Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
RESUMO
O presente trabalho propõe uma análise de dois livros, cujo viés investigatório
tem uma mesma direção. Portanto, disporemos aqui os resultados das pesquisas de
Mark S. Smith contidas em seu livro “O Memorial de Deus” e de Thomas Römer, em
seu livro “A Origem de Javé”.
ABSTRACT
The present work proposes an analysis of two books, whose research bias has
the same direction. Therefore, we will have here the research results of Mark S. Smith's
in his book "The Memorial of God" and Thomas Römer in his book "The Origin of
Yahweh".
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos muito se tem discutido sobre a ideia de um e único Deus
universal, bem como de uma única religião que represente a maneira correta de se
venerar esse Deus e, que ressalvadas as devidas proporções culturais possam servir para
todos os povos.
É justamente esse tema, que Smith e Römer vão abordar em seus livros. Seus
esforços são para à luz das mais recentes pesquisas, inclusive as arqueológicas mostrar a
origem de Yhwh e como passou a ser primeiramente o Deus tutelar e nacional de Israel,
para depois tornar-se o Deus universal. Assim, o propósito de Smith e Römer é buscar
compreender tanto a origem de Yhwh como do monoteísmo israelita.
Para conseguir expor o seu propósito nesta pesquisa, Smith começa do fim, ou
seja, do que já está convencionado, e o faz em razão das novas descobertas
arqueológicas. Até 1970 toda pesquisa parecia confirmar a estrutura fornecida pela
Bíblia, mas a partir deste ano, a desconfiança e duras críticas colocam-na em dúvida.
2
SMITH, 2006, p. 28.
concepção de Smith é a apresentação do passado que mostre o esforço em determinar a
natureza da evidência no que é narrado ou em julgar o que é autêntico ou verificável3.
3
Ibidem, p. 34.
4
Ibidem, p. 48-49.
5
Ibidem, p. 53-54.
6
Ibidem, p. 79.
7
Ibidem, p. 85.
Smith acredita ser possível uma tolerância cultual conjunta para Yhwh e Baal no
Reino no Norte. No período da conquista assíria sobre o Reino do Norte, Smith sugere
que o Norte apoiava um número de divindades sob a autoridade de um deus nacional, e
o mesmo pode ser dito para Judá, afirma8.
Essa teologia global encontrava seu paralelo na família real, pois em termos
gerais a imagem de Yhwh como um Deus guerreiro e patriarca divino, pressupunha uma
devoção a outros deuses em sua casa divina, mesmo que lhes fossem subordinadas.
Em resumo, é dizer que, o Deus da Bíblia nunca está longe demais da linguagem
da sociedade ou da natureza. Assim, e segundo Smith, para compreender o monoteísmo
de Israel é necessário conhecer seu politeísmo e os de seus antecedentes culturais. Smith
vai se valer especialmente dos textos ugaríticos do período do Bronze Recente e de
outras fontes10.
8
SMITH, 2006, p. 89.
9
Ibidem, p. 131.
10
Ibidem, p. 133.
11
Ibidem, p. 135.
Israel e povos ao redor. A estrutura do cosmos é a principal divisão: Divindades
antropomórficas benéficas e criaturas monstruosas maléficas12. O espaço divino é
dividido em duas categorias: a) Nível horizontal ou terreno (as montanhas, onde as
divindades eram veneradas e distribuíam bênçãos); b) Nível vertical os reinos (marcar
a competição cósmica – Baal, governante do céu; Yamm, governante do mar; Mot,
governante do submundo).
12
Ibidem, p. 134.
13
Imagens descrita ou concebida sob forma humana ou de atributos e características humanas.
14
Imagens descrita ou concebida sob forma animal ou com características animal.
15
Que tem forma de animal.
16
SMITH, 2016, p. 140.
17
Ibidem, p. 141.
18
Ibidem, p. 150-151.
19
Ibidem, p. 151.
Baseado na descoberta de dois manuscritos da 4ª Caverna de Qumran de Dt 32.8-9,
Smith afirma que numa tradução mais literal, após a divisão da humanidade feita por El,
coube a Yhwh à sua porção, Jacó para que fosse seu deus patrono/tutelar20.
