo

Dreno de Robinson ou D-Bag®


Constitui uma bolsa ligada a um tubo flexível de silicone. É o
dreno de sistema passivo mais utilizado. Muito comumente é
conectado a uma sonda vesical de demora para aferição de débito
urinário. Em sua extremidade inferior, possui um sistema de abertura
controlada, uma pequena torneira, para coletar fluidos. O tubo pode
ser fenestrado a depender da indicação.
Exemplo de dispositivo. Fonte: Medical Expo.5

Dreno de Malecot
Dreno tubular de látex com extremidade em formato de cogumelo.
Atualmente menos utilizado, mas em geral é útil em cistostomia, ne-
frostomia ou até gastrostomias. Seu formato típico tem função de
evitar retração dessas cavidades citadas, que podem se tornar
virtuais, inviabilizando possível colabamento.

Fonte: Mederen.6

Dreno Pigtail
Característico pelo seu formato de rabo de porco - do inglês
“pigtail” -, este dreno tubular de pequeno calibre é útil para drenar
cavidades únicas. Em geral é muito utilizado para drenar cavidade
pleural, porém seu uso não é possível quando há diversas lojas de
coleção fluida numa única cavidade ou ainda quando o líquido
apresenta maior viscosidade. Sua inserção geralmente é guiada por
tomografia computadorizada ou ainda por ultrassonografia. São
drenos passivos e comumente são conectados a um saco coletor,
unidos por meio de uma válvula que impede o refluxo, conhecida
como válvula de Heimlich. frequentemente têm sua luz obstruída e
por isso é recomendado que sejam lavados cerca de duas ou três
vezes ao dia. Antes de ser removido, deve-se realizar um corte em
determinada linha para desenrolar sua extremidade de remoção
automática, permitindo assim sua retirada.

Fonte: Eptca Medical Devices.7

Fonte: Hospital Procedures.8

Dreno de tórax
Consiste num dreno passivo ligado a um reservatório com água
para evitar o refluxo de gases para o interior da cavidade pleural por
pressão negativa, atuando como uma válvula, especialmente durante
a inspiração. Este é o processo conhecido como drenagem em selo
d’água. O reservatório é conectado a um tubo flexível e fenestrado o
qual é capaz de drenar gases, no caso do pneumotórax, e líquidos,
em caso de derrame pleural. Em geral, o reservatório é composto por
uma haste imersa e um ou dois orifícios laterais na tampa em
contato com o ar ambiente. A haste deve ficar submersa até a marca
sinalizadora ou cerca de 2 centímetros sob a água para que o
sistema funcione adequadamente. O frasco reservatório é vantajoso
por permitir a mensuração de líquido drenado e verificar se há
presença de bolhas na água, o que traduz a drenagem de gases.

Fonte: Medical Brasil.9

Dreno de Kehr
O dreno de Kehr ou dreno em “T” são comumente utilizados após
manipulação de vias biliares, que são ocupadas pelo dreno, o qual
contém uma extremidade mais longa que é trazida para a pele,
criando assim uma fístula biliar controlada, conectada a um saco
coletor. Este dispositivo permite a realização de uma colangiografia
para verificar a patência das vias biliares ou a presença de cálculos.
Pode ser clampeado após sete dias e retirado na ausência de sinais
de obstrução canalicular.
Fonte: Surgical Technology.10

Estruturas anatômicas do aparelho digestivo em relação ao Dreno de


Kehr. Fonte: Mount Nittany.11

Dreno de sistema aberto

Dreno de Penrose
o dispositivo para drenagem aberta mais frequente. Feito
geralmente de látex, é uma estrutura laminar, achatada e semelhante
a um dedo de luva. Para absorver o conteúdo líquido drenado, uma
gaze deve ser aplicada em sua extremidade externa. Por não estar
conectado a um reservatório, a mensuração de líquido drenado nesse
caso é difícil, permitindo apenas uma estimativa a partir de gases
trocadas. Pelo fato de consistir num sistema aberto ao meio externo,
a complicação mais comum deste dispositivo é infecção bacteriana -
essas colonizam o dispositivo e por contiguidade infectam a região.
Em geral, é utilizado para drenar pus e retirado em poucos dias.

Dreno Penrose. Fonte: Alibaba.12

1.3.Quando é indicado?
Os drenos podem ser indicados de maneira terapêutica ou
profilática, sendo essa última sua indicação mais comum. Em
qualquer cirurgia na qual é criada uma cavidade, o corpo tem a
tendência a acumular líquido ou gás e, dessa forma, a indicação
profilática tem como objetivo evitar que haja acúmulo de fluidos a fim
de prevenir hematoma, seroma e infecção. É imprescindível que a
indicação para drenagem seja individualizada para o caso e
procedimento submetido, pois, caso contrário, é possível que a
internação seja prolongada e o paciente exposto a riscos
desnecessários e desconforto. Esses dispositivos são
frequentemente usados após cirurgias de tireóide, mama, região
axilar, abdome e após artroplastias.

1.4. Como os drenos são aplicados?


A inserção dos dispositivos de drenagem ocorre no final do
procedimento cirúrgico. O paciente deve estar anestesiado.
Rotineiramente, o dreno é aplicado em uma pequena incisão
adjacente ao sítio cirúrgico, separada por uma pequena distância a
fim de diminuir o risco de infecção de ferida no pós-operatório. A
técnica de inserção é individualizada ao procedimento cirúrgico em
questão. Com exceção do dreno de Penrose, são fixados por meio de
sutura com fio não absorvível, sendo mais comum o uso de fio de
nylon.

1.5. Remoção Segura


A remoção de um dreno deve obedecer ao critério médico para
sua remoção, novamente individualizando o caso. No caso de
dispositivos de pressão negativa, o tubo emergente da cavidade deve
ser primeiramente clampeado e em seguida removido o reservatório
antes que o dreno ou tubo seja de fato retirado da cavidade. Esse
procedimento pode ser doloroso ao paciente.
O procedimento de remoção não é livre de complicações. A
depender do dispositivo e sítio cirúrgico, tais eventos adversos
podem variar. Para minimizar a ocorrência desses eventuais danos
ao paciente, é fundamental que o cirurgião tenha uma boa técnica e
respeite os critérios de remoção. A literatura aponta que é seguro
remover um dreno com débito inferior a 25 ml nas últimas 24 horas,
ou inferior a 1 mL/h, desde que esse não esteja obstruído. Todavia,
algumas situações requerem atenção especial, como no caso do
dreno de tórax que possui critérios mais específicos: melhora clínica
do padrão respiratório; radiografia de tórax evidenciando boa
expansão pulmonar; volume de drenagem inferior a 100 mL nas
últimas 24 horas; líquido de aspecto claro ou seroso e ausência de
bolhas no dreno nas últimas 24 horas.

1.6. Complicações
Como qualquer procedimento invasivo, existem riscos de eventos
adversos no manejo do paciente com dreno. Dentre as complicações
mais comuns, pode-se citar hemorragia, inflamação local, infecção e
obstrução da via. Outras complicações de pior prognóstico incluem
perfuração intestinal e fístula enterocutânea em drenos abdominais;
hemotórax, pneumotórax hipertensivo e enfisema subcutâneo no
caso do dreno de tórax, dentre outras. É possível ainda que o dreno
quebre durante sua remoção e haja necessidade de reabordagem
cirúrgica do paciente, o que, assim como no caso das outras
complicações, certamente prolongará o tempo de internação do
paciente.

1.7. Contraindicações
A literatura não estabelece contraindicações absolutas à
aplicação de drenos com finalidade terapêutica ou profilática.
Entretanto existem determinadas condições nas quais o médico deve
considerar antes de submeter o paciente a esse procedimento
invasivo, tais como no caso de coagulopatia; uso contínuo de
anticoagulantes orais sem suspensão nas últimas 48 horas e com
INR superior a 1,5; uso contínuo de antiagregante plaquetário sem
suspensão nos últimos 5 a 7 dias; infecção da pele local; recusa do
paciente; inserção em hematoma próximo a anastomose arterial,
uma vez que o paciente tem risco aumentado de choque
hipovolêmico.

2. SONDAS
2.1. O que são?
Sondas podem ser definidas como tubos de borracha ou plástico
flexível que são introduzidos em algum canal do organismo ou
cavidade.

2.2. Tipos
Sonda nasogástrica ou Levine
Consiste num tubo simples de luz única, feito de plástico, com
aberturas próximas à extremidade. Possui marcas circulares que
auxiliam sua inserção, de acordo com o tamanho necessário aferido.
Sonda de Levine. Fonte: Medienf24.13

Sonda nasoenteral ou Dobbhoff


É uma sonda feita de silicone a qual fica alojada no intestino
delgado, mais especificamente no jejuno, sendo fina e flexível com
uma extremidade pesada para que se movimente em sintonia ao
peristaltismo. Em geral, vem acompanhada de um fio-guia para
facilitar sua inserção. Muito usada para alimentar doentes crônicos
incapazes de se alimentar e também em pós-operatório de cirurgias
abdominais em que haja intenção de desviar o trânsito alimentar do
estômago e duodeno.
Sonda nasoenteral Dobbhoff. Fonte: Total Médica.14

Sonda de Sengstaken-Blakemore
Criado na década de 50 por Sengstaken e Blakemore, é um
dispositivo usado especificamente para tratamento hemorragia
digestiva alta por tamponamento em caso de varizes esofagianas
sangrantes, é uma sonda composta por três luzes e dois balões. Uma
luz fornece caminho para insuflar o balão gástrico (via de coloração
bege), outra luz para insuflar o balão esofágico (via de coloração
vermelha) e a última viabilizando abertura para o trato
gastrointestinal. Seu uso é contraindicado em casos de varizes de
fundo gástrico, estenose esofágica e em pacientes submetidos a
cirurgias que manipulem a junção esofagogástrica. Como principais
complicações, temos: necrose de asa de nariz, necrose esofágica e
perfuração - para tal, o balão esofágico deve ser inflado numa
pressão de 35 a 40 mmHg, aferida com manômetro, para evitar
isquemia da mucosa local.
Durante a passagem do tubo, existe a possibilidade de asfixia por
intubação endotraqueal inadvertida ou por migração do tubo - nesse
caso, o dispositivo todo deve ser removido imediatamente. A
complicação mais comum é a ocorrência de broncoaspiração,
especialmente por conta de refluxo gástrico na inserção do aparato, e
por acúmulo de saliva imediatamente acima do balão esofágico - tais
pacientes podem se beneficiar de antibioticoprofilaxia para
pneumonia aspirativa, em geral com ceftriaxone associado a
clindamicina. Em todos os casos, a Sonda de Sengstaken-Blakemore
deve ser removida compulsoriamente em 24 horas.
Exemplo de dispositivo. Fonte: Produlab.15

Sonda vesical de alívio


Consiste num tubo plástico flexível de fino calibre utilizado para
esvaziamento vesical momentâneo. Uma vez cateterizado, esse
dispositivo deve ser removido assim que houver parada de
eliminação de urina. Seu objetivo principal é fornecer conforto a
pacientes com retenção urinária aguda ou ainda obter amostra de
urina para análise. Vale ressaltar que toda sondagem vesical, seja de
alívio ou demora, é um procedimento estéril.
Sonda vesical de alívio. Fonte: Seucardio.16

Sonda vesical de demora ou Foley


A cateterização vesical de demora objetiva manutenção do
adequado esvaziamento vesical em qualquer condição que o
paciente não seja capaz de fazê-lo adequadamente. A
impossibilidade de esvaziamento normal da bexiga apresenta
evolução para quadro infeccioso, o que pode causar lesão renal
aguda e até mesmo sepse. A sonda de Foley em geral é conectada a
um saco coletor que permite aferir o débito urinário durante as
evoluções médicas, a fim de colaborar com a avaliação do quadro
clínico do paciente.
Cateter de Foley. Fonte: Heartline Medical.17

Sonda de aspiração traqueal


Consiste num tubo de pequeno calibre, feito de silicone, o qual é
acoplado a um aspirador para remover o excesso de secreções das
vias aéreas superiores.
Cateter de aspiração traqueal. Fonte: Balke.18

Sonda para gastrostomia


Dispositivo tubular implantado sobre o abdome com a finalidade
de descomprimir o trato gastrointestinal e administrar medicamentos
e alimentos, na impossibilidade de uso de sonda nasogástrica. Seu
uso vem se tornando cada vez mais comum em concordância ao
envelhecimento populacional. Pode ser implantada por via aberta ou
ainda por via endoscópica, menos invasiva, mas nem sempre
possível. Em sua extremidade interna, possui um balão que auxilia
em sua fixação.
Sonda para gastrostomia. Fonte: Casa Cirúrgica Ipiranga.19

Sonda para jejunostomia


Assim como no caso da gastrostomia, é indicada para
alimentação, administração de drogas e descompressão. Indicada
quando há impedimento de se realizar a gastrostomia.

Sonda para jejunostomia e seus componentes. Fonte: NHS.20


2.3. Indicações
A sondagem do trato gastrointestinal tem como principais
indicações a descompressão para remoção de gás e líquidos;
rebaixamento do nível de consciência; realizar lavagem gástrica para
promover esvaziamento do conteúdo gástrico, por exemplo, no
tratamento de tentativas de suicídio; diagnóstico de íleo adinâmico;
administrar medicamentos e alimentos; auxiliar no tratamento do
sangramento gástrico ou duodenal e obtenção de conteúdo gástrico
para análise. No caso das sondas nasoenterais, sua indicação
principal é quando há necessidade de permanência do dispositivo
por maior tempo em relação à sonda nasogástrica. Outras
indicações de sonda nasoenteral são: risco de aspiração pulmonar e
refluxo gastroesofágico importante. Caso haja indicação, a sonda
nasoenteral pode ser aplicada por via endoscópica, com o objetivo de
posicioná-la distalmente à papila duodenal. A sonda de Sengstaken-
Blakemore tem como objetivo o manejo de pacientes com varizes
esofagianas rotas, como mencionado anteriormente. A vantagem
desse dispositivo é que além de promover hemostasia, permite
alimentação do doente ou ainda lavagem gástrica.
aplicação de dispositivos de sondagem vesical tem como por
finalidade a manutenção do esvaziamento da bexiga e estão
indicados mediante casos de doenças degenerativas
neuromusculares e de bexiga neurogênica, durante atos cirúrgicos de
grande porte, retenção urinária aguda por obstrução ao livre fluxo de
urina, pacientes sob cuidados intensivos e lavagem vesical após
cirurgia sobre a próstata para evitar formação de coágulos.
A sonda de aspiração traqueal é mais indicada em caso de
trauma ou pacientes com nível de consciência rebaixado que estejam
secretivos. Tem por finalidade manter a patência da via aérea
superior, facilitando a respiração ou intubação, caso haja
necessidade. Também é utilizada na neonatologia, durante o suporte
à vida do recém-nascido.
A gastrostomia é frequentemente indicada no tratamento paliativo
de pacientes com tumores irressecáveis de faringe e esôfago, para
que recebam dieta e assim ofertar aporte nutricional adequado, bem
como na administração de medicamentos de absorção no trato
gastrointestinal, uma vez obstruída a via alimentar alta. Em geral, a
jejunostomia é feita na contraindicação da gastrostomia e após
cirurgias gástricas nas quais o estômago não possa receber dieta
temporariamente, ou tumores de estômago.

2.4. Complicações
A sondagem do trato gastrointestinal, seja nasogástrica ou
nasoenteral apresenta como complicações erosão da mucosa nasal,
rinossinusite, obstrução ou deslocamento da sonda, aspiração
pulmonar; desconforto abdominal; náuseas e vômitos; soluços e
distúrbios hidroeletrolíticos.
Como complicações comuns, a sondagem vesical pode ser
responsável por infecção de trato urinário; ruptura do balão da sonda;
trauma e estenose de uretra; orquiepididimite; vazamento e
obstrução da sonda e incontinência a longo prazo.
A gastrostomia apresenta como principais complicações: má
posição da sonda, podendo resultar em isquemia e necrose; infecção;
perfuração do cólon e sangramento.
São eventos adversos da jejunostomia: dor e infecção local; mal
posicionamento ou deslocamento da sonda; diarreia; dores
abdominais; hiperglicemia; extravasamento e obstrução da sonda;
perfuração; hemorragia e pneumoperitônio.

2.5. Contraindicações
Constitui contraindicação à sondagem por via nasogástrica ou
nasoenteral obstrução intestinal completa; fístula enterocutânea
proximal de grande drenagem; sangramento digestivo superior;
fístula liquórica; fratura de base de crânio.
Como contraindicação à sondagem vesical, temos estenose de
uretra; fimose e obstrução por hiperplasia prostática benigna. Caso
sua realização não seja possível, outros procedimentos como a
cistostomia devem ser considerados.
A sonda de aspiração traqueal não apresenta contraindicação
formal em seu uso.
Como contraindicações à gastrostomia, temos: coagulopatia ou
uso de medicações que prolonguem o tempo de sangramento,
antecedente de gastrectomia, carcinomatose peritoneal, ascite
volumosa, peritonite, instabilidade hemodinâmica, doenças
psiquiátricas com risco de auto-remoção da sonda e abdome
perfurativo.
A jejunostomia é contraindicada em casos de incontinência da
estomia, infecção parietal e peritoneal, deslocamento da sonda e
tardiamente risco aumentado de hérnia incisional.
Vale ressaltar que a recusa do paciente constitui uma
contraindicação e sua vontade deve ser respeitada a menos que haja
risco de morte.

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de Cirurgia: A Base Biológica da Prática Cirúrgica Moderna, 18ª ed. Rio de Janeiro:
Elsevier; 2010. p. 132-137.
9. SCHETTINI, SÉRGIO MADI, OTÁVIO. Introdução à Prática Médica. 1. ed. São Paulo:
UNINOVE, 2016.

CRÉDITOS DAS IMAGENS


1. B. Braun. Redovac® 400 CompleteKits. [acesso em 2020 jan. 23].
2. Enfermagem Novidade. Drenos e os cuidados de enfermagem. [acesso em 2020 jan.
23].
3. Assessment Technologies Institute. Hamovac Drain. [acesso em 2020 jan. 23].
4. Made-In-China. Vacuum Assisted Closure VAC Therapy Npwt System. [acesso em 2020
jan. 23].
5. Medical Expo. Dreno de Robinson ou D-Bag®. [acesso em 2020 jan. 23].
6. Mederen. Malecot Catheter. [acesso em 2020 jan. 23].isJPY.
7. Eptca Medical Devices. Angiografia e hemodinâmica: cateter para drenagem. [acesso
em 2020 jan. 23].gtGX8.
8. Hospital Procedures. Pgtail. [acesso em 2020 jan. 23].cABNW.
9. Medical Brasil. Biokit. [acesso em 2020 jan. 23].
10. Surgical Technology. Kehr’s T Tube Drainage in Post surgery. [acesso em 2020 jan.
23].cvV13.
11. Mount Nittany. Discharge Instructions Caring for Your T-Tube. [acesso em 2020 jan.
23].
12. Alibaba. Dreno de penrose de látex médico. [acesso em 2020 jan. 23].
13. Medienf24. Sonda alimentação Levin PVC. [acesso em 2020 jan. 23].
14. Total Médica. SONDA NASOENTERAL DOBBHOFF. [acesso em 2020 jan. 23].
15. Produlab. SONDA SENGSTAKEN CON BALÓN. [acesso em 2020 jan. 23].
16. Seucardio. Cateterismo Vesical Intermitente: é importante e não machuca. [acesso
em 2020 jan. 23].
17. Heartline Medical. Latex Foley Cath. [acesso em 2020 jan. 23].
18. Balke. SONDA ASPIRAÇÃO TRAQUEAL. [acesso em 2020 jan. 23].
19. Casa Cirúrgica Ipiranga. SONDA DE GASTROSTOMIA KANGAROO. [acesso em 2020
jan. 23].
20. NHS. Jejunostomy (JEJ) Feeding Tube – Passport. [acesso em 2020 jan. 23].
Parte 2: Principais Temas Teóricos da
Cirurgia Geral

Parte 2 | Capítulo 12

Abdome agudo
Autores: Ana Cristina Fiuza de Albuquerque e Rafael Bernardo da Silva

1. Introdução
O abdome agudo caracteriza-se como uma síndrome dolorosa que leva o doente a
procurar atendimento médico e que requer tratamento imediato, clínico ou cirúrgico. Sua
importância está na elevada prevalência e nas complicações graves que podem advir de um
diagnóstico tardio.

2. Etiologia
Qualquer órgão intra ou retroperitonial pode originar um quadro de abdome agudo. A
estrutura acometida pode ser previamente normal ou cronicamente doente, sofrendo, nesse
caso, um processo de agudização. Classicamente, os abdomes agudos são divididos em
cinco síndromes clínicas de acordo com a etiologia: hemorrágico, inflamatório, obstrutivo,
perfurativo e vascular. O trauma não constitui uma causa de abdome agudo.
Tabela 1:Principais causas de abdome agudo Quadro Clínico

HEMORRÁGICO: PERFURATIVO:

• Gravidez ectópica rota


• Úlcera péptica • Divertículos do cólon
• Rotura de aneurismas
• Doença inflamatória intestinal
• Rotura de cistos ovarianos, tumores
• Corpo estranho
hepáticos

INFLAMATÓRIO: VASCULAR:

• Apendicite aguda
• Embolia da artéria mesentérica superior
• Colecistite aguda
• Choque hipovolêmico
• Colangite
• Trombose mesentérica (arterial ou
• Diverticulite
venosa)
• Pancreatitie aguda
OBSTRUTIVO:

• Bridas e aderências
• Neoplasias
• Hérnias da parede abdominal
• Diverticulite
• Volvo
• Doença inflamatória intestinal
• Íleo biliar
• Corpo estranho

3. Quadro Clínico
A caracterização da dor constitui a chave para o diagnóstico. Na maioria das vezes, o
processo se inicia com uma dor mal caracterizada referida em epi/mesogastro, definida
como visceral. À medida que o processo evolui, a inflamação do órgão se estende ao
peritônio parietal contíguo, gerando uma dor melhor localizada com sinais de defesa
abdominal. Essa apresentação é típica dos abdomes agudos inflamatórios, etiologia mais
comum.
A peritonite também pode resultar da ruptura de uma víscera, sendo as substâncias que
causam maior irritação peritoneal: suco gástrico, bile, conteúdo fecal, e, em menor
intensidade, sangue e urina.

4. Diagnóstico
A anamnese e o exame físico criteriosos são capazes de direcionar o diagnóstico em
grande parte dos casos. Dependendo da etiologia, a apresentação clínica terá algumas
particularidades.
No abdome agudo inflamatório, a dor geralmente é insidiosa, com um intervalo
relativamente longo entre o início dos sintomas e a procura por atendimento médico, ao
contrário do perfurativo, que leva, na maioria das vezes, a uma dor súbita e intensa com
difusão precoce no abdome. No abdome agudo vascular, a dor também é súbita e
persistente, porém com uma dissociação em relação ao exame físico, que não apresenta
sinais de irritação peritoneal. Já no hemorrágico, além da irritação peritoneal, há uma clínica
relacionada à perda volêmica, com taquicardia, pulsos finos, hipotensão, etc. Apesar de
todas as causas poderem cursar com náusea e vômitos, no abdome agudo obstrutivo, esse
quadro é mais proeminente e associado a: distensão, parada da eliminação de fezes e flatos
e distúrbios hidroeletrolíticos.
Na coleta da história, deve-se questionar acerca de quadros semelhantes anteriores, as
características da dor (localização, irradiação, fatores de piora e melhora), cirurgias prévias,
uso de medicações (anticoagulantes, anti-inflamatórios não hormonais, anticoncepcionais),
doenças associadas (diabetes, hipertensão, coronariopatias, arritmias, aterosclerose,
colagenoses, etc.), atraso menstrual, alterações do hábito intestinal.
No exame físico, após coleta dos sinais vitais, pesquisar a presença de palidez, icterícia,
cicatrizes e hérnias da parede abdominal, massas palpáveis, equimoses (sinal de Cullen e
Grey-Turner na pancreatite aguda).
Alguns pacientes podem ter um quadro pouco característico, dificultando e retardando o
diagnóstico. São eles os idosos, obesos, desnutridos, imunossuprimidos, em uso de
corticoides, antibióticos ou quimioterápicos.
A rotina de abdome agudo, que constitui as radiografias de tórax (póstero-anterior) e
abdome (deitado e em ortostase), é o exame de imagem mais acessível na avaliação inicial
do doente. Permite visualizar a presença de pneumoperitônio, distensão de alças, níveis
hidroaéreos, corpos estranhos. A etapa em ortostase pode ser substituída pela radiografia
em decúbito lateral com raios horizontais, na impossibilidade de o doente permanecer em
pé para o exame.
A ultrassonografia possui elevada sensibilidade para doenças das vias biliares, massas,
coleções e líquido livre na cavidade abdominal. Contudo, a tomografia contrastada do
abdome é o exame de maior acurácia no contexto do abdome agudo.
Os exames laboratoriais são direcionados pela síndrome clínica, porém a maioria dos
doentes se beneficia de um perfil que inclui hemograma completo, gasometria, eletrólitos,
função renal e glicemia.

5. Diagnóstico Diferencial
Diversas doenças podem simular um abdome agudo. Na tabela 2 estão reunidas as
condições que eventualmente se apresentam com dor abdominal e que devem estar na
lembrança do médico-assistente.
Tabela 2: Condições que simulam abdome agudo

Pleuropulmonares: pneumonias com consolidações, pleurites, derrames pleurais.

Cardíacas: síndrome coronariana aguda, pericardite.

Genitourinárias: infecção do trato urinário, litíase.

Infecciosas: herpes zóster, tabes dorsalis, tuberculose peritoneal.

Gastrointestinais: enteroinfecções, febre tifoide.

Colagenoses: poliarterite nodosa, lupus eritematoso sistêmico.

Metabólicas: cetoacidose diabética, porfiria aguda, uremia.

Hematológicas: crise falcêmica.

6. Tratamento
A cirurgia é a terapia de escolha na maioria dos pacientes com abdome agudo,
reservando o tratamento clínico para algumas condições específicas. Dois exemplos são a
pancreatite aguda e a diverticulite, nas quais a cirurgia está indicada somente nas
complicações. A laparotomia também pode ser utilizada como método diagnóstico nos
pacientes sem etiologia definida e que apresentem sinais francos de irritação peritoneal ou
dor persistente associada a piora clínica.
No abdome agudo vascular, terapias endovasculares podem ser associadas para
reestabelecer o fluxo sanguíneo mesentérico nos casos de embolia e trombose arteriais.
Em todos os pacientes, a estabilização hemodinâmica e a antibioticoterapia, quando
indicada, devem ser instituídas precocemente para um melhor resultado cirúrgico.

Conclusões
O abdome agudo, devido à sua etiologia multifatorial, pode ser um desafio diagnóstico.
Contudo, sua suspeição deve ser elevada para uma rápida definição terapêutica. No
fluxograma ao final do capítulo, há uma simplificação para orientação diagnóstica a partir
das características da dor, porém, apresentações atípicas e a congruência dos sintomas das
diversas síndromes clínicas podem distanciar o médico-assistente da causa do problema.

Fluxograma diagnóstico
Referências
1. Penner RM, et al. Diagnostic approach to abdominal pain in adults. UpToDate, out. 2013.
2. Towsend C, et al. Sabiston Tratado de Cirurgia: a base biológica da prática cirúrgica moderna. Elsevier Brasil;
2019.
Parte 2 | Capítulo 13

Hérnias da parede abdominal


Autores: Talita de Lima Aquino Nogueira Vilarinho, Erika Silva Spessirits e Raimundo Nonato
Araújo

1. INTRODUÇÃO
Hérnia como um estado patológico, em virtude do qual alguns órgãos da cavidade
abdominal podem sair dela, por meio de um ponto fraco da parede, natural ou adquirido,
sendo conservada a integridade do peritônio e da pele. Vemos, assim, que se excluem do
conceito de hérnia as saídas de vísceras por meio de rotura da pele e do peritônio, como
acontece nas eviscerações traumáticas ou pós-operatórias. Por outro lado, a definição
engloba as eventrações abdominais pós-operatórias ou hérnias incisionais, em que há
integridade da pele e formação de saco peritonial.

• Anatomia:
• ANATOMIA (de dentro para fora)
• Vísceras abdominais.
• Fáscia transversalis.
• Anel inguinal interno (ou profundo): início do canal inguinal.
• Canal femoral.
• Parede posterior:
• Músculo transverso.
• Músculo oblíquo interno.
• Parede anterior:
• Aponeurose do músculo oblíquo interno.
• Anel inguinal externo (ou superficial): final do canal inguinal.
• Conteúdo do canal inguinal
• Homem
• Funículo espermático (plexo pampiniforme, músculo cremaster, vasos
deferentes, conduto peritoneovaginal obliterado).

• Mulher:

• O ligamento redondo do útero.

Fonte: Sabiston ³

• Fatores de risco da hérnia inguinal:


Fatores de risco hérnia inguinal Fatores de risco hérnia inguinal
em adultos em crianças

Prematuridade Prematuridade
Sexo masculino Sexo masculino
História familiar História familiar
Criptorquia Criptorquia
• Diagnóstico

• Tipos de hérnia:
HÉRNIA TIPO FISIOPATOLOGIA CARACTERÍSTICAS

Adquirida:

enfraquecimento

da parede Medial aos vasos

posterior epigástricos.
Inguinal Direta
(no triângulo de Valsalva: protusão vai de

Hasselbach) por encontro a polpa do dedo.

tabagismo e idade

avançada.

Inguinal Indireta Hérnia inguinal mais


comum e a inguinal que

mais

encarcera. Lateral aos

vasos epigástricos

inferiores

Valsalva: protusão vai de

encontro a ponta do dedo.

Hérnia que mais encarcera


Mais comum em
Femoral tratamento com técnica de
mulheres.
McVay.

Criança: defeito

congênito

(alargamento do

anel umbilical com

provável

fechamento com 4-
Umbilical
6 anos de idade

adulto: defeito ao

lado do anel

umbilical e não no

anel umbilical

propriamente dito.

Dor desproporcional ao

Defeito na linha tamanho da hérnia.


Epigástrica
alba Geralmente contém

gordura pré-peritoneal.

Recomenda-se reparo

primario (simples) para


Em área de incisão
Incisional defeitos pequenos <2cm e
cirúrgica prévia
reparo com uso de tela nos

defeitos maiores (>2-3cm)

Spiegel Lateral ao músculo Geralmente identificada

reto abdominal. por método complementar


(US/TC)

• Hérnias especiais:
HÉRNIAS ESPECIAIS

Pinçamento lateral da borda antimesentérica de víscera

Richter abdominal, causando estrangulamento sem sinais de obstrução

intestinal. Mais comum nas hérnias femorais.

Littré Presença de divertículo de Meckel no saco herniário.

Amyand Presença do apêndice cecal no saco herniário.

Hérnia femoral em que o saco herniário se projeta pelo ligamento


Laugier
lacunar.

Hérnia femoral com descida do saco herniário por cima do


Cloquet
músculo pectíneo ao invés do canal femoral.

Parte da parede do saco herniário é composta por um vísceras


Deslizamento
(geralmente cólon ou bexiga).

Hérnia femoral apresentando como conteúdo o apêndice


Garengeot
vermiforme.

Pantaloon Consistência de hérnia direta e indireta no mesmo local.


Fonte: Utiyama²

• Tratamento das hérnias:

• Classificação de Nyhus
Classificação de NYLUS
I. Indireta com anel inguinal profundo normal (até 2cm)

Indireta com anel interno alargado, porém com parede posterior


II.
preservado

Defeito na parede posterior

a:direta
III.
b: indireta

c: femoral

Hérnia recidivada

a: direta

IV. b: indireta

c: femoral

d: Mista

Fonte: Utiyama²

• Tipos de cirurgia:
TÉCNICA

Hérnia inguinal
Marcy Ligadura alta do saco herniário somente
em crianças

Pontos
Shouldice Imbricação de quatro planos musculares
contínuos

Reparo tecidual
Sutura da fáscia transversalis ao
Bassini em três
ligamento inguinal
camadas

Sutura do tendão conjunto ao ligamento

Ligamento de de Cooper, a partir do tubérculo púbico,


McVay
Cooper lateralmente ao canal femoral, até os

vasos femorais

Tela com Tela de polipropileno suturada ao


Lichtenstein
tension free ligamento inguinal, no tendão conjunto
Fonte: Utiyama²

• Cirurgia videolaparoscópica
Técnica laparoscópica transabdominal (TAPP) versus Técnica laparoscópica totalmente
extraperitoneal (TEP)

COMPARAÇÃO ENTRE AS TÉCNICAS LAPAROSCÓPICAS TAAP


VERSUS TEP

Vantagens da TAPP Vantagens da TEP

Permite o rápido e fácil diagnóstico


Não viola a cavidade peritoneal
de hérnia contralateral

Permite Melhor reconhecimento dos


Menor risco de lesões viscerais
elementos anatômicos

Menor risco de obstrução intestinal

Menor risco de conversão e de hérnias nas incisões dos

trocartes

Realização mais suscetível quando


Menor risco de lesões
realizada com anestesia
vasculares
locorregional

Na maioria dos casos não precisa

fixar a prótese

• Principais complicações

Trombose do plexo
Orquite isquêmica com atrofia testicular
pampiniforme

Causa hiperestesia genitais e na face

Lesão do ramo genital do nervo interna da coxa e na bolsa escrotal

genitofemoral (grandes lábios na mulher

Tratamento analgesia

Fonte: Petroianu¹
Referências
1. Oliveira RG , Petroianu M, Miranda. Blackbook: Cirurgia - série BlackBook, Editora - 2008.
2. Utiyama E, Rassian S, Birolini D, Procedimentos Básicos em Cirurgia. 2. ed.
3. Sabiston . Tratado de Cirurgia. A base biológica da prática cirúrgica moderna. 19 ed. saunders. Elsevier.
Parte 2 | Capítulo 14

Afecções da vesícula e via biliar


Autores: Artur Guimarães Filho e Jose Alberto Guilherme Frota
Junior

1. Colelitíase
1.1. Introdução
Os cálculos da vesícula biliar são formados a partir da
precipitação dos solutos contidos na bile (colesterol, bilirrubina,
proteínas), podendo serem classificados em: cálculos de colesterol
e cálculos pigmentados. O primeiro é bem mais comum,
correspondendo a cerca de 70% dos cálculos no ocidente, sendo
compostos basicamente por colesterol e cálcio. Já os pigmentados
são formados da precipitação da bilirrubina produzida a partir do
metabolismo da hemoglobina e podem ser subdivididos em
castanhos e pretos. Os cálculos pretos são encontrados nos
pacientes cirróticos ou em condições hemolíticas. Já os marrons
são encontrados nos ductos biliares são comuns em populações
asiáticas e acredita-se que se desenvolvam a partir de infecção
bacteriana ou parasitária dos ductos biliares.
Os principais processos envolvidos na formação de cálculos são:
1. Aumento da secreção (colesterol e lipídios) na bile, o que gera
a formação de cristais;
2. Ação de agentes pronucleares, como glicoproteínas e
imunoglobulinas, que também levam à formação de cristais; e
3. Dismotilidade da vesícula biliar, que leva a estase, conferindo
tempo para a precipitação dos solutos. Tempo prolongado de jejum,
nutrição parenteral total, análogos de somatostatina e vagotomia
são condições que podem promover dismotilidade e formação de
cálculos.

1.2. História natural


A maioria dos pacientes são assintomáticos, sendo o
diagnóstico realizado durante exame ultrassonográfico solicitado
por sintomas de dor ou desconforto no abdome superior. Na
ultrassonografia observa-se imagens hiperecogênicas de diâmetros
variáveis no interior da vesícula biliar com sombra acústica
posterior. Os sintomas podem ser secundários à obstrução
temporária do ducto cístico. O mais comum é a cólica biliar, mais
intensa no hipocôndrio direito, região epigástrica e pode se irradiar
para a escápula, geralmente após alimentação, principalmente de
gorduras. Pode haver também náuseas, vômitos e distensão
abdominal. Não há icterícia, febre ou leucocitose. A colecistectomia
em pacientes assintomáticos geralmente não é indicada devido à
baixa taxa de complicações nesses pacientes e apenas 20-30% dos
pacientes assintomáticos desenvolvem sintomas em um período de
20 anos.
QUANDO REALIZAR COLECISTECTOMIA NO PACIENTE
ASSINTOMÁTICO

– Portadores de Anemia Hemolítica/Anemia Falciforme

– Vesícula em porcelana

– Presença de cálculo volumoso (> 2,5cm)

– Ducto biliar e Pancreático comum, Longo

– Cirurgia bariátrica

– Pacientes imunocomprometidos/Transplantados

1.3. Fatores de risco preditivos de calculos biliare


Uma série de condições favorece a formação da colelitíase: sexo
feminino, idade maior de 40 anos, obesidade (IMC > 45), parentesco
de primeiro grau com doença por calculo biliar, nutrição parenteral
total, perda rápida de peso, gravidez, determinados grupos étnicos
(nativos americanos, aborígenes, sul-americanos, escandinavos),
condições associadas (doença de Crohn, cirrose, fibrose cística),
medicamentos (estrogênios, octreotida, ceftriaxona).

1.4. Tratamento
Tratamento de escolha da colelitíase é a colecistectomia por
videolaparoscopia. Para pacientes com risco cirúrgico proibitivo,
pode-se tentar terapia clínica com ácido ursodesoxicólico,
dissolução de contato ou litotripsia extracorpórea por ondas de
choque, porém, todas com alto grau de recidiva. Durante as crises, o
uso de sintomáticos quase sempre está indicado.

2. Colecistite aguda
2.1. Introdução
Consiste na inflamação da vesícula, quase sempre secundária a
obstrução calculosa duradoura do ducto cístico e irritação da
mucosa local. A bile contida na vesícula biliar obstruída tende a
evoluir com proliferação bacteriana, o que agrava ainda mais a
inflamação local, podendo ocasionar sintomas sistêmicos. O quadro
pode complicar ainda mais com isquemia e necrose da vesícula,
culminando na colecistite gangrenosa. Se houver infecção por
germes anaeróbios, com formação gasosa, constitui a colecistite
enfisematosa. Pode ocorrer colecistite sem a presença de cálculos
na vesícula (colecistite alitiásica), comum em pacientes internados
em UTI.

2.2. Quadro clínico


SINTOMAS MAIS COMUNS

– Febre

– Dor/defesa em hipocôndrio direito

– Hipersensibilidade a palpação

– Sinal de Murphy (durante inspiração, há piora da dor a palpação em hipocôndrio D.)


– Anorexia e vômitos

– Irradiação para região interescapular/ombro direito

2.3. Diagnóstico
A anamnese e o exame físico muitas vezes são bastante
sugestivos do diagnóstico, porém, pode ser necessário o uso de
exames complementares para auxiliar no diagnóstico e descartar
outras doenças. Geralmente há leucocitose com desvio a esquerda
no hemograma. Porém, haver pacientes com colecistite e
leucograma normal, principalmente idosos ou imunossuprimidos.
Pode haver elevação das enzimas hepáticas secundária a
inflamação local em 20% a 25% dos casos. Geralmente não há
aumento das bilirrubinas, porém, no caso da síndrome de Mirizzi
(impactação do cálculo no infundíbulo da vesícula ocasionando
compressão extrínseca do ducto hepático/colédoco) as bilirrubinas
tendem a estar alteradas.
A ultrassonografia é o exame de escolha para confirmar presença
de cálculo na vesícula biliar com uma sensibilidade de 85% e
especificidade de 95%. Além disso, pode ser encontrado: aumento
das dimensões da vesícula, espessamento da parede da vesícula (>
5mm), presença de líquido pericolecístico, debris intravesicular e
sinal de Murphy ultrassonográfico. Em casos atípicos, pode se
utilizar a cintilografia, onde se constata a obstrução da vesícula
biliar. Tomografia pode ser utilizada, porém, é menos sensível para o
diagnóstico em comparação ao ultrassom.

2.4. Complicações
O quadro de colecistite aguda pode evoluir de várias formas,
desde um quadro leve, sem repercussões locais e sistêmicas, até
quadros fulminantes, com hipotensão, coma, insuficiência renal,
coagulopatia e plaquetopenia. As principais complicações da
colecistite aguda são: empiema, gangrena, perfuração, perfuração
bloqueada, perfuração livre, fistulização.
CONDUTA NA COLECISTITE AGUDA
Grau Definição Conduta

– Paciente sem disfunção orgânica – Colecistectomia


Leve videolaparoscópica
– Alterações inflamatórias leves – Antibiótico profilaxia

– Leucocitose > 18.000 – Colecistectomia


– Massa palpável em QSD videolaparoscópica / colecistectomia
– Duração dos sintomas > 72 h aberta
– Inflamação local – Antibióticos 5-7 dias
importante
Moderado – Colecistite com
gangrena
– Abscesso pericolecístico
– Abscesso hepático
– Peritonite biliar
– Colecistite enfisematosa

– Associada a disfunção orgânica p/ – Colecistectomia


sepse percutânea
Grave
– Comorbidade determinando alto
risco cirúrgico

– Colecistectomia
Obs.: Pacientes com risco cirúrgico elevado
percutânea

2.5. Tratamento
Inicialmente, o paciente deve permanecer em dieta zero,
necessitando de reposição hidroeletrolítica, além de
antibioticoterapia de amplo espectro. Também deve-se realizar
controle da dor e dos vômitos sintomáticos. A colecistectomia é o
tratamento definitivo, tanto por técnica aberta como por
videolaparoscopia, devendo ser realizada na fase inicial da doença,
durante a primeira semana. Em caso de quadros arrastados, o
tratamento não cirúrgico imediato pode ser uma opção, porém, o
paciente deve ser submetido a colecistectomia por volta da sexta
semana pós-crise. Em casos de inflamação intensa local, pode ser
optado por colecistectomia parcial (técnica de Thorek) para se evitar
possíveis lesões ao ducto colédoco. Em paciente com risco
cirúrgico proibitivo, pode ser realizada a drenagem percutânea da
vesícula, possibilitando a melhora dos sintomas e postergando a
colecistectomia em até seis meses.
3. Coledocolitíase
3.1. Introdução
É definido pela presença de cálculo no ducto biliar comum.
Geralmente é de causa secundária, ou seja, os cálculos se originam
na vesícula biliar e acabam migrando para o colédoco (95% dos
casos). Os cálculos da via biliar podem ser classificados como
primários se originarem no ducto biliar comum (cálculos marrons),
muito comum em pacientes asiáticos, podendo também estar ligado
a vários fatores: estenose biliar, papilite crônica, colangite de
repetição, disfunção do esfíncter de Oddi, colangiopatia pancreática.
A coledocolitíase está presente em 10% a 15% dos casos de
colelitíase.

3.2. Quadro clínico


A maioria dos pacientes é assintomático (85% a 90% dos casos),
podendo ser diagnosticado durante uma colangiografia
intraoperatória (durante uma colecistectomia). Quando o quadro não
é sintomático, pode ser caracterizada por dor em epigástrio ou
hipocôndrio direito, geralmente em cólica, podendo irradiar para o
ombro direito. Além disso, há icterícia, colúria e acolia fecal,
secundários a obstrução do colédoco. Pode haver ainda náuseas ou
vômitos associados aos quadros álgicos. Complicações comuns
associadas ao quadro consistem em pancreatite ou colangite.

3.3. Diagnóstico
As enzimas canaliculares como fosfatase alcalina (FA) e gama-
glutamil transferase (gama-GT) são as mais alteradas nessa
doença. Os níveis de bilirrubina total (BT) podem estar elevados (>
de 2 mg/dL), secundário a obstrução biliar. Ademais, se houver
complicações associadas, pode se esperar alterações no
leucograma ou nos níveis de amilase e lipase. A ultrassonografia é o
primeiro exame de imagem a ser realizado, permitindo a
visualização do cálculo no colédoco em 50-60% das vezes. A
dilatação das vias biliares com colédoco maior de 8mm é um sinal
indireto da presença do cálculo. A tomografia (TC) pode ser
realizada, porém, não visualiza com precisão os cálculos na via biliar,
identificando apenas dilatação da via biliar intra e extra-hepáticas. A
colangiorressonância (colângio-RM) é o exame de escolha para o
diagnóstico, pois apresenta alta sensibilidade (95%) e especificidade
(98%) estando indicada na maioria dos casos suspeitos. A
colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) ainda é o
padrão-ouro no diagnóstico de coledocolitíase, porém, só é realizada
naqueles pacientes com alto índice de suspeição devido ser um
método invasivo e passível de complicações. Entretanto, permite
tanto o diagnóstico como tratamento imediato (papilotomia sem ou
com exploração endoscópica das vias biliares e colocação de
prótese). A colangiografia intraoperatória (CIO) pode ser utilizada
nos pacientes com moderado risco de coledocolitíase, permitindo o
diagnóstico durante a colecistectomia em pacientes com fatores de
risco associados para presença de cálculos. A ultrassonografia
endoscópica (USE), apresenta sensibilidade e especificidade
semelhantes a colângio-RM e à CPRE, porém é um exame de alto
custo e de menor disponibilidade.
Tabela 1: Estratificação de risco para coledocolitíase
ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO

– Presença de coledocolitíase na USG


- Preditores muito forte – Clínica de colangite ascendente
– Bilirrubina total > 4mg/dl

– USG evidenciando ducto biliar comum dilatado (> 6mm)


- Preditores forte
– Bilirrubina total entre 1,8 e 4mg/dl

– Hepatograma alterado (exceto bilirrubinas)


- Preditores moderados – Idade > 55 anos
– Clínica de pancreatite aguda biliar

1 preditor muito forte ou


Alto Risco Realizar CPRE e/ou USG endoscópico
2 preditores fortes

Realizar colângio-RM ou colangiografia


Médio Risco 1 preditor forte/moderado
intraoperatória

Baixo Risco Nenhum preditor Não necessita avaliação adicional


3.4. Conduta e tratamento
O tratamento da coledocolitíase deve ser individualizado, pois,
dependendo de cada caso, pode ser executado por modalidades
terapêuticas diferentes ou combinadas. Além disso, deve-se levar
em consideração a disponibilidade dos equipamentos e capacidade
técnica dos profissionais. A CPRE com esfincterotomia endoscópica
e extração dos cálculos é eficaz no tratamento da colelitíase e deve
ser o método de escolha nos pacientes com colecistectomia previa
com exames e clinica sugestivos de litíase. Está ainda indicado,
também no pré-operatório de colecistectomia quando há a
concomitância de coledocolitíase. Caso a CPRE não seja realizada
no pré-operatório, pode-se optar por exploração da via biliar, esta
podendo ser por via laparoscópica ou por via aberta. A
esfincteroplastia transduodenal (EPTD) é realizada quando há
impossibilidade de retirar os cálculos impactados na via biliar
quando não há disponibilidade da CPRE. Em situação semelhante,
porém, com dilatação da via biliar, pode ser necessário
descompressão da via biliar através de uma anastomose
biliodigestiva (colédoco enteroanastomose). Pacientes com alta
probabilidade de cálculos na via biliar (história sugestiva, bilirrubina
total acima de 2mg/dL, e US com dilatação da via biliar), a
realização de colângio-RM ou colângio intraoperatória está indicada
e evita a CPRE, uma vez que metade desses pacientes não
apresentam mais cálculos. Quando o paciente apresenta
probabilidade moderada de cálculos como história de icterícia
previa, colúria, acolia ou pancreatite sem alterações clínicas atuais
ou com exames de laboratório e de imagens normais está indicado
a colangiografia transoperatória (CIO).

4. Colangite aguda
4.1. Introdução
É
É definida como infecção bacteriana aguda e ascendente da
árvore biliar causada por uma obstrução. A causa mais comum são
os cálculos, no entanto, pode se manifestar a partir de qualquer tipo
de obstrução, como as neoplasias. Para haver desenvolvimento de
colangite, dois fatores são necessários: proliferação bacteriana e
obstrução de fluxo, com aumento da pressão intraluminal. Os
patógenos mais comuns são a Klebsiella, E. Coli, Enterobacter,
Pseudomonas e Citrobacter spp.

4.2. Quadro clínico


A colangite aguda é caracterizada pela tríade de Charcot, a qual
inclui icterícia, febre e dor no quadrante superior direito, geralmente
não associada a sensibilidade abdominal. Contudo, menos de 50%
dos pacientes apresentam clínica com as três manifestações
simultâneas.
Outra forma de apresentação é a pêntade de Reynolds, presente
quando a infecção começa a se manifestar com choque, sendo
adicionados outros dois achados à tríade de Charcot, a alteração do
estado mental e a hipotensão.

4.3. Diagnóstico
Além da clínica sugestiva e do exame físico, podemos solicitar
como exames laboratoriais a fosfatase alcalina e as transaminases,
que estarão com níveis significativamente elevados, indicando lesão
hepatocelular e processo infeccioso. O primeiro exame de imagem
que deve ser solicitado é a ultrassonografia, que evidencia dilatação
da árvore biliar. A colangiografia por CPRE ou PTC é indispensável,
pois é meio de diagnóstico e tratamento por meio da identificação
da localização e da causa da obstrução, drenagem da árvore biliar,
possibilidade de colher amostra de culturas ou realizar biópsia se
necessário.
CRITÉRIOS DE TOKYO – 2018

A1: Febre (>38°c) ou calafrios


Inflamação
A2: Leucócitos < 4000 ou > 10000
Sistêmica
A3: PCR > 1mg/dl

Colestase B1: Bilirrubina > 2mg/dl


B2: Alteração de função hepática (FA, GGT, TGO ou TGP)
C1: Dilatação de via biliar
Imagem
C2: Evidência de etiologia na imagem ( estenose, cálculo, stent..)

Diagnóstico Suspeito 1 item A + 1 item B/C

Diagnóstico Definitivo 1 tem A + 1 item B + 1 item C

4.4. Tratamento
O tratamento da colangite aguda é feito com hidratação e
antibioticoterapia precoce pelo alto risco de evolução para sepse.
Entre os patógenos envolvidos encontram-se, Enterobacteriaceae,
Enterococcus e anaeróbios. A associação de ceftriaxona +
metronidazol ou ampicilina + gentamicina + metronidazol oferecem
boa cobertura e resultado terapêutico quando utilizados. Para os
pacientes que não respondem ao tratamento clínico, é necessário
realizar descompressão emergencial da árvore biliar, primeiramente
por meios endoscópicos, e, se indisponíveis, por meio da realização
da exploração do ducto biliar comum e o posicionamento de um
tubo em T. A intervenção cirúrgica deve ser protelada até a
estabilização do paciente, controle da colangite e diagnóstico
confirmado, devido à alta morbidade e mortalidade. A
colecistectomia deve ser realizada ainda no mesmo internamento
após estabilização do quadro.

5. Câncer da vesícula biliar


5.1. Introdução
O adenocarcinoma da vesícula biliar é uma doença agressiva
com prognóstico reservado. Geralmente os sintomas são
inespecíficos, dificultando o diagnóstico precoce. Acomete
geralmente pacientes com faixa etária entre 60 a 70 anos e é 2-3
vezes mais comum em mulheres. Geralmente os pacientes são
assintomáticos, principalmente nos estágios iniciais. Cerca de 80%
dos tumores são adenocarcinoma tipo infiltrativo. A maior parte dos
casos acomete a região fúndica da vesícula biliar.

5.2. Quadro clínico


O paciente pode se apresentar com sintomas semelhantes a uma
colecistite, dor epigástrica ou no hipocôndrio D, náuseas e vômitos,
podendo ser acompanhado de anorexia, saciedade precoce ou
plenitude. Perda de peso, icterícia (51% dos casos) e massa
abdominal indicam sinais de doença maligna avançada. A icterícia é
do tipo obstrutiva e está relacionada à invasão tumoral das vias
biliares. Outros sinais de doença avançada incluem ascite,
hepatomegalia e vesícula palpável.

5.3. Fatores de risco


Os fatores de risco para adenocarcinoma da vesícula biliar estão
relacionados à inflamação crônica da vesícula biliar. A litíase da
vesícula biliar é o principal fator e coexiste em cerca de 70% a 95%
dos casos. Outros fatores relatados na literatura incluem: cálculos
biliares > de 3 cm, sexo feminino, idade > 40 anos, obesidade,
vesícula em porcelana, pólipo da vesícula biliar > 1cm, metaplasia
intestinal e pilórica do epitélio da vesícula biliar, doença cística
congênita da via biliar, colangite esclerosante primaria, alterações
anatômicas da junção biliopancreáticas, infecção da bile
(Salmonella, Helicobacter), medicamentos (metildopa,
anticoncepcionais orais e isoniazida) e exposição a carcinógenos.

5.4. Diagnóstico
O primeiro exame de imagem solicitado, geralmente é a
ultrassonografia, com sensibilidade de de 50% a 80%, alcançando
identificação de quase 90% nos casos avançados. Os achados mais
importantes são: espessamento da parede da vesícula sem sinais
de colecistite aguda, lesão irregular no espaço sub-hepático, massa
heterogênea no lúmen da vesícula, espessamento assimétrico do
parede da vesícula ou pólipo > 10mm. A tomografia e a ressonância-
NM apresentam importância no estadiamento, principalmente para
demonstrar metástases regionais e no planejamento cirúrgico. A
colangiorressonância, apresenta uma imagem mais definida da
árvore biliar. A CPRE é útil nos casos de icterícia obstrutiva, pois
pode precisar o local acometido e utilizar próteses como tratamento
paliativo. O ultrassom endoscópico apresenta maior sensibilidade
na detecção de lesões menores de 2cm em relação a TC e
ressonância-NM e, ainda, fornece valiosa informação acerca dos
linfonodos regionais com possibilidade de coleta de citologia para
avaliação.

5.5. Estadiamento
TUMOR PRIMÁRIO

Tx Não pode ser avaliado

T0 Sem evidência de tumor primário

Tis Carcinoma in situ

A: Tumor invade lâmina própria


T1
B: Tumor invade camada muscular

Tumor invade tecido conjuntivo perimuscular, sem extensão além da serosa ou


T2
intra-hepático

Tumor que perfura a serosa (peritônio visceral) e/ou que invade diretamente o
T3
fígado e/ou outro órgão ou estrutura adjacente

Tumor que invade a veia porta principal ou artéria hepática ou que invade dois ou
T4
mais órgãos ou estruturas extra-hepáticas.

LINFONODOS REGIONAIS

Nx Linfonodos regionais não podem ser avaliados

N0 Ausência de linfonodos regionais

Metástase em linfonodos ao longo do ducto cístico, do ducto biliar comum, da


N1
artéria hepática e/ou da veia porta

Metástase para linfonodos periaórticos, pericavais, da artéria mesentérica


N2
superior e/ou do tronco celíaco

METÁSTASE A DISTÂNCIA
M0 Ausência de metástase a distância

M1 Metástase a distância

ESTÁDIO ANATÔMICO E GRUPOS PROGNÓSTICOS

Estádio 0 Tis N0 M0

Estádio 1 T1 N0 M0

Estádio 2 T2 N0 M0

A: T3 N0 M0
Estádio 3 B: T4 N0 M0
T1-3 N1 M0

A: T4 N? M0
Estádio 4 B: T? N2 M0
T? N? M1

5.6. Tratamento
A taxa global de sobrevida em 5 anos é de 3% a 13%. Cerca de
80% dos pacientes morrem dentro do primeiro a partir do
diagnóstico. A quimioterapia e a radioterapia não causam
modificação nas taxas de sobrevida. Apenas 10% a 30% dos
pacientes são considerados candidatos a ressecção quando
diagnosticados. A ressecção da vesícula biliar ainda é o tratamento
com potencial de cura, com a abordagem convencional sendo a de
escolha devido o potencial maior de disseminação da doença caso a
vesícula seja perfurada. Dependendo do estadiamento, é necessário
realizar uma colecistectomia alargada, com a retirada das cadeias
linfonodais pericoledocianos, periportais, hepatoduodenais, celíacos
direitos e pancreaticoduodenais posteriores, além do ducto hepático
ou do parênquima hepático a depender do grau e da localização da
invasão. Pacientes já colecistectomizados podem necessitar de
outros procedimentos cirúrgicos para ampliação de margens. Para
pacientes com doença irressecável, o tratamento paliativo deve ser
realizado, com descompressão da via biliar por stents, tratamento
da dor e desobstrução duodenal. Em casos de irressecabilidade
(envolvimento da veia porta ou hepático extenso) ou incurabilidade
(metástase hepática ou peritoneal), biópsia percutânea deve ser
realizada para diagnóstico tecidual.

6. Câncer do ducto biliar


6.1. Introdução
O colangiocarcinoma ou adenocarcinoma do epitélio biliar é uma
patologia pouco comum, porém, com prognóstico bem reservado.
Pode ser dividido em três subtipos baseado na localização na via
biliar. Os mais comuns são os do terço proximal (peri-hilares)
também chamada de tumor de Klatskin, correspondendo à cerca de
60% dos colangiocarcinomas. As lesões intra-hepáticas são
responsáveis por cerca de 30% dos casos e aqueles do terço distal,
denominados de periampulares, representam cerca de 10% dos
casos. A inflamação crônica da árvore biliar, com proliferação celular
compensatória parece ser o fator de risco mais importante.
Alterações na estrutura do colédoco também podem favorecer esta
inflamação crônica, como o caso das estenoses ou dos cistos de
colédoco. A colangite esclerosante primaria oferece risco de até
30% a mais do que a população geral. Outros fatores também são
considerados risco para esta neoplasia: hepatolitíase, cirrose
hepática, tabagismo, obesidade, infecções pelos vírus da hepatite B
e vírus da hepatite C.

6.2. Quadro clínico


Depende do local de origem e geralmente são decorrentes à
obstrução da via biliar. A icterícia associada à ausência de dor é um
sintoma comum. No caso do tumor distal, a icterícia pode ser
flutuante. A vesícula biliar pode ser palpável (sinal de Courvoisier-
Terrier). Além disso, hiperbilirrubinemia direta, prurido, colúria, acolia
fecal e esteatorreia podem estar relacionados. Dor local, perda de
peso, anorexia e mal-estar costumam estar associados a doença
avançada.
6.3. Diagnóstico
Há alterações nos níveis de bilirrubina, assim como das enzimas
canaliculares e marcadores de função hepática. Marcadores
tumorais como CEA e o CA19-9, estão presentes em 40% e 85%
respectivamente. A ultrassonografia é o primeiro exame de imagem
a ser realizado, evidenciando dilatação ductal intra-hepática nos
tumores proximais e dilatação do hepatocolédoco, vias biliares intra-
hepáticas nos tumores distais. Nas lesões distais a vesícula biliar
tende a estar distendida. Já em lesões proximais, a vesícula está
descomprimida. A tomografia é útil no estadiamento da doença,
podendo também definir critérios de irressecabilidade,
especialmente a angiotomografia possui destaque na detecção do
comprometimento vascular. CPRE permite coletar material para
exame citológico da via biliar, contudo oferece risco de infecção
local adicional. A ultrassonografia endoscópica, pode auxiliar em
casos de diagnóstico mais difícil sendo útil para complementar o
estadiamento. A colângio–RM oferece boa definição da arvore biliar
podendo esclarecer o local da obstrução. A citologia negativa não
exclui malignidade, já que a biopsia local é de difícil realização e
pouco confiável, sendo interessante a realização em casos que o
tratamento cirúrgico está contraindicado.

6.4.Estadiamento
Estadiamento do câncer do ducto biliar intra-hepático
TUMOR PRIMÁRIO (T)

Tx O tumor primário não pode ser avaliado

T0 Sem evidências de tumor primário

Tis Carcinoma in situ (tumor intraductal)

T1 Tumor solitário sem invasão vascular

A: Tumor solitário com invasão vascular


T2
B: Tumores múltiplos, com ou sem invasão vascular

Tumor perfurando o peritônio visceral ou envolvendo estruturas extra-


T3
hepáticas por extensão direta

T4 Tumor com invasão periductal


LINFONODOS REGIONAIS (N)

Nx Linfonodos regionais não podem ser avaliados

N0 Ausência de metástase nos linfonodos regionais

N1 Presença de metástase em linfonodos regionais

Metástases a distância (M)

M0 Ausência de metástases a distância

M1 Presença de metástases a distância

ESTÁDIO ANATÔMICO E GRUPOS PROGNÓSTICOS

Estádio 0 Tis N0 M0

Estádio I T1 N0 M0

Estádio II T2 N0 MO

Estádio III T3 N0 M0

T4 N0 M0
Estádio IV A
Qualquer T N1 M0

Estádio IV B Qualquer T Qualquer N M1

Estadiamento para câncer do ducto biliar peri-hilar


TUMOR PRIMÁRIO (T)

Tx Tumor primário não pode ser avaliado

T0 Sem evidências de tumor primário

Tis Carcinoma in situ

Tumor confinado ao ducto biliar, sem extensão além da camada muscular ou


T1
tecido fibroso

A: Tumor invadindo além de parede do ducto biliar para o tecido adiposo


T2 circunjacente
B: Tumor invade o parênquima hepático adjacente

T3 Tumor invade ramos unilaterais da veia porta ou artéria hepática

Tumor invade veia porta principal ou seus ramos bilateralmente; ou a artéria


hepática comum; ou os ductos biliares secundários bilateralmente; ou ductos
T4
biliares secundários unilateralmente com envolvimento contralateral de veia
porta ou artéria hepática
LINFONODOS REGIONAIS (N)

Nx Linfonodos regionais não podem ser avaliados

N0 Ausência de metástase nos linfonodos regionais

Metástase para linfonodos regionais (incluindo linfonodos ao longo do ducto


N1
cístico, ducto biliar comum, artéria hepática e veia porta)

Metástase para linfonodos periaórticos, pericavais, artéria mesentérica superior,


N2
e/ou artéria celíaca

METÁSTASE A DISTÂNCIA (M)

M0 Ausência de metástase a distância

M1 Presença de metástase a distância

ESTÁDIO ANATÔMICO E GRUPOS PROGNÓSTICOS

Estádio 0 Tis N0 M0

Estádio I T1 N0 M0

Estádio II T2 a-b N0 MO

Estádio III A T3 N0 M0

Estádio III B T1-3 N1 M0

T4 N0-1 M0
Estádio IV A
Qualquer T N2 M0

Estádio IV B Qualquer T Qualquer N M1

Estadiamento para câncer do ducto biliar distal


TUMOR PRIMÁRIO (T)

Tx Tumor primário não pode ser avaliado

T0 Sem evidências de tumor primário

Tis Carcinoma in situ

T1 Tumor histologicamente confinado ao ducto biliar

T2 Tumor invade além de parede do ducto biliar

Tumor invade a vesícula, pâncreas, duodeno, ou outros órgãos adjacentes sem


T3
envolver o tronco celíaco ou artéria mesentérica superior

T4 Tumor invade o tronco celíaco ou artéria mesentérica superior


LINFONODOS REGIONAIS (N)

N0 Ausência de metástase nos linfonodos regionais

N1 Presença de metástase em linfonodos regionais

Metástase a distância (M)

M0 Ausência de metástase a distância

M1 Presença de metástase a distância

ESTÁDIO ANATÔMICO E GRUPOS PROGNÓSTICOS

Estádio 0 Tis N0 M0

Estádio Ia T1 N0 M0

Estádio Ib T2 N0 M0

Estádio IIa T3 N0 M0

T1 N1 M0

Estádio IIb T2 N1 M0

T3 N1 M0

Estádio III T3 N0 M0

Estádio III T4 Qualquer N M0

Estádio IV Qualquer t Qualquer N M1

6.5. Tratamento
O tratamento cirúrgico com ressecção da lesão com margens de
segurança livres de tumor é a única modalidade terapêutica com
potencial de cura para os colangiocarcinomas. Nos tumores
proximais, deve ser realizado a retirada em bloco do ducto colédoco
com parênquima hepático. Os tumores distais são tratados com
duodenopancreatectomia cefálica, devendo ser realizado
congelação para determinar área livre de tumor na via biliar. Quando
o tumor for irressecável há indicação de descompressão da via biliar
para melhora da qualidade de vida e alívio da icterícia. A
desobstrução pode ser realizada por via percutânea, por stent ou por
papilotomia ou ainda por cirurgia com anastomose biliodigestiva. A
classificação de Bismuth-Corlette demonstra a extensão do
envolvimento dos ductos biliares e extensão da ressecção a ser
realizada nos tumores hilares. A classificação da American Joint
Committee Cancer tem demonstrado ser mais útil na definição da
conduta a ser adotada. Quimioterapia e radioterapia geralmente não
são utilizadas pois não mostraram grandes benefícios. Metástase a
distância ou doença localmente avançada constituem critérios de
irressecabilidade.

