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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA

PGR- MANIFESTAÇÃO -266963/2020 MPF/VCPGR/HJ


RECLAMAÇÃO Nº 41.910

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RECLAMANTE Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro
RECLAMADO Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
RELATOR Min. Gilmar Mendes

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Egrégio Supremo Tribunal Federal,

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PARECER
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Reclamação constitucional. Tipos. Cabimento.


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Há dois tipos de reclamação constitucional para o Supremo Tribunal Federal:


a subjetiva (de parte) e a objetiva (de não parte).
7/0 5.7

A pretensão deduzida na presente reclamação constitucional abrange, em si, os


dois tipos: é objetiva (violação aos julgamentos proferidos pelo plenário do
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Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2797 e


na Questão de Ordem na Ação Penal n. 937) e é subjetiva (afronta à decisão
monocrática da Reclamação n. 32.989).
Em por

Quanto à reclamação objetiva – violação ao julgamento da ADIn 2.797 – não


restou comprovado que a decisão recorrida revigorou seja o enunciado da
Súmula n. 394 do Supremo Tribunal Federal, seja a lei n. 10.628, de 2002,
sso

partes integrantes do dispositivo do acórdão.


Quanto à reclamação objetiva – violação ao julgamento da AP 937 (QO) – em
razão de ofensa à autoridade de julgado, não é consentido seu manejo, pois a
pre

decisão proferida é desprovida de efeito vinculante.


Quanto à reclamação subjetiva – violação à decisão monocrática da Rcl 32.989
Im

– em razão de afronta a julgado do Supremo Tribunal Federal, não houve


determinação expressa sobre qual seria o órgão competente para julgamento;
mas sim se consignou que a competência do Supremo Tribunal Federal não
estaria aberta para o julgamento daquela reclamação.
A reclamação constitucional não pode ser usada para alcançar entendimento
inédito no âmbito da jurisdição originária do Supremo Tribunal Federal sob
pena de desvirtuar tanto a sua natureza quanto a competência de direito estrito
do próprio Supremo Tribunal Federal (CF/88, art. 102, I).

Parecer pelo não cabimento da reclamação.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 (eletrônico)


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-I-

1. Cuida-se de Reclamação ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio


de Janeiro (MPRJ) contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro (TJRJ). A causa de pedir da Reclamação é a suposta violação à autoridade

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das decisões do Supremo Tribunal Federal.

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2. A petição inicial aduz que o acórdão reclamado desrespeitou as decisões
proferidas:

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(a) na Reclamação 32.9891, na medida em que esta teria a rmado que o
Senador Flávio Nantes Bolsonaro não possuiria prerrogativa de foro no

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STF, quanto a apuração da prática de fatos anteriores ou sem relação

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com o atual mandato;
(b) na ADI 2797, uma vez que tal decisão teria xado que “não há
extensão do foro por prerrogativa a ex-exercentes de cargos públicos
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após deixar o referido cargo” e
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(c) na AP 937 QO/RJ, no que concerne à tese xada no sentido de que


“o foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos
8/2 95

durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas”.


7/0 5.7

3. Requer, liminarmente, a cassação do acórdão impugnado, com o


restabelecimento dos efeitos práticos do que restou decidido nas decisões
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paradigmáticas invocadas como violadas.


Em por

4. No mérito, pugna pela confirmação da liminar, com a consequente fixação


da competência da 27ª Vara Criminal da Capital  do Rio de Janeiro para a
sso

supervisão das investigações referentes às condutas, em tese, praticadas quando o


atual Senador Flávio Nantes Bolsonaro desempenhava as funções de Deputado
pre

Estadual do Rio de Janeiro (PIC/MPRJ 2018.00452470). 


Im

5. Em resposta, Flávio Nantes Bolsonaro alega vício formal, sustentando que


não cabe reclamação contra decisão já transitada em julgado, bem assim que não se
pode utilizar a reclamação constitucional como sucedâneo recursal.

6. Aduz que o acórdão impugnado não viola a Reclamação  32.989, na medida


em que a decisão apontada como paradigma não fixou competência, limitando-se a
1
Partes da Reclamação 32989: Reclamante Flavio Nantes Bolsonaro e Reclamado Ministério
Público do Estado do Rio de Janeiro. Foi proferida decisão em 1.2.19 e certificado o trânsito em
julgado em 20.3.19. Informações obtidas no site do STF.

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afirmar que a Suprema Corte não é competente para apreciar os fatos. Também
repeliu a afronta à autoridade da decisão proferida na ADI 2797, pontuando que o
precedente não tratou da hipótese de continuidade de foro por prerrogativa.

7. Por fim, afirmou inexistir desrespeito à tese fixada na  AP 937 QO/RJ,
porque tal decisão se ateria à hipótese de perda do mandato. Ao final, requereu a

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negativa de seguimento à Reclamação ou a total improcedência dos pedidos. 

8. A autoridade reclamada prestou informações, arguindo, de início, que a

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atribuição para atuação no feito seria da Procuradoria-Geral da República, não do

9
Ministério Público Estadual. Apontou que não foi esgotada a jurisdição do

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Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, uma vez que não teria sido
interposto recurso contra o acórdão impugnado.

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9.
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Quanto às decisões indicadas como paradigmas, informou que a
Reclamação 32.989 não determinou a submissão de um Senador da República à
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jurisdição de magistrado de primeiro grau. No que diz respeito à decisão proferida
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na AP 937 QO, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro esclareceu inexistir


desobediência, porquanto o próprio Supremo Tribunal Federal teria mantido a
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prerrogativa de foro em casos semelhantes.  


7/0 5.7

10. Os autos vieram à Procuradoria-Geral da República para manifestação,


: 2 : 00

inclusive, sobre o pedido de habilitação no feito formulado pela defesa de Flávio


Nantes Bolsonaro. 
Em por

11. Eis, em síntese, o relatório.


sso

- II -
pre

12. A presente reclamação não deve ser conhecida, pelas razões a seguir
expostas.
Im

A reclamação constitucional na Constituição Federal e a sua natureza jurídica na


visão do Supremo Tribunal Federal

13. A reclamação constitucional, preliminarmente tratada como correição


2
parcial (medida administrativa), criada com base na teoria dos poderes implícitos
do direito norte-americano3 e introduzida no regimento interno do Supremo

2
A própria correição parcial, no âmbito na legislação federal, é regulada no art. 6º da Lei nº 5.010,
de 1966.

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Tribunal Federal, foi constitucionalizada pela primeira vez na Constituição Federal


de 1988. 4

14. Conforme Marcelo Navarro Ribeiro Dantas, em livro inteiramente


dedicado ao instituto da reclamação constitucional5, sua evolução pode ser dividida
em 5 fases6: “1ª – Fase de formulação (vai da criação do STF até 1957, quando o
seu Regimento Interno a prevê expressamente; 2ª – Fase de discussão (inicia-se

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com sua inclusão no RISTF, estendendo-se até à promulgação da CF/67); 3ª –
Fase de consolidação (da CF/67 até a EC 7/77); 4ª – Fase de definição (da EC

10
7/77 até o regime constitucional anterior ao da CF/88); e 5ª – Fase de plenificação
do instituto (a partir da promulgação da CF/88)”.

9
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15. Sempre se discutiu a natureza jurídica da reclamação7: Pontes de Miranda
(ação), Moacyr Amaral Santos e Alcides de Mendonça Lima (recurso ou

:46 c
sucedâneo recursal), Orosimbo Nonato (remédio incomum), Moniz de Aragão

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(incidente processual), José Frederico Marques (medida de direito processual
constitucional) e Djaci Falcão (medida processual de caráter excepcional).
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16. Em julgamento relevante sobre a reclamação8, o Supremo Tribunal
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Federal entendeu, ainda sob o pálio da constituição passada, que a reclamação,


independentemente de sua natureza jurídica, não poderia ser criada por outro
8/2 95

tribunal que não o próprio Supremo Tribunal Federal. É o que se depreende de


trecho da ementa do julgado: “Como quer que se qualifique – recurso, ação ou
7/0 5.7

medida processual de natureza excepcional, é incontestável a afirmação de que


somente o Supremo Tribunal Federal em face primacialmente, da previsão
: 2 : 00

inserida no art. 119, § 3º, letra c, da Constituição da República, é dado no seu


Regimento Interno, criar tal instituto, não previsto nas leis processuais.”
Em por

3
Caso McCulloch v. Maryland, julgado pela Suprema Corte Norte-Americana em 1819. Esta
decisão, na qual a Suprema Corte considerou válida a criação de um banco nacional pelo Congresso
sso

(Bank of the United States) e inválida a tributação de suas atividades pelo Estado de Maryland, é
mais conhecida pelo estabelecimento da denominada teoria dos poderes implícitos, pela qual é
legítimo o desempenho pela União de competências que não estão expressas na Constituição, mas
pre

são necessárias e apropriadas para a realização dos fins nela estabelecidos. Cf. Luís Roberto
Barroso. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro . 3ª ed. São Paulo: Saraiva: 2008,
Im

p. 10.
4
CF/88, art. 102, I, l , reclamação constitucional para o STF, e art. 105, I, f, reclamação
constitucional para o Superior Tribunal de Justiça. O instituto da reclamação, tanto para o STF
quanto para o STJ, estava regulamentado nos arts. 13 a 18 da Lei nº 8.038, de 1990. A EC 92/16
acrescentou o § 3º ao art. 111-A da CF/88 para prever a reclamação ao Tribunal Superior do
Trabalho.
5
Reclamação Constitucional no Direito Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor,
2000.
6
Reclamação Constitucional no Direito Brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor,
2000, p. 46-48.
7
Cf. voto do Min. Celso de Melo na Reclamação 336, DJ de 15.3.91.
8
Representação 1.092, Rel. Min. Djaci Falcão, DJ de 19.12.84.

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17. Nesse julgamento, o Ministro Moreira Alves destacou : “..., porque


também eu entendo que a reclamação objeto desta representação não se confunde
com a correição parcial, mas é meio processual que só pode ser criado por lei.”

18. No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.212, já sob a


égide da Constituição de 1988, o Supremo Tribunal Federal, num primeiro
momento, confirmando a jurisprudência firmada na Representação nº 1.092, acima

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relatada, entendeu que o constituinte estadual não poderia contemplar na
constituição estadual dispositivo outorgando competência para o tribunal de justiça

10
julgar reclamação destinada a garantir a autoridade de seus julgados e das suas
competências.

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19. O julgado recebeu a seguinte ementa: “Criação, por norma de
Constituição estadual ou do Regimento do Tribunal de Justiça, de reclamação

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destinada à preservação da competência deste, ou à garantia de suas decisões.

