Você está na página 1de 34

LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof.

Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009

4. OS AGRAVOS

A gente vai examinar os agravos contra as decisões proferidas pelos juízes singulares.
Não vamos examinar o agravo regimental até porque já o estudamos. Vamos estudar agora os
agravos contra as decisões interlocutórias proferidas pelos juízes de primeira instância

E aqui vocês vão se lembrar que contra essas decisões cabem duas espécies de agravo:

 AGRAVO RETIDO

 AGRAVO DE INSTRUMENTO (arts. 524 e segs.)

Não é qualquer agravo de instrumento. É o agravo de instrumento regulado pelos artigos


524 e seguintes.

Então, contra as decisões interlocutórias de primeira instância cabe, ou agravo retido ou


agravo de instrumento que está regulado nos arts. 524 e seguintes.

4.1. O AGRAVO RETIDO

O agravo retido é um assunto que para quem não tem conhecimento de processo físico,
para quem não tem experiência forense eu reputo quase que como dar aula de grego. É muito
difícil para alguém que não tem contato com o processo compreender o que seja um agravo
retido. Então, eu vou tentar fazer aqui uma abstração para vocês responderem na prova.

Para entender o que é um agravo retido, vocês têm que saber o que é um recurso retido.

Recurso retido é aquele recurso que apesar de interposto, não é processado


imediatamente. O processamento dele fica retido, fica preso, fica travado. O recurso fica com o
seu processamento travado na dependência de um ato futuro que o confirme. Quando, no futuro
você vier a confirmá-lo, o recurso que estava com o seu processamento retido, volta a fluir. O
objetivo dos recursos retidos é evitar a preclusão. Você evita a preclusão, mas não processa
imediatamente o recurso. É como se fosse uma espécie de protesto: “Eu não gostei do que você
fez, to recorrendo, mas não examine meu recurso agora não, só examine meu recurso, tempos
depois, quando eu vier a confirmá-lo.” Se eu não confirmar depois, o recurso não vai ser
processado, ele morre.

O recurso retido é assim, é interposto contra uma interlocutória e precisará ser


confirmado, posteriormente, no momento da apresentação da apelação ou das contrarrazões de
apelação. E aqui é importante que vocês percebam o seguinte porque pode cair no concurso e
vocês têm que ficar alertas. O agravo retido tem que ser confirmado logo no início da apelação.
Vocês já abrem um parágrafo na apelação dizendo assim: “O apelante quer ratificar o agravo que
interpusera lá atrás. Peço que, antes de julgar a apelação (ou as contrarrazões) se julgue o
agravo.” Por isso se diz que o agravo retido tem que ser ratificado em preliminar de apelação. É
uma frase muito comum se dizer que o agravo retido tem que ser ratificado em preliminar de
apelação. O que se quer dizer é que o agravo retido tem que ser confirmado logo no início da
apelação ou das contrarrazões de apelação. Se não confirmar, o agravo cai.

353
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
O agravo retido é um recurso sem preparo e é um recurso que é interposto perante o
órgão a quo, perante o juiz que proferiu a decisão agravada. Ele segue a regra que eu já
expliquei: o recurso é interposto perante o órgão a quo. Ele vai receber o recurso.

E cabe retratação. É um recurso que permite retratação.

Prestem bem atenção: até bem pouco tempo atrás, só havia uma modalidade de agravo
retido. Sucede que agora e isso é um problema para quem vai fazer concurso, há duas
modalidades de agravo retido e são bem diferentes. Existe atualmente o agravo retido contra
decisões escritas ou decisões orais

 Agravo retido contra decisões escritas do juiz – deve ser interposto em dez dias
por escrito. O agravo retido interposto contra decisões interlocutórias escritas tem
que ser interposto em dez dias por escrito.

 Agravo retido contra decisões orais – Ou seja, contra decisões proferidas em


audiência, tem que ser oral e na hora, sob pena de preclusão. Você impugna e o
juiz coloca as razões do seu agravo em ata. Passou daquele momento, preclusão.