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Parte 2 | Capítulo 15

Neoplasias colônicas malignas


Autores: Francisco Wendel de Sousa Arruda e Caio Plácido Costa
Arcanjo

1. INTRODUÇÃO
Os novos casos de câncer colorretal estimado para o Brasil no
ano de 2010 é de 13.310 casos em homens e de 14.800 em
mulheres. Esses valores correspondem a um risco estimado de 14 e
15 casos novos a cada 100 mil homens e mulheres,
respectivamente. Esses tumores acometem o cólon esquerdo em
77,8% dos casos, destacando-se o cólon sigmoide (32,6%) e da sua
junção com o reto (29,0%). Mais de 80% dos pacientes têm mais de
50 anos, tendo como idade média 60,6 anos.
O subtipo mais frequente é o adenocarcinoma, presente em 95%
dos casos, cujo risco de desenvolvimento é ainda mais elevado nas
síndromes de pólipos hereditários. Contudo, cerca de 90% desses
tumores originam-se esporadicamente de adenomas polipoides.
Vários estudos vêm comprovando a sequência adenoma-carcinoma
(Mucosa Normal Epitélio Hiperplásico Adenoma Câncer) na
carcinogênese colônica. Existe uma interação complexa de fatores
genéticos (genes: APC, K-RAS e p-53) e ambientais, como dieta, que
determinam o surgimento desse tumor. O fígado e os linfonodos
regionais são os locais mais comuns de disseminação, sendo rara a
disseminação para outros órgãos antes do acometimento hepático.

2. FATORES DE RISCO
• Idade superior a 50 anos, aumentando sua incidência a cada
década a partir dessa idade.

• Raça negra.
• Presença de doença anorretal benigna.
• Dieta rica em calorias, gordura animal e carboidratos
refinados.

• Diabetes: maior incidência e pior prognóstico.


• Doença inflamatória intestinal.
• Obesidade e sedentarismo.
• Tabagismo e etilismo.
• História familiar de câncer de colorretal.
• Pólipos adenomatosos.
• Síndromes hereditárias (HNPCC e PAF).
3. FATORES DE PROTEÇÃO
• A triagem proporciona a detecção precoce, melhorando o
prognóstico.

• Atividade física.
• Ingestão de folato, cálcio e vitamina D.

• Aspirina.

• Terapia hormonal pós-menopausa.

4. SÍNDROMES HEREDITÁRIAS
A.Polipose Adenomatosa Familiar (PAF):

• Doença autossômica dominante caracterizada pelo


surgimento de pólipos por todo o cólon e reto.

• Relacionada com a depleção do braço longo do


cromossomo 5 (incluindo o gene APC).

• Os pacientes com PAF desenvolvem adenocarcinoma


intestinal por volta dos 40 anos.

• É indicada cirurgia profilática para todos os pacientes.

B.Câncer de cólon hereditário não polipoide (Hnpcc ou Síndrome de


Lynch):

• Critérios diagnósticos:
i. Três ou mais parentes com CCR.
ii. Pelo menos um destes de primeiro grau.
iii. Um com menos de 50 anos.
iv. Tendo pelo menos duas gerações acometidas.
v. Exclusão de PAF.

• Não segue a sequência adenoma-carcinoma.


• Lynch II: predisposição para CCR e tumores ginecológicos.

C.Outras síndromes:

• Gardner: PAF associada a tumores de tecidos moles e


ossos, hipertrofia do epitélio pigmentar da retina, cânceres
ampulares e tumores desmoides do mesentério.

• Turcot: PAF associada a tumores malignos do sistema


nervoso central.

5. TRIAGEM
• População geral, sem fatores de risco: a partir dos 50 anos.

• Pessoas negras e de descendência africana devem iniciar a


triagem a partir dos 45 anos de idade.

• Se presença de doença anorretal benigna, deve ser


rastreado a partir dos 45 anos de idade

• A American Cancer Society recomenda: pesquisa de sangue


oculto nas fezes + sigmoidoscopia flexível a cada 5 anos ou
colonoscopia a cada 10 anos.

• Em famílias com síndrome de Lynch: colonoscopia a cada 2


anos a partir dos 20 anos e anualmente após os 40 anos.

A. Pesquisa de sangue oculto nas fezes:

• Teste negativo tem valor limitado.


• Teste positivo determina a realização de uma colonoscopia.

• Alto índice de falsos negativos e falsos positivos.

• Deve ser feito anualmente ou a cada 5 anos juntamente com


a sigmoidoscopia.

B. Sigmoidoscopia flexível:

• Atinge a flexura esplênica dos cólons, onde localizam-se


cerca de 70% das lesões.

• Detecção de um pólipo, torna obrigatória a realização de


uma colonoscopia.

• Deve ser realizada a cada 5 anos.

C. Colonoscopia:

• Exame padrão-ouro para a detecção tanto de CCR, quanto


de pólipos.

• Propicia a terapêutica de pólipos e permite a coleta de


material.

• Método de alto custo e com possíveis complicações


(distensão abdominal, sangramento e até perfuração cólica).

• Deve ser realizada a cada 10 anos.

D. Enema opaco:
• Reservado para os casos em que a colonoscopia não pode
ser realizada.

• Revela aspecto de “maçã mordida”, característico de CCR.

E. Podem se tornar importantes no futuro:

• Colonoscopia virtual.

• Teste de DNA fecal.

6. O QUE UM CIRURGIÃO DEVE


SABER?
6.1. Manifestações clínicas
• Dor abdominal.
• Massa abdominal palpável.
• Sangramento retal.
• Emagrecimento.
• Facilmente confundido com fenômenos dispépticos.
• Assintomático quando precoce.
• A sintomatologia depende da localização do tumor:
A. Cólon direito:
• Lesões costumam cursar com ulceração.

• Melena.

• Anemia ferropriva.

• Raramente causam sintomas obstrutivos.

• Sangramento intermitente, podendo ter teste de sangue


oculto nas fezes negativo.

B. Cólon esquerdo:

• Sintomas obstrutivos.

• Alteração do hábito intestinal.

• Perfuração.

Tabela 1: Sintomatologia e exame físico de 490 portadores de


câncer colônico
Sintomas e exame físico N %
Acima de 50% dos pacientes

Alteração de hábito intestinal 346 70,6%

Cólica abdominal 292 59,6%

Sangue nas fezes 287 58,6%

Alteração da matéria fecal 272 55,5%

Abaixo de 50% dos pacientes

Muco nas fezes 206 42,0%

Dor no baixo-ventre 57 17,7%

Anemia 74 15,1%

Queda do estado geral 71 14,5%

Tumor abdominal palpável 48 9,8%


Obstrução intestinal 42 8,6%

Fístulas colônicas 10 2,0%

Perfuração colônica 8 1,6%

Fonte: Cruz GMG, Santana JL, Santana SKAA, Constantino JRM,


Chamone BC, Ferreira RMRS, et al.1

6.2. Diagnóstico
A. Anamnese:

• Geralmente pacientes acima de 50 anos.

• Sangramento retal.

• Anemia .

• Emagrecimento.

• Alteração do hábito intestinal.

• Dor abdominal.

• História familiar.

• Fatores de risco.

B. Exame físico:

• Todos os pacientes com o quadro descrito acima devem ser


submetidos ao toque retal, mesmo os com menos de 50
anos.
• Toque retal: evidência de lesão ulcerada vegetante próximo
à mucosa normal.

C. Exames complementares:

• Biópsia por meio de retossigmoidoscopia flexível ou


colonoscopia.

• Hemograma completo: avaliar presença de anemia


ferropriva.

• Dosagem de enzimas hepáticas: avaliar possíveis


metástases.

• O antígeno carcinoembrionário (CEA) não tem valor


diagnóstico, mas pode ser usado no prognóstico e no
controle de recidivas.

6.3. Estadiamento
O sistema para estadiamento mais utilizado para tumores de
cólon é o TNM. Para estadiamento preciso, é necessária ressecção
cirúrgica para estudo.

• Estágio 0 (Tis N0 M0): Lesão intraepitelial ou com invasão


da lâmina própria.

• Estágio I (T1-2 N0 M0): Invasão até a camada muscular.


Sem envolvimento de linfonodos regionais.

• Estágio II (T3-4 N0 M0): Invade além da muscular própria.


Sem envolvimento de linfonodos regionais.
• Estágio III (Tx N1-2 M0): Presença de metástase em
lifonodos regionais.

• Estágio IV (Tx Nx M1): Apresenta metástase a distância.

6.4. Tratamento
• O melhor tratamento para neoplasias colônicas é a
ressecção cirúrgica.

• A proposta cirúrgica na maioria das vezes é curativa, mas a


depender o avanço da doença, pode haver intenção paliativa.

• O objetivo da cirurgia é a remoção do câncer primário com


margens adequadas e linfadenectomia regional.

• A extensão da ressecção é determinada principalmente pela


localização do tumor.

• A quimioterapia pode trazer benefícios para alguns


pacientes com CCR.

A.Tratamento cirúrgico:

• Tumores de ceco e cólon ascendente: Colectomia direita


(ressecção do segmento suprido pelo ramo direito da artéria
cólica média).

• Tumores de cólon transverso: Colectomia direita extensa


(ressecção do segmento suprido pela artéria cólica média).

• Tumores de cólon descendente: Colectomia esquerda


(ressecção do segmento suprido pelo ramo esquerdo da
artéria cólica média e pela artéria cólica esquerda).

• Tumores de sigmoide: retossigmoidectomia anterior


(ressecção do segmento irrigado pela artéria mesentérica
inferior).

• Metástases hepáticas ou pulmonares podem ser passíveis


de ressecção.

B. Tratamento quimioterápico:

• 5-fluorouracil + leucovorin é o mais utilizado

• FOLFOX: 5-fluorouracil + leucovorin + oxaliplatina.

• FOLFIRI: 5-fluorouracil + leucovorin + irinotecano

• FOLFOX e FOLFIRI melhoram a taxa de resposta e sobrevida


dos pacientes com metástase.

• Terapia-alvo com anticorpos monoclonais, como cetuximab


e bevacizumabe, é eficaz em pacientes com neoplasia
avançada.

C. Resumo das indicações terapêuticas por estágio tumoral:

• Estágio I: ressecção tumoral.

• Estágio II: ressecção tumoral + terapia adjuvante com 5-FU


(adjuvância somente em pacientes com pelo menos um
indicativo de mal prognóstico: T4, células pouco
diferenciadas, perfuração ou < 12 para amostra.

• Estágio III: ressecção tumoral + terapia adjuvante.


• Estágio IV: quimioterapia pré-operatória + ressecção tumoral
(dependendo do local e da extensão das metástases) +
ressecção dos focos metastáticos hepáticos e pulmonares
passíveis de tratamento cirúrgico + quimioterapia pós-
operatória.

6.5. Prognóstico
ESTÁGIO SOBREVIDA MÉDIA

I Pacientes submetidos apenas à ressecção têm sobrevida de 90%.

Pacientes submetidos apenas à ressecção têm sobrevida média de


II
75%.

Pacientes tratados apenas com ressecção têm sobrevida de


III aproximadamente 50%, alcançando 78% de sobrevida em 3 anos se for
adicionada terapia adjuvante.

IV Apresentam sobrevida de apenas 5%.

6.6. Seguimento pós-operatório


1. Colonoscopia 1 ano após cirurgia, e depois, a cada 5 anos.
2. No primeiro ano após a cirurgia: avaliação do paciente a cada
3 meses (exame físico, exames de imagem e dosagem de CEA).
3. No segundo ano após a cirurgia: avaliação do paciente a cada
4 meses (exame físico, exames de imagem e dosagem de CEA).
4. Após 2 anos e antes dos 5: avaliação a cada 6 meses (exame
físico, exames de imagem e dosagem de CEA).
5. Após 5 anos: avaliações anuais.

REFERÊNCIAS
1. Cruz GMG, Santana JL, Santana SKAA, Constantino JRM, Chamone BC, Ferreira RMRS,
et al. Câncer Colônico – Epidemiologia, Diagnóstico, Estadiamento e Gradação
Tumoral de 490 Pacientes. Rev bras Coloproct, 2007; 27(2): 139-153.
2. Courtney M, et al. Sabiston: Textbook of Surgery: The Biological Bases of Mordern
Surgical Practice. 19th ed. Elsevier; 2015.
3. Regadas FSP et al. Fundamentos da Cirurgia Digestiva. 1. ed. Edições UFC; 2010.
4. Meyerhardt J, Saunders M. Colorectal Cancer. Dana-Farber Cancer Institute. Elsevier;
2007.
5. America Cancer Society. Cancer facts and figures. Atlanta; 2007.
Parte 2 | Capítulo 16

Neoplasias gástricas benignas e malignas


Autores: Geterson Bezerra Moreira e Rhuce Pedrosa Carvalho

1. INTRODUÇÃO
As neoplasias gástricas podem ser divididas em benignas e malignas. As benignas são
sinalizadas, na maioria das vezes, por pólipos, que são encontrados incidentalmente na
endoscopia digestiva alta (EDA). Eles são achados em 6% dos procedimentos, pois a
maioria são assintomáticos.
As neoplasias malignas gástricas são consideradas como a mais comuns em alguns
países. No Japão é o câncer mais comum. É considerada a causa de maior mortalidade em
oncologia. Um dos motivos por essa alta taxa na mortalidade é pelo diagnóstico tardio,
pois essa patologia é assintomática, evoluindo com sintomas sutis. No Brasil, está entre as
5 causas de câncer, retirando o câncer de pele não melanoma. De acordo com a
epidemiologia, é mais comum em homens na 5º a 7º década. O tipo mais comum é o
adenocarcinoma gástrico com 95% dos casos.

2. NEOPLASIAS BENIGNAS
Alguns dos fatores de risco dos pólipos gástricos são H. pylori, gastrite atrófica,
inibidores da bomba de prótons e síndromes familiares. A abordagem inicial deve abranger
a avaliação histológica do pólipo e da mucosa circundante. A polipectomia deve ser
realizada em todos os pólipos com características neoplásicas ou com diâmetro maior ou
igual a 1 cm. Quando há múltiplos pólipos, deve ser escolhido o maior para ressecção.
Além disso, colher biópsia dos outros pólipos. Para estudo da mucosa, no Brasil, é colhido
de 5 amostras, duas em antro, uma em incisura angular e duas em corpo gástrico. O
objetivo desse estudo é avaliar presença de displasia e de H. pylori.
De acordo com essa avaliação, os pólipos serão divididos em:

1. Pólipos hiperplásicos: contabilizam 75% dos pólipos em área comum com H.


pylori. Advém de condições inflamatórias crônicas, como gastrite atrófica, anemia
perniciosa, local com gastroenterostomias, úlceras e erosões. Diagnosticados
incidentalmente, pois não manifestam sintomas, mas raramente ocorre
sangramento oculto ou obstrução intermitente (quando pedunculados em antro).
Suas características são lisos, variando de 0,5 a 1,5 cm, e são encontrados no
corpo, cárdia, fundo e antro. Seu potencial maligno é aumentado em pólipos > 1
cm e pedunculados. Então, normalmente, em pólipos medindo > 0,5 cm já são
ressecados, com estudo da mucosa para ver o grau de displasia. Se detectado H.
pylori, tratar para erradicação. Para controle dos pólipos e da infecção, realiza-se
EDA com 3 a 6 meses após o tratamento. Se o paciente for de alto risco de câncer
gástrico (obtiver em biópsia atrofia difusa com metaplasia intestinal ou tiver
história familiar), é assistido com endoscopias em intervalos regulares de um a
dois anos.
2. Pólipos de glândulas fúndicas: um dos fatores ligados a eles é o uso de inibidores
de bomba de prótons (IBP). Sua etiologia é considerada esporádica, mas ocorre
associação com síndromes de polipose, como polipose adenomatosa familiar
(PAF), adenocarcinoma gástrico, polipose proximal do estômago (GAPPS) e
polipose associada a MUTYH (PAM). Esse tipo de pólipo ocorre em 20% a 100%
dos portadores de PAF. Além dessas associações, pode ocorrer também com
síndrome de Zollinger-Ellison, gastrinoma e longo uso de IBP. Há estudos que
citam a infecção por H. pylori como um fator protetor para esse tipo de pólipo.
Geralmente, são assintomáticos, quando aumentam de tamanho pode causar
obstrução, dor abdominal ou vômitos. São normalmente pequenos, de 0,1 a 0,8
cm, sésseis e exclusivos de corpo gástrico. Seu potencial maligno é considerado
apenas em casos de PAF, que apresentam displasia de baixo grau com difícil
progressão para câncer. Os casos que devem ser ressecados são os de diâmetro
maior ou igual 1 cm, presença de ulceração e localização em antro. Se for
observado mais de 20 pólipos e for um paciente < 40 anos com adenomas
duodenais concomitantes, há possibilidade de ter diagnóstico de PAF. Em casos
em que o uso de IBP é o fator de risco principal, é indicado suspender a droga e
trocar por inibidores de H2, se necessário. A vigilância com EDA é indicada apenas
para pacientes com diagnóstico de PAF (indicado uma colonoscopia também).
3. Adenomas gástricos: são responsáveis por 6-10% dos pólipos gástricos,
considerados mais comum. Sua etiologia é ligada a gastrite atrófica crônica,
podendo ocorrer na PAF, apesar de raro. Comumente, não manifestam sintomas,
podendo causar sangramento oculto. Suas características são < 2 cm, solitários e
encontrada em antro (maior número), corpo ou cárdia. Os adenomas são
precursores do adenocarcinoma em 8-59% dos casos. Por isso, todos esses
pólipos devem ser ressecados endoscopicamente ou se houver múltiplos
adenomas ou carcinoma invasivo é necessário cirurgia (que será discutido mais à
frente). Se for detectado H. pylori, deve ser tratado. A vigilância deve ser feita com
1 ano após a ressecção e, se o paciente for considerado de alto risco para câncer,
é repetido por tempo indefinido.
4. Pólipos fibroides inflamatórios: são extremamente raros, contabilizando < 0,1% dos
pólipos. A conduta é ressecção endoscópica com ótimo prognóstico, sem
necessidade de acompanhamento.

3. NEOPLASIAS MALIGNAS
3.1. Adenocarcinoma gástrico
Os fatores de risco para o adenocarcinoma gástrico são: nutricionais (baixo consumo
de gordura e proteínas animais, alto consumo de carboidratos complexos, excessivo
consumo de nitratos, pouco consumo de frutas e verduras), ambientais (tabagismo, água
contaminada), social (baixo nível socioeconômico), médica (gastrectomia parcial, anemia
perniciosa, H. pylori, pólipos adenomatosos, doença de Ménétrier), sexo masculino e grupo
sanguíneo A (específico para o subtipo “difuso”).
Há dois tipos de classificação mais usadas no câncer gástrico conhecidos como Lauren
e Borrmann. A primeira é de acordo com histologia, dividindo o adenocarcinoma em
intestinal e difuso. Já a de Borrmann leva em consideração as características
endoscópicas, dividindo em 4 tipos macroscópicos diferentes.
Existe a classificação, também, do chamado câncer gástrico precoce, tumores restritos
a mucosa e submucosa, com ou sem linfonodos locais. Ela foi iniciada no Japão, onde
realizam screening em pacientes assintomáticos, proporcionando uma taxa de cura de
85%. A primeira figura a seguir é a classificação do câncer precoce e a segunda imagem
seria classificação macroscópica do adenocarcinoma gástrico.

Fonte: Cancer:principles & practice of oncology.10 ed.

As manifestações clínicas vêm mais tardiamente, pois no início esse câncer é


assintomático ou sintomas inespecíficos. Os sintomas mais comuns são perda de peso,
dor epigástrica, náuseas, vômitos, hiporexia, disfagia e melena. As características dessa
dor são que ela é constante, sem irradiação e não melhora com ingestão de alimentos.
Podem ocorrer sintomas decorrentes de metástases, que comumente acomete em pulmão,
fígado e peritônio. Manifestam a tosse, icterícia e ascite. Além disso, podem provocar
alterações no exame físico, como linfonodo de Virchow (supraclavicular esquerdo
palpável), linfonodo irmã Maria José (periumbilical palpável), tumor de Krukenberg (massa
ovariana palpável) e prateleira de Blumer (linfonodos palpáveis ao toque retal).
O exame padrão ouro para diagnóstico é a endoscopia digestiva alta com biópsia de
diversas amostras. A ultrassonografia endoscópica é útil tanto para determinar invasão em
parede gástrica como em linfonodos regionais. As evidências desse exame ajudam na
classificação do “N” (do estadiamento TNM), mas que só é definido certamente após a
cirurgia de linfadenectomia. A tomografia computadorizada (TC) de abdome, pelve e tórax
serve para determinar se há metástases em órgãos e linfonodos a distância. Se após esse
exame ainda houver dúvidas deve ser realizada a videolaparoscopia.
Após ser estadiado, a proposta de tratamento pode ser estabelecida. A cirurgia curativa
é proposta a todos que não têm doença a distância, mesmo que seja um T4. O tumor deve
ser ressecado com boa margem de segurança de, no mínimo, 5-6 cm no subtipo intestinal e
8 cm no difuso.
O tipo de gastrectomia dependerá da localização do tumor. Lesão distal ou em corpo a
mais de 5 a 6 cm da junção esofagogástrica (JEG) podem ser tratados com gastrectomia
subtotal com reconstrução em Billroth II ou em Y de Roux. Se a neoplasia estiver em terço
médio a menos de 5 a 6 cm da JEG ou em fundo gástrico, deve ser realizado a
gastrectomia total com Y de Roux. Se o tumor for de cárdia, são realizados esofagectomia
distal com gastrectomia total com reconstrução em Y de Roux.
Todos os tumores devem ser realizados a linfadenectomia profilática. Sendo
classificadas em D1 (linfonodos perigástricos até 3 cm de margem), D2 (D1+ os que
acompanham as artérias proximais) e D3 (D2 + com os do ligamento hepatoduodenal,
região próxima do pâncreas e duodeno). O procedimento preferível pelos colégios
brasileiros está sendo a D2, se não aumentar o risco da cirurgia.
Em relação à terapia adjuvante, não houve muitas respostas nos tumores, em geral,
exceto nos com mutações HER-2 positivos que respondem ao tratamento com
trastuzumab.
As gastrectomias realizadas paliativamente são com objetivo de evitar sangramentos,
obstruções e perfurações (apenas para pacientes com risco cirúrgico baixo). A radioterapia
e quimioterapia estão com resultados bons nos cuidados paliativos.
O acompanhamento pós-cirúrgico deve ser a cada 4 meses, no primeiro ano, a cada 6
meses por dois anos, e depois anualmente. A endoscopia deve continuar sendo feita
quando foi realizado gastrectomia subtotal. O prognóstico mais reservado é para o estágio
IV.

3.2. Linfoma gástrico


O linfoma gástrico é uma totalidade de 45% de todos os linfomas, mas apenas 5% de
todas as lesões malignas do estômago. Há dois tipos pela classificação, linfoma difuso de
grandes células B (não Hodgkin com prognóstico reservado) e linfoma MALT (não Hodgkin
com alta chance de cura). Quando visualizado endoscopicamente, apenas 75% tem
características malignas, os outros 25% é caracterizado como úlcera péptica benigna. Por
isso é dada a importância primordial em colher amostra para estudo histopatológico.
Recomenda-se colher 10-15 amostras de boa qualidade, quando há chances de ser linfoma,
pois há amostras capazes de serem negativas, chamados linfomas de baixo grau. Além da
EDA, interessante obter TC de abdome e pelve e USG endoscópico para avaliar os
linfonodos da região. A conduta da maioria dos tipos do difuso de grandes células B é
poliquimioterapia. E no linfoma MALT é tratado com a erradicação do H. pylori, que
aumenta a sobrevida para > 80%, nos próximos 5 anos.

3.3. Tumor estromal gastrointestinal (GIST)


O mesênquima da parede gastrointestinal é a origem dessa neoplasia e pode ser divido
em tumor estromal (GIST/células de cajal), leiomioma /leiomiossarcoma (origem
muscular) e Schwannoma (origem nervosa). O GIST é o mais comum, com incidência na 6ª
década. O diagnóstico é feito por ecoendoscopia com punção da lesão para estudo
histológico. O grau de malignidade é dado pelo número de mitoses e o tamanho do tumor,
pois não há classificação ainda de estadiamento para essa patologia. Com menos de 5 ou
igual a 5 mitoses, é considerada benigna, se entre 5 e 50, maligno, mas se acima de 50 é
altamente maligno. De acordo com o tamanho, < 5 cm é considerado benigno e se acima
de 5 cm é maligno. E assim aumenta, também, a chance de metástases com o tamanho. O
tratamento é cirúrgico com ressecção da massa com margens negativas. Para doenças
irressecáveis e metástases à distância é proposto quimioterapia com mesilato de
imatinibe.

3.4 Tumores neuroendócrinos


São divididos em tipo 1 e 2 correlacionados a hipergastrinemia e o tipo 3 que é
esporádico. Os tipos 1 e 2 tem curso tardio, são menores que 1-2 cm e a ressecção é
endoscópica. Já no tipo 3 pode ter metástases e são tratados com gastrectomia com
linfadenectomia.

CONCLUSÃO
Por fim, a maior dificuldade para se ter conhecimento dessas lesões precocemente é o
diagnóstico, pois são ou assintomáticas ou apresentam sintomas inespecíficos. Quanto
mais precoce o diagnóstico, melhor o prognóstico e a sobrevida do paciente.
Consideremos lesões precoces gástricas, são tratadas apenas com ressecção
endoscópica com boa resposta ao tratamento. Em lesões gástricas diversas, sem doença a
distância, considerado tratamento cirúrgico como procedimento curativo. Se houver
metástases, consideramos terapia paliativa, que o objetivo é proporcionar alívio dos
sintomas e evitar complicações com menor morbidade.

REFERÊNCIAS
1. Mahachai V, Graham DY, Odze RD. Gastric polyps. UpToDate; 2019 [acesso em 03 out. 2019].
2. Clínica Cirúrgica USP. 1. ed. Barueri, SP: Manole. 2 volumes.
3. Townsend C, Beauchamp D. Sabiston: Tratado de Cirurgia. 19. ed. 2 volumes.
4. Waidhauser J, et al. Frequency, localization, and types of gastrointestinal stromal tumor-associated neoplasia.
World Journal Of Gastroenterology, [s.l.], 14 ago. 2019; 25(30): 4261-4277.
Parte 2 | Capítulo 17

Tumores e abscessos hepáticos


Autores: João Paulo Ribeiro Silva e Marina Rodrigues Lima

1. Tumores benignos do fígado


Os tumores hepáticos benignos ocorrem em 9% da população e a
grande maioria é diagnosticada em pacientes assintomáticos
durante a realização de exames de imagem de rotina. Os tumores
benignos mais comuns são o hemangioma, o adenoma e a
hiperplasia nodular focal. A diferenciação entre tumores benignos e
malignos é essencial e pode ser feita com base nos dados clínicos e
em exames de imagem.

1.1. Hemangioma cavernoso


O hemangioma é a neoplasia hepática mais comum, com
prevalência geral entre 0,4% e 7,4%, representando 70% dos tumores
benignos. Tem predomínio no sexo feminino (60% a 80% dos casos)
e sem picos de incidência por faixa etária.
A maioria dos hemangiomas é único (90%) e localiza-se no lobo
direito. Ao exame histológico, é uma lesão não encapsulada, que não
tem tendência ao sangramento e sem relação com malignidade. A
maioria é assintomática, sendo a sintomatologia como dor ou
plenitude abdominal presente nas lesões maiores. Tem na síndrome
de Kasabach-Merritt a sua clínica mais grave, que se caracteriza por
trombocitopenia e coagulopatia de consumo.
O diagnóstico é essencialmente radiológico, por meio da
tomografia computadorizada e da ressonância magnética com
gadolínio (padrão-ouro). Nesta, apresenta-se tipicamente isointenso
em T1 e hiperintenso em T2 com realce paralelo às estruturas
arteriais e persistência do realce na fase tardia. Diferencia-se de
lesões malignas pelo fluxo sanguíneo mais lento. A cintilografia com
hemácias marcadas apresenta elevada precisão para hemangiomas
> 2 cm, mas raramente é necessária.
Uma vez diagnosticado, a maioria dos casos não necessita de
tratamento, sendo a conduta expectante (acompanhamento
ultrassonográfico a cada 6-12 meses).
O tratamento cirúrgico, seja por enucleação ou ressecções
anatômicas, tem sua indicação restrita na impossibilidade de excluir
malignidade, nas lesões sintomáticas volumosas e na síndrome de
Kasabach-Merritt. Atividades físicas, gravidez e uso de
anticoncepcionais não são contraindicados.
Figura 1: Ressonância magnética ponderada em T2 com hemangioma
mostra sinal luminoso típico.

Fonte: Jarnagin, W. R. Belghiti, J., E Blumgart’s surgery of the liver,


biliary tract, and pancreas. Philadelphia:Elsevier, Saunders.

1.2. Hiperplasia nodular focal (HNF)


A hiperplasia nodular focal é o 2º tumor hepático benigno mais
comum, com predomínio em mulheres em idade reprodutiva. Nem a
sua causa, nem o seu desenvolvimento estão relacionados ao uso
de anticoncepcionais hormonais. A grande maioria das lesões é
assintomática. É considerada uma reação hiperplásica resultado de
malformações arteriais.
É importante a sua diferenciação radiológica com adenomas e
tumores malignos. Tanto a tomografia como a RNM evidenciam
lesão homogênea, sem cápsula, com cicatriz central estrelar,
hiperintensa em T2 e na fase tardia, mas nem sempre está presente.
A RNM tem melhor acurácia que a TC. O uso de contraste
hepatobiliar auxilia na diferenciação de malignidade com surgimento
de lesões iso ou hiperintensas na fase contrastada biliar.
A conduta é expectante e a indicação de ressecção limita-se às
massas volumosas sintomáticas ou na dúvida diagnóstica.
Figura 2: Tomografia computadorizada abdominal nas fases arterial e
portal. A: Hiperplasia nodular focal durante fase arterial, observa-se
intenso realce da lesão (setas brancas). B: Aspecto pós-embolização
da lesão. Observa-se diminuição do tamanho e a completa
desvascularização do centro da lesão, apresentando-se como área
central homogênea e sem realce (setas pretas).

Fonte: Jarnagin, W. R. Belghiti, J., E Blumgart’s surgery of the liver,


biliary tract, and pancreas. Philadelphia:Elsevier, Saunders.

1.3. Adenoma hepático


O adenoma hepático é uma neoplasia incomum que ocorre quase
exclusivamente em mulheres em idade reprodutiva, havendo claras
evidências de relação etiológica e evolutiva entre o tumor e o uso de
anticoncepcionais combinados (independentemente da dose de
estrogênios). São raros os casos descritos em homens (com uso de
anabolizantes, diabetes e glicogenólise tipo I).
Manifestações clínicas são mais comuns que os primeiros
tumores descritos e incluem dor abdominal e hipotensão arterial
secundária a hemorragia intra-abdominal (choque hipovolêmico) por
rotura do adenoma. O risco de sangramento é maior na gravidez,
história de uso prolongado de anticoncepcionais orais, adenomas
múltiplos, bem como lesões grandes e de localização subcapsular.
Embora o adenoma hepático seja considerado um tumor benigno,
existem relatos de sua transformação maligna em carcinoma
hepatocelular.
A avaliação laboratorial hepática costuma ser normal e a
definição diagnóstica se faz essencialmente por imagem. O aspecto
arteriográfico típico do adenoma é uma lesão hipervascular, que com
frequência tem um núcleo hipovascular central, correspondendo à
hemorragia ou necrose. À semelhança dos carcinomas
hepatocelulares, os adenomas exibem um aspecto hiperintenso em
T1, como em T2 na RNM. Outro diagnóstico diferencial é com a
hiperplasia nodular focal.
O tratamento do adenoma hepático é clínico nas lesões menores
que 5 cm, com indicação de suspensão do uso de anticoncepcionais
e vigilância por RNM anual ou semestral. Nas maiores que 5 cm que
não regridem após suspensão dos ACOs, bem como nas lesões
próximas à superfície e ressecáveis, a cirurgia é melhor indicada. No
sexo masculino, a indicação é absoluta pelo risco de malignização,
independente das dimensões. A cirurgia pode ser aberta ou
laparoscópica com ressecções regradas ou extensas com margens
pequenas de segurança.
Abordagem singular deve ser dada na adenomatose hepática, que
é definida pela presença de 10 ou mais lesões. Tem a mesma faixa
etária das apresentações simples, mas com taxa de malignização
maior, cerca de 10%. O tratamento cirúrgico é indicado nas lesões
maiores que 5 cm e nos sintomáticos. No acometimento bilateral, as
lesões são abordadas em dois tempos com a ressecção das lesões
acima dimensionadas por segmento anatômico, para garantir reserva
hepática para novo procedimento. As lesões menores que 5 cm são
acompanhadas com imagem e dosagem de alfafetoproteína. O
transplante hepático é indicado quando a ressecção não é factível
por comorbidades. A pontuação do MELD é de 20 por 3 meses, sobe
para 24 entre 3 e 6 meses, quando então atinge os 29 pontos
Figura 3: Adenomas hepatocelulares. As duas lesões grandes (uma
no caudado e outra no lobo esquerdo) são hiperintensas nas
imagens de RNM ponderadas em T2 com supressão de gordura e na
fase opaca e na fase oposta (A e C). A RNM ponderada em T1 com
gadolínio, obtida na fase arterial e tardia (D e E), mostra forte
aumento da lesão na fase arterial e melhora persistente na fase
tardia.

Fonte: Jarnagin, W. R. Belghiti, J., E Blumgart’s surgery of the liver,


biliary tract, and pancreas. Philadelphia:Elsevier, Saunders.
2. Tumores hepáticos malignos
Os tumores hepáticos malignos são conceitualmente abordados
em dois segmentos: primários e secundários. Os primários são
constituídos em sua essência pelo carcinoma hepatocelular (CHC) e
os secundários englobam metástases de diversos sítios primários, a
destacar o câncer colorretal, tumores neuroendócrinos, dentre
outros.

2.1. Carcinoma hepatocelular – CHC


O CHC é a quinta causa mais comum e a terceira em mortes por
câncer no mundo, cuja maior incidência se encontra na Ásia e na
África Subsaariana. De 40% a 90% dos pacientes com CHC têm
cirrose hepática como doença de base, especialmente a
macronodular, e acomete geralmente homens de meia-idade.
Os seus principais fatores de risco são: infecção pelos vírus da
hepatite B (52%) e C (25%), sendo o último a principal causa no Brasil,
etilismo, ingesta de aflatoxina B1, exposição ao cloreto de vinila,
diabetes mellitus tipo 2, esteato-hepatite não alcoólica e hepatite
autoimune.
Devido à apresentação assintomática na maioria dos pacientes, o
screening de lesões malignas em pacientes com cirrose é
fundamental, com esta se baseando em ultrassonografia a cada 6
meses. A descompensação clínica aguda, trombose de veia porta e
aumento do fígado são as principais manifestações que permitem a
suspeição nos hepatopatas crônicos e indicam a avaliação por
imagem.
CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA CARCINOMA HEPATOCELULAR

1. Histopatológico/citológico em pacientes não cirróticos.

2. Não invasivo (para pacientes cirróticos)


– Lesão focal > 1 cm: TC ou RNM evidenciando hipervascularização na fase arterial e
washout na fase venosa.

Figura 4: CHC. A: fase arterial hiperdensa e B: fase tardia


demonstrando a cápsula.
Fonte: Jarnagin, W. R. Belghiti, J., E Blumgart’s surgery of the liver,
biliary tract, and pancreas. Philadelphia:Elsevier, Saunders.

A ultrassonografia não consegue diferenciar de


colangiocarcinoma, neoplasia com incidência crescente nos
cirróticos. Já a alfafetoproteína (AFP) tem acurácia diagnóstica
subótima e se eleva em outras condições como metástases de
neoplasias gástricas, colônicas, bem como nos colangiocarcinomas.
É usada como marcador de recidiva e metástases.
Para o tratamento do CHC, é levada em consideração uma série
de fatores, dentre eles o estadiamento tumoral e o status subjacente
do fígado. Pacientes não cirróticos são candidatos a ressecções e os
cirróticos necessitam de análise criteriosa das lesões (quantidade,
dimensões, invasões locais e metástases), doenças de base, função
hepática e status de performance.
A estratégia mais utilizada para classificar e definir a estratégia
terapêutica se baseia no estadiamento Barcelona Clinic Liver Cancer
(BCLC), com atualização recente em 2018:
Para melhor entendimento do estadiamento e conduta no CHC em
pacientes cirróticos, uma análise deve ser feita com exclusão em
etapas:
1) Pacientes CHILD C e/ou com status performance 3-4 são
terminais, independentemente da(s) lesão(ões) com indicação
apenas ao suporte clínico;
2) Excluídas as condições acima, avalia-se o tratamento paliativo:
2.1) Invasão de veia porta, metástases extra-hepáticas e status
de performance 1-2 são indicações de terapia sistêmica com
sorafenib, o único que melhora sobrevida (1 ano).
2.2) Descartadas essas condições, se forem encontradas acima
de 3 lesões (multinodular) ou lesão maior que 5 cm, a paliação é
feita por meio de quimioembolização transarterial.
3) Para o tratamento curativo, deve-se obedecer aos seguintes
critérios: CHILD A-B, lesão única menor que 5 cm ou até 3 lesões
menores ou iguais a 3 cm, status de performance 0. A escolha do
tratamento varia:
3.1) Se o paciente tiver indicação de transplante hepático, será
submetido a tal. Comorbidades proibitivas ao procedimento
indicam o tratamento para ablação percutânea (seja por
radiofrequência, irradiação por micro-ondas), reservando a
alcoolização para lesões subcapsulares, ou próximas à vesícula
biliar ou ao coração.
3.2) A ressecção do CHC está indicada em pacientes sem
cirrose, ou nos casos de cirrose bem compensada (CHILD super
A), considerando como parâmetros de normalidade as
bilirrubinas e a pressão portal.
A ablação percutânea tem taxa de cura e sobrevida semelhante à
ressecção cirúrgica se a lesão for até 2 cm.
Como considerações finais em relação a essa abordagem, a
decisão do tratamento deve ser individualizada, uma vez que
situações não avaliadas nesse esquema podem ter impacto negativo
no prognóstico: peritonite bacteriana espontânea, hemorragia
digestiva de repetição, ascite refratária com ou sem síndrome
hepatorrenal e desnutrição severa.

2.2. Metástases hepáticas


As metástases hepáticas são as lesões malignas mais comuns.
O fígado é o segundo local mais comum de metástase de neoplasias
abdominais, perdendo para a via linfonodal e é sítio de implante para
metade dos tumores extra-abdominais. O câncer colorretal é o mais
importante e necessita ser descartado no caso de achados
incidentais de lesões hepáticas malignas.
Geralmente há pior prognóstico quando se manifesta por dor
abdominal, perda de peso, ascite, febre, icterícia e hepatomegalia. O
CEA é o melhor marcador laboratorial de recorrência, mesmo
inespecífico, mas de longe a regra é a avaliação radiológica por
TC/RNM.
As metástases sincrônicas colorretais são idealmente abordadas
ao mesmo tempo da ressecção da doença primária e depende muito
da experiência da equipe. Na prática, elas são tratadas em segundo
tempo (cirurgia + QT adjuvante + metastasectomia/hepatectomia)
com bons resultados.
A cirurgia é o melhor e mais indicado tratamento (principalmente
com quimioterapia adjuvante com 5-FU +
oxaliplatina/irinotecan/capecitabine) e tem melhores desfechos
para o câncer colorretal. Tumores neuroendócrinos, tumor de Wilms,
melanomas, leiomiossarcomas, câncer de mama (nas lesões únicas
sem qualquer outro sítio linfonodal ou a distância) se beneficiam da
abordagem operatória. O transplante hepático só se mostrou
eficiente nos tumores carcinoides difusos.

3. Abscesso hepático piogênico (AHP) e


abscesso amebiano (AHA)
O AHP é definido por coleções de pus solitárias ou múltiplas no
fígado e tem sua importância por causar significante morbidade,
mortalidade e altos custos nos serviços de saúde.
Para entender a sua etiologia é necessária a correlação com sua
via de chegada ao fígado:
Sintomas constitucionais como febre, calafrios, mal-estar e
anorexia são os mais comuns. Associa-se ainda dor abdominal,
náuseas, êmese, diarreia, perda de peso, icterícia (que pode ser
indicador de sepse) e choque séptico. Independentemente de serem
lesões múltiplas ou únicas do micro-organismo envolvido, a
apresentação tende a ser a mesma. Embolização séptica se
manifesta raramente por meio de endoftalmite, meningite, celulite,
abscesso pulmonar, prostatites, pielonefrites, artrite infecciosa e
tamponamento cardíaco devido à efusão pericárdica.
Nos exames laboratoriais são encontrados geralmente
hipoalbuminemia, leucocitose, aumento de fosfatase alcalina, gama-
GT, transaminases, bem como VHS e PCR. Alargamento do INR,
aumento de escórias nitrogenadas e hipoalbuminemia tem
correlação com pior prognóstico.
A ultrassonografia é o exame inicial a ser feito por ter menor
custo e aplicação na avaliação de vesícula e vias biliares. Os
abscessos piogênicos se apresentam como lesões hipoecoicas com
paredes finas, sendo o espessamento um sinal de cronicidade. A
presença de gás se mostra hiperecoicas com formação de sombra
acústica e está associada ao diabetes mellitus tipo 2.
A tomografia computadorizada tem sensibilidade de 97% com o
uso do contraste endovenoso. As lesões tipicamente são descritas
como em sinal de alvo, que podem ser homogêneas ou
multiloculadas, com centro hipodenso e periferia vascularizada na
fase portal. Já a RNM é uma alternativa e mostra hipointensidade em
T1 e hiperintensidade em T2. A diferenciação com neoplasias
infectadas pode ser difícil.
Figura 5: Tomografia de abdome em paciente de 50 anos com
processo inflamatório em íleo terminal (A), com abscesso hepático
em segmento posterior direito (B). Paciente submetido à drenagem
da coleção (C).

Fonte: Jarnagin, W. R. Belghiti, J., E Blumgart’s surgery of the liver,


biliary tract, and pancreas. Philadelphia:Elsevier, Saunders.
Quanto à localização, o lobo direito é mais acometido, seguido do
esquerdo e depois ambos. Coleções menores que 2 cm
(microabscessos) quando agrupados, remete-se a origem arterial
estafilocócica. Os de origem coliforme tendem a se agrupar numa
fase mais tardia da doença, o que explica o sucesso da drenagem
destes por meio de um cateter em coleções inicialmente
multisseptadas. Abscessos múltiplos tendem a ser de origem biliar
e os criptogênicos são únicos.
Os micro-organismos mais envolvidos são a Escherichia coli no
Ocidente seguido pelo Streptococcus milleri, enquanto a Klebsiella
pneumoniae é mais comum nos asiáticos e está associada a maior
embolização séptica. Na origem biliar e intestinal é polimicrobiana
com gram-negativos e anaeróbios e na arterial é geralmente
monomicrobiana por estafilococos ou estreptococos. A coleta de
material para cultura, bem como hemocultura deve ser regra.
O tratamento do AHP envolve basicamente 3 abordagens:

• Antibioticoterapia:
Esquema 1 – ampicilina + aminoglicosídeo + metronidazol ou
Esquema 2 – cefalosporina de terceira geração ou
ciprofloxacina + metronidazol.
Tempo de tratamento de quatro semanas. As primeiras duas
semanas parenterais e, a depender da resposta ao tratamento
(regressão da lesão, paciente assintomático, leucograma
normal), alta com tratamento ambulatorial por mais duas
semanas. Lembrar que a cultura das amostras colhidas
escalona a escolha dos fármacos.

• Terapia percutânea: sempre que possível, drenagem da(s)


coleção(ões) com cateter guiado por ultrassonografia ou
tomografia sob anestesia local e sedação. A simples aspiração
da coleção é reservada para lesões menores que 5 cm com
boa janela de localização.

• Abordagem cirúrgica: laparoscópica ou aberta. Reservada


aos casos refratários às terapias anteriores, localização difícil,
ruptura de abscesso para cavidade, bem como para
tratamento da causa subjacente concomitantemente à
drenagem da coleção. Durante a abordagem, a
ultrassonografia transoperatória é factível para localizar e
guiar a drenagem. As ressecções hepáticas ficam reservadas
aos casos de necrose hepática, hepatolitíase ou estenoses
localizadas que sejam causas do abscesso hepático.
Vale salientar que nas comunicações dos abscessos com as vias
biliares e em suas lesões, pode ser necessária a abordagem distal
com CPRE e papilotomia. A colângio-RNM tem papel importante no
planejamento cirúrgico/endoscópico.
O abscesso hepático amebiano (AHA) é causada pela Entamoeba
histolytica, que chega ao fígado pela via portal. As manifestações
clínicas típicas são dor em hipocôndrio direito, febre e
hepatomegalia. São comumente lesões grandes, únicas em lobo
hepático direito (80%), com conteúdo achocolatado em seu interior,
maior tendência à superficialização, mas menor chance de
perfuração livre em cavidade por não acometer a cápsula de Glisson.
A perfuração para hemitórax direito é mais comum que para a
cavidade peritoneal. Efusão pericárdica indica lesões em lobo
hepático esquerdo. A correlação clínica entre o AHA e a colite
invasiva amebiana não é significativa (< 30%).
As culturas tendem a dar negativas, a não ser em caso de
infecção secundária. Laboratorialmente não difere muito do que foi
apresentado anteriormente, exceto pela hiperbilirrubinemia que é
incomum. A sorologia (hemaglutinação indireta) é mandatória nos
casos suspeitos, com necessidade de repetição em 1 semana caso
negativa. A positividade persiste em média por 12 meses.
A radiografia pode evidenciar efusão, empiema, atelectasia à
direita com elevação importante da cúpula diafragmática ipsilateral,
quadro esse que pode levar à confusão com pneumonia, uma vez
que o paciente pode se apresentar com febre, tosse seca e dor
pleurítica. A ultrassonografia tem papel mais importante e acurácia
de 90% no diagnóstico, evidenciando lesões de padrão misto
hipercoico/enos com halo periférico mal-definido nas fases
precoces. O espessamento da parede se dá em fases mais tardias (8
a 16 semanas). A TC não acrescenta muito à USG nas fases
precoces da doença, sendo reservada para casos suspeitos com
lesões pequenas, bem como para avaliação de complicações
regionais por contiguidade.

Fonte: Jarnagin, W. R. Belghiti, J., E Blumgart’s surgery of the liver,


biliary tract, and pancreas. Philadelphia:Elsevier, Saunders.

O tratamento é realizado clinicamente com metronidazol por 7 a


10 dias, com o paciente apresentando melhora clínica nas primeiras
72 horas. O tinidazol dose única tem boa resposta, mas é menos
disponível que o primeiro. Após isso, deve ser feita descolonização
intestinal com paromomicina ou iodoquinol. A ausência ou resposta
parcial ao metronidazol indica escalonamento para deidroemetina
(disponível em centros especializados) e necessidade de drenagem
percutânea, cuja indicação ainda se estende para lesões maiores
que 10 cm, para complicações locais como acometimento pleural,
pericárdico e em casos de dúvida diagnóstica.

Referências
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1314.
Parte 2 | Capítulo 18

Doenças diverticular dos cólons


Autores: Janiel Carvalho Ponte e Alexandre Araújo Aguiar

1. Introdução
A doença diverticular caracteristicamente é uma doença benigna,
que pode acometer pacientes de todas as faixas etárias, porém, é
mais frequente com o avançar da idade, chegando a acometer cerca
de 10% dos adultos na faixa dos 50 anos, podendo chegar a 50%-80%
da população acima dos 80 anos, com distribuição igualitária entre
homens e mulheres. A doença diverticular caracteriza-se pelo
surgimento de uma protusão sacular que pode surgir por meio de
qualquer seguimento do trato gastrointestinal, porém sendo mais
comum o surgimento dessa afecção no cólon. A projeção sacular
pode ser classificada em divertículo verdadeiro, quando composto
por todas as camadas da parede intestinal, ou pseudodivertículo,
quando não possui uma das camadas, os divertículos colônicos, que
são epidemiologicamente mais prevalentes, em regra são projeções
da mucosa intestinal, sem demais camadas, sendo, assim, os
pseudodivertículos os mais prevalentes.
Figura 1: Diverticulitis, saco de mucosa intestinal
Fonte: Gastroenterologos

2. Patogênese
Os divertículos originam-se da herniação de parte ou todas as
camadas do TGI, sendo mais relevante e mais prevalente a patologia
no cólon, destaca-se que nessa porção do TGI a projeção da mucosa
por meio dos pontos de penetração das arteríolas na parede
muscular, podendo em alguns casos a arteríola ser elevada até o
cume do divertículo, incorrendo nesses casos maior frequência de
eventos hemorrágicos com repercussão clínica. Destaca-se ainda na
patogênese da doença diverticular o espessamento da parede
colônica, consequente da hipertrofia da camada muscular colônica,
podendo ainda preceder o surgimento do divertículo, associa-se esse
espessamento com a base etiopatogênica da diverticulose, que,
apesar de não ser totalmente definida, associa-se fortemente com a
mudança de padrão alimentar decorrente da revolução industrial que
introduziu fortemente alimentos processados na dieta ocidental, com
destaque para o trigo refinado, assim como açúcares e carnes
vermelhas, em suma, alimentos com maior teor calórico e menor
quantidade de fibras, influindo, assim, no prejuízo da formação do
bolo fecal, gerando uma necessidade de maior esforço da
musculatura intestinal para viabilizar a projeção do conteúdo
entérico, incorrendo assim no aumento significativo da pressão
intraluminal, podendo chegar a 90mmhg em alguns pontos do cólon,
gerando assim os divertículos nos pontos da maior fragilidade
tensional. Associa-se ainda a essa etiopatogênese o processo
natural de envelhecimento, onde nesse caso o processo de
fragilidade e frouxidão das fibras viabiliza o surgimento das
saculações.

3. Quadro Clínico
A doença diverticular, como outras das patologias benignas,
apresenta-se na maioria dos pacientes de forma assintomática,
sendo frequente sua descoberta incidental a realização de exame
colonoscópico eletivo por outra queixa ou de rastreio, porém em
alguns casos podem apresentar sangramento retal, podendo chegar
até a hemorragias maciças. Nas patologias diverticulares destaca-se
uma complicação comum nos portadores de divertículos, a
diverticulite, que manifesta-se com clínica variada, a depender do
grau de acometimento e extensão do processo diverticular, sendo
comumente flagrado dor no quadrante inferior esquerdo do abdome,
febre baixa redução ou aumento de mobilidade gastrointestinal,
anorexia e leucocitose, não infrequente pode surgir também dor
supra púbica, dor em fossa ilíaca direita, fleimão de bloqueio
infeccioso, até peritonite difusa e sepse, tudo isso associa-se
diretamente à localização do divertículo acometido.
4. Diverticulite
A diverticulite é uma infecção pericólica extraluminal resultante
do extravasamento de conteúdo fecal secundário a uma perfuração
no divertículo; em resposta a esse fato o organismo inicia um
processo de controle infeccioso visando conter a infecção, dando
assim início às queixas e às sintomatologias.
A evolução clínica da diverticulite é variada e depende
diretamente da competência do organismo na contenção do
processo infeccioso, por isso o diagnóstico preciso é necessário para
adequada condução do caso. Além dos sintomas citados
anteriormente destaca-se durante o exame físico do paciente com
suspeita de diverticulite o toque retal e vaginal, visando flagrar massa
flutuante dolorosa, que é fortemente sugestiva de abscesso.

5. Diagnóstico
Dentre os exames de imagem sugere-se a Tomografia de Abdome
Total com contraste como exame preferencial na avaliação do
paciente com suspeita de diverticulite, podendo ainda optar-se pela
Ressonância Magnética sem prejuízos ao diagnóstico da patologia,
assim como de suas complicações, respeitando obviamente as
peculiaridades de cada técnica assim como a viabilidade de
realização desses exames de maneira individualizada ao caso do
paciente. Destaca-se ainda a possibilidade da ultrassonografia
abdominal como exame de auxílio no diagnóstico e segmento do
paciente com diverticulite, porém com prejuízo na avaliação caso
haja dissensão gasosa, o que não é infrequente nesses pacientes,
porém como vantagem do método ultrassonográfico destaca-se a
possibilidade de drenagem percutânea de abscessos intracavitários.
Devemos citar ainda o clister opaco, método utilizado com
frequência antes da disponibilidade dos métodos tomográficos, que
consiste na infusão de contraste via retal seguido de radiografia;
esse contraste deve ser hidrossolúvel para não acarreta risco de
peritonite por bário. Esse método vem caindo em desuso pelo
elevado risco de extravasamento de contraste para cavidade
abdominal agravando e disseminando o processo infeccioso, além
do risco da pressão positiva, para injetar o contraste, acrescentar um
extravasamento adicional de conteúdo fecal no cavidade. Esse
último risco também se estende a outros exames que necessitam de
pressão positiva para realização como a sigmoidoscopia e a
colonoscopia, exames que, via de regra, são sugeridos quando,
dentre os diagnósticos diferenciais, levanta-se fortemente a
possibilidade de neoplasia intestinal perfurada, porém devem ser
criteriosamente avaliada a sua realização de acordo com o custo-
benefício em cada caso.
Figura 2: Tomografia computadorizada (TC) da pelve, corte axial,
sem meio de contraste, evidenciando divertículos em cólon
sigmoide (círculos vermelhos)

Fonte: Acoesunimedbh

Figura 3: Diverticulite - Diverticulose


Fonte: Cenapro

Devido ao amplo espectro clínico da diverticulite, que pode


ocorrer desde um evento único, leve, isolado e autolimitado,
passando por crises recorrentes que cedem ao uso de antibióticos,
indo até quadros graves que evoluem rapidamente para um sepse
grave, sugere-se a classificação de Hinchey para organização da
doença conforme o quadro clínico.

Estágio 1 Abscesso pericólico e/ou mesentérico. Mortalidade < 5%

Estágio 2 Abscesso pélvico contido (plastrão). Mortalidade < 5%

Estágio 3 Peritonite generalizada purulenta. Mortalidade = 13%

Estágio 4 Peritonite fecal generalizada. Mortalidade = 43%

O tratamento da diverticulite deve ser individualizado conforme a


gravidade clínica do paciente. Epidemiologicamente a maioria dos
casos apresenta-se na forma de diverticulite não complicada, que
nos casos mais leves pode ser tratada ambulatorialmente com
antibióticos orais, porém na existência de qualquer sinal de
complicação ou comprometimento do estado geral do paciente deve
ser optado pela hospitalização, associada a antibiótico por terapia
endovenosa, suporte clínico e avaliação cirúrgica.
Deve-se considerar o tratamento cirúrgico na vigência de
complicações, tais como abscessos, fístulas, peritonite generalizada
e obstrução:
- Abscessos podem surgir e o diagnóstico pode ser sugerido no
exame físico do paciente por meio do toque retal e vaginal, buscando
coleções móveis e dolorosas; via de regra limita-se a região pélvica,
onde pode ser realizado drenagem cirúrgica guiada por
ultrassonografia ou tomografia caso apresente diâmetro maior que 2
cm.
- Fístulas diversas podem surgir, via de regra secundárias a um
abscesso; elas podem ser cutâneas (espontânea ou secundária a
uma drenagem percutânea), vesical (identificável por meio de
pneumatúria, fecalúria ou infecções urinárias recorrentes), vaginal ou
para intestino delgado. O surgimento dessas fístulas associa-se com
a localização do processo infeccioso e as estruturas adjacentes a
esse processo. Nesses casos, a conduta inicial é a eliminação do
processo infeccioso e controle do processo inflamatório; em seguida
deve-se realizar exame colonoscópio avaliando criteriosamente a
mucosa e descartando com todos os esforços possíveis o
diagnóstico de neoplasia ou Doença de Crohn, pois esses
diagnósticos necessitam de abordagem cirúrgica diferente da
diverticulite. Após descartadas essas hipóteses de maneira eletiva
realiza-se em único tempo a ressecção da fístula excisando-se o
cólon sigmoide com confecção de anastomose entre o cólon
descendente e o reto.
- Peritonite generalizada pode ocorrer secundariamente a um
divertículo perfurado onde o organismo não consegue tamponar o
foco infeccioso incorrendo em extravasamento de conteúdo fecal
para a cavidade abdominal ou pode surgir ainda de um abscesso que
rompe incorrendo em extravasamento de pus para a cavidade, em
tais circunstâncias a laparotomia exploradora é indicada para a
realização de lavagem exaustiva da cavidade e realização de
ressecção do segmento intestinal doente seguido de confecção de
colostomia, preferencialmente pela técnica a Hartmann. Debelado o
processo infeccioso, em 10 semanas pode-se avaliar a reconstrução
do trânsito intestinal com fechamento da colostomia.
- Obstrução é uma complicação relativamente incomum, porém
pode acontecer quando ocorre um estreitamento do sigmoide
secundário a hipertrofia da camada muscular do intestino. Outra
causa de obstrução, essa com maior frequência, se dar quando há
um intenso processo inflamatório secundário a diverticulite onde o
delgado adere ao plastrão ou ao abscesso, gerando uma obstrução
pela aderência; nesses casos realiza-se a passagem de sonda
nasogástrica em aspiração, associado a antibioticoterapia
endovenosa e drenagem do abscesso, visando assim debelar o
processo infeccioso e aliviar a tensão sobre a alça.
Dentre os diagnósticos diferenciais que devem ser aventados
destacam-se:
Neoplasia colorretal; Doença inflamatória intestinal; Apendicite
aguda; Colite infecciosa; Colite isquêmica; Cólica renal; Patologias
ginecológicas.
No seguimento dos pacientes com doença diverticular, após dois
quadros a agudos complicados cada vez mais vem-se indicando
sigmoidectomia eletiva por abordagem videolaparoscópica, visando
minimizar as chances de cirurgias de emergência e colostomias.

CONCLUSÃO

Doença diverticular apresenta grande relevância epidemiológica,


além de considerável morbimortalidade, principalmente nos casos
complicados, é uma patologia corriqueiramente conduzida pelos
profissionais da cirurgia geral, porém o clínico também deve estar
apto a conduzir esses pacientes dentro das suas limitações técnicas,
e, por isso, o domínio teórico das nuances dessa patologia devem
estar presentes na formação médica. A seguir, deixaremos
esquematizado algumas sugestões de tratamentos para quadros
agudos de diverticulite.
Tratamento ambulatorial:
- ATB VO por 7 a 10 dias.
- Dieta líquida nos primeiros 2-3 dias.
- Reavaliação em 2-3 dias, a cada 7 dias após até os sintomas.
- ATB deve cobrir bacilos gram-negativos e anaeróbios,
particularmente E. coli e B. fragilis.
- Ciprofloxacina 500mg (12/12h) + Metronidazol 500mg (8/8h);
Sulfametoxazol/Trimetoprim, 800/160 (12/12h) + Metronidazol
500 mg (8/8h); Amoxicilina/Ác. Clavulânico, 875/125 (12/12h);
Moxifloxacina 400 mg (1 x dia).
Tratamento Hospitalar:
- ATB IV ou VO (a seguir).
- Jejum.
- Fluidoterapia IV.
- Controle da dor.
- Repetir imagem após 2 ou 3 dias se não houver sinais de
melhora.
- Deve ser mantido por via IV por 3 a 5 dias, então trocado para
VO. Tendo em conta a boa resposta ao tratamento.
– Ertapenem 1g (1 x dia); Piperacilina-Tazobactan 3,375g
(6/6h); Ticarcilina/Ác. Clavulânico 3,1g (4/4h); Cefazolina 1-2g
(8/8h) + Metronidazol 500 mg (8/8h); Cefuroxima 1,5g (8/8h) +
Metronidazol 500 mg (8/8h); Ceftriaxona 1g (1 x dia)+
Metronidazol 500 mg (8/8h); Cefotaxima 1-2g (6/6h) +
Metronidazol 500 mg (8/8h); Ciprofloxacina 400mg (12/12h) +
Metronidazol 500 mg (8/8h).

