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Psicologia da Educação

dos Surdos

Prof. Kevin Daniel dos Santos Leyser

Indaial – 2019
1a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2019

Elaboração:
Prof. Kevin Daniel dos Santos Leyser

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

L685p

Leyser, Kevin Daniel dos Santos

Psicologia da educação dos surdos. / Kevin Daniel dos Santos


Leyser. – Indaial: UNIASSELVI, 2019.

276 p.; il.

ISBN 978-85-515-0352-2

1. Surdos - Educação. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da


Vinci.

CDD 371.912
Impresso por:
Apresentação
Caro acadêmico, antes de apresentar o conteúdo deste livro, gostaria
de me apresentar a você.

Sou Bacharel e Licenciado em Psicologia (2005) e Licenciado em


Filosofia (2004) pela Universidade Comunitária Regional de Chapecó, e
Bacharel em Teologia pela Faculdade de Educação Teológica Logos (2002).
Especialista em Psicopedagogia e Práticas Pedagógicas e Gestão Escolar pela
Faculdade de Administração, Ciências, Educação, Letras (2007), Especialista
em Educação a Distância: Gestão e Tutoria pelo Centro Universitário
Leonardo da Vinci (2018) e Mestre em Educação pela Universidade Regional
de Blumenau (2011).

Agora vamos ao Livro Didático. Este livro tem como objetivo


sistematizar os elementos básicos da disciplina de Psicologia da Educação
para Surdos, que proporcionará um contato com os principais tópicos, autores
e obras, além dos instrumentos necessários, não apenas para acompanhar a
presente disciplina, mas também para os estudos autônomos posteriores.

A primeira unidade fornecerá uma introdução sobre como os alunos,


incluindo os surdos, aprendem em contextos formais e informais. As relações
entre ensino e aprendizagem também serão destacadas, pois nem sempre
são tão óbvias quanto parecem. Nesse contexto, enfatizaremos o tema de que
os alunos surdos não são simplesmente alunos que não podem ouvir, mas
podem ter necessidades e pontos fortes acadêmicos diferentes de seus pares
ouvintes. No nível mais básico, é somente pela compreensão dos fundamentos
da aprendizagem e as maneiras pelas quais a educação e a instrução podem
promovê-la, que seremos capazes de reconhecer os desafios que os alunos
surdos enfrentam nos contextos educacionais e a necessidade de várias
acomodações de ensino-aprendizagem. Em última análise, o objetivo desta
unidade é fornecer uma compreensão completa de como podemos combinar
melhor os métodos e materiais de ensino com os estilos de aprendizagem dos
alunos surdos, ao mesmo tempo em que acomodamos as grandes diferenças
individuais entre eles.

A segunda unidade se concentrará em três temas centrais. Primeiro,


exploraremos o desenvolvimento da linguagem, em sentido amplo, e
da língua, em sentido estrito, para o aprendiz surdo. Com isso também
introduziremos várias questões de aprendizagem que são influenciadas por
esse desenvolvimento. Segundo, discutiremos especificamente as questões
de ensino e avaliação da linguagem e da língua para indivíduos surdos.
Finalmente, o terceiro tema será uma descrição dos perfis cognitivos de
alunos surdos e suas implicações para a educação.

III
A terceira unidade introduzirá questões mais específicas da educação
e aprendizagem para surdos no âmbito da educação formal. Primeiro,
discutiremos as questões referentes à realização escolar e às instruções quanto
a literacia. No mesmo teor, discutiremos as questões sobre a numeracia, no
segundo tópico. Prosseguiremos então para apresentar as novas tecnologias
de aprendizagem para aprendizes surdos. Finalizando com uma discussão
sobre os contextos de aprendizagem para esse público específico.

Desejo uma boa jornada a todos rumo à edificação da educação e


sucesso frente aos desafios intelectuais, éticos e pessoais proporcionados
pelo estudo da Psicologia da Educação para Surdos.

Prof. Me. Kevin Daniel dos Santos Leyser

NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

IV
V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS.............. 1

TÓPICO 1 – APRENDIZAGEM E ENSINO........................................................................................ 3


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 3
2 DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM ................................................................................. 4
3 A NATUREZA ECOLÓGICA DA APRENDIZAGEM................................................................... 6
4 AS ORIGENS DA APRENDIZAGEM............................................................................................... 9
5 APRENDIZAGEM FORMAL EM ESCOLAS................................................................................... 12
6 APRENDIZAGEM INDIVIDUAL, COOPERATIVA E COLABORATIVA................................ 14
7 APRENDER E ENSINAR..................................................................................................................... 16
7.1 ENSINO E INSTRUÇÃO................................................................................................................. 17
7.2 O ENSINO E O RELACIONAMENTOS ALUNO-PROFESSOR............................................... 21
8 EDUCAÇÃO BASEADA EM EVIDÊNCIAS.................................................................................... 22
8.1 VIABILIDADE DOS DELINEAMENTOS DE PESQUISA.......................................................... 24
8.2 PRÁTICAS DE PUBLICAÇÃO....................................................................................................... 25
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................................ 25
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 26
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 29

TÓPICO 2 – APRENDIZES SURDOS.................................................................................................. 31


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 31
2 FALA, SOM E AUDIÇÃO.................................................................................................................... 33
3 PERDA AUDITIVA............................................................................................................................... 36
4 APARELHOS AUDITIVOS E IMPLANTES COCLEARES........................................................... 40
5 DEFICIÊNCIA AUDITIVA E SURDEZ............................................................................................. 44
6 SER SURDO NA ESCOLA................................................................................................................... 46
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................................ 48
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 49
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 52

TÓPICO 3 – O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS................................................... 53


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 53
2 LÍNGUA E COMUNICAÇÃO............................................................................................................. 55
3 FUNDAÇÕES DA INTERAÇÃO SOCIAL....................................................................................... 57
4 O LÚDICO COMO JANELA E SALA................................................................................................ 62
5 UMA CRIANÇA SURDA NA FAMÍLIA.......................................................................................... 63
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 65
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 71
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 74

UNIDADE 2 – LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS....... 75

TÓPICO 1 – DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM................................................................. 77


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 77

VII
2 A LINGUAGEM .................................................................................................................................... 77
3 LÍNGUAS DE SINAIS.......................................................................................................................... 80
4 MULTIMODALIDADE E SISTEMAS DE SINAIS........................................................................ 83
5 O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM................................................................................. 87
6 AQUISIÇÃO DO BILINGUISMO E APRENDIZAGEM DE LÍNGUA ESTRANGEIRA....... 91
7 AQUISIÇÃO DE LÍNGUA FALADA POR CRIANÇAS SURDAS............................................. 93
8 AQUISIÇÃO DA LÍNGUA DE SINAIS POR CRIANÇAS SURDAS......................................... 97
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................................ 101
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 103
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 106

TÓPICO 2 – ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM............................................................... 107


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 107
2 AQUISIÇÃO DE LÍNGUAS EM CASA E APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS NA ESCOLA.108
3 AVALIAÇÃO DA PROFICIÊNCIA LINGUÍSTICA....................................................................... 110
4 AUMENTANDO A ACESSIBILIDADE À LÍNGUA NA EDUCAÇÃO..................................... 115
4.1 AUMENTANDO A ACESSIBILIDADE À LÍNGUA APRIMORANDO A ACÚSTICA DA
SALA DE AULA................................................................................................................................ 115
4.2 AUMENTANDO A ACESSIBILIDADE À LÍNGUA ADICIONANDO UM CÓDIGO
MANUAL À LÍNGUA FALADA................................................................................................... 117
4.3 AUMENTANDO A ACESSIBILIDADE À LÍNGUA ATRAVÉS DA LÍNGUA DE SINAIS..... 122
5 PROMOÇÃO DA COMPETÊNCIA EM LÍNGUAS ATRAVÉS DA EDUCAÇÃO
BILÍNGUE............................................................................................................................................... 123
6 FACILITANDO O DESENVOLVIMENTO DA LÍNGUA ATRAVÉS DA INTERAÇÃO EM
SALA DE AULA..................................................................................................................................... 127
7 INSTRUÇÃO DIRETA DE LÍNGUA................................................................................................. 130
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................................ 133
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 134
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 137

TÓPICO 3 – PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS......................................................... 139


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 139
2 INTELIGÊNCIA VERSUS COGNIÇÃO........................................................................................... 140
3 ATENÇÃO VISUAL E COGNIÇÃO VISUAL ................................................................................ 144
4 MEMÓRIA E APRENDIZAGEM....................................................................................................... 148
5 FUNCIONAMENTO EXECUTIVO E METACOGNIÇÃO............................................................ 150
6 COGNIÇÃO SOCIAL E TEORIA DA MENTE............................................................................... 153
6.1 PREDITORES DA TEORIA DO DESENVOLVIMENTO DA MENTE EM CRIANÇAS
SURDAS............................................................................................................................................. 155
6.2 TEORIA DA MENTE EM CRIANÇAS COM IMPLANTES COCLEARES.............................. 157
6.3 IMPLICAÇÕES MAIS AMPLAS DA TEORIA DO DESENVOLVIMENTO DA MENTE..... 160
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................................ 162
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 163
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 166

UNIDADE 3 – REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES........................................................... 167

TÓPICO 1 – REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA....................................... 169


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 169
2 ENTENDENDO A REALIZAÇÃO DOS APRENDIZES DE SURDOS...................................... 170
3 LEITURA................................................................................................................................................. 173
3.1 ELEMENTOS DA LEITURA........................................................................................................... 174

VIII
3.1.1 Reconhecendo Palavras.......................................................................................................... 175
3.1.2 Entendendo o que palavras significam................................................................................ 177
3.1.3 Gramática: as regras da língua.............................................................................................. 180
3.1.4 Então, o que devemos fazer sobre isso?............................................................................... 181
4 EDUCAÇÃO BILÍNGUE PARA ALUNOS SURDOS..................................................................... 182
5 A ESCRITA ............................................................................................................................................. 184
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 189
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 192

TÓPICO 2 – REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: NUMERACIA................................... 193


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 193
2 MATEMÁTICA...................................................................................................................................... 193
2.1 ENTÃO, O QUE NÓS PODEMOS FAZER SOBRE ISSO?.......................................................... 198
3 A CIÊNCIA DA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS................................................................................. 200
3.1 BARREIRAS PARA A EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS PARA ALUNOS SURDOS................... 200
3.2 ENTÃO, O QUE NÓS PODEMOS FAZER SOBRE ISSO?.......................................................... 203
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 207
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 210

TÓPICO 3 – NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES


SURDOS............................................................................................................................. 211
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 211
2 A REVOLUÇÃO DIGITAL.................................................................................................................. 211
2.1 REVOLUÇÃO NA COMUNIDADE SURDA............................................................................... 212
2.2 REVOLUÇÃO NA EDUCAÇÃO DOS SURDOS......................................................................... 213
3 APRENDIZAGEM MULTIMÍDIA..................................................................................................... 214
4 CARACTERÍSTICAS DO ALUNO QUE AFETAM A APRENDIZAGEM MULTIMÉDIA...... 217
5 PROJETO DE MULTIMÍDIA INSTRUCIONAL EFICAZ............................................................. 218
5.1 IMAGENS E ANIMAÇÕES............................................................................................................. 218
5.2 EXIBIÇÃO DE INFORMAÇÕES.................................................................................................... 219
5.3 HIPERMÍDIA.................................................................................................................................... 220
5.4 NAVEGAÇÃO................................................................................................................................... 222
6 SUPORTE EDUCACIONAL................................................................................................................ 224
7 EFEITOS DA APRENDIZAGEM MULTIMÍDIA ASSISTIDA POR COMPUTADOR EM
ESTUDANTES SURDOS..................................................................................................................... 225
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 232
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 235
REFERÊNCIAS.......................................................................................................................................... 237

IX
X
UNIDADE 1

PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E
OS APRENDIZES SURDOS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• apresentar o modelo ecológico de ensino-aprendizagem para aprendizes


surdos;

• introduzir contexto da pessoa surda e os desafios educacionais iniciais;

• compreender como ocorre o início da aprendizagem da criança surda em


casa e a relação dela com os pais.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – APRENDIZAGEM E ENSINO

TÓPICO 2 – APRENDIZES SURDOS

TÓPICO 3 – O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1
APRENDIZAGEM E ENSINO

1 INTRODUÇÃO
Se quisermos ensinar efetivamente os alunos surdos, para que eles
realmente aprendam com nosso ensino, então este deve estar firmemente
fundamentado no que sabemos sobre a aprendizagem em geral e sobre o ensino
em relação ao aprendizado em particular. O conhecimento dos processos básicos
de aprendizagem é (ou deveria ser) um requisito para todos aqueles que ensinam.
Por isso, iniciamos este livro com um tópico que fornece uma introdução sobre
como os alunos, incluindo os surdos, aprendem em contextos formais e informais.
As relações entre ensino e aprendizagem também serão destacadas, pois nem
sempre são tão óbvias quanto parecem.

Nesse contexto, enfatizaremos o tema de que os alunos surdos não


são simplesmente alunos que não podem ouvir, mas podem ter necessidades
e pontos fortes acadêmicos diferentes de seus pares ouvintes. No nível mais
básico, é somente pela compreensão dos fundamentos da aprendizagem e as
maneiras pelas quais a educação e a instrução podem promovê-la, que seremos
capazes de reconhecer os desafios que os alunos surdos enfrentam nos contextos
educacionais e a necessidade de várias acomodações de ensino-aprendizagem.
Em última análise, o objetivo é fornecer uma compreensão completa de como
podemos combinar melhor os métodos e materiais de ensino com os estilos de
aprendizagem dos alunos surdos, ao mesmo tempo em que acomodamos as
grandes diferenças individuais entre eles.

A aprendizagem é o resultado de uma interação complexa entre


características do indivíduo, fatores socioemocionais e variáveis ​​instrucionais.
É, portanto, um processo consideravelmente mais complexo do que muitos
apreciam, mesmo porque o aprendizado geralmente parece tão automático. No
entanto, como Alexander, Schallert e Reynolds (2009, p. 176) apontaram, “[...] não
se pode começar a entender a verdadeira natureza da aprendizagem humana
sem abraçar sua complexidade interacional”. O ensino tradicional aproxima-se
na educação de surdos, em contraste, muitas vezes baseado na identificação e
aplicação de respostas simples para questões complexas. O resultado tem sido
o insucesso acadêmico de muitos alunos surdos. Se quisermos melhorar os
resultados do ensino, ou seja, os resultados acadêmicos dos alunos surdos, os
professores precisam aplicar o que é frequentemente chamado de abordagem
ecológica da instrução, levando em conta as características dos alunos (incluindo
os pontos fortes e fracos que descreveremos posteriormente), bem como o
ambiente educacional. Em essência, se alguém estuda a aprendizagem, deve

3
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

estudar o desenvolvimento em contexto (BRONFENBRENNER, 1996). No


decorrer deste tópico, descreveremos o que tal modelo ecológico significa para
ensinar aprendizes surdos.

2 DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM
Durante o curso de sua vida, os seres humanos se desenvolvem de várias
maneiras. É claro que eles se desenvolvem fisicamente, ficando mais altos,
maiores e mais velhos. No entanto, também, no desenvolvimento ao longo da
vida, são igualmente importantes as funções mentais como linguagem, resolução
de problemas e criatividade. O desenvolvimento dessas funções mentais
está intimamente associado ao desenvolvimento do cérebro e é grandemente
influenciado pela experiência.

Em parte, o desenvolvimento dos seres humanos é geneticamente


especificado e, portanto, predeterminado pela natureza. Os genes, espalhados
nos cromossomos encontrados em todas as células do corpo, determinam o curso
do desenvolvimento, mas também podem criar desvios do curso “natural”. Um
desvio que pode ocorrer no desenvolvimento humano, com potencialmente muitas
causas genéticas, é a perda auditiva. A perda auditiva, como outras características
individuais, pode ser causada por mutações genéticas, mudanças permanentes
de tamanhos variados nas sequências de DNA encontradas nos cromossomos.
Essas mutações podem estar presentes no nascimento ou adquiridas a qualquer
momento durante a vida de uma pessoa. No entanto, embora as especificações
genéticas (o genótipo) sejam importantes para o desenvolvimento, o crescimento
do indivíduo (o fenótipo) é influenciado não apenas pela natureza, mas também
pelo que é adquirido, aprendido, no meio ambiente. A forma como os humanos
crescem fisicamente, por exemplo, é amplamente especificada geneticamente, mas
o crescimento físico das crianças fica em perigo se elas não receberem alimento
e exercício suficientes. O cérebro e as funções mentais associadas a ele também
precisam de nutrição para o desenvolvimento do pensamento e da linguagem na
forma de diversidade experiencial no mundo. A contribuição ambiental, portanto,
é de importância crucial para o desenvolvimento de estruturas e processos
cerebrais geneticamente especificados.

O cérebro consiste essencialmente em uma grande massa de células


cerebrais ou neurônios, cerca de 86 bilhões deles, que estão conectados uns aos
outros em vastas redes. Estruturalmente, as células cerebrais são agrupadas em
várias partes do cérebro, das quais as mais proeminentes são os hemisférios
cerebrais direito e esquerdo. O input ambiental não leva tanto a um aumento do
número de neurônios, mas, mais importante, a conexões cada vez mais eficazes
entre eles. Com o tempo, vários circuitos ou redes de neurônios tornam-se
especializados para funções específicas. Por exemplo, em todas as pessoas destras e
na maioria das canhotas, o hemisfério esquerdo do cérebro torna-se especializado
(ou lateralizado) para o processamento, compreensão e produção da linguagem,
independentemente da modalidade dessa língua, falada ou de sinais. Indivíduos

4
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

surdos que crescem usando a língua de sinais desde o nascimento, entretanto,


tendem a ser mais organizados bilateralmente para a linguagem; isto é, ambos os
hemisférios cerebrais estão provavelmente envolvidos.

As crianças não adquirem sua língua nativa ouvindo fitas de áudio ou


assistindo televisão, mas através de interações e comunicação próximas com seus
pais (KUHL, 2004). Elas ouvem ou, no caso de pais que falam a língua de sinais,
observam a língua sendo produzida sob várias situações, processam-na, criam
representações mentais dela, e ativamente constroem e testam hipóteses sobre
significados. As condições socioambientais em que o input da língua é dado,
portanto, são tão importantes quanto o input em si, proporcionando treinamento
complexo e variável em contextos de aprendizagem que destacam informações e
características essenciais de várias tarefas linguísticas e não linguísticas.

Durante toda a infância, enquanto a linguagem está sendo adquirida, o


cérebro está amadurecendo e se desenvolvendo. É somente no início da idade
adulta que o córtex motor pré-frontal, importante para o monitoramento e
controle das ações, atinge seu estado maduro. Naquela época, o cérebro tornou-se
bastante especializado e, em alguns aspectos, parece funcionar como um conjunto
de módulos relativamente independentes. O cérebro adulto, portanto, pode ser
visto como o resultado final de “interações multidirecionais dinâmicas entre
genes, cérebro, cognição, comportamento e ambiente” (KARMILOFF-SMITH,
2009, p. 100). Todavia, isso não significa que o cérebro adulto seja uma entidade
fixa. Em vez disso, ele permanece plástico (mutável) e dinâmico em suas funções
ao longo da infância e na idade adulta.

Por um lado, isso significa que o desenvolvimento das funções mentais


e, assim, o aprendizado não precisam esperar até que o cérebro atinja seu estado
adulto. Muito pelo contrário, a aprendizagem começa muito cedo, mesmo antes
do nascimento (DECASPER; FIFER, 1980), e os processos de aprendizagem
ajudam a moldar o cérebro ao longo do desenvolvimento. A falta de controle pré-
frontal (maturação completa do cérebro) em crianças pequenas é realmente útil
para o aprendizado. Como resultado, bebês e crianças pequenas são relativamente
desinibidos em suas explorações, aumentando assim a aprendizagem flexível e
estimulando a criatividade (GOPNIK, 2010). Por outro lado, a aprendizagem
não para quando o cérebro termina de crescer. É a plasticidade do cérebro que
permite que os humanos se envolvam na aprendizagem ao longo da vida.

Onde isso deixa a noção de que há períodos críticos no desenvolvimento,


por exemplo, na aprendizagem da língua nativa? Segundo Kuhl (2004), os
sistemas visual, auditivo e de linguagem diferem em relação aos períodos em
que podem ser aprendidos sem muito esforço. No entanto, mesmo dentro desses
sistemas, há muito mais plasticidade do que frequentemente se supõe. Períodos
críticos para alguns domínios da aprendizagem existem, mas parecem menos
rígidos do que se pensava anteriormente. Em primeiro lugar, a aprendizagem de
línguas implica o desenvolvimento de redes de atenção. Essas redes ajudam uma

5
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

criança a se concentrar em propriedades específicas da fala ou de expressões e


gestos de sinais. Com a experiência e a exposição à linguagem, essas propriedades
tornam-se codificadas, essencialmente catalogadas no cérebro. Essa codificação
literalmente resulta em mudanças no cérebro, levando ao tecido neural que se
torna especializado na análise de padrões de linguagem específicos. Kuhl (2004)
chama isso de uma forma de comprometimento neural. O aprendizado inicial
resulta em comprometimento neural que atua como um tipo de filtro, apoiando
e restringindo o aprendizado futuro de idiomas. A aprendizagem de padrões de
línguas não nativas torna-se mais difícil porque o cérebro já se tornou um tanto
limitado pela aquisição da primeira língua.

A ideia de um período crítico no desenvolvimento da linguagem, portanto,


não deve ser vista tanto como uma janela que é fechada em algum momento,
mas muito mais como um processo, determinado pela maturidade e pelo
aprendizado. Como veremos na Unidade 2, no entanto, o processo não é aberto.
O fraco acesso à linguagem de alta qualidade no início da vida, por exemplo,
por perda auditiva significativa sem acesso a uma língua falada e/ou de sinais,
pode resultar em dificuldades permanentes na linguagem, particularmente na
área gramatical (MARKMAN et al., 2011). Isso não significa que inputs tardios
impeçam totalmente a aquisição de linguagem, mas problemas persistentes
com processamento, compreensão e produção de estruturas gramaticais devido
a inputs degradados ou insuficientes terão impacto sobre a aprendizagem, a
alfabetização e o sucesso pessoal na sociedade.

3 A NATUREZA ECOLÓGICA DA APRENDIZAGEM


A aprendizagem impulsiona o desenvolvimento, refere-se essencialmente
às mudanças no conhecimento de um indivíduo como resultado de experiências.
O desenvolvimento, por sua vez, é impulsionado por vários mecanismos de
aprendizagem, como aprendizado baseado em erros, aprendizado através
da construção ativa de significado, aprendizado probabilístico e aprendizado
auto-organizável (ALEXANDER; SCHALLERT; REYNOLDS, 2009). Se o
desenvolvimento é governado pelo que precisa ser aprendido em fases específicas
da vida, a aprendizagem é restringida por fatores intrínsecos a tarefas específicas
e ao conhecimento e habilidades do indivíduo.

Algumas tarefas são mais facilmente aprendidas do que outras através


de um mecanismo de aprendizagem específico, mas a aprendizagem também é
influenciada por fatores extrínsecos, como ambientes físicos e sociais. O ambiente
físico, por exemplo, pode ter um impacto na aprendizagem através do número
de pessoas no ambiente de aprendizagem (aglomeração), a quantidade de ruído
de fundo irrelevante, o tamanho das escolas ou salas de aula, a qualidade dos
edifícios como casas e escolas, a iluminação e o clima interno (EVANS, 2006).
Aspectos do ambiente social que afetam a aprendizagem são o clima pedagógico,
o número e a qualidade das interações e a qualidade da linguagem nas interações
(HART; RISLEY, 1995).

6
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

Aprender assim é um processo ecológico moldado tanto por aspectos


da situação de aprendizagem como pelas características do aprendiz. Ou seja,
a aprendizagem sempre ocorre em contextos específicos, seja informalmente
durante atividades em casa ou interações com outras pessoas ou formalmente
como resultado de instrução em sala de aula ou outro ambiente educacional.
Esses contextos moldam o processo e os resultados da aprendizagem, às vezes de
forma sutil e às vezes não tão sutil (CAPRA et al., 2006). O contexto não determina
totalmente a aprendizagem, no entanto. Os humanos aprendem ativamente
e constantemente construindo o significado por si mesmos. Esse modo de
aprendizagem resulta do processamento de informações verbais e visuais,
geralmente por meio de vias separadas. Além do conteúdo em si, o indivíduo
também aprende a atender e processar a correlação entre diferentes fontes de
informação. A aprendizagem humana é, portanto, uma atividade cognitiva
cumulativa e interativa, limitada, em certa medida, por causa das restrições de
processamento, como a velocidade ou a discriminação do input ou a influência
do conhecimento prévio, memória e funcionamento executivo (veremos mais
sobre estes aspectos na Unidade 2 deste livro).

Alexander, Schallert e Reynolds (2009, p. 186) definiram a aprendizagem


da seguinte forma:

um processo multidimensional que resulta em uma mudança


relativamente duradoura em uma pessoa ou pessoas e,
consequentemente, como essa pessoa ou pessoas perceberão o mundo
e reciprocamente responderão física, psicológica e socialmente às
possibilidades [affordances] oferecidas pelo ambiente. O processo
de aprendizagem tem como base a relação sistêmica, dinâmica e
interativa entre a natureza do aprendiz e o objeto da aprendizagem
ecologicamente situado em um determinado tempo e lugar, bem como
ao longo do tempo.

Essa definição se encaixa bem com a sugestão que oferecemos no


próximo tópico desta unidade, de que quando um indivíduo não tem acesso
à informação em uma modalidade sensorial (uma dimensão do processo, por
exemplo, audição), em certo sentido, todo o indivíduo é modificado, pelo menos
em termos de processamento psicológico e cognitivo (MARSCHARK; ​​KNOORS,
2012; MYKLEBUST, 1960).

A aprendizagem é caracterizada por vários princípios fundamentais.


Em primeiro lugar, aprender significa mudar, obviamente, a mudança no
conhecimento armazenado na memória de longo prazo, seja quantitativamente
(mais conhecimento) ou qualitativamente (em sua organização, veja o Tópico 3
da Unidade 2). Essa mudança no aluno pode levar a mudanças no ambiente do
aluno, o que pode novamente afetar o aluno. Por exemplo, aprender a cozinhar
com proficiência frequente leva os indivíduos a reorganizar suas cozinhas e,
com utensílios específicos mais próximos, os hábitos de cozinhar podem mudar.
Tornar-se especialista em um campo, por exemplo, a psicologia escolar, pode
levar à reorganização das estantes de livros, o que, por sua vez, pode afetar a
recuperação futura de informações (desses livros). Por meio de processos cíclicos

7
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

como esses, a aprendizagem é constante e contínua, e nem crianças, nem adultos


podem impedir que o aprendizado aconteça, pois é inevitável, essencial e ubíquo.
As crianças irão adquirir a linguagem e o idioma desde que haja alguma forma
de input linguístico. Elas não podem decidir não aprender a linguagem e o
idioma, em específico; o processo é inevitável. Sem aprendizagem, os humanos
simplesmente não sobreviveriam. É de vital importância que muito ou talvez a
maior parte da aprendizagem ocorra automaticamente.

Os exemplos anteriores apontam que a aprendizagem pode ser não


intencional e incidental ou consciente e intencional. Mesmo na educação, nem
toda aprendizagem é explícita. Pelo contrário, grande parte dela que ocorre
durante os anos escolares resulta de processos implícitos (dentro e fora da
escola). Já observamos que a aprendizagem do primeiro idioma, primeira língua,
geralmente evolui implicitamente, pelo menos se houver modelos de linguagem
acessíveis para aprender. Quando tais modelos não estão disponíveis, como
quando uma criança com surdez profunda está em uma família ouvinte não
familiarizada com a língua de sinais, a aprendizagem geralmente implícita da
língua tem que se tornar mais explícita.

No entanto, mesmo que a aprendizagem ocorra explicitamente, o uso do


que foi aprendido pode estar implícito. Ou seja, a maneira como aprendemos
está fortemente relacionada à maneira como somos constituídos como humanos.
A arquitetura neurocognitiva dos seres humanos molda amplamente a
aprendizagem e é moldada pela aprendizagem, assim como a linguagem (e a
língua, particularmente) molda a aprendizagem e é moldada por ela. Muitos dos
processos envolvidos no desenvolvimento, portanto, são recíprocos. Certamente,
há considerável variação entre os seres humanos nos processos e resultados da
aprendizagem, em parte por causa do fato de que são muitas vezes pequenas,
contudo importantes, diferenças em nossa arquitetura ou funcionamento
neurocognitivo.

Em estudos separados, por exemplo, McEvoy, Marschark e Nelson (1999)


e Marschark et al. (2004) descobriram que a organização do conhecimento lexical
nas memórias de longo prazo de estudantes universitários surdos e ouvintes se
sobrepunha aproximadamente a 77% a 80%. Eles argumentaram, no entanto,
que os 20% ou mais de conhecimento conceitual provavelmente desempenham
um papel significativo nas diferenças observadas entre as duas populações em
leitura, resolução de problemas e aprendizagem em geral.

Em resumo, a aprendizagem é tanto um processo quanto um produto.


O produto é a mudança que resulta da aprendizagem; o processo é o modo
como essa mudança foi realizada. As pessoas podem aprender de maneira
diferente em diferentes momentos no tempo. Em parte, aprender como um
processo de desenvolvimento é o resultado de nossa arquitetura neurocognitiva
se desenvolvendo com o tempo e amadurecendo. Todavia, como vimos, a

8
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

aprendizagem também é recursiva e iterativa: as mudanças estabelecidas por


ela influenciam os processos de aprendizagens subsequentes. E, finalmente, a
aprendizagem é interativa. As mudanças trazidas por ela não ocorrem apenas nos
aprendizes, mas também no contexto da aprendizagem (BRONFENBRENNER,
1996).

4 AS ORIGENS DA APRENDIZAGEM
Geary (2009) sugeriu que, se alguém quiser entender a aprendizagem,
não só precisa abordar o quê, onde, quem e quando aprender, mas também o
porquê. Por que aprendemos? Em um contexto evolucionário, a aprendizagem
resulta em indivíduos que têm várias opções para resolver conflitos sociais ou
desafios de subsistência. Eles podem prever o comportamento de outras pessoas
ou de animais, onde conseguir alimentos, levando as vantagens competitivas em
comparação com os seres humanos que aprenderam menos. No início de nossa
evolução, essa aprendizagem foi amplamente implícita e seus objetivos muitas
vezes não eram óbvios para os aprendizes. Hoje, muito da aprendizagem tornou-
se mais explícito, e a busca de objetivos específicos muitas vezes tem que ser
motivada explicitamente.

Esforços bem-sucedidos para entender a aprendizagem humana, portanto,


exigem ênfase simultânea em ambientes informais e formais de aprendizagem
(BRANSFORD et al., 2010). A aprendizagem estruturada geralmente ocorre
em contextos formais, principalmente, por meio de ensino explícito conduzido
em salas de aula, laboratórios ou situações de tarefas específicas. O ensino e
a aprendizagem em ambientes educacionais formais geralmente envolvem
currículos planejados e predeterminados. A aprendizagem informal, em contraste,
é frequentemente implícita, ocorrendo simplesmente através da participação em
atividades cotidianas no mundo. Em contraste com a aprendizagem formal e
estruturada, a informal parece ser rápida e sem esforço. Talvez até 90% de toda
a aprendizagem ocorra dessa maneira, em contextos informais. Este processo
informal está intimamente ligado ao conceito de aprendizagem situada, isto é, a
ideia de que este processo está situado em contextos sociais e físicos particulares,
o mesmo contexto no qual ele é aplicado (LAVE; WENGER, 1991). Procede,
portanto, detectando (geralmente inconscientemente) padrões de covariação em
eventos no ambiente. As crianças e os adolescentes trazem muito conhecimento
informal para o contexto escolar, nas aulas, brincadeiras e momentos lúdicos. Em
todos os casos, fornece uma base importante para a aprendizagem mais formal
em contextos acadêmicos.

Aprender, em última instância, pode levar à especialização ou expertise.


O que distingue os experts dos novatos é a quantidade e a qualidade das
informações que eles possuem sobre um determinado tópico. Isso fornece aos
experts a capacidade de perceber aspectos específicos de problemas e situações
que podem passar despercebidos aos novatos. Em outras palavras, os alunos
experts são muito melhores no reconhecimento de padrões e na identificação

9
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

de características distintas que colocam algo em uma categoria ou outra em


comparação com os alunos novatos. Alunos experts, portanto, não apenas
aprenderam com as experiências, mas também aprenderam a experimentar e
experienciar. Seu conhecimento é estreitamente conectado e bem organizado em
torno de conceitos fundamentais.

A maior parte da aprendizagem durante a primeira infância, do nascimento


até cerca de quatro ou cinco anos de idade, ocorre em casa. É informal e, em
grande medida, implícita (ver Tópico 3 desta unidade), procedendo rapidamente
e aparentemente sem muito esforço. Um scaffolding (uma estrutura de suporte)
eficaz de experiências precoces por parte dos pais, não apenas no domínio da
língua, mas também em outros domínios cognitivos, contribui para a facilidade de
aprendizagem. Essa pode ser uma das razões pelas quais os filhos de professores
parecem ter melhor desempenho na escola do que muitos de seus colegas. Seus
pais-professores aprenderam (explícita e implicitamente) a melhor forma de
estruturar situações de aprendizagem que correspondam às habilidades de uma
criança.

De maneira mais geral, o ambiente intrinsecamente familiar e autônomo


em casa também é uma base importante para a aprendizagem. Esse ambiente e
as pessoas e os eventos vivenciados são altamente previsíveis para as crianças
pequenas, devido a sua frequência, transparência em termos da progressão
ordenada das atividades e da linguagem que normalmente a acompanha. Às
vezes, porém, os pais simplificam demais as atividades e a linguagem dirigida
aos filhos pequenos, com a expectativa de que sejam menos competentes do que
realmente são. Essa tendência tem sido vista particularmente entre os pais de
crianças com necessidades especiais, o que pode levar essas crianças a se tornarem
excessivamente dependentes dos outros.

As crianças parecem aprender sobre o mundo ao seu redor da mesma


maneira que os cientistas conduzem experimentos. De acordo com a "teoria da
teoria", as crianças têm teorias intuitivas sobre o mundo, análogas às teorias
científicas. Essas teorias mudam de maneira semelhante à ocorrência de mudanças
nas teorias científicas (GOPNIK, 2018). Ou seja, as crianças analisam o ambiente,
prestam atenção às regularidades e formam teorias intuitivas sobre o mundo
biológico, físico ou psicológico. Piaget (1970) referiu-se a isso como raciocínio
hipotético-dedutivo e presumiu que não ocorria até a infância tardia, nos anos pré-
adolescentes. Reconhecemos agora que as crianças pequenas são aprendizes mais
sofisticados, percorrendo o mundo de uma maneira analítica mais deliberada e
compreendendo muito mais do que Piaget jamais imaginou. Por exemplo, como
provou Stanislas Dehaene (1997) em relação ao senso numérico das crianças.

O que caracteriza a aprendizagem exuberante que ocorre durante a


infância? Meltzoff et al. (2009) resumiram pesquisas relevantes, resultando no
estabelecimento de fundamentos para uma nova teoria da aprendizagem em bebês
e crianças. Eles identificaram três principais forças motrizes na aprendizagem
inicial.

10
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

A primeira força motriz refere-se ao fato de a aprendizagem das crianças


ser computacional. Elas prestam atenção às regularidades estatísticas e à
covariação na linguagem e nos eventos ao seu redor, derivando informações de
seus ambientes que lhes permitem reconhecer e prever implicitamente as relações
de causa e efeito em torno delas.

A segunda força motriz refere-se à aprendizagem das crianças ser social.


As interações sociais com outras pessoas oferecem uma fonte rica de informações
para a aprendizagem das crianças, não apenas na linguagem, mas também em
termos de dinâmica comportamental, cognitiva e social. A imitação, a atenção
compartilhada e a compreensão dos sentimentos e perspectivas dos outros (veremos
mais sobre este aspecto no Tópico 3 da Unidade 2) são pedras angulares desses
processos de aprendizagem social. A aprendizagem é acelerada pela imitação, e
as oportunidades de aprendizado são multiplicadas pela imitação, levando a um
processo mais rápido com menos erros em comparação com a descoberta individual
ou a aprendizagem de tentativa e erro. No entanto, a imitação pelas crianças não
é simplesmente a cópia da linguagem ou comportamento de adultos ou colegas.
Em vez disso, geralmente envolve a reconstrução de metas, ações e intenções de
outros para alcançar resultados semelhantes. Assim, compartilhar a atenção com
os outros facilita a aprendizagem social, porque essa atenção compartilhada por
um evento ou objeto cria um terreno comum para comunicação e ensino. Tomadas
em conjunto, as capacidades para tomar a perspectiva dos outros e compreender
suas emoções são os ingredientes essenciais da aprendizagem cooperativa (ver
Tópico 3, Unidade 2), atividades que se tornarão cada vez mais importantes à
medida que a criança se envolve com os colegas e ingressa na escola.

A terceira força motriz refere-se ao fato de a aprendizagem ser toda


baseada em redes cerebrais neurais. Estas redes ligam a percepção e a ação em
suporte à aprendizagem. A aprendizagem das crianças, portanto, é, até certo
ponto, determinada pela arquitetura neurocognitiva específica que elas possuem
em virtude de serem humanas.

Aprendizagem e o brincar, muitas vezes, fundem-se em crianças


pequenas. Vamos considerar o brincar com alguma profundidade no Tópico 3
desta unidade, no que se refere especificamente ao desenvolvimento linguístico,
cognitivo e social. Neste ponto, é suficiente notar que o brincar é um componente
natural e importante na vida das crianças (JOIA, 2018). O brincar – e a ludicidade,
no sentido mais amplo – envolve as crianças no explorar de seus ambientes físicos
e sociais, estabelecendo assim a base para a posterior exploração e aprendizagem
acadêmica, bem como a descoberta dos seus próprios potenciais físicos (HIRSH-
PASEK et al., 2009). Como veremos, a brincadeira é uma base essencial para a
formação do conhecimento cognitivo e procedimental, atenção sustentada,
representação simbólica, resolução de problemas e desenvolvimento da memória.

11
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

5 APRENDIZAGEM FORMAL EM ESCOLAS


Quando as crianças vão à escola, a aprendizagem formal – a capacidade
de se beneficiar da instrução explícita – torna-se cada vez mais importante. A
aprendizagem informal também ocorre em contextos educacionais, mas a
aprendizagem formal envolve um conjunto diferente de habilidades e aptidões
do que é necessário na aprendizagem informal. Dependendo de onde moram,
as crianças nos países ocidentais costumam frequentar a escola entre quatro e
seis anos de idade. As crianças surdas, muitas vezes, frequentam a escola com
menos de três anos de idade, muitas vezes em programas destinados a aumentar
a prontidão escolar.

Na escola, as crianças se transformam em estudantes. Elas precisam


aprender informações cada vez mais complexas, muitas vezes novas, bem como
usar seus conhecimentos existentes de novas maneiras. Aprender, no entanto,
é muito mais do que a aquisição de informações. Na verdade, é a construção
do conhecimento, a construção de representações mentais. Este é um processo
ativo em que a instrução orienta os alunos a atribuir significado à instrução e
aos materiais didáticos, ao mesmo tempo em que promove habilidades que
permitem que as crianças se tornem aprendizes independentes no sentido formal,
assim como já estão no sentido informal. A informação é assim transformada em
conhecimento. O objetivo essencial da instrução é aprimorar a aprendizagem
significativa pelo estímulo do processamento ativo do conteúdo pelos alunos,
enquanto reduzindo a carga cognitiva. Vamos descompactar essa noção a seguir.

Os seres humanos têm vias separadas para perceber e processar


informações (BADDELEY; ANDERSON; EYSENCK, 2011). Devido aos limites
de memória de trabalho, só podemos processar quantidades limitadas de novas
informações em cada via. Para criar uma aprendizagem significativa, temos que
colocar o esforço consciente em processos cognitivos, como selecionar, organizar
e integrar novas informações com conhecimento prévio. O Tópico 3 da Unidade
2 descreverá como isso envolve memória de curto prazo ou de trabalho, memória
de longo prazo e funcionamento executivo (que essencialmente controla o fluxo
interno de informações). O processo é uma combinação de processamento
“de cima para baixo” (top down) e “de baixo para cima” (bottom up), pois o que
sabemos influencia a maneira como percebemos e lidamos com as informações
recebidas e as informações recebidas alteram o que sabemos. O elemento-chave
da aprendizagem, portanto, é que ela leva a mudanças na informação armazenada
na memória de longo prazo, tanto quantitativa quanto qualitativamente. A
memória de longo prazo, portanto, pode ser vista como um depósito dinâmico e
em evolução, contendo informações sobre experiências passadas e conhecimento
de vários domínios. Alguns desses conhecimentos são explícitos (por exemplo,
a circunferência da Terra) e alguns deles são implícitos (por exemplo, como se
mediria a circunferência da Terra).

12
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

A aprendizagem pode ser mediada por fatores motivacionais que


aumentam ou diminuem o engajamento. A metacognição, essencialmente a
cognição sobre a cognição ou pensamento sobre o pensamento (ver Tópico 3,
Unidade 2), também medeia a aprendizagem regulando o processamento cognitivo
e o afeto. Diferenças nos conhecimentos prévios e nas habilidades dos aprendizes
podem influenciar a aprendizagem de novas informações diretamente, em relação
à medida em que as novas informações são capazes de se “encaixar” com o que já
é conhecido (MORENO; MAYER, 2007), ou indiretamente, em relação à medida
em que o aluno é motivado a se envolver no esforço cognitivo necessário. De
qualquer maneira, um risco potencial é que as demandas cognitivas das tarefas
de aprendizagem ou a quantidade de informação que precisa ser processada
excedem as habilidades de processamento cognitivo dos aprendizes, o que é
usualmente referido como sobrecarga cognitiva (PAAS; VAN GOG; SWELLER,
2010).

Quando os processos cognitivos necessários não são capazes de lidar


com a taxa ou a complexidade da informação recebida, o indivíduo pode ficar
sobrecarregado antes que a aprendizagem significativa comece. Consistente
com a descrição anterior, isso pode ocorrer porque as informações ou eventos
que estão sendo experimentados não são familiares (ou seja, não se encaixam
bem com o que está na memória de longo prazo) ou o aluno não é motivado
ou capaz de alocar os processos necessários, ou pode ser uma consequência da
qualidade da interação ou da comunicação entre pessoas, como professores e
alunos. Quanto mais complexa a tarefa cognitiva em relação ao conhecimento
e habilidades do aprendiz, maior a probabilidade de criar um "gargalo" no
processamento cognitivo (SWELLER; VAN MERRIENBOER; PAAS, 1998).
Informações irrelevantes, não relacionadas à tarefa, podem levar à distração nas
quais o aluno processa informações de maneira inadequada à tarefa em questão
(KIRSCHNER; PAAS; KIRSCHNER, 2009).

Evitar a sobrecarga cognitiva durante a construção do significado a partir


de novas informações envolve lidar com a capacidade limitada da memória
operacional. Como a instrução geralmente envolve novas informações, um
objetivo do professor (formal ou informal) é projetar ou agrupar as informações de
maneira a acomodar essas limitações e, assim, ajudar o aluno a evitar ou superar
os gargalos. Tais ajustes são ainda mais importantes – mas também mais difíceis –
se os professores e alunos não compartilharem uma língua comum fluente ou se o
acesso à língua de ensino for limitado por parte dos alunos. Nesses casos, e mais
notavelmente entre os alunos surdos, grande parte da capacidade de memória
de trabalho dos alunos deve ser dedicada apenas à compreensão da língua –
compreensão de palavras e frases individuais –, deixando menos capacidade de
construir o significado real que resulta na aprendizagem.

Quando um aprendiz consegue integrar efetivamente novas informações


com conhecimento prévio por meio de uma combinação de habilidades
cognitivas, características da informação e adaptação à memória de longo prazo,

13
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

as limitações de processamento desaparecem. Quantidades muito grandes de


informações podem ser armazenadas, recuperadas e utilizadas para obter ainda
mais informações. Em outras palavras, a aprendizagem ocorre.

6 APRENDIZAGEM INDIVIDUAL, COOPERATIVA E


COLABORATIVA
Embora os professores desempenhem um papel importante na
aprendizagem dos alunos na escola, a aprendizagem não se restringe às interações
professor-aluno. Aprender com os colegas também é importante, não apenas fora
da sala de aula, mas também dentro dela. Assim, os alunos na escola não apenas
aprendem como indivíduos, mas também coletivamente, durante o trabalho em
grupo e com as discussões. O trabalho em grupo nas escolas pode implicar tutoria
entre pares, aprendizagem cooperativa e aprendizagem colaborativa. Estas três
formas de trabalho em grupo distinguem-se por níveis crescentes de igualdade e
envolvimento mútuo entre estudantes (TOLMIE et al., 2010).

A tutoria entre pares é caracterizada por uma relação vertical entre os


alunos: um aluno, o tutor, sabe mais do que o(s) outro(s) ou, por algum motivo, é
mais capaz de lidar com a tarefa em mãos. A aprendizagem cooperativa faz uso de
programas altamente estruturados de atividade nos quais os alunos completam
tarefas individualmente e discutem os resultados uns com os outros. Em ambos os
casos, os alunos precisam ser capazes de implantar uma variedade de habilidades
sociais, incluindo fazer turnos, expressar opiniões, estimular colegas, fornecer e
receber ajuda, ouvir outras pessoas e esclarecer tarefas. Também precisa haver
um senso de coesão e interdependência do grupo. O comportamento pró-social
é, portanto, absolutamente necessário para a aprendizagem cooperativa e está
positivamente associado ao sucesso acadêmico (WENTZEL, 1994). Na medida
em que a aprendizagem colaborativa requer atividade conjunta e compreensão
compartilhada, ela não tem apenas um impacto cognitivo, mas também social.
Além dos ganhos sociais, os indivíduos engajados na aprendizagem colaborativa
frequentemente adquirem melhores habilidades de diálogo e melhoram ainda
mais suas habilidades de trabalho em grupo. Nesse sentido, o trabalho em grupo
oferece uma mistura de aprendizagem formal e informal semelhante àquela em
que as crianças se envolvem mais cedo, durante as interações entre pais e filhos.

A colaboração pode levar a uma melhor resolução de problemas do que


trabalhar individualmente (JOHNSON; JOHNSON, 1981). Isso é especialmente
verdadeiro para tarefas complexas, em que múltiplos indivíduos podem
essencialmente expandir a capacidade de processamento disponível, levando a
uma solução de problemas mais eficiente e eficaz (PAAS; VAN GOG; SWELLER,
2010). A solução colaborativa de problemas, no entanto, exige claramente uma
comunicação fluente em grupo e habilidades eficientes de gerenciamento de
grupo (KIRSCHNER; PAAS; KIRSCHNER, 2009). Isso pode ser um desafio
quando os alunos não são fluentes em uma língua comum, assim como no caso

14
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

de interações aluno-professor. Em tais situações, há também a possibilidade de


que os alunos que são mais fluentes na língua de instrução ou talvez mais velhos
possam dominar a aprendizagem colaborativa, mesmo que não sejam os mais
conhecedores ou proficientes na tarefa em questão.

Esta é obviamente uma dificuldade potencial em salas de aula mistas com


surdos e ouvintes. No entanto, também é problemática em grupos de surdos por
causa do efeito Dunning-Kruger, em que o mecanismo de superioridade ilusória
faz com que indivíduos que possuem pouco conhecimento sobre um assunto
passem a acreditar que sabem mais que outros mais competentes (KRUGER;
DUNNING, 1999). Tal efeito pode levá-los a tomar decisões erradas e chegar
a resultados indevidos. Diversos estudos demonstraram que os alunos surdos
tendem a pensar que aprenderam ou sabem mais do que realmente sabem
em maior grau do que os alunos ouvintes (MARSCHARK et al., 2005). Como
resultado, a aprendizagem colaborativa ou a tutoria de pares em um grupo
de alunos surdos pode ser mais lenta ou até mesmo desviada de sua meta. O
progresso da aprendizagem colaborativa em grupos de alunos surdos, portanto,
pode exigir um acompanhamento mais próximo do professor do que em grupos
de alunos ouvintes, para garantir que os líderes compreendam verdadeiramente
a tarefa e a meta, mas também, reconhecendo que sempre existe o potencial da
autocorreção no interior do grupo como um todo.

Dada a necessidade de interdependência no trabalho em grupo, não


deveria surpreender que a qualidade da aprendizagem cooperativa e colaborativa
seja prevista pela percepção da disponibilidade de suporte socioemocional
e acadêmico dos pares (HIJZEN; BOEKAERTS; VEDDER, 2006). O contexto
educacional e o tom estabelecido pelo professor também desempenham um
papel importante no estabelecimento de uma boa qualidade de aprendizagem
colaborativa. Os professores precisam conscientizar os alunos sobre o que é
necessário aprender e trabalhar juntos, habilidades que as crianças surdas, em
particular, podem não ter adquirido antes de irem à escola. O acompanhamento
dos professores da colaboração e aprendizagem cooperativa na sala de aula,
portanto, precisa ocorrer em vários níveis. Isso é facilitado pela consulta regular
com grupos de alunos, em vez de esperar que os indivíduos levantem questões,
mas isso precisa ocorrer sem que o professor se torne intrusivo ou controlador.

Em suma, a aprendizagem baseada na escola é uma atividade cognitiva


e social. Requer um ambiente de apoio em que os alunos interajam uns com
os outros e em que as interações sejam construídas não apenas em habilidades
comunicativas e proficiências de linguagem, mas também em habilidades
sociais. Em todos esses domínios, os aprendizes surdos correm mais riscos do
que os aprendizes ouvintes, particularmente em salas de aula onde os pares
ouvintes dominam o ambiente. Habilidades de comunicação insuficientes,
incompatibilidades no modo de comunicação entre os alunos, proficiências na
língua relativamente baixas (ver Tópico 1, Unidade 2) e problemas com regras
sociais e regulação emocional (ver Tópico 4, Unidade 2) podem contribuir para
um ambiente de sala de aula no qual os alunos surdos têm problemas em serem

15
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

aceitos por seus pares. Tal ambiente de sala de aula pode influenciar negativamente
as oportunidades de aprendizagem para os alunos surdos tanto a curto como a
longo prazo.

7 APRENDER E ENSINAR
Em contextos educacionais formais, o ensino é, por definição, um processo
importante no estabelecimento da aprendizagem. Mais comumente, isso envolve
instrução direta de profissionais, mas, como observamos, o ensino também pode
ocorrer entre pares e, de formas mais indiretas, por meio de processos mediados
(por exemplo, com a ajuda de intérpretes) ou através da aprendizagem a distância
com a ajuda de tecnologia e materiais multimídia (BRANSFORD et al., 2010).
No entanto, alguma aprendizagem ocorre em situações em que os aprendizes
constroem significado sem instrução explícita. Normalmente, isso envolve o
que Geary (2008) chamou de informação biologicamente primária. Informações
biologicamente primárias são informações que podem ser adquiridas pelos
alunos sem esforço consciente ou com mínimo esforço. A capacidade de fazê-lo
se desenvolveu no curso da evolução dos seres humanos. Um exemplo de tal
informação referida anteriormente é a nossa primária ou primeira língua.

Em contraste com a informação biologicamente primária, a informação


biologicamente secundária não pode ser aprendida sem instrução explícita e
encorajamento motivacional. Ler, escrever e resolver problemas matemáticos
são exemplos de informações biologicamente secundárias. Apesar de haver, de
acordo com Geary (1995), um sistema biologicamente primário de habilidades
quantitativas que incluem um tipo de compreensão implícita da criança de
contagem e outras operações mais simples, a resolução de problemas matemáticos
é de ordem secundária.

A quantidade deste tipo de informação biologicamente secundária


cresceu tanto durante a evolução humana que escolas e outros tipos de instalações
educacionais tiveram que ser criados para a transmissão efetiva desta informação
culturalmente importante, mas não necessariamente óbvia. Nas palavras de
Geary (2008, p. 186), “escolas [...] são uma inovação cultural imposta a crianças
e adolescentes por adultos para facilitar as transmissões entre gerações de
habilidades secundárias (por exemplo, escrita) e conhecimento”. A aprendizagem
secundária nas escolas refere-se à aquisição de informações e habilidades que são
consideradas pela cultura ou comunidade como importantes. A aquisição de tais
informações procede através de mecanismos criados para permitir que indivíduos
processem e compreendam novas informações que podem não ser adquiridas
espontaneamente. Em essência, a aprendizagem de informação biologicamente
secundária é tipicamente a aprendizagem formal que ocorre principalmente nas
escolas.

16
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

7.1 ENSINO E INSTRUÇÃO


Espera-se que as escolas não apenas promovam a aprendizagem
acadêmica, mas também melhorem a saúde e previnam ou evitem comportamentos
problemáticos (GREENBERG et al., 2003). A instrução em sala de aula que é
culturalmente apropriada e adaptada ao desenvolvimento produz resultados
sociais e emocionais positivos, bem como resultados cognitivos. Os alunos
precisam reconhecer e gerenciar suas emoções e apreciar as perspectivas dos
outros, habilidades que serão usadas dentro e fora da sala de aula. Além disso,
os alunos precisam aprender a tomar decisões positivas, a lidar efetivamente com
as relações interpessoais e a responder aos inputs apropriados (e inapropriados)
de outras pessoas. A competência social e emocional contribui, assim, para a
motivação dos aprendizes e para seu desempenho acadêmico.

Os contextos formais de aprendizagem nas escolas, no entanto, são


amplamente moldados pelos professores. Eles desenvolvem e gerenciam o
ambiente social, bem como o ambiente acadêmico, preparando o terreno para
a formação de relacionamentos entre pares e apoiando os alunos por meio do
incentivo e do fornecimento de feedback (JENNINGS; GREENBERG, 2009). O
que os professores sabem sobre a aprendizagem certamente contribui para o seu
ensino, mas o conhecimento da aprendizagem não se traduz simplesmente em
conhecimento de ensino. Ensinar requer mais que isso. Além de ensinar sobre o
conteúdo da disciplina, o ensino envolve a aplicação cuidadosa do conhecimento,
a manutenção do controle apropriado sobre os fatores instrucionais e contextuais,
e a garantia de que as relações professor-aluno, assim como os relacionamentos
entre os pares, apoiem ​​o ensino e a aprendizagem.

Ensinar, assim, é essencialmente apoiar os aprendizes na aquisição de


informação e na construção de conhecimento. No núcleo do ensino está a instrução
(contudo, o ensino não pode ser reduzido à instrução). O objetivo da instrução é
ajudar os aprendizes a compreender o conteúdo do que é instruído (MORENO;
MAYER, 2007). O que os alunos apreendem da instrução, no entanto, também é
mediado por sua motivação para aprender e por sua capacidade de controlar seus
próprios processos de aprendizagem por meio de estratégias metacognitivas. Em
um sentido amplo, isso significa que a instrução se refere a todas as ações de
instrutores que melhoram a aprendizagem (MAYER, 2008). Não se trata apenas
de transmitir informações, mas também de orientar os alunos em seus esforços
para resolver problemas e aprender sozinhos, inclusive aprender a aprender.
Poderíamos presumir que os alunos aprenderiam simplesmente ao ser expostos
a informações e experiências com o mínimo de orientação, ou precisariam de
instrução explícita e direta? Eles descobrem conceitos e procedimentos por meio
do manuseio de informações, ou precisam de ensino formal? Temos enfatizado
que, na aprendizagem, os alunos constroem ativamente o significado. Todavia,
será isso suficiente?

17
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

Aprender/construir significado sem ensino explícito parece estar


limitado a domínios biologicamente primários. Aprender o conteúdo de
disciplinas acadêmicas, domínios biologicamente secundários, requer orientação
instrucional direta, especialmente quando a informação é nova ou o aprendiz é
novo (KIRSCHNER; SWELLER; CLARK, 2006). Para estabelecer as mudanças na
memória de longo prazo que definem a aprendizagem, é mais eficaz e eficiente
que os professores expliquem completamente novos conceitos, procedimentos e
estratégias de aprendizagem para seus alunos.

Em outras palavras, ao contrário das suposições frequentes, a instrução


direta geralmente leva a resultados melhores e mais rápidos em comparação
com a aprendizagem da descoberta, ou seja, “deixar o aluno descobrir por
si mesmo”. Alunos inexperientes ou aprendizes experientes diante de novas
informações, tarefas ou contextos, normalmente, terão conhecimento insuficiente
na memória de longo prazo e talvez habilidades cognitivas insuficientes para uma
aprendizagem totalmente independente. Essas situações frequentemente levam a
esforços improdutivos de solução de problemas. Em termos da teoria da carga
cognitiva, quando os alunos se deparam com tarefas cognitivamente desafiadoras,
como aprender a ler, escrever e calcular, cargas pesadas de memória afetarão
negativamente a aprendizagem. Os novos alunos, em particular, enfrentam
dificuldades porque lhes faltam esquemas mentais adequados para incorporar
novas informações e sintetizá-las com seu conhecimento prévio.

Existem várias possibilidades instrucionais que permitem aos professores


gerenciar a carga cognitiva em seus alunos (PAAS; VAN GOG; SWELLER, 2010).
Uma abordagem é usar “exemplos trabalhados” nos quais o aluno é orientado
não apenas para o problema, mas também para possíveis soluções. Isso evita
que o aluno tenha que resolver um problema do zero, em vez disso, é levado
a entender o problema e a ver como resolvê-lo. Os exemplos permitem que a
aprendizagem ocorra, dando aos alunos a oportunidade de refletir sobre uma
solução e alternativas, bem como caminhos para a solução. O fornecimento de
instruções diretas, apresentando exemplos trabalhados, reduz a carga de memória
de trabalho direcionando a atenção, restringindo a busca do aluno pela solução e
evitando o efeito labirinto (garden paths) no qual consumirá muito tempo e talvez
será confuso retornar.

E
IMPORTANT

A teoria de Garden Path (traduzido literalmente como “caminho do jardim”), ou


teoria do labirinto, foi desenvolvida por Frazier (1979). Este modelo teórico argumenta que
os leitores consideram apenas uma estrutura sintática para uma sentença e o significado
não está envolvido na seleção do significado sintático preliminar. Assim, leitores e ouvintes
podem ser enganados por frases ambíguas (ou seja, frases tipo labirintos).

18
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

A carga cognitiva na aprendizagem também pode ser reduzida pela


chamada abordagem parte-todo. Nesta abordagem, a quantidade de informação
(por exemplo, elementos problemáticos e operações) é reduzida dividindo uma
tarefa complexa em tarefas mais simples. Como o aluno demonstra a capacidade
de entender e resolver partes da tarefa maior, informações ou subtarefas podem
ser adicionadas até que a tarefa original requeira apenas mais uma pequena
etapa. Alternativamente, os alunos podem ser solicitados a explicar em voz alta
como conseguiram resolver um problema, muitas vezes chamado de "pensar em
voz alta".

O uso de planilhas de processo é outra maneira de orientar a instrução


e reduzir a carga cognitiva. As planilhas contêm descrições explícitas das várias
etapas na solução de um problema complexo ou na conclusão de uma tarefa,
incluindo dicas e heurísticas relevantes para a classe de problemas/tarefas.

Grande parte da instrução nas escolas é voltada para ajudar os alunos


a automatizar estratégias de aprendizagem para que a resolução de problemas
se torne mais eficiente. Problemas não rotineiros tornam-se problemas rotineiros
quando os alunos podem aplicar estratégias de solução de problemas que já
possuem em situações novas (uma definição comum de inteligência). Esse
processo é referido como transferência de esquema (BRANSFORD et al., 2010).
A aprendizagem inicial meticulosa, a prática de aplicar conceitos abstratos em
contextos variados e o uso de estratégias de processamento destinadas a estabelecer
o vínculo entre informações antigas e novas contribuem para a transferência de
esquemas. A transferência de esquemas impede que os aprendizes se tornem
sobrecarregados pelas demandas de atenção e pela carga cognitiva, porque o
não familiar é tornado familiar. Com prática suficiente, os processos relevantes
tornam-se automáticos, não exigindo mais alocação explícita de atenção ou
pesquisa de informação na memória de longo prazo (FELDON, 2007). Há uma
desvantagem na automatização, no entanto, porque uma vez que uma habilidade
é automatizada, ela não está mais sujeita ao monitoramento ativo pelo indivíduo.
Torna-se difícil mudar um processo tão automático, por exemplo, aprender a
amarrar o cadarço do sapato na direção oposta à direção que você usou toda
a sua vida. No caso de processos acadêmicos, é crucial que os processos sejam
automatizados corretamente na primeira vez.

Uma parte da instrução, portanto, é a orientação dos alunos no


processamento e armazenamento de novas informações na memória de
longo prazo, acabando por automatizar sua recuperação e uso (FELDON,
2007). Professores experientes mostram vantagens distintas a esse respeito
em comparação com os novos professores. Eles demonstram como levar
em conta que, durante a instrução nas salas de aula, vastas quantidades de
informações sensoriais e semânticas estão sendo disponibilizadas aos alunos.
Dada a capacidade limitada da memória de trabalho, eles utilizam técnicas que
orientam os alunos para informações mais relevantes e os ensinam a distingui-
las das informações irrelevantes, reduzindo novamente a carga cognitiva. Ao
mesmo tempo, com base em sua experiência, informações concretas e princípios

19
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

abstratos relacionados ao ensino e à aprendizagem, também são mais capazes


de diferenciar entre dicas relevantes e irrelevantes de seus alunos. Assim como
no caso de alunos mais experientes, os professores mais experientes têm a
capacidade de interpretar e reagir a eventos em sala de aula porque possuem
procedimentos de interpretação mais automatizados. Assim, eles são capazes
de acomodar uma maior complexidade na sala de aula em comparação com os
professores novos, adaptando-se mais efetivamente a situações inesperadas ou
incomuns. Professores mais experientes também são capazes de atribuir mais
atenção a diferenças individuais específicas entre os alunos, permitindo-lhes
responder de forma mais suave e eficaz aos desafios encontrados por cada aluno.
Tudo isso permite que professores experientes sejam mais eficazes em ensinar e
gerenciar simultaneamente os alunos da turma.

Como o exposto acima deve deixar claro, o principal desafio para


a formação de professores é preencher a lacuna entre a teoria e a prática,
automatizando os processos cognitivos, instrucionais e gerenciais apropriados
a diferentes subgrupos de alunos. A formação de professores, portanto, deve
envolver não apenas o ensino da teoria, mas também estratégias para traduzir a
teoria em habilidades de ensino que ajudem os alunos a alcançar seu potencial.

Paralelamente aos seus futuros alunos, os professores precisam praticar


essas habilidades intensiva e repetidamente antes de trabalhar na sala de aula
para se tornarem automatizados. Os graduados em cursos de formação de
professores que oferecem oportunidades práticas abrangentes e bem orientadas
tendem a ser mais eficazes e consistentes em seu ensino, em comparação àqueles
que recebem prioritariamente instrução circunscrita em teoria e em sala de aula.
Tanto para os futuros professores quanto para os professores que já atuam no
campo, a orientação do mentor usando o feedback em vídeo, que visa identificar
pontos cruciais de decisão no ensino, pode ser muito eficaz. A reflexão sobre esses
pontos de decisão deve acompanhar a discussão de respostas alternativas viáveis,
da mesma forma que encorajamos essas atividades em crianças aprendizes.

É claro que os professores precisam de um conhecimento considerável


sobre o assunto que estão ensinando, algo que está faltando frequentemente entre
os professores de surdos (PAGLIARO, 1998). Ao mesmo tempo, é importante que
os professores evitem perder suas intuições sobre o que é aprender como um
novato. Professores eficazes precisam ter conhecimento pedagógico, que é mais do
que apenas conhecimento de conteúdo. Implica também conhecimento sobre os
conflitos dos jovens aprendizes e sobre formas de apoiá-los na sua aprendizagem.

20
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

7.2 O ENSINO E O RELACIONAMENTOS ALUNO-


PROFESSOR
Bergin e Bergin (2009) argumentam que o bem-estar social e emocional dos
estudantes é fundamental para o sucesso escolar. Uma das bases sobre as quais
o bem-estar socioemocional é construído é o apego. Como veremos no Tópico
3 desta unidade, o apego se refere ao vínculo emocional entre os indivíduos no
tempo e no espaço (BOWLBY, 1969, 2002). O apego entre pais e bebês resulta
em crianças se sentindo seguras, permitindo que explorem livremente seus
ambientes.

O apego está envolvido de forma mais ampla na socialização das crianças


durante toda a infância, não apenas durante a primeiríssima infância e a primeira
infância. A segurança no apego dos pais, portanto, tem sido encontrada fortemente
ligada a uma variedade de efeitos para a criança, incluindo o sucesso na escola.
Embora considerado com menos frequência, o apego professor-aluno também
é muito importante (BERGIN; BERGIN, 2009). Alunos que experienciam bons
relacionamentos professor-aluno tendem a ter um bom desempenho acadêmico.
Eles obtêm pontuações mais altas nos testes de desempenho, experimentam
atitudes mais positivas em relação à escola, mostram mais envolvimento na sala
de aula e são menos propensos a serem retidos (HAMRE; PIANTA, 2001).

De um modo mais geral, as variáveis ​​dos professores centrados nos


alunos são importantes indicadores de resultados positivos dos alunos. As
variáveis ​​do professor, como ter relações positivas com os alunos, ser não diretivo,
demonstrar empatia e cordialidade e incentivar o pensamento e a aprendizagem
(CORNELIUS-WHITE, 2007) fornecem aos alunos bases “seguras” as quais
poderão explorar academicamente. Como os professores podem desenvolver
relacionamentos mais seguros com seus alunos? Primeiro, os professores precisam
estar bem preparados para a aula. Novamente em paralelo aos seus alunos, uma
melhor preparação permite aos professores mais capacidade cognitiva de atender
a aspectos da sala de aula além do conteúdo em si, incluindo o funcionamento
interpessoal. Em segundo lugar, os professores precisam de autenticidade.
Mostrar aos alunos quem eles realmente são, seus “selves verdadeiros”, ajuda os
professores a apoiarem laços socioemocionais. Em terceiro lugar, manter altas
expectativas para os alunos também contribui para relacionamentos positivos
professor-aluno. Isso é especialmente benéfico quando associado à compreensão
precisa das competências do aluno e das diferenças individuais. Finalmente, os
professores precisam ter uma atitude de apoio à autonomia em vez de serem
controladores (GURLAND; GROLNICK, 2003). O apoio à autonomia pode ser
estabelecido por ser sensível aos objetivos de cada criança e por oferecer às
crianças escolhas.

21
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

Os professores parecem reagir mais negativamente aos alunos inseguros


do que aos alunos seguros. As crianças que foram maltratadas em casa ou na escola
muitas vezes anseiam por relações seguras com seus professores, mas geralmente
é mais difícil para os professores realmente gostarem delas. Mesmo nesses casos,
no entanto, é possível desenvolver relacionamentos seguros professor-aluno
(BERGIN; BERGIN, 2009). Indo um passo além, assim como no apego entre pais e
filhos e entre professores e alunos, o vínculo com a escola pode contribuir para os
sentimentos de segurança e bem-estar dos alunos. Quando os alunos experimentam
um sentimento de pertencer a sua escola, eles participam de redes de amizade
com os colegas e têm relações positivas com seus professores. O vínculo escolar
muitas vezes parece mais difícil no Ensino Médio, provavelmente tanto devido
à estrutura menos que ideal do Ensino Médio quanto aos fatores interpessoais
entre os alunos. Em comparação com as escolas de Ensino Fundamental, por
exemplo, as escolas de Ensino Médio normalmente envolvem uma ênfase maior
no professor e no controle administrativo. As relações professor-aluno tornam-se
menos pessoais no Ensino Médio, uma função tanto do contexto e dos indivíduos
nele inseridos (BERGIN; BERGIN, 2009).

Os problemas que os alunos surdos frequentemente experimentam
no relacionamento com seus pares (ver Tópico 4, Unidade 2) também podem
influenciar as relações professor-aluno. Comunicações menos fluentes, habilidades
sociais menos desenvolvidas e uma língua incompatível entre os alunos surdos e
seus professores podem levar a relacionamentos professor-aluno que são menos
positivamente experimentados por ambas as partes.

8 EDUCAÇÃO BASEADA EM EVIDÊNCIAS


Muitas pessoas, investidores e governos atribuem grande valor à
implementação e uso de práticas baseadas em evidências em domínios como
saúde e educação. O paradigma dominante é que a eficácia e a eficiência das
intervenções nesses domínios são melhor garantidas se as práticas forem apoiadas
ou informadas pela pesquisa. Práticas baseadas em evidências na educação são
aquelas práticas que melhoram os resultados do aluno, conforme demonstrado
pela pesquisa (GARY; PRING, 2007). Nos Estados Unidos, por exemplo, a Lei No
Child Left Behind (Nenhuma Criança Deixada para Trás) de 2002 enfatizou o uso
de evidências de pesquisa para melhorar a instrução. Na República da Irlanda,
a Lei Education of Persons With Special Education Needs (Educação de Pessoas com
Necessidades Educativas Especiais) de 2004 determinou a prática baseada em
evidências para todos os indivíduos com necessidades educacionais especiais.

No Brasil, o desempenho dos alunos no Pisa (Programa Internacional de


Avaliação de Estudantes) avançou muito pouco, apesar de ter sido o único país
na América Latina a melhorar em todas as disciplinas entre o ano 2000 e 2009.
Ainda assim, as principais bases de dados são o IBGE, o Ministério do Trabalho, a
Secretaria do Tesouro Nacional e o INEP. “Apesar da lei de acesso à informação, o

22
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

acesso de pesquisadores às bases de microdados no Brasil ainda é muito limitado,


complicado e burocratizado, o que coloca os pesquisadores brasileiros em
enorme desvantagem em relação aos seus colegas de outros países” (ELACQUA
et al., 2015, p. 22). A ideia da prática baseada em evidências é simplesmente
que a instrução deve ser baseada em evidências de pesquisa e em um senso de
responsabilidade, levando a uma cultura de mensurar e compartilhar resultados
educacionais (GARY; PRING, 2007).

A prática baseada em evidências é frequentemente equacionada com o


uso de métodos educacionais que foram provados eficazes pela pesquisa científica.
Essa interpretação estrita, em nossa opinião, não é muito útil, porque a maioria
dos pesquisadores em pesquisas sociais ou educacionais negaria o objetivo (e
até mesmo a possibilidade) de se “provar” algo. Além disso, há fatores mais
importantes a serem levados em conta na tomada de decisões educacionais dos
professores do que apenas a pesquisa. Uma perspectiva muito mais útil, e na
verdade uma que foi pretendida pelos criadores da prática baseada em evidências
na medicina, é aquela que reconhece tanto a pesquisa quanto a expertise prática.
Aplicando a definição da medicina baseada em evidências de Sackett et al. (1996, p.
71) ao campo da educação de surdos, diríamos que a educação de surdos baseada
em evidências é o “uso consciente, explícito e criterioso da melhor evidência atual
na tomada de decisões” sobre tal campo.

A prática da educação baseada em evidências significa integrar a


experiência individual de ensino com as melhores evidências educacionais
externas disponíveis da pesquisa sistemática. Seguindo a visão de Sackett et al.
(1996) sobre os bons médicos, os bons professores usarão tanto o conhecimento
individual de ensino quanto a melhor evidência externa disponível, pois
nenhum destes sozinho é suficiente. Sem experiência de ensino, a prática corre
o risco de se tornar tiranizada por evidências de pesquisa, pois mesmo uma
excelente evidência externa pode ser inaplicável ou inapropriada para um aluno
individual. Sem a melhor evidência atual, no entanto, a prática corre o risco de
se tornar rapidamente desatualizada, em detrimento dos alunos. Esta questão
é particularmente proeminente na educação de surdos, em que a natureza da
população estudantil mudou significativamente ao longo das últimas décadas.

Alguns estudiosos preferem o termo “práticas informadas por evidência”


ao invés de “baseadas em evidências” (SEBBA, 2007). Nessa visão, as pessoas que
usam evidências de pesquisa para suas ações não baseiam suas ações na pesquisa,
mas permitem que a pesquisa as guie. Qualquer que seja a maneira como é vista,
é claro, a pesquisa deve ser confiável. Meta-análises ou, melhor ainda, revisões
sistemáticas de pesquisas são vistas como fontes confiáveis ​​de informações de
pesquisa. Uma extensa e completa visão geral das evidências disponíveis para
práticas em educação de surdos pode ser encontrada em Spencer e Marschark
(2010). Idealmente, essas informações são integradas por professores e outros
profissionais com suas próprias experiências, preferências e valores, bem como
com os desejos dos alunos para os quais trabalham e com o contexto em que
trabalham e vivem.

23
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

8.1 VIABILIDADE DOS DELINEAMENTOS DE PESQUISA


Ensaios clínicos randomizados (ECRs) são tipicamente encontrados em
pesquisas médicas, particularmente em pesquisas que buscam demonstrar a
eficácia de drogas ou outros tratamentos. Em um ECR, o objetivo é determinar
se o resultado do tratamento é o resultado de um medicamento, uma cirurgia ou
alguma outra intervenção terapêutica. O profissional que administra o tratamento
não faz parte da intervenção. Pode-se argumentar sobre se essa perspectiva é
sempre apropriada no campo da medicina, mas certamente é muito limitada para
intervenções sociais ou educacionais.

Em psicoterapia, por exemplo, é bem aceito que pelo menos 30% do


efeito da terapia é explicado pelo terapeuta e não pelo método. Isso também
parece plausível na educação, porque sabemos, a partir dos estudos de eficácia
educacional, que os professores são tão importantes quanto a didática e os
métodos de contribuição ao desempenho acadêmico. Professores eficazes podem
alcançar até quatro vezes mais crescimento de aprendizagem em seus alunos do
que professores menos eficazes (MARZANO, 2003). Concentrar-se simplesmente
nos efeitos das intervenções educacionais, portanto, nega a importância daqueles
que as aplicam.

Além disso, muitas vezes é impossível realizar experimentos


educacionais com alocação randomizada de participantes individuais para
condições experimentais de uma forma eticamente adequada. Suponha, por
exemplo, que gostaríamos de estudar o efeito das configurações educacionais
na aprendizagem social entre os alunos surdos. Quais pais concordariam com
um experimento no qual os alunos surdos fossem colocados aleatoriamente no
ensino regular ou especial apenas para estudar essa questão? E como poderíamos
garantir que a colocação em si fosse a única diferença? A realidade é que, na
pesquisa educacional, pelo menos do ponto de vista metodológico, os projetos
mais restritos quase nunca serão aplicáveis. A alocação randomizada de classes
de estudantes em vez de invíduos é às vezes possível, mas tais projetos quase-
experimentais se beneficiam grandemente da adição de métodos qualitativos
para obter informações relevantes.

Finalmente, muitos experimentos ocorrem em condições de laboratório e


não no mundo real. As condições sob as quais a manipulação ocorre, portanto,
diferirão em maior ou menor extensão com a vida real e os participantes se
comportarão do mesmo modo. Como consequência, neste tipo de experimento, a
eficácia de uma intervenção (se produz ou não um efeito) pode ser demonstrada,
mas não a efetividade (quão bem funciona). Para realizar o último, o experimento
tem que ser repetido em condições reais, condições que geralmente são muito
mais difíceis de controlar.

24
TÓPICO 1 | APRENDIZAGEM E ENSINO

8.2 PRÁTICAS DE PUBLICAÇÃO


Há mais uma questão a ser levada em conta na discussão da pesquisa
educacional. A pesquisa formal é tipicamente publicada em revistas científicas. Os
periódicos e publicações que recebem mais respeito são aqueles que são revisados​​
por pares, isto é, aqueles que são lidos (geralmente anonimamente) e criticados por
dois ou mais acadêmicos que possuem experiência na área da pesquisa. A revisão
por pares contribui para a qualidade das publicações, mas é bem conhecido que
estudos que podem relatar efeitos estatisticamente significativos têm uma chance
muito maior de serem publicados do que estudos que não mostram efeito.

Esse viés pode parecer apropriado, porque a falha em demonstrar a


eficácia da manipulação pode realmente significar que não tem efeito ou pode ser
o resultado de uma metodologia de pesquisa fraca ou insuficiente (por exemplo,
participantes insuficientes para superar diferenças individuais). No entanto, o
viés leva claramente a mal-entendidos e a uma visão incompleta das evidências
da pesquisa. Isso significa que, se alguém reunir as evidências disponíveis para
um tratamento ou intervenção com base em uma revisão de publicações em
revistas científicas, deve-se levar em conta que a revisão provavelmente será
positivamente enviesada. Ou seja, pesquisas que falharam em mostrar um efeito
da manipulação de interesse serão sub-representadas, se não totalmente ausentes.