A lei fala em agravo retido oral, interposto na hora, contra decisão proferida em audiência
de instrução. Só que a interpretação que se já não é só audiência de instrução, mas qualquer
audiência. Embora a lei só fale em audiência de instrução e julgamento, vale para a decisão oral
proferida em qualquer audiência.

O objetivo do legislador aqui foi prestigiar a oralidade, o que é algo bom se nós
tivéssemos a cultura da oralidade. Mas o nosso processo não tem essa cultura. Imagine o juiz,
com suas vaidades, ter que ficar recebendo, na sua cara, um agravo retido. Isso, rigorosamente é
o seguinte: é uma forma elegante de dizer que o juiz fez bobagem. Na audiência, na cara dele.
Entre nós, é tão curioso que o advogado vai falar isso, o juiz vai ouvir e cabe ao juiz ditar ao
escrivão as razões do agravo. É constrangedor. Nós não temos essa cultura. Nos EUA, tudo é
oral e esse enfrentamento faz parte da cultura deles, tanto que a visão americana do processo é
chamada de uma visão desportiva do processo, é a idéia de que aquilo é uma luta e o melhor
atleta ganha. Isso que eu estou falando aqui, não é impressão minha, é algo disseminado.

Criou-se esse modelo, e que é um problema também porque na audiência o juiz profere
uma série de decisões. Imagina: Cada pergunta indeferida é uma decisão. Já pensou se contra
cada uma dessas decisões coubesse um agravo retido? Você quer perguntar, o juiz indefere e
você: “Então, V. Exa., me permita, eu vou agravar em razão do cerceamento do direito de defesa
garantido constitucionalmente pelo indeferimento da pergunta.” Se for isso a cada momento,
inviabiliza a audiência. Há doutrinadores que dizem que o juiz deve dividir a audiência em
partes. Cada vez que ele termina uma parte, diz que terminou e abre espaço para as partes
agravarem. Faz um agravo em bloco, para agravar de tudo o que aconteceu no período, para ver
se dá uma racionalidade ao sistema.

O problema para concurso é: Como é que você vai fazer um agravo retido oral em
concurso? É um grande problema porque a peça é escrita. No concurso para procurador do
Município de Salvador há uns dois anos, a peça escrita foi um agravo retido oral. Isso é
sensacional! Tinha acabado de sair a lei e era para todo mundo saber que recuso contra decisão
proferida em audiência é o agravo retido oral. E aí cobraram exatamente isso. O que a galera fez
no concurso foi criativo: Começaram a escrever aquilo que, supostamente, estaria sendo dito
oralmente na audiência.

354
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009

4.2. AGRAVO RETIDO E DE INSTRUMENTO: CABIMENTO

O problema mais grave do agravo retido hoje, sem dúvida, é saber quando cabe agravo
retido. Essa é a grande pergunta. As interlocutórias são agraváveis e são agraváveis ou por
agravo retido ou por agravo de instrumento e você tem que saber quando é um e quando é outro.
Quando é que uma decisão interlocutória é impugnável por agravo retido e quando é impugnável
por agravo de instrumento. Isso você tem que saber hoje. E para que vocês saibam, quando é um
e quando é outro, partam da seguinte premissa (que me parece ser a chave de compreensão do
problema): Não há, não existe nenhum caso em que você possa opor um ou outro. Não há
nenhuma situação em que você possa escolher se vai entrar com o retido ou por instrumento.

Antes, há muito tempo atrás, existia essa concepção, de que a escolha pelo retido ou pelo
instrumento era do agravante. Ou seja, caberia ao agravante optar pela interposição do agravo
retido ou do agravo de instrumento. Isso acabou. Não há mais essa opção. Não há mais essa
opção do agravante. Ou o caso é de agravo de instrumento ou é de agravo retido.