Quanto a nova visão religiosa monoteísta, Smith diz que representa para Israel
uma resposta à ameaça externa dos impérios mesopotâmicos e desafio interno da
deterioração social. Segundo os padrões do Oriente Próximo, enquanto os reis
permanecessem no poder, isso era sinal de poder e proteção do deus patrono. Mas,
quando eram subjugados significava a impotência desse deus ou uma punição ao seu
reino22. É justamente essa crise ideológica e teológica que se abate nos judeus, quando
Judá é arrasada pela Babilônia. Embora, segundo Smith, Israel se aproprie dessa
ideologia, que entende ser assíria, uma mudança merece destaque. O poder de Yhwh
não equivale ao poder do rei.
20
SMITH, 2006, p. 160-161.
21
Ibidem, p. 172.
22
Ibidem, p. 174.
representações bíblicas sobre o passado de Israel23. Quando se propõe a falar sobre o
papel da memória em várias culturas do Antigo Oriente Próximo, Smith cita
especialistas como Assman (1990, 1997); sobre o Egito, Jonker (1995); sobre a
Mesopotâmia, Schottroff (1967), Brettler (2001), Fleming (1998), Hendel (2001a,
2002a); sobre o Antigo Israel, Brandfon (1987), Bloch Smith (2003); sobre o estudo da
Bíblia e a arqueologia, Yerushalmi (1988), Funkenstein (1993); sobre a memória e
tradição judaica, Gerhardsson (1961), Riesner (1988)24.
23
SMITH, 2006, p. 183.
24
Ibidem, p. 184.
25
Ibidem, p. 208.
26
Ibidem, p. 203-213.
Para Smith, o monoteísmo em Israel seguiu o que chama de “métodos de
monoteísmo”. Primeiro Yhwh adquire as características das outras divindades, enquanto
estas são negadas. Segundo, a negação dos outros deuses pela afirmação de que
tradições mais antigas associadas a Yhwh, não pertenciam a ele. Terceiro, amnésia da
memória coletiva de Israel em tratar os outros deuses, como os deuses de outros povos,
ou seja, condenavam aquilo que algum dia pertenceram a eles27.
Passaremos agora a pesquisa de Thomas Römer. Seu livro foi lançado neste ano
(2016) no Brasil pela Editora Paulus com o título “A Origem de Javé. O Deus de Israel
e seu nome”. O título original é “L’invention de Dieu”, que traduzido literalmente, quer
dizer: “A invenção de Deus”. A apresentação desta obra na versão brasileira feita pelo
Dr. José Ademar Kaefer explica o significado de “invenção” para Römer: “... é uma
27
SMITH, p. 216-218.
28
Ibidem, p. 219-223.
construção progressiva de tradições sedimentadas cuja história desordenou os estratos
até fazer emergir uma forma inédita” 29.
Assim, como Smith, a pesquisa de Römer se interessa pelo Deus da Bíblia e sua
origem. Também busca compreender o estabelecimento do monoteísmo em Israel, que
culminou na expressão religiosa mundial mais antiga dessa ideia, o Judaísmo, seguido
posteriormente pelo Cristianismo e Islamismo.
Römer inicia seu livro apresentando uma visão geral da divisão da Bíblia
Hebraica. Ele dispõe os temas estruturais de Gênesis e nos quatro livros subsequentes
(Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio) o tema especial é o “nascimento e a morte
de Moisés”. Aqui Römer já pincela mudanças na identidade tanto de “ser judeu” como
da “divindade”. Inicialmente é judeu quem descende de Abraão, mas com Moisés, é
judeu quem adere a aliança entre Yhwh e Israel. Sobre Yhwh, Ele é o Deus universal,
criador de todas as coisas; em José é o Deus dos hebreus e egípcios; com os patriarcas,
o Deus clãnico (Abraão, Isac e Jacó) e, com Moisés o Deus guerreiro e da tempestade30.
No primeiro capítulo Römer aborda a questão do Deus de Israel e seu nome. Ele
adota, portanto, a designação Yhwh como o Deus de Israel. Römer a partir de Gn 1 e 2
se vê em um dilema. Será que o título “Elohim” para o Deus único, não quer significar
em si uma reunião de divindades? Esse mesmo dilema persegue os massoretas (II-X
29
RÖMER, 2016, p. 15. Por José Ademar Kaefer.
30
Ibidem, p. 16.
31
Ibidem, p. 17.
d.C) que procuravam, quando do sistema de vocalização, dar sentido para o nome
próprio do Deus de Israel. Por isso, a partir do século III d.C., o Judaísmo não mais o
pronuncia, e as razões são: a) Numa visão monoteísta, não convém o único Deus ter um
nome próprio e; b) combater usos mágicos do nome divino.