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O conhecimento profissional, em geral, e o conhecimento do professor,
em particular, envolvem muito mais do que conhecer os resultados de pesquisas
relevantes. Divulgar os resultados da pesquisa é meramente fornecer informações
na esperança de que as pessoas as atendam e usem.

O conhecimento é a integração dessas informações com as experiências,


habilidades e atitudes de um profissional. Essa integração da expertise individual
do professor com a melhor informação disponível da pesquisa e a subsequente
aplicação desse conhecimento não são nada fáceis para professores ou outros
profissionais. Ainda assim, isso é importante para avançarmos com a educação e,
em particular, se quisermos avançar mais na educação dos surdos.

25
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico você aprendeu que:

• Se alguém estuda a aprendizagem, deve estudar o desenvolvimento em


contexto.

• A contribuição ambiental é de importância crucial para o desenvolvimento de


estruturas e processos cerebrais geneticamente especificados.

• As condições socioambientais em que o input da língua é dado são tão


importantes quanto o input em si, proporcionando treinamento complexo
e variável em contextos de aprendizagem que destacam informações e
características essenciais de várias tarefas linguísticas e não linguísticas.

• É a plasticidade do cérebro que permite que os humanos se envolvam na


aprendizagem ao longo da vida.

• A aprendizagem de padrões de línguas não nativas torna-se mais difícil porque


o cérebro já se tornou um tanto limitado pela aquisição da primeira língua.

• Aspectos do ambiente social que afetam a aprendizagem são o clima


pedagógico, o número e a qualidade das interações, e a qualidade da linguagem
nas interações.

• Aprender é um processo ecológico moldado tanto por aspectos da situação de


aprendizagem como pelas características do aprendiz.

• Quando um indivíduo não tem acesso à informação em uma modalidade


sensorial, em certo sentido, todo o indivíduo é modificado, pelo menos em
termos de processamento psicológico e cognitivo.

• Mesmo que a aprendizagem ocorra explicitamente, o uso do que foi aprendido


pode estar implícito.

• A aprendizagem é tanto um processo quanto um produto.

• Se alguém quiser entender a aprendizagem, não só precisa abordar o quê,


onde, quem e quando aprender, mas também o porquê.

• Os alunos experts são muito melhores no reconhecimento de padrões e na


identificação de características distintas que colocam algo em uma categoria
ou outra em comparação com os alunos novatos.

26
• O ambiente intrinsecamente familiar e autônomo em casa é uma base
importante para a aprendizagem.

• De acordo com a "teoria da teoria", as crianças têm teorias intuitivas sobre o


mundo, análogasàs teorias científicas.

• A primeira força motriz na aprendizagem inicial refere-se ao fato de a


aprendizagem das crianças ser computacional.

• A segunda força motriz refere-se à aprendizagem das crianças ser social.

• A terceira força motriz refere-se ao fato de a aprendizagem ser toda baseada


em redes cerebrais neurais.

• O objetivo essencial da instrução é aprimorar a aprendizagem significativa


pelo estímulo do processamento ativo do conteúdo pelos alunos, enquanto
reduzindo a carga cognitiva.

• Os seres humanos têm vias separadas para perceber e processar informações.

• A aprendizagem pode ser mediada por fatores motivacionais que aumentam


ou diminuem o engajamento.

• Quando os processos cognitivos necessários não são capazes de lidar com


a taxa ou a complexidade da informação recebida, o indivíduo pode ficar
sobrecarregado antes que a aprendizagem significativa comece.

• O progresso da aprendizagem colaborativa em grupos de alunos surdos pode


exigir um acompanhamento mais próximo do professor do que em grupos de
alunos ouvintes.

• Os aprendizes surdos correm mais riscos do que os aprendizes ouvintes,


particularmente em salas de aula onde os pares ouvintes dominam o ambiente.

• A informação biologicamente secundária não pode ser aprendida sem instrução


explícita e encorajamento motivacional.

• Para estabelecer as mudanças na memória de longo prazo que definem


a aprendizagem, é mais eficaz e eficiente que os professores expliquem
completamente novos conceitos, procedimentos e estratégias de aprendizagem
para seus alunos.

• A carga cognitiva na aprendizagem também pode ser reduzida pela chamada


abordagem parte-todo.

• O apego está envolvido de forma mais ampla na socialização das crianças


durante toda a infância, não apenas durante a primeiríssima infância e a
primeira infância.
27
• Os problemas que os alunos surdos frequentemente experimentam no
relacionamento com seus pares também podem influenciar as relações
professor-aluno.

• A prática da educação baseada em evidências significa integrar a experiência


individual de ensino com as melhores evidências educacionais externas
disponíveis da pesquisa sistemática.

28
AUTOATIVIDADE

1 Em qual idade o córtex motor pré-frontal atinge o seu estado maduro?

2 Quais aspectos do ambiente físico e social afetam a aprendizagem?

3 O que diz a teoria da teoria sobre a aprendizagem?

4 Meltzoff et al. (2009) resumiram pesquisas relevantes, resultando no


estabelecimento de fundamentos para uma nova teoria da aprendizagem
em bebês e crianças. Eles identificaram três principais forças motrizes na
aprendizagem inicial. Quais são estas três forças motrizes?

29
30
UNIDADE 1
TÓPICO 2

APRENDIZES SURDOS

1 INTRODUÇÃO
Como observado no primeiro tópico, é a crença do autor deste livro de
estudos de que ensinar alunos surdos não é o mesmo que – ou não deveria ser o
mesmo que – ensinar alunos ouvintes. Ficará evidente em todo o livro que essa
suposição tem vários níveis. Talvez o mais óbvio seja que ter uma perda auditiva
pode prejudicar seriamente a comunicação, simplesmente porque a maior parte
da comunicação interpessoal ocorre por meio da língua falada. Se uma criança
nasce com audição limitada ou adquire uma perda auditiva no início da vida
(especialmente antes dos dois anos de idade), o desenvolvimento da língua falada
será similarmente limitado, pelo menos até certo ponto.

Certamente, algumas crianças surdas e com deficiência auditiva adquirem


habilidades de língua falada muito boas, mas elas raramente são tão boas quanto
as de uma criança com audição normal. Simplificando, o desenvolvimento de uma
língua falada depende em grande parte de ser capaz de ouvir essa língua. Como
veremos em tópicos posteriores, os aparelhos auditivos e implantes cocleares,
por exemplo, permitem que os indivíduos ouçam mais. Todavia, até mesmo
perda auditiva mínima pode interferir na capacidade das crianças de receber
e aprender a língua falada que as rodeia. Ao mesmo tempo, a perda auditiva
pode interferir na aprendizagem, tanto a aprendizagem informal e incidental
que acontece nas atividades cotidianas, quanto na aprendizagem mais formal
associada à escolaridade. Todas essas questões e suas implicações maiores são o
objetivo deste livro de estudos.

Ao longo do livro, enfatizaremos que, embora a língua falada e a língua de


sinais sejam apropriadas para o ensino de alunos surdos, elas não são equivalentes.
Existem diferenças sociais, cognitivas e acadêmicas associadas ao uso de uma
modalidade de língua ou outra que, acreditamos, afetarão a aprendizagem. Esta
não é uma questão de orientação filosófica ou de ser politicamente correto, mas
uma conclusão baseada no exame das evidências disponíveis da pesquisa em
vários campos.

De fato, um dos principais objetivos deste livro de estudos é evitar as


controvérsias filosóficas e políticas que têm atormentado a educação de alunos
surdos, interferindo e, às vezes, ignorando possíveis intervenções e oportunidades
que possam compensar os desafios da educação de surdos. Deste modo, temos
que ser claros neste ponto: muitas crianças surdas têm sucesso na escola e há

31
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

muitos adultos surdos de sucesso. Todavia, em um mundo em que cerca de


95% das pessoas passam a maior parte da vida ouvindo, a perda auditiva cria
inúmeros desafios.

A partir da psicologia e de outras ciências e práticas profissionais voltadas


para a saúde e educação, o maior desafio associado à perda auditiva e aprendizagem
está relacionado à linguagem, de modo amplo, e à língua, especificamente. Como
a linguagem é a pedra angular da educação, as escolas em que a comunicação
efetiva é limitada tendem a se tornar ambientes de aprendizagem restritivos para
os alunos surdos. No entanto, a perda auditiva precoce e a comunicação limitada
também afetam o desenvolvimento cognitivo e socioemocional, e isso também
pode impedir a aprendizagem.

Como os próximos tópicos irão revelar, mesmo que o risco de obstrução


da aquisição da língua falada seja o primeiro a preocupar os pais de uma
criança surda, e mais tarde isso é o mais evidente para colegas e professores,
as implicações da perda auditiva vão muito além. Um psicólogo que estuda as
implicações da perda auditiva em crianças explica o seguinte: “Quando falta um
tipo de sentido, ela altera a integração e a função de todos os outros. A experiência
é agora constituída de maneira diferente; o mundo da percepção, concepção,
imaginação e pensamento tem um fundamento alterado, uma nova configuração”
(MYKLEBUST, 1960, p. 1). É essencialmente por esta razão que argumentamos
que crianças surdas não são simplesmente crianças que não podem ouvir, esta
é a razão por trás dos esforços internacionais para fornecer triagem auditiva
neonatal universal e intervenção precoce para crianças com perda auditiva, e é a
razão porque acreditamos que um livro destinado ao ensino/educação de alunos
surdos é necessário.

Para apreciar os desafios que os alunos surdos enfrentam na educação e


as oportunidades que os pais e professores têm de ajudar os alunos a reduzir ou
superar esses desafios, é preciso entender o que são audição e perda auditiva e,
mais importante, o que significa ser surdo. Em um nível, isso inclui compreender
as características básicas do som, da audição e da fala, bem como a da perda
auditiva. Este nível inclui possibilidades de reabilitação ou habilitação, mas
também suas limitações. Em um nível diferente, para muitos indivíduos, ser
surdo é muito mais do que uma condição audiológica. É também um estilo de
vida. No Brasil, “deficiência auditiva” é uma das cinco categorias de deficiência
identificadas pelo governo (BRASIL, 1999; BRASIL, 2004), mas as pessoas surdas
constituem a única dessas categorias que também é considerada uma minoria
linguística e cultural (KAUCHAKJE, 2003).

As comunidades surdas e a cultura surda existem em muitos países ao


redor do mundo. Estas têm características associadas a outras comunidades e
culturas: história, literatura, costumes e reconhecimento de contribuições para
campos como ciência e tecnologia. Como Marschark (2007) sugeriu, nesse

32
TÓPICO 2 | APRENDIZES SURDOS

sentido, ser surdo oferece o mesmo tipo de diversidade cultural que famílias
afro-americanas, hispânicas ou judias nos Estados Unidos, que podem apreciar
tanto a cultura americana dominante quanto um elo com uma herança especial.
Consistente com a convenção normal neste campo de estudo, portanto, ao longo
deste livro de estudos usaremos o termo “surdo”, com letra inicial minúscula,
como um adjetivo genérico, em grande parte relacionado à perda auditiva, e
usaremos o termo “Surdo”, com letra inicial maiúscula, no sentido mais restrito
quando nos referirmos à cultura e à comunidade Surda ou aos indivíduos
pertencentes a ela.

Deixamos claro agora que há mais em ser surdo/Surdo do que apenas o


status auditivo. Contudo, também devemos ser explícitos que essas características,
a gestalt (no sentido de que, para compreender as partes, é necessário compreender
o todo, pois o todo é maior do que as somas das partes) do indivíduo surdo,
são diretamente pertinentes ao ensino de alunos surdos. O restante deste tópico,
portanto, fornece uma breve introdução a algumas dessas questões básicas
envolvidas, além de apontar outras que serão abordadas posteriormente. Se
nosso foco fosse estritamente o ser surdo/Surdo, poderíamos proceder de
maneira diferente. No entanto, nosso foco é a educação, o processo de ensino e
aprendizagem, de surdos, a partir do olhar da psicologia. Portanto, procedemos
concentrando-nos no entendimento do que significa ouvir e não ouvir.

2 FALA, SOM E AUDIÇÃO


O som é a transmissão de ondas pelo ar. As ondas sonoras são sinusoidais,
como uma onda senoidal, em forma e possuem duas características importantes.
A altura ou amplitude das ondas resulta no volume de um som. O número de
sinusoidais em um período de tempo específico expressa a frequência de um
som. A sonoridade é medida em decibéis (dB); a frequência é medida em hertz
(Hz). Um tom de 10 dB é muito suave, como um suspiro alto; a fala normal tem
um volume de 60 a 65 dB; e o jato de um avião-caça a uma altura de 90 metros
cria um som de cerca de 140 dB. Os decibéis são medidos em escala logarítmica,
como a Escala Richter para terremotos. Isso significa que o impacto de 40 dB não
é o dobro de 20 dB, mas 100 vezes isso (LEVY, 2015).

A fala é uma combinação específica de sons, tipicamente uma combinação


complexa de sons entre 250 e 8000 Hz. Não é tão simples quanto uma única onda
senoidal poderia sugerir. A percepção auditiva da fala também é um processo
complexo, tipicamente caracterizado como ocorrendo em estágios (LEVY, 2015).
O primeiro e mais básico estágio é a detecção do som da fala. Esta é essencialmente
a capacidade de ouvir se há som ou não. Então, quando uma árvore cai na floresta
e não há ninguém para ouvi-la, ela cria um som (ondas sonoras são geradas no
ar), mas não há percepção auditiva (nenhum receptor).

33
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

O segundo estágio da percepção da fala envolve a discriminação dos sons


da fala, ou seja, a capacidade de perceber semelhanças e diferenças entre os sons
da fala. Um dos aspectos fascinantes do desenvolvimento da linguagem é que os
bebês podem perceber essencialmente quaisquer sons de fala, não apenas aqueles
do ambiente da língua em que nascem. No entanto, à medida que experimentam
a língua falada, seus cérebros se tornam “sintonizados” com a língua que estão
vivenciando e acabam se tornando incapazes de ouvir as diferenças que não
estão presentes no que se tornará sua língua nativa. Entretanto, pesquisas mais
recentes foram publicadas mostrando que durante os últimos dois meses no
útero, quando o feto já está ouvindo a voz da mãe, alguns dos circuitos cerebrais
para a percepção da fala estão pré-sintonizados com a língua que ela está falando
(MOON; LAGERCRANTZ; KUHL, 2012). Portanto, embora sejam necessárias
mais pesquisas, os recém-nascidos podem não estar igualmente preparados para
perceber qualquer som da fala.

O terceiro estágio da percepção auditiva da fala é a identificação de sons da


fala individuais. Isso envolve, por exemplo, a capacidade de identificar as vogais.
Finalmente, o quarto e último estágio da percepção da fala é a compreensão, que
se refere à compreensão do significado de uma combinação de sons da fala, uma
frase, uma palavra ou um morfema – a menor unidade significativa.

Geralmente pensamos na fala em termos de percepção auditiva da fala,


mas a fala também pode ser percebida visualmente pela leitura dela, também
chamada de leitura labial (embora envolva realmente a língua, os dentes e
algumas características faciais, assim como os lábios) ou de leitura orofacial. É
claro que, para a leitura da fala ser possível, a face do falante deve ser visível para
o ouvinte, mas mesmo assim a fala é apenas parcialmente visível. Muitas palavras
faladas criam expressões faciais ou visemes (expressões faciais e posições labiais
particulares a cada som da fala – fonema) similares, ou possuem uma articulação
invisível. A pronúncia de sons com “p” e “m”, “d” e “n” e “s” e “z” pode ser
facilmente confundida entre si.

Ana Mangili, em uma entrevista, relata que:

Pesquisadores do Instituto Max Planck para Cognição Humana e


Ciências Cerebrais (Alemanha) descobriram, em 2012, que o sulco
temporal superior esquerdo (região do lobo temporal cerebral) é a área
do cérebro, presente em todos os humanos, responsável por entender
o que uma pessoa diz sem escutá-la direito. Quanto maior a ativação
do sulco temporal superior esquerdo, melhor será a habilidade de
Leitura Labial de cada pessoa.
Também em 2012, outro estudo realizado no Florida Atlantic University
(Estados Unidos) revelou que os bebês fazem uso da Leitura Labial
nos seus pais para aprender a falar. Com o desenvolvimento da
audição e da linguagem da criança, por volta do primeiro ano de vida
ela abandona o uso desta técnica. Porém, nas crianças com deficiência
auditiva, dependendo dos estímulos recebidos e do grau da perda da
audição, a Leitura Labial poderá continuar sendo usada ao longo da
vida (MANGILI, 2014, s.p.).

34
TÓPICO 2 | APRENDIZES SURDOS

Sob condições ótimas, com excelente visibilidade da boca e da face


do falante, uma taxa de articulação lenta e iluminação adequada, a maioria
das pessoas só consegue perceber um máximo de 25% da fala visualmente.
Alguns surdos, no entanto, são capazes de compreender quase tudo que lhes
é dito apenas pela leitura orofacial. Como isso é possível? Suas habilidades de
percepção visual não são superiores às pessoas que ouvem (pelo menos neste
caso, mas veja o Tópico 3 da Unidade 2). Em vez disso, através de muitos anos de
prática, indivíduos surdos muitas vezes são capazes de usar o contexto (verbal e
não verbal) e aprendem regularidades da língua falada para preencher as lacunas
inerentes à percepção visual da fala. Assim, a leitura orofacial é essencialmente
uma forma de adivinhação instruída, aproveitando as habilidades cognitivas
que os indivíduos surdos desenvolveram e que os indivíduos ouvintes não
desenvolveram. Indivíduos ouvintes, nesse sentido, são leitores preguiçosos
da fala, pois nunca tiveram que depender exclusivamente ou principalmente
da visão para entender a língua falada, mesmo que o que eles veem nos lábios
afete o que ouvem (MCGURK; MCDONALD, 1976). A leitura orofacial também
é uma atividade intensa, mesmo para um adulto surdo que é especializado nisso.
Requer muita energia e rapidamente leva à fadiga em alunos surdos (CAMPBELL;
DODD; BURNHAM, 1998).

A audição é tipicamente vista como envolvendo apenas a orelha que


vemos no lado da cabeça. Todo o órgão auditivo, no entanto, consiste no ouvido
externo, ouvido médio e ouvido interno, muito mais do que apenas a parte visível
– ouvido externo (LEVY, 2015). O ouvido externo consiste no pavilhão auricular
(ou aurícula, a aba ou apêndice na lateral da cabeça) e no canal auditivo, que
termina no tímpano. A transdução de som começa com ondas sonoras entrando
no canal auditivo, afuniladas pelo pavilhão auricular. As ondas sonoras fazem
com que o tímpano vibre, um movimento que passa pelos três menores ossos do
corpo humano, o malleus (martelo), o incus (bigorna) e o stapes (estribo) no ouvido
médio, até a janela do vestíbulo ou janela oval. A janela oval é uma membrana
que age exatamente como o tímpano, passando vibrações para fluidos além dela,
no ouvido interno. Sons com frequências mais altas têm distâncias mais curtas
entre as ondas, criando vibrações mais rápidas passadas ao longo desta cadeia.

Junto com os fluidos do ouvido interno, especificadamente a cóclea (um


canal em forma de caracol), estão as células sensoriais ou ciliadas que formam o
órgão de Corti, normalmente ordenadas em fileiras internas e externas. As células
ciliadas internas são as células reais que transmitem o som eletricamente ao nervo
acústico, ou nervo vestibulococlear, enquanto ondulam no fluido perilinfático,
como algas marinhas no fundo do oceano. No entanto, tudo isso é mecânico ou
eletromecânico. Para entender o que ouvimos, é necessária uma maior transmissão
dos estímulos auditivos para o córtex auditivo no cérebro. Isso é feito através
do nervo acústico, que conecta a cóclea com vários centros no tronco cerebral e,
finalmente, com o córtex auditivo. Podemos dizer que ouvimos sons com nossos
ouvidos, mas interpretamos e entendemos sons com nosso cérebro (LEVY, 2015).

35
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

3 PERDA AUDITIVA
A perda auditiva pode ocorrer como resultado de obstrução ou dano em
qualquer parte do ouvido (BENTO et al., 1998). Obstrução do ouvido externo
devido a uma malformação, excesso de cera do ouvido (cerume) ou uma ruptura
do tímpano resultam em uma perda auditiva condutiva. As ondas sonoras não
podem alcançar o ouvido interno através do ouvido externo e médio, mas são
conduzidas apenas indiretamente, através dos ossos do crânio. O resultado é uma
perda de volume que dificulta a detecção de sons, mas não impede completamente
a discriminação de sons. As pessoas ouvintes podem ouvir a ponta do dedo
batendo levemente nos dentes, mesmo que quaisquer ondas sonoras através do
ar sejam insuficientes para vibrar o tímpano.

Perdas auditivas condutivas também podem ocorrer como resultado


de infecções do ouvido médio acompanhadas de acúmulo de fluido (otite
média com efusão – OME) ou otosclerose, em que os ossos do ouvido médio
se fundem e não podem mover-se o suficiente para transmitir ondas sonoras.
Embora as consequências da perda auditiva condutiva certamente não devam
ser subestimadas, especialmente se ocorrerem precocemente durante o período
de aquisição da língua, a perda auditiva condutiva é mais fácil de curar e menos
grave do que a perda auditiva neurossensorial que resulta de danos no ouvido
interno (PILTCHER et al., 2015).

A perda auditiva neurossensorial pode ocorrer se as células ciliadas


da cóclea estiverem danificadas, se sua função for limitada (conhecida como
patologia coclear) ou se o nervo acústico ou os centros sensoriais no tronco
cerebral não funcionarem adequadamente (patologia retrococlear ou neuropatia
auditiva). Nesses casos, os sons não chegam ao cérebro, não porque estejam
fisicamente bloqueados, mas por causa de deficiências neurológicas, resultando
em problemas dinâmicos e de discriminação. A cura não está (ainda) disponível
para perda auditiva neurossensorial, embora a reabilitação auditiva por meio de
aparelhos auditivos ou implantes cocleares possa restaurar a audição funcional
até certo ponto.

A comparação da perda auditiva condutiva versus neurossensorial é


paralela à deficiência visual causada por alterações no próprio globo ocular (por
exemplo, miopia ou hipermetropia) versus perda de células nervosas dentro do
olho (por exemplo, na retinite pigmentosa). No primeiro caso, quando a distância
entre a lente e a retina do olho é menor ou maior do que deveria ser para os
objetos estarem em foco, a visão normal pode ser restaurada usando óculos.
Neste último caso, os óculos não serão muito úteis devido ao dano neurológico
irreversível. Da mesma forma, no caso de uma perda auditiva condutiva, a
audição pode ser restaurada em uma extensão considerável através do uso de
aparelhos auditivos. Eles serão muito menos bem-sucedidos em compensar uma
perda auditiva neurossensorial, devido ao dano neurológico irreversível à cóclea,
ao nervo auditivo, ao tronco cerebral ou ao córtex auditivo.

36
TÓPICO 2 | APRENDIZES SURDOS

O grau de perda auditiva é expresso como o nível médio de amplificação


necessário para permitir que alguém ouça o som de uma frequência específica.
O índice de Fletcher (FI) é frequentemente usado para indicar o grau de perda
auditiva. Este índice é a perda auditiva média, expressa em decibéis, calculada
sobre as frequências de tom puro de 500, 1000 e 2000 Hz. É também chamada de
média de tom puro (PTA), normalmente medida sem ajuda (sem amplificação por
um aparelho auditivo ou implante coclear) no ouvido melhor, o que contribuirá
mais para a percepção do som. Às vezes, a frequência de 4000 Hz é incluída no
PTA, resultando no que é chamado de Fletcher High Index. As frequências médias
para o PTA são as mais importantes para a percepção da fala (PILTCHER et al.,
2015; ROESER; VALENTE; HOSFORD-DUNN, 2007).

Uma perda auditiva média (PTA) acima de 20 dB é considerada significante


para a aquisição da língua falada, pois é nesse ponto que a percepção da fala
se torna obstruída. Os PTAs entre 20 e 40 dB podem ser referidos como perdas
auditivas leves. PTAs entre 41 e 70 dB podem ser consideradas como perdas
auditivas moderadas. PTAs entre 71 e 90 dB são consideradas perdas auditivas
severas e aquelas que excedem 91 dB são consideradas profundas. Em alguns
países da Europa Ocidental é feita uma outra distinção, rotulando as perdas entre
35 e 90 dB como “deficientes auditivos” e reservando o rótulo “surdos” para
perdas de 90 dB ou mais. Recentemente, um número de pesquisadores se referiu
a perdas auditivas mínimas, até 15 dB, um nível que ainda pode afetar a língua e a
aprendizagem em crianças (GOLDBERG; RICHBURG, 2004). Entretanto, a menos
que seja indicado o contrário, os alunos surdos que são o tópico principal deste
livro de estudos normalmente têm perdas auditivas neurossensoriais bilaterais
(de ambas os ouvidos) mais graves, congenitamente ou adquiridas no início da
vida.

A perda auditiva neurossensorial bilateral em crianças é tipicamente


congênita (presente ao nascimento) ou adquirida no início da vida. Nos países
ocidentais, a surdez congênita profunda na primeira infância é uma incapacidade
de baixa incidência, ocorrendo em 0,7 a 1 criança em cada 1000 (LEIGH; NEWALL;
NEWALL, 2010). Mais de 50% de todos os casos de perda auditiva sensorial
bilateral podem ser atribuídos a fatores genéticos. Fatores genéticos podem ser os
únicos a causar perda auditiva ou fazer parte de síndromes genéticas mais amplas,
levando a uma distinção entre perdas auditivas hereditárias não sindrômicas e
sindrômicas (COHEN; GORLIN, 1995).

A perda auditiva hereditária não sindrômica pode ser autossômica


dominante (na qual somente a cópia do gene em um cromossomo precisa ser
anormal), autossômica recessiva (em que ambas as cópias do gene devem ser
anormais) ou X-ligada (na qual uma mutação no cromossomo X leva à expressão
dominante em machos, que possuem apenas um cromossomo X, sendo recessivos
em fêmeas, que possuem dois). As causas sindrômicas de perda auditiva
incluem, por exemplo, a síndrome de Usher (também resultando em perda da
visão, levando à surdocegueira), síndrome de Lange-Nielsen e síndrome de
Waardenburg (PILTCHER et al., 2015; COHEN; GORLIN, 1995).

37
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

Além dos fatores genéticos, a perda auditiva congênita pode ser causada
por doença materna (por exemplo, diabetes materna, rubéola), infecções infantis
(por exemplo, rubéola, citomegalovírus) ou toxinas (ototoxinas, por exemplo,
associadas ao fator Rh no sangue). Agora que a rubéola materna foi em grande
parte eliminada, a causa mais prevalente de surdez congênita não hereditária nos
países ocidentais é a prematuridade extrema (PILTCHER et al., 2015).

As causas de surdez na infância adquirida precocemente incluem


meningite, encefalite, sarampo, caxumba e trauma como resultado de traumatismo
craniano. As causas de perda auditiva hereditárias não sindrômicas (congênitas)
geralmente oferecem o melhor prognóstico para o desenvolvimento infantil,
porque a chance de deficiência intelectual, motora ou visual relacionada é pequena
comparada às causas sindrômicas e adquiridas da surdez infantil. A meningite,
em particular, frequentemente leva a danos neurológicos adicionais, resultando
em distúrbios de aprendizagem, bem como perda auditiva. De fato, deficiências
neurológicas entre crianças surdas ocorrem até seis vezes mais frequentemente
que em crianças ouvintes. Como resultado, estimativas sugerem que talvez 40%
de todas as crianças surdas sofram de múltiplas deficiências, como surdocegueira,
perda auditiva, deficiência intelectual ou transtornos do espectro do autismo.

Como observado anteriormente, os efeitos potenciais da surdez congênita


ou adquirida precocemente na infância são suficientemente significativos, de
modo que é importante que a triagem auditiva, o diagnóstico e a intervenção
sejam fornecidos o mais cedo possível. A medição das emissões otoacústicas e da
audiometria de tronco encefálico tornaram a triagem auditiva neonatal universal
eficiente e relativamente barata (LEIGH; NEWALL; NEWALL, 2010). Na triagem
auditiva otoacústica, “cliques”, na verdade timbres consistindo de uma ampla
gama de frequências, são gerados e recebidos por um computador. As emissões
são essencialmente ecos, enviados de volta por uma cóclea saudável em resposta
ao som.

A triagem auditiva otoacústica pode ser realizada durante visitas


domiciliares ou no hospital, horas ou dias após o nascimento. A detecção
de emissões otoacústicas indica que o ouvido externo, médio e interno está
funcionando adequadamente. Isso não significa, no entanto, que a criança
necessariamente ouça. Problemas ao nível do nervo auditivo ou do cérebro ainda
podem criar perda auditiva (neurossensorial). Da mesma forma, se as emissões
não forem detectadas e a criança não "passar" pela triagem, isso não significa que
ela seja surda. Resíduos no canal auditivo ou movimentos leves da cabeça durante
a medição podem causar um resultado semelhante, sendo este último o motivo
pelo qual a triagem é frequentemente realizada quando os bebês estão dormindo.
Se uma criança não passar em uma primeira triagem, uma segunda e, finalmente,
uma terceira medição de triagem normalmente será realizada antes que uma
criança seja encaminhada para avaliação otológica e audiológica completa.
Infelizmente, no entanto, até 50% dos pais não fazem o acompanhamento depois
que a criança não passa na triagem auditiva.

38
TÓPICO 2 | APRENDIZES SURDOS

Mais uma vez, a triagem das emissões otoacústicas não revelará se há


um problema de audição além da cóclea: uma patologia retrococlear ou mau
funcionamento dos nervos auditivos ou núcleos auditivos no tronco encefálico.
A audiometria do tronco encefálico é necessária para esse tipo de avaliação,
permitindo que os audiologistas (uma especialidade da fonoaudiologia) avaliem
se os núcleos no tronco encefálico estão processando sons ou não (LEVY, 2015).
Em alguns países, a medição da resposta do tronco encefálico em vez do teste de
emissões otoacústicas é feita durante a triagem neonatal universal, especialmente
quando uma criança é considerada em risco. Isso permite o diagnóstico definitivo
de perdas auditivas sensorioneurais com um único teste que também permite
que o grau da perda auditiva seja aproximado pelo menos em termos de leve/
moderado versus grave/profundo.

A identificação de quais frequências estão implicadas em uma perda


auditiva é mais difícil, mas a medição das respostas auditivas do estado
estacionário (desencadeando atividade elétrica, ou potenciais evocados, no
cérebro) oferece algumas possibilidades. Se uma criança é diagnosticada com uma
perda auditiva significativa no início da vida (após a triagem auditiva neonatal,
mas de preferência até três meses de idade), esse tipo de avaliação pode dizer
aos pais em termos gerais se a criança é profundamente surda ou não. O perfil
de frequência preciso da perda auditiva e seu impacto na percepção da fala, no
desenvolvimento da língua e no desenvolvimento geral são coisas que terão que
ser determinadas mais tarde na infância.

Após a triagem auditiva neonatal, as técnicas mais utilizadas para avaliar


a capacidade auditiva em crianças e adolescentes com perda auditiva são a
audiometria tonal limiar e a audiometria vocal (LEVY, 2015; ROESER; VALENTE;
HOSFORD-DUNN, 2007). Na audiometria tonal limiar, tons puros de uma
intensidade e frequência específicas são apresentados a um indivíduo (através
de fones de ouvido), que então tem que indicar sempre que um som é detectado.
Todas as frequências de fala são testadas sistematicamente, resultando em uma
exibição gráfica, um audiograma, que mostra a quantidade de amplificação (em
dB) necessária para uma pessoa perceber um tom de uma frequência específica
(expressa em Hz). A audiometria vocal envolve um procedimento semelhante,
realizado com palavras faladas, falado por um profissional e reproduzido
digitalmente via computador. É importante ressaltar que ambos os tipos de
avaliação audiológica requerem um nível de capacidade cognitiva suficiente para
entender e executar as tarefas necessárias. A audiometria vocal também exige
que as palavras usadas façam parte do vocabulário receptivo do indivíduo que
está sendo testado. Essas formas de avaliação, portanto, não podem ser usadas de
maneira confiável com crianças muito pequenas ou com pessoas com deficiências
intelectuais graves.

39
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

A triagem auditiva neonatal universal possibilita diagnósticos precoces


da surdez infantil, levando ao início precoce da intervenção centrada na família.
O diagnóstico e a intervenção precoces contribuem para todos os aspectos
do desenvolvimento infantil e, especificamente, têm demonstrado facilitar a
comunicação e o desenvolvimento da língua em crianças surdas (YOSHINAGA-
ITANO; SEDEY, 2000). Parte da intervenção precoce centrada na família tem um
caráter audiológico. A amplificação sonora, o fornecimento de próteses auditivas,
o implante coclear em caso de perdas auditivas profundas e a reabilitação da língua
falada podem fazer parte de programas de intervenção precoce, muitas vezes
combinados a meios manuais de apoio à comunicação e ao desenvolvimento da
língua, como a língua de sinais, fala apoiada em sinais, ou palavra complementada
(ver Tópico 2, Unidade 2).

4 APARELHOS AUDITIVOS E IMPLANTES COCLEARES


Existem vários tipos de aparelhos auditivos (MADELL; FLEXER, 2008),
mas todos eles são essencialmente dispositivos que amplificam os sons recebidos.
Os aparelhos auditivos incluem um microfone, um alto-falante, eletrônicos e
uma bateria. Os aparelhos auditivos analógicos amplificam os sons ao longo de
todo o espectro de frequências, enquanto os aparelhos auditivos digitais contêm
um microchip programado precisamente para compensar as necessidades de
amplificação do perfil de perda auditiva de um indivíduo (ou seja, diferentes
níveis de amplificação em diferentes frequências). Os aparelhos auditivos digitais,
que são consideravelmente mais caros do que os aparelhos analógicos, são quase
sempre usados ​​com crianças, pelo menos se forem pagos por seguros, serviços
sociais ou pais abastados. Aparelhos auditivos podem ser usados ​​no ouvido ou
parcialmente atrás da orelha. No último caso, um molde auricular é colocado
no ouvido e conectado ao dispositivo real atrás da orelha. Aparelhos auditivos
atrás da orelha são usados ​​com mais frequência em crianças, certamente se essas
crianças tiverem perdas auditivas severas a profundas, porque o output desses
aparelhos é mais poderoso.

Com o tempo, a amplificação sonora através dos aparelhos auditivos


ajudará muitas crianças surdas na percepção da fala. Assim como no diagnóstico
e intervenção precoces, a amplificação precoce é importante, mas não é fácil
proporcionar aparelhos auditivos para bebês surdos. Ajustar esses aparelhos
com o crescimento contínuo do ouvido externo de um bebê é difícil, eles podem
desenvolver alergias devido a substâncias nos moldes auriculares e há o fato óbvio
de que os bebês dormem muito. Durante o sono, os bebês também percebem a
linguagem falada e outros sons, embora isso ocorra no nível de processos abaixo
do limiar consciente, ajuda a conectar o cérebro à percepção auditiva. No entanto,
usar aparelhos auditivos durante o sono não é muito confortável e a maioria dos
pais os remove quando seus bebês estão dormindo. Nesses momentos, outros
dispositivos de amplificação podem ser usados, incluindo amplificadores
conectados a seus berços.

40
TÓPICO 2 | APRENDIZES SURDOS

A amplificação precoce também apresenta algumas desvantagens


significativas. Estabelecer uma relação sinal-ruído  ou  razão sinal-
ruído  (frequentemente abreviada por  S/N ou  SNR, do inglês,  signal-to-noise
ratio e RSR em português) ideal com aparelhos auditivos é muito difícil e, quando
os audiologistas não conseguem obter feedback de crianças (muito jovens), pode
ser praticamente impossível ajustar um aparelho auditivo digital adequadamente.
O problema do sinal (fala) e ruído (por exemplo, televisões, fala múltipla de
outras crianças) ficar confuso é um problema nessa situação e mais geralmente
quando se trata de ouvir em um ambiente natural do que em uma cabine de teste
auditivo. Mesmo sob as melhores condições, no entanto, a percepção auditiva da
fala com aparelhos auditivos nunca é tão boa quanto a audição “normal” e, sob
condições de escuta adversas, torna-se realmente muito difícil.

As salas de aula da escola são notoriamente pobres a esse respeito,


normalmente com muito ruído de fundo e pouca acústica (ver Tópico 2, Unidade
2). O Sistema de Frequência Modulada Pessoal (FM), que exige que o professor e
o aluno usem um dispositivo auxiliar, pode ajudar a melhorar as relações sinal-
ruído e, assim, apoiar a percepção da fala na sala de aula. Observe o que diz uma
nota da Secretaria de Estado da Saúde do Governo de Santa Catarina sobre o
Sistema FM (Frequência Modulada):

Com a publicação da PORTARIA Nº 1.274, DE 25 DE JUNHO DE 2013,


o Sistema FM entrou na tabela SUS. O Sistema FM é a mais importante
e essencial ferramenta educacional já desenvolvida para os indivíduos
com deficiência auditiva, pois é o meio mais efetivo para favorecer
a relação sinal/ruído, principalmente em ambiente educacional.
Equipamento que auxilia no aprendizado e na captação da voz do
professor para o deficiente auditivo na escola. O aluno escuta a voz do
professor diretamente em seu Aparelho Auditivo. Sem que o barulho
do ambiente atrapalhe o entendimento da voz do professor. Quem
pode receber o sistema FM?

-  Todo e qualquer paciente que faça uso de aparelho auditivo ou


Implante coclear.
-  Com faixa etária entre 5 e 17 anos.
-  Estar matriculado no Ensino Fundamental I ou II ou Ensino Médio.
-  Possuir domínio da linguagem oral ou em fase de desenvolvimento.

Como funciona? O som é captado por um microfone e enviado por


meio de frequência modulada para o receptor que deverá estar
conectado ao aparelho auditivo (SANTA CATARINA, 2013, s. p.).

Ainda assim, embora crianças e adolescentes com perdas auditivas


profundas possam ser capazes de detectar a linguagem falada usando aparelhos
auditivos, é pouco provável que sejam capazes de discriminar completamente a
fala, quanto mais de identificá-la e compreendê-la. Isso porque a causa das perdas
auditivas mais profundas é o dano à cóclea. Como observamos anteriormente, a
amplificação simples é mais eficaz para perdas auditivas condutivas, em que o
aumento do volume ajuda o som a passar por partes menos funcionais do ouvido
externo ou médio.

41
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

Nos casos em que as perdas auditivas profundas das crianças são causadas
por uma cóclea disfuncional, malformada ou mesmo ausente, o implante coclear
(IC) pode ser uma boa alternativa (NIPARKO et al., 2009). No implante coclear,
um fio fino contendo 18 a 22 eletrodos correspondentes a diferentes frequências
é cirurgicamente inserido na cóclea. Deitados contra a parede interna da cóclea,
os eletrodos estimulam o nervo auditivo diretamente, ignorando as células
ciliadas frequentemente danificadas. O fio contendo os eletrodos é conectado a
um transmissor, colocado cirurgicamente junto com um pequeno ímã, no crânio
logo atrás da orelha. Este transmissor magnético é conectado (através da pele
por indução magnética) com a parte externa de um implante coclear, que contém
um receptor e um microprocessador. Crianças surdas têm recebido implantes
cocleares desde o final dos anos 80. Nos Estados Unidos, os implantes estão
disponíveis para crianças a partir dos dois anos de idade desde 1990 e com 18
meses de idade desde 1998. Desde 2002, os ICs foram aprovados para bebês de
até 12 meses de idade e em alguns outros países as crianças os recebem desde os
seis meses de idade ou até mais jovens (assim que o crânio é grande o suficiente).

No caso do Brasil, o Ministério da Saúde determina alguns critérios


para a indicação de implantes cocleares (BRASIL, 1999, 2004). Tefili et al. (2013)
sintetizam bem estes critérios a seguir:

• Em adultos
a) pessoas com surdez neurossensorial profunda bilateral com código
linguístico estabelecido (casos de surdez pós-lingual ou de surdez pré-
lingual, adequadamente reabilitados);
b) ausência de benefício com prótese auditiva (menos de 30% de
discriminação vocal em teste com sentenças);
c) adequação psicológica e motivação para o uso de implante coclear.
• Em crianças:
a) experiência com prótese auditiva, durante pelo menos três meses;
b) incapacidade de reconhecimento de palavras em conjunto fechado;
c) família adequada e motivada para o uso do implante coclear;
d) condições adequadas de reabilitação na cidade de origem (TEFILI
et al., 2013, p. 417)

Além disso, Tefili et al. (2013) afirmam que os planos de saúde privados
em território nacional têm a obrigação de oferecer cobertura para ICs desde o
ano de 2012. Estas coberturas, evidentemente, possuem também seus próprios
critérios de avaliação.

os requisitos básicos são perda auditiva neurossensorial severa ou


profunda bilateral; motivação adequada da família (para menores
de 12 anos ou deficientes pós-linguais) ou do paciente (se maior de
12 anos ou deficiente pré-lingual) para o uso do implante coclear e
para o processo de reabilitação fonoaudiológica. Para crianças até 7
anos, é exigida ainda experiência com uso de próteses auditivas por
um período mínimo de 3 meses após diagnóstico de perda auditiva
severa. Maiores de 12 anos devem ter resultado igual ou menor que
50% de reconhecimento de sentenças em formato aberto com uso de
prótese auditiva em ambas as orelhas; e, em caso de deficiência pré-
lingual, presença de código (TEFILI et al., 2013, p. 417-418).

42
TÓPICO 2 | APRENDIZES SURDOS

A taxa de implante coclear para crianças tem aumentado constantemente,


a idade de implantação tem diminuído constantemente e o uso de implantes
bilaterais ou binaurais, um em cada orelha, está se tornando comum. Enquanto
isso, melhorias estão sendo feitas regularmente no software usado pelos
microprocessadores de implantes para processamento de fala (e música). O
implante coclear precoce melhorou, assim, a percepção da fala e o desenvolvimento
da língua falada para muitas crianças surdas (NIPARKO et al., 2009; SPENCER;
MARSCHARK; SPENCER, 2011). O implante coclear também diminuiu as
lacunas na proficiência em língua e alfabetização entre crianças surdas e ouvintes,
embora essas lacunas não tenham sido completamente fechadas (MARSCHARK
et al., 2010).

Não obstante os avanços decorrentes do implante coclear precoce,


continuam a existir grandes diferenças individuais nos desfechos, cujas causas são
apenas parcialmente compreendidas. As alegações de que os implantes cocleares
podem curar a surdez infantil, portanto, simplesmente não são verdadeiras. De
fato, se a cura ou não da surdez é um objetivo realista e para quem pode ser
desejável é outra questão, abordada até certo ponto mais adiante neste tópico.

Nesta conjuntura, é importante enfatizar novamente um ponto: o uso


de aparelhos auditivos ou implantes cocleares por uma criança pequena não
necessariamente ou automaticamente leva à percepção da fala. O fornecimento
profissional desses dispositivos de escuta assistida por audiologistas
especializados em crianças pequenas é uma precondição para o sucesso. Outra é
a terapia cuidadosa e contínua e as oportunidades de input de alta qualidade da
língua falada.

Finalmente, a boa manutenção dos dispositivos de assistência auditiva


requer não apenas a disponibilidade de técnicos devidamente treinados,
mas também o conhecimento das habilidades básicas de reparo em crianças e
adolescentes surdos mais velhos, seus pais e seus professores. Mesmo quando
todas essas condições são atendidas e a percepção da fala é otimizada, os alunos
surdos não ouvirão a mesma quantidade ou a mesma qualidade de som e fala
que os ouvintes. Eles sempre terão que depender, muito mais do que seus colegas
ouvintes, de meios visuais de comunicação, incluindo leitura orofacial e atenção
a dicas visuais no ambiente. Como a língua falada é entendida, dependerá muito
das características do ouvinte individual e das condições de escuta (incluindo
o falante). De maneira mais geral, tanto o desenvolvimento da linguagem, da
língua, quanto a aprendizagem por meio da língua falada exigirão não apenas
um input de língua falada de alta qualidade, mas também aprender a usar a visão
na comunicação e na linguagem de modo geral (ver Tópico 2, Unidade 2).

43
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

5 DEFICIÊNCIA AUDITIVA E SURDEZ


Notamos anteriormente que ser surdo é tanto uma deficiência quanto,
para algumas pessoas surdas, também ou predominantemente uma identidade
linguística e cultural. Mais de 95% de todas as crianças surdas nascem em famílias
ouvintes. Para os pais ouvintes, uma criança surda quase sempre é totalmente
inesperada. Sua visão instintiva da surdez é principalmente patológica: a perda
auditiva é causada por uma condição médica; deve ser curada se for possível e, se
não for, cuidada. Essa visão é compartilhada por muitos profissionais, certamente
a maioria dos otorrinolaringologistas, mas também por muitos fonoaudiólogos e
professores.

Muitos surdos, no entanto, certamente aqueles com pais surdos, mas


também muitos com pais ouvintes, aderem a outra visão, que valoriza sua
comunidade Surda, sua cultura Surda e sua língua de sinais (KAUCHAKJE,
2003; WOLL; LADD, 2011). Essa visão de ser surdo é sociocultural, apontando
para o status da comunidade Surda como uma minoria linguístico-cultural. É
apoiada por muitos adultos ouvintes filhos de pais surdos, ou CODAs (do inglês,
Children of Deaf Adults) – expressão traduzida em português como “filho de pais
surdos” ou “filhos de surdos adultos” (BEZERRA; MATEUS, 2017, p. 452) –, mas
também por profissionais ouvintes (por exemplo, linguistas de língua de sinais,
psicólogos, professores) e por alguns pais ouvintes.

A comunidade Surda não é uma comunidade monolítica mais do que a


comunidade de ouvintes. Há muita diversidade na comunidade, expressa, por
exemplo, em valores variados associados ao uso das línguas falada e de sinais
(SILVA; KAUCHAKJE; GESUELI, 2003). O que une muitos Surdos, apesar de sua
diversidade, é um sentimento intenso de pertencer a outras pessoas que sabem
como é ser Surdo em um mundo dominado por pessoas ouvintes – pessoas que
muitas vezes ignoram os desafios que os Surdos enfrentam e as forças específicas
que eles têm. Esse vínculo entre os Surdos costumava ser celebrado em clubes
sociais e associações de Surdos. Mais recentemente, em parte como resultado de
uma melhor comunicação por meio da tecnologia, a comunidade Surda tornou-se
muito mais fluida. Hoje podemos ver redes de pessoas Surdas que se encontram
às vezes face a face, mas cada vez mais na Internet e nas redes sociais. Nas
últimas décadas, as comunidades Surdas em muitos países realizaram conquistas
consideráveis ​​em relação ao reconhecimento formal e/ou social de suas línguas
de sinais e cultura Surda. Esse reconhecimento levou a um maior acesso por meio
da tecnologia e da interpretação da língua de sinais.

Em extremos opostos, as visões patológicas e culturais da surdez podem


ser expressas pelo desejo de curá-la ou celebrá-la. Na prática, a maioria dos
surdos e Surdos, seus pais e os profissionais envolvidos com eles e a comunidade
Surda veem a surdez em termos menos extremos. No entanto, essas diferentes
visões continuam a levar a controvérsias com relação a questões como a testagem
genética, o implante coclear, o uso da língua de sinais na educação e a educação
regular para alunos surdos.

44
TÓPICO 2 | APRENDIZES SURDOS

O que é importante no contexto deste livro é o fato de que, para muitos


aprendizes surdos, a surdez não é apenas uma condição audiológica, mas também
um modo de ser. Educar esses alunos, e especialmente os mais velhos, portanto,
é uma questão de prestar atenção não apenas à perda auditiva, mas também ao
fato de serem Surdos. Ter outros alunos surdos ou Surdos na sala de aula pode
significar coisas diferentes para eles do que para seus professores ou colegas de
classe. Para os alunos audiologicamente surdos, o ensino regular pode significar
tomar medidas para aumentar a disponibilidade de ensino da língua falada, por
exemplo, através do ritmo de instrução, condições acústicas na sala de aula, uso
da língua escrita, arranjos de assentos e FM ou outros dispositivos de assistência.

Questões semelhantes também podem ser importantes até certo ponto


para os alunos Surdos, mas eles também esperam respeito pela sua língua e
cultura. A inclusão de alunos Surdos na educação regular significa, portanto,
também a inclusão da língua de sinais para instrução, professores Surdos, colegas
Surdos e eventos culturais Surdos. Ambos os grupos podem ser incluídos no
ensino regular ou especial, mas a inclusão completa de alunos Surdos em salas de
aula regulares é um desafio maior do que ocorre em escolas especiais projetadas
para surdos (STINSON; ANTIA, 1999).

Como consequência da introdução do implante coclear precoce, algumas


pessoas Surdas (e algumas ouvintes) temem que as línguas de sinais e as culturas
surdas voltem a estar sob pressão, como nos anos em que a língua de sinais
geralmente era proibida em sala de aula (MOORES, 2010). Esse sentimento
persiste apesar de ser uma minoria de crianças surdas (uma proporção apenas
daquelas com perdas auditivas profundas) que está recebendo esses implantes.
Nessa visão, os pais e profissionais ouvintes precisam valorizar a língua de sinais
e a cultura dos Surdos para criar e educar crianças surdas assim como valorizam
a língua falada, os aparelhos auditivos e os implantes cocleares.

A noção de Ganhos Surdos, por exemplo, enfatiza os efeitos positivos de


ser Surdo em áreas como aprendizagem visual, literatura, arte e arquitetura. Além
disso, defensores de uma abordagem bilíngue-bicultural à educação de surdos
argumentam que, por meio dessa abordagem, os danos ao desenvolvimento
de crianças surdas podem ser evitados (HUMPHRIES et al., 2012; LISSI;
SVARTHOLM; GONZALEZ, 2012). Outros clamam por mais flexibilidade nas
políticas, não negando o potencial da língua de sinais e da cultura de Surdos
no desenvolvimento de alunos surdos, mas pedindo evidências dos benefícios
da educação bilíngue bicultural (KNOORS; MARSCHARK, 2012; FERNADNES,
2005). Pode-se entender a visão instintiva dos pais (ouvintes) sobre a perda
auditiva como uma condição patológica, mas esforços devem ser feitos para
ampliar essa perspectiva normativa com outra perspectiva mais sociocultural
que valoriza a língua de sinais e a cultura Surda sem negar a importância da
proficiência em língua falada e escrita e participação na sociedade como um todo
(KNOORS, 2007).

45
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

6 SER SURDO NA ESCOLA


Por volta do século XVI, algumas crianças surdas na Europa estavam
recebendo educação formal em ambientes projetados especificamente para elas
(LANG, 2011). No início, essas crianças vieram em grande parte de famílias ricas e
a instrução era ministrada por tutores ou escolas particulares. A educação apoiada
pelo governo para crianças surdas teve que esperar até a Era do Iluminismo.
Em 1760, o Abade Charles-Michel de l'Épée estabeleceu a primeira escola para
surdos, a École National des Sourds et Muets em Paris (atual Institut National des
Jeunes Sourds). Logo, seu exemplo foi seguido em outros países.

Samuel Heinicke começou uma escola para surdos em 1778 em Leipzig,


Alemanha. Em 1783, Thomas Braidwood começou uma escola para surdos em
Londres, Inglaterra. Henri Daniel Guyot foi o fundador da primeira escola para
surdos na Holanda, em 1790 em Groningen, agora parte da Royal Dutch Kentalis.
Thomas Hopkins Gallaudet contratou Laurent Clerc, um dos professores surdos
da escola de Paris, para ajudar a criar um programa para educar alunos surdos no
Connecticut Asylum for the Deaf and Dumb (agora a Escola Americana para Surdos),
em 1817. Excelentes introduções à história da educação de surdos, a forma mais
antiga de educação especial, podem ser encontradas em Lane (1984) e Lang (2011).

Desde o início, as escolhas sobre a língua de ensino e a condição auditiva


do corpo docente na educação de surdos levaram a violentas controvérsias,
dividindo os profissionais em campos descritos como os oralistas, aqueles que
apoiavam a comunicação exclusivamente pela língua falada, e os gestualistas,
proponentes do uso de sinais e língua de sinais e da indicação de professores
surdos (MOORES, 2010). Esta “guerra de métodos” de 200 anos na educação de
surdos incluiu uma batalha particularmente destrutiva na Segunda Conferência
Internacional de Educadores de Surdos (ICED) em Milão, em 1880.

Naquela conferência, em que participaram apenas 164 professores,


sendo todos menos um deles ouvinte, os delegados proclamaram que as
crianças surdas deveriam ser criadas e educadas exclusivamente com a língua
falada (GALLAUDET, 1881). Esta decisão agora infame levou ao abandono da
língua de sinais de muitas escolas para surdos nos países ocidentais. Em alguns
lugares, como o Gallaudet College (agora Gallaudet University) em Washington,
DC, a comunicação por sinais permaneceu em uso (a língua de sinais não foi
reconhecida pelos linguistas como uma verdadeira língua até 1960). Na maioria
dos outros lugares, no entanto, o uso exclusivo da língua falada na educação de
surdos no século XX ganhou ainda mais ímpeto com a invenção de aparelhos de
amplificação, como os aparelhos auditivos. A língua de sinais e a cultura Surda
foram para a clandestinidade, com a língua de sinais sendo secretamente usada
por alunos surdos nos dormitórios de escolas residenciais para surdos e em
clubes de Surdos.

46
TÓPICO 2 | APRENDIZES SURDOS

As línguas de sinais não se tornaram amplamente e abertamente apreciadas


mais uma vez, até que linguistas como William Stokoe (2005) mostraram
convincentemente que eram línguas reais, ricas e bem estruturadas; e psicólogos
como Vernon (2005) e Schlesinger e Meadow (1972) demonstraram sua importância
para o desenvolvimento e educação da criança. O subsequente movimento de
emancipação das pessoas Surdas, apoiado por muitos pais e profissionais, levou
ao estabelecimento de escolas bilíngues para surdos nos anos 80 e 90, primeiro
em países escandinavos, como a Suécia e a Dinamarca, e um pouco mais tarde
em outros, incluindo os Estados Unidos, Reino Unido e Holanda. Na 21ª reunião
do ICED em Vancouver, Canadá, em 2010, um pedido formal de desculpas foi
oferecido pelo Comitê Organizador do ICED para a decisão feita em Milão em
1880. Para muitas pessoas, isso foi visto como um fim oficial da guerra de métodos
que caracterizou a educação de surdos por tanto tempo, desperdiçando energia e
recursos que poderiam ter sido dedicados ao delineamento de melhores técnicas
de ensino, melhoria da didática e desenvolvimento de currículos de ponta para
alunos surdos.

A guerra pode ter acabado, mas as tensões permanecem, em parte devido


à introdução do implante coclear precoce e em parte devido a mudanças na
política educacional em muitos países que levaram ao aumento da integração
de estudantes surdos em escolas regulares não bilíngues. Ao mesmo tempo, a
marginalização da língua falada em programas que alegam ser bilíngues afastou
alguns pais de crianças surdas que têm melhores oportunidades de uma língua
falada (SWANWICK et al., 2014). No Brasil o movimento das escolas bilíngues
ainda está ganhando força, mas encontra diversos empecilhos (SKLIAR, 1999).

Historicamente, a maioria das primeiras escolas para surdos eram


programas residenciais. Os alunos surdos permaneciam em dormitórios durante
a semana, com muitos deles indo para casa nos fins de semana e feriados. A língua
de sinais e a cultura Surda floresceram nesse cenário, assim como nas famílias
Surdas. Juntamente com crianças jovens surdas sendo “orientadas” por alunos
mais velhos e particularmente por aqueles com pais surdos, este crescimento
foi suportado pelo fato de que escolas residenciais para surdos dominaram a
educação de surdos por décadas devido às distâncias que estes alunos tinham
que viajar e dificuldades com transporte público. Gradualmente, porém, outras
escolas para surdos começaram a surgir, incluindo escolas diurnas. Nesses
programas, os alunos surdos ficavam com “pais adotivos” durante a semana ou,
na década de 1960, podiam morar em casa e viajar diariamente para a escola.

Nas últimas décadas, cada vez mais estudantes surdos foram educados
em suas escolas locais. Essa mudança é, em parte, consequência de políticas
governamentais deliberadas que buscaram a inclusão de alunos com deficiência
no ensino regular (FUCHS; FUCHS, 1994). "Uma escola para todos" é um grito de
guerra popular para este movimento, que começou nos Estados Unidos com pais
de crianças com deficiência intelectual protestando contra a institucionalização
de seus filhos, mas teve talvez seu maior impacto na educação de surdos.

47
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

O movimento de inclusão certamente tem objetivos nobres, mas na


realidade as implicações da inclusão plena – participação plena na instrução
e nas atividades sociais na sala de aula, não apenas na presença física –
são frequentemente subestimadas (STINSON; ANTIA, 1999). Às vezes, as
autoridades educacionais estimulam a educação inclusiva porque acham que é
menos dispendiosa do que as escolas especiais para surdos. De fato, a inclusão
plena de alunos surdos no ensino regular pode ser muito mais cara do que a
educação especial, dado que todos os alunos precisam aprender a se comunicar
uns com os outros, que os professores precisam aprender a ensinar alunos surdos
e as instalações da escola e serviços precisam ser adequadamente projetados para
acomodar alunos surdos. E, como veremos em tópicos posteriores, a ideia de que
as escolas regulares oferecem o ambiente menos restritivo (LRE) para alunos com
deficiência claramente não se aplica a muitos alunos surdos. É por estas razões
que, ao advogar pela igualdade de direitos para estudantes com e sem deficiência,
tanto a Declaração de Salamanca e a Estrutura de Ação em Educação Especial
(BRASIL, 1997) como a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência
(2010) apoiaram a educação inclusiva, mas também se referiram explicitamente à
opção adicional para alunos surdos serem educados em escolas especiais.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar das demandas por uma ampla gama de opções educacionais para
alunos surdos, as matrículas em escolas especiais para surdos diminuíram nos
últimos anos, principalmente nos Estados Unidos e no Reino Unido, e até certo
ponto nos países escandinavos (SWANWICK et al., 2014). No Brasil o fenômeno é
semelhante, uma diminuição ou manutenção de matrículas em escolas especiais
e um aumento de matrículas nas escolas regulares (LAPLANE, 2015). Ao mesmo
tempo, alunos surdos que estão sendo educados em ambientes de educação
especial frequentemente são caracterizados como tendo mais necessidades do que
seus pares surdos ou ouvintes em salas de aula regulares, incluindo uma maior
frequência de problemas de saúde mental e aprendizagem e mais frequentemente
provenientes de meios socioeconômicos desfavorecidos (SHAVER et al., 2014).

Muitos alunos surdos são colocados em escolas regulares em uma base


individual, apoiados por professores de surdos que fornecem apoio de meio
período, conforme necessário. Em alguns países, o acesso à instrução por esses
alunos também é suportado pelo fornecimento de dispositivos FM, texto em
tempo real e/ou interpretação da língua de sinais. Em alguns lugares, iniciativas
foram tomadas para combinar o melhor da educação regular e especial em
programas para alunos surdos.

Qualquer que seja o ambiente educacional, os alunos surdos permanecem


surdos, com algumas necessidades e pontos fortes diferentes dos colegas ouvintes.
O restante deste livro aborda questões associadas ao ensino e aprendizagem de
todos esses alunos.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Se uma criança nasce com audição limitada ou adquire uma perda auditiva no
início da vida (especialmente antes dos dois anos de idade), o desenvolvimento
da língua falada será similarmente limitado, pelo menos até certo ponto.

• Embora a língua falada e a língua de sinais sejam apropriadas para o ensino de


alunos surdos, elas não são equivalentes.

• Como a linguagem é a pedra angular da educação, as escolas em que a


comunicação efetiva é limitada tendem a se tornar ambientes de aprendizagem
restritivos para os alunos surdos.

• Em um nível diferente, para muitos indivíduos, ser surdo é muito mais do que
uma condição audiológica.

• As comunidades surdas e a cultura surda existem em muitos países ao redor


do mundo.

• A fala é uma combinação específica de sons, tipicamente uma combinação


complexa de sons entre 250 e 8000 Hz.

• A percepção auditiva da fala também é um processo complexo, tipicamente


caracterizado como ocorrendo em estágios.

• Geralmente pensamos na fala em termos de percepção auditiva da fala, mas


a fala também pode ser percebida visualmente pela leitura dela, também
chamada de leitura labial ou de leitura orofacial.

• A perda auditiva pode ocorrer como resultado de obstrução ou dano em


qualquer parte do ouvido.

• A perda auditiva condutiva é mais fácil de curar e menos grave do que a perda
auditiva neurossensorial que resulta de danos no ouvido interno.

• A perda auditiva neurossensorial pode ocorrer se as células ciliadas da cóclea


estiverem danificadas, se sua função for limitada ou se o nervo acústico ou os
centros sensoriais no tronco cerebral não funcionarem adequadamente.

• O grau de perda auditiva é expresso como o nível médio de amplificação


necessário para permitir que alguém ouça o som de uma frequência específica.

49
• Uma perda auditiva média (PTA) acima de 20 dB é considerada significante
para a aquisição da língua falada, pois é nesse ponto que a percepção da fala se
torna obstruída.

• A perda auditiva neurossensorial bilateral em crianças é tipicamente congênita


(presente ao nascimento) ou adquirida no início da vida.

• A perda auditiva hereditária não sindrômica pode ser autossômica dominante,


autossômica recessiva ou X-ligada.

• Além dos fatores genéticos, a perda auditiva congênita pode ser causada por
doença materna, infecções infantis ou toxinas.

• A triagem auditiva otoacústica pode ser realizada durante visitas domiciliares


ou no hospital, horas ou dias após o nascimento.

• A identificação de quais frequências estão implicadas em uma perda auditiva


é mais difícil, mas a medição das respostas auditivas do estado estacionário
oferece algumas possibilidades.

• Após a triagem auditiva neonatal, as técnicas mais utilizadas para avaliar


a capacidade auditiva em crianças e adolescentes com perda auditiva são a
audiometria tonal limiar e a audiometria vocal.

• Existem vários tipos de aparelhos auditivos, mas todos eles são essencialmente
dispositivos que amplificam os sons recebidos.

• Aparelhos auditivos podem ser usados ​​no ouvido ou parcialmente atrás da


orelha.

• Durante o sono, os bebês também percebem a linguagem falada e outros sons,


e embora isso ocorra no nível de processos abaixo do limiar consciente, ajuda a
conectar o cérebro à percepção auditiva.

• A amplificação precoce também apresenta algumas desvantagens significativas.

• Sistema de Frequência Modulada Pessoal (FM), que exige que o professor e o


aluno usem um dispositivo auxiliar, pode ajudar a melhorar as relações sinal-
ruído e, assim, apoiar a percepção da fala na sala de aula.

• Nos casos em que as perdas auditivas profundas das crianças são causadas por
uma cóclea disfuncional, malformada ou mesmo ausente, o implante coclear
(IC) pode ser uma boa alternativa.

• A taxa de implante coclear para crianças tem aumentado constantemente, a


idade de implantação tem diminuído constantemente e o uso de implantes
bilaterais ou binaurais, um em cada orelha, está se tornando comum.

50
• O uso de aparelhos auditivos ou implantes cocleares por uma criança pequena
não necessariamente ou automaticamente leva à percepção da fala.

• Ser surdo é tanto uma deficiência quanto, para algumas pessoas surdas,
também oupredominantemente uma identidade linguística e cultural.

• O que une muitos Surdos, apesar de sua diversidade, é um sentimento intenso


de pertencer a outras pessoas que sabem como é ser Surdo em um mundo
dominado por pessoas ouvintes.

• Para muitos aprendizes surdos, a surdez não é apenas uma condição


audiológica, mas também um modo de ser.

• Como consequência da introdução do implante coclear precoce, algumas


pessoas Surdas (e algumas ouvintes) temem que as línguas de sinais e as
culturas surdas voltem a estar sob pressão, como nos anos em que a língua de
sinais geralmente era proibida em sala de aula.

• Desde o início, as escolhas sobre a língua de ensino e a condição auditiva


do corpo docente na educação de surdos levaram a violentas controvérsias,
dividindo os profissionais em campos descritos como os oralistas, aqueles que
apoiavam a comunicação exclusivamente pela língua falada, e os gestualistas,
proponentes do uso de sinais e língua de sinais e da indicação de professores
surdos.

• As línguas de sinais não se tornaram amplamente e abertamente apreciadas até


que linguistas como William Stokoe mostraram convincentemente que eram
línguas reais, ricas e bem estruturadas; e psicólogos como Vernon e Schlesinger
e Meadow demonstraram sua importância para o desenvolvimento e educação
da criança.

51
AUTOATIVIDADE

1 As comunidades surdas e a cultura surda existem em muitos países ao redor


do mundo. Quais seriam algumas características destas comunidades?

2 A fala é uma combinação específica de sons. Descreva algumas características


da fala, inclusive os estágios de percepção auditiva dela.

3 O que é o Sistema de Frequência Modulada Pessoal (FM)? E como pode


beneficiar o processo de aprendizagem em sala de aula?

52
UNIDADE 1
TÓPICO 3

O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS

1 INTRODUÇÃO
Imagine receber o seguinte e-mail de pais em busca de conselhos:

Nosso filho recebeu seu primeiro implante aos cinco anos e o segundo aos
sete anos. Ele agora tem oito anos e só fala frases de cinco a seis palavras
(gramaticalmente incorretas) e entende um pouco mais. Ele só pode ler no
nível dos anos pré-escolares. Ele estava em uma escola mal administrada, então
nos mudamos há oito meses para uma grande escola particular de ensino oral.
Ele está ganhando habilidades de língua e alfabetização, mas tememos que não
seja rápido o suficiente para diminuir a distância. Eu sei que não estamos nesta
escola há muito tempo e devemos esperar mais, mas o tempo é algo que já
perdemos muito. Eu não quero um jovem de 20 anos que não tenha uma língua
utilizável e não possa ler, mas também sinto que mudar para Libras [Língua
Brasileira de Sinais] dificultará ainda mais a leitura. O que eu faço?

Embora estejam fazendo perguntas básicas sobre o desenvolvimento de


seu filho surdo, esses pais abordaram várias questões problemáticas e controversas
que continuam a surgir na educação de surdos. Questões que frequentemente
recebem respostas baseadas em filosofias pessoais, crenças e tradição, em vez de
evidências de pesquisa. Neste caso, eles poderiam receber a seguinte resposta,
todas relacionadas a pontos levantados em vários lugares ao longo deste livro:

1. Quase todas as crianças surdas têm dificuldade em aprender a ler (TRAXLER,


2000).
2. A educação “oral” não elimina atrasos de linguagem (GEERS, 2006).
3. Não há evidências de que a aprendizagem da língua de sinais interfira na
aprendizagem da linguagem falada (para crianças com ou sem implantes
cocleares), mas também não levará necessariamente à alfabetização escrita
(MAYER; AKAMATSU, 1999).
4. Os implantes cocleares são uma ajuda tremenda para muitas crianças surdas,
mas não as fazem crianças ouvintes (SPENCER; MARSCHARK; SPENCER,
2011).
5. Infelizmente, não há uma resposta simples ou única para a sua situação, uma
situação que seja compartilhada por muitos, se não pela maioria dos pais de
crianças surdas.

53
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

Em suma, mesmo que as perguntas desses pais fossem simples, elas


também solicitariam respostas complexas. Até mesmo para começar a respondê-
las exigiria não apenas que se soubesse e se pudesse destilar as evidências gerais
em relação às interações da língua, alfabetização e escolaridade, mas também que
se conhecesse as características específicas da criança e da família. O primeiro
requisito envolveria pesquisa apropriada e sua avaliação (ver Tópico 1 desta
unidade); o segundo envolveria uma avaliação completa e adequada centrada na
família (ver Tópico 2 da Unidade 2).

Em resposta a questões como essas, os pais de crianças surdas


frequentemente obtêm informações contraditórias de pessoas diferentes,
frequentemente deixando-os mais preocupados. Felizmente, pesquisas recentes
forneceram uma melhor compreensão sobre os fatores que afetam a língua e
a aprendizagem entre crianças surdas e as maneiras pelas quais os ambientes
iniciais e as interações entre pais e filhos moldam seu desenvolvimento.

A triagem auditiva neonatal universal e os programas de intervenção


precoce estão proporcionando às crianças surdas jovens e suas famílias
experiências sociais e educacionais, informações baseadas em evidências e apoio
prático. Sabemos, a partir de vários estudos, que os pais que recebem forte apoio
da família e dos amigos, assim como dos profissionais, são mais capazes de lidar
com as demandas de ter uma criança surda (CALDERON; GREENBERG, 2011).
Estar plenamente informado permite que eles tenham expectativas razoáveis​​
para si e para seu filho. Também impede que eles acreditem que há algo que
transformará magicamente seu filho surdo em uma criança ouvinte ou que seu filho
está condenado a uma vida de dependência e fracasso. A coleta de informações é,
portanto, essencial para os pais que têm filhos surdos, especialmente durante os
primeiros meses de vida. Isso é ainda mais importante, pois sabemos que, devido
ao número de decisões apresentadas aos pais de crianças surdas em um período
relativamente curto, eles frequentemente relatam sentirem-se como se estivessem
vivendo em uma montanha-russa (BOSTEELS; VAN HOVE; VANDENBROECK,
2012). Além disso, as informações frequentemente são apresentadas aos pais
de maneiras preconceituosas, muitas vezes exagerando os aspectos médicos
da surdez e negligenciando outros aspectos do que significa ser surdo/Surdo
(MATTHIJS et al., 2012), como se um bebê não fosse mais do que seus ouvidos.

Uma das coisas mais importantes que os pais de uma criança surda têm
que aprender é que, como observamos no Tópico 2, embora as crianças surdas
e ouvintes tenham muitas das mesmas forças externas agindo sobre elas e
respondem mais ou menos da mesma maneira, existem modos além de apenas
ouvir os limiares e a modalidade da língua em que elas são diferentes. Afinal, as
diferenças individuais estão presentes até mesmo entre gêmeos idênticos. Essas
diferenças podem ser maiores entre as crianças surdas do que entre as crianças
ouvintes, mas isso não é necessariamente ruim. As crianças são extremamente
flexíveis e resistentes. Elas se ajustam a seus ambientes familiares e sociais, e
crianças surdas, literalmente, não sabem o que estão perdendo (por não ouvir). O
que é essencial para os adultos no mundo de uma criança surda é reconhecer os

54
TÓPICO 3 | O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS

pontos fortes e as necessidades da criança – construir sobre a primeira e trabalhar


para acomodar a segunda. Tudo isso começa essencialmente no nascimento, e este
tópico considerará como e o que as crianças surdas aprendem em casa. Não por
coincidência, também incluirá o que pais de crianças surdas estão aprendendo
em casa ao mesmo tempo, quer eles percebam isso ou não.

2 LÍNGUA E COMUNICAÇÃO
Ao longo deste livro de estudos, enfatizamos repetidamente a importância
da comunicação efetiva ou bem-sucedida entre pais e filhos, pois é o melhor
preditor de sucesso em praticamente todas as áreas de desenvolvimento de crianças
surdas e ouvintes. A falta de comunicação natural e bem-sucedida desde o início
talvez seja a consequência mais séria do diagnóstico tardio de perda auditiva e é
importante que os pais não subestimem a importância da comunicação durante
os primeiros meses de vida (LEDERBERG; BEAL-ALVAREZ, 2011).

Ter uma criança que não responde à voz da mãe ou presta atenção às
coisas que acontecem ao seu redor pode parecer um problema menor, mas terá um
impacto duradouro na criança, nos pais da criança e nas relações entre eles. Além
disso, como vimos no Tópico 1, muito do que uma criança pequena sabe vem
incidentalmente, simplesmente do brincar e da interação com o mundo. Outro
conhecimento vem da experimentação mental: pensar sobre as coisas, entender as
conexões ou o modo como as coisas funcionam e, às vezes, testá-las no mundo real.
Provavelmente, a maior parte do conhecimento de uma criança em determinado
momento vem de outras pessoas que fornecem novas informações (como que
os cavalos não fossem cachorros), novos comportamentos (como amarrar um
cadarço) e novas coisas com as quais interagir (como brinquedos, jogos e ideias).
Família e colegas são, portanto, grandes contribuintes para o desenvolvimento e
a aprendizagem, e muito do que eles fornecem vem através da língua.

Por toda a sua importância, a aquisição da língua é um desafio considerável
para a grande maioria das crianças surdas e a maioria tem pais e professores
que não têm certeza de como melhor ajudá-los a realizar essa façanha. Crianças
surdas de pais surdos têm o benefício de acesso total à língua desde o nascimento
por meio de uma linguagem visual natural, e o trabalho de vários pesquisadores
indica que essas crianças passam por vários marcos do desenvolvimento da língua
na mesma ordem e na mesma velocidade que as crianças ouvintes, pelo menos
até os dois anos de idade (MEIER; NEWPORT, 1990). Depois disso, até os filhos
surdos de pais surdos podem ter atrasos no desenvolvimento da linguagem. Dois
estudos longitudinais de crianças surdas de pais surdos que estavam a par com
os pares ouvintes aos dois anos descobriram que tinham vocabulários (de sinais)
significativamente menores do que os vocabulários falados das crianças ouvintes
aos três anos, de acordo com a mesma ferramenta de avaliação (ANDERSON;
REILLY, 2002; WOOLFE et al., 2010). Um padrão semelhante parece ser comum

55
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

na língua de sinais de crianças ouvintes de pais surdos, sugerindo que não se


trata de crianças surdas, mas de como os pais surdos “ensinam” para seus filhos
uma primeira língua.

Se esses achados forem verificados em pesquisas futuras, pode-se


imaginar várias fontes de atrasos da língua entre filhos de pais surdos (assim
como de pais ouvintes). Por um lado, pelo menos durante a primeira infância e
nos anos pré-escolares, os filhos de pais surdos provavelmente serão expostos a
menos usuários fluentes da língua do que crianças ouvintes da mesma idade. Eles
também perderão oportunidades que as crianças ouvintes de pais ouvintes têm
para a aprendizagem incidental da língua, ouvindo por acaso as conversas de seus
pais e de outras pessoas. Obviamente, isso afetará o número de palavras que eles
aprendem. Além disso, haverá um efeito cumulativo na linguagem, pois quanto
mais contato com a língua eles tiverem, mais complexas serão suas interações
com os outros e mais linguagem elas adquirirão. Relacionado a isso também é
o fato de que muitos adultos surdos não possuem habilidades de letramento
ou nível de escolaridade de adultos ouvintes (QI; MITCHELL, 2012), portanto,
podem não ser os melhores modelos de língua para seus filhos em termos do
nível de seus discursos.

Pais e irmãos (e até mesmo o pet da família) proporcionam aos bebês e às


crianças pequenas as primeiras interações que apoiam a aprendizagem em áreas
sociais, linguísticas e cognitivas. Embora as barreiras iniciais da língua possam
parecer um problema para os pais ouvintes que têm filhos surdos, a comunicação
não é apenas sobre a língua. Independentemente de as crianças surdas terem ou
não aparelhos auditivos ou implantes cocleares e se elas usam principalmente a
língua de sinais ou falada, é através da visão e do toque que os bebês surdos terão
acesso ao mundo da experiência.

Koester, Papousek e Smith-Gray (2000) descreveram os comportamentos


naturais que os pais surdos usam nas interações com seus filhos surdos, o que
tem sido chamado de parentalidade intuitiva. Por exemplo, é comum ver pais
surdos (e outros habilidosos usuários de sinais) modificando sua língua de sinais
e expressões complementares da mesma maneira que os pais ouvintes modificam
sua língua falada para bebês, chamada de “manhês” (motherese), mas também
para seus animais de estimação (HIRSH-PASEK; TREIMAN, 1982). Isso inclui
produção lenta, expressão facial exagerada, repetição e sorrisos complementares
(MOHAY et al.,1998). Os pais surdos também usam o toque com mais frequência
e eficácia do que os pais ouvintes em obter e manter a atenção do filho surdo
(KOESTER; BROOKS; TRACI, 2000). Tais comportamentos ensinam a criança a
prestar atenção a certas coisas, como a mãe, um comportamento importante que
pode ser transferido (generalizado) para outras pessoas e coisas.

