Insuficiência Cardíaca Descompensada é a principal causa
de internação em países desenvolvidos, a principal causa cardiovascular e terceira geral no Brasil. ICD possui alta taxa de letalidade e uma apresentação diversa que dificulta o manejo, as diretrizes buscam sistematizar o cuidado para coordenar as áreas de emergência, cardiologia, clínica e terapia intensiva de forma ágil e eficaz.
A Insuficiência Cardíaca é um estado onde o coração não
consegue manter a perfusão adequada dos tecidos (fração de ejeção reduzida) ou só consegue às custas de aumento das pressões de enchimento (fração de ejeção preservada) criando uma Síndrome de Baixo Débito ou uma Síndrome Congestiva. A ICD apresenta início súbito de sinais e sintomas associados à função cardíaca alterada, podendo ter alterações na sístole, na diastóle, na pré ou pós carga e/ou no ritmo cardíaco. Requer tratamento urgente por apresentar significativo risco de vida.
Apresentações da ICD:
• ICD Aguda: o paciente pode ser “novo” (sem ICC, geralmente
após IAM) ou, mais comumente nas salas de emergência, um portador de Insuficiência Cardíaca Crônica. Não pode preencher critérios para outras apresentações.
• ICD Hipertensiva: IC apresentando também alta PA e sem
disfunção sistólica ou edema agudo de pulmão.
• ICD por Edema Agudo de Pulmão: aumento abrupto da
pressão capilar pulmonar despeja líquido nos septos e alvéolos pulmonares causando dispnéia de repouso, SaO2<90% e alterações radiológicas. É a causa mais frequente em idosos, hipertensos, coronariopatas e diabéticos.
• ICD por Choque Cardiogênico: diagnosticada no paciente
com hipoperfusão, hipotensão, diurese reduzida e frequência cardíaca normal mesmo após correção da pré-carga. Pode ter congestão.
• ICD por Alto Débito: pacientes com alto débito, geralmente
com frequência cardíaca aumentada, periferia quente e congestão pulmonar. Pode ser causada por arritimias, anemia, tireotoxicose, iatrogenia, sepse (também com redução da PA) e outros.
• ICD Direita: baixo débito cardíaco, congestão venosa
(aumento de pressão venosa jugular, aumento hepático) e hipotensão.
A principal causa da ICD é a perda de contratilidade (por
isquemia, Chagas, hipertensão e outros) seguida por sobrecarga hemodinâmica, distúrbios da frequência cardíaca e alterações do enchimento ventricular. Os principais desencadeantes são a má adesão ao tratamento, medicação inadequada, progressão da doença e infecções.
É importante ressaltar que existem mecanismos mecânicos e
neuro-humorais compensatórios na insuficiência cardíaca descompensada e na crônica que eventualmente se tornam deletérios e implicam em pior prognóstico, deve-se tentar evitar o remodelamento cardíaco. Outro problema é a Síndrome Cardiorrenal, uma insuficiência renal causada pela ação independente ou combinada de DRC, disfunção sistólica e baixo volume minuto, disfunção diastólica, diabetes, doença vascular e/ou hipertensão, é mais comum em homens de idade avançada e pode acabar comprometendo a função renal mesmo após resolução da ICD.
O principal sistema de classificação para ICD é a
Classificação Clínica-Hemodinâmica que se baseia na presença ou não de hipoperfusão periférica e de congestão pulmonar. A hipoperfusão periférica apresenta pressão de pulso reduzida, sonolência, extremidades frias, oligúria, náuses, vômitos, dor abdominal e livedo reticular (quanto mais proximal, mais grave), classificado em quente quando ausente e frio quando presente. A congestão pulmonar apresenta crepitações, estertores, roncos e sibilos pulmonares, estase jugular, hepatomegalia, dispnéia, ortopnéia, dispnéia paroxística noturna, B3 e edema, classificado em seco quando ausente e úmido quando presente. A classificação dos perfis coloca A como quente e seco, B como quente e úmido, C como frio e úmido e L como frio e úmido.