REFERÊNCIAS
1. Townsend MC. Sebastian: Tratado de Cirurgia. 20. ed. Elsevier; 2019.
2. Cirocchi R. A historical review of surgery for peritonitis secondary to acute colonic
diverticulitis: from Lockhart-Mummery to evidence-based medicine. World Journal of
Emergency Surgery. 20 de jan. 2017.
3. Ribas Y, et al. Int J Colorectal Dis. 2010 Nov; 25(11): 1363-70. Epub 2010 Jun 5.
4. Fingerhut A, Veyrie N. Complicated diverticular disease: the changing paradigm for
treatment. Rev. Col. Bras. Cir., Rio de Janeiro; 39(4): 322-327, Aug. 2012 [acesso em 26
out. 2019].
5. Cantao AFB, et al. Jejunal diverticulitis as a cause of acute abdomen. J. Coloproctol.,
Rio de Janeiro, 2016 Mar.; 36(1):50-52 [acesso em 26 out. 2019].
. Muglia VF. Doença diverticular dos cólons: evolução da abordagem terapêutica e papel
da tomografia computadorizada nos quadros agudos. Radiol Bras., São Paulo, 2017
Apr.; 50(2): IX-X. [acesso em 26 out. 2019].
7. Yucesoy AN. A double row epiploicoplasty for primary closure of free perforated
sigmoid diverticulitis. J. Coloproctol., Rio de Janeiro, 2018 Sept.; 38(3): 254-256
[acesso em 26 out. 2019].
Parte 2 | Capítulo 19

Pancreatite aguda e crônica


Autores: João José da Ponte Portela e Anderson José Vieira da Silva

1. Pancreatite aguda
1.1. Introdução
No fim do século XIV e início do século XX diversos
pesquisadores como Rugero Oddi e Claude Bernard descreveram
detalhes da anatomia biliopancreática e sua fisiologia. O
desenvolvimento desses estudos culminou com os trabalhos
publicados por Reginald H. Fitz e H. Chiari, que inauguraram o
estudo da pancreatite aguda e suas complicações.
Desde então, a sua fisiopatologia e tratamento vêm sendo
estudados, no entanto, os dados sobre a doença no Brasil ainda são
bastante escassos, especialmente dados atualizados, e a maior
parte das fontes de informação sobre ela provêm de estudos
realizados na Europa e nos Estados Unidos.

1.2. Definição e etiologia


A pancreatite aguda é um processo inflamatório agudo do
pâncreas que pode envolver áreas peripancreáticas ou sistemas de
órgãos remotos. Pode ser causada por problemas congênitos,
hereditários ou adquiridos e ter natureza química, traumática ou
infectoparasitária. A litíase biliar e ingestão de álcool são as
principais causas (correspondem, juntas, a aproximadamente por
80% dos casos). Já as causas idiopáticas representam 10% e os
outros 10% dizem respeito a causas diversas, como uso de drogas,
cirurgia abdominal, hipercalcemia, hipertrigliceridemia, vasculite,
tumores pancreáticos, isquemia ou embolia, transplante de órgãos,
insuficiência renal avançada e parasitas intraductais, dentre outras.
Quadro 1: Principais fatores etiológicos da pancreatite aguda.
DEFINIDAS

Colelitíase

Etilismo

Hipertrigliceridemia

Pós-CPRE

Drogas

Autoimune

Hereditária

Trauma

Infecções

Hipercalcemia

Pós-operatório

CONTROVERSAS

Disfunção do esfíncter de Oddi

Pâncreas divisum

Fonte: Guimarães-Filho, Maya, Leal, Melgaço.1

1.3. Apresentação clínica


A doença tem apresentação clínica e gravidade variáveis. O
principal sintoma é dor abdominal, presente em mais de 95% dos
pacientes. Geralmente é aguda, de instalação súbita, localizada na
parte superior do abdome, com irradiação dorsal e intensidade
moderada a forte, apresentando piora com a alimentação
inadequada ou uso de álcool. A dor é acompanhada, em 90% dos
casos, por náuseas e vômitos, que podem ser impassíveis de
contenção.
1.4. Classificações e tratamento
Em relação aos tipos, a pancreatite aguda abrange desde formas
rápidas com recuperação completa a formas graves envolvendo
necrose pancreática e peripancreática, abscessos, falência múltipla
órgãos e morte. Em 85% a 90% dos casos, a pancreatite aguda tem
um componente apenas de inflamação pancreática e apresenta
mínima disfunção orgânica, com taxas de mortalidade inferiores a
2%. Por sua vez, em aproximadamente 10% dos casos, ocorre
necrose no parênquima pancreático e nos tecidos adjacentes, o que
pode evoluir com infecção e com as complicações isquêmicas,
obstrutivas, perfurativas e hemorrágicas das vísceras próximas,
levando à falência de órgãos e à morte.1 Nesse sentido, em 1992, no
“Simpósio de Atlanta”, foram definidas duas formas clínicas de
pancreatite aguda: a intersticial (leve ou edematosa) e a grave
(necro-hemorrágica ou necrosante).
Em geral, a amplidão das lesões pancreáticas tem relação com a
gravidade da doença e por isso é possível classificar a doença em
branda ou grave nos dois primeiros dias da admissão, com base na
apresentação clínica, na avaliação laboratorial de rotina e no exame
tomográfico. Na forma branda, que inclui a grande maioria dos
casos, há melhora com a reposição de líquidos e eletrólitos.
O Tratamento pode ser feito nas enfermarias de medicina interna
e a cura é atingida em por volta de uma semana. 1
A forma grave, por sua vez, é passível de ser tratada
cirurgicamente. O tratamento cirúrgico consiste na
necrosectomia/desbridamento e é indicado a todos os pacientes
que apresentarem necrose pancreática infectada e necrose estéril
com sintomas como febre crônica, letargia, inapetência alimentar e
náusea. Nos pacientes hemodinamicamente instáveis, a cirurgia
deve ser feita o mais rápido possível, enquanto nos pacientes
estáveis recomenda-se adiar a cirurgia por, pelo menos, quatro
semanas, para fins de estabilização do processo inflamatório. Com
os raros dados disponíveis na literatura mundial não é possível
precisar qual técnica operatória é superior nem qual condiciona uma
menor morbidade e menor mortalidade. Porém, atualmente, a
recomendação é que se inicie a intervenção com técnicas
minimamente invasivas, como drenagem endoscópica e drenagem
percutânea, pois resultam em menos efeitos adversos e morbidade.
Na impossibilidade do uso dessas técnicas, podem ser realizadas
cirurgia aberta ou por videolaparoscopia, devendo a indicação ser
individualizada e dependente da experiência do cirurgião.4

1.5. Pancreatite crônica


A pancreatite crônica se caracteriza pela fibrose progressiva do
parênquima glandular, inicialmente focal e, depois, difusa por todo o
pâncreas. Geralmente há persistência das lesões, mesmo com a
retirada do fator causal, determinando alterações pancreáticas
residuais anatômicas e funcionais, a dor crônica incapacitante e
perda permanente da função endócrina e exócrina.5

1.6. Etiologia
O álcool é o principal fator etiológico da doença e atua como
cofator em pessoas que são suscetíveis a desenvolver a patologia
por outros motivos, sejam eles genéticos ou ambientais. Já o
tabagismo aumenta o risco de pancreatite crônica e acelera a
progressão de todas as formas da condição. O risco da doença é 7 a
17 vezes maior para tabagistas em relação a não fumantes.5
Figura 1: Pancreatite crônica alcóolica. Seção histológica do
pâncreas de um paciente com pancreatite crônica induzida pelo
álcool representando fibrose abundante e atrofia acinar.
Fonte: Sampaio.6

No que diz respeito aos outros fatores etiológicos, sistemas de


classificação como a do TIGAR-O, proposta por Etemad e Whitcomb,
caracterizam a doença em vários fatores e mecanismos conhecidos
que, em conjunto, são denominados modificadores de risco. Esses
modificadores de risco e cofatores genéticos, múltiplos e
ambientais, em interação produzem a expressão da doença,
induzindo a pancreatite.7
Cada um dos fatores de risco identificados no TIGAR-O (figura 2)
predispõe o indivíduo a desenvolver pancreatite crônica.
Figura 2: Classificação TIGAR-O
Fonte: Dias.8

1.7. Tratamento
O controle da pancreatite crônica deve seguir abordagem
sequencial e escalonada, a começar pela eliminação de fatores
exógenos tóxicos como o álcool e o fumo, seguido pela
suplementação de enzimas pancreáticas e pelo uso criterioso de
analgésicos. A abstinência do álcool é fundamental, especialmente
quando ele é o pilar causador da doença. Pacientes com sintomas
persistentes podem passar por tratamentos mais invasivos. A
estimativa é de que até 50% dos pacientes desenvolvam sintomas
progressivos ou clinicamente intratáveis e que se tornem candidatos
ao tratamento cirúrgico. A principal indicação cirúrgica é a dor
abdominal intratável, mas ela também é indicada nas complicações
da pancreatite crônica, como pseudocistos, fístulas pancreáticas,
estenoses, comprometimento de órgãos adjacentes ou suspeita de
neoplasia.9
Devido à causa multifatorial da dor e ao pouco entendimento da
fisiopatologia da pancreatite crônica, várias opções cirúrgicas foram
desenvolvidas ao longo do tempo. Os procedimentos têm sido
classificados em três categorias: descompressão ductal,
denervação do pâncreas e ressecção proximal, distal ou total do
pâncreas. As estratégias de denervação se mostraram inefetivas ou
inviáveis, o que restringiu a discussão do tratamento cirúrgico à
descompressão versus ressecção. Nas últimas décadas surgiram
novos procedimentos híbridos, que combinam as duas modalidades
e são seguros e efetivos, na medida em que apresentam os
benefícios de remissão da dor dos procedimentos cirúrgicos de
ressecção, associados às baixas taxas de morbidade e mortalidade
dos procedimentos descompressivos.9
Em 1987, Frey e Smith desenvolveram uma técnica que alia as
duas vantagens de forma máxima. Ela consiste na ressecção local
da cabeça do pâncreas com uma pancreatojejunostomia
longitudinal (figura 2). Ao contrário de outros procedimentos muito
utilizados, nos quais o colo pancreático é dissecado da junção
esplenomesentérica e seccionado; neste o colo é preservado
intacto, com o corpo e cauda do órgão, o que facilita e reduz os
riscos da operação, gerando taxas de mortalidade próximas a zero.
Figura 3 – Principais passos da técnica de Frey, em que (A)
corresponde à abertura do ducto de Wirsung longitudinalmente
retirando cálculos e desfazendo estenoses; (B) enucleação do tecido
pancreático da cabeça e processo uncinado do pâncreas em
contiguidade com a abertura do ducto de Wirsung; (C) visão
transversal que evidencia a margem posterior de ressecção da
cabeça pancreática em contiguidade com o ducto pancreático
principal. (D) reconstrução com anastomose pancreatojejunal.
Fonte: Gestic.10

Conclusão
Foi detectada severa escassez de estudos sobre a realidade da
pancreatite tanto aguda quanto crônica no Brasil, especialmente no
que diz respeito à epidemiologia da doença. Nesse sentido, ressalta-
se a importância de empreender novos estudos na área no intuito de
contribuir para o desenvolvimento de tratamentos mais eficazes, a
exemplo da técnica de Frey, no caso da pancreatite crônica, que não
possui equivalente na contraparte aguda da doença.
Por sua vez, também é preciso reconhecer os inúmeros avanços
na compreensão e no tratamento da pancreatite desde que
começou a ser estudada no século XIX, conforme citado ao longo
deste trabalho.

Referências
1. Guimarães-Filho M, Maya M, Leal P, Melgaço A. Pancreatite aguda: etiologia,
apresentação clínica e tratamento. Revista Hospital Universitário Pedro Ernesto
[internet]. 2014; 8(1) [acesso em 2020 jan. 26].
Parte 2 | Capítulo 20

Doenças inflamatórias intestinais


Autores: Leonillson Joanh Paullo Vilarinho Barbosa, Joannillson
Taygon Vilarinho Barbosa e Cádmo Silton Andrade Portella

1. INTRODUÇÃO
Estudaremos neste capítulo as Doenças Inflamatórias Intestinais,
dando enfoque à Doença de Crohn (DC) e à Retocolite Ulcerativa
(RCU), as quais são assuntos muito abordados em provas de
residência e que possuem uma grande importância para a prática
clínica.
Ambas as doenças podem possuir apresentações clínicas
semelhantes e, dessa maneira, é lançado mão de subsídios
laboratoriais e de imagem para que se possa chegar a um
diagnóstico final. Em cerca de 10% dos casos não se é possível
diferenciar as doenças; nesse caso ela é denominada de colite
indeterminada.
Figura 1: O padrão saltatório da doença ajuda no diagnóstico de qual
DII se trata
Fonte: Johns Hopkins Medicine

1.1. Fisiopatologia
Não há uma causa bem definida que explique ao certo o
surgimento dessas doenças, mas acredita-se que a resposta estaria
em alterações da imunorregulação intestinal. Entretanto, sabe-se que
fatores genéticos (história familiar etc.) e ambientais (patógenos
como: Salmonella, Campylobacter e anaeróbios); fatores
psicossociais; tabagismo; hábitos alimentares; anticoncepcionais e
anti-inflamatórios estão ligados às patogêneses destas.
Obs.: Curiosamente tabagismo é fator protetor para risco de
desenvolvimento de RCU, enquanto aumentaria em duas vezes o
risco de desenvolvimento de DC.

2. DOENÇA DE CROHN
2.1. Epidemiologia
Tem um pico de incidência etária bimodal (15 aos 25 anos e dos
55 aos 60 anos), principalmente em brancos, judeus principalmente
de áreas urbanas, e tem o aumento do seu risco de incidência com o
uso de anticoncepcionais orais em mulheres.

2.2. Patologia
Na DC o trato gastrointestinal pode ser todo afetado desde a boca
até o ânus em padrão descontínuo, tendo sítio de preferência para
instalação no intestino delgado (90% dos casos), principalmente o
íleo terminal. Dessa maneira, há o padrão de “pedra de calçamento”
em que há uma mucosa sadia alternada com a mucosa lesionada
(padrão descontínuo). De maneira mais histológica pode ser
observado granulomas não caseosos formados por infiltrações
frouxas de macrófagos e úlceras aftoides.

2.3. Diagnóstico
Para realização do diagnóstico não se pode ater apenas a um
aspecto clínico ou laboratorial, é necessário um conjunto de
indicativos laboratoriais, radiológicos, endoscópicos, além de
anamnese para se fechar o diagnóstico e se excluir possíveis
diagnósticos diferenciais tais como RCU, diverticulite, gastroenterite
eosinofílica, apendicite, linfomas, entre outros.
A manifestações clínicas apresentam-se com períodos de
exacerbação alternados com períodos de remissão. As
manifestações intestinais mais características se apresentam como
dor abdominal, diarreia e consequente perda ponderal, que também
se associa à má absorção intestinal, que ocorre principalmente nas
ileocolites. Entretanto, a DC pode afetar da boca ao ânus, portando os
sintomas vão variar conforme local de instalação e tipo de agressão
ao organismo, podendo ser do tipo inflamatório, fibroestenosante ou
fistulizante. Dessa maneira os sintomas variam desde febre baixa,
astenia, úlceras aftoides em boca, sintomas dispépticos, diarreia
sanguinolentas, incontinência anal, abcessos, suboclusões ou
obstruções, fístulas enterocutâneas, perianais etc. Ainda há a
existência de manifestações extraintestinais (MEI), mas estas serão
vistas à parte por serem comuns a RCU e DC, apesar de leve
predileção por portadores de DC.
No exame físico podem ser observados achados a ectoscopia
como aftas orais, fístulas enterocutâneas etc., além de dor a
palpação abdominal, massas palpáveis, distensão devida a
processos obstrutivos.
O laboratório pode mostrar anemia, leucocitose VHS e PCR
aumentados, distúrbios hidroeletrolíticos e albumina diminuída
devido ao processo de desnutrição. Quanto a sorologias, os dois
principais marcadores são o p-ANCA, anticorpo antineutrofílico
citoplasmático perinuclear (detectado entre 60%-70% dos portadores
de RCU e de 5%-10% dos de DC) e o ASCA, anticorpos anti-
Saccharomyces cerevisiae (presente em 60%-70% dos portadores de
DC e 10%-15% dos de RCU).
A radiografia simples pode indicar dilatações de alças,
perfurações e em caso de uso de contraste evidenciar fistulas e
estenoses. Ressonância magnética e Tomografia computadorizada
podem evidenciar espessamento mural >2cm e abcessos
intracavitários. Enterotomografia e enteroressonância têm obtido
melhores resultados para avaliação do intestino delgado.

2.4. Tratamento
Não existe tratamento que forneça a cura para a Doença de Crohn,
sendo assim, o objetivo principal é buscar induzir e manter a
remissão. O tratamento clínico se baseia em suporte clínico e
medicamentoso.
O tratamento deve ser feito em etapas (indução da remissão e
manutenção), tendo como arsenal terapêutico usado conforme
gravidade da doença, há corticoides, sulfassalazina,
antibioticoterapia (com metronidazol e ciprofloxacino),
imunossupressores (azatioprina e ciclosporina) além de anticorpo
monoclonais contra mediadores essências à cascata inflamatória:
inibidores do TNF-alfa (infliximabe ou adalimumabe) e anti-integrina
(natalizumab e vedolizumab).
Ele é iniciado após um sistema de avaliação da atividade da
doença baseado no número de evacuações, dor abdominal, status
geral, perda ponderal, ocorrência de fístulas e de manifestações
patológicas a distância, que permite classificar a doença em leve,
moderada ou grave.
De maneira geral, na doença leve a moderada a droga de primeira
escolha são os derivados do 5-ASA (estratégia dita como STEP UP:
início com medicações menos potentes). Uma vez alcançada a
remissão a manutenção também é realizada com os derivados de 5-
ASA. Já nos no caso das doenças moderada a grave a droga de
primeira escolha são os agentes anti-TNF, associados a algum
imunomodulador (estratégia dita como TOP DOWN: combinação de
duas drogas, sendo assim mais efetiva). A mesma terapia de indução
que responde bem, sendo dupla deve ser mantida para terapia de
manutenção.
No caso de doença grave ou fulminante, torna-se uma emergência,
devendo as complicações – seja perfuração, abscesso ou obstrução
– serem resolvidas com rafia, drenagem e tratamento clínico inicial,
respectivamente. Além dessas condutas citadas, o uso de
antibioticoterapia deve ser preconizado, cobrindo gram-negativos
entéricos e anaeróbicos. Após o tratamento instituído e melhora
clínica, agentes biológicos ou corticoides devem ser iniciados.
O tratamento cirúrgico tem um papel restrito devido à patologia da
DC (doença que tem padrão saltatório por todo o trato
gastrointestinal), procurando sempre tratamento conservador
inicialmente, com exceção daquelas associadas a situações que
ameaçam a vida do paciente como em sepse e hemorragia maciça.
De 70%-75% dos pacientes com DC precisam cirurgia em algum
momento para aliviar os sintomas se o tratamento medicamentoso
fracassar.
Deve-se buscar realizar sempre a menor ressecção do intestino,
optando-se por estricturoplastia às enterectomias, pois recidivas são
comuns nas anastomoses, aumentando assim chances de
reabordagens. Após cirurgia, deve-se considerar azatioprina e
metronidazol durante pelo menos 3 meses, pois têm demonstrado
reduzir a recorrência.
As opções cirúrgicas mais comuns são a ressecção local com
anastomose primária (mais comum), estenoplastia (múltiplas áreas
estenosadas ao longo do segmento intestinal), colectomia subtotal
com ileoproctostomia e colectomia total com ileostomia.

2.5. Manifestações extraintestinais (mei)


As manifestações extraintestinais (MEI) estão presentes nas DII
em uma variação de 21% a 36% dos pacientes, sendo esta variação
influenciada por área geográfica estudada, duração e da extensão da
doença. Doença ativa, história familiar positiva para DII (70% a 84%) e
presença de alguns alelos HLA tem sido associada a elas.
Podem afetar qualquer órgão ou sistema, sendo os órgãos mais
afetados a pele, articulações, olhos e fígado. Há uma correlação entre
episódios de atividade intestinal e exacerbação dos sintomas
extraintestinais (como artrite periférica, eritema nodoso e lesões
aftosas orais). Entretanto, algumas manifestações têm curso
independente da atividade intestinal, como, por exemplo, uveíte,
artrite axial, pioderma gangrenoso e colangite esclerosante primária.
Outras manifestações mais raras incluem bronquiectasia, bronquite,
osteomalacia, osteoporose, nefrolitíase, tromboembolismo e
vasculites.

3. RETOCOLITE ULCERATIVA (RCU)


3.1. Epidemiologia
A doença pode iniciar em qualquer idade, tendo um pico de
incidência etária bimodal (20 aos 40 anos, com muitos estudos
mostrando um segundo pico de incidência dos 55 aos 60 anos), sem
predileção por sexo, sendo judeus preferencialmente afetados.

3.2. Patologia
Esta doença se inicia no reto e progride de maneira ascendente e
contínua, restringindo-se até no máximo o cólon (metade das vezes
restringe-se ao reto, indo no máximo até o sigmoide e em apenas
20% dos casos acomete todo o cólon). É possível se perceber de
maneira macroscópica que ela acomete predominantemente a
camada mucosa do cólon. Em uma análise mais histológica, uma
característica muito observada é a presença de neutrófilos invadindo
o epitélio geralmente nas criptas, e com isso há a “criptite”.

3.3. Diagnóstico
As manifestações clínicas apresentam-se com períodos de
exacerbação alternados com períodos de remissão (há pessoas que
apresentam doença crônica e contínua). Os sintomas variam
conforme a apresentação e a extensão das lesões, podendo haver
manifestações extraintestinais associadas. As manifestações
clínicas mais comuns são diarreia, sangramento retal, eliminação de
muco nas fezes e dor abdominal. Em casos exuberantes pode haver
perda ponderal, febre e anorexia. Normalmente não há grandes
alterações ao exame físico.
O laboratório pode mostrar anemia, leucocitose, VHS e PCR
aumentados, distúrbios hidroeletrolíticos e hipoalbuminemia.
Leucócitos na coprologia funcional. Quanto a sorologias, os dois
principais marcadores são o p-ANCA e o ASCA (a presença de p-
ANCA + e ASCA – mostra uma especificidade de 98% p RCU).
A radiografia simples é útil para detectar a forma fulminante da
doença. Mas como o tratamento é realizado de acordo com a
extensão da doença, a retossigmoidoscopia flexível é útil para definir
as porções acometidas. A colonoscopia é contraindicada na suspeita
de megacólon tóxico, devido ao risco de perfuração.

3.4. Tratamento
A gravidade da doença é melhor avaliada pela intensidade dos
sintomas e pode ser classificada pelos critérios estabelecidos por
Truelove e Witts, úteis na definição terapêutica de indução da
remissão e manutenção: 1) leve (menos de 3 evacuações por dia,
com ou sem sangue, sem comprometimento sistêmico e com VHS
normal); 2) moderada (mais de 4 evacuações por dia com mínimo
comprometimento sistêmico); 3) grave (mais de 6 evacuações por dia
com sangue e com evidência de comprometimentos sistêmicos, tais
como febre, taquicardia, anemia e VHS acima de 30). Megacólon
tóxico também devem ser considerado grave.
De maneira geral, nas colites leves a indução é praticada com a
mesalazina retal. Em caso de refratariedade é possível associação
com corticoide retal. Para a manutenção o tratamento pode ser
mantido com mesalazina retal. Para os casos de colite leve a
moderada a terapia de escolha serão os derivados de 5-ASA, mas por
via oral. Em caso de colites graves a fulminantes é necessário
suporte clínico inicial e, em alguns casos refratários, realização de
colectomia total. A indução e a remissão são realizadas com
derivados de 5-ASA, inicialmente, mas em caso de refratariedade
imunomoduladores e até biológicos (anti-TNF) devem ser
considerados.
De 25%-30% dos pacientes com CU podem precisar cirurgia se o
tratamento médico não for completamente bem-sucedido. Observem
que pela patologia da doença, esta manifesta-se de maneira restrita
ao cólon, logo o tratamento cirúrgico com ressecção colônica torna-
se curativa, sendo a proctocolectomia restauradora com IPAA (Ileal
Pouch Anal Anastomosis) o padrão de escolha. Assim sendo, as
indicações de tratamento cirúrgico são: 1) refratariedade ao
tratamento clínico; 2) displasias e carcinomas (colectomia); 3) colites
fulminantes e refratárias e megacólon toxico (colectomia total com
ileostomia mais sepultamento do reto a Hartmann (ou fístula
mucosa) e 3) sangramento colônico maciço.
Figura 1: Proctocolectomia restauradora com IPAA (Anastomose Anal
da Bolsa Ileal)
Fonte: Medscape.8

3.5. Complicações locais das DII


Perfuração (ruptura) do intestino: a perfuração intestinal ocorre
quando a inflamação crônica e a ulceração do intestino enfraquecem
a parede intestinal, culminando com uma abertura, representando
potencialmente risco de morte devido a peritonite. Na retocolite, essa
complicação está geralmente relacionada ao megacólon tóxico (ver
abaixo). Na Doença de Crohn (DC) ela normalmente ocorre como
resultado de um abscesso ou fístula.
Colite fulminante: quando uma inflamação grave faz com que o
cólon se torne extremamente dilatado, ocorre o que se chama íleo
paralítico. Os movimentos peristálticos paralisam temporariamente e
ocorre uma distensão abdominal. O raio X abdominal pode revelar
uma concentração aumentada de gases localizada em regiões
paralisadas do intestino grosso.
Megacólon tóxico: é considerado a complicação mais grave das
DII (mais comum na RCU). O cólon se dilata, perdendo a capacidade
de executar a peristalse de forma adequada. Manifesta-se com
leucocitose, febre alta e dor abdominal, com sinais de peritonite. A
radiografia simples indica dilatação em alça colônica >6cm. O
suporte clínico deve ser oferecido o quão breve possível (dieta zero,
sonda nasogástrica, reposição hidroeletrolítica). Caso o paciente não
apresente melhora do quadro dentro de um período de 24 a 48 horas,
a cirurgia pode ser necessária com colectomia total.
Maior risco de câncer colorretal: de 5% a 8% dos pacientes
portadores da RCU desenvolverão câncer colorretal em 20 anos a
partir do momento do diagnóstico da doença. É menos comum na
DC. O risco de câncer colorretal aumenta de acordo com a gravidade
e a duração da doença.
Tabela 1: Tratamento clínico das DII
CU DISTAL CU EXTENSA DC

leve 5-ASA retal 5-ASA tópico e oral Sulfassalazina


CS retal 5-ASA para
doença
colônica
METRO ou
CIPRO. Para
DP
BUD para
doença ileal
e/ou cólon
direito

CS oral GCS oral


5- ASA retal ou oral 5-ASA tópico e oral AZA ou 6-MP
moderada
CS retal AZA ou 6-MP MTX
Anti-TNF Anti- TNF

CS oral ou EV
MTZ
subcutâneo
ou IM
5-ASA retal e oral CS EV
infliximabe EV
severa GCS oral ou intravenoso CSA EV
ou
CS retal Infliximabe EV
adalimumab
SC ou
certolizumab
SC

AZA ou 6-MP
ou
resistente AZA ou 6-MP AZA ou 6-MP ou
Anti-TNF
ou ou anti-TNF Anti-TNF
ou
dependente ou combinação de ou combinação
combinação
dos CS AZA/6-MP + anti-TNF AZA/6-MP + Anti-TNF
AZA/6-MP +
Anti-TNF

5-ASA retal ou oral 5-ASA oral AZA ou 6-MP


quiescente
AZA ou 6-MP oral AZA ou 6-MP oral ou MTX

antibióticos
AZA ou 6-MP
orais
perianal
infliximabe EV
adalimumab
SC

Tabela 1 – 5-ASA, ácido 5-aminossalicílico; 6-MP, 6 mercaptopurina;


AZA, azatioprina; BUD, budesonida; CSA, ciclosporina A; CS,
corticoides; IM., intramuscular; EV., endovenoso; MTX, metotrexato;
s.c., subcutâneo; TNF, fator de necrose tumoral.; DP, doença perianal;
METRO, metronidazol; CIPRO, ciprofloxacino de displasia.
Fonte: World Gastroenterology Organization Practice Guidelines.1

Tabela 2: Resumão
RCU DC

APRESENTAÇÃO CLÍNICA
Manifestações + ++
Extraintestinais

Sangue e muci nas fezes ++ +

Fístulas, estenoses e
- +
doenças perianal

TRATAMENTO

Responde a ATB Não Sim

Potencial
Resolutividade cirúrgica Conservadora
curativo

SOROLOGIA

Anca+ ++ +

Asca+ + ++

PATOLOGIA

Granuloma não
Biópsia Criptite
caseoso

Padrão Contínuo Saltatório

Camada acometida Mucosa Transmural

REFERÊNCIAS
1. Bernstein C, et al. Doença inflamatória intestinal. World Gastroenterology Organization
Practice Guidelines. 2015.
2. Grinman AB. Manifestações extraintestinais das doenças inflamatórias intestinais.
Brazilian Journal Of Health and Biomedical Sciences. 2012; 11(4).
3. Sander GB, et al. Retocolite Ulcerativa. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas. 2002.
4. Motal ES et al. Manifestações extraintestinais em doença de Crohn e retocolite
ulcerativa: prevalência e correlação com o diagnóstico, extensão, atividade, tempo de
evolução da doença. Rev bras. colo-proctol. 2007; 27(4).
5. Pontte ACA, et al. Consensus guidelines for the management of inflammatory bowel
disease. Brazilian Study Group of Inflammatory Bowel Diseases. 2010; 47(3).
. Goldman L, Ausiello D. Cecil Medicina Interna. 24. ed. Saunders Elsevier; 2012.
7. Sabiston. Tratado de cirurgia: A base biológica da prática cirúrgica moderna. 19. ed.
Saunders Elsevier.
. Brewer MBB, Bafford AC. Ileal Pouch-Anal Anastomosis Technique. Medscape; 2019.
Parte 2 | Capítulo 21

Apendicite aguda
Autores: Leonillson Joanh Paullo Vilarinho Barbosa e Joannillson
Taygon Vilarinho Barbosa

1. Epidemiologia
É a causa mais comum de abdômen agudo, sendo também a
emergência cirúrgica geral mais comum. A prevalência de apendicite
durante a vida é cerca de 7% em países ocidentais. O fator causal
mais importante de apendicite aguda é a obstrução luminal, tendo
como predileção em paciente do sexo masculino e faixa etária de
adultos jovens.

2. Bases anatômicas
O apêndice é uma formação em forma de dedo de luva que se
projeta do ceco, aproximadamente a 2,5 cm abaixo da válvula
ileocecal, tendo como medidas, geralmente, 0,5 cm de largura e
tamanho médio de 5 a 10 cm, mas podendo ser de um até 30 cm.
Embora sua implantação seja num ponto constante, a orientação do
órgão como um todo varia de acordo com a posição da sua ponta.
Segundos estudos, a maior prevalência é retrocecal (65,3%);
seguidos de pélvica (31,6%); subcecal (2,3%); dentre outros.

3. Fisiopatologia
Trata-se da inflamação aguda do apêndice vermiforme. A
apendicite aguda resulta da obstrução da luz do apêndice provocada
por, na grande maioria das vezes, hiperplasia linfoide, sendo este o
fator mais comum encontrado em pacientes menores de 20 anos,
enquanto a obstrução por fecálito é mais comum em idoso.
Causas de apendicite aguda:
OBSTRUÇÃO DA LUZ APENDICULAR

Coprólitos (mais comum) Restos de vegetais

Hipertrofia de tecidos linfoides Sementes de frutas

Cálculos Corpos extranhos (ossos etc.)

Parasitas intestinais
Bário espessado (enema opaco)
(Ascaris, Oxyurus)

Idiopático

Após a obstrução, a pressão intraluminal aumenta, o que pode


acarretar isquemia e desenvolvimento de processo inflamatório
transluminal. Com isso, pode ocorrer proliferação bacteriana,
gangrena e perfuração do apêndice cecal. Esse processo ocorre
normalmente dentro de 24 horas.
Os principais achados histológicos são congestão vascular e
edema, exsudato fibrinoleucocitário e perfuração com abscesso em
alguns casos.
Pode ser dividida em quatro fases por ordem:
1) Fase edematosa;
2) Fase fibrinosa;
3) Fase flegmonosa;
4) Fase perfurativa ou gangrenosa.

3.1.Bacteriologia
A apendicite aguda é uma infecção polimicrobiana, tendo a
associação de germes aeróbios e anaeróbios, sendo os principais
agentes encontrados nas culturas a Escherichia coli e o Bacteroides
fragilis.

3.1.1. Diagnóstico
O diagnóstico de apendicite aguda é eminentemente clínico,
portanto, o conhecimento dos sinais e sintomas associados e a
avaliação precoce do cirurgião são importantes para que isso possa
ser possível, além de se possibilitar um bom manejo terapêutico e
um bom prognóstico cirúrgico. Abaixo alguns sintomas comuns em
apendicite aguda:
Dor abdominal iniciada em região periumbilical que posteriormente migra para Fossa
Ilíaca Direita (FID) – 50% a 60% dos pacientes, sendo o SINTOMA CLÁSSICO de
apendicite aguda

Anorexia (mais frequente)

Náuseas (frequente)

Vômito (incomum)

Discreta elevação da temperatura

Constipação ou Diarreia (menos comum)

No exame abdominal pode se observar percussão dolorosa no


ponto de McBurney (ponto situado entre espinha ilíaca
anterossuperior e o umbigo, a dois terços de distância deste), além
de defesa muscular em QID. A seguir, alguns sinais semiológicos
sugestivos de apendicite:
Blumberg Dor à descompressão abdominal súbita, sugestivo de peritonite

Rovsing Dor em FID após pressão em fossa ilíaca esquerda

Psoas Dor à extensão de coxa direita

Obturador Dor durante a rotação interna passiva da coxa direita flexionada

Aumento da temperatura axilar em 1°C em relação a temperatura


Lenander
axilar

Dor a compressão da FID durante a elevação do membro inferior


Lapinsky
direito

Summer Hiperestesia na FID

Dunphy Dor a percussão abdominal ou quando o paciente tosse

Idosos e imunossuprimidos podem não apresentar clínica


sugestiva para apendicite aguda, ocasionando muitas vezes retardo
no diagnóstico e aumento das comorbidades.
Diagnósticos diferenciais sempre devem ser pensados na
suspeita de apendicite aguda:
Urinários Pielonefrite, ureterolitíase

Gravidez tubária rota, ruptura ou torção de cisto ovariano, abscesso


Em mulheres
tubo-ovariano

Adultos jovens Ileíte de chron

Anatômicos Diverticulite colônica, divertículo de meckel

Infecciosos Enterocolite (yersinia,

Tumor carcinoide do apêndice, pseudo mixoma peritoneal,


Oncológicos
adenocarcinoma em cólon direito

Em crianças e
Pneumonia, otite média, Intussuscepção
idosos

Dunphy Dor a percussão abdominal ou quando o paciente tosse

Exames complementares laboratoriais e de imagem podem vir a


ser necessários para afastar ou confirmar outras suspeitas
diagnósticas.
Hemograma Leucocitose moderada com neutrofilia

Sumário de urina Normal

Apêndice preenchido com gás, fecalito radiopaco, nível líquido,


Rx de abdome
pneumoperitônio

Inflamação apendicular (sensibilidade de 75 a 90%) e


Ultrassonografia
especificidade de 86% a 100%

Tomografia Abscesso periapendicular

Videolaparoscopia Obesos, gestantes e idosos

Figura 1: RX simples de abdome.Alça sentinela na FID.


Fonte: Revista Hupe - UERJ.3

Figura 2: RX simples de abdome. Nível hidroaéreo no ceco e íleo


terminal
Fonte: Revista Hupe - UERJ.3

Figura 3: Ultrassonografia abdominal. Imagem em alvo na FID (AA).


Fonte: Revista Hupe - UERJ.3

Como dito, o diagnóstico é clinico e pode ser realizados somente


com base na história, exame físico e tendo ainda a possibilidade de
hemograma. Baseado nisso, Alvarado criou uma escala que é usada
como triagem para identificar pacientes com alto risco de apendicite
aguda (5 ou mais pontos) para prosseguir com avaliação radiológica
quando necessário:
Migração da dor 1

Sintomas Anorexia 1

Náuseas e/ou vômitos 1

Defesa de parede abdominal em QID 2


Sinais
Dor à palpação 1

Elevação da temperatura 1

Laboratório Leucocitose 2

Desvio à esquerda 1

Total 10
Uma pontuação de três para baixo (índice baixo) quase exclui
apendicite aguda (96,2% de achados normais na tomografia
computadorizada). Com sete pontos ou mais (índice alto),
encontramos 78% de casos positivos em mulheres e 94% em
homens. Entre quatro e seis pontos (índice intermediário), a
sensibilidade é de 35% de casos positivos para a apendicite.
Em locais de baixos recursos onde exames de imagem, tais como
ultrassonografia e tomografia computadorizada, valores menores ou
iguais a 3 pontos podem ter alta para casa com orientação de retorno
em 12 horas; entre 4 e 6 podem ser observados mais de perto e com
maior ou igual a 7 pontos na escala podem ser levados à cirurgia,
tolerando um índice de erro diagnóstico entre 10% a 20%, em
laparotomias ou laparoscopias brancas (sem achados de
apendicite).
A escala de Alvarado pode também ser útil na seleção de
pacientes para complementação diagnóstica por tomografia
computadorizada, sendo indicada nos casos intermediários (quatro a
seis pontos) e dispensável abaixo de três.

3.2. Tratamento
O tratamento é cirúrgico, podendo ser cirurgia aberta ou
videolaparoscópica (preferencial). Na cirurgia aberta há dois tipos de
incisões mais comuns: incisão de McBurney (oblíqua em FID) e de
Davis (transversa sobre o ponto de McBurney).
Figura 4: À esquerda, incisão de McBurney. À direita, incisão de
Rockey-Davis.
Fonte: Baley & Love’s Short Practice of Surgery.

Existe uma classificação videolaparoscópica da apendicite aguda


de acordo com os achados inflamatórios:
Grau 0 Normal

Grau 1 Hiperemia e edema

Grau 2 Exsudato fibrinoso

Grau 3 Necrose segmentar

Grau 4A Abscesso

Grau 4B Peritonite regional

Grau 4C Necrose da base do apêndice

Grau 5 Peritonite difusa

A terapia com antibiótico é utilizada de acordo com o estágio da


apendicite.
Apendicite não complicada CEFOXITINA EV (24 a 48 horas)

Apendicite gangrenosa ou Para patógenos entéricos aeróbicos e anaeróbicos,


perfurada exemplo:
METRONIDAZOL + GENTAMICINA OU AMPICILINA +
CLINDAMICINA – durante 7 dias ou até que fique
afebril e leucograma normal

Sendo diagnosticada e tratada de forma precoce, o prognóstico é


favorável. Entretanto, a frequência de complicações associadas à
apendicite não perfurada é em torno de 10% e de perfurada, 18%,
sendo mais comuns nos extremos etários. As principais
complicações são infecção de sítio cirúrgico precoce) e obstrução
intestinal. A mortalidade geral nos casos de apendicite perfurada é
de 3%, podendo chegar a 15% em idosos.
Algoritmo para avaliação e tratamento de pacientes com possível
apendicite aguda.

Referências
1. Williams N, O’Connell PR, McCaskie A. Bailey & Love’s Short Practice of Surgery. 27th
edition. 2018.
2. Lima AP, et al. Perfil clínico-epidemiológico da apendicite aguda: análise retrospectiva
de 638 casos. Rev. Col. Bras. Cir. 2016; 43(4).
3. Freitas RG, et al. Abdome Agudo Não Traumático. Apendicite aguda. Revista do
Hospital Universitário Pedro Ernesto, UERJ. 2009; 8(1).
4. Goldman L, Ausiello D. Cecil Medicina Interna. 24. ed. Saunders Elsevier; 2012.
5. Sabiston. Tratado de cirurgia: A base biológica da prática cirúrgica moderna. 19. ed.
Saunders Elsevier.
. Wakeley CP, et al. The position of the vermiform appendix as ascertained by an analysis
of 10,000 cases. Journal of Anatomy. 1933.
7. Jaffe BM, Berger DH. The appendix. In: Schwartz Principles of Surgery McGraw Hill
Medical Publishing Division. 11. ed. Schwartz’s Principles of Surgery. 2005. c. 30.
Parte 2 | Capítulo 22

Tumores pancr2eáticos e
neuroendócrinos
Autores: Diego de Aragão Bezerra e Tárcilla Pinto Passos Bezerra

1. Introdução
O pâncreas localiza-se na parte superior da cavidade abdominal,
em uma área chamada retroperitônio, situada posteriormente ao
estômago. Divide-se em três regiões: cabeça, corpo e cauda. A
cabeça do pâncreas tem íntima relação com os vasos mesentéricos,
com o duodeno e as vias biliares distais. O corpo e a cauda do
pâncreas são próximos aos vasos esplênicos e o próprio baço. O
pâncreas tem duas funções distintas:
- Endócrina: essencial para controle dos níveis glicêmicos com
produção de insulina e glucagon.
- Exócrina: produção de enzimas que participam da digestão e da
absorção de alimentos.
Figura 1
Fonte: https://www.vicc.org/cancer-info/adult-pancreatic-cancer

O câncer de pâncreas é raro antes dos 30 anos, sendo frequente


após os 60 anos de idade. O câncer de pâncreas apresenta elevada
taxa de mortalidade, sobretudo devido ao diagnóstico tardio e ao
comportamento biológico agressivo da doença. Embora seja o nono
diagnóstico de câncer mais comum, representa o quarto tipo de
câncer que mais leva ao óbito por ano no mundo, com 270 mil novos
casos por ano e 260 mil mortes relacionadas. No Brasil, responde
por cerca de 2% de todos os tipos de câncer diagnosticados e 4% do
total de mortes por essa doença.
Carcinoma de pâncreas é mais frequente em homens (1,3:1) e os
afrodescendentes têm uma chance um pouco maior de desenvolver
câncer de pâncreas e de morrer pela doença em comparação aos
brancos. Os fatores de risco mais associados com essa neoplasia
são o tabagismo (relação com a intensidade desse hábito),
pancreatite crônica e diabetes. Outros fatores possivelmente
relacionados são obesidade, diabetes mellitus, dislipidemia, dieta
rica em carne vermelha e consumo de álcool. Estudos recentes
sugerem que a infecção pelo Helicobacter pylori pode estar
associada entre 4% a 25% dos casos de adenocarcinoma de
pâncreas.
Algumas alterações genéticas têm relação com o câncer de
pâncreas, tais como supressão tumoral no p53 e p16, mutações no
gene K-Ras que são encontradas em mais de 90% dos casos. Essa
associação hereditária pode ser estabelecida em 5%-10% dos casos.

1.1. Patologia
Cerca de 95%-97% das neoplasias pancreáticas são
adenocarcinomas que se originam de células glandulares exócrinas
dos ductos. Trata-se de uma neoplasia sólida, não endócrina,
localizando-se mais frequentemente na cabeça (65%), 15% no
corpo/cauda e 20% envolvendo difusamente a glândula. Grande
parte da massa tumoral (até 2/3 do volume) existe devido à
pancreatite adjacente. A neoplasia comumente comprime o
colédoco distal e o ducto pancreático principal. Podendo também,
comprimir outras estruturas adjacentes, como o estômago,
duodeno, veias porta e cava. É uma neoplasia maligna de
comportamento agressivo, caracterizada por disseminação vascular
e linfáticas precoces. Metástases para os linfonodos regionais e
fígado ocorrem em 80% dos casos. Sendo o tumor multicêntrico em
30% dos diagnósticos.

1.2. Quadro clínico


Os sintomas do câncer pancreático variam conforme a
localização do tumor, resultantes da progressão da doença e
síndrome consumptiva associada. Quando um paciente apresenta
sinais de câncer de pâncreas, a doença já se encontra avançada. Os
tumores localizados na cabeça apresentam sintomas mais
precoces, uma vez que a icterícia se instala em etapas iniciais,
alertando, dessa forma, a suspeita clínica. Já os tumores no corpo e
cauda pancreática tendem a ter diagnósticos tardios até que se
tornem massas abdominais volumosas.
A dor é extremamente frequente, de modo geral localizada no
abdome superior ou região lombar, podendo ser em faixa ou irradiar-
se para o dorso. Quando se apresenta de forma intensa, mesmo nas
fases iniciais, é decorrente da invasão tumoral dos nervos,
pancreatite adjacente e secundária à obstrução dos ductos
pancreáticos. Cerca de 10% dos pacientes apresentam pancreatite
aguda ou diabetes como primeiro sintoma clínico.
Perda de peso ocorre em mais de 90% dos pacientes e icterícia
em 70%-80% dos casos. Nos tumores localizados na cabeça
pancreática, icterícia se apresenta precocemente, e, na maioria das
vezes, é acompanhada de prurido. Outras manifestações podem
surgir na evolução da doença, como anorexia, fraqueza geral,
depressão, dispepsia, insuficiência exócrina ou endócrina (diabetes)
e trombose venosa profunda nos membros inferiores.
Ao exame clínico, 25% dos pacientes apresentam o sinal de
Courvoisier, descrito como a presença de vesícula biliar palpável e
indolor. Hepatomegalia, associada ou não à palpação de nódulos na
superfície hepática, pode ser decorrente de implantes secundários.
Alguns sinais são indicativos de doença avançada como ascite,
adenomegalia supraclavicular (sinal de Troisier ou nódulo de
Virchow), nódulo periumbilical (nódulo de Irmã Maria José),
nodulações palpáveis no espaço retovaginal ou retovesical
(prateleira de Blummer). A tromboflebite migratória (sinal de
Trousseau) pode estar presente em qualquer câncer avançado,
inclusive nos adenocarcinomas pancreáticos.

1.3. Diagnóstico
Os pacientes portadores de câncer de pâncreas podem
apresentar anemia tanto pela anorexia como pela perda sanguínea
no trato digestivo, em razão da invasão tumoral no estômago ou
duodeno. Quando ocorre obstrução biliar, há aumento das
bilirrubinas, fosfatase alcalina e gama-GT. Elevações na amilase
podem ocorrer em 5% dos casos. As aminotransferases podem se
elevar em pacientes com icterícia prolongada ou intensa. A função
renal (ureia e creatinina) pode estar comprometida tanto pela idade
como pela hiperbilirrubinemia. A avaliação da coagulação é
essencial devido à atividade da protrombina, que pode estar
diminuída nos doentes ictéricos devido à absorção prejudicada da
vitamina K, devendo ser corrigida antes de procedimentos
diagnósticos invasivos.
O marcador mais utilizado no adenocarcinoma de pâncreas é o
antígeno carboidrato 19.9 (CA 19.9). Ele é uma mucina produzida
pelo tumor e pode ser dosado na corrente sanguínea. Tem alta
sensibilidade e especificidade, embora na presença de colangite os
níveis podem aumentar significativamente. É uma ferramenta útil no
diagnóstico de recorrências, sendo importante no seguimento de
pacientes tratados com intenção curativa. Níveis muito elevados
(>1000 U/ml) são patognomônicos de doença avançada.
Os exames de imagem desempenham um papel fundamental,
tanto no diagnóstico quanto no estadiamento dos pacientes com
câncer de pâncreas. A ultrassonografia é normalmente o primeiro
exame a ser solicitado em pacientes com dor em andar superior do
abdome e em pacientes ictéricos. Apesar de ser um exame
acessível e de baixo custo, é muito dependente do equipamento e do
operador. O achado mais encontrado é uma massa sólida
hipoecoica, monogênea ou heterogênea, de contornos imprecisos,
em topografia pancreática. Esse achado ultrassonográfico,
associado a alterações laboratoriais, tem sensibilidade de 83% e
especificidade de 99% para câncer de pâncreas. A tomografia
computadorizada de abdome com múltiplos detectores e trifásica
(sem contraste, com contraste em fase arterial e em fase venosa) é
o principal método para o diagnóstico e estadiamento dos tumores
de pâncreas. Em um estudo comparativo com 62 pacientes
submetidos a um estadiamento pré-operatório com TC helicoidal,
ressonância magnética, arteriografia e ecoendoscopia, a tomografia
computadorizada helicoidal demonstrou a mais alta acurácia quanto
à extensão do tumor primário (73%), extensão locorregional (74%),
invasão vascular (83%), metástase à distância (83%), estadiamento
TNM (46%) e ressecabilidade (83%), enquanto a ecoendoscopia foi
superior na avaliação do tamanho do tumor e comprometimento
linfonodal. A ecoendoscopia tem importância na identificação de
tumores pequenos não visualizados na TC helicoidal, além de
possibilitar coleta de material para exame histopatológico. Trata-se
de um exame de alto custo e pouco acessível, não devendo retardar
o tratamento cirúrgico da doença. A ressonância magnética de vias
biliares/ colangiorressonância tem papel mais importante na
identificação das lesões ductais císticas do pâncreas, com
sensibilidade e especificidade superiores à TC nessa categoria de
doenças. Para obtenção de material para análise histopatológica ou
citológica, dispomos de 4 métodos principais: punção guiada por
ecoendoscopia, punção guiada por tomografia de abdome, punção
obtida por laparoscopia e escovado obtido pelo exame de
endoscopia. A sensibilidade da punção com agulha fina guiada por
ecoendoscopia (PAAF-EE) varia de 75%-80% com especificidade
próxima de 100%. O principal objetivo de incluir a punção dos
tumores de pâncreas na abordagem sistemática dessa doença é
evitar o tratamento cirúrgico em um pequeno grupo de pacientes
que de outra forma seriam submetidos aos altos riscos da
pancreatectomia. Entretanto, quando o resultado se impõe como
falso-negativo ou inconclusivo, o que pode chegar a 14% em alguns
estudos, as consequências resultam em atraso no tratamento
cirúrgico e, portanto, piora na sobrevida desses pacientes. Portanto,
ainda se justifica a realização de pancreatectomia mesmo sem
resultado histopatológico prévio, sobretudo em centros onde a
mortalidade pela cirurgia seja baixa. Vale a pena investir em punção
guiada por ecoendoscopia ou tomografia, sobretudo em pacientes
assintomáticos e com risco cirúrgico elevado, em que o resultado do
exame histopatológico ou citológico poderia evitar cirurgia
desnecessária. A biópsia estaria indicada em pacientes com doença
avançada e estado geral comprometido, situação em que o
tratamento operatório curativo ou paliativo não está indicado.
Pacientes com massa pancreática localizada, cuja possibilidade de
linfoma, tuberculose, sarcoidose, paracoccidioidomicose e outras
doenças incomuns estiverem sendo consideradas

1.4. Estadiamento
O estadiamento do câncer de pâncreas deve passar
necessariamente pela solicitação de TC helicoidal trifásica, que é
capaz de identificar a maioria dos critérios de irressecabilidade
(como invasão de tronco celíaco, artéria mesentérica superior) e
metástases para órgãos distantes
com razoável sensibilidade e especificidade. Os critérios são
estabelecidos pelo sistema Tumor-Nódulo-Metástase (TNM) da
American Joint Commitee on Cancer (AJCC).
Fonte: Medicina Net.18
Fonte: Medicina Net.19

Uma vez definido o estadiamento da doença, os pacientes


podem ser classificados em 3 grupos: ressecáveis, ressecáveis
limítrofes ou irressecáveis. Os tumores considerados ressecáveis
são aqueles sem doença a distância e sem invasão de vasos ou
estruturas nobres, como artéria mesentérica superior e artérias do
eixo celíaco. Os tumores ressecáveis limítrofes, de acordo com o
NCCN (National Comprehensive Cancer Network), preenchem uma
ou mais das seguintes características: invasões das VMS-portais
unilaterais ou bilaterais; menos de 180 graus de fixação na artéria
mesentérica superior; fixação ou envolvimento da artéria hepática,
se ressecável; oclusão da veia mesentérica superior, se for de
segmento pequeno e reconstruível. Tais ressecções só devem ser
tentadas por cirurgiões com experiência em reconstruções
vasculares. Os tumores irressecáveis são aqueles que apresentam
metástases a distância, incluindo linfonodos fora da área de
ressecção, ascite neoplásica/carcinomatose peritoneal ou
envolvimento vascular além do que já foi citado. A laparoscopia de
estadiamento tem indicação sobretudo nos tumores de corpo e
cauda de pâncreas, já que a sensibilidade da TC helicoidal nesse
grupo de doentes é menor para identificação de invasão vascular e
de pequenos implantes hepáticos e peritoneais. Nos tumores de
cabeça de pâncreas, a laparoscopia não tem indicação de rotina,
podendo ser utilizada apenas em casos duvidosos, em que a
laparoscopia poderia evitar uma laparotomia desnecessária.

1.5. Tratamento
O tratamento cirúrgico é o único método potencialmente curativo
para os tumores de pâncreas. Os pacientes com doença ressecável
respondem por apenas 10% a 20% dos casos. Mesmo submetidos
ao tratamento cirúrgico, apenas 10% a 15% atingem uma sobrevida
em 5 anos. Para os tumores envolvendo a cabeça do pâncreas, o
processo uncinado ou outros tumores periampulares, o
procedimento de eleição é Duodenopancreatectomia ou Cirurgia de
Whipple. A ressecção envolve a vesícula biliar, porção terminal do
ducto colédoco, 15 cm proximais de jejuno, todo o duodeno,
estômago distal, piloro e cabeça do pâncreas até o nível da veia
mesentérica superior. O procedimento pode ser realizado ainda com
preservação de todo o estômago, piloro e uma porção diminuta de
duodeno (Cirurgia de Preservação do Piloro), o que resulta em
menor morbidade cirúrgica, menor tempo operatório, sem aumentar
a taxa de recorrência local nem diminuir a sobrevida a longo prazo.
A reconstrução do trato digestivo é realizada utilizando a alça de
jejuno proximal que se anastomosa com o ducto hepático comum
(hepaticojejunostomia), com o coto pancreático
(pancreaticojejunostomia) e com estômago (gastrojejunostomia).
Em pacientes selecionados, que foram submetidos à cirurgia em
condição nutricional inadequada, pode-se confeccionar uma
jejunostomia para garantir um suporte nutricional otimizado no pós-
operatório. O resultado anatômico final é representado na figura 1.
Nos centros especializados e com alto volume cirúrgico a taxa de
mortalidade perioperatória gira em torno de 5%.
Figura 1: Cirurgia de Whipple.
Fonte: Hopkins Medicine.20

Os tumores de corpo e cauda de pâncreas raramente são


ressecáveis. Somente de 5% a 7% dos pacientes com tumores nessa
localização serão submetidos ao tratamento cirúrgico. Mesmo
esses pacientes com doença ressecável têm uma sobrevida
significativamente menor do que os pacientes com tumores de
cabeça de pâncreas, tendo em vista a doença mais avançada no
momento do diagnóstico. O procedimento padrão é a
pancreatectomia distal com esplenectomia em bloco, procedimento
já realizado por videocirurgia em muitos centros de forma segura e
com menor morbidade cirúrgica, resultando em menos dor pós-
operatória e menor tempo de internação, entretanto sem diferenças
na sobrevida global a longo prazo.
A quimioterapia adjuvante nos tumores de pâncreas, associada
ou não à radioterapia, tem proporcionado aumento da sobrevida nos
pacientes já submetidos ao tratamento cirúrgico (aumento da
sobrevida livre de doença em 3 anos de 7,5% para 23,5%). As drogas
mais estudadas foram 5-Fluorouracil (5-FU) e Gencitabina, sendo
essa última considerada droga de primeira linha no tratamento
adjuvante do câncer de pâncreas, por ter menos efeitos colaterais e
melhor perfil de toxicidade. A Quimioterapia Neoadjuvante (aquela
administrada antes do procedimento cirúrgico), associada ou não à
radioterapia, vem cada vez mais sendo empregada e parece ter as
seguintes vantagens: garante que todos os pacientes se beneficiem
de um tratamento multimodal, tendo em vista que um percentual
significativo de doentes não conseguem completar ou iniciar a
terapia adjuvante devido à morbimortalidade do procedimento
cirúrgico; capacidade de identificar o comportamento biológico do
tumor, sendo a resposta ou não à terapia neoadjuvante um bom
preditor de agressividade da doença; melhora nas taxas de margens
cirúrgicas negativas; diminuir o grau de invasividade da doença nos
casos “ressecáveis limítrofes”, proporcionando melhores resultados
cirúrgicos, sobretudo nos pacientes com invasão vascular. Para os
pacientes com doença irressecável, o objetivo do tratamento passa
a se concentrar no alívio dos sintomas. No controle da icterícia
obstrutiva, o tratamento de eleição é a realização de
Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica (CPRE) com
aposição de stent para desobstruir a via biliar. A derivação
biliodigestiva cirúrgica tem indicação nos casos em que se indica a
laparotomia curativa, mas que no intraoperatória identifica-se
doença irressecável. O procedimento mais indicado, se possível, é a
coledocojejunostomia. Para os casos em que a doença se apresenta
com obstrução duodenal, indica-se uma derivação digestiva, a
gastrojejunostomia. O manejo da dor deve ser realizado de forma
escalonada, com utilização de opioides em altas doses, caso seja
necessário. Nos casos de doença metastática em pacientes com
bom status clínico, pode-se lançar mão da quimioterapia paliativa
com Gencitabina, resultando em aumento da sobrevida em meses.

1.6. Tumores Endócrinos


Os tumores endócrinos pancreáticos (TEP) são neoplasias
epiteliais com diferenciação neuroendócrina predominante. São
neoplasias raras e de crescimento lento, caracterizadas pela
capacidade de armazenar e secretar peptídeos e neuroaminas.
Cerca de 3% dos tumores pancreáticos e 19% das lesões
pancreáticas incidentais detectadas em tomografias são tumores
endócrinos do pâncreas. Podem ser classificados como funcionais
ou não funcionais, dependendo de estar ou não presente uma
síndrome clínica resultante do hormônio autonomamente liberado
(gastrinoma, insulinoma, glucagonoma, VIPoma, somatostatinoma,
GRFoma, ACTHoma). Os TPEs não funcionais liberam hormônios e
peptídeos (polipeptídeo pacreático, neurotensina, subunidades da
gonadotrofina coriônica humana, enolase neurônio-específica,
cromogranina A, calcitonina) que não causam síndromes clínicas
distintas. Os gastrinomas e os insulinomas são os TEPs mais
comuns. Todos os TEPs compartilham certas características. Os
TEPs são classificados como APUDomas (captação e
descarboxilação de precursores de aminas), que compartilham
características citoquímicas com tumores carcinoides, melanomas
e outros tumores endócrinos (feocromocitomas, câncer medular de
tireoide). Com exceção dos insulinomas, esses tumores
frequentemente são malignos.

1.6.1. Gastrinoma
É o tumor endócrino secretor de gastrina, usualmente surgindo
no pâncreas ou no duodeno. Causa a síndrome de Zollinger-Ellison,
que é caracterizada por sintomas e sinais clínicos resultantes da
hipersecreção de ácido gástrico (doença ulcerosa péptica, doença
do refluxo gastroesofágico, diarreia). É o mais comum tumor
pancreático endócrino maligno funcional, com incidência anual de
0,5-2 por milhão.4 É causa de 0.1%-1% dos casos de doença
ulcerosa péptica.3 A maioria é esporádica, e menos comumente
ocorre como parte da neoplasia endócrina múltipla tipo 1(NEM 1).

1.6.2. Patologia
Tumores secretores de gastrina se originam de células
neuroendócrinas que se desenvolvem do endoderma embrionário.2
Os tumores primários se localizam no pâncreas (30%), duodeno
(60%-70%) ou em outros locais (5%-10%), como estômago, jejuno,
fígado, baço, ovário, coração, linfonodos). A secreção ectópica de
gastrina pelo tumor resulta em hipergastrinemia, que estimula a
hipersecreção de ácido pelas células parietais do antro gástrico. Os
efeitos do excesso de acidez gástrica incluem úlceras pépticas
(frequentemente múltiplas, grandes, localizadas no duodeno distal e
jejuno proximal), má-absorção por inativação de enzimas digestivas
pancreáticas pela acidez, inibição da reabsorção intestinal de sódio
e água, resultando em diarreia secretória. A elevação crônica da
gastrina sérica induz a hiperplasia de células gástricas
enterocromafins-like e desenvolvimento de tumores carcinoides
gástricos.
A NEM 1 é usualmente decorrente de herança autossômica
dominante da mutação do gene supressor tumoral NEM 1 e, menos
comumente, devido à mutação de novo desse gene.

1.6.3. Quadro clínico


A maioria dos sintomas está relacionada à hipersecreção de
ácido gástrico, e incluem: Dor abdominal (75%-98%); Sangramento
gastrintestinal (44%-75%); Diarreia (30%-73%); Azia (44%-56%);
Náuseas e vômitos (12%-30%); Perda ponderal (75-53%).
Menos comumente, pode apresentar complicações graves da
doença ulcerosa péptica, como perfuração ou obstrução.
A apresentação do tumor avançado pode incluir dor, icterícia e
sangramento. Metástases hepáticas estão presentes ao diagnóstico
de 5%-10% dos gastrinomas duodenais, e 20%-25% dos gastrinomas
pancreáticos. Metástases ósseas estão presentes em até um terço
dos pacientes que têm metástases hepáticas. Os linfonodos são
positivos em cerca de 40%-60% dos pacientes com tumores
duodenais, e 40% com tumores pancreáticos.

1.6.4. Diagnóstico
Deve-se suspeitar de síndrome de Zollinger-Ellison (SZE) em
qualquer paciente cuja doença ulcerosa péptica se acompanha de
diarreia, é recorrente, não se cura com o tratamento, não se associa
com infecção por H. pylori, associa-se a complicações
(sangramento, obstrução, estenose de esôfago), é múltipla ou
ocorre em localizações incomuns, ou se associa a tumor
pancreático. Também se deve suspeitar de SZE em pacientes com
diarreia secretória crônica, doença ulcerosa péptica associada a
grandes pregas gástricas, história familiar ou pessoal de cálculos
renais ou endocrinopatias, ou achados laboratoriais de
hipercalcemia, hipergastrinemia ou hipersecreção de ácido gástrico.
O teste inicial é a concentração de gastrina sérica em jejum, que
está elevada em 99%-100% dos casos de SZE. Outras causas de
hipergastrinemia incluem resposta fisiológica à acloridria ou
hipocloridria por causa de anemia perniciosa, gastrite atrófica,
insuficiência renal, infecção por H. pylori ou uso de inibidores de
bomba de prótons, que suprimem a secreção de ácido clorídrico por
até uma semana após serem descontinuados.
Se o nível de gastrina sérica estiver elevado, deve-se determinar o
pH gástrico em jejum. Gastrina sérica superior a 1.000 pg/mL
(normal < 100) e pH for menor ou igual a 2,0 confirmam o
diagnóstico. Cerca de 40% dos pacientes terão essa combinação de
achados.
Se a gastrina estiver elevada menos de 10 vezes e o pH for
menor que 2,0, então deve ser realizado o teste de estimulação de
secretina e medido o débito basal do ácido. Débito basal de ácido
maior que 15mEq/h, com gastrina sérica de jejum maior que 120
pg/mL confirmam o diagnóstico de SZE.
Gastrina sérica de jejum menor que 100pg/mL (na ausência de
medicações que suprimem a secreção de ácido gástrico) exclui o
diagnóstico de SZE.
Outros marcadores bioquímicos de tumores neuroendócrinos
incluem cromogranina A, pancreastatina, neurocinina A e serotonina.
Após confirmação diagnóstica, investigação adicional deve ser
realizada em todos os pacientes, e inclui screening para NEM 1
(pesquisar hiperparatireoidismo e prolactinoma, com dosagens de
paratormônio, cálcio e prolactina) e exames de imagem para
localizar a lesão, detectar doença metastática e avaliar
complicações.
Endoscopia digestiva alta é usualmente o primeiro exame de
imagem realizado. Os exames não invasivos incluem tomografia
computadorizada, ressonância magnética nuclear e cintilografia de
receptores de somatostatina. Se os exames não invasivos não são
conclusivos, deve-se realizar ultrassonografia endoscópica. Se esta
for negativa, deve-se considerar angiografia seletiva com
estimulação arterial. A cintilografia de receptores de somatostatina
é o método preferido para localização, identificando 60% dos
gastrinomas primários e mais de 90% dos pacientes com doença
metastática hepática. Ela utiliza octreotideo marcado com índio-111,
que se liga com alta afinidade aos receptores de somatostatina
subtipo 2, que são altamente expressos nos gastrinomas.
Para os gastrinomas pancreáticos, a ultrassonografia
endoscópica é particularmente sensível. Pequenos gastrinomas
duodenais (<1cm) frequentemente não são detectados por qualquer
modalidade de imagem, mas podem ser encontrados na cirurgia se
for realizada duodenotomia rotineira.