Swisher (2000) apontou que as crianças pequenas não têm períodos de


atenção visual muito longos e, como veremos no Tópico 3 da Unidade 2, o tempo
de atenção das crianças surdas muitas vezes é ainda menor que o das crianças
ouvintes. Ao desenvolver as habilidades necessárias para ser um aprendiz visual,

56
TÓPICO 3 | O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS

esperamos que as crianças surdas consigam adquirir mais tempo de atenção ao


longo do tempo, mas não está claro o quanto essas habilidades se desenvolvem
naturalmente ou precisam ser ensinadas. Pesquisadores mostraram que as
crianças surdas de famílias surdas gastam pelo menos tanto tempo atendendo às
mesmas coisas que suas mães (atenção conjunta) como fazem as crianças ouvintes
de famílias ouvintes aos nove, 12 e 18 meses de idade (MEADOW-ORLANS;
SPENCER; KOESTER, 2004). O fato de elas gastarem muito mais tempo fazendo
isso do que as crianças surdas de famílias ouvintes sugere que as habilidades
de atenção visual podem ser aprendidas em contextos apropriados (WAXMAN;
SPENCER, 1997). Presumivelmente, este é o resultado das várias estratégias
de obtenção de atenção e manutenção da atenção que foram documentadas
nas interações das mães surdas com seus filhos (MARSCHARK, 2007). Essas
primeiras interações também ajudam as crianças surdas a adquirir habilidades de
tomada de vez/palavra (turn-taking) e os fundamentos das habilidades linguísticas
(SWISHER, 2000) que, por sua vez, fornecem a base para níveis mais elevados de
aprendizagem.

Marschark e Hauser (2012) discutiram a importância de os pais ajudarem


seus filhos surdos a ampliar seus campos visuais efetivos (ou seja, absorver mais
do ambiente), algo que os pais surdos fazem com naturalidade. Considerando
que a atenção das crianças ouvintes será atraída pelas coisas que elas ouvem ao
seu redor, a maior sensibilidade das crianças surdas aos estímulos periféricos
(por exemplo, movimento, mudanças no brilho) serve como um mecanismo
compensatório (MARSCHARK; ​​KNOORS, 2012). Essa adaptação aprendida é
importante porque os torna mais visualmente conscientes de seus ambientes e
oferece mais oportunidades de aprendizagem incidental. No entanto, também
pode torná-las mais propensas à distração, uma das razões para o menor tempo
de atenção.

Com o tempo, essa distração será compensada por sua capacidade


de desviar e voltar rapidamente a atenção visual para a pessoa ou coisa de
interesse central (RETTENBACK; DILLER; SIRETEANU, 1999). Exatamente
como isso acontece não foi documentado, mas há claramente grandes diferenças
individuais em quando e quão bem as crianças diferentes alcançam esse equilíbrio
nas interações com indivíduos e com o mundo. Vamos, portanto, examinar as
interações iniciais e suas implicações mais de perto, começando pelas relações
sociais.

3 FUNDAÇÕES DA INTERAÇÃO SOCIAL


Durante os primeiros estágios do desenvolvimento social, as mães e as
crianças desenvolvem maneiras de interagir umas com as outras por meio de
uma variedade de experiências compartilhadas. Eventualmente, suas ações se
entrelaçam de uma maneira que tanto simplifica suas rotinas cotidianas como
ensina a criança sobre estratégias bem-sucedidas (e malsucedidas) de interação
social.

57
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

Para entender como os bebês surdos desenvolvem habilidades para


interação social, precisamos apenas observar as interações entre eles e seus pais
durante os primeiros meses de vida. É através de suas mães, em particular, que os
bebês têm seus primeiros contatos com o mundo, alimentando, acariciando, dando
banho e, pelo menos para as crianças ouvintes, ouvindo as vozes de suas mães.
Essas primeiras experiências não determinam o curso do desenvolvimento, mas
têm implicações cumulativas para o crescimento na interação social, exploração e
aprendizagem formal e informal. Porque os seres humanos são criaturas sociais,
quase qualquer interação face a face ou tátil será um evento social para crianças
surdas e suas mães. O que o bebê aprende com as interações comportamentais
com os pais e com os outros afetará a forma como eles constroem relacionamentos
sociais mais complexos com os familiares e, eventualmente, com os que estão fora
da família. Mesmo nos primeiros estágios, a língua normalmente desempenha
um papel central e torna-se cada vez mais importante.

Durante os últimos três meses de gravidez, o feto geralmente descansa


com a cabeça contra a pélvis da mãe. Neste ponto do desenvolvimento, a maioria
dos fetos se desenvolveu até o ponto em que eles podem ouvir e até mesmo
reagir à fala humana (DECASPER; FIFER, 1980). Para aquelas mães que falam
e carregam bebês que podem ouvir, o feto realmente aprende a voz de sua mãe
durante esse tempo através da condução óssea. Após o nascimento, isso permite
ao recém-nascido distinguir sua voz das outras, incluindo a do pai. Sabemos,
a partir de extensas pesquisas, que experiências auditivas antes do nascimento
podem afetar a aprendizagem e a percepção posteriores tanto em humanos como
em animais, e elas podem desempenhar um papel no apego social e emocional
precoce de mães e bebês.

Decasper e Spence (1986), por exemplo, mostraram que crianças com


menos de três dias de idade podem aprender a sugar um mamilo mais rápido
ou mais devagar do que a taxa normal para ligar um gravador que permite
ouvir o som da voz de suas mães. Tais achados sugerem que ouvir a fala das
mães ouvintes antes do nascimento e logo depois deste pode ter um papel nas
interações sociais precoces, tornando a mãe “familiar” ao recém-nascido. No
entanto, assim como uma criança provavelmente responde positivamente ao som
familiar da voz de sua mãe, a mãe provavelmente responde positivamente, por
sua vez, a uma criança que sorri, balbucia e olha para o seu rosto em resposta à
sua voz. Com base nesse relacionamento original, mãe e filho gradualmente se
tornam mais sintonizados entre si e expandem suas primeiras "conversas".

Esse cenário típico não significa que os relacionamentos precoces mãe-


bebê exigem comunicação vocal ou falada (embora as mães surdas vocalizem
para seus bebês) e já vimos que há uma variedade de outras formas de interação
precoce. Obviamente, a visão, o tato e até o cheiro ajudam o bebê a identificar
pessoas e objetos familiares nos primeiros dias de vida. Nas primeiras relações
entre bebês e seus pais, na verdade, sorrisos e toques e toques ritmicamente
padronizados parecem ser tão reconfortantes quanto vozes familiares. O toque

58
TÓPICO 3 | O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS

materno, em particular, tem efeitos poderosos em recém-nascidos surdos e


ouvintes (KOESTER; BROOKS; TRACI, 2000). As mães surdas tendem a tocar
seus filhos mais do que as mães ouvintes, mas as mães ouvintes que estão cientes
das perdas auditivas dos filhos também tendem a tocar mais os filhos, a usar essas
expressões faciais exageradas e a tentar manter os objetos e a si mesmas dentro da
linha de visão dos bebês (MEADOW-ORLANS; SPENCER; KOESTER, 2004). Pais
que ainda não descobriram que seus filhos são surdos também podem, sem saber,
compensar a falta de audição com outros meios de comunicação, mas ainda não
há dados disponíveis sobre essa possibilidade, porque se os pais ainda não estão
cientes da perda auditiva de seus filhos, não há como identificá-los para estudo.
Não obstante, é claro que existem múltiplos sinais, por vezes despercebidos,
envolvidos na parentalidade intuitiva que guiam as primeiras interações sociais
dos pais e dos seus filhos surdos. Essas sugestões contribuirão para o apego mãe-
filho e outros relacionamentos.

Neste ponto, é importante enfatizar que as crianças surdas podem não


estar em nenhuma desvantagem particular porque não conseguem reconhecer as
vozes de suas mães ao nascer. Os bebês surdos e suas mães ouvintes simplesmente
começam seus relacionamentos interagindo de maneiras um pouco diferentes do
que os bebês ouvintes e suas mães. A questão importante é como essas diferenças
podem influenciar as interações sociais e a aprendizagem subsequentes. Na maioria
das vezes, as interações de crianças surdas com pais surdos se parecem muito com
as de crianças ouvintes com pais ouvintes. Quando completam um ano de idade,
ambos os filhos surdos de pais surdos e os filhos ouvintes de pais ouvintes podem
perceber quando os outros estão felizes, assustados ou tristes apenas olhando
para seus rostos. Nessa idade, as crianças surdas demonstram tanto afeto aos pais
quanto os filhos ouvintes. Crianças surdas de pais surdos sabem como chamar a
atenção batendo no braço das pessoas ou acenando para elas, enquanto as que
têm pais ouvintes geralmente usam suas vozes para chamar a atenção. Crianças
surdas e mães surdas, portanto, têm relacionamentos iniciais bastante normais.
Essencialmente, as únicas maneiras pelas quais elas parecem diferentes são o uso
de comunicação por sinais em vez de falada e o uso de comportamentos visuais
e táteis, em vez de estratégias de atenção e direcionamento de atenção auditiva
(MEADOW-ORLANS; SPENCER; KOESTER, 2004).

Embora não haja forte relação causal entre o apego materno-infantil


e o comportamento social posterior, as crianças que possuem melhores
relacionamentos e melhor comunicação com suas mães ou outros cuidadores
primários também tendem a ser aquelas que desenvolvem boas relações
sociais com seus pares e maior autoestima (CALDERON; GREENBERG, 2011).
Crianças que são boas socializadoras provavelmente têm várias características
de personalidade que as tornam mais capazes de conviver com outras crianças
e, portanto, mais populares. A maioria dessas qualidades é adquirida cedo na
vida através de interações dentro da família, mas outras podem vir como parte
de seu temperamento natural. Algumas crianças surdas e ouvintes, por exemplo,
simplesmente são mais sociáveis ​​do que outras, uma qualidade que é vista cedo
pelos pais e parece continuar nos anos escolares. Algumas crianças são melhores

59
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

na resolução de problemas sociais, descobrindo como brincar com sucesso com


outras crianças e para quem podem recorrer para apoio emocional ou prático.
Parte dessa habilidade parece residir no fato de algumas crianças parecerem mais
sensíveis às sugestões sociais dadas por outras crianças e adultos, e, portanto, são
melhores em responder apropriadamente a aberturas positivas e negativas. Ter
um meio eficaz de comunicação é necessário aqui, mas pode não ser suficiente
(JAMBOR; ELLIOT, 2005).

Não é de surpreender que o comportamento social das crianças com


seus pares, assim como sua estabilidade emocional, seja afetado pela qualidade
das relações entre pais e filhos. Por exemplo, comportamentos controladores
ou superprotetores por parte das mães ouvintes podem afetar as interações
das crianças surdas com os colegas e outros adultos, porque levam as crianças
a “esperar” esses tipos de comportamento dos outros. Pais e professores que
estão constantemente resgatando crianças surdas de situações embaraçosas irão
impedi-los de desenvolver suas próprias estratégias para a solução de problemas
sociais. Ao mesmo tempo, temos que reconhecer que algumas ações por parte
das mães que podem parecer estar controlando podem ser necessárias para
garantir a segurança, cooperação ou obediência de seus filhos (LEDERBERG;
PREZBINDOWSKI, 2000). O que parece ser intrusão simplesmente pode ser
parte do esforço de obter a atenção de seus filhos e parte de sua diretividade
pode refletir tentativas de superar as barreiras da comunicação, em vez de ser um
reflexo de qualquer desejo de controlar os comportamentos de seus filhos.

Tudo isso alimenta os primeiros relacionamentos entre pais e filhos


e torna-se parte dos padrões de interação que se expandem e se tornam mais
complexos ao longo do tempo. Os pais ouvintes e seus filhos surdos estabelecem
tais interações exatamente como pais e filhos que compartilham o mesmo status
auditivo. Se às vezes leva mais tempo do que nos casos de crianças surdas de pais
surdos ou de crianças ouvintes de pais ouvintes, isso pode ser tanto resultado da
ansiedade dos pais quanto da falta de audição da criança. Dadas as dificuldades
auditivas e de inteligibilidade da fala, mesmo com implantes cocleares (ver Tópico
2 desta unidade e Tópico 1 da Unidade 2), as crianças surdas mais velhas podem
achar que os sinais sociais que funcionam em casa não funcionam bem fora da
família imediata, a menos que estejam interagindo com outras pessoas familiares
com língua de sinais ou com as vozes dos surdos.

Muitas das habilidades envolvidas nas posteriores interações criança-


criança são bem diferentes das envolvidas nas interações mãe-criança. As crianças
surdas jovens podem se comportar em relação aos colegas da mesma maneira que os
jovens ouvintes, mas sem um sistema de comunicação compartilhada, elas podem
não obter ou dar tantas pistas sociais precisas quanto as crianças ouvintes. Essa
situação se torna mais complexa pelo fato de que, em comparação a companheiros
ouvintes da mesma idade, as crianças surdas jovens provavelmente tiveram menos
contato com outras crianças com as quais interagiram socialmente. Programas de
intervenção precoce são úteis nesse sentido, pois as crianças surdas são expostas a
mais diversidade nas interações sociais e comunicativas nesses ambientes.

60
TÓPICO 3 | O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS

Pesquisas realizadas em locais de intervenção precoce mostraram que


a estabilidade das amizades entre crianças surdas pré-escolares é semelhante
àquela de crianças ouvintes. Ambos os grupos, por exemplo, mostram padrões
semelhantes de preferência de parceiros de brincadeiras (LEDERBERG, 1993).
Embora as crianças surdas mais jovens não usem muita linguagem formal nas
interações com os colegas surdos ou ouvintes, elas usam uma variedade de
comunicação não linguística. Crianças surdas mais velhas usam mais linguagem
e comunicação gestual com outras crianças surdas do que com crianças ouvintes,
indicando que adquiriram algumas habilidades de cognição social. Suas
interações com parceiros de brincadeiras surdos também tendem a ser mais
sociais e menos centradas em objetos do que as comunicações com parceiros
de brincadeiras ouvintes. Finalmente, as crianças surdas que têm melhores
habilidades linguísticas são mais propensas a brincar com crianças ouvintes,
brincar com mais de uma criança de cada vez, interagir com professores e usar a
língua durante a brincadeira. A situação social da aprendizagem tornar-se-á mais
complexa à medida que as crianças crescem, uma questão que consideraremos no
Tópico 4 da Unidade 2.

Quando se olha para crianças matriculadas em programas de intervenção


precoce que envolvem o ensino de língua de sinais e de língua falada, elas tendem
a mostrar um jogo mais cooperativo com colegas do que crianças que recebem
apenas instrução de língua falada, presumivelmente porque as crianças são mais
capazes de se fazer entender (CORNELIUS; HORNETT, 1990). A disponibilidade
de experiências sociais mais diversificadas, por sua vez, aumenta sua capacidade
de lidar com as interações sociais posteriores e as necessidades de crescer em
um mundo amplamente ouvinte. Ao mesmo tempo, é preciso ter cautela com
as alegações de que a integração e a inclusão de crianças surdas jovens as
beneficiam linguística e socialmente, simplesmente por estarem cercadas por
colegas ouvintes. As crianças surdas jovens preferem claramente brincar e se
comunicar com outras crianças surdas, embora seus comportamentos sociais
sejam praticamente os mesmos, independentemente de brincarem com surdos
ou ouvintes da mesma idade. Da mesma forma, as crianças ouvintes preferem
brincar com os colegas ouvintes em vez de com os surdos, então a questão aqui
não é o status de audição per se (KNUTSON et al., 1997). Em vez disso, as crianças
preferem brincar com as crianças com quem podem se comunicar.

Agora deve ficar claro que a vida emocional e acadêmica de crianças


surdas jovens é reforçada por pais que estão cientes de suas necessidades e buscam
programas de intervenção e educação para eles e seus filhos, incluindo instrução
de comunicação (CALDERON; GREENBERG, 2011). Há também forte apoio para
uma relação entre a comunicação precoce entre pais e filhos, comportamentos
relacionados ao apego e habilidades sociais posteriores. As crianças com vínculos
estáveis ​​e seguros no início da vida tendem a ser mais competentes socialmente
durante os anos escolares do que as crianças com menos apegos seguros (VAN
GENT et al., 2012).

61
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

Neste momento, não há evidências que sugiram que haja algum benefício
no uso da língua falada sobre a língua de sinais, ou o contrário, no estabelecimento
de vínculos precoces entre pais e filhos (LEDERBERG; PREZBINDOWSKI, 2000).
O uso da língua de sinais pode preencher todos os papéis iniciais de socialização
normalmente preenchidos pela fala dos pais. Ainda assim, alguns pais de crianças
surdas não entendem a importância da comunicação precoce e têm hesitação ou
mesmo medo em relação à língua de sinais. Alguns deles veem a língua de sinais
como um método estranho e talvez perigoso que pode impedir o desenvolvimento
da fala da criança. Outros pais ficam ansiosos para que seus filhos aparentem e
ajam o mais “normal” possível e a língua de sinais claramente não se encaixa
nesse requisito. Pouco eles percebem que, para algumas crianças, a aquisição
precoce da língua de sinais pode ser a melhor maneira de ajudá-los a alcançar
um funcionamento social “normal” e otimizar a aprendizagem. Oportunidades
perdidas de comunicação e socialização logo no início podem dar um ponto de
partida distintamente desvantajoso a uma criança em relação a outras crianças.

4 O LÚDICO COMO JANELA E SALA


Spencer e Hafer (1998) descreveram a brincadeira de crianças surdas
como “janela” e “sala”. Isto é, observando como as crianças progridem através
dos vários estágios do brincar/lúdico – representacional, simbólico, dramático
e imaginário –, podemos ver o crescimento no desenvolvimento cognitivo e o
crescimento nas habilidades sociais (a “janela”). Também obtemos informações
sobre os níveis de linguagem expressiva e receptiva de uma criança, suas
habilidades na solução de problemas sociais e o desenvolvimento da teoria da
mente (ver Tópico 3 da Unidade 2). Ao mesmo tempo, o brincar dá às crianças
oportunidades de explorar, exercitar habilidades já adquiridas em novos
contextos, experimentar vários papéis e aprender com o feedback que recebem
de pessoas e coisas (o “quarto”). Os desafios das crianças surdas tentando brincar
com crianças ouvintes foram mencionados anteriormente, mas o brincar tem uma
função importante no desenvolvimento.

Crianças surdas e ouvintes progridem através de fases semelhantes de


comportamento lúdico, fases que parecem paralelas ao desenvolvimento da
linguagem e da língua (MEADOW-ORLANS; SPENCER; KOESTER, 2004). As
crianças com defasagens no desenvolvimento da linguagem mostram atrasos nos
aspectos mais complexos da brincadeira, como planejamento e coordenação de
objetos, pelo menos em parte, porque eles são menos capazes de se beneficiar de
conselhos e feedback de suas mães e de seus pares mais avançados em termos
de desenvolvimento. Descobriu-se que as crianças com níveis mais baixos
de linguagem gastam menos tempo em níveis mais elevados de brincadeiras
simbólicas (brincadeira de faz-de-conta/fingimento), mas o tempo gasto em
brincadeiras representativas (por exemplo, “dirigir” um carro de brinquedo) e
brincadeiras simbólicas (por exemplo, “dirigir” um bloco de madeira fazendo de

62
TÓPICO 3 | O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS

conta que é um carro de brinquedo) é igual ou superior ao de crianças com mais


linguagem. Isso sugere novamente uma conexão entre o brincar e a linguagem,
assim como a descoberta de que crianças surdas com linguagem apropriada para
a sua idade mostram um comportamento lúdico normal (SPENCER; DEYO, 1993).

Brincar é uma “sala” na qual as crianças exploram possibilidades. Para


os pais de crianças surdas jovens, às vezes há uma preocupação de que eles
devem utilizar tanto tempo quanto possível em situações de ensino estruturado,
de modo a compensar ou evitar atrasos em vários domínios. Todavia, o brincar
pode ser usado de forma estruturada para comunicar novos conceitos ou relações
entre os conceitos antigos (por exemplo, a estrutura de categorias ou dimensões
físicas), mas a brincadeira em si também desempenha um papel inestimável no
desenvolvimento de todas as crianças (SPENCER, 2010). De fato, pelo menos com
crianças ouvintes, são as interações de comunicação informais e não estruturadas
de pais e filhos que apoiam e preveem habilidades de linguagem posteriores da
criança (HART; RISLEY, 1995).

Juntamente às descobertas que indicam que as crianças com habilidades


linguísticas apropriadas à idade se dão melhor com seus colegas em contextos
escolares, pesquisas sobre outros aspectos do brincar indicam que a intervenção
precoce e contextos pré-escolares proporcionam uma variedade de oportunidades
linguísticas e não linguísticas para as crianças surdas (e entre crianças surdas
e crianças ouvintes) que não estariam de outra forma disponíveis. Embora as
comparações de crianças mais velhas com e sem experiência social pré-escolar
ainda necessitam ser mais exploradas, parece provável que a disponibilidade de
experiências sociais, linguísticas e cognitivas mais diversas só pode aumentar a
flexibilidade de crianças surdas jovens em lidar com interações sociais posteriores
e a necessidade de crescer em um mundo amplamente ouvinte.

5 UMA CRIANÇA SURDA NA FAMÍLIA


A primeira infância é um período de aprendizagem rápida para crianças
surdas e ouvintes. Além de aprender sobre as coisas, as pessoas e o meio ambiente,
elas também aprendem muito sobre como aprender e como interagir tanto de
maneira verbal quanto de maneira não verbal. Quando as mães fazem perguntas
aos bebês de um mês de idade em “manhês”, elas não estão realmente esperando
respostas, exceto talvez através de sorrisos e outras expressões faciais. Quando
pais e bebês compartilham uma língua, seja de sinal ou falada, essas brincadeiras
podem ser episódios importantes de aprendizagem linguística. Essas interações
ensinam as crianças sobre as interações sociais e apoiam o desenvolvimento de
uma relação emocional recíproca entre mãe e filho, na qual cada um tem seus
próprios papéis. Eventualmente, um vínculo de apego se formará, pois as crianças
buscarão a mãe e outras figuras familiares e as usarão como bases “seguras” para
a exploração de lugares e outras pessoas.

63
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

Ajustar-se a ter uma criança surda não é uma experiência fácil para muitos
pais ouvintes. Períodos de luto, depressão e culpa são frequentemente relatados,
uma reação natural a ter um filho que parece “menos do que perfeito”. Todavia,
esses sentimentos eventualmente darão lugar aos esforços combinados dos pais
para determinar as necessidades e serviços disponíveis para seus filhos – e para
si mesmos. As mães tendem a assumir as maiores responsabilidades emocionais
e cotidianas para as crianças surdas, como acontece com a maioria das crianças
com necessidades especiais na maioria das culturas; e elas às vezes se sentirão
sobrecarregadas. As mães que recebem mais apoio social de amigos e familiares
são as que melhor lidam com sua nova situação e os efeitos desse apoio são vistos
em melhores interações comportamentais e maior sensibilidade às necessidades
de comunicação de seus filhos.

Normalmente, a língua desempenha um papel contínuo e crescente na


interação social precoce, tanto pela comunicação explícita quanto pela percepção
das relações entre comunicação e comportamentos dos cuidadores. Tanto quanto
qualquer um pode dizer, a comunicação por sinais e falada é equivalente em
seu potencial para fornecer toda a informação e experiência necessárias para
o desenvolvimento social normal. Essa equivalência exige que os pais sejam
usuários competentes da língua, em qualquer modo que seja mais acessível a
seus filhos.

Notamos anteriormente que uma forma de os pais ouvintes obterem as


habilidades linguísticas necessárias, bem como o apoio emocional e prático às suas
necessidades, é através de programas de intervenção precoce. Esses programas
incluem instrução de comunicação para pais e filhos em língua de sinais,
língua falada ou ambas. Eles também expõem crianças (e pais) a outras pessoas
semelhantes a elas. Juntamente com a instrução explícita e implícita dentro do
lar, esses programas promovem o desenvolvimento inicial das interações sociais
entre crianças.

À medida que as crianças surdas saem do ambiente doméstico para


a comunidade maior, elas ganham diversidade muito necessária em sua
experiência. Ter múltiplos parceiros sociais ajuda a compensar a tendência das
mães ouvintes de serem controladoras e talvez superprotetoras de suas crianças
surdas, e contribui para o desenvolvimento cognitivo e da língua, bem como para
o desenvolvimento social. A comunicação com os que estão dentro e fora de casa
agora assume uma importância ainda maior, e, portanto, voltaremos a considerar
o desenvolvimento da língua com mais detalhe.

64
TÓPICO 3 | O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS

LEITURA COMPLEMENTAR

A EDUCAÇÃO DO SURDO EM QUESTÃO

Celma Regina Borghi Rodriguero

[...] No que se refere à surdez, os estudos mostram argumentos em defesa


de uma visão prospectiva dos processos humanos, atribuindo-se papel essencial
às relações sociais no surgimento e na consolidação de capacidades potenciais das
crianças.

Neste sentido, Góes explica que a “deficiência não torna a criança um ser
que tem possibilidades a menos; ela tem possibilidades diferentes”, uma vez que
“a linguagem não depende da natureza do meio material que utiliza, mas o que
é importante é o uso efetivo de signos, seja qual for a forma de realização, desde
que possa assumir o papel correspondente ao da fala” (1996, p. 35).

Goldfeld, por sua vez, ressalta que:

A história dos surdos comprova as ideias de Vygotsky e Bakhtin quanto


à importância da linguagem no desenvolvimento do pensamento e da
consciência, mostrando também que a sua aquisição pela criança deve
ocorrer através de diálogos, conversações, já que, sem uma língua
de fácil acesso, os surdos não conseguiriam participar ativamente da
sociedade (1997, p. 159).

Para Vygotsky, seria mais fácil ao surdo aprender a linguagem de sinais


ou dos gestos; no entanto, declara que essa linguagem é limitada e que o surdo
ficaria inserido num mundo pequeno, ou seja, no daqueles que conhecem a
língua. Além disso, defende que através dessa língua não é possível se chegar a
conceitos ou representações abstratas.

En verdad, el lenguage es no solo un medio de comunicación, sino


tambien un medio del pensamento, y la consciencia se desarrolla
principalmente com la ayuda del lenguage y surge a partir de la
experiencia social (1989a, p. 67).

Segundo o autor, sem a linguagem não existe a consciência, nem a


autoconsciência. Conclui dizendo que a consciência é resultado de experiência
social. Portanto, proporcionar a oralidade ao surdo corresponde a dar-lhe a
possibilidade não apenas de comunicar-se, mas também de desenvolver a
consciência, o pensamento e a autoconsciência e, assim, de trazê-lo de volta ao
estado humano. Por outro lado, ensinar a criança surda a falar contraria a sua
natureza, e se o intuito é ensinar a linguagem oral, a questão deve ser avaliada
com maior amplitude, discutindo-se as particularidades dos métodos a serem
utilizados. Vygotsky critica os métodos tradicionais, através dos quais a linguagem
oral é ensinada aos surdos de forma mecânica. Para ele, o ideal é iniciar o ensino
da linguagem desde cedo, permitindo, desta forma, que a criança surda, assim

65
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

como a ouvinte, passe naturalmente pelas fases de pronúncia, sem que se tema
a pronúncia incorreta, a falta de articulação, a confusão de sons etc., antes do
domínio correto da linguagem.

Goldfeld (1997) afirma que no decorrer da história, a ideia sobre os


surdos, feita pela sociedade no geral, mostrava apenas aspectos negativos, sendo
que na antiguidade eles eram tratados com piedade e compaixão. Como pessoas
castigadas, deveriam ser sacrificadas ou abandonadas.

Esclarece que até o século XV persistia a ideia de que o surdo era um ser
primitivo e não poderia ser educado. Os surdos, como outros povos dominados,
foram proibidos de usar suas línguas, e a eles foi oferecida uma outra, importante
para seu convívio com a sociedade, mas difícil de ser aprendida e praticamente
impossível de ser adquirida de forma espontânea. Segundo Goldfeld (1997),
através da história ficou evidenciado que essa proibição trouxe para os surdos
dificuldades na escolarização e na socialização.

Os educadores, no decorrer da história da educação dos surdos, criaram


diferentes metodologias de ensino para eles. Alguns baseavam-se apenas na
língua oral, isto é, a língua auditiva-oral utilizada no país. Outros pesquisaram
a língua de sinais, uma língua espaço-visual criada pelas comunidades surdas
através das gerações. E, outros ainda, criaram códigos visuais para facilitar a
comunicação com os alunos, mas que não se configuravam como uma língua.

Atualmente, no Brasil, destacam-se três abordagens ou filosofias


educacionais, e como ressalta Goldfeld, todas têm relevância e representatividade
no trabalho com os surdos. Em relação a essas filosofias educacionais, a autora
comenta:

o oralismo, ao considerar a oralização sua meta principal e ao não


valorizar realmente o diálogo espontâneo e contextualizado, na única
língua em que este é possível para a criança surda, a língua de sinais,
provoca diversos danos ao desenvolvimento linguístico e cognitivo
desta criança, já que o desenvolvimento cognitivo é determinado
pela aquisição da linguagem, que deve ocorrer através do diálogo
contextualizado (1997, p. 159).

Dessa forma, mesmo atingindo seu objetivo, a oralização não consegue


evitar danos no desenvolvimento da criança surda. Como escreve Skliar, a
proposta oralista “supõe que é possível ensinar a linguagem e sustenta a ideia
(...) de que existe uma dependência unívoca entre a eficiência ou eficácia oral e o
desenvolvimento cognitivo” (1997, p. 11).

A comunicação total, mesmo valorizando a comunicação e não a


língua, não oferece à criança uma língua de fácil acesso, que possa lhe servir de
ferramenta do pensamento e, portanto, não pode suprir todas as necessidades da
criança surda. Por outro lado, “estimula a criação de códigos e línguas artificiais
independentes do meio socioeconômico e cultural” (GOLDFELD, 1997, p. 160). A
autora refere-se ao bilinguismo como:
66
TÓPICO 3 | O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS

a melhor opção educacional para a criança surda, pois a expõe a uma


língua, de fácil acesso, a língua de sinais, que pode evitar o atraso da
linguagem e possibilitar um pleno desenvolvimento cognitivo, além
de expor a criança à linguagem oral, que é essencial para seu convívio
com a comunidade ouvinte e a sua própria família (1997, p. 160).

Nesse sentido, a educação, quando baseada no bilinguismo, parte


da conversação, como nas crianças ouvintes, possibilitando, desse modo, a
internalização da linguagem e o desenvolvimento das funções superiores.

O bilinguismo, se utilizado de modo correto, ou seja, permitindo o acesso


da criança surda à comunidade que utilize a Libras (Língua Brasileira de Sinais),
de forma que ela possa adquiri-la através de diálogos e, ao mesmo tempo, se forem
estimulados os resíduos auditivos e a língua oral, pode-se dar às crianças surdas
condições semelhantes às ouvintes, na aprendizagem e no desenvolvimento.

Vygotsky (conforme citado por Góes, 1996) considera como cruéis os


métodos que envolvem árduos treinamentos de articulação de sons e proibição
da “mímica”, embora apresente como sugestão o desenvolvimento da fala, um
recurso necessário e interessante para a vida da criança surda.

Góes ressalta que, numa perspectiva teórica, “o desenvolvimento da


criança surda deve ser compreendido como processo social, e suas experiências
de linguagem concebidas como instâncias de significação e de mediação nas suas
relações com a cultura, nas interações com o outro” (1996, p. 37).

Na linguagem se dão as relações sociais nas quais a criança nasce imersa,


e na surdez o modo e as possibilidades dessa imersão são cruciais, pois, conforme
o caso, é quase impossível o acesso à linguagem falada. Mostra-se necessária,
então, a incorporação de uma língua de sinais, de modo que se possa configurar
condições mais adequadas ao aumento das relações interpessoais, que formam o
funcionamento nas áreas cognitiva e afetiva.

Portanto, os problemas tradicionalmente apontados como


característicos da pessoa surda são produzidos por condições sociais.
Não há limitações cognitivas ou afetivas inerentes à surdez, tudo
dependendo das possibilidades oferecidas pelo grupo social para
seu desenvolvimento, em especial para a consolidação da linguagem
(GÓES, 1996, p. 38).

Segundo Vygotsky (1989), o surdo está mais adaptado fisicamente


que o cego para conhecer e participar da vida, pois conserva quase todas as
possibilidades de reações físicas da pessoa normal, com exceção de alguns
transtornos que o autor considera pouco significativos na esfera de sentido e
equilíbrio. O importante é que o surdo-mudo conserva a visão e, com isso, tem a
possibilidade de controle de seus movimentos.

67
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

Como un aparato de trabajo, como una máquina humana, el cuerpo


del sordomudo se diferencia un poco del cuerpo de una persona
normal y, por lo tanto, toda la plenitud de las posibilidades físicas, del
desarollo corporal, de la adquisición de los hábitos y habilidades de
trabajo se conservan para el sordo2 (VYGOTSKY,1989a, p. 65).

Dessa forma, o surdo tem acesso a todos os tipos de atividades laborais,


exceto às relacionadas diretamente ao som. Mas a educação do surdo com um
enfoque filantrópico acaba por reduzir o universo de trabalho, oferecendo
possibilidades simples e, por vezes, inúteis. A surdez é menos complicada que
a cegueira, pois é principalmente como um fenômeno visual que o mundo está
representado na consciência humana. O surdo não perde nenhum elemento
essencial do mundo. No entanto, a surdomudez dificulta o relacionamento com
as pessoas, pois provoca um afastamento do convívio social, ou seja, ao ficar
privado da fala, o surdo não participa da experiência social, ficando excluído da
comunicação geral. Para o autor, "a sordomudez es un defecto, por excelência,
social” (VYGOTSKY, 1989a, p. 66).

Portanto, a preocupação maior na educação do surdo é ensiná-lo a falar, e


isto é possível, uma vez que não há nenhum problema orgânico com os centros da
linguagem. “Deste modo, la mudez no es una afección orgánica, sino simplemente
un desarollo deficiente a causa de que el sordo no oye las palavras, y no puede
aprender a hablar” (1989a, p. 66).

Marchesi salienta que "o grau da perda auditiva é, possivelmente, a


dimensão que tem maior influência no desenvolvimento das crianças surdas,
não somente nas habilidades linguísticas, mas também nas cognitivas, sociais e
educacionais" (1995, p. 199).

O momento da perda auditiva tem clara repercussão sobre o


desenvolvimento na infância. Isto implica que, quanto mais idade, mais experiência
com o som e linguagem oral, maior a possibilidade de evolução linguística. A
etiologia da surdez é também um fator de variabilidade relacionado com a idade
da perda auditiva, possíveis distúrbios associados à reação emocional dos pais e
desenvolvimento intelectual.

O autor menciona as causas de base hereditária e as adquiridas e comenta


que há um consenso em se aceitar que é menor a probabilidade de um distúrbio
associado à surdez quando a origem é hereditária. Resultados de estudos
comprovam que “as crianças surdas profundas, cuja causa é hereditária, têm um
maior nível intelectual que os surdos com outro tipo de etiologia” (MARCHESI,
1995, p. 201).

Se desde o momento da detecção da surdez houver a possibilidade de


uma atenção educacional, há a garantia de um desenvolvimento satisfatório.
Para Marchesi, uma educação que inclua “a estimulação sensorial, as atividades
comunicativas e expressivas, o desenvolvimento simbólico, a participação dos

68
TÓPICO 3 | O INÍCIO DA APRENDIZAGEM PARA SURDOS

pais, a utilização dos resíduos auditivos da criança etc., favorece a supressão de


limitações que a perda auditiva acarreta” (1995, p. 210). E acrescenta ele:

Uma educação adaptada a suas possibilidades, que utilize diferentes


recursos comunicativos, que contribua para sua socialização, que seja
capaz de não colocar à margem, nem do mundo dos ouvintes nem
do mundo dos surdos, pode ter enormes repercussões favoráveis para
sua aprendizagem e sua educação (MARCHESI, 1995, p. 201).

Para o autor, é mais difícil se obter consequências favoráveis se a criança


tiver que adaptar-se a modelos educacionais criados pensando-se em crianças
ouvintes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Houve um período em que a educação dos surdos objetivava a superação


da surdez, através de técnicas e de outros recursos, negando a própria língua
e a própria cultura. Hoje, embora ainda de modo discreto, surgem tentativas
da comunidade surda, em conjunto com o sistema educacional, no sentido de
resgatar a sua identidade e os direitos sociais, buscando uma interação que lhes
possibilite participar da construção de sua história.

A esse respeito, Glat (1995) argumenta que no atual modelo educacional,


o que é enfatizado é a falha do meio em oferecer condições adequadas que
possam promover a aprendizagem e o desenvolvimento do indivíduo e não sua
deficiência intrínseca. Portanto, disponibilizar meios de superar as desvantagens
naturais proporciona ao indivíduo uma participação mais ativa na vida social e
comunitária.

Esse aspecto é extremamente importante, uma vez que a linguagem e a


fala são pontos-chave na percepção e no desenvolvimento cognitivo da criança. E,
como prevê Vygotsky (1984), um adulto não pode transmitir à criança a sua forma
de pensar, senão apresentar-lhe um significado que ela desenvolverá a partir das
particularidades estruturais e genéticas de seu pensamento.

Dessa forma, se for possibilitada ou respeitada a aquisição da primeira


língua, a língua de sinais, o surdo terá facilitado o seu desenvolvimento. É
indispensável, como lembra Góes (1997), que haja preocupação e cuidado com
a maneira pela qual os sinais são incorporados ao contexto educacional e não
somente com a eficácia comunicativa e o valor instrumental deles.

Ao tomarmos a premissa vygotskyana de que o “aprendizado humano


pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual as
crianças penetram na vida intelectual daqueles que as cercam” (1984, p. 99),
destacamos a linguagem como um dos principais meios através do qual ocorre o
domínio dos meios sociais, ou seja, o crescimento intelectual da criança.

69
UNIDADE 1 | PSICOLOGIA DA APRENDIZAGEM E OS APRENDIZES SURDOS

É na linguagem que se dão as relações sociais do indivíduo, e na surdez é


difícil ou impossível o acesso às formas de linguagem que dependam dos recursos
da audição; portanto, faz-se necessária a incorporação de uma linguagem que
configure condições adequadas ao aumento das relações interpessoais, que
proporcionam o desenvolvimento cognitivo e afetivo da criança surda, o que
não implica desconsiderar-se a oralização. Mas que não seja, no entanto, a única
filosofia considerada viável.

FONTE: RODRIGUERO, C. R. B. O desenvolvimento da linguagem e a educação do surdo.


Psicologia em Estudo. DPI/CCH/UEM. v. 5, n. 2, p. 99-116, 2000.

70
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico você aprendeu que:

• Pesquisas recentes forneceram uma melhor compreensão sobre os fatores que


afetam a língua e a aprendizagem entre crianças surdas e as maneiras pelas
quais os ambientes iniciais e as interações entre pais e filhos moldam seu
desenvolvimento.

• Os pais que recebem forte apoio da família e dos amigos, assim como dos
profissionais, são mais capazes de lidar com as demandas de ter uma criança
surda.

• Embora as crianças surdas e ouvintes tenham muitas das mesmas forças


externas agindo sobre elas e respondem mais ou menos da mesma maneira,
existem modos além de apenas ouvir os limiares e a modalidade da língua em
que elas são diferentes.

• A comunicação efetiva ou bem-sucedida entre pais e filhos é o melhor preditor


de sucesso em praticamente todas as áreas de desenvolvimento de crianças
surdas e ouvintes.

• A aquisição da língua é um desafio considerável para a grande maioria das


crianças surdas e a maioria tem pais e professores que não têm certeza de como
melhor ajudá-los a realizar essa façanha.

• Pais e irmãos (e até mesmo o pet da família) proporcionam aos bebês e crianças
pequenas as primeiras interações que apoiam a aprendizagem em áreas sociais,
linguísticas e cognitivas.

• Comportamentos naturais que os pais surdos usam nas interações com seus
filhos surdos têm sido chamados de parentalidade intuitiva.

• Os pais surdos usam o toque com mais frequência e eficácia do que os pais
ouvintes para obter e manter a atenção do filho surdo.

• Ao desenvolver as habilidades necessárias para ser um aprendiz visual,


esperamos que as crianças surdas consigam adquirir mais tempo de atenção ao
longo do tempo, mas não está claro o quanto essas habilidades se desenvolvem
naturalmente ou precisam ser ensinadas.

71
• A atenção das crianças ouvintes será atraída pelas coisas que elas ouvem ao
seu redor, a maior sensibilidade das crianças surdas aos estímulos periféricos
(por exemplo, movimento, mudanças no brilho) serve como um mecanismo
compensatório.

• Durante os primeiros estágios do desenvolvimento social, as mães e as crianças


desenvolvem maneiras de interagir umas com as outras por meio de uma
variedade de experiências compartilhadas.

• Para entender como os bebês surdos desenvolvem habilidades para interação


social, precisamos apenas observar as interações entre eles e seus pais durante
os primeiros meses de vida.

• Ouvir a fala das mães ouvintes antes do nascimento e logo depois dele pode ter
um papel nas interações sociais precoces, tornando a mãe “familiar” ao recém-
nascido.

• Nas primeiras relações entre bebês e seus pais, na verdade, sorrisos e toques
e toques ritmicamente padronizados parecem ser tão reconfortantes quanto
vozes familiares.

• Os bebês surdos e suas mães ouvintes simplesmente começam seus


relacionamentos interagindo de maneiras um pouco diferentes do que os bebês
ouvintes e suas mães.

• Embora não haja forte relação causal entre o apego materno-infantil e


o comportamento social posterior, as crianças que possuem melhores
relacionamentos e melhor comunicação com suas mães ou outros cuidadores
primários também tendem a ser aquelas que desenvolvem boas relações sociais
com seus pares e maior autoestima.

• Os pais ouvintes e seus filhos surdos estabelecem interações exatamente como


pais e filhos que compartilham o mesmo status auditivo.

• As crianças surdas jovens podem se comportar em relação aos colegas da


mesma maneira que os jovens ouvintes, mas sem um sistema de comunicação
compartilhada, elas podem não obter ou dar tantas pistas sociais precisas
quanto as crianças ouvintes.

• Pesquisas realizadas em locais de intervenção precoce mostraram que a


estabilidade das amizades entre crianças surdas pré-escolares é semelhante
àquela de crianças ouvintes.

• A vida emocional e acadêmica de crianças surdas jovens é reforçada por pais


que estão cientes de suas necessidades e buscam programas de intervenção e
educação para eles e seus filhos, incluindo instrução de comunicação.

72
• Neste momento, não há evidências que sugiram que haja algum benefício no
uso da língua falada sobre a língua de sinais, ou o contrário, no estabelecimento
de vínculos precoces entre pais e filhos.

• Crianças surdas e ouvintes progridem através de fases semelhantes de


comportamento lúdico, fases que parecem paralelas ao desenvolvimento da
linguagem e da língua.

• O brincar pode ser usado de forma estruturada para comunicar novos conceitos
ou relações entre os conceitos antigos, mas a brincadeira em si também
desempenha um papel inestimável no desenvolvimento de todas as crianças.

• As mães tendem a assumir as maiores responsabilidades emocionais e


cotidianas para as crianças surdas, como acontece com a maioria das crianças
com necessidades especiais na maioria das culturas; e elas às vezes se sentirão
sobrecarregadas.

• Normalmente, a língua desempenha um papel contínuo e crescente na interação


social precoce, tanto pela comunicação explícita quanto pela percepção das
relações entre comunicação e comportamentos dos cuidadores.

73
AUTOATIVIDADE

1 Qual é o melhor preditor de sucesso em praticamente todas as áreas de


desenvolvimento de crianças surdas e ouvintes?

2 Independentemente de as crianças surdas terem ou não aparelhos auditivos


ou implantes cocleares e se elas usam principalmente a língua de sinais
ou falada, é através de quais sentidos que os bebês surdos terão acesso ao
mundo da experiência?

3 As crianças surdas podem não estar em nenhuma desvantagem particular


porque não conseguem reconhecer as vozes de suas mães ao nascer. No
entanto, como descreveríamos as suas primeiras interações com suas mães?

74
UNIDADE 2

LINGUAGEM, COGNIÇÃO E
EMOÇÃO NOS APRENDIZES
SURDOS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• apresentar o processo de aquisição e desenvolvimento da língua para


aprendizes surdos e suas implicações na aprendizagem;

• introduzir questões atuais sobre o ensino e avaliação da língua para


aprendizes surdos;

• compreender os perfis cognitivos de alunos surdos e suas implicações


para a educação.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

TÓPICO 2 – ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

TÓPICO 3 – PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

75
76
UNIDADE 2
TÓPICO 1
DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

1 INTRODUÇÃO
Até este momento o leitor está bem ciente da nossa crença de que a
comunicação entre pais e filhos é uma base essencial para o desenvolvimento
linguístico, social e cognitivo. De fato, vimos que a aprendizagem nos sentidos
formal e informal depende, em grande parte, da comunicação interpessoal, pelo
menos se é para ser eficiente. Ao mesmo tempo, enfatizamos que comunicação e
linguagem não são exatamente a mesma coisa, mesmo em humanos (vamos supor
que isso é óbvio no caso de outros animais). Em última análise, é a linguagem, no
sentido lato, e a língua, no sentido estrito, que possibilita a aprendizagem eficiente
e o funcionamento interpessoal. No entanto, é claro que a aquisição de linguagem
e da língua é um dos maiores desafios para os alunos surdos. O desafio para a
aquisição de língua falada para uma criança surda ou com deficiência auditiva é
bastante evidente: é difícil aprender uma língua falada que você não pode ouvir ou
ouvir bem. Uma vez que uma criança surda tenha adquirido pelo menos o básico
da língua falada, ainda existe a luta constante para entender e ser entendido pelos
outros, porque é extremamente raro que um indivíduo surdo (mesmo aquele com
um implante coclear) ouça tão bem quanto uma pessoa ouvinte típica e a fala de
indivíduos surdos nem sempre são fáceis de entender (embora o implante coclear
precoce tenha melhorado isso drasticamente).

Em contraste com a língua falada, as línguas de sinais são relativamente


fáceis e diretas para as crianças surdas adquirirem, porque são 100% visíveis.
No entanto, é difícil para uma criança adquirir uma língua fluente se ela não for
usada fluentemente em casa. Com 95% das crianças surdas tendo pais ouvintes,
a língua de sinais raramente será a língua materna antes que a família tenha
uma criança surda. Posteriormente, embora muitos pais e irmãos aprendam esta
língua, raramente obterão a fluência que os pais ouvintes compartilham com seus
filhos ouvintes. Voltaremos a essa questão mais adiante neste tópico.

2 A LINGUAGEM
Uma das principais características que define humanos como humanos é a
linguagem. Várias espécies de animais têm intrincados sistemas de comunicação
(por exemplo, golfinhos, pássaros, abelhas), e alguns primatas são capazes de
usar comunicação simbólica, como gestos ou sinais simples. Em contraste, a

77
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

capacidade de adquirir sistemas complexos de sons ou formas de mãos, posturas


corporais e movimentos, e a capacidade de combiná-los em palavras ou sinais
ordenados, enunciados e histórias, é exclusivamente humana.

A linguagem, em princípio, é um sistema de blocos de construção sem


sentido (sons ou movimentos com as mãos) que são reunidos em unidades
significativas (morfemas: palavras e partes significativas das palavras), que,
através da aplicação de um conjunto finito de regras, podem ser combinados e
usados ​​em uma infinita variedade de enunciados. Esse caráter simbólico e gerativo
da linguagem, pode ser expresso quer pela modalidade auditivo-motora, pela
audição e fala (língua falada), quer pela modalidade visual-motora, pela visão
e sinais (língua de sinais). Independentemente da modalidade, todas as línguas
possuem os mesmos níveis distintos de organização, a mesma arquitetura básica,
por definição. De fato, foi seu reconhecimento de que a comunicação entre os
surdos (na atual Universidade de Gallaudet) tinha essas características que
primeiro indicaram a Stokoe (2005) que era uma língua verdadeira e não apenas
uma coleção de gestos.

A linguagem pode ser estudada em diferentes níveis. Trabalhando “de


baixo para cima” (bottom-up), o uso de sons da fala e sua combinação em sílabas e
palavras simples é chamado de fonologia. Fonética se refere à articulação real da
fala. Morfologia refere-se à combinação de palavras simples ou partes de palavras
em palavras mais complexas, incluindo processos como inflexão (“cavalo” + “s”
= “cavalos”), derivação (“in” + “definido” = “indefinido”), e composição (“auto”
+ “estima” = “autoestima”). A semântica abrange aspectos lexicais de linguagens,
como, por exemplo, o significado das palavras, tanto em termos de características
semânticas quanto em termos de características gramaticais. Combinar palavras
em frases ou enunciados aplicando regras (gramaticais) e restrições em regras é
o domínio da sintaxe. Finalmente, a pragmática implica regras com as quais os
enunciados podem ser usados ​​em contextos maiores, como narrativas e conversas.

As línguas diferem umas das outras nas estruturas formais específicas


que são usadas para expressar significado, nos significados que são realmente
expressos, e nas maneiras pelas quais a língua pode ser usada. Por exemplo,
com relação às propriedades formais, algumas línguas têm regras de ordem
de palavras relativamente rígidas e morfologia relativamente fraca, enquanto
outras são conhecidas por terem uma morfologia rica e uma ordem de palavras
relativamente livre. Qualquer combinação é suficiente para fornecer a geratividade
gramatical descrita anteriormente. Em contraste com idiomas como o inglês, o
holandês e o turco, os idiomas tonais, como o cantonês ou o chinês mandarim,
usam diferenças no tom para expressar diferenças de significado. O cantonês, por
exemplo, tem seis tons diferentes que aumentam, diminuem ou mantêm o tom do
som da fala, de modo que, em teoria, a mesma “palavra” pode ser pronunciada de
seis maneiras diferentes e ter seis significados diferentes (um verdadeiro desafio
para as crianças surdas chinesas). Em suma, os idiomas aderem a princípios gerais
de organização, mas diferem nas maneiras específicas como eles usam sons (ou
movimentos das mãos), regras e restrições para expressar o significado. Algumas

78
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

dessas diferenças são específicas da modalidade, por exemplo, a expressão


simultânea relativamente extensa de elementos linguísticos em línguas de sinais
em oposição à ênfase na ordenação sequencial em línguas faladas.

Diferenças em que significados são expressos e as regras que estruturam


o uso de enunciados originam-se da sociedade na qual uma língua é usada, sua
cultura específica e sua história. Assim, o português de Portugal e o português do
Brasil são um pouco diferentes. O que é o uso culto da língua em uma sociedade
pode estar quebrando regras pragmáticas ou sociais em outra (deixaremos os
leitores usarem sua imaginação). E o número de palavras que uma língua tem
para expressar conceitos, como “neve”, pode ser completamente diferente nas
línguas inuítes do norte do Canadá ou línguas faladas no sul da Europa ou da
América, simplesmente porque questões culturais e ambientais tornam a neve
um tema muito mais importante para os inuítes do que para os povos italianos,
espanhóis, portugueses ou brasileiros. Em outras palavras, isso não é algo
relacionado a ser inuíte ou brasileiro. Os esquiadores de cross-country (nórdicos)
portugueses têm muitas palavras diferentes para neve, correspondendo às ceras
de cores diferentes usadas em esquis em diferentes condições.

FIGURA 1 – INUÍTES POSANDO NA NEVE

FONTE: <https://cdn-images-1.medium.com/max/1200/1*GrcNKdzVXtsG_nz5J_5g4g.jpeg>.
Acesso em: 14 maio 2019.

Legenda: Foto de sete crianças Inuítes.

O mundo tem aproximadamente 6900 línguas faladas e 200 línguas de


sinais (LEWIS, 2009). Algumas são usadas ​​por um grande número de pessoas
(por exemplo, inglês, espanhol, mandarim, língua de sinais americana [ASL],
língua de sinais brasileira [LIBRAS]), outras por comunidades muito menores
(por exemplo, frísio, basco, Língua de Sinais Quebequense ou LSQ). Algumas
línguas não são mais usadas e são chamadas de mortas (como o latim), enquanto
outras foram revividas para uso comum nas últimas décadas (como o hebraico).
Os humanos têm usado a língua por muitos milhares de anos, mas a língua escrita
é uma invenção relativamente recente, tendo procedido do cuneiforme, dos povos
da Mesopotâmia, e dos hieróglifos, do antigo Egito, para os alfabetos romanos ou
árabes relativamente simples e eficientes. Ao contrário da crença popular, muitas

79
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

línguas não têm uma ortografia, então elas não são expressas no papel ou em uma
tela (computador). Esse é o caso não apenas das línguas de sinais, mas também
de muitos idiomas falados.

A função mais básica de todas as línguas é a comunicação. Isso pode


acontecer em conversas casuais entre pessoas sobre pessoas, objetos ou eventos no
passado, presente ou futuro. A comunicação também pode envolver muito mais
funções cognitivamente desafiadoras, como instrução na educação ou explicação
da natureza do amor. Os atos linguísticos, às vezes, ocorrem embutidos em
contextos ricos que exigem alocação relativamente baixa de recursos cognitivos
(por exemplo, dizendo a uma criança pequena para fechar uma porta, obviamente
aberta) ou em contextos reduzidos que a tornam cognitivamente desafiadora
(por exemplo, descrevendo a teoria da gramática universal para um estudante do
ensino médio). A linguagem que é abstrata ou que envolve contextos reduzidos
é tipicamente aprendida mais tarde na infância e adolescência, enquanto que a
linguagem envolvendo contextos bem definidos e referências concretas é muito
mais fácil e, portanto, é adquirida mais cedo na vida. Todavia, a importância da
língua não se restringe à comunicação. A língua também é uma característica
central de nossas identidades individuais e de grupo. Ela faz parte da cultura de
um povo. Embora tenham sido feitas tentativas para criar e implementar idiomas
falados universais (por exemplo, Esperanto) e línguas de sinais (por exemplo,
Gestuno), todas essas tentativas falharam, pelo menos em termos de seu uso real.
As pessoas simplesmente querem manter sua própria língua, porque é parte de
quem elas são.

3 LÍNGUAS DE SINAIS
As línguas de sinais não são idiomas universais, nem são inventadas.
Elas são, como as línguas faladas, línguas naturais, cultivadas e transmitidas em
comunidades de usuários do idioma. No caso das línguas de sinais, os núcleos
dessas comunidades são surdos (e muitas vezes Surdos) e seus parentes surdos
ou ouvintes. As línguas de sinais não são idiomas universais, essencialmente pela
mesma razão que não existem línguas naturais universais faladas. As línguas
são usadas e transmitidas de geração em geração em comunidades de pessoas
e estão intimamente ligadas às culturas dessas pessoas. As línguas constituem
uma das características mais importantes das identidades culturais e psicológicas
de vários povos. Esse processo de identificação cultural explica por que pessoas
surdas no Brasil usam LIBRAS, nos Estados Unidos usam ASL e surdos na França
usam a Língua Francesa de Sinais (LSF). Apenas para enfatizar que a LIBRAS
é diferente do português, observe que os surdos em Portugal usam a Língua
Gestual Portuguesa (LGP) que tem uma relação com a Língua Gestual Sueca e a
LIBRAS está mais próxima da LSF do que da LGP.

A arquitetura das línguas de sinais se assemelha a das línguas faladas.


Os níveis distintos de organização, vocabulário, fonologia (embora em forma
manual), morfologia, sintaxe e pragmática podem ser identificadas nas línguas de

80
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

sinais, assim como nas línguas faladas. A expressão formal dessa arquitetura pode
ser um pouco diferente, principalmente por causa de diferentes características da
modalidade visual-manual em comparação com a modalidade auditivo-motora.
Por exemplo, em comparação com as línguas faladas, o grau de organização
sequencial nas línguas de sinais é menor, mas a simultaneidade (transmissão de
múltiplos significados ao mesmo tempo) é muito maior. Esta última característica
é simplesmente porque, com as mãos e braços como articuladores dominantes,
é relativamente fácil expressar dois sinais ou partes de signos simultaneamente,
enquanto os articuladores da linguagem falada (principalmente os lábios e a
língua) limitam tais possibilidades (embora o volume, vocalizar e prosódia
podem gerar diferenças significativas).

Com relação à tipologia, a classificação das línguas de acordo com suas


características estruturais, as línguas de sinais são bem diferentes das línguas
faladas dominantes em países ocidentais como o alemão, o holandês, o francês,
o inglês, o espanhol ou o português. Já mencionamos que as línguas de sinais
geralmente exibem uma ordem de palavras relativamente livre e uma morfologia
rica. Elas também contêm uma estrutura linguística chamada classificadores ou
sinais polivalentes que são encontrados em alguns idiomas falados, como japonês
e tailandês. Os classificadores são morfemas que identificam características de
seus referentes. Línguas de sinais fazem isso usando configurações de mão
(handshapes) particulares que possuem significados que são determinados pelo
contexto. Na LIBRAS, os classificadores são formas que, substituindo o nome que
as precedem, pode vir junto ao verbo para classificar o sujeito ou o objeto que está
ligado à ação do verbo. Portanto os classificadores na LIBRAS são marcadores de
concordância de gênero: pessoa, animal, coisa.

81
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

FIGURA 2 – CONFIGURAÇÕES DE MÃO DA LIBRAS

FONTE: Felipe (2006, p. 28)

28] Legenda: Configurações de Mão da LIBRAS.

Na LIBRAS
IntroducMec_3_CORRECAO1.p65
28 existem dez tipos de classificadores.
17/3/2007,O
14:52classificar descritivo

(CL-D), o classificador que especifica (CL-ESP), o classificador de uma parte do


corpo (CL-PC), o classificador locativo (CL-L), o classificador semântico (CL-S), o
classificador instrumental (CL-I), o classificador do corpo (CL-C), o classificador
do plural (CL-P), o classificador de elemento (CL-E), e o classificador de nome

82
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

e número (CL-Nº). Classificadores tipicamente são descritos como indicando


localização, movimento, forma de movimento ou forma. Excelentes relatos da
estrutura de várias línguas de sinais podem ser encontrados em Valli e Lucas
(2000) e Sandler e Lillo-Martin (2006).

4 MULTIMODALIDADE E SISTEMAS DE SINAIS


Às vezes, o significado é expresso pela combinação de símbolos em duas
modalidades diferentes ao mesmo tempo. O uso de gestos naturais, simultâneos
ao discurso (cospeech), é um bom exemplo dessa multimodalidade (MCNEILL,
1996, 2005). As crianças usam gestos desde muito cedo, combinando-os com o
discurso e a língua falada. A função primária dos gestos nos estágios iniciais
da aquisição da língua, é permitir que as crianças se expressem quando ainda
são muito jovens para usar a língua falada em conversação, normalmente nos
primeiros 9 meses de vida. O uso de gestos na conversação interpessoal continua
ao longo da vida, no entanto, eles são usados ​​mesmo quando os indivíduos não
estão frente a frente (por exemplo, durante conversas telefônicas).

Gesticular na maioria das vezes acontece de maneira automática e


inconsciente. Ela beneficia não apenas a comunicação, mas também a aquisição e
o aprendizado da língua, a produção da língua e a compreensão da língua. Isso
se refere especificamente aos gestos que acompanham uma palavra, os chamados
gestos naturais simultâneos ao discurso ou cospeech. Por carregarem significado,
seja sozinho ou em combinação, como os morfemas, os gestos cospeech ajudam os
ouvintes a entender tanto o significado explícito das palavras do falante quanto
o contexto físico e emocional do falante. Esses gestos se somam à fluência da
expressão de um falante, influenciando positivamente a recordação de palavras e
frases pelo receptor (FEYEREISEN, 2006). Eles diminuem a carga de memória de
trabalho, mas somente se o gesto é simbólico e, portanto, significativo (WAGNER
COOK; YIP; GOLDIN-MEADOW, 2011).

Gestos simbólicos adicionam significado às palavras faladas, às vezes


criando uma sobreposição de significado e, assim, criando redundância
semântica, às vezes elaborando o significado e, às vezes, permanecendo sozinhos.
Em vários estudos, Marschark e seus colegas descobriram que crianças surdas
e ouvintes usavam todos esses tipos de gestos (MARSCHARK et al., 2005). Os
gestos geralmente podem apoiar a aprendizagem de idiomas, por exemplo,
com relação à prosódia em um segundo idioma, ou seja, os padrões rítmicos
específicos dos enunciados falados em um segundo idioma, são aprendidos mais
facilmente quando gestos são usados ​​para enfatizar as estruturas prosódicas,
como as questões de entonação ascendente (ou o levantamento ou abaixamento
das sobrancelhas para indicar diferentes tipos de interrogativas em LIBRAS e em
ASL). Aprender novas palavras em uma segunda língua também é apoiado por
gestos de cospeech (TELLIER, 2008), desde que essas novas palavras não sejam
foneticamente muito complexas, contendo sons de fala desconhecidos para a
própria língua nativa de alguém (KELLY; LEE, 2012).

83
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

Como a maioria dos gestos são ambíguos e derivam seu significado


da(s) palavra(s) que acompanham, o timing ou sincronia das palavras e gestos é
importante. O início de um gesto cospeech normalmente ocorre um pouco antes do
início da pronúncia da palavra. Se, no entanto, o gesto começar muito antes (um
terço de segundo ou mais) do que a palavra, o benefício do gesto de compreensão
é posto em perigo. Em outras palavras, a integração do significado da palavra e do
gesto é mais ideal se o tempo for síncrono (HABETS et al., 2011). Essa descoberta
é sustentada por observações de interações entre pais e filhos, nas quais palavras
e gestos estão intimamente ligados. Os gestos de mães ou outros cuidadores, em
comunicação precoce com bebês, ajudam crianças pequenas a atender a uma
pessoa ou objeto no momento em que uma palavra é falada, apoiando assim a
aquisição de novas palavras. A combinação de palavra e gesto resulta no que
é referido como redundância intersensorial, desde que estejam sincronizados,
ocorrendo próximos no tempo (BAHRICK; LICKLITER, 2000). Para crianças
menores de 2 anos de idade, em particular, gestos dêiticos (apontando) simples
parecem ser úteis no desenvolvimento da língua falada. Compreender palavras
faladas acompanhadas de gestos simbólicos é mais difícil e, portanto, leva mais
tempo, possivelmente porque leva algum tempo para as crianças poderem alocar
atenção e fazer as conexões entre uma palavra, um gesto simbólico e seu referente,
por exemplo, um objeto (PUCCINI; LISZKOWSKI, 2012).

Palavras e gestos de cospeech podem ser integrados de outras maneiras


que não em seu timing. O ambiente sonoro e o estado auditivo dos ouvintes, por
exemplo, podem desempenhar papéis importantes, pelo menos para adultos. Em
dois experimentos, Obermeier, Dolk e Gunter (2012), mostraram que a integração
de gestos e palavras na audição e em adultos com dificuldades auditivas pode
ocorrer mesmo se os sinais forem assíncronos. Em adultos ouvintes, essa integração
só acontece quando o ruído de fundo interfere na percepção auditiva. Obermeier,
Dolk e Gunter (2012), no entanto, descobriram que, presumivelmente, porque a
percepção auditiva em adultos com dificuldades auditivas é sempre dificultada
(por definição), elas integram palavras e gestos automaticamente, mesmo sob
condições assíncronas. Eles concluíram que os gestos são benéficos no combate
a condições comunicativas difíceis, independentemente de serem causadas
por fatores ambientais (ruído) ou pessoais (perda auditiva). Alternativamente,
um estudo recente usando fala degradada em combinação com sinais, em
apresentações para bebês ouvintes, sugeriu que o uso de sinais pode limitar a
capacidade de segmentar palavras em fala degradada (TING; BERGESON;
MIYAMOTO, 2012). Mais pesquisas são necessárias para determinar se essa
limitação resulta do sinal auditivo degradado ou se fatores como a sincronia
temporal são responsáveis pelo
​​ efeito.

De acordo com a hipótese dos sistemas integrados (KELLY; ÖZYÜREK;


MARIS, 2010), os gestos cospeech e palavras são elementos de um sistema integrado
na compreensão da língua (MCNEILL, 2005). Os gestos cospeech e as palavras
faladas são vistos como dois lados da moeda da mesma língua. Na compreensão
da língua, a palavra influencia o gesto e vice-versa, tornando a multimodalidade
importante tanto para a aquisição da língua quanto para o uso desta. Se a

84
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

expressão multimodal de símbolos demonstrou facilitar a aquisição da língua


em crianças ouvintes, ela tem ainda mais potencial para a aquisição de língua e
o uso dela por crianças e adultos surdos. Esse benefício deriva não apenas pela
visibilidade dos gestos cospeech, mas também pela possibilidade de combinar
palavras faladas com sinais manuais cospeech. Sinais assemelham-se a gestos, pois
ambos são símbolos produzidos manualmente, que devem ser percebidos pela
visão. Os sinais diferem dos gestos porque são parte de uma língua e têm uma
forma relativamente estável. Os gestos, por outro lado, não fazem parte de uma
língua, mas funcionam como uma espécie de suporte paralinguístico a uma língua
(MCNEILL, 1996). As formas de gestos variam muito, mas são semelhantes para
indivíduos surdos e ouvintes (MARSCHARK et al.,1987).

DICAS

Para aprofundar seus estudos sobre gestos, cospeech e a comunicação, leia o


artigo Aquisição dos gestos na comunicação pré-linguística: uma abordagem teórica de
Etelvina do Rosário Silva Lima e Anabela Cruz-Santos (2012). <http://www.scielo.br/pdf/rsbf/
v17n4/22.pdf>. Acesso em: 14 maio 2019.

A combinação de fala e sinais, por um lado, é um fenômeno natural,


resultante do fato de que, até certo ponto, é possível combinar sinais e língua
falada. Lucas e Valli (1992) sugeriram que os usuários surdos de língua de sinais
tendem a usar mais sinais baseados na língua falada oficial da comunidade
que pertencem (português no Brasil, por exemplo) em situações de contato
linguístico envolvendo pessoas ouvintes, embora esse “sinal de contato” seja
visto em praticamente todos as línguas de sinais. Contudo, a literatura sugere
que indivíduos surdos com níveis mais altos de educação parecem usar o sinal
de contato frequentemente entre si, mas é necessário realizar mais pesquisas
para determinar a validade dessas observações e a influência de outros fatores
contextuais e pessoais (por exemplo, contextos educacionais versus sociais). Em
qualquer caso, o sinal de contato geralmente envolve a combinação de sinais com
(partes de) palavras faladas e o uso da ordem de palavras do idioma falado. É um
sistema orientado por sinais, não uma língua, mas uma comunicação multimodal,
aderindo a características de processamento de informação visual e produção de
linguagem manual.

Por outro lado, existem sistemas de comunicação multimodais


propositadamente criados por educadores que, procuram apoiar formas de
linguagem faladas por meios visuais para melhorar o acesso à língua falada, para
auxiliar a compreensão, ou mesmo para aumentar a aquisição desta. Exemplos
desses sistemas incluem a combinação de fala e soletração com os dedos (o
chamado Método Rochester), a combinação da fala com gestos que desambiguam
a fala nos lábios (palavra complementada) e a combinação de fala e sinal usando

85
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

a estrutura gramatical da língua falada (comunicação simultânea ou fala apoiada


por sinais). Existem também sistemas variados que combinam fala e sinal de acordo
com regras diferentes. Esses sistemas diferem na medida em que representam as
propriedades lexicais e gramaticais da língua falada via sinais. Alguns sistemas
são estritos, projetados para representar os elementos de uma língua falada 100%
em componentes manuais. Eles codificam manualmente o português ou o inglês
integralmente, ou pelo menos essa é a intenção. Outros sistemas de sinais são
mais “naturais” e menos ligados a regras, às vezes chamados de sinais pidgin. Os
sinais em pidgin pretendem transmitir o conteúdo proposicional, o significado de
um enunciado falado em sinais, mas não todas as suas propriedades gramaticais.

Sistemas de comunicação multimodal e simultânea na educação de surdos


têm uma longa e controversa histórica. Nas últimas três ou quatro décadas, o uso
da comunicação simultânea (em oposição a sistemas com elementos gramaticais
criados artificialmente) tornou-se difundido. Embora o uso simultâneo da
linguagem falada, juntamente a sinais de línguas de sinais nativas, tenha sido
criticado por não ser uma língua real (JOHNSON; LIDDELL; ERTING, 1989;
MARMOR; PETTITO, 1979), o princípio de ampliar palavras faladas com
sinais não parece uma ideia tão ruim, dados os efeitos positivos dos gestos
cospeech. Pelo menos dentro dos ambientes educacionais, a pesquisa por várias
décadas mostrou consistentemente que os alunos surdos aprendem tanto com a
comunicação simultânea quanto com qualquer outra forma de instrução na sala
de aula (COKELY, 1990; MARSCHARK et al., 2005).

Infelizmente, a pesquisa fundamental sobre o processamento cognitivo


da fala e de sinais é escassa. Em um dos poucos estudos que abordaram essa
questão, Giezen (2011) estudou se o input bimodal influenciava negativamente
a percepção de fala aumentando a carga de memória de trabalho, uma hipótese
proposta por Bergeson, Pisoni e Davis (2005). Alternativamente, pode haver
um efeito positivo na carga de memória devido ao efeito de sinais redundantes
(BAHRICK; LICKLITER, 2000). O estudo de Giezen (2011) incluiu oito crianças
surdas holandesas com uma idade média de 6 anos e 11 meses no momento do
teste; todas tinham implantes cocleares com uma idade média de implantação de 1
ano e 10 meses. Três crianças participaram de programas escolares convencionais;
cinco foram para uma escola para surdos. Uma tarefa usando palavras familiares
e novas foi usada, mensurando o reconhecimento de palavras e a aprendizagem
de novas palavras. Algumas das palavras compunham pares mínimos, palavras
que soavam muito parecidas (e, portanto, eram mais difíceis de discriminar);
outros compunham pares distantes que não pareciam iguais. Os itens foram
apresentados em três condições: falada, via sinal e bimodal. Os resultados
indicaram que o input bimodal não interferiu negativamente no processamento
da fala das crianças com implantes cocleares, mas melhorou a percepção de pares
de palavras mínimos (KNOORS; MARSCHARK, 2012).

No entanto, esse efeito positivo ocorreu apenas em crianças que


frequentaram a escola para surdos, onde foram expostos ao input bimodal durante
um período prolongado. Giezen (2011) apontou que esses resultados devem ser

86
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

interpretados com cautela, dado o pequeno número de participantes, e mais


pesquisas são certamente necessárias. Contudo, os resultados são consistentes
com os efeitos positivos da comunicação simultânea nos estudos educacionais
mencionados anteriormente, e em trabalhos mais recentes sobre o uso de sinais
na formação de vocabulário através de palavras escritas para crianças com
surdez profunda (WAUTERS et al., 2001) e palavras faladas para crianças com
perdas auditivas moderadas a severas (MOLLINK; HERMANS; KNOORS, 2008).
Abordaremos o uso de sistemas de sinais no ensino de idiomas no próximo tópico
desta unidade.

DICAS

Para saber um pouco mais sobre o funcionamento desse processo cognitivo,


assista ao vídeo Conheça a memória de trabalho. Trabalho desenvolvido pela professora e
designer instrucional Amanda Costa. <https://vimeo.com/258286014>. Acesso em: 14 maio
2019.

5 O DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM
Nas últimas décadas, muito conhecimento foi reunido sobre os
mecanismos que possibilitam a aquisição relativamente rápida de uma
primeira língua pelas crianças. Na década de 1950, Skinner (1978), sugeriu
que as crianças adquirem a linguagem por meio do condicionamento
instrumental, um mecanismo geral de aprendizagem em pombos e ratos, assim
como humanos, em que a aprendizagem é amplamente governada por reforço
e punição, generalização e discriminação. Sua teoria do comportamento verbal
era que apenas imitando e associando rótulos verbais com coisas (e sendo
apropriadamente reforçado), as crianças aprendem a linguagem. Em contraste
com esse mecanismo “externo” de aprendizagem da linguagem, Chomsky (1959),
argumentou que a gramática era tão abstrata que, para aprender esse sistema
complexo governado por regras, as crianças precisam possuir um dispositivo de
aquisição de língua (DAL) específico, uma gramática universal inata, que lhes
permita aprender uma primeira língua ou língua nativa tão facilmente. O DAL
de Chomsky era necessário, dada a suposição de que o input da linguagem é tão
caótico, inconsistente e, muitas vezes, incorreto, que as crianças não poderiam
adquirir a língua apenas nessa base.

87
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

DICAS

Para aprofundar mais o seu conhecimento sobre a evolução das teorias


sobre a relação entre a língua e a cognição no constante à aquisição da linguística, leia o
texto Língua e Cognição: Antes e depois da revolução cognitiva de Letícia Maria Sicuro
Corrêa (2006). <http://www.leffa.pro.br/tela4/Textos/Textos/Anais/Textos_Em_Psicolin/
Artigos/L%C3%ADngua%20e%20cogni%C3%A7%C3%A3o_antes%20e%20depois%20da%20
revolu%C3%A7%C3%A3o%20cognitiva.pdf>. Acesso em: 14 maio 2019.

Outra razão para postular um dispositivo de aquisição de língua em


crianças é a visão de que a aquisição da língua é limitada apenas à espécie humana.
Pesquisa desde a década de 1960, no entanto, mostrou que alguns outros animais,
especificamente primatas, são capazes de aprender aspectos básicos da língua
(GARDNER; GARDNER, 1975). Além disso, uma investigação mais detalhada
mostrou que o input linguístico em ambientes infantis é muito mais estruturado
e voltado para suas capacidades de aprendizagem do que Chomsky e seus
seguidores jamais imaginaram. A aquisição de língua agora é cada vez mais
vista como um processo cognitivo que não requer um dispositivo ou módulo de
aquisição de língua inato específico e não depende apenas do input linguístico.
Em vez disso, a aquisição da língua resulta de uma série de processos cognitivos
competitivos operando em um ambiente que contém inputs suficientemente
ricos para crianças solucionadoras de problemas, a fim de extrair estrutura e
significado (sintaxe e semântica) da língua que as rodeia. Em termos mais formais,
a aquisição de língua é incorporada e situada em um contexto comunicativo que
permite que as crianças atribuam significado a símbolos e estruturas enquanto,
ao mesmo tempo, aprendem essas propriedades linguísticas. Esta teoria da
linguagem ou da língua emergente destina-se a explicar a aprendizagem de
primeira e segunda língua (MACWHINNEY, 2005), e se encaixa bem com a visão
ecológica da aprendizagem que delineamos anteriormente.

Segundo Tomasello (2005), a aquisição da linguagem é muito mais


interconectada com outros tipos de aprendizagem do que se pensava
anteriormente. Sua ênfase não era tanto nos aspectos formais da aprendizagem
de línguas, mas muito mais nas funções sociocognitivas, argumentando que os
aspectos formais da língua são um resultado do uso e não uma pré-condição
para sua aquisição, como Chomsky (1959) argumentou. Para Chomsky, as
teorias baseadas na teoria sustentam que a essência da língua é sua dimensão
simbólica, sendo a gramática derivativa. Em contraste com a gramática gerativa
e outras abordagens formais, nas abordagens baseadas no uso a dimensão
gramatical da linguagem é um produto de um conjunto de processos históricos
e ontogenéticos referenciados coletivamente como gramaticalização. Em sua
opinião, a aprendizagem das crianças é integrada a outras habilidades cognitivas
e sociocognitivas, como a leitura intencional ou a teoria da mente, a descoberta
de padrões ou a aprendizagem estatística. O fato de as crianças aprenderem a

88
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

compartilhar a atenção com outras pessoas; seguir sua atenção e comunicação;


dirigir a atenção dos outros para objetos, pessoas ou atividades; e aprender a
identificar ações intencionais de outras pessoas influencia profundamente a
aquisição de símbolos e estruturas linguísticas.

Na visão de Tomasello (2005), para a qual somos claramente solidários


na busca de compreender a aquisição da língua por crianças surdas, não há uma
distinção clara entre símbolos e estruturas, nem entre expressões mais gerais
e idiossincráticas. Todos eles precisam ser aprendidos pelos processos gerais
de aquisição que observamos anteriormente, como encontrar padrões e ler
intencionalmente. Nesse sentido, a teoria é tão “simples” quanto a de Skinner,
mas coloca os mecanismos primários de aquisição da língua na cognição (a
mente) e não em contingências comportamentais (o ambiente). Ainda não há
uma explicação teórica adequada do processo de aquisição da linguagem ou da
língua, mas Tomasello (2005) acha que sua teoria baseada no uso é a que mais se
aproxima, considerando a capacidade humana para a linguagem como:

uma conspiração de muitos processamentos cognitivos, cognitivos e


informacionais diferentes e habilidades de aprendizagem, algumas das
quais os seres humanos compartilham com outros primatas e algumas
das quais são produtos únicos da avaliação humana (TOMASELLO,
2005, p. 321).