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Relevância jurídica da argüição, que se lhe opõe, de invasão da competência
privativa da União para legislar sobre direito processual (Constituição, art. 22, I).” 9
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20. Nesse julgamento, o Ministro Octavio Gallotti explicitou a posição do
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Supremo Tribunal Federal:


8/2 95

Historicamente justificado pela peculiar posição do Supremo Tribunal em


nosso regime político; depois pela faculdade a ele atribuída de estabelecer o
7/0 5.7

processo dos feitos submetidos a seu julgamento (CF 67, art. 119, § 3º, c/ a
redação da E.C. 7-77); hoje expressamente previsto no art. 102, I, l , da Carta
: 2 : 00

de 1988 (art. 105, I, f, para o S.T.J.) - o instituto da reclamação mostrou-se


alheio tanto à esfera de competência legislativa das Assembléias, como à
regimental dos Tribunais estaduais, visto configurar matéria de direito
Em por

processual, sobre a qual cabe à União privativamente dispor (CF, art. 22, I).

21. Por ocasião do julgamento de mérito dessa ação direta de


sso

inconstitucionalidade, o Supremo Tribunal Federal mudou de entendimento10


para dizer que: (i) a reclamação tinha natureza jurídica de direito de petição11 e (ii)
pre

o constituinte estadual poderia criar na constituição estadual a reclamação,


conforme se depreende da ementa do acórdão:
Im

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 108,


INCISO VII, ALÍNEA I DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO
CEARÁ E ART. 21, INCISO VI, LETRA J DO REGIMENTO
INTERNO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA LOCAL. PREVISÃO, NO

9
ADIn 2212, liminar deferida, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ de 30.3.01.
10
Este é um dos raros casos em que o STF concedeu a liminar, mas negou a procedência do pedido
formulado na ação direta de inconstitucionalidade.
11
Na linha da opinião externada em artigo de Ada Pelegrini Grinover (“A reclamação para garantia
da autoridade das decisões dos Tribunais”).

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ÂMBITO ESTADUAL, DO INSTITUTO DA RECLAMAÇÃO.


INSTITUTO DE NATUREZA PROCESSUAL CONSTITUCIONAL,
SITUADO NO ÂMBITO DO DIREITO DE PETIÇÃO PREVISTO
NO ARTIGO 5º, INCISO XXXIV, ALÍNEA A DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO ART. 22, INCISO I DA
CARTA.
1. A natureza jurídica da reclamação não é de um recurso, de uma ação e
nem de um incidente processual. Situa-se ela no âmbito do direito

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constitucional de petição previsto no artigo 5º, inciso XXXIV da
Constituição Federal. Em conseqüência, a sua adoção pelo Estado-membro,
pela via legislativa local, não implica em invasão da competência privativa da

10
União para legislar sobre direito processual (art. 22, I da CF).

9
2. A reclamação constitui instrumento que, aplicado no âmbito dos

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Estados-membros, tem como objetivo evitar, no caso de ofensa à autoridade
de um julgado, o caminho tortuoso e demorado dos recursos previstos na
legislação processual, inegavelmente inconvenientes quando já tem a parte

:46 c
uma decisão definitiva. Visa, também, à preservação da competência dos

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Tribunais de Justiça estaduais, diante de eventual usurpação por parte de
Juízo ou outro Tribunal local.
3. A adoção desse instrumento pelos Estados-membros, além de estar em
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sintonia com o princípio da simetria, está em consonância com o princípio da

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efetividade das decisões judiciais
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4. Ação direta de inconstitucionalidade improcedente.12


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22. Essa posição do Supremo Tribunal Federal foi confirmada no julgamento


da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.48013, cujo trecho da ementa registra:
7/0 5.7

1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADIn 2.212 (Pl. 2.10.03, Ellen,


: 2 : 00

DJ 14.11.2003), alterou o entendimento – firmado em período anterior à


ordem constitucional vigente (v.g., Rp 1092, Pleno, Djaci Falcão, RTJ
112/504) – do monopólio da reclamação pelo Supremo Tribunal Federal e
Em por

assentou a adequação do instituto com os preceitos da Constituição de 1988:


de acordo com a sua natureza jurídica (situada no âmbito do direito de
petição previsto no art. 5º, XXIV [sic]14, da Constituição Federal) e com os
sso

princípios da simetria (art. 125, caput e § 1º) e da efetividade das decisões


judiciais, é permitida a previsão de reclamação na Constituição Estadual.
pre

23. Todavia, no julgamento do recurso extraordinário nº 405.03115, o


Im

Supremo Tribunal Federal, mais uma vez, confirmou o entendimento de que a


criação de instrumento processual – reclamação – por regimento interno viola a
Constituição Federal. O julgado recebeu a seguinte ementa:

12
ADIn 2.212, mérito, por maioria, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 14.11.03.
13
ADIn 2.480, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 15.6.07.
14
Aqui ocorreu um lapso quanto ao número do inciso em que é previsto o direito de petição, pois
ele vem insculpido no inciso XXXIV do art. 5º, da CF/88.
15
RE 405.031, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 17.4.09.

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RECLAMAÇÃO – REGÊNCIA – REGIMENTO INTERNO –


IMPROPRIEDADE.
A criação de instrumento processual mediante regimento interno discrepa da
Constituição Federal. Considerações sobre a matéria e do atropelo da
dinâmica e organicidade próprias ao Direito.

24. Desse breve histórico jurisprudencial, constata-se que o Supremo


Tribunal Federal tratava a reclamação como direito de petição que pode ser criado

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pelo constituinte estadual16, mas não pode ser criado em regimento interno de
tribunal17.

10
25. Para finalizar, há posição doutrinária defendendo que o Supremo

9
Tribunal Federal, em função do novo Código de Processo Civil, aceitou a tese de

:43 l 41
que a natureza jurídica da reclamação constitucional passou a ser a de ação.18 Nos
precedentes localizados, contudo, o que se nota é que alguns Ministros comentam

:46 c
sobre o tema, mas não se revela possível afirmar, com segurança, que houve uma

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mudança convicta e fundamentada do entendimento do Supremo Tribunal Federal
acerca da natureza jurídica da reclamação constitucional.
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-III-
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O efeito vinculante na Constituição Federal 19


8/2 95

26. Com o advento da Emenda Constitucional nº 3, de 1993, houve


7/0 5.7

significativa alteração no controle de constitucionalidade brasileiro, pois foi criada a


ação declaratória de constitucionalidade (ADC) e instituído o efeito vinculante
: 2 : 00

para as suas decisões.20


Em por

27. A despeito das diversas críticas sobre os referidos institutos (ADC e efeito
vinculante), no julgamento da Questão de Ordem na Ação Declaratória de
Constitucionalidade nº 1, o Supremo Tribunal Federal decidiu pela
sso
pre

16
ADIns 2.212 e 2.480.
Im

17
RE 405.031.
18
Nesse sentido: Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha. Curso de direito processual civil
meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais v. 3. 17a. ed. Salvador : Editora
JusPodivm, 2020, p. 660. No STF: AgRg na Reclamação 24417 (1 a. Turma, j. 7.3.17), o Min.
Roberto Barroso faz a seguinte menção: “Isto é, a reclamação indiscutivelmente tornou-se uma
ação,...”; e a Questão de Ordem na Reconsideração na Reclamação 25.638 (Plenário, j.9.5.19), nos
votos dos Ministros Dias Toffoli e Luiz Fux há referências de que a reclamação tem natureza
jurídica de ação.
19
Vale recordar o seguinte fato: o “efeito vinculante” surgiu inicialmente para a representação
interpretativa e ele consta no art. 187 do RISTF.
20
Efeito vinculante a decisões judiciais é matéria reservada à criação pelo legislador constituinte e
disciplinada pelo legislador ordinário.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 7/31


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constitucionalidade da ADC21, mas não definiu a natureza jurídica do efeito


vinculante.

28. No seu voto, o Ministro Moreira Alves, relator, estabeleceu que se o efeito
vinculante não fosse respeitado poderia ser ajuizada reclamação diretamente no
Supremo Tribunal Federal:

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“De feito, se a eficácia erga omnes que também possuem suas decisões de
mérito lhe dá a mesma eficácia que têm as decisões de mérito das ações diretas
de inconstitucionalidade (e – note-se – é em virtude dessa eficácia erga omnes

10
que esta Corte, por ser alcançada igualmente por ela, não pode voltar atrás na
declaração que nela fez anteriormente), do efeito vinculante que lhe é próprio

9
resulta: a) – se os demais órgãos do Poder Judiciário, nos casos concretos sob

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seu julgamento, não respeitarem a decisão prolatada nessa ação, a parte
prejudicada poderá valer-se do instituto da reclamação para o Supremo

:46 c
Tribunal Federal, a fim de que este garanta a autoridade dessa decisão; e b) –

09 10 R
essa decisão (e isso se restringe ao dispositivo dela, não abrangendo – como
sucede na Alemanha – os seus fundamentos determinantes, até porque a
Emenda Constitucional n. 3 só atribui efeito vinculante à própria decisão
definitiva de mérito), essa decisão, repito, alcança os atos normativos de igual
0 - 1-

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conteúdo daquele que deu origem a ela mas que não foi seu objeto, para o fim
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de, independentemente de nova ação, serem tidos como constitucionais ou


inconstitucionais, adstrita essa eficácia aos atos normativos emanados dos
8/2 95

demais órgãos do Poder Judiciário e do Poder Executivo, uma vez que ela não
alcança os atos editados pelo Poder Legislativo.” 22
7/0 5.7

29. Posteriormente, a Lei nº 9.868, de 1999, no parágrafo único do art. 28,


: 2 : 00

estendeu o efeito vinculante para a ação direta de inconstitucionalidade.

30. Boa parte da doutrina pátria entendeu que seria inconstitucional a atitude
Em por

do legislador de atribuir por lei ordinária o efeito vinculante para a ação direta de
inconstitucionalidade, já que o efeito vinculante foi criado para a ação declaratória
sso

de constitucionalidade por emenda constitucional.23


pre
Im

21
QO na ADC 1, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 16.6.95. A constitucionalidade da EC 3/93 foi
questionada na ADIn 913, não conhecida por ausência de pertinência temática da Associação dos
Magistrados Brasileiros (acórdão publicado no DJ de 5.5.95).
22
Necessário destacar que o STF, no julgamento da Reclamação 4.374, j. 10.4.13, aceitou a
reclamação até para modificar entendimento proferido em sede de controle concentrado. Ou seja, a
reclamação foi usada como uma ação rescisória desconstituindo julgado proferido numa ação direta
de inconstitucionalidade. Em suma, o STF não se considera vinculado ao efeito vinculante.
23
Essa aliás foi a linha de raciocínio defendida pelo Ministro Moreira Alves no julgamento do AgRg
na Reclamação 1.880. A discussão doutrinária, como se sabe, está esgotada, pois a EC 45/04 dispôs
que a decisão da ação direta de inconstitucionalidade tem efeito vinculante (art. 102, § 2º, da
Constituição Federal).

