Você está na página 1de 3

A imprescindibilidade da figura centralizadora do empreendedor é a razão pela qual, em geral,

os shopping centers não adotam estruturas jurídicas nas quais os lojistas tenham a domínio do
imóvel, quer diretamente, com a constituição do condomínio especial254 – no qual as lojas
são partes autônomas, exploradas diretamente pelo lojista proprietário –, quer indiretamente,
com a venda aos lojistas de parte das quotas ou das ações da pessoa jurídica que é a
proprietária da totalidade do imóvel.

Os shopping centers no Brasil caracterizam-se, quase na sua totalidade, pelo fato de não serem
os lojistas proprietários das lojas – têm eles apenas o direito contratual de seu uso privativo,
em geral pelo prazo de cinco anos.

O shopping, analisado globalmente, é, ele mesmo, um estabelecimento de conjunto, formado


pela integração dos estabelecimentos dos lojistas269. Com efeito, o shopping “tem por si uma
aptidão funcional que ultrapassa a das lojas atomisticamente consideradas” – desempenha
“uma função comercial que se baseia no conjunto, o que potencia enormemente o valor de
cada loja” 270.

Reparem na expressão estabelecimento de conjunto ou empresa de conjunto. Essa


caracterização desnatura a análise contrato de locação em Shopping Center como um simples
contrato de locação. Há nas palavras do autor estudado: "uma série de contratos coligados
que formam uma rede de contratos."

Participar dessa rede de estabelecimento, juridicamente, significa compreender a dimensão


dos contratos advindos da ideia de rede, de relações, que se organizam para um fim comum:
atrair clientes para aquele local preconcebido por um empreendedor.

o Shopping se exterioriza como uma unidade autonomia, formada por sub unidades (ou sub
estabelecimentos) com autonomia limitada de ação empresarial lato sensu.