1.6.5. Tratamento
Os pacientes devem receber terapia medicamentosa para
controlar a hipersecreção de ácido gástrico e, se possível, terapia
cirúrgica para remover o próprio gastrinoma. Inibidores de bomba de
prótons são atualmente as drogas preferidas.
Os pacientes devem ser tratados indefinidamente, a menos que
sejam curados cirurgicamente. A terapia a longo prazo é segura, e
os pacientes têm sido tratados durante até 20 anos com omeprazol
sem perda de eficácia, embora níveis reduzidos de vitamina B12, que
são comuns com o tratamento prolongado, exijam suplementação.
A gastrectomia total, o tratamento histórico para essa doença,
agora é realizada apenas em pacientes que não podem ou não
tomarão medicações antissecretórias. A vagotomia seletiva reduz
de forma eficaz a secreção gástrica, mas muitos pacientes
continuam a demandar uma dose baixa de droga. A
paratireoidectomia deve ser realizada nos pacientes com
hiperparatireoidismo, SZE e NEM 1 porque reduz acentuadamente a
secreção ácida e aumenta a sensibilidade às drogas
antissecretórias.
A exploração cirúrgica para cura é recomendada em todos os
pacientes sem metástase hepática, NEM 1 ou comorbidades que
limitem a expectativa de vida. A ressecção cirúrgica diminui a taxa
de metástases e resulta em taxa de cura em 5 anos de 30%.
Crescimento tumoral agressivo ocorre em 25% dos gastrinomas
esporádicos e em 15% nos gastrinomas associados a NEM 1. O
preditor prognóstico mais importante é o desenvolvimento de
metástases hepáticas. Os pacientes com gastrinoma metastático
no fígado têm prognóstico ruim, com taxa de sobrevida em 5 anos
de 30%.
O tratamento da doença metastática inclui octreotideo
isoladamente ou em combinação com interferon-A, que objetiva a
inibição do crescimento adicional do tumor. Se esse tratamento
falhar, agentes quimioterápicos são recomendados
(estreptozotocina, 5-fluoracil, doxorrubicina, cisplatina, etoposídeo).
Em pacientes com doença metastática extensa, a radioterapia
dirigida para receptores da somatostatina usando análogos
marcados com ítrio-90, lutecio-177 ou índio-111 é cada vez mais
utilizada. O transplante de fígado é indicado ocasionalmente nos
raros pacientes com metástases limitadas ao fígado.

1.6.6. Insulinoma
O insulinoma é o tumor endócrino pancreático mais comum.
Consiste em neoplasia das células beta das ilhotas pancreáticas,
caracterizado pela produção excessiva de insulina, que se manifesta
com sintomas neurovegetativos e neuroglicopênicos secundários à
hipoglicemia.
É um tumor raro, com incidência de 4 casos por milhão de
pessoas por ano. Em sua forma esporádica (90% dos casos),
geralmente é solitário e pequeno (80%-90% têm menos de 2 cm),
distribuído em igual proporção na cabeça, no corpo e na cauda do
pâncreas. A idade média de apresentação é entre 40-50 anos, sendo
discretamente mais comum no sexo feminino.
Insulinomas malignos são definidos pela presença de metástase
a distância, sendo tal apresentação rara (5%-11% dos casos), com
as metástases mais comuns em fígado e linfonodos regionais.
Menos de 10% dos casos de insulinoma estão associados à NEM-1.

1.6.7. Quadro clínico


Os sinais e sintomas são devidos à hipoglicemia, que consistem
em sintomas adrenérgicos (fome, sudorese, ansiedade, palpitações,
náusea, tremor) e sintomas neuroglicopênicos (cefaleia, letargia,
zumbido, diplopia ou visão turva, amnesia, confusão mental,
mudança de comportamento, convulsões e coma).

1.6.8. Diagnóstico
Deve-se suspeitar de insulinoma na presença da tríade de
Whipple, caracterizada por: (1) sintomas neurológicos de
hipoglicemia; (2) glicemia <50mg/dL; e (3) alívio imediato dos
sintomas após administração de glicose.
Outros critérios diagnósticos incluem glicemia ≤ 45mg/dL, níveis
de insulina ≥ 6 MUI/mL com baixos níveis de glicemia, peptídeo-C ≥
0,6 ng/mL, proinsulina ≥ 194 mg/dL ou ≥ 25%, na ausência do uso de
sulfonilureias. O método padrão-ouro é o teste do jejum prolongado
(72h), que confirma o diagnostico com níveis de glicose baixos e
concomitantes níveis de insulina elevados. Outras causas de
hipoglicemia são diabetes mellitus, sepse ou outra doença crítica,
insuficiência renal ou hepatica, exercício extenuante, medicações
(insulina, sulfonilureias, álcool, propranolol, haloperidol, salicilatos e
outros), hiperplasia de células beta, nesidioblastose, tumores
extrapancreáticos, hipopituitarismo e doença de Addison.
Os métodos de imagem incluem ultrassonografia, tomografia
computadorizada, ressonância magnética nuclear e PET-TC. A
ultrassonografia abdominal é o método inicial. A tomografia
computadorizada detecta até 2/3 dos insulinomas e a maioria das
lesões metastáticas.
Estudos invasivos como ultrassonografia endoscópica,
arteriografia seletiva por cateterização do tronco celíaco, coleta de
sangue venoso portal e estimulação intra-arterial de secreção de
insulina com cálcio são técnicas muito mais sensíveis e usadas O
método mais sensível e eficaz para a detecção de tumores
pancreáticos como o insulinoma é ultrassonografia intraoperatória,
que pode localizar 95-100% das lesões.

1.6.9. Tratamento
O manejo da hipoglicemia inclui medidas dietéticas (refeições
menores e mais frequentes), diazoxida (inibe a liberação de insulina)
e análogos da somatostatina (octreotide, lanreotide).
A cirurgia é o único método que cura a doença, permitindo a
reversão do quadro clinico e laboratorial. A enucleação é o
tratamento de escolha para insulinomas solitários benignos.
Insulinomas associados a NEM-1 requerem ressecção mais
agressiva, com pancreatectomia subtotal e enucleação de lesões na
cabeça do pâncreas. Já os insulinomas malignos devem ser
ressecados em conjunto com as metástases acessíveis. Tumores
de cabeça de pâncreas podem necessitar de
pancreatoduodenectomia. Metástases hepáticas devem ser
ressecadas, caso não haja envolvimento bilobar difuso,
comprometimento da função hepática ou metástases extra-
hepáticas extensas (pulmonares, peritoneais).
A embolização da artéria hepática, com ou sem a infusão de
quimioterapia, é aplicada como técnica paliativa. As experiências
tanto com quimioterapia quanto com radioterapia são limitadas. A
sobrevida pós-operatória em 10 anos é de 91% sem insulinoma
maligno e 29% com insulinoma maligno. Fatores associados a pior
prognóstico são idade avançada, insulinoma maligno e associação
com NEM 1.

Referências
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Parte 2 | Capítulo 23

Doença do refluxo gastroesofágico


Autores: Patrick Teles Frota Capote e Saulo Pinho Nunes

1.Introdução
A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) se define como uma
condição em que o conteúdo gastroduodenal, ao refluir
retrogradamente para o esôfago, gera sintomas que incomodam e
levam a uma redução na qualidade de vida do indivíduo. Esse refluxo
patológico também pode gerar complicações como esofagite,
estenose esofágica, disfagia, úlceras, sangramentos e lesões pré-
malignas.
A DRGE está entre um dos diagnósticos mais realizados na
gastroenterologia, por conta de sua elevada prevalência, podendo
chegar a 20% nas populações urbanas. Essa doença pode
apresentar um quadro clínico amplo, dividindo-se entre sintomas
típicos e atípicos, sendo esses últimos mais difíceis de se
diagnosticar, retardando o tratamento do paciente.
É uma doença de origem multifatorial, apresentando alguns
fatores de risco associados, vistos quadro 1.
QUADRO 1 – FATORES DE RISCO

Idade: Idades mais avançadas

Sexo: Mais prevalente em mulheres

Gestação

Obesidade

Hérnia hiatal

Fatores genéticos
Os pacientes que desenvolvem a DRGE, ao serem
diagnosticados, devem ser tratados de acordo com cada caso. O
tratamento consiste na associação de mudanças de hábito de vida,
medicamentos e cirurgia. A escolha vai depender do quadro clínico,
sejam sintomas típicos ou atípicos, da presença ou não de
complicações e das condições socioeconômicas de cada paciente.

2. Etiopatogenia e Fisiopatologia
Alguns fatores estão associados ao desenvolvimento da DRGE,
como o aumento da pressão intragástrica, a depuração esofagiana
e, como um dos mais importantes, o relaxamento transitório do
esfíncter esofagiano inferior (EEI), que é um espessamento distal do
esôfago, responsável por servir de barreira contra o refluxo do
conteúdo duodeno-estomacal. Em condições basais, ele mantém-se
sob pressão de contração em torno de 10-35 mmHg, impedindo o
refluxo. Outros fatores relacionados seriam as alterações na
estrutura anatômica tendo a hérnia hiatal como seu principal
representante.
As lesões na DRGE decorrem da exposição da mucosa esofágica
à agentes agressores como ácidos, sais biliares, pepsina e enzimas
pancreáticas. Essas substâncias provocam uma diminuição da
resistência do epitélio mucoso do esôfago, levando à dilatação do
espaço intercelular e a erosões. Entretanto, nem sempre há a
presença de erosões, podendo ter uma DRGE sintomática sem
complicações, assim podemos classificar a doença em forma não
erosiva e forma erosiva.

3. Quadro clínico
Classicamente os sintomas desses pacientes podem ser
divididos em típicos e atípicos. No que diz respeito aos típicos, o
principal é a sensação de queimação retroesternal, conhecida como
pirose, estando presente em mais de 60% dos casos. Outro sintoma
típico é a regurgitação, que se caracteriza pelo refluxo do conteúdo
ácido misturado a restos alimentares não digeridos até a boca ou
hipofaringe, sem associação com náusea.
Em relação às manifestações atípicas ou extraesofágicas da
DRGE, temos uma variedade de sinais e sintomas, representados na
quadro 2.
QUADRO 2 – MANIFESTAÇÕES ATÍPICAS DA DRGE

Dor torácica

Tosse crônica

Asma

Apneia do sono

Rouquidão

Pigarro

Globus faríngeo

Existem também os chamados sinais de alarme, que nos leva a


pensar em complicações mais importantes da doença, sendo
necessária uma investigação mais rigorosa nesses pacientes. São
eles: anemia, hemorragia digestiva, perda ponderal, disfagia,
odinofagia, sintomas intensos em pacientes idosos ou com história
familiar de câncer.

4. Diagnóstico
O diagnóstico da DRGE inicialmente pode ser dado baseando-se
na história clínica do paciente. A presença dos sintomas típicos, por
4 a 8 semanas, tem um valor preditivo positivo elevado. A ausência
de sintomas típicos não exclui o diagnóstico, sendo mais importante
ainda a realização de exames complementares. Outra forma de
aumentar as chances de dar o diagnóstico é associando-se o teste
diagnóstico terapêutico, que consiste na administração em dose
plena de medicamentos conhecidos como inibidores da bomba de
prótons, por 4 semanas. Se o paciente apresentar melhora dos
sintomas, está dado o diagnóstico. Entretanto nem sempre é tão
simples, sendo necessário lançar mão de exames complementares.

5. Exames complementares
5.1. Endoscopia digestiva alta (EDA)
Não são todos os pacientes que estão indicadas a realização da
EDA. Como discutido anteriormente, muitas vezes podemos dar o
diagnóstico clinicamente sem necessitar de outros métodos. Porém,
em pacientes acima de 40 anos, e naqueles que desenvolvem sinais
e sintomas de alarme, torna-se necessária a realização da EDA.
Pela endoscopia podemos diagnosticar a hérnia hiatal, que se
caracteriza pela presença de uma diferença acima de 2 cm entra a
junção esofagogástrica e o pinçamento diafragmático. A hérnia
hiatal pode ser classificada em:

• Tipo I ou por deslizamento: presença da JEG acima de 2 cm


do pinçamento diafragmático sem herniação de estômago.

• Tipo II ou paraesofágica: herniação do fundo gástrico sem


alteração da posição da JEG.

• Tipo III ou mista: herniação do fundo gástrico associado ao


deslocamento da JEG pelo hiato esofágico.
Figura 1
Fonte: Rohde, Bersch.1

A EDA também é muito útil na identificação de lesões erosivas.


Existem duas classificações conhecidas atualmente, que são a
classificação de Savary-Miller modificada e a classificação de Los
Angeles.
A classificação de Savary-Miller pode ser vista na tabela 1.
TABELA 1 – CLASSIFICAÇÃO DE SAVARY-MILLER MODIFICADA

Grau Descrição

1 Uma ou mais erosões, lineares ou ovaladas, em uma única prega longitudinal

Várias erosões em mais de uma prega longitudinal não ocupam a circunferência


2
toda do esôfago

3 Erosões confluentes que se estendem por toda a circunferência do esôfago

Lesões crônicas: úlceras, estenose, isoladas ou associadas às lesões do grupo


4
1a3

5 Epitélio colunar em continuidade com a linha Z (esôfago de Barret)

A classificação de Los Angeles é a mais utilizada atualmente


para a classificação endoscópica na DRGE, vista na tabela 2.
TABELA 2 – CLASSIFICAÇÃO DE LOS ANGELES

Grau Descrição

A Uma ou mais erosões, menor ou igual a 5 mm de comprimento

B Uma erosão maior que 5 mm de comprimento, não contíguas entre os ápices de


suas pregas esofágicas

Erosões contínuas (ou convergentes) entre os ápices de pelo menos duas pregas,
C
evolvendo menos que 75% da circunferência do esôfago.

D Erosões ocupando 75% ou mais da circunferência do esôfago

Outros achados na EDA são a estenose péptica (figura 2),


resultante de cicatrização e fibrose das lesões inflamatórias no
esôfago. Ela é geralmente localizada no esôfago distal. Também
podemos diagnosticar o esôfago de Barret (figura 3), que é definido
como a presença de epitélio colunar visível em esôfago, contendo
metaplasia intestinal pelo estudo anatomopatológico. É uma lesão
de natureza pré-maligna para adenocarcinoma esofágico.
Figura 2

Fonte: Sakai, Paulo.2

Figura 3
Fonte: Sakai, Paulo.2

5.2. Esofagomanometria convencional e de alta


resolução
É um exame que consiste na aferição da eficiência da peristalse
esofágica. Está indicado em pacientes que vão ser submetidos à
pHmetria de 24horas, pois ele ajuda a localizar o EEI, local onde será
posicionada a sonda. Também é indicado em pacientes que foram
indicados ao tratamento cirúrgico, pois vai definir qual a técnica
mais adequada. Pacientes com distúrbios motores do esôfago,
como disfagia, espasmo esofágico difuso e “esôfago em quebra-
nozes” também se beneficiam de tal exame. Diferentemente da
convencional, a manometria de alta resolução lança mão de
diversos sensores de pressão, incluindo de sensibilidade
circunferencial, oferecendo uma imagem contínua no gráfico (figura
4).
Figura 4
Fonte: Zaterca, Schlioma, et al.3

5.3. pHmetria de 24 horas


É o exame padrão-ouro para refluxos ácidos e consiste na
aposição de uma sonda a 5 cm do EEI, enquanto ela mede as
variações no pH local, o paciente anota em um diário a presença de
eventos de refluxo, correlacionando com suas atividades diárias
durante 24h. O exame permite analisar a frequência dos episódios
de refluxo, a duração da exposição da mucosa gástrica esofágica ao
ácido e a capacidade de clearance esofágico. Esses dados são
colocados em um escore de DeMeester. O diagnóstico de refluxo
ácido é dado quando houver pH abaixo de 4 em mais de 4% do
tempo total ou escore de DeMeester acima de 14,8. É um exame que
deve ser principalmente indicado na avaliação de pacientes com
sintomas atípicos e que apresentam ausência de alterações pela
EDA, refratários ao tratamento com IBP.

5.4. Impedâncio-pHmetria
É um exame que permite caracterizar de forma mais ampla as
características do refluxo, podendo detectar o fluxo de líquido e gás
no esôfago por meio de alterações na resistência à corrente elétrica
por meio de eletrodos posicionados no esôfago. Associa-se a esse
sistema um eletrodo de pH, podendo detectar variações que vão do
ácido (pH<4) ao alcalino (pH>7). É um exame indicado
principalmente para aqueles pacientes que fazem uso de IBP sem
melhora do quadro clínico e que apresentam endoscopia negativa.

6. Tratamento
A grande maioria dos pacientes que apresentam a DRGE não
complicada se beneficiam do tratamento clínico. Esse tratamento
consiste na adoção de medidas não farmacológicas
comportamentais (Quadro 3), associadas ou não ao tratamento
medicamentoso.
QUADRO 3 – MEDIDAS COMPORTAMENTAIS

Elevação da cabeceira da cama (>15cm)

Ingerir pouco volume, evitando-se alimentos gordurosos, café, cítricos, bebidas alcoólicas,
bebidas gasosas, menta, hortelã, produtos à base de tomate e chocolate

Evitar deitar-se antes de 2 horas após refeição

Suspender tabagismo

Perda de peso corporal

O tratamento farmacológico é baseado na terapia de inibição da


secreção ácida, seja em sua produção ou em sua ação sobre a
mucosa. Temos como fármacos disponíveis:

• Antiácidos e sucralfato são utilizados para neutralizar a


secreção ácida produzida, servindo como medicamento para
alívio imediato.
• Alginato é um polissacarídeo extraído da alga marrom, que
se polimeriza ao entrar em contato com o conteúdo ácido,
formando uma matriz de gel sobrenadante ao conteúdo
gástrico.

• Bloqueadores dos receptores H2 de histamina,


representados por cimetidina, ranitidina, famotidina e
naztidina. Apresentam resultados satisfatórios no que diz
respeito à cicatrização de esofagite erosiva leve. Geralmente
não indicados para sintomas mais intensos, portanto,
prescritos principalmente em situações em que não se pode
utilizar IBP.

• Procinéticos: ajudam com o aumento do clearance


esofágico, melhorando sintomas como plenitude pós-prandial
e eructação principalmente. Não estão associados à
cicatrização da esofagite, portanto, são prescritos como
coadjuvantes sintomáticos.

• Inibidores de bomba de prótons são a primeira linha no


tratamento farmacológico da DRGE. Apresentam índices
elevados de cicatrização e melhora dos sintomas.
Sendo assim, temos como primeira escolha para o tratamento
medicamentoso os IBPs, indicados em ciclos de 4 a 8 semanas em
dose plena (tabela 6). Se houver sintomas atípicos ou complicações
(estenose, úlceras ou esôfago de Barret), podemos utilizá-los em
dose dobrada por um período de no mínimo 8 semanas.
QUADRO 4 – IBPS E SUA POSOLOGIA DIÁRIA

Omeprazol – 40mg por dia

Lansoprazol – 30mg por dia

Pantoprazol – 40 mg por dia

Rabeprazol – 20mg por dia

Esomeprazol – 40mg por dia


É recomendado que esses medicamentos sejam ingeridos 30 a
60 minutos antes das refeições. Alguns efeitos adversos associados
são: cefaleia, diarreia, constipação intestinal e dor abdominal.
Como dito anteriormente, a maioria dos pacientes se beneficia e
consegue-se ter um bom resultado a partir do tratamento clínico,
porém, em alguns casos está indicado o tratamento cirúrgico, como
será melhor discutido mais à frente.

6.1. Tratamento cirúrgico da DRGE


Ainda não há um consenso definitivo a respeito das indicações
absolutas de cirurgia para o tratamento da DRGE, entretanto
algumas diretrizes sugerem esse tipo de opção terapêutica em
casos como citados abaixo:

• Sintomas refratários após tratamento medicamento em


dose plena.

• Surgimento de complicações como estenose, ulceração,


esôfago de Barret e esofagite acentuada a despeito do
tratamento clínico.

• Intolerância de manutenção do tratamento medicamentoso,


como alto custo, efeitos colaterais, etc.

• O paciente desejar ser submetido à cirurgia, após explicados


os riscos e os benefícios.

• Presença de sintomas atípicos acentuados.

• Hérnia hiatal grande (> 5cm), refratária ao tratamento


medicamentoso.
• Paciente jovens em perspectiva de uso de IBP por longo
tempo, sem previsão de suspensão do mesmo.
Antes de o paciente ser submetido ao procedimento, existem
algumas avaliações que devem ser levadas em consideração. A
esofagomanometria é essencial, pois por meio dela poderemos
definir qual cirurgia será realizada. A esofagografia também é
importante para avaliar situação de hérnia atual, avaliar o tamanho
do esôfago, presença de complicações e ajudar no diagnóstico
diferencial.
O tratamento cirúrgico visa reestabelecer a competência das
barreiras anatômicas antirrefluxo, criando-se uma válvula
antirrefluxo, associada a um reforço dos pilares diafragmáticos.
Dentre as mais utilizadas atualmente, temos a fundoplicatura e
suas variantes como a mais indicada. Elas podem ser:

• Fundoplicatura de Nissen.
• Fundoplicatura de Toupet.
6.1.1. Fundoplicatura de Nissen
É a técnica mais utilizada e caracteriza-se pela criação de uma
válvula em 360º ao redor do esôfago terminal, feita com o fundo
gástrico (figura 5). Está indicada nos pacientes que não apresentam
a manometria, atividade motora mantida, pois, caso seja realizada
em pacientes com motilidade comprometida, o paciente pode vir a
desenvolver quadro de disfagia.
Primeiramente é realizada a exposição do hiato esofágico,
fazendo uma abertura através da membrana frenoesofágica.
Associado a isso, realiza-se a ligadura dos vasos gástricos curtos, a
fim de facilitar a rotação do fundo gástrico. É dissecado os ramos
direito e esquerdo do pilar diafragmático direito e, com um fio
inabsorvível, faz-se a plicatura entre eles. A válvula é feita por meio
da rotação da parede posterior do estômago ao redor do esôfago,
suturando-a com fio inabsorvível na parede anterior do estômago.
Figura 5
Fonte: Rohde, Bersch.1

6.1.2. Fundoplicatura de Toupet


Essa cirurgia utiliza dos mesmos princípios da cirurgia de Nissen,
como a confecção de válvula antirrefluxo e a plastia do pilar
diafragmático, entretanto, ao invés de 360º, é realizada uma válvula
de 240 – 270º (figura 6), suturando o fundo gástrico com 3 pontos
de fio inabsorvível em cada lado do esôfago. Essa cirurgia é mais
indicada naqueles que apresentam pela manometria algum grau de
distúrbio de motilidade, evitando-se assim um quadro de disfagia no
pós-operatório.
Figura 6
Fonte: Rohde, Bersch.1

A fundoplicatura pode ser realizada tanto por maneira


convencional quanto por videolaparoscopia, não havendo
superioridade na efetividade de uma sobre a outra; entretanto,
alguns estudos indicam que há uma ocorrência maior de hérnias
incisionais na técnica aberta.
Algumas complicações podem estar associadas ao tratamento
cirúrgico e são elas:

• Disfagia (9% a 20%)

• Desconforto abdominal superior


• Meteorismo

• Diarreia – relacionada com a manipulação o do nervo Vago


Diversas revisões sistemáticas compararam o tratamento clínico
e o cirúrgico, demonstrando resultados semelhantes na redução dos
sintomas e das complicações da DRGE. Importante sempre lembrar
do paciente sobre os riscos e benefícios da cirurgia e das indicações
mais adequadas para cada caso.

6.2. Terapia endoscópica


6.2.1. Fundoplicatura endoscópica
Com o avançar dos métodos terapêuticos, a fundoplicatura
também tem sido realizada de maneira endoscópica. É uma
fundoplicatura parcial feita sem incisões e uma alternativa à cirurgia
de Nissen, apresentando menores taxas de distensão abdominal e
disfagia, se comparado com esta.
Porém, nem todos os pacientes tem indicação de serem
submetidos ao procedimento. O paciente ideal não deve possuir
hérnia hiatal ou, se possuir, ela deve ter menos de 3 cm.

6.2.2. Sistema Stretta


Atualmente existem alguns métodos endoscópicos para
tratamento da DRGE, dentre eles, mais recentemente que tem tido
destaque internacional é o sistema Stretta. Ele consiste em um
tratamento endoscópico não cirúrgico por radiofrequência feito
ambulatorialmente sob sedação ou anestesia geral, em que é
introduzida uma sonda e posicionada em nível de EEI. Na
extremidade dessa sonda há um balão, que é insuflado até atingir as
paredes do esôfago. Nesse balão existem 4 pequenas agulhas de
cerca de 5mm, que entram em contato com a musculatura
esofágica. Depois de feito isso, é, então, acoplado um gerador de
ondas de radiofrequência. Esse método terapêutico também
apresenta como indicação nos pacientes refratários ao tratamento
clínico ou naqueles que não pretendem ser submetidos a
procedimento cirúrgico ou que foram submetidos à fundoplicatura
cirúrgica e voltaram a ter sintomas. É um método que tem
demonstrado bastante eficácia e a maioria dos pacientes em cerca
de 30 a 90 dias tem deixado o tratamento medicamentoso.

Referências
1. Rohde L, Bersch OA. Rotinas em cirurgia digestiva. 2018.
2. Sakai P. Tratado de Endoscopia Digestiva Diagnóstica e Terapêutica. 2015.
3. Zaterca, Schlioma, et al. Tratado de Gastroenterologia da Graduação à Pós-
Graduação. 2016.
4. Tratamento endoscópico permite que pacientes com refluxo deixem de usar
medicação de forma contínua. Medscape, 16 fev. 2018.
5. Hiran FC. Endoscopic fundoplication: pacient selection and technique, J Vis Surg.
2017; 3: 121.
Parte 2 | Capítulo 24

Câncer de Esôfago
Autores: Janssen Loiola Melo e Felipe Barbosa Rios

1. INTRODUÇÂO
O carcinoma esofágico ocupa a sexta posição brasileira entre os
cânceres mais frequentes no sexo masculino e a décima quinta
posição no sexo feminino, segundo dados no Instituto Nacional do
Câncer (INCA), com cerca de 8.240 casos novos de câncer de
esôfago entre os homens e 2.550 entre as mulheres.1 No mundo, é o
oitavo mais comum, tendo sua incidência duas vezes maior nos
homens e a partir dos 40 anos de idade.2 Estima-se que surjam
572.034 novos casos de câncer de esôfago anualmente, além de
508.585 mortes anuais.3
A distribuição do câncer esofágico por sexo, idade e raça é
influenciada pelo tipo de célula.4 O carcinoma de células escamosas
(CEC) e o adenocarcinoma são responsáveis por mais de 95% dos
casos e diferem em diversos aspectos como a localização e fatores
predisponentes. Apesar do aumento na incidência do
adenocarcinoma, o tipo histológico mais frequente ainda é o CEC.2
No Brasil não dispomos de políticas de rastreamento populacional
para câncer de esôfago e, tendo em vista o diagnóstico tardio dessa
doença, conhecer os tipos histológicos e o comportamento do
carcinoma de esôfago é de grande importância.4

2. EPIDEMIOLOGIA
As taxas de incidência variam em diferentes países, com as taxas
mais altas encontradas na África Oriental e no Leste Asiático, em
uma área que é frequentemente chamada de “cinturão do esôfago”.
Essa área compreende uma região de maior risco, abrangendo o
norte do Irã, as repúblicas da Ásia Central e a China Central e Norte.
Predomina o CEC como tipo histológico. As taxas mais baixas são
encontradas na África Ocidental e Central e na América Central.
Os principais fatores de risco nessas áreas não são bem
elucidados, mas o estado nutricional precário e o consumo de
bebidas quentes estão entre esses fatores. Já nas áreas de baixo
risco, como os Estados Unidos e vários países ocidentais, o
tabagismo e o alcoolismo são os responsáveis por cerca de 90% do
total de casos de CEC.
Enquanto as taxas de incidência de adenocarcinoma têm
aumentado consideravelmente em vários países ocidentais, devido
ao aumento dos fatores de risco conhecidos para esse tipo
histológico como o esôfago de Barrett com metaplasia intestinal e a
obesidade, as taxas de carcinoma espinocelular tem decaído nesses
mesmos países por conta da redução ao longo do prazo no consumo
de tabaco e álcool.5
Nos casos de adenocarcinoma, observou-se que grande parte do
crescimento da incidência envolve os tumores localizados na junção
esofagogástrica e cárdia.6

3. FATORES ETIOLÓGICOS
3.1. Fatores de risco para carcinoma espinocelular
de esôfago
Várias são as doenças hereditárias associadas com o
desenvolvimento do câncer de esôfago como a Síndrome de Peutz-
Jeghers (SPJ) e a Síndrome de Cowden.3 A tilose, tal como a
Síndrome de Howell-Evans, é outra doença hereditária associada.7
Todavia, é estimado que uma história de tabagismo, consumo de
álcool e dietas pobres em frutas e vegetais representaram quase 90%
dos CEC esofágicos nos Estados.8
Dentre as doenças esofágicas subjacentes que são
conhecidamente fatores de risco podemos citar a acalásia,
estenoses cáusticas e gastrite atrófica.3 Lesões térmicas na mucosa
esofágica ocasionada por bebidas e alimentos de alta temperatura
podem aumentar o risco de CEC.9
A influência do HPV no desenvolvimento de CEC, principalmente o
subtipo HPV-16, ainda é incerta.10

3.2. Fatores de risco para adenocarcinoma de


esôfago
Em relação ao adenocarcinoma, a presença de tabagismo,
sobrepeso, doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) e uma dieta
pobre em frutas e vegetais representa quase 80% dos casos nos
Estados Unidos.11 A DRGE é o principal fator de risco associado e
pode-se afirmar que a maioria, se não todos, os adenocarcinomas
esofágicos surgem de uma região da metaplasia de Barrett.3 Estes
apresentam pelo menos 30 vezes mais risco do que a população em
geral e a triagem endoscópica para detectar displasia é
recomendada para identificar pacientes com displasia de alto grau.3
Pacientes com estados hipersecretores de ácido (como a
síndrome de Zollinger-Ellison) ou outras condições associadas ao
refluxo gastroesofágico (como miotomia cirúrgica ou dilatação com
balão do esfíncter inferior do esôfago ou esclerodermia) podem ter
um risco aumentado.12 Provavelmente o consumo de álcool não é
fator de risco para os adenocarcinomas,13 assim como a infecção
pelo HPV.14

4. PATOLOGIA
4.1. Carcinoma de Células Escamosas (CEC)
Os CECs surgem do epitélio estratificado não queratinizado, que
faz parte do epitélio normal do esôfago, ocorrendo, na grande
maioria das vezes, na porção média do órgão. Inicialmente invade a
camada submucosa, estendendo-se ao longo da parede do esôfago,
geralmente na direção cefálica.
As lesões precoces costumam ser sutis e podem não ser
localizadas na endoscopia. Já as lesões mais avançadas se
caracterizam por massas infiltrativas e ulceradas, muitas vezes
circunferenciais e causando obstrução. A invasão linfonodal local
ocorre rápido e precocemente, devido ao fato de os vasos linfáticos
no esôfago estarem localizados na lâmina própria, ao contrário do
restante do trato gastrointestinal, que está localizado abaixo da
muscular da mucosa.3

4.2. Adenocarcinoma
A maior parte dos casos de adenocarcinoma esofágico localiza-
se contígua à junção esofagogástrica e está relacionada ao esôfago
de Barrett. Pode manifestar-se como úlcera, nódulo, padrão mucoso
com alteração, ou não ter nenhuma alteração endoscópica visível.

5. APRESENTAÇÃO CLÍNICA
Os pacientes com câncer de esôfago em estágio inicial podem
apresentar sintomas inespecíficos, como desconforto retroesternal e
pirose. Os pacientes que possuem doença localmente avançada
apresentam-se comumente com disfagia progressiva e perda de
peso. Estima-se que 20% dos pacientes apresentam também
odinofagia.2
Anemia por deficiência de ferro pode ocorrer principalmente
devido a sangramento crônico, mas raramente os pacientes vão
referir melena, hematêmese ou sangue em alimentados
regurgitados.15 Além disso, o sangramento gastrointestinal alto
agudo é raro e sua causa é resultado da erosão do tumor na aorta, ou
nas artérias pulmonares e brônquicas.2
Em pacientes com doença avançada outros sintomas que podem
surgir são a regurgitação de saliva ou de alimentos. Caso o nervo
laríngeo recorrente seja atingido pelo tumor primário, ou por
metástases associadas, o paciente pode apresentar rouquidão ou
tosse. Pneumonia por aspiração não costuma ser frequente, mas é
um quadro possível.2
Uma das complicações tardias do câncer de esôfago são as
fístulas traqueobrônquicas, associadas a tosses intratáveis ou
pneumonias frequentes. É uma complicação grave e os pacientes
que a desenvolvem costumam apresentar expectativa de vida inferior
a um mês.2

6. DIAGNÓSTICO
Várias modalidades de exame de imagem estão disponíveis na
suspeita de câncer esofágico, sendo o esofagograma com bário o
exame inicial recomendado para qualquer paciente com disfagia e a
endoscopia digestiva alta com biópsia o melhor exame para o
diagnóstico.4
O diagnóstico dos pacientes com suspeita de câncer esofágico é
realizado pelo exame histológico. Uma biópsia pode ser obtida por
endoscopia digestiva alta ou, em casos de metástase, guiada por
imagem de um local metastático. Exames contrastados são uma
opção cada vez menos usada e não consegue diagnóstico de certeza
por biópsia.2

6.1. Endoscopia Digestiva Alta


É possível visualizar os cânceres esofágicos como placas
superficiais, nódulos ou ulcerações. Em casos de lesões avançadas,
visualiza-se áreas de estenose, massas circunferenciais ou
ulcerações grandes. A biópsia confirma o diagnóstico em mais de
90% dos casos, sendo que estudos demonstraram que a precisão
diagnóstica aumenta com o aumento do número de biópsias
realizadas (até sete). O auxílio do ultrassom endoscópico é
principalmente no estadiamento da lesão. Para lesões pequenas com
o diâmetro ≤2cm associado ao acometimento menor que 1/3 da
parede esofágica e limitadas à mucosa do esôfago, a ressecção
endoscópica sozinha pode representar terapia adequada.2

7. ESTADIAMENTO
O estágio da doença em que se encontra o paciente está
diretamente relacionado ao prognóstico do câncer de esôfago, além
de auxiliar na escolha terapêutica adequada.2
O principal critério utilizado é o da American Joint Committee on
Cancer (AJCC), que se encontra na sua 8ª edição.
Tabela 1: Carcinoma epidermoide
Figura 1
Fonte: D.J. Sugarbaker, R.Bueno, Y.L. Colson, M.T. Jaklitsch, M. J.
Krasna, S.J. Menizer, M. Williams, A. Adams; Adult Chest Surgery, 2nd
Edition: accesssurgery.com

7.1. Critérios de estadiamento TNM


São considerados tumores de esôfago todos aqueles que
surgirem em sua porção cervical, torácica ou abdominal, como
também os que envolverem a junção esofagogástrica com uma
distância até 2cm do estômago proximal. O ponto de referência
utilizado é a distância para a arcada dentária superior e a localização
do tumor vai ter diferença em toda a conduta posterior. Vale lembrar
que para os tipos histológicos (adenocarcinoma ou carcinoma
espinocelular) vão existir estadiamentos distintos (16-19). Os
linfonodos regionais do esôfago se estendem dos linfonodos
periesofágicos aos celíacos, e a importância da localização da
metástase também está relacionada com a altura do tumor. Hoje a
classificação do estágio N está relacionada ao número de linfonodos
envolvidos e não à sua localização.20

7.2. Estadiamento regional


O ultrassom endoscópico é a técnica mais precisa na realização
de estadiamento locorregional de câncer invasivo de esôfago. Esse
método de estadiamento utiliza um transdutor de ultrassom de alta
frequência que fornece imagens com detalhes das massas
localizadas no esôfago e sua relação com as camadas da parede
esofágica (estadiamento T).2
Os tumores T2, T3 e T4 aparecem como estenoses, ulcerações ou
massas exofíticas. Os tumores T3 e T4 vão ser extraesofágicos. No
estágio T3, as massas se estendem até a camada adventícia,
enquanto que no estágio T4 as massas vão invadir estruturas
adjacentes. A 8ª edição da classificação TNM divide os tumores T4
em T4a e T4b. Os tumores T4a são aqueles potencialmente
ressecáveis. O ultrassom endoscópico classifica o estadiamento do
câncer de esôfago pelas características de imagem e permite
também a realização de biópsia linfonodal pela punção aspirativa por
agulha fina (PAAF).
A broncoscopia pré-operatória com biópsia e citologia com
escova tem sido a escolha por alguns, como a última investigação no
preparo para pacientes que tenham tumores não metastáticos
localmente avançados que estejam localizados ao nível ou acima da
carina.21 Nos casos de carcinoma espinocelular cervical o
recomendado é realizar laringoscopia flexível para avaliação da
disseminação local da doença e se excluir tumores malignos de
cabeça e pescoço sincrônicos.2
Os locais onde mais comumente são encontradas metástases
são fígado, pulmões, ossos e glândulas suprarrenais.2 O
estadiamento de metástases é feito com a realização de exames de
imagens, como a tomografia computadorizada (TC) com contraste,
PET–TC, ultrassonografia endoscópica e, para alguns pacientes, a
laparoscopia diagnóstica.2
O FDG-PET TC (tomografia por emissão de pósitrons com
fluorodeoxiglucose) é mais sensível do que a TC com contraste para
detectar doenças metastáticas, sendo usado principalmente quando
não são vistas nos exames iniciais.2 A laparoscopia diagnóstica é
reservada para os pacientes com adenocarcinomas clínicos
potencialmente ressecáveis classificados como T3 e T4, que estejam
localizados na porção abdominal do esôfago, ou se houver suspeição
de metástase intraperitoneal que não pode ser confirmada.2

8. ABORDAGEM PRÉ-OPERATÓRIA
8.1. Abordagem pré-operatória de acordo com os
achados histológicos
No que diz respeito às diferenças histológicas, devido à escassez
de dados do impacto da histologia na eficácia do tratamento, a
abordagem costuma ser semelhante para os dois tipos
histológicos.22 Sabe-se que as taxas de resposta são mais elevadas
para os CECs após a realização da quimiorradioterapia. Nesse caso,
quando uma resposta endoscópica completa é alcançada o
tratamento não cirúrgico é uma opção após a quimiorradioterapia
inicial. No caso dos adenocarcinomas, existem poucas informações
sobre o manejo não cirúrgico e é recomendado que a maioria dos
pacientes receba tratamento cirúrgico após quimiorradioterapia
inicial.22
O tipo histológico influencia também no padrão de recorrência. Os
CECs localizados na região superior ou média do tórax costumam
recidivar primeiro localmente. Já os adenocarcinomas de esôfago
distal têm disseminação mais comumente a distância.22 No entanto,
apesar desses dados, muitos estudos sugerem que o
adenocarcinoma tem um prognóstico melhor do que o CEC,
principalmente quando a doença está em seu estágio inicial.23
A distinção na localização e na histologia do tumor tem efeitos na
escolha da terapia.23 Alguns estudos sugerem que a quimioterapia de
indução sozinha pode ser suficiente para os adenocarcinomas,
enquanto que os resultados para os carcinomas espinocelulares são
melhores quando realizada a quimiorradioterapia.23 Esse fato está
associado à redução do tamanho do tumor visando obter-se uma
ressecção radical e uma resposta completa.23
Em pacientes com adenocarcinoma ressecável de esôfago
localmente avançado (T3-4 e N+) na junção esofagogástrica, alguns
estudos compararam a cirurgia associada a quimioterapia
perioperatória (MAGIC Trial) com o tratamento neoadjuvante com
quimiorradioterapia seguido de cirurgia (CROSS Trial).Todavia, ainda
persiste indefinidas qual das duas abordagens apresenta melhores
benefícios. Já em um estudo alemão (FLOT 4) que substituiu a
quimioterapia perioperatória do triplet baseado em antraciclina
(MAGIC) pelo triplet baseado em docetaxel (FLOT), percebeu-se que
os pacientes tratados com esquema FLOT apresentaram maior taxa
de resposta patológica completa (por volta de 10%) e maior
sobrevida global (MAGIC: 35 meses, FLOT: 50 meses).24

8.2. Métodos de abordagem pré-operatória


8.2.1. Radioterapia
Antes do advento da quimioterapia moderna e da
quimiorradioterapia, a radioterapia isolada era bastante utilizada para
o controle local do câncer de esôfago. O papel da radioterapia
isolada foi complementado pela quimiorradioterapia combinada na
maior parte dos pacientes.25

8.2.2. Quimiorradioterapia pré-operatória


Diversos estudos mostraram que há melhor sobrevida com
quimiorradiação simultânea pré-operatória quando comparado com a
terapia local isolada. Essa abordagem é preferida para o estágio
potencialmente ressecável T3 ou 4, ou o linfonodo positivo. Porém, a
terapêutica ideal não está definida.22

8.2.3. IMRT associado à quimioterapia


Técnicas mais atuais de radiação, como a Intensity Modulated
Radiation Therapy (IMRT), estão correlacionadas a perfis de
toxicidade mais favoráveis.26, 27

8.3. Abordagem pré-operatória em pacientes


adultos mais velhos
Existem poucos dados disponíveis a respeito da segurança e da
eficácia da quimiorradioterapia em idosos. Porém, há um relatório
que sugere que pacientes com idade superior a 70 anos toleram
quimiorradioterapia à base de cisplatina sem um grande aumento de
efeitos adversos e com resultados que são comparáveis aos
alcançados em indivíduos mais jovens.28 Pacientes com
comorbidades importantes tiveram experiência de toxicidade mais
grave e atrasos na quimioterapia, ou reduções de dose quando
comparados com aqueles sem comorbidades. Não está definido se
os resultados obtidos com quimiorradioterapia definitiva são tão
bons quanto os que podem ser obtidos com a esofagectomia em
pacientes idosos com câncer esofágico em estágio inicial.28

9. Manejo cirúrgico
O objetivo do tratamento cirúrgico é curativo, e sua realização é a
base da terapêutica multidisciplinar para os pacientes que têm
doença localizada.29, 30 É importante frisar que o tratamento cirúrgico
independe da histologia do tumor e a escolha está mais relacionada
com a localização. A abordagem cirúrgica deve sempre ser
considerada nos tumores torácicos e abdominais. Para os tumores
em esôfago cervical, o tratamento geralmente é com
quimiorradioterapia exclusiva, reservando a cirurgia para os casos de
ausência de resposta.

9.1. Tratamento cirúrgico isolado


Apesar de apenas 30% a 40% dos pacientes terem doença
potencialmente ressecável na apresentação, a cirurgia tem sido o
tratamento padrão para o câncer de esôfago torácico em estágio
inicial. Sua utilização como monoterapia tem sido questionada, com
desfechos não favoráveis a longo prazo.31

9.2. Critérios para ressecção


9.2.1. Esofagectomia como primeira linha de terapia
As indicações para esofagectomia como escolha terapêutica
inicial para os pacientes com câncer de esôfago são:32
1) Pacientes com lesões T1N0M0.
2) Pacientes com lesões T2N0M0 (na maior parte dos centros
médicos).
Outros centros médicos sugerem ressecção inicial, seja qual for a
histologia, já outros optam pela quimiorradioterapia inicial no caso de
adenocarcinomas T2N0 do esôfago distal e esofagogástrico, e
ressecção inicial no caso de carcinoma espinocelular T2N0 menores
que dois centímetros e bem diferenciados.33, 34
9.2.2. Esofagectomia após quimioterapia neoadjuvante ou
quimiorradioterapia As indicações para quimiorradioterapia inicial ao
invés de esofagectomia:32
1) Pacientes que tenham tumores torácicos esofágicos, ou na
junção esofagogástrica, e comprometimento total do esôfago
(estágio T3) com ou sem doença nodal.
2) Pacientes com doença T4a com invasão de estruturas locais,
como pericárdio, pleura ou diafragma, que têm a possibilidade de
serem ressecados em bloco e que não tenham sinais de metástase
em outros órgãos.
Para os pacientes que foram tratados com quimiorradioterapia
para doenças potencialmente ressecáveis e que tiveram resposta
clínica, é discutido se há necessidade de cirurgia subsequente. No
entanto, normalmente é aconselhada a realização da ressecção
cirúrgica, principalmente para os pacientes que tenham
adenocarcinoma.32 No caso dos pacientes operáveis que não
respondem à quimiorradioterapia, a cirurgia sempre deve ser
considerada. Sugere-se que seja realizado PET – TC com o intuito de
verificar os pacientes em que a cirurgia pode ser evitada.22
Os pacientes candidatos à ressecção cirúrgica de acordo com o
reestadiamento costumam ser submetidos à cirurgia quatro a seis
semanas após a conclusão da quimioterapia ou
quimiorradioterapia.32

9.2.3. Contraindicações relativas à esofagectomia


1) Idade avançada.
2) Presença de comorbidades.
Dentre os indicadores de irressecabilidade, estão incluídas a
presença de metástases ou a disseminação extrarregional de
linfonodos.35

9.3. Procedimentos cirúrgicos


No caso dos pacientes que possuem adenocarcinoma ou
carcinoma espinocelular no esôfago torácico (terço médio ou inferior
do esôfago), excetuando-se os cânceres da junção esofagogástrica,
normalmente é necessária uma esofagectomia total por conta do
risco de lesões salteadas na submucosa.28 Em alguns casos, por
exemplo, um câncer de esôfago invasivo superficial ou precoce, de
localização distal no local do esôfago de Barrett, pode ser feita uma
ressecção mais limitada, porém a análise histológica intraoperatória
das margens cirúrgicas não podem demonstrar alterações de
Barrett.28
Deve-se ressaltar que a esofagectomia não é uma cirurgia
simples, e as taxas de complicações são altas. A escolha da cirurgia
depende de vários fatores, podendo-se citar:2
1) Localização do tumor, tamanho, extensão submucosa e se
existe aderência às estruturas adjacentes.
2) O tipo ou a extensão da linfadenectomia.
3) O canal a ser usado para recuperar a continuidade
gastrointestinal.
4) Existência de refluxo biliar pós-operatório.
5) A escolha do cirurgião.
As esofagectomias mais utilizadas na América do Norte são a
esofagectomia trans-hiatal, Ivor-Lewis (anastomose transtorácica) e
tri-incisional (anastomose cervical).35,36
A esofagectomia trans-hiatal (Figura 2) pode ser feita para
ressecção dos cânceres de esôfago cervical, torácico, e da junção
esofagogástrica. É realizada a partir de uma incisão de laparotomia
na linha média superior e uma incisão no pescoço esquerdo,
normalmente sem toracotomia.28 É realizada a dissecção do esôfago
torácico, sem corte, através do hiato diafragmático superiormente e
através do pescoço inferiormente. Entre as desvantagens, tem-se a
incapacidade de fazer uma linfadenectomia torácica completa.28
Figura 2

Fonte: Modificado de Pinotti e cols


A esofagectomia transtorácica Ivor-Lewis (Figura 3) pode ser
utilizada para ressecar câncer no terço inferior do esôfago. No
entanto, não é a abordagem ideal para cânceres localizados no terço
médio. Esse procedimento (Figura 4) utiliza-se de laparotomia, com
uma toracotomia direita e uma anastomose esofagogástrica
intratorácica. Nesse tipo de cirurgia é permitida a visualização direta
do esôfago torácico além de possibilitar a realização de uma
linfadenectomia torácica completa. Prefere-se uma abordagem Ivor-
Lewis minimamente invasiva a uma toracotomia.32 Como
desvantagens, tem-se a limitação do comprimento do esôfago
proximal, a localização intratorácica da anastomose esofagogástrica
e um risco de 3% a 20% de refluxo biliar grave.37
Figura 3 e Figura 4

A esofagectomia tri-incisional (Figura 5) permite ao cirurgião


realizar uma linfadenectomia completa de dois campos (mediastinal
e abdominal superior) sob visão direta e uma anastomose
esofagogástrica cervical.
Figura 5

Fonte: Página DAX 309. Disponível em:


<http://dax309.club/esofagectomia-total-68/> Acesso em 18 Nov.
2019

Não foi estabelecido o número mínimo de linfonodos que devem


ser retirados durante a esofagectomia potencialmente curativa. No
entanto, deve-se remover o máximo possível, pois a linfadenectomia
mais extensa tem sido associada a uma melhor sobrevida.37, 38 A
piloroplastia ou piloromiotomia é controversa e serve para reduzir o
risco de obstrução do tubo gástrico usado na anastomose.32 A
utilização de jejunostomia também é controversa, mas geralmente é
utilizada e inserida no momento da ressecção cirúrgica.32

10. Manejo pós-operatório


Inicia-se dieta enteral no 2º dia de pós-operatório, avançando
lentamente até atingir as metas de alimentação por volta do 5º dia de
pós-operatório. O paciente permanece com uma sonda nasogástrica
em aspiração no tubo gástrico, até que seja realizado a deglutição de
bário ou azul de metileno no 7º dia de pós-operatório, com o objetivo
de verificar se existe vazamento e esvaziamento do conduto. É
importante ressaltar que os pacientes permanecem com dieta líquida
mínima via oral por uma média de duas semanas e alimentação via
jejunostomia.32 As taxas de fístula salivar cervical na técnica tri-
incisional são altas, mas geralmente benignas e com resolução
espontânea. As taxas de morbimortalidade variam e dependem da
demanda do hospital, do cirurgião, das comorbidades do paciente e
do tipo de abordagem cirúrgica.39, 40

11. Tumor superficial


Além do aumento da incidência dos adenocarcinomas, houve
também uma modificação na distribuição dos estágios.41 Está
crescendo a incidência de câncer superficial do esôfago que não
ultrapassa a camada submucosa. Sabe-se que o envolvimento
submucoso é o principal determinante do prognóstico dos cânceres
esofágicos precoces. Geralmente utiliza-se o ultrassom endoscópico
para avaliar a extensão do tumor.41 Os cânceres esofágicos iniciais
são classificados como tumores T1, sendo subdivididos em T1a e
T1b, dependendo da profundidade da invasão.42 O risco de
metástases é maior nos tumores T1b do que dos T1a.43, 44

11.1. Subclassificação de estágio T mais


abrangente
Essa classificação divide os tumores da mucosa em três tipos,
com base na profundidade da invasão:41
1) M1 – Limitado à camada epitelial.
2) M2 – Invade a lâmina própria.
3) M3 – Invade, mas não ultrapassa a muscular da mucosa.
Os tumores que invadem a submucosa são subclassificados da
seguinte maneira:41
1) SM1 – penetra o terço mais superficial da submucosa.
2) SM2 – penetra no terço intermediário da submucosa.
3) SM3 – penetra o terço mais profundo da submucosa.
Além da profundidade da invasão, existem outras características
do tumor que podem aumentar o risco de metástases, como: a
aparência macroscópica da lesão, o tamanho do tumor, a presença
de invasão vascular, e possivelmente o grau histológico de
diferenciação.44-46
Se o ultrassom endoscópico identificar câncer de esôfago que
invade a muscular da mucosa ou se houver evidência de
envolvimento de linfonodos, a terapia cirúrgica é frequentemente
recomendada. Mas se o ultrassom endoscópico identifica apenas
doenças da mucosa e o paciente é potencialmente elegível para
tratamento endoscópico, uma ressecção endoscópica é realizada
para definir com certeza a profundidade da invasão. O tratamento de
escolha para pacientes com câncer superficial de esôfago que invade
a submucosa (T1b) é a esofagectomia. A ressecção endoscópica é a
abordagem preferida para pacientes com tumores M1 e M2, bem
como aqueles com doença M3 bem diferenciada sem invasão
vascular. A esofagectomia ainda é preferida para pacientes com
carcinomas intramucosos de M3 com invasão vascular.4

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Parte 2 | Capítulo 25

Doença ulcerosa péptica


Autores: Danilo Frota Guimarães e Arnaldo Paula Pessoa Azevedo
Júnior

1. INTRODUÇÃO
Úlcera é uma ruptura no revestimento mucoso do estômago ou
duodeno com mais de 5 mm de diâmetro e profundidade até a
submucosa. Úlceras menores que essa são chamadas de erosões.11
A prevalência da úlcera péptica (UP) estimada na população
ocidental é de 5% a 15%; apesar da diminuição da incidência,
permanece uma das doenças do trato gastrointestinal mais
prevalentes e onerosas.¹
Grande parte desse declínio deve-se ao maior conhecimento da
patogênese da doença (papel do Helicobacter pylori e riscos do uso
crônico de AINEs).¹
Como consequência, ocorreu declínio da terapia cirúrgica eletiva,
porém permaneceu constante o percentual de pacientes que
necessitam de cirurgia de emergência.¹
As úlceras pépticas são causadas por aumento nos fatores
agressivos e/ou redução nos fatores de protetores da mucosa
(Quadro 1).¹
Quadro 1: Principais fatores protetores e agressores da mucosa.
FATORES PROTETORES OU
FATORES LESIVOS OU AGRESSIVOS
DEFENSIVOS

Produção de muco H. Pylori

Prostaglandinas endógenas Aines

Secreção de bicarbonato Secreção de ácido clorídrico


Fluxo sanguíneo Isquemia

Renovação celular Ingestão de álcool

Fatores de crescimento Tabagismo

Refluxo duodenal de bile

Pepsinas

É causada por esse desequilíbrio entre fatores que podem


danificar o revestimento mucoso gastroduodenal e os mecanismos
de defesa que normalmente limitam a lesão.11
Uso de AINEs, aspirina, corticoides, anticoagulantes; infecção por
H.pylori; tabagismo; idade avançada (>65 anos); história pessoal;
história familiar de úlcera péptica; e permanência em terapia
intensiva são todos fatores de risco importantes.7
Os dois fatores etiológicos mais importantes responsáveis pela
ulceração péptica são a infecção pelo patógeno gástrico gram-
negativo Helicobacter pylori, o uso de aspirina e outros anti-
inflamatórios não esteroidais (AINEs) (Figura 1).³
A infecção pelo H. pylori aumentou o risco em 18 vezes do
desenvolvimento de UP e pode ocasionar gastrite aguda com
infiltração neutrofílica da lâmina própria mais comum no antro
gástrico. Se não tratada, pode ocasionar gastrite crônica com
infiltrado linfocítico ou plasmocítico quase sempre envolvendo o
corpo e antro gástrico.7
Os pacientes infectados com H. pylori, 10% a 15% terão
hipersecreção de ácido gástrico, levando a úlceras antrais ou
duodenais secundárias à inibição da secreção de somatostatina,
estimulando a liberação de gastrina. A maioria restante dos
pacientes infectados com H. pylori terá úlceras gástricas associadas
à hipocloridria e atrofia da mucosa.6
Um terço dos usuários crônicos de AINEs desenvolvem úlcera.7
Os AINEs danificam a mucosa gástrica inibindo as
prostaglandinas da Ciclooxigenase-1, que fornecem um efeito
protetor na mucosa gástrica 6
A maioria das úlceras pépticas cicatriza com a supressão de
ácido gástrico, mais comumente pela administração de um inibidor
da bomba de prótons (IBP) isolado por 6 a 8 semanas ou com o
tratamento do H. pylori associado. Mais de 85% das úlceras
induzidas por AINEs curam
dentro de 6 a 8 semanas após a interrupção do medicamento
agressor, juntamente com a supressão de ácido gástrico.6
A eficácia dessa terapia médica mudou significativamente o
algoritmo geral de tratamento, resultando em menos intervenção
cirúrgica em comparação com o passado.6
Figura 1: Mecanismos e fatores de risco na patogênese da úlcera
péptica.

Fonte: Søreide et al.4

2. ABORDAGEM
2.1. Diagnóstico
Uma apresentação clínica comum é dispepsia: uma dor ou um
desconforto abdominal crônico e/ou recorrente centrado na parte
superior do abdome.5
Geralmente, apresenta-se como uma dor epigástrica, em
queimação, que pode irradiar-se para as costas e está presente há
cerca de 1-2 semanas.7
A dor abdominal pode estar ausente em mais de 30% dos idosos
com úlcera péptica.12
Pacientes com úlcera duodenal podem sentir dor parecida com
fome ou dor abdominal noturna associada à secreção circadiana de
ácido gástrico. Pacientes com úlcera gástrica tendem a apresentar
dor abdominal pós-prandial, náusea, vômito e perda de peso.6
O uso de AINEs e o alivio do desconforto com o uso de
antiácidos também pode auxiliar no diagnóstico.11
Exame físico pode-se perceber uma sensibilidade gástrica
aumentada ou dor à palpação de abdômen superior. 7
No entanto, esses não são indicadores sensíveis nem
específicos.² Deve-se observar que a maioria das pessoas com
dispepsia não tem úlcera péptica.5
Úlceras gástricas e duodenais podem causar sangramento oculto
e anemia ferropriva.11
As UPs podem apresentar várias complicações e seus sinais e
sintomas estão resumidos no quadro a seguir (Quadro 2).

Quadro 2 – Sinais e sintomas de complicações da úlcera péptica


SANGRAMENTO PERFURAÇÃO OBSTRUÇÃO

Sintomas de úlceras
Hematêmese Dor epigástrica
precedentes

Melena Início súbito Náuseas

Proteção e rigidez
+/- dor abdominal Vômitos
abdominal

Taquicardia Taquicardia Alcalose metabólica

Hipotensão Hipotensão -----

Segundo a sociedade americana de endoscopia gastrointestinal


(ASGE), no momento não é recomendado nenhum programa de
triagem populacional para diagnóstico com endoscopia.7
Deve-se realizar endoscopia baseada na história de fatores de
risco para câncer de estômago, nos fatores de risco para úlcera
péptica e nos sintomas, ou seja, uma boa anamnese e um exame
físico abdominal cuidadoso ainda são fundamentais.7
Se o paciente tiver ≥60 anos com sintomas dispépticos ou
pacientes com menos de 60 anos de idade e sintomas de alarme de
dispepsia (por exemplo, perda de peso, anemia, vômitos, saciedade
precoce o disfagia), indica-se a endoscopia digestiva alta. Trata-se
do teste diagnóstico padrão-ouro para úlcera péptica e neoplasias
no trato gastrointestinal superior. Permite realizar biópsia para
diagnóstico de malignidade e detecção do H. pylori.11
Se uma úlcera estiver presente, sempre realizar um teste para
Helicobacter pylori. Exames de histologia e biópsia com urease
(teste rápido da urease) são executados nas biópsias de estômago
obtidas durante a endoscopia. Ambos os exames conseguem
detectar o H pylori. No entanto, a histologia determina se a úlcera é
neoplásica e/ou se há evidências de um AINE ser a causa provável.11
Úlceras do duodeno não precisam ser biopsiadas, porém as
úlceras do estômago devem ser biopsiadas rotineiramente para
excluir uma malignidade gástrica ulcerada, pois 5% das úlceras
gástricas são malignas e esse percentual aumenta quando as
úlceras são maiores que 3 cm e associadas a uma massa
abdominal.6, 12
Um hemograma completo deverá ser solicitado se o paciente
parecer clinicamente anêmico ou apresentar evidência de
sangramento gastrointestinal.11
Dosar amilase e lipase se houver possibilidade de pancreatite
aguda ser o diagnóstico. Dosar o perfil bioquímico hepático, caso
suspeita de coledocolitíase. Solicitar US de abdômen total se houver
suspeita de colecistite ou cólica biliar.7

2.2. Tratamento
A primeira etapa é eliminar a causa subjacente, seguida pelo
tratamento para a cicatrização da úlcera.6 O objetivo da terapia é
tratar complicações (por exemplo, sangramento ativo), eliminar a
causa subjacente sempre que possível, aliviar os sintomas,
cicatrizar úlceras e prevenir recorrências.11, 12
Tanto os IBPs quanto os antagonistas H2 inibem a secreção de
ácido, mas os IBPs fazem isso com maior eficácia e cicatrizam
úlceras pépticas mais rápido.11
Em geral, os IBPs são os medicamentos de primeira escolha para
cicatrização da úlcera devido à simplicidade da sua posologia e sua
eficácia.6
Os IBPs mais utilizados e suas doses para cicatrizar ulceras
pépticas não hemorrágicas são: omeprazol 40mg/dia, pantoprazol
40mg/dia, lansoprazol 30mg/dia, rabeprazol 20mg/dia, esomeprazol
40mg/dia e dexlansoprazol 30mg/dia.7
É necessário verificar se o H.pylori está presente, uma vez que o
tratamento se baseia em sua presença ou ausência. Se o H. pylori
estiver presente, deve-se iniciar a terapia de erradicação. Se o
paciente fizer uso de AINEs (incluindo aspirina), ele deverá ser
descontinuado, se possível.6
O tratamento de H. pylori é fundamental em pacientes infectados
e com UP para promover a cicatrização da úlcera e evitar futuras
recorrências. Infelizmente, essa tarefa se tornou mais difícil por
causa da resistência bacteriana às drogas.²
A maioria dos esquemas tem entre 70% e 90% de eficácia na
prática, limitados principalmente pela resistência a antibióticos e
pela adesão do paciente ao esquema terapêutico.6
Uma recente declaração de consenso sobre a erradicação
recomenda uso da estratégia tradicional de tratamento com terapia
tripla, usando IBP, amoxicilina e claritromicina somente em regiões
com sensibilidades bacterianas favoráveis à claritromicina. Todos
os regimes de tratamento devem ser administrados por 14 dias para
melhorar as taxas de erradicação do H. pylori.6
São consideradas úlceras refratárias as que não cicatrizam após
8 a 12 semanas de tratamento. Dessa maneira, devem ser
pesquisados fatores que estejam contribuindo para a não
cicatrização, como, por exemplo, a má aderência ao tratamento,
persistência da infecção pelo H. pylori, uso inadvertido de AINEs,
tabagismo, estados hipersecretores, comorbidades, rápida
metabolização de antissecretores e causas incomuns de úlcera,
como doença de Crohn, gastroenterite eosinofílica, infecções
diversas e câncer. 13

2.3. Complicações
• As principais complicações das úlceras pépticas são:
sangramento, perfuração, obstrução de saída e penetração.