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 8/31


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31. O Supremo Tribunal Federal, no entanto, decidiu, por maioria, pela


constitucionalidade do mencionado dispositivo legal (AgRg na Reclamação
1.88024).

32. Assim, as decisões proferidas em controle concentrado passaram a ter


além da eficácia erga omnes também efeito vinculante.

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33. A partir dessa decisão, mudou o entendimento do Supremo Tribunal
Federal acerca da legitimidade para a propositura de reclamação constitucional,
como se verá a seguir.

9 10
-IV-

:43 l 41
A legitimidade para a propositura da reclamação constitucional

:46 c
09 10 R
34. Inicialmente, o Supremo Tribunal Federal apenas admitia o ajuizamento
de reclamação por quem havia sido parte no processo.25 Ou seja, teria que ter sido
requerente ou requerido, no controle concentrado (ADIn/ADC/ADPF), ou
0 - 1-
recorrente ou recorrido, no controle difuso (RE, por exemplo).

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02 .98

35. No entanto, com a decisão proferida no AgRg na Reclamação 1.880 já


mencionada, o Supremo Tribunal Federal26 passou a permitir que qualquer pessoa
8/2 95

que se sentisse prejudicada pela não observância do efeito vinculante poderia


7/0 5.7

ajuizar reclamação no Supremo Tribunal Federal:


“4. Reclamação. Reconhecimento de legitimidade ativa ad causam de todos
: 2 : 00

que comprovem prejuízo oriundo de decisões dos órgãos do Poder Judiciário,


bem como da Administração Pública de todos os níveis, contrárias ao julgado
Em por

do Tribunal. Ampliação do conceito de parte interessada (Lei 8038/90,


artigo 13). Reflexos processuais da eficácia vinculante do acórdão a ser
preservado.”27
sso

36. Esse quadro não mudou com a Emenda Constitucional 45, de 2004, que
pre

criou a súmula vinculante. 28

37. O legislador ordinário, ao disciplinar a súmula vinculante, fez uso do


Im

instrumento da reclamação. É que contra as decisões que não respeitam estas


24
AgRg na Reclamação 1.880, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 19.4.04.
25
O art. 13 da Lei nº 8.038, de 1990, mencionava “parte interessada” e Ministério Público.
26
O STF talvez já prevendo a enxurrada de reclamações, deixou inicialmente a distribuição “livre”
em clara ofensa ao disposto no parágrafo único do art. 13 da Lei nº 8.038, de 1990, que
determinava a distribuição “ao relator da causa principal, sempre que possível”. No RISTF: art. 70,
§ 1º.
27
Trecho da ementa do AgRg na Reclamação 1.880, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 19.4.04.
28
A súmula vinculante nada mais é do que a antiga súmula acrescida do efeito vinculante. Sua
regulamentação foi feita na Lei nº 11.417, de 2006.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 9/31


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súmulas optou o legislador pelo cabimento da reclamação para dar efetividade ao


seu efeito vinculante29.

38. Em resumo, não respeitar as súmulas vinculantes do Supremo Tribunal


Federal também significa negar “autoridade ao julgado” do Supremo Tribunal
Federal. 30

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39. De forma esquematizada, cabe reclamação constitucional para o Supremo
Tribunal Federal em duas hipóteses31: (i) violação à sua competência (ii) não
observância da autoridade do seu julgado.

9 10
40. E – aqui importa ressaltar – que dentro do desrespeito à autoridade do

:43 l 41
julgado do Supremo Tribunal Federal, há uma única hipótese no processo
objetivo32: quando a decisão do Supremo Tribunal Federal tiver efeito vinculante.

:46 c
09 10 R
41. Necessário recordar que a parte em determinado processo subjetivo
(controle difuso) julgado pelo Supremo Tribunal Federal também dispõe de
legitimidade para ajuizar reclamação perante este Tribunal quando a autoridade de
0 - 1-

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seu julgado não for observada.
02 .98

42. Em outras palavras, só cabe reclamação – por quem não foi parte –
quando o decidido pelo Supremo Tribunal Federal ocorrer em sede de controle
8/2 95

concentrado de constitucionalidade (ADIn, ADC e ADPF) ou quando o Supremo


7/0 5.7

Tribunal Federal tiver, nos termos constitucionais e legais, editado súmula


vinculante.
: 2 : 00

29
Art. 7º da Lei nº 11.417, de 2006.
30
Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão
Em por

de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar
súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos
demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal,
sso

estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em
lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas,
pre

acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração
pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre
Im

questão idêntica. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)


§ 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de
súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que
indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a
procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que
outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.
31
Há, na doutrina, quem diga que o cabimento da reclamação para garantir a efetividade da súmula
vinculante seria uma terceira hipótese de cabimento da reclamação.
32
Sobre o processo objetivo na jurisprudência do STF: Rp.1016, Rp. 1405, AR 878 e QO na ADC
1.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 10/31


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43. É que o Supremo Tribunal Federal no julgamento da Reclamação nº


33
4.335 , manteve o entendimento de que as decisões em sede de controle difuso não
têm eficácia erga omnes nem efeito vinculante.34 Ou seja, as decisões em controle
difuso não possibilitam a propositura de reclamação por quem não foi parte no
processo original.35

44. Em suma, a reclamação constitucional por quem não é parte na causa é

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decorrente do efeito vinculante, como bem disse, certa vez, o Ministro Carlos
Velloso36: “Certo é que o efeito vinculante propicia às partes virem diretamente ao

10
Supremo Tribunal, no caso de descumprimento desse efeito, mediante
reclamação.”

9
:43 l 41
45. Firmado o entendimento de quem tem legitimidade para a propositura de
reclamação, cumpre examinar os tipos de reclamação.

:46 c
09 10 R
-V-

Os dois tipos de reclamação constitucional


0 - 1-

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46. Dentro da moldura constitucional da reclamação há, por assim dizer, dois
02 .98

tipos de reclamação no Supremo Tribunal Federal: uma reclamação subjetiva


8/2 95

33
Reclamação 4.335 (DJ 22.10.14). A reclamação foi julgada procedente em razão da súmula
7/0 5.7

vinculante nº 26 (“Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime


hediondo ou equiparado, o juízo de execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei n.
8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche ou não, os
: 2 : 00

requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo
fundamentado, a realização de exame criminológico.”) e do artigo 462 do Código de Processo Civil
de 1973 (“Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do
Em por

direito influir no julgamento da lide, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a


requerimento da parte, no momento de proferir a sentença.”). Cumpre destacar que o STF tem
precedentes no sentido que “não cabe reclamação por ofensa à súmula vinculante editada após a
sso

decisão impugnada” (AgR na Reclamação nº 8.846, DJe de 9.4.10, e AgR na Reclamação nº 7.989,
DJe de 20.8.12).
34
Assinala Luís Roberto Barroso: “Ainda no regime constitucional anterior, o STF, no julgamento
pre

do Processo Administrativo n. 4.477/72, estabeleceu o entendimento de que a comunicação ao


Senado somente é cabível na hipótese de declaração incidental de inconstitucionalidade, isto é, na
Im

apreciação de caso concreto. No controle por via principal concentrado, a simples decisão da Corte,
por maioria absoluta, já importa na perda de eficácia da lei ou ato normativo. V. STF, DJU, 16
maio 1977,p. 3123.” O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 3ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2008, p.121.
35
Não se pretende discutir aqui as ADIns 3406 e 3470 (conhecidas como “Caso Amianto”), pois a
Ministra Rosa Weber, Relator, suspendeu, em parte, os efeitos da decisão (decisão de 19.12.17).
Também houve a interposição de embargos de declaração ainda pendentes de julgamento. Na
doutrina sobre esses julgados ver: Pedro Lenza. Direito constitucional esquematizado. 23a. ed. São
Paulo : Saraiva, 2019, p. 314-318; e Juliano Taveira Bernardes e Olavo Augusto Vianna Alves
Ferreira. Direito constitucional tomo I – Teoria da constituição. 8a ed. Salvador : Editora
JusPodivm, 2018, p. 388-389.
36
Aparte no julgamento do AgRg na Reclamação 1.880.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 11/31


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(reclamação de parte) e uma reclamação objetiva (reclamação de não parte).37 Ou,


noutros termos, uma reclamação de quem foi parte no processo que foi julgado
pelo Supremo Tribunal Federal e uma reclamação de quem não foi parte no
processo que foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal.

47. Correto dizer, portanto, que o constituinte resolveu permitir para aquelas
partes que já haviam tido sucesso com as suas demandas no âmbito do Superior

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Tribunal de Justiça (último intérprete do direito infraconstitucional) e/ou no
âmbito do Supremo Tribunal Federal (último intérprete do direito constitucional)

10
ajuizar reclamação quando as decisões desses tribunais não estivessem sendo
executadas de acordo com a coisa julgada firmada por esses tribunais ou que

9
estivessem sendo descumpridas pelos juízes das instâncias inferiores.

:43 l 41
48. Pareceu para o constituinte que seria um absurdo que o vencedor da causa

:46 c
tivesse de percorrer novamente todas as instâncias da justiça para que o Superior

09 10 R
Tribunal de Justiça e/ou Supremo Tribunal Federal reinterpretassem as suas
decisões para dizer o correto modo de aplicá-las.
0 - 1-

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49. Essa seria a chamada reclamação subjetiva ou reclamação de parte,
02 .98

derivada, pois, de um processo subjetivo.38


8/2 95

50. Por outro lado, a reclamação chamada de objetiva/de não parte poderia ser
ajuizada por qualquer pessoa que se sentisse prejudicada, já que a decisão proferida
7/0 5.7

pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado de


constitucionalidade tem efeito vinculante.39
: 2 : 00

51. Assim, para assegurar o entendimento proferido pelo Supremo Tribunal


Em por

Federal no controle concentrado é permitido que qualquer um proponha


reclamação diretamente no Supremo Tribunal Federal.
sso

37
A reclamação objetiva (reclamação de não parte) é aquela permitida quando há violação a uma
decisão proferida em sede de processo objetivo. Explica Luís Roberto Barroso: “ (…) Trata-se de
pre

um processo objetivo, sem partes, que não se presta à tutela de direitos subjetivos, de situações
jurídicas individuais.” (O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro . 3ª ed. São Paulo:
Im

Saraiva: 2008, p.146). Na jurisprudência do STF sobre processo objetivo ver: Representação 1.016,
Representação 1.405, Ação Rescisória 878 e QO na ADC 1.
38
Processo subjetivo é o processo regulado pelo Código de Processo Civil. No controle concentrado
impera o processo objetivo:“(...) Por essa razão, os princípios constitucionais do processo (leia-se:
do processo subjetivo) não podem ser aplicados ao processo objetivo sem apurada dose de cautela”.
Clèmerson Merlin Clève. A fiscalização abstrata de constitucionalidade no direito brasileiro. São
Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 143-145. Cabe ressaltar, por honestidade
intelectual, que a distinção entre processo objetivo e processo subjetivo não ocorre de modo
absoluto (Cf. José Joaquim Gomes Canotilho. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 2ª
ed. Coimbra : Livraria Almedina, 1998, p. 861).
39
Ressalte-se que o STF não está sujeito ao seu efeito vinculante, de acordo com o julgamento da
Reclamação nº 4.374 (DJ 4.9.13).