No final, a aquisição e o uso da língua são atividades cognitivas,


intimamente relacionadas ao desenvolvimento e ao funcionamento do cérebro.
Regiões específicas do cérebro humano estão envolvidas no processamento da
linguagem, com o desempenho real do processamento dependente da estrutura e
do funcionamento dessas regiões e das conexões entre elas. Por um longo tempo,
o conhecimento sobre a relação entre cérebro e linguagem resultou do estudo da
patologia cerebral, por exemplo, em pessoas que sofreram acidentes vasculares
cerebrais (AVC), como acidentes vasculares cerebrais ou trauma cerebral de
acidentes ou guerra. Nesses estudos, mudanças no uso de linguagem após AVC
ou trauma foram relacionadas a estudos post mortem de tecido cerebral. Com
o advento das técnicas de imagem cerebral (KUHL, 2010), tornou-se possível
estudar a estrutura e o funcionamento do cérebro em tempo real em adultos
saudáveis e,
​​ cada vez mais, em crianças.

Tais estudos indicaram que algumas regiões cerebrais e algumas conexões


entre elas, que são importantes para o processamento da língua falada em
adultos, já são ativadas em bebês com apenas alguns dias de vida (DEHAENE;
DEHAENE-LAMBERTZ, 2009). Isso não quer dizer que o desenvolvimento do
cérebro relacionado à linguagem esteja terminado. Pelo contrário, tanto através
de processos biológicos em curso (natureza) e como consequência do input de
linguagem (ambiente), o cérebro continua a se desenvolver, tornando possível
o processamento mais efetivo de uma linguagem cada vez mais complexa
(KUHL; RIVERA-GAXIOLA, 2008). Nos primeiros estágios do desenvolvimento
do cérebro, o número de células cerebrais aumenta, assim como, ainda mais
importante, o número de conexões (sinapses e vias) entre as células e as regiões

89
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

do cérebro. O aumento da mielinização (isolamento) das fibras nervosas é


outro desenvolvimento importante, permitindo uma transmissão mais rápida
dos impulsos nervosos, assim como a especialização progressiva (incluindo
a lateralização) de partes do cérebro para funções cognitivas específicas. Nos
estágios posteriores, o número de conexões entre as células do cérebro diminui
como consequência de um processo chamado de poda sináptica, que leva a um
uso mais efetivo do cérebro durante o processamento da linguagem e outras
tarefas.

Em grande medida, o desenvolvimento e funcionamento do cérebro é


semelhante, independentemente da modalidade da língua. Adquirir e usar uma
língua de sinais envolve as mesmas regiões cerebrais principais da língua falada
(para uma visão abrangente da pesquisa sobre o processamento da língua de sinais
no cérebro, ver Emmorey (2002). As diferenças observadas como consequência
da modalidade da língua estão principalmente relacionadas ao envolvimento do
córtex temporal e do córtex visual. O primeiro é ativado durante o processamento
de língua auditiva em indivíduos ouvintes, mas geralmente não em pessoas
profundamente surdas – a menos que usem implantes cocleares (KRAL;
SHARMA, 2011). Nos surdos usuários da língua de sinais, essa região é usada no
processamento visual da língua de sinais, embora esse processamento também
envolva a ativação do córtex occipital, especializada em lidar com o input visual.
Adquirir e usar uma segunda língua envolve principalmente as mesmas áreas do
cérebro que adquirir e usar a língua nativa da pessoa. Embora existam indícios
de que os estágios iniciais da segunda ou a aprendizagem posterior de línguas
estrangeiras envolvam predominantemente o hemisfério direito (XIANG, 2012),
a obtenção de proficiência substancial nessa segunda língua acaba resultando na
ativação dominante do hemisfério esquerdo.

A capacidade de adquirir uma língua nativa é limitada no tempo.


Gradualmente, a competência para adquirir uma primeira língua diminui,
especialmente se uma sintaxe complexa estiver envolvida (MAYBERRY, 2010).
Outros domínios da língua, como o vocabulário, parecem mais flexíveis ao
longo do tempo. A aquisição da língua ocorre normalmente em crianças que não
apresentam sintomas de comprometimento neurológico e que recebem um input
linguístico rico e consistente, começando preferencialmente desde o nascimento
– na verdade, no caso da língua falada, no 2º ou 3º meses finais da gravidez
(DECASPER; FIFER, 1980; MOON; LAGERCRANTZ; KUHL, 2012) –, mas
definitivamente não mais tarde do que o 2º ano de idade. Vários estudos mostram
que problemas com a qualidade ou o acesso ao input de linguagem em língua
falada ou de sinais durante os primeiros 2 anos de vida, provavelmente, levarão
a lacunas permanentes na proficiência da língua que não podem ser totalmente
superadas mais tarde na vida (MARKMAN et al., 2011). Isso não deve significar
que os atrasos no input de linguagem impedem totalmente a aquisição da língua,
mas os problemas resultantes com a compreensão e produção de estruturas
gramaticais afetam a alfabetização, a aprendizagem acadêmica e a conquista do
sucesso pessoal na sociedade.

90
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

Como indicado anteriormente, as crianças não adquirem uma língua


completamente a partir da interação e da comunicação apenas. Aspectos
específicos do vocabulário e da gramática e o uso da língua para a alfabetização
normalmente têm que ser aprendidos na escola através do ensino explícito de
línguas. Ser capaz de ler e escrever também contribui para o desenvolvimento da
linguagem, porque a leitura e a escrita aumentam o vocabulário e o conhecimento
da sintaxe complexa em crianças e adolescentes (veja o Tópico 1 da Unidade
3). Os fundamentos básicos da língua nativa são normalmente adquiridos,
predominantemente, através da interação pais-filhos em casa, mas o ensino da
língua e da alfabetização são necessários para apoiar as habilidades de ordem
superior.

Nem todas as crianças ouvintes adquiriram os aspectos básicos da


primeira língua antes de entrar na escola. Há uma variação considerável no ritmo
de aquisição da língua e no sucesso final entre os indivíduos (BERMAN, 2004).
Tanto para crianças ouvintes quanto para surdas leva vários anos para completar
os estágios mais avançados da aquisição da língua. Portanto, as crianças surdas
claramente não são o único grupo de crianças que tem que aprender pelo menos
alguns aspectos básicos da língua durante os primeiros anos da escola. Essa
situação é muito mais comum entre crianças surdas do que ouvintes, no entanto,
criando dificuldades para professores de alunos surdos que acham que precisam
estar ensinando a língua em vários níveis diferentes ao mesmo tempo em que
tentam ensinar o conteúdo da disciplina.

DICAS

Para saber mais sobre a aquisição da Língua de Sinais, assista ao vídeo Aquisição
de Língua de Sinais desenvolvido pelo departamento de Letras (LIBRAS) da Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC). <https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/104231>.
Acesso em: 14 maio 2019.

6 AQUISIÇÃO DO BILINGUISMO E APRENDIZAGEM DE


LÍNGUA ESTRANGEIRA
Viver em um mundo cada vez mais global exige que muitas pessoas se
tornem proficientes e se comuniquem em mais de um idioma. Muitas vezes, uma
segunda ou terceira língua estão sendo aprendidas mais tarde na vida, como
uma criança mais velha, adolescente ou adulto. Esta aprendizagem da segunda
língua ou de línguas estrangeiras, é realizada com maior frequência através do
ensino formal de línguas na escola. No entanto, também há muitas crianças que
adquirem duas ou mais línguas desde o nascimento ou muito cedo na vida, às
vezes por causa de uma escolha explícita feita pelos pais, mas na maioria das vezes

91
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

porque são criadas em situações em que ser multilíngue é apenas um fato da vida,
portanto, a norma. Tornar-se multilíngue quando a criança não é problemática,
embora certas circunstâncias sejam mais conducentes do que outras.

Para a maioria das crianças, a aquisição da linguagem começa em casa.


Lá elas adquirem os aspectos básicos de uma língua. Essas habilidades básicas
de comunicação interpessoal são um aspecto muito perceptível da proficiência
linguística, tipicamente adquirida em situações em que a aquisição é apoiada
por inúmeras pistas contextuais diversas. É a língua que está sendo usada aqui
e agora, envolvendo pessoas e objetos que estão presentes. Essa língua e as
situações em que é utilizada são caracterizadas por baixos desafios cognitivos.
Tanto a riqueza do contexto quanto os desafios cognitivos reduzidos contribuem
para o ritmo acelerado com que esses aspectos básicos da língua são adquiridos.
Mais importante para o sucesso acadêmico final é a língua avançada tipicamente
aprendida na escola, levando à proficiência em linguagem cognitivo-acadêmica.
Essa forma mais avançada da língua é usada em situações em que a informação
contextual é escassa e as demandas cognitivas são altas e, consequentemente, leva
mais tempo para ser adquirida. Na educação, as tarefas de linguagem podem ser
estruturadas de acordo com a quantidade de informação contextual presente e
as demandas cognitivas que são necessárias. Na educação bilíngue, isso tem que
ser feito em duas línguas, para que o indivíduo se torne proficiente em ambas
(MAYER; AKAMATSU, 2011).

Às vezes, acredita-se que adquirir duas ou mais línguas é algo que só


pode ser alcançado com sucesso por crianças muito brilhantes, mas essa visão é
sustentada principalmente por pessoas que vivem em países que são basicamente
monolíngues. De fato, muitas, se não a maioria das crianças do mundo, são
bilíngues, e elas realmente lucram em vários níveis ao adquirir mais de um idioma.
Aprender uma segunda língua depois de dominar uma primeira pode ser mais
fácil, mas não em todos os aspectos e não em todas as condições. A transferência
de habilidades da língua é limitada principalmente à proficiência em linguagem
cognitivo-acadêmica e somente quando requisitos específicos são atendidos.
Cummins (1981, p. 29) descreveu isso em sua hipótese de interdependência:
“Na medida em que a instrução em L1 é eficaz em alcançar proficiência em L1, a
transferência dessa proficiência para L2 pode ocorrer, desde que haja um input
adequado de L2 e a pessoa estiver motivada a aprender L2”. Esta posição implica
que a transferência só ocorrerá se as crianças forem proficientes em sua primeira
língua, mas também precisam receber uma contribuição adequada na segunda
língua e estar motivadas a aprender essa língua.

Crescer como bilíngue leva a vantagens nos domínios cognitivos, assim


como na linguagem, mas o impacto cognitivo não é positivo em todos os aspectos.
Por exemplo, o bilinguismo aumenta o funcionamento executivo, incluindo
atenção, inibição e alternância entre tarefas e memória de trabalho, mas afeta
negativamente a recuperação de informações codificadas linguisticamente de
longo prazo, memória semântica (BIALYSTOK; CRAIK, 2010). Nada disso parece
afetar o cronograma geral do desenvolvimento da linguagem, já que crianças

92
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

monolíngues e bilíngues parecem alcançar os marcos críticos do desenvolvimento


da linguagem na mesma proporção (KOVACS; MEHLER, 2009; PETITTO et al.,
2001). Isso não quer dizer que a proficiência linguística nas duas línguas seja
a mesma; pode variar de maneiras relacionadas ao domínio específico em que
uma língua é usada. Os bilíngues que adquirem duas línguas faladas (bilíngues
unimodais), por exemplo, exibem menor proficiência formal em linguagem do
que os aprendizes monolíngues, resultando em vocabulários menores em cada
idioma separado. São os vocabulários menores que tornam o acesso a itens
no léxico mental da memória de longo prazo um pouco mais lento. Por outro
lado, os bilíngues demonstram uma consciência metalinguística melhorada em
comparação aos aprendizes monolíngues (CROMDAL, 1999), pelo menos entre
os indivíduos ouvintes (MORRISON et al., 2013).

Em resumo, crescer com mais de um idioma tem claramente algumas


vantagens distintas, mas também algumas desvantagens. Quando se trata de
proficiência linguística, um aprendiz bilíngue não é simplesmente o mesmo
que dois aprendizes monolíngues em um único cérebro. Por essa razão, as
comparações entre as habilidades de leitura dos alunos surdos usuários de língua
de sinais e as mesmas habilidades dos alunos ouvintes podem não ser apropriadas
(SINGLETON et al., 2004).

Na vida real, conhecer mais de um idioma geralmente é uma consequência


simples do mundo em que vivemos. A necessidade de os indivíduos conhecerem
vários idiomas só aumentará. Há uma necessidade definitiva de criar condições
educacionais que facilitem esse processo, tanto para os alunos surdos quanto
para os ouvintes, em vez de prejudicá-lo.

DICAS

Assista ao vídeo Educação Bilíngue e Cultura Surda, material produzido pela


UNIVESP para o curso de Pedagogia. Material fundamental para o início dos trabalhos e
aprendizagens sobre a cultura surda e Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). <https://www.
youtube.com/watch?v=-jgB_juQFqM>. Acesso em: 14 maio 2019.

7 AQUISIÇÃO DE LÍNGUA FALADA POR CRIANÇAS


SURDAS
Observamos, anteriormente, que o período anterior ao início da educação
formal na escola é o mais importante para adquirir o básico de uma língua nativa.
Para ser capaz de adquirir uma língua, uma criança precisa ter acesso ao input
nesse idioma, a barreira crítica para a aquisição da língua falada para crianças
surdas. Assim, a identificação e intervenção precoces precisam estar em vigor se

93
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

uma criança com perda auditiva significativa for adquirir a língua falada. De fato,
um dos principais focos de muitos programas de intervenção precoce é melhorar o
acesso à língua falada e manter ou estabelecer bons padrões de comunicação entre
pais e filhos. Em todas essas áreas, muito progresso foi feito nas últimas décadas.

Em muitos países ocidentais, a introdução da triagem auditiva neonatal


universal, levou ao diagnóstico de surdez severa em crianças entre o nascimento e
os 3 meses de idade. A partir desse momento, a intervenção precoce pode começar e
há uma forte associação entre intervenção precoce e melhor proficiência na língua
(YOSHINAGA-ITANO; SEDEY, 2000). A amplificação através de alto-falantes em
berços e mais tarde através de aparelhos auditivos é destinada a estabelecer pelo
menos algum acesso à fala e outros sons. Tais intervenções podem ser benéficas
para crianças pequenas com limiares auditivos de até 90 decibéis (dB), embora o
grau em que elas levam à aquisição da língua falada seja muito variável.

Como vimos no Tópico 2 da Unidade 1, os aparelhos auditivos digitais


fizeram uma diferença considerável na capacidade das crianças surdas de acessar
a linguagem falada, porque elas são programadas de modo a corresponder ao
padrão de perda auditiva neurossensorial que a criança apresenta. Crianças com
perda auditiva profunda, em contraste, muitas vezes não lucram o suficiente com
a amplificação sonora, pelo menos não para aquisição da língua. A perda auditiva
neurossensorial dessas crianças geralmente decorre da disfunção da cóclea. Em
particular, as células ciliadas na cóclea estão totalmente ou parcialmente ausentes
ou não funcionam adequadamente. Pesquisadores já mostraram pela primeira
vez que é possível regenerar células ciliadas em mamíferos, resultando em algum
ganho auditivo (MIZUTARI et al., 2013), mas investigações similares envolvendo
seres humanos ainda estão muito distantes.

No Tópico 2 da Unidade 1, descrevemos como o implante coclear


geralmente contorna a cóclea disfuncional, transmitindo sons por estimulação
elétrica direta do nervo acústico (WALTZMAN; ROLAND, 2006). O sucesso do
implante coclear em fornecer acesso suficiente à fala para posterior aquisição
da língua falada depende de vários fatores, incluindo a profundidade na qual
o fio do eletrodo pode ser inserido (afetando quantas frequências podem ser
comunicadas ao nervo auditivo), a idade da criança na implantação e capacidades
cognitivas e apoio dos pais, incluindo a qualidade da interação pai-filho. Os
melhores resultados são obtidos quando há inserção completa de todos os
eletrodos, quando a criança recebe o implante antes dos 2 anos de idade e não tem
incapacidades adicionais, e quando há uma relação pai-filho sensível e responsiva,
resultando em um input de linguagem de alta qualidade (MARKMAN et al.,
2011). Implantes bilaterais podem levar a melhores resultados Markman et al.
(2011) também apontaram a importância da educação materna e do background
socioeconômico. Ou seja, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, a taxa de
desenvolvimento de língua falada em crianças surdas, com implantes cocleares,
é muito maior quando são de famílias relativamente ricas em comparação com
crianças de famílias relativamente pobres, uma descoberta que já vimos também
é verdade para crianças ouvintes (HART; RISLEY, 1995).

94
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

Nem todas as crianças surdas crescem em circunstâncias em que intervenções


precoces, aparelhos auditivos digitais e implantes cocleares estão prontamente
disponíveis, mesmo em países desenvolvidos. Se a perda auditiva de uma criança
for detectada relativamente tarde ou se a criança não usar um implante ou aparelhos
auditivos, o acesso à língua falada será diminuído ou ausente. A criança, então, tem
que adquirir a língua falada apenas por meios visuais, através da leitura de fala
possivelmente complementada por sinais, soletração com os dedos e através de
formas escritas de linguagem. Embora a aquisição relativamente bem-sucedida não
seja totalmente impossível nesta situação, a probabilidade de proficiência na língua
falada é menor do que para crianças que obtiveram implantes ou efetivamente usam
aparelhos auditivos digitais desde muito cedo.

Grande parte das pesquisas atuais, envolvendo o desenvolvimento da


língua em crianças surdas, concentra-se em crianças surdas com perdas auditivas
severas a profundas, frequentemente com implantes cocleares. Muito menos
se sabe sobre a aquisição de língua em crianças surdas com menores perdas
auditivas. Comentários de Moeller et al. (2007) e Lederberg, Schick e Spencer
(2013) são úteis para tirar algumas conclusões gerais, por exemplo, mesmo as
crianças surdas que recebem intervenção e os implantes cocleares no início,
tipicamente experimentam atrasos no desenvolvimento da língua falada, e a
proficiência apropriada à idade não é frequentemente atingida. Blamey et al.
(2001) relataram que as crianças surdas, geralmente, mostram uma taxa média
de desenvolvimento da língua falada de 55% daquela observada em crianças
ouvintes, mas a taxa vem melhorando rapidamente. Svirsky, Teoh e Neuburger
(2004), por exemplo, relataram taxas de aquisição de língua em pelo menos
algumas crianças com implantes que correspondiam à taxa de crianças ouvintes.
Fatores que podem retardar essa taxa são a intervenção precoce que começa mais
tarde, habilidades de leitura da fala relativamente ruins, menos tempo gasto em
atividades de leitura e comprometimento ou distúrbio específico de linguagem
(DEL). O DEL é um distúrbio neurobiológico do desenvolvimento, pelo menos
até certo ponto geneticamente determinado, que impede o processamento da
linguagem e, portanto, a aquisição da língua. Esse distúrbio ocorre em 3% a 7%
das crianças ouvintes. Sabendo que algumas etiologias de perda auditiva (por
exemplo, meningite, citomegalovírus) podem resultar em distúrbios neurológicos
adicionais, parece provável que a prevalência de DEL em crianças surdas deva
ser relativamente alta. Dados exatos estão faltando, mas descobertas iniciais de
pesquisas realizadas no Reino Unido sugeriram, no entanto, que a prevalência
pode não ser maior do que entre crianças ouvintes (MARSHALL et al., 2013).

DICAS

Para saber mais sobre o Distúrbio Específico de Linguagem (DEL), leia o artigo
Distúrbio Específico de Linguagem: a relevância do diagnóstico inicial de Crestani et al.
(2013). Na íntegra em: http://www.scielo.br/pdf/rcefac/2012nahead/188-11.pdf.

95
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

Cada vez mais, parte da grande variação nas habilidades de língua falada
de crianças surdas, independentemente de terem ou não implantes cocleares, tem
sido atribuída a habilidades de processamento cognitivo, como funcionamento
executivo, memória de trabalho e habilidades motoras finas (CONWAY et al.,
2011). Ao contrário da crença popular, o desenvolvimento da linguagem falada
em crianças surdas geralmente não está associado ao grau de perda auditiva.
Crianças moderadamente surdas à severamente surdas não adquirem a língua
falada mais rapidamente do que crianças profundamente surdas. A quantidade
de perda auditiva parece, no entanto, desempenhar um papel na percepção da
fala, onde a visão (leitura orofacial) e a proficiência na língua, assim como a
audição, são extremamente importantes. Em comparação com crianças surdas
com perdas auditivas moderadas a graves ou crianças surdas com implantes, as
crianças surdas com aparelhos auditivos têm de ser mais proficientes na língua
falada para alcançar níveis semelhantes de percepção da fala.

Atrasos na proficiência na língua falada são refletidos em todos os domínios


da linguagem, mas principalmente na morfologia e sintaxe. Nas fases iniciais
do desenvolvimento da linguagem, quando o balbucio e outras vocalizações
repetitivas são comuns, não há muita diferença entre crianças surdas e ouvintes,
mas isso muda com o tempo (MARSCHARK, 2007). Em comparação com a maioria
das crianças ouvintes, a aquisição da fonologia expressiva começa mais tarde em
crianças surdas, e a obtenção de um inventário fonético completo é relativamente
rara. No entanto, a ordem de aquisição dos fonemas é mais ou menos a mesma em
crianças surdas e ouvintes, com a ordem largamente determinada pela frequência
de ocorrência, intensidade acústica e, para crianças surdas, visibilidade.

As crianças surdas tendem a ter vocabulários menores do que as crianças


ouvintes: menos palavras, menos significados de palavras, mas também
significados de palavra menos relacionados refletidos, por exemplo, em menor
conhecimento de categorias e exemplares e relações de superordenados e
subordinados menos desenvolvidas (MARSCHARK et al., 2004). A aprendizagem
de palavras é reduzida em muitas crianças surdas, levando a um desenvolvimento
de vocabulário atrasado e geralmente menos bem-sucedido (LEDERBERG;
PREZBINDOWSKI; SPENCER, 2000). O acesso melhorado e mais precoce ao input
de línguas faladas facilitou o desenvolvimento do vocabulário em muitas crianças
surdas, mas Sarchet et al. (2014) descobriram que a defasagem no conhecimento
do vocabulário em relação aos alunos ouvintes continua, pelo menos, até a idade
universitária em estudantes com e sem implantes cocleares.

Em contraste com a fonologia e o vocabulário, os problemas das crianças


surdas com a morfologia da língua falada não são simplesmente uma questão
de atraso. A ordem de adquirir vários morfemas parece diferir, particularmente,
entre os morfemas ligados, aqueles ligados às palavras como resultado da inflexão
ou derivação (por exemplo, o morfema que indica plural / -s /. Dificuldades na
aquisição, são em grande parte, devido a esses morfemas ligados não serem muito
salientes acusticamente, recebendo menos estresse do que outros morfemas
quando falados. Além disso, muitos desses morfemas ocorrem em formas de
palavras relativamente pouco frequentes.
96
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

Em holandês falado, por exemplo, o tempo passado pode ser formado


adicionando-se o morfema / -te / ou / -de / ao radical de um verbo regular.
Alternativamente, o pretérito pode ser criado por uma mudança de vogal no
radical de verbos irregulares. Esses verbos irregulares são muito mais frequentes
que os regulares em holandês falado casual, então, os problemas vistos na
aquisição de morfemas ligados por crianças surdas holandesas, com implantes
cocleares, podem ser o resultado de uma combinação de baixa saliência perceptiva
e frequência limitada de input (HAMMER, 2010). O padrão de desenvolvimento
da sintaxe da língua falada em crianças surdas também difere do padrão
observado em crianças ouvintes. A extensão dos enunciados (extensão média
do enunciado ou EME) cresce mais lentamente; a compreensão e a produção de
enunciados mais complexos gramaticalmente, aqueles com cláusulas relativas,
sentenças passivas e assim por diante, são postergados; e a ordem de adquirir
estruturas gramaticais é um pouco diferente.

Assim como no desenvolvimento da língua de sinais, o desenvolvimento


da língua falada mostra evidências de um período crítico em que o input acessível
de linguagem precisa estar disponível para obter proficiência normal em um
idioma. Pesquisas recentes sobre os efeitos dos implantes cocleares mostraram
que o período ideal para melhorar o acesso por meio do implante é entre o
nascimento e os 2 anos de idade. Algumas crianças que receberam o implante
entre as idades de 2 e 4 anos fazem progressos consideráveis ​​no desenvolvimento
da língua falada, desde que recebam um forte apoio dos pais. O implante coclear
após os 2 anos de idade está tipicamente associado a atrasos no desenvolvimento
da língua falada e o implante após os quatro anos quase sempre está associado a
estes atrasos (NIPARKO et al., 2009).

8 AQUISIÇÃO DA LÍNGUA DE SINAIS POR CRIANÇAS


SURDAS
O processo de aquisição da língua de sinais é, notavelmente, similar à
aquisição da língua falada, desde que as crianças recebam uma linguagem rica e
apropriada desde cedo. Essa condição, no entanto, não é facilmente satisfeita na
maioria dos casos, porque a grande maioria das crianças surdas tem pais ouvintes
que não são proficientes na língua de sinais (se é que sabem alguma coisa). Se os
pais decidirem criar o filho com uma língua de sinais, terão que aprender. Como
isso leva tempo, alguns pais levam surdos usuários da língua de sinais nativos
ou outros modelos de língua de sinais para o lar (MOHAY et al., 1998) e para a
educação de seus filhos surdos. Mesmo assim, o ambiente linguístico da língua
de sinais raramente corresponde ao de crianças surdas com pais surdos usuários
da língua, porque a aquisição proficiente da língua de sinais depende tanto da
idade do input da língua de sinais quanto da subsequente qualidade desse input,
uma questão que expandiremos mais adiante neste tópico.

97
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

A aquisição nativa da língua de sinais ocorre apenas quando crianças


surdas ou ouvintes crescem em famílias usuárias de uma língua de sinais com
membros surdos. Estas são relativamente escassas. Famílias com pais surdos e
avós surdos, isto é, com múltiplas gerações de usuários de língua de sinais, são
ainda mais raros. No entanto, há algumas excelentes descrições da aquisição
nativa de línguas de sinais (SCHICK; MARSCHARK; ​​SPENCER, 2006). O seguinte
é largamente baseado em visões gerais do desenvolvimento de uma língua de
sinais fornecido por Schick (2011) e Lederberg, Schick e Spencer (2013).

Como um precursor do desenvolvimento fonológico, as crianças surdas


balbuciam manualmente, assim como as crianças ouvintes balbuciam vocalmente.
Assim como suas contrapartes faladas, os balbucios manuais são rítmicos e
organizados na forma de sílabas, compartilhando propriedades formacionais com
línguas de sinais adultas, como a forma da mão, a localização da mão e o movimento
da mão. O início dos balbucios manuais é entre os 6 e os 14 meses de idade, com
formas manuais simples e mais tarde seguidas por formas mais complexas. Esse
mesmo padrão de desenvolvimento é visto em relação à localização e movimento
das mãos. Também como na aquisição da língua falada, os erros articulatórios
ocorrem nas produções iniciais de crianças surdas, tipicamente substituindo
formas mais complexas por mais fáceis. Os movimentos, por exemplo, são afetados
por fatores motores, linguísticos e perceptivos, incluindo as capacidades motoras
grossas e finas da criança e a saliência perceptual, por exemplo, a proximidade
com a face (ou seja, a probabilidade de estar na visão central).

DICAS

Para aprofundar seu conhecimento sobre a aquisição de línguas de sinais


por crianças surdas leia o artigo Aspectos da Aquisição de Línguas de Sinais por Crianças
Surdas de Lodenir B. Karnopp (2011), no link: https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/
handle/10183/143213/000946898.pdf?sequence=1.

Os primeiros léxicos de crianças nativas na língua de sinais assemelham-


se aos de falantes nativos em termos de conteúdo. Diferenças estão relacionadas
a diferenças na estrutura gramatical, por exemplo, a alta frequência relativa de
verbos e outros predicados em vocabulários de sinais. Há alguma evidência de
que os primeiros sinais são produzidos um mês ou dois antes das primeiras
palavras (sinais tipicamente entre 8 e 10 meses de idade), possivelmente devido
à maturação mais rápida das habilidades motoras grossas (por exemplo, dos
braços) do que das habilidades motoras finas (por exemplo, dos lábios, laringe).
Essa vantagem não dura muito, entretanto, e não há indicações de que essa
ligeira vantagem desenvolvimental leve a benefícios na aquisição posterior da
linguagem (ABRAHAMSEN; CAVALLO; MCCLUER, 1985).

98
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

Para crianças surdas e ouvintes, gestos como agarrar, alcançar e apontar


ocorrem entre 6 e 10 meses de idade. Para crianças surdas, eles frequentemente
se desenvolvem em combinações gesto-sinal, um dos primeiros exemplos de
desenvolvimento sintático. Um marco nesse desenvolvimento é a ocorrência de
combinações de pontos e sinais lexicais em aproximadamente 12 meses, seguidos
por combinações de dois sinais lexicais em torno de 16 a 18 meses de idade. Embora
a forma de gestos de apontar e pronomes em línguas de sinais seja a mesma, a
aquisição do sistema de pronomes na língua de sinais não é um fenômeno inicial
(ao menos em algumas línguas de sinais). A aquisição da interação entre forma e
função nos pronomes leva tempo e resulta em erros semelhantes aos encontrados
também no desenvolvimento da língua falada (por exemplo, erros de reversão
pronominal, “você” para “eu”). Ao mesmo tempo, a ordem de sinalização em
línguas de sinais geralmente parece ser sujeito-verbo-objeto, assim como em
português ou inglês, mas as línguas de sinais permitem mais flexibilidade na
ordem de sinalização do que idiomas falados como português, inglês, alemão,
holandês ou francês. A ordem de sinais bastante flexível nas expressões da
língua de sinais reflete influências pragmáticas, como a ordenação em tópico e
comentário e o uso do espaço.

A aquisição de concordância verbal ou direcionalidade é um marco típico


no desenvolvimento morfológico de uma criança que adquire a língua de sinais.
Ao contrário das línguas faladas, a concordância verbal na língua de sinais envolve
marcações (espaciais) em classes específicas de verbos, modificando onde ou
como os sinais são feitos, usando localizações reais ou abstratas no espaço. Sinais
ou gestos no espaço real podem ser usados ​​para se referir a pessoas ou objetos
fisicamente presentes ou, em um sentido mais abstrato, serem “colocados” ali
pelo usuário de língua de sinais. A concordância verbal interage com o sistema
pronominal e se desenvolve cedo em crianças surdas nativas na língua de sinais,
normalmente em torno de 24 a 30 meses de idade. Inicialmente, é limitada a
verbos específicos, generalizando posteriormente para vários verbos e classes
verbais. Num primeiro momento, a concordância acontece com as referências
presentes. Embora as crianças entendam a referência abstrata (isto é, referência a
pessoas ou objetos que não estão fisicamente presentes) aos 3 anos, a incorporação
de tal referência na concordância verbal tem que esperar até os 5 anos. Verbos
marcadores para dois argumentos parece ser mais difícil para as crianças, e assim,
também, é um desenvolvimento posterior, do que marcadores de um argumento.
Os classificadores também representam uma aquisição complexa para a criança
surda jovem, e o domínio normalmente não ocorre antes dos 8 ou 9 anos de idade.

Embora tenhamos feito alusão a isso apenas uma ou duas vezes, parte
da morfologia das línguas de sinais é expressa na face. A expressão facial
pode incluir marcadores para funções sintáticas, como negações, formas de
perguntas diferentes e condicionais. As crianças surdas usam expressões faciais
bem cedo, muitas vezes expressando emoções. Expressões faciais também são
usadas em combinação com sinais. No início, as funções sintáticas são expressas
principalmente através do uso de sinais. Marcadores faciais e outros não-manuais

99
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

(por exemplo, mudanças no corpo) podem acompanhar esses sinais lexicais,


mas a integração total de expressões lexicais e não manuais tipicamente é um
desenvolvimento posterior na aquisição da língua de sinais.

Outro desenvolvimento relativamente tardio é o domínio da sintaxe


complexa, que se baseia na interação entre morfologia espacial e sintaxe, no nível
da sentença, e no nível superior do discurso. A sintaxe complexa no discurso de
sinais exige que as crianças mantenham referências espaciais ao longo do tempo,
algo que não apenas explora a proficiência linguística, mas também a memória de
trabalho. Nesse contexto, é importante lembrar que, para a maioria das crianças
surdas, a maior parte de seu input de língua de sinais vem de famílias que não são
proficientes nessa língua. Dada a nossa ênfase na importância de um ambiente
rico e fluente na língua, não deveria ser surpreendente que muitas crianças
surdas sofram atrasos significativos na proficiência em língua de sinais, atrasos
mais visíveis na morfologia, sintaxe e discurso da língua de sinais (SINGLETON;
NEWPORT, 2004). Teoricamente, em alguns domínios mais flexíveis, como a
aquisição de vocabulário, tais atrasos podem ser superados se o input se tornar
ótimo. Na prática, isso é bem difícil. A morfologia e a sintaxe complexa são
muito mais vulneráveis ​​a deficiências de input do que o vocabulário, e atrasos
nessas áreas, provavelmente, não serão superados completamente após os 3
anos de idade. Atrasos nesses domínios também influenciarão negativamente a
aprendizagem de uma segunda língua pela criança surda.

Por que o input parental menos otimizado da língua de sinais influencia


negativamente a proficiência em língua de sinais em crianças surdas? Muitas
crianças ouvintes de imigrantes ouvintes, que não usam sua nova língua nacional
em casa, podem se tornar fluentes nessa língua. Então, aprender esta língua
nacional é a aprendizagem de uma segunda língua para crianças ouvintes de
imigrantes ouvintes, com base na proficiência em primeira língua adquirida
em casa, enquanto que para crianças surdas é, pelo menos em parte, aquisição
da primeira língua. Além disso, como vimos no Tópico 2 da Unidade 1, muitos
pais tentam primeiro que seu filho surdo se torne “oral”, isto é, adquira a língua
falada em vez da língua de sinais. Como resultado, muitas vezes, é apenas após
as crianças surdas terem sido malsucedidas em adquirir a língua falada que seus
pais consideram a alternativa da língua de sinais, e a pesquisa mostrou claramente
que as crianças que aprendem a língua de sinais mais tarde, muitas vezes, não
conseguem fluência completa em sua língua nacional de sinais (MAYBERRY,
2010).

Mesmo supondo que uma criança se torne relativamente fluente na


língua de sinais, o número limitado de outros indivíduos no mundo da criança
que são fluentes, pode criar desafios para o crescimento social e cognitivo, bem
como para funcionar em contextos educacionais. Outro desafio para uma criança
surda que aprende uma língua de sinais, embora aparentemente não tenha sido
abordada pela pesquisa, reside no fato de que, todas as línguas de sinais que
conhecemos têm muito menos sinais do que suas respectivas línguas faladas têm
palavras. É verdade que tudo o que pode ser produzido em um idioma pode ser

100
TÓPICO 1 | DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM

produzido em outro, e isso vale para idiomas de sinais e falados. No entanto,


com um menor vocabulário lexicalizado (aceito), a comunicação será claramente
diferente de maneiras que parecem influenciar o desenvolvimento da linguagem
e o desenvolvimento cognitivo.

Quão sérias são essas questões mencionadas na realidade? Atrasos na


competência gramatical provavelmente não influenciarão a capacidade de
um indivíduo de participar de conversas cotidianas em língua de sinais com
pares surdos, embora haja alguns relatos de que, durante essas conversas, mal-
entendidos podem ocorrer devido à enorme variação nas habilidades de língua
de sinais entre usuários não nativos (EDMONDSON, 1983). De maior importância
a longo prazo é a falta de proficiência em gramática complexa, particularmente
exigida no uso de linguagem cognitiva e acadêmica. A linguagem acadêmica em
si mesma, quanto ao que ela trata, é cognitivamente desafiadora, e é provável que
ocorra em sala de aula apenas com suporte contextual limitado. Isso geralmente
ocorre no Ensino Médio e Superior. Para entender a língua de sinais de professores
ou intérpretes explicando tópicos acadêmicos, os problemas em compreender
a gramática complexa inevitavelmente dificultarão a compreensão e, assim, a
aprendizagem.

Atrasos na aquisição da língua de sinais nem sempre resultam do input


limitado ou tardio da língua de sinais. Em alguns casos, a língua de sinais de
crianças surdas mostra evidências de DEL (WOLL; MORGAN, 2012). Avaliar
DEL em crianças surdas usuárias de língua de sinais é difícil, em parte porque
a diferenciação entre atrasos na proficiência em língua de sinais resultante de
input ou de problemas de processamento é muito difícil. No entanto, existem
algumas iniciativas promissoras, resultando em instrumentos de avaliação que
contribuem para a detecção do DEL em crianças surdas usuárias de língua de
sinais. O uso de uma tarefa de repetição não linear como marcador é um exemplo
(MANN; MARSHALL, 2010), mas são necessárias mais pesquisas, incluindo o
uso de técnicas de imageamento cerebral.

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma, o processo de aquisição da língua de sinais assemelha-se ao da
aquisição da língua falada na importância do input precoce e fluente da língua e
do curso principal do desenvolvimento (os marcos linguísticos). Há, no entanto,
diferenças sutis no processo e no curso, principalmente devido a diferenças de
modalidade, como a extensão em que a iconicidade do sinal é explorada (ORMEL
et al., 2009). As diferenças na aquisição da língua de sinais tornam-se evidentes na
educação de surdos, tanto em ambientes comuns como em ambientes separados
para alunos surdos, onde encontramos dois grupos de estudantes usuários de
línguas de sinais. Um grupo parece entrar na escola com proficiência em língua
de sinais relativamente apropriada à idade, usuários nativos com pais surdos
(WOOLFE et al., 2010). Esse grupo é uma pequena minoria, no entanto. A grande
maioria das crianças surdas usuárias de língua de sinais entrará na escola

101
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

com atrasos variados nas habilidades desta língua, comparáveis ​​aos atrasos
observados em seu idioma falado. Essas crianças precisam de uma programação
intensiva de língua de sinais no início de sua vida acadêmica, não muito diferente
da programação intensiva de língua falada, necessária para as crianças surdas
que se comunicarão principalmente nessa modalidade.

O conhecimento da língua de sinais ajuda os professores a compreender


as avaliações da proficiência em língua de sinais, a planejar metas para as lições
desta língua que sejam adequadas ao desenvolvimento, a estruturar programas
de reabilitação de língua de sinais, se necessário, a encaminhar uma criança para
terapia de língua de sinais (tal como a terapia da fala) em casos de DEL. Nesse
ponto, deve ficar óbvio que os professores em programas de língua de sinais
ou bilíngues precisam ser fluentes na língua de instrução. A história recente, no
entanto, indica que isso não é fácil de realizar. Passamos, portanto, a considerar
as avaliações de linguagem e sua relevância para o ensino e a aprendizagem.

102
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• A linguagem, em princípio, é um sistema de blocos de construção sem


sentido (sons ou movimentos com as mãos) que são reunidos em unidades
significativas (morfemas: palavras e partes significativas das palavras), que,
através da aplicação de um conjunto finito de regras, podem ser combinados e
usados em
​​ uma infinita variedade de enunciados.

• O mundo tem aproximadamente 6900 línguas faladas e 200 línguas de sinais.

• A função mais básica de todas as línguas é a comunicação.

• As línguas de sinais não são idiomas universais, nem são inventadas. Elas
são, como as línguas faladas, línguas naturais, cultivadas e transmitidas em
comunidades de usuários do idioma.

• Os níveis distintos de organização, vocabulário, fonologia (embora em forma


manual), morfologia, sintaxe e pragmática podem ser identificadas nas línguas
de sinais, assim como nas línguas faladas.

• Às vezes, o significado é expresso pela combinação de símbolos em duas


modalidades diferentes ao mesmo tempo.

• Gestos simbólicos adicionam significado às palavras faladas, às vezes criando


uma sobreposição de significado e, assim, criando redundância semântica, às
vezes elaborando o significado e, às vezes, permanecendo sozinhos.

• Palavras e gestos de cospeech podem ser integrados de outras maneiras que não
em seu timing.

• A combinação de fala e sinais, por um lado, é um fenômeno natural, resultante


do fato de que, até certo ponto, é possível combinar sinais e língua falada.

• Existem sistemas de comunicação multimodais propositadamente criados


por educadores que procuram apoiar formas de linguagem faladas por meios
visuais para melhorar o acesso à língua falada, para auxiliar a compreensão, ou
mesmo para aumentar a aquisição desta.

• Nas últimas décadas, muito conhecimento foi reunido sobre os mecanismos


que possibilitam a aquisição relativamente rápida de uma primeira língua
pelas crianças.

103
• A aquisição de língua, agora, é cada vez mais vista como um processo
cognitivo que não requer um dispositivo ou módulo de aquisição de língua
inato específico e não depende apenas do input linguístico.

• A aquisição da linguagem é muito mais interconectada com outros tipos de


aprendizagem do que se pensava anteriormente.

• Algumas regiões cerebrais e algumas conexões entre elas que são importantes
para o processamento da língua falada em adultos já são ativadas em bebês
com apenas alguns dias de vida.

• Gradualmente, a competência para adquirir uma primeira língua diminui,


especialmente se uma sintaxe complexa estiver envolvida.

• Os fundamentos básicos da língua nativa são normalmente adquiridos


predominantemente através da interação pais-filhos em casa, mas o ensino da
língua e da alfabetização são necessários para apoiar as habilidades de ordem
superior.

• Aprender uma segunda língua depois de dominar uma primeira, pode ser
mais fácil, mas não em todos os aspectos e não em todas as condições.

• Crescer como bilíngue leva a vantagens nos domínios cognitivos, assim como
na linguagem, mas o impacto cognitivo não é positivo em todos os aspectos.

• As comparações entre as habilidades de leitura dos alunos surdos usuários de


língua de sinais e as mesmas habilidades dos alunos ouvintes podem não ser
apropriadas.

• A identificação e intervenção precoces precisam estar em vigor se uma criança


com perda auditiva significativa for adquirir a língua falada.

• A probabilidade de proficiência na língua falada é menor do que para crianças


que obtiveram implantes ou efetivamente usam aparelhos auditivos digitais
desde muito cedo.

• Atrasos na proficiência na língua falada são refletidos em todos os domínios da


linguagem, mas principalmente na morfologia e sintaxe.

• Assim como no desenvolvimento da língua de sinais, o desenvolvimento da


língua falada mostra evidências de um período crítico em que o input acessível
de linguagem precisa estar disponível para obter proficiência normal em um
idioma.

• A aquisição nativa da língua de sinais ocorre apenas quando crianças surdas ou


ouvintes crescem em famílias usuárias de uma língua de sinais com membros
surdos.

104
• Como um precursor do desenvolvimento fonológico, as crianças surdas
balbuciam manualmente, assim como as crianças ouvintes balbuciam
vocalmente.

• Os primeiros léxicos de crianças nativas na língua de sinais assemelham-se aos


de falantes nativos em termos de conteúdo.

• A aquisição de concordância verbal ou direcionalidade é um marco típico no


desenvolvimento morfológico de uma criança que adquire a língua de sinais.

• Parte da morfologia das línguas de sinais é expressa na face.

• Atrasos na aquisição da língua de sinais nem sempre resultam do input


limitado ou tardio da língua de sinais.

105
AUTOATIVIDADE

1 A importância da língua não se restringe à comunicação. Em que outro


aspecto ela é importante para o ser humano?

2 Qual é a função primária dos gestos nos estágios iniciais da aquisição da


língua?

3 Por que o timing ou sincronia das palavras e gestos é importante?

4 Crescer com mais de um idioma tem claramente algumas vantagens


distintas, mas também algumas desvantagens. Quais seriam as
desvantagens?

106
UNIDADE 2 TÓPICO 2
ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

1 INTRODUÇÃO
Quando crianças surdas entram na escola pela primeira vez, aos 3 anos de
idade em alguns países, muitas delas, se não a maioria delas, apresentam atrasos
no desenvolvimento da linguagem em comparação com pares ouvintes (se usam
língua falada) e pares surdos com pais surdos (se eles usam língua de sinais). À
primeira vista, as razões para essa situação parecem bastante óbvias. No primeiro
caso, as crianças que não podem ouvir claramente, terão dificuldade em aprender
uma língua que depende das ondas sonoras produzidas pela fala e “projetadas”
para serem recebidas por ouvidos totalmente funcionais. No segundo caso, as
crianças normalmente aprendem sua primeira língua através da imersão total em
uma comunidade que a utiliza, e elas terão dificuldade em aprender uma língua
se ela não for usada regularmente por aqueles ao seu redor. Em consonância com
a nossa discussão no tópico anterior, um resultado prático desta situação é que,
além de ensinar a linguagem necessária para alcançar a proficiência cognitivo-
acadêmica, os professores de crianças surdas, muitas vezes, têm de fornecer
apoio para a aquisição de habilidades de comunicação interpessoais básicas, uma
tarefa que normalmente não é necessária com crianças ouvintes (exceto talvez no
caso de imigrantes recentes).

Se as origens da língua difusa atrapalham as crianças surdas, é apenas


porque simplificamos a situação para os presentes propósitos. Os tópicos
posteriores destacarão os fatores em jogo além dos dois descritos anteriormente.
Em particular, os fundamentos cognitivos e sociais do desenvolvimento típico
da linguagem podem estar ausentes, ou pelo menos podem ser diferentes, nos
primeiros ambientes de crianças com perdas auditivas significativas. A falta
de informação disponível para os novos pais de uma criança surda, ou os pais
sendo sobrecarregados com informações conflitantes, torna a situação ainda
mais difícil. A programação da intervenção precoce (Tópico 2 da Unidade 1),
destinada tanto aos pais quanto às crianças surdas, certamente ajuda. Já vimos
que, as crianças cujas perdas auditivas são identificadas precocemente e recebem
serviços de intervenção nos primeiros 6 meses de vida, são mais propensas a
ter níveis de linguagem na faixa “normal”, independentemente de estarem
usando comunicação falada ou de sinais (YOSHINAGA-ITANO; SEDEY, 2000).
No entanto, a maioria deles se enquadra na faixa “normal baixa” e os atrasos
persistem nos anos escolares (YOSHINAGA-ITANO, 2006). Para entender essa
situação complexa, e talvez ver algumas maneiras possíveis de sair disso como
resultado de um ensino apropriado, consideremos as diversas questões associadas
à aprendizagem de línguas e ao ensino de idiomas para crianças surdas.

107
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

2 AQUISIÇÃO DE LÍNGUAS EM CASA E APRENDIZAGEM


DE LÍNGUAS NA ESCOLA
Facilmente, o tópico que levou à maior controvérsia na educação de surdos
por mais de 200 anos é a maneira como as crianças surdas deveriam aprender a
língua. É como se a educação fosse toda sobre a tomada de decisão pelos pais
e educadores em relação ao uso da linguagem das crianças surdas em vez de
descobrir como as crianças surdas aprendem a língua, a verdadeira questão que
deve nos interessar. Desentendimentos incluem se deve ou não utilizar sinais,
seja através de uma língua de sinais natural ou fala apoiada por sinais; se deve ou
não complementar o input da língua auditiva com a fala visual através da leitura
orofacial; e, em menor escala, o equilíbrio entre a aquisição da língua natural
e a instrução formal da língua. Como exemplo da última questão, na Holanda,
nos anos 50, Van Uden introduziu o método materno-reflexivo de aprendizagem
de línguas para crianças surdas. Nessa abordagem didática, o ensino de línguas
foi modelado após o processo normal de interação entre pais e filhos, imitando
tanto quanto possível as condições "naturais" de aprendizagem da língua. O
suporte visual da língua falada através da leitura orofacial e da língua escrita foi
promovido, enquanto o uso da língua de sinais foi fortemente desencorajado.
Durante os anos 1960 e 1970, vários países escandinavos adotaram o modelo
bilíngue muito diferente na educação de surdos. Após o reconhecimento do
status linguístico das línguas de sinais (STOKOE, 2005), as abordagens bilíngues
à linguagem para crianças surdas enfatizaram o uso precoce da língua de
sinais, com a língua falada sendo vista como uma segunda língua introduzida
principalmente na forma escrita e através da instrução formal da língua.

FIGURA 3 – VAN UDEN (1912-2008) E SUA OBRA

FONTE: <https://images-na.ssl-images-amazon.com/images/I/51hpXsUEniL._SX331_
BO1,204,203,200_.jpg>. Acesso em: 14 maio 2019.

Legenda: Van Uden (1912-2008) e sua obra.

108
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

O advento dos aparelhos auditivos digitais e do implante coclear e a


melhora da audição para muitas crianças surdas criaram um interesse renovado em
abordagens “orais” para educar crianças surdas, enfatizando novamente a língua
falada, mas (frequentemente) com uma maior sensibilidade à ampla variação
nos resultados potenciais. Como Marschark e Spencer (2006) descreveram, o
ensino ou remediação de habilidades de língua falada pode variar de métodos
unisensoriais (por exemplo, acupédico, auditivo-verbal), no qual a ênfase é quase
inteiramente no desenvolvimento de audição residual para apoiar habilidades
de escuta, para programas bilíngues nos quais a língua falada é frequentemente
apoiada em sessões específicas e tipicamente limitadas no tempo (LYNAS,
1999). Dentro desse continuum estão várias abordagens à programação da língua
falada, incluindo uma ênfase na leitura orofacial e vários sistemas de sinais nos
quais os sinais são modificados ou criados para permitir que eles sejam usados​​
relativamente simultaneamente à língua falada, dentro do padrão temporal mais
fechado possível.

A introdução e o uso de novas alternativas no continuum da fala ao sinal


quase sempre foram acompanhados por debates filosóficos e retórica ferozes,
geralmente à custa de pesquisa empírica objetiva. Como resultado, embora recursos
e esforços consideráveis ​​tenham sido dedicados a defender e supostamente
avaliar a eficácia relativa de métodos individuais, tem havido pouco progresso
teórico ou prático para justificar o custo em termos de despesas e impacto na
vida das crianças (ERIKS-BROPHY, 2004). Nenhum método “nivelou o campo de
jogo” para os alunos surdos, permitindo-lhes alcançar a proficiência em línguas
em níveis semelhantes aos dos pares ouvintes (KNOORS; MARSCHARK, 2012).
A realidade é que um método para todos os alunos surdos não se encaixa em
nenhum deles.

É certo que algumas pessoas questionam a viabilidade de crianças surdas


e ouvintes demonstrarem níveis comparáveis ​​de habilidade de linguagem,
devido ao fato de que as condições prévias para aquisição de língua em
crianças surdas muitas vezes são menos que ideais (por exemplo, problemas
de aprendizagem relacionados à perda auditiva sindrômica ou não sindrômica,
deficiências múltiplas ou oportunidades de aprendizagem de línguas perdidas
devido à identificação tardia). Isso não quer dizer que não devamos lutar pela
aquisição ideal da língua por crianças surdas, apenas que talvez as expectativas
e preferências pela língua falada versus língua de sinais precisem ser expressas
em termos práticos. Do ponto de vista das crianças e adolescentes surdos que
precisam adquirir uma língua, no entanto, os debates sobre a modalidade da
linguagem parecem sem sentido e potencialmente prejudiciais. Como Hauser e
Marschark (2008, p. 450) afirmam:

nossa conveniente divisão entre indivíduos que usam a língua falada


e aqueles que usam a língua de sinais é, em grande parte, uma ficção.
Independentemente do estado auditivo de seus pais, seus limiares
auditivos e suas colocações educacionais, a maioria dos alunos
surdos é exposta a ambas as modalidades de língua. Os alunos com
dificuldades de audição estão em situação semelhante.

109
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

Esquecendo os argumentos filosóficos sobre a modalidade da língua no


momento, como podemos promover a aprendizagem de línguas na escola, com
base na língua que já foi adquirida em casa? Em geral, existem três possibilidades.
Primeiro, podemos aumentar a disponibilidade de língua acessível para que
ela possa ser adquirida mais ou menos naturalmente, mesmo que tardiamente.
Em segundo lugar, podemos incentivar a interação em sala de aula facilitando
a língua, levando novamente à aquisição tardia, mas relativamente natural.
Terceiro, podemos ensinar diretamente a língua. Qualquer que seja o caminho
que escolhamos, sabemos que a janela de oportunidade, para pelo menos
alguns aspectos da aprendizagem de línguas (especialmente a gramática), não
é indefinida. A remediação é, portanto, consideravelmente limitada, mas a porta
é deixada aberta para ensinar habilidades de compensação. Na prática, várias
combinações de todas essas três abordagens de sala de aula são usadas na maioria
das situações, o equilíbrio entre elas depende das necessidades de língua dos
alunos surdos individuais e das habilidades e recursos dos professores. Idealmente,
ambos devem ser monitorados e o equilíbrio deve ser reavaliado continuamente
com modificações baseadas no progresso das crianças. O ensino de idiomas para
alunos surdos é, portanto, em grande medida, um ensino diagnóstico.

3 AVALIAÇÃO DA PROFICIÊNCIA LINGUÍSTICA


Ensinar a língua aos alunos surdos é um empreendimento complexo,
especialmente para um professor em sala de aula (em oposição a um especialista
em línguas). Já vimos que as diferenças individuais entre as crianças surdas são
muito grandes, e o desenvolvimento da proficiência em língua é muito menos
previsível do que em crianças ouvintes. Para concentrar o ensino nos pontos fortes
e fracos dos alunos surdos, precisamos nos envolver no ensino diagnóstico de
língua. O ensino diagnóstico é uma forma de ensino em que há constante interação
entre avaliação de habilidades e progresso e planejamento de programas, tanto em
nível individual quanto em nível de sala de aula. Nessa perspectiva, o objetivo da
avaliação é a orientação. A avaliação também pode servir a outras metas. Às vezes,
os mesmos instrumentos podem fornecer informações para vários objetivos, mas,
dada a diversidade de alunos surdos, isso nem sempre é o caso. Pelo contrário,
essa heterogeneidade cria desafios significativos para professores, psicólogos,
fonoaudiólogos e audiologistas. Decisões devem ser tomadas em relação a que
tipo de avaliação atende melhor às metas de avaliação e que tipo de instrumento
deve ser selecionado, indivíduo por indivíduo (JAMIESON; SIMMONS, 2011).

Ao selecionar um instrumento de avaliação da língua, existem vários tipos


para escolher. Uma primeira distinção útil é entre avaliações formais e informais.
Na avaliação formal, o teste, a tarefa e o procedimento são claramente prescritos.
Partir de procedimentos de testes padronizados pode dificultar seriamente a
interpretação dos dados e a validade e confiabilidade gerais do teste. Ou seja,
no caso de testes padronizados, normalmente haverá uma base de pesquisa
que demonstrou que o construto mede o que deve medir (validade) e o faz de
maneira confiável – que resultados semelhantes são obtidos, não importa quem

110
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

é o avaliador, desde que o procedimento padrão seja seguido com precisão. Para
fazer comparações de resultados possíveis, tais testes têm normas baseadas em
um grande grupo de referência.

As avaliações informais da língua são muito mais orientadas para o
processo do que as avaliações formais. Embora possam envolver procedimentos
padrão, elas não envolvem testes em si. O uso individual da língua é avaliado no
contexto (JAMIESON; SIMMONS, 2011). Exemplos típicos de avaliação informal
são o uso de observações, listas de verificação, tarefas de elicitação e “avaliação
dinâmica”, uma combinação de avaliação e treinamento individual.

Outra distinção útil na avaliação da língua é entre procedimentos de


avaliação independentes do currículo e procedimentos vinculados ao currículo.
Nesse último, quer-se saber quanto um aluno aprendeu de um currículo ou método
específico. Avaliações relevantes geralmente são feitas em dois ou mais pontos no
tempo, geralmente, um no início do ensino do currículo, outro, algum tempo
depois, e talvez mais em intervalos regulares (por exemplo, mensalmente). Com
esse tipo de avaliação, pode-se medir o progresso de um aluno em comparação
com o desempenho que outros (na mesma ou em outra subpopulação) tiveram
na mesma sala de aula. Instrumentos de avaliação independentes do currículo,
em contraste, tornam possível avaliar habilidades gerais ou proficiência em
estudantes. No entanto, ao contrário das avaliações dependentes do currículo,
a interpretação do progresso não pode estar diretamente ligada ao currículo
específico fornecido.

Se um professor quiser ter uma visão completa da competência linguística


e do desempenho linguístico dos alunos na sala de aula, todos os domínios da
língua de instrução devem ser avaliados, não só o vocabulário (avaliado com
maior frequência), mas também a fonologia, morfologia, sintaxe, e pragmática
bem como compreensão e produção de forma mais ampla. Idealmente, isso inclui
testes formais e o que é chamado de amostragem de línguas. Na amostragem de
línguas, a comunicação entre os usuários do idioma é gravada, transcrita e analisada
para obter uma imagem do idioma usado em conversas reais. Nos testes formais,
a avaliação ocorre em condições mais semelhantes a laboratórios, fornecendo,
talvez, um espectro mais amplo da língua que um aluno possa compreender ou
produzir, mas não dando muita informação sobre a probabilidade ou capacidade
de usar essa língua na vida cotidiana. A amostragem de línguas, portanto, pode
fornecer uma visão abrangente da produção da língua, mas oferece muito menos
informações sobre a compreensão desta.

A escolha sobre o tipo de avaliação e a técnica ou instrumento de avaliação


específico que um professor ou outro avaliador deseja usar deve depender,
principalmente, do objetivo da avaliação. É sobre a quantidade da língua que
o indivíduo compreende? Quanto o indivíduo pode produzir? O foco é no
vocabulário ou também na sintaxe? Pretende ser uma mensuração do progresso
dentro do currículo ou uma visão geral das habilidades? A intenção é comparar
o desempenho a um grupo de referência ou a um critério predeterminado? E a

111
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

avaliação pretende avaliar habilidades em condições do mundo real ou examiná-


las de maneira mais generalizada, independente de contextos específicos de
comunicação? Várias questões práticas também são importantes. Por exemplo,
o tempo disponível para avaliação pode determinar o método preferido de
avaliação, porque a amostragem de língua leva muito tempo em relação à
testagem de idioma.

Até o momento, a discussão da avaliação tem sido independente do status da


audição. As coisas tornam-se muito mais complicadas quando os alunos surdos estão
envolvidos. A primeira questão é a língua que está sendo avaliada. Para um idioma
falado como português, inglês ou holandês, vários testes, frequentemente com boas
propriedades psicométricas, estão disponíveis. A maioria desses instrumentos,
no entanto, foi desenvolvida especificamente para indivíduos ouvintes. Avaliar
a proficiência em língua de sinais é mais problemático devido à relativa falta de
informação sobre vários aspectos do desenvolvimento da língua de sinais (pelo
menos em comparação com pesquisas sobre aquisição de língua falada), a enorme
variação na proficiência em língua de sinais entre usuários nativos e não nativos,
a relativa falta de instrumentos de avaliação padronizados e a disponibilidade de
instrumentos de avaliação com boas características psicométricas que se mostraram
válidos e confiáveis (SINGLETON;
​​ SUPALLA, 2011).

Recentemente, vários testes foram desenvolvidos para a avaliação de


habilidades linguísticas de crianças usando várias línguas de sinais, incluindo
Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS – (QUADROS; CRUZ, 2011), American Sign
Language – ASL – (MALLER et al., 1999), British Sign Language – BSL – (HERMAN;
HOLMES; WOLL, 1999), Língua Australiana de Sinais – AUSLAN – (SCHEMBRI
et al., 2002), entre outras. Em comparação com os testes desenvolvidos para a
avaliação da língua falada, no entanto, as normas para esses testes permanecem
relativamente fracas.

DICAS

Leia o livro Língua de Sinais: instrumentos de avaliação


de R. M. de Quadros e C. R. Cruz (2011) para conhecer mais sobre os
instrumentos e novas pesquisas nesta área.

FONTE: <https://images-na.ssl-images-amazon.com/images/
I/41D45e3bbsL._SX344_BO1,204,203,200_.jpg>. Acesso em: 14 maio
2019.

Legenda: Capa de um livro

112
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

A avaliação da proficiência em língua falada em crianças surdas é outra


questão complexa. Muitos testes foram desenvolvidos para a avaliação da língua
usada pelos alunos ouvintes. O fato de que a proficiência em língua falada de
crianças surdas difere dos pares ouvintes de maneira importante, levanta a
questão de quão apropriado é usar esses instrumentos para avaliar a língua
falada de alunos surdos. Eles medem os mesmos constructos? Qual é o valor
de usar normas auditivas na interpretação do desempenho de crianças surdas?
As respostas a essas perguntas dependem do objetivo real da avaliação. Por
exemplo, ao avaliar a língua falada de alunos surdos em salas de aula regulares,
o uso de normas auditivas pode ser apropriado, mesmo se a interpretação exigir
alguma qualificação ou explicação adicional. Alguns testes de habilidades de
língua falada foram desenvolvidos especificamente para avaliação de alunos
surdos. O uso de tais testes pode ser útil na comparação de alunos surdos com
pares surdos, mas a baixa incidência de perda auditiva em crianças, significa que
os grupos de referência de normas tendem a ser comparativamente pequenos.
Enquanto um professor estiver interessado nas habilidades de um indivíduo em
vez de avaliação em relação a um grupo de comparação, isso não é um problema.
No entanto, se o objetivo da avaliação exigir referência a um grupo normativo, é
necessário ter cautela.

A acessibilidade dos itens dentro de um teste é outra preocupação. Se


alguém está testando um aluno surdo na língua falada, é inevitável que o teste
não apenas avalie as habilidades de linguagem, mas também a percepção
auditiva e visual da fala. Um resultado de teste específico, portanto, não reflete
necessariamente a proficiência linguística, mas, geralmente, deve ser entendido
como abrangendo habilidades de proficiência da língua e percepção de fala.
Infelizmente, não há uma maneira real de contornar esse problema. Alguns
professores ou outros avaliadores adaptam procedimentos de teste, por exemplo,
realizando testes em língua escrita, língua escrita e falada ou comunicação
simultânea.

No entanto, tais adaptações ameaçam a validade e a confiabilidade do


teste (QI; MITCHELL, 2012). As normas de referência tornam-se inúteis nesses
casos, porque foram estabelecidas usando um procedimento de avaliação

113
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

diferente. Além disso, tais adaptações podem não resolver realmente o problema.
Se alguém evita o uso da fala ao avaliar a proficiência na língua falada porque
também implica testar a percepção da fala e a capacidade de leitura orofacial e,
em vez disso, usa a linguagem escrita, o teste também se torna um teste de leitura.
Dado o desafio de ler para muitos alunos surdos (veja o Tópico 1 da Unidade
3), a solução de um problema simplesmente cria outro. Da mesma forma, o uso
de sinais de apoio e comunicação simultânea ameaça a validade de um teste de
língua falada de várias maneiras. Primeiro, o teste então avalia a compreensão
dos sinais e da fala. Segundo, devido à iconicidade de alguns sinais (isto é, sinais
que se parecem com seus referentes), o teste de língua pode se tornar uma tarefa
bastante fácil de resolver problemas, especialmente se envolver a verificação de
imagens e pode não avaliar a proficiência na língua falada.

Às vezes, os professores adaptam os testes de línguas devido à preocupação


com a complexidade dos itens, supondo que os itens de teste individuais sejam
muito difíceis para os alunos surdos. Os itens específicos, às vezes, são alterados
ou os professores podem exigir que os alunos surdos realizem testes destinados
a alunos mais jovens, levando ao que é chamado de teste fora de nível. Por mais
bem-intencionada que essa abordagem possa parecer, ela não garante maior
precisão ou validade na avaliação das habilidades dos alunos surdos. O suporte
empírico para a eficácia das adaptações é, muitas vezes, inexistente, e a eficácia
de vários testes e adaptações de testagens tem sido questionada (QI; MITCHELL,
2012).

Uma questão adicional em relação às avaliações de língua falada é que


os alunos surdos podem ser de famílias que usam uma língua falada em casa
diferente da língua nacional usada na escola (JAMIESON; SIMMONS, 2011). Isso
pode ser alemão no Brasil, turco na Alemanha ou espanhol nos Estados Unidos.
Para ter uma visão completa da proficiência linguística de um aluno individual,
a proficiência na língua materna também deve ser avaliada. Para alguns desses
idiomas, pode não haver testes de proficiência ou podem ser aplicados em
diferentes grupos, e encontrar um indivíduo apropriado que conheça o idioma e
possa administrar o teste, pode ser problemático. Frequentemente, todos os três
fatores co-ocorrem. Em alguns países, esta situação está melhorando um pouco,
devido ao desenvolvimento de instrumentos de avaliação específicos, criação
de procedimentos específicos ou diretrizes de melhores práticas, e o uso de
intérpretes na avaliação (BLUMENTHAL, 2009).

Essas dificuldades não devem ser vistas, significando que a avaliação


da língua de alunos surdos é muito difícil para valer a pena o esforço dos
profissionais. Em vez disso, a avaliação de línguas é uma parte vital do ensino de
idiomas para alunos surdos, mas, na realização de tais avaliações, é importante
determinar cuidadosamente os objetivos da avaliação, selecionar os melhores
instrumentos de avaliação disponíveis e não ser rápido demais para adaptar o
procedimento ou itens. Se os itens ou procedimentos de teste forem modificados,
é importante que as modificações sejam descritas da forma mais precisa possível

114
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

para possibilitar a replicação. Dada a complexa situação da língua para muitos


alunos surdos, tentar traçar o perfil do desenvolvimento da língua, com base
em vários tipos de avaliação dela, levando em conta seus repertórios e recursos
mistos (multimodais e multilíngues), pode ser uma maneira particularmente boa
de avançar. Finalmente, ao interpretar os resultados das avaliações de línguas
para alunos surdos, ainda é preciso ter muito mais cuidado do que com os alunos
ouvintes. Reconhecer os desafios potenciais dessa administração e interpretação
permite que a avaliação seja feita de uma maneira que preserve a validade e a
confiabilidade, tanto quanto possível.

4 AUMENTANDO A ACESSIBILIDADE À LÍNGUA NA


EDUCAÇÃO
Os professores têm várias opções para aumentar a acessibilidade da
língua para alunos surdos na sala de aula. Essas possibilidades variam desde
o ajuste das condições acústicas até a percepção aprimorada da língua falada, o
fornecimento de suporte visual para a língua falada por meio do uso de pistas ou
sinais e o uso de uma língua alternativa, como a língua nacional ou regional de
sinais.

4.1 AUMENTANDO A ACESSIBILIDADE À LÍNGUA


APRIMORANDO A ACÚSTICA DA SALA DE AULA
Uma das medidas que as escolas podem tomar para otimizar o acesso
auditivo à língua falada é a criação de uma acústica ideal para a sala de aula. As
escolas tendem a ser ambientes barulhentos, escolas convencionais provavelmente
mais do que escolas para surdos simplesmente porque há menos consciência
da necessidade de atenção à qualidade do som. Ruídos de fundo e ecos criam
barreiras acústicas nas salas de aula que afetam negativamente a percepção da fala
e podem ser prejudiciais ao aprendizado acadêmico das crianças (DOCKRELL;
SHIELD, 2006). As salas de aula para as crianças mais novas tendem a ser as
mais barulhentas, muito mais barulhentas do que os ambientes domésticos
(JAMIESON, 2010). Nessas circunstâncias, a relação sinal-ruído se torna muito
importante, porque as interações eficazes na sala de aula na língua falada, exigem
que os alunos possam ouvir as vozes (sinais) do professor e de outros alunos.
Pesquisas mostram que nas salas de aula regulares, as crianças com perdas
auditivas significativas apresentam pior desempenho em relação à percepção de
fala em comparação aos ouvintes sob todas as condições de escuta, mas quanto
pior o ambiente de audição, mais a percepção da fala sofre (JAMIESON, 2010).

A acústica da sala de aula é uma preocupação crescente, à medida que


mais e mais alunos surdos estão sendo educados em ambientes tradicionais, e a
questão é particularmente importante para os estudantes profundamente surdos
que recebem implantes cocleares em idade precoce. Acústica pobre em sala de

115
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

aula pode impedir seriamente as habilidades comunicativas de crianças surdas


com implantes. Ela não apenas limita a comunicação eficaz direta, reduzindo a
capacidade de ouvir a fala de professores e colegas na sala de aula, mas a má
acústica também pode limitar a aprendizagem incidental de interações informais
em sala de aula (JAMIESON, 2010).

Melhorar a acústica da sala de aula ou criar uma ecologia sonora acústica
(JAMIESON, 2010), primeiro requer a medição da acústica em salas de aula
individuais. Isso, geralmente, é feito com equipamentos que modelam os alunos
com dispositivos de escuta assistida, por exemplo, com uma cabeça artificial com
microfones nos ouvidos. Ao mesmo tempo, as habilidades de percepção de fala
de alunos surdos usando próteses auditivas ou implantes cocleares devem ser
avaliadas, não apenas sob as condições de laboratório de um centro de audiologia
ou clínica de otorrinolaringologia, mas também em ambientes de sala de aula
real ou virtual. Este tipo de avaliação faz com que seja possível determinar a
relação sinal-ruído para os alunos individuais em relação às condições acústicas
específicas em suas salas de aula (NEUMAN et al., 2012). Após essas avaliações,
a acústica pode ser melhorada conforme necessário, mas todas as salas de aula
devem satisfazer os padrões acústicos regulares de sala de aula.

A prática educativa revela que muitas salas de aula não cumprem os


requisitos acústicos básicos, mesmo quando os padrões foram estabelecidos.
Melhorar a relação sinal-ruído através de dispositivos técnicos de amplificação
é, portanto, outra forma de melhorar a percepção da fala por alunos surdos em
contextos educacionais (HARKINS; BAKKE, 2010). Sistemas de campos sonoros
são, às vezes, sugeridos e podem melhorar a percepção da fala em condições de
escuta ruidosa para alunos ouvintes, bem como para alunos surdos (DOCKRELL;
SHIELD, 2012). Vários estudos, no entanto, demonstraram que dispositivos
como desktop ou Sistemas de Frequência Modulada (FM) pessoais são mais
apropriados para alunos surdos (ANDERSON et al., 2005). Muitas vezes esquecido
a esse respeito, especialmente nas salas de aula regulares, é a necessidade de
garantir que os aparelhos auditivos e os implantes cocleares estejam funcionando
corretamente. Disfunções do dispositivo e, com muito mais frequência, baterias
inoperantes precisam ser identificadas e resolvidas rapidamente. Caso contrário,
os alunos surdos são excluídos da comunicação em sala de aula. As crianças surdas
mais jovens nem sempre estão cientes (ou cuidam) de que seus dispositivos não
estão funcionando, e os alunos mais velhos podem relutar em solicitar assistência
em uma sala de aula regular. Os professores, portanto, precisam assumir alguma
responsabilidade para garantir que os aparelhos auditivos e implantes dos alunos
estejam funcionando adequadamente e incentivem a autodefesa e a autoconfiança
dos alunos. O conhecimento técnico adequado e o apoio ao nível da sala de aula e
da escola são requisitos nesta era de tecnologia e inclusão na educação.

116
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

DICAS

Assista ao vídeo 3x4: Sistema de frequência modulada como auxílio a


deficientes auditivos produzido pela TV USP Bauru, que apresenta o sistema de frequência
modulada aplicado ao contexto escolar, o seu uso tornou-se uma política pública e auxilia
alunos por todo o país. Esse projeto é resultado de pesquisas desenvolvidas por diversas
instituições, incluindo a Universidade de São Paulo (USP). Disponível no link: https://www.
youtube.com/watch?v=gJLLeDS3BuY.

4.2 AUMENTANDO A ACESSIBILIDADE À LÍNGUA


ADICIONANDO UM CÓDIGO MANUAL À LÍNGUA FALADA

Outra maneira de avançar e aumentar o acesso à língua falada para
alunos surdos é apoiar visualmente a língua falada por meio de pistas ou sinais,
tornando a comunicação multimodal. Cornett (1967) criou um sistema de pistas
manuais, chamado de Cued Speech (muitas vezes traduzido como Fala com
Indicações, Palavra Complementada ou Linguagem Falada Complementada –
LFC), para melhorar a leitura orofacial por surdos. Como descrevemos no Tópico
2 da Unidade 1, a quantidade de fala visível na boca, geralmente, é insuficiente
para uma percepção visual precisa da fala ou leitura orofacial. Na LFC, dicas
manuais feitas em vários locais permitem uma percepção visual inequívoca da
fala. Embora a LFC permita uma comunicação interpessoal eficaz, os esforços
para usá-la na sala de aula tiveram apenas um sucesso limitado. Isso pode ocorrer
porque a comunicação manual por meio da língua de sinais tem uma comunidade
linguística para oferecer, enquanto a LFC não tem. Na verdade, Cornett pretendia
que a LFC fosse usada em ambientes de sala de aula, mas esperava que os alunos
surdos continuassem a usar a língua de sinais para a comunicação social. O uso
da LFC em instrução de leitura é mais comum. Pesquisas têm mostrado que a
esse tipo de fala pode aumentar a consciência fonológica e o reconhecimento de
palavras, elementos importantes para se tornar um leitor fluente (LEYBAERT;
APARICIO; ALEGRIA, 2011). Esses resultados, no entanto, limitaram-se a idiomas
com uma ortografia relativamente transparente, como o português, francês e
espanhol, enquanto os resultados foram, na melhor das hipóteses, equivocados
para idiomas como o inglês, que têm menos ortografias regulares (SPENCER;
MARSCHARK, 2010).

117
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

FIGURA 4 – DR. R. ORIN CORNETT

FONTE: <https://ww1.prweb.com/prfiles/2006/07/06/408499/tN_NCSA2.jpg>. Acesso em: 14


maio 2019.

Legenda: Dr. R. Orin Cornett

Nascido em Driftwood, Oklahoma, em 14 de novembro de 1913, o Dr.


R. Orin Cornett, inventor do Cued Speech, morreu em 17 de dezembro de 2002,
em Laurel, Maryland, aos 89 anos de idade. A invenção do Cued Speech em
1966, abriu um novo campo na educação dos surdos. Seu sistema de Fala com
Indicações baseava-se na hipótese de que, se todos os sons na língua falada
pudessem claramente parecer diferentes uns dos outros, vindos dos lábios do
falante, aqueles que fossem deficientes auditivos aprenderiam uma língua falada
da mesma maneira como uma pessoa que ouve, mas visualmente ao invés de
acusticamente.

A utilização de sinais para apoiar a língua falada, comunicando-se


simultaneamente em fala e sinal, tornou-se muito popular nos anos 1970 como
parte da filosofia da comunicação total. Diferente da comunicação simultânea,
que envolve falar e usar sinais na mesma ordem de palavras, a comunicação total
enfatiza o uso de quaisquer métodos de comunicação para cada aluno, juntamente
à amplificação e outras formas de apoio. O movimento da comunicação total,
fortalecido pela consciência disseminada da língua de sinais como uma língua
de fato, desde a linguística à psicologia e à educação, acabou com o tabu de um
século sobre o uso de sinais na educação de surdos. Vários sistemas de sinais
foram usados, variando de sistemas que estritamente tentaram representar
todos os elementos lexicais e gramaticais da língua falada nas mãos, às vezes, até
usando sinais lexicais inventados, a sistemas de sinais mais naturais, focando na
representação manual do significado usando sinais lexicais e algumas estruturas
gramaticais emprestadas das línguas de sinais naturais.

Existem vários objetivos inerentes ao uso da comunicação simultânea,


incluindo a comunicação interpessoal, com maior destaque quando há usuários
de língua de sinais menos fluentes, melhorando o acesso à língua falada e
apoiando a aquisição dela por crianças surdas jovens. O advento da educação
surda bilíngue e a implementação de línguas naturais de sinais em programas
educacionais, levaram a críticas da comunicação simultânea por não ser uma
118
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

língua, mas um sistema inventado que poderia comprometer a aquisição da língua


e aprendizagem por crianças surdas (COKELY, 1990; JOHNSON; LIDDELL;
ERTING, 1989). Embora tais críticas tenham levado a uma diminuição do uso de
comunicação simultânea, ou pelo menos a reivindicações públicas nesse sentido,
há poucas evidências que sugerem que a comunicação simultânea é inadequada
para fins educacionais.