Após destacar as hipóteses, Römer acredita que Yhwh surgiu ao sul da Palestina,
no território de Edom e da Arábia. Para ele, os testemunhos arqueológicos, epigráficos e
iconográficos mostram um povo ou grupo por nome “Shasu” em território de Edom,
Seir e da Arábia no momento de transição entre o Bronze Recente e a Idade do Ferro. E
entre eles havia um grupo cujo deus se chamava Yhw37. Römer também se arroga em
quatro textos bíblicos para comprovar a origem sulista de Yhwh – Dt 33.2; Jz 5.4-5; Sl
68.7-9; Hc 3. Assim, antigamente Yhwh estava ligado a uma divindade da montanha no
deserto, e possuía aspectos de um deus da guerra e da tempestade.
32
Theo" vem do grego e significa Deus e "fórico" também, e quer dizer carregar/portar. Logo, "teofórico"
é todo nome que faz referencia a Deus através de elementos presentes no próprio nome. Consulta:
http://www.dicionarioinformal.com.br/teof%C3%B3rico/acesso em 20/12/2016 ás 1h40.
33
RÖMER, 2016, p. 36.
34
Ibidem, p. 36.
35
Ibidem, p. 39.
36
Ibidem, p. 43.
37
Ibidem, p.46-47.
Römer também argumenta sobre uma possível ligação entre Yhwh e o deus
egípcio Set, que no segundo milênio antes de nossa era foi transportado para o sul do
Levante, e assim, como Yhwh era o deus do estrangeiro e tutelar dos egípcios
migrantes38.
Segundo a análise de Römer, por estranho que pareça a montanha onde Yhwh se
revela a Moisés estar em território madianita (Êx 3). Desta forma, Römer conjectura a
possibilidade destas referências fazerem alusão a uma contribuição madianita ao culto
de Yhwh40.
38
RÖMER, 2016, p. 55-56.
39
Ibidem, p. 60.
40
Ibidem, p. 69.
41
Ibidem, p. 76.
tutelar42. Römer quer aqui pontuar que, antes de Yhwh ser venerado como o deus
nacional e tutelar de Israel, esse lugar era de El. As narrativas patriarcais e as séries de
epítetos para El, principalmente entre os capítulos 12-50 de Gênesis confirmam essa
ideia (El Elion, El Roi, El Olam, El Shadday, e outros).
Para Römer Yhwh é introduzido em Israel pelo grupo dos Shasu ou Hapiru, após
uma vitória sobre os egípcios. Yhwh é introduzido primeiro em Benjamim e Efraim,
onde Israel se encontra. É só com Saul e Davi que Yhwh é introduzido como o Deus
tutelar de Jerusalém43. Esse aspecto é objeto de análise do capítulo cinco.
Antes de Yhwh ser introduzido em Jerusalém (c. 1000 a.C.), muitas divindades
eram veneradas, geralmente ligadas à fertilidade, ceifas e colheitas. Ex.: Anat (Anatoth
Jr 1.1-2), Baal (Baal-Perasim 2Sm 5), Dagom (Bet-Dagom Js 15.41), El (Bet-El),
Shamash (Bet-Sames 1Sm 6) e muitos outros, assegura Römer. Exceto a famosa Estela
de Tel Dan, os fatos históricos concretos das narrativas bíblicas sobre a monarquia e a
existência dos três primeiros reis de Israel (Saul, Davi e Salomão) são bastante
questionáveis44.
Segundo Römer, antes de Yhwh estar ligado à Jerusalém, estava ligado a arca
que foi construída no Sinai, e que mostrou-se um perigo tanto para os Filisteu, inimigos
de Israel, como para o próprio Israel (1Sm 6.2-3, 19-20). Esta relação pode ser
comparada com os santuários portáteis dos nômades e pelos cofres sagrados atestados
pela iconografia egípcia e de outros45. O que tinha na arca, de acordo com Êx, Dt 10.1-5
e 1Rs 8.9 eram as duas tábuas da lei. Talvez uma substituição às duas pedras sagradas
ou estátuas simbolizando Yhwh e Asherá.
42
RÖMER, 2016, p. 81.
43
Ibidem, p. 87-88.
44
Ibidem, p. 91.
45
Ibidem, p. 94.
46
Ibidem, 2016, p. 107.
No Reino do Norte Yhwh tem a forma de um touro/bezerro e, é identificado
como o Deus do êxodo (1Rs 12.28-30). A novidade é que são dois bezerros. Para
Römer, isso significa um par divino, Yhwh e sua esposa Asherá. Ao analisar o ôstraco
nº 41 de Samaria e o nome “glyw”, Römer afirma que pode ser traduzido por “bezerro
de Yhwh” ou “Yhwh é um bezerro”47. Desta forma, acredita que em forma de touro,
Yhwh foi venerado em Israel, Betel, Samaria, Siquém, Dã e até na Transjordânia.