• Definições – formas atípicas de úlceras:


1) Úlceras gigantes: medindo mais que 2 cm, com risco
aumentado de malignidade. Mais comum sangramento e/ou
obstrução de saída gástrica.
2) Úlceras de canal pilórico: localizadas no canal pilórico,
possivelmente se apresentam com vômitos por obstrução de
saída gástrica.
3) Úlceras hemorrágicas: úlceras que causam sangramento e
podem necessitar de ressuscitação volêmica, hemotransfusões,
hospitalização e terapia endoscópica de urgência.7

2.3.1. Sangramento
Ele ocorre quando uma úlcera erode na parede de um vaso
sanguíneo gastroduodenal.11
O sangramento é a complicação mais comum da UP.
Até 15% das UP sangram e sua mortalidade é cerca de 10%, além
de ser a causa mais comum de hospitalização nos pacientes com
UP. Ela é responsável por cerca de 20% de todas as hemorragias
digestivas altas (HDAs) agudas.11, 12
O uso de AINEs é um fator de risco importante para sangramento
da UP, promovendo o sangramento em parte por meio de seus
efeitos antiplaquetários.11
Pacientes com sangramento agudo (hematêmese e/ou melena
e/ou choque hipovolêmico) devem ser avaliados no pronto-socorro e
uma endoscopia deve ser realizada após estabilização clínica.11
Essa estabilização passa por uma anamnese e um exame físico
resumidos; avaliação da necessidade de intubação orotraqueal e da
necessidade de internação em unidade de terapia intensiva;
solicitação de hemograma, coagulograma, eletrólitos (sódio,
potássio), ureia, creatinina e perfil hepático; avaliação da quantidade
necessária de hidratação venosa e de transfusão sanguínea (uma
estratégia mais restritiva de transfusão apenas para hemoglobina <
7 g/dL) que demonstraram melhorar significativamente os
desfechos do paciente.8
Deve-se usar IBP antes da realização da endoscopia na suspeita
de hemorragia digestiva não varicosa.
IBP não diminui mortalidade, apenas mantém pH acima de 6,
facilitando a agregação plaquetária e estabilizando do coágulo.
Dose habitual: Omeprazol em altas doses: bolus de 80 mg, seguido
por 8 mg/h.9
Endoscopia digestiva alta deve ser realizada nas primeiras 24
horas da admissão hospitalar na suspeita de hemorragia digestiva
por UP. A terapêutica endoscópica é guiada pela classificação de
Forrest, pois ela relaciona estigmas de sangramento endoscópico
com percentagem de ressangramento (Quadro 3). Essa terapia está
indicada nos pacientes com UP se: Forrest IA, IB e IIA. Considerar
terapia endoscópica se UP com Forrest IIB, especialmente nos
pacientes com alto risco de ressangramento. Deve-se dar
preferência para uso da terapia combinada (injeção de adrenalina +
segundo método), ou monoterapia com método térmico ou
mecânico (hemoclipes) (fluxograma 1). Todos os casos de HDA por
UP devem ser pesquisados para a infecção por H. pylori, e se for
constatada o tratamento deve ser oferecido. O IBP de ser mantido IV
em altas doses por 72 h nos casos de úlcera péptica com Forrest IA,
IB, IIA e IIB.9
O tratamento cirúrgico ou a embolização arterial transcateter via
radiologia intervencionista fica reservada para os pacientes em que
a hemostasia endoscópica das úlceras hemorrágicas fracassar.11
A embolização tornou-se o procedimento de escolha quando o
tratamento endoscópico não é viável, para o paciente com úlcera de
ressangramento ou hemorragia gastrointestinal inicial maciça.6
Quadro 3: Classificação Endoscópica de Forrest
Fluxograma 1 – Papel da endoscopia na hemorragia por úlcera
péptica Fonte: Bucci, Rotondano, Marmo.10

2.3.2. Perfuração
A perfuração é causada pela erosão da úlcera por meio da
parede do estômago ou duodeno para a cavidade peritoneal (Figura
2).11
A úlcera péptica perfurada é uma emergência cirúrgica e é
associada a uma morbidade de até 50% e mortalidade de até 30%.
Embora o sangramento seja a complicação mais comum, cerca de
7% dos pacientes com UP vão desenvolver a perfuração (proporção
de 6:1).4, 6, 12
Figura 2: Mecanismos e fatores de risco na patogênese da úlcera
péptica perfurada.

Fonte: Søreide et al.4

A maioria das perfurações ocorre em pacientes idosos, que


fazem uso de AINEs e com as úlceras localizadas no duodeno ou no
antro gástrico.11
Os pacientes devem ser encaminhados ao pronto-socorro para
serem submetidos a uma avaliação cirúrgica de imediato.11
Apresenta-se como uma condição abdominal aguda, com
peritonite localizada ou generalizada e alto risco de desenvolvimento
de sepse, choque, peritonite e morte. Estima-se que 30% a 35% dos
pacientes que vão à sala de cirurgia por doença ulcerosa péptica
perfurada terão sinais de choque e sepse, resultando em morte em
metade desses pacientes.6
O diagnóstico precoce é essencial, mas os sinais clínicos podem
ser obscurecidos em idosos ou em pacientes imunocomprometidos,
atrasando o diagnóstico.4 Se o diagnóstico for claro, a intervenção
cirúrgica não deve ser adiada para um teste de confirmação, como
uma tomografia computadorizada.6
Um estudo de coorte dinamarquês de 2.688 pacientes com
úlcera perfurada descobriu que a cada hora de atraso da admissão à
intervenção cirúrgica resultava um aumento de 2,4% na mortalidade
pós-operatória.6
Para pacientes que apresentam sinais de sepse, uma gasometria
arterial e a dosagem do lactato podem ser úteis. Uma radiografia
abdominal e de tórax pode mostrar pneumoperitônio, mas não é tão
sensível quanto a tomografia computadorizada para identificação e
localização da fonte de perfuração.6
As hemoculturas devem ser realizadas precocemente, antes do
início dos antibióticos de amplo espectro, embora o tratamento com
antibióticos não deva ser adiado.4
Deve-se puncionar acesso intravenoso e proceder ressuscitação
volêmica adequada. A inserção de cateter urinário para monitorar a
produção de urina e a colocação de equipamentos de
monitoramento invasivos devem ser consideradas medidas
adicionais para orientar a ressuscitação.6
A técnica cirúrgica precoce mais conveniente laparoscópica ou
laparotômica deve ser usada para lidar efetivamente com a
perfuração e, ao mesmo tempo, obter o controle da sepse intra-
abdominal.4, 6
Atualmente, nenhuma evidência sugere que a laparoscopia seja
melhor que a cirurgia aberta, mas igualmente nenhuma evidência
sugere que a laparoscopia é prejudicial em pacientes com sepse ou
peritonite generalizada. No entanto, como nenhuma diferença de
mortalidade foi demonstrada para cirurgia aberta versus a técnica
laparoscópica, a experiência do cirurgião local e a avaliação do
paciente devem ser consideradas até que evidências robustas
possam ser obtidas.4
A maioria dos cirurgiões trata um paciente com úlcera perfurada
com a técnica do patch de omento devido à sua morbimortalidade
reduzida em comparação à ressecção gástrica. A maioria das
perfurações ocorre no duodeno ou no antro pré-pilórico e deve ser
reparada com esse adesivo omental (figura 3).6
Figura 3 – Reparo com patch Graham da úlcera duodenal perfurada.
Um segmento do omento é fixado com suturas sobre uma
perfuração do duodeno
Fonte: Baker.14

A desvantagem dessa abordagem cirúrgica mais conservadora


tem sido uma incidência significativa de recorrência da úlcera. Com
o objetivo de reduzir o risco de recorrência da úlcera, foram
utilizados outros procedimentos, que incluem piloroplastia com
vagotomia troncular, antrectomia com vagotomia troncular e uma
vagotomia de células parietais combinada com um patch omental.6
A biópsia é desnecessária porque essas úlceras duodenais
raramente são associadas a malignidades.
O paciente deve ser tratado com um IBP intravenoso e testado
para H. pylori e tratado se positivo.
A endoscopia deve ser realizada 6 a 8 semanas após a cirurgia e
da conclusão da terapia com H. pylori.6
Às vezes, uma perfuração pode ser muito grande (> 2 cm) ou os
tecidos inflamados muito friáveis para permitir uma sutura primária
segura. Além disso, se um vazamento ocorrer após uma tentativa de
reparo primário, um segundo reparo poderá não ser possível. Nessas
circunstâncias, a ressecção pode ser uma opção mais segura. A
estratégia cirúrgica pode então envolver ressecção, ressecção
gástrica com uma gastrojejunostomia anastomose (se localizada na
região pilórica) ou a colocação de um dreno T, se localizado no
duodeno.4
Úlceras pépticas gigantes do duodeno que perfuram apresentam
um desafio técnico único, devido à sua localização proximal à
ampola de Vater.
A maioria autores defendem um reparo de patch de omento
combinado com uma técnica de “tubo triplo”, com ou sem exclusão
pilórica. A técnica de “tubo triplo” é realizada colocando um tubo no
estômago para drenagem, bem como um tubo de jejunostomia
retrógrado que de volta ao duodeno para descompressão.
Finalmente, é colocada uma jejunostomia por cateter de
alimentação para alimentação enteral. A exclusão do piloro pode ser
realizada suturando o piloro com uma sutura em bolsa com fio
absorvível ou grampeando através do estômago distal com um
grampeador não cortante, proximal ao piloro. À medida que o
duodeno cicatriza, a linha de grampos gástricos ou suturas pilóricas
se abrirão e a continuidade será restaurada no trato gastrointestinal.
Drenos peritoneais são geralmente colocados ao redor do local da
perfuração para controlar o vazamento do conteúdo duodenal. 6
O tratamento de eleição das úlceras gástricas perfuradas é a
excisão ou ressecção em cunha; no entanto, uma gastrectomia
parcial pode ser necessária, dependendo da localização da úlcera e
da extensão da doença.6
Deve-se sempre excluir câncer gástrico com biópsias, pois 13%
das perfurações gástricas podem ser secundárias a uma
malignidade.
Úlcera gástrica que não cicatriza com a terapia apropriada deve
também levantar suspeita de malignidade.6
2.3.3. Obstrução de saída gástrica
A obstrução da saída gástrica ocorre em menos de 2% dos
pacientes com UP, é causada por estenose pilórica crônica e pode
ocorrer à medida que úlceras no canal pilórico são cicatrizadas ou
apresentam inflamação e edema.11, 12
Pode apresentar-se com náuseas, vômitos e perda de peso.11
A tomografia computadorizada com contraste oral geralmente é
o teste diagnóstico inicial realizado nesses pacientes para identificar
obstrução ou estenose, além de avaliar a evidência de malignidade.6
Uma EDA é indicada para avaliar a aparência, o grau de obstrução
da saída gástrica e obter biópsias para excluir malignidade.6
O manejo é voltado ao tratamento da causa da úlcera. Inibidores
da bomba de prótons em doses elevadas também são usados no
manejo dessa condição. A dilatação endoscópica é muitas vezes
útil, sendo a cirurgia reservada para casos refratários.11
Antes da intervenção cirúrgica, é apropriado corrigir as
deficiências nutricionais com uso de sonda nasoenteral ou com
nutrição parenteral total.6
As opções cirúrgicas incluem vagotomia troncular com
piloroplastia, antrectomia ou gastrojejunostomia. A
gastrojejunostomia com uma vagotomia troncular evita a
abordagem do duodeno e é uma boa opção técnica nesse cenário,
mas tem uma maior incidência de úlcera recorrente.6

2.3.4. Penetração
Ocorre quando a úlcera crônica penetra pela espessura inteira da
parede gástrica ou duodenal em um órgão adjacente como o
pâncreas, mas sem perfuração livre para a cavidade peritoneal. O
manejo é o mesmo da terapia de úlcera padrão. No entanto,
algumas vezes uma intervenção cirúrgica é necessária.11

2.4. Prognóstico
Com a terapia com IBP, as úlceras duodenais tipicamente
cicatrizam em 4 semanas e as úlceras gástricas em 8 semanas.11
Em pacientes com úlceras pépticas causadas por Helicobacter
pylori, o prognóstico após a erradicação é satisfatório: o risco de
recorrência de úlcera duodenal é aproximadamente 20%, o risco de
recorrência de úlcera gástrica é aproximadamente 30%.11
A erradicação do H. pylori também é benéfica para indivíduos
com doença ulcerosa complicada. 11
Para úlceras associadas ao uso de AINEs, a descontinuação do
AINE (e a erradicação do H. pylori, se presente) causará um baixo
índice de recorrência de úlceras. Em pacientes que continuam a usar
AINEs, a recorrência de úlceras é alta. Assim, a prescrição de um IBP
simultâneo é recomendável.11

CONCLUSÃO
O tratamento da doença ulcerosa péptica evoluiu
significativamente nos últimos 40 anos. Embora a terapia de
supressão ácida e a descoberta e tratamento do H. pylori tenham
tornado a doença ulcerosa crônica menos comum, a perfuração, o
sangramento e a obstrução aguda da úlcera exigem que o cirurgião
tenha conhecimento significativo dos múltiplos algoritmos de
tratamento apropriado para os cuidados de emergência e eletivos
desses pacientes. 6

REFERÊNCIAS
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prática cirúrgica moderna. 19. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2015.
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3. Huang JQ, Sridhar S, Hunt RH. Role of Helicobacter pylori infection and nonsteroidal
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Bleeding Control. Gastrointestinal Endoscopy Clinics Of North America, [s.l.], 2015;
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11. Kristle Lee Lynch (United Kingdom). British Medical Journal. BMJ Best Practice:
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12. Greenberger NJ, Blumberg RS, Burakoff R. Current Diagnóstico & Tratamento:
gastroenterologia, hepatologia & endoscopia. 2. ed. Rio de Janeiro: Lange; 2012.
13. Averbach M. Sobed. Tratado ilustrado de endoscopia digestiva. Rio de Janeiro:
Thieme Revinter Publicações; 2018.
14. Baker RJ. Perforated duodenal ulcer. In: Fischer JE, Bland KI, editors. Mastery of
surgery. 5th edition. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2007.
Parte 2 | Capítulo 26

Nódulos tireoidianos
Autores: Eneivaldo Soares Mororó e Guilherme Pinho Mororó

1. Introdução
Nódulos tireoidianos são afecções bastante comuns em nosso
meio, afetando cerca de de 6% das mulheres e 2% dos homens. Essa
prevalência é ainda maior em regiões com deficiência de iodo.
Contudo, cerca de 85%-95% dessas lesões são benignas.
A avaliação de nódulos tireoidianos desenvolveu-se bastante
após o advento da ultrassonografia, visto que afecções menores que
1 cm, anteriormente não identificadas com a palpação, puderam ser
visualizadas. Hoje, cerca de 70% dos adultos possuem algum nódulo
tireoidiano quando submetidos a ultrassonografia de alta resolução.
Além disso, a avaliação de características da lesão por esse exame
pode sugerir risco maior para malignidade, como visto
posteriormente.
A existência desse acometimento, em geral, sugere afecções
relativas a própria tireoide, visto que raramente neoplasias primárias
em outros sítios metastatizam para a tireoide, sendo os principais
mama, rim e cólon.

1.1. Diagnóstico
Anamnese com identificação do sexo, da idade, da história
familiar e da história de radiação na infância são pontos-chaves para
a conduta desses pacientes. Isso é evidenciado pela maior
incidência de malignidade em jovens e pior prognóstico em idosos.
A prevalência dos nódulos tireoidianos é maior em mulheres, mas
lesões malignas são 2 a 3 vezes mais comuns em homens.
Fundamental questionar sobre se paciente tem história de irradiação
prévia no pescoço.
Na história familiar pode nos influenciar na conduta a ser tomada
quando identificamos síndromes associadas a câncer de tireoide,
como NEM 2A e 2B e Síndrome de Gardner. De forma contrária, a
história de irradiação na infância é um importante fator de risco para
carcinoma papilífero.
A sintomatologia do paciente identifica sinais de alarmes, como
dor, evolução rápida e rouquidão (sugerindo acometimento do nervo
laríngeo recorrente).
Exame físico é fundamental para guiar melhor a investigação e o
rastreio desses pacientes, pois textura firme, contorno irregular,
aderido a estruturas adjacentes e linfonodo cervical ipsilateral
aumentado e palpável são características que sugerem malignidade.
Logo, deve-se avaliar com cuidado tamanho, consistência, textura da
superfície, mobilidade e sensibilidade, além das estruturas
adjacentes.
Nódulos associados à dor na porção inferior do pescoço
anteriormente, com tosse, dispneia, hemoptise, disfonia, disfagia
e/ou odinofagia são condições que sugerem malignidade por
compressão e invasão de estruturas adjacentes, como nervo
laríngeo recorrente, traqueia e esôfago.
Tendo em vista a anamnese e o exame físico do paciente, alguns
exames complementares são importantes na elucidação do caso.
Sendo os mais utilizados: avaliação da função tireoidiana,
ultrassonografia cervical e cintilografia tireoidiana.

• A avaliação da função tireoidiana é realizada com a


solicitação inicialmente hormônio estimulante da tireoide
(TSH). Hipertireoidismo, mesmo que subclínico, tente a levar
a um feedback negativo sobre a hipófise, causando uma
diminuição no TSH. Outros exames podem ser solicitados
para melhor avaliação do acometimento e da causa, como
tiroxina (T4) e anticorpo antitireoperoxidase (anti-TPO), esse
último para descartar tireoidite autoimune em pacientes com
TSH elevado indicando hipotireoidismo primário, situação na
qual há desenvolvimento assimétrico da glândula,
confundindo examinar sobre a presença de um nódulo, a
ultrassonografia nesses casos também é esclarecedora.

• Ultrassonografia cervical (US): esse exame é de extrema


importância no manejo do paciente com suspeita de nódulo
tireoidiano, identificando lesões que na palpação são
imperceptíveis ou de difícil avaliação, além de determinar as
características da lesão. Nesse contexto, a US classifica os
nódulos em sólidos, císticos e mistos, sendo estes os com
maior risco de malignidade.
- Esse exame não é obrigatoriamente realizado antes da
biópsia, contudo gera informações adicionais que auxiliam
até no procedimento a ser realizado.
- Algumas características visualizadas na US aumentam a
suspeita de um maior potencial de malignidade, entre elas:
lesões hipoecogênicas, contornos irregulares e calcificação
fina. Ademais, o Doppler é bastante utilizado para determinar
a vacularização com a Classificação de Chammas (tabela 1).
Tabela1: Classificação de Chammas.
Chammas I Ausência de Vascularização

Chammas II Vascularização periférica

Chammas III Vascularização periférica maior ou igual a central

Chammas IV Vascularização central maior que a periférica

Chammas V Vascularização apenas central

- A grande problemática criada com o advento desse exame é


que houve um superdiagnóstico de câncer de tireoide em
países pioneiros, como Coreia do Sul e EUA, mas sem
modificar a mortalidade de forma significativa. Isso
demonstrou a necessidade da criação de um classificação
mais fidedigna para os nódulos tireoidianos, orientando a
conduta a ser tomada. Portanto, em 2015 foram convocados
comitês que definiram uma abordagem para nódulos
incidentais de tireoide, conhecido como TIRADS (Sistema de
Geração de Imagens, relatórios e dados da tireoide), a
semelhança do BIRADS para a mama, para definir os
benefícios de um diagnóstico de cânceres clinicamente
importantes e os riscos de procedimentos a serem realizados
nesse tipo de lesão.
- Portanto, é fundamental compreender melhor o TIRADS. Ele
é dividido em 5 características básicas: Composição,
Ecogenicidade, Forma, Margem e Focos Ecogênicos, sendo
dadas pontuações para cada característica (Tabelas 2 e 3),
quanto mais pontos mais suspeito é o nódulo. Isso favorece
um direcionamento melhor para quais nódulos devem ser
pesquisados com mais detalhes por meio da PAAF e quais
necessitam melhor acompanhamento por meio de
ultrassonografias regulares (não existe consenso na literatura
em que regularidade esse acompanhamento deve ser feito,
mas, em geral, se não há alteração de tamanho após 5 anos
pode-se suspendê-lo).
Tabela 2: Aspectos avaliados pelo TIRADS associados com as
características e pontuações que determinam a suspeita de
malignidade do nódulo da tireoide.
CARACTERÍSTICA E PONTUAÇÃO

Cístico ou Predominantemente Cístico: 0 pontos


Composição Espongiforme: 0 pontos
(escolher 1) Sólido e Cístico misturados: 1 ponto
Sólido ou Predominantemente Sólido: 2 pontos

Anecoico: 0 pontos
Ecogenicidade Hiperecoico ou isoecoico: 1 ponto
(escolher 1) Hipoecoico: 2 pontos
Muito hipoecoico: 3 pontos

Forma Mais largo que alto: 0 pontos


(escolher 1) Mais alto que largo: 3 pontos

Regular: 0 pontos
Margem Mal definido: 0 pontos
(escolher 1) Lobulado ou irregular: 2 pontos
Extensão extra tireoidiana: 3 pontos

Nenhum ou grandes artefatos em cauda de cometa: 0 pontos


Focos
Macrocalcificações: 1 ponto
Ecogênicos
Calcificações periféricas: 2 pontos
(aplicar em todos)
Focos de pontos ecogênicos: 3 pontos
Tabela 3: Estratificação dos nódulos tireoidianos associados ao
risco e a conduta recomendada para cada situação específica
PONTUAÇÃO CLASSIFICAÇÃO RISCO CONDUTA

0 pontos TR1 Benigno Não necessita PAAF

2 pontos TR2 Não suspeito Não necessita PAAF

PAAF se > ou = 2,5 cm


3 pontos TR3 Pouco suspeito Seguimento se > ou =
1,5cm

Moderadamente PAAF se > ou = 1,5 cm


4 a 6 pontos TR4
suspeito Seguimento se > ou = 1cm

PAAF se > ou = 1 cm
Altamente
7 pontos ou mais TR5 Seguimento se > ou =
suspeito
0,5cm

• Cintilografia: exame solicitado apenas quando TSH


encontra-se suprimido, classificando o nódulo, comparando-
o ao resto da glândula, em:
- Nódulo “quente”: hipercaptante. Sugere benignidade.
- Nódulo “frio”: não captante. 10% dos casos são malignos.

Tabela 4: Associação das características identificadas na


ultrassonografia e na cintilografia com o risco de malignidade.
BENIGNO MALIGNO

Lesão anecoica ou
Ecogenicidade Lesão hipoecogênica
hiperecogênica

Margens Regulares Irregulares

Calcificações
Calcificações grosseiras (“em Microcalcificações
casca de ovo”)
Halo Presente Ausente
hipoecogênico

Vascularização Chammas I, II e III Chammas IV e V

Cintilografia Nódulo “quente” Nódulo “frio”

• Punção aspirativa com agulha fina (PAAF): é o método mais


preciso para diferenciar os nódulos benignos dos malignos,
analisando citologicamente os nódulos. A acurácia é
aumentada com a realização do procedimento guiado por
ultrassonografia.
- Por meio da PAAF classifica-se os tumores de acordo com
a classificação Bethesda (tabela 5), contudo tem como
fator limitante a dificuldade em diferenciar um adenoma de
um carcinoma folicular, sendo os dois agrupados como
tumores foliculares.
- Esse procedimento invasivo só é indicado em algumas
situações específicas:
• Nódulos de quaisquer tamanhos associados a
linfoadenomegalias suspeitas;
• Nódulos > 0,5 cm com características de malignos na
ultrassonografia;
• Nódulos de 1 cm ou maior com microcalcificações;
• Nódulos mistos (císticos-sólidos) com 1,5 cm ou mais e
características que sugerem malignidade na
ultrassonografia, ou 2 cm ou mais, independentemente
das características da ultrassonografia;
• Nódulos espongiformes com 2 cm ou mais.
- Nódulos benignos são identificados nas amostras como
grupamentos de células epiteliais foliculares de aspecto
normal com coloide, não sendo necessária ressecção
cirúrgica.
- Nódulos malignos são identificados nas amostras como
grupamentos abducentes de células epiteliais com
características nucleares atípicas e coloide escasso ou
ausente, sendo recomendado tireoidectomia nesses
pacientes.
- Pacientes sem indicação para PAAF ou que tiveram
resultados benignos devem ser reavaliados a cada 6-18
meses com ultrassonografia. Esse tempo pode ser
encurtado se houver crescimento acelerado.
Tabela 5: Definição da classificação de Bethesda com risco de
malignidade e conduta a ser realizada em determinados casos
RISCO DE
DEFINIÇÃO CONDUTA
MALIGNIDADE

Amostra não diagnóstica ou


Bethesda I 1%-4% Repetir PAAF
não satisfatória

Seguimento clínico e
Bethesda II Benigno 2,5%
com ultrassonografia

Bethesda III Atipia indeterminada 14% Repetir PAAF

Bethesda IV Tumor Folicular 25% Cirurgia

Bethesda V Suspeito de malignidade 70% Cirurgia

Bethesda VI Maligno 99% Cirurgia

2. Tratamento
O tratamento dos nódulos de tireoide levam muitas dependem de
muitas variáveis, desde a clínica do paciente (se é ou não
sintomático) ao estadiamento do nódulo. Nesse contexto, várias
terapêuticas foram desenvolvidas, buscando diminuir, ainda mais, a
mortalidade e as complicações dos procedimentos para garantir
uma melhor qualidade de vida ao indivíduo.
Um dos tratamentos mais antigos e mais estudados é a cirurgia
convencional que, em geral, realiza-se uma tireoidectomia total, em
especial, se paciente com alta probabilidade de malignidade do
nódulo. Isso porque a recidiva de cânceres de tireoide são comuns
após procedimentos mais conservadores que realizam apenas uma
lobectomia, por exemplo.
No entanto, novos tratamentos como ablação com
radiofrequência demonstraram que para nódulos benignos
tireoidianos estão associados a um menos risco de alteração da
função da glândula, menor tempo de internação e menos lesão de
estruturas adjacentes, como nervo laríngeo recorrente, apesar de
mesmo índice de redução do volume da tireoide e das recorrências
se comparados com a cirurgia convencional. Logo, para nódulos
benignos o tratamento com radiofrequência é considerado primeira
linha nos casos de problema estético, sintomatologia associada,
hiperfuncionalidade da glândula e recusa por cirurgia.
Outros tratamentos considerados nesse contexto são ablação
radioativa com iodo (a qual muitas vezes é associada ao
procedimento cirúrgico no intuito de erradicar completamente a
glândula, destruindo um possível câncer residual, fundamental, em
especial nos casos de câncer metastático e recidivaste também) e
uso de inibidores de tirosina-quinase (como vandetanibe,
cabozantinibe, sorafenibe, entre outros, mas precisam de mais
estudos para demonstrar a eficiência na diminuição na
morbimortalidade desses pacientes).

Referências
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Edition-Enhanced Online Features and Print, Single Volume, 24: Goldman’s Cecil
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Parte 3: Procedimentos Básicos da Cirurgia
Geral na Prática

Parte 3 | Capítulo 27

Os anestésicos locais
Autora: Isabela Alcântara Rocha
Coautor: Dr. Thales Resende Damião

1. INTRODUÇÃO
A descoberta dos anestésicos locais foi feita pelo oftalmologista Carl Köller no final do
século XIX, que passou a utilizar a cocaína em sua prática médica na forma de colírio
anestésico. A cocaína foi isolada pela primeira vez em 1960 pelo químico Niemann, que
mencionou o seu efeito de adormecimento local e torpor quando em contato com a pele ou
mucosa.1 Posteriormente novas substâncias surgiram em substituição à cocaína, e por
serem substâncias capazes de bloquear a percepção da dor, os anestésicos locais
passaram a ser utilizados de forma abrangente até os dias atuais nos consultórios de
dentistas, em procedimentos na pele, como, por exemplo, a realização de botões
anestésicos para sutura, biópsias ou excisões e até durante o ato cirúrgico por meio da
raquianestesia, bloqueio epidural ou anestesia locorregional.

2. O QUE UM CIRURGIÃO DEVE SABER


2.1. A percepção do estímulo doloroso
A nocicepção refere-se à ativação de fibras nervosas sensoriais primárias (nociceptores)
por estímulos nocivos, isto é, estímulos que potencialmente provocam lesão tecidual. Os
nociceptores possuem terminações nervosas livres localizadas na pele, nos tecidos
profundos e nas vísceras eles transmitem impulsos da periferia para o corno dorsal da
medula espinal, onde a informação é subsequentemente processada e transmitida a
diversas partes do cérebro.2

2.2. A farmacologia dos anestésicos locais


Segundo Rang3 a transmissão de um estímulo ocorre a partir da despolarização da
membranas axonais com a abertura dos canais de sódio. Os anestésicos locais agem
bloqueando os canais de sódio impedindo a criação do potencial de ação que levaria a
transmissão daquele estímulo doloroso. Porém, sua ação não é seletiva, logo, não é possível
bloquear a sensibilidade dolorosa sem afetar as outras modalidades sensitivas como
térmica ou tátil, e, além disso, os anestésicos locais podem ter ação também no
componente motor. Inicialmente há o bloqueio da condução de fibras nervosas de pequeno
diâmetro para depois atingirem as de maiores diâmetro. Os estímulos nociceptivos são
conduzidos por fibras do tipo Aδ e C que são bloqueados mais rapidamente do que outras
modalidades sensitivas já o componente motor será o ultimo a ser bloqueado, pois os
axônios motores têm os maiores diâmetros e são mielinizados.

2.2.1. Quanto à natureza química


Os anestésicos locais são bases fracas compostas por: uma cadeia aromática (lipofílica)
e uma cadeia intermediária, a qual contém uma ligação éster ou amida e uma amina
terciária (hidrofílica). A estrutura química dos anestésicos locais interfere em sua interação
com o organismo: um anestésico que contém ligação do tipo éster é rapidamente
metabolizado no plasma enquanto ligações do tipo amida são mais estáveis e duradouras
por serem metabolizadas por enzimas hepáticas. Além disso, por ser um composto básico,
os anestésicos locais atuam mais rapidamente também em meios alcalinos, sendo de difícil
aplicação em meios ácidos, como, por exemplo, uma ferida contendo secreção purulenta.3
Figura 1: Anestésicos locais de ligações amida e éster

Fonte: Imagem adaptada a partir do slide 16 de 42 em:


https://slideplayer.com.br/slide/5610322/

2.2.2. Quanto às propriedades físico-químicas


O início da ação do anestésico local depende de seu grau de ionização (Pka), que
representa o valor do pH no qual as formas ionizadas e não ionizadas estão presentes em
partes iguais. A forma não ionizada do anestésico é responsável pela difusão dele nas
células nervosas e a quantidade do anestésico em sua forma não ionizada é inversamente
proporcional ao Pka; logo, quanto menor o Pka, maior a concentração do anestésico em
forma não carregada eletricamente e maior será sua difusão consequentemente será mais
rápido será o seu início de ação. Por exemplo: a lidocaína tem um pka de 7,7 tem o início de
ação mais rápido que a bupivacaina que tem um Pka de 8,1.4
A duração do anestésico está relacionada à capacidade de ligação às proteínas dos
canais de sódio das membranas nervosas. Então, quanto maior a afinidade do anestésico a
essas proteínas, maior será a sua permanência naquele canal e consequentemente maior a
extensão do seu bloqueio.4
A lipossolubilidade determina a potência do anestésico, visto que o axônio possui
lipídeos em sua composição, então quanto mais lipossolúvel o anestésico local maior a sua
penetração na membrana nervosa axonal. Por sua vez, uma lipossolubilidade extremamente
elevada acarreta maior difusão do anestésico para o tecido adiposo, gerando diminuição de
sua concentração na membrana nervosa e consequentemente perda em sua potência.4
Figura 2: Propriedades físico-químicas dos anestésicos locais de uso clínico

Fonte: Barash PG, Cullen BF, Stoelting RK, Cahalan MK, Stock MC, Ortega R & Sharar SR. .
Fundamentos de Anestesiologia Clínica. Artmed Editora , Porto Alegre; 2017, 8ª ed, p.312
2.2.3. Quanto à associação de substâncias:
O uso de vasoconstrictores (epinefrina) é responsável pelo aumento da duração do
bloqueio anestésico. Quando há vasodilatação, ocorre uma absorção sistêmica do
anestésico, causando diminuição da sua quantidade no local de aplicação. A associação de
uma substância vasoconstrictora visa minimizar essa perda para a corrente sanguínea
aumentando a concentração do anestésico no local de ação contribuindo para que seu
efeito seja prolongado. Além disso, a associação de epinefrina ao anestésico local parece
desempenhar efeito analgésico ao interagir com receptores adrenérgicos α2 na medula
espinal. Os opioides (em especial a buprenorfina) também exercem efeito sinérgico na
analgesia quando associados aos anestésicos locais durante anestesias no espaço
peridural ou subaracnóideo sem aumentar a toxicidade sistêmica do anestésico local. Os
agonistas adrenérgicos α2 como a clonidina produzem analgesia sinergística por meio de
receptores adrenérgicos supraespinais e espinais, além disso, a clonidina produz efeitos
inibidores na condução nervosa periférica. Os esteroides (dexametasona) combinados aos
anestésicos locais são capazes de prolongar a duração da analgesia por aproximadamente
50% na abordagem supraclavicular ou interescalena para bloqueio do plexo braquial.5

3. Efeitos colaterais e toxicidade


Os efeitos colaterais de um anestésico local dependem de sua concentração plasmática.
Ao ganharem a corrente sanguínea por absorção sistêmica ou por injeção acidental nos
vasos os anestésicos locais, em altas concentrações plasmáticas, exercem efeitos tóxicos
no sistema nervoso central e cardiovascular.3 A concentração plasmática de um anestésico
local está diretamente ligada à dose administrada, além de relações com absorção
sistêmica, local da injeção, distribuição tecidual, eliminação da droga e adição ou não de
agentes vasoativos. Para serem empregados com segurança e para que não ocorram
intoxicações, as doses máximas dos anestésicos locais devem ser respeitadas.6
Figura 3: As doses dos anestésicos locais para bloqueios nervosos maiores
Fonte: Imagem adaptada a partir de: Miller RD, Eriksson LI, Fleisher LA, Wiener-Kronish JP,
Cohen NH, & Young WL.. Miller’s Anesthesia [e-book]. Elsevier Health Sciences, Philadelphia,
2014, v.8, p.1043

3.1. Sistema nervoso central


Os efeitos colaterais ao nível do sistema nervoso central ocorrem devido à capacidade
dos anestésicos locais de penetração na barreira hematoencefálica e os sintomas precoces
ao cruzarem esta barreira são: zumbido, entorpecimento da língua, dormência perioral e
gosto metálico.6 Em baixas concentrações plasmáticas, os anestésicos locais promovem
efeitos estimulantes no sistema nervoso central: euforia, tremores, agitação, convulsões
clônicas e confusão mental. Em concentrações maiores ocorrem os efeitos inibitórios:
sonolência, sedação, perda da consciência ou até morte por depressão respiratória.7

3.2. Sistema cardiovascular


Os efeitos colaterais dos anestésicos locais no sistema cardiovascular ocorrem quando
são atingidas concentrações plasmáticas altas, como, por exemplo, na injeção inadvertida
do anestésico nos vasos sanguíneos (especialmente se associados à epinefrina) e
geralmente quando surgem os efeitos cardiovasculares já estão em vigência os efeitos
adversos do SNC. A depressão miocárdica acontece por diminuição da força de contração
cardíaca, vasodilatação arteriolar resultando em hipotensão e por bloqueio de condução ou
arritmias devido diminuição da excitabilidade elétrica cardíaca.7

4. Uso clínico dos anestésicos locais


4.1. Uso tópico
O uso tópico consiste na aplicação do anestésico na pele ou mucosa para reduzir a dor
em procedimentos urológicos, proctológicos, oftálmicos, cosméticos, dentários etc. Além
disso, uma das indicações do anestésico tópico tem como objetivo o manejo da dor local,
como, por exemplo, em casos de queimaduras ou lesões na pele. Para esse fim, os
anestésicos locais têm apresentação em gel, pomadas, colírios, sprays ou soluções.

4.2. Anestesia intravenosa regional


Pode ser realizada a infiltração do anestésico via intravascular em um membro
previamente garroteado de modo que o anestésico se difunda até as terminações nervosas
do tecido adjacente, porém, sem atingir a circulação sistêmica e consequentemente exercer
efeitos tóxicos.4

4.3. Anestesia infiltrativa


Um botão anestésico pode ser realizado a partir da infiltração do anestésico local no
tecido subcutâneo para posteriormente realizar procedimentos na pele subjacente, como,
por exemplo: excisão de lesões dermatológicas ou suturas.
Figura 4: Exemplo de anestesia infiltrativa

Fonte: Brewer JD, Roenigk RK. Anestesia tumescente: técnica auxiliar para excisões
extensas em cirurgia dermatológica. Surgical & Cosmetic Dermatology. 2010; 2(2), p.141

4.4. Raquianestesia
Cirurgias ortopédicas, ginecológicas, urológicas e perianais, bem como procedimentos
em abdome inferior (infraumbilicais) são indicações da raquianestesia.10 A raquianestesia
consiste na aplicação de anestésicos locais no espaço subaracnoide através da passagem
de uma agulha pela parede do saco dural. Um dos efeitos adversos da punção é uma
cefaleia relacionada ao ortostatismo, que ocorre quando há perfuração acidental da
meninge.11 A raquianestesia deve ser feita abaixo do nível da terceira vértebra lombar (L3 –
L5), a fim de evitar que a agulha perfure o cone da medula espinhal, que termina em L1 na
maioria dos pacientes.13

Figura 5: Anatomia da coluna lombar e local da raquianestesia


Fonte: Imagem adaptada a partir de: I, PhilippN encontrada em:
https://de.wikipedia.org/wiki/Spinalan%C3%A4sthesie#/media/Datei:Prinzip_der_Spinalanae
sthesie.png

4.5. Bloqueio epidural


O bloqueio epidural consiste na administração de um anestésico local no espaço
peridural, o anestésico se difunde através da dura-máter e atinge as raízes nervosas e a
medula espinal e através dos forames intervertebrais produzindo múltiplos bloqueios
paravertebrais.4 Segundo ITUK,13 essa anestesia é geralmente utilizada para procedimentos
abdominais, pélvicos e de membros inferiores e, menos frequentemente, para
procedimentos torácicos. Também pode ser usada para complementar a anestesia geral e
para analgesia pós-operatória. Ela pode ser feita em qualquer nível da coluna vertebral,
embora seja mais comumente realizada na região lombar ou torácica, sendo regida pelo
nível dos dermátomos associados ao procedimento a ser realizado.13

4.6. Anestesia locorregional


A anestesia locorregional consiste na infiltração de anestésicos locais no território de
fibras nervosas por meio de uma agulha guiada por ultrassom. Essa técnica visa o bloqueio
de plexos ou nervos periféricos, possibilitando a realização de procedimentos nos membros,
além de tratamento de dores neuropáticas, como, por exemplo, uma neuralgia do trigêmeo.
Figura 6: Bloqueio de plexo braquial via interescalênica

Fonte: A e B extraídas de nysora.com, e C extraída de nysora.com

CONCLUSÃO
Os anestésicos locais são substâncias que visam o bloqueio da transmissão de
estímulos nociceptivos; são amplamente utilizados para o tratamento da dor, na sua
prevenção para realização de procedimentos clínicos de diversas especialidades e também
nos hospitais em diferentes modalidades anestésicas, possibilitando o ato cirúrgico. Dada a
sua grande abrangência e importância no cotidiano da prática médica, é de extrema
importância o conhecimento dos efeitos dos anestésicos locais no corpo humano, a fim de
se manejar o evento orgânico mais subjetivo que existe e capaz de intervir em aspectos
emocionais, psicológicos e afetivos da vida do paciente: a dor.

REFERÊNCIAS
1. França VP. O namoro de Freud e a descoberta da anestesia tópica. Rev Med Minas Gerais. 2010; 20(1):131-137.
2. Schulman JM, Strichartz GR. Farmacologia dos anestésicos locais. In: Golan DE, et al. Princípios de
Farmacologia: A Base Fisiopatológica da Farmacoterapia.Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 2009. v. 2.
3. Rang HP, Dale MM, Ritter JM, Flower RJ & Henderson G. . Rang & Dale Farmacologia. Rio de Janeiro: Elsevier
Brasil; 2015.
4. Cangiani LM, Carmona, MJC, Torres MLA, Bastos CO, Ferez D, Silva, ED & Tardelli MA. Tratado de anestesiologia.
São Paulo: SAESP; 2017.
5. Barash PG, Cullen BF, Stoelting RK, Cahalan MK, Stock MC, Ortega R & Sharar SR.. Fundamentos de
Anestesiologia Clínica. Artmed Editora, Porto Alegre; 2017.
. Barbosa MPL, Boni CLA, Andrade FCJ. Conduta na intoxicação por anestésicos locais. Rev. méd. Minas Gerais.
2010; 20(4/S1).
7. Brunton LL, Knollmann BC. As Bases Farmacológicas da Terapêutica de Goodman e Gilman-13. Artmed Editora,
Porto Alegre; 2018.
. Miller RD, Eriksson LI, Fleisher LA, Wiener-Kronish JP, Cohen NH, & Young WL.. Miller’s Anesthesia [e-book].
Elsevier Health Sciences, Philadelphia, 2014.
9. Brewer JD, Roenigk RK. Anestesia tumescente: técnica auxiliar para excisões extensas em cirurgia
dermatológica. Surgical & Cosmetic Dermatology. 2010; 2(2): 140-143.
10. Hodgson PS, Liu SS. New developments in spinal anesthesia. Anesthesiology Clinics of North America. 2000;
18(2): 235-249.
11. Alstadhaug KB, et al. Post-lumbar puncture headache. Tidsskrift for den Norske lægeforening: tidsskrift for
praktisk medicin, ny række. 2012; 132(7): 818-821.
12. Introduction to Ultrasound-Guided Regional Anesthesia. NYSORA, 2019 [acesso em 2019 dez. 14].
13. Morche KR, Balbinot LAK, Schneider GF, Schwantes GC, Moura MD & Aquino RB. Bloqueios do neuroeixo: uma
revisão entre duas modalidades anestésicas. Acta méd. Porto Alegre, 2018; 39(1): 47-54.
Parte 3 | Capítulo 28

Agulhas e fios
Autora: Lara Ranulfo de Mendonça
Coautores: Breiner Rodrigues de Almeida Ferro e Leandro do Couto
Aguiar

1. Introdução
No passado, frequentemente segurávamos agulhas em nossas
mãos. O risco de perfuração acidental e de infecção/contaminação
tornou essa prática insustentável e, por isso, passamos a utilizar
porta-agulhas. A observação das diferentes características
biológicas dos tecidos humanos também impuseram a necessidade
de variados tipos de agulhas e fios.
As agulhas são feitas de aço ou outras ligas metálicas, para que
tenham resistência suficiente (a fim de não quebrar), rigidez e
ductilidade para suportar a deformação plástica sob ação de cargas
sem se quebrar e de retornar à forma anterior original quando
deformadas). As agulhas perfuraram, penetraram e ultrapassam
tecidos que recebem o fio de sutura.
As suturas eram realizadas utilizando fios de fibras de cânhamo,
linho ou de crina de animais. Entretanto, tais fios apresentavam
inúmeras dificuldades em seu uso, como baixa resistência, muita
reatividade e difícil manuseio.
Com a evolução da Medicina foram sendo desenvolvidos
métodos para diminuir as adversidades antes encontradas no
processo de síntese tecidual, exemplificados por antissepsia
(utilização de produtos sobre pele e mucosas com objetivo de reduzir
microrganismos em sua superfície), assepsia (conjunto de medidas
para impedir a introdução de agentes patogênicos no organismo),
fabricação de fios cirúrgicos cada vez melhores e aprimoramento
das técnicas para realização de procedimentos diversos. Cada fio
possui características particulares e indicações de uso. Os fios
cirúrgicos podem ter a necessidade de ser removidos ou então
serem absorvidos pelo próprio organismo do indivíduo.
Inicialmente agulhas e fios eram produzidos separadamente;
tinha-se um agulheiro com tamanhos e tipos de agulhas diferentes e
os fios eram avulsos passados posteriormente e as agulhas podiam
ser reesterilizadas. Ainda hoje podem ser utilizadas em algumas
situações específicas, porém em caráter de exceção.
Atualmente é disseminado o uso de fios de sutura pré-
esterilizados, embalados individualmente, com agulhas pré-
instaladas e entregues prontos.

2. AGULHAS
2.1. Escolha da agulha
Para cada sutura existe uma agulha ideal que será escolhida com
base no local onde será utilizada, a maleabilidade e composição do
tecido, além do tipo de ponto que pretende-se usar.

2.2. Estrutura das agulhas


A estrutura das agulhas cirúrgicas é dividida em três partes: a
ponta (parte que penetra os tecidos), o corpo (parte central
presa/fixada pelo porta agulha) e o fundo ou olho (parte ao qual o fio
é acoplado). Quanto à forma, podem ser retas (em desuso) ou
curvas. O ângulo interno classifica-as em curvas, semirretas e retas.
As pontas podem ser de secção transversa cilíndrica ou
triangular. As cilíndricas são chamadas de não cortantes ou
atraumáticas, por apenas perfurarem o tecido sem cortar. Ideais para
vísceras ocas como intestino ou vasos sanguíneos. As de secção
triangular são chamadas de triangulares, cortantes ou traumáticas.
Elas são identificadas no produto por um alvo ou bola e por um
triângulo, respectivamente.
De acordo com o corte transversal do corpo da agulha temos o
perfil. O perfil da agulha pode ser cilíndrico, plano ou triangular.
Tecidos firmes e densos, como a pele e músculos, precisam de
agulhas triangulares com pontas cortantes. Tecidos macios e
delgados requerem o uso de agulhas cilíndricas com ponta
atraumática.
Figura 1: Tipos de agulhas

Fonte: Página Technofio. 1. Produtos: Seda. [S. l.], [2016?] [Acesso em


2019 out. 22]. Disponível em: http://technofio.com.br/produtos/seda-
preta-trancada

Figuras 2 e 3: Agulhas com relação ao seu perfil. Cortante e cilíndrica


Fonte: Clínica Cirúrgica, Rodrigues JJG, Machado MCC, Rasslan S.

2.3. Tipos de agulhas cirúrgicas e suas indicações


de uso – Exemplos
Agulha cilíndrica: sutura de cavidade abdominal, intestino e dos
vasos sanguíneos.
Agulhas cortantes com perfil triangular ou plano/invertido: tecidos
de maior resistência como a pele e os tecidos fibrosos.
Agulhas cilíndricas com pontas rombas: suturar vísceras macias,
como o fígado.

3. FIOS
Para escolher o fio adequado é importante ater-se às
características físico-químicas, relacioná-los aos tecidos e às
condições orgânicas do local a ser operado.
A resistência do fio à tração, as alterações induzidas ao tecido
pela sua presença e seu tempo de absorção devem ser consideradas
no momento de sua escolha. Algumas características relevantes:
Capilaridade: capacidade de o fio absorver / reter líquidos.
Relaciona-se com a capacidade de retenção de micro-organismos e
adesão de micróbios.
Diâmetro: mede o calibre do fio. É expressa, por convenção, por
zeros. A quantidade de zeros é inversamente proporcional ao
diâmetro transversal do fio. Dessa forma, quanto maior o número de
zeros menor será o diâmetro do fio e vice-versa.
Composição física: fato de o fio ser formado por um filamento
único (monofilamentar) ou por múltiplos filamentos
(multifilamentares). Alguns exemplos de fios monofilamentares são
os fios de náilon e polipropileno. Exemplos de multifilamentares
temos o Categute, poliéster e poliglactina. Em geral os fios
multifilamentares apresentam menos memória (vide abaixo) e mais
fácil manuseio, porém geram maior reação inflamatória ao tecido e
maior possibilidade de formação de biofilme.
Resistência à tração: é quantidade de força / peso que o fio pode
suportar sem se romper.
Força do nó: avalia se o nó feito com aquele tipo de fio pode ser
desfeito de forma fácil ou difícil. Tem influência da aspereza do
material, quantidade de atrito entre outros fatores.
Memória: capacidade de retornar a forma original após ser
tracionado e manipulado.
Um fator de extrema importância na escolha do fio é a quantidade
de reação tecidual que ele origina. A reação tecidual inclui desde
trauma na passagem, indução de processo inflamatório e
predisposição a instalação de processos infecciosos.
Figura 4: Fio monofilamentar – memória.

Fonte: Clínica Cirúrgica, Rodrigues JJG, Machado MCC, Rasslan S.

Figura 5: Fio multifilamentar – memória


Fonte: Clínica Cirúrgica, Rodrigues JJG, Machado MCC, Rasslan S.

Figura 6: Fios multifilamentar e monofilamentar.


Fonte: Clínica Cirúrgica, Rodrigues JJG, Machado MCC, Rasslan S.

4. O FIO IDEAL
O fio ideal conseguiria englobar inúmeras características
requisitadas para um bom fio e sua utilização. O fio ideal conseguiria
unir os pontos positivos de cada um dos fios utilizados em um único
fio. Infelizmente, o fio perfeito ainda não foi inventado ou descoberto.
Algumas qualidades do fio ideal são:
- Duração no tecido somente pelo período em que for necessário
(ou seja, desaparecer após a cicatrização).
- Memória pequena para que seu manuseio seja mais simples.
- Não ser condutor de eletricidade.
- Ter boa força de nó.
- Ter grande resistência à tração.
- Ser monofilamentar (apresentam menor reação tecidual, menos
indutores de inflamação e “facilitadores” de infecções).
- Ter baixo custo financeiro.
Ainda que o fio ideal ainda não exista, cada fio possui seus pontos
fortes e seus pontos fracos. Cabe ao profissional saber aliar os
pontos positivos com a necessidade encontrada para uma sutura
específica. Os fios foram divididos, neste capítulo, em absorvíveis e
inabsorvíveis para uma melhor didática.

4.1. Fios absorvíveis


São fios cujo organismo tem a capacidade de reabsorvê-los, por
meio de fagocitose ou hidrólise enzimática, do local em que foram
implantados. Podem ser derivados de tecidos animais ou podem ser
análogos sintéticos.

4.2. Categute simples


Obtido por meio da camada serosa do intestino de ovelhas ou
bovinos. É conservado e depois sofre processos industriais para
minimizar proteínas animais. O categute simples é embalado e
mantido em solução alcoólica para preservar suas características
sem endurecer e tornar-se quebradiço. É um fio de rápida reabsorção
pelo organismo.
Indicação: tecidos de cicatrização rápida – trato urinário, mucosa
oronasal, mucosa vaginal.
Não utilizar: pele e intradérmico.
Força de tensão (refere-se à força necessária para partir a sutura):
7 a 10 dias
Tempo médio de reabsorção: máximo de 70 dias.

4.3. Categute cromado


É o categute simples após passar por um processo de imersão
em cromo para aumentar sua resistência à tensão e aumentar sua
duração no organismo antes de ser reabsorvido.
Indicação: tecidos com cicatrização um pouco mais demorada
como o trato gastrointestinal, trato geniturinário, sutura de útero nas
cesáreas.
Força de tensão: 3 a 4 semanas.
Tempo médio de reabsorção: 90 dias.
4.4. Poliglactina VICRYL®
Fio sintético composto por polímeros. É multifilamentar e tem
maior resistência e maior duração no organismo do que os fios
categute simples e cromado.
Indicação: tecidos moles em geral, fechamento de cavidade
abdominal, aproximação de tecidos subcutâneos.
Não utilizar: aparelho cardiovascular, neurológico.
Força de tensão: média de 30 dias.
Tempo médio de reabsorção: 50 até 70 dias.

4.5. Poliglecaprone Monocryl®


Fio absorvível sintético com alta resistência e pouca memória. Fio
monofilamentar, colorido ou incolor, em que, geralmente, a cor do fio
está relacionada com o tipo de agulha escolhido (se usarmos
agulhas atraumáticas optaremos pelo fio colorido enquanto no uso
de agulha traumática optamos pelo fio incolor).
Indicação: suturas intradérmicas e subdérmicas, anastomose
gastrointestinal, mucosa uretral.
Força de tensão: 21 a 28 dias.
Tempo médio de reabsorção: 90 a 120 dias.

4.6. Polidioxanona PDS II®


É um fio de boa força de tensão. Tem baixa memória. Pode ser
encontrado incolor ou colorido. Causa pouca reação em tecidos
adjacentes.
Indicação: pele, intradérmico e subdérmico, subcutâneo, sutura
estrutural em rinoplastia.
Força de tensão: 60 dias.
Tempo médio de reabsorção: maior que 180 dias.

4.7. Fios inabsorvíveis


Por conceito são aqueles fios que não são reabsorvidos pelo
organismo. Entretanto, com o passar dos anos e a exposição a
diversos processos químicos e físicos dos tecidos corporais, os fios
podem ser lentamente degradados e, dessa forma, serem
possivelmente absorvidos. Esse tipo de fio pode ser tingido com
corantes e envolvido por outras substâncias a fim de melhorar a
visibilidade em processos operatórios, diminuir a capilaridade e
aumentar a resistência.

4.8. Fio de náilon


Náilon é um fio cirúrgico composto de polímero sintético. É
monofilamentar, causa pouca reação tecidual (fio mais inerte ao
organismo) mas apresenta baixo atrito, fato que ocasiona um fio
pouco fixo e com alta memória. Tem boa relação custo-benefício.
Indicação: fechamento de tecidos com alta tensão e que
necessitam de suturas de longa duração. Ex.: pele sob tensão,
tendões, defeitos de parede abdominal como diástase e hérnias.

4.9. Polipropileno
Fio sintético, monofilamentar, não absorvido pelo organismo. É
um fio de altíssima estabilidade tissular e com pouca reação no
corpo. Fio de muita memória.
Indicação: cirurgias cardiovasculares, fechamento de
aponeuroses de cavidade abdominal, fixação de telas em correção de
hérnia inguinal, suturas vasculares, sutura intestinal durante cirurgia
de apendicectomia.

4.10. Poliéster
Multifilamentar, trançado, não absorvível. É um fio maleável e
suave, facilitando a manipulação mas dificultando a fixação dos nós.
Indicação: pode ser utilizado em qualquer sutura, especialmente
utilizado em cirurgias cardíacas.

4.11. Seda
Multifilamentar, trançado e torcido. Facilmente manuseado, tem
alta resistência e produz nós bastante seguros. Pode induzir muita
reação com formação de granulomas por presença de proteínas de
origem animal.
Indicação: melhor escolha para ligaduras vasculares
Força de tensão: máximo de 1 ano.

4.12. Algodão
Multifilamentar, origem vegetal. Fios de baixo custo, pouca
memória e fácil manuseio.
Indicação: fixação de campos cirúrgicos, ligaduras vasculares.

4.13. Aço
Fio monofilamentar, não biodegradável, obtido do aço inoxidável.
Fio eletrolítico. Inerte, alta resistência e flexibilidade.
Indicação: suturas ósseas como fechamento de esternotomia
durante cirurgia cardíaca.

5. INOVAÇÕES NA PRÁTICA
CIRÚRGICA
5.1. Fios Antibacterianos
São fios agulhados como o poliglactina, poliglicaprona e
polidioxanona, porém com o adicional de conterem substâncias
antibacterianas em sua estrutura. A denominação “Plus” é
acrescentada no nome dos fios.
Os fios com antimicrobianos (usualmente o Triclosan e a
Clorexidina) fornecem proteção contra colonização da sutura por
bactérias associadas a infecções de sítio cirúrgico por no mínimo 7
dias (período considerado crítico no processo de cicatrização).
As bactérias comumente relacionadas são: Staphylococcus
aureus, Staphylococcus epidermidis, Escherichia coli, entre outras.
Figura 7: Sutura/fio Monocryl PLUS.
Fonte: Johnson & Johnson do Brasil Indústria e Comércio de
Produtos para Saúde Ltda.,2018. Browse Products. [S.l.]; 2019
[acesso em 2019 out. 8].

5.2. Fios Farpados / Escamados


A sutura farpada apresenta pontos de fixação ao longo de toda a
sutura, como se fossem pequenos ganchos, não apresentando a
necessidade de nós para estabilização e proporcionando maior
controle da tensão. As farpas/escamas ao longo do fio previnem
movimentação retrógrada do fio da sutura no tecido suturado, além
de eliminar a necessidade de nós e impedindo as complicações
relacionadas a eles. São muito utilizados para suturas contínuas
longas com possível tensão. Ex.: Fechamento de aponeurose pós
laparotomia, correção de diástase retoabdominal, sutura subdérmica
contínua.
Figura 8: Fio de sutura farpado/escamado.

Fonte: Johnson & Johnson do Brasil Indústria e Comércio de


Produtos para Saúde Ltda., 2018. Browse Products. [S.l.]; 2019
[acesso em 2019 out. 8].

6. COLA CIRÚRGICA
Colas cirúrgicas são uma boa alternativa às suturas
convencionais, tendo como vantagens: retirada espontânea do
sistema, boa força tênsil; barreira antimicrobiana; menor tempo de
aplicação; diminuição de dor e inflamação pós-operatória no local da
síntese. A composição da cola é principalmente Cianoacrilato (e seus
derivados) e Metacrilosisolfolano. É empregada na camada superior
da pele e pode ser acompanhada de uma tela de poliéster para selar
e proteger o corte. Em geral, mantém sua força de tensão por 2-3
semanas.
Possui as desvantagens de elevar o custo com matérias,
possibilidade de causar reações alérgicas e necessitar de maior
cautela no uso em certas regiões corporais (como em áreas muito
estiradas). Por mais que ainda seja recente, a síntese feita com cola
cirúrgica é certamente uma inovação promissora e sua
implementação está progressivamente sendo disseminada na prática
médica.
CONCLUSÃO
Existem variados tipos de agulhas e fios, indicações individuais e
características cada um deles. Alguns fatos devem ser lembrados:
-Tecidos delicados e frágeis requerem o uso de agulhas
atraumáticas, assim como tecidos resistentes e densos precisam do
uso de agulhas cortantes e mais traumáticas.
Os fios de sutura, seguindo as premissas de Van Winkle e Hasting,
devem:
- Ter força semelhante a força do tecido em que for utilizado.
- Ser conhecidas as interações biológica provocadas por eles no
processo de cicatrização.
- Somente perder resistência se o tecido suturado estiver
ganhando resistência, ou seja, cicatrizando.
A aplicação da técnica de forma correta, o bom conhecimento
básico teórico e a gradativa experiência adquirida em campo
permitem que o profissional faça escolhas seguras e adequadas,
além de conseguir obter resultados positivos nos procedimentos
realizados.

REFERÊNCIAS
1. Chega ao Brasil sutura farpada para o fechamento de incisões cirúrgicas [acesso em
2019 out. 10]. Disponível em: https://portalhospitaisbrasil.com.br/chega-ao-brasil-
sutura-farpada-para-o-fechamento-de-incisoes-cirurgicas/.
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Rev. Bras. Cir. Plást.2017;32(1):101-108.
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4. Equipe operatória fios e suturas: técnica cirúrgica – FMUSP. [acesso em 2019 set. 28].
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9. Goffi FS, Tolosa EMC. Operações fundamentais. In: Goffi FS. Técnica cirúrgica: bases
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1 . Moriya T, Vicente Y, Tazima M F. Instrumental cirúrgico. Medicina (Ribeirão Preto.
Online). 2011 mar.; 44(1): 18-32.
17. Quitzan JG. Técnica Cirúrgica Veterinária. Botucatu, SP: [s. n.], 2013 [acesso em 2019
set. 30].
1 . Petroniau A, Miranda ME, Oliveira RG. Blackbook Cirurgia: Medicamentos e rotinas
médicas. Belo Horizonte: Blackbook; 2008. 736 p.
19. Rodrigues JJG, Machado MCC, Rasslan S. Clínica Cirúrgica. Barueri, SP: Manole;
2008.
20. Barros M et al. Princípios básicos em cirurgia. Porto,Acta Med Port.; 2011.
21. Ingracio AR. Técnica Cirúrgica. Caxias do Sul, RS: Educs; 2017. [E-book]
22. Produtos: Seda. [S. l.], [2016?] [acesso em 2019 out. 22].
23. Stratafix™ Knotless Tissue Control Devices: Product & Procedure Compendium. US:
Ethicon; 2017 [acesso em 2019 out. 21].
Parte 3 | Capítulo 29

Nós e suturas
Autora: Lara Ranulfo de Mendonça
Coautores: Breiner Rodrigues de Almeida Ferro e Leandro do Couto
Aguiar

1. INTRODUÇÃO
Os nós cirúrgicos são fundamentais na hemostasia definitiva
(como, por exemplo, ligadura de vasos sangrantes) e no processo de
síntese. Eles são parte importante das ações manuais repetitivas em
uma cirurgia. Aprender a técnica básica sobre os tipos de nós, suas
utilizações, além de aprimorar a teoria com o treinamento repetitivo
da técnica adequada são os pontos de partida para consegui-los
realizar de forma correta.
A realização de sutura para o fechamento de incisões ou síntese
de ferimentos tem objetivo de evitar infecção, proteger estruturas
nobres, obter estética satisfatória e possibilitar o processo
cicatrização primária da ferida com maior qualidade, rapidez e
segurança. As suturas podem ser realizadas por pontos separados
(também denominados interrompidos ou suturas simples) e por
pontos contínuos (suturas contínuas).

2. NÓS
As extremidades das ligaduras e das suturas são unidas por nós.
Um nó é um entrecruzamento dos fios com o propósito de uni-los.
São dois tipos: comuns (quadrado e deslizante) e especiais (nó de
cirurgião, nó de roseta e nó por torção). Podem ser realizados por
meio das técnicas manuais, apenas instrumentais ou mistas (mais
comuns, com uso de porta-agulha e mão livre para auxiliar). Em geral,
são realizados 3 seminós: 1º de contenção, 2º de fixação e o 3º de
segurança.