Há três regras que vocês devem examinar na ordem que eu disser. Se mudar a ordem,
vocês vão se embananar. São três regras de cabimento do agravo de instrumento. Se você superar
essas três regras, o caso é de agravo retido. Só vai ser retido se não for de instrumento. E acabem
com essa história de achar que hoje em dia agravo retido é a regra. Eu já vi muita gente dizer
isso, mas não existe isso. O que há hoje em dia é que ou o caso é de agravo retido ou é de
instrumento. Mas dizer que o retido é a regra é até temeridade porque você teria que fazer uma
estatística para ver qual dá mais. E, certamente, vai dar mais agravo de instrumento. Não tenho a
menor dúvida disso. Não caiam nessa pilha doutrinária (foi a má impressão da doutrina, logo que
saiu a lei). Então, há três regras para o agravo de instrumento. Não se encaixando o caso em
qualquer uma dessas três regras, o caso é de agravo retido.

a) 1ª Regra de cabimento do agravo de instrumento

É a principal, a mais importante. Decisão interlocutória que possa causar grave prejuízo,
dano irreparável, de difícil reparação, se é potencialmente lesiva ao agravante o caso é de agravo
de instrumento porque é preciso rever imediatamente a decisão. Não dá para entrar com agravo
retido. Se a situação é de urgência não dá para entrar com agravo retido para esperar a situação
posterior. Essa é a regra mãe. Básica. Praticamente todos os doutrinadores, ao examinarem o
Código, se restringem a essa regra. Se a situação é de urgência, se a decisão agravada pode
causar prejuízo irreparável ou de difícil reparação ao agravado, o caso é de agravo de
instrumento. Tanto é assim, que o legislador estabeleceu uma regra no inciso II, do art. 527.

Art. 527 - Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e


distribuído incontinenti, o relator: II - converterá o agravo de
instrumento em agravo retido, salvo quando se tratar de decisão
suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação,
bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos
aos efeitos em que a apelação é recebida, mandando remeter os
autos ao juiz da causa; (Alterado pela L-011.187-2005)

Ou seja, se eu entro com agravo de instrumento em uma situação que não é de urgência, o
relator do agravo de instrumento vai dizer: olha, não é situação de agravo de instrumento.
Devolva e volta para ser retido. Isso para mostrar que não havendo urgência, não há por que o
agravo de instrumento prosseguir. Quais são os problemas?
355
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009

Você, para entrar com agravo de instrumento, pagou custas, coisa que não faria no agravo
retido. Você pagou custas e o relator mandou converter. Devolvem-se as custas? Não. Problema
é seu. Entrou com recurso errado, as custas não são devolvidas.

O que eu vou dizer agora foi questão de concurso recente. Foi uma questão prática em
que na AIJ o juiz antecipou a tutela. O juiz, em mesa, antecipou a tutela. O concurso pedia para
você elaborar o recurso cabível. Aí você fica com aquela coisa na mente: decisão proferida em
audiência, agravo retido oral. Só que aí está o erro porque só será agravo retido oral, se couber
agravo retido. Para que seja agravo retido oral, é preciso que a situação peça agravo retido. E se a
decisão envolve tutela antecipada, o risco de dano é imediato, então, teria que ser um agravo de
instrumento, mesmo que a decisão tenha sido proferida em audiência. Sim, porque não basta que
a decisão tenha sido proferida em audiência para que caiba agravo retido. É preciso que tenha
sido proferida em audiência e se encaixe nas hipóteses de agravo retido. Sim, porque se foi
proferida em audiência, mas se encaixa nas hipóteses de agravo de instrumento, vai ser agravo de
instrumento. Essa pergunta derrubou muita gente. A peça era um agravo de instrumento. E, com
razão porque a primeira coisa que você tem que saber é se é agravo de instrumento ou se é caso
de agravo retido. É de agravo retido? Bom, então tem que ser oral, porque foi proferido em
audiência. Não foi proferido em audiência? Tem que ser por escrito.