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 12/31


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52. Ou seja, o efeito vinculante das decisões proferidas em processo objetivo


autoriza que qualquer um ajuíze reclamação no Supremo Tribunal Federal.

53. Independentemente de ser do tipo subjetiva/de parte ou do tipo objetiva/


de não parte, a reclamação sempre foi vista como uma solução excepcional.

54. Até porque assumi-la como regra significaria admitir que o usual no Brasil

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é o não cumprimento das decisões judiciais.

55. Tanto é assim que ela somente é prevista para o Supremo Tribunal

10
Federal e para o Superior Tribunal de Justiça em situações exaustivamente

9
descritas pelo poder constituinte originário40: violar competência do Supremo

:43 l 41
Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça ou negar autoridade a julgado
do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.

:46 c
09 10 R
56. Em conclusão parcial, dentro da moldura constitucional criada pelo poder
constituinte, há dois tipos de reclamação: a subjetiva (de parte) e a objetiva (de não
parte). Para o Supremo Tribunal Federal é possível o ajuizamento dos dois tipos
0 - 1-

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de reclamação. 41
02 .98

-VI-
8/2 95

A presente reclamação constitucional


7/0 5.7

57. Como se viu no amplo histórico realizado anteriormente, a reclamação


constitucional, tal como prevista pelo constituinte, é exceção no sistema
: 2 : 00

constitucional brasileiro. Nas palavras do decano do STF: “A reclamação,


considerada a sua dupla função constitucional (RTJ 134/1033), tem por finalidade
Em por

neutralizar situações anômalas, que, criadas por terceiros estranhos ao Supremo


Tribunal Federal, venham a afetar a integridade da competência institucional desta
sso

Corte ou a comprometer a autoridade de suas próprias decisões” (decisão


monocrática do Min. Celso de Mello na Rcl 2106, DJ 8.8.02).
pre

58. Da análise da inicial, constata-se que se alega que houve violação a três
julgados do Supremo Tribunal Federal. São eles: (i) a Ação Penal n. 937 (QO), (ii)
Im

a Reclamação n. 32.98942 e (iii) a Ação direta de inconstitucionalidade n. 2797. O


fundamento da reclamação é então o art. 102, I, l [“(...)e garantia das suas decisões].
40
Sobre o poder constituinte ver: Manoel Gonçalves Ferreira Filho . O Poder Constituinte. 4ª ed.
São Paulo: Saraiva, 2005, p. 187.
41
Não cabe reclamação contra a coisa julgada (Súmula 734 do STF: “Não cabe reclamação quando
já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo
Tribunal Federal”).
42
Partes da Reclamação 32989: Reclamante Flavio Nantes Bolsonaro e Reclamado Ministério
Público do Estado do Rio de Janeiro. Foi proferida decisão em 1.2.19 e certificado o trânsito em
julgado em 20.3.19. Informações obtidas no site do STF.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 13/31


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59. A presente reclamação constitucional, portanto, abrange os dois tipos: é


objetiva (violação aos julgamentos proferidos pelo plenário do Supremo Tribunal
Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2797 e na Questão de Ordem
na Ação Penal n. 937) e é subjetiva (afronta à decisão monocrática da Reclamação
n. 32.98943).44

60. Vejamos primeiramente a parte objetiva desta reclamação referente à

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suposta violação ao julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2797.45

61. O Supremo Tribunal Federal entendeu que era inconstitucional a

10
tentativa do legislador de ressuscitar a vigência do enunciado 394 da sua súmula.

9
O entendimento antigo do Supremo Tribunal Federal era o de que a prerrogativa

:43 l 41
de foro ficava mantida mesmo após o exercício da função pública. Todavia, quando
revogou a súmula, tal entendimento deixou de existir.

:46 c
09 10 R
62. Em outros termos, o Supremo Tribunal Federal estipulara no enunciado
da súmula 394 que: “Cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a
competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito ou a ação
0 - 1-

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penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício.” A súmula foi revogada
02 .98

[Precedentes do Supremo Tribunal Federal: Inq 687-SP (QO) e Inq 881-MT


(QO), rel. Min. Sydney Sanches; AP 313-DF (QO), AP 315-DF (QO), AP 319-
8/2 95

DF (QO) e Inq 656-AC (QO), rel. Min. Moreira Alves, 25.8.99]. O legislador na
lei n. 10.62846 quis positivar em lei o entendimento do enunciado da Súmula 394,
7/0 5.7

mas o Supremo Tribunal Federal rechaçou essa criação, declarando a


inconstitucionalidade da lei nos seguintes termos:
: 2 : 00

EMENTA: I. ADIn: legitimidade ativa: "entidade de classe de âmbito


Em por

nacional" (art. 103, IX, CF): Associação Nacional dos Membros do Ministério
Público - CONAMP 1. Ao julgar, a ADIn 3153-AgR, 12.08.04, Pertence, Inf
STF 356, o plenário do Supremo Tribunal abandonou o entendimento que
sso

excluía as entidades de classe de segundo grau - as chamadas "associações de


associações" - do rol dos legitimados à ação direta. 2. De qualquer sorte, no
novo estatuto da CONAMP - agora Associação Nacional dos Membros do
pre

Ministério Público - a qualidade de "associados efetivos" cou adstrita às


pessoas físicas integrantes da categoria, - o que basta a satisfazer a
Im

jurisprudência restritiva-, ainda que o estatuto reserve às associações a liadas


papel relevante na gestão da entidade nacional. II. ADIn: pertinência temática.

43
Partes da Reclamação 32989: Reclamante Flavio Nantes Bolsonaro e Reclamado Ministério
Público do Estado do Rio de Janeiro. Foi proferida decisão em 1.2.19 e certificado o trânsito em
julgado em 20.3.19. Informações obtidas no site do STF.
44
Dos três julgados citados somente o da ADIn 2797 constitui decisão provida de efeito vinculante.
45
Na doutrina sobre o julgado ver: Luís Roberto Barroso. Curso de direito constitucional
contemporâneo. Saraiva : São Paulo, 1999, p. 133.
46
Restabelecia a tese jurídica anterior: a de subsistência da competência especial mesmo após a
cessação do exercício da função pública que a determinou.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 14/31


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Presença da relação de pertinência temática entre a nalidade institucional das


duas entidades requerentes e os dispositivos legais impugnados: as normas
legais questionadas se re etem na distribuição vertical de competência
funcional entre os órgãos do Poder Judiciário - e, em conseqüência, entre os do
Ministério Público . III. Foro especial por prerrogativa de função: extensão, no
tempo, ao momento posterior à cessação da investidura na função dele
determinante. Súmula 394/STF (cancelamento pelo Supremo Tribunal
Federal). Lei 10.628/2002, que acrescentou os §§ 1º e 2º ao artigo 84 do C.

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Processo Penal: pretensão inadmissível de interpretação autêntica da
Constituição por lei ordinária e usurpação da competência do Supremo
Tribunal para interpretar a Constituição: inconstitucionalidade declarada. 1. O

10
novo § 1º do art. 84 CPrPen constitui evidente reação legislativa ao

9
cancelamento da Súmula 394 por decisão tomada pelo Supremo Tribunal no

:43 l 41
Inq 687-QO, 25.8.97, rel. o em. Ministro Sydney Sanches (RTJ 179/912),
cujos fundamentos a lei nova contraria inequivocamente. 2. Tanto a Súmula
394, como a decisão do Supremo Tribunal, que a cancelou, derivaram de

:46 c
interpretação direta e exclusiva da Constituição Federal. 3. Não pode a lei

09 10 R
ordinária pretender impor, como seu objeto imediato, uma interpretação da
Constituição: a questão é de inconstitucionalidade formal, ínsita a toda norma
de gradação inferior que se proponha a ditar interpretação da norma de
0 - 1-
hierarquia superior. 4. Quando, ao vício de inconstitucionalidade formal, a lei

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interpretativa da Constituição acresça o de opor-se ao entendimento da
02 .98

jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal - guarda da Constituição


-, às razões dogmáticas acentuadas se impõem ao Tribunal razões de alta
8/2 95

política institucional para repelir a usurpação pelo legislador de sua missão de


intérprete nal da Lei Fundamental: admitir pudesse a lei ordinária inverter a
7/0 5.7

leitura pelo Supremo Tribunal da Constituição seria dizer que a interpretação


constitucional da Corte estaria sujeita ao referendo do legislador, ou seja, que a
: 2 : 00

Constituição - como entendida pelo órgão que ela própria erigiu em guarda da
sua supremacia -, só constituiria o correto entendimento da Lei Suprema na
medida da inteligência que lhe desse outro órgão constituído, o legislador
Em por

ordinário, ao contrário, submetido aos seus ditames. 5. Inconstitucionalidade


do § 1º do art. 84 C.Pr.Penal, acrescido pela lei questionada e, por
arrastamento, da regra nal do § 2º do mesmo artigo, que manda estender a
sso

regra à ação de improbidade administrativa. IV. Ação de improbidade


administrativa: extensão da competência especial por prerrogativa de função
pre

estabelecida para o processo penal condenatório contra o mesmo dignitário (§


2º do art. 84 do C Pr Penal introduzido pela L. 10.628/2002): declaração, por
lei, de competência originária não prevista na Constituição:
Im

inconstitucionalidade. 1. No plano federal, as hipóteses de competência cível


ou criminal dos tribunais da União são as previstas na Constituição da
República ou dela implicitamente decorrentes, salvo quando esta mesma
remeta à lei a sua xação. 2. Essa exclusividade constitucional da fonte das
competências dos tribunais federais resulta, de logo, de ser a Justiça da União
especial em relação às dos Estados, detentores de toda a jurisdição residual. 3.
Acresce que a competência originária dos Tribunais é, por de nição,
derrogação da competência ordinária dos juízos de primeiro grau, do que
decorre que, demarcada a última pela Constituição, só a própria Constituição a
pode excetuar. 4. Como mera explicitação de competências originárias

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 15/31


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implícitas na Lei Fundamental, à disposição legal em causa seriam oponíveis as


razões já aventadas contra a pretensão de imposição por lei ordinária de uma
dada interpretação constitucional. 5. De outro lado, pretende a lei questionada
equiparar a ação de improbidade administrativa, de natureza civil (CF, art. 37,
§ 4º), à ação penal contra os mais altos dignitários da República, para o m de
estabelecer competência originária do Supremo Tribunal, em relação à qual a
jurisprudência do Tribunal sempre estabeleceu nítida distinção entre as duas
espécies. 6. Quanto aos Tribunais locais, a Constituição Federal -salvo as