A abordagem inicial de ICD conta com ABCDEFGH
• Avaliação clínica-hemodinâmica
• Boa ventilação e respiração
• Circulação (reposição volêmica para L e C tardio)
• Diuréticos (para B)
• ECG
• Frequência Cardíaca
• Garantir continuação de medicações rotineiras se estável
◦Em Síndrome Cardiorrenal, suspender iECA, BRA e
espironolactona
◦Betabloqueadores são controversos, já que a suspensão é
associada a maior mortalidade, mas a diretriz recomenda suspender em uso de inotrópicos (pela ação antagônica) e reduzir para 50% se houver internação.
• Heparina para prevenir TEP e TVP
O perfil A (quente e seco) é oligossintomático, estável e pode
ser manejado ambulatorialmente com medicações.
O perfil B (quente e úmido) é o mais comum e conta com EAP
e congestão venosa. A terapia busca resolução da congestão e da dispnéia, retorno da pressão jugular à normalidade e manutenção da perfusão (PAS acima de 80 mmHg e função renal preservada). Principais medicamentos são diuréticos (os de alça são preferidos por também serem venodilatadores) e vasodilatadores (reduz congestão e pré e pós carga).
Perfil C (frio e úmido) é o mais letal, tendo congestão
pulmonar e hipoperfusão. Se a PAS está acima de 90 mmHg o tratamento usa diuréticos e vasodilatadores. Se a PAS está abaixo de 90 mmHg (choque cardiogênico), o tratamento usa vasoconstritores (noradrenalina), acesso arterial para mensurar pressão média (tentar evitar necrose tecidual) e, após PAS>90 mmHg, usar inotrópicos
Perfil D (frio e seco) ocorre geralmente por excesso de
diuréticos, levando à hipoperfusão por hipovolemia que é tratada com reposição volêmica lenta e cuidadosa para evitar congestão, se ocorrer, inotrópicos geralmente são necessários.
de infecção ou anemia possivelmente desencadeadoras), EAS, uréia e creatinina (investigar função renal), eletrólitos, troponinas (se IAM é suspeita clínica), Rx de tórax (percebe a congestão e cardiomegalia e faz diagnóstico diferencial com enfisema e pneumotórax), ecocardiograma (função ventricular, lesões valvares e derrame pericárdico) e ECG (arritmias, SCA, alterações da Fc, alterações devem ser corrigidas com amiodarona para arritmia ventricular sustentada e cardioversão em instáveis).
Sobre os tratamentos:
Ventilação Mecânica reduz o retorno venoso e a pré-carga,
diminuindo a mortalidade em EAP por choque cardiogênico, mas seu uso deve ser restrito aos refratários ou aos em franca insuficiência respiratória. A oxigenação aumenta a inflamação e só deve ser feita quando SaO2<92%.
Morfina alivia a dispnéia e está nas diretrizes, mas não
melhora o prognóstico e potencialmente aumenta mortalidade.
Os iECA são os vasodilatadores orais de preferência,
enquanto os endovenosos são a nitroglicerina (menos potente, mas com mais ação coronariana) e o nitroprussiato (mais potente, preferido na ICD).
Diuréticos de alça são preferidos na ICD por serem mais
rápidos e potentes, mas o potássio deve ser monitorizado. Tiazídicos ajudam no manejo da HAS e como potencializadores dos de alça. A espironolactona poupa potássio e seu antagonismo à aldosterona reduz internações, mortalidade e remodelamento cardíaco, mas demora para começar a agir e é mais usada na ICC.
Inotrópicos melhoram a função ventricular, mas, a longo
prazo, aumentam a fibrose ventricular, o risco de arritmias e mortalidade, devendo ser reservados para a falha de outras terapias e mantido pelo menor tempo possível. Os principais não-digitálicos são a dobutamina (agonista beta-adrenérgico com efeito hemodinâmico dose-dependente e necessitando de doses mais altas em pacientes que usam beta-bloqueadores, útil naqueles com PA abaixo de 85), a milrinona (cardiotônica por inibir a fosfodiesterase, aumentando o AMPc disponível) e a levosimendana (inicialmente também inibem fosfodiesterase, mas também sensibilizam a troponina C ao cálcio, atuando como vasodilatadora, cardiotônica com redução da pré e pós- carga, melhora do fluxo coronariana e sem aumento de demanda miocárdica de oxigênio). Os digitálicos bloquam a bomba de sódio-potássio, armazenando cálcio na célula, tem indicação para controle da FC, principalmente taquiarritmias supraventriculares de alta resposta.