Marschark e Hauser (2012) expressaram preocupação de que os usuários


ouvintes de comunicação simultânea frequentemente são incapazes de reconhecer
seus erros de sinais devido à predominância de sua língua falada. No contexto
dos gestos cospeech, no Tópico 1 desta unidade, no entanto, citamos pesquisas
realizadas nos Estados Unidos indicando que nas mãos de professores com boas
habilidades de comunicação simultânea, tanto os alunos surdos mais jovens
quanto os mais velhos (MARSCHARK et al., 2005) com e sem prótese auditiva
aprendem tanto com a instrução via comunicação simultânea quanto com a
língua falada e a língua de sinais produzida por um professor ou um intérprete.
Há, agora, pesquisas emergentes produzindo descobertas similares da instrução
de crianças surdas nas séries iniciais (HERMANS et al., 2014) e, a rejeição da
comunicação simultânea parece prematura, sem uma avaliação adequada de
seus resultados em relação a objetivos de uso. De fato, a comunicação simultânea
parece ser cada vez mais usada na prática, mesmo em ambientes em que seu uso
é negado. Knoors e Marschark (2012) sugeriram que poderia ser particularmente
eficaz como um “código de apoio” para melhorar a comunicação com crianças
surdas jovens que usam implantes cocleares. Quando a língua falada é perdida,
as informações estariam simultaneamente disponíveis nas mãos. Esse não é o
caso da interpretação da língua de sinais, em que esta é atrasada e o atendimento
a ela necessitaria da falta de alguma língua falada.

Em contraste com a situação na década de 1970, quando a comunicação


simultânea foi fortemente criticada, muitos alunos surdos têm, agora,
consideravelmente, mais acesso auditivo à língua falada, e o momento pode ser
adequado para reconsideração. Em seu forte apelo por educação surda bilíngue,
R. Johnson, Liddell e Erting (1989), afirmaram que a comunicação simultânea,
inevitavelmente leva a uma fala e uso de sinais corrompidos, que a parte com
sinais da comunicação simultânea não é compreensível para os alunos, que a
língua de sinais oferece muito melhor acesso ao conteúdo do currículo e que o
uso da comunicação simultânea não facilitaria a aquisição de uma língua falada,
mas, ao contrário, levaria as crianças surdas a usar gramáticas idiossincráticas.
Essas queixas foram teóricas, no entanto, e praticamente 30 anos depois, não
estamos cientes de qualquer evidência empírica para apoiá-las.

O uso da comunicação simultânea exige que o falante não apenas pense


no conteúdo da mensagem e selecione palavras do léxico mental, mas, também,
analise o enunciado linguisticamente para selecionar sinais apropriados para
expressar os significados normalmente carregados por palavras de função e
morfemas gramaticais. Alguns usuários de comunicação simultânea experientes,
parecem fazer isso com precisão e eficiência, mas têm o potencial de levar à

119
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

sobrecarga cognitiva, mesmo quando os usuários são bem treinados (STRONG;


CHARLSON, 1987). Como consequência, os sinais podem ser omitidos e/ou
enunciados abreviados, levando a um estilo telegráfico “Eu Tarzan, você Jane”
(MARMOR; PETITTO, 1979). Além disso, há o problema da sincronicidade
(SWISHER, 1985). Leva mais tempo para produzir um sinal do que falar uma
palavra, embora os sinais individuais possam conter mais informações do que
palavras individuais através de inflexões de sinais. Sinais articulados em sincronia
com palavras faladas, portanto, podem exigir que o falante fale mais lentamente,
embora estudos relevantes não tenham sido realizados desde que a linguística e a
psicolinguística das línguas de sinais se tornaram mais conhecidas.

Em uma conversa entre indivíduos surdos e ouvintes, a diminuição na


velocidade da fala na comunicação simultânea, na verdade, pode ser benéfica
para o parceiro surdo, porque mais tempo é permitido para processar um
enunciado. No entanto, a pesquisa mostrou que um uso mais natural dos
sistemas de sinais leva a resultados muito melhores na comunicação, desde que
os professores sejam adequadamente treinados (MAYER; AKAMATSU, 1999).
Isto é, o uso de sinais das línguas de sinais naturais, o foco no uso preciso do
conteúdo proposicional e a aplicação de regras gramaticais da língua de sinais
para melhorar a sincronicidade levam a altas porcentagens de enunciados
apropriadamente comunicados simultaneamente.

Ao contrário das expectativas de R. Johnson, Liddell e Erting (1989),


parece que a comunicação simultânea proporciona aos alunos surdos acesso
ao conteúdo do currículo tão bem quanto uma língua de sinais. Marschark et
al. (2008) relataram quatro experimentos de aprendizagem em sala de aula de
estudantes universitários surdos, através de instrução direta (professores usando
a língua de sinais por si mesmos) e instrução mediada (usando intérpretes de
língua de sinais). Ambos instrutores e intérpretes foram reconhecidos como tendo
excelentes habilidades. Os resultados indicaram uma aprendizagem comparável
do material quando os instrutores usaram a língua de sinais e comunicação
simultânea em suas palestras. Convertino et al. (2009) realizaram uma metanálise
de 10 experimentos em que estudantes universitários surdos e ouvintes foram
instruídos por professores utilizando intérpretes de língua de sinais. A única
variável de comunicação que previa o aprendizado era a habilidade receptiva de
comunicação simultânea dos alunos surdos, embora a comunicação simultânea
não tenha sido usada para instrução em nenhum dos experimentos. Depois de
controlar outros fatores, as habilidades receptivas e expressivas dos alunos em
língua de sinais e em língua falada não tinham relação com o aprendizado, assim
como o status de audição de seus pais. Pesquisas de Hermans et al. (2014) também
não mostraram um efeito benéfico da língua de sinais sobre a comunicação
simultânea em uma série de experimentos envolvendo alunos surdos no
ensino fundamental. De fato, parece que muitos estudantes surdos hoje, tanto
com implantes cocleares quanto sem implantes cocleares, sentem-se bastante à
vontade usando a língua falada e a língua de sinais juntas.

120
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

Revisando a pesquisa disponível, que é bastante limitada, sobre o impacto


da comunicação simultânea e outras formas de línguas codificadas manualmente
no desenvolvimento da língua falada, Spencer e Marschark (2010) e Schick (2011)
deixaram claro que afirmações sobre os efeitos da comunicação simultânea
no desenvolvimento da língua falada, de uma forma ou de outra, não foram
validadas empiricamente. A aquisição de morfemas por jovens surdos, aprendizes
de um idioma através de uma língua codificada manualmente, provou ser muito
difícil, mesmo quando a contribuição é rica e consistente. Power, Hyde e Leigh
(2008), no entanto, obtiveram descobertas mais positivas com alunos surdos um
pouco mais velhos. Resultados positivos também foram obtidos com relação
ao desenvolvimento lexical e ao desenvolvimento da ordem das palavras, mas
infelizmente não de forma consistente.

Consistente com a sugestão de R. Johnson, Liddell e Erting (1989), ainda


não parece haver qualquer evidência de uma língua codificada manualmente
resultando em proficiência em língua falada em estudantes surdos comparável
ao de pares ouvintes, embora também não tenhamos conhecimento de nenhum
investigador que pudesse prever esse resultado. Além disso, vários estudos
apoiaram observações de que os alunos surdos tendem a usar o input de sinais da
comunicação simultânea para construir enunciados que aderem muito mais aos
requisitos da língua de sinais do que da língua falada, resultando em construções
gramaticais semelhantes a língua de sinais (KNOORS, 1994). Os estudantes desses
estudos, no entanto, quase não tinham acesso auditivo à comunicação simultânea,
o que significa que o processamento da comunicação simultânea era um processo
predominantemente visual. Pode ser que mais processamento auditivo, como o
disponível para estudantes com implantes cocleares, leve a resultados diferentes.

Claramente, mais pesquisas são necessárias para estabelecer quais


aspectos, se houver, do desenvolvimento da língua falada podem lucrar com
um input de comunicação simultânea e quais condições (incluindo a qualidade
do input da comunicação simultânea) são necessárias para estabelecer efeitos
positivos. Investigações mais básicas do processamento de sinal-fala, semelhantes
aos estudos gestuais em ciência cognitiva e neurociência cognitiva que discutimos
anteriormente, também são necessárias.

Em resumo, a comunicação simultânea pode ser um poderoso


compromisso comunicativo, dando aos alunos surdos tanto acesso ao conteúdo
curricular como a língua de sinais ou a língua falada. Pelo menos, para fins de
instrução, a comunicação simultânea nos parece uma opção viável para muitos
alunos surdos e, talvez, especialmente para aqueles com maior acesso à parte
auditiva da comunicação simultânea possibilitada pelos implantes cocleares.
No entanto, a má prática leva a resultados ruins. O treinamento intensivo de
professores é necessário para garantir que a instrução através do uso combinado
de fala e sinal seja completa e de alta qualidade. De qualquer modo, mais pesquisas
são necessárias para determinar até que ponto a comunicação simultânea pode
promover o desenvolvimento da língua, para quem pode promover e em quais
contextos isso ocorre com mais efetividade.

121
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

4.3 AUMENTANDO A ACESSIBILIDADE À LÍNGUA ATRAVÉS


DA LÍNGUA DE SINAIS
A terceira forma de aumentar a acessibilidade à língua em sala de aula
é por meio de uma língua que, por definição, é acessível a alunos surdos, desde
que eles não tenham uma deficiência visual: a língua de sinais. O uso da língua
de sinais na educação de alunos surdos torna essa educação bilíngue, dado o
fato de que essa educação aborda também o domínio do vernáculo escrito/falado.
Programas bilíngues em educação de surdos têm em comum que eles incorporam
duas línguas, a língua de sinais nacional e a língua falada, embora estas não
precisem ser faladas. Eles também prestam atenção às culturas nas quais essas
línguas são usadas, ou deveriam, e, portanto, esses programas são muitas vezes
referidos como bilíngues-biculturais.

Existe uma variação considerável entre os programas bilíngues, no


entanto, com relação à ordem e prioridade com que as línguas são apresentadas
no currículo (programação simultânea ou sequencial), as metas para as quais os
idiomas são usados ​​(linguagem instrucional ou não), o modo em que a língua
falada é apresentada (oralmente ou escrita), a extensão em que o caráter bicultural
é enfatizado e o ambiente no qual o programa é ministrado (educação regular ou
especial). Nesse ponto, não temos conhecimento de nenhuma pesquisa que tenha
examinado os efeitos da parte bicultural da educação bilíngue-bicultural sobre os
resultados acadêmicos, socioemocionais ou linguísticos.

Tanto o reconhecimento das línguas de sinais como ricas e bem


estruturadas, como o desapontamento nos resultados da educação surda,
enfatizando a língua falada, alimentaram o início da educação surda bilíngue.
Mas a educação bilíngue também deve ser vista como uma resposta natural a
uma situação em que muitas crianças surdas cresceram para se tornar bilíngues
em língua de sinais e falada, mesmo se a educação formal fosse monolíngue,
enfatizando a língua falada e escrita (KNOORS, 1994).

O uso formal da língua de sinais na educação surda bilíngue parece ter


começado na Escandinávia com o reconhecimento formal da Língua de Sinais
Sueca e adoção de programação bilíngue para alunos surdos em 1983 (RYDBERG;
GELLERSTEDT; DANERMARK, 2009). Outros países seguiram, resultando
na educação bilíngue como a principal opção em escolas especiais para surdos
em países como Holanda, Dinamarca e Finlândia; como uma alternativa entre
as opções educacionais, como no Brasil, nos Estados Unidos e no Reino Unido;
ou como projetos especiais para demonstrar sua utilidade em países específicos
como Hong Kong e Áustria. Mais recentemente, na ausência de evidências de
suas contribuições para os resultados acadêmicos dos alunos surdos quando
outros fatores são controlados, a educação bilíngue na Escandinávia e no Reino
Unido está em declínio, sendo encontrada principalmente em escolas e programas
separados para alunos surdos (SWANWICK et al., 2014).

122
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

Vários objetivos para a educação bilíngue foram expressos, alguns


mais amplamente apoiados do que outros. Gregory (1986) articulou quatro
objetivos principais: permitir que crianças surdas se tornassem linguisticamente
competentes; prover acesso a um amplo currículo; facilitar boas habilidades de
alfabetização; proporcionar aos alunos surdos um senso positivo de sua própria
identidade. Desses objetivos, fornecer aos alunos surdos acesso ao conteúdo do
currículo é um objetivo comum de todos os programas bilíngues. Promover a
competência linguística, principalmente através do fornecimento da língua de
sinais como a primeira língua de crianças surdas, é, provavelmente, o segundo
objetivo mais frequentemente citado. Estimular o desenvolvimento da identidade
social e da autoestima é, provavelmente, o terceiro objetivo mais frequentemente
declarado. Melhorar a proficiência na língua falada como segunda língua é
outro objetivo defendido por alguns programas bilíngues. A extensão em que a
programação bilíngue resulta em competência linguística é abordada na próxima
seção.

5 PROMOÇÃO DA COMPETÊNCIA EM LÍNGUAS ATRAVÉS


DA EDUCAÇÃO BILÍNGUE
A base teórica da educação surda bilíngue depende fortemente da hipótese
de interdependência linguística de Cummins (1981), embora o conhecimento atual
sobre aquisição bilíngue da língua e potenciais consequências cognitivas envolva
muito mais do que o arcabouço teórico de Cummins (ver Tópico 1 desta unidade).
Sua proposta de que a transferência de proficiência linguística (principalmente
da variedade acadêmico-cognitiva) de uma primeira língua para uma segunda
língua é possível, significa que aprender uma segunda língua é mais fácil quando
o usuário da língua já conhece a primeira. Essa suposição, no entanto, negligencia
condições específicas descritas por Cummins (1981) para que tal transferência
ocorra. Estas condições implicam que a transferência só ocorrerá na medida em
que os alunos surdos sejam proficientes na língua de sinais, tenham um input
adequado da segunda língua falada e tenham motivação para aprender o idioma
que é a segunda língua. Não é de surpreender, portanto, que o uso da estrutura
de Cummins como base teórica para a educação de surdos bilíngues tenha sido
questionado (KNOORS; MARSCHARK, 2012).

Um primeiro e crucial ponto para entender a aplicabilidade da hipótese de


Cummins (1981), é a questão das oportunidades dos alunos surdos se tornarem
proficientes na língua de sinais como sua primeira língua. Para atingir esse
objetivo, o input rico e consistente de língua de sinais deve ser fornecido dentro
dos primeiros dois anos de vida (CORMIER et al., 2012). Para alunos surdos com
pais surdos, essa é uma opção potencialmente viável, embora os achados de J.
Anderson e Reilly (2002) e Woolfe et al., (2010) sugiram que mesmo eles possam
sentir atrasos de vocabulário (de sinais) durante os anos pré-escolares. O que
dizer, então, sobre os 95% de alunos surdos com pais ouvintes? Knoors (2007)
apontou que, após 20 anos de educação surda bilíngue, ainda há uma escassez de

123
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

pesquisas sobre as consequências de input limitado de língua de sinais dos pais


na proficiência em língua de sinais de crianças surdas. O que estudos publicados
indicam (HERMANS, KNOORS; VERHOEVEN, 2009) não alimenta o otimismo,
apontando para atrasos consideráveis ​​na proficiência em língua de sinais em
alunos surdos com pais ouvintes. Não está claro até que ponto a educação bilíngue
para crianças surdas realmente resulta ou realisticamente pode ser construída em
um ambiente linguístico eficaz.

Há todos os motivos para acreditar que, em muitos países, as


oportunidades para os pais e professores se tornarem proficientes em línguas de
sinais estão ausentes ou simplesmente não são boas o suficiente. Mas, mesmo que
consigamos intensificar o ensino da língua de sinais para ouvir pais e professores
ao nível de, digamos, treinamento de intérprete de língua de sinais, não há
garantia de que todos os pais e professores envolvidos tenham proficiência em
língua de sinais suficiente para serem modelos bem-sucedidos da língua para
alunos surdos. Dado o importante papel que a aptidão da língua desempenha na
obtenção de proficiência na segunda língua, parece implausível que todos os pais
e professores ouvintes possam aprender com sucesso a língua de sinais, mesmo
quando a qualidade instrucional é excelente.

Ter modelos de língua de sinais tão fluentes como profissionais surdos


usuários desta, seria uma maneira de contornar esse problema, e, é fortemente
defendido por acadêmicos surdos (HUMPHRIES et al., 2012). Nem as barreiras
para executar esta proposta (por exemplo, encontrar um número suficiente de
adultos surdos que são verdadeiramente fluentes em sua língua de sinais e
disponíveis para tal atividade) nem suas consequências (por exemplo, intervir
em famílias ouvintes e possivelmente mudar a dinâmica familiar, treinar
professores surdos suficientes e criar oportunidades de trabalho para eles) deve
ser subestimada, mas valeria a pena realizar estudos bem desenhados nesse
sentido. Tais investigações seriam particularmente importantes para os alunos
surdos, cuja única opção para obter proficiência na língua é através da introdução
precoce da língua de sinais. Do outro lado do continuum, para as crianças surdas
com relativamente bom acesso à língua falada e condições benéficas de apoio
(por exemplo, aqueles com implantes cocleares), podemos incorporar a língua de
sinais no currículo escolar como segunda língua, oferecida em algum momento
posterior em suas vidas acadêmicas quando já tenham uma base mais forte em sua
língua primária (KNOORS; MARSCHARK, 2012). Ao mesmo tempo, deveríamos
procurar maneiras de treinar pais e educadores não usuários da língua de sinais
com mais sucesso nela, talvez integrando instrução off-line e on-line na língua de
sinais.

Outro desafio para a educação bilíngue é oferecer aos alunos surdos a


oportunidade de experimentar o input adequado de uma língua falada/escrita.
Originalmente, muitos defensores da educação surda bilíngue, argumentavam
que a única maneira de alcançar o sucesso era fornecer a língua falada em forma
escrita. Nas palavras de R. Johnson, Liddell e Erting (1989, p. 17), “a aprendizagem
de uma língua falada para uma pessoa surda é um processo de aprender uma

124
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

segunda língua através da alfabetização (leitura e escrita) [...] a fala não deve
ser empregada como veículo principal para a aprendizagem de uma língua
falada para crianças surdas”. Outros, como Knoors e Fortgens (1995), sugeriram
uma visão alternativa, enfatizando o uso de próteses auditivas e implantes
suplementados pelo treinamento auditivo para maximizar a possibilidade da
língua falada se tornar o veículo de aquisição da língua falada para tantos alunos
surdos em programas bilíngues quanto possível.

Futuras possibilidades à parte, quase três décadas após a introdução da


educação surda bilíngue, temos de concluir que, em comparação com a publicação
relativamente frequente de descrições de programas, a pesquisa em resultados tem
sido limitada (SPENCER; MARSCHARK, 2010). Estudos recentes que revisam o
desempenho acadêmico de alunos surdos educados de modo bilíngue na Suécia
apontam apenas ganhos educacionais limitados (RYDBERG; GELLERSTEDT;
DANERMARK, 2009). Comparando coortes de estudantes que frequentaram a
escola antes e depois do advento da educação bilíngue, por exemplo, Rydberg,
Gellerstedt e Danermark (2009), descobriram que os surdos na Suécia ainda se
encontravam atrasados ​​em termos de desempenho educacional em comparação
com os pares ouvintes. Aparentemente, o único estudo que relatou resultados
educacionais promissores de programação bilíngue para a educação de crianças
surdas é um relatório não publicado, mas publicamente disponível, de Nover et
al. (2002).

Ao relatar as pontuações de compreensão de leitura no Stanford


Achievement Test de alunos surdos com idade entre 8 e 18 anos, mais de um terço
dos quais tinham pais surdos, Nover et al. (2002) verificaram que os alunos entre
as idades de 8 e 12 anos tiveram escores significativamente melhores do que as
normas nacionais para o teste relatado por Traxler (2000) para crianças surdas e
com deficiência auditiva. Em idades diferentes durante esses 5 anos, no entanto,
essas pontuações diferiam apenas de 5 a 25 pontos (1%) das normas para alunos
surdos, 95% dos quais teriam pais ouvintes. Pontuações no mesmo teste para
estudantes da mesma idade e dos mesmos anos de nascimento matriculados em
uma escola arbitrariamente selecionada para surdos que aderiram mais a uma
filosofia de comunicação total situam-se 5 a 40 pontos acima das mesmas normas,
excedendo as pontuações do programa bilíngue em todos, exceto um dos grupos
etários (MARSCHARK, 2011).

No que diz respeito às fluências linguísticas resultantes da programação


bilíngue, um estudo espanhol de pequena escala realizado por Jiménez, Pino e
Herruzo (2009), analisou o desenvolvimento da língua falada de surdos de 4 a 8
anos com implantes cocleares que frequentavam um programa apenas oral. Eles
encontraram vantagens para os alunos surdos bilíngues em relação à expressão
falada e de sinais (ou seja, fluência verbal). Os estudantes com formação oral
obtiveram melhores resultados na recepção auditiva e sintaxe produtiva e
morfologia. Não foram encontradas diferenças em relação ao vocabulário da
língua falada, memória sequencial auditiva ou habilidades de comunicação social.
Outros estudos mostraram que a proficiência em língua de sinais em alunos

125
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

matriculados em educação surda bilíngue está associada à proficiência em língua


escrita (HOFFMEISTER et al., 1997). No entanto, a proficiência em língua escrita
em alunos surdos bilíngues parece estar relacionada ainda mais fortemente com
a proficiência na língua falada (NIEDERBERGER, 2008).

Pode ser que a proficiência em língua de sinais esteja correlacionada


com proficiência em língua escrita por causa da transferência cultivada, isto é,
professores explicitamente ligando sinais a palavras escritas. Pesquisas holandesas
indicam que as línguas de sinais e escritas são associadas apenas em alunos surdos
que têm cerca de 8 anos de idade ou mais, possivelmente devido à proficiência
insuficiente em língua de sinais para se beneficiar com a instrução de promoção de
transferência cultural (HERMANS; ORMEL; KNOORS, 2010). Alternativamente,
envolver-se espontaneamente no processamento associativo e relacional através
das modalidades visuais e verbais pode ser mais difícil para as crianças surdas do
que para as crianças ouvintes (MARSCHARK; ​​HAUSER, 2012). Uma aplicação
direcionada de sinais em programas de treinamento destinados a melhorar
o vocabulário da língua escrita e falada de crianças surdas, tem se mostrado
eficaz em dois estudos (MOLLINK; HERMANS; KNOORS, 2008; WAUTERS et
al., 2001), mas os fundamentos linguísticos e cognitivos de tal treinamento têm
que ser explorados mais a fundo. Como observado anteriormente e contrário a
muitas expectativas, a pesquisa até o momento não forneceu evidências de que a
língua de sinais geralmente resulta em melhor acesso ao conteúdo curricular em
comparação à comunicação simultânea ou texto (BORGNA et al., 2011).

O que parece claro é que a educação bilíngue para surdos é um conceito


mais complexo do que muitas pessoas esperavam e que não é fácil de implementar
totalmente e com sucesso. Spencer e Marschark (2010, p. 79-80) sugeriram,
portanto, que “a programação de sinais/bilíngue, em que uma língua de sinais
natural serve como primeira língua e meio de comunicação em sala de aula, tem
uma forte base teórica, mas até hoje falta evidência suficiente para permitir a
avaliação de seus resultados no desenvolvimento da linguagem”. Mayer e Leigh
(2010, p. 177) foram mais além, concluindo o seguinte:

O ponto-chave a ser feito é que não há dados que sugiram que, como
grupo, os alunos em programas bilíngues estão atingindo os níveis
de alfabetização e linguagem adequados à idade que foram previstos
quando os modelos bilíngues foram implementados pela primeira
vez. Dada essa falta de evidências convincentes, pareceria instrutivo
revisitar o modelo e considerar algumas das preocupações levantadas
sobre sua implementação específica com os alunos surdos, como uma
maneira de pensar em por que os resultados foram menos do que o
esperado.

Apesar da falta de fortes evidências, ainda existem muitas razões para que
os alunos surdos possam ser proficientes em língua de sinais. Para alguns alunos
surdos, é a única língua acessível a eles. Para outros, é uma excelente maneira
de se comunicar sempre que a comunicação na língua falada não for possível,
por exemplo, sob condições de escuta adversas. Para todos os alunos surdos,
é o caminho para se tornar um membro da comunidade Surda e ser capaz de

126
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

lucrar com a diversidade linguística e cultural (GREGORY, 1986). Dado o enorme


desafio de fornecer aos alunos surdos uma língua de sinais no início da vida e as
crescentes possibilidades de adquirir a língua falada devido à intervenção precoce
e implementação coclear, opções como a alternativa de língua de sinais como
segundo idioma que sugerimos anteriormente deve ser explorada (KNOORS;
MARSCHARK, 2012).

Em conclusão, existem várias abordagens para melhorar a acessibilidade


à língua para alunos surdos. Cada abordagem tem seus pontos fortes e fracos,
e a adequação de qualquer alternativa em particular dependerá das situações
familiares e escolares específicas, bem como das características do aluno. A
maioria das abordagens para melhorar a acessibilidade da linguagem, no entanto,
tem em comum que mais e melhores pesquisas de resultados são bem-vindas
e necessárias. Um planejamento cuidadoso do ensino da língua por parte das
escolas e dos professores também é necessário. Easterbrooks (2010) enfatizou a
necessidade de se levar em conta que existem pelo menos dois subgrupos na
população de alunos surdos com diferentes necessidades, aqueles que podem
aprender sua primeira língua com base na audição e aqueles que precisam de
informações linguísticas visuais para alcançar esse fim.

Revisitar a educação surda bilíngue levou Knoors e Marschark (2012) a


concluir que uma diferenciação no input da língua tem que ocorrer para os alunos
surdos para que a maioria tenha oportunidades ótimas para o sucesso. Formas de
diferenciação nesse input já foram introduzidas em alguns programas de educação
para surdos, incluindo diferenciação em salas de aula (por exemplo, salas de aula
mistas de língua de sinais e de língua falada nas séries primárias), diferenciação
entre grupos de classe (por exemplo, modelos de fluxo) e diferenciação através da
criação de provisões educacionais adjacentes (por exemplo, escolas de parceria).
Essas iniciativas merecem apoio, desde que sejam acompanhadas de pesquisas
sobre sua eficácia e efetividade. Segundo Knoors e Marschark (2012, p. 301):

Aplicando uma distinção nuançada no input da linguagem, mantendo


a interação entre crianças surdas e com deficiência auditiva, através
de ambientes educacionais, estabelecendo um bom programa
educacional em SL2 (língua de sinais como segunda língua), medindo e
monitorando com precisão os resultados cognitivos e socioemocionais
do treino e da educação, podemos fazer ainda melhor, adequando de
maneira mais apropriada às necessidades e pontos fortes das crianças
surdas. Para atingir essas metas, no entanto, precisamos de um ajuste
contínuo do planejamento e das políticas de linguagem para que elas
nos sirvam e não nós a elas.

6 FACILITANDO O DESENVOLVIMENTO DA LÍNGUA


ATRAVÉS DA INTERAÇÃO EM SALA DE AULA
A interação em sala de aula, especificamente a interação professor-aluno,
pode melhorar o desenvolvimento da língua se permitir que os alunos surdos
participem plenamente das trocas de comunicação em sala de aula, mas isso
127
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

requer um estilo apropriado de interação do professor. A pesquisa relativamente


limitada, que está disponível nesta área, indica que estabelecer uma interação em
sala de aula que realmente estimule a aprendizagem de línguas em alunos surdos
é um desafio considerável para os professores (KNOORS; HERMANS, 2010).

Está bem estabelecido que um estilo de comunicação sensível e responsivo


facilita a aprendizagem de línguas não apenas em casa, mas também na escola.
Na escola tal estilo é caracterizado pelo fato de os professores permitirem que os
alunos tomem iniciativas comunicativas e, ao mesmo tempo, expandam e ampliem
essas iniciativas, estabelecendo uma atenção conjunta. Usando perguntas abertas,
expansões, prompts, modelagem avançada, reformulações e o uso de palavras
raras e linguagem complexa, estão todos associados ao crescimento da língua
em crianças (DICKINSON; TABORS, 2002). O diálogo professor-criança é um
contexto essencial para o ensino e a aprendizagem, particularmente nos primeiros
anos de educação. A natureza e a qualidade do estilo interacional de um professor
realmente preveem o aprendizado de idiomas das crianças (SHIEL et al., 2012).
Tal diálogo deve ser significativo, enfocando a construção de significados entre
professores e alunos (VYGOTSKY, 1993).

Se as crianças tiverem problemas para adquirir uma língua, resultando


em uma fala menos precisa ou menos inteligível, os adultos tendem a assumir
o controle da conversação. Essa é uma reação intuitiva e compreensível. Como
consequência, no entanto, os adultos dominam as conversas, levantando muitas
questões fechadas (por exemplo, sim-não) e deixando pouco espaço para as
crianças praticarem, expandirem e refinarem sua própria língua, impedindo ainda
mais o aprendizado da língua. Embora seja bem conhecido que as estratégias de
interação dos professores realmente ajudam as crianças na aquisição da língua,
pesquisas mostraram que a aplicação desses estilos de interação, baseada em
evidências em salas de aula pré-escolares com ouvintes é difícil, resultando em
baixa qualidade do ensino da língua (JUSTICE et al., 2008). A oferta de ensino
de idiomas de alta qualidade parece depender, em grande parte, das crenças de
autoeficácia dos professores e, em menor escala, do treinamento.

NOTA

As crenças de autoeficácia é um conceito desenvolvido por A. Bandura (1977)


que se refere a crenças que os indivíduos têm em sua própria capacidade de organizar e
executar determinado curso de ação para alcançar determinado resultado.

128
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

A pesquisa sobre interação em sala de aula na educação de surdos remonta,


em grande parte, as décadas de 1980 e 1990. Em uma série de estudos, David e
Heather Wood e seus colegas da Universidade de Nottingham, mostraram que
muitos professores em educação surda tendiam a usar um estilo de interação
diretiva, corrigindo muitas vezes a língua de seus alunos. Esse estilo impediu a
aquisição de proficiência linguística entre esses estudantes (WOOD et al., 1992).
Ao mesmo tempo, havia alguns indícios de que o comportamento comunicativo
dos professores poderia ser influenciado em direções positivas através de análises
de interação de vídeo, promovendo aspectos específicos dos estilos de interação
do professor. Estudos recentes de larga escala, fornecem evidências mais fortes de
que a interação professor-criança eficaz, pode ser treinada, pelo menos em salas
de aula com crianças ouvintes. Hamre et al. (2012), por exemplo, demonstraram
isso através da realização de um curso intensivo de 14 semanas focado na prática
em salas de aula pré-escolares, abordando as crenças, o conhecimento e as práticas
observadas dos professores em relação à interação e à comunicação.

Consistente com esses achados, Mayer, Akamatsu e Stewart (2002)


concluíram que os professores exemplares de surdos são capazes de envolver
a si mesmos e seus alunos em um processo de investigação dialógica. Nesse
processo, o professor sabe o que um aluno entende ou não como resultado de
uma análise implícita dos enunciados dos alunos. A resposta dos professores
é assim adaptada às necessidades individuais comunicativas e linguísticas do
aluno. Stewart (2006) formulou duas diretrizes para ajudar os professores a lidar
com a diversidade linguística e as necessidades comunicativas dos alunos surdos.
Primeiro, a comunicação do professor deve ser influenciada pela dinâmica de
comunicação em sala de aula e pelas características de aprendizagem dos alunos
surdos. Em segundo lugar, é importante reconhecer que não há apenas uma
maneira de se comunicar na sala de aula. Em vez disso, os professores precisam
usar diferentes meios de comunicação, dependendo da situação. A implicação
é que os professores precisam ser proficientes tanto em LIBRAS quanto em
português para poder codificar suavemente entre as duas línguas conforme a
situação exigir.

Outro desafio para a interação bem-sucedida dos professores em uma sala


de aula com alunos surdos é estabelecer e manter contato visual entre os alunos
e entre professor e alunos. Se o contato visual falhar, os alunos surdos perderão
as informações apresentadas em língua de sinais, comunicação simultânea ou
texto, bem como o que for apresentado em materiais visuais relacionados ao
conteúdo. Esse é um risco sério, dado a descoberta de Matthews e Reich (1993)
de restrições à comunicação em salas de aula com alunos surdos. Nas aulas em
escolas para surdos, consistindo de apenas quatro a seis alunos e ministradas
por professores muito experientes, usando comunicação simultânea, os alunos
assistiam visualmente a apenas 44% dos sinais utilizados pelos professores. Os
alunos pareciam distrair-se frequentemente uns pelos outros, por outro material,
ou por informações no quadro. A perda de informação foi relativamente limitada
devido à quantidade de repetições feitas pelos professores. Mas a repetição
extensiva diminui a taxa de transmissão de informações, reduzindo o quanto

129
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

pode ser ensinado em uma determinada classe ou semestre. Mathews e Reich


recomendaram limitar a comunicação aluno-aluno durante a instrução e não
abordar apenas um aluno por vez, mas sim usar técnicas de comunicação que
envolvam todos os alunos de uma só vez (MARSCHARK; LANG; ALBERTINI,
2002). Professores surdos de alunos surdos, por exemplo, parecem utilizar técnicas
de comunicação visual como o olhar fixo direcionado ao grupo e apontam que
ajudam a estabelecer comunicação visual efetiva em salas de aula com alunos
surdos (SMITH; RAMSEY, 2004). Se essas técnicas podem ser ensinadas também
para professores ouvintes de surdos, ainda precisam ser determinadas.

7 INSTRUÇÃO DIRETA DE LÍNGUA


Mesmo ao educar as crianças que entram na escola com proficiência
linguística apropriada à idade e que não têm problemas na aprendizagem
incidental, o ensino formal ou direto de línguas é bastante comum, não apenas
na educação primária, mas também na educação secundária. Como as crianças
surdas muitas vezes entram na escola com atrasos consideráveis ​​na língua falada
e de sinais e experimentam sérios problemas com a aprendizagem incidental, o
ensino direto da língua é, muitas vezes, ainda mais importante para elas do que
para as crianças ouvintes.

Surpreendentemente, poucos currículos para o ensino direto de línguas


foram descritos, sem falar em métodos de linguagem e pesquisas sobre a eficácia
de tais métodos raros. O pequeno público-alvo é um dos fatores que contribuem
para essa situação, tornando a maioria dos editores educacionais desinteressados
em desenvolver currículos e métodos linguísticos, no desenvolvimento de
material de teste especializado para alunos surdos, e a prevalência de abordagens
que enfatizam a aprendizagem "natural" da língua a despeito da instrução formal
(por exemplo, o método materno-reflexivo).

Os países diferem no que diz respeito às exigências legais relativas ao


conteúdo dos currículos escolares de maneiras que afetam a possibilidade de
ensino direto de línguas. Alguns países, incluindo a Noruega e a Suécia, possuem
um currículo estadual, exigindo que as escolas dos alunos com e sem deficiência
sigam o mesmo currículo. Outros países, como a Holanda, apenas declararam
metas curriculares amplas, deixando o caminho exato para atingir essas metas para
as próprias escolas. Na situação anterior, algumas vezes ocorrem modificações
para tornar o currículo acessível a alunos surdos, por exemplo, oferecendo
programação educacional em língua de sinais, simplificando a linguagem escrita
e acrescentando imagens, ou usando várias técnicas de scaffolding no ensino
real. Na última situação, currículos específicos ou métodos de ensino podem
ser desenvolvidos para permitir que os alunos surdos atinjam os objetivos
educacionais amplos.

130
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

Nos Estados Unidos, Blackwell et al. (1978) desenvolveram um currículo


de aprendizagem de língua baseado nas teorias de aprendizagem de Bruner e
Vygotsky. Um esboço de temas foi desenvolvido, incluindo procedimentos para
traduzir esses temas em lições específicas. Encenando eventos; simbolizando
experiências através de fotos, artes e artesanato; e transformá-los em formas
de linguagem foram os pilares do programa. A adaptação às necessidades
individuais dos alunos foi feita com base em uma avaliação cuidadosa do
potencial de aprendizagem e proficiência linguística dos alunos. Embora o
currículo tenha muitas características atraentes, uma grande desvantagem foi
seu caráter relativamente aberto e desestruturado, e a pressão resultante sobre os
professores para projetarem todos os temas e lições.

Após a introdução da educação surda bilíngue na Holanda, as escolas para


surdos começaram a colaborar, juntamente às universidades, através da criação de
uma equipe de especialistas chamada Sprong Vooruit (Salto para Frente). A equipe
foi criada para desenvolver currículos para línguas, leitura e cultura surda. Esses
currículos, bem como métodos e lições específicas, estão disponíveis on-line para
os professores (https://sprongvooruit.nl/home). Com base nos métodos regulares
existentes para o ensino de línguas na educação pré-escolar e primária, foram
desenvolvidos métodos para o ensino da Língua Holandesa e Língua de Sinais da
Holanda na pré-escola e do 1º ao 6º ano escolar. Esses métodos são utilizados em
quase todas as escolas para surdos. Infelizmente, nenhuma pesquisa de eficácia
foi realizada ainda.

Em vários países foram desenvolvidos programas que enfocam a educação


de surdos em um dos domínios da linguagem. Um dos poucos programas que
visam à percepção da fala, que foi avaliada empiricamente, foi desenvolvido por
Paatsch et al. (2006). Eles desenvolveram um programa de produção de fala e
treinamento de vocabulário falado. Durante 15 semanas, 21 alunos surdos com
idades entre 5 e 12 anos receberam treinamento, 16 deles apresentaram perdas
auditivas superiores a 90 dB; 15 dos 16 eram usuários de implante coclear. Todos
os alunos foram integrados em uma escola primária regular, com uma unidade
especializada para crianças surdas e com deficiência auditiva, nas quais apenas
a língua oral era usada. Os resultados indicaram que os alunos melhoraram
significativamente na produção de fala, vocabulário e percepção de fala como
resultado do treinamento. Segundo Paatsch et al. (2006), a percepção da fala
melhorou como resultado direto da melhora da fala.

Um pouco mais de pesquisa está disponível com relação ao treinamento


de vocabulário para crianças surdas. Luckner e Cooke (2010) resumiram a
pesquisa de vocabulário com alunos surdos, incluindo 41 estudos. Apenas dez
desses estudos, no entanto, examinaram o efeito de um programa ou intervenção
específica. Dois programas tiveram efeitos positivos apresentados em mais de
um estudo e cinco programas demonstraram resultados positivos em um estudo.
Os programas que promoveram a aprendizagem de vocabulário variaram de
instrução de vocabulário direto apoiada pelo uso de computadores e instrução de

131
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

vocabulário oral/auditivo em crianças surdas com implantes cocleares até o uso


de sinais em treinamento de vocabulário. Luckner e Cooke (2010) enfatizaram a
perspectiva promissora da instrução de vocabulário auxiliada por computador.

Os efeitos benéficos encontrados em tais estudos envolvendo alunos


surdos, estão em consonância com os achados de alunos ouvintes e alunos com
outras deficiências, como espectro autista ou dificuldades de aprendizagem. As
vantagens do treinamento controlado por computador incluem uma redução do
tempo direto do professor, a possibilidade de adaptar a instrução às necessidades
individuais dos alunos, fornecimento de feedback imediato, aumento da
quantidade de prática, inclusão de scaffolding e revisão sistemática, e uso de
várias representações de significado como fotos, texto e som. Luckner e Cooke
(2010) defenderam a exposição frequente a novos vocabulários. Todas as lições
de idiomas, por exemplo, devem conter uma seção dedicada à instrução direta
de vocabulário, novas palavras devem ser usadas repetidamente em múltiplos
contextos e o novo vocabulário deve ser integrado não apenas no ensino de
línguas, mas também na ciência e estudos sociais. Finalmente, os alunos devem
explicitamente ser ensinados como atribuir significado a um novo vocabulário
usando o contexto específico.

Com base em uma revisão da pesquisa sobre instrução de vocabulário


na primeira infância, Williams (2012) recomendou que os professores de surdos
se concentrassem na qualidade da interação durante os eventos de leitura de
livros de contos e durante as atividades de acompanhamento. Ela sugeriu que a
instrução de vocabulário deveria ser incorporada nas atividades habituais de sala
de aula na pré-escola, como culinária, artes e artesanato, e brincadeiras, ou seja,
em eventos reais reconhecíveis. Os professores também foram incitados a usar
ferramentas específicas para promover a aprendizagem de vocabulário, como
escrever palavras em cartões, listar e categorizar palavras em gráficos.

Diversas abordagens para a instrução da gramática também foram


estudadas. Cannon et al. (2011) estudaram o efeito de um programa chamado
Language Links: Syntax Assessment and Intervention. Este é um programa direcionado
de instrução gramatical (inglesa) em software de computador. Foi usado com 26
alunos surdos em educação especial primária. Todos tinham entre 5 e 12 anos de
idade e usavam a Língua de Sinais Americana (ASL) para comunicação diária.
A intervenção ocorreu durante nove semanas com uma sessão de dez minutos
realizada em cada dia de aula. Os participantes tiveram que ler uma sentença
em inglês na tela do computador e selecionar uma imagem que correspondesse
à morfossintaxe da sentença. Eles trabalharam individualmente através de todos
os seis módulos e todos os seis níveis do programa. Um total de oito professores
participaram do estudo. Ao final da intervenção, a compreensão dos alunos surdos
da morfossintaxe inglesa na forma escrita foi aumentada significativamente.

132
TÓPICO 2 | ENSINO E AVALIAÇÃO DA LINGUAGEM

Berent et al. (2007) estudaram o efeito da instrução Focus-on-Form, uma


abordagem usada no ensino de segunda língua. Nessa abordagem, o texto é
visualmente aprimorado para tornar as relações gramaticais entre palavras
explícitas e as redações escritas são codificadas para revisão. O objetivo é chamar
a atenção dos alunos para formas de linguagem específicas e seus significados.
Em comparação com o ensino habitual de gramática, a instrução Focus-on-Form
visualmente realizada, obteve uma melhora significativamente no conhecimento
gramatical inglês em estudantes universitários surdos.

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dada a complexidade dos alunos surdos como um grupo, não é de
surpreender que ensinar a língua a eles também seja uma atividade complexa.
Não existe uma maneira de ensinar a língua efetivamente a todos os alunos
surdos, porque a variação individual das necessidades é considerável. O ensino
diagnóstico de línguas é, portanto, fortemente recomendado, integrando avaliação
e ensino real.

Mais pesquisas para fortalecer a base de evidências das melhores práticas


no ensino de idiomas para alunos surdos de várias idades são necessárias, mas
parece seguro sugerir uma combinação de melhoria das condições acústicas da
sala de aula para que os alunos possam se beneficiar; planejamento cuidadoso de
linguagem, dirigido aos pontos fortes e fracos dos alunos; estabelecer interação
em sala de aula que seja sensível e responsiva; fornecer instruções diretas
direcionadas à língua usando métodos bem desenhados para os quais há algumas
evidências, é a melhor maneira de obter sucesso no ensino da língua para alunos
surdos.

133
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Após o reconhecimento do status linguístico das línguas de sinais, as


abordagens bilíngues à linguagem para crianças surdas enfatizaram o uso
precoce da língua de sinais, com a língua falada sendo vista como uma
segunda língua introduzida principalmente na forma escrita e através da
instrução formal da língua.

• O advento dos aparelhos auditivos digitais e do implante coclear, e a melhora


da audição para muitas crianças surdas, criaram um interesse renovado em
abordagens “orais” para educar crianças surdas.

• A introdução e o uso de novas alternativas no continuum da fala ao sinal


quase sempre foram acompanhados por debates filosóficos e retórica ferozes,
geralmente à custa de pesquisa empírica objetiva.

• Ensinar a língua aos alunos surdos é um empreendimento complexo,


especialmente para um professor em sala de aula.

• As diferenças individuais entre as crianças surdas são muito grandes, e o


desenvolvimento da proficiência em língua é muito menos previsível do que
em crianças ouvintes.

• O ensino diagnóstico é uma forma de ensino em que há constante interação


entre avaliação de habilidades e progresso e planejamento de programas, tanto
em nível individual quanto em nível de sala de aula.

• As avaliações informais da língua são muito mais orientadas para o processo


do que as avaliações formais.

• Se um professor quiser ter uma visão completa da competência linguística e


do desempenho linguístico dos alunos na sala de aula, todos os domínios da
língua de instrução devem ser avaliados.

• Avaliar a proficiência em língua de sinais é mais problemático devido à


relativa falta de informação sobre vários aspectos do desenvolvimento da
língua de sinais, a enorme variação na proficiência em língua de sinais entre
usuários nativos e não nativos, a relativa falta de instrumentos de avaliação
padronizados e a disponibilidade de instrumentos de avaliação com boas
características psicométricas que se mostraram válidas e confiáveis.

134
• Para ter uma visão completa da proficiência linguística de um aluno individual,
a proficiência na língua materna também deve ser avaliada.

• Tentar traçar o perfil do desenvolvimento da língua com base em vários


tipos de avaliação dela, levando em conta seus repertórios e recursos mistos
(multimodais e multilíngues), pode ser uma maneira particularmente boa de
avançar.

• Uma das medidas que as escolas podem tomar para otimizar o acesso auditivo
à língua falada, é a criação de uma acústica ideal para a sala de aula.

• A acústica da sala de aula é uma preocupação crescente, à medida que mais e


mais alunos surdos estão sendo educados em ambientes tradicionais, a questão
é particularmente importante para os estudantes profundamente surdos que
recebem implantes cocleares em idade precoce.

• Outra maneira de avançar e aumentar o acesso à língua falada para alunos


surdos, é apoiar visualmente a língua falada por meio de pistas ou sinais,
tornando a comunicação multimodal.

• O uso da comunicação simultânea exige que o falante não apenas pense no


conteúdo da mensagem e selecione palavras do léxico mental, mas também
analise o enunciado linguisticamente para selecionar sinais apropriados para
expressar os significados normalmente carregados por palavras de função e
morfemas gramaticais.

• Parece que muitos estudantes surdos, tanto com implantes cocleares quanto
sem, sentem-se bastante à vontade usando a língua falada e a língua de sinais
juntas.

• A comunicação simultânea pode ser um poderoso compromisso comunicativo,


dando aos alunos surdos tanto acesso ao conteúdo curricular como à língua de
sinais ou à língua falada.

• A terceira forma de aumentar a acessibilidade à língua em sala de aula é por


meio de uma língua que, por definição, é acessível a alunos surdos, desde que
eles não tenham uma deficiência visual: a língua de sinais.

• O uso formal da língua de sinais na educação surda bilíngue parece ter


começado na Escandinávia com o reconhecimento formal da Língua de Sinais
Sueca e adoção de programação bilíngue para alunos surdos em 1983.

• A base teórica da educação surda bilíngue depende fortemente da hipótese de


interdependência linguística de Cummins.

• Um desafio para a educação bilíngue é oferecer aos alunos surdos a


oportunidade de experimentar o input adequado de uma língua falada/
escrita.
135
• A proficiência em língua escrita em alunos surdos bilíngues parece estar
relacionada ainda mais fortemente com a proficiência na língua falada.

• Pode ser que a proficiência em língua de sinais esteja correlacionada com


proficiência em língua escrita por causa da transferência cultivada, isto é,
professores explicitamente ligando sinais a palavras escritas.

• A educação bilíngue para surdos é um conceito mais complexo do que muitas


pessoas esperavam e que não é fácil de implementar totalmente e com sucesso.

• A interação em sala de aula, especificamente a interação professor-aluno,


pode melhorar o desenvolvimento da língua se permitir que os alunos surdos
participem plenamente das trocas de comunicação em sala de aula, mas isso
requer um estilo apropriado de interação do professor.

• Está bem estabelecido que um estilo de comunicação sensível e responsivo


facilita a aprendizagem de línguas não apenas em casa, mas também na escola.

• Estudos recentes de larga escala fornecem evidências mais fortes de que a


interação professor-criança eficaz pode ser treinada, pelo menos em salas de
aula com crianças ouvintes.

• A comunicação do professor deve ser influenciada pela dinâmica de


comunicação em sala de aula e pelas características de aprendizagem dos
alunos surdos.

• É importante reconhecer que não há apenas uma maneira de se comunicar na


sala de aula. Em vez disso, os professores precisam usar diferentes meios de
comunicação, dependendo da situação.

• O ensino formal ou direto de línguas é bastante comum, não apenas na


educação primária, mas também na educação secundária.

136
AUTOATIVIDADE

1 O que é o Ensino Diagnóstico?

2 Ao selecionar um instrumento de avaliação da língua, existem vários


tipos para escolher. Uma primeira distinção útil é entre avaliações
formais e informais. O que seria uma avaliação formal? Quais seriam suas
desvantagens?

3 O que é o sistema de pistas manuais chamado de Cued Speech (Palavra


Complementada)?

4 A interação em sala de aula, e especificamente a interação professor-aluno,


pode melhorar o desenvolvimento da língua se permitir que os alunos surdos
participem plenamente das trocas de comunicação em sala de aula, mas isso
requer um estilo apropriado de interação do professor. Quais interações
do professor com o aluno permitem esta melhora do desenvolvimento da
língua?

137
138
UNIDADE 2 TÓPICO 3
PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

1 INTRODUÇÃO
Nos tópicos anteriores, descrevemos os fundamentos da aprendizagem
entre os alunos surdos. Essas descrições centram-se em questões associadas à
linguagem de modo geral e a língua em particular, o principal meio pelo qual
a maioria de nós adquire a maior parte do nosso conhecimento. No Tópico 3 da
Unidade 1, descrevemos como as interações entre as crianças surdas e seus pais
estabelecem fundamentos para aprender de algumas maneiras semelhantes e, em
alguns aspectos, diferentes daquelas de crianças ouvintes. Com o papel crescente
da língua nas interações interpessoais e na aprendizagem em geral, pode-se
esperar observar diferenças crescentes entre crianças com fluência maior e menor
na língua. Essa expectativa é apoiada pela evidência disponível.

Vimos no Tópico 1, desta unidade, que aos três anos, muitas crianças, se
não a maioria das crianças surdas, ficam um pouco atrasadas no desenvolvimento
da língua se comparadas aos seus colegas ouvintes. Embora estudos sobre
desenvolvimento cognitivo em pré-escolares surdos sejam relativamente raros, é
nesse ponto que também esperamos começar a ver divergências cognitivas entre
aprendizes surdos e ouvintes. A extensão em que essas diferenças observadas
são uma função da língua, das circunstâncias ambientais ou de outras diferenças
cognitivas entre crianças surdas e ouvintes ainda é uma questão de investigação
(bem como de algum debate filosófico). Embora seja conveniente dizer “isso não
importa realmente; nós simplesmente temos que lidar com essas diferenças”,
a vida não é tão simples assim. Os professores podem abordar algumas das
diferenças observadas entre surdos e ouvintes em sala de aula. O objetivo, no
entanto, deve ser o de fornecer às crianças surdas os fundamentos cognitivos
de que precisam para aprender, não apenas remediações de diferenças de
comportamento/conhecimento, talvez, superficiais.

Neste tópico vamos nos basear em tópicos anteriores, descrevendo


aspectos do funcionamento cognitivo das crianças surdas que influenciarão sua
aprendizagem formal e informal. Ao longo desta discussão é essencial ter em
mente que, embora as crianças surdas e ouvintes possam ser cognitivamente
semelhantes em mais maneiras do que diferentes, as crianças surdas são muito
mais variáveis ​​do que seus pares ouvintes. Já vimos que, além das diferenças
individuais observadas entre as crianças ouvintes, as crianças surdas também
serão afetadas por fatores diretamente relacionados as suas perdas auditivas
(por exemplo, etiologias dessas perdas, menor acesso a informações auditivas
no ambiente) e fatores indiretamente relacionados a suas perdas auditivas (por
exemplo, uma maior probabilidade de ambientes de linguagem empobrecidos,
139
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

diferentes padrões de interação entre pais e filhos, histórias educacionais em


contextos abaixo do ideal). Esta variabilidade é refletida nas pontuações nos testes
de inteligência (MALLER; BRADEN, 2011), bem como nos resultados acadêmicos
observados (MARSCHARK; LANG; ALBERTINI, 2002).

É importante notar que, além da variabilidade “background” entre as


crianças surdas, elas também têm mais probabilidade do que as crianças ouvintes
de ter múltiplos desafios de aprendizagem de fonte médica. Esses geralmente são
uma consequência das etiologias de sua surdez, seja sindrômica ou não sindrômica
(Tópico 2 da Unidade 1). Estas crianças podem exigir acomodações de educação
especial que vão além da consideração das questões cognitivas discutidas aqui e
os problemas de linguagem descritos nos dois capítulos anteriores. Infelizmente,
as necessidades das crianças surdas com múltiplos desafios são tão individuais e
variam tão amplamente que há pouca pesquisa que nos permite tirar quaisquer
conclusões gerais (KNOORS; VERVLOED, 2011). Essa situação é lamentável,
porque essas crianças normalmente serão as que precisam do maior apoio.

2 INTELIGÊNCIA VERSUS COGNIÇÃO


Quando os psicólogos falam sobre inteligência, eles estão se referindo
ao potencial cognitivo de um indivíduo, incluindo a capacidade de adquirir
conhecimento, tanto intencional quanto incidentalmente, usando esse
conhecimento intencionalmente em alguns casos e automaticamente em outros. A
cognição refere-se aos processos envolvidos na aquisição de conhecimento, retê-
lo e recuperá-lo sob várias condições. A quantidade e a qualidade da informação
que foi adquirida não é uma parte da inteligência em si, mas reflete a sua
realização e desempenho. Os alunos com o mesmo potencial intelectual podem
ter uma ampla gama de conhecimentos ou realizações acadêmicas, dependendo
de seus ambientes e oportunidades.

Os desafios acadêmicos enfrentados pelos alunos surdos não são um


reflexo de qualquer inferioridade intelectual associada à perda auditiva, mas
podem resultar, em parte, de diferenças cognitivas entre alunos surdos e ouvintes
que exigiria ou se beneficiaria de uma acomodação especial. Nós abordaremos
esses problemas mais tarde. Enquanto isso, pais e professores sempre perguntam
se as crianças surdas são tão inteligentes quanto as crianças que ouvem. Essa
pergunta não é tão simples quanto parece. A maioria dos testes desenvolvidos
para medir a inteligência destina-se a pessoas que dependem de audição durante
a maior parte da aprendizagem, assim como vimos que a maioria das avaliações
da língua é desenvolvida para indivíduos que usam a língua falada. Quando
avaliados com testes de inteligência que são justos para crianças surdas e ouvintes,
os dois grupos geralmente têm um desempenho igualmente bom. No entanto, na
medida em que pode haver diferenças verdadeiras na inteligência entre as duas
populações, devemos ter cuidado para não definir "justo" como "produzindo
os mesmos resultados para crianças surdas e ouvintes" (MARSCHARK, 1993).
Diferenças reais em inteligência, seja quantitativa ou qualitativa, precisam ser

140
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

reconhecidas se quisermos acomodar as necessidades das crianças surdas e


desenvolver suas forças. O reconhecimento de que crianças surdas e ouvintes
podem ter o mesmo potencial intelectual, mesmo quando diferem em algumas
dimensões relevantes para a aprendizagem, é um componente essencial para a
educação de alunos surdos.

A suposição de igual potencial intelectual para surdos e ouvintes vem


da constatação de que os escores médios de inteligência não-verbal de crianças
surdas não diferem significativamente dos escores de crianças ouvintes, pelo
menos quando aqueles com múltiplas deficiências são excluídos (BRADEN, 1984,
1985). Esta conclusão, no entanto, não deve ser tomada para indicar que as duas
populações pensam, aprendem ou se comportam da mesma forma. De fato, a
substância deste tópico diz respeito às diferenças e às semelhanças na cognição,
que provavelmente afetam a aprendizagem, o segundo tópico da primeira
unidade e o primeiro tópico desta segunda, oferecem várias razões pelas quais as
duas populações podem diferir. Além disso, a inteligência não verbal não cobre
totalmente a gama de habilidades necessárias para a aprendizagem em sala de
aula, muito menos, outras atividades do mundo real que afetam a aprendizagem
formal. Nossa ênfase na língua aqui e nos proponentes da língua falada e da língua
de sinais para crianças surdas fala da centralidade da linguagem (comportamento
verbal) em todas as facetas do esforço humano.

Em testes de inteligência verbal, os alunos surdos, geralmente, caem


significativamente abaixo da média dos alunos ouvintes (MALLER; BRADEN,
1993). Avaliar a inteligência verbal entre os alunos surdos pode ser problemático,
particularmente à luz de seus frequentes atrasos no desenvolvimento da língua.
Então, por que nos incomodamos? A administração de testes de inteligência verbal
a crianças surdas pode ser útil de várias maneiras. A variabilidade observada
entre crianças surdas em tais testes, por exemplo, pode revelar relativa força ou
fraqueza ao lidar com materiais verbais. Talvez, como resultado, os escores de
inteligência verbal sejam um melhor preditor de desempenho acadêmico do que
os escores não verbais, portanto, podem fornecer informações úteis para tomar
decisões quanto à programação (AKAMATSU; MAYER; HARDY-BRAZ, 2008).
Todavia, estas pontuações não devem ser tomadas como medidas válidas de
capacidades cognitivas ou de outros alunos sem a evidência de sua validade nesse
domínio. As diferenças nos ambientes e nas experiências de crianças surdas e de
crianças com deficiência podem levar a diferentes abordagens de aprendizagem,
pelo fato de o conhecimento ser organizado de diferentes maneiras e em
diferentes níveis de habilidade em domínios explorados por qualquer teste em
particular. A identificação de tais diferenças é fundamental se o apoio ideal para
a aprendizagem for fornecido.

Apesar das dificuldades associadas ao uso de testes de inteligência


existentes com alunos surdos, esses testes continuam a servir como um elemento
primário em avaliações destinadas à inclusão escolar de crianças com necessidades
especiais em muitos países. Os profissionais da educação têm, portanto, que
enfrentar o dilema de usar testes padronizados que podem não ter sido validados

141
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

para alunos surdos ou selecionar testes projetados especificamente para alunos


surdos, e talvez projetados no pressuposto da equivalência intelectual entre os
domínios. Na maioria das vezes as avaliações de alunos surdos tipicamente
utilizam testes não verbais. Como já observamos, esses testes geralmente são
considerados como resultados comparáveis ​​para pessoas surdas e ouvintes,
mas os resultados têm sido bastante variáveis. Ulissi, Brice e Gibbins (1989), por
exemplo, relataram que crianças surdas pontuaram na faixa normal na Escala
Não Verbal da Bateria de Avaliação Kaufman para Crianças (KAUFMAN;
KAUFMAN, 1983), um teste popular usado com crianças surdas. No entanto,
outros estudos relataram escores mais baixos de surdos do que de ouvintes
na Escala de Desempenho Internacional de Leiter Revisada (ROID; MILLER,
1997), no Teste Abrangente de Inteligência Não Verbal (HAMMILL; PEARSON;
WIEDERHOLT, 1997) e no Teste de Inteligência Não Verbal Universal (MALLER;
BRADEN, 2011).

Infelizmente, o lócus de tal variabilidade permanece incerto. Conforme


Maller e Braden (2011, p. 474):

a amostra é representativa de surdos? A amostra inclui pessoas surdas


que têm deficiências não identificadas? [...] os surdos examinandos
entendem as instruções? Os itens têm um significado diferente para
crianças surdas, devido a diferentes oportunidades de aprendizagem
ou exposição diferente ao material?

Alternativamente, pode haver diferenças reais na inteligência entre


indivíduos surdos e ouvintes em alguns domínios, se não em geral. Por exemplo,
como veremos mais adiante, neste tópico, indivíduos surdos pontuam mais do
que indivíduos ouvintes em algumas tarefas visuoespaciais, consequentemente,
podem pontuar mais em alguns elementos de testes de inteligência que requerem
memória ou manipulação visuoespacial (BRADEN; KOSTRUBALA; REED,
1994). Eles tendem a ter um desempenho pior do que os indivíduos ouvintes em
tarefas que requerem memória sequencial, desta maneira, frequentemente têm
pontuação mais baixa em testes da extensão de memória (FAGAN et al., 2007).

Essa discussão deve deixar claro que as suposições históricas deixadas


de lado, as diferenças cognitivas entre crianças surdas e ouvintes não precisam
indicar deficiências. Há evidências que sugerem que alguns subgrupos da
população surda podem ter maior inteligência do que os ouvintes. Kusché,
Greenberg e Garfield (1983), por exemplo, examinaram a inteligência não verbal e
o aproveitamento da língua em quatro grupos de alunos surdos do ensino médio:
um grupo os alunos tinham pelo menos um pai surdo e evidência de surdez
hereditária, os alunos tinham pais ouvintes, mas também irmãos ou primos
surdos e outras indicações de surdez genética; dois grupos com pais ouvintes e
nenhuma evidência de surdez genética, cada um desses grupos foi combinado
com um dos grupos com surdez genética quanto à idade, perda auditiva e escores
de desempenho. Kusché, Greenberg e Garfield (1983) descobriram que os dois
grupos com surdez genética tinham escores de inteligência significativamente
maiores do que os grupos pareados com surdez não genérica; como apenas um dos

142
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

grupos geneticamente surdos teve pais ouvintes, Kusché, Greenberg e Garfield


(1983) descartaram os efeitos da exposição anterior à língua como fonte dessas
diferenças. Em vez disso, eles sugeriram que “é possível que a seleção natural,
cultural e/ou histórica tenha resultado em inteligência não verbal superior para
surdos quando etiologias genéticas estão envolvidas” (KUSCHÉ; GREENBERG;
GARFIELD, 1983, p. 464).

Em apoio às conclusões de Kusché, Greenberg e Garfield (1983), Maller e


Braden (2011) apontaram para pesquisas inéditas indicando que crianças surdas
que testaram positivo para mutações no gene Conexina-26 tiveram escores mais
altos de inteligência do que crianças surdas que não tinham tais mutações. O gene
Conexina-26 é reconhecido como relacionado a perdas auditivas hereditárias
(ARNOS; PANDYA, 2011) e o tamanho do efeito foi consistente com as descobertas
de Kusché, Greenberg e Garfield (1983). Embora esses resultados sugiram uma
vantagem intelectual genética para alguns surdos, Zweibel (1987) argumentou
que fatores ambientais explicam os achados relacionados. Ele administrou testes
de inteligência para 243 crianças entre as idades de 6 e 14 anos, 94% apresentavam
perdas auditivas congênitas.

Zweibel (1987) descobriu que crianças surdas com pais ou irmãos surdos
(sugerindo surdez genética) tiveram uma pontuação significativamente maior em
dois testes de inteligência não verbal do que crianças surdas com pais ouvintes e
irmãos ouvintes. Um subgrupo de crianças com pais surdos e irmãos surdos não
diferiu de um grupo auditivo de comparação em um teste. Para Zweibel (1987),
crianças surdas com pais surdos obtiveram escores mais altos de inteligência do
que crianças geneticamente surdas com pais ouvintes, mas com irmãos surdos.
Ele concluiu que o background genético não faz diferença na inteligência, mas
que o uso da língua de sinais no lar facilita a aprendizagem, levando a ganhos
subsequentes no desenvolvimento cognitivo.

As conclusões de Zweibel (1987) foram consistentes com os achados


anteriores de Sisco e Anderson (1980), indicando maior inteligência não verbal
em crianças surdas com pais surdos em comparação com os pais ouvintes. Eles
também haviam interpretado suas descobertas em termos de fatores ambientais,
sugerindo que os pais surdos têm expectativas mais altas para seus filhos em
relação ao potencial de sucesso educacional. Como vimos nos tópicos anteriores,
no entanto, há uma série de diferenças entre crianças surdas com pais surdos e
aquelas com pais ouvintes. Muitas dessas diferenças provavelmente giram em
torno do acesso a modelos de línguas fluentes, mas também parece haver algumas
interações da língua e a cognição que influenciarão tanto o desenvolvimento
quanto a aprendizagem. Vamos, portanto, voltar-nos para as interações da
cognição, da aprendizagem e da língua, com vistas a entender como podemos
precisar modificar nossos métodos e materiais na sala de aula para melhor apoiar
o desempenho acadêmico das crianças surdas.

143
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

DICAS

Leia o Capítulo 9, Desenvolvimento e educação das crianças surdas, do


livro Desenvolvimento psicológico e educação 3: transtornos do desenvolvimento e
necessidades educativas especiais de César Coll, Álvaro Marchesi e Jesús Palacios (2007),
para aprofundar a discussão sobre a inteligência, educação e as crianças surdas.

3 ATENÇÃO VISUAL E COGNIÇÃO VISUAL


As pessoas, às vezes, presumem que os deficientes visuais ouvem melhor
do que os que enxergam, e que, pessoas com deficiência auditiva enxergam
melhor do que os ouvintes. Essa noção de compensação sensorial parece basear-
se no pressuposto de que temos uma quantidade limitada de capacidade de
percepção e que, se não estiver sendo usada para uma coisa, ela pode ser usada
para outra. Se um sentido está parcial ou completamente ausente, existem três
possibilidades: 1) os sentidos remanescentes assumem parte dessa capacidade
e, assim, melhoram; 2) sem a contribuição de um dos sentidos, os outros não
se desenvolvem ou funcionam tão bem quanto podiam; 3) não faz diferença
para os outros sentidos. Estudos envolvendo indivíduos surdos sugeriram que
talvez todas essas alternativas sejam verdadeiras em algumas áreas e até certo
ponto. Não há um aumento geral da visão, percepção visual ou habilidades de
processamento visuoespacial em indivíduos surdos, no entanto; na verdade, eles
são mais propensos a ter problemas de visão do que indivíduos ouvintes (GUY
et al., 2003).

Se os alunos surdos não tiverem uma vantagem visual generalizada sobre


os aprendizes ouvintes, a modalidade visual é certamente importante para eles.
Dependendo da tarefa visuoespacial específica envolvida, eles demonstram
ter um desempenho melhor, pior ou o mesmo que os indivíduos ouvintes. Por
exemplo, adultos surdos que usam a língua de sinais apresentam desempenho
relativamente melhor em relação aos indivíduos ouvintes, e surdos que usam a
língua falada em suas habilidades para mudar rapidamente a atenção visual e
escanear estímulos visuais (RETTENBACK; DILLER; SIRETEANU, 1999) e detectar
movimento na periferia visual (CORINA; KRITCHEVSKY; BELLUGI; 1992). Dye,
Hauser e Bavelier (2008) argumentam que tais achados não são indicativos de
melhor ou pior atenção visual, mas de uma diferença na alocação da atenção,
ou seja, os indivíduos surdos apresentam maior atenção em locais periféricos,
enquanto os indivíduos ouvintes se concentram mais no centro do campo visual.
Essa atenção periférica aprimorada não ocorre em usuários (ouvintes) nativos
da língua de sinais, portanto, não é o uso de uma língua visuoespacial per se que
modifica o sistema de atenção. Esses achados refletem o fato de que a privação
auditiva desde o nascimento tem um efeito importante no desenvolvimento do
sistema visual (PROKSCH; BAVELIER, 2002).

144
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

Simplificando, as crianças surdas têm que dedicar mais atenção do que as


crianças ouvintes ao ambiente visual para saber o que está acontecendo, elas têm
mais de seus cérebros dedicados à visão periférica do que os ouvintes (NEVILLE;
LAWSON, 1987). O que interessa aqui é como essas diferenças neurológicas afetam
outros aspectos da cognição (ou seja, efeitos neuropsicológicos). Por exemplo, a
maior sensibilidade dos surdos à periferia visual não significa necessariamente
que o que eles “veem” seja processado o suficiente para que as informações sejam
extraídas. No entanto, a sensibilidade aos estímulos visuais periféricos pode
oferecer às crianças surdas uma vantagem na medida em que permite que elas se
tornem conscientes dos eventos que outras crianças percebem ao ouvir. Também
pode levar a uma maior distração em ambientes visualmente ruidosos, mas não
parece haver nenhuma evidência de pesquisa de uma forma ou de outra.

Pelz, Marschark e Convertino (2008) compararam alunos surdos que eram


usuários nativos da língua de sinais, alunos surdos que dependiam exclusivamente
da língua falada e alunos ouvintes em sala de aula e tarefas relacionadas nas
quais diferentes fontes de informação visual eram separadas por diferentes
ângulos. Nem os surdos usuários da língua de sinais (NEVILLE; LAWSON,
1987) nem os surdos como um grupo (PROKSCH; BAVELIER, 2002) mostraram
alguma vantagem (ou desvantagem) sobre os alunos ouvintes em compreender
as informações apresentadas na periferia visual. Embora tais achados contrariem
as suposições feitas com base em estudos de detecção visual, eles são consistentes
com os resultados de investigações de interação mãe-criança, indicando que as
mães surdas não utilizam sinais com crianças jovens surdas a menos que haja
contato visual (MEADOW-ORLANS, SPENCER, KOESTER, 2004). De fato, as
mães de crianças surdas usam comportamentos direcionadores de atenção visual
e manutenção de atenção com crianças surdas e crianças pequenas que supõem
que não podem processar informações apresentadas na periferia (HARRIS;
CHASIN, 2005).

As descobertas acima mencionadas indicam que as diferenças visuais


entre crianças surdas e ouvintes começam cedo e refletem uma interação entre
ambiente e desenvolvimento cerebral. Indo além da sensibilidade a mudanças
no campo visual, o desempenho de crianças surdas em testes de atenção visual
sustentada, geralmente é pior do que o de crianças ouvintes (QUITTNER et al.,
1994). Esse achado foi interpretado por Dye, Hauser e Bavelier (2008, p. 253) de
uma maneira neutra em termos de valor como evidência de uma "redistribuição
de atenção [...] através do espaço visual", mas tem implicações claras para
a aprendizagem em sala de aula. No tópico anterior, descrevemos um estudo
de Matthews e Reich (1993) que examinou a comunicação nas aulas do ensino
médio em uma escola para surdos, um cenário em que se esperaria que as pessoas
fossem sensíveis às necessidades de comunicação visual. Eles descobriram que,
quando os alunos estavam usando a língua de sinais, os colegas só olhavam para
eles cerca de 30% do tempo. Quando os professores estavam usando a língua de
sinais com a turma, os alunos olhavam para eles em média apenas 44% do tempo,
apenas um pouco menos do que quando eles eram o alvo da comunicação de um

145
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

professor (50%). Matthews e Reich argumentaram que a falta de comunicação


visual efetiva na sala de aula poderia explicar parte do desempenho acadêmico
relativamente pobre dos alunos surdos.

Marschark et al. (2005) examinaram a alocação da atenção visual de alunos


surdos em salas de aula regulares que incluíam um instrutor, um intérprete e uma
exibição visual (ou seja, exigindo mudança constante de atenção visual ou um
campo de atenção mais amplo). Os alunos surdos que cresceram usando a língua
de sinais e os que cresceram com a língua falada mostraram os mesmos padrões
de atenção visual e níveis comparáveis ​​de compreensão, apesar das suposições
dos estudos de visão periférica de que os surdos usuários da língua de sinais
experientes teriam uma vantagem. Outro de seus experimentos, envolvendo
intérpretes ingleses da Língua de Sinais Americana (ASL) bilíngues, produziu
uma observação que pode ajudar a explicar esses resultados. Nesse experimento,
os intérpretes ouvintes assistiram a uma palestra interpretada sem áudio e uma
palestra com áudio, mas sem interpretar. No geral, não houve diferença em sua
compreensão/aprendizagem nas duas modalidades. Os investigadores notaram,
no entanto, que os participantes (ouvintes) nunca desviaram o olhar do intérprete,
relatando mais tarde que sabiam que isso resultaria na perda de algumas das
informações. Essa estratégia bastante óbvia contrastava com o comportamento
dos alunos surdos no estudo bem como com o que é visto entre os alunos
surdos em geral, quando eles frequentemente olham para longe dos intérpretes
e instrutores em sala de aula por períodos prolongados (MATTHEWS; REICH,
1993). Esse comportamento sugere três possibilidades: 1) por causa de suas
habilidades visuoespaciais aprimoradas, os alunos surdos conseguem desviar o
olhar da comunicação em sala de aula sem perder muita informação; 2) os alunos
surdos são capazes de desviar o olhar da comunicação em sala de aula sem perder
muita informação, porque possuem maior capacidade visual de preencher as
lacunas; 3) os alunos surdos não conseguem desviar o olhar da comunicação em
sala de aula sem perder muita informação (em relação aos pares ouvintes), mas
eles podem não saber disso. Consideramos essa questão mais adiante em uma
seção posterior.

Indivíduos surdos que usam a língua de sinais demonstraram ter outras


vantagens visuoespaciais em relação aos indivíduos ouvintes, tais como aumento
da capacidade de discriminação facial e capacidade de manipulação mental
(EMMOREY, 2002). Bettger et al. (1997), no entanto, mostraram que tais habilidades
levam tempo para se desenvolver. A discriminação facial entre crianças surdas
(com idade entre 6 a 9 anos) de pais ouvintes não foi melhor do que a de crianças
ouvintes com pais ouvintes, de fato foi um pouco menor. Na idade adulta, os
surdos tiveram um desempenho igualmente bom, independente do status da
audição parental, presumivelmente como resultado da experiência visual e da
“religação” neurológica relacionada. Então, novamente, vemos a adaptação e a
experiência afetando as habilidades visuais das crianças surdas. Marschark et
al. (2013) descobriram que existem limites para essa adaptação. Usando uma
bateria de sete tarefas visuais-espaciais, cinco das quais foram tiradas dos Testes

146
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

de Habilidades Cognitivas Woodcock-Johnson III (WJ-III), eles descobriram


que estudantes universitários ouvintes tinham desempenho tão bom quanto ou
melhor do que os alunos surdos.

Questões teóricas e de pesquisa à parte, Simms e Thumann (2007) e


Marschark e Hauser (2012) argumentaram que os educadores focaram, por muito
tempo, os déficits supostamente resultantes da falta de audição e recomendaram
que os currículos fossem organizados para fazer o melhor uso da informação
visual e processamento visual. Permanece, no entanto, que crianças surdas e
com deficiência auditiva são propensas a distrações em ambientes educacionais
por atividades no campo visual periférico. Dye, Hauser e Bavelier (2008, p. 260),
portanto, sugeriram que a aprendizagem pode ser melhor apoiada ao fornecer às
crianças surdas um ambiente visualmente previsível, organizado de modo que
os alunos com perda auditiva possam ver o professor e seus colegas em todos os
momentos. Em contraste com as opiniões de alguns (EVANS, 2004) e a situação
em muitos programas integrados, isso argumentaria contra um grande número
de alunos surdos em uma sala de aula.

Finalmente, apesar das alegações sobre as vantagens visuoespaciais dos


alunos surdos, depender apenas da visão tem claramente suas desvantagens. É
comumente reconhecido que as informações apresentadas verbalmente (em fala
ou em sinais) a alunos surdos em uma situação instrucional, devem ser estimuladas
para permitir que os alunos tenham tempo de desviar o olhar de que está falando
ou usando sinais para atender a quaisquer recursos visuais apresentados como
informações de apoio. Na maioria dos casos, essa necessidade faz com que os
professores progridam mais lentamente através de uma determinada quantidade
de informações do que em uma situação apenas com alunos ouvintes. Na sala
de aula regular, os professores simplesmente podem não estar dispostos ou não
conseguirem se lembrar desse tempo extra (algo que observamos com professores
surdos e ouvintes). Se o fizerem, é provável que menos informações possam ser
cobertas do que seria o caso na sala de aula apenas com alunos ouvintes. Em ambos
os casos, os alunos surdos adquirem menos informação. Sem outras estratégias ou
oportunidades que compensem essa situação (por exemplo, estudantes recebendo
aulas particulares em outros momentos), não há solução óbvia para esse dilema.
Mesmo que os alunos surdos recebam o tempo para comparecer sequencialmente
ao professor/intérprete e aos materiais visuais relacionados, eles terão que
depender mais da memória de trabalho, potencialmente levando à sobrecarga
cognitiva. Eles também estarão menos propensos a se engajar em processamento
relacional comparado aos alunos ouvintes que podem olhar para uma exibição
visual enquanto o instrutor fala sobre isso, uma situação que realmente resulta
em melhor aprendizagem (MAYER; MORENO, 1998). Vamos, portanto, voltar-
nos para a memória e processos relacionados envolvidos na aprendizagem.