2.1.COMUNS
2.1.1. Nó quadrado ou antideslizante
Nó básico, composto por dois seminós, feitos com os mesmos
movimentos similares mas com mãos opostas, ou então um seminó
feito no sentido horário e outro seminó em sentido anti-horário,
como, por exemplo, a técnica de Pauchet utilizando nós do dedo
médio e dedo indicador respectivamente (vide a seguir). É um nó
firme, seguro, não facilmente desfeito. Faz-se um terceiro seminó
contrário ao segundo apenas por segurança. Estes são realizados de
forma contrária ou anterior (chamados de nós e contranós), a fim de
não afrouxar o nó ao final da sua execução.

2.1.2.Nó torto ou deslizante


Caso os seminós sejam feitos com movimentos similares
mantendo as mesmas mãos (repetição) ou se os seminós forem
feitos sem alternar o sentido. Usado para reajuste de segurança.

2.2. ESPECIAIS
2.2.1. Nó duplo ou nó do cirurgião
Utilizado para nós feitos sob tensão, em que o primeiro seminó
feito tem que ser duplo para manter a tensão nos fios. O segundo
seminó é simples e feito no sentido oposto ao primeiro seminó, e o
terceiro também é simples e contrário ao segundo. Outra utilidade do
nó do cirurgião seria em caso de uso de fio monofilamentar, que
naturalmente apresenta maior memória e maior probabilidade de
afrouxar o nó.
Figura 1- Nó de cirurgião
Fonte: Bases técnicas da cirurgia, Kirk RM.

2.2.2. Nó em roseta
Nó para ancorar as extremidades de fios em suturas
intradérmicas, por exemplo, quando apenas uma extremidade do fio
está disponível. Ele é reversível se tracionado.
Técnica nó em roseta: rotação de uma das extremidades do fio
em torno das presas do porta-agulha, o qual realiza a preensão da
parte proximal desse mesmo seguimento e o traciona por dentro da
alça anteriormente formada.
Figura 2: Nó em roseta- nó de apoio para suturas contínuas
Fonte: Instrumental cirúrgico, Moriya T, Vicente Y, Tazima M F.

3. TÉCNICA MANUAL
Unimanual (uma mão realiza os movimentos enquanto a outra
mão somente fixa o fio) ou bimanual. Realizados pela Técnica de
Pauchet e Técnica de Sapateiro.

3.1. Técnica de Pauchet com o dedo médio – Nó


comum com uma mão:
3.1.1. Primeiro seminó – Mão direita
Fio inicia cruzado, segurando com a mão direita o fio de baixo
pela pinça do indicador, deixando o dedo médio livre.
Fio empalmado e mão em pronação.
Mão em supinação.
Cruzamento dos fios.
Faz alça com o fio utilizando o dedo médio.
Traciona pontas do fio.

3.1.2. Segundo seminó – Mão esquerda


Empunhadura após o cruzamento do fio.
Fio empalmado (mão em pronação) e fio empalmado (mão em
supinação).
Cruzamento do fio e confecção da alça.
Tração na ponta do fio.
Figura 3: Técnica Pauchet com dedo médio
Fonte: Instrumental cirúrgico, Moriya T, Vicente Y, Tazima M F.

4. Técnica de Pauchet com o dedo


indicador – Nó Comum com duas mãos
4.1. Primeiro seminó – Mão direita
Empunhadura do fio após o cruzamento, segurando com a mão
direita o fio de cima pela pinça do médio, deixando o dedo indicador
livre.
Introdução do dedo indicador.
Faz alça com o fio e traciona alça.
Tração das pontas do fio.

Segundo seminó – Mão esquerda


Empunhadura do fio após o cruzamento e posicionamento do
dedo indicador.
Confecção e tração da alça.
Tração das pontas do fio.
Figura 4: Técnica Pauchet com dedo indicador
Fonte: Instrumental cirúrgico, Moriya T, Vicente Y, Tazima M F.

5. Técnica de Sapateiro
Um pouco mais lenta em sua confecção, porém permite que as
extremidades dos fios sejam mantidas esticadas e que não haja
perda de tensão nos seminós. Primeiro seminó duplo se tensão ou
uso de fio monofilamentar, segundo e terceiro seminós simples,
contrários entre si por meio da troca de mão ou inversão do sentido
(contra nós).

5.1. Primeiro seminó


O fio que vai executar o nó está pela frente e está cruzado por
baixo.
Dedo “em revolver”, utilizando a primeira comissura da mão para
apoiar os fios.
Pega-se, descruza-se por baixo, cria-se uma alça e entrega o fio
pela frente.
Para ser duplo seminó duplo, entrega-se novamente pela frente.

5.2. Segundo e terceiro seminós


Pega-se o fio do mesmo lado que se faz o primeiro seminó.
Levar o fio por trás e entregar por trás.
Figura 5: Técnica de Sapateiro
Fonte: Instrumental cirúrgico, Moriya T, Vicente Y, Tazima M F.

6. TÉCNICA INSTRUMENTAL
Uso de pinças e porta-agulha, utilizado para a realização de suturas
de ferimentos e incisões.

6.1. Nó cirúrgico
Segure a agulha (e o fio) entre o polegar esquerdo e o indicador.
Segure o porta-agulha (fechado) na mão direita com a ponta
apontando para a esquerda.
Coloque o fio agulhado contra a ponta do porta-agulha.
Com a mão esquerda, passe o fio em torno da ponta do porta
agulha duas vezes, posicionando o fio distalmente a você.
Abra o porta-agulha e posicione-o para segurar a extremidade
curta do fio.
Puxe o fio mantendo o laço duplo e deixe o laço descer para o fio
segurando a extremidade curta do fio.
Abra o porta-agulha e libere a extremidade curta do fio.
Segundo seminó (simples): sentido contrário ao primeiro.
Coloque o porta-agulha sob o fio.
Passe a extremidade longa do fio em volta do porta-agulha uma
vez.
Abra o porta-agulha e use-o para segurar a extremidade curta do
fio.
Deixe o laço único descer e tensione o fio.
Terceiro seminó (simples).
Segundo seminó no sentido oposto:
Dica: para nós no sentido regular usamos o “lado interno” do fio
para enrolar o porta-agulha.
Para nós no sentido oposto utilizamos o “lado externo” do fio.
Caso o fio possua alta memória será necessário confeccionar 3
nós para garantir uma fixação segura. Dessa forma, o nó seguinte
será sempre do lado oposto ao nó anterior. Ou seja, primeiro nó
sentido regular, segundo nó sentido oposto, terceiro nó sentido
regular.
Figura 6 e 7: técnica de confecção e de fixação do nó.
Fonte: Bases técnicas da cirurgia, Kirk RM.

7. FIXAÇÃO DO NÓ
As funções de “apertar o nó em sua base, conduzir os seminós
até o local adequado e de finalizar sua fixação são feitas pelo dedo
indicador, cuja posição é capaz de alcançar tecidos mais profundos e
de dificil acesso, além de possuir melhor sensibilidade tátil. Não se
deve apertar o nó tracionando as duas extremidades para trás ou
para os lados, pois as estruturas envolvidas podem ser lesadas e até
avulsionadas, ou mesmo o campo cirúrgico mais restrito pode não
permitir tal manobra. A fixação é tão importante quanto a técnica em
si, visto um nó frouxo não tem utilidade ao seu objetivo.

8. O NÓ BEM-EXECUTADO
• Não deve ser cruzado, pois pode romper.
• Não deve ser frouxo.
• Deve ter forças iguais em ambas extremidades do fio.
• Deve ser bem fixado com o dedo indicador.
• Deve possuir número de nós variando de acordo com o tipo de
fio e local de utilização. Fios finos e monofilamentares, por sua
memória, exigem três ou mais nós.
9. PREENSÃO DA AGULHA COM O
PORTA-AGULHAS
O porta agulhas deve prender a agulha na região do corpo, em sua
porção central ou no terço posterior, mas não nas extremidades pelo
risco maior de quebra ou deformidade do material. Se o individuo for
destro ele deve manter a mão em meia-pronação e a ponta da agulha
deve apontar para cima e para esquerda. Já os canhotos devem
manter a ponta da agulha para cima e para direita.
Entrada da agulha em 90 graus em relação ao tecido, em um
ponto equidistante da saída da agulha até a borda da ferida. A
distância entre os pontos deve ser similar ou ligeiramente maior que
a distância entre a borda da pele e a entrada da agulha.

10. SUTURAS EM PONTOS


SEPARADOS
10.1. Vantagens
O afrouxamento ou queda de um dos nós simples não interfere
nos pontos remanescentes.
Menos corpo estranho (fios) no ferimento ocasionando menos
reação tissular.
Pontos menos isquemiante.
Espaços entre pontos que possibilitam a drenagem de secreções
ou coleções. Ideias para uso em áreas contaminadas ou infectadas.

10.2. Desvantagens
Maior trabalho para ser realização.
Mais demorada.

10.3. EXEMPLOS E TÉCNICAS UTILIZADAS


10.3.1. Simples
A agulha é inserida de um lado, cruza-se a incisão e é
exteriorizada para o outro lado através do tecido. Finalizada com a
confecção do nó instrumental ou misto. A posição do nó em relação
ao arco do fio (acima ou abaixo) determina se será uma sutura
simples com nó externo ou interno. O nó deve estar na lateral da linha
de incisão para não gerar maior reação e atrapalhar a cicatrização.
Utilização: é uma sutura universal, usada principalmente na pele.
Figura 8: sutura simples

Fonte: Técnica Cirúrgica, Ingracio AR

10.3.2. “U” horizontal


A agulha perfura a pele, atravessa a incisão e alcança a outra
borda, onde é exteriorizada. Após esse primeiro passo, a agulha vai
perfurar um ponto lateral adjacente da mesma borda. Então, a borda
na qual a sutura foi iniciada será a mesma borda que foi acessada no
final. Finaliza-se com o nó instrumental. Apresenta a característica de
grande eversão das bordas da ferida.
Utilização: suturas de aponeurose, cirurgias de hérnia, suturas de
estruturas com fibras como músculo e tendões.
Figura 9: sutura em “U” horizontal
Fonte: Técnica Cirúrgica, Ingracio AR

10.3.3. “U” vertical (Donatti)


Técnica “longe-longe-perto-perto”. O fio é introduzido a
aproximadamente 8mm da incisão em um lado, passa pela incisão, e
sai pelo lado oposto em uma distância média de 8mm. A agulha é
invertida e retorna ao lado original em uma distância menor, bem
próxima da linha de incisão e mais superficial. Utilização: sutura de
estruturas onde deseja-se leve eversão de bordas, porém com
coaptação adequada delas. Ponto mais estético que o anterior. Ex.:
pele, áreas de articulações (joelho, cotovelo).
Figura 10: Sutura em “U” vertical
Fonte: Técnica Cirúrgica, Ingracio AR

10.3.4. Sutura em “X”


Dois pontos simples unidos. O primeiro ponto simples é realizado
e o segundo ponto simples é feito paralelamente ao primeiro. A
sutura termina com um nó das extremidades dos fios. O ponto,
quando finalizado, apresenta formato da letra “X”. É extremamente
isquemiante e, portanto, hemostático, porém com estética ruim.
Utilização: é usado em fechamento de paredes e aponeurose em
caso de hérnias, músculos ou outras estruturas sangrantes sem vaso
identificável, couro cabeludo.
Figura 11: sutura em “X”
Fonte: Técnica Cirúrgica, Ingracio AR

11. SUTURAS EM PONTOS


CONTÍNUOS
11.1.Vantagens
Rapidez na realização.
Nós apenas no início e no fim da sutura.
Mais hemostática.

11.2. Desvantagens
Um nó frouxo ou solto vai ocasionar a deiscência da sutura por
completo.
É mais isquemiante.

11.3. EXEMPLOS E TÉCNICAS UTILIZADAS


11.3.1. Sutura contínua chuleio simples
A sutura inicia com um nó cirúrgico na borda de incisão e termina
com outro nó na borda oposta. As perfurações são feitas em ângulos
retos em relação às bordas, como se fossem uma sequência de
pontos simples, mas a parte exposta atravessa a incisão
diagonalmente. A cada perfuração é importante ajustar a tensão.
Utilização: sutura de vasos, intestino.
Figura 12: sutura continua chuleio simples

Fonte: Bases técnicas da cirurgia, Kirk RM.


11.3.2. Chuleio ancorado
Chuleio simples, mas que antes de transpassar o fio no tecido
novamente, ele passa dentro de um balão onde a agulha anterior
entrou, ou seja, ele é ancorado no ponto anterior. A sutura é finalizada
com outro nó no lado oposto. É o mais hemostático das suturas
contínuas, porém inestético.
Utilização: vísceras maciças, como no fechamento do útero após
o parto cesárea, couro cabeludo.
Figura 13: sutura continua em chuleio ancorado

Fonte: Bases técnicas da cirurgia, Kirk RM.

11.3.3. “U” horizontal (barra grega ou colchoeiro)


“U” horizontal realizado em série. O início da sutura é um nó
simples instrumental e, sem cortar as extremidades do fio utilizado
neste nó, inicia-se a realização dos pontos em “U” horizontal,
perfurando, atravessando a incisão, fazendo a lateralização
adjacente ao local de saída e reiniciando a sutura no sentido inverso.
O fechamento é feito com o nó em roseta.
Utilização: fechamento do ceco durante a apendicectomia quando
a base do apêndice não está favorável (técnica de Parker-Kerr),
sutura contínua com desejado de leve eversão de bordas (cicatriz
posterior de otoplastia).
Figura 14: sutura contínua em barra grega
Fonte: Bases técnicas da cirurgia, Kirk RM.

11.3.4. Intradérmica
Sutura começa no início da incisão e percorre através da derme
superficial. A agulha é introduzida longitudinalmente na derme por
uma extensão de cerca de 0,5 cm, tangenciando a margem da ferida
internamente, atravessa a incisão e faz o mesmo do outro lado. O
processo é repetido até ser alcançado o ângulo final da outra
extremidade, onde há exposição do fio através da pele. O fechamento
é realizado pela técnica de roseta. Os nós podem ser elaborados
somente ao término da sutura ou então o primeiro nó pode ser o
passo inicial da sutura (ponto simples) e, assim, fixar o fio e facilitar a
execução.
Utilização: feridas de pouca tensão, utilizada somente para
fechamento de derme-epiderme, com coaptação da mesma. Produz
o melhor resultado estético, porém não suporta tensão.
Figura 15: sutura contínua intradérmica

Fonte: Bases técnicas da cirurgia, Kirk RM.

13. FINALIZAÇÃO DA SUTURA


Todas as suturas aqui descritas, com exceção da sutura
intradérmica, têm o seu fechamento realizado pela confecção do nó
cirúrgico feito com o porta-agulha (técnica instrumental ensinada
anteriormente neste capítulo). No caso da sutura intradérmica, sua
finalização é feita pelo nó em roseta.
13.1. CARACTERÍSTICAS DE UMA BOA
SUTURA
Realizar adequada antissepsia e assepsia.
Limpar o local e retirar corpos estranhos.
Regularizar bordas (cortando os excessos de pele irregulares e
tecidos mortos).
Tirar a tensão do tecido (evitando isquemias e deiscências) e
fazer a sutura por planos, aproximando primeiro tecidos mais
profundos e progredindo para os superficiais (evitando espaços
mortos, extravasamento de líquido, entre outras complicações).
Realizar a sutura utilizando os instrumentos, os materiais e as
técnicas adequadas, com pontos simétricos e equidistantes.
Manuseio delicado dos tecidos.

CONCLUSÃO
A Lei dos nós de Levingston explicita que movimentos iguais de
mãos opostas executam um nó perfeito e que a ponta do fio que
muda de lado após a execução do primeiro seminó deve voltar ao
lado inicial para realizar o outro seminó; tendo-a sempre em mente é
possível executar a técnica de forma adequada.
A forma como cada profissional cria seus nós depende da
preferência pessoal. É fundamental praticar como realizar manobras
manuais e instrumentais para conseguir fazê-las em circunstâncias
adversas.
Na realização de suturas, as agulhas devem ser inseridas e
retiradas somente utilizando instrumentos. É necessário ter boa base
teórica para escolher a sutura que será empregada em cada situação
e local do organismo.
O sucesso da síntese cirúrgica depende do cuidado e da distância
com que os pontos são inseridos, a aproximação dos tecidos, o
cuidadoso ajuste da tensão e a finalização com nós seguros.

REFERÊNCIAS
1. Cirurgia ambulatorial. Nós instrumentais [acesso em 2019 out. 12].
2. Equipe operatória fios e suturas: técnica cirúrgica – FMUSP. [acesso em 2019 set. 28].
3. Sutura: princípios básicos [acesso em 2019 out. 3].
4. Carreiro MC. Manual prático de técnica operatória e cirurgia experimental. Curitiba:
Appris; 2019.
5. Goffi FS, Tolosa EMC. Operações fundamentais. In: Goffi FS. Técnica cirúrgica: bases
anatômicas e fisiopatológicas e técnicas da cirurgia. 4. ed. Rio de Janeiro: Atheneu;
2001.
. Marques RG. Técnica Operatória e Cirurgia Experimental. São Paulo. Guanabara
Koogan; 2005.
7. Magalhães RG. Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental. São Paulo: Sarvier; 1996.
. Cirino LMI. Instrumental cirúrgico e operações fundamentais. In: Cirino LMI: Manual de
técnica cirúrgica para a graduação. São Paulo: Sarvier; 2006.
9. Leonard PC, Zilberstein B, Jacob CE, Yagi O, Cecconello I, Nós e suturas em vídeo
cirurgia: Orientação práticas e técnicas, Arq Bras Cir Dig. 2010; 23(3): 200-205.
10. Kirk RM. Bases técnicas da cirurgia. 6. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012. 224 p.
11. Ugulino Netto A, Lisboa JBRM. Manual de Suturas: Técnica Operatória. [S. l.]:
MedResumos; 2016. [acesso em 2019 set. 27].
12. Moriya T, Vicente Y, Tazima M F. Instrumental cirúrgico. Medicina (Ribeirão Preto.
Online), 30 mar. 2011; 44(1): 18-32.
13. Quitzan JG. Técnica Cirúrgica Veterinária. Botucatu- São Paulo: [s. n.]; 2013 [acesso
em 2019 set. 30].
14. Petroniau A, Miranda ME, Oliveira RG. Blackbook Cirurgia: Medicamentos e rotinas
médicas. Belo Horizonte: Blackbook; 2008. 736 p.
15. Rodrigues JJG, Machado MCC, Rasslan S. Clinica Cirúrgica. Barueri, SP: Manole; 2008.
1 . Barros M, et al. Princípios básicos em cirurgia. Porto, Acta Med Port.; 2011.
17. Ingracio AR. Técnica Cirúrgica. Caxias do Sul, RS: Educs; 2017. [E-book].
Parte 3 | Capítulo 30

Punção venosa periférica e central


Autor: Gabriel Bernardo Rena
Coautor: Mariane de Castro Michielin
Orientador: Dr. Roberto Salvador Martins

1. INTRODUÇÃO
A punção venosa é definida como o ato de introduzir de uma
agulha ou cateter em um vaso, podendo ser dividida em central ou
periférica. Trata-se do procedimento mais comumente realizado em
ambiente hospitalar, seja em casos eletivos (como uma coleta
sanguínea para realização de exames) ou em casos de urgência
(pacientes vítimas de trauma, por exemplo).
Os acessos venosos periféricos são amplamente utilizados em
ambientes hospitalares e não hospitalares, sendo úteis na
administração de soluções endovenosas, medicamentos e também
na coleta de sangue. Existem certas regiões anatômicas
preferenciais para a realização desses procedimentos, bem como
técnica adequada, podendo eventualmente cursar com
complicações locais.
Por sua vez, os acessos venosos centrais possuem maior
complexidade de realização e podem ser considerados cirurgias de
pequeno porte, requerendo bom conhecimento anatômico,
habilidade e treinamento técnico. De uma forma geral, estes
acessos podem ser utilizados para administração de soluções
hidroeletrolíticas, medicamentos, hemoderivados, nutrição
parenteral e também coleta de exames.

1.1. Classificação
As principais classificações envolvendo os cateteres são quanto
à localização da ponta da agulha, localização do acesso e tempo de
permanência.

• Localização da ponta da agulha: Classificamos em periférico


aqueles cateteres que se situam em veias superficiais ou
periféricas, como a veia cefálica e veia mediana do epicôndilo
lateral do úmero. Já os centrais são aqueles que são
localizados em veias profundas ou centrais, como a veia cava
superior ou inferior.

• Localização do acesso: É uma classificação muito


semelhante à da localização da ponta da agulha, por meio da
separação em periféricos e centrais. Nos periféricos, temos a
divisão pelo tipo de cateter, como o tipo butterfly, jelco ou
cateter curto. Dentro dos centrais, temos o transcutâneo (por
punção), que se dá pela utilização das veias jugulares
externas e internas; o de inserção periférica, utilizando as
veias cefálicas e basílicas; e os dissecados, que também
utilizam as veias cefálicas e basílicas.
Figura 1: Cateter tipo butterfly
Fonte: Fibra Cirúrgica ®. 1

Figura 2: Cateter tipo jelco

Fonte: Cirúrgica Fernandes ®. 2

• Tempo de permanência: É uma classificação puramente


cronológica. Chamamos de cateter de curta permanência
aqueles que permanecem por um período igual ou inferior a
30 dias, sendo empregado os cateteres comuns. Os de média
permanência são aqueles que ficam por um período entre 1 e
3 meses, e os cateteres mais comumente utilizados são os
não tunelizados com discos microbianos. Já, os de longa
permanência, são aqueles que permanecem por um período
maior que 3 meses, sendo os tunelizados os tipos mais
comuns.

2. PUNÇÃO VENOSA PERIFÉRICA


2.1. Definição
A punção venosa periférica trata-se de um procedimento
realizado com muita frequência, principalmente pela equipe da
enfermagem, e consiste no acesso direto à corrente sanguínea por
meio de dispositivos adequados. Esse processo decorre de
criteriosa seleção do local de punção e de qualidade técnica
adequada para a penetração venosa.

2.2. Indicações
• Hidratação venosa em pacientes com desidratação ou com
impossibilidade de realização pela via oral.

• Administração de drogas endovenosas isoladas (sedação,


analgesia, contrastes radiológicos, medicamentos
específicos) ou intermitentes, de curta permanência.

• Nutrição parenteral periférica (contendo concentração de


glicose até 10% ou 12%).

• Coleta sanguínea para realização de exames.

• Procedimento de emergência no paciente instável ou com


necessidade de reanimação.

• Hemotransfusão e hemodiálise.

• Administração de soluções endovenosas durante


procedimentos anestésicos.

2.3. Locais de Realização


A escolha do local de punção venosa deve ser baseada em uma
criteriosa inspeção dos membros, do pescoço e do couro cabeludo
(crianças).
• Região cervical: A punção venosa periférica na região
cervical não é tão utilizada pelo maior risco de complicações,
visto que a área possui íntimo contato com gânglios e artérias
importantes. Quando há impossibilidade de acesso por outros
locais preferenciais, como em veias dos membros superiores,
podemos utilizar as veias superficiais da região cervical,
sendo as mais comumente empregadas: veia temporal
superficial, veia auricular, veia occipital e veia jugular externa e
interna.

• Região dos membros superiores: Em geral, as veias


superficiais dos membros superiores são as mais utilizadas
para a punção. Os sítios de maior facilidade de implantação e
que promovem um maior conforto ao paciente adulto, são: as
veias do dorso da mão (veia basílica, veia cefálica e veias
metacarpianas dorsais), veia cefálica na parte lateral do
antebraço, veia ulnar e veia basílica do antebraço, com
preferência no membro não dominante.

• As veias da fossa antecubital devem ser consideradas


escolhas secundárias quando há necessidade de uma
permanência maior do acesso, uma vez que ocasionam pior
movimentação do antebraço do paciente. No entanto, estas
são bem indicadas em coletas de exames e punções de
emergência por apresentarem maior calibre e melhor
visualização.
Figura 3: Ilustração anatômica das veias do membro superior.
Fonte: Reis G. 3

• Região dos membros inferiores: As veias superficiais dos


membros inferiores são utilizadas somente como última
opção no adulto, pela maior associação com infecção, flebite
(inflamação da parede da veia) e tromboembolismo, além da
maior restrição de movimento. Nesse caso, o local
preferencial de punção é a veia safena magna, localizada no
dorso dos pés.

2.4. Técnica do Procedimento


Podemos dividir a técnica de realização da punção venosa
periférica em onze etapas:
1ª etapa: Orientar o paciente quanto ao procedimento a ser
executado e seus objetivos, bem como a posição que o membro
deve ser mantido durante o processo.
2ª etapa: Verificar se há iluminação adequada e contenção
apropriada em alguns casos para crianças.
3ª etapa: Garrotear o membro em sua parte proximal, com leve
pressão e sem gerar o desaparecimento no pulso radial. Nesta
etapa, verificamos qual a veia de melhor acesso, e podemos pedir ao
paciente que feche e abra a mão repetidamente e mantenha o braço
pendente para tornar as veias mais dilatadas e visíveis.
4ª etapa: Realizar antissepsia das mãos, com clorexidina a 2%,
iodopovidona a 10% ou álcool a 70%. O álcool não deve ser utilizado
antes dos outros antissépticos, pois inibe a ação destes.
5ª etapa: Em situações eletivas e em crianças menores,
podemos fazer o uso de anestésicos tópicos após prévia escolha da
veia a ser puncionada.
6ª etapa: Garrotear o membro novamente a fim de proporcionar a
dilatação da veia. Em adultos, o garroteamento é realizado
geralmente 5 a 10 centímetros do local de punção venosa.
7ª etapa: Realizar antissepsia do local com algodão embebido
em álcool a 70%, com movimentos circulares do centro às
extremidades.
8ª etapa: Tracionar a pele para baixo com o primeiro dedo abaixo
do local a ser puncionado. Em seguida, realizar a punção com
cateter de plástico sob agulha metálica (tipo Jelco), introduzindo a
agulha com o bisel voltado para cima em ângulo inicial de 45º com a
superfície cutânea e assim alcançado a veia, com inclinação de 10º.
9ª etapa: Se houver retorno sanguíneo, introduzimos o cateter
flexível sob o interior da veia, delicadamente, e posteriormente
removemos a agulha metálica. Nesta fase, a veia pode colabar pela
pressão exercida com a saída da agulha, devendo esta ser realizada
lentamente.
10ª etapa: Remover o garrote e conectar a agulha ao equipo de
soro para verificação de perviedade.
11ª etapa: Fixar adequadamente o cateter à pele do paciente, de
preferência com curativo estéril específico, visto que reduz as
chances de infecção.
O tempo médio de permanência do cateter é de 12 horas para os
dispositivos de infusão com asas (tipo butterfly) e 36 horas para os
cateteres plásticos sob agulhas (tipo Jelco).

2.5. Complicações
A frequência de complicações associadas à punção venosa
periférica é baixa e a maioria pode ser resolvida com a troca do
acesso por meio da punção em outro local. No entanto, quando as
complicações estão presentes, podem conduzir ao aumento da
morbidade e prolongamento da hospitalização, visto que a
contaminação do cateter venoso é a principal causa de infecções
sanguíneas intra-hospitalares.
Podemos destacar algumas complicações locais associadas ao
uso de cateter venoso periférico mais relatadas literatura, como
hematoma, trombose, flebite, tromboflebite, infiltração,
extravasamento, espasmo venoso e infecção local. Estas estão
diretamente relacionadas à experiência e ao conhecimento técnico-
científico dos profissionais da saúde sobre a terapia intravenosa,
que garantem a eficácia terapêutica e qualidade do cuidado
prestado.

3. PUNÇÃO VENOSA CENTRAL


3.1. Definição
A punção venosa central pode ser definida como a introdução de
um cateter objetivando deixar sua ponta na veia cava superior ou
inferior, próxima ao átrio direito.
Figura 4: Acesso venoso central com a ponta do cateter na veia cava
superior

Fonte: Caroline T. 4

3.2. Indicações
Acesso de curta permanência: indicações para o acesso que vai
permanecer por menos de 1 mês.

• Impossibilidade de obtenção de um acesso periférico.

• Acesso venoso para cirurgia de grande porte.

• Administração de drogas vasoativas (como dopamina e


noradrenalina) ou outras drogas irritantes aos vasos
(quimioterapia e fenitoína, por exemplo).

• Hemodiálise sem fístula arteriovenosa.


• Monitorização da pressão venosa central.

• Coletas de sangue frequentes para realização de exames.

• Implantação de marca-passo transvenoso.


Acesso de longa permanência: indicações para o acesso que irá
permanecer por cerca de 6 meses a 2 anos.

• Pacientes oncológicos.

• Doenças crônicas que necessitam de acesso endovenoso


com frequência.

• Hemodiálise sem fístula arteriovenosa.

• Nutrição parenteral prolongada ou permanente.

3.3. Locais de Realização


• Subclávia: é o local mais indicado para pacientes já
internados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Ao utilizar
o acesso pela veia subclávia, garantimos uma melhor
mobilidade ao paciente, e consequentemente mais conforto.
Outra vantagem se dá em relação ao risco de infecção e
trombose, uma vez que ambos são menores. No entanto,
devemos evitar este local em casos hipoxemia e insuficiência
respiratória grave, pelo risco alto de pneumotórax.

• Femoral: região mais favorável para pacientes com parada


cardiorrespiratória, uma vez que não atrapalha os demais
profissionais nas manobras de reanimação. Devemos evitar o
seu uso em casos de trauma de membro inferior ou pelve,
compressão de veia cava e infecção local.
• Jugular interna: mais adequada para casos eletivos. É um
bom local de punção, uma vez que a veia é mais superficial e
calibrosa.

• Jugular externa: trata-se da região onde necessita-se de


menos experiência, por ficar sob visão direta ao realizar
manobra de Valsalva (aumento da pressão intratorácica).

3.4. Técnica do Procedimento


Subclávia: sempre que possível devemos optar pelo lado direito,
uma vez que o risco de gerar um pneumotórax se torna menor.

• Preparo: antes de iniciar o procedimento em si devemos


orientar o paciente quanto ao que será realizado, escolher e
testar o cateter adequado, realizar a paramentação e a
antissepsia do local. Devemos então anestesiar a pele e o
tecido subcutâneo na região da junção do terço medial e
médio da clavícula.

• Posicionamento: posicionar o paciente na posição de


Trendelenburg de 15 a 30 graus. Posteriormente, devemos
afastar levemente os ombros para a região posterior, podendo
utilizar um coxim entre as escápulas. Em seguida, realizamos
leve extensão do pescoço com rotação contralateral da
cabeça.

• Procedimento:
1ª etapa: inserir a agulha conectada à seringa 1 a 2 cm abaixo
do ponto médio da clavícula em direção à fúrcula esternal,
passando posteriormente e rente à clavícula.
Figura 5: Local para inserção da agulha na veia subclávia
Fonte: Eachempati SR. 5

2ª etapa: manter tracionado o êmbolo da seringa até obter


refluxo sanguíneo e não introduzir mais do 3 a 5 cm da agulha.
Caso não ocorra o refluxo, tracionar a agulha seguindo o
movimento oposto à introdução, mantendo pressão negativa. Se
mesmo após o retorno da agulha não obtivermos refluxo,
devemos introduzi-la novamente, porém com uma angulação
discretamente mais cefálica.
3ª etapa: assim que o refluxo sanguíneo for visto, realizar
fixação da agulha na posição, utilizando os dedos. Em seguida,
desconectar a seringa, e imediatamente ocluir a agulha com o
dedo, impedindo uma embolia gasosa. Assim, inserir o fio-guia
pela agulha e então retirá-la.
4ª etapa: utilizar o dilatador com a finalidade de dilatar o tecido
subcutâneo e a veia caso seja necessário (cateteres maiores).
Posteriormente, introduzir o cateter e remover o fio-guia.
5ª etapa: verificar se há o retorno sanguíneo pelo cateter e
viabilidade de todos os lumens. Se positivo, devemos fixar o
cateter com sutura e ocluir com curativo adesivo transparente.
6ª etapa: caso após a passagem do cateter não haja refluxo
sanguíneo, devemos tentar reposicioná-lo, podendo realizar
tração ou introdução mais profunda. Se essas tentativas
falharem, precisamos retirar o cateter e realizar novamente todo
o procedimento.
Femoral: diferentemente da veia subclávia, não há preferência
pelo lado a ser realizado o procedimento.

• Preparo: orientar o paciente quanto ao processo, escolher e


testar o cateter adequado, realizar a paramentação e a
antissepsia local. Em seguida, anestesiamos a região e caso
o paciente esteja muito agitado ou se trate de uma criança,
podemos realizar sedação.

• Posicionamento: o paciente deve se encontrar em decúbito


dorsal com leve abdução dos membros inferiores.

• Procedimento:
1ª etapa: inserir a agulha conectada à seringa 1 a 2 cm abaixo
do ligamento inguinal e 1 cm medialmente em relação à artéria
femoral sob um ângulo de 45 graus em direção à cicatriz
umbilical.
Figura 6: Identificação da veia femoral

Fonte: Azevedo AA. 6


2ª etapa: manter tracionado o êmbolo da seringa até obter
refluxo sanguíneo, introduzindo a agulha até 2 cm nas crianças
e 4 cm no adulto. Caso não ocorra o refluxo, devemos tracionar
a agulha seguindo o movimento oposto à introdução, mantendo
pressão negativa. Se mesmo assim não houver refluxo, retirar
completamente a agulha e realizar o procedimento novamente.
3ª etapa: assim que o refluxo sanguíneo for visto, precisamos
deixar o bisel da agulha à 180 graus e então fixá-la na posição
utilizando os dedos. Em seguida, devemos desconectar a
seringa e imediatamente ocluir a agulha com o dedo, impedindo
uma embolia gasosa. Posteriormente, inserir o fio-guia pela
agulha e então retirá-la.
4ª etapa: usar o dilatador com a finalidade de dilatar o tecido
subcutâneo e a veia, caso necessário. Imediatamente, introduzir
o cateter e remover o fio-guia.
5ª etapa: verificar se há retorno sanguíneo pelo cateter e
viabilidade de todos os lumens, fixando o cateter com sutura e
curativo adesivo transparente.
Jugular interna: optar pelo lado direito, sempre que possível, pelo
menor risco de pneumotórax e praticamente risco nulo de lesão do
ducto torácico.

• Preparo: orientar o paciente quanto ao procedimento,


escolher e testar o cateter adequado, realizar paramentação e
a antissepsia do local. Logo após, realizar anestesia da região
e em casos de muita agitação ou de se tratar de uma criança,
podemos realizar a sedação. Se houver exame de
ultrassonografia disponível, podemos utilizá-lo para identificar
e marcar a posição da veia jugular interna.

• Posicionamento: o paciente deve permanecer em decúbito


dorsal com a cabeça levemente estendida e rotacionada no
sentido contralateral ao lado do procedimento. Se possível
deixar o paciente em posição de Trendelenburg à 20 graus,
com a finalidade de aumentar a turgência venosa e facilitar o
procedimento.
• Procedimento:
1ª etapa: identificar duas regiões, sendo a primeira o triângulo
formado entre os feixes clavicular e esternal do músculo
esternocleidomastoideo, e a segunda o local onde a veia jugular
interna passa lateralmente à artéria carótida, se localizando no
ponto médio da borda medial do músculo
esternocleidomastoideo.
Figura 7: Identificação da veia jugular média

Fonte: Jardel L, Lima P, Marcelino J, Carvalho L, Santos G. 7

2ª etapa: Inserir a agulha conectada à seringa no ângulo


superior do triângulo previamente identificado, lateralmente à
artéria carótida (palpada durante o procedimento), em um
ângulo de 20 a 45 graus com a pele (o maior ângulo será
observado em pacientes mais obesos) com a ponta da agulha
direcionada para o mamilo ipsilateral ao procedimento.
3ª etapa: manter tracionado o êmbolo da seringa até obter
refluxo sanguíneo, e introduzir até 2 cm nas crianças e 4 cm no
adulto. Caso não haja refluxo, devemos tracionar a agulha
seguindo o movimento oposto à introdução, mantendo pressão
negativa. Se mesmo assim não notarmos a presença do refluxo,
é necessário retirar completamente a agulha e realizar o
procedimento novamente.
4ª etapa: com a visualização do refluxo sanguíneo, devemos
fixar a agulha na posição utilizando os dedos. Imediatamente,
desconectar a seringa e ocluir a agulha com o dedo, impedindo
uma embolia gasosa. Prontamente inserir o fio-guia pela agulha,
não forçando contra resistências, retirando-a em seguida.
5ª etapa: utilizar o dilatador para dilatar o tecido subcutâneo e a
veia, caso seja necessário (cateteres maiores). Posteriormente,
introduzir o cateter realizando movimentos rotacionais e então
remover o fio-guia.
6ª etapa: por fim, verificar se há retorno sanguíneo pelo cateter
e viabilidade de todos os lumens e assim fixar o cateter com
sutura e curativo adesivo transparente.
É recomendado a realização de uma radiografia simples de tórax
para confirmar a localização adequada do cateter (junção da veia
cava superior com o átrio direito).
Jugular externa: optar pelo lado direito, quando possível, pelo
menor risco de pneumotórax e risco praticamente nulo de lesão do
ducto torácico.

• Preparo: orientar o paciente quanto ao processo, escolher e


testar o cateter adequado, realizar paramentação e a
antissepsia do local. Em seguida, anestesiar a região e
realizar sedação (em casos de agitação intensa e/ou paciente
pediátrico).

• Posicionamento: posicionar o paciente na posição de


Trendelenburg a 30 graus, fazendo uso de coxim sob os
ombros. Posteriormente, realizar leve extensão do pescoço
com rotação contralateral da cabeça antes do procedimento
para melhor visualização. A rotação da cabeça para o lado do
procedimento é feita no momento da introdução do fio-guia.
• Procedimento:
1ª etapa: iniciar realizando a manobra de Valsalva para facilitar
a visualização da veia jugular externa. Uma vez visualizada,
devemos inserir a agulha conectada à seringa cerca de 3 a 6 cm
acima da clavícula.
2ª etapa: manter tracionado o êmbolo da seringa até obter
refluxo sanguíneo. Caso não ocorra o refluxo, tracionar a agulha
seguindo o movimento oposto à introdução, mantendo pressão
negativa. Se ainda não houver a visualização do refluxo
sanguíneo, é necessário retirar completamente a agulha e
realizar novamente o procedimento.
3ª etapa: no momento em que refluxo sanguíneo for visto,
devemos desconectar a seringa, e imediatamente ocluir a
agulha com o dedo, impedindo uma embolia gasosa.
4ª etapa: inserir o fio-guia pela agulha, mas antes de passá-lo,
realizar a rotação da cabeça, de modo que permaneça ipsilateral
ao procedimento. Em seguida, elevar levemente o ombro e
realizar a abdução do braço ipsilateral ao procedimento.
Somente então passar o fio-guia e retirar a agulha.
5ª etapa: usar o dilatador para dilatar o tecido subcutâneo e a
veia caso em casos necessários (cateteres maiores). Logo
após, introduzir o cateter utilizando movimentos rotacionais e
então remover o fio-guia.
6ª etapa: por fim, devemos verificar se há o retorno sanguíneo
pelo cateter e viabilidade de todos os lumens e fixar o cateter
com sutura e cobrir com curativo adesivo transparente.

3.5. Complicações
• Subclávia: de forma geral, podemos ter a ocorrência de
hemotórax com hemorragia maciça. Tem-se diferença entre o
lado utilizado no processo de punção, sendo que no lado
direito a complicação mais frequente é a progressão do
cateter para a veia jugular. Por sua vez, no lado esquerdo, as
complicações mais comuns incluem pneumotórax e lesão de
ducto torácico.

• Femoral: dentre as complicações mais frequentes


destacam-se: edema de membros inferiores, risco muito
elevado de trombose, maior risco de infecção, punção arterial.

• Jugular interna: os maiores riscos relacionados à utilização


da veia jugular interna são: pneumotórax, hemotórax, punção
da artéria carótida. Além disso, quando o procedimento é
realizado do lado esquerdo podemos acrescentar a chance de
lesão do ducto torácico.

• Jugular externa: assim como os demais procedimentos de


punção venosa central, os principais riscos envolvem
infecção, pneumotórax e hemotórax.

CONCLUSÃO
Com base em tudo o que foi abordado neste capítulo podemos
afirmar que as punções venosas periféricas e centrais consistem em
técnicas de alta complexidade para realização e manuseio. Sendo
assim, o cuidado com os procedimentos que incluem o acesso
vascular deve ser prioridade nas equipes profissionais para melhor
assistência aos pacientes.
Em vista disso, torna-se fundamental a padronização de técnicas
adequadas para a prevenção de eventuais intercorrências, bem
como a incorporação dessas técnicas, promovendo assim um
tratamento apropriado e digno aos pacientes.

REFERÊNCIAS
1. Bouza E, Alvarado N, Alcalá L, Pérez MJ, Rincón C, Muñoz P. A Randomized and
Prospective Study of 3 Procedures for the Diagnosis of Catheter-Related Bloodstream
Infection Without Catheter Withdrawal. Clin Infect Dis. 2007 Mar 15.
2. Bowdle A. Vascular Complications of Central Venous Catheter Placement: Evidence-
Based Methods for Prevention and Treatment. J Cardiothorac Vasc Anesth. 2014 Apr.
3. Danski MTR, Oliveira AM, Meier MJ, Pedrolo E. Effectiveness of ultrasonography-
guided peripheral venous access: an integrative review. Enferm Glob [Internet]. 2016
[cited] 2017 Jan.
4. Dubois J, Garel L, Tapiero B, Dubé J, Laframboise S, David M. Peripherally Inserted
Central Catheters in Infants and Children. Radiology. 1997 Sep.
5. Gauderer MW. Vascular Access Techniques and Devices in the Pediatric Patient. Surg
Clin North Am. 1992 Dec.
. Hade AD, Beckmann LA, Basappa BK. A Checklist to Improve the Quality of Central
Venous Catheter Tip Positioning. Anaesthesia. 2019 Jul.
7. Oliveira AKA, Medeiros LP, Melo GSM, Torres GV. Passos da técnica de punção venosa
periférica: revisão integrativa. Arq Ciênc Saúde. 2014; 21(1): 88-95.
. Petroianu A, Miranda ME, Oliveira RG. Blackbook de Cirurgia. Belo Horizonte:
Blackbook Editora; 2008.
9. Resende V. Acesso Venoso. Monteiro ELC; Santana EM. Técnica Cirúrgica. Rio de
Janeiro: Guanabara; 2006.
10. Smith RN, Nolan JP. Central Venous Catheters. BMJ. 2013 Nov. 11.
11. Taylor RW, Palagiri AV. Central Venous Catheterization. Crit Care Med. 2007 May.
12. Tertuliano AC, Borges JLS, Fortunato RAS, Oliveira AL, Poveda V. Flebite em Acessos
Venosos Periféricos de Pacientes de um Hospital do Vale do Paraíba. Rev Min
Enferm. 2014.

CRÉDITOS DAS IMAGENS


1. Fibra Cirúrgica®. Dispositivo Asepto Scalp BD 21G. [acesso em 2020 mar. 2].
2. Cirúrgica Fernandes®. Cateter Intravenoso Jelco. [acesso em 2020 mar. 2].
3. Reis G. Pinterest. [acesso em 2020 mar. 2].
4. Caroline T. Acesso Venoso Central. Apresentação de SlideShare, 2017. [acesso em
2020 mar. 2].
5. Eachempati SR. Acesso vascular. Manual MSD – Versão para Profissionais de Saúde,
2017. [acesso em 2020 mar. 2].
. Azevedo AA. Acesso Venoso Central – Veia femoral. Medprime, 2019. [acesso em
2020 mar. 2].
7. Jardel L, Lima P, Marcelino J, Carvalho L, Santos G. Punção de veia jugular por
enfermeiro, parecer do COREN-SP. Apresentação de SlideShare, 2014. [acesso em
2020 mar. 2].
Parte 3 | Capítulo 31

Procedimento de pressão arterial


invasiva (PAI)
Autores: Breno Alexander Bispo e Rogerio Fortunato de Barros

1. Considerações iniciais
O procedimento de monitorização da pressão arterial invasiva
(PAI) consiste em uma técnica que envolve a utilização de cateteres
intra-arteriais, por meio da inserção destes em uma artéria viável,
com o intuito de se obter um registro da pressão arterial de forma
contínua. Essa técnica é muito utilizada em unidades de terapia
intensiva e em salas de operações, pois nesses ambientes faz-se
necessário um controle mais apurado dos registros pressóricos do
paciente. Existem dois métodos utilizados na medida de pressão
intravascular: por meio de um transdutor de distensão eletrônico
(mais usado), ou, na falta dessa tecnologia, pode-se medir utilizando
um manômetro numa conexão de 3 vias acoplado ao sistema de
medição seguindo a técnica de aferição da pressão venosa
profunda.
Este capítulo visa elucidar e abordar as vantagens, as
desvantagens, as técnicas, os materiais utilizados, as complicações,
as indicações e as contraindicações dessa técnica no dia a dia do
cirurgião.

2. Considerações anatômicas
A seleção do local de punção dá início com a localização de um
pulso arterial palpável. Dentre os locais mais comuns, encontram-se
as artérias periféricas (radiais, braquiais ou pediosas) e as artérias
centrais (femorais ou axilares). Em geral, as artérias periféricas
possuem um risco de infecção menor quando comparado aos
locais de punção arterial central. Os acessos mais comuns são nas
artérias radiais, pediosas, tibiais posteriores, axilares e femorais. O
local de punção escolhido deve apresentar uma circulação colateral
adequada, avaliada pela prova de Allen ou com o auxílio de
aparelhos de ultrassonografia com doppler.

2.1. Prova de Allen


A avaliação da presença de circulação colateral em pacientes
submetidos a cateterismo arterial é mandatária, pois caso não haja
essa circulação o risco de complicação isquêmica aumenta
consideravelmente. Pacientes submetidos a cateterismo na artéria
radial devem ter o fluxo ulnar da mesma mão avaliado antes do
procedimento para evitar riscos de isquemia. Tal avaliação pode ser
realizada pelo teste de Allen (figura 1), que consiste em aplicar
pressão digital sobre as artérias radiais e ulnar no pulso, fazendo
com que a palma da mão fique pálida. A hiperextensão dos dedos e
do pulso não devem ocorrer, pois a tensão tecidual pode gerar um
falso positivo. O examinador então remove a pressão de uma das
artérias. Um teste positivo ocorre quando leva mais de 5 segundos
para a cor (sangue) retornar à palma da mão. O ideal é repetir o
processo na artéria ulnar e radial.
Figura 1: A imagem representa a realização correta da prova de
Allen.
Fonte: WHO Guidelines on Drawing Blood: Best Practices in
Phlebotomy. Geneva: World Health Organization; 2010.

3. Principais Indicações
• Monitoramento continuo da pressão arterial: é necessário
em diversas situações, entre elas, durante o intraoperatório de
uma cirurgia de grande porte; em pacientes em que o acesso
intravascular está dificultado; pacientes que apresentam
comorbidades significativas e eventualmente necessitarão do
uso de drogas vasoativas.

• Amostras frequentes de sangue: por meio dos cateteres


intra-arteriais é possível a retirada frequente de amostras de
sangue, para a realização de exames como: gasometria,
eletrólitos, lactato, entre outros, que são parâmetros muito
importantes para pacientes submetidos a cirurgias de grande
porte ou em ambiente de terapia intensiva.
• Avaliação das variações da pressão arterial: a variação da
pressão sistólica e a variação da pressão de pulso são
medidas necessárias para se prever a responsividade a
fluidos em um determinado paciente. Durante o
monitoramento de pressão arterial invasiva, esses parâmetros
podem ser calculados por meio das variações no formato das
ondas, que serão discutidas posteriormente.

4. Principais contraindicações
• Prova de Allen anormal

• Circulação colateral inadequada na ultrassonografia com


Doppler

• Infecção no local de punção

• Coagulopatia

• Intervenções cirúrgicas anteriores

• Malformações congênitas ou adquiridas

• Queimaduras no local

• Aneurisma

• Stent

• Fístulas arteriovenosas

• Enxerto vascular
• Doença vascular periférica grave

• Síndrome de Raynaud ativa

5. Vantagens
• Monitoramento da pressão arterial batimento a batimento
(muito útil para pacientes que necessitam de um controle
rigoroso dos volumes pressóricos)

• Permite leituras precisas dos valores pressóricos,


principalmente valores muito baixos, como em pacientes
chocados

• Evita-se traumas decorrentes das insuflações repetidas pelo


manguito, utilizado na aferição da pressão arterial não
invasiva

• Permite uma avaliação precisa da pressão em pacientes nos


quais o método não invasivo é inviável (pacientes obesos
mórbidos ou com edema periférico grave)

• Possibilidade de retirada de amostras contínuas de sangue


arterial

6. DESVANTAGENS
• Potencial foco para infecção devido à permanência do
cateter intra-arterial por longos períodos
• Possibilidade da formação de trombose no local de inserção
do cateter, o que pode resultar em êmbolos e oclusão arterial

• Possível demora e dificuldade na inserção do sistema de


monitoramento, principalmente em pacientes chocados,
podendo desviar a atenção de outros problemas mais
urgentes

• Isquemia de membros por administração inadvertida de


algumas medicações

• Altos custos quando comparado ao meio de monitoramento


não invasivo

7. Materiais necessários
Principais:

• Aparelho de medição – composto por uma cânula arterial


conectada a um tudo contendo uma coluna contínua de
solução salina

• Transdutor de distensão eletrônico


• Monitor – amplifica e filtra o sinal provenientes do transdutor.
Também organiza os resultados das aferições arteriais em
formato de ondas em tempo real

• Cateter sobre agulha (Angiocath ou Jelco) – de 18 a 20G com


2,5 a 5 cm de comprimento, ou cateter com fio-guia

• Equipo de soro
• Soro fisiológico 500ml a 0,9% – necessário para conduzir a
onda de pressão ao transdutor. Além disso, necessário no
processo de lavagem da cânula

• Torneira de três vias


Assepsia:

• Máscara
• Solução de clorexidina
• Luvas estéreis
• Campo estéril
Anestesia local:

• Lidocaína a 1% sem epinefrina


Curativo:

• Esparadrapo ou Micropore®

Apoio:

• Gaze

• Porta-agulhas

• Fio de nylon 3-0

• Tesoura

• Suporte para braço


• Lupa cirúrgica ou instrumentos de magnificação óptica

8. Avaliação e preparo do paciente


• Deve-se explicar cuidadosamente o procedimento para o
paciente

• Deve-se também realizar uma boa anamnese, buscando por


possíveis contraindicações e complicações pós-procedimento

• Realiza-se também um de exame físico do local a ser


puncionado. Não esquecer do teste de Allen no caso das
artérias ulnar e radial

• Em caso de dúvidas no teste de Allen, deve ser solicitada a


avaliação ultrassonográfica do local de punção, confirmando
a presença de circulação colateral adequada. Atenção nos
casos de obesos ou crianças pequenas

9. Técnica de inserção
• A técnica de inserção para o cateterismo arterial é estéril.
Solução antisséptica é aplicada no local de acesso e aguardar
secar; além disso, para a realização do procedimento é
necessária a lavagem adequada das mãos e a utilização de
luvas estéreis; pode-se utilizar também máscaras, gorro e
óculos de proteção, porém estes não necessariamente
obrigatórios

• Todo o equipamento, incluindo o equipamento para


monitoramento, deve ser preparado e o transdutor, calibrado
antes do procedimento

• Posicionar o paciente de acordo com o local de punção


escolhido. Caso seja a artéria radial deve-se colocar a mão e
o antebraço do paciente com a face anterior voltada para
cima, imobilizar em um suporte próprio e colocar um coxim
de apoio sob o punho, para deixá-lo em extensão

• Palpar suavemente a artéria escolhia com a mão não


dominante

• Realizar um pequeno botão anestésico no local da punção,


tomando os devidos cuidados para não infundir anestésico na
artéria

• Insere-se então a agulha utilizando a mão dominante em um


ângulo de 45 graus e avança lentamente até obter retorno
pulsátil do sangue

• Ao observar o retorno pulsátil, deve-se inserir o fio-guia


delicadamente e retirar a agulha. A utilização do fio-guia é
fortemente recomendada, principalmente em casos em que o
operador não tenha muita experiencia com o procedimento.
No caso de dispositivos sem o fio-guia, empurra-se o cateter
sobre a agulha

• Realiza-se uma pequena incisão na pele para o dilatador, o


qual vai facilitar a entrada do cateter que deve ser inserido
posteriormente, retirando-se o fio-guia

• Por fim, deve-se conectar o cateter ao tubo de


monitoramento previamente calibrado

• Não podemos esquecer de lavar o cateter para evitar oclusão


devido à coagulação sanguínea e fixá-lo com curativo não
oclusivo de maneira segura
Figura 2: A imagem representa a forma correta da inserção do
cateter na artéria radial.
Fonte: Arthur CT, Gilles C, Allison D. Indications, interpretation, and
techniques for arterial catheterization for invasive monitoring.
Uptodate Jul 24, 2019.

10. Interpretação dos resultados


• Interpretação do traçado da forma de onda arterial
A forma de onda arterial resulta da ejeção de sangue do
ventrículo esquerdo na aorta durante a sístole, seguida de
escoamento periférico durante a diástole. A forma da onda arterial
normal é mostrada na figura a seguir (figura 3).
Figura 3: A imagem representa a forma da onda arterial normal
durante a o monitoramento da PAI.

Fonte: Arthur CT, Gilles C, Allison D. Indications, interpretation, and


techniques for arterial catheterization for invasive monitoring.
Uptodate Jul 24, 2019.

A elevação sistólica representa a ejeção do ventrículo durante a


sístole e é representada por um pico na onda, seguido por uma
rápida diminuição da pressão quando a contração ventricular
termina. O entalhe representa o fechamento da válvula aórtica, que
indica o início da diástole.

• Outras informações importantes derivadas do formato da


onda de pressão:
Pressão Arterial Média (PAM): representa a área sob a curva
durante uma única batida. Pode ser estimado matematicamente
como a soma da pressão diastólica mais um terço da pressão
de pulso, entretanto essa formula só é valida para uma
frequência cardíaca de aproximadamente 60 batimentos por
minuto. A maioria dos monitores hoje calcula a média desse
número eletronicamente.
Pressão de Pulso: a pressão de pulso é a diferença entre as
pressões sistólica e diastólica. A pressão de pulso elevada
indica rigidez vascular, particularmente em hipertensos e idosos,
já as reduções na pressão de pulso são geralmente causadas
por hipovolemia.

11. Complicações
• Dor
• Inchaço
• Hematoma ou sangramento no local da inserção
• Danos às estruturas adjacentes
• Infecção local ou sistêmica
• Vasoespasmo
• Tromboembolismo
• Dissecção
• Pseudoaneurisma
• Formação de fístula arteriovenosa
• Isquemia local ou distal
• Necrose
REFERÊNCIAS
1. Arthur CT, Gilles C, Allison D. Indications, interpretation, and techniques for arterial
catheterization for invasive monitoring. Uptodate Jul 24, 2019.
2. Barros RF, Amato ACM, Vicente NC. Procedimentos Médicos Técnica e Tática:
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3. Bertrand OF, Carey PC, Gilchrist IC. Allen or no Allen: that is the question! J Am Coll
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4. Esper SA, Pinsky MR. Arterial waveform analysis. Best Pract Res Clin Anaesthesiol
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Paulo: Roca; 1998.
. Marbas LL, Case E. Blueprints: clinical procedures. Boston: Blackwell; 2004. p. 93-96.
7. Miller RD. Miller’s Anesthesia. 6. ed. New York: Churchill Livingstone; 2004.
Parte 3 | Capítulo 32

Acesso intraósseo
Autor: Giovana Battaglia
Coautor: Dr. Fábio J. B. Sotelo

1. INTRODUÇÃO
O acesso intraósseo (IO) para reposição volêmica apesar de pouco
utilizado deve ser de conhecimento médico geral, uma vez que, em
situações de hipovolemia crítica, pode ser a única maneira de realizar
a reposição de forma rápida e eficaz.1
Situações como hemorragias graves ou outras relacionadas a
hipovolemia podem levar ao “colabamento” de veias em adultos e
principalmente em crianças (com veias mais finas e de difícil punção),
impossibilitando o acesso venoso periférico e até o central com
rapidez, sendo o acesso IO uma opção importante na reposição
imediata de fluidos, sangue e fármacos.2, 3 A infusão intraóssea além
de rápida é segura e eficaz ainda em neonatos.4

2. ANATOMIA E FISIOLOGIA DOS


OSSOS LONGOS
A punção intraóssea (PI) é realizada em ossos longos, os quais
possuem um córtex denso e uma medula esponjosa extremamente
irrigada por arteríolas. A drenagem ocorre nas regiões proximal e
distal dos ossos longos, através de capilares sinusoides, que
desembocam no canal venoso central, localizado no eixo longitudinal
do osso.1
A agulha da PI atravessa o córtex de ossos longos e atinge a
medula óssea marrom. Em criança é preferível que a punção seja
realizada na face medial da tuberosidade anterior da tíbia, enquanto
no adulto é preferível o maléolo medial da tíbia, por sua espessura
menor, a qual possibilita a inserção mais fácil da agulha.1
Figura 1: Anatomia e local de PI

Fonte: Reichman.1

Locais da infusão por via IO descritos na Literatura:


Tíbia Adultos e crianças

Maléolo medial Adultos

Esterno Adultos

Crista ilíaca Adultos

Clavícula Adultos
Fêmur Crianças

Úmero Crianças

Calcâneo Crianças

Fluídos e medicações administradas por via intraóssea são


imediatamente absorvidos para a circulação sistêmica.

3. INDICAÇÕES
Segundo a American Heart Association, acesso intraósseo é
indicado quando o acesso vascular não é possível, após 90 segundos
de tentativa ou após 2 tentativas.5
Pode ser utilizado em:

• Parada cardíaca

• Choque

• Sepse

• Traumatismo

• Desidratação grave

• Queimaduras extensas

• Epilepsia
Além disso, pode ser utilizado para fornecer amostras de sangue
para análise laboratorial e gasometria.
Durante a ressuscitação cardiopulmonar, o acesso pela tíbia
proximal é mais indicado por não ser necessário interromper a
massagem cardíaca.
4. FÁRMACOS E FLUIDOS
ADMINISTRADOS POR VIA
INTRAÓSSEA
Medicamentos e fluidos mais comuns para administração
intraóssea.2
Analgésicos, Antibióticos Fluidos Bloqueadores Medicações para Diversos
anestésicos, neuromusculares ressuscitação
anticonvulsivantes
e sedativos

Diazepam Amicacina Hemoderivados Atracúrio Adenosina Antitoxinas


Fentanila Ampicilina Glicose Pancurônio Adrenalina Contraste
Cetamina Ceftriaxona Ringer Lactato Rocurônio Atropina Dexametasona
Lorazepam Clindamicina Solução salina Succinilcolina Cloreto de Diazóxido
Midazolam Gentamicina isotônica e Vecurônio cálcio Heparina
Morfina Sulfadiazina hipertônica Digoxina Insulina
Fenobarbital Vancomicina Dobutamina Azul de metileno
Fenitoína Dopamina Metilprednisolona
Propofol Isoproterenol Prostaglandinas
Lidocaína Vitaminas
Noradrenalina
Bicarbonato
de sódio
(diluído)
Vasopressina

É importante ressaltar que as doses da via IO são a mesmas


usadas por via venosa.

5. CONTRAINDICAÇÕES1, 6
• Osteomielite

• Osteoporose

• Punção em áreas de queimadura, abscesso e celulite

• Fratura no osso da punção


• Ossos com pinos, placas

• Pacientes obesos em que a agulha não atinge a medula

• Punção no esterno em crianças ou em pacientes que


apresentem má formação nesse osso, pesem menos de 50 kg,
ou que já fizeram esternotomia

6. TÉCNICA
I. Assepsia e antissepsia com solução de clorexidina ou iodo
povidine.
II. Agulhas de injeção intraóssea: modelo Cook ou modelo de
aspiração esternal ou ilíaca de Illinois ou agulha Jamshidi, usada em
punção de medula óssea.
III. O local para punção mais frequentemente usado em crianças
corresponde à face medial da tíbia em cerca de 1 a 3 cm abaixo da
tuberosidade tibial.
IV. A agulha deve ser direcionada levemente inclinada (15 a 30º)
para a parte distal evitando a punção da cartilagem de crescimento
metafisária. Há dois dispositivos que facilitam esse acesso: o driver
intraósseo EZ-IO (Vidacare, San Antonio, TX) e a pistola de injeção
óssea (BIG, Wais Medical, Kress USA Corporation). Ambos os
dispositivos apresentam o tamanho adulto ou pediátrico e ajustam a
profundidade na qual a agulha será inserida no osso. Para a infusão
pelo esterno há um outro dispositivo usado em adultos chamado
MONOJECT™ I-Type Sternal-Iliac Aspiration Needle (Covidien,
Mansfield, MA).
V. Ao se sentir a ponta da agulha atravessando o córtex do osso,
não se deve mais aprofundá-la.
VI. A agulha permanece na posição sem suporte.
VII. A infusão em bolus de 5 a 10 mL de solução fisiológica com
uma seringa resulta em mínima resistência e não deve haver
evidência de infiltração no subcutâneo; se o fluxo da solução é
facilmente administrado e não há extravasamento, deve-se conectar o
equipo de soro e fixá-lo à coxa. A agulha deve ser protegida de abalos,
circundando-a com gaze e esparadrapo
Figura 2: Agulhas de acesso intraósseo.

Fonte: Reichman.1

Figura 3: Dispositivos de IO. À esquerda EZ-IO e à direita BIG

Fonte: Reichman.1

Figura 4: Acesso usando o EZ-IO. A. Agulha aplicada no dispositivo. B.


Agulha inserida a 90° na pele. C. O dispositivo é retirado. D. O estilete
é removido. E.O EZ-estabilizador e o tubo é inserido.
Fonte: Reichman.1

Figura 5: Acesso usando dispositivo BIG. A. Ajuste de profundidade.