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hipóteses dos seus arts. 29, X e 96, III -, reservou explicitamente às
Constituições dos Estados-membros a de nição da competência dos seus
tribunais, o que afasta a possibilidade de ser ela alterada por lei federal

10
ordinária. V. Ação de improbidade administrativa e competência

9
constitucional para o julgamento dos crimes de responsabilidade. 1. O eventual

:43 l 41
acolhimento da tese de que a competência constitucional para julgar os crimes
de responsabilidade haveria de estender-se ao processo e julgamento da ação de
improbidade, agitada na Rcl 2138, ora pendente de julgamento no Supremo

:46 c
Tribunal, não prejudica nem é prejudicada pela inconstitucionalidade do novo

09 10 R
§ 2º do art. 84 do C.Pr.Penal. 2. A competência originária dos tribunais para
julgar crimes de responsabilidade é bem mais restrita que a de julgar
autoridades por crimes comuns: afora o caso dos chefes do Poder Executivo -
0 - 1-
cujo impeachment é da competência dos órgãos políticos - a cogitada

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competência dos tribunais não alcançaria, sequer por integração analógica, os
02 .98

membros do Congresso Nacional e das outras casas legislativas, aos quais,


segundo a Constituição, não se pode atribuir a prática de crimes de
8/2 95

responsabilidade. 3. Por outro lado, ao contrário do que sucede com os crimes


comuns, a regra é que cessa a imputabilidade por crimes de responsabilidade
7/0 5.7

com o termo da investidura do dignitário acusado. (acórdão publicado no DJ


de 19.12.06)
: 2 : 00

63. Da ementa transcrita, constata-se que não cabia ao legislador restabelecer


aquela posição que deu origem ao mencionado enunciado sumular.
Em por

64. Firmada essa premissa, importante dizer que o efeito vinculante dessa
sso

decisão se refere apenas à sua parte dispositiva47 : não pode o julgador decidir
processos seja aplicando a súmula 394 do Supremo Tribunal Federal, seja
aplicando a lei n. 10.628, de 2002. Aceitando competência já desfeita pela ação da
pre

jurisdição constitucional do Supremo Tribunal Federal que a reputou ilegítima.


Im

65. O julgador que acaso elasteça o foro por prerrogativa de função como
outrora estará, em verdade, aplicando direito inexistente. A uma, porque o
enunciado da súmula (admitindo apenas para argumentação súmula como fonte
do direito) foi revogada. A duas, porque estará aplicando lei já retirada do
ordenamento jurídico (a lei n. 10.628, de 2002).

47
Voto do Min. Moreira Alves já transcrito aqui (páginas 7 e 8).

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 16/31


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66. Assim caso um juiz aplique a inexistente súmula 394 do Supremo


Tribunal Federal num processo, a questão deve ser resolvida pelos meios
ordinários de correção judicial presentes no sistema recursal. Da mesma forma, a
aplicação de lei inexistente sujeita-se à impugnação por recurso. Ou seja, isso
acontecendo, cabe à parte prejudicada fazer uso do sistema recursal, impetrar
mandado de segurança e até mesmo propor reclamação constitucional no Supremo
Tribunal Federal.

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67. Na decisão ora reclamada, todavia, nada disso ocorreu. Aliás não há no

10
acórdão menção expressa à súmula 394 ou à lei 10.628, de 2002. Nesse sentido,
basta ver a sua ementa:

9
:43 l 41
Habeas Corpus. Questionamento sobre regra de competência do foro especial
por prerrogativa de função em razão dos fatos sob investigação serem

:46 c
contemporâneos e relacionados ao mandato eletivo que o paciente exercia, à

09 10 R
época, como Deputado Estadual na Assembleia Legislativa do Estado do Rio
de Janeiro, o que, portanto, atrairia o foro especial e competência do Órgão
Especial deste Tribunal de Justiça para o processamento e o julgamento,
afastando, pois, a competência do Juiz de Primeiro Grau. No caso em análise, o
0 - 1-

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Procedimento Investigatório Criminal foi instaurado em 2018 pelo Ministério
02 .98

Público Estadual quando o paciente ainda era Deputado Estadual e, ao


término deste mandato, iniciou-se outro mandato eletivo de Senador, sem
8/2 95

interregno temporal entre os cargos eletivos. Sob a ótica dos novos contornos
oferecidos pelo STF recentemente sobre o tema (Questão de Ordem na A.P.
7/0 5.7

937) não se encontra uma resposta objetiva à questão trazida neste habeas
corpus, sendo exigível, portanto, um maior exercício interpretativo para se
de nir a quem toca a competência de julgar o paciente. Havendo inequívoca
: 2 : 00

continuidade no exercício de função pública, ambos os cargos eletivos exercidos


no Poder Legislativo sem interregno temporal entre eles, persiste a necessidade
Em por

do resguardo da função pública por meio de aplicação de regra diferenciada de


competência, sem que isso viole o princípio republicano e princípio da
igualdade à luz dos novos vetores constitucionais. Frise-se, inclusive, que o
sso

Ministério Público, se valendo da sua independência funcional, opinou em dois


sentidos divergentes, sendo um deles pela tese favorável à defesa reconhecendo
o foro por prerrogativa de função, o que signi ca dizer que o tema ora em
pre

debate encerra realmente um exercício interpretativo das novas diretrizes


adotadas pelo STF. Destaca-se que a interpretação conferida ao foro por
Im

prerrogativa de função neste voto em nada se confunde com qualquer espécie


de privilégio ao ocupante de função pública, uma vez que se atém à nalidade
protetiva da regra de competência em relação à função e ao cargo público,
aplicável ao titular que é investigado pela prática de infração penal no exercício
do cargo e em função do cargo em que estava investido. Quanto ao pleito que
persegue a nulidade da investigação, não encontra melhor sorte a impetração.
Em primeiro lugar, o aproveitamento dos atos processuais praticados por juízo
incompetente, em homenagem aos princípios da instrumentalidade das formas,
da celeridade e da economia processual, encontra assento tanto na seara do
direito processual civil quanto do direito processual penal, conforme artigos 64,

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 17/31


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§ 4º, 240, 802 e 957 do CPC e art. 567 do CPP, este último permitindo a
utilização dos atos instrutórios produzidos, ainda que realizados por
autoridade absolutamente incompetente, sendo certo que até mesmo atos
decisórios praticados por juízo incompetente são rati cáveis, de acordo com o
que dispõe o artigo 108, §1º do CPP. Nesse contexto, os atos cuja validade se
questiona consistem em medidas cautelares, com caráter instrutório, praticadas
na fase investigativa, portanto, poder-se-ia aplicar a chamada “teoria do juízo
aparente”. Em segundo lugar, pondere-se que as cortes superiores rmaram

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jurisprudência no sentido de ser possível à verdadeira autoridade competente a
rati cação dos atos instrutórios e decisórios proferidos por juízo incompetente.
Por m, também é pací co na jurisprudência dos tribunais superiores que o

10
reconhecimento de nulidades no curso do processo penal, seja ela absoluta ou

9
relativa, reclama efetiva demonstração de prejuízo, o que não compete à esta

:43 l 41
Egrégia Câmara valorar e sim ao Órgão Especial competente para julgar a
causa. Precedentes do STJ e do STF. Por derradeiro, impende destacar que a
regra geral é de desmembramento de investigação ou de ação quando houver

:46 c
outros investigados/corréus sem foro por prerrogativa de função. Contudo, na

09 10 R
linha de entendimento do E. Supremo Tribunal Federal, não deve ocorrer o
desmembramento quando este representar prejuízo às investigações ou, ainda,
quando o julgamento em separado possa causar prejuízo relevante à prestação
0 - 1-
jurisdicional, cabendo ao órgão competente para julgar a autoridade com foro

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por prerrogativa a decisão sobre a necessidade de desmembramento de
02 .98

investigações. Concessão parcial da ordem. (ementa do acórdão juntado na


inicial da reclamação, s. 155-174).
8/2 95
7/0 5.7

68. Seria hipótese de cabimento de reclamação se tivesse ocorrido ou a


aplicação explícita do revogado enunciado da súmula 394 ou a aplicação da lei n.
: 2 : 00

10.628, de 2002. Aí sim teria ocorrido o desrespeito a julgado do Supremo


Tribunal Federal proferido com efeito vinculante. Mas como se extrai da ementa e
Em por

do voto ora reclamados não se discutiu a questão jurídica sob a ótica do julgamento
da ADIn 2797.
sso

69. Assim, aceitar a presente reclamação constitucional implicaria permitir seu


uso como puro sucedâneo recursal, algo que o Supremo Tribunal Federal, há
pre

tempos, não permite, conforme se extrai dos seguintes julgados:


Im

EMENTA: RECLAMAÇÃO. INSTAURAÇÃO DE AÇÃO PENAL


PARA APURAR EVENTUAL CRIME CONTRA A ORDEM
TRIBUTÁRIA. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
N. 1.571/DF. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE
RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL COMO SUCEDÂNEO DE
RECURSAL. ATO RECLAMADO ANTERIOR À DECISÃO
PARADIGMA. PRECEDENTES. RECLAMAÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE. (Reclamação 3076, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJ
19.8.11, negrito nosso)

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 18/31


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Ementa: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. JUÍZO DE


ADMISSIBILIDADE DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ANÁLISE
DE MÉRITO DO RECURSO. RECLAMAÇÃO. ALEGADA
USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO STF. INOCORRÊNCIA.
INDEVIDA UTILIZAÇÃO DA RECLAMAÇÃO COMO
SUCEDÂNEO RECURSAL. SEGUIMENTO NEGADO.
PRECEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
(Reclamação 8176 AgR, Rel. Min. Teori Zavascki, DJ 13.6.13, negrito nosso).

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Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. AUSÊNCIA DE
EFICÁCIA GERAL VINCULANTE DO PARADIGMA INVOCADO.