147
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

4 MEMÓRIA E APRENDIZAGEM
Sabe-se há mais de 100 anos que os surdos se lembram menos do que
os indivíduos ouvintes em tarefas de extensão (span) da memória envolvendo
materiais verbais e não verbais. Embora esses achados já tenham sido apontados
como indicadores de déficits intelectuais em pessoas surdas, estudos recentes
indicaram que esses achados estão mais relacionados à modalidade de língua
primária de um indivíduo do que seu estado auditivo (HALL; BAVELIER, 2010).
Os alunos surdos que possuem habilidades fonológicas e de fala relativamente
fortes tendem a usar estratégias de codificação fonológica ou temporal adequadas
para tarefas de memória sequencial, e têm maiores extensões de memória
(LICHTENSTEIN, 1998). Aqueles que dependem principalmente da língua de
sinais são mais propensos a usar estratégias de codificação visuoespaciais que são
menos apropriadas para a retenção de sequências, mas podem ser mais eficazes
para lembrar locais no espaço. Todman e seus colegas (TODMAN; COWDY,
1993; TODMAN; SEEDHOUSE, 1994) descobriram que as crianças surdas tinham
melhor memória do que as crianças ouvintes por figuras visuais complexas, mas
a vantagem desapareceu quando as partes que compunham as figuras tinham
que ser lembradas em sequência. Tais achados e sua própria demonstração de
que a memória de espaço visuoespacial é tão boa quanto ou melhor em surdos
usuários da língua de sinais do que em falantes ouvintes, levaram Hall e Bavelier
(2010) a argumentar que as tarefas de memória sequencial são inerentemente
tendenciosas contra surdos usuários da língua de sinais e que tarefas de memória
de trabalho separadas deveriam ser utilizadas para surdos e ouvintes.

O que devemos fazer se um aluno surdo tiver problemas na memória


de trabalho? Se os professores monitoram os alunos regularmente e identificam
problemas de memória de trabalho, há duas maneiras de prosseguir
(GATHERCOLE; ALLOWAY, 2008). A primeira é oferecer suporte a aulas,
estruturando seu ensino de forma a prevenir ou reduzir a sobrecarga de memória.
Isso pode ser feito, por exemplo, limitando a quantidade de dados (informações)
a serem armazenados usando sentenças mais curtas ou problemas matemáticos
que exijam menos etapas a serem resolvidas. Os professores também podem
apoiar a memória de trabalho, apresentando ajudas de memória externa, como
gráficos nas paredes de uma sala de aula, lembrando aos alunos informações
importantes ou até mesmo estratégias de memória. Repetição de informações
também é uma forma de apoio em sala de aula.

Outra maneira de remediar ou evitar dificuldades de memória de


trabalho é oferecendo aos alunos treinamento explícito de memória. A memória
de trabalho é uma das três principais funções executivas (FEs), juntamente
à inibição e a flexibilidade cognitiva. A revisão de Diamond (2012) da eficácia
de várias abordagens de treinamento sugeriu que o funcionamento executivo
pode ser treinado por exercícios físicos de autocontrole em combinação com
desenvolvimento de caráter ou com abordagens de mindfulness, combinações
encontradas em atividades como tae kwon do ou yoga. Diamond (2012, p. 338)
especulou que “os programas que melhorarão com sucesso as FEs são aqueles que

148
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

desafiam as FEs e trazem alegria e orgulho às crianças, dão a elas um sentimento


de inclusão e pertencimento social e ajudam seus corpos a serem fortes, ajustados​​
e saudáveis”.

O treinamento do funcionamento executivo, incluindo a memória de


trabalho, faz parte dos currículos escolares, como o programa PATHS ou o
Tools for Mind. O treinamento em informática, em particular, pode ser útil para
melhorar a memória de trabalho. Diamond (2012) apontou que o programa de
treinamento Cogmed (KLINGBERG et al., 2005) demonstrou sucesso em jovens
ouvintes, e os efeitos foram retidos por meses após o treinamento e generalizados
da memória para a matemática. Kronenberger et al. (2011) conduziram um
estudo piloto a respeito dos efeitos do treinamento Cogmed sobre habilidades de
memória de trabalho e repetição de sentenças em nove alunos surdos, com idades
entre 7 e 15 anos, todos os quais receberam implantes cocleares antes dos três
anos de idade. Após o treino em computadores domésticos, durante um período
de cinco semanas, a memória de trabalho verbal e não verbal e a repetição de
frases melhoraram significativamente. Seis meses após o treinamento, descobriu-
se que um terço de todos os participantes mantiveram as melhorias. A repetição
da sentença foi a variável que melhorou mais, tanto imediatamente quanto após
seis meses do treinamento.

Outro aspecto do funcionamento executivo relacionado à memória que


difere entre aprendizes surdos e ouvintes é o uso de informações contextuais
(disponíveis na memória de trabalho) ou conhecimento prévio (disponível a partir
da memória de longo prazo). Por exemplo, observou-se que os alunos surdos
não utilizam o conhecimento prévio que sabemos que eles têm em situações
em que seria útil (MARSCHARK; ​​EVERHART, 1999). Da mesma forma, eles,
frequentemente, deixam de relacionar ou integrar informações individuais para
formar conceitos e identificar relacionamentos durante a leitura (BANKS; GRAY;
FYFE, 1990) ou resolver problemas matemáticos (ANSELL; PAGLIARO, 2006).
Marschark e Wauters (2011) observaram que essa relativa falta de processamento
relacional automático é consistente com achados similares de uma variedade
de estudos de memória e resolução de problemas e pode representar um estilo
geral de processamento de informações característico de alunos surdos – um
que pode ter efeitos específicos na aprendizagem. Uma revisão de Ottem (1980),
por exemplo, mostrou que crianças e adultos surdos tiveram um desempenho
menor do que ouvintes quando tarefas cognitivas exigiam o relacionamento ou
a integração de múltiplos conceitos, dimensões de estímulos ou informações.
Atividades como categorização por características únicas (por exemplo, cor ou
tamanho) foram realizadas de forma semelhante por adultos e crianças surdos
e ouvintes, mas as atividades que exigiam manter mais de uma característica
em mente (por exemplo, cor e tamanho) foram melhor realizadas pelas pessoas
ouvintes do que pessoas surdas.

Descobertas de diferenças nas maneiras como alunos surdos e ouvintes


abordam situações de solução de problemas também podem refletir diferenças
no conhecimento de background que adquiriram por meio da aprendizagem

149
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

incidental. McEvoy, Marschark e Nelson (1999) demonstraram diferenças


significativas na organização do conhecimento conceitual entre alunos surdos
e ouvintes, com alunos surdos tendo conexões mais fracas entre conceitos
relacionados como “treinar” e “acompanhar”. Marschark et al. (2004) verificaram
ainda que, embora a categoria pertencente a um objeto familiar seja tão saliente
para estudantes surdos quanto para ouvintes, ao que tudo indica, os alunos surdos
têm menor probabilidade de ativar automaticamente membros da categoria de
alta frequência (cavalo, cachorro, pássaro) na memória quando encontram um
nome de categoria (animal). Essa diferença de processamento de informações
afetaria não apenas a compreensão de leitura dos alunos surdos, mas também
seu desempenho de memória e resolução de problemas.

Esse tipo de processamento top-down (de cima para baixo),


frequentemente descrito com relação à leitura, é um componente essencial não
apenas da compreensão da língua, mas também da resolução de problemas e da
aprendizagem de maneira mais geral. Na medida em que a excitação ou aplicação
de conhecimento prévio é menos automática para surdos do que ouvintes, seu
desempenho será prejudicado. Ainda não está claro se essa diferença se relaciona
com os atrasos das crianças surdas no desenvolvimento da linguagem (BEBKO,
1998) ou se representa uma diferença geral no modo como os surdos lidam
com a informação no mundo. A diferença pode ser o resultado da dependência
primária de visão dos indivíduos surdos, em vez de visão e audição, e a visão e
a audição integradas dos indivíduos ouvintes, começando no nascimento. Isso
levanta a questão de até que ponto o processamento relacional durante a leitura
e a solução de problemas pode ser ensinado/aprendido, particularmente quando
é que a automaticidade em tal processamento é necessária para a compreensão
e a aprendizagem? Para responder a essa questão, precisamos olhar para o
funcionamento executivo mais de perto.

5 FUNCIONAMENTO EXECUTIVO E METACOGNIÇÃO


Uma série de diferenças entre o funcionamento cognitivo típico de
crianças com e sem perda auditiva foram discutidas anteriormente. Em alguns
casos, como a incapacidade de uma criança reconhecer a falta de compreensão,
as diferenças podem ser vistas como fraquezas, pelo menos em termos das
ferramentas necessárias para o sucesso acadêmico. Outras instâncias, como
memória aprimorada para informações visuais e espaciais versus informações
sequenciais, são claramente pontos fortes e não fracos. Em ambos os domínios,
verbal e não verbal, no entanto, há uma tendência para os alunos surdos
enfrentarem dificuldades na integração da informação, muitas vezes não
reconhecendo quando a compreensão conceitual ou linguística foi quebrada, às
vezes, empregando estratégias de atenção visual focada que fornecem menos
informações do que está disponível. Felizmente, o fato de os alunos surdos
demonstrarem tal conhecimento conceitual e procedimental em outros contextos
sugere o potencial para melhorar seu desempenho em tarefas formais e informais.

150
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

O funcionamento executivo geralmente se refere a um nível mais alto de


funcionamento cognitivo que controla e utiliza atividades de nível inferior, como
atenção e memória. As funções executivas incluem metacognição (por exemplo,
pensar sobre o pensamento) e regulação comportamental (por exemplo, controle
de emoções, pensamentos e comportamentos). A linguagem desempenha um
papel central no funcionamento executivo, cada vez mais, à medida que as
crianças se tornam mais capazes de controlar seu comportamento por meio da
internalização da linguagem (consciente ou inconscientemente). O fato de muitas
crianças surdas apresentarem cada vez mais atrasos na linguagem apropriada
à idade, à medida que envelhecem, significa que também pode haver cada vez
mais atrasos no funcionamento executivo. No entanto, a necessidade de um
funcionamento executivo eficiente também aumenta à medida que as crianças
crescem e a sala de aula se torna menos estruturada. Portanto, os alunos precisam
depender mais de recursos internos, controle e organização.

As funções executivas são talvez mais necessárias quando um aluno se


aproxima de uma nova tarefa com o mínimo de apoio de outras pessoas, uma
situação na qual tanto a inteligência quanto o conhecimento prévio são importantes.
Com o tempo, quanto mais as crianças se deparam com novas tarefas, melhor
elas se tornam em resoluções de problemas. De fato, inteligência é algumas vezes
definida como o ser capaz de aplicar conhecimento prévio a situações novas.
Como vimos, no entanto, as crianças surdas podem encontrar-se em ambientes
excessivamente estruturados em casa e na escola, recebendo mais assistência
na solução de problemas do que seus pares da mesma idade, independente de
precisarem deles. Quanto mais estrutura fornecida por pais e professores, menos
as crianças surdas terão que descobrir as coisas por si mesmas. Ambientes que são
muito estruturados não estimulam o desenvolvimento de funções executivas ou,
nesse sentido, o desenvolvimento da autoconfiança e autoestima de uma criança.
Se quisermos que as crianças surdas desenvolvam flexibilidade cognitiva e se
tornem aprendizes independentes, precisamos deixá-las enfrentar os desafios
(apropriados) por conta própria. Isso é verdade não apenas na sala de aula, mas
também em outros contextos de aprendizagem e interações sociais.

Assim como os alunos surdos talvez não apreciem a necessidade de aplicar


conhecimento prévio ou considerar múltiplas dimensões do problema ao mesmo
tempo, parece que eles podem não monitorar sua compreensão e aprendizagem
com a mesma frequência ou precisão que seus pares ouvintes. Os alunos surdos
na sala de aula frequentemente não entendem e aprendem tanto quanto eles (e
nós) pensamos que eles o fazem (BORGNA et al., 2011). Essa superestimação
ocorre não apenas quando estão lendo, mas também quando estão recebendo
informações via língua de sinais ou língua falada. Além disso, Morrison et al.
(2013) descobriram que, tanto na leitura quanto na sala de aula, os alunos surdos
têm menos probabilidade do que os alunos ouvintes de saber como reparar erros
perdidos ou erros de comunicação. Juntamente a seus vocabulários menores e
tendências para não se envolver tanto no processamento top-down, tais achados
sugerem que as dificuldades dos alunos surdos com a leitura não são apenas sobre

151
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

leitura (MARSCHARK et al., 2009). Em vez disso, a falha em reconhecer quando a


compreensão é bem-sucedida ou não, sugere um problema com a metacognição
em vez de um problema relacionado a uma modalidade em particular.

Uma variedade de estudos examinou as estratégias metacognitivas de


leitura de alunos surdos, geralmente achando que eles ficam muito atrasados​​
tanto na qualidade quanto na quantidade das estratégias empregadas em
comparação com os pares ouvintes (ANDREWS; MASON, 1991; SCHIRMER,
2003; SCHIRMER; BAILEY; LOCKMAN, 2004). Outros estudos examinaram
o monitoramento de compreensão e conscientização de alunos surdos sobre
quando e por que ele se decompõe. Embora estudantes universitários ouvintes
tenham sido encontrados mais acurados que seus pares surdos na avaliação de
sua aprendizagem em sala de aula, estudos semelhantes não parecem ter sido
realizados com crianças, mas há várias investigações sobre aspectos específicos
da percepção de dificuldades de compreensão durante a leitura por parte de
alunos surdos.

Gibbs (1989), por exemplo, examinou o reconhecimento dos alunos


surdos de problemas que afetam a compreensão, como inconsistências internas e
inconsistências com o conhecimento do mundo. Menos da metade dos problemas
relacionados à compreensão foram identificados pelos jovens de 16 a 19 anos.
Achados semelhantes foram obtidos com estudantes universitários surdos por
Kelly, Albertini e Shannon (2001) e Borgna et al. (2011), que os encontrou pobres
na identificação dos principais pontos das passagens, conforme determinado
pelos investigadores, instrutores ou outros estudantes. Apenas cerca de 50%
dos alunos do estudo de Kelly, Albertini e Shannon (2001) foram capazes de
identificar as ideias principais, consideravelmente melhor do que o desempenho
observado por Borgna et al. (2011) com materiais mais difíceis (nível universitário
em vez de nível secundário). Todavia, menos de 25% dos alunos do estudo de
Kelly, Albertini e Shannon (2001) responderam corretamente às perguntas de
forma suficiente para indicar que eles entendiam as principais informações de
conteúdo, consideravelmente abaixo dos alunos surdos e ouvintes no estudo de
Borgna et al. (2011), Kelly, Albertini e Shannon (2001) procurou treinar os alunos
para monitorar melhor sua compreensão, revisando estratégias metacognitivas
eficazes, mas sua intervenção não melhorou muito o desempenho.

Mousley e Kelly (1998), em contraste, demonstraram o potencial do


treinamento metacognitivo para alunos surdos em uma tarefa não verbal de
resolução de problemas. Três experimentos envolveram o problema da Torre de
Hanói, uma tarefa que requer várias ações para organizar anéis em um conjunto
de pinos em uma ordem específica. Em um experimento, os pesquisadores
exigiram que os alunos surdos levassem pelo menos dois minutos para visualizar
as etapas envolvidas na solução da tarefa. Os alunos que receberam as instruções
de visualização solucionaram o problema em movimentos significativamente
menores do que os de um grupo de comparação não instruído. Mousley e Kelly
(1998) concluíram que o processo de visualização incentivava o planejamento e

152
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

reduzia o número de movimentos impulsivos e não reflexivos. Uma intervenção


semelhante mostrou-se bem-sucedida na resolução de problemas de matemática.
Essa intervenção envolveu as estratégias de modelagem de professores para
resolver um problema de matemática, explicando seu pensamento enquanto
ele passava pela solução do problema passo a passo. Os alunos que receberam
a intervenção foram capazes de generalizar as etapas de solução de problemas
para problemas matemáticos semelhantes. Coerente com as observações já feitas,
o estudo de Mousley e Kelly demonstrou que os alunos surdos não utilizam
frequente e suficientemente as funções executivas e estratégias metacognitivas
durante a resolução de problemas, mas podem fazê-lo. Não se sabe se isso é uma
função de uma falha em adequar as estratégias às situações problemáticas ou se é
difícil aplicá-las efetivamente.

Martin e Jonas (1986) e Martin, Craft e Sheng (2001) também procuraram


treinar habilidades metacognitivas de alunos surdos, mas usaram uma
intervenção mais generalizada. Eles adotaram o programa Enriquecimento
Instrumental (EI) desenvolvido por Feuerstein (1980) e o usaram com estudantes
nos Estados Unidos, no Reino Unido e na China. O programa de EI envolve uma
variedade de atividades, como fazer comparações entre partes, projetar relações
visuais, identificar relações espaciais, seguir instruções e configurar sistemas
de classificação, todos os domínios em que alunos surdos têm demonstrado
dificuldade. A intervenção no estudo de 1986 durou dois anos, com professores
incorporando as atividades e discussões metacognitivamente orientadas sobre
estratégias de resolução de problemas em aulas pelo menos duas vezes por
semana. Em comparação com os alunos que não receberam a intervenção,
os alunos que passaram pelo programa de EI mostraram ganhos em leitura,
computação matemática e conceitos, e inteligência não verbal de acordo com as
Matrizes Progressivas de Raven Padrão. Uma versão abreviada da intervenção
no estudo de 2001 foi realizada na China e na Inglaterra. Os alunos surdos nos
dois países obtiveram ganhos no teste de Raven e mostraram avanços em seu
pensamento crítico para a solução de problemas. Professores nos dois países
relataram que os estudantes que receberam a intervenção fizeram mais perguntas
em níveis cognitivos mais altos, foram mais atentos nas aulas e estavam mais
propensos a usar o vocabulário relacionado à cognição.

6 COGNIÇÃO SOCIAL E TEORIA DA MENTE


A descoberta de Martin e seus colegas (MARTIN; JONAS, 1986; MARTIN;
CRAFT; SHENG, 2001) de que o treinamento cognitivo levou os alunos surdos a se
envolverem na sala de aula em um nível um pouco mais elevado tem implicações
além da aprendizagem per se. Esses resultados também sugerem que os alunos
podem ter sido mais conscientes das intenções e expectativas dos professores,
fornecendo contribuições adicionais para o desenvolvimento cognitivo e o
progresso acadêmico. A capacidade metacognitiva de pensar sobre estados
mentais, como memórias, crenças, desejos e intenções – incluindo as expectativas
dos professores para os alunos em situações particulares – é um aspecto da

153
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

cognição social, conhecida como teoria da mente. Já vimos que, desde uma
idade muito jovem, as crianças geralmente são capazes de compreender crenças,
emoções e motivações de outras pessoas. Esse aspecto da cognição social é uma
pedra angular do estabelecimento de relações sociais, tanto dentro da família
quanto além dela. De fato, entender as emoções, os motivos, os pensamentos
e as crenças de cada um é tão importante quanto compreender as intenções e
declarações comunicativas de cada um.

O fato de que a proficiência na língua e as interações iniciais da língua


com outras pessoas parecem ser essenciais para o desenvolvimento da cognição
social e da teoria da mente, em particular, tornou essa área de interesse para os
pesquisadores que se concentram em crianças surdas. Nosso próprio interesse
na teoria da mente é a possibilidade de afetar as relações aluno-professor e a
aprendizagem em si, embora isso não tenha sido investigado explicitamente.
Outros estão mais interessados ​​nas ligações entre o desenvolvimento da linguagem
e a cognição social. Estudando a relação longitudinal entre a teoria da mente e o
desenvolvimento da proficiência em linguagem em crianças pré-escolares, por
exemplo, Astington e Jenkins (1999) descobriram que os dois estavam fortemente
correlacionados. A proficiência em linguagem previa a teoria da mente, mas a
relação não era recíproca. A descoberta de que as habilidades da teoria da mente
não previam a proficiência em linguagem levaram os autores a concluir que a
proficiência em linguagem é uma exigência para o desenvolvimento da teoria
da mente. Habilidades sintáticas podem ser especialmente importantes, pois
estruturas sintáticas como a complementação são necessárias para representar
crenças falsas linguisticamente. Descobertas de pesquisas relacionadas em vários
idiomas, no entanto, deixam isso em aberto (CHEUNG et al., 2004).

O estudo de Astington e Jenkins (1999) usou uma “tarefa de crença falsa em


mudança de localização”, a tarefa mais usada para avaliar a teoria da mente. Às
vezes, a tarefa envolve um objeto sendo colocado em um local, em vista tanto da
criança quanto de outra pessoa (ou fantoche). Depois que a outra pessoa/fantoche
sai da sala, a criança vê o objeto movido para outro local, em seguida, é perguntado
onde a pessoa/boneco ausente procurará o objeto depois de retornar à sala. Essa
tarefa, portanto, requer que a criança se lembre da sequência de eventos e, mais
importante, reconheça que a pessoa/fantoche ausente não viu o objeto movido e,
portanto, acredita que ainda está no local original (isto é, reconhecimento de uma
crença falsa). Uma segunda tarefa de crença falsa frequentemente usada envolve
um objeto inesperado (como um lápis) encontrado em um recipiente que parece
conter algo diferente (como doces). Ao descobrir esse “truque”, as crianças são
perguntadas se ficaram surpresas e o que outras crianças pensariam que estava
no recipiente.

Dada a sua importância para o estabelecimento de relações sociais, a teoria


da mente tem sido estudada bastante em crianças e adolescentes surdos. Devido
aos frequentes atrasos no desenvolvimento da linguagem e à relativa falta de
proficiência linguística na língua falada e na língua de sinais, parece plausível
que a aquisição da teoria da mente fosse adiada em comparação com os pares

154
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

ouvintes. Peterson e Siegal (2000) revisaram onze estudos sobre o desempenho de


crianças surdas em testes que medem a teoria da mente usando tarefas de crença
falsas. Eles descobriram que, mesmo entre as crianças surdas com inteligência
normal, há um atraso significativo no desenvolvimento da teoria da mente,
particularmente entre as crianças surdas com pais ouvintes. Considerando que
as crianças ouvintes normalmente adquirem a teoria da mente com a idade
de 4 a 5 anos, vários estudos indicaram que crianças surdas (de pais ouvintes)
podem não demonstrar isso até 2 a 12 anos depois. Segundo Peterson e Siegal
(2000), parece que o desenvolvimento da teoria da mente em crianças surdas
está relacionado à qualidade e quantidade de exposição à linguagem acessível
em casa durante a infância. Crianças surdas com pais surdos, portanto, obtêm
resultados notavelmente melhores em tarefas de crença falsa do que crianças
surdas de pais ouvintes, embora crianças surdas que usam a língua de sinais com
seus pais ouvintes tenham melhor desempenho do que aquelas que usam apenas
a língua falada (COURTIN, 2000).

6.1 PREDITORES DA TEORIA DO DESENVOLVIMENTO DA


MENTE EM CRIANÇAS SURDAS
Marschark e Knoors (2012) observaram que o desempenho bem-sucedido
em tarefas de crença falsa requer que as crianças reconheçam os estados
mentais dos outros e sejam capazes de prever o desempenho com base em tal
entendimento. Eles, portanto, argumentaram que uma criança pode ter uma
teoria da mente, mesmo que ela não passe por tarefas de crenças falsas. Odom,
Blanton e Laukhuf (1973), por exemplo, demonstraram que crianças surdas de 7
a 12 anos podiam identificar expressões faciais de emoções específicas tão bem
quanto crianças ouvintes, mas as crianças surdas não eram capazes de prever
qual estado mental a emoção resultaria de uma sequência de eventos retratada,
demonstrando uma defasagem no desenvolvimento da teoria da mente.
Marschark et al. (2000) estudaram a teoria da mente examinando as histórias
contadas por crianças surdas matriculadas em uma escola de comunicação total
e aquelas contadas por pares ouvintes. As crianças surdas utilizavam a língua de
sinais como principal meio de comunicação e tinham pais ouvintes. As histórias
foram contadas através de sinais ou faladas e gravadas em vídeo. Os jovens de
9 a 15 anos tiveram que contar histórias sobre temas de fantasia a partir de sua
própria perspectiva, mas envolvendo relações com outros indivíduos, incluindo
assim a possibilidade de atribuir estados mentais a outros. Em contraste com os
achados de Peterson e Siegal (2000), Marschark et al. (2000) descobriram que as
crianças surdas produziam mais referências a estados mentais em suas histórias
do que as crianças ouvintes; não houve efeitos da idade em nenhum dos grupos.
Os autores concluíram que o uso de metodologias mais abertas pode revelar
uma maior capacidade de teoria da mente entre crianças surdas. Descobertas e
conclusões semelhantes também foram obtidas por Rhys-Jones e Ellis (2000), que
utilizaram narrações de histórias com alunos de escolas primárias e secundárias,
e Rieffe e Terwogt (2000), que pediram aos surdos de 6 e 10 anos que explicassem
os sentimentos de personagens nas histórias.
155
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

Esses achados não excluem a possibilidade de as crianças surdas diferirem


dos pares ouvintes no desenvolvimento de outros aspectos da teoria da mente.
Com base em um estudo com 93 crianças australianas entre 5 anos e 10 meses e 13
anos e 6 meses, das quais 39 eram surdas, Peterson e Wellman (2009) mostraram
que as diferenças no desenvolvimento da teoria da mente não estão relacionadas
à estrutura ou conteúdo de suas teorias da mente, tanto quanto a taxa de sua
emergência. Crianças surdas e crianças ouvintes passam pelos mesmos estágios
de desenvolvimento da cognição social, assim como os pares ouvintes o fazem
através de uma variedade de línguas e culturas. A taxa de desenvolvimento entre
crianças surdas, no entanto, é mais lenta na maioria dos casos, mas não em todos.

Observamos anteriormente que as crianças surdas com pais surdos


apresentam melhor desempenho em tarefas de teoria da mente do que crianças
surdas com pais ouvintes. Estudos de Peterson e Siegal (2000) e Courtin (2000)
obtiveram resultados indicando que crianças surdas de pais surdos, pelo menos
entre 5 e 10 anos de idade, tiveram pontuação significativamente maior em tarefas
de teoria da mente que crianças surdas filhos de pais ouvintes. Trata-se de usar
a língua de sinais ou de os pais surdos serem mais capazes de se comunicar com
seus filhos sobre emoções e situações que evocam emoções específicas? Woolfe,
Want e Siegal (2002) estudaram o desempenho da tarefa de crença falsa entre
60 crianças surdas britânicas, com idades variando de 4 a 8 anos. Um terço das
crianças eram usuários da língua de sinais nativos com pais surdos; 40 eram
usuários da língua de sinais tardios ​​com pais ouvintes. As crianças nativas na
língua de sinais superaram os usuários da língua de sinais tardios na tarefa da
teoria da mente, apesar de serem significativamente mais jovens. Esse resultado
foi confirmado em um segundo estudo, com os mesmos grupos, contudo com
crianças mais velhas. Não foram encontradas diferenças no funcionamento
executivo entre os grupos, alimentando a ideia de que o funcionamento executivo
não poderia explicar as diferenças observadas na teoria da mente no primeiro
estudo. De acordo com Peterson e Siegal (2000), os autores apontaram para a
importância da proficiência sintática para a realização de várias tarefas de teoria
da mente, embora a alternativa de comunicação social permaneça viável.

Os achados de Woolfe, Want e Siegal (2002) foram confirmados por Morgan


e Kegl (2006). Eles estudaram 22 surdos da Nicarágua, na faixa etária de 7 a 39
anos, que aprenderam a língua de sinais nicaraguense em diferentes idades. Eles
foram testados em uma tarefa de crença falsa e em uma tarefa de recontagem em
que tiveram que contar o que aconteceu em um desenho não verbal. A exposição
tardia à língua de sinais foi associada a déficits sérios e duradouros na cognição
social, medida tanto pela tarefa de crença falsa quanto pela tarefa de recontagem.
Morgan e Kegl (2006) concluíram que a idade de 10 anos marca uma idade crucial
em relação à exposição à língua de sinais para o desenvolvimento da teoria da
mente.

A importância da introdução de linguagem rica e precoce para o


desenvolvimento da teoria da mente também foi enfatizada em um estudo em
grande escala de Schick et al. (2007). O estudo examinou a teoria da mente em 176

156
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

crianças surdas com idades entre 3 anos 11 meses e 8 anos 3 meses e 40 crianças
ouvintes que serviram como grupo de comparação. As crianças surdas usavam
Língua de Sinais Americana (ASL) ou inglês falado. A bateria de testes incluía
tarefas de inteligência não verbal, raciocínio de falsas crenças e proficiência de
linguagem. As tarefas de crença falsa incluíam a tarefa de mudança na localização
e a tarefa de conteúdo inesperado descrita anteriormente. As crianças nativas
no uso da língua de sinais com pais surdos e as crianças ouvintes tiveram um
desempenho similar nas tarefas de teoria da mente, e ambos os grupos superaram
significativamente as crianças surdas com pais ouvintes. Aos 7 anos, no entanto,
as crianças surdas de pais ouvintes, depois de serem expostas intensamente à
ASL por vários anos, pareciam estar alcançando os usuários da língua de sinais
nativos. Idade e a capacidade de processar e lembrar uma estrutura sintática
específica – clausulas falsas de complemento com verbos de comunicação como
"Ela disse à menina que havia um inseto em seu cabelo" (quando uma foto
acompanhante mostrava que era apenas uma folha) – são preditores independentes
de desempenho nas tarefas de falsas crenças. A habilidade gramatical geral, no
entanto, não previu desempenho. Isto está em contraste marcante com outros
estudos que apontaram para uma relação entre a proficiência geral da língua e a
teoria da mente (HAO; SU; CHAN, 2010).

Além de falsos complementos com verbos de comunicação, a única


construção sintática examinada em profundidade, e o único outro preditor
linguístico da teoria da mente no estudo de Schick et al. (2007) era o vocabulário.
Segundo os autores, “é possível que algum tipo de semântica lexical e a sintaxe
particular do complemento contribuam independentemente como bootstraps
(desenvolver algo através de iniciativa própria com um mínimo de auxílio
externo) representacionais para uma (teoria da mente) madura” (SCHICK et al.,
2007, p. 392). Aparentemente, o raciocínio mental necessário para uma resposta
correta na tarefa da crença falsa não pode ser alcançado pela observação apenas
de cenas visuais. As crianças precisam ter acesso ao discurso de mudança de
perspectiva e complementar a sintaxe, em particular parece contribuir para o
desenvolvimento do raciocínio mental, ao passo que a modalidade de língua não
importa. Ter acesso suficiente à língua é a chave, especialmente a língua que inclui
sentenças com verbos mentais e estruturas de complemento sintáticas. Muitos
pais ouvintes, no entanto, não são capazes de expor seus filhos surdos a esse tipo
de input de linguagem de maneira consistente e acessível.

6.2 TEORIA DA MENTE EM CRIANÇAS COM IMPLANTES


COCLEARES
A discussão anterior sobre a importância da língua para a teoria da mente
levanta questões interessantes sobre o seu desenvolvimento em crianças surdas
com implantes cocleares. Como os implantes levam à melhora da fala e da audição
de muitas crianças surdas (ver Tópico 1 desta unidade), o desenvolvimento da
cognição social também terá ganhos? Peterson (2004) revisou sete estudos sobre o

157
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

desempenho da teoria da mente (tarefa de crença falsa) em crianças surdas orais


com aparelhos auditivos convencionais. Todos os estudos, exceto um, indicaram
um atraso significativo na teoria da mente em tais crianças. A magnitude desse
atraso foi semelhante à observada entre crianças surdas usuárias tardias de
língua de sinais (HAO; SU; CHAN, 2010). A única exceção na revisão de Peterson
foi um estudo de crianças com perda auditiva moderada a grave, indicando que
a cognição social se desenvolve melhor em crianças com perda auditiva menos
grave. Esse achado é consistente com a explicação da comunicação social para
benefícios similares entre crianças surdas de pais surdos, assim como entre filhos
ouvintes de pais ouvintes.

Peterson (2004) também descreveu um estudo sobre a teoria da mente


de 52 crianças australianas com idade entre 4 e 12 anos, incluindo 13 crianças
severamente surdas com aparelhos auditivos convencionais e 13 crianças com
implantes cocleares. As crianças com implantes tinham idades variando de 4,2
anos a 11,2 anos e receberam seus implantes entre 2 e 5 anos de idade. Seis das
crianças com implantes frequentaram escolas regulares; os demais estavam
matriculados em unidades de educação especial ou em escolas especiais. Peterson
descobriu que nem a proficiência na língua falada nem o desempenho da teoria
da tarefa mental diferiam entre as crianças com implantes cocleares e aquelas
com aparelhos auditivos convencionais. Os pares ouvintes superaram ambos os
grupos significativamente em ambas as medidas.

Os resultados de Peterson (2004) podem ser usados ​​para indicar que os


implantes cocleares não proporcionam às crianças acesso suficiente à linguagem
falada para permitir o desenvolvimento normal das habilidades de cognição social.
Consistente com essa sugestão, havia um estudo examinando especificamente
as relações entre o implante coclear, a proficiência na língua falada e a teoria
da mente em crianças surdas. Remmel e Peters (2009) realizaram um estudo
envolvendo 30 crianças surdas implantadas precocemente nos Estados Unidos.
Parecia haver pouco ou nenhum atraso na compreensão da língua ou na cognição
social dessas crianças em relação a pares ouvintes e crianças surdas nativas no uso
da língua de sinais. Os estágios da teoria do desenvolvimento da mente também
pareciam amplamente comparáveis. A proficiência sintática geral e, em menor
medida, a compreensão da sintaxe do complemento previam a teoria da mente
nessas crianças. No entanto, dadas as habilidades de língua das crianças e o fato
de terem sido recrutadas de um programa de implante muito seletivo, Remmel e
Peters (2009) sugeriram que seus participantes podem não ter sido uma amostra
representativa.

Indo além da tarefa de crença falsa, Ketelaar et al. (2012) examinaram


múltiplos aspectos da teoria da mente entre 72 crianças surdas implantadas
precocemente e 69 crianças ouvintes na Holanda. Tanto a compreensão dos
desejos e crenças foram estudados em um subgrupo de crianças com mais de 30
meses, mas os precursores do desenvolvimento da teoria da mente – intenções –

158
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

foram estudados em todas as crianças. Intenções referem-se ao caráter orientado


por objetivos de grande parte do nosso comportamento, buscando satisfazer
anseios, desejos e esperanças ou agir de acordo com crenças, expectativas, ideias,
pensamentos e convicções.

As crianças do estudo de Ketelaar et al. (2012) variaram em idade de 1 a


6 anos. A média de idade das crianças ouvintes foi de 39 meses e a das crianças
surdas de 37 meses. Todas as crianças surdas receberam seus implantes antes dos
3 anos de idade; dois terços tinham implantes unilaterais e um terço bilaterais.
As crianças surdas e ouvintes não diferiram em suas habilidades motoras grossas
ou finas ou na condição socioeconômica de seus pais. O modo preferido de
comunicação em 36% das crianças surdas era apenas a língua falada, e em 64%
era a língua de sinais ou a língua falada apoiada por sinais. Apesar do fato de
que nesse estudo holandês as crianças surdas foram implantadas muito cedo,
as habilidades da teoria da mente ainda eram afetadas. Não foram encontradas
diferenças entre os surdos e os ouvintes em sua compreensão das intenções dos
outros. Entender os desejos e crenças de outras pessoas, em contraste, mostrou-
se muito mais difícil. As crianças surdas tiveram pior desempenho do que as
crianças ouvintes, mesmo após os resultados terem sido corrigidos quanto às
diferenças nas habilidades verbais. Segundo Ketelaar et al. (2012), as crianças com
implantes cocleares experimentam um atraso no desenvolvimento da teoria da
mente ou seguem um caminho de desenvolvimento diferente.

Por que o desenvolvimento da teoria da mente seria afetado em crianças


surdas com implantes cocleares? A proficiência na língua não pode ser o único
fator, porque a teoria da mente também foi atrasada em crianças que tinham
habilidades de língua falada comparáveis ​​àquelas de pares ouvintes no estudo
de Ketelaar et al. (2012). Os autores sugeriram que mais atenção deve ser dada
ao conteúdo das conversas entre pais e filhos surdos com implantes, pois a
qualidade das conversas vivenciadas por crianças surdas com implantes e de
crianças ouvintes pode não ser comparável. Pode ser que a comunicação entre
pais e filhos com implantes em certa medida careça de conversas sobre estados
mentais, ou, alternativamente, essas conversas possam não ter verbos mentais
específicos ou complementos sintáticos (SCHICK et al., 2007).

Moeller e Schick (2006) realizaram um estudo relevante para as alternativas


supracitadas. Eles examinaram a língua usada nas interações sociais de mães
ouvintes e suas crianças surdas, especificamente em um esforço para identificar
relações com o desenvolvimento da teoria da mente. Todas as 22 crianças
usavam a língua de sinais em interações com suas mães, apesar de 10 delas terem
implantes cocleares. No geral, não houve diferenças significativas no desempenho
em medidas de linguagem ou em tarefas de crença falsa entre as crianças com e
sem implantes cocleares. Como grupo, no entanto, elas apresentaram atrasos ​​em
ambos os domínios em relação a um grupo de comparação de ouvintes. Moeller
e Schick (2006) também descobriram que mães de crianças ouvintes referiam-se
a estados mentais em linguagem dirigida a seus filhos mais frequentemente do
que mães de crianças surdas. A quantidade dessa "conversa mental" e o nível das

159
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

habilidades de língua de sinais das mães estavam significativamente relacionadas


ao desempenho de seus filhos na tarefa de crença falsa. As habilidades de língua
das crianças, mas não o grau de perda auditiva, também estavam relacionadas ao
desempenho da teoria da mente. Moeller e Schick (2006), portanto, concluíram
que meios mais eficazes de comunicação entre mães e seus filhos surdos facilitam
a compreensão social e o desenvolvimento da teoria da mente.

Um estudo realizado por Morgan et al. (2014) apoiam a hipótese de que


as conversas entre mães ouvintes e suas crianças surdas frequentemente contêm
uma falta de input de linguagem sobre estados mentais. Mães de 20 crianças
surdas, com idade média de 2 anos e 4 meses, participaram, dessas crianças, 16
tiveram implantes cocleares; quatro usavam aparelhos auditivos convencionais.
Dezenove mães ouvintes e seus filhos ouvintes, dentro da mesma faixa etária,
serviram como um grupo de comparação. Análises de conversas entre mãe e filho
revelaram que as mães das crianças surdas falavam significativamente menos
sobre emoções, asserções e pensamentos das pessoas do que as mães das crianças
ouvintes.

6.3 IMPLICAÇÕES MAIS AMPLAS DA TEORIA DO


DESENVOLVIMENTO DA MENTE
A conexão entre os aspectos quantitativos e qualitativos do input da
linguagem e a teoria do desenvolvimento da mente têm implicações mais amplas
para as crianças e os pais. Lecciso, Petrocchi e Marchetti (2013), por exemplo,
compararam as habilidades de teoria da mente de crianças ouvintes e crianças
surdas que usaram a língua falada nas interações com suas mães. Os resultados
indicaram que não apenas as crianças surdas demoravam no desenvolvimento
da teoria da mente em relação aos seus pares ouvintes, mas as mães ouvintes
das crianças surdas eram menos proficientes em teoria do que as mães ouvintes
de crianças ouvintes. Lecciso, Petrocchi e Marchetti (2013) especularam que
esse achado poderia ser o resultado de uma evitação prolongada de “conversas
mentais” em conversas com seus filhos surdos. Ketelaar et al. (2012) também
questionaram se os atrasos precoces na teoria da mente podem resultar em
psicopatologia posterior ou desapareceriam porque as crianças com implantes
cocleares frequentemente conseguem alcançar seus pares ouvintes. Ambas as
questões e os efeitos do desenvolvimento da teoria da mente na aprendizagem e
nos contextos formais e informais necessitam de mais investigação.

Professores de alunos surdos em salas de aula regulares ou de educação


especial frequentemente encontram alunos surdos sem habilidades de teoria da
mente apropriadas à idade. Como consequência, as relações sociais na sala de
aula podem sofrer, especialmente se incluir outros alunos (ouvintes) que estão
à frente de seus pares surdos na cognição social. Essa situação pode influenciar
negativamente o gerenciamento da sala de aula e o aproveitamento do aluno,
pois atrasos na cognição social podem prejudicar ou impedir a aprendizagem

160
TÓPICO 3 | PERFIS COGNITIVOS DE ALUNOS SURDOS

colaborativa entre os alunos. Há, portanto, todas as razões para os professores


promoverem a aprendizagem de habilidades de teoria da mente em seus alunos
surdos (e os alunos ouvintes, se necessário). Organizar conversas frequentes
sobre as intenções, crenças e expectativas das pessoas é uma maneira de avançar;
oferecer input de linguagem contendo verbos de estado mental frequentes é
outra. Discutir ou fazer com que os alunos escrevam sobre os anseios, desejos e
objetivos não declarados dos protagonistas das histórias lidas oferece mais uma
oportunidade.

Em resumo, a pesquisa disponível leva à conclusão de que crianças


surdas e ouvintes passam por estágios similares no desenvolvimento da teoria da
mente, assim como crianças ouvintes em uma variedade de idiomas e culturas.
Se a proficiência das crianças surdas é atrasada na língua falada ou na língua
de sinais, o desempenho nas tarefas de teoria da mente também é atrasado. O
input de linguagem acessível (social) inicial parece, assim, um pré-requisito
para o desenvolvimento normal da cognição social, mas há razões para duvidar
se a questão é apenas fornecer acesso, dado o fato de que crianças surdas com
proficiência linguística adequada à idade ainda mostram atrasos na cognição
social. O conteúdo do input inicial da linguagem, portanto, também pode ser
uma questão crucial. O timing de tal input também é importante, pois há algumas
evidências de que a exposição a uma linguagem rica e estimulante da cognição
social pode prevenir atrasos de longo prazo no desenvolvimento da cognição
social, se ocorrer antes dos 7 anos de idade.

Antes de deixar a questão da cognição social, é importante notar que


estudos envolvendo crianças surdas indicam que tanto a aquisição da teoria
da mente quanto a capacidade ou probabilidade de usá-la em várias situações
(automática ou intencionalmente) não são simples ou unidimensionais, mas
envolvem vários tipos de conhecimento e habilidades reunidos através do
funcionamento executivo. Em nossa visão, as habilidades de teoria da mente são
particularmente importantes para a iniciativa de ensino-aprendizagem na medida
em que permitem que as crianças coloquem a linguagem e o comportamento dos
professores em um contexto mais amplo, afetando tanto o aprendizado quanto a
generalização do aprendizado. Embora os estudos ainda não tenham examinado
possíveis vínculos entre a teoria da mente e o desempenho acadêmico, esperamos
que incentivar os alunos surdos a refletir sobre as relações de determinadas
tarefas com o conteúdo acadêmico em mãos e os objetivos dos professores nessas
tarefas os ajudem a implementar melhor estratégias cognitivas e metacognitivas.
É precisamente esse tipo de modificação do ensino que temos em mente quando
nos referimos a ajustar nossos métodos e materiais para acomodar as diferenças
cognitivas entre alunos surdos e ouvintes.

161
UNIDADE 2 | LINGUAGEM, COGNIÇÃO E EMOÇÃO NOS APRENDIZES SURDOS

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora não haja diferença na inteligência geral entre indivíduos
surdos e ouvintes, as diferenças em vários processos cognitivos são relatadas
já na idade pré-escolar, por exemplo, no sequenciamento de comportamentos
e na capacidade de distanciar-se da própria perspectiva. Essas diferenças estão
associadas a variações nas habilidades de linguagem e talvez com diferenças nas
experiências iniciais dentro da família, mas também podem ser indicadores de
diferenças cognitivas essenciais entre aprendizes surdos e ouvintes associados à
dependência primária do processamento visual em vez do auditivo.

Vimos que algumas diferenças relacionadas à dependência dos indivíduos


surdos da visão, como o aumento da atenção às mudanças no campo visual
periférico, parecem representar um funcionamento adaptativo. A diminuição
da atenção visual central seletiva e sustentada bem como a maior distração, no
entanto, podem complicar a aprendizagem em salas de aula e tarefas em que
a atenção visual sustentada é necessária. Da mesma forma, os alunos surdos
geralmente apresentam uma memória mais fraca para os materiais verbais e não
verbais em relação aos pares ouvintes, especialmente quando as informações são
apresentadas sequencialmente. Estudos envolvendo usuários nativos da língua
de sinais surdos, em contraste, mostraram que eles têm memória visuoespacial
igual ou melhor que a de adultos ouvintes. Surpreendentemente, parece que
ninguém ainda documentou métodos de acomodar as necessidades de memória
e construir sobre os pontos fortes de memória dos alunos surdos na sala de aula, a
fim de melhorar a aprendizagem. Estamos cientes das diferenças e os professores
podem, implícita ou explicitamente, fazer ajustes na sala de aula. Nesta era da
prática baseada em evidências, no entanto, precisamos documentar até que ponto
e em quais contextos esses ajustes são bem-sucedidos ou não.

Fatores cognitivos e metacognitivos que contribuem para ou impedem


a aprendizagem em sala de aula por alunos surdos só agora estão sendo
descobertos, e mais pesquisas são necessárias para separar e identificar os fatores
causais. É especialmente importante realizar pesquisas adicionais em intervenções
focadas cognitivamente, algumas das quais demonstraram aumentar o uso
de aprendizagens benéficas por alunos surdos e estratégias de resolução de
problemas. Enquanto isso, é importante reconhecer que os alunos surdos podem
trazer para a sala de aula necessidades específicas de treinamento em resolução
de problemas e estratégias de aprendizagem orientadas por cognição que diferem
em grau e talvez em tipo dos comportamentos e necessidades dos alunos ouvintes.
Os professores, portanto, precisam de treinamento especializado para acomodar
as necessidades acadêmicas de alunos com perda auditiva. Até entendermos
plenamente as habilidades cognitivas e de linguagem necessárias para que os
alunos surdos se beneficiem de intervenções educacionais, a educação especial
nunca será especial.

162
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• Quando os psicólogos falam sobre inteligência, eles estão se referindo ao


potencial cognitivo de um indivíduo, incluindo a capacidade de adquirir
conhecimento, tanto intencional quanto incidentalmente, e usar esse
conhecimento, intencionalmente em alguns casos e automaticamente em
outros.

• Os desafios acadêmicos enfrentados pelos alunos surdos não são um reflexo


de qualquer inferioridade intelectual associada à perda auditiva, mas podem
resultar, em parte, de diferenças cognitivas entre alunos surdos e ouvintes que
exigiria ou se beneficiaria de uma acomodação especial.

• A suposição de igual potencial intelectual para surdos e ouvintes vem da


constatação de que os escores médios de inteligência não verbal de crianças
surdas não diferem significativamente dos escores de crianças ouvintes, pelo
menos quando aqueles com múltiplas deficiências são excluídos.

• Em testes de inteligência verbal, os alunos surdos caem significativamente


abaixo da média dos alunos ouvintes.

• As diferenças nos ambientes e nas experiências de crianças surdas e de crianças


com deficiência podem levar a diferentes abordagens de aprendizagem, ao fato
de o conhecimento ser organizado de diferentes maneiras e a diferentes níveis de
habilidade em domínios explorados por qualquer teste em particular.

• As diferenças cognitivas entre crianças surdas e ouvintes não precisam indicar


deficiências.

• Há uma série de diferenças entre crianças surdas com pais surdos e aquelas
com pais ouvintes.

• Os indivíduos surdos apresentam maior atenção em locais periféricos, enquanto


os indivíduos ouvintes se concentram mais no centro do campo visual.

• A privação auditiva desde o nascimento tem um efeito importante no


desenvolvimento do sistema visual.

• A sensibilidade aos estímulos visuais periféricos pode oferecer às crianças


surdas uma vantagem na medida em que permite que elas se tornem conscientes
dos eventos que outras crianças percebem ao ouvir.

163
• As diferenças visuais entre crianças surdas e ouvintes começam cedo e refletem
uma interação entre ambiente e desenvolvimento cerebral.

• Indivíduos surdos que usam a língua de sinais demonstraram ter outras


vantagens visuoespaciais em relação aos indivíduos ouvintes, tais como
aumento da capacidade de discriminação facial e capacidade de manipulação
mental.

• Apesar das alegações sobre as vantagens visuoespaciais dos alunos surdos


depender apenas da visão, têm claramente suas desvantagens.

• Aqueles que dependem principalmente da língua de sinais são mais propensos


a usar estratégias de codificação visuoespaciais que são menos apropriadas
para a retenção de sequências, mas podem ser mais eficazes para lembrar locais
no espaço.

• Se os professores monitoram os alunos regularmente e identificam problemas


de memória de trabalho, há duas maneiras de prosseguir: 1 - oferecer suporte a
aulas, estruturando seu ensino de forma a prevenir ou reduzir a sobrecarga de
memória; 2 - oferecer aos alunos treinamento explícito de memória.

• Um aspecto do funcionamento executivo relacionado à memória que difere


entre aprendizes surdos e ouvintes é o uso de informações contextuais
(disponíveis na memória de trabalho) ou conhecimento prévio (disponível a
partir da memória de longo prazo).

• Descobertas de diferenças nas maneiras como alunos surdos e ouvintes


abordam situações de solução de problemas também podem refletir diferenças
no conhecimento de background que adquiriram por meio da aprendizagem
incidental.

• O funcionamento executivo geralmente se refere a um nível mais alto de


funcionamento cognitivo que controla e utiliza atividades de nível inferior,
como atenção e memória.

• Se quisermos que as crianças surdas desenvolvam flexibilidade cognitiva e se


tornem aprendizes independentes, precisamos deixá-las enfrentar os desafios
(apropriados) por conta própria.

• A falha em reconhecer quando a compreensão é bem-sucedida ou não, sugere


um problema com a metacognição em vez de um problema relacionado a uma
modalidade em particular.

• A capacidade metacognitiva de pensar sobre estados mentais, como memórias,


crenças, desejos e intenções – incluindo as expectativas dos professores para os
alunos em situações particulares – é um aspecto da cognição social, conhecida
como teoria da mente.

164
• O fato de que a proficiência na língua e as interações iniciais da língua com
outras pessoas parecem ser essenciais para o desenvolvimento da cognição
social e da teoria da mente, em particular, tornou essa área de interesse para os
pesquisadores que se concentram em crianças surdas.

• Dada a sua importância para o estabelecimento de relações sociais, a teoria da


mente tem sido estudada intensamente em crianças e adolescentes surdos.

• Crianças surdas com pais surdos obtêm resultados notavelmente melhores


em tarefas de crença falsa do que crianças surdas de pais ouvintes, embora
crianças surdas que usam a língua de sinais com seus pais ouvintes tenham
melhor desempenho do que aquelas que usam apenas a língua falada.

• Crianças surdas e crianças ouvintes passam pelos mesmos estágios de


desenvolvimento da cognição social, assim como os pares ouvintes o fazem
através de uma variedade de línguas e culturas. A taxa de desenvolvimento
entre crianças surdas, no entanto, é mais lenta na maioria dos casos, mas não
em todos.

• As crianças precisam ter acesso ao discurso de mudança de perspectiva, e


complementar a sintaxe em particular parece contribuir para o desenvolvimento
do raciocínio mental, ao passo que a modalidade de língua não importa.

• Os implantes cocleares não proporcionam às crianças acesso suficiente à


linguagem falada para permitir o desenvolvimento normal das habilidades de
cognição social.

• As crianças com implantes cocleares experimentam um atraso no


desenvolvimento da teoria da mente ou seguem um caminho de
desenvolvimento diferente.

• Pode ser que a comunicação entre pais e filhos com implantes em certa
medida careça de conversas sobre estados mentais, ou, alternativamente,
essas conversas possam não ter verbos mentais específicos ou complementos
sintáticos.

• Meios mais eficazes de comunicação entre mães e seus filhos surdos facilitam
a compreensão social e o desenvolvimento da teoria da mente.

• Há todas as razões para os professores promoverem a aprendizagem de


habilidades de teoria da mente em seus alunos surdos (e os alunos ouvintes, se
necessário).

165
AUTOATIVIDADE

1 Quando os psicólogos falam sobre inteligência a que eles estão se referindo?

2 O que devemos fazer se um aluno surdo tiver problemas na memória de


trabalho?

3 Um aspecto do funcionamento executivo relacionado à memória que difere


entre aprendizes surdos e ouvintes é o uso de informações contextuais
(disponíveis na memória de trabalho) ou conhecimento prévio (disponível
a partir da memória de longo prazo). Descreva esta diferença.

4 Dada a sua importância para o estabelecimento de relações sociais, a teoria


da mente tem sido estudada intensamente em crianças e adolescentes
surdos. O que as pesquisas de Peterson e Siegal (2000) indicam sobre o
desenvolvimento da teoria da mente em crianças e adolescentes surdos?

166
UNIDADE 3

REALIZAÇÃO ESCOLAR E
INSTRUÇÕES

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender a realização acadêmica de aprendizes surdos nas áreas de


leitura e escrita (literacia) e os aspectos de instrução relacionados.

• compreender a realização acadêmica de aprendizes surdos nas áreas de


matemática (numeracia) e ciências e os aspectos de instrução relaciona-
dos.

• apresentar questões atuais sobre as novas tecnologias de aprendizagem


para aprendizes surdos.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

TÓPICO 2 – REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: NUMERACIA

TÓPICO 3 – NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA


APRENDIZES SURDOS

167
168
UNIDADE 3
TÓPICO 1
REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

1 INTRODUÇÃO
Este tópico e o próximo analisam o desempenho escolar entre aprendizes
surdos e com deficiência auditiva, o que sabemos sobre isso e como achamos
que podemos melhorá-lo. Nossa afirmação que precisa ser melhorada não será
uma surpresa para alguém familiarizado com a educação de surdos. No entanto,
haverá aqueles que acreditam que crianças surdas em salas de aula regulares,
com implantes cocleares ou com pais surdos (ou alguma combinação delas) estão
indo bem na escola. Eles presumem que estamos falando de crianças surdas em
contextos especiais que podem usar aparelhos auditivos, ter pais ouvintes e talvez
ter várias deficiências. Das unidades anteriores também pode-se pensar que
nossas referências a “pais surdos” e “pais ouvintes” nas sentenças anteriores são
palavras-código para ter uma primeira língua fluente ou não, respectivamente, e
que “implantes cocleares” é código para usar língua falada, em vez de língua de
sinais. O leitor cuidadoso, entretanto, reconhecerá que, embora tais atribuições
possam ser verdade, às vezes, elas são simplificações exageradas.

Com a crescente popularidade dos implantes cocleares, por exemplo,


pais, educadores e pesquisadores têm esperado uma melhora significativa na
conquista de alunos surdos e com deficiência auditiva. E embora reconheçamos
que melhorias consideráveis ​​foram feitas, também precisamos reconhecer que
os resultados foram extremamente variáveis​​ (MARSCHARK et al., 2010). Além
disso, os achados limitados de longo prazo disponíveis indicam que, apesar de
frequentemente funcionarem em níveis adequados à idade quando são jovens,
os alunos surdos com implantes cocleares estão significativamente atrás de seus
pares ouvintes no desempenho acadêmico quando chegam ao Ensino Médio
(STINSON; KLUWIN, 2011). Em termos mais gerais, embora possamos ver que
as crianças em salas de aula regulares, crianças com implantes cocleares e aquelas
com pais surdos, frequentemente alcançam níveis um pouco mais elevados do
que outras crianças surdas em domínios relacionados à escola, como grupos,
elas raramente alcançam níveis de desempenho acadêmico comparáveis ​​aos de
seus pares ouvintes. Essas questões serão abordadas neste e no próximo tópico,
no qual perguntamos: “Por quê?” e “O que isso nos diz sobre a educação de
crianças surdas em geral?” Primeiro, exploraremos as características da realização
acadêmica e do baixo desempenho dos aprendizes surdos em termos gerais e
especificamente no que diz respeito à literacia impressa (ler e escrever).

169
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

Antes de considerar diretamente as habilidades de leitura e escrita de


crianças surdas, devemos reconhecer que algumas pessoas argumentam que é
o sistema educacional, que atende crianças surdas, que têm baixo desempenho
escolar e não os próprios alunos surdos. Na medida em que isso pode ser verdade,
não é por falta de tentativa. A maioria dos educadores de crianças surdas observa
que novos métodos, cada um considerado como a solução há muito procurada
para a educação de surdos, surgem a cada dez anos, mas, normalmente, levam a
mudanças relativamente pequenas nos resultados. Não há soluções que funcionem
para todas as crianças surdas em todas as situações. Assim, o objetivo principal
deste livro é enfatizar a necessidade de práticas educacionais que correspondam
às diversas forças e necessidades dos alunos surdos. Para esse fim, neste tópico,
veremos quais conclusões gerais podem ser tiradas com alguma confiança sobre
o desempenho escolar entre os alunos surdos e quão ampla ou estritamente essas
conclusões devem ser generalizadas.

Em seguida, consideramos a realização acadêmica nas áreas específicas


de leitura e escrita, bem como os aspectos de instrução nessa área que levam a
um sucesso maior (ou menor). No próximo tópico, vamos considerar questões
semelhantes no que diz respeito à matemática e à ciência. À parte de algum
trabalho no ensino de ciências, no entanto, praticamente todos os estudos de
pesquisa e intervenção envolvendo alunos surdos concentraram-se na literacia
e numeracia (capacidade de raciocinar e aplicar conceitos numéricos simples).
A situação deriva em parte da importância desses dois domínios para a escola
e o trabalho e, em parte, por serem os domínios mais frequentemente avaliados
por testes padronizados. Aprendizes surdos também parecem ter dificuldades
particulares em assuntos como história e geografia, mas estes parecem não ter
sido estudados empiricamente.

2 ENTENDENDO A REALIZAÇÃO DOS APRENDIZES DE


SURDOS
Nos tópicos anteriores, discutimos como uma maior conscientização sobre
os fundamentos da aprendizagem entre os alunos surdos, levou a mudanças na
forma como os vemos e, em menor medida, (infelizmente) como os educamos.
Historicamente, alguns de seus insucessos crônicos foram colocados aos pés de
escolas especiais para surdos, que tendiam a ter mais orientações vocacionais do
que acadêmicas e, frequentemente, empregavam professores menos qualificados
do que aqueles em escolas regulares (PAGLIARO, 1998).

Qi e Mitchell (2012) resumiram as realizações acadêmicas dos alunos


surdos e com deficiência auditiva nas últimas quatro décadas, conforme
indicado pelo Stanford Achievement Test (SAT), o teste de realização (aquisição)
padronizado mais utilizado nos Estados Unidos. Os relatórios anteriores de
Allen (1986) e Traxler (2000) forneceram dados de grandes amostras normativas
de alunos surdos e com deficiência auditiva (variando de quase 3600 a mais de

170
TÓPICO 1 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

8300 indivíduos), descrevendo seu desempenho nos subtestes de Compreensão


de Leitura e Matemática do SAT em diferentes níveis de anos escolares. Estes
foram comparados às normas de alunos ouvintes e levaram ao estabelecimento
de normas adicionais para crianças com perda auditiva. É a partir desses relatos
que alguns autores chegaram à conclusão geral de que “os alunos surdos
se formam no Ensino Médio com a leitura ao nível do terceiro ou quarto ano
escolar” (GUTIÉRREZ, 1994, p. 89). De fato, os resultados apresentados nessas
publicações indicaram que a pontuação média (50% acima, 50% abaixo) para
surdos com idade de 18 anos estava um pouco abaixo do terceiro ano escolar (8
a 9 anos de idade) em 1974 e logo abaixo do quarto ano escolar (9 a 10 anos) em
1999. Como veremos mais adiante, a maioria dos estudos se concentrou em 50%
dos alunos surdos e com deficiências auditivas funcionando abaixo da média, e
poucos procuraram entender as características dos alunos que funcionam acima
da média.

Qi e Mitchell (2012) descobriram que os escores do SAT não melhoraram


significativamente nos últimos 40 anos, apesar de mudanças significativas na
educação de surdos, incluindo o ensino de currículos acadêmicos em vez de
vocacionais, uso de língua de sinais e tecnologias de inclusão nas sala de aula, e
educar crianças surdas em salas de aula regulares com companheiros ouvintes da
mesma idade. Poucos países parecem ter realizado tais análises, embora alguns
tenham feito isso sem divulgar os resultados de forma ampla. Como observamos
no Tópico 2 da Unidade 2, por exemplo, resultados semelhantes foram obtidos na
Suécia, onde, nos últimos 30 anos, crianças surdas têm recebido educação bilíngue
em Língua de Sinais Sueca e Sueco escrito/falado (RYDBERG; GELLERSTEDT;
DANERMARK, 2009). Todavia, não está claro se haverá avaliações em larga escala
das realizações de alunos surdos no futuro que permitam estudos de mudança ao
longo do tempo (MARSCHARK et al., 2013).

É muito cedo para observar qualquer impacto do implante coclear precoce


nos dados de Qi e Mitchell (2012) e amostras normativas do tipo fornecidas pelo
teste SAT não abordam uma série de outros fatores que foram assumidos como
afetando o nível do desempenho acadêmico dos alunos surdos. Por exemplo, é
frequentemente afirmado que crianças surdas de pais surdos – que estão expostas
a uma língua acessível (se não sempre fluente) desde o nascimento – exibem
maior desempenho acadêmico (geralmente na leitura) do que crianças surdas de
pais ouvintes. Essa afirmação estaria consistente com a sugestão de Qi e Mitchell
(2012) de que os atrasos no desenvolvimento da língua podem explicar a realização
acadêmica abaixo da média para surdos e indivíduos com baixa audição.

Os primeiros estudos a esse respeito realizados por investigadores como


Meadow (1976), Stuckless e Burch (1966) e Vernon e Koh (1970) encontraram
pequenas vantagens na realização acadêmica de surdos, filhos de pais surdos,
mas não comparáveis ​​aos de pares ouvintes. A maioria de tais estudos examinou
a compreensão da leitura, com alguma descoberta de que crianças surdas de
pais surdos desempenham melhor do que as crianças surdas de pais ouvintes
(PADDEN; RAMSEY, 2000), enquanto outros falharam para encontrar essas

171
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

diferenças (NIEDERBERGER, 2008). Coletivamente, os estudos afirmativos em


relação às habilidades de leitura de crianças surdas de pais surdos mostraram que
eles estão associados com habilidades de língua de sinais precoces. No entanto,
sabemos que as habilidades iniciais de língua falada também estão associadas
à capacidade de leitura (GEERS et al., 2008). Portanto, parece ser uma língua
precoce, em vez de ter pais surdos que apoiem ​​o desempenho acadêmico e o
aprendizado mais geral.

Naturalmente, ter pais surdos também pode afetar o sucesso acadêmico


por meio da motivação, modelagem ou outros fatores que o afetam indiretamente,
mas tais evidências ainda não foram fornecidas. E, pode-se, facilmente, supor o
contrário, sugerindo que, os maiores resultados acadêmicos e níveis educacionais
dos pais ouvintes, em média, torna-os modelos melhores, mais confiantes e mais
competentes quando se trata de leitura e habilidades acadêmicas, motivando
assim as crianças surdas na escola. Marschark et al. (2012), no entanto, não
encontraram diferenças em função do status da audição parental em surdos de
5 a 11 anos de idade e nos relatos de seus pais sobre a leitura, a matemática ou
o desempenho escolar das crianças em geral. Isso não significa que não houve
diferença no desempenho das crianças, apenas que nem eles nem seus pais
pensaram que havia.

Em resumo, afirmações anedóticas à parte, as descobertas disponíveis


indicam claramente que qualquer outra coisa que tenha mudado na educação de
alunos surdos nas últimas décadas, a realização acadêmica de alunos surdos não
melhorou muito e, em média, ainda fica atrás da de colegas ouvintes. Geralmente,
tem sido assumido por investigadores dentro e fora da educação de surdos que a
comunicação através do uso de língua de sinais na sala de aula foi uma mudança
fundamental que levaria a um melhor desempenho acadêmico (DETTERMAN;
THOMPSON, 1997). Os estudos de Marschark e seus colegas, descritos mais
adiante neste tópico, sugerem, no entanto, que esse não foi o caso nos Estados
Unidos.

Da mesma forma, os dados suecos e noruegueses sobre a realização


acadêmica de alunos surdos que receberam educação bilíngue ao longo de suas
carreiras escolares mostraram apenas uma melhora limitada. Consideramos os
resultados da literacia em contextos de educação bilíngue mais adiante neste
tópico, mas se as evidências das salas de aula bilíngues não são inspiradoras,
tampouco isso ocorre nas salas de aula regulares. As descobertas de Qi e Mitchell
(2012) incluem dados de vários coortes de aprendizes surdos e com deficiência
auditiva nos Estados Unidos que foram educados em grande parte ou inteiramente
em salas de aula regulares, sem nenhum efeito discernível ou, pelo menos, não
documentado sobre a realização acadêmica. Para tentar entender as razões para
essa situação, agora voltamo-nos para as áreas específicas do currículo para
tentar entender melhor as barreiras enfrentadas pelos alunos surdos e, talvez,
para formas de reduzir essas barreiras.

172
TÓPICO 1 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

3 LEITURA
Se há uma coisa que parece bastante óbvia sobre ler e escrever na língua
nacional é que dependem de saber como as letras e as palavras soam, pelo menos
até certo ponto. De fato, entre alunos surdos mais jovens e mais velhos e com
deficiência auditiva, melhores habilidades de fala e audição estão associadas a
melhores habilidades de leitura (LICHTENSTEIN, 1998). No entanto, a leitura
e a escrita envolvem mais do que apenas sons e ortografia, e invocam todos os
processos cognitivos que discutimos no Tópico 3 da Unidade 2: memória de
curto e longo prazo, metacognição e assim por diante. A este respeito, a leitura
é frequentemente descrita como envolvendo processos top-down (de cima para
baixo) e bottom-up (de baixo para cima). O que sabemos sobre conceitos, palavras,
gramática e o mundo, influencia como processamos palavras em uma página
impressa (ou texto na tela do computador, mensagens em celulares ou legendas
em vídeos) ou como colocamos elas lá (ou seja, escrita). Da mesma forma, essas
palavras mudam o que sabemos sobre o conteúdo e sobre a linguagem, bem
como, talvez, sobre a pessoa que as produziu, o contexto de sua produção e assim
por diante (ver Figura 1).

Já observamos que, nos últimos 40 anos, a média da pontuação do SAT de


Leitura e Compreensão para alunos surdos e com deficiência auditiva de 18 anos
nos Estados Unidos aumentou apenas ligeiramente, e eles ainda estão muito atrás
dos colegas ouvintes em outros domínios acadêmicos também. Descobertas desse
tipo levaram muitos observadores a atribuírem às dificuldades acadêmicas dos
alunos surdos, em geral, devido às habilidades de leitura relativamente fracas
durante os anos escolares (ROGERS; CLARKE, 1980; LUCKNER; HANDLEY,
2008). Ao mesmo tempo, existe uma crença generalizada entre educadores e
alunos de que os alunos surdos aprenderão mais através da língua de sinais do
que através do texto (LANG; MCKEE; CONNER, 1993). Note, no entanto, que os
processos e componentes de leitura são os mesmos para comunicação através do
ar, seja língua falada ou língua de sinais. Também vimos nos tópicos anteriores
que há uma variedade de outros desafios enfrentados por alunos surdos durante
os anos escolares (e anteriores) que resultam em diferenças quantitativas e
qualitativas em seus conhecimentos e habilidades relevantes em termos de
linguagem relativos aos pares ouvintes. Talvez, portanto, não seja surpreendente
que a evidência disponível sugira que os aprendizes surdos, muitas vezes, não
são melhores em compreender a língua através do ar do que a língua impressa.

173
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

FIGURA 1 – A LEITURA ENVOLVE AMBOS OS PROCESSOS TOP-DOWN E BOTTOM-UP

TOP

Conhecimento
Conceitual Estratégico
(palavras, coisas) (resolução de
problemas)

Metacognitivo/Metalinguístico
______________________________________

Estrutura Discursiva
Gramática
Vocabulário
Morfologia
Fonologia/Ortografia

BOTTOM

FONTE: O autor

Aparentemente, o primeiro estudo comparando diretamente a


aprendizagem de alunos surdos com texto e língua de sinais é um que foi conduzido
por Marschark et al. (2006), embora os resultados tenham sido repetidos várias
vezes. Esses estudos constataram consistentemente que os alunos surdos com
idades entre 12 e 24 anos aprenderam tanto ou mais da leitura quanto da língua
de sinais na sala de aula. Embora estejamos nos concentrando em leitura e escrita
neste tópico, é importante que reconheçamos a complexidade da leitura e até que
ponto ela depende do amplo conjunto de habilidades e capacidades cognitivas
observadas anteriormente. Então, primeiro, consideramos alguns dos processos
de “nível inferior” envolvidos na leitura e por que eles podem ser desafiadores
para os alunos surdos.

3.1 ELEMENTOS DA LEITURA


A maioria de nós pode lembrar de nossas dificuldades iniciais e, às vezes,
posteriores com a leitura. Aprender a ler uma segunda língua envolve muitos dos
mesmos desafios, mas, pelo menos como adolescentes ou adultos, temos muito
mais conhecimento linguístico e do mundo, maior flexibilidade cognitiva e uma
primeira língua sobre a qual pode ser construída. No entanto, para muitas crianças
pequenas, a leitura é uma tarefa complexa e desafiadora, independentemente
da qualidade da instrução inicial e até mesmo da capacidade de ouvir. Para

174
TÓPICO 1 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

os alunos surdos, há três componentes da leitura que, historicamente, foram


encontrados para lhes dar uma dificuldade particular e foram os mais estudados:
decodificação de palavras, vocabulário e gramática.

3.1.1 Reconhecendo Palavras


A capacidade de reconhecer palavras individuais como totalidades,
através da abordagem da palavra inteira, ou reconhecendo as letras ou sons
componentes, via fonética, é geralmente chamada de decodificação. Em ambos
os casos, os leitores pegam palavras de um texto maior e as armazenam
temporariamente na memória de trabalho, na qual a recuperação de informações
(geralmente automaticamente) da memória de longo prazo, fornece o significado
do que está sendo lido no contexto de palavras anteriores no texto. Dessa forma, os
significados de grupos de palavras ou sentenças, são, gradualmente, construídos
através do processo interativo top-down e bottom-up. Na maioria dos casos, as
palavras exatas do texto são rapidamente esquecidas e, somente o significado
é retido primeiro na memória de trabalho e depois na memória de longo prazo.

Pode-se pensar que simplesmente identificar as palavras em um texto é


a parte mais simples da leitura, desde que as palavras sejam familiares. Usando
uma análise dos erros cometidos durante a leitura, no entanto, Albertini e Mayer
(2011) identificaram a dificuldade em ler palavras no contexto como um grande
impedimento para a compreensão de textos de estudantes universitários surdos.
Ou seja, enquanto “leem em voz alta” usando língua falada ou de sinais, os alunos
omitem palavras e identificam outras incorretamente. Juntamente aos achados
que indicam que os estudantes surdos têm vocabulários significativamente
menores do que ouvintes, mas não sabem disso (SARCHET et al., 2014), o estudo
de Albertini e Mayer sugere que os leitores surdos podem não reconhecer seus
níveis de (in) compreensão no nível da palavra.

A decodificação de palavras usualmente se baseia no processamento


fonológico, baseado nos sons de letras individuais ou combinações de letras.
Esta é, provavelmente, parte do motivo pelo qual a leitura entre crianças que são
consideradas surdas ou com deficiência auditiva, geralmente é melhor quanto
mais audição elas tiverem, seja suportada por próteses auditivas e implantes
cocleares ou não. Também explica por que aqueles com boa articulação da fala
tendem a fazer erros de ortografia mais fonologicamente corretos do que aqueles
com habilidades de articulação menos desenvolvidas. Em um estudo clássico
sobre memória de curto prazo, Conrad (1972) apresentou estudantes surdos orais
no Reino Unido com sequências de consoantes ou palavras que variavam em sua
similaridade visual e acústica. Em comparação com os pares ouvintes, os alunos
surdos, frequentemente, confundiam palavras que pareciam iguais ou soavam
iguais, refletindo seu uso da língua falada em algum nível.

175
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

A decodificação de palavras é frequentemente estudada usando palavras


monomorfêmicas simples, embora Gaustad e Kelly (2004) argumentem que a
decodificação de palavras em leitores surdos pode ser suportada pela decodificação
em trechos morfológicos maiores. A decodificação de palavras polimorfêmicas
mais complexas, no entanto, é difícil para os leitores surdos, especialmente crianças
surdas. Van Hoogmoed et al. (2011) estudaram o processamento de palavras
complexas, criadas por inflexão, em crianças e adultos surdos comparados a
crianças e adultos ouvintes na Holanda. As habilidades de processamento das
crianças surdas foram consideravelmente atrasadas, tanto em termos de precisão
quanto em velocidade de processamento, mas os adultos surdos e ouvintes tiveram
um desempenho igualmente bom. Resultados semelhantes foram obtidos para
palavras complexas criadas por derivação e composição, com o processamento
de compostos sendo o processo mais fácil. A velocidade de reconhecimento em
adultos surdos foi mais lenta do que em adultos ouvintes, apontando para um
pouco menos de automatismo (VAN HOOGMOED et al., 2013).

Embora os melhores leitores surdos tendam a ter melhores habilidades


fonológicas, vários pesquisadores argumentaram que essas habilidades não são
necessárias para uma leitura competente. Uma metanálise de estudos relevantes
de Mayberry, Del Giudice e Lieberman (2011) indicou que a codificação e a
consciência fonológica dos leitores surdos explicaram apenas 11% da variância
em sua proficiência em leitura, enquanto as habilidades linguísticas explicaram
mais amplamente 35%. No mínimo, portanto, está claro que o processamento
fonológico não é tudo o que existe para a leitura, nem é totalmente dependente
da audição. Os leitores surdos podem usar apenas processos diferentes para
decodificação de palavras do que os alunos ouvintes. Leybaert (1993), por
exemplo, argumentou que os leitores surdos podem usar informações oriundas
da leitura orofacial, da soletração digital, da articulação e da ortografia do texto
para criar representações fonológicas que não são auditivas. Esse processo é
semelhante ao modo como as pessoas cegas usam várias fontes de informação
para construir representações mentais que funcionam como imagens visuais, mas
não são baseadas na visão.

Duas intervenções criadas para ajudar os leitores surdos a decifrar o código


fonológico da leitura são a fala com pistas e a fonética visual. Nós descrevemos
a fala com pistas no Tópico 2 da Unidade 2 no contexto do aumento do acesso
dos aprendizes surdos à fonologia da língua falada, mas também se espera que
ela apoie a aquisição de habilidades de literacia. Agora disponível para mais de
50 idiomas, a fala com pistas usa formas de mão específicas em locais específicos
ao redor do rosto para desambiguar fonemas que parecem semelhantes nos
lábios e soam semelhantes a alguém com perda auditiva. Pesquisas envolvendo
crianças surdas que aprenderam francês e espanhol indicaram que o uso de
fala com pistas tanto em casa como na escola apoia a decodificação de palavras,
reconhecimento de morfemas e habilidades relacionadas à leitura subjacente
(LEYBAERT; APARICIO; ALEGRIA, 2011). Até hoje, no entanto, não há evidência

176
TÓPICO 1 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

de que ela apoie a leitura de idiomas como o inglês, presumivelmente porque


é muito menos regular na correspondência de som para ortografia do que em
idiomas como o português, o francês, o espanhol e o italiano.

A fonética visual também usa representações visuais dos fonemas da


língua falada para apoiar o processamento fonológico por alunos surdos e com
deficiência auditiva. Com base no conceito de que é mais importante reconhecer
os fonemas como blocos de construção da língua do que ouvir ou produzir os
sons, a fonética visual é como a fala que usa um conjunto de 46 sinais de mão
(mas também símbolos escritos) que são produzidos em conjunto com a língua
falada para fornecer representações multisensoriais (auditivas, visuais, táteis e
cinestésicas) de fonemas (TREZEK; WANG, 2006). No entanto, a fonética visual é
usada no ambiente escolar especificamente para fins de leitura e não como suporte
para a língua falada. Além disso, os sinais manuais da fonética visual incorporam
elementos icônicos para lembrar os estudantes dos movimentos articulatórios
usados ​​na produção de fonemas individuais. A fala com pistas fornece apenas
informações sobre os sons em si.

Trezek e Wang (2006) relataram que o fornecimento de fonética visual ao


longo de um programa de intervenção de oito meses aumentou significativamente
a decodificação e a leitura de palavras de crianças surdas, bem como sua
compreensão de leitura. Em consonância à natureza do caráter relacionado à
articulação da fonética visual, as melhorias observadas foram independentes dos
níveis de perda auditiva das crianças. Trezek et al. (2007), no entanto, descobriram
que, embora a fonética visual tenha melhorado as habilidades de leitura das
crianças surdas, esses ganhos não foram mantidos ao longo do tempo. O fato de
que um declínio similar nos ganhos com a idade é visto entre crianças surdas com
implantes cocleares (GEERS et al., 2008) nos lembra novamente que a leitura não
é apenas sobre ouvir sons. Ensinar a leitura para alunos surdos tem que envolver
uma abordagem mais global, ou talvez aproximações, integrando habilidades de
nível inferior e superior, em vez de se concentrar em sub-habilidades individuais.
Então, vamos subir para o próximo nível de leitura.