Segundo a Estela de Mesa (850-810 a.C.) havia um santuário de Yhwh na cidade de
Nebo, a qual ele destruiu48.
No Reino do Sul, Yhwh é venerado como uma figura real, sentado no trono, e
assim, lembra El. Segundo Römer, assim como no Norte, no Sul Yhwh foi venerado em
diversos lugares. Os “ בָּמוֹתbamôts” – “lugares altos”, registrados nos livros de Samuel,
Reis e Crônicas, são santuários locais e ao ar livre, não controlados pelo rei, construídos
em colinas e lugares altos. Nestes santuários, segundo Römer encontrava-se estelas
(massebôtes) e uma Asherah (árvore ou poste sagrado)50. Só e a partir de Ezequias e
Josias estes santuários dão lugar ao Templo de Jerusalém.
Seguindo os exemplos de Amon e Moabe, Römer acredita que em Jerusalém,
Yhwh foi venerado primeiro junto a uma divindade solar e estava subjugado a ela. Aos
poucos foi assumindo superioridade até tornar-se o Deus tutelar de Jerusalém. Segundo
o Sl 82, Yhwh é visto como um dos filhos de El Elion e, está subordinado a ele. Mas,
conforme Dt 32.8, Israel é dado em herança a Yhwh. Estes textos são indícios de
memória de uma ascensão de Yhwh na assembleia dos filhos de El51. Desta forma, a
ascensão de Yhwh se dar pela apropriação de funções e características das outras
divindades.
47
RÖMER, 2016, p. 109.
48
Ibidem, p. 114.
49
Ibidem, p. 118-119.
50
Ibidem, p. 123.
51
RÖMER, 2016, p. 127.
Visto que Yhwh na teologia sionita é representado pela imagem real, e o rei a
sua encarnação na terra, o termo “Molek”, que tem ligação com sacrifícios humanos,
inclusive de crianças, Römer argumenta que talvez antes significasse “Melek” – “rei”,
título atribuído a Yhwh. Assim, ele imagina que antigamente sacrifícios de crianças
foram feitos para Yhwh-Melek52.
Destaca-se, portanto, que foi durante os séculos IX e VIII a.C., que Yhwh
tornou-se o Deus principal, Deus da dinastia davídica e o Deus nacional de Judá,
quando absorve as funções do deus solar e combina as de El e Baal e, assim exalta a sua
superioridade.
De acordo com a Bíblia Hebraica é terminantemente proibido a veneração a
Yhwh por meio de representação iconográfica. É sobre esse tema que Römer apresenta
o oitavo capítulo. Para ele, “as massebôt” (pedras erigidas) são vestígios de culto com
imagens. Römer ver nos textos bíblicos ao menos quatro utilizações: a) Função
funerária ligada a um culto aos mortos (Gn 35.19-30; 2Sm 18.18); b) Comemorar um
acontecimento (Êx 24.2; Js 4); c) Ratificação de contrato (Gn 31.43-45); d)
Endereçada a culto divino (Gn 28.18-22)53. Baseado nos bétilos54 de Mari, Arad e
Neguev, Römer afirma que a “massebah” era uma maneira de representar Yhwh. Em
Judá, segundo o autor, o que comprova tais representações é o interdito “não farás
imagens esculpidas” (Êx 20.3-5). Outras inúmeras citações bíblicas como a expressão
nos Salmos “face de Yhwh” pode-se referir a representação imagética de Yhwh (Sl
10.11; 13.2; 22.25; 30.8).
No capítulo dez, Römer vai nos informar que a queda do Reino do Norte em 722
a.C., para a Assíria, deu a Judá e sua capital Jerusalém desenvolvimento e progresso55.
Com Ezequias e sua política contra a Assíria, Judá perde muitas cidades e ver ser
52
Ibidem, p. 134.
53
Ibidem, p. 140.
54
Römer diz se tratar de pedras utilizadas em um contexto cultual.
55
RÖMER, 2016, p. 176.
levados cativos 200.150 pessoas. No entanto, Jerusalém resiste e permanece, e isso,
fortalece a ideia de que eles eram “o verdadeiro Israel”, “o verdadeiro povo de Yhwh”.