O terceiro problema decorre da mente do mal dos advogados logo que a lei saiu. Isso foi
um sócio meu que pensou e eu fiquei impressionado com a mente dele. Saiu a lei (olha o que o
cara pensou!) estabelecendo essa divisão que eu mostrei: agravo contra decisão escrita,
apresentado por escrito em dez dias e, contra decisão em audiência, interposto oralmente na
mesma hora. ele falou assim: “Pra mim isso não significa nada porque eu vou fazer o seguinte:
estou em audiência, o juiz decide. Eu vou ficar calado e vou agravar de instrumento em dez
dias. Quando chegar lá em cima, o relator vai dizer que não cabia agravo de instrumento e vai
converter em retido. Pronto. Não precisei me desgastar com o juiz, vou ter dez dias para
preparar o agravo em casa, por escrito, citando jurisprudência, doutrina, etc. Para que eu vou
me desgastar de cara se, dez dias depois, eu posso entrar com o agravo de instrumento e o
relator converte em retido?” Realmente, se vingasse essa interpretação, não teria o menor
sentido a legislação. Assim, como é que a gente tem que interpretar?

A conversão do agravo de instrumento em agravo retido só cabe nos casos em que o


recurso cabível seria o agravo retido escrito porque se o recurso cabível for o agravo retido oral,
aí você perdeu o prazo. Isso é mais um problema que decorre desse inciso II, do art. 527.

Essa é a primeira grande regra de cabimento de agravo de instrumento.

b) 2ª Regra de cabimento do agravo de instrumento

Caberá agravo de instrumento em casos expressamente designados pela lei e aí, nesses
casos, pouco importa se há urgência ou não. A urgência não é mais um critério determinador do
cabimento do agravo de instrumento. Então, quais são os casos em que a lei expressamente
determina que cabe agravo de instrumento?

1. Decisão que não admite apelação – Sempre impugnável por agravo de


instrumento.
2. Decisão que recebe a apelação em efeitos diversos – Também impugnável
por agravo de instrumento.
3. Decisão que decreta a falência

356
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
Nesses casos, a urgência é irrelevante.

c) 3ª Regra de cabimento do agravo de instrumento

É a regra mais complicada. Caberá agravo de instrumento nos casos em que o agravo
retido for incompatível com a situação. E aí, qual é o problema dessa hipótese? É que é muito
aberta, muito indeterminada. Vou dar exemplos:

 Agravo em execução é sempre por instrumento. Decisão interlocutória em


execução é sempre impugnável por agravo de instrumento. Recurso retido em
execução é absolutamente incompatível.

 As decisões parciais que estudamos ao longo do curso em inúmeros momentos.


Não tem sentido você impugnar por agravo retido uma decisão que já resolve
parte do processo. Por que recurso vai ficar preso ali a espera do resto? Se aquilo
já foi resolvido, se desgarra do processo e sobe.

E como é que eu percebi essa terceira regra? Logo que a lei saiu em 2001, aconteceu o
seguinte caso lá no escritório: um juiz estadual declinou a competência para a Justiça do
Trabalho. É uma decisão interlocutória em que não há urgência. Não tem risco de lesão imediata,
tal. Eu já ia entrar com agravo retido e me dei conta do seguinte: Se eu fizesse isso, o recurso ia
ficar preso no processo que ia para a Justiça do Trabalho e lá não há agravo retido. Ele ia ficar lá
e eu nunca mais poderia reiterá-lo. Não ia adiantar nada porque jamais seria processado. Então,
eu percebi que, nesse caso, o agravo retido era incompatível. Não podia entrar com agravo retido
porque a situação não permitia a oposição do agravo retido. E aí entrei com agravo de
instrumento.

Com isso, aprendemos o que é o agravo retido e aprendemos quando cabe agravo retido e
quando cabe agravo de instrumento. Agora, vamos ver algumas peculiaridades do agravo de
instrumento.

4.2. O AGRAVO DE INSTRUMENTO

O agravo de instrumento é um recurso que tem uma característica muito marcante que é
só dele. É interposto diretamente no órgão ad quem. Ele não passa pelo a quo. O recorrente já
leva o problema diretamente ao tribunal. Então você interpõe o recurso já no tribunal.