B. Inserido o dispositivo a 90° da pele. C. Removido a trava de
segurança. D. O dispositivo BIG é segurado enquanto é acionada a
unidade. E. Remover o BIG. F. Trava de segurança ativada. G. Puxado
o estilete-trocarte da cânula. H. Conectada a tubulação IV e aspirada
a medula óssea.
Fonte: Reichman.1

7. COMPLICAÇÕES
O acesso IO deve permanecer no paciente por no máximo 24
horas. Sendo mais indicada apenas no momento do atendimento de
emergência, até a possibilidade de obtenção de um acesso vascular
periférico ou central de maior permanência, com a finalidade de
diminuir as complicações.5
A ocorrência de eventos adversos durante o uso dessa via é
inferior a 1%. Estudos recentes descreveram taxas de complicações
de aproximadamente 0,6%, e apontaram o extravasamento e a
infiltração de fluidos administrados como as complicações mais
frequentes. Ou seja, o acesso IO tem se mostrado seguro.7
Osteomielite, celulite, abscesso e sepse, relacionam-se a falhas na
técnica de assepsia para punção ou em erro de manuseamento do
dispositivo de acesso IO. A síndrome compartimental e a necrose
tecidual correlacionam-se à ocorrência do extravasamento de fluidos
para o subcutâneo. Embolia gordurosa também pode ocorrer, apesar
de não haver casos descritos na literatura em crianças, pois
apresentam pouca gordura na medula óssea.8
Fratura, deslocamento da agulha e extravasamento para o
subcutâneo podem ser minimizados se colocado um coxim sobre o
membro puncionado, além da imobilização dele.8
Dor tem sido relacionada ao aumento da pressão intramedular, o
que não é problema com infusões mais lentas ou em pacientes
inconscientes.

CONCLUSÃO
O acesso venoso pela via intraóssea é seguro e efetivo para
reposição volêmica, além de ser uma opção para a administração de
fármacos e exames laboratoriais em qualquer faixa etária. A via
intraóssea deve ser obtida quando o acesso venoso não for
rapidamente estabelecido.
Apesar de sua utilização, assim que a estabilidade hemodinâmica
for alcançada, deve-se proceder com sua retirada o mais precoce
possível, a fim de se evitar complicações mais graves.

REFERÊNCIAS
1. Reichman FE. Emergency Medicine Procedures. McGraw-Hill Education. Texas Houston.
2 ed. 2013. cap. 55, p. 361.
2. DeBoer S, Russell T, Seaver M, Vardi A. Infant intraosseous infusion. Neonatal Netw.
2008; 27(1): 25-32.
3. Von Hoff DD, Kuhn JG, Burris HA 3rd, Miller LJ. Does intraosseous equal intravenous? A
pharmacokinetic study. Am J Emerg Med. 2008; 26(1): 31-8.
4. Coronel Carvajal C. Vía intraósea en pediatría. Rev Cuba Pediatr [Internet]. 2003; 75(3).
5. Américo Riberio de Sá et al. Acesso vascular por via intraóssea em emergências
pediátricas. Rev Bras Ter Intensiva. 2012; 24(4): 407-414.
. Vizcarra C, Clum S. Intraosseous route as alternative access for infusion therapy. J Infus
Nurs. 2010;33(3):162-74. Erratum in J Infus Nurs. 2011; 34(2): 123.
7. Luck RP, Haines C, Mull CC. Intraosseous access. J Emerg Med. 2010; 39(4): 468-75.
. Vizcarra C, Clum S. Intraosseous route as alternative access for infusion therapy. J Infus
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9. Lane JC, Guimarães HP. Acesso venoso pela via intraóssea em urgências médicas. Rev
Bras Ter intensiva. 2008; 20(1): 63-7.
Parte 3 | Capítulo 33

Paracentese
Autora: Laís Siqueira de Magalhães
Coautor: Ivan Kirche Duarte

1. INTRODUÇÃO
Etimologicamente, o sufixo grego “–centese” significa “punção
ou perfuração cirúrgica de alguma membrana ou cavidade”. Desse
modo, o termo “paracentese” ou “abdominocentese” se traduz como
a punção da cavidade abdominal por meio de agulhas, trocartes ou
cânulas, cuja finalidade seja o diagnóstico e/ou a terapêutica da
ascite.
A ascite é o acúmulo patológico de líquido na cavidade
abdominal, uma vez que há, aproximadamente, 50mL de líquido
intraperitoneal em indivíduos hígidos. Ela pode ser causada por
diversas enfermidades: cardíacas (insuficiência cardíaca, pericardite
constritiva, “cor pulmonale”), neoplásicas (câncer metastático,
mesotelioma, linfoma, pseudomixoma peritoneal), hepáticas (cirrose
hepática, hepatite alcoólica, hepatite fulminante, trombose de veias
supra-hepáticas, doença veno-oclusiva, metástases hepáticas
maciças), renais (síndrome nefrótica, doença renal crônica dialítica),
infecciosas (tuberculose, esquistossomose, fúngica, bacteriana),
pancreáticas (pancreatite, pseudocisto), quilosa (obstrução de
linfáticos mesentéricos), biliares (doenças de vias biliares),
imunológicas (lúpus eritematoso sistêmico, angioedema
hereditário), ginecológicas (síndrome de Meigs, endometriose,
síndrome da hiperestimulação ovariana) e outras (mixedema,
gastroenterite eosinofílica, febre familiar do mediterrâneo, doença
de Whipple, hipoalbuminemia).
Sua suspeita se baseia na anamnese e no exame físico, o qual
pode demonstrar sinais semiológicos como:
A) Macicez móvel: principal sinal semiológico, considerado
clinicamente o mais sensível. Em decúbito dorsal horizontal,
obtém-se som timpânico na região mesogástrica (em
decorrência do ar presente nas alças intestinais) e som maciço
nas demais regiões (devido ao acúmulo de líquido nas goteiras
parietocólicas bilateralmente e no fundo de saco posterior),
sinal conhecido como semicírculo de Skoda – a macicez de
flancos à percussão. Realizando a mudança de decúbito, para
lateral esquerda e direita, observa-se a mudança das zonas de
timpanismo e macicez, devido ao escoamento do líquido para
os flancos ipsilaterais.
B) Sinal de piparote: menos sensível, pois requer ascite de
grandes proporções. Consiste na propagação da onda líquida
quando a percussão de um lado do abdome é sentida nas
polpas digitais do outro lado, com o paciente comprimindo sua
linha média abdominal.
Se necessário, a confirmação da ascite pode ser obtida através
da ultrassonografia de abdome, a qual se positiva a partir de 100mL.
A paracentese pode ser dividida em diagnóstica e/ou terapêutica:
A) Diagnóstica: análise do líquido ascítico a fim de determinar
sua etiologia. Deve ser realizada em: casos de início recente de
ascite; pacientes hospitalizados que contenham ascite;
deterioração clínica em pacientes ambulatoriais ou internados
com cirrose (febre, dor abdominal, palpação dolorosa do
abdome, alteração do estado mental, íleo, hipotensão,
insuficiência renal); anormalidades laboratoriais que possam
indicar infecção (leucocitose, acidose, piora da função renal);
encefalopatia hepática; sangramento gastrintestinal.
B) Terapêutica: drenagem de grandes quantidades de líquido
ascítico a fim de proporcionar uma melhora do desconforto
abdominal e torácico (muitas vezes, a ascite pode gerar
dispneia). Deve-se atentar, nos casos de drenagem de volume
superior a 5L, à reposição de albumina intravenosa.
Algumas literaturas dizem que o procedimento é contraindicado
absolutamente em casos de fibrinólise evidente ou coagulação
intravascular disseminada, ao passo que outras afirmam que
coagulopatia não é uma contraindicação, podendo o procedimento
ser realizado com segurança na maioria dos pacientes.
Contraindicações relativas à paracentese às cegas – gravidez,
distensão intestinal grave, bexigoma, extensa cirurgia
abdominal/pélvica anterior – devem contar com o auxílio de
ultrassonografia, diminuindo a incidência de aspirações sem
sucesso e de complicações. Ainda, deve-se evitar a punção em
locais com infecção de pele, com cicatriz cirúrgica, com varizes
abdominais visíveis e com hematomas.
Os riscos da paracentese são sangramento (sendo o hematoma
a complicação mais frequente), perfuração de vísceras, infecção
local ou peritonite, vazamento persistente no local da punção e
hipotensão quando grandes volumes são drenados.

2. O que um cirurgião deve saber


Os materiais necessários para realizar a paracentese são: luvas
estéreis, máscara facial (opcional), iodo a 10% ou álcool a 70%, gaze
estéril, campo oftálmico estéril, anestésico local, seringas de 5mL e
50mL, agulhas (40x12mm para aspirar o anestésico, 30x7mm para
aplicar o anestésico no paciente), cateter venoso periférico (20-22G
para paracentese diagnóstica ou 14-16G para paracentese
terapêutica), dois frascos de cultura (um aeróbio e um anaeróbio),
tubos para amostras (hematológica, química e microbiológica),
sistema de drenagem se paracentese terapêutica e gaze para
curativo com esparadrapo.
A técnica da paracentese consiste em:
1. Explicação do procedimento ao paciente e obtenção de seu
consentimento.
2. Separação de todo o material e, se necessário, equipamento
de ultrassonografia (utilizada como guia).
3. Preenchimento do pedido dos exames necessários e
rotulação dos frascos de coleta com os dados básicos do
paciente.
4. Posicionamento do paciente em uma posição confortável:
supina para grandes volumes ou decúbito dorsal horizontal com
leve inclinação para a lateral esquerda para pequenos volumes.
5. Percussão do abdome para determinar a macicez local. E,
para encontrar o principal sítio de punção, deve-se realizar uma
linha entre a cicatriz umbilical e a espinha ilíaca anterossuperior
esquerda. Divide-se tal linha em três partes e realiza-se a
punção na junção do terço médio com o terço inferior. A fossa
ilíaca esquerda é o local preferencial, pois o cólon sigmoide é
móvel, ao passo que o ceco e cólon ascendente são fixos. Outra
opção é puncionar na linha mediana, dois centímetros abaixo da
cicatriz umbilical.
Figura 1: Local indicado para a paracentese
Fonte: Acervo da Editora

6. Paramentação do profissional com luvas estéreis e com


máscara facial (opcional).
7. Limpeza da região a ser puncionada com gaze estéril e com
solução iodada a 10% ou alcoólica a 70%.
8. Colocação de campo oftálmico estéril na região a ser
puncionada.
9. Preparação do anestésico local para sua administração em
pele, subcutâneo e tecidos moles, utilizando uma seringa de
5mL e agulhas de 40x12mm (para aspirar o anestésico) e de
30x7mm (para aplicar o anestésico). Deve-se sempre aspirar ao
avançar com a agulha em planos mais profundos, a fim de evitar
a infusão de anestésico nos vasos.
10. Punção local a 90 graus ou a 45 graus (com a técnica do
“trajeto em Z” para diminuir o risco de vazamento) com o cateter
periférico intravenoso (20-22G se diagnóstica ou 14-16G se
terapêutica) e uma seringa de 50mL, sempre aspirando ao
avançar com a agulha em planos mais profundos. Quando a
agulha penetrar na cavidade peritoneal, um “alívio” na pressão
será sentido. A partir desse momento, inicia-se a aspiração do
líquido ascítico.
11. Se paracentese terapêutica, retira-se o mandril, mantendo
apenas o cateter plástico fixado localmente, de modo a não
permitir que o mesmo dobre (para não colapsar o trajeto).
Conecta-se tal cateter a um sistema de drenagem (tubo coletor).
12. Se paracentese diagnóstica, após obtenção da quantidade
desejada de líquido ascítico, remove-se a agulha com aspiração
contínua, com posterior pressão no local da punção por um
curto período (para não haver sangramento ou vazamento de
líquido ascítico).
13. Aplicação de curativo no local da punção por meio de gazes
com esparadrapos.
14. Testagem do líquido ascítico ao distribuí-lo, à beira do leito,
em dois frascos de cultura (um aeróbio e um anaeróbio) e em
tubos para amostras (hematológica, química e microbiológica).
Deve-se atentar para as alterações hemodinâmicas que podem
ser geradas quando se remove grande quantidade de líquido ascítico
na paracentese terapêutica. Recomenda-se que, a partir de 5 litros
de líquido ascítico removido, reponha-se albumina (6-10 g/L,
considerando o total removido e não apenas o volume acima de 5
litros) para minimizar os sintomas de depleção do volume
intravascular e de insuficiência renal.
A primeira avaliação a ser realizada se relaciona ao aspecto do
líquido ascítico, norteando o raciocínio clínico e a solicitação de
exames complementares. Um líquido amarelo-citrino (amarelado e
transparente) sugere uma ascite sem complicações, típica de
cirróticos e de portadores de insuficiência cardíaca. Todavia, um
aspecto mais turvo pode ser encontrado em casos de peritonite
bacteriana espontânea, confirmada quando, na análise, houver ≥ 250
neutrófilos/mm3.
Outros aspectos do líquido ascítico podem ser:
A) Leitoso/esbranquiçado: encontrado na ascite quilosa, quando
a concentração de triglicérides está acima de 110 mg/dL. Caso
seja colocado no refrigerador por 48-72 horas, os lipídios
geralmente formam um sobrenadante.
B) Sanguinolento/róseo: quando a concentração de hemácias
está acima de 10000/mm3, o fluido é róseo; quando está acima
de 50000/mm3, o aspecto é sanguinolento. Sua etiologia inclui,
principalmente, punção traumática, malignidade e ascite
cirrótica sanguinolenta.
C) Bilioso/marrom: encontrado em casos de alta concentração
de bilirrubina no líquido ascítico, bem como em casos de úlcera
duodenal e perfuração de vesícula biliar.
Frente à clínica do paciente e ao aspecto macroscópico de seu
líquido ascítico, determinados testes podem ser solicitados, com
resultados que possuem diferentes significados. De rotina, são
solicitados: contagem de células com diferencial, albumina e
proteínas totais e cultura para aeróbios e anaeróbios; opcional
frequentemente útil inclui: glicose, desidrogenase lática (DHL),
amilase, coloração de Gram, adenosina deaminase e citologia
oncótica; opcional, embora raramente útil, estão: cultura para BAAR,
triglicerídeos, ureia, bilirrubina, pesquisa e cultura para fungos,
citometria de fluxo e reação em cadeia da polimerase (PCR).
Alguns testes são explorados a seguir:
A) Contagem de células com diferencial: usada para
diagnosticar peritonite bacteriana espontânea. O aumento de
linfócitos pode indicar tuberculose, infecções fúngicas ou
carcinomatose peritoneal, e o aumento de células vermelhas
pode indicar trauma, cirrose, malignidade, carcinomatose
peritoneal ou insuficiência cardíaca. Para corrigir o número de
polimorfonucleares, a cada 250 células vermelhas se subtrai 1
polimorfonuclear.
B) Albumina: importante para determinar a etiologia da ascite.
Através da diferença da albumina sérica com a ascítica,
encontramos o GASA (gradiente de albumina soro-ascite): um
GASA ≥1,1 g/dL sugere ascite por hipertensão portal (há uma
maior concentração de albumina presente no soro do que na
ascite, típico de um extravasamento de líquido por transudação),
enquanto um GASA <1,1 g/dL ocorre na ausência de
hipertensão da veia porta. A ascite por hipertensão portal pode
ser causada por cirrose, hepatite alcoólica e ascite cardíaca, à
medida que carcinomatose peritoneal, peritonite tuberculosa e
ascite pancreática podem ser causas de ascite sem hipertensão
portal.
C) Proteínas totais: são um reflexo da proteinemia sérica e da
pressão portal. É considerado um exsudato se ≥ 2,5 g/dL,
enquanto um transudato se dá por <2,5 g/dL. Em casos de
infecção, valores <1,1 g/dL sugerem uma peritonite bacteriana
espontânea, enquanto ≥1,1 g/dL sugerem uma peritonite
secundária.
D) Glicose e DHL: são úteis na diferenciação da peritonite
bacteriana secundária (suspeitar se glicose <50 mg/dL e DHL
maior que o limite superior da normalidade). Ainda, glicose
baixa e DHL alto podem se correlacionar com casos de
malignidade.
E) Amilase: pode ser solicitada nos casos de pancreatite aguda
ou perfuração intestinal, traduzindo a dispersão de enzimas
pancreáticas na cavidade abdominal.
F) Coloração de Gram e cultura: recomendada quando há
suspeita de infecção. Pode auxiliar no diagnóstico de: peritonite
bacteriana espontânea (polimorfonucleares ≥250 células/mm3
e cultura positiva para apenas um agente etiológico), ascite
neutrocítica (polimorfonucleares ≥250 células/mm3 e cultura
negativa), bacterascite não neutrocítica monobacteriana
(polimorfonucleares <250 células/mm3 e cultura positiva para
apenas um agente etiológico), peritonite bacteriana secundária
(polimorfonucleares ≥250 células/mm3 e cultura positiva para
múltiplos organismos).
G) Citologia oncótica: solicitada, nos casos suspeitos de
malignidade, para pesquisa de células neoplásicas.
H) Triglicerídeos: na ruptura de vasos linfáticos, pode-se haver
vazamento de linfa para a cavidade peritoneal, traduzindo um
líquido ascítico de aspecto esbranquiçado. Assim, a ascite
quilosa – causada principalmente por malignidades (linfomas,
sarcomas), iatrogenia (cirurgias envolvendo grandes dissecções
retroperitoneais, como as cirurgias pancreáticas) e processos
infecciosos (tuberculose) – demonstra um nível de triglicerídeos
>110 mg/dL.
I) Ureia: solicitada na suspeita de ascite urinária, principalmente
por causas iatrogênicas decorrentes de lesões vesicais ou
ureterais (pós cirurgias pélvicas – ginecológicas, colorretais ou
urológicas).
J) Bilirrubina: um aumento da concentração de bilirrubinas no
líquido ascítico pode deixá-lo amarronzado, conhecido como
coleperitônio. A bilirrubina é solicitada em casos suspeitos de
perfuração biliar ou intestinal. Em caso de aumento isolado da
bilirrubina acima dos valores plasmáticos, pensa-se em fístula
biliar, ao passo que amilase e bilirrubina aumentados falam a
favor de perfuração intestinal.

CONCLUSÃO
A paracentese é um procedimento simples que todos os
profissionais médicos devem saber fazer, já que pode determinar
a etiologia da ascite e aliviar os possíveis sintomas causados por
ela. Pode ser feita à beira do leito, inclusive com o auxílio da
ultrassonografia, a qual fornece maior sucesso ao procedimento.
Porém, deve-se ficar atento às complicações que o método pode
gerar. Exames posteriores são solicitados conforme a clínica do
paciente.

REFERÊNCIAS
1. Townsend CD. Sabiston: Tratado de Cirurgia – A Base da Prática Cirúrgica Moderna.
18. ed. Rio de Janeiro, RJ: Elsevier; 2010.
2. Martins HS. Emergências Clínicas: Abordagem Prática. 10. ed. Barueri, SP: Manole;
2015.
3. Bickley LS, Szilagyi PG. Bates, propedêutica médica. 11. ed. Rio de Janeiro, RJ:
Guanabara Koogan; 2015.
4. Mcgibbon A, Chen GI, Peltekian KM, Van Zanten SV. An evidence-based manual for
abdominal paracentesis. Digestive Diseases and Sciences. dez. 2007; 52(12): 3307-
15.
5. Weniger M, D’haese JG, Angele MK, Kleespies A, Werner J, Hartwig W. Treatment
options for chylous ascites after major abdominal surgery: a systematic review. The
American Journal of Surgery. jan. 2016; 211(1): 206-13.
. Aponte EM, O’Rourke MC. Paracentesis. Atual. em Mai, 2019. Treasure Island (FL):
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7. Runyon AB, Chopra S, Robson KM. Diagnostic and therapeutic abdominal
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https://www.uptodate.com/contents/diagnostic-and-therapeutic-abdominal-
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. Runyon AB, Lindor KD, Robson KM. Spontaneous bacterial peritonitis in adults:
Diagnosis. Atual. em Set, 2019 [acesso em 2019 out. 16].
9. Runyon AB, Lindor KD, Robson KM. Spontaneous bacterial peritonitis variants. Atual.
em Set, 2019 [acesso em 2019 out. 16].
Parte 3 | Capítulo 34

Punção lombar
Autor: João Victor Maretti
Coautor: Rafael Andrade de Azeredo Bastos
Orientador: Prof. Dr. Gilberto Sadala Mendes

1. INTRODUÇÃO
A punção lombar consiste na introdução de uma agulha própria
para esse procedimento no espaço subaracnóideo para drenar
líquido cerebrospinal ou líquor, preferencialmente em topografia
anatômica da coluna vertebral lombar - sendo essa via a mais
comum. Existem outras regiões passíveis desse procedimento,
como a subocciptal (punção da cisterna magna), ventricular e
cervical lateral. Vale ressaltar que essas demais vias constituem
num procedimento neurocirúrgico e deve ser executado apenas pelo
especialista.
Sua execução é comum e tem como possíveis finalidades a
diagnóstica, como em suspeita de meningite, e terapêutica, como
tratamento de hidrocefalia de pressão normal ou pseudotumor
cerebral - ou ainda para administrar anestésicos.
Por constituir num procedimento invasivo, a Academia Brasileira
de Neurologia recomenda a adoção do Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido para que o paciente assine, a fim de prestar
maiores esclarecimentos quanto aos riscos do procedimento e
medidas de prevenção.

2. CONTRAINDICAÇÕES
Em relação às contraindicações da punção lombar, podemos
dividi-las em absolutas e relativas. As contraindicações absolutas
consistem: infecção de pele ou partes moles no local da punção e os
já referidos sinais de hipertensão intracraniana; recusa ao
procedimento por parte do paciente ou responsável também
constitui em contraindicação absoluta à realização da punção
lombar (seja diagnóstica, terapêutica ou para fins anestésicos). Já
as relativas constituem: coagulopatias ou trombocitopenia,
abscesso cerebral e neutropenia. Recomenda-se que os níveis de
plaquetas sejam superiores a 50.000/mm³ e INR inferior a 1,5.
Recomenda-se como cuidado prévio principal a realização de
tomografia computadorizada de crânio, a fim de avaliar possibilidade
de hipertensão intracraniana, associado a dados clínicos. O ato da
punção lombar pode promover desbalanço importante entre os
gradientes de pressão, tendo como consequência herniação cerebral
pós-punção - condição fatal. Nesse sentido, a atenção aos sinais
clínicos do paciente deve ser priorizada. Vômitos incoercíveis em
jato, anisocoria, alteração do estado mental, cefaleia de forte
intensidade e edema de papila à fundoscopia de olho podem
hipertensão intracraniana, e nesse caso, o procedimento é
contraindicado. A tomografia, por sua vez, tem alta sensibilidade na
evidência de sinais radiológicos que podem inferir hipertensão
intracraniana, como desvio de linha média, apagamento das
cisternas supraquiasmática e basilar, massa na fossa posterior,
perda da cisterna cerebelar superior e apagamento da cisterna da
placa quadrigeminal. Quanto aos casos em que há infecção de pele
no sítio da punção, há contraindicação de modo a evitar contato de
microrganismos infecciosos com o líquor, o que pode gerar uma
infecção do sistema nervoso central iatrogenicamente.
A realização de uma tomografia computadorizada de crânio está
bem indicado no caso de pacientes com idade superior a 60 anos,
imunodeprimidos, história prévia de convulsão há menos de 1
semana, nível de consciência alterado, sinais focais no exame
neurológico, papiledema ou clínica de hipertensão intracraniana e
enfim, lesões expansivas conhecidas no sistema nervoso central.
Em casos de infecção aguda de instalação inferior a 48 horas e
ausência de sinais neurológicos focais ou papiledema, a coleta de
líquor sem a realização prévia de exame de imagem pode ser
conduzida.

3. ANATOMIA DIRIGIDA
A coluna vertebral no adulto é formada por 33 vértebras,
dispostas em 5 regiões. Na região cervical, dispomos de 7 vértebras;
na torácica, são 12; em região lombar, 5; 5 sacrais e 4 coccígeas.
Vale ressaltar que no adulto as vértebras sacrais e coccígeas se
fundem, formando o osso sacro.
Funcionalmente, a coluna vertebral além de sustentar o peso
corporal e viabilizar locomoção, protege a medula e nervos espinais,
os quais são abrigados no canal vertebral. Para este fim, a coluna é
então interligada por uma série de ligamentos, músculos e meninges
no canal medular. As meninges - dura-máter, aracnóide e pia-máter -
envolvem a medula espinal, sustentando e protegendo tais
estruturas nervosas suspensas em líquor.
Durante o ato da punção lombar, a agulha deve transpassar uma
série de estruturas até alcançar o espaço subaracnóideo para
coletar líquor ou ainda administrar drogas para raquianestesia.
Abaixo, a Figura 1 ilustra com maior clareza a estratigrafia para a
realização de punção lombar. É importante notar que tal
procedimento deve ser realizado a nível de L3-L4 ou L4-L5 para evitar
que a agulha transpasse a medula espinhal, produzindo lesão
nervosa. Isso se deve ao fato de que este nível, no canal medular,
contém apenas cauda equina, em conjunto ao filamento terminal e,
por sua vez, ao adentrar o espaço subaracnóideo, a agulha é capaz
de desviar dessas fibras nervosas. Para localizar estes níveis, basta
que o profissional palpe as cristas ilíacas ântero-superiores e trace
uma linha transversal em direção ao dorso medialmente.
A fim de facilitar o procedimento, o paciente deve ser
adequadamente posicionado, de forma que as lâminas vertebrais e
processos espinhosos sejam afastados; e o ligamento amarelo
distendido. Isso facilita a passagem da agulha pelo trajeto, até sentir
determinada resistência, que significa que o profissional atingiu a
dura-máter. Ao progredir, a resistência desaparece, o que indica a

É
entrada da agulha no espaço subaracnóideo. É importante ressaltar
que para a realização de anestesia epidural, o profissional não
transpassa a dura-máter, ficando restrito ao espaço epidural.

Figura 1: Anatomia lombar dirigida ao procedimento de punção


lombar

Lumbar Puncture: punção lombar; Subarachnoid Space: espaço


subaracnóideo; Spinous Process: processo espinhoso; Vertebral
body: corpo vertebral; Skin: pele; Subcutaneous Layer: camada
subcutânea; Back Muscles: musculatura dorsal; Supraspinous
Ligament: ligamento supraespinal; Interspinous ligament: ligamento
interespinhoso; Ligamentum Flavum: ligamento amarelo; Epidural
Space: espaço epidural. Fonte: Research Gate. ¹

A Figura 1 elucida a estratigrafia até o espaço subaracnóideo.


Para o sucesso do procedimento, o profissional deve inserir a agulha
e transpassar as seguintes estruturas anatômicas: pele, subcutâneo,
musculatura paraespinal, ligamento supraespinal, ligamento
interespinhoso, ligamento amarelo, espaço epidural, dura-máter e
aracnoide.

4. MATERIAIS NECESSÁRIOS
Para a realização da punção lombar, são necessários os
seguintes materiais:

• Equipamentos de proteção individual e coletivo – EPI e EPC

• Caneta cirúrgica marca-pele

• Máscara pessoal

• Avental estéril

• Luva estéril

• Campo estéril

• Gazes

• Pinça Cheron

• Esparadrapo
• Materiais para antissepsia: álcool 70% ou clorexidina ou
iodopolvidina

• Lidocaína 2% sem vasoconstritor

• Seringa de 10 mL para anestesia

• Agulha comum 25 g para seringa

• Agulha de Quincke (ponta em bisel) ou agulha de Whitacre


(ponta de lápis) com diâmetro de 21 a 25 gauges (g)

• Obs.: quanto a maior o número da unidade em gauge,


menor é o diâmetro e menor a chance de cefaleia pós-
punção. Preferir 25 gauges em mulheres magras e crianças

• Válvula de três vias

• Manômetro

• Tubos de coleta

Figura 1: Anatomia lombar dirigida ao procedimento de punção


lombar
Exemplo de dispositivo. Fonte: Medical Expo.²

5. TÉCNICA DE COLETA –
CHECKLIST
• Explicar o procedimento ao paciente, esclarecendo a
necessidade e seus riscos. Certificar-se que o paciente
assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

• Conferir identificação do paciente no frasco de coleta.


• Paramentar EPI e EPC.
• Identificação e marcação do local da punção: a partir do dor-
so, palpar as cristas ilíacas ântero-superiores e traçar uma
linha imaginária póstero-medialmente, até atingir topografia
da coluna vertebral. Palpar o espaço intervertebral local para
localizar o processo espinhoso da vértebra L4 e então definir
o nível L3-L4 ou L4-L5. Marque o local com a caneta cirúrgica
marca-pele.
Figura 3: Palpação do local de punção, tendo como referência os
níveis lombares e cristas ilíacas

Exemplificação da palpação lombar – imagem modificada. Fonte:


Medscape.3

• Posicionar o paciente em decúbito lateral com a coluna


fletida – posição fetal.

• Obs.: essa é a melhor posição para realização do


procedimento, especialmente em casos de necessidade de
aferição da pressão de saída do líquor com manômetro.
Outra opção é com paciente sentado e com a coluna fletida
(posição de Buda), porém essa posição proporciona
aumento da pressão intra-abdominal (Valsalva), o que pode
resultar numa falsa hipertensão. É possível também que o
paciente fique posicionado com os membros inferiores
estendidos, a fim de obter maior conforto.

• Lavagem das mãos com antisséptico.


• Paramentação – colocar máscara, avental estéril e luva
estéril.

• Antissepsia da pele com gaze com montada em pinça


Cheron. Realizar movimento circular excêntrico ou retangular
obedecendo a ordem centro-periferia.

• Com a seringa de 10mL e agulha comum de 25g realizar


anestesia com lidocaína 2% sem vasoconstritor (vide Capítulo
27 – Anestésicos Locais).

• Com o bisel em sentido caudal, introduzir a agulha de


Quincke em posição oblíqua (30º a 45º de inclinação).
Direcionar a agulha ao nível da cicatriz umbilical (sentido
cefálico), de modo a respeitar a anatomia curva dos
processos espinhosos. Introduzir agulha lenta e
constantemente, de modo a permitir a identificação dos
planos. Sentir resistência da dura-máter.

• Ao ultrapassar a resistência característica da dura-máter,


interromper a introdução. Rotacionar a agulha no sentido
horário, a fim de orientar o bisel para o sentido cefálico. No
caso da agulha de Whitacre, não há necessidade de rotacioná-
la, pois seu formato cilíndrico divulsiona as fibras nervosas.
Com uma das mãos manter a agulha estável enquanto, com a
outra, retira o estilete. Observar o gotejamento do líquor e
imediatamente prosseguir ao próximo passo.
• Obs.: é recomendado evitar aspiração para reduzir o risco
de sangramento de pequenos vasos do espaço
subaracnóideo.

• Inserir válvula de três vias acoplada ao manômetro, com seu


registro aberto entre o espaço subaracnóideo e a coluna do
dispositivo. Observar o nível e registrar a pressão de saída do
liquor.

• Redirecionar o registro, de modo a fechar a comunicação


com o espaço subaracnóideo e permitir a coleta do liquor para
o tubo. É possível retirar com segurança até 40mL de liquor,
porém, em média as análises requerem 7 a 10mL em adultos
– em neonatos, basta 0,5 a 2mL. Caso seja insuficiente, retirar
a válvula e o manômetro e completar a quantidade desejada.
Figura 4: Coleta de líquor
Coleta do material em tubos apropriados. Fonte: Clerkship Directors
in Emergency Medicine.4

6. CUIDADOS E COMPLICAÇÕES
As complicações decorrentes da punção lombar geralmente são
evitáveis, por isso se faz necessário conhecer os riscos e as
técnicas corretas para que o procedimento atinja seu objetivo sem
causar mor-bimortalidade ao paciente. Dentre as complicações mais
importantes, citamos:

• Herniação cerebral: é a complicação de maior gravidade.


Caracterizada pela protrusão do tecido cerebral através de
uma das barreiras rígidas intracranianas (incisura tensorial,
foice cerebral, forame magno). Sua ocorrência é sinalizada
por: hipertensão sistólica, respiração irregular e bradicardia;
quadro conhecido como reflexo de Cushing. Para evitar essa
complicação a punção lombar é contraindicada nos casos de
hipertensão liquórica diagnosticados por exame de fundo de
olho (presença de papiledema) ou neuroimagem.

• Sangramento: alguns fatores favorecem tal complicação.


Esses são: idade avançada (os plexos venosos da região
epidural ficam mais frágeis e vulneráveis com o avançar da
idade); aumento da pressão intra-abdominal, por exemplo à
ascite e gestação (aumenta o calibre do plexo venoso,
tornando-o mais vulnerável); Punção lombar prévia (ocorre
reação inflamatória local, o que promove fibrose entre a dura-
máter e o ligamento amarelo, assim reduzindo a capacidade
de absorver sangue). Nesses casos a indicação de punção
deve ser avaliada caso a caso. Alguns medicamentos alteram
a homeostase e podem favorecer a ocorrência de
complicação. Em seguida será citada a conduta para cada um
desses medicamentos que mais geram dúvida na prática
clínica.
• Anti-inflamatório não esteroidal (exceto AAS): como esses
medicamentos não exercem efeito protetor cardiovascular,
devem ser suspensos antes do procedimento. Em caso de
procedimento de urgência em pacientes em uso de AINES, o
mesmo deve ocorrer com cautela. Diclofenaco, Ibuprofeno e
Cetorolaco devem ser suspensos 1 dia antes do
procedimento; Indometacina deve ser suspenso 2 dias antes;
Meloxicam e Naproxeno, 4 dias; Piroxicam, 10 dias. O Ácido
Acetilsalicílico não deve ser suspenso uma vez que não
interfere na função plaquetária.

• Heparinas: devem ser suspensas. Heparina de Baixo Peso


Molecular deve ser suspensa nas 12 horas que antes do
procedimento e 24 horas se paciente renal crônico; Heparina
Subcutânea Não Fracionada deve ser suspensa de 4 a 6 horas
antes do procedimento; Heparina intravenosa deve ter a
infusão suspensa nas 4 horas que antecedem a punção.

• Varfarina: recomenda-se a suspensão e realização do


procedimento apenas com INR menor que 1,5. Em caso de
urgência, recomenda-se reversão com vitamina K ou baixa
dose de concentrado de complexo protrombínico.

• Novos anticoagulantes. Esses medicamentos também devem


ser suspensos, quando possível, por um dia. Nos doentes
renais crônicos recomenda-se a substituição por Heparina
Não Fracionada e, então, suspendê-la por 6 horas até o
procedimento.

• O reinício das drogas após o procedimento é recomendado a


partir de seis horas da realização.

• Cefaleia: decorre da diminuição do líquido cefalorraquidiano,


pode ser evitada ao manter o paciente deitado em decúbito
dorsal por alguns instantes após o procedimento. Agulhas de
maior calibre e punções de repetição podem predispor a
ocorrência de cefaleia. Como cefaleia é também sinal de outra
complicação, a herniação, recomenda-se respeitar esse
período de repouso após procedimento e, caso presença do
sintoma, investigar.

• Dor local: geralmente de leve a média intensidade, pode ser


tratada com uso de analgésico comum.

• Infecção: é uma das complicações mais frequentes e pode


ser evitada ao respeitar as técnicas de antissepsia para
procedimentos cirúrgicos.

REFERÊNCIAS
1. Ellenby MS, Tegtmeyer K, Lai S, Braner DAV, et al. Lumbar Puncture. New England
Journal of Medicine. 2006; 355(13): e12.
2. Silva CP, Leite FB, Vale TC, et al. Líquido Cefalorraquidiano – Técnicas De Coletas E
Aspectos Diagnósticos. Revista Médica Oficial do Hospital Universitário da UFJF.
2004; 30(2-3): 91-97.
3. Ellenby MS, Tegtmeyer K, Lai S, Braner DAV, et al. Lumbar Puncture. New England
Journal of Medicine. 2006; 355 (13): e12.
4. Shlamovitz GZ. Lumbar Puncture. Medscape [acesso em 2019 nov. 7]. Disponível em:
https://emedicine.medscape.com/article/80773.
5. Flores WL. Manual do Residente de Clínica Médica. 2. ed. Barueri, SP: Manole; 2017.
. Narouze S et al. Interventional Spine and Pain Procedures in Patients on Antiplatelet
and Anticoagulant Medications. Guidelines from the American Society of Regional
Anesthesia and Pain Medicine, the European Society of Regional Anaesthesia and
Pain Therapy, the American Academy of Pain Medicine, the International
Neuromodulation Society, the North American Neuromodulation Society, and the World
Institute of Pain. Reg Anesth Pain Med. 2018; 43: 225-262.
7. Domingues R et al. Lumbar puncture, anticoagulants, antiplatelet drugs. Arq
Neuropsiquiatr. 2016; 74(8): 679-686.

CRÉDITOS DAS IMAGENS


1. Research Gate. Cross section of the spine showing the different layers of the spine and
which are crossed by a needle during the lumbar puncture procedure. [acesso em
2020 jan. 23].
2. Medical Expo. AGULHA DE ANESTESIA RAQUIDIANA DE QUINCKE. [acesso em 2020
jan. 23].
3. Medscape. Lumbar Puncture Technique. [acesso em 2020 jan. 23].
4. Clerkship Directors in Emergency Medicine. [acesso em 2020 jan. 23].
Parte 3 | Capítulo 35

Toracocentese
Autor: Laís Siqueira de Magalhães
Coautor: Ivan Kirche Duarte

1. INTRODUÇÃO
A toracocentese é um procedimento médico que, ao remover
fluidos ou ar do espaço pleural, pode ser diagnóstica ou
terapêutica/de alívio. A palavra advém da junção de tórax com o
sufixo grego -centese, que traduz “punção”.
O espaço pleural reveste internamente a parede torácica, sendo
delimitado pelas pleuras visceral e parietal, membranas lisas e
serosas. Sob circunstâncias normais, o espaço pleural contém
apenas uma pequena quantidade de líquido pleural, o qual é
lubrificante e é responsável por transmitir as forças respiratórias
entre o pulmão e a parede torácica. Todavia, o desequilíbrio entre
acúmulo e absorção de líquido pleural – pressão hidrostática
aumentada, pressão intrapleural negativa aumentada,
permeabilidade capilar aumentada, pressão oncótica plasmática
diminuída, drenagem linfática diminuída ou interrompida – acarreta
o desenvolvimento de derrame pleural.
As causas mais comuns de derrame pleural são insuficiência
cardíaca, pneumonia bacteriana, câncer, embolia pulmonar, doença
viral, cirurgia cardíaca, cirrose com ascite. Outras causas menos
comuns podem ser uremia, mixedema, síndrome nefrótica e
doenças reumato-lógicas. Vale ressaltar que, quando o espaço
pleural sofre uma infecção piogênica ou supurativa, forma-se um
empiema, o qual é classificado em fases: aguda (derrame pleural de
baixa viscosidade e baixa conta-gem celular),
transicional/exsudativa/fibrinopurulenta (elevação de leucócitos no
derrame pleural) e organizada/crônica (crescimento de capilares e
fibroblastos para dentro da borda pleural, cursando com uma
diminuição na expansibilidade pulmonar).
Em relação à clínica apresentada pelo paciente, o derrame pleural
pode ser assintomático; mas, quando extenso, pode provocar
dispneia e dor ou peso torácicos. Ao exame físico, na área onde o
líquido pleural está acumulada, haverá redução do murmúrio
vesicular, diminuição da ausculta da voz e macicez à percussão. À
radiografia de tórax em posi-ção supina, um mínimo de 250 a 500mL
de líquido deve se acumular antes de obliterar o seio costofrênico;
em casos duvidosos, pode-se so-licitá-la em posição de Laurell
(decúbito lateral com raios horizontais), esperando que o líquido
escorra com a mudança do decúbito.
A toracocentese diagnóstica é indicada em pacientes com
derrame pleural sem causa óbvia, podendo fornecer o diagnóstico
ou direcio-nar a investigação diagnóstica. Pode ser auxiliada por
uma ultrassono-grafia, principalmente em derrames pleurais
pequenos e em casos de toracocentese difícil, com a finalidade de
reduzir complicações. Para controle, a radiografia de tórax após a
toracocentese deve ser feita se houver tosse, dispneia, dor torácica,
saída de ar durante a toracocente-se ou redução do frêmito
toracovocal na parte superior do hemitórax aspirado.
Já a toracocentese terapêutica é indicada em pacientes com
grande derrame pleural que esteja causando intenso desconforto ou
dispneia. Pelo risco de edema pulmonar de reexpansão (expansão
pulmonar abrupta que causa ruptura e extravasamento de líquido
plasmático para o interior dos alvéolos pulmonares), a aspiração de
líquido pleu-ral deve ser suspensa quando o paciente apresentar
sintomas como hipotensão, dor torácica ou tosse. Antigamente,
havia uma restrição para remoções acima de 1,5 litro; no entanto,
hoje se sabe que a maio-ria dos pacientes não apresenta problemas
com a remoção de maiores volumes.
Contraindicações ao procedimento de toracocentese incluem pa-
cientes não cooperativos, alteração severa da hemostasia,
instabilida-de hemodinâmica, falência respiratória severa, efusão
pleural pequena e infecção de pele no local da punção.
Contraindicações relativas di-zem a respeito de bolhas no local da
punção e o uso de pressão positi-va expiratória (PEEP).
As complicações do procedimento podem ser: dor, pneumotórax,
respiração encurtada/dispneia, tosse (devido à distensão abrupta
dos alvéolos), reação vasovagal (sudorese, desconforto geral,
lipotimia), edema pulmonar reexpansivo, punção errônea de fígado
ou baço, san-gramento por laceração de vasos intercostais, início de
infecção pleu-ral, enfisema subcutâneo, embolia gasosa e
hematoma subcutâneo. Deve-se interromper o procedimento se o
paciente apresentar quais-quer sinais de instabilidade
cardiovascular.
Vale lembrar que não é necessária a realização da toracocentese
em centro cirúrgico, mas ela preferencialmente deve ser realizada
em um local limpo e reservado para pequenos procedimentos.

2. O QUE UM CIRURGIÃO DEVE


SABER
Os materiais necessários para realizar a paracentese são: luvas
es-téreis; máscara facial (opcional); gaze; solução antisséptica;
campos estéreis; anestésico local (lidocaína a 2% sem
vasoconstritor); agulhas de 40x12mm e 30x7mm; seringas de 10mL
e 20-60mL; cateter venoso periférico de calibre 14G ou 16G; frascos
comuns ou a vácuo; espara-drapo.
A técnica da toracocentese consiste em:
1. Explicar o procedimento ao paciente e obter o seu consenti-
mento.
2. Separar todo o material e, se necessário, o equipamento de
ul-trassonografia (utilizada como guia).
3. Preencher o pedido dos exames necessários e rotular os fras-
cos de coleta com os dados básicos do paciente.
4. Posicionar o paciente na posição sentada, ou com os braços
e a cabeça apoiados em travesseiros, sobre um anteparo, ou
com a mão ipsilateral ao derrame apoiada sobre o ombro
contralateral. Em pacientes em que esse posicionamento não é
possível, a po-sição é semissentada no leito ou em decúbito
lateral do lado do derrame pleural.
Figura 1: Possível posicionamento do paciente para a realização da
toracocentese

Fonte: Acervo da Editora

5. Palpar os possíveis locais de punção: o 6o, 7o ou 8o espaço


intercostal na linha axilar média ou a região subescapular, sendo
o local escolhido aquele que apresentar a melhor propedêutica.
6. Paramentar o profissional com luvas estéreis e com máscara
facial (opcional).
7. Realizar a assepsia e a antissepsia do paciente.
8. Posicionar o campo estéril na região a ser puncionada.
9. Aspirar, com a seringa de 10mL e a agulha de 40x12mm, o
anestésico local (lidocaína a 2% sem vasoconstritor), e realizar
um botão anestésico com a agulha de 30x7mm. Anestesiar
todos os planos: pele, tecido subcutâneo, periósteo e pleura
parietal. Sempre aspirar a seringa antes da próxima injeção do
anestésico, evitando a instilação de anestésico diretamente na
circulação.
10. Puncionar o paciente no local escolhido com uma agulha de
40x12mm acoplada a uma seringa de 20 a 60mL, sempre na
bor-da superior da costela inferior para evitar o feixe
vasculonervoso. Deve-se solicitar ao paciente que, durante a
punção, prenda sua respiração para evitar traumatismos ao
parênquima pulmonar.
11. Se toracocentese terapêutica, retirar a agulha e introduzir
um cateter venoso periférico de calibre 14G ou 16G no pertuito
pre-viamente criado. Após sua introdução, remover o mandril,
man-tendo o cateter plástico.
12. Após obter a quantidade necessária de líquido (tanto na pa-
racentese diagnóstica como na terapêutica), solicitar ao
paciente que realize apneia ou expiração forçada para se retirar
a agulha, cobrindo imediatamente o orifício com um curativo
oclusivo.
13. Aplicar um curativo no local da punção por meio de gazes
com esparadrapos.
Colocar o material colhido em frascos à beira do leito e
encaminhar para exame citológico e bioquímico.A análise do líquido
pleural se ini-cia no seu aspecto macroscópico: pode ser
sanguinolento, sugerindo neoplasia, tuberculose, trauma ou embolia
pulmonar; quando turvo, há lipídeos, excesso de proteínas ou
excesso de células; se leitoso, re-mete ao quilotórax; se purulento,
indica derrame parapneumônico complicado. Ainda, se houver odor
pútrido, pode indicar a presença de anaeróbios, e caso haja odor de
urina, sugere urinotórax.
Após a avaliação macroscópica, o fluido coletado deve ser
diferen-ciado em transudato ou em exsudato através da dosagem de
proteínas e de desidrogenase lática (DHL) no líquido pleural e no
sangue, com posterior análise de seus valores.
O transudato é causado por aumento da pressão hidrostática.
Pode ser encontrado em cirrose hepática, insuficiência cardíaca,
hipoalbu-minemia grave, diálise peritoneal, hipotireoidismo,
síndrome nefrótica, síndrome da veia cava superior, estenose mitral
e pericardite constriti-va.
Por sua vez, o exsudato é causado por aumento da
permeabilidade capilar ou por obstrução linfática. As principais
etiologias de exsuda-to incluem: malignidade (principalmente
metástases de mama e de pulmão), efusões parapneumônicas,
tuberculose, embolia pulmonar, artrite reumatoide, doenças
autoimunes, pancreatite e infecções fún-gicas. De acordo com os
critérios de Light, um exsudato pode se classi-ficar por, pelo menos,
um destes positivos:
1) Relação proteínas líquido pleural/proteínas séricas >0,5.
2) Relação DHL líquido pleural/DHL sérico >0,6.
DHL líquido pleural >2/3 do limite superior do DHL sérico normal.
Além desses parâmetros, deve-se solicitar bacterioscopia (Gram),
cul-tura para aeróbios e anaeróbios, glicose (que pode ser baixa nos
ca-sos de empiema, derrame parapneumônico complicado e
neoplasia) e citologia oncótica. Em relação à celularidade, o
predomínio de po-limorfonucleares indica um processo agudo na
pleura (derrame pa-rapneumônico, embolia, pancreatite), ao passo
que o predomínio de linfócitos fala a favor de neoplasia ou
tuberculose (nesse caso, pode-se solicitar a dosagem da adenosina
deaminase (ADA), enzima secretada por linfócitos e macrófagos
ativados). A presença de eosinófilos ocorre se houver sangue ou ar
na pleura, reação medicamentosa, asbestose e síndrome de Churg-
Strauss.
Outros exames adicionais podem ser solicitados: pH (menor que
7,2 em derrames parapneumônicos indica possível necessidade de
drena-gem do empiema, e em neoplasias indica péssimo
prognóstico), pep-tídeo natriurético cerebral (marcador de
insuficiência cardíaca sistólica e diastólica), amilase (sugere ruptura
do trato gastrintestinal ou doen-ças pancreáticas), triglicérides
(indica quilotórax ou pseudoquilotórax), testes imunológicos (podem
ser positivos em doenças do colágeno), dentre outros.
Derrame parapneumônico com glicose no líquido pleural <60
mg/dL, pH <7,2 ou DHL >1000 U/L indica a necessidade de
drenagem.
Ademais, pacientes com derrame pleural de repetição devem ser
avaliados para pleurodese, principalmente se o derrame for neoplási-
co. Tal procedimento consiste no colabamento dos folhetos visceral
e parietal, o que impossibilita o acúmulo de líquido.

CONCLUSÃO
A toracocentese é um exame realizado em derrames pleurais de
etiologia desconhecida. Após o procedimento, deve-se classificar o
derrame pleural em transudato ou exsudato, sendo a insuficiência
cardíaca, a cirrose e a síndrome nefrótica as causas de transudato
mais comuns, e as de exsudato, infecção e neoplasia.

REFERÊNCIAS
1. Townsend CD. Sabiston: Tratado de Cirurgia, A Base da Prática Cirúrgica Moderna. 18.
ed. Rio de Janeiro, RJ: Elsevier; 2010.
2. Martins HS. Emergências Clínicas: Abordagem Prática. 10. ed. Barueri, SP: Manole;
2015.
3. Goffi FS. Técnica cirúrgica: bases anatômicas, fisiopatológicas e técnicas da cirurgia.
4. ed. São Paulo, SP: Atheneu; 2007.
4. Kalifatidis A, Lazaridis G, Baka S, Mpoukovinas I, Karavasilis V, Kioumis I, et al.
Thoracocentesis: from bench to bed. Journal of Thoracic Disease. fev. 2015; 7(1): S1-
4.
5. Sales R, Onishi R. Toracocentese e biópsia pleural. Jornal Brasileiro de Pneumologia,
São Paulo, ago. 2006; 32 (4): S170-S173.
. Heffner JE, Maldonado F, Finlay G. Diagnostic evaluation of a pleural effusion in adults:
Initial testing. Atual. em set. 2019 [acesso em 2019 out. 20].
7. Huggins JT, Broaddus VC, Finlay G. Large volume (therapeutic) thoracentesis:
Procedure and complications. Atual. em set. 2019 [acesso em 2019 out. 20].
Parte 3 | Capítulo 36

Drenagem torácica
Autoras: Larissa Miranda Rocha e Dra. Jackeline Ribeiro Oliveira
Guidoux

1. Introdução
Os pulmões são envolvidos por duas membranas contínuas, a
pleura visceral e a pleura parietal. O espaço entre as duas
membranas forma a cavidade pleural, que em condições normais
contém uma fina película de líquido que permite o deslizamento
suave de uma camada pleural sobre a outra durante a respiração.
Além disso, também mantém a tensão superficial que garante a
insuflação dos pulmões. Em situações patológicas, o espaço pode
ser ocupado por material anormal, comprometendo a mecânica
pulmonar e exigindo tratamento imediato de esvaziamento.
Drenagem pleural é um procedimento médico largamente utilizado
com finalidade terapêutica ou diagnóstica. Trata-se da introdução de
um dreno tubular no espaço pleural para remoção de material
líquido ou gasoso.4, 5

2. Indicações
Há dois métodos de drenagem pleural: aberto e fechado. A
drenagem aberta, ou pleurostomia, é um método mais complexo,
que exige anestesia geral e é realizada pelo cirurgião torácico. É
indicada apenas no tratamento de infecções crônicas. Essas
infecções são chamadas empiema crônico e ocorrem quando já há
fixação do pulmão pelo espessamento da pleura.
O segundo método é largamente utilizado na prática médica e
possui diversas indicações. É considerado relativamente simples,
mas requer cuidados especiais para evitar complicações.
Procedimento comum no pronto-socorro, nas unidades de
tratamento intensivo e nos hospitais gerais.1, 2, 4
As indicações mais comuns são:

• Drenagem de líquido:

• Derrame seroso

• Hemotórax

• Empiema

• Quilotórax

• Drenagem de ar:

• Pneumotórax

• Pós-operatório de cirurgia torácica1

3. Contraindicações
Sua principal contraindicação relativa é a discrasia sanguínea, a
qual, quando possível, deve ser corrigida previamente ao
procedimento.1

4. Procedimento
O primeiro passo deve ser explicar todo o procedimento ao
paciente; trata-se de uma técnica realizada à beira do leito e que
pode necessitar da cooperação do paciente na sua realização. Em
crianças, exige sedação e realização em centro cirúrgico.1

5. Preparo cirúrgico
É necessário preparo cirúrgico com gorro, capote, luvas, máscara
e óculos. Fazer antissepsia ampla e rigorosa no hemitórax a ser
drenado. Colocação de compressas ou campo fenestrado no
hemitórax do local a ser drenado.4

6. Anestesia
Procedimento que gera muita dor, sendo necessário anestesia
local de pele e periósteo. Primeiro anestesia-se a pele; em seguida,
se introduz a agulha até a 6ª costela, sempre aspirando e injetando.
Ao tocar a costela, inclinar a agulha no sentido cranial, para injetar
anestésico na borda superior da costela.1

7. Posição do paciente
Em decúbito dorsal, com a mão atrás da cabeça, para abrir
espaço intercostal e facilitar procedimento.1

8. Local da incisão
A escolha do local a ser drenado exige atenção especial. Sua
localização pode tornar procedimento mais fácil, mais complicado,
gerar mais dor ou até provocar complicações relacionadas a danos
em estruturas nobres. Vai depender da indicação e também da
experiência do cirurgião. No tratamento de pneumotórax e
hemotórax, o local mais utilizado para introdução do dreno é entre a
linha axilar média e a anterior, ao nível do 5° espaço intercostal na
borda superior da costela inferior do espaço. Maneira rápida para
encontrar 5° espaço: projetar o mamilo do homem ou sulco
inframamário da mulher. Por vezes, vai ser possível uso de exame de
imagem para realização do procedimento, o que facilita sua correta
localização. Em situações de emergência, entretanto, isso não é
possível. Importante realizar exame físico pré-drenagem e confirmar
hemitórax com alteração – direito ou esquerdo. No pneumotórax,
lado comprometido terá alteração de percussão com som
timpânico.4

9. Incisão
Outro cuidado importante trata-se do tamanho da incisão, que vai
depender do diâmetro do dreno. Dreno deve passar mais ou menos
justo com as bordas da incisão. A abertura não deve ser maior que o
necessário e geralmente é em torno de 1 a 1,5 cm. Uma incisão
maior pode favorecer entrada de ar e ocorrência de pneumotórax,
configurando uma das complicações possíveis. É feita uma
toracotomia na pele e, com pinça do tipo Kelly, promove-se a
dissecção da musculatura até que seja atingida a cavidade pleural.
No caso de dreno rígido, introduz-se em sentido posterior e cranial.
O dreno é fixado à pele com fio de sutura resistente e conectado ao
sistema de selo de água. O diâmetro do dreno varia de acordo com o
tamanho do paciente e o tipo de líquido encontrado. Normalmente o
número escolhido é French 32, mas tamanhos menores também
podem ser indicados, como o número 28 para casos de
pneumotórax.1, 3, 4

10. Características do sistema de drenagem


O frasco do selo de água vem vazio e é completado com soro
fisiológico. Atenção para a quantidade de soro utilizado; em pouca
quantidade, tem risco de pneumotórax, em grande quantidade, há
maior resistência na drenagem. Geralmente usa-se 500ml no
recipiente com capacidade de 2.000ml ou 250ml no recipiente de
1.000ml. Sempre na mesma quantidade, a fim de avaliar a
quantidade de líquido que está sendo drenado e concentrado ali. No
pneumotórax, vai borbulhar no selo d’agua. No hemotórax, a garrafa
vai ser preenchida por sangue. O líquido deve ser trocado todos os
dias ou quando o recipiente estiver cheio.1, 3

11. Complicações
Há diversas possíveis complicações do procedimento, que
podem levar ao aumento da morbidade e tempo de internação. As
complicações mais comuns são: (1) dreno localizado fora da
cavidade pleural, como no subcutâneo ou musculatura; (2) lesões no
pulmão, no fígado e no baço; (3) e hemorragia importante devido a
lesões dos vasos intercostais. Ainda pode ocorrer persistência do
pneumotórax, que pode ser por conta da entrada de ar na cavidade
pleural pela abertura da pele ou pela má fixação do dreno. É
necessário devida atenção ao frasco coletor. O recipiente cheio
dificulta a drenagem e pode causar retenção de líquidos. Se surgir
dificuldade respiratória, o tórax deve ser radiografado
imediatamente.3

12. Retirada do dreno


Alguns critérios devem ser avalizados no momento da retirada do
dreno: débito de drenagem, aspecto do líquido, escape de ar e
radiografia. Débito inferior a 100ml/24h tem indicação de retirada.
Não se deve retirar dreno enquanto houver escape de sangue vivo ou
pus. No pneumotórax, é retirado quando não há mais saída de ar ou
observação de borbulhas no frasco de drenagem. É indicado ajuda
de mais de uma pessoa para retirar dreno. No momento da retirada,
é orientado ao paciente realização da manobra de valsalva, para
criar pressão positiva dentro da cavidade pleural e não propiciar a
ocorrência de pneumotórax. Realizar curativo oclusivo.3

Conclusão
Mesmo sendo considerado um procedimento simples, a
drenagem pleural constitui um método que exige uma série de
cuidados especiais, necessários para sua ocorrência em segurança
e alcance do seu objetivo, que pode ser de diagnóstico ou
tratamento. Por vezes vai ser indicada para pacientes instáveis,
debilitados ou em pós-operatório, o que pode tornar suas
complicações ainda mais sérias. Assim, é indispensável o
conhecimento da sua técnica correta e clínica envolvida.

Referências
1. Amato ACM. Procedimentos médicos: técnica e tática. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora
Roca; 2016.
2. Goffi FS. Técnica cirúrgica: Bases anatômicas, fisiopatológicas e técnicas da cirurgia.
4. ed. São Paulo: Editora Atheneu; 2007.
3. Marques RG. Técnica operatória e cirurgia experimental. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan; 2005.
4. Monteiro ELC, Santana EM. Técnica Cirúrgica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan;
2006.
5. Moore KL, Dalle AF, Argur AMR. Anatomia orientada para clínica. 6. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan; 2011.
Parte 3 | Capítulo 37

Pericardiocentese
Autor: Gabriel Bernardo Rena
Cuautora: Mariane de Castro Michielin
Orientador: Dr. Roberto Salvador Martins

1. INTRODUÇÃO
A pericardiocentese é um procedimento invasivo realizado com a
finalidade de remoção do líquido pericárdico do saco pericárdico. É
frequentemente utilizado para o ajuste do tamponamento cardíaco,
com a correção da hipotensão devido à diminuição do volume
sistólico, que é causado pela compressão extrínseca das câmaras
cardíacas.
Esse procedimento pode ser realizado às cegas ou com a ajuda
de exames de imagem em tempo real, como a ecocardiografia
transtorácica (ETT) ou fluoroscopia, para reduzir o risco de
complicações processuais. O procedimento pode ser realizado à
beira do leito ou no laboratório de cateterismo cardíaco. No entanto,
a decisão sobre onde executar e quais exames utilizar é baseada na
estabilidade do paciente, no conforto do operador e na
disponibilidade de adjuvantes de imagem.

2. SITUAÇÃO NA EMERGÊNCIA
Atualmente, a pericardiocentese é a primeira opção de
tratamento para pacientes com tamponamento cardíaco. Neste
tópico vamos abordar mais especificamente essa patologia, para
podermos compreender melhor a realização do procedimento.
• O que é o tamponamento cardíaco?
O tamponamento cardíaco é uma emergência médica que
consiste na compressão cardíaca devido à presença de líquido no
espaço pericárdico, dificultando a contratilidade cardíaca. Ele pode
resultar em choque cardiogênico; portanto, é uma patologia de alta
mortalidade, cabendo a nós identificar e intervir rapidamente.
Figura 1: Acúmulo de líquido no espaço pericárdico

Fonte: Leonard J. 1

• Quais são as principais causas do tamponamento cardíaco?


• Trauma (lesões perfurantes e/ou contundentes)
• Ruptura de aneurisma de aorta
• Pós-cirurgia cardíaca

• Infarto agudo do miocárdio

• Câncer cardíaco ou pulmonar

• Pericardite

• Uremia

• Como podemos identificar o tamponamento cardíaco?


Esta patologia está fortemente relacionada à tríade de Beck, que
consiste no abafamento ou hipofonese das bulhas cardíacas,
associado à hipotensão arterial e turgência jugular. Porém, essa
tríade ocorre em apenas 10% dos pacientes. Outros sinais clínicos
presentes incluem pulso paradoxal e sinal de Kussmaul, ou seja,
maior ingurgitamento da veia jugular na inspiração.

• Quais exames devemos solicitar na vigência de um


tamponamento cardíaco?
O diagnóstico é clínico, porém podemos utilizar exames de
imagem para auxiliar, como a ultrassonografia e a ecocardiografia,
especialmente nos pacientes que não apresentam risco imediato à
vida.
Figura 2: Ecocardiograma de um paciente com derrame pericárdico,
comprimindo o ventrículo direito. RA: Átrio direito. LA: Átrio
esquerdo. RV: Ventrículo direito. LV: Ventrículo esquerdo. Pericardeal
effusion: Derrame pericárdico.
Fonte: Torres M. 2

• Como realizar o tratamento do tamponamento cardíaco?


O tratamento consiste na realização da pericardiocentese para
alívio imediato, uma vez que a remoção do líquido pericárdico
permite o enchimento ventricular normal e a restauração do débito
cardíaco adequado. Posteriormente, o paciente deve ser submetido
à toracotomia ou esternotomia.

3. INDICAÇÕES
A pericardiocentese é realizada em pacientes como
procedimento terapêutico ou diagnóstico. Em casos de derrames
pericárdicos agudos ou crônicos sem evidência de tamponamento
cardíaco e outras situações não emergentes, o procedimento é
indicado para diagnóstico da etiologia subjacente ao derrame.
Nesse caso, obtemos líquido pericárdico para análise laboratorial,
para alívio de sintomas como dispneia ou edema ou para impedir a
progressão do derrame para uma situação emergente.
Como visto anteriormente, a principal indicação da
pericardiocentese é o tamponamento cardíaco manifesto,
representando cerca de 80% a 90% dos procedimentos. Para
entendermos com maior clareza as demais indicações da
pericardiocentese, é fundamental compreendermos primeiro as
classes de recomendações existentes.
A classe I é aquela na qual há evidências científicas suficientes e
conclusivas que provam que o procedimento é útil. Por sua vez, a
classe II A é onde a maioria das evidências é a favor da utilização do
procedimento. Já na classe II B, não encontramos um predomínio de
evidências a favor da realização do processo, porém mesmo assim
há indicação relativa.
Assim sendo, dividiremos as indicações de acordo com as
classes:

• Classe I

• Tamponamento cardíaco;
• Dderrame pericárdico com separação diastólica > 20 mm
entre epicárdio e pericárdio no exame de ecocardiografia;

• Suspeita de derrame pericárdico purulento ou


tuberculoso.

• Classe II A

• Derrame pericárdico (excluído purulento e tuberculoso)


com separação diastólica entre 10 a 20 mm entre epicárdio
e pericárdio com finalidade diagnóstica;

• Suspeita de derrame pericárdico maligno.