10
INVIABILIDADE DA UTILIZAÇÃO DE RECLAMAÇÃO COMO

9
SUCEDÂNEO RECURSAL. AGRAVO AO QUAL SE NEGA

:43 l 41
PROVIMENTO. I - Ausente a e cácia geral vinculante do paradigma
invocado, cuja relação processual a reclamante não integrou, incabível se mostra
a via reclamatória. II - Somente são legitimados à propositura de reclamação

:46 c
constitucional aqueles prejudicados por atos contrários às decisões de e cácia

09 10 R
vinculante e geral ou, ainda, a parte que compôs a relação processual, onde a
decisão, que se objetiva preservar, tenha alcance subjetivo. III – É rme a
orientação jurisprudencial desta Suprema Corte no sentido da impossibilidade
0 - 1-
do uso da reclamação constitucional como sucedâneo recursal. IV – Agravo

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regimental ao qual se nega provimento.
02 .98

(Reclamação 27622 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ 30.4.18,


negrito nosso)
8/2 95

70. Já decidiu o Supremo Tribunal Federal que: “O remédio constitucional da


7/0 5.7

reclamação não pode ser utilizado como um (inadmissível) atalho processual


destinado a permitir, por razões de caráter meramente pragmático, a submissão
: 2 : 00

imediata do litígio ao exame direto do Supremo Tribunal Federal. Precedentes.”


(AgRg na Reclamação 5.926, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 13.11.09). Pensar de
Em por

modo contrário, significaria aceitar a reclamação constitucional como se fosse um


atalho constitucional, algo aliás que o Supremo Tribunal Federal não admite.48
sso

71. Assim, não cabe a presente reclamação por ofensa ao quanto decidido na
ADIn 2797, já que na decisão ora questionada não houve violação ao efeito
pre

vinculante da parte dispositiva do julgado. É que a reclamação somente seria cabível


se restasse demonstrado um efeito revigorador49 da súmula 394 ou da lei 10.628, de
Im

2002 na decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Em outros


termos, que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro as tivesse
revigorado.

-VII-
48
Entre outros: AgRg na Rcl 5.926, j. 26.6.09, DJe 12.11.09.
49
Não se pretende discutir aqui diferenças elencadas pela doutrina acerca de repristinação, efeito
repristinatório e efeito revigorador. A ideia que se busca reter se refere a um novo aproveitamento
da súmula 394.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 19/31


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72. Vejamos,então, o exame de suposta violação ao julgamento da Ação Penal


937 (QO).

73. Decidiu o Supremo Tribunal Federal na Ação Penal 937 (Questão de


Ordem):
Ementa: Direito Constitucional e Processual Penal. Questão de Ordem em

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Ação Penal. Limitação do foro por prerrogativa de função aos crimes
praticados no cargo e em razão dele. Estabelecimento de marco temporal de
xação de competência. I. Quanto ao sentido e alcance do foro por prerrogativa

10
1. O foro por prerrogativa de função, ou foro privilegiado, na interpretação até
aqui adotada pelo Supremo Tribunal Federal, alcança todos os crimes de que

9
são acusados os agentes públicos previstos no art. 102, I, b e c da Constituição,

:43 l 41
inclusive os praticados antes da investidura no cargo e os que não guardam
qualquer relação com o seu exercício. 2. Impõe-se, todavia, a alteração desta

:46 c
linha de entendimento, para restringir o foro privilegiado aos crimes praticados

09 10 R
no cargo e em razão do cargo. É que a prática atual não realiza adequadamente
princípios constitucionais estruturantes, como igualdade e república, por
impedir, em grande número de casos, a responsabilização de agentes públicos
por crimes de naturezas diversas. Além disso, a falta de efetividade mínima do
0 - 1-

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sistema penal, nesses casos, frustra valores constitucionais importantes, como a
02 .98

probidade e a moralidade administrativa. 3. Para assegurar que a prerrogativa


de foro sirva ao seu papel constitucional de garantir o livre exercício das
funções – e não ao m ilegítimo de assegurar impunidade – é indispensável que
8/2 95

haja relação de causalidade entre o crime imputado e o exercício do cargo. A


7/0 5.7

experiência e as estatísticas revelam a manifesta disfuncionalidade do sistema,


causando indignação à sociedade e trazendo desprestígio para o Supremo. 4. A
orientação aqui preconizada encontra-se em harmonia com diversos
: 2 : 00

precedentes do STF. De fato, o Tribunal adotou idêntica lógica ao condicionar


a imunidade parlamentar material – i.e., a que os protege por suas opiniões,
Em por

palavras e votos – à exigência de que a manifestação tivesse relação com o


exercício do mandato. Ademais, em inúmeros casos, o STF realizou
interpretação restritiva de suas competências constitucionais, para adequá-las
sso

às suas nalidades. Precedentes. II. Quanto ao momento da xação de nitiva


da competência do STF 5. A partir do nal da instrução processual, com a
publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações nais, a
pre

competência para processar e julgar ações penais – do STF ou de qualquer


outro órgão – não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar
Im

outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo. A
jurisprudência desta Corte admite a possibilidade de prorrogação de
competências constitucionais quando necessária para preservar a efetividade e a
racionalidade da prestação jurisdicional. Precedentes. III. Conclusão 6.
Resolução da questão de ordem com a xação das seguintes teses: “(i) O foro
por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o
exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas; e (ii) Após o nal
da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para
apresentação de alegações nais, a competência para processar e julgar ações
penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar cargo ou

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 20/31


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deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo”. 7. Aplicação da nova
linha interpretativa aos processos em curso. Ressalva de todos os atos
praticados e decisões proferidas pelo STF e demais juízos com base na
jurisprudência anterior. 8. Como resultado, determinação de baixa da ação
penal ao Juízo da 256ª Zona Eleitoral do Rio de Janeiro, em razão de o réu ter
renunciado ao cargo de Deputado Federal e tendo em vista que a instrução
processual já havia sido nalizada perante a 1ª instância.
(negrito nosso, AP 937 QO, Rel. Luís Roberto Barroso, j. 3.5.18, publicação

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11.12.18)

74. Comentando essa decisão, explica a doutrina:

9 10
Na medida em que os autos ainda estavam no STF, o Min. Barroso, Relator,

:43 l 41
suscitou a questão de ordem para enfrentar o tema da prerrogativa de foro.
Descrevendo uma problemática, qual seja, o que chamou de
“disfuncionalidade prática do regime de foro”, sustentou a necessidade de se

:46 c
repensar o instituto, seja por alteração constitucional (lembramos que o

09 10 R
Senado Federal aprovou a PEC 10/2013), seja por drástica mudança de
interpretação constitucional (mutação constitucional), a partir de três razões:

. razões filosóficas: “trata-se de uma reminiscência aristocrática, não


0 - 1-

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republicana, que dá privilégio a alguns, sem um fundamento razoável”;
02 .98

. razões estruturais: “Cortes Constitucionais, como o STF, não foram


concebidas para funcionarem como juízos criminais de 1.º grau, nem têm
8/2 95

estrutura para isso. O julgamento da Ação Penal 470 (conhecida como


Mensalão) ocupou o Tribunal por um ano e meio, em 69 sessões”;
7/0 5.7

. razões de justiça: “o foro por prerrogativa é causa frequente de impunidade,


: 2 : 00

porque dele resulta maior demora na tramitação dos processos e permite a


manipulação da jurisdição do Tribunal”.
Em por

No dia 03.05.2018, 6 Ministros aderiram integralmente às seguintes teses,


estabelecendo que a nova linha interpretativa (inegável viragem
jurisprudencial, a partir de mutação constitucional) deva ser aplicada
sso

imediatamente aos processos em curso, com a ressalva de todos os atos


praticados e decisões proferidas pelo STF e pelos demais juízos com base na
pre

jurisprudência anterior, conforme precedente firmado na Questão de Ordem


no Inquérito 687 (Rel. Min. Sydney Sanches, j. 25.08.1999). Vejamos:
Im

“o foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos


durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas”; e

“após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de


intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar
e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a
ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o
motivo”. (Pedro Lenza, Direito constitucional esquematizado. 24a. ed. São
Paulo : Saraiva, 2020, p. 423, negrito nosso)

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 21/31


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75. Seja como for, mister destacar que, em nenhum momento, se reconhece
caráter vinculante a esse julgado tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência. A
decisão, com efeito, não foi proferida em sede de controle concentrado. A decisão
não tem, portanto, efeito vinculante. Não vincula os demais órgãos do Poder
Judiciário. Tanto assim que a parte dispositiva do acórdão se limita a determinar a
baixa dos autos. Decisão proferida em processo objetivo e em sede de controle
concentrado de constitucionalidade não gera baixa dos autos. O processo onde está

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fica: no Supremo Tribunal Federal.

10
76. Não há efeito vinculante em julgamento proferido no bojo de uma ação
penal, cujo desfecho limita-se a condenar ou absolver. A questão de ordem, a seu

9
turno, é de índole endógena, não sendo possível atribuir-lhe efeito vinculante. Na

:43 l 41
AP 937, a questão de ordem foi suscitada ex officio pelo Ministro Luís Roberto
Barroso.

:46 c
09 10 R
77. Ora, como a decisão da AP 937 (QO) não tem efeito vinculante, não há
que se admitir o cabimento da presente reclamação constitucional por esse
fundamento.
0 - 1-

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02 .98

78. Em casos semelhantes, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal


inclina-se fortemente pelo não conhecimento da reclamação. É que “inexistindo, in
8/2 95

casu, precedente fruto de exercício da fiscalização abstrata de constitucionalidade, a


reclamação constitucional não pode ser admitida, sob pena de frustrar a teleologia
7/0 5.7

indispensável para a subsistência do sistema recursal pelo manejo indevido da


medida como sucedâneo de recurso de índole ordinária ou extraordinária” (Rcl
: 2 : 00

12.692 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 20.3.14, negrito nosso). No mesmo sentido:
Em por

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. AUSÊNCIA DE


EFICÁCIA GERAL VINCULANTE DO PARADIGMA INVOCADO.
INVIABILIDADE DA UTILIZAÇÃO DE RECLAMAÇÃO COMO
sso

SUCEDÂNEO RECURSAL. AGRAVO AO QUAL SE NEGA


PROVIMENTO. I - Ausente a e cácia geral vinculante do paradigma
pre

invocado, cuja relação processual a reclamante não integrou, incabível se mostra


a via reclamatória. II - Somente são legitimados à propositura de reclamação
constitucional aqueles prejudicados por atos contrários às decisões de e cácia
Im

vinculante e geral ou, ainda, a parte que compôs a relação processual, onde a
decisão, que se objetiva preservar, tenha alcance subjetivo. III – É rme a
orientação jurisprudencial desta Suprema Corte no sentido da impossibilidade
do uso da reclamação constitucional como sucedâneo recursal. IV – Agravo
regimental ao qual se nega provimento.
(Reclamação 27622 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ 30.4.18,
negrito nosso)

79. Em suma, o cabimento de reclamação constitucional do tipo objetivo


somente se legitima se a decisão acaso desrespeitada tiver efeito vinculante, tiver

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 22/31


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sido proferida em sede de controle concentrado. Incabível, portanto, a presente


reclamação constitucional, já que desprovida de efeito vinculante a decisão do
Supremo Tribunal Federal que se alega desrespeitada (QO na AP 937).