Está posta assim, o fundamento do Templo como único lugar de adoração, Jerusalém a
cidade de Yhwh, e a centralização do culto a Yhwh.
No penúltimo capítulo, Römer fala das reformas de Josias, cujo reinado coincide
com o declínio do Império assírio, e ver o Egito retomar as rédeas do Levante. A
reforma de Josias começa com a descoberta de um rolo (Dt?) (2Rs 22.16-20; 23.1-3, 15,
21-23). Segundo Römer a ideia de achar um livro é muito comum na literatura antiga, e
serve para legitimar mudanças de ordem religiosa, econômica e política56. A partir do
século VI a.C., os temas astrais e antropomórficos saem de moda em meio a elite
jerusalemita. Josias abole a “prostituição cultual” e bane o culto a Asherá no Templo de
Jerusalém57. Desta forma e segundo Römer, baseando-se em lugares do Oriente Antigo,
quando uma divindade é elevada a Deus principal, é sempre a partir do rei.
Com as reformas de Josias, Yhwh torna-se “um”, embora e ainda não o “único”,
e Jerusalém o único lugar de culto legítimo para sacrifício. Desta maneira, a intenção é
mostrar a superioridade de Yhwh sobre todas as outras divindades e considerá-lo como
o verdadeiro Deus de Israel. É justamente essa característica agregadora de “Deus um”
para também ser o “Deus único”, que o último capítulo do livro trata.
A queda de Jerusalém em 586 a.C., pelos babilônicos gerou uma grande crise
identitária na coletividade judaica. É justamente nesse período que um número
considerável de textos bíblicos surgem na tentativa de explicar a destruição de
Jerusalém e o papel de Yhwh na catástrofe entre os intelectuais da Golah58 babilônica.
Os membros da Escola Deuteronomista procuraram explicar o exílio construindo uma
história de Yhwh e seu povo, a fim de chegar a uma consequência lógica dos infortúnios
de Israel, em razão de sua desobediência a Yhwh. Desta forma o caminho para as
afirmações monoteístas está posto. Yhwh é tanto o Deus nacional como do universo.
Essa reflexão monoteísta para Römer é avançada com o conteúdo dos oráculos
do Deutero-Isaías, que segundo Römer são inspirados no Cilindro de Ciro59. O chamado
monoteísmo sacerdotal diferentemente dos anteriores têm um caráter inclusivista, ou
56
Ibidem, p. 189.
57
Ibidem, p. 196.
58
O termo Golah é usado para se referir aos judeus exilados na Babilônia que entendiam ser o
remanescente fiel, a quem Yhwh preservara.
59
RÖMER, 2016, p. 213.
seja, procura definir qual é o papel de Yhwh e de Israel entre os demais povos e deuses.
Assim, quando os povos veneram um deus criador, na verdade estão venerando a Yhwh.
Römer acredita que o monoteísmo dualista persa imposto por Dario I (521-486)
também influenciou o pleno estabelecimento do monoteísmo israelita, embora
compreenda ser difícil precisar as influências que os persas exerceram.
DISPOSIÇÕES FINAIS
Ambos mencionam que foi com Davi que o termo “Israel” passa a referir-se
também a Judá, e que o progresso de Judá e Jerusalém só acontece com a queda do
Norte em 722 a.C., para a Assíria. Ambos concordam ainda em muitas outras coisas,
mas as pesquisas deixam uma pergunta, que acreditamos não ser tão fácil responder.
Como explicar a proposição de que Yhwh é oriundo do sul, mas é primeiro venerado no
Norte? Embora, algumas respostas possam ser dadas, parece-nos mais razoável acreditar
que ou Yhwh é oriundo de regiões do Norte, ou foi cultuado primeiramente no Sul e,
depois migrou para o Norte onde obteve maior aceitação e divulgação.
Em face das constantes mudanças das pesquisas de cunho científico e das novas
descobertas, principalmente da arqueologia, Römer mais do que Smith é muito cético,
quando se apropria dos textos bíblicos para analisá-los e observá-los à luz das recentes
pesquisas. Talvez, Römer nas entrelinhas esteja sinalizando para o que muitos já
defendem, e assim, quer fazer uma distinção óbvia: Não dar para unir fé e ciência e
vice-versa, embora, possa haver diálogo.
REFERÊNCIA
RÖMER, Thomas. A Origem de Javé. O Deus de Israel e seu nome. Ed. Paulus.
São Paulo – SP, 2016.
SMITH, Mark S. O memorial de Deus. Ed. Paulus. São Paulo – SP, 2006.