• Classe II B

• Derrame pericárdico (excluído purulento e tuberculoso)


com separação diastólica < 10 mm entre epicárdio e
pericárdio com finalidade diagnóstica.
É fundamental lembrarmos que a pericardiocentese para fins de
diagnóstico não se justifica na maioria dos casos de pequenas
efusões leves ou moderadas (< 20 mm) pelos seguintes motivos:
baixo poder diagnóstico (a patologia subjacente já é frequentemente
conhecida ou identificável por diferentes testes não invasivos); a
pericardite viral, ou idiopática, frequentemente é autolimitada e
requer apenas um tratamento anti-inflamatório; e alto risco do
procedimento em comparação com um baixo rendimento
diagnóstico.

4. CONTRAINDICAÇÕES
Não existem contraindicações absolutas à pericardiocentese
quando ocorre tamponamento cardíaco e choque cardiogênico. Isso
se deve ao fato de que mesmo a retirada de uma pequena
quantidade de líquido em um paciente muito instável pode gerar
melhora imediata na hemodinâmica. Com exceção da dissecção de
aorta e da ruptura pós-infarto da parede livre, que são
contraindicações à pericardiocentese por agulha e indicações para
drenagem cirúrgica com urgência.
As contraindicações relativas incluem:

• Presença de procedimentos menos invasivos que


conseguem realizar o diagnóstico

• Derrame pericárdico pequeno evoluindo com terapia anti-


inflamatória

• Distúrbios de coagulação não corrigidos


• INR > 1.5
• Pacientes em uso de anticoagulantes
• Ttrombocitopenia (plaquetas < 50.000/mm^3): A baixa
contagem de plaquetas é algo comum em pacientes que
necessitam da pericardiocentese e possuem uma
malignidade subjacente, principalmente quando tratados com
quimioterapia. Uma transfusão profilática de plaquetas
raramente é necessária e até mesmo improdutiva antes de
uma punção pericárdica nesses pacientes

• Derrame posterior ou localizado

5. REALIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO
Atualmente, existem algumas poucas maneiras convencionais de
se retirar o excesso de líquido pericárdico, sendo a
pericardiocentese percutânea de longe a técnica mais direta e
virtualmente mais rápida. Essa técnica é considerada muito segura
se o paciente não possuir contraindicações para um procedimento
percutâneo, e se o operador for experiente.
Para a realização dessa técnica, precisamos primeiramente
solicitar alguns exames laboratoriais: contagem de plaquetas e INR,
uma vez que a plaquetopenia < 50.000/mm^3 e INR > 1,5 são
contraindicações relativas à pericardiocentese, como vimos no
tópico anterior.
Nos últimos anos, o acesso ao saco pericárdico tornou-se muito
mais seguro devido ao uso sistemático de exames de imagem para
orientar o procedimento. É obrigatório obtermos uma boa
interpretação da extensão e da localização do derrame antes do
início do procedimento, embora as punções pericárdicas de
emergência muitas vezes não podem ser adiadas.
A imagem também identifica outros fatores que influenciam na
realização e na localização da punção, como massas ou aderências
intrapericárdicas. Na maior parte das vezes, a ecocardiografia de
rotina é a ferramenta mais rápida e acessível para visualizar o
derrame pericárdico, seguida de fluoroscopia que nos ajuda a
orientar a posição e a trajetória da agulha durante procedimento.

5.1. Preparação
O procedimento deve ser realizado na sala de cirurgia ou na UTI,
onde o paciente pode ser monitorado continuamente. O local deve
possuir uma máquina de ecocardiografia, bem como são
necessárias cortinas estéreis, seringas, agulhas, anestésico local,
bisturi e um kit de pericardiocentese.
O paciente deve ser colocado em decúbito dorsal com a
cabeceira levemente elevada (30º à 45º). Além disso, necessita de
acesso endovenoso, suplementação de oxigênio e monitorização
cardíaca. Caso o tempo permita, é recomendada a passagem de
sonda nasogástrica para descompressão do estômago, com o
intuito de prevenir uma perfuração gástrica.

5.2. Técnica
• 1º passo: Realizar a antissepsia do local que será
posteriormente puncionado com clorexidina. As regiões
anatômicas de preferência são a via subxifoide ou a região do
tórax anterior. Devemos preparar a área e cobri-la de maneira
estéril.

• 2º passo: Anestesiar o local da pele e subcutâneo com


lidocaína 1% à 2%;

• 3º passo: Conectar o cabo da derivação V1 do


eletrocardiograma na extremidade distal da agulha já
acoplada na seringa, para a monitorização
eletrocardiográfica.
• 4º passo: Inserir a agulha de grande calibre (calibre 20 ou
maior) e de comprimento suficiente em 45º através da pele,
0,5 cm à esquerda do apêndice xifoide. Em seguida, avançar
lentamente a agulha em direção à fúrcula esternal, mantendo
a aspiração da seringa, até que o refluxo de líquido
pericárdico seja notado.
Figura 3: Posicionamento da agulha e seringa para realização da
pericardiocentese.

Fonte: Nickson C. 3

Essa etapa pode ser realizada com auxílio do ultrassom ou


fluoroscopia para orientação. Caso a pericardiocentese esteja
sendo realizada às cegas e o líquido pericárdico não seja
encontrado na primeira passagem, a agulha deverá ser retirada
e ajustada movendo-se na direção prevista do saco pericárdico
até encontrar fluido.

• 5º passo: Ao encontrar o líquido pericárdico, devemos aspirá-


lo com calma, sendo que cerca de 50 a 100 ml são suficientes
para melhorar a hemodinâmica do paciente.
• 6º passo: Retirar a agulha e realizar curativo oclusivo estéril.

6. POSSÍVEIS COMPLICAÇÕES
A pericardiocentese é um procedimento invasivo que traz
consigo potenciais riscos. Embora nos dias de hoje, com a presença
da pericardiocentese guiada por ecocardiografia, as taxas de
complicações sejam baixas, ainda é considerado um procedimento
de alto risco quando realizado por profissionais não experientes.
As principais complicações são:

• Hemopericárdio por perfuração do miocárdio ou laceração


coronária: trata-se da complicação direta mais temida e com
risco de vida, embora ocorra em menos de 1% dos
procedimentos;

• Pneumopericárdio;
• Pneumotórax;
• Arritmias;
• Reação vasovagal;
• Lesão da artéria mamária interna;
• Pericardite purulenta;
• Edema pulmonar agudo ou dilatação de ventrículo direito
por alívio muito rápido do derrame;

• Punção acidental do peritônio, da veia cava inferior ou da veia


hepática;
• Infecção.

CONCLUSÃO
Com base em tudo o que foi abordado neste capítulo, podemos
concluir que a pericardiocentese é um procedimento de escolha em
certas situações de emergências com risco à vida, como o
tamponamento cardíaco.
Trata-se de um procedimento invasivo e com possíveis
complicações graves, portanto, sua realização deve ser reservada a
profissionais com maior experiência e capacitação para efetivação
da técnica correta. Dessa forma, conseguimos minimizar os riscos
de potenciais consequências que podem não somente piorar o
quadro do paciente, como levar ao óbito.

REFERÊNCIAS
1. Ariyarajah V, Spodick DH. Cardiac Tamponade Revisited: a Postmortem Look at a
Cautionary Case. Tex Heart Inst J, 2007.
2. Barra LD, Guimarães LA, Gomes MBV, Hanashiro M, Kilimnik LM, Lodi LD, et al.
Tamponamento Cardíaco Agudo: Uma Breve Revisão. Revista Médica de Minas
Gerais, 2008. 18(3 Supl 4): S37-S40
3. Bastian A, MeinBner A, Lins M, Siegel EG, Moller F, Simon R. Pericardiocentesis:
Differential Aspects of a Common Procedure. Intensive Care Med, 2000. 26: 572-576.
4. Bilchick KC, Wise RA. Paradoxical physical findings described by Kussmaul: pulsus
paradoxus and Kussmaul’s sign. Lancet. 2002 Jun 1;359(9321):1940-2.
5. Fenili R, Alcacer JA, Cardona MC. Traumatismo Torácico: Uma Breve Revisão. Arq.
Catarin Med, 2002; 31.
. Karatolios K, Maischi B. Die Perikardpunktion. Dtsch med Wochenschr, 2007. 132(33):
1707-1710
7. Maggiolini S, De Carlini CC, Imazio M. Evolution of the pericardiocentesis technique. J
Cardiovasc Med (Hagerstown). 2018 Jun;19(6):267-273.
. Meredith, JW; Hoth, JJ. (2007). Thoracic Trauma: When and How to Intervene. Surg
Clin N Am, 2007.
9. Sinnaeve PR, Adriaenssens T. A contemporary look at pericardiocentesis. Trends
Cardiovasc Med. 2019 Oct;29(7):375-383.

CRÉDITOS DAS IMAGENS


1. Leonard J. What to know abou cardiac tamponade. Medical News Today. [acesso em
2020 mar. 2].
2. Torres M. Derrame Pericárdico Diagnóstico. As Doenças Cardíacas, 2013. [acesso em
2020 mar. 2].
3. Nickson C. Pericardiocentesis. Life in the Fastlane, 2019. [acesso em 2020 mar. 2].
Parte 3 | Capítulo 38

Intubação orotraqueal
Autora: Tamires Guimarães Cavalcante Carlos de Carvalho
Cuautora: Dra. Alessandra Muoio

1. Como era e como é


A primeira intubação traqueal com sucesso em humanos
submetidos a anestesia é atribuída à Trendelenburg por volta dos
anos 1870. Ele projetou um tubo acoplado a uma bolsa inflável na
parte distal, o que possibilitava a vedação da via aérea quando
introduzida por meio de uma traqueostomia. O posterior
desenvolvimento do laringoscópio com diferentes tipos de lâminas
possibilitou a colocação do tubo sem a traqueostomia. A primeira
laringoscopia direta foi descrita no ano de 1895 por Kirsten.
Atualmente, dispomos de diversos modelos e tamanhos de
instrumentos para intubação. A disponibilidade de novos – e cada
vez mais eficientes – dispositivos de intubação endotraqueal fez
com que esse procedimento se popularizasse. Ele é comum nas
unidades de emergência, cuidados intensivos e centros cirúrgicos. O
manuseio das vias aéreas é, hoje em dia, a habilidade mais essencial
na medicina de emergência.

2. Introdução
A intubação endotraqueal é subdividida em orotraqueal e
nasotraqueal.
A intubação nasotraqueal às cegas, procedimento menos
empregado na prática, requer um paciente alerta e colaborativo. A
técnica a ser aplicada nesse procedimento acompanha o fluxo de ar.
É
É mais frequentemente utilizado para induzir a anestesia em
cirurgias na região da cabeça e do pescoço.
Neste capítulo abordaremos a intubação orotraqueal por ser mais
comumente utilizada na medicina de emergência.
A intubação orotraqueal é classificada como uma via aérea
artificial definitiva e cumpre papel importante na prática médica.
Considerações anatômicas
A laringoscopia ideal depende de uma orientação espacial em
relação às estruturas anatômicas do paciente.
Figura 1: Via aérea superior

Fonte: Kovacs.4

Figura 2: A abertura laríngea: parte fundamental da técnica de


intubação orotraqueal. Ela é vista na laringoscopia direta.
Crédito: Adaptado de PocketDentistry.

A epiglote deve ser ativamente procurada pelo laringoscopista,


como um guia para a abertura glótica. O alvo dessa parte do
processo de intubação é passar o tubo por entre as pregas vocais,
na rima glótica.

3.1. Indicações
• Apneia

• Proteção de vias aéreas (vômitos e sangramento)

• Condição que pode cursar com obstrução de vias aéreas


(anafilaxia, infecções e queimadura de vias aéreas)
• Necessidade de assistência ventilatória prolongada ou
controle da ventilação pulmonar

• Trauma cranioencefálico

• Glasgow < 8

• Incapacidade de manter oxigenação com máscara

3.2. Equipamento
• Bolsa e máscara de ventilação
• Fixador de tubo
• Estetoscópio
• Fonte de oxigênio
• Aspirador, cateteres de aspiração
• Conjunto de laringoscópio
• Tubos orotraqueais (dispor sempre de tubos com números
maiores e menores do que o esperado)

• Estilete-guia

• Seringa de 10ml

• Lidocaína
• Midazolam

• Fentanil

• Bloqueador neuromuscular

• Cardioversor

• Oxímetro

• Extra: equipamento para acesso alternativo a via aérea:


ventilação translaríngea, cricotireoidostomia, máscara
laríngea, combitube
Figura 3: Equipamento para intubação orotraqueal.

Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas

3.3. Técnica
7Ps:
1. Preparação: checar materiais
2. Pré-oxigenação: após avaliar saturação
3. Pré-tratamento: pelo menos 3 minutos antes da intubação
4. Paralisia e indução: com sedativos e bloqueadores
neuromusculares
5. Proteção e posição
6. Passar o tubo
7. Pós-tubo: checar posicionamento
Figura 4: Posicionamento do paciente.

Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas.

• Posicionamento do paciente.
• Posicionar se possível o paciente em decúbito dorsal.
• Posicionar-se atrás da cabeça da vítima.
• Solicitar a auxiliar que estabilize a cabeça e pescoço do
paciente nos casos com suspeita de trauma cervical.
Figura 5: Demonstração dos eixos oral, faríngeo e traqueal e seus
alinhamentos em um posicionamento adequado.

Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas.

Figura 6: Demonstração da posição do farejador.

Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas.

3.3.1. Posição do farejador


Para se obter esta posição a coluna cervical é fletida em direção
anterior (ventral), com a elevação da cabeça em aproximadamente 8-
10 cm com auxílio de um suporte firme; ao mesmo tempo em que a
cabeça é estendida (dorsiflexão).
Manter o paciente na posição do farejador nos casos sem suspeita
de trauma de cervical.
Figura 7: Demonstração da oxigenação

Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas.

• Pré-oxigenação do paciente consciente


• Pré-oxigenar espontaneamente (com bolsa e máscara) os
pacientes conscientes

• Efetuar a monitorização com oxímetro de pulso, cardioscópio


e pressão

• Não invasiva
• Obter se possível acesso venoso periférico antes do
procedimento. Sedar o paciente com midazolam 5 a 15mg por
via intravenosa associado se necessário a fentanil na dose de
50 a 150 μg
Avaliar necessidade de bloqueador neuromuscular de ação
rápida.
Testar o equipamento a ser utilizado.
Figura 8: Pré-oxigenação com ambu.
Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas.

• Pré-oxigenação do paciente inconsciente


• Pré-oxigenar artificialmente (com ambu e reservatório) nos
casos de inconsciência ou sedação
Figura 9: Laringoscopia

Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas.

3.3.2. Laringoscopia
O propósito da laringoscopia é facilitar a intubação orotraqueal
sob visão direta.
Realizar a laringoscopia de forma tranquila, de preferência na
posição do farejador, deslocando a lâmina do laringoscópio em
direção caudal com relação ao paciente (seta). Evitar o movimento
de báscula com a lâmina, pois há o risco de trauma em dentes
incisivos superiores.
Figura 10: Introdução da lâmina do laringoscópio

Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas.

• Técnica de introdução da lâmina do laringoscópio


• Introduzir a lâmina do laringoscópio acima do lábio inferior,
afastando a língua lateralmente para visualizar a epiglote
(seta)
Figura 11: Visualização das cordas vocais
Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas.

• Visualização das cordas vocais


• Avançar com a lâmina do laringoscópio em direção caudal,
deslocar a epiglote para visualizar as cordas vocais
Figura 12: Anatomia da visualização das cordas vocais

A epiglote deve ser deslocada para que as cordas vocais sejam


bem visualizadas. O movimento do laringoscópio deve ser realizado
em direção superior e caudal.

Figura 13: Introdução do tubo orotraqueal


Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas

• Introdução do tubo orotraqueal


• Introduzir o estilete-guia (mandril) no tubo. Posicionar o tubo
orotraqueal para introdução

• Escolher entre as lâminas curva ou reta de acordo com sua


experiência

• Visualizar as estruturas e introduzir o tubo dois centímetros


entre as cordas vocais
Figura 14: Posicionamento do tubo orotraqueal

Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas


• Posicionamento do tubo orotraqueal
• Avançar o tubo orotraqueal até 22 cm (ponto de inserção do
balonete)
Figura 15: Retirada do mandril

Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas

Figura 16: Ausculta pulmonar

Fonte: Protocolos das unidades de pronto atendimento 24 horas.

3.3.3. Avaliação do posicionamento do tubo orotraqueal.


Verificar a posição do tubo, através de ausculta bilateral do tórax,
do epigástrio e da capnografia. Insuflar o balonete com cinco a dez
mililitros de ar. Fixar o tubo em posição.
Radiografar para verificar se a posição do tubo encontra-se a mais
de 2cm da carina.

3.3.4. Lembretes
Observar que a luz da lâmpada do laringoscópio deve estar de cor
branca, a luz amarela indica bateria fraca.
Ao introduzir o laringoscópio, escolher a lâmina com as
dimensões adequadas ao paciente. Lembrar que é possível utilizar
uma lâmina grande para intubar um paciente pequeno, mas o inverso
não é verdadeiro.
A manobra não deve durar mais do que trinta segundos.
Ventilar o paciente por trinta segundos antes da próxima tentativa
no caso de insucesso.

3.3.5. Reconhecimento da via aérea difícil


Segundo a Sociedade Americana de Anestesiologia, via aérea
difícil é uma situação clínica em que um anestesista
convencionalmente treinado apresenta dificuldades em aplicar a
ventilação com máscara facial, dificuldade para intubação traqueal,
ou ambos.
A via aérea difícil pode ser em decorrência de diversos fatores
como: paciente, cenário clínico e habilidade de quem realiza o
procedimento.
Dentre os fatores relacionados ao paciente, existem sinais
clínicos que auxiliam a estimar a dificuldade da intubação
orotraqueal. Entre eles podemos citar alguns: leão cervical, artrite
avançada em região cervical, trauma maxilofacial, abertura da boca
limitada, obesidade, variações anatômicas (comprimento do
pescoço, retro ou prognatismo). Qualquer obstrução de via aérea
representa um desafio imediato. Todos os doentes com mecanismo
de trauma fechado necessitam de imobilização da coluna cervical
com colar cervical, o que dificulta a obtenção de uma via aérea
definitiva.
Na tentativa de predizer a dificuldade de realizar a intubação,
utilizamos alguns escores.

• Escore de Mallampati
É baseado no quanto pode ser visualizado ao externalizar a língua
do paciente.

Fonte: ATLS.5

1) Visão do palato mole, pilares tonsilares e úvula totalmente


visíveis.
2) Visão do palato mole e úvula.
3) Visão do palato mole e base da úvula.
4) Palato mole não é visualizado. Somente o palato duro é
visualizado.
Pacientes com grau III e IV apresentam maiores riscos de
apresentar dificuldades na intubação orotraqueal.

• Escore POGO
É utilizado para descrever a abertura glótica a ser visualizada na
laringoscopia.
Fonte: Kovacs.4

• Método LEMON
O método mnemônico LEMON pode auxiliar na avaliação de uma
potencial via aérea difícil. Vários componentes do LEMON são úteis
no doente traumatizado.

Fonte: ATLS.5

3.3.6. Protocolo de decisão em via aérea


Esse algoritmo aplica-se apenas a doentes que estão com
insuficiência respiratória aguda ou em apneia, que necessitam de
uma via aérea imediatamente e aqueles com suspeita de lesão da
coluna cervical pelo mecanismo de trauma ou pelo exame físico.
A principal prioridade deve ser garantir o fornecimento de oxigênio
enquanto se mantém a coluna cervical alinhada.
Fonte: ATLS.5

3.3.7. Complicações Possíveis

• Broncoaspiração (vômitos)

• Intubação esofágica

• Intubação seletiva, colapso pulmonar e pneumotórax.


• Laceração de partes moles das vias aéreas.

• Lesão da coluna cervical por movimentação da cabeça


durante o procedimento

• Luxação da mandíbula

• Fratura ou arrancamento de dentes

• Ruptura ou vazamento do balonete do tubo

• Trauma de via aérea, hemorragia e aspiração

Referências
1. Kirstein A. Autoskopie des larynx und der trachea. Berlin Klinische Wochenschrift 1895;
32: 476-8.
2. Dunn PF, Goulet RL. Endotracheal tubes and airway appliances. Intern Anesth Clin.
2000; 38: 65-94.
3. [...]
4. Kovacs G, Law JA. Airway Interventions and Management in Emergencies: The infinity
Edition. A Free Open Access Living Textbook.
5. Comitê de Trauma do Colégio Americano de Cirurgiões. Advanced Trauma Life Suport
(ATLS). 9. ed. 2014.
. Matsumoto T, Carvalho WB. Intubação orotraqueal. Jornal de Pediatria, 2007; 83(2).
7. Protocolos de procedimentos das unidades de pronto atendimento 24 horas, Fernando
Suarez Alvarez et al, 2010
. J Pediatr (Rio J). 2007;83(2 Supl):S83-90, Toshio Matsumoto, Werther Brunow de
Carvalho
Parte 3 | Capítulo 39

Cricotireoidostomia
Autor: Victor Costa Monteiro
Orientador: Dr. Gustavo Nader Guidoux

1. INTRODUÇÃO
A cricotireoidostomia é um procedimento cirúrgico usado para
ventilar o paciente em situações de emergência. Consiste em uma
incisão feita através da pele e da membrana cricotireóidea até que a
via aérea esteja pérvia. O orifício comunica a luz traqueal ao meio
externo, permitindo a ventilação. Essa técnica deve ser empregada
apenas temporariamente, devendo ser substituída pela
traqueostomia convencional assim que possível.
É um procedimento responsável por salvar inúmeras vidas, sendo
que seu sucesso está ligado diretamente à técnica cirúrgica correta,
à disponibilidade do material necessário, à indicação adequada e
aos cuidados para que se minimizem as possíveis complicações.

2. BASES ANATÔMICAS
O pescoço contém inúmeras estruturas vitais localizadas dentro
de um pequeno espaço. Para se evitar acidentes e fazer um
procedimento adequado é necessário conhecer bem a anatomia
cervical. Algumas estruturas, em especial, merecem destaque
quando se trata de um procedimento de cricotireoidostomia, sendo
que o conhecimento delas é essencial para uma boa técnica. As
estruturas são: cartilagem tireóidea, cartilagem cricoide, membrana
cricotireóidea, artéria e veia cricotireóidea.
A membrana cricotireóidea, um dos componentes da anatomia
cervical interna, está entre a cartilagem tireóidea e a cartilagem
cricoide. A artéria e veia cricotireóidea estão na margem superior da
membrana cricotireóidea e podem sofrer lesões durante a
cricotireoidostomia. Por isso é importante conhecer as principais
estruturas anatômicas do pescoço.
Figura 1: Anatomia cervical interna demonstrando a membrana
cricotireóidea entre a tireóide e a cartilagem cricóidea.

Fonte: Debkowska MP, Butterworth JF, Moore JE, Kang S, Appelbaum


EN, Zuelzer WA.3

3. INDICAÇÕES
A cricotireoidostomia, como já citado, tem boa indicação em
situações de emergência. As principais indicações são: quando o
paciente não estiver intubado, quando não for possível a realização
de intubação orotraqueal ou nasotraqueal e quando não se dispuser
de instrumental e material necessário para intubação.
Outras indicações são: obstrução de via aérea próxima à
subglote, trauma oral ou maxilofacial, trauma de coluna cervical,
hemorragia oral profusa, êmese copiosa e algumas anormalidades
anatômicas.

4. CONTRAINDICAÇÕES
As contraindicações incluem: incapacidade de identificação dos
marcos de superfície no pescoço; obstrução de vias aéreas
distalmente à subglote, estenose traqueal ou transecção; câncer de
laringe, visto que a cricotireoidostomia pode espalhar as células
cancerígenas para os tecidos do pescoço e coagulopatias, exceto
em casos extremamente necessários.
Outras contraindicações relativas incluem cirurgia traqueal
possível ou conhecida, laringe fraturada, ruptura laringotraqueal e
crianças. Pacientes com doença laríngea aguda podem ter uma taxa
mais alta de estenose subglótica, tornando a cricotireoidostomia
eletiva relativamente contraindicada. Ela também é uma
contraindicação relativa em crianças com menos de 5 anos devido
ao formato do funil das vias aéreas pediátricas e a um risco
aumentado de estenose subglótica.

5. PRÉ-OPERATÓRIO

Visto que a cricotireoidostomia é um procedimento cirúrgico


estéril, é necessário que se faça toda a técnica de lavagem de
mãos e paramentação cirúrgica. É necessária a utilização de luva
estéril, avental estéril, gorro estéril, máscara e óculos de proteção.

6. MATERIAIS UTILIZADOS

O kit necessário para se realizar uma cricotireoidostomia inclui:


antisséptico, bisturi, pinça hemostática curva, tubo endotraqueal
de pequeno calibre e uma seringa de 10mL.

Figura 2: kit essencial para uma cricotireoidostomia.


Fonte: Debkowska MP, Butterworth JF, Moore JE, Kang S, Appelbaum
EN, Zuelzer WA.4

7. TÉCNICA CIRÚRGICA
I – Posicione o paciente em decúbito dorsal com hiperextensão
do pescoço e elevação do tronco, expondo a traqueia anterior.
II – Faça antissepsia da região cervical anterior.
III – Faça anestesia local com lidocaína a 1% caso o paciente
esteja consciente.
IV – Palpe a cartilagem tireóidea (primeira proeminência de cima
para baixo), a cartilagem cricoide (segunda proeminência após a
cartilagem tireóidea) e a membrana cricotireóidea que se localiza
entre a cartilagem tireóidea e cricoide.
Figura 3: Topografia do pescoço demonstrando os principais pontos
de referência usados para a realização de uma cricotireoidostomia.

Fonte: Debkowska MP, Butterworth JF, Moore JE, Kang S, Appelbaum


EN, Zuelzer WA.5

V – Faça uma incisão com a ponta do bisturi e por um único


movimento na pele, tela subcutânea e membrana cricotireóidea,
expondo a luz traqueal. Se o operador não tiver certeza da
localização da membrana cricotireóidea, uma agulha acoplada a
uma seringa cheia de solução salina pode ser inserida no local. Se
houver retorno de bolhas de ar por aspiração, isso confirmará a
localização da ponta da agulha nas vias aéreas.
VI – Dilate a abertura com a pinça hemostática curva.
VII – Introduza através do orifício o tubo endotraqueal de
pequeno calibre.
VIII – Confirme a colocação endotraqueal através do retorno de
CO2 expirado, aumento da saturação de O2, expansibilidade torácica
e ausculta pulmonar.
IX – Não solte o tubo endotraqueal até que ele esteja preso ao
pescoço.
X – Faça a fixação da cânula ao pescoço por meio de cadarços
ou fita adesiva.
Figura 4: Corte sagital do trato respiratório superior demonstrando a
localização de uma cricotireoidostomia e a relação com as
estruturas vitais circundantes.

Fonte: Fonte: Debkowska MP, Butterworth JF, Moore JE, Kang S,


Appelbaum EN, Zuelzer WA.6

8. COMPLICAÇÕES
A cricotireoidostomia de emergência é um passo dado para
salvar a vida do paciente. Portanto, é um procedimento onde os
benefícios superam os riscos. No entanto, não é um procedimento
livre de complicações. Dentre as principais, temos: hemorragias;
lacerações da cartilagem traqueal, tireóidea ou cricóidea; perfuração
da traqueia e a criação de um trato falso (passagem do tubo em um
espaço que não seja a traqueia).
Das complicações a longo prazo, as principais são estenose
subglótica e alterações vocais.

CONCLUSÃO
Em resumo, a cricotireoidostomia é um procedimento
extremamente importante, principalmente na emergência. Conhecer
a técnica adequada e saber realizar o procedimento pode ser o
diferencial na vida do paciente. Quando bem indicada a
cricotireoidostomia salva vidas. Conhecer as bases anatômicas é
crucial para uma boa técnica e para que se evite iatrogenias. No
entanto, o procedimento não está livre de complicações; é
necessário conhecê-las e saber identificá-las. A cricotireoidostomia
deve ser contraindicada quando necessário. Em suma, após a
realização de uma cricotireoidostomia é importante encaminhar o
paciente para uma posterior traqueostomia convencional.

REFERÊNCIAS
1. Mckenna P, Morley EI. Cricothyrotomy (Cricothyroidotomy). In: StatPearls [Internet].
StatPearls Publishing; 2019.
2. Monteiro ELC, et al. Técnica Cirúrgica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006.
3. Debkowska MP, Butterworth JF, Moore JE, Kang S, Appelbaum EN, Zuelzer WA. Acute
post-operative airway complications following anterior cervical spine surgery and the
role for cricothyrotomy. J Spine Surg. 2019 Mar.; 5(1): 142–154. doi:
10.21037/jss.2019.03.01 [acesso em 2020 jan. 30].
4. Debkowska MP, Butterworth JF, Moore JE, Kang S, Appelbaum EN, Zuelzer WA. Acute
post-operative airway complications following anterior cervical spine surgery and the
role for cricothyrotomy. J Spine Surg. 2019 Mar.; 5(1): 142–154. doi:
10.21037/jss.2019.03.01 [acesso em 2020 jan. 30].
5. Debkowska MP, Butterworth JF, Moore JE, Kang S, Appelbaum EN, Zuelzer WA. Acute
post-operative airway complications following anterior cervical spine surgery and the
role for cricothyrotomy. J Spine Surg. 2019 Mar.; 5(1): 142–154. doi:
10.21037/jss.2019.03.01 [acesso em 2020 jan. 30].
. Debkowska MP, Butterworth JF, Moore JE, Kang S, Appelbaum EN, Zuelzer WA. Acute
post-operative airway complications following anterior cervical spine surgery and the
role for cricothyrotomy. J Spine Surg. 2019 Mar.; 5(1): 142–154. doi:
10.21037/jss.2019.03.01 [acesso em 2020 jan. 30].
Parte 3 | Capítulo 40

Traqueostomia
Autoras: Larissa Miranda Rocha e Dra.Jackeline Ribeiro Oliveira
Guidoux

1. Introdução
A traqueia faz parte do trajeto para a condução do ar do meio
ambiente até os pulmões, compõe a via aérea inferior juntamente
com brônquios, bronquíolos e alvéolos. É um tubo fibrocartilaginoso,
tem aproximadamente 12 cm de comprimento no adulto e se
estende da cartilagem cricoide até a carina, onde se divide nos dois
brônquios principais. É composta por 18 a 22 anéis cartilaginosos
incompletos, em formato de ferradura, letra “C”, que sustentam sua
porção anterior. Enquanto sua porção posterior é constituída por
uma membrana fibromuscular. A mucosa é formada por epitélio
respiratório ciliar, importante para evitar que partículas,
microrganismos e outras substâncias cheguem aos pulmões. Além
disso, tem capacidade para umidificar e aquecer o ar.
A traqueostomia é um procedimento cirúrgico que tem o objetivo
de estabelecer uma comunicação da traqueia com o meio exterior
por meio da criação de uma abertura na região anterior do pescoço,
facilitando ou permitindo a ventilação do paciente. É considerado
um procedimento simples, mas extremamente importante e
responsável pelo salvamento de incontáveis vidas.
Fonte: Netter.1

1.1. Repercussões fisiológicas desfavoráveis


1. Ausência da umidificação e aquecimento do ar inspirado,
antes realizados pelas vias aéreas superiores
2. Ausência de fluxo aéreo para as cordas vocais, com
impedimento da fonação
3. Quebra da barreira antimicrobiana natural pela comunicação
com o exterior
4. Transtornos da deglutição provocados pela fixação
traqueocutânea

1.2. Principais indicações


A traqueostomia tem um objetivo principal de servir como uma
alternativa artificial para a passagem de ar em situações em que,
por vários motivos, a respiração normal fisiológica pode estar
comprometida ou possui risco de instabilidade. Dentro dessas
situações, existem diversas indicações, que vão desde eletivas,
preventivas, até as mais iminentes. Sua indicação, mais comum, no
entanto, trata-se da ventilação prolongada. A intubação
translaríngea, quando prolongada, pode lesar traqueia e laringe.
Recomenda-se que essa intubação seja convertida em
traqueostomia o mais rápido possível.
Quanto mais prologada a intubação, maior o índice de
complicações, ao favorecer o aparecimento de processos
inflamatórios, infecções locais e luxações.
Entre as principais indicações estão:
1. Obstrução de vias aéreas superiores
2. Suporte respiratório
3. Tosse ineficaz
4. Proteção da broncoaspiração
5. Apneia obstrutiva do sono

1.3. Contraindicações
Não há contraindicações absolutas. Algumas situações podem
dificultar o processo ou configurar-se como contraindicação relativa
dependendo do caso. São exemplos: Pescoço curto, bócios, massas
pulsáteis ou neoplasias na região da traqueostomia, infecções e
impossibilidade de estender a coluna cervical.

1.4. Eletiva, de urgência ou de emergência


A traqueostomia pode ser classificada como eletiva, de urgência
e de emergência. Considera-se eletiva quando o paciente já se
encontra com tubo orotraqueal ou nasotraqueal, ou que ainda não
apresenta insuficiência respiratória. Sempre que possível deve ser
realizada dessa forma, permitindo que a técnica seja realizada com
todos os preparos cirúrgicos e cuidados necessários, e evitando
complicações. A traqueostomia de urgência refere-se ao contexto
do paciente com insuficiência respiratória, leve ou moderada, mas
que ainda dispõe de tempo para o preparo pré-cirúrgico. Na situação
de emergência, o paciente está na eminência de uma parada
respiratória, e o acesso à via aérea deve ocorrer em minutos ou
segundos.

1.5. Avaliação pré-operatória


A traqueostomia é um procedimento considerado simples, mas
que não deve ser subestimado. O pré-operatório consiste na
avalição do paciente para identificar qualquer condição adversa que
possa gerar complicações. Essas condições devem ser, se possível,
corrigidas antes do procedimento. Como uma crise hipertensiva ou
um distúrbio de coagulação. Assim, fica bem evidente que o
procedimento realizado de forma eletiva garante uma segurança
muito maior. Em situações de emergência, não há tempo de
proceder com uma avaliação mais rigorosa.

1.6. Cânula traqueal


Antes do início do procedimento, é importante escolher a cânula
utilizada. Existem vários tipos – metálicas, plásticas,
confeccionadas de silicone ou Nylon. A escolha vai depender de
cada situação e das necessidades do paciente. Elas também variam
no calibre. Após a escolha do tipo de cânula, diversos calibres
devem ser colocados na mesa cirúrgica para ser escolhida somente
depois da exposição da traqueia.

1.7. Aspectos gerais da técnica


Sempre que possível deve ser realizada em ambiente de centro
cirúrgico. Em algumas situações, entretanto, devido a motivos como
instabilidade do paciente e ao maior risco de transporte intra-
hospitalar, tem sido realizada na unidade de terapia intensiva. Mas é
importante deixar claro que o ambiente deve garantir segurança
para possíveis situações de complicações. É muito recomendado
que antes da realização, o paciente seja intubado (se ainda não
estiver). Procedimento deve ocorrer com paciente em decúbito
dorsal e com hiperextensão do pescoço com auxílio de um coxim
subescapular. Deve ser realizada a antissepsia e colocação de
campos esterilizados. A anestesia pode ser local ou geral. Pelo
menor risco de repercussão sistêmica, tem sido feita com anestesia
local e sedação.

1.8. Técnica de traqueostomia convencional


1. Incisão longitudinal de pele e tela subcutânea. Na linha
mediana, entre a cartilagem cricoide e a fúrcula esternal. Numa
extensão de 3 a 4cm. A incisão também pode ser do tipo
transversal, dois dedos acima da fúrcula esternal
2. Hemostasia rigorosa, com atenção para as veias jugulares
anteriores
3. Abertura da rafe mediana com afastamento lateral dos
músculos pré-tireoidianos e exposição do istmo da glândula tireoide,
que poderá ser afastada caudal ou cranialmente
4. Exposição e abertura da traqueia seccionando-se três ou
quatro anéis a partir do segundo, após sua tração anterior com
pinça de Allis ou pequenos ganchos metálicos. Essa abertura deve
ser feita com bisturi próprio e deve ser suficiente para a passagem
da cânula
5. Introdução da cânula, com o mandril, na luz traqueal
6. Retirada do mandril, deixando-se a cânula
7. Insuflação do balão da cânula
8. Fechamento da pele e tela subcutânea com pontos
separados. A sutura não deve ser total, deixando um espaço em
torno da cânula para deixar escapar ar e evitar o enfisema
subcutâneo
9. Curativo simples na ferida cirúrgica com gazes estéreis
10. Fixação da cânula ao redor do pescoço por cadarços

1.9. Pós-operatório
O pós-operatório de uma traqueostomia é geralmente
acompanhado de pouca morbidade. Para isso, alguns cuidados
devem ser tomados. A monitorização após o procedimento é
extremamente importante, isso porque algumas de suas
complicações podem aparecer nas primeiras horas após a cirurgia.
Outras podem aparecer mais tardiamente. A ferida deve ser avaliada
e o curativo deve ser feito com gaze estéril e sendo trocado sempre
que necessário. A cânula deve ser trocada com periodicidade de
sete a dez dias. Atenção especial para a fixação da cânula, para
evitar saída inadvertida. A aspiração de secreções na traqueia pode
ser necessária, sua realização exige rigorosa sepsia e atenção para
evitar lesões. A retirada da cânula deve ocorrer quando o paciente já
for capaz de respirar normalmente por via fisiológica, quando a
traqueostomia não for mais necessária. A cânula deve ser retirada e
um curativo simples deve ser feito, que cicatrizará por segunda
intenção.

1.10. Complicações
A literatura descreve complicações da traqueostomia, desde
intra-operatórias até pós-operatórias ou tardias. O preparo pré-
cirúrgico e os cuidados pós-operatórios diminuem os riscos. As
principais complicações são hemorragia, enfisema subcutâneo e/ou
mediastinal, infecção, saída inadvertida da cânula, obstrução da
cânula, fístula traqueoesofágica e a estenose de traqueia. O
sangramento é pouco comum e geralmente fácil de ser controlado e
ocorre habitualmente nas primeiras horas após a cirurgia. Quando
presente, pode ser devido algum distúrbio de coagulação ou crise
hipertensiva. A infecção é sempre uma potencial complicação para
qualquer procedimento cirúrgico. Cuidados com a correta assepsia
e antissepsia, curativos frequentes e, em alguns casos, a
antibioticoterapia, contribuem para a não ocorrência de infecções. O
enfisema subcutâneo pode gerar grande desconforto e
preocupação. Ocorre mais frequentemente pelo fechamento
completo da ferida cirúrgica, o ar não encontrando saída para a
atmosfera, infiltra-se no interstício da tela subcutânea. Um sinal de
alerta para essa situação pode ser a crepitação à palpação. O
tratamento para o enfisema subcutâneo é conservador e ocorre com
a retirada dos pontos. A saída inadvertida da cânula é uma das
complicações mais sérias e que pode ser letal. A recolocação da
cânula pode ser extremamente trabalhosa, necessitando de
cirurgião experiente e instrumental adequado.
Conclusão
Trata-se de um procedimento importantíssimo, tendo seus
primeiros registros já na era antes de Cristo. Hoje, tem diversas
indicações, que vão desde situações de urgência até cuidados
preventivos complementares a outros procedimentos que possam
causar dificuldade respiratória. Apesar de ser um procedimento com
enorme benefício, deve ser realizado respeitando os cuidados com
ambiente e material necessário. Suas complicações, embora não
frequentes, podem levar a óbito. É importante destacar que a
traqueostomia de emergência, quando o paciente está prestes a ter
uma parada cardiorrespiratória, é pouco realizada e recomendada.
Deve ocorrer apenas em situações excepcionais e com cirurgião
preparado. Para as situações de emergência, é recomendada a
intubação orotraqueal ou nasotraqueal, ou ainda a
cricotireoidostomia. Sendo procedimentos mais rápidos e que
garantiram maior segurança nesse contexto em que as condutas
devem ser feitas em minutos. Assim, percebe-se que a realização da
traqueostomia, tanto eletivo como de urgência ou emergência, exige
conhecimento da técnica, e também dos parâmetros para sua
realização.

Referências
1. Netter FH. Atlas de anatomia humana. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015.
2. Goffi F S. Técnica cirúrgica: Bases anatômicas, fisiopatológicas e técnicas da cirurgia.
4. ed. São Paulo: Atheneu; 2007.
3. Marques RG. Técnica operatória e cirurgia experimental. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan; 2005.
4. Monteiro ELC, Santana EM. Técnica Cirúrgica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan;
2006.
5. Ricz HMA, Mello Filho FV, Freitas LCC, Mamede RCM. Traqueostomia. Medicina, Ribeirão
Preto, 2011; 44(1): 63-69.
Parte 3 | Capítulo 41

Técnica em sondagem nasogástrica e


nasoenteral
Autor: João Victor Maretti
Orientador: Dr. Fabio Goussain Labat
Coautora: Tamires Guimarães Cavalcante Carlos de Carvalho

1. INTRODUÇÃO
A sondagem do trato gastrointestinal, seja ela nasoenteral ou nasogástrica, é definida
como o ato de introduzir de uma sonda apropriada (Levine ou Dobbhoff) pela cavidade
nasal até o trato digestivo. É um procedimento que, como qualquer outro, tem suas
indicações, contraindicações e complicações, já abordadas no capítulo “Cuidados com
drenos e sondas”.

2. MATERIAIS NECESSÁRIOS
Para a sondagem do trato digestivo, os seguintes materiais são necessários:

• Sonda nasogástrica ou nasoenteral com fio-guia

• Pacote de gaze para lubrificar o dispositivo

• Xilocaína gel

• EPI e luvas de procedimento

• Seringa de 10 ou 20 mL

• Soro fisiológico 10 a 20 mL

• Esparadrapo

• Estetoscópio
3. TÉCNICA DE SONDAGEM
NASOGÁSTRICA E NASOENTERAL
• Inicialmente, explicar o procedimento ao paciente e realizá-lo conforme seu
consentimento. Após o consentimento inicial, separar materiais e iniciar
paramentação.

• Verificar o uso de próteses dentárias pelo paciente. Solicitar para que retire, caso
estas estejam presentes.

• Posicionar o paciente em decúbito dorsal, com a cabeceira elevada a 45º


(posição de Fowler).

• Testar as narinas, solicitando ao paciente que respire com maior intensidade, de


forma a identificar eventuais desvios ou obstruções. Escolher a melhor narina, ou
seja, a que ofereça melhor fluxo aéreo.

• Prosseguir com anestesia da narina com gel anestésico – em geral, xilocaína.

• Realizar marcação da sonda pela estimativa da distância do ápice do nariz ao


lóbulo da orelha e então até o apêndice xifoide do osso esterno. A marcação pode
seguir orientação da própria sonda ou, ainda, um esparadrapo identificador do
comprimento pode ser aplicado. Para a sondagem nasoenteral, o procedimento é
o mesmo, todavia no ato da marcação, a distância aferida deve ter acréscimo de
20 a 25 cm, considerando o biotipo do paciente, para que esta seja locada no
duodeno.

• Lubrificar a sonda em seu comprimento estimado com lidocaína gel. Lubrificar o


interior da sonda injetando 10 a 20 mL de soro fisiológico, para que o guia corra
sem resistência.

• Iniciar introdução da sonda pela narina escolhida até sentir resistência ou


sensação de engasgo pelo paciente.

• Neste momento, solicitar flexão da cabeça e movimentos de deglutição ao


paciente. Esse passo facilita a inserção da sonda e a deglutição faz com que a
epiglote proteja a traqueia e evite cateterização das vias aéreas (neste caso, o
paciente teria tosse, desconforto respiratório e rouquidão imediatamente – caso
ocorra, retirar imediatamente o dispositivo).

• Prosseguir introduzindo a sonda até sua marcação.


• Retirar o guia.

• Testar a posição do tubo pela ausculta na região epigástrica (ou mesogástrica no


caso da sondagem nasoenteral) após injetar ar na sonda com a seringa. A correta
locação se dá pela ausculta de um som semelhante a um sopro (borborigmo).

• Fixar o dispositivo na região nasal com esparadrapo, de forma a evitar que o tubo
dobre.

• Solicitar radiografia de abdome após o procedimento em todos os casos para


verificar posição da sonda. No caso da radiografia na sondagem nasoenteral, o
dispositivo estará locado no estômago imediatamente após a passagem. Uma
nova imagem deve ser obtida 3 a 4 horas após para verificar o posicionamento da
sonda no duodeno, tendo em vista tempo do movimento da ponta pesada com o
peristaltismo.

REFERÊNCIAS
1. Thomsen TW, Shaffer RW, Setnik GD. Videos in clinical medicine. Nasogastric intubation. N Engl J Med 2006;
354(17): e16.
2. Matsuba C. Acessos para Nutrição Parenteral e Enteral. In Baract EC, Bernardo WM. Programa de atualização
baseado em diretrizes da AMB (Prodiretrizes). Porto Alegre, RS: Artmed; 2013. v. 2, cap.3.
Parte 3 | Capítulo 42

Sondagem de alívio e demora


Autores: Ricardo Pagrion Neto e Dr. Octávio Henrique Arcos Campos

1. Introdução
O cateterismo vesical é um procedimento invasivo, realizado por agentes de saúde em
âmbito hospitalar buscando avaliar o débito urinário, aliviar obstruções que impeçam a
drenagem da urina pela bexiga. Os pacientes acamados, comatosos, que foram submetidos
a anestesia e até mesmo que necessitam de alívio em casos de hiperplasia prostática
benigna são submetidos a sondagem vesical, como entre outros casos.1
Sendo uma técnica essencial para a medicina moderna, deve-se sempre avaliar a sua
necessidade, pois quando implicada em momento inoportuno, pode trazer consequências
irreversíveis ao paciente.
As indicações podem são divididas de duas formas: diagnósticas ou terapêuticas, para
facilitar a compreensão. Sendo: retenção urinária aguda ou crônica, eliminação de resíduos
pós-miccionais, quantificar o débito urinário como dito acima, irrigação vesical para
hematúria macroscópica, dilatação uretral, coleta de urina para análise laboratorial,
mensuração de pressão intravesical e uretral em estudos urodinâmicos como em
incontinência urinária e terapias com BCG para marcação de câncer de bexiga.3

1.1. Tipo de cateteres vesicais


As funções dos cateteres foram mencionadas acima, mas basicamente ele realiza a
drenagem da urina do meio interno para o meio externo. Há cateteres específicos para cada
indicação, dependendo da idade, história prévia de cateterismo, gênero em relação ao
tamanho da uretra, o tipo de fluido a ser drenado. Eles podem apresentar várias pontas e
orifícios específicos, os mais conhecidos são apresentados a seguir.
Figura 1: Catéteres
Fonte: Crippa, et al.3

Os tamanhos dos cateteres são universalmente medidos em unidades French (Fr), sendo
que 1 Fr equivale a 0,33mm, sendo indicados para crianças até adultos, variando seu
tamanho. Assim, também há a convenção do tamanho do cateter em relação à sua cor.
Sendo: 8 Fr = Preto; 10 Fr = cinza; 12 Fr = branco; 14 Fr = verde claro; 16 Fr = laranja; 18 Fr =
vermelho; 20 Fr = amarelo; 22 Fr = azul escuro ou roxo; 24 Fr = azul claro; 26 Fr = rosa.
Em relação ao número de vias, existem de uma simples via, via dupla e três vias. O mais
utilizado de uma única via é o cateter de Nelaton (figura 1), conhecido como sonda de alívio
(figura 2), geralmente transparente com entrada azul, utilizado, como o próprio nome diz,
para a drenagem da bexiga, quando a micção voluntária não está presente, devendo ser
retirado após a conclusão do esvaziamento. Podem advir com um ou mais orifícios, mas
não possuem balão para fixação intravesical.
Já os cateteres de duas vias, sendo o mais utilizado é o cateter de Foley (figura 1),
conhecido como sonda de Foley, bastante utilizado na medicina, não só para drenagem
vesical. Possui duas vias, sendo uma com uma válvula que tem como função a insuflação
de um cuff, o qual é utilizado para manter a sonda intravesical, impedindo sua saída. A
segunda via, a maior, é utilizada para a drenagem do fluido (urina, sangue, soro entre outros),
que deve ser acoplado a um coletor (figura 2).
Já os cateteres de três vias possuem as duas vias citadas anteriormente, e uma via com
função de irrigação vesical, como em hematúrias, formações de coágulos, a fim de lavar a
bexiga diminuindo o tamanho dos coágulos, facilitando a drenagem do fluido. Mas também
pode ser utilizada para a introdução medicamentosa tópica (figura 2).
Figura 2: Sonda de Foley de 2 e 3 vias e sonda de alívio de única via
Fonte: Crippa, et al.3

Em relação ao tempo de permanência dos cateteres, devem ser levadas em conta


possíveis formações de biofilme, materiais que sejam alérgicos aos pacientes, se são mais
maleáveis ou não, se o paciente possui algum transtorno psíquico e há probabilidade de
houver a retirada da sonda com o cuff inflado, podendo causar inúmeras lesões vesicais e
uretrais. O tempo de permanência, mesmo que prolongado, deve ser o menor possível,
cabendo ao profissional de saúde buscar a causa da necessidade da sondagem e que a
solucione.

2. Técnica de sondagem
Normalmente quando não há histórico prévio de sondagem, ou histórico de patologias
urológicas, inicia-se com uma sonda 16 Fr (laranja) em um adulto, não é regra, mas o mais
comum. Todos os instrumentos devem estar preparados, de fácil acesso, e todo o
procedimento deve ser asséptico. O médico deve estar posicionado lateralmente ao
paciente, sendo o lado o mesmo da sua mão dominante, para que o manuseio da sonda seja
mais eficiente. A técnica difere entre homens e mulheres, visto o tamanho da uretra.
Em relação à sondagem masculina, após a assepsia da região genital, desde a exposição
do prepúcio, escroto, glande até a sínfise púbica. Antes da inserção da sonda, deve-se
utilizar de anestésico local, a fim de não causar dor e desconforto ao paciente. A mais
utilizada é lidocaína 2%, devendo ser instilada 1ml por segundo. O volume de anestésico
administrado deve corresponder ao tamanho da uretra, geralmente no gênero masculino é
de 20ml, devendo o médico esperar ao menos 15 minutos para que possa ter efeito.2
Quando administrado de forma rápida, pode trazer complicações ao paciente e dificuldade
para o agente de saúde introduzir a sonda, podendo ocasionar sangramentos por distensão
das paredes uretrais. Após a ação anestésica, o médico deve içar o pênis com a mão não
dominante a 90 graus e introduzir a sonda entre 7-12cm, devendo horizontalizar o pênis para
que não haja obstrução pela curvatura da uretra bulbar, e introduzir a sonda até sua
bifurcação, assim vai ocorrer a drenagem ativa, sendo o momento para inflar o balão da
segunda via (via menor, com válvula), para que haja a fixação intravesical. Assim, a sonda
deve ser fixada no abdome ou na coxa, e reavaliar se há potencial para lesões iatrogênicas.
Em relação à sondagem feminina, deve ser realizada a assepsia do introito vaginal, lábios
maiores e menores, como clitóris e meato uretral que está localizado abaixo do clitóris (1-
2cm), as duas regiões inguinais. A posição difere no sentido que a mulher deve estar em
‘’frog-leg’’, ou seja, pernas posicionadas em flexão e abdução. A uretra feminina é muito
menor que a do homem, visto que mede de 3-5cm, sendo que a quantidade de anestésico
deve ser menor, entre 5-10ml. Os lábios menores devem ser afastados com a mão não
dominante e a sonda introduzida no meato uretral até a metade, não sendo necessária até a
bifurcação, assim que ocorrer a drenagem ativa de urina, o balão deverá ser insuflado.3

3. Complicações
Sempre se atentar a quadros de parafimose, quando ocorre o edema do prepúcio e este
não consegue voltar à posição original, sempre devendo ser retraído à posição normal após
o término do procedimento. A infecção dos cateteres é uma causa comum, devendo só ser
tratada quando assintomática, visto que bacteriúria assintomática, só é tratada em certos
casos como em gestantes e pacientes que serão submetidos a manipulação do trato
urinário.4 A presença prolongada da sonda pode causar uma inflamação crônica, levando a
um aumento da parede da uretra, espessando-a, o que é conhecido como estenose uretral e
trará inúmeras complicações ao paciente, até mesmo a obstrução de via baixa urinária, ou
seja, a tentativa de sanar um problema vesical pode resultar em uma iatrogenia. Pode
ocorrer a incapacidade de desinsuflar o balão no momento da retirada da sonda, podendo
ser utilizado algumas técnicas, como: introdução de um fio guia na via do balão (mas pode
causar lesão vesical), uretrocistoscopia, punção suprapúbica e injeção de éter sulfúrico 2-
3ml na via do balão.

Conclusão
Deter o conhecimento da técnica de sondagem vesical de alívio e demora, e os tipos de
sondas e suas indicações, cabe a todos os médicos independente da sua área de escolha e
é preconizado que os alunos de medicina concluam seus cursos sabendo tanto a parte
teórica quanto a prática, para que assim diminua os índices de complicações que muitas
das vezes são irreversíveis e trazem novos eventos adversos aos pacientes.

Referências
1. Vieira FA. Ações de enfermagem para prevenção de infecção do trato urinário relacionada ao cateter vesical de
demora. Einstein (São Paulo). 2009; 7(3): 372-375.
2. Tailly T, Denstedt JD. Fundamentals of urinary tract drainage. In: Wein AJ, et al. Campbell-Walsh urology. 11th
edition review. Philadelphia: Saunders; 2015. Cap. 6, p. 119-135.
3. Crippa AS, Dip Júnior NG., organizadores. Urologia para graduação. São Paulo: Universidade Nove de Julho –
UNINOVE; 2018.
4. Stamm AMNF, Coutinho MSSA. Infecção do trato urinário relacionada ao cateter vesical de demora: incidência e
fatores de risco. Revista da Associação Médica Brasileira. 1999; 45(1): p. 27-33.
Parte 3 | Capítulo 43

Cistostomia
Autor: Ricardo Pagrion Neto
Orientador: Dr. Octávio Henrique Arcos Campos

1.Introdução
No século XIX, apesar de muito temido, foi proposto o acesso à bexiga por via
suprapúbica. A cistostomia é o procedimento realizado por médicos especializados para
realizar o acesso à bexiga urinária, localizado na pelve, sendo acessada pelo hipogastro e
inserido um catéter para derivação urinária. Assim, tornou-se uma cirurgia que cria um
trajeto alternativo para a saída da urina.
A cistostomia é indicada quando há obstrução de colo vesical, trauma vesical e uretral,
pós-uretroplastia, pós-cistoplastia, estenose de uretra ou qualquer condição que impeça a
saída de urina pela via uretral. Vale ressaltar que a cistostomia é reservada como última
opção em casos de retenção urinária aguda. Antes dela, lançamos mão da sondagem
vesical. Caso não seja possível, idealmente um profissional capacitado (urologista) realiza a
sondagem por meio de cistoscopia no centro cirúrgico. Se não houver disponibilidade do
urologista ou material, aí sim, em último caso, utilizamos a cistostomia.

A cistostomia, atualmente, possui duas técnicas de acesso à bexiga:


1. Cistostomia aberta ou a céu aberto:
A técnica a céu aberto é contraindicada quando o paciente possui câncer de bexiga,
visto que ocorre a perfuração da parede anterior da bexiga, poderá disseminar células
neoplásicas ou formação de fístula vesicocutânea.
2. Técnica cirúrgica:

• Deve-se preconizar a utilização da anestesia, dependendo das condições clínicas


do paciente, de escolha do próprio cirurgião, após avaliação do paciente, podendo
ser desde raquimedular até local.

• Assepsia do paciente como a colocação de campos cirúrgicos sobre a região


suprapúbica/hipogástrica

• A incisão fica a gosto do cirurgião, Pfannenstiel (figura 1)3 podendo ser mediana
inferior (figura 2), como na imagem abaixo. Uma incisão de 2-4 cm é suficiente, na
maioria dos casos para acessar a bexiga.
Figura 1: Pfannenstiel
Fonte: Russell.2

Figura 2: Incisão mediana inferior

Fonte: Cologna.1

• Deve-se abrir a aponeurose do músculo reto anterior, que está na linha mediana, e
separar o músculo piramidal, em seguida abertura da fáscia perivesical, podendo
ser visualizada a parede anterior da bexiga, que na ausência de patologias possui a
coloração rósea pálida, na presença de dúvida da localização do órgão, pode-se
utilizar uma agulha fina com seringa para aspirar conteúdo contido dentro, assim,
se vier urina, poderá certificar que é o local correto.1
Figura 3: Bexiga urinária do trato masculino e feminino

Fonte: (ACESSABER, 2019)

• Realiza-se a manobra de Guyon, que é consiste no deslocamento da gordura


perivesical e pré-peritoneal, empurrando-a em sentido cranial com uma gaze, por
exemplo.

• Passagem de dois fios simetricamente à esquerda e a direita da linha mediana,


passando apenas pela parede vesical anterior, para que na hora da incisão a lâmina
perfure apenas a parede anterior (figura 4).
Figura 4: Método da passagem do fio na parede anterior da bexiga
Fonte: Cologna.1

• Então é realizada a incisão com o bisturi podendo ser vertical ou horizontal, de


1cm, que é suficiente para a passagem do cateter.

• Introduz o cateter pelo orifício recém-realizado, isso mantendo a contração dos


fios superiormente.

• É realizada uma sutura em bolsa, para fazer com que o cateter fique fixado dentro
da bexiga e que impeça a saída de urina (figura 5).
Figura 5: Realização da sutura em bolsa
Fonte: Cologna.1

• Caso a cistostomia for perdurar por longo período a parede anterior da bexiga
pode ser fixada a parede abdominal por meio de fios de tração através da bainha do
reto abdominal, facilitando a troca de cateteres (figura 6).
Figura 6: Inserção da sonda no interior da bexiga
Fonte: Cologna.1

• O fechamento da aponeurose do músculo reto anterior, pode ser realizada com fios
absorvíveis, e que o cateter e a sua fixação na pele fique o mais retilíneo possível
para facilitar se houver a troca. Então o cateter é fixado a pele, sendo a pele
suturada com fio inabsorvível, e é realizado o curativo.
Possíveis complicações: Infecção da ferida pós operatória, extravasamento urinário tanto
para o subcutâneo, quando para o extracutâneo, infecções urinárias, entre outras.

3. Cistostomia por punção suprapúbica


A cistostomia por punção, é realizada com a introdução de um trocarte que é um cateter
de rápida drenagem. As indicações são as mesmas que a técnica a céu aberto, sendo que a
por punção pode ser realizada no leito, com anestesia local e de maneira mais rápida.

• Os primeiros passos são iguais ao da técnica passada, como assepsia, introdução


do campo e anestesia, só que punção suprapúbica preconiza-se a incisão mediana
inferior, de 0,5cm-1cm.

• Ocorre a introdução do trocarte até o mesmo se encontrar no interior da bexiga


(facilitado quando a bexiga está repleta de urina). Então é retirada a parte central do
trocar (ponteira) e introduzido o cateter pelo meio da bainha que já se encontra
dentro da bexiga, assim é retirado a bainha do trocater, deixando o cateter
introduzido (semelhante à técnica de Seldinger para acesso venoso central) (figura
7). Fixa o cateter com um fio monofilamentar a pele.
Figura 6: Introdução do trocater

Fonte: Cologna.1

As complicações são análogas às da técnica de céu aberto, porém ainda há risco de


perfuração de vísceras como o intestino.1

Conclusão
As técnicas de cistostomia devem ser realizadas por médicos, de preferência médicos-
cirurgiões, os quais dominam a anatomia da pelve e sistema genitourinário, pois a técnica
quando realizada de forma inadequada pode trazer graves consequências ao paciente,
desde a infecção do trato urinário, como a disseminação de células cancerígenas. Sempre
avaliar se é realmente necessário a prática da derivação vesical, buscando agir rapidamente,
mas com êxito.
Este capítulo buscou resumir, de forma simples porém instrutiva, o método da
cistostomia, com uma linguagem acessível a estudantes de medicina, e até mesmo a
residentes e especialistas.
Referências
1. Cologna AJ. Cistostomia. Medicina. Ribeirão Preto, 2011; 44(1): 57-62.
2. Russell J, Nauta MD. Surgical Pitfalls, General Laparotomy. 2009. Elsevier Health Sciences. Philadelphia
3. Rocha LS, Antunes CF, Antunes LD, Rodrigues AP, Cardoso SM, Machado NC. Aspectos ético-legais e técnicos do
procedimento de cateterismo vesical supra púbico pelo enfermeiro. 6º Congresso Internacional em Saúde, n. 6,
2019.
4. Teixeira A, Teixeira TMC. Temas de Técnica Cirúrgica. Anais da Faculdade de Medicina de Porto Alegre. 33: 49-
76.
Table of Contents
Capa
Rosto
Créditos
Sumário
Agradecimentos
Apresentação
Autores Coordenadores
Parte 1: Princípios Básicos da Cirurgia Geral
1. Cirurgia segura
2. Nomenclatura cirúrgica
3. Ambiente cirúrgico e seus profissionais
4. Resposta Endócrina, Metabólica e Imunológica ao Trauma
(REMIT)
5. Distúrbios hidroeletrolíticos e ácido-base
6. Nutrição em cirurgia
7. Cicatrização de Feridas
8. Cuidados pré-operatórios e risco cirúrgico
9. Antibioticoprofilaxia e antibioticoterapia em cirurgia
10. Complicações das feridas operatórias
11. Cuidados com drenos e sondas
Parte 2: Principais Temas Teóricos da Cirurgia Geral
12. Abdome agudo
13. Hérnias da parede abdominal
14. Afecções da vesícula e via biliar
15. Neoplasias colônicas malignas
16. Neoplasias gástricas benignas e malignas
17. Tumores e abscessos hepáticos
18. Doenças diverticular dos cólons
19. Pancreatite aguda e crônica
20. Doenças inflamatórias intestinais
21. Apendicite aguda
22. Tumores pancr2eáticos e neuroendócrinos
23. Doença do refluxo gastroesofágico
24. Câncer de Esôfago
25. Doença ulcerosa péptica
26. Nódulos tireoidianos
Parte 3: Procedimentos Básicos da Cirurgia Geral na Prática
27. Os anestésicos locais
28. Agulhas e fios
29. Nós e suturas
30. Punção venosa periférica e central
31. Procedimento de pressão arterial invasiva (PAI)
32. Acesso intraósseo
33. Paracentese
34. Punção lombar
35. Toracocentese
36. Drenagem torácica
37. Pericardiocentese
38. Intubação orotraqueal
39. Cricotireoidostomia
40. Traqueostomia
41. Técnica em sondagem nasogástrica e nasoenteral
42. Sondagem de alívio e demora
43. Cistostomia

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