Para quem não tem prática, preste atenção no que vou dizer. Para quem tem prática vai
parecer uma imbecilidade o que vou dizer. Imaginem que este livro sejam os autos de um
processo. No meio desse livro, o juiz proferiu uma decisão interlocutória. Eu quero que o
tribunal examine essa decisão imediatamente. Só que os autos estão aqui embaixo. Como é que o
tribunal vai reexaminar essa decisão se os autos estão aqui embaixo? Eu tenho que levar ao
tribunal uma cópia do que está acontecendo aqui embaixo. Eu tenho que reproduzir o que está
acontecendo para que o tribunal, que não tem acesso aos autos, verifique se a decisão tem que ser
mantida ou reformada. E, para isso, eu tenho que formar um instrumento, que é um conjunto de
peças que será levado ao tribunal para que o tribunal, sem ter acesso aos autos, possa verificar se
a decisão é boa ou ruim.

O nome agravo de instrumento vem disso. Instrumento é um conjunto organizado de


peças processuais que o agravante tem de fazer, tentando reproduzir no tribunal o que está
acontecendo lá embaixo. Esse conjunto de peças para concurso é muito fácil. Na advocacia é
difícil fazer. Mas para concurso é muito fácil. Quando forem fazer o agravo de instrumento no
357
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
concurso, vão dizer no final do agravo de instrumento o seguinte: “O instrumento deste agravo é
composto pela reprodução integral dos autos de primeira instância e, além disso (por incrível que
pareça, não basta você reproduzir integralmente o processo), a certidão de intimação da decisão
agravada” Você vai reproduzir integralmente os autos de primeira instância e, além disso, juntar
a certidão de intimação da decisão agravada, que tem o objetivo de aferir a tempestividade do
recurso. Então, você junta toda documentação, mas a certidão de intimação da decisão para que
se possa aferir a tempestividade. Muito simples, basta colocar no final.

Agora, prestem bem atenção agora!!

Observação 01. Na lei, só existem quatro peças obrigatórias, que são: a certidão de
intimação, a cópia da decisão agravada e as cópias das procurações de agravantes e agravados. A
lei só fala dessas quatro. E por que estou dizendo que no concurso você tem que dizer que tirou
cópia de tudo? Porque a jurisprudência criou uma figura interessantíssima. Uma das coisas mais
geniais que a jurisprudência brasileira jamais criou: a jurisprudência disse que o agravo tinha que
ser formado com as “peças indispensáveis à compreensão da controvérsia”. Isso está na lei? Não.
Quais são essas peças? O que a jurisprudência dizia sobre peças indispensáveis à compreensão
da controvérsia? Quer dizer, a peça indispensável à compreensão da controvérsia era exatamente
aquela específica que você não havia juntado (a capa dos autos, o carimbo de juntada...). Era
sempre o que você achava que não tinha relevância e, portanto, não tirou cópia. E aí os tribunais
diziam: “Não consegui compreender, não entendi nada do que está acontecendo e, por conta
disso, não conheço do agravo.” Então, essa criação jurisprudencial (não está na lei) fez com que
os advogados simplificassem o problema: agora tiram cópia de tudo + certidão de intimação. É
uma coisa curiosa isso porque quando eu começo a dizer que tem que tirar cópia de tudo, vocês
questionam dizendo que não está na lei. Realmente não está! Na lei só estão os quatro requisitos.
Mas a jurisprudência criou esse slogan: “peças indispensáveis à compreensão da controvérsia.”

Observação 02. Para prova de marcar (porque isso pode aparecer). Em


compensação ao que eu disse há pouco, é justo que se diga que a jurisprudência trouxe algumas
decisões interessantes sobre a certidão de intimação, dizendo o seguinte: que é possível dispensar
a certidão de intimação nos casos de tempestividade manifesta. Exemplo: A decisão agravada é
de hoje, você recorreu amanhã. Não há matemática no mundo para dizer que seu recurso não é
tempestivo. Nesses casos, a certidão de intimação é desnecessária. Se a função dela é aferir a
tempestividade e se isso pode ser feito sem ela, não há problema. Interposto o agravo de
instrumento no tribunal, cabe ao agravante em três dias juntar no juízo a quo a cópia do agravo,
do protocolo de interposição e da relação de documentos. Se ele não fizer isso em três dias e o
agravado alegar e provar essa omissão (o agravado, nas contrarrazões alega e prova que o
agravante não cumpriu essa providência), o recurso não será conhecido. O agravo não será
conhecido (art. 526). Notem uma coisa curiosa: trata-se de uma exigência legal para o agravo
cujo desrespeito não pode ser observado de ofício. O desrespeito a essa exigência só pode ser
observado após a provocação do agravado. E se o agravado não provocar na primeira
oportunidade que lhe couber falar nos autos, preclusão.