- VIII-

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80. Resta, por fim, o exame da presente reclamação na parte em que se
apresenta como reclamação subjetiva (de parte)50: violação à decisão da Reclamação

10
n. 32.989.

9
:43 l 41
81. Na reclamação n. 32.989, o Ministro Relator, em sede monocrática, não a
conheceu nos seguintes termos:

:46 c
"(…) 2. Assento imprópria a autuação. A tônica, no âmbito da Administração

09 10 R
Pública, é a publicidade. O sigilo corre à conta de situações jurídicas em que a
lei o preveja. Nada justi ca lançar, no cabeçalho, apenas as iniciais do
reclamante, em razão, até mesmo, da ampla divulgação dada a este processo. O
0 - 1-

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Pleno do Supremo, na sessão do dia 3 de maio de 2018, ao apreciar a questão
02 .98

de ordem na ação penal nº 937, relator ministro Luís Roberto Barroso,


procedeu à reinterpretação da Constituição Federal, considerada a prerrogativa
de foro, a rmando que o instituto pressupõe delito cometido no exercício do
8/2 95

mandato e a este, de alguma forma, ligado. Excepcionou o entendimento


conforme o estágio no qual o processo se encontre, a rmando ter a fase de
7/0 5.7

alegações nais o efeito de prorrogar a competência. Acompanhei o Relator em


parte, por entender pertinente a interpretação conferida ao preceito
: 2 : 00

constitucional, tendo formado na corrente vencida tão somente quanto à


ressalva, ante a premissa segundo a qual é improrrogável competência absoluta.
Reitero o que sempre sustentei: a competência do Tribunal é de Direito
Em por

estrito, está delimitada, de forma exaustiva, na Constituição Federal. As regras


respectivas não podem merecer interpretação ampliativa. A Lei Maior, ao
sso

prever cumprir ao Supremo julgar Deputados e Senadores, há de ter


abrangência de nida pela conduta criminosa: no exercício do mandato e
relacionada, de algum modo, a este último. Neste processo, a leitura da inicial
pre

revela que o reclamante desempenhava, à época dos fatos narrados, o cargo de


Deputado Estadual na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, tendo sido
Im

diplomado Senador da República no último dia 18 de dezembro. A situação


jurídica não se enquadra na Constituição Federal em termos de competência
do Supremo. Frise-se que o fato de alcançar-se mandato diverso daquele no
curso do qual supostamente praticado delito não enseja o chamado elevador
processual, deslocando-se autos de inquérito, procedimento de investigação
penal ou processo-crime em tramitação. Percebam a excepcionalidade da
reclamação. Pressupõe a usurpacão da competência do Tribunal, o desrespeito
a pronunciamento que haja formalizado ou a verbete dotado de e cácia

50
Partes da Reclamação 32989: Reclamante Flavio Nantes Bolsonaro e Reclamado Ministério
Público do Estado do Rio de Janeiro.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 23/31


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vinculante. Descabe utilizá-la, considerados os limites próprios, como


sucedâneo de habeas corpus. Não existe, juridicamente, requerimento
direcionado a ver deferida ordem de ofício, cuja iniciativa é exclusiva do Órgão
julgador. 3. Reti quem a autuação para fazer constar, por inteiro, o nome do
reclamante, devendo a Secretaria observar o sigilo quanto ao conteúdo do
processo, a teor do artigo 6º, parágrafo único, da Lei Complementar nº
105/2001. 4. Nego seguimento à reclamação, cando prejudicada a medida
cautelar." (negrito nosso, decisão de 1.12.19)

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82. Da leitura da decisão, extrai-se que a Reclamação 32.989 foi proposta com
fulcro na tese de que estaria havendo desrespeito à competência do Supremo

10
Tribunal Federal porque o então reclamante (Flávio Nantes Bolsonaro), por ser

9
parlamentar federal, deveria ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal. Em

:43 l 41
síntese, estaria sendo usurpada a competência do Supremo Tribunal Federal.

:46 c
83. Ora, o que foi dito pelo Min. Marco Aurélio é que a reclamação não

09 10 R
poderia ser conhecida, já que os atos que teriam sido praticados pelo reclamante se
deram no exercício não do mandato federal, mas do mandato estadual, o que
afastaria a competência do Supremo Tribunal Federal. Não coube a alegação,
0 - 1-

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portanto, de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal, a justificar
02 .98

o cabimento de reclamação. Não esteve aberta a jurisdição do Supremo Tribunal


Federal, pois.
8/2 95

84. Além de não se ter na decisão da Reclamação 32989 pronunciamento de


7/0 5.7

cunho material (de discussão de tese jurídica de direito processual propriamente


dita), deve-se perceber que não houve sequer recurso da decisão monocrática.
: 2 : 00

Aconteceu o trânsito em julgado.51 Noutros termos, reclamante e reclamado


concordaram com o acerto da decisão monocrática, mesmo tendo a possibilidade
Em por

de um reexame mediante a interposição de recurso. Aceitaram o trânsito em


julgado da decisão que firmava a ausência de competência do Supremo Tribunal
Federal para julgar a reclamação.
sso

85. E, nesse ponto, cumpre frisar que o Min. Marco Aurélio não disse qual
pre

juiz seria competente, apenas sinalizou que não estava aberta a jurisdição do
Supremo Tribunal Federal para o julgamento daquela reclamação. Em outros
Im

termos: não deu a liminar e não reconheceu a existência de usurpação da


competência do Supremo Tribunal Federal. Apenas isso. Logo, essa decisão não
tem o condão de se projetar para além das partes dela52, que dela não recorreram e,
portanto, concordaram que o foro originário não era do Supremo Tribunal
Federal.

51
Segundo pesquisa realizada no site do STF.
52
Partes da Reclamação 32989: Reclamante Flavio Nantes Bolsonaro e Reclamado Ministério
Público do Estado do Rio de Janeiro.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 24/31


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86. Em conclusão:

(i) Não restou comprovado que a decisão ora reclamada


revigorou o enunciado da Súmula n. 394 do Supremo Tribunal
Federal e/ou a lei n. 10.628, de 2002, partes integrantes do
dispositivo do acórdão da ADIn 2797 julgada pelo STF;

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(ii) Não cabe reclamação constitucional objetiva (de não parte)
para garantir julgado do Supremo Tribunal Federal desprovido
de efeito vinculante (AP 937 QO);

9 10
(iii) Não cabe reclamação constitucional subjetiva (de parte) para

:43 l 41
discutir decisão monocrática proferida em sede de reclamação
constitucional que apenas entendeu ausente usurpação da

:46 c
competência do Supremo Tribunal Federal.

09 10 R
- IX -
0 - 1-
87. Uma vez que se superem os óbices já elencados, é preciso repisar a função

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da reclamação constitucional no sistema constitucional brasileiro para o Supremo
02 .98

Tribunal Federal: ela só serve para a preservação da competência do Supremo


Tribunal Federal e para a garantia da autoridade das decisões do Supremo
8/2 95

Tribunal Federal.
7/0 5.7

88. Seu campo de atuação é restrito, nem poderia ser diferente. Não se pode
: 2 : 00

transformar uma corte constitucional em uma corte de execução. A jurisdição


constitucional não se elastece para ser juízo de execução. Não se estende para ser
juízo de cumprimento de sua jurisprudência.
Em por

89. Na presente reclamação, o pedido feito mostra-se mais abrangente não só


sso

do que a própria reclamação – que se destina apenas a cassar decisões – como


também dos precedentes evocados para se conseguir provimento judicial ainda
pre

inédito na própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

90. O pedido da inicial, ainda que mascarado apenas com “o fim de cassar a


Im

decisão da 3a. Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de


Janeiro”, traz em seu bojo diversas consequências jurídicas implícitas, quais sejam:
(i) garantir o foro de 1º grau, (ii) aclarar regra de competência, (iii) prática de
overruling e (iv) higidez de investigação.

91. Em verdade, a presente reclamação, acaso provida, ou traria o caso para a


competência do Supremo Tribunal Federal ou cassaria decisão do Tribunal de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro impondo-lhe a obediência a uma decisão da

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 25/31


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Corte Constitucional com efeito vinculante. Não teria, pois, o condão de


determinar resolver qual o tribunal competente em um caso inédito como o
presente.

92. Provimento de tal categoria há de ser obtido pelos meios recursais


ordinários, já que o reclamante não demonstrou a violação à competência do
Supremo Tribunal Federal. Se houvesse violação à competência do Supremo

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Tribunal Federal, aí sim a competência seria do Supremo Tribunal Federal
estabelecida por ele próprio. Diria a corte: minha competência foi usurpada, logo

10
julgarei o processo.

9
93. Em outras palavras, aclarar a competência somente aconteceria, no caso

:43 l 41
em tela, se o Supremo Tribunal Federal assumisse a usurpação da sua competência.
Fora dessa hipótese não há como a reclamação ser conhecida; não há como dizer

:46 c
qual o juízo competente, pois.

94. 09 10 R
Também na inicial pretende-se, ainda que de forma disfarçada, a prática
de overruling.53 Quando o Supremo Tribunal Federal decidiu a Questão de
0 - 1-

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Ordem na Ação Penal 937 ficaram a descoberto diversas situações fáticas não
02 .98

pensadas e não contempladas no caso então em exame.


8/2 95

95. As teses traduzem princípios, muito mais que regras. Não se dispôs sobre
toda a casuística.
7/0 5.7

96. As teses estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal foram:


: 2 : 00

III. Conclusão 6. Resolução da questão de ordem com a xação das seguintes


teses: “(i) O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes
Em por

cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções


desempenhadas; e (ii) Após o nal da instrução processual, com a publicação
do despacho de intimação para apresentação de alegações nais, a competência
sso

para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente
público vir a ocupar cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o
pre

motivo”.
(negrito nosso)
Im

97. Na AP 937, o caso subjacente versava sobre a suposta captação ilícita de


sufrágio operada pelo então Prefeito de Cabo Frio/RJ, Marcos da Rocha Mendes.
Candidato à reeleição, o Chefe do Executivo Municipal teria, de acordo com a
denúncia oferecida pelo MPRJ, angariado votos mediante a entrega de dinheiro em
espécie e de alimentos para os eleitores, configurando-se o crime tipificado no art.
299, do Código Eleitoral.
53
Na doutrina ver: Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira. Curso de
direito processual civil 2, 2016, p. 510

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 26/31


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98. No ano de 2015, Marcos da Rocha Mendes assume o mandato de


Deputado Federal. Tem-se, portanto, um hiato estabelecido entre o mandato de
prefeito e o mandato de parlamentar. Nas eleições de 2016, Marcos Rocha Mendes
retorna ao cargo de Prefeito.