"2. A teoria da empresa e o shopping center Considerando que o que diferencia o shopping
dos demais centros comerciais é, como acima exposto, a fórmula de integração empresarial
adotada, é de grande utilidade para a qualificação da operação econômica global denominada
shopping center a teoria da empresa, atualmente positivada no âmbito do direito privado
brasileiro. Com exceção do perfil institucional, o Código Civil brasileiro disciplinou todos os
demais aspectos jurídicos da empresa258, adotando a separação conceitual entre empresário,
empresa e estabelecimento. O empresário259, perfil subjetivo da empresa, foi definido no art.
966 do Código Civil como “quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada
para a produção ou a circulação de bens ou serviços”. Do conceito legal acima, infere-se que a
atividade econômica organizada é o elemento objetivo qualificador da figura de
empresário260, o que torna clara a interdependência dos conceitos. O conceito de
estabelecimento, perfil objetivo da empresa, também está ligado aos de empresário e de
atividade, tendo sido definido legalmente no art. 1.142 do Código Civil como “todo o complexo
de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade
empresária”, dispositivo que é idêntico ao art. 2.555 do Código Civil italiano. O complexo de
bens é visto de forma única pelo direito, constituindo uma universalidade de fato (art. 90 do
CC), por sua finalidade261: o empresário organiza tais bens com o objetivo de servir para o
exercício da atividade empresarial262. Mesmo ciente de que o fenômeno da empresa não
cabe em um esquema jurídico unitário, à luz do Código Civil brasileiro, que definiu o perfil
subjetivo como empresário e o perfil objetivo como estabelecimento, conclui-se que o
vocábulo empresa somente é tecnicamente utilizado para se referir ao perfil funcional263. Até
mesmo porque “o exercício da empresa” mencionado no art. 1.142 do Código Civil, nada mais
é do que o exercício profissional da “atividade econômica organizada para a produção ou a
circulação de bens ou serviços” pelo empresário, de que trata o art. 966 do Código Civil264.
Em seu perfil funcional, a empresa “appare come quella particolare forza in movimento che è
l’attività imprenditrice”, ou seja, a prática contínua de uma série de atos, pelo empresário,
para organizar o trabalho alheio e os capitais próprios e alheios, com o fim de produção e
distribuição de bens e serviços para o mercado de consumo265. Na teoria da empresa a
atividade econômica organizada unificada pela finalidade está no centro da análise, não
devendo os atos jurídicos (gênero no qual estão incluídos os negócios jurídicos) praticados
pelo empresário ser considerados isoladamente, pois estão dentro de um contexto maior – são
praticados em conjunto, e de forma coordenada, visando determinada finalidade. A causa da
atividade pode vir a alterar a função econômica dos atos e negócios que a compõem, bem
como pode mudar a qualificação dos negócios jurídicos. A atividade é mais que a soma dos
atos que a compõem. Aproveitando comparação já utilizada266, um filme é mais do que a
soma das fotografias de todas as cenas: as fotos, unidas em razão de finalidade única, ao
serem colocadas em movimento, transubstanciam-se. Aplicando tais conceitos ao shopping
center, não é difícil concluir serem os lojistas, na sua grande maioria, empresários e as lojas
múltiplos estabelecimentos, para o exercício das diversas empresas. O empreendedor também
age como empresário267: pratica uma série de atos orientados para a criação e manutenção
de uma organização – o shopping –, visando aumentar as vendas dos produtos e dos serviços
das lojas integrantes do centro comercial, com a atração de grande quantidade de
consumidores. Ao projetar, executar e administrar uma estrutura com a finalidade de
melhorar a distribuição de produtos e serviços dos lojistas para o mercado, o empreendedor
está produzindo riquezas – age, portanto, no exercício de uma atividade econômica268. Longe
de passivamente ceder o uso de seu imóvel aos lojistas, o empreendedor utiliza o imóvel para
produção de nova riqueza, explorando-o como um estabelecimento. O shopping, analisado
globalmente, é, ele mesmo, um estabelecimento de conjunto, formado pela integração dos
estabelecimentos dos lojistas269. Com efeito, o shopping “tem por si uma aptidão funcional
que ultrapassa a das lojas atomisticamente consideradas” – desempenha “uma função
comercial que se baseia no conjunto, o que potencia enormemente o valor de cada loja”270. O
estabelecimento formado pelos múltiplos estabelecimentos dos lojistas é o instrumento para
uma empresa de conjunto, constituída pelas atividades empresariais, praticadas de forma
integrada pelo empreendedor e por todos os lojistas. A organização da coletividade dos lojistas
no estabelecimento de conjunto, feita pelo empreendedor, tem como finalidade única o
exercício da atividade de conjunto271. Se o shopping foi economicamente conceituado por
Langoni como uma inovadora organização dos fatores de produção272, juridicamente ele
somente poderia ser qualificado como empresa, pois, nas palavras de Bulgarelli, o verdadeiro
achado na teoria jurídica da empresa foi “a transmutação do conceito econômico de empresa
como organização da atividade econômica em atividade econômica organizada”273. A
empresa de conjunto surge da integração das atividades empresariais de cada lojista e do
empreendedor. O sucesso do shopping depende do êxito das atividades empresariais de todos
os lojistas, ao mesmo tempo em que o sucesso de cada lojista está influenciado pelo êxito da
empresa de conjunto. E a estrutura jurídica comumente utilizada para viabilizar o shopping
reflete esta interdependência. O empreendedor firma com os diversos lojistas uma série de
contratos coligados que formam uma rede de contratos. “Es una red porque sólo funciona si
hay una multiplicidad de sujetos interactuando entre sí, mediante contratos conexos”274. E a
causa supracontratual da rede de contratos criada, como será exposto adiante, é o exercício
das atividades empresariais de todos os lojistas e do empreendedor de forma integrada, ou,
em outras palavras, a criação e manutenção da empresa de conjunto, organizada para
fornecer o máximo de produtos e de serviços aos consumidores. 3. A rede de contratos
constituída pelos contratos firmados entre o empreendedor e os diversos lojistas Nos dias de
hoje, é impossível para o empresário praticar todas as atividades necessárias para a produção
e distribuição de bens e serviços. Por outro lado, não quer o empresário depender do mercado
para adquirir os bens e serviços que lhe são necessários. Como consequência, é muito comum
a “associação” de empresários entre si, por meio de vários contratos bilaterais de duração,
para suprir as necessidades inerentes ao exercício das atividades empresariais275. Esses
contratos, cada qual com sua autonomia e sua função econômica próprias, têm em comum
uma função econômica supracontratual, ligada às finalidades das atividades empresariais das
partes. A atividade empresarial está estruturada, portanto, não apenas em um único contrato
ou em vários contratos vistos isoladamente, mas por diversos contratos coligados (ou conexos)
com dependência. O fenômeno da coligação contratual para o exercício da atividade
empresarial é muito amplo, abrangendo diversas situações distintas, como as cadeias
contratuais, a terceirização e as redes contratuais, sendo esta última a que interessa ao
presente estudo, porque se entende aplicável ao tema específico. A palavra “rede” é utilizada
para dar a ideia da atuação simultânea de várias pessoas, de forma ordenada, objetivando a
manutenção e a melhora do sistema do qual elas são partes integrantes. Prefere-se “rede de
contratos” a “grupo de contratos” porque os contratos não estão apenas “agrupados”,
“juntos”, e sim integrados.

Você também pode gostar