Observação 03. Aqui é uma pergunta que vocês vão ter que responder na prova:
“Pode o tribunal extinguir o processo em julgamento de agravo?” Ao julgar um agravo pode o
tribunal extinguir o processo? Isso é interessante porque, como houve uma interlocutória e o
agravo, se o tribunal extinguir o processo no julgamento do agravo, será um processo extinto
sem sentença. Não houve nem sentença e o processo já acabou. E é possível o processo ser
extinto em julgamento de agravo? É! Vai que em julgamento de agravo o tribunal reconhece uma
ilegitimidade, uma prescrição. Então, é possível. Já foi pergunta de concurso. Outra pergunta que
tem que ser feita: “Pendente agravo de instrumento, a superveniência de uma sentença afeta esse
recurso?” Qual é o destino do agravo quando sobrevém sentença? O agravo cai? Não
necessariamente. É essa a resposta. Por que? E aí vocês vão ter que responder assim: Porque se o
358
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
julgamento do agravo (olhem qual é a regra. Não esqueçam dessa regra e eu tenho que
estabelecer uma regra pra vocês porque a quantidade de situações é infinita) puder anula a
sentença, ele vai sobreviver. Se o julgamento do agravo puder derrubar a sentença, a
superveniência da sentença não afeta o agravo. Um exemplo: imagine que no agravo se discuta
competência do juízo. O juiz sentencia. Ora, o agravo não vai cair porque se for provido, o juiz é
incompetente, portanto, a sentença, cai. Se o julgamento do agravo inerfere na sentença, o agravo
permanece, independentemente da sentença. E quando é que interfere? Quando o julgamento
dele puder invalidar a sentença. Não é o ideal. O ideal é que o agravo fosse julgado antes da
sentença, mas não é isso que acontece. Às vezes a sentença sai antes do agravo. Ocorre que
muitos desembargadores esperam sair a sentença para derrubar o agravo, pensando que não
precisa fazer mais nada e aí extingue o agravo. Não é assim, porque se o agravo discutir a
validade do processo, a sentença vai ser inválida e cai. Quer ver outra coisa? Se o agravo for em
antecipação de tutela. Se vem a sentença, aí perde o objeto. Porque aí já é cognição exauriente.
Aí perde o objeto realmente. Não dá para ficar discutindo cognição sumária, se já tem cognição
exauriente. Aí o agravo não tem sentido porque a sentença substitui a decisão interlocutória. O
agravo que discute antecipação de tutela tem essa característica. Por isso é que a resposta é “não
necessariamente.” Há casos em que o agravo morre, há outros que não morre ante a
superveniência da sentença.

Observação 04. O agravo de instrumento não tem efeito suspensivo automático. É


preciso, portanto, que o agravante peça o efeito suspensivo e o relator vai examinar se concede
ou não o efeito suspensivo. O efeito suspensivo é por decisão judicial que vai verificar se há
perigo e se há relevância na fundamentação. Havendo esses requisitos, o relator pode dar o efeito
suspensivo. Atenção: Imaginem que a decisão agravada seja uma decisão negativa. Ou seja, uma
decisão que não concede o que você pediu. Você pede uma tutela antecipada e o juiz nega. Aí
você agrava. Cabe pedido de efeito suspensivo quando a decisão é negativa? A pergunta se
justifica pelo seguinte: Se a decisão não deu nada, vai suspender o que? O que é suspender o
não? Suspender a negativa? É uma questão lógica interessante. Como é que se suspende o nada?
Suspender o nada é, rigorosamente, preencher. Como é que eu suspendo o vazio? Enchendo de
alguma maneira. Suspender a não-concessão é conceder. Suspender os efeitos de uma decisão
que não concede, é conceder aquilo que foi negado. Então, o efeito suspensivo aí é um efeito
suspensivo curioso porque você suspende dando o que foi negando e não tirando o que foi
concedido. Suspende-se concedendo o que foi negado, e não tirando o que foi concedido. É um
efeito suspensivo que a doutrina resolveu chamar de efeito suspensivo ativo. Por que efeito
suspensivo ativo? Porque você suspende ativando. Você suspende concedendo. Você não
suspende “desligando” a decisão. Você suspende “ligando” a decisão. Só que como esse nome é
muito estranho (efeito suspensivo ativo), embora tenha vingado (muita gente usa e já caiu em
concurso algumas vezes), atualmente se prefere a expressão “antecipação da tutela recursal”.
Pedir a antecipação da tutela recursal é pedir que se conceda logo o que foi negado. Então, efeito
suspensivo ativo ou antecipação da tutela recursal é isso: é conceder logo, aquilo que lhe foi
negado por uma decisão em primeira instância.