3.1.2 Entendendo o que palavras significam


Nos tópicos anteriores, vimos que muitas crianças surdas não têm acesso
total à língua fluente durante os primeiros anos e têm menos interações sociais que
envolvem oportunidades de aprendizagem de palavras. Esta situação e os atrasos
resultantes no desenvolvimento do vocabulário (o aprendizado de palavras e seus
significados) têm sido documentados para crianças surdas de pais ouvintes, mas
parece que os filhos surdos de pais surdos também apresentam alguns atrasos da
língua em comparação a crianças ouvintes, embora, talvez, por diferentes razões
(KNOORS; MARSCHARK, 2012). Quaisquer que sejam suas origens, não deve
surpreender que as habilidades de vocabulário estejam fortemente relacionadas
às habilidades de leitura de alunos surdos e com deficiência auditiva (WAUTERS
et al., 2006), assim como são para os alunos ouvintes (SHIOTSU; WEIR, 2007). A

177
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

questão aqui não é apenas sobre quantidade – quantas palavras eles sabem – mas
também sobre a qualidade de seu conhecimento de palavras, sua profundidade
(o quanto eles sabem sobre a palavra/conceito) e sua amplitude (como ela está
conectada a outras palavras/conceitos). Por exemplo, crianças surdas com acesso
menor ou tardio à língua fluente normalmente têm maior probabilidade de
compreender e usar substantivos concretos e verbos de ação de alta frequência,
em vez de palavras mais abstratas ou gerais com as quais possam ter menos
experiência. Por causa de seu menor acesso à língua falada e escrita, os significados
das palavras individuais (escritas) também são menos superaprendidos pelos
surdos do que para os ouvintes e têm conexões associativas menores ou mais
fracas com outras palavras (MARSCHARK et al., 2004).

A ideia de palavras menos superaprendidas se reflete no que acontece


quando estamos ouvindo alguém falando em outra língua que não a nossa. Às
vezes temos a sensação de quase entender palavra após palavra na fala de alguém,
apenas para descobrir, no final da sentença, que não compreendemos o significado
do enunciado completo. Nessa situação, somos incapazes de controlar a taxa de
input e a taxa da fala normal que impede que façamos uma “busca” suficiente
para entender os significados das palavras no contexto (processamento top-down
e bottom-up novamente). Diminuir a taxa de input, por exemplo, durante a leitura,
parece que deve ajudar. No entanto, ir devagar e concentrar-se em palavras
individuais em vez de mensagens, arrisca sobrecarregar a memória de trabalho,
especialmente quando informações relacionadas na memória de longo prazo não
estão sendo ativadas automaticamente ou com rapidez suficiente para construir o
significado do texto (RAWSON; KINTSCH, 2002). Em ambos os casos, o resultado
é um entendimento superficial ou tênue que é facilmente interrompido. Esse é
um dos desafios associados à educação bilíngue para alunos surdos, porque a
língua de sinais não fornece acesso direto a significados de palavras (escritas)
como as palavras em si mesmas.

Como o conhecimento de vocabulário de alunos surdos tende a ser menos


rico do que o de pares ouvintes e porque eles provavelmente encontraram as
palavras em menos contextos, muitos alunos surdos têm dificuldade particular com
palavras que têm múltiplos significados. Frequentemente, apenas o significado
mais comum da palavra foi aprendido (ou superaprendido), e os leitores surdos
podem não estar cientes de alternativas ou ter significados alternativos que vêm
à mente tão rapidamente. Em vez disso, eles precisam depender fortemente do
contexto local para determinar qual significado é apropriado (KELLY, L. 1996), um
verdadeiro desafio se os alunos também tiverem dificuldades com a gramática.
No entanto, um foco no contexto local também pode interferir na compreensão
do texto maior (BANKS; GRAY; FYFE, 1990). Além de reduzir o processamento
top-down, a busca lexical lenta (processamento bottom-up) interrompe a leitura
de nível mais elevado e sobrecarrega os recursos cognitivos disponíveis. Um
resultado da sobrecarga de memória de trabalho, por exemplo, é a interrupção
do processamento gramatical. Easterbrooks e Stephenson (2006), Musselman
(2000) e Paul (1996), portanto, sugeriram que novas palavras devem ser ensinadas
a alunos surdos usando vários sentidos e situações, em vez de simplesmente

178
TÓPICO 1 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

dar aos alunos listas de vocabulário para aprender ou focar em significados


únicos. Curiosamente, as instruções em línguas de sinais tiveram um problema
semelhante. Vários livros didáticos de distintas línguas de sinais organizavam
sinais por suas formas de mão, e não por seus significados.

Materiais de vídeo mais recentes nas instruções de línguas de sinais


incorporam sinais em diálogos, mostrando variações naturais e mudanças sutis de
significado no contexto, ensinando esta língua mais como uma língua estrangeira
falada. Como diferentes métodos de ensinar e aprender sinais individuais afetam
a aquisição a longo prazo (para crianças ou adultos) ainda precisam ser estudados,
mas estão além do escopo deste livro.

Porque seus vocabulários são mais limitados e palavras/conceitos não são


tão bem conectados na memória de longo prazo, crianças surdas frequentemente
encontram palavras escritas que não usaram na comunicação interpessoal. Isso
é verdadeiro tanto para os estudantes que usam a língua de sinais como para
aqueles que usam a língua falada, embora seja provável que seja um obstáculo
maior para os surdos usuários da língua de sinais. Hermans et al. (2008a), no
entanto, descobriram que aprender palavras escritas era mais fácil quando as
crianças já conheciam um sinal para um conceito, enfatizando o papel da memória
de longo prazo. Eles notaram que o reconhecimento de uma palavra impressa/
escrita pode ocorrer quando ela ativa seu sinal na memória. Quando a palavra
é encontrada repetidamente, o vínculo entre palavra e o sinal é fortalecido e, ao
longo do tempo, está ligado a conceitos relacionados, de modo que seu significado
é automaticamente ativado em contextos relacionados (significado associativo).
Essa automaticidade através do superaprendizado reduz a necessidade de
processamento cognitivo intencional (decodificação consciente) e permite que a
leitura prossiga de maneira mais suave (HERMANS et al., 2008b). Em contraste,
quando as palavras são aprendidas isoladamente, sem oportunidades de aumentar
a profundidade e a amplitude do significado das palavras, um aprendiz surdo
pode ficar preso à situação descrita anteriormente, em que muita capacidade
cognitiva é dedicada ao processamento bottom-up (de baixo para cima) deixando
pouco para o processamento top-down (de cima para baixo) que permite que a
compreensão seja bem-sucedida.

A automaticidade no reconhecimento e compreensão de palavras é


apoiada pelo fato de os alunos estarem expostos a múltiplos significados, sentidos
e palavras e, para os alunos surdos, conhecerem suas formas escritas, faladas
e em sinais. Consistente com o modelo dualista de Paivio (1986), Wauters et al.
(2008) descobriram que aumentar o número de maneiras pelas quais as crianças
experimentam os significados das palavras (por exemplo, ouvir, ver, cheirar,
tocar) aumenta a automaticidade de ativação de significado. Wauters et al. (2008)
descobriram que tais estratégias de ensino realmente eram mais eficazes para
crianças ouvintes do que crianças surdas, uma situação que parece provavelmente
relacionada com a amplitude e profundidade de seu conhecimento/palavra
do que com seu estado auditivo (MARSCHARK et al., 2004). No entanto, no
Tópico 3 da Unidade 2, observamos que, ao contrário de suposições frequentes,

179
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

adolescentes e adultos jovens ouvintes frequentemente superam colegas surdos


no funcionamento visual-espacial, sendo assim menos dependentes na audição,
não torna os alunos surdos melhores aprendizes visuais, necessariamente.

O desenvolvimento de vocabulário e a conexão entre a escrita e significado


continuam a ser uma área de particular dificuldade para os alunos surdos,
claramente relacionados ao desenvolvimento da linguagem e à acessibilidade
da língua em seus ambientes. Uma variedade de estudos, portanto, explorou
intervenções para melhorar o conhecimento do vocabulário de alunos surdos
(SPENCER; MARSCHARK, 2010). Padden e Ramsey (2000), por exemplo,
descreveram o encadeamento usado por professores de surdos que são usuários
fluentes de língua de sinais. O encadeamento envolve o professor mostrando
uma palavra na escrita, no sinal e na soletração digital. As letras da palavra são
mostradas duas vezes, suportando o reconhecimento visual da escrita, enquanto
o sinal é repetido para reforçar o significado. Seal et al. (2005) enfatizaram a
importância de adicionar a forma falada da palavra a tais encadeamentos para
crianças com implantes cocleares. Gaustad e Kelly (2004) descreveram estratégias
semelhantes focadas na compreensão dos aprendizes surdos de unidades
individuais significativas ou morfemas. Estes incluem tanto as palavras de raiz
quanto sufixos e prefixos. Esse nível de compreensão requer conhecimento de
gramática, outro aspecto desafiador da leitura para muitos aprendizes surdos.
Então, agora vamos subir a outro nível.

3.1.3 Gramática: as regras da língua


Professores e pesquisadores há muito reconhecem a dificuldade específica
que os jovens surdos têm com as estruturas e regras gramaticais. Gramática aqui
se refere às regras pelas quais nós combinamos morfemas e unidades maiores
em unidades ainda maiores no texto (ou fala ou sinal). Isso envolve a ordem
das palavras em sentenças, mas também inclui o uso de morfemas gramaticais,
que indicam o número e o tempo verbal, bem como preposições, conjunções e
artigos. Algumas construções gramaticais são mais difíceis do que outras e,
algumas são, particularmente, problemáticas para alunos surdos: negação,
preposições, conjunção, questões, referências anafóricas (pronomes), estruturas
complementares, orações relativas e disjunção (TREZEK; WANG; PAUL, 2011).
Os primeiros quatro desses são desafiadores para os alunos surdos e com
deficiência auditiva, em parte porque não são enfatizados ​​na língua falada.
Alunos ouvintes do Ensino Médio, portanto, foram observados como tendo
uma melhor compreensão dos morfemas gramaticais e segmentação de palavras
do que estudantes universitários surdos (GAUSTAD; KELLY, 2004). Por outro
lado, da equação da língua, a negação, as preposições e as conjunções, em geral
não são produzidas explicitamente em línguas de sinais naturais (embora sejam
produzidas em LIBRAS e sistemas semelhantes). Mesmo quando são incluídos
em um enunciado de língua de sinais, geralmente são expressos de forma muito
diferente do que na língua escrita ou falada, muitas vezes usando localizações no
espaço, em vez de morfemas separados.

180
TÓPICO 1 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

Uma razão pela qual construções gramaticais complexas como cláusulas


relativas ou embutidas criam dificuldades para leitores menos qualificados é que
elas colocam demandas adicionais na memória de trabalho ao mesmo tempo
em que estão ocupadas com a decodificação de palavras e busca de significado.
No caso dos leitores surdos, já vimos que a menor automaticidade na busca de
palavras e no processamento top-down e bottom-up relacionados ao significado
podem levar a uma sobrecarga de memória de trabalho. R. Kelly (2003) descobriu,
assim, que tais estruturas complexas tornavam significativamente mais lenta
a leitura de estudantes universitários surdos, particularmente aqueles com
habilidades de leitura de baixo nível. Ele concluiu que os alunos com habilidades
gramaticais mais pobres não conseguem tirar o máximo proveito do suporte
de seu conhecimento de vocabulário e vice-versa. L. Kelly (1996), no entanto,
mostrou que a compreensão de frases com construções complexas poderia ser
aumentada em uma tarefa de múltipla escolha em que os alunos surdos viam
vídeos nos quais os significados da sentença eram demonstrados e tinham que
escolher a frase que se ajustava ao vídeo. Até o momento, não está claro se os
professores estão usando essas estratégias, mesmo quando se mostraram eficazes
– precisamente uma das razões para este livro ser escrito.

3.1.4 Então, o que devemos fazer sobre isso?


Este não é o lugar para tentar uma revisão dos muitos métodos que as
pessoas afirmam que irão melhorar as habilidades de leitura dos alunos surdos.
Easterbrooks e Beal-Alvarez (2013) e Easterbrooks e Stephenson (2006) fornecem
excelentes descrições de metodologias que se acredita serem eficazes, e P. E.
Spencer e Marschark (2010) avaliam as evidências disponíveis em relação aos
resultados. Tanto Easterbrooks e Stephenson (2006) como P. E. Spencer e Marschark
(2010) concluíram que, embora a literatura de pesquisa esteja crescendo, há pouca
base para a escolha de uma metodologia em detrimento de outra. Ainda assim,
algumas generalizações são evidentes nesse ponto.

Como indicamos anteriormente, uma base sólida na língua é essencial para


o desenvolvimento da literacia, e é o ingrediente que falta para muitas crianças
surdas. No entanto, existem algumas evidências de que as habilidades de literacia
também podem promover o desenvolvimento da língua, pelo menos em crianças
ouvintes (ROBERTS; JURGENS; BURCHINAL, 2005). Williams (2004) apresentou
um argumento semelhante em relação às crianças surdas. Ainda assim, para que
a língua e a literacia influenciem uma a outra, as crianças precisam ter acesso
efetivo à língua. Não estamos nos referindo aqui se uma criança surda conhece
uma língua de sinais ou pode receber e entender a língua falada através de um
aparelho auditivo ou implante coclear. Independentemente da sua modalidade
de comunicação preferida e da língua de instrução, a maioria dos alunos surdos e
com deficiência auditiva ainda recebe informações degradadas. Do lado da língua
falada, já explicamos que mesmo os implantes cocleares não proporcionam às

181
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

crianças surdas acesso “normal” à fala. A recepção da língua falada certamente


é melhorada para crianças com implantes, geralmente em maior grau do que
pode ser alcançado com aparelhos auditivos. Ainda assim, o input que chega
ao ouvido, ao nervo auditivo e ao cérebro não é tão bom quanto a da “audição
normal”.

Do lado da língua de sinais, não é raro as pessoas culparem as pobres


habilidades de língua de sinais dos pais e professores ouvintes, pela falta de
fluência na língua das crianças surdas. Há, certamente, alguma validade para
esse argumento, e reconhecidamente não se tem feito um bom trabalho no
desenvolvimento de métodos para ensinar adultos a língua de sinais (KNOORS;
MARSCHARK, 2012). A maioria dos adultos não tem tempo suficiente durante o
dia para adquirir fluência na língua de sinais, ou um novo idioma falado, mesmo
que programas instrucionais apropriados estejam disponíveis. Ao mesmo tempo,
por qualquer razão, muitos adultos surdos também não têm fluência em sua
língua nacional de sinais.

Embora as estatísticas não estejam disponíveis, a constatação de que


adolescentes e estudantes universitários surdos não aprendem mais com a língua
de sinais do que com o texto, sugere, claramente, a falta de fluência na língua
de sinais (MARSCHARK et al., 2006). Por mais preocupante que essa descoberta
seja para algumas pessoas, o fato desses alunos acharem que são usuários com
compreensão fluente da língua de sinais cria problemas ainda maiores para a
aprendizagem. Mesmo no nível universitário, os alunos surdos muitas vezes não
conseguem reconhecer as dificuldades de compreensão em sala de aula ou podem
reconhecê-las, mas presumem que não devem esperar entender tudo (NAPIER;
BARKER, 2004). Ao mesmo tempo, enquanto a velha máxima é verdadeira de
que qualquer coisa que possa ser dita em uma língua pode ser dita em outra,
os léxicos limitados das línguas de sinais naturais necessariamente significam
que não haverá uma correspondência de um para um entre a língua de sinais
do aprendiz e a língua em que a pessoa está aprendendo a ler e a escrever. Uma
solução proposta para este dilema é a educação bilíngue para alunos surdos,
utilizando a língua nacional de sinais, bem como o vernáculo.

4 EDUCAÇÃO BILÍNGUE PARA ALUNOS SURDOS


Como observaram Knoors e Marschark (2012), milhões de crianças em
todo o mundo crescem de forma bilíngue como consequência da área geográfica
em que vivem, seja uma comunidade com uma história de vários idiomas ou
devido à imigração. No entanto, como descrevemos no Tópico 2 da Unidade 2,
a educação bilíngue para crianças surdas continua a ser controversa, embora
(ou talvez porque) não haja provas convincentes a favor ou contra ela. Crianças
surdas, de pais surdos, que se comunicam usando uma língua de sinais natural,

182
TÓPICO 1 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

podem ter uma vantagem em se tornar bilíngue em virtude de viver em uma


situação relativamente favorável à língua em comparação a crianças surdas que
não compartilham um modo efetivo de comunicação com seus pais (ouvintes).
Como observamos anteriormente, essa disponibilidade de modelos de língua
fluentes a partir do nascimento, resulta em habilidades de alfabetização que
parecem um pouco avançadas em comparação com outras crianças surdas. Ainda
assim, a aquisição inicial da língua de sinais é quantitativa e qualitativamente
diferente da aquisição da língua falada por crianças ouvintes de pais ouvintes
tanto no processo quanto no resultado (ANDERSON; REILLY, 2002), novamente
o resultado da falta de equivalência exata na aquisição da língua de sinais ou da
língua falada.

Ao contrário das famílias surdas, as famílias ouvintes têm que fazer uma
escolha explícita para a educação bilíngue, comprometendo-se a aprender e usar
a língua de sinais. No entanto, parece que o fator chave no estabelecimento de
proficiência em leitura, em alunos surdos, é a disponibilidade de uma linguagem
consistente e rica dos pais (HARRIS; BEECH, 1998), algo que os pais que estão
apenas aprendendo a usar a língua de sinais não serão capazes de fornecer. Em
média, as habilidades em língua de sinais de crianças surdas com pais ouvintes
estão muito aquém das habilidades de crianças surdas com pais surdos (MAYER;
LEIGH, 2010). No entanto, crianças surdas cujos pais apoiam o desenvolvimento
inicial através do uso de sinais parecem ter vantagens linguísticas, sociais e
acadêmicas durante os primeiros anos (CALDERON; GREENBERG, 1997), mesmo
que as implicações de longo prazo do bilinguismo bimodal para a alfabetização e
outras áreas de desenvolvimento permanecem obscuras (MAYBERRY, 2010). Ou
seja, apesar da evidência de vantagens precoces, no momento em que chegam à
educação pós-secundária, nem a aprendizagem em leitura nem a aprendizagem
em sala de aula é prevista pelas habilidades em línguas de sinais dos alunos
surdos ou pela idade em que aprenderam a língua de sinais (MARSCHARK et
al., 2009).

O precedente deve deixar claro que os estudos que demonstram melhores


habilidades de leitura entre crianças surdas de pais surdos em comparação
com filhos surdos de pais ouvintes (CHAMBERLAIN; MAYBERRY, 2000) são
confundidos pelo fato de que existem muitas diferenças nessas famílias além
da disponibilidade da língua de sinais. Da mesma forma, por mais que pareça
benéfico para os alunos surdos terem acesso precoce à linguagem em um
ambiente bilíngue, ainda não temos nenhuma evidência de que seja suficiente
para oferecer vantagens na leitura ou em outros domínios acadêmicos. Em vez
disso, a leitura envolve a interação complexa da linguagem, o apoio ambiental
e a capacidade cognitiva. O mesmo pode ser dito para essencialmente toda
“solução” para a leitura e outros desafios acadêmicos dos aprendizes surdos. A
leitura compartilhada (SCHLEPER, 1997), por exemplo, pretende tornar a leitura
uma atividade positiva e motivadora compartilhada entre pais e filhos surdos.

183
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

Os programas de leitura compartilhada dirigidos a crianças surdas


envolvem pais e filhos que olham para os livros juntos, com os pais demonstrando
e encorajando a elaboração do conteúdo do livro. Os pais aprendem a seguir os
interesses de seus filhos em vez de serem diretivos e ajustar o nível e a quantidade
de material para que correspondam ao tempo de atenção e à capacidade de
linguagem da criança. Evidências dos Estados Unidos e da Holanda sugerem
que a leitura compartilhada em casa apoia a aquisição de sub-habilidades
de leitura de crianças ouvintes nos anos escolares, incluindo conhecimento
fonológico, vocabulário e motivação crescente para a leitura (ZEVENBERGEN;
WHITEHURST, 2003).

Apesar de seu uso popular com crianças surdas, no entanto, a evidência


de sua eficácia em relação às habilidades de leitura é notavelmente pequena.
Sínteses fornecidas por Easterbrooks e Stephenson (2006) e P. E. Spencer e
Marschark (2010) sugerem que a leitura compartilhada pode ser mais eficaz na
produção de benefícios em longo prazo quando usada em ambientes escolares. As
crianças mais velhas, naturalmente, também têm mais conhecimento do mundo e
habilidades cognitivas avançadas que também se relacionam com outras áreas da
aprendizagem acadêmica. Antes de considerar tais questões, vamos olhar para o
outro lado da moeda da literacia, a escrita.

5 A ESCRITA
As habilidades de escrita de alunos surdos, como aquelas de alunos
ouvintes, geralmente são mais difíceis de quantificar do que suas habilidades de
leitura. Em parte, por esse motivo, também há muito menos pesquisas sobre o
assunto. Alguns pesquisadores se concentram em escrever amostras de alunos
surdos que variam em dimensões específicas (por exemplo, aqueles que usam
língua de sinais versus língua falada, aqueles com implantes cocleares ou não)
para descrever seus pontos fortes e fracos. Essa abordagem apreende a grande
variabilidade entre os surdos que escrevem e demonstra algumas diferenças óbvias
entre os grupos (MAYER, 2007). No entanto, generalizar a partir de indivíduos ou
pequenas amostras de alunos surdos também corre o risco de obscurecer possíveis
causas e correlações de seus estilos de escrita, o que requer dados de grupo. Os
estudos de escrita parecem nunca incluir medidas de cognição ou linguagem que
são essenciais se quisermos compreender os fundamentos da escrita de alunos
surdos e as maneiras pelas quais ela está relacionada à leitura (ou não).

Estudos sobre a escrita de crianças surdas, não surpreendentemente,


indicam uma forte associação com a leitura e a escrita. Estudos de Yoshinaga-
Itano e Snyder (1985), e Everhart e Marschark (1988), por exemplo, mostraram
que jovens surdos que escrevem tipicamente produzem sentenças relativamente
curtas com estruturas rígidas (simples ativa, sentenças sujeito-verbo-objeto)
que são relativamente concretas e literais. A gramática usada em frases mais
complexas frequentemente contém erros (YOSHINAGA-ITANO; SNYDER;
MAYBERRY, 1996), palavras funcionais são omitidas ou usadas incorretamente

184
TÓPICO 1 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

(MARSCHARK; MOURADIAN; HALAS, 1994), e a estrutura do discurso


pode ser pobre (QUIGLEY; PAUL, 1984). Everhart e Marschark (1988), no
entanto, descobriram que os jovens surdos escreviam histórias com estruturas
discursivas comparáveis ​​aos colegas ouvintes, pelo menos quando analisadas
em termos de seus significados subjacentes (ou seja, gramáticas de histórias).
Musselman e Szanto (1998), Yoshinaga-Itano Snyder e Mayberry (1996) e
Marschark, Mouradian e Halas (1994) também descobriram que o significado é
frequentemente preservado na escrita de crianças surdas, mesmo que os erros
de ortografia, gramática e seleção de palavras (ou omissão) tornem sua escrita
menos coerente do que a de seus colegas ouvintes. Ao mesmo tempo, a escrita de
crianças surdas geralmente parece ter a estrutura da língua de sinais, de modo
que as palavras omitidas frequentemente correspondem a aspectos da mensagem
que não seriam explicitamente expressos em sinais. Como esses erros podem
ter implicações superficiais ou mais informativas, os pesquisadores começaram
a examinar a escrita das crianças surdas no contexto do que elas querem dizer
(FERREIRO, 1990) em vez de apenas as relações lexicais e acertos gramaticais.

C. Mayer (2007) adotou essa abordagem ao examinar amostras de crianças


surdas que usaram língua de sinais ou comunicação simultânea (língua de sinais
mais língua falada) como seu principal modo de comunicação. Seu foco, tanto
nesta pesquisa como em investigações subsequentes, tem sido na maneira em
que as crianças passam da comunicação face a face para a comunicação escrita.
Em suas palavras, “o texto escrito e a linguagem face a face devem fazer sentido
uma para a outra, constituindo uma relação simbiótica que as crianças pequenas
precisam desvendar” (MAYER, 2007, p. 12). Mayer sugeriu que a escrita poderia
ser um pouco mais desafiadora para as crianças surdas que usam a língua de
sinais do que aquelas que usam a língua falada, mas independentemente de usar
uma ou outra, ela argumentou que as crianças precisam primeiro ter acesso ao
idioma no qual irão ler e escrever.

Esses pontos não pretendem sugerir que as crianças surdas precisem


de um apoio para a literacia que seja totalmente diferente daquelas de crianças
ouvintes. Em vez disso, C. Mayer (2007) argumentou que precisamos pegar o que
aprendemos sobre a promoção de habilidades de literacia em crianças ouvintes
e adaptá-las e complementá-las de modo a serem apropriadas para crianças
surdas ou com deficiência auditiva. Sua descrição do desenvolvimento da escrita
de crianças surdas e o arcabouço teórico anterior fornecido por C. Mayer e
Wells (1996) levantam uma questão importante, mas contenciosa, em relação à
linguagem e à literacia, que descrevemos primeiro no Tópico 1 da Unidade 2.
Parafraseando C. Mayer (2007), quando enfatizamos a transição da comunicação
face a face para a escrita, é necessário considerar a língua de sinais versus a língua
falada como a língua de instrução para crianças surdas. As crianças surdas que
usam a língua falada, a comunicação simultânea ou um sistema de sinais baseado
na língua nacional tendem a ter uma transição mais fácil para a escrita do que
aquelas que usam uma língua de sinais natural que possui diferentes regras
morfológicas, gramaticais e discursivas (BURMAN; NUNES; EVANS, 2006). Para
crianças surdas que têm essa base, a chave será fornecer conexões explícitas entre
essa língua e o que é escrito e lido.
185
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

Entre crianças surdas que usam uma língua de sinais natural, Singleton
et al. (2004) descobriram que aqueles com melhores habilidades na língua
mostraram uma melhor transição para a escrita, embora não tão boa quanto
ouvintes que estavam aprendendo o idioma nacional como segunda língua
falada. Seus resultados demonstraram que a transição de um idioma falado para
outro envolve uma conexão mais direta entre os elementos de sua língua face
a face e a língua na qual eles estarão lendo e escrevendo – eles têm o “código”
de linguagem necessário e podem se concentrar nos detalhes da mudança da
comunicação interpessoal para a comunicação escrita.

Se as crianças surdas começam com uma língua de sinais ou uma língua


falada, portanto, a meta para os pais e professores deve ser a de fornecer uma ponte
de uma forma de comunicação para a outra. No primeiro caso, estas são línguas
diferentes. Neste último, são apenas modalidades diferentes da mesma língua,
e crianças com perdas auditivas tendem a ser menos adeptas às nuances dessa
língua. Anteriormente neste tópico, descrevemos a fala e a fonética visual como
dois meios de fornecer uma ponte para as crianças surdas, independentemente
de estarem, inicialmente, usando a língua de sinais ou a língua falada. O uso da
fonética visual por Trezek et al. (2007), por exemplo, melhorou significativamente
as habilidades de escrita de crianças surdas, assim como a leitura delas. Escrever,
no entanto, requer uma facilidade mais exata com o vernáculo do que a leitura.
Não há “escrita de palavra inteira” ou “escrita da essência” que corresponda às
estratégias de leitura convenientes, ainda que imprecisas, adotadas por muitos
aprendizes surdos. Então, o que nós podemos fazer sobre isso?

Aram, Most e Mayafit (2006) demonstraram o potencial de um processo


que eles chamavam de escrita mediada para apoiar a escrita precoce de crianças
surdas. As crianças e suas mães olhavam para um livro de histórias (sem palavras)
e as crianças eram encorajadas a escrever a história como contavam. Suas mães
“mediaram” o processo escrevendo qualquer palavra que as crianças quisessem
incluir, mas não sabiam. O envolvimento ativo das mães na leitura e na escrita
compartilhada foi associado a melhorias independentes na escrita infantil e em
sua linguagem mais geral.

Antia, Reed e Kreimeyer (2005) argumentam que os métodos que


geralmente usamos para ensinar os alunos surdos a escrever, na verdade, podem
retardar seu progresso. Eles sugeriram que a ênfase dos pais e professores na
escrita correta pode interferir na motivação dos alunos para escrever e na criação
de textos coerentes e significativos. Para os alunos mais velhos, uma escrita
mais dirigida ou propositada pode ser útil para fazer da escrita uma função
pessoal e criativa que é mais atraente para os jovens surdos que escrevem.
Manter diários ou anotações pessoais, escrever anotações para os membros da
família e escrever minutas ou boletins informativos para grupos de jovens ou
clubes não é tão estressante quanto escrever na escola e proporcionar aos alunos
surdos oportunidades de ver a escrita como uma maneira de expressar suas
experiências, sentimentos e opiniões (ALBERTINI; MEATH-LANG; HARRIS,
1994; MUSSELMAN; SZANTO, 1998).

186
TÓPICO 1 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: LITERACIA

Albertini e Shannon (1996), por exemplo, descobriram que a escrita


informal fora da escola era bastante comum entre as crianças surdas e, geralmente,
era vista como bastante confortável. Ou seja, se os alunos estão escrevendo para
um propósito específico e se concentrando no conteúdo, o processo pode ser mais
positivo e interessante. A correção e a modelagem gradual da escrita do aluno
para formas convencionais podem vir depois, uma vez que ele se torne menos
ansioso. Marschark, Lang e Albertini (2002) sugeriram, portanto, que a escrita
deveria ser vista como um processo e não como uma sequência rígida. Ao permitir
que os alunos surdos explorem a escrita em vez de criticar constantemente o que
produzem, a atividade pode se tornar mais pessoal e gratificante.

Dentro do ambiente escolar, as ideias acima mencionadas estão por trás


do que é frequentemente chamado de escrita através do currículo. Em vez de
considerar a escrita como uma atividade separada do resto do dia letivo, escrever
sobre o que está acontecendo no conteúdo dos cursos e nas atividades curriculares
pode fornecer uma maneira de vincular a atividade de escrever ao que o aluno está
aprendendo. O objetivo é que eles sejam mutuamente apoiados. Lang e Albertini
(2001), por exemplo, encorajaram os jovens surdos a escrever de forma criativa
sobre o que eles estavam aprendendo nas aulas de ciências. Ter um professor
de português e um professor de ciências trabalhando juntos proporcionaria aos
alunos conteúdo e propósito na escrita. Os alunos surdos seriam encorajados a
registrar os detalhes do experimento por escrito e depois usar as informações
para formar hipóteses sobre o que aconteceria. O professor de ciências poderia
usar seus relatórios de laboratório para envolver os alunos no aprendizado de
ciências, enquanto o professor de português poderia ajudar os alunos na redação.
Embora Lang e Albertini (2001) tenham fornecido demonstrações interessantes a
esse respeito, eles não ofereceram evidências de que o desempenho dos alunos
surdos melhorasse em qualquer dos domínios.

Antia et al. (2009), no entanto, realizaram um estudo envolvendo um


grande grupo de surdos e com deficiência auditiva de 8 a 18 anos de idade em
salas de aula regulares. No geral, o grupo de mais de 100 alunos pontuou no nível
de “média baixa” em comparação aos padrões de alunos ouvintes em um teste
de escrita padronizado, embora tenha havido uma variabilidade considerável.
O modo de comunicação preferencial dos alunos não estava relacionado às
pontuações de escrita, mas aqueles que utilizavam intérpretes para apoiar a
língua de sinais na sala de aula tiveram uma pontuação menor que os outros.
Mais importante, a lacuna entre os aprendizes surdos e os padrões de aprendizes
ouvintes diminuiu com a idade, sugerindo que eles estavam começando a
acompanhar os colegas ouvintes.

Resultados semelhantes foram obtidos por Antia et al. (2009) em um estudo


de cinco anos envolvendo quase 200 estudantes surdos que passaram, pelo menos,
parte de cada dia letivo em salas de aula regulares. Constatou-se que os escores
de escrita aumentavam ao longo do tempo em relação aos colegas ouvintes,
embora, novamente, fossem bastante variáveis. Ainda assim, as pontuações
permaneceram abaixo das expectativas do nível de idade para crianças ouvintes.

187
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

Desta vez, o modo de comunicação mostrou-se significativamente relacionado


aos escores de escrita, com uma vantagem para os alunos matriculados em
programas que enfatizam a língua falada (GEERS; MOOG, 1989; MUSSELMAN;
SZANTO, 1998).

Em resumo, a modalidade da língua, a exposição precoce à leitura e à


aprendizagem dos alunos surdos são importantes, mas também há outros
fatores envolvidos. Vários estudos, por exemplo, analisaram os preditores
de desempenho acadêmico entre alunos surdos de sucesso, demonstrando a
importância do envolvimento dos pais e as altas expectativas em todos os níveis
educacionais (DELANA; GENTRY; ANDREWS, 2007; TOSCANO; MCKEE;
LEPOUTRE, 2002).

Com base nos relatórios dos alunos, Toscano, McKee e Lepoutre (2002)
concluíram que as habilidades de literacia dos alunos surdos também se
beneficiaram da experiência precoce e intensa com leitura e escrita, atividades
sociais relativamente limitadas, autoimagem positiva e comunicação eficaz e
extensa dentro da família. Observe também que DeLana, Gentry e Andrews (2007)
concluíram que os alunos de famílias que usam a língua falada se beneficiaram
mais do que aqueles de famílias que usam a língua de sinais.

Em outras palavras, habilidades de leitura e escrita bem-sucedidas de


alunos surdos requerem os mesmos fatores de apoio e carinho que os de alunos
ouvintes. Na verdade, esperamos que o mesmo seja verdade em relação à
matemática, a área de conteúdo a que veremos a seguir. O desafio, claro, é a
melhor maneira de fornecer estes ambientes aos alunos surdos.

188
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• Apesar de frequentemente funcionarem em níveis adequados à idade quando


são jovens, os alunos surdos com implantes cocleares estão significativamente
atrás de seus pares ouvintes no desempenho acadêmico quando chegam ao
Ensino Médio.

• Não há soluções que funcionem para todas as crianças surdas em todas as


situações.

• Há necessidade de práticas educacionais que correspondam às diversas forças


e necessidades dos alunos surdos.

• À parte de algum trabalho no ensino de ciências, praticamente todos os


estudos de pesquisa e intervenção envolvendo alunos surdos concentraram-se
na literacia e numeracia.

• Parece ser uma língua precoce, em vez de ter pais surdos que apoiem ​​o
desempenho acadêmico e o aprendizado mais geral.

• As descobertas disponíveis indicam claramente que mesmo que tenha mudado


muitas coisas na educação de alunos surdos nas últimas décadas, a realização
acadêmica de alunos surdos não melhorou muito e, em média, ainda fica atrás
da realização acadêmica de colegas ouvintes.

• Entre alunos surdos mais jovens e mais velhos e com deficiência auditiva,
melhores habilidades de fala e audição estão associadas a melhores habilidades
de leitura.

• A leitura é frequentemente descrita como envolvendo processos top-down (de


cima para baixo) e bottom-up (de baixo para cima).

• Para os alunos surdos, há três componentes da leitura que, historicamente,


foram encontrados para lhes dar uma dificuldade particular e foram os mais
estudados: decodificação de palavras, vocabulário e gramática.

• Albertini e Mayer identificaram a dificuldade em ler palavras no contexto


como um grande impedimento para a compreensão de textos de estudantes
universitários surdos.

• A decodificação de palavras polimorfêmicas mais complexas é difícil para os


leitores surdos, especialmente para crianças surdas.
189
• Embora os melhores leitores surdos tendam a ter melhores habilidades
fonológicas, vários pesquisadores argumentaram que essas habilidades não
são necessárias para uma leitura competente.

• Os leitores surdos podem usar informações oriundas da leitura orofacial,


da soletração digital, da articulação e da ortografia do texto para criar
representações fonológicas que não são auditivas.

• Ensinar a leitura para alunos surdos tem que envolver uma abordagem mais
global, ou talvez aproximações, integrando habilidades de nível inferior e
superior, em vez de se concentrar em sub-habilidades individuais.

• Por causa de seu menor acesso à língua falada e escrita, os significados das
palavras individuais (escritas) também são menos superaprendidos pelos
surdos do que para os ouvintes e têm conexões associativas menores ou mais
fracas com outras palavras.

• Novas palavras devem ser ensinadas a alunos surdos usando vários sentidos
e situações, em vez de simplesmente dar aos alunos listas de vocabulário para
aprender ou focar em significados únicos.

• Materiais de vídeo mais recentes nas instruções de línguas de sinais


incorporam sinais em diálogos, mostrando variações naturais e mudanças
sutis de significado no contexto, ensinando esta língua mais como uma língua
estrangeira falada.

• Aumentar o número de maneiras pelas quais as crianças experimentam os


significados das palavras (por exemplo, ouvir, ver, cheirar, tocar) aumenta a
automaticidade de ativação de significado.

• O desenvolvimento de vocabulário e a conexão entre a escrita e significado


continuam a ser uma área de particular dificuldade para os alunos surdos,
claramente relacionados ao desenvolvimento da linguagem e à acessibilidade
da língua em seus ambientes.

• Algumas construções gramaticais são mais difíceis do que outras e algumas


são, particularmente, problemáticas para alunos surdos: negação, preposições,
conjunção, questões, referências anafóricas (pronomes), estruturas
complementares, orações relativas e disjunção.

• A menor automaticidade na busca de palavras e no processamento top-down e


bottom-up relacionados ao significado, nos leitores surdos, podem levar a uma
sobrecarga de memória de trabalho.

• A constatação de que adolescentes e estudantes universitários surdos não


aprendem mais com a língua de sinais do que com o texto sugere claramente a
falta de fluência na língua de sinais.

190
• Apesar da evidência de vantagens precoces, no momento em que chegam à
educação pós-secundária, nem a aprendizagem em leitura nem a aprendizagem
em sala de aula é prevista pelas habilidades em línguas de sinais dos alunos
surdos ou pela idade em que aprenderam a língua de sinais.

• Os programas de leitura compartilhada dirigidos a crianças surdas envolvem


pais e filhos que olham para os livros juntos, com os pais demonstrando e
encorajando a elaboração do conteúdo do livro.

• As habilidades de escrita de alunos surdos, como aquelas de alunos ouvintes,


geralmente são mais difíceis de quantificar do que suas habilidades de leitura.

• Estudos sobre a escrita de crianças surdas, não surpreendentemente, indicam


uma forte associação com a leitura e a escrita.

• O significado é frequentemente preservado na escrita de crianças surdas,


mesmo que os erros de ortografia, gramática e seleção de palavras (ou omissão)
tornem sua escrita menos coerente do que a de seus colegas ouvintes.

• A escrita de crianças surdas geralmente parece ter a estrutura da língua de


sinais, de modo que as palavras omitidas frequentemente correspondem a
aspectos da mensagem que não seriam explicitamente expressos em sinais.

• As crianças surdas que usam a língua falada, a comunicação simultânea ou um


sistema de sinais baseado na língua nacional tendem a ter uma transição mais
fácil para a escrita do que aquelas que usam uma língua de sinais natural que
possui diferentes regras morfológicas, gramaticais e discursivas.

• Se as crianças surdas começam com uma língua de sinais ou uma língua falada,
portanto, a meta para os pais e professores deve ser fornecer uma ponte de
uma forma de comunicação para a outra.

• Ao permitir que os alunos surdos explorem a escrita em vez de criticar


constantemente o que produzem, a atividade pode se tornar mais pessoal e
gratificante.

• Os preditores de desempenho acadêmico entre alunos surdos de sucesso


demonstram a importância do envolvimento dos pais e as altas expectativas
em todos os níveis educacionais.

• As habilidades de literacia dos alunos surdos também se beneficiaram


da experiência precoce e intensa com leitura e escrita, atividades sociais
relativamente limitadas, autoimagem positiva e comunicação eficaz e extensa
dentro da família.

191
AUTOATIVIDADE

1 Para os alunos surdos, há três componentes da leitura que, historicamente,


foram encontrados para lhes dar uma dificuldade particular e foram os mais
estudados, quais são estes três componentes?

2 Duas intervenções criadas para ajudar os leitores surdos a decifrar o código


fonológico da leitura são a fala com pistas e a fonética visual. Descreva o
que seria a intervenção da fonética visual.

3 Algumas construções gramaticais são mais difíceis do que outras, todavia


algumas são particularmente problemáticas para alunos surdos. Quais são
estas construções gramaticais?

192
UNIDADE 3
TÓPICO 2
REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: NUMERACIA

1 INTRODUÇÃO
Não há dúvida de que, quando se trata de educar alunos surdos, tendemos
a ser obcecados pela língua e pela literacia. No entanto, como indicamos
anteriormente, os alunos surdos tendem a ficar atrás de seus pares ouvintes em
todo o currículo. Parte da situação, claro, é um resultado direto de atrasos na
aquisição da língua. Todavia o complexo de fatores associados à aprendizagem,
incluindo linguagem, desenvolvimento cognitivo, aprendizagem social e
emocional e experiências educacionais, também afetará o desempenho em outros
domínios.

No tópico anterior, notamos que além da leitura e da escrita, a matemática


é a área mais amplamente avaliada do currículo para surdos e ouvintes, mas
também há algumas informações relevantes para a presente discussão sobre
educação em ciências. Este tópico aborda ambos os domínios, juntamente aos
fatores relacionados que podem influenciar a aprendizagem e outras áreas
acadêmicas.

2 MATEMÁTICA
Como no caso da leitura, estudos realizados nos últimos 40 anos indicam
que crianças surdas ficam atrás de pares ouvintes de 2 a 6 anos em matemática
(ALLEN, 1986; QI; MITCHELL, 2012). Por exemplo, a norma nacional do Stanford
Achievement Test, nona edição (SAT9) para alunos surdos e com deficiência
auditiva, obteve notas médias para alunos de 18 anos ao nível do quinto ano
escolar (10 a 11 anos) em resolução de problemas matemáticos e logo abaixo do
nível do sexto ano escolar (11 a 12 anos de idade) em procedimentos matemáticos.
Pesquisas conduzidas com estudantes universitários também demonstraram que
alunos surdos não se saem tão bem quanto os colegas ouvintes na resolução de
problemas matemáticos (MARSCHARK et al., 2013). Pelo menos em parte, tais
descobertas refletem diferenças em habilidades mais fundamentais relacionadas
à matemática, como cálculo mental e velocidade de comparação de números
(BULL; MARSCHARK; BLATTO-VALLEE, 2005).

Como é geralmente o caso com a realização acadêmica dos aprendizes


surdos a parte da leitura (CONVERTINO et al., 2009), há pouca evidência de
que seu desempenho em matemática esteja relacionado aos limiares auditivos
(MARSCHARK et al., 2013). Os resultados de várias pesquisas sugerem que

193
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

as expectativas dos pais, as práticas pedagógicas e os fatores relacionados ao


professor provavelmente contribuem para essas diferenças entre os alunos
ouvintes. Fatores semelhantes têm sido sugeridos como envolvidos nas lacunas
observadas no desempenho acadêmico mais amplamente entre alunos surdos e
ouvintes (MARSCHARK; LANG; ALBERTINI, 2002). O que é menos claro é até
que ponto tais variáveis ​​interagem com as habilidades cognitivas de linguagem
e matemáticas das crianças para influenciar o desempenho e, porque as crianças
surdas, em particular, experimentam dificuldades em adquirir proficiência em
matemática.

Pesquisadores apontaram várias vezes para o atraso dos alunos surdos no


desenvolvimento de habilidades matemáticas como sendo o resultado de menos
experiências precoces com conceitos quantitativos (KRITZER, 2009), atrasos no
desenvolvimento da língua (GREGORY, 1998) e menor qualificação de professores
em práticas de ensino de matemática (PAGLIARO, 1998). Mais recentemente,
a pesquisa também demonstrou o impacto sobre a realização acadêmica das
diferenças baseadas no processamento de informações sensorial e de linguagem,
o que foi discutido nos tópicos anteriores (MARSCHARK; KNOORS,
​​ 2012).

Todas essas questões, é claro, podem estar envolvidas em diferentes


crianças surdas em diferentes idades. Pagliaro e Ansell (2012), por exemplo,
examinaram as estratégias de resolução de problemas de matemática de 59
crianças surdas e com deficiência auditiva, todas com pontuação igual ou superior
a de um usuário nativo da língua de sinais de sua idade (5 a 9 anos) em um teste
de compreensão da Língua de Sinais Americana (ASL). Eles apresentaram nove
problemas de palavras na ASL que exigiam adição, subtração, multiplicação ou
divisão. No geral, as crianças usaram os mesmos tipos de estratégias de resolução
de problemas independentemente do status da audição, mas as crianças surdas
eram muito mais propensas a usar estratégias de contagem simples (contando
para frente ou para trás) do que estratégias mais avançadas de modelagem ou
estratégias baseadas em fatos, comparadas aos seus pares ouvintes.

Pagliaro e Ansell (2012) concluíram que a diferença nas estratégias


poderia refletir diferenças nas habilidades linguísticas das crianças ou em suas
experiências educacionais. Com relação à linguagem, eles enfatizaram que para
entender um problema bem o suficiente para poder iniciar o processo de solução
de problemas, a criança tem que entender primeiro qual é o problema, isto é,
entender a linguagem na qual ele é expresso. De fato, as habilidades em língua
de sinais das crianças neste estudo se correlacionaram significativamente com
suas frequências de usar estratégias de solução viáveis ​​para os problemas. Com
relação à educação, eles notaram a pouca frequência com que as crianças surdas
são expostas a problemas contextualizados e os tipos de experiências de resolução
de problemas necessárias para serem capazes de lidar com isso e desenvolver
estratégias de solução mais sofisticadas.

194
TÓPICO 2 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: NUMERACIA

A língua também tem sido sugerida como um fator chave no desempenho


matemático de alunos surdos mais velhos, pois alguns pesquisadores têm
apontado que muitas vezes têm pouco acesso à comunicação em sala de aula
(PAGLIARO; ANSELL, 2002). Kidd, Madsen e Lamb (1993), por exemplo,
argumentaram que as dificuldades dos alunos surdos no idioma utilizado nos
textos desempenham um papel importante em seu desempenho relativamente
pobre em matemática devido a fatores como múltiplos significados de palavras,
múltiplos rótulos para conceitos matemáticos e falta de familiaridade com
símbolos matemáticos e abreviações. O uso de traduções de língua falada/escrita
para língua de sinais em salas de aula de matemática também pode afetar a
dificuldade dos problemas. Espera-se que os problemas se tornem mais fáceis com
as sugestões icônicas potencialmente disponíveis na língua de sinais (ANSELL;
PAGLIARO, 2001), mas isso pode mudar a natureza do problema para que as
crianças surdas o interpretem de forma diferente (e às vezes mais facilmente)
do que crianças ouvintes. Ansell e Pagliaro (2006), no entanto, descobriram que,
apesar das expectativas dos professores de que as características visuais-espaciais
dos problemas apresentados por meio da língua de sinais apoiariam a aplicação
de estratégias viáveis ​​de resolução de problemas por crianças surdas:

A maioria das crianças não pareceu ver o uso de sinais para expor
o problema como contendo links para sua solução. De fato, muitas
crianças, particularmente as menos bem-sucedidas, pareciam não
atender à situação problemática, concentrando-se principalmente
nos números dos problemas. Elas ignoraram ou não reconheceram
qualquer relação entre a contextualização e sua solução, perdendo
marcadores linguísticos que poderiam ter contribuído para tornar o
problema mais fácil (ANSELL; PAGLIARO, 2006, p. 167).

Blatto-Vallee et al. (2007) obtiveram resultados semelhantes, descobrindo


que os alunos surdos no Ensino Médio até a faculdade, tinham menos probabilidade
do que os pares ouvintes de utilizar representações de relações espaciais refletindo
aspectos conceituais e matemáticos de problemas matemáticos em palavras. Em
vez disso, eles aparentemente dependiam de representações mentais “pictóricas”,
que incluíam aspectos incidentais dos problemas, mas não relações quantitativas/
conceituais importantes para sua solução.

Marschark et al. (2013) examinaram especificamente até que ponto as


habilidades visuoespaciais de estudantes universitários surdos contribuíram para
a solução de problemas matemáticos que incluíam diagramas. Como no estudo
de Blatto-Vallee et al. (2007), os estudantes ouvintes, geralmente demonstraram
melhores habilidades visuoespaciais do que os alunos surdos, superando os
alunos surdos em duas das sete tarefas visuoespaciais, sem diferença entre
os grupos nas outras cinco. Uma das duas tarefas em que os alunos ouvintes
superavam os alunos surdos envolvia a localização e a marcação de um padrão
repetido o mais rápido possível, envolvendo, assim, a habilidade visuoespacial
e o funcionamento executivo e a atenção sustentada. A segunda envolveu a
separação da figura do fundo em um diagrama complexo. Talvez mais interessante
tenha sido a constatação de que as pontuações de desempenho em matemática
dos alunos surdos estavam associadas a um leque mais amplo de habilidades

195
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

visuoespaciais do que as dos alunos ouvintes. Também é digno de nota que não
houve diferenças no desempenho visuoespacial ou nos escores de matemática
entre os usuários de sinais precoces e os usuários de sinais tardios no grupo de
surdos. Esses achados, portanto, contrastam com a suposição geral de que os
alunos surdos devem ser considerados aprendizes visuais e a crença de que os
aprendizes que usam a língua de sinais devem ser particularmente adeptos a esse
respeito.

Em conjunto, os estudos acima mencionados sugerem que existem


habilidades visuoespaciais específicas que podem apoiar a resolução de problemas
de matemática de alunos surdos – e presumivelmente podem ser aumentadas
por treinamento – mesmo que esses alunos não tenham necessariamente
melhores habilidades visuoespaciais do que ouvintes. De certa forma, isso parece
intuitivamente óbvio. No entanto, tais intervenções raramente foram tentadas
com alunos surdos, presumivelmente porque se supunha que suas habilidades
visuoespaciais aumentadas seriam “naturalmente” utilizadas na sala de aula.

Uma exceção é um estudo relatado por Nunes e Moreno (2002). Eles


desenvolveram um programa de intervenção concebido para promover o
reconhecimento, por parte das crianças surdas, das relações entre os conceitos
matemáticos básicos de que as crianças ouvintes aprendem informalmente (em
grande parte através da aprendizagem incidental) e conceitos matemáticos
mais formais aprendidos na escola. Além disso, enfatizaram a importância de
os alunos surdos reconhecerem a utilidade dos diagramas e da resolução de
problemas matemáticos, promovendo informações representacionais em vez
de pictóricas. Concentrando-se na composição aditiva, o fato de que qualquer
número pode ser visto como a soma de outros números, mostrou que as crianças
surdas poderiam aprender rapidamente a aplicar estratégias visuoespaciais à
resolução de problemas matemáticos em situações do mundo real, habilidades
que melhoram significativamente suas habilidades matemáticas relativas a um
grupo que não recebeu a intervenção.

Se os alunos surdos têm habilidades visuoespaciais específicas que


podem apoiar o seu desempenho em matemática (e talvez em outros domínios),
eles precisam saber quando aplicar essas habilidades. Pesquisas de Marschark
et al. (2013), envolvendo o ensino de matemática por meio da língua de sinais,
sugeriram que os fatores metacognitivos, bem como a preparação acadêmica
prévia, são importantes para o desempenho dos alunos surdos em sala de aula. Em
particular, a falha em utilizar conhecimentos, estratégias e habilidades anteriores
foi identificada como uma dificuldade particular na aprendizagem da matemática
e de ciências (BORGNA et al., 2011). Nunes e Moreno (2002) argumentaram da
mesma forma que a aprendizagem incidental reduzida, às vezes, deixa as crianças
surdas com menos habilidade em inferir quando os conceitos matemáticos que
aprenderam precisam ser aplicados em situações particulares.

196
TÓPICO 2 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: NUMERACIA

No Tópico 3 da Unidade 2, descrevemos outra intervenção destinada


a melhorar a solução de problemas de matemática, relatada por Mousley
e Kelly (1998). Nesse estudo, os alunos surdos foram solicitados a explicar
sua compreensão do problema da Torre de Hanói e como eles iriam resolvê-
lo. Os alunos descreveram seus vários objetivos na tarefa e as estratégias que
usaram para resolver o problema. Mousley e Kelly então deram aos alunos um
problema de matemática que era paralelo ao problema da Torre de Hanoi. Eles
descobriram que os alunos que registram suas estratégias estavam associados a
um maior sucesso na compreensão e solução do problema de matemática. Em
outro experimento, o professor modelou estratégias para resolver um problema
de matemática, explicando seus processos de pensamento e levando os alunos à
solução. Um grupo de alunos surdos recebeu essa intervenção, enquanto outro
recebeu uma aula regular de matemática. Os alunos que receberam a intervenção
subsequentemente conseguiram generalizar as etapas de solução de problemas
para outros problemas semelhantes. Mousley e Kelly (1998) sugeriram que
intervenções estruturadas que incentivem os alunos a aproveitar o tempo para
visualizar soluções de problemas devem aumentar o desempenho bem-sucedido
de matemática.

Martin e Jonas (1986) procuraram melhorar a eficácia metacognitiva


dos alunos surdos em matemática usando um Programa de Enriquecimento
Instrumental (PEI) a longo prazo (FEUERSTEIN, 1980). Os alunos do grupo de
intervenção participaram de um programa de atividades de dois anos que incluiu
fazer comparações entre parte-todo, projetando relações visuais, identificando
relações espaciais, seguindo instruções e estabelecendo sistemas de classificação
hierárquica. Um grupo de comparação recebeu o currículo regular. No final
dos 2 anos, o grupo de intervenção mostrou ganhos em computação e conceitos
matemáticos, bem como na leitura. Tais descobertas sugerem novamente que
muitos dos fatores subjacentes à obtenção de sucesso em uma área acadêmica são
bastante gerais, mesmo que existam algumas habilidades limitadas e específicas
ao conteúdo envolvidas.

Quando as intervenções do tipo usado nos estudos de Nunes e Moreno


(2002) e Martin e Jonas (1986) são conduzidas durante períodos relativamente
longos em salas de aula reais, elas provavelmente influenciam as atitudes dos
professores, bem como o pensamento dos alunos. Em uma continuação do estudo
de Martin e Jonas, os professores relataram aumentar o uso de perguntas que
exigiam o funcionamento cognitivo de nível mais alto de seus alunos e que seus
alunos eram mais atentos nas aulas e mais propensos a usar vocabulário que
indicava sua consciência metacognitiva. Há também algumas evidências de que
questões culturais e sociais motivacionais podem estar envolvidas nas diferenças
observadas entre o desempenho de surdos e ouvintes (STINSON; KLUWIN,
2011).

Como as dificuldades dos alunos surdos em habilidades de leitura e escrita


tiveram prioridade nas investigações e intervenções educacionais, tem havido
um crescente interesse em como a linguagem usada nos livros de matemática

197
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

pode afetar a aquisição de habilidades matemáticas por crianças surdas (KELLY;


GAUSTAD, 2007). Mais recentemente, também houve pedidos para uma melhor
compreensão dos fundamentos cognitivos da aprendizagem e realização de
matemática em alunos surdos, bem como da educação em geral. Descrevemos
no Tópico 3 da Unidade 2, por exemplo, que crianças surdas geralmente têm um
desempenho pior do que os colegas ouvintes da mesma idade em tarefas verbais
e não verbais de memória de curto e longo prazo, particularmente quando as
tarefas envolvem retenção temporal ou sequencial. Moreno (2000) mostrou que a
falha em utilizar informações temporais, em particular, cria dificuldades para a
compreensão de adição e multiplicação de crianças surdas.

Mais de 20 anos atrás, Kluwin e Moores (1985, 1989) levantaram a


hipótese de que pelo menos 50% da variabilidade na realização acadêmica em
matemática dos alunos surdos pode ser devida a fatores instrucionais. Apenas
recentemente, entretanto, pesquisas revelaram diferenças cognitivas entre alunos
surdos e ouvintes e diferenças instrucionais entre professores com maior e menor
experiência no ensino de alunos surdos que poderiam levar a tais resultados
(MARSCHARK; K ​ NOORS, 2012).

2.1 ENTÃO, O QUE NÓS PODEMOS FAZER SOBRE ISSO?


Temos argumentado em vários lugares neste livro que as diferenças
cognitivas ou de estilo de aprendizagem entre aprendizes surdos e ouvintes
podem exigir abordagens pedagógicas modificadas para apoiar o desempenho
acadêmico. Há também indicações generalizadas de que as experiências
matemáticas e de solução de problemas fornecidas à maioria dos alunos surdos,
tanto formal quanto informalmente, são insuficientes em frequência e estrutura
para alcançar resultados acadêmicos adequados ao nível do ano escolar em
questão (KRITZER, 2009).

Bull (2008), por exemplo, argumentou que os atrasos dos alunos surdos
no desenvolvimento de conceitos de medição e fração são devidos, em parte, a
ter menos oportunidades de praticar até mesmo as habilidades de baixo nível. Ela
observou que, com o afastamento da prática na sala de aula, a transição para a
automaticidade nos fundamentos da matemática pode ser dificultada. Consistente
com essa sugestão, Bull et al. (2011) descobriram que os estudantes universitários
surdos eram significativamente menos precisos do que os estudantes universitários
ouvintes em estimar a localização dos números em uma linha numérica (Tarefa
Número-Posição). Eles sugeriram que os alunos surdos com maior acesso precoce
à língua (por exemplo, pais surdos ou implantes cocleares) podem ter vantagens
no desenvolvimento de habilidades acadêmicas de resolução de problemas, na
medida em que têm mais interações do mundo real que envolvem processamento
relacional e integração do conhecimento. Essa possibilidade é particularmente
interessante aqui, porque estudos indicaram que crianças e adultos tendem a se

198
TÓPICO 2 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: NUMERACIA

concentrar em informações de itens individuais em vez de relações entre itens


em matemática e ciências (BLATTO-VALLEE et al., 2007), assim como o fazem na
memória e na resolução de problemas de forma mais geral.

Uma recomendação para superar essas dificuldades foi feita tanto


para a educação de surdos (DIETZ, 1994) como para a educação geral. Essa
recomendação envolve um foco nas habilidades de raciocínio verbal e um
incentivo para o uso frequente de atividades de resolução de problemas, na
forma de problemas contextualizados com histórias nos primeiros anos da escola.
Pagliaro e Ansell (2002) descobriram que tal atividade raramente ocorre nas
aulas para crianças surdas. Menos de um quinto dos professores de surdos do
primeiro ao terceiro ano escolar, que foram entrevistados, relataram apresentar
problemas contextualizados com histórias diariamente. Tais experiências devem
ser especialmente importantes para crianças surdas com pais ouvintes, como
Kritzer (2008) descobriu que a maioria delas raramente é exposta a conceitos
quantitativos durante os anos pré-escolares em relação a pares ouvintes e pares
surdos com pais surdos.

Pagliaro e Kritzer (2005), no entanto, relataram que professores do Ensino


Fundamental e Médio de alunos surdos, nos Estados Unidos, raramente usavam
as atividades recomendadas durante o horário de aula. Com base em uma
pesquisa com quase 300 professores de matemática que foram identificados por
seus administradores escolares como sendo os mais eficazes, eles descobriram que
pouco tempo foi gasto na solução de problemas do mundo real. Essa situação foi
atribuída, em parte, às crenças dos professores de que tais problemas estão além do
alcance da maioria dos alunos surdos que primeiro precisam compreender mais
o básico da matemática. Esteve, portanto, envolvido neste resultado da pesquisa
o fato do treinamento limitado em matemática dos professores, especialmente no
que tange a educação matemática para alunos surdos. Os professores que agora
educam a maioria dos alunos surdos provavelmente não têm consciência das
forças específicas de seus alunos.

Uma nota final em relação à matemática é que certamente existem alguns


alunos surdos e com deficiência auditiva que se saem bem em matemática. Wood,
Wood e Howarth (1983) verificaram que aproximadamente 15% dos alunos surdos
apresentavam desempenho igual ou superior à média dos alunos ouvintes, e Qi
e Mitchell (2012) mostraram que há uma pequena proporção de alunos surdos
no extremo superior do desempenho de matemática. Infelizmente, tentativas de
determinar quem são os melhores alunos e como eles diferem de colegas com
desempenho inferior estão apenas começando, e intervenções como a de Nunes e
Moreno (2002) continuam recebendo mais atenção na literatura acadêmica do que
na sala de aula. Primeiro, vamos considerar uma outra área central da realização
e desempenho acadêmico relacionada à literacia e à matemática que pode nos
ajudar a entender e melhorar o ensino de alunos surdos de maneira mais geral.

199
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

3 A CIÊNCIA DA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS


Já observamos que, além da literacia e da matemática, há pouca informação
disponível sobre as realizações acadêmicas e instruções para os alunos surdos
e com deficiência auditiva através do currículo. A outra área em que há pelo
menos alguma literatura que podemos usar é a educação em ciências. Tal como
a compreensão matemática e de leitura, a importância da educação em ciências
no mundo de hoje reside não só no assunto, mas também nas capacidades de
raciocínio e resolução de problemas que envolve e na forma como encoraja
os jovens a pensar sobre a natureza das coisas. Em conjunto, o conteúdo e as
habilidades adquiridas no ensino de ciências influenciarão não apenas o
desempenho do aluno, mas também o emprego e como os alunos lidam com o
dia a dia.

Há uma longa história de indivíduos surdos e com deficiência auditiva


fazendo contribuições para a ciência e a tecnologia (LANG, 1994). Hoje, no
entanto, por algum motivo – e vamos explorar várias possibilidades – aprendizes
surdos, em média, ficam para trás de colegas ouvintes em conquistas científicas
(ROALD; MIKALSEN, 2000), mesmo quando ensinados através de atividades
científicas práticas com demandas verbais limitadas. Até certo ponto, essa situação
pode refletir a ênfase crescente na literacia e na matemática, na crença de que
elas são ferramentas essenciais para que os alunos surdos (e ouvintes) adquiram
conhecimento em ciências. Alternativamente, parece provável que a curiosidade
e a empolgação que a ciência pode incutir nas crianças possam ajudar e inspirá-
los em relação à leitura e à matemática também. Então, vamos considerar em que
medida os atrasos dos alunos surdos em ciências refletem fatores instrucionais,
falta de base em outras áreas, a ênfase nos currículos de educação de surdos ou
fatores intrínsecos aos alunos.

3.1 BARREIRAS PARA A EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS PARA


ALUNOS SURDOS
Como no caso da matemática, pode ser que as diferenças cognitivas,
metacognitivas e de conhecimento sutis e não tão sutis entre os alunos surdos
e seus pares ouvintes exijam métodos e materiais instrucionais em ciências
um pouco diferentes, qualitativa e/ou quantitativamente, daqueles em áreas
não técnicas (ROALD; MIKALSEN, 2000). Vamos considerar essa questão com
mais profundidade no próximo tópico. No entanto, é claro que as atuais aulas
de ciências para alunos surdos, particularmente em salas de aula regulares,
frequentemente negligenciam sua falta de conhecimento de conteúdo científico
em relação aos colegas ouvintes e sua falha documentada em aplicar o
conhecimento que possuem. Em parte, como consequência, descobriu-se que
os alunos surdos têm mais dificuldade do que colegas ouvintes na integração
de informações de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM) obtidas

200
TÓPICO 2 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: NUMERACIA

de aulas, livros e outros materiais de estudo (RICHARDSON et al., 2000), levando


a uma menor aprendizagem e manutenção mais elevada de equívocos sobre a
natureza da ciência do que os estudantes ouvintes.

Outro contribuinte para essa situação é a considerável variabilidade nas


histórias educacionais dos aprendizes surdos e abordagens à aprendizagem,
levando não apenas a diferenças no conhecimento conceitual e de conteúdo,
mas também ao que D. Hammer (1996) denominou de atitudes epistemológicas.
Kritzer (2008) mostrou que pré-escolares surdos e, especialmente, aqueles com
pais ouvintes, experimentaram atrasos nos fundamentos da matemática por causa
da menor exposição a conceitos relacionados através da língua. Pagliaro e Ansell
(2002) também descobriram que professores de matemática de alunos surdos
não os expunham a resoluções de problemas mais difíceis, na crença de que seus
alunos não tinham o conhecimento e as habilidades para estarem “prontos” para
isso. Assim, parece provável que pais e professores relutem em expor os jovens
surdos à linguagem complexa e aos conceitos envolvidos na ciência, mesmo que
eles mesmos tenham a linguagem necessária para fazê-lo.

McIntosh et al. (1994) argumentaram que o aprendizado de ciências


pelos alunos surdos também seria afetado: 1) pelo fato de que as crianças surdas
normalmente tiveram menos oportunidades de brincadeiras não estruturadas
nas quais ocorre a aprendizagem incidental; 2) pela sua tendência a um lócus de
controle externo, esperando que outros guiem e estruturem suas atividades; e 3)
pela sua dependência instrumental, sendo mais propensos a buscar ajuda do que
tentar resolver os problemas por eles mesmos. McIntosh et al. (1994) argumentaram
que, como resultado, crianças surdas e crianças com deficiência auditiva podem
ter menor probabilidade de se engajar em “aprendizagem de descoberta”,
menos probabilidade de se engajar espontaneamente em experimentação mental
ou empírica e mais propensas a tratar fatos científicos como informações não
relacionadas, em vez de procurar pontos comuns e convergências. Lembre-se de
que Ansell e Pagliaro (2006) descobriram uma falha consistente dos alunos surdos
em relacionar os problemas de matemática com as situações do mundo real que
eles descrevem, mesmo quando essas situações foram explicitamente descritas.
Também notamos que Blatto-Vallee et al. (2007) descobriram que alunos surdos
do Ensino Fundamental (12 anos de idade) até o nível universitário tendem a
tratar diagramas que acompanham problemas de matemática como imagens e
não como representações que poderiam ajudar na solução de problemas. Estudos
semelhantes, aparentemente, não foram conduzidos em ciências, mas neste
momento seriam esperados resultados paralelos.

Ao abordar a questão da literacia precoce, observamos que, em um estudo


realizado por Geers et al. (2008), crianças com implantes cocleares que tinham lido
em nível escolar quando tinham 8 a 9 anos ficaram para trás por uma média de
cerca de 2 anos quando tinham entre 16 e 17 anos de idade. Além da questão de
tais crianças ainda terem perdas auditivas significativas, também pode ser que os
níveis de leitura entre os alunos surdos mais jovens exibam efeitos mínimos, de
modo que as diferenças de proficiência possam não ser aparentes. O mesmo pode

201
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

ser verdade no que diz respeito à aprendizagem de ciências, em que os conceitos


científicos elementares que as crianças estão expostas e compreendem podem não
ter profundidade e complexidade suficientes para revelar diferenças qualitativas
ou quantitativas. De fato, Roald e Mikalsen (2000) mostraram que crianças surdas
e ouvintes tinham conceitos similares sobre fenômenos científicos. No entanto, na
idade do Ensino Médio, foram observadas diferenças significativas nos níveis de
conhecimento e desempenho.

Como em outras áreas do currículo, é provável que essa situação ocorra


por vários motivos relacionados. Em primeiro lugar, as dificuldades de literacia
limitarão claramente a exposição dos alunos surdos à informação nas ciências
devido à falta de capacidade de leitura, falta de exposição ou ambos. Em segundo
lugar, por causa de suas oportunidades diminuídas de aprender incidentalmente
a partir das conversas de adultos e colegas que ocorrem em torno deles, eles terão
menor exposição a conceitos que formal ou informalmente formam a base do
conteúdo científico e do raciocínio. Terceiro, e intimamente relacionado, será
uma falta de compreensão do vocabulário usado em ciências. A esse respeito
argumenta-se que os intérpretes de sinais para alunos surdos geralmente
simplificam os termos e explicações científicas (HARRINGTON, 2000).

Lang et al. (2006) apontou que das palavras consideradas importantes


a partir de uma revisão dos currículos de ciências, aproximadamente 60% não
tiveram representações de sinais. Eles argumentaram sobre a necessidade de
identificar sinais que são de uso comum na ciência e apontaram dificuldades
tanto para tentar criar sinais para essas ideias quanto para os estudantes que
experimentam diferentes sinais para conceitos semelhantes entre as aulas.
No entanto, tem havido relutância considerável em alguns países em criar
colaborativamente um vocabulário de sinais de ciências semelhantes aos
desenvolvidos para a matemática na Língua de Sinais da Nova Zelândia. Ao
mesmo tempo, é importante não colocar o ônus de uma linguagem científica
precisa e completa nos intérpretes. Estudos de Marschark e colegas – por exemplo,
Marschark et al. (2005) e Marschark et al. (2008) – demonstraram consistentemente
que os estudantes surdos aprendem menos do que os colegas ouvintes em aulas de
STEM, independentemente de seus professores serem ou não professores surdos
ou ouvintes e usando sinais para si próprios ou dependendo dos intérpretes.

Uma outra barreira em potencial para o sucesso dos alunos surdos pode
estar nas dificuldades inerentes ao uso da visão tanto para assistir à comunicação
(seja ela em sinais ou falada), como para assistir às demonstrações e outras
experiências visuais ao mesmo tempo. Ou seja, o uso crescente de tecnologias
visuais em salas de aula STEM cria desafios adicionais para a aprendizagem
de alunos com perda auditiva, bem como aqueles que são deficientes visuais.
O uso crescente de ferramentas multimídia tem sido reforçado por pesquisas
que demonstram a utilidade de combinar informações verbais e visuais em
ambientes STEM para alunos ouvintes (GELLEVIJ et al. 2002) e há muito tempo
tem sido uma ênfase no uso de materiais visuais para apoiar a educação de
alunos surdos (MOORES, 2001). No entanto, os educadores ainda não abordaram

202
TÓPICO 2 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: NUMERACIA

o fato de que alunos surdos e com deficiência auditiva são incapazes de assistir
simultaneamente a exibições visuais e à língua de sinais (ou a textos em tempo
real ou às expressões orofaciais de outros) na sala de aula. Se pudermos encontrar
maneiras de contornar esse problema, as tecnologias visuais podem ter o potencial
de aumentar a eficiência e a eficácia de recursos limitados de interpretação e
seriam particularmente benéficas em contextos STEM, em que a natureza do
material a ser aprendido e as barreiras acima mencionadas à aprendizagem por
crianças surdas coloca-as em desvantagem.

3.2 ENTÃO, O QUE NÓS PODEMOS FAZER SOBRE ISSO?


Reconhecendo as limitações das tecnologias de sala de aula perante a
expectativa de que os alunos surdos possam “olhar em vários lugares ao mesmo
tempo” (ver Tópico 3 da Unidade 2 e o Tópico 3 da Unidade 3), parece haver pouca
dúvida de que as inovações tecnológicas têm grande potencial para os alunos
surdos. Barman e Stockton (2002), por exemplo, estudaram a aprendizagem
relacionada a um novo currículo de ciências nos Estados Unidos que foi usado
com alunos surdos. O currículo estudado apresentava informações científicas
detalhadas e de alta qualidade, desenvolvidas por especialistas em diversas
áreas. Lições estruturadas e on-line sobre temas relacionados à ciência da terra e
tópicos sobre energia são apresentados por meio de materiais escritos, ilustrações
e descrições de atividades práticas. Guias on-line orientam os alunos pelo método
científico, incentivando a observação, a inferência, a previsão, a comunicação, a
mensuração, a classificação, a interpretação dos dados, a formação de hipóteses
e, em última análise, o planejamento de seus próprios experimentos. Além de
fornecer material diretamente, o programa incentiva os alunos a usar a tecnologia
por meio de pesquisas em computadores, videoconferência e criação de páginas
da Web relacionadas à ciência. Portfólios eletrônicos de trabalho estudantil
permitem que eles compartilhem suas ideias com os colegas e forneçam aos
professores informações para avaliação contínua.

Os estudantes do estudo de Barman e Stockton (2002) relataram que o


uso da tecnologia era a melhor parte do currículo, embora alguns achassem que
precisavam de mais interação com seus professores. Além disso, parecia que
os materiais escritos, originalmente desenvolvidos para estudantes ouvintes,
tendiam a ser muito difíceis para os alunos surdos. Curiosamente, com o propósito
de compreender os fundamentos cognitivos da aprendizagem científica, Barman
e Stockton descobriram que os alunos surdos continuaram a ter dificuldade
em gerar suas próprias hipóteses a partir da leitura das observações. Se isso
representa uma barreira criada pela dificuldade dos materiais (dada a leitura e
os níveis de conhecimento dos alunos surdos) ou é outro indicador da possível
necessidade de materiais qualitativamente diferentes daqueles utilizados com os
alunos ouvintes ainda está por ser determinado. No momento, no entanto, parece
que essas questões não estão sendo tratadas na educação em ciências da maneira

203
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

como estão na educação matemática, em que as necessidades linguísticas e as


atividades práticas dos alunos surdos são tratadas de forma integrada, como
retratam as pesquisas de Nunes e Moreno (2002) e Pagliaro e Ansell (2012), por
exemplo.

Já mencionamos o foco de alguns educadores em atividades com baixas


exigências verbais para o ensino em ciências a alunos. Todavia, ainda não está
claro se tal enfoque pode realmente fornecer aos alunos o nível de entendimento
necessário para serem capazes de identificar conceitos fundamentais e transferir
a compreensão entre domínios relacionados (e talvez não relacionados). Apesar
das dificuldades contínuas com as habilidades de literacia, alguns pesquisadores
sugeriram que a escrita pode servir como um componente de apoio na educação
em ciências para alunos surdos.

Yore (2000), por exemplo, sugeriu incorporar a escrita dentro das


atividades científicas. Ele recomendou uma abordagem “faça primeiro e leia e
escreva depois”, com atividades práticas e concretas sendo o núcleo da instrução,
seguidas por atividades de redação que podem apoiar a integração de ideias e
ajudar os alunos a lidar com as relações que descobriram. Akamatsu, Mayer e
Hardy-Braz (2008) sugeriram uma abordagem semelhante em relação à educação
de surdos de forma mais geral. Como em algumas das abordagens à instrução de
literacia descritas anteriormente neste tópico, a abordagem de Yore à escrita em
ciências envolve professores reagindo ao conteúdo e à estrutura conceitual da
escrita em ciências do aluno em vez da ortografia e gramática, contanto que esta
última não indique uma falta de compreensão do aluno. Ao estender seu trabalho
bem-sucedido com estudantes ouvintes para alunos surdos, Yore propôs o uso
de modelos pré-preparados ou mapas conceituais e trabalhos iniciais em grupo
para identificar informações básicas. Além disso, como em algumas abordagens à
literacia, ele sugeriu o uso de revisão por pares de relatórios escritos para ajudar
os alunos a determinar e melhorar a extensão em que sua escrita comunica suas
intenções e compreensão de maneira eficaz.

Ao longo das linhas da proposta de Yore (2000), Lang e Albertini (2001)


empregaram uma abordagem qualitativa para analisar relatórios de professores
sobre a atividade de sala de aula e de estudantes entre 12 a 17 anos de idade.
Os professores participaram pela primeira vez de um workshop sobre o
desenvolvimento da literacia em ciências e a língua vernácula para alunos surdos,
enfatizando a aquisição de conceitos importantes, bem como a comunicação eficaz
em um ambiente colaborativo. Após o treinamento, Lang e Albertini coletaram e
analisaram amostras de escrita extraídas dos alunos em exercícios relacionados à
ciência, como pedir aos alunos que se imaginassem como um biscoito passando
pelo sistema digestivo, uma máquina simples ou um elemento químico. Os alunos
registraram suas previsões, observações e conclusões relacionadas a uma atividade
científica em sala de aula e resumiram o que aprenderam depois de uma aula de
ciências. Tanto os pesquisadores quanto os professores envolvidos relataram que
as duas primeiras atividades, claramente as mais interessantes para os alunos,

204
TÓPICO 2 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES: NUMERACIA

foram eficazes tanto para o aprendizado do aluno quanto para a avaliação


do professor. As atividades imaginativas resultaram na escrita mais longa e
detalhada, expressando o conhecimento do aluno de forma coerente, mesmo que
a escrita contivesse erros. A escrita guiada dos “relatórios de laboratório”, por sua
vez, deu aos professores informações úteis sobre as habilidades de seus alunos
em pensar logicamente e construir significado a partir da atividade científica. É
importante ressaltar que Lang e Albertini descobriram que as habilidades dos
professores para identificar e enfatizar o conteúdo apropriado nas aulas de ciências
estavam fortemente relacionadas a sua formação em ciências: mais treinamento
e experiência no campo estavam positivamente relacionados ao desempenho dos
alunos em ciências, assim como ocorria em matemática.