99. Por fim, em recurso especial eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral nega o

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seu registro de candidatura no ano de 2018, extinguindo-se, com isso, o mandato.
No julgamento, o Tribunal Superior Eleitoral aplicou a LC n. 135/2010 (Lei da

10
Ficha Limpa)54.

9
100. Nota-se que o case da Ação Penal 937 jamais se ocupou de parlamentares

:43 l 41
eleitos, de maneira ininterrupta, muito menos para casas legislativas diversas.
Trata-se de uma especificidade que, por si só, já distingue os casos cotejados.

:46 c
09 10 R
101. Ainda no que tange à AP 937 QO/RJ, o requerente aponta alguns casos
provenientes do entendimento nela firmado, quais sejam:
0 - 1-

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AgR no INQ 4204/DF (Deputado Federal Adelson Barreto);
02 .98

INQ 4703 QO/DF (Deputado Estadual Sérgio Ricardo de Almeida);


8/2 95


7/0 5.7

• AgR na PET 7674/PR (Deputado Federal Luiz Hiloshi Nishimori);


: 2 : 00

• AP 647/PR (Deputado Federal Hidekazu Takayama);

ED no INQ 3621 (Senador Weverton Rocha Marques de Souza)


Em por

• AgR no INQ 4358


sso

• PET 7734
pre

102. Após a exposição destas decisões, o autor da demanda consigna que “ De


Im

acordo com os precedentes expostos, a tese jurídica adotada pela 3ª Câmara


Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro [...] mostra-se
incoerente e destoante da jurisprudência vinculante do Supremo Tribunal Federal”
(negrito nosso).

103. No mais, muitos dos julgados mencionados também se distinguem da


decisão ora reclamada, notadamente pela existência de um vácuo entre os mandatos
54
TSE, RESPE nº 0000266-94.2016.6.19.0096.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 27/31


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ocupados. É o caso do INQ 4204 (Dep. Federal Adelson Barreto), que teve seu
mandato interrompido por cassação.

104. No INQ 3621 (Sen. Weverton Rocha Marques de Souza), o cargo anterior
era de Secretário estadual. No INQ 4358, os supostos delitos foram praticados, em
tese, em circunstâncias alheias à atividade parlamentar. E assim por diante...

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105. O Superior Tribunal de Justiça replicou a tese fixada na AP 937 QO, de
modo a restringir o foro de governadores e conselheiros de contas para somente

10
contemplar as hipóteses em que os delitos foram praticados durante o exercício do

9
cargo e em razão deste (Corte Especial, QO na APn 857).

:43 l 41
106. Não o fez, porém, quando se trata de Desembargadores. Neste caso, após

:46 c
uma distinção, o Superior Tribunal de Justiça simplesmente manteve o foro por

09 10 R
prerrogativa de função, independentemente de considerações outras sobre nexo
temático e contemporaneidade (APn 878 QO), ou seja, nessa casuísta, a tese fixada
0 - 1-

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na AP 937 QO restou afastada.
02 .98

107. É dever constatar ainda que no âmbito do próprio Supremo Tribunal


8/2 95

Federal há questões pendentes referentes à interpretação do acórdão da AP 937


(QO), como, por exemplo, a questão dos mandatos sucessivos e dos “mandatos
7/0 5.7

cruzados”.
: 2 : 00

108. A Segunda Turma, em acórdão ainda não transitado em julgado, decidiu:


Em por

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO


REGIMENTAL. INQUÉRITO CRIMINAL. DECLÍNIO DE
COMPETÊNCIA. APLICAÇÃO DE ENTENDIMENTO DO PLENO
sso

DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA QUESTÃO DE ORDEM


DA AÇÃO PENAL 937. PARLAMENTAR FEDERAL. “MANDATOS
pre

CRUZADOS”. INSURGÊNCIA DESPROVIDA.


1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar Questão de Ordem
Im

suscitada nos autos da AP 937, de relatoria do eminente Ministro Luís


Roberto Barroso, decidiu que a competência desta Corte para processar e
julgar parlamentares, nos termos do art. 102, I, b, da Constituição Federal,
restringe-se aos delitos praticados no exercício e em razão da função pública.
2. Vislumbrada a presença das balizas estabelecidas pelo Pleno do Supremo
Tribunal Federal, o foro por prerrogativa de função alcança os casos
denominados de “mandatos cruzados” de parlamentar federal.
3. Agravo regimental desprovido.
(ementa dos embargos de declaração no Inquérito 4.432, j. 25.10.19).

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 28/31


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109. Por outro lado, há algumas decisões monocráticas proferidas pelos


Ministros da 1a. Turma do Supremo Tribunal Federal no sentido de que o foro
por prerrogativa de função não alcança a situação de um parlamentar que deixa de
ocupar o cargo eletivo, por causa do término da legislatura, para assumir um outro,
mas em uma casa legislativa diferente.

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110. Nessa linha, cita-se decisão do Ministro Marco Aurélio que, ao interpretar
o julgado da AP 937 (QO), dele extraiu que não deve ser julgado pelo Supremo

10
Tribunal Federal atual Deputado Federal acusado de cometer crime ao tempo que
ocupava o cargo de Senador da República:

9
:43 l 41
Neste inquérito, constata-se que só delitos praticados ao investigado Aécio
Neves da Cunha, atualmente Deputado Federal, teriam sido cometidos no

:46 c
exercício do cargo de Senador da República, e em razão deste. A situação

09 10 R
jurídica não se enquadra na Constituição Federal em termos de competência
do Supremo.
3. Declino da competência para a primeira instância da Justiça Federal de São
0 - 1-
Paulo, Subseção Judiciária de São Paulo/SP, considerado o local do suposto

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cometimento de parte dos delitos imputados. Requisitem os autos ao
02 .98

Departamento de Polícia Federal, para a remessa cabível.


(decisão no Inquérito 4519, decisão de 5.2.19)
8/2 95

111. No mesmo sentido, são as decisões na AP 1.035 (Rel. Min. Rosa Weber) e
7/0 5.7

no INQ 4624 (Rel. Min. Marco Aurélio).


: 2 : 00

112. Da mesma forma que não há definição pacífica do Supremo Tribunal


Federal sobre “mandatos cruzados” no nível federal, também não há definição de
Em por

“mandatos cruzados” quando o eleito deixa de ser representante do povo na casa


legislativa estadual e passa a ser representante do Estado da Federação no Senado
sso

Federal (câmara representativa dos Estados federados).


pre

113. Dessa breve exposição, constata-se que há diversas hipóteses e situações que
não foram ainda pacificadas pelo Supremo Tribunal Federal. Igualmente também
Im

surgirão diversas interpretações acerca do julgamento da AP 937 (QO). É normal


que isso aconteça. É do sistema. O entendimento firmado pelo Supremo Tribunal
Federal ainda está sendo decantado pelo corpo do Poder Judiciário.

114. Daí que a presente reclamação, com efeito, busca um entendimento


jurisprudencial ainda não firmado. A hipótese subjacente ao processo (parlamentar
estadual que virou senador e está respondendo por atos que teriam sido praticados

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 29/31


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no exercício da função de deputado estadual) não foi ainda tratada pelo Supremo
Tribunal Federal.

115. Não dá para se exigir efeito vinculante de decisão do Supremo Tribunal


Federal que não existe. Noutros termos, a casuística in concreto mostra-se maior
que as hipóteses vislumbradas pelas decisões (seja do Superior Tribunal de Justiça,

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seja do Supremo Tribunal Federal).

116. Entende-se, ainda, a pretensão da reclamação (aliás legítima) de garantir a

10
higidez da investigação que já está em avançado estágio. Mas isso já o fez o

9
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Janeiro quando assentou:

:43 l 41
(…) Quanto ao pleito que persegue a nulidade da investigação, não encontra

:46 c
melhor sorte a impetração. Em primeiro lugar, o aproveitamento dos atos

09 10 R
processuais praticados por juízo incompetente, em homenagem aos princípios
da instrumentalidade das formas, da celeridade e da economia processual,
encontra assento tanto na seara do direito processual civil quanto do direito
0 - 1-
processual penal, conforme artigos 64, § 4º, 240, 802 e 957 do CPC e art. 567

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do CPP, este último permitindo a utilização dos atos instrutórios produzidos,
02 .98

ainda que realizados por autoridade absolutamente incompetente, sendo certo


que até mesmo atos decisórios praticados por juízo incompetente são
8/2 95

rati cáveis, de acordo com o que dispõe o artigo 108, §1º do CPP. (…)
7/0 5.7

117. Por fim, mas não menos importante, cabe frisar sempre a possibilidade de
: 2 : 00

concessão de habeas corpus de ofício pelo Supremo Tribunal Federal. Foi o que
aconteceu, por exemplo, na Reclamação n. 24.506:
Em por

Ante o exposto, inde ro a liminar requerida.


Todavia, por reputar con gurado agrante constrangimento ilegal, passível de
sso

correção por habeas corpus de ofício quando do julgamento de mérito da ação,


determino cautelarmente, sem prejuízo de reexame posterior, a revogação da
prisão preventiva de Paulo Bernardo Silva, decretada nos autos do processo nº
pre

5854-75.2016.403.6181.
Determino, ainda, que o Juízo Federal da 6ª Vara Criminal Especializada em
Im

Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacional e em Lavagem de Valores da


Seção Judiciária de São Paulo avalie a necessidade, se for o caso, de aplicação de
medidas cautelares diversas da prisão, dentre aquelas previstas no art. 319,
incisos I, II, III, IV, V e IX, e no art. 321, ambos do Código de Processo
Penal.
Comunique-se, solicitando à autoridade reclamada informações (RISTF, art.
157) especí cas a respeito das alegações do reclamante em sua exordial, no
sentido de que as diligências levadas a cabo pela autoridade policial e pelo
Parquet Federal, estariam direcionadas tanto às condutas imputadas ao
reclamante quanto às da Senadora Gleisi.

HJ/BNMR - Reclamação n.º 41.910 30/31


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(Reclamação 24.506, decisão monocrática do Ministro Dias Toffoli, de


29.6.16, DJE 30.6.16)

118. Finalizando: a reclamação constitucional não pode ser usada para alcançar
entendimento inédito no âmbito da jurisdição originária do Supremo Tribunal
Federal. Não é esse o seu escopo. A reclamação constitucional não é instrumento

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destinado a fazer tese do porvir (criar fonte do direito) no âmbito da jurisdição
originária do Supremo Tribunal Federal sob pena de desvirtuar tanto a sua
natureza quanto a competência de direito estrito do próprio Supremo Tribunal

10
Federal (CF/88, art. 102, I).

9
:43 l 41
-X -

119. Diante o exposto, manifesta-se o Ministério Público Federal pelo

:46 c
09 10 R
não cabimento da reclamação constitucional proposta.

Brasília, 26 de agosto de 2020.


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HUMBERTO JACQUES DE MEDEIROS
02 .98

Vice-Procurador-Geral da República
8/2 95
7/0 5.7
: 2 : 00
Em por
sso
pre
Im

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