Em um estudo relacionado, Roald (2002) realizou entrevistas com


professores de ciências surdos que tinham sido alunos em suas aulas de ciências
no Ensino Médio e posteriormente se formaram em Física na graduação. Os
professores refletiram sobre sua própria educação, bem como sobre a educação que
estavam fornecendo aos seus alunos atuais. Eles concluíram que o conhecimento
dos professores sobre o assunto é fundamental para o sucesso do ensino em
ciências, mas também enfatizaram a importância de uma comunicação eficaz
para os alunos surdos com professores e alunos. Em particular, eles sugeriram
a importância da aprendizagem colaborativa, em que os alunos trabalham em
grupos de pares, envolvem o professor em discussões sobre atividades científicas
em sala de aula e discutem a ciência em geral. Para que isso seja eficaz, os
professores sugeriram a necessidade de aulas relativamente pequenas e de lições
cuidadosamente estruturadas, nas quais discussões de problemas e conceitos são
usadas para desenvolver atividades de laboratório e leitura. Tendo descoberto
que o conteúdo e a linguagem nos livros didáticos que eles tinham como alunos
eram difíceis, os professores surdos indicaram que ter que escrever sobre suas
atividades em ciências era útil para interpretar, organizar e lembrar o que haviam
aprendido. Relacionados a nossa discussão anterior sobre o uso de diagramas
em matemática, os professores relataram reconhecer a importância de ilustrações
que retratam objetos e relações para auxiliar na resolução de problemas e
aprendizado em ciências, embora tenham relatado ter resistido a essa abordagem
quando eram estudantes e agora receberam reações iniciais semelhantes de seus
próprios alunos.

Ainda não sabemos ao certo a medida em que insights desse tipo, obtidos
nesses estudos, realmente levam os professores a ajustar seus métodos e materiais
de instrução. Também ainda não sabemos o impacto potencial que estes ajustes
poderão ter sobre os alunos surdos. No contexto de descobertas indicando que
professores de alunos surdos e professores de alunos ouvintes têm atitudes,
metas e estratégias um pouco diferentes, pode ser que o contexto instrucional e
os antecedentes educacionais influenciam suas expectativas e abordagens para
educar os alunos surdos em ciências, como aparentemente fazem nos domínios
da literacia e da matemática.

205
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

Em qualquer caso, a extensão em que as características de professores,


ambientes e alunos afetam o desempenho de maneira diferente quando estão em
combinações diferentes é uma questão complexa que exigirá mais investigação.
Enquanto isso, a sensibilidade dos professores às competências, pontos fortes e
necessidades de seus alunos surdos, e maneiras pelas quais eles podem estar em
desacordo com seu treinamento e experiência com os alunos ouvintes, são um
componente essencial para ajudar os alunos surdos a desenvolverem seus pontos
fortes e acomodar suas necessidades.

Para entender as possíveis influências desses fatores sobre o desempenho


e realização acadêmica, precisamos considerá-los, assim como os fatores
relacionados no contexto da aprendizagem em sala de aula. Para este fim,
precisamos examinar como o ensino e a aprendizagem estão entrelaçados com
as diversas habilidades cognitivas e de linguagem dos alunos surdos descritas
nos tópicos anteriores. Somente reconhecendo plenamente a complexidade da
educação de surdos podemos esperar identificar elementos individuais que a
melhorem.

206
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Como no caso da leitura, estudos nos últimos 40 anos indicam que crianças
surdas ficam atrás de pares ouvintes de 2 a 6 anos em matemática.

• Algumas descobertas refletem diferenças em habilidades mais fundamentais


relacionadas à matemática, como cálculo mental e velocidade de comparação
de números.

• As expectativas dos pais, as práticas pedagógicas e os fatores relacionados


ao professor, provavelmente, contribuem para as diferenças na realização
acadêmica entre os alunos ouvintes.

• Pesquisadores apontaram para o atraso dos alunos surdos no desenvolvimento


de habilidades matemáticas como sendo o resultado de menos experiências
precoces com conceitos quantitativos, atrasos no desenvolvimento da língua,
menor qualificação de professores em práticas de ensino de matemática, e
questões de processamento de informações sensorial e de linguagem.

• A língua também tem sido sugerida como um fator chave no desempenho


matemático de alunos surdos mais velhos, pois alguns pesquisadores têm
apontado que muitas vezes têm pouco acesso à comunicação em sala de aula.

• Os alunos surdos no Ensino Médio até a faculdade têm menos probabilidade


do que os pares ouvintes de utilizar representações de relações espaciais
refletindo aspectos conceituais e matemáticos de problemas matemáticos em
palavras.

• Alunos surdos aparentemente dependem de representações mentais


“pictóricas”, que incluem aspectos incidentais dos problemas, mas não relações
quantitativas/conceituais importantes para sua solução.

• Existem habilidades visuoespaciais específicas que podem apoiar a resolução


de problemas de matemática de alunos surdos – e presumivelmente podem
ser aumentadas por treinamento – mesmo que esses alunos não tenham
necessariamente melhores habilidades visuoespaciais do que ouvintes.

• A aprendizagem incidental reduzida, às vezes, deixa as crianças surdas com


menos habilidade em inferir quando os conceitos matemáticos que aprenderam
precisam ser aplicados em situações particulares.

207
• Intervenções estruturadas que incentivem os alunos a aproveitar o tempo
para visualizar soluções de problemas devem aumentar o desempenho bem-
sucedido de matemática.

• Muitos dos fatores subjacentes à obtenção de sucesso em uma área acadêmica


são bastante gerais, mesmo que existam algumas habilidades limitadas e
específicas ao conteúdo envolvidas.

• A falha em utilizar informações temporais, em particular, cria dificuldades


para a compreensão de adição e multiplicação de crianças surdas.

• Pelo menos 50% da variabilidade na realização acadêmica em matemática dos


alunos surdos pode ser devida a fatores instrucionais.

• Os atrasos dos alunos surdos no desenvolvimento de conceitos de medição e


fração são devidos, em parte, a ter menos oportunidades de praticar até mesmo
as habilidades de baixo nível.

• Recomenda-se o foco nas habilidades de raciocínio verbal e um incentivo


para o uso frequente de atividades de resolução de problemas na forma de
problemas contextualizados com histórias nos primeiros anos da escola.

• Os professores que agora educam a maioria dos alunos surdos, provavelmente


não têm consciência das forças específicas de seus alunos.

• Aprendizes surdos, em média, ficam para trás de colegas ouvintes em


conquistas científicas mesmo quando ensinados através de atividades
científicas práticas com demandas verbais limitadas.

• As atuais aulas de ciências para alunos surdos, particularmente em salas de


aula regulares, frequentemente negligenciam sua falta de conhecimento de
conteúdo científico em relação aos colegas ouvintes e sua falha documentada
em aplicar o conhecimento que possuem.

• Parece provável que pais e professores relutem em expor os jovens surdos à


linguagem complexa e aos conceitos envolvidos na ciência, mesmo que eles
mesmos tenham a linguagem necessária para fazê-lo.

• Crianças surdas e crianças com deficiência auditiva podem ter menor


probabilidade de se engajar em “aprendizagem de descoberta”, menos
probabilidade de se engajar espontaneamente em experimentação mental
ou empírica e mais propensas a tratar fatos científicos como informações não
relacionadas, em vez de procurar pontos comuns e convergências.

• Há uma falha consistente dos alunos surdos em relacionar os problemas de


matemática com as situações do mundo real que eles descrevem, mesmo
quando essas situações foram explicitamente descritas.

208
• Alunos surdos tendem a tratar diagramas que acompanham problemas de
matemática como imagens, e não como representações que poderiam ajudar
na solução de problemas.

• As dificuldades de literacia limitam a exposição dos alunos surdos à


informação nas ciências devido à falta de capacidade de leitura, falta de
exposição ou ambos.

• Alunos surdos têm menor exposição a conceitos que formal ou informalmente


formam a base do conteúdo científico e do raciocínio.

• A falta de compreensão do vocabulário usado em ciências pode ser também


devido aos intérpretes de sinais para alunos surdos que geralmente simplificam
os termos e explicações científicas.

• O uso crescente de tecnologias visuais em salas de aula STEM cria desafios


adicionais para a aprendizagem de alunos com perda auditiva, bem como
aqueles que são deficientes visuais.

• Alunos surdos e com deficiência auditiva são incapazes de assistir


simultaneamente a exibições visuais e língua de sinais (ou textos em tempo
real ou as expressões orofaciais de outros) na sala de aula.

• Alguns pesquisadores sugeriram que a escrita pode servir como um


componente de apoio na educação em ciências para alunos surdos.

209
AUTOATIVIDADE

1 A partir de suas pesquisas, McIntosh e seus colaboradores (1994)


argumentaram que o aprendizado de ciências pelos alunos surdos é afetado
por pelo menos três fatores. Descreva quais são estes fatores.

2 Marschark et al. (2013) examinaram especificamente até que ponto


as habilidades visuoespaciais de estudantes universitários surdos
contribuíram para a solução de problemas matemáticos que incluíam
diagramas. Quais foram as conclusões desta pesquisa?

3 Pesquisadores como Kritzer, Gregory, Plagliaro, Marschark e Knoors


apontaram para o atraso dos alunos surdos no desenvolvimento de
habilidades matemáticas como sendo o resultado de diferentes fatores.
Quais seriam estes fatores de acordo com estes pesquisadores?

210
UNIDADE 3
TÓPICO 3
NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA
APRENDIZES SURDOS

1 INTRODUÇÃO
Para surdos e ouvintes, a instrução dos professores e a colaboração dos
colegas estão sendo cada vez mais complementadas e, às vezes, até substituídas
por ferramentas de aprendizagem aprimoradas por multimídia e assistidas por
computador, usadas tanto na sala de aula quanto a distância.

As possíveis contribuições da instrução e prática aprimoradas por


multimídia para a aprendizagem de crianças e adolescentes surdos são um
desenvolvimento estimulante na educação de surdos que parecem ter uma
promessa considerável, também são o assunto deste tópico.

2 A REVOLUÇÃO DIGITAL
É uma suposição comum que o uso de informações visuais, como imagens,
animações ou filmes, em combinação com informações verbais (em formato
falado ou escrito) aumenta a aprendizagem nos alunos, fornecendo codificação
dupla de informações na memória e aprendizagem “mais profunda” (MORENO;
MAYER, 2002). Na educação de alunos surdos, a apresentação visual de todas as
informações, mesmo aquelas normalmente apresentadas auditivamente para os
alunos ouvintes, é vista como uma pedra angular didática. Tais apresentações
podem incluir representações visuais de conteúdo (por exemplo, imagens
ou animações) ou clipes de vídeo da língua de sinais. Essa combinação de
múltiplas representações de informação é chamada de multimídia. Em materiais
de multimídia, os alunos recebem informações em pelo menos dois formatos
distintos, como informação verbal e pictórica (MAYER, 2003).

As informações representadas multiplicadamente podem ocorrer com


várias mídias, desde livros (papel) até weblogs (digital). O computador e outras
tecnologias da informação estão expandindo cada vez mais as opções para
incorporar informações multimídia no processo de aprendizagem. Não só se
tornou mais fácil criar e usar formas animadas de informação visual, mas a
tecnologia também aumentou as possibilidades de controle do aluno na instrução,
na interatividade e na aprendizagem a distância.

211
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

Collins e Halverson (2010) e outros chegaram ao ponto de afirmar que a


tecnologia da informação está levando a uma revolução na educação comparável
àquela que mudou a aprendizagem nas corporações de ofício (aprendizes de
mestres artesãos) a uma aprendizagem nas escolas após a Revolução Industrial.
No mínimo, a tecnologia claramente pode facilitar a construção do conhecimento
tanto no indivíduo como em grupos. O uso combinado da tecnologia de
informação e comunicação tem, portanto, o potencial de influenciar a organização
da educação, ainda mais se ela empregar formatos baseados na web que permitam
amplo acesso e disponibilidade. Em conjunto, tais mudanças podem mudar
fundamentalmente a relação entre professores e alunos e a relação de ensino e
aprendizagem (KUIPER; VOLMAN; TERWEL, 2005).

2.1 REVOLUÇÃO NA COMUNIDADE SURDA


O impacto da tecnologia da informação e comunicação não se limita a
pessoas ouvintes. Embora tenha havido apenas alguns estudos relevantes,
sabemos que os surdos usam computadores extensivamente e intensivamente.
Aparentemente, com apenas algumas exceções, esses estudos se concentraram
no uso de tecnologias para adultos. Uma destas exceções é uma pesquisa
israelense feita por Barak e Sadovsky (2008) envolvendo 100 adolescentes surdos
e com deficiências auditivas e 114 colegas adolescentes ouvintes pareados por
inteligência e status socioeconômico. Eles descobriram que os alunos surdos e
com deficiência auditiva usavam a Internet mais intensamente e por períodos de
tempo mais longos do que os alunos ouvintes, particularmente para comunicação
pessoal e em grupo. Ainda a ser explorado seria a frequência e os motivos para o
uso do computador por crianças surdas.

Em uma pesquisa com adultos surdos nos Estados Unidos, Zazove et al.
(2004) descobriram que mais de 60% dos entrevistados usaram um computador.
Isso é comparado a aproximadamente 70% do uso de computadores na população
geral dos EUA e 50% a pessoas com deficiências. Dezoito por cento dos usuários
de computador surdos relataram ter um computador em casa, e o uso foi
associado à idade, ao nível educacional e à renda familiar. Idade mais jovem,
maior nível de escolaridade e maior renda familiar, foram associados ao uso mais
frequente de computadores, mas apenas 27% aprenderam a usar o computador
na escola. No geral, os surdos que relataram usar computadores indicaram que
eles o faziam principalmente por diversão, embora a comunicação com outras
pessoas, principalmente surdas, também tenha sido relatada como uma função
importante. Trinta e oito por cento de todos os entrevistados relataram o uso do
computador para recuperar informações.

M. R. Power, Power e Horstmanshof (2007) também descobriram que os


dispositivos tecnológicos são populares entre os surdos, principalmente porque
eles suportam a comunicação (por exemplo, e-mail e chat), bem como a navegação

212
TÓPICO 3 | NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES SURDOS

na web. Este estudo, que incluiu principalmente pessoas surdas, usuárias de


língua de sinais, indicou que a maioria delas usava computadores e telefones
celulares por motivos sociais, contatando amigos e parentes, surdos e ouvintes.

M. R. Power, Power e Horstmanshof (2007) sugeriram que a comunidade


surda está se tornando cada vez mais uma comunidade virtual. Valentine e Skelton
(2008) chegaram à mesma conclusão em um estudo de entrevista envolvendo
adultos surdos que mostrou que a Internet estava ampliando sua comunidade.
Antes da Internet, os contatos entre pessoas surdas eram relativamente limitados
a horários fixos e a um espaço fixo (por exemplo, Associações de Surdos)
devido aos requisitos de comunicação visual, face a face. As redes sociais on-
line ampliaram as oportunidades sociais dos surdos e, juntamente, com mais
contatos interpessoais e recuperação de informações, também contribuíram
para um aumento significativo das viagens. Valentine e Skelton observaram, no
entanto, que ainda não há evidências de que tais tecnologias tenham aumentado
a integração de surdos e ouvintes, apesar de seu potencial para remover barreiras
de comunicação e sociais.

Multimídia digital, baseada na web e de outra forma, também estão sendo


usadas ​​cada vez mais para fornecer às pessoas surdas acesso à informação. De
interesse crescente é o uso de tais tecnologias em locais públicos, como guias
multimídia de PDA (Assistente Digital Pessoal) para visitantes surdos em museus
(RUIZ et al., 2011). A pesquisa sobre a eficácia dessas ferramentas é rara, mas
Proctor (2005) avaliou o uso de um guia que fornecia acesso à língua de sinais
para exibições em um museu canadense. Dois anos após a sua introdução, 78%
dos visitantes surdos que usaram o guia com língua de sinais relataram que ele
enriqueceu e melhorou as visitas aos museus, 6% não relataram nenhuma mudança
em comparação às visitas sem guias e apenas 1% respondeu negativamente.

2.2 REVOLUÇÃO NA EDUCAÇÃO DOS SURDOS


As tecnologias de informação e comunicação também entraram na
educação de aprendizes surdos. Um avanço significativo é a educação a distância,
permitindo a oferta de serviços educacionais especiais em áreas remotas
(BELCASTRO, 2004). Cursos on-line e tutoria para alunos surdos são cada vez
mais populares, embora a pesquisa avaliativa ainda esteja faltando.

Stinson (2010) sugeriu que a tecnologia de computação em salas de aula,


com alunos surdos, está se expandindo porque se supõe que ela melhorará a
aprendizagem. Os quadros interativos, por exemplo, são essencialmente quadros
computadorizados operados por toque que permitem que professores e alunos
criem, modifiquem e armazenem informações de texto e imagens. Os quadros
também podem fornecer acesso a informações on-line, permitindo a criação de
sofisticados recursos multimídia em sala de aula. O uso de quadros varia muito,
variando de 12% em alguns países (exceto em escolas para surdos, onde o uso é

213
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

muito maior) a 60% em outros países. Também aqui, embora tenhamos descrições
do uso instrucional da tecnologia, falta pesquisa empírica sobre sua eficácia
educacional com alunos surdos.

Stinson (2010) também observou o aumento do uso de tablets PCs


touchscreen em salas de aula com alunos surdos. Os Tablet PCs são menores que
os notebooks e, portanto, mais fáceis de usar em diversos ambientes. A maioria
dos tablet PCs fornece acesso à Internet, seja por meio de conexões Wi-Fi ou
pelo acesso à Internet móvel. Alguns estudos de pequena amostra sugerem que
os tablet PCs podem melhorar o aprendizado de alunos surdos melhorando o
acesso à comunicação e à informação e apoiando a colaboração entre pares (LIU
et al., 2006).

3 APRENDIZAGEM MULTIMÍDIA
Se as (multi) mídias digitais devem melhorar a instrução e a
aprendizagem para os alunos surdos, é importante explorar como os ambientes
de aprendizagem precisam ser projetados para aproveitá-las (VERHOEVEN;
GRAESSER, 2008; VERHOEVEN; SCHNOTZ; PAAS, 2009). Para que um aluno
construa conhecimento a partir de um ambiente de aprendizagem interativo,
vários processos básicos estão envolvidos. Primeiro, o tópico a ser aprendido
deve ser identificado. O tópico serve como um quadro de referência para o aluno,
geralmente usando um formato de âncora. Uma âncora é um contexto macro no
qual um tópico é introduzido, declarando o problema em um vídeo introdutório
ou motivando o texto. O aluno, então, deve procurar informações relacionadas,
guiado pela tarefa ou atividade. Se a informação estiver disponível on-line, o aluno
terá que buscar informações, compreender e avaliar a relevância das informações,
selecionar as mais pertinentes e integrá-las ao conhecimento prévio.

A enorme quantidade de informação disponível via Internet tem o potencial


de criar sobrecarga cognitiva, particularmente em alunos surdos, que podem estar
relativamente limitados nas habilidades metacognitivas necessárias para lidar
com isso (ver Tópico 3 da Unidade 2). O uso da Internet para a aprendizagem
se beneficiará, portanto, de habilidades específicas de literacia digital que
serão adquiridas de maneira mais rápida e eficiente por meio de instrução do
que por meio de aprendizagem por tentativa e erro. Orientação com feedback
explicativo, por exemplo, pode ajudar os alunos, particularmente os usuários de
computadores iniciantes. Esse treinamento de habilidades também deve levar
em conta a necessidade de os alunos surdos lidarem com a vasta quantidade de
texto que encontrarão. Embora alguns professores e bibliotecários tenham notado
uma tendência de os alunos surdos buscarem informações pictóricas ao longo do
texto, essa estratégia não será eficaz por muito tempo.

Em última análise, o aluno deve atribuir significado às informações


encontradas on-line, envolvendo todas as habilidades de leitura (e dificuldades)
descritas no Tópico 1 desta unidade: conhecimento ortográfico, fonológico,

214
TÓPICO 3 | NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES SURDOS

sintático e semântico, bem como as funções executivas de nível superior necessárias


para inferência e integração de informações. Como discutiremos mais adiante,
imagens e animações podem apoiar a compreensão do texto, mas muitas das
habilidades necessárias para integração e documentação do conhecimento não
são ensinadas ou não são ensinadas adequadamente na escola (VERHOEVEN;
GRAESSER, 2008).

Para melhorar a aprendizagem dos alunos surdos por meio da construção


do conhecimento interativo, as limitações da memória de trabalho devem ser
levadas em conta, juntamente às características do aluno, como motivação,
lócus de controle e conhecimento prévio, bem como fatores ambientais, como
interatividade e oportunidades de aprendizagem colaborativa (VERHOEVEN;
SCHNOTZ; PAAS, 2009). Tendo em conta os desafios dos alunos surdos em
compreender a leitura e integrar novas informações com conhecimento prévio,
o ensino específico das competências de literacia digital parece ainda mais
importante para os alunos surdos do que para os alunos ouvintes. No mínimo,
eles podem exigir formas de instrução um pouco diferentes, potencialmente uma
outra oportunidade de aproveitar a multimídia.

Existem amplas evidências de que a combinação de imagens com palavras


promove uma aprendizagem mais profunda, pelo menos em estudantes ouvintes
(MAYER, 2003), o que é frequentemente chamado de efeito multimídia ou efeitos
de modalidade. Ocorre não apenas em experimentos de psicologia, mas também
em situações ecologicamente válidas, como laboratórios de ciências da escola e
tarefas de casa (EILAM; POYAS, 2008). O efeito benéfico na conclusão da tarefa de
casa pode ser criado por um aumento na aprendizagem significativa e eficiente,
mas um aumento nos fatores motivacionais que medeiam a aprendizagem não
pode ser excluído, nesse caso ou no que diz respeito à aprendizagem em sala de
aula. Iding (2000), por exemplo, sugeriu que o uso de exibições visuais dinâmicas
acompanhadas por descrições verbais de instrutores é especialmente relevante
para a aprendizagem de princípios ou processos científicos que devem ser
visualizados para serem entendidos.

Mayer e Moreno (1998) enfatizaram ainda que os alunos com menos


conhecimento de conteúdo participando de uma aula se beneficiarão mais de
materiais verbais e visuais combinados. A apresentação sequencial de materiais
verbais e visuais, em contraste, aumenta, desnecessariamente, a carga cognitiva
e põe em risco a utilidade de exibições visuais no laboratório e na sala de aula
(IDING, 2000). As rupturas causadas pela divisão de atenção entre as descrições
verbais e seus referentes visuais são claramente problemáticas para os alunos
surdos, devido a sua dependência da linguagem visual.

Uma alternativa sugerida para apoiar alunos surdos em salas de aula


multimídia é a legenda em tempo real ou outro sistema de texto na tela. Embora
isto possa parecer uma possibilidade viável, o texto suplementar provou ser eficaz
apenas com melhores leitores surdos (HERTZOG; STINSON; KEIFFER, 1989).
Mesmo quando os níveis de leitura são controlados, os alunos surdos aprendem

215
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

menos com o texto na tela do que com os colegas ouvintes (JELINEK LEWIS;
JACKSON, 2001), presumivelmente por causa das diferenças no conhecimento
prévio. Em qualquer caso, R. E. Mayer e Moreno (1998) descobriram que os
materiais de texto eram menos eficazes do que as apresentações verbais auditivas
na aprendizagem multimídia, criando impedimentos significativos à integração
da informação.

R. E. Mayer, Heiser e Lonn (2001) demonstraram que, ao exigir que os


alunos ouvintes dividam sua atenção visual, o texto apresentado simultaneamente
pode “sobrepor” materiais visuais, resultando na utilização reduzida de ambas
as fontes de input. Mousavi, Low e Sweller (1995) verificaram que a combinação
da apresentação visual e verbal da informação reduziu a carga cognitiva apenas
quando a informação verbal foi apresentada de forma auditiva, permitindo que
os alunos assistissem aos dois modos. Eles descobriram que a disponibilidade
simultânea de diagramas e texto reduzia a carga na memória de trabalho e
eliminava a necessidade de procurar relações entre o diagrama e as instruções
relacionadas.

Embora a questão aparentemente não tenha sido abordada na pesquisa


pedagógica com alunos surdos, o ritmo da instrução em sala de aula, juntamente
ao uso de apresentações visuais, também parece ser um desafio em potencial para
os alunos surdos. Tiene (2000), por exemplo, demonstrou que a vantagem de ter
informações verbais e visuais redundantes foi obtida (com alunos ouvintes) apenas
quando elas foram apresentadas simultaneamente e em diferentes modalidades.
Gellevij et al. (2002) obtiveram descobertas similares em experimentos envolvendo
programação de computadores, indicando que informações multimodais
permitiram aos estudantes desenvolver um modelo mental melhor e mais
integrado de funções e capacidades de software. Assim, embora Presno (1997)
tenha argumentado que o uso de monitores de computador em demonstrações
de sala de aula e laboratoriais permite que os alunos sigam melhor as descrições
verbais simultâneas, tais achados provavelmente se aplicam apenas a alunos
com audição normal ou quase normal. Em virtude de suas perdas auditivas, essa
opção não está disponível para alunos surdos, e ainda não exploramos maneiras
de integrar o uso dessas tecnologias visuais à necessidade de os alunos surdos
atenderem visualmente a língua do professor, seja falada ou de sinais.

A discussão anterior deve deixar claro que a contribuição positiva da


multimídia não ocorre automaticamente. Para aprender com multimídia, os
aprendizes têm que construir ativamente o significado com base em informações
de canais separados. As imagens são processadas no canal visual, palavras faladas
no canal auditivo (CLARK; ​​PAIVIO, 1991). Palavras escritas podem ter que ser
convertidas em representações mentais verbais. Uma representação mental
coerente de todo material verbal deve ser construída e as conexões devem ser
feitas entre os canais verbal e pictórico e entre a informação atual e o conhecimento
prévio. Em outras palavras, para realmente aprender com multimídia, o aluno
precisa selecionar, organizar e integrar informações usando praticamente todos
os níveis de processamento cognitivo discutidos no Tópico 3 da Unidade 2.

216
TÓPICO 3 | NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES SURDOS

O processamento de informações de múltiplos canais requer considerável


esforço cognitivo. Armazenar informação verbal e pictórica na memória de
trabalho enquanto processa e atribui significado a essa informação pode
facilmente exceder a capacidade limitada de memória de trabalho (BADDELEY,
2007), um possível lócus de sobrecarga cognitiva. O aluno também pode ficar
sobrecarregado simplesmente pela quantidade de informações que precisam ser
processadas em um curto espaço de tempo. O desafio para o projeto e a instrução
com multimídia, portanto, é encontrar uma maneira de orientar a aprendizagem
ativa, evitando as armadilhas, para que os alunos possam construir representações
mentais adequadas.

4 CARACTERÍSTICAS DO ALUNO QUE AFETAM A


APRENDIZAGEM MULTIMÉDIA
Várias características dos alunos são importantes se considerarmos apoiar
a instrução com multimídia. A maioria delas diz respeito a aspectos da memória
de trabalho, como capacidade de memória de trabalho e estratégias de memória
(SEUFERT; SCHÜTZE; BRÜNCKEN, 2009) e, para alunos surdos, as dificuldades
acrescidas quando múltiplas fontes de informação visual estão envolvidas
simultaneamente.

Sabemos que os alunos com capacidades relativamente baixas de memória


de trabalho lucram com textos bem estruturados. A quantidade de estrutura é
ainda mais importante se esses textos estiverem em formato hipermídia (uma
coleção de documentos com links; ver adiante). Os organizadores avançados
que destacam a estrutura do texto são frequentemente úteis, desde que sejam
ativamente utilizados pelo aluno (THIEDE; ANDERSON; THERRIAULT, 2003).
Borgna et al. (2011), no entanto, os consideraram relativamente ineficazes para
estudantes surdos, que, às vezes, aprendiam mais sem organizadores do que
com eles. Aumentar a saliência das sentenças de tópico em cada nó da rede
hipertextual contribui para a compreensão e pode ser útil para os alunos surdos,
embora, dada a complexidade adicional envolvida, os recursos de hipertexto
precisam ser limitados em materiais destinados a crianças. Alunos mais velhos
que, presumivelmente, são capazes de estruturar seu próprio aprendizado, ao
que tudo indica seriam capazes de gerenciar melhor a aprendizagem hipertextual.

As características dos alunos tendem a influenciar a aprendizagem


hipertextual mais em situações controladas pelo aluno (SCHEITER et al., 2009). Se
um aluno tem um alto nível de conhecimento prévio, aprender com hipermídia
exigirá menos apoio e melhorará os resultados, uma descoberta obtida tanto
com alunos adultos quanto com crianças (KUIPER; VOLMAN; TERWEL, 2005).
Boas habilidades de autorregulação (isto é, o funcionamento executivo) também
contribuem para a aprendizagem hipermídia, assim como a motivação do aluno
para a instrução e uma atitude positiva em relação à aprendizagem on-line. Essas
mesmas características influenciam o uso efetivo de exemplos e desempenho

217
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

geral de solução de problemas pelos alunos. Assumimos que tais descobertas se


aplicam tanto a surdos quanto a ouvintes, mas, novamente, uma base relevante
de evidências ainda não foi estabelecida.

5 PROJETO DE MULTIMÍDIA INSTRUCIONAL EFICAZ


Outro tópico relevante na atualidade dos contextos educacionais são as
multimídias instrucionais. É necessário sabermos mais sobre as implicações do
uso destes recursos para tornar o processo de ensino-aprendizagem mais eficaz. A
seguir vamos apresentar os resultados de pesquisas sobre a eficácia e os desafios
do uso de imagens e animação, exibição de informações, hipermídia e navegação
na web, no processo de ensino-aprendizagem.

5.1 IMAGENS E ANIMAÇÕES


Em contraste com as imagens, que são estáticas, as animações são
dinâmicas. Ambas as imagens e animações são cada vez mais utilizadas na
hipermídia on-line. A questão é até que ponto e em que condições as imagens
e animações contribuem para a construção do conhecimento e, assim, para a
aprendizagem. Em qualquer caso, os alunos precisam aprender que necessitam
usar o contexto para entender uma ilustração (KUIPER; VOLMAN; TERWEL,
2005).

As imagens estáticas incluem apenas informações visuoespaciais,


enquanto as animações também envolvem informações temporais. O
processamento de animações, portanto, é mais complexo do que o processamento
de imagens e pode colocar uma demanda maior em surdos do que ouvintes,
dadas suas capacidades de memória de trabalho mais limitadas com informações
temporais e sequenciais (HALL; BAVELIER, 2010). Ao mesmo tempo, o efeito
multimídia é robusto com materiais visuais dinâmicos (animações e vídeo), mas
nem sempre é obtido quando imagens estáticas são usadas. Isso pode ocorrer
porque as imagens geralmente não adicionam informações relativas ao texto
anexo, mas são simplesmente redundantes. Embora seja contrário às previsões da
Teoria de Dupla Codificação de Allan Paivio (1986), a redundância de imagem-
texto pode, na verdade, reduzir a aprendizagem, especialmente em aprendizes
mais avançados (CHANDLER; SWELLER, 1996). A adição de imagens também
pode levar a um processamento mais superficial do texto anexo. Em um
estudo envolvendo estudantes universitários ouvintes, Rasch e Schnotz (2009)
descobriram que a adição de imagens a textos cobrindo tópicos científicos não
melhorava nem impedia a aprendizagem. No entanto, o tempo de processamento
foi significativamente maior quando as imagens foram usadas. Finalmente, há
uma limitação para nossa afirmação geral de que as animações geralmente
levam a uma melhor aprendizagem do que as imagens estáticas: as animações
geralmente não contribuem mais para a aprendizagem quando as informações
são relativamente abstratas.
218
TÓPICO 3 | NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES SURDOS

UNI

CONCEITO TÉCNICO:
A teoria de Dupla Codificação de Paivio ampliou a teoria geral do processamento de
informações, sugerindo o tratamento separado dos subsistemas verbais e visuais da memória.
Uma forma de elaboração enfatiza as associações verbais. A outra forma de elaboração é a
criação de uma imagem visual para representar uma imagem ou uma palavra. A informação
apresentada em qualquer forma, verbal ou visual, é codificada e armazenada na memória
visual ou na memória verbal. Estes sistemas de memória são separados, cada um capaz de
activar o outro, bem como converter informações de uma forma para outra. As palavras
podem ser codificadas em um formato verbal, mas também são capazes de ser convertidas
para um formato de imagem. O mesmo pode ser dito para as imagens, cuja forma pode ser
convertida para uma descrição verbal. Se as imagens visuais e associações verbais são as
duas maiores formas de elaboração, qual delas é mais eficaz? Segundo Paivio, uma imagem
fornece um segundo tipo de código para a memória que é independente do código verbal.
Essa teoria é conhecida como Teoria da Dupla Codificação, porque propõe dois códigos
de memória independentes uma vez que os dois códigos funcionam melhor quando
trabalhados separadamente. Do ponto de vista de Paivio, a ligação entre os códigos verbal e
visual fortalecem a memória. Para os designers, a apresentação combinada da informação
visual e verbal é susceptível de aumentar as probabilidades de reconhecimento e recordação,
devido às associações reforçadas pela dupla codificação (ALBUQUERQUE, 2019).

Em animações interativas envolvendo material concreto, o aluno pode


ser capaz de manipular aspectos da animação, como a direção ou a velocidade
do movimento. Embora, talvez mais motivador, a pesquisa até agora não
estabeleceu um efeito benéfico geral de animações interativas na aprendizagem.
Alternativamente, informações visuais na forma de visões gráficas estáticas
podem contribuir para a aprendizagem a partir do hipertexto, mas somente se
elas forem simples e fáceis de processar (DESTEFANO; LEFEVRE, 2007).

5.2 EXIBIÇÃO DE INFORMAÇÕES


A exibição visual da informação pode influenciar a aprendizagem,
mas pode ser mais ou menos eficaz para os alunos individuais. A exibição de
informações contribui mais para a aprendizagem se as informações forem
apresentadas de maneira coerente, espacialmente contingente e de estilo pessoal
(MAYER, 2003). O uso de material incoerente, não diretamente conectado ou
relacionado ao tema considerado, está em desacordo com a obtenção de coerência
na exibição de informações. Como as informações devem ser mantidas focadas,
materiais incoerentes assim devem ser evitados. Este chamado efeito de coerência
aplica-se aos formatos impresso e digital. Além disso, a exibição de informações
verbais e pictóricas também é mais eficaz se as duas forem apresentadas próximas
umas das outras, em vez de mais separadas, portanto, a apresentação na mesma
página é preferida à apresentação em páginas diferentes. Esse é o efeito de
contiguidade espacial, que também é válido tanto para formatos impressos

219
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

quanto digitais. Resulta da relativa facilidade de manter palavras e imagens na


memória de trabalho quando são apresentadas espacialmente próximas umas
das outras. Finalmente, ao exibir informações, é necessário levar em conta o efeito
de personalização. Se, por exemplo, as palavras são apresentadas em um estilo de
conversação, a dialogicidade, os alunos aprendem o material mais profundamente
em comparação com a apresentação de palavras em um estilo mais formal.

Naturalmente, a linguagem usada na informação exibida também merece


atenção. A maioria dos mecanismos de pesquisa não aceita linguagem natural.
Em vez disso, é preciso usar palavras-chave. Assim, os alunos precisam aprender
como traduzir uma consulta em linguagem natural para uma que use palavras-
chave específicas ou, ainda mais difícil, combinações de palavras-chave (KUIPER;
VOLMAN; TERWEL, 2005). Ao projetar ou selecionar websites, a linguagem
usada deve ser adaptada às necessidades dos usuários. O tamanho das fontes não
deve ser muito pequeno e os alunos mais jovens serão ajudados se as cores forem
usadas. Dada a capacidade limitada de memória de trabalho de estudantes mais
jovens, as informações a serem baixadas da web não devem exigir muito tempo.

5.3 HIPERMÍDIA
As informações na web geralmente estão em formato hipermídia.
Hipermídia ou hipertexto é uma coleção de documentos vinculados por links
que permite aos leitores passar de um trecho de texto para outro através dos
links (DESTEFANO; LEFEVRE, 2007). Para que a hipermídia seja eficaz, os alunos
precisam saber como navegar na web. Eles precisam decidir quais links usar e
quais ignorar. Muitas vezes, o significado de cada unidade em textos hipermídia
tem que ser entendido para ser combinado com os outros na construção de
interpretações completas e precisas de texto. Isso requer habilidades como
chunking de múltiplas informações e integração de informações através de textos,
imagens e animações (VERHOEVEN; SCHNOTZ; PAAS, 2009). Esses processos
de integração exigem consideráveis ​​recursos de memória de trabalho e, portanto,
podem facilmente levar a uma sobrecarga cognitiva, especialmente para os
alunos que são leitores mais fracos ou menos conhecedores do conteúdo. Embora
não exista uma pesquisa específica disponível para a compreensão de hipertexto
por alunos surdos, parece provável que eles estejam em risco de problemas de
compreensão, devido a sua proficiência em leitura comparativamente baixa e às
limitações na retenção de informações sequenciais. Ainda a ser determinado (ou
mesmo explorado) é como podemos projetar materiais hipermídia e didáticas
relacionadas para tais alunos, de modo a minimizar a possibilidade de sobrecarga
cognitiva.

220
TÓPICO 3 | NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES SURDOS

UNI

CONCEITO TÉCNICO:
No ano passado a ciência reconheceu essa forma de aprendizado como a mais eficiente para
lembrar de novos conhecimentos. Chunking pode ser traduzido por choques, reencontros
ou divisões. Esse processo se trata de tentar fazer algo muito complexo fazer sentido ao
quebrá-lo em menores unidades (chunks). Por exemplo, quando você está aprendendo
uma nova linguagem, você aprende frases, gramática, vocalização, entre outros, até que
consegue construir sentenças complexas. Outro benefício dessa prática é que ela pode
lhe ajudar no aprendizado de coisas completamente diferentes, pelo mesmo caminho. Por
exemplo, quando alguma música é utilizada como forma de memorizar a tabela periódica
ou quando você aprende uma nova linguagem muito mais fácil depois de já conhecer outras
(BATTISTELLI, 2019).

Segundo DeStefano e LeFevre (2007), o hipertexto coloca novos requisitos


cognitivos na leitura. Seu aumento da carga cognitiva, em comparação com a leitura
de texto linear e a tomada de decisão exigida com múltiplos links embutidos, criam
uma maior probabilidade e custo associado à interrupção da compreensão em
andamento, especialmente quando o texto vinculado é cognitivamente exigente.
Se menos links forem usados, a aprendizagem hipertextual aumentará, talvez,
porque a pesquisa visual se torna mais eficaz se menos links estiverem sendo
usados. No entanto, o uso do que é chamado de links de rede, links de hipertexto
que não possuem nenhuma ordem hierárquica inerente, também resulta em
mais carga cognitiva em relação aos links hierárquicos. Em outras palavras, a
leitura hipertextual hierárquica é cognitivamente menos exigente do que a leitura
hipertextual em rede. A razão para isso é que encontrar informações é mais
fácil em textos hierárquicos do que em redes, devido à eficiência da navegação.
Portanto, é provável que o tipo de links no hipertexto seja mais importante que o
número absoluto de links.

A sobrecarga cognitiva também pode ser evitada restringindo o número de


opções de navegação, diminuindo o número de decisões a serem tomadas. Isso é
especialmente importante para os alunos com conhecimento prévio relativamente
limitado sobre uma tarefa específica. Assim, pode ser que a leitura hipertextual
seja útil apenas para alunos que tenham conhecimento prévio suficiente e
habilidades de funcionamento executivo para apoiar e orientar o uso de material
com hiperlinks. Esse conhecimento ajuda esses aprendizes “especialistas” a
conectar novas informações a estruturas que já existem na memória de longo
prazo (RAWSON; KINTSCH, 2002). No entanto, aprendizes com habilidades/
conhecimentos mais baixos, precisarão de mais orientação na leitura hipertextual
do que estudantes de alta habilidade/conhecimento. Esses fatores sugerem que
muitos alunos surdos terão problemas com hipertexto em relação aos pares
ouvintes, porque eles frequentemente têm menos conhecimento de conteúdo
anterior e menos funcionamento executivo automático em comparação aos
alunos ouvintes (KNOORS; HERMANS, 2010).

221
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

Uma característica de design da hipermídia que pode ser útil para alunos
surdos ou para outros com menos conhecimento prévio é a quantidade de
estrutura no conteúdo de texto: mais estrutura ajuda a compensar menos conexões
na base de conhecimento existente. Se os links no texto levarem a janelas pop-up,
o texto nessas janelas não influenciará a aprendizagem de maneira positiva ou
negativa. No entanto, as janelas pop-up contribuem para facilitar a navegação e
podem aprimorar a compreensão se destacarem informações textuais. Alunos
com pouco conhecimento prévio, portanto, parecem particularmente propensos
a se beneficiar se designers instrucionais criarem hipertexto estruturando e
destacando links e usando organizadores avançados. Os efeitos só serão positivos,
no entanto, se as manipulações realmente diminuírem a carga cognitiva.

Outro recurso de design de hipermídia que parece aumentar a


acessibilidade e a compreensão para alunos surdos é o uso de links de sinais. A
nova tecnologia foi projetada para construir hiperlinks dentro do vídeo, de modo
que ambientes web baseados em língua de sinais e opcionais em texto possam
ser criados (FELS et al., 2006). Em comparação com links de texto, os links de
sinais são bastante complexos. Eles contêm várias partes, incluindo um indicador
de vídeo, uma barra de densidade de link, imagens em miniatura, operações
para vincular ao recurso referenciado e para desambiguar o significado da
imagem em miniatura, além de uma caixa de texto opcional. Pesquisas sobre a
eficácia dos links de sinal para alunos surdos estão em falta, com exceção de um
estudo de Fels et al. (2006), envolvendo 14 adultos surdos usuários de língua de
sinais e com idade variando de 18 a 30 anos. O estudo avaliou a capacidade de
aprendizagem e usabilidade de uma interface de página da Web com links de
sinais. Os dados consistiam em protocolos, questionários e anotações em voz alta,
além da gravação em vídeo do uso da Web pelos indivíduos. A conclusão mais
importante do estudo foi que páginas da Web com links de sinais poderiam ser
navegadas com sucesso por adultos surdos sem qualquer conhecimento técnico
específico, mas o design da interface precisava de mais atenção.

5.4 NAVEGAÇÃO
Existem várias possibilidades para navegar na Web e pesquisar
informações. Usar palavras-chave, inserir um URL específico e usar links são os
métodos mais comuns. A eficácia desses métodos depende do tipo de informação
que se está procurando, do conhecimento prévio do aluno, do conhecimento da
estrutura da web e das habilidades em técnicas de busca. Selecionar bons sites
é relativamente difícil para os alunos na educação fundamental. Pesquisar com
palavras-chave é muito difícil para crianças pequenas e, embora os alunos mais
velhos consigam usar mecanismos de busca e palavras-chave, eles costumam ter
pouco tempo para ler atentamente as informações nos sites (KUIPER; VOLMAN;
TERWEL, 2005). Como resultado, eles podem não ser capazes de julgar a utilidade
ou relevância de sites ou conteúdo do site. Suas pesquisas, portanto, tendem a ser
bastante intuitivas e assistemáticas, a menos que tenham um apoio considerável.

222
TÓPICO 3 | NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES SURDOS

Mesmo quando os alunos possuem habilidades técnicas suficientes para


a pesquisa on-line, eles geralmente não conseguem usar as informações com
eficiência. O processo de busca em si requer tanto esforço que o exame cuidadoso
da informação e a integração com conhecimento prévio frequentemente
sofrem. Como consequência, os alunos mais jovens geralmente procuram frases
específicas que contenham a resposta necessária (por exemplo, "Quanto pesa
um elefante adulto?"). É provável que visitem apenas um número limitado de
sites, geralmente os mais familiares, com pouca exploração. Eles também pulam
com rapidez e frequência nos sites. Os meninos são particularmente propensos
a mostrar essa tendência, aprendendo significativamente melhor se as buscas
são de um escopo predeterminado e limitado (SEGERS; VERHOEVEN, 2009).
Muitas crianças parecem, portanto, estar sobrecarregadas com a quantidade de
informação disponível na web, embora os limiares para sobrecarga de informação
provavelmente estejam mudando à medida que os grupos mais jovens de crianças
têm maior exposição à tecnologia, informação e computação.

Não são apenas os alunos surdos que evitam textos na web. Os alunos
geralmente ficam entediados com sites que contêm grandes quantidades de texto
e navegam rapidamente para longe deles. É especificamente o caráter multimídia
da web que atrai os alunos mais jovens e eles preferem a busca relativamente
rápida e fácil, pelo menos em comparação com os livros (KUIPER; VOLMAN;
TERWEL, 2005). Felizmente, o critério mais importante para selecionar um site
por jovens estudantes parece ser se o conteúdo que aparenta relevante para a
tarefa. A confiabilidade e a validade das informações, no entanto, raramente são
avaliadas e, mesmo que sejam, os critérios incorretos costumam ser aplicados.
Alunos “mais fracos”, portanto, precisam de considerável supervisão e ajuda na
busca de informações adequadas na estruturação de seu trabalho, e as dificuldades
dos alunos surdos em julgar sua compreensão e conhecimento, como exemplifica
Borgna et al. (2011), colocam eles em risco particular de recuperação de informação
ineficiente e superficial.

Um estudo espanhol sobre a navegação de hipertexto por 33 crianças


ouvintes do sexto ano escolar mostrou que estratégias de navegação eficazes,
levando à construção de significado coesa, estavam diretamente relacionadas às
habilidades de leitura das crianças (SALMERÓN; GARCÍA, 2011). A visualização
gráfica da estrutura do hipertexto, no entanto, não estava relacionada as suas
habilidades de leitura, sugerindo que essa estratégia é uma parte básica da
proficiência em leitura eletrônica e, portanto, típica de literacia eletrônica. Mais
uma vez, tais achados sugerem potenciais desafios para os alunos surdos e
indicam a necessidade de pesquisas nesse sentido para determinar intervenções
efetivas.

Resumindo a literatura sobre o uso efetivo de informações baseadas


na web por crianças, Kuiper, Volman e Terwel (2005) descobriram que as
crianças preferem explorar o uso de pesquisas direcionadas por palavras-chave.
Formular palavras-chave adequadas é difícil. Como resultado, suas buscas são

223
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

frequentemente desestruturadas e focadas na coleta de conhecimento fatual e em


uma única resposta correta em particular. Relativamente pouca atenção é dada à
leitura cuidadosa das informações.

6 SUPORTE EDUCACIONAL
Frequentemente, os estudantes são obrigados a usar informações de fontes
multimídia digitais, baseadas na web ou não, para a aprendizagem investigativa.
A aprendizagem investigativa refere-se àquela centrada no aluno, com
professores orientando a investigação de questões do mundo real. A ensinagem
e a aprendizagem baseadas na investigação complementam o ensino tradicional
em sala de aula, permitindo que os alunos conectem seus próprios interesses
aos objetivos instrucionais dos professores. Em particular, a aprendizagem
investigativa requer que os alunos encontrem informações, analisem, determinem
como se relacionam com a tarefa predefinida e gerem soluções que demonstrem
seu pensamento e compreensão. No entanto, esses ambientes abertos de
aprendizagem representam um desafio significativo (JOHNSON; PERRY;
SHAMIR, 2010). As exigências cognitivas são tão exigentes que a aprendizagem
investigativa muitas vezes pode resultar em nenhum aprendizado. Para alcançar
a aprendizagem, é necessário o apoio instrucional dos professores. Uma maneira
de fornecer esse suporte de forma eficaz é através do uso de roteiros de aula
altamente estruturados.

Em um estudo sobre o efeito dos roteiros de aula na aprendizagem


colaborativa apoiada por computador, 108 estudantes ouvintes de 16 a 19 anos,
Mäkitalo-Siegl, Kohnle e Fischer (2011) mostraram que, pelo menos para alunos
“relativamente fracos”, o ganho de aprendizagem foi o mais alto quando roteiros
altamente estruturados foram usados. Esses roteiros foram modelados a partir
de critérios formulados por De Jong (2006) em seu modelo de aprendizagem
investigativa ou aprendizagem baseada em problemas. De acordo com essa
teoria, um roteiro de aula eficaz para a aprendizagem investigativa deve incluir
uma fase de orientação, uma fase subsequente de geração de hipóteses, uma fase
para a coleta de informações, uma fase dedicada para extrair conclusões e uma
fase de avaliação. O uso de tais roteiros no estudo de Mäkitalo-Siegl, Kohnle e
Fischer (2011) reduziu a frequência com que os estudantes precisavam procurar
assistência. Os pesquisadores concluíram que, em ambientes com alto nível de
estrutura, os alunos conseguem se concentrar no entendimento, em vez de se
esforçarem para lidar com a própria metodologia de busca de informações.

Outras maneiras pelas quais os professores podem ajudar os alunos


na aprendizagem multimídia, apoiada por computador, envolvem instrução
na avaliação da confiabilidade e validade das informações obtidas, instrução
em habilidades efetivas de busca de informações e instrução sobre como ler e
entender textos (KUIPER; VOLMAN; TERWEL, 2005).

224
TÓPICO 3 | NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES SURDOS

Pesquisas sobre a eficácia de um programa de instrução de leitura


assistida por computador para crianças pré-escolares e do primeiro ano escolar
mostraram que programas que não são controlados pelo aluno, mas incorporam
dicas que apoiam o progresso dos alunos em lições, dependendo de seu domínio
de habilidades, resultam em maiores resultados de aprendizagem (JOHNSON;
PERRY; SHAMIR, 2010). Um estudo de Savage et al. (2010) examinou eficácia de
um programa de intervenção em literacia baseado na web para alunos do primeiro
ano escolar. Os professores do estudo foram agrupados de acordo com sua
capacidade de integrar a tecnologia de computadores em suas instruções diárias.
Alguns professores que ainda estavam no estágio inicial em relação à tecnologia
de sala de aula costumavam consumir muito tempo no uso de computadores.
Como resultado, eles se frustraram, levando a erros ainda maiores e, às vezes,
ao abandono do uso da tecnologia. Os professores no estágio de adoção do uso
da tecnologia começaram a aplicar a tecnologia da computação de maneira
sistemática, embora com um mínimo de experimentação. Ensinar com a ajuda da
informática nesta etapa passa por aulas bem planejadas e bem executadas, mas,
muitas vezes, não está muito ligado a outras formas de aprendizagem, como a
aprendizagem colaborativa ou a aprendizagem investigativa.

O estágio de adaptação do uso da tecnologia na aula é caracterizado


pelo fato de os professores realmente saberem como integrar a tecnologia em
suas instruções. Esses professores transformam a instrução como resultado
da incorporação de tecnologia. Savage et al. (2010) descobriram que o ganho
de aprendizagem era mais alto nas aulas que eram instruídas por professores
tecnicamente competentes no programa de instrução de leitura na web, que
planejavam suas lições efetivamente, e que estavam claramente no estágio
de adoção ou de adaptação da aplicação da tecnologia computacional. Se
os professores conseguiram integrar o programa de instrução com suporte
computacional às formas de instrução mais amplas e muitas vezes não
tecnológicas, o efeito sobre os resultados em crianças do primeiro ano escolar
acabou sendo o maior, consideravelmente melhor do que em uma condição de
controle usando um programa de leitura típica baseada em livros. Assim, as
intervenções assistidas por computador parecem ser mais eficazes quando os
professores ou outros adultos fornecem experiências de aprendizagem mediadas
para apoiar a aprendizagem dos alunos.

7 EFEITOS DA APRENDIZAGEM MULTIMÍDIA ASSISTIDA


POR COMPUTADOR EM ESTUDANTES SURDOS
A partir das publicações disponíveis sobre programas multimídia
assistidos por computador para alunos surdos, tem-se a impressão de que muitos
programas são desenvolvidos em projetos com ciclos de vida relativamente
curtos. A avaliação do uso de múltiplas mídias e resultados (quantitativos e
qualitativos) é, muitas vezes, inexistente. Loeterman, Paul e Donahue (2002),
no entanto, relataram resultados após o desenvolvimento de uma unidade

225
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

multimídia assistida por computador dentro da abordagem Cornerstone para


leitura por crianças surdas. Essa abordagem foca na identificação de palavras
impressas, conhecimento de palavras e compreensão de histórias (WANG; PAUL,
2011).

No programa, os professores têm diferentes opções para a apresentação


de uma história: em língua falada, língua de sinais ou um sistema de sinais (ver
Tópico 1 da Unidade 2). A história está disponível em língua de sinais em formato
de vídeo e os materiais também incluem um livro de histórias no formato impresso
e uma versão de hipertexto. As crianças ficam envolvidas em ler e discutir a
história 2 horas por dia durante 6 dias. A viabilidade e a eficácia da unidade
foram avaliadas em seis salas de aula, envolvendo oito professores, com um total
de 32 crianças surdas e com deficiência auditiva, com idade entre 6 e 12 anos.
Uma metodologia de pré-teste/pós-teste foi usada para avaliar o conhecimento
dos alunos sobre as palavras selecionadas na unidade de várias maneiras (por
exemplo, filmar as aulas, fazer entrevistas). Os pesquisadores relataram que
todos os alunos surdos apresentaram aumento no conhecimento das palavras-
alvo e também aprenderam palavras que não foram avaliadas. Se esse progresso
pode ser atribuído apenas ao programa multimídia, não está claro devido à falta
de qualquer grupo de comparação ou condição de controle.

Mueller e Hurtig (2009) estudaram o impacto dos e-books em um


projeto de leitura compartilhada envolvendo quatro crianças surdas, com idade
variando de 2 anos 0 mês a 4 anos 10 meses, e suas mães. Os 25 e-books utilizados
foram baseados em livros de histórias autênticos para crianças. Eles envolviam
multimídia interativa contendo um narrador que conta a história, faz comentários,
faz perguntas e dá o devido feedback. O estudo usou um delineamento de retirada
de sujeito único. Na fase de intervenção, os livros continham um narrador em
língua de sinais; nas fases de linha de base e de retirada, eles não continham este
narrador. O tempo e a frequência de uso dos livros foram medidos em conjunto
com a aquisição de vocabulário de sinais pelas crianças e suas mães usando pré-
testes e pós-testes. O efeito de um narrador de sinais na duração e frequência das
sessões de leitura compartilhada foi misto. Com alguns livros e algumas crianças,
isso resultou em uma duração e uma frequência de uso um pouco maiores,
mas, com outros livros e crianças, a adição de um narrador de sinais não fez
diferença. Em qualquer caso, os efeitos tendem a ser muito pequenos, e incluir
um narrador de sinais não teve nenhum efeito sobre a aquisição do vocabulário
de sinais. De acordo com os pesquisadores, a explicação mais provável é que as
mães costumavam usar a língua de sinais com seus filhos em sua conversa diária,
de qualquer maneira, de modo que usar um narrador de sinais, além dos sinais
nos livros eletrônicos não oferecia valor algum agregado.

Gentry, Chinn e Moulton (2005) examinaram se as histórias multimídia via


CDs eram eficazes na transmissão de informações linguísticas para crianças surdas
e que tipo de apresentações multimídia eram mais eficazes em comparação com
material apenas impresso: material impresso mais imagens, material impresso
mais vídeos de língua de sinais digital ou material impresso combinado com

226
TÓPICO 3 | NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES SURDOS

imagens e vídeos com língua de sinais digital. Participaram 25 alunos surdos, com
idades entre 9 e 18 anos, recrutados em escolas regulares e especiais. Histórias no
nível de leitura do terceiro ano foram usadas como estímulos, e a aquisição de
informações fatuais foi medida por uma atividade de recontagem de histórias.
A compreensão e a aprendizagem, medidos pela exatidão da recontagem da
história, foram os mais baixos na condição somente para o material impresso.
Adicionar imagens ou vídeos aumentou significativamente a compreensão. Em
comparação ao material impresso com vídeos em língua de sinais, o material
impresso com imagens foi um pouco mais eficaz, embora essa diferença não
tenha sido estatisticamente significativa. O que não ficou claro foi a preferência na
percepção visual temporal: os alunos primeiro leram o texto e depois assistiram e
olharam as imagens e vídeos ou primeiro assistiram e olharam as imagens e vídeos
e depois leram o texto? Os autores concluíram que a apresentação multimídia de
material de leitura é significativamente mais eficaz para a compreensão do que o
uso de apenas material impresso. A incorporação de vídeos de língua de sinais,
no entanto, não parece melhorar a compreensão de leitura em comparação com
o uso de imagens.

Esses achados, de modo geral, foram confirmados em três experimentos


relatados por Marschark et al. (2006). Em um experimento envolvendo estudantes
universitários surdos, verificou-se que uma aula combinada com texto em tempo
real (C-Print) foi mais eficaz na transmissão de informações do que a interpretação
em língua de sinais ou a interpretação em língua de sinais em combinação com
a legenda. Um segundo experimento no estudo de Marschark et al. (2006) foi
realizado em escolas secundárias para surdos na Holanda, onde eles descobriram
que a legendagem de programas de televisão em combinação com interpretação
em língua de sinais não resultou em maior ganho de aprendizagem do que apenas
legendas. Um terceiro experimento relacionado envolveu alunos do Ensino Médio
na Austrália e um professor surdo usuário nativo de língua de sinais. As aulas de
geografia apresentadas em Auslan (Língua Australiana de Sinais), como texto em
C-Print ou texto em conjunto com Auslan e C-Print, levaram a níveis comparáveis​​
de aprendizagem. Nos três casos, pode-se concluir que ter que atender a múltiplos
recursos de informação visual pode afetar negativamente a aprendizagem dos
alunos surdos, compensando qualquer ganho potencial. Stinson et al. (2009),
no entanto, descobriram que o texto C-Print levou a uma maior aprendizagem
por alunos surdos do ensino médio do que a interpretação em língua de sinais,
mas não houve diferença para estudantes universitários surdos. Portanto, há
claramente mais pesquisas a serem feitas sobre esse assunto.

227
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

UNI

CONCEITO TÉCNICO:
A C-Print é uma tecnologia e serviço de fala-para-texto (legendagem) desenvolvida
no Instituto Técnico Nacional para Surdos, uma faculdade do Instituto de Tecnologia de
Rochester. O sistema está sendo usado com sucesso para fornecer acesso de comunicação
a pessoas surdas ou com deficiência auditiva em muitos programas em todo o país. Além
dos ambientes educacionais, o C-Print também pode ser usado em ambientes empresariais
e comunitários, e com pessoas com outras deficiências, como pessoas com deficiência
visual ou dificuldades de aprendizagem.

Reitsma (2008) levantou a questão dos alunos surdos tendo que atender
a múltiplos estímulos visuais em seu estudo sobre a eficácia de um programa
de computador para a aprendizagem de leitura e ortografia de crianças surdas.
O programa multimídia, instalado em um laptop, consistia em dois tipos de
exercícios baseados em computador. No primeiro, uma imagem ou vídeo de sinais
indicando um significado de palavra foi apresentado na tela, e as crianças foram
convidadas a selecionar a ortografia da palavra correta a partir de três palavras
escritas alternativas. No segundo tipo, uma palavra impressa era mostrada
na tela e as crianças tinham que escolher a imagem ou vídeo de sinais que
correspondiam ao significado da palavra. Os distratores eram ortograficamente
ou semanticamente relacionados. O programa foi testado em 11 crianças surdas,
com média de idade de 7 anos e 10 meses, todas em escolas especiais para surdos,
nas quais tanto a fala quanto a língua de sinais foram utilizadas. Todos, exceto um,
usavam aparelhos auditivos; nenhum utilizou implante coclear. Vinte palavras,
antes desconhecidas para as crianças, foram praticadas durante duas sessões. As
crianças aprenderam a ler e compreender, em média, 12 das 20 novas palavras, e
20% de todas as palavras foram escritas corretamente após o treinamento.

A compreensão da leitura foi medida solicitando que as crianças


sinalizassem as 20 palavras escritas e sinalizando para as crianças, pedindo-
lhes que apontassem para a palavra escrita correspondente (identificação de
palavras). A prática foi mais bem-sucedida quando o foco estava na ortografia e
não no significado. Os vídeos com sinais não facilitaram a leitura ou a ortografia.
Nem imagens nem vídeos de sinais resultaram em diferenças na leitura, mas os
resultados de ortografia foram maiores quando as imagens foram usadas em vez
de vídeos de sinais. De acordo com Reitsma (2008), isso pode ter sido o resultado
de professores usarem muito mais imagens do que vídeos em suas instruções.
Por outro lado, a percepção de vídeos de sinais é muito mais complexa do que a
percepção de imagens. Pode ser que olhar rapidamente para uma imagem seja
mais eficaz do que perceber um sinal, se alguém quiser aprender novas palavras
escritas.

228
TÓPICO 3 | NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES SURDOS

Dowalby e Lang (1999) estudaram o efeito de quatro tipos de auxílio


instrucional na recordação fatual imediata do conteúdo das aulas sobre o olho
humano. Os participantes foram 144 estudantes universitários surdos agrupados
em leitores de baixa, média e alta capacidade. As condições da ajuda instrucional
eram a leitura de texto e a visualização de filmes de conteúdo, a leitura de textos
e a visualização de traduções em língua de sinais do texto, a leitura de texto
e a resposta a perguntas aditivas e todas as condições em conjunto. A leitura
de texto com perguntas adjuntas sobre o texto resultou em uma proporção
significativamente maior de recordação fatual em comparação a uma condição de
controle, e isso foi apenas para os leitores de baixa capacidade. As traduções em
língua de sinais não contribuíram significativamente para uma maior recordação
fatual para qualquer grupo.

O fato de a instrução multimídia para alunos surdos exigir adaptações


específicas para o sucesso é ilustrado por uma série de estudos sobre a eficácia
da instrução científica baseada na web por Lang e Steely (2003). Lang e Steely
apontaram que a instrução baseada na Web para alunos surdos tem inerentemente
alguns desafios distintos. As habilidades limitadas de compreensão de leitura
de muitos alunos surdos são uma; quando a informação auditiva na instrução
multimídia baseada na web é substituída por legendas literais ou editadas, a
capacidade de leitura se torna um problema. O conteúdo das legendas pode ser
muito difícil de ler para muitos alunos surdos e/ou as informações em legendas
podem ser insuficientes para fornecer aos alunos surdos acesso significativo à
informação. Outro desafio é que se a aprendizagem assistida por computador for
oferecida na aprendizagem a distância, os alunos surdos perdem certos apoios
para sua aprendizagem – como os aspectos organizacionais e estruturais da sala
de aula (por exemplo, pedindo ajuda a professores ou colegas).

Para fins de três experimentos, Lang e Steely (2003) criaram programas


de computador multimídia de acordo com as diretrizes do Centro de Ciências
Aplicadas de Oregon. Os programas foram construídos usando a abordagem
“grande ideia”, o que significa que há um foco no ensino explícito de redes
subjacentes de conceitos. Se os alunos entenderem essas grandes ideias, poderão
integrar fatos e conceitos em conjuntos significativos, o que frequentemente é
um obstáculo para os alunos surdos (ver Tópico 3 da Unidade 2). Os conceitos
foram introduzidos sequencialmente, o que significa que eles foram parcialmente
desenvolvidos em uma aula e depois reforçados em aula subsequentes. Sentenças
em textos foram mantidas relativamente curtas e tinham estruturas um pouco
simples. Os organizadores gráficos foram usados ​​para ajudar os alunos a
acompanhar o conteúdo importante que aprenderam anteriormente, e as
animações foram incorporadas para ilustrar e reforçar conceitos importantes. Os
programas tinham questões intercaladas, mas depois de cada aula havia exercícios
e questões de teste. Em contraste com o conteúdo multimídia desenvolvido para
alunos ouvintes, um princípio central era a tríade de apresentação de conteúdo.
Cada lição continha uma série de tríades que começavam com uma pequena tela
de texto, seguida por uma animação relacionada e, finalmente, uma tradução em
língua de sinais do texto.

229
UNIDADE 3 | REALIZAÇÃO ESCOLAR E INSTRUÇÕES

Em sua primeira experiência, Lang e Steely (2003) usaram um programa


multimídia de 72 aulas para ensinar ciências da terra a 49 alunos do 6º, 7º e 8º anos
escolares em seis salas de aula em três escolas. As salas de aula foram alocadas
aleatoriamente para o programa experimental ou para uma condição de controle,
mas não houve diferenças significativas entre os grupos no pré-teste (conhecimento
prévio). Os ganhos de pré-teste a pós-teste não diferiram significativamente para
os grupos experimental e de controle, embora os ganhos tenham sido maiores na
condição multimídia. Em um segundo experimento, um programa multimídia de
seis lições sobre gravidade foi testado com 37 alunos surdos de três programas
de Ensino Fundamental e Médio. Um desenho de pré-teste/pós-teste foi usado
novamente com um grupo de comparação de educação padrão, desta vez com
pares de alunos surdos designados aleatoriamente, combinados com capacidade
de leitura e compreensão de língua de sinais.

Quando o conhecimento prévio foi controlado, os escores pós-teste, no


grupo experimental, foram significativamente maiores do que no grupo controle.
Finalmente, um programa multimídia de seis lições sobre química (estrutura
atômica) foi testado com alunos surdos do Ensino Fundamental e do Ensino
Médio de três escolas usando um delineamento pré-teste/pós-teste no qual os
alunos foram aleatoriamente designados para o currículo baseado na web ou o
currículo padrão. Novamente, quando o conhecimento prévio era controlado, os
resultados do pós-teste eram significativamente mais altos na condição curricular
baseada na web. Os pesquisadores concluíram que a multimídia interativa e os
materiais do currículo baseados na web levaram a ganhos significativamente
maiores do que as experiências tradicionais de sala de aula.

Long, Marchetti e Fasse (2011) relataram três experimentos comparando


aprendizagem on-line e presencial envolvendo estudantes universitários surdos e
ouvintes. Em geral, os alunos matriculados em cursos on-line relataram melhores
resultados de aprendizagem e obtiveram notas mais altas do que os alunos em
cursos presenciais. Cursos on-line foram encontrados como sendo especialmente
benéfico para os alunos surdos por causa das possibilidades de discussão on-
line, algo que é mais difícil em salas de aula mistas tradicionais. A quantidade e
a qualidade das interações on-line foram consideradas um fator importante para
alcançar o sucesso da aprendizagem, pois os alunos de cursos on-line que tiveram
mais discussões on-line superaram aqueles com menos discussões.

A partir da pesquisa disponível, podemos concluir que os surdos


usam, frequentemente, mídias digitais e que a Internet desempenha um papel
importante no estabelecimento e continuidade das relações sociais. Sobre a relação
entre o uso de multimídia digital e a aprendizagem de alunos surdos, no entanto,
sabemos muito pouco neste momento. Pesquisas sobre esse assunto envolvendo
estudantes ouvintes e dos poucos estudos realizados com alunos surdos sugerem
otimismo e nos levam a oferecer cautelosamente algumas recomendações para a
prática e para pesquisas futuras.

230
TÓPICO 3 | NOVAS TECNOLOGIAS DE APRENDIZAGEM PARA APRENDIZES SURDOS

Primeiro, sabemos que, para os alunos ouvintes, a combinação de


informações auditivas e visuais leva a uma melhor aprendizagem do que a
combinação de informações de duas fontes de informação visual. Assim, valeria a
pena estudar em que medida e em que condições os alunos surdos com implantes
cocleares ou aparelhos auditivos digitais podem ter acesso a informações auditivas
via internet e recursos multimídia.

Em segundo lugar, em muitos casos, os alunos surdos precisam construir


significado combinando informações de duas ou mais fontes visuais. Se isso
envolver novas informações ou novos aprendizes, é necessário um planejamento
cuidadoso do ambiente de aprendizagem (ver Tópico 3 da Unidade 2). Construção
cuidadosa de texto, apresentação de informações de fontes espacialmente próximas
umas das outras (aderindo ao princípio de apresentação da tríade usado por Lang
e Steely (2003), e evitar informações visuais redundantes (“menos é mais”) devem
ser três dos princípios orientadores mais importantes. Também consistente com o
princípio “menos é mais”, se a Internet for usada para aprender, os ambientes de
aprendizagem estruturados precisam ser construídos para evitar que os alunos
surdos se percam em uma avalanche de informações. As buscas na web parecem
um formato muito útil, especialmente para crianças e adolescentes surdos.

Aprender por meio de multimídia digital será mais proveitoso se for


apoiado por professores e integrado completamente em seus métodos de ensino.
Instrução multimídia eficaz, portanto, não é apenas sobre a construção cuidadosa
e eficaz de materiais digitais e ambientes, mas também sobre o treinamento de
professores em seu uso efetivo. Uma recomendação final, portanto, decorre do fato
de que as apresentações multimídia de tecnologias de informação e comunicação
já são dominantes na vida de muitos alunos surdos e ouvintes. A penetração da
Internet na educação está aumentando a cada ano, à medida que mais e mais
pessoas a acessam através de vários dispositivos: smartphones, tablet PCs,
laptops e computadores de mesa. Televisão, rádio e hardware de computador
estão se tornando cada vez mais integrados. Muitas pessoas estão conectadas
globalmente pela Internet a cada momento do dia. Saber como usar vários tipos
de computadores e como acessar, estruturar e avaliar o valor da informação
digital, portanto, é de suma importância em nosso mundo digital e global.

Os alunos, surdos e ouvintes, precisam ser letrados digitalmente.


Para os alunos surdos, em particular, se aplicadas de forma inteligente, as
tecnologias de informação e comunicação podem oferecer um apoio importante
para as relações sociais e a aprendizagem, não mais deixando-os em posição
desfavorável em relação aos pares ouvintes. Isso requer educação em literacia
digital como disciplina em programas educacionais para alunos surdos desde
cedo. Para funcionar plenamente na sociedade de hoje (e de amanhã), ser letrado
digitalmente é tão importante quanto saber ler, escrever e calcular. Se os alunos
surdos têm estado em desvantagem nestas áreas no passado, as tecnologias estão
agora disponíveis para ajudar a nivelar este terreno.

231
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• Na educação de alunos surdos, a apresentação visual de todas as informações,


mesmo aquelas normalmente apresentadas auditivamente para os alunos
ouvintes, é vista como uma pedra angular didática.

• Em materiais de multimídia, os alunos recebem informações em pelo menos


dois formatos distintos, como informação verbal e pictórica.

• Algumas pesquisas indicam que os alunos surdos e com deficiência auditiva


usam a Internet mais intensamente e por períodos de tempo mais longos do
que os alunos ouvintes, particularmente para comunicação pessoal e em grupo.

• Os dispositivos tecnológicos são populares entre os surdos, principalmente,


porque eles suportam a comunicação (por exemplo, e-mail e chat), bem como
a navegação na web.

• A comunidade Surda está se tornando cada vez mais uma comunidade virtual.

• Ainda não há evidências de que tais tecnologias tenham aumentado a


integração de surdos e ouvintes, apesar de seu potencial para remover barreiras
de comunicação e sociais.

• Multimídias digitais, baseadas na web e de outra forma, também estão sendo


usadas ​​cada vez mais para fornecer às pessoas surdas acesso à informação.

• Cursos on-line e tutoria para alunos surdos são cada vez mais populares,
embora a pesquisa avaliativa ainda esteja faltando.

• Para que um aluno construa conhecimento a partir de um ambiente de


aprendizagem interativo, vários processos básicos estão envolvidos.

• A enorme quantidade de informação disponível via Internet tem o potencial


de criar sobrecarga cognitiva, particularmente em alunos surdos, que podem
estar relativamente limitados nas habilidades metacognitivas necessárias para
lidar com isso.

• O aluno deve atribuir significado às informações encontradas on-line,


envolvendo todas as habilidades de leitura (e dificuldades): conhecimento
ortográfico, fonológico, sintático e semântico, bem como as funções executivas
de nível superior necessárias para inferência e integração de informações.

232
• Para melhorar a aprendizagem dos alunos surdos por meio da construção
do conhecimento interativo, as limitações da memória de trabalho devem ser
levadas em conta, juntamente às características do aluno, como motivação,
lócus de controle e conhecimento prévio, bem como fatores ambientais, como
interatividade e oportunidades de aprendizagem colaborativa.

• A combinação de imagens com palavras promove uma aprendizagem mais


profunda, pelo menos em estudantes ouvintes, o que é frequentemente
chamado de efeito multimídia.

• As rupturas causadas pela divisão de atenção entre as descrições verbais e seus


referentes visuais são claramente problemáticas para os alunos surdos, devido
a sua dependência da linguagem visual.

• Uma alternativa sugerida para apoiar alunos surdos em salas de aula


multimídia é a legenda em tempo real ou outro sistema de texto na tela.

• Ao exigir que os alunos ouvintes dividam a atenção visual própria deles, o texto
apresentado simultaneamente pode “sobrepor” materiais visuais, resultando
na utilização reduzida de ambas as fontes de input.

• A disponibilidade simultânea de diagramas e texto reduz a carga na memória


de trabalho e elimina a necessidade de procurar relações entre o diagrama e as
instruções relacionadas.

• Para aprender com multimídia, os aprendizes têm que construir ativamente


o significado com base em informações de canais separados. As imagens são
processadas no canal visual, palavras faladas no canal auditivo.

• Para realmente aprender com multimídia, o aluno precisa selecionar, organizar


e integrar informações usando praticamente todos os níveis de processamento
cognitivo.

• O desafio para o projeto e a instrução com multimídia é encontrar uma maneira


de orientar a aprendizagem ativa, evitando as armadilhas, para que os alunos
possam construir representações mentais adequadas.

• Os organizadores avançados que destacam a estrutura do texto são


frequentemente úteis, desde que sejam ativamente utilizados pelo aluno, no
entanto, podem ser relativamente ineficazes para estudantes surdos.

• As características dos alunos tendem a influenciar a aprendizagem hipertextual


mais em situações controladas pelo aluno.

• A redundância de imagem-texto pode, na verdade, reduzir a aprendizagem,


especialmente em aprendizes mais avançados.

233
• A adição de imagens também pode levar a um processamento mais superficial
do texto anexo.

• As animações geralmente não contribuem mais para a aprendizagem quando


as informações são relativamente abstratas.

• Informações visuais na forma de visões gráficas estáticas podem contribuir


para a aprendizagem a partir do hipertexto, mas somente se elas forem simples
e fáceis de processar.

• A exibição de informações contribui mais para a aprendizagem se as


informações forem apresentadas de maneira coerente, espacialmente
contingente e de estilo pessoal.

• Embora não exista uma pesquisa específica disponível para a compreensão


de hipertexto por alunos surdos, parece provável que eles estejam em
risco de problemas de compreensão, devido a sua proficiência em leitura
comparativamente baixa e às limitações na retenção de informações sequenciais.

• A leitura hipertextual hierárquica é cognitivamente menos exigente do que a


leitura hipertextual em rede.

• A sobrecarga cognitiva também pode ser evitada restringindo o número de


opções de navegação, diminuindo o número de decisões a serem tomadas.

• Muitos alunos surdos terão problemas com hipertexto em relação aos pares
ouvintes, porque eles frequentemente têm menos conhecimento de conteúdo
anterior e menos funcionamento executivo automático em comparação com os
alunos ouvintes.

• Para alcançar a aprendizagem, é necessário o apoio instrucional dos professores.


Uma maneira de fornecer esse suporte de forma eficaz é através do uso de roteiros
de aula altamente estruturados.

• Em ambientes com alto nível de estrutura, os alunos conseguem se concentrar


no entendimento, em vez de se esforçarem para lidar com a própria metodologia
de busca de informações.

• A apresentação multimídia de material de leitura é significativamente mais


eficaz para a compreensão do que o uso apenas do material impresso, mas a
incorporação de vídeos de língua de sinais não parece melhorar a compreensão
de leitura em comparação com o uso de imagens.

• A multimídia interativa e os materiais do currículo baseados na web levam a


ganhos significativamente maiores do que as experiências tradicionais de sala
de aula.

234
AUTOATIVIDADE

1 Lang e Steely apontaram que a instrução baseada na Web para alunos


surdos tem inerentemente alguns desafios distintos. Descreva quais seriam
estes desafios.

2 A exibição visual da informação pode influenciar a aprendizagem, mas


pode ser mais ou menos eficaz para os alunos individuais. Neste contexto,
fala-se do Efeito de Coerência. Explique a relação deste efeito com a eficácia
da exibição visual da informação na aprendizagem.

3 O efeito de contiguidade espacial tem implicações na eficácia da


aprendizagem no contexto do uso de informações verbais e pictóricas.
Explique estas implicações.

235
236
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