Vamos entrar no último assunto do curso: recursos extraordinários.

5. OS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS

Ele tem que ser sempre o último assunto do curso porque é quase uma prova de
fidelidade. É aqui que você vai dizer se é isso que você realmente quer, porque passar por
recursos extraordinários ileso não é fácil. É um assunto jogo duro, mas vamos a ele, porque,
como dizia Santo Agostinho, “não oremos por fardos mais leves e, sim, por ombros mais fortes.”
Então, vamos fortalecer os nossos ombros e agüentar esse fardo que não é pouco pesado.
359
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009

O que significa a expressão “recursos extraordinários”? reparem que estou usando no


plural porque essa designação se refere, no processo civil, ao recurso especial para o STJ e ao
recurso extraordinário para o Supremo. O especial para o STJ e o extraordinário para o Supremo
são espécies do mesmo gênero, o grande gênero dos recursos extraordinários. Quando você ouvir
essa expressão no plural, ela estará se referindo tanto ao especial para o STJ, quanto para o
extraordinário para o Supremo.

Claro que tem variações dessa expressão. Tem gente que usa

 ‘recursos EXCEPCIONAIS’,
 ‘recursos DE ESTRITO DIREITO’,
 ‘recursos DE SUPERPOSIÇÃO’

Teve concurso que perguntou isso. Tudo isso, é o nome desse gênero que, no Brasil
engloba o especial e o extraordinário.

Prestem bem atenção ao que eu vou dizer: Até 1988, não havia STJ. Até 1988, era só
STF. Então, o que acontecia: Eu podia me valer de um recurso extraordinário para o STF, até
1988, para discutir questões legais e constitucionais. O STF, até 1988, julgava recursos
extraordinários, discutindo questões legais e constitucionais. O recurso extraordinário tinha essa
abrangência. Aí vem a Constituição de 1988 e cria o STJ. E pega um pedaço do antigo recurso
extraordinário que ia para o Supremo (pense nesse recurso como um bolo) e jogou para o STJ
julgar. E ao invés de dizer: cabe recurso extraordinário para o STF julgar questão constitucional
e, cabe recurso para o STJ julgar questão legal, já que o recurso extraordinário foi bipartido
(metade ele para o STF e metade dele para o STJ), ao invés de unificar a terminologia, o
legislador criou um outro nome: ao invés de chamar de recurso extraordinário para o STJ,
chamou de recurso especial para o STJ. Deu outro nome. O fato de ter dado um outro nome, não
significa dizer que o recurso especial não seja o recurso extraordinário. Ele é o velho recurso
extraordinário, só que para o STJ e com outra matéria. Por isso que o gênero engloba os dois,
porque o recurso especial é, rigorosamente, o velho recurso extraordinário, só que para o STJ.

E por que o nome é especial e não extraordinário? A explicação é melhor possível,


comovente: Ser supremo é ser extraordinário. Agora, se é superior, no máximo, especial. Essa é
a grande explicação: chamar de extraordinário um recurso que vai para o Superior Tribunal de
Justiça? Não pode! Por mais que os jornalistas temem em chamar o STJ de Supremo Tribunal de
Justiça. Eis a origem.

Feita essa consideração, como é que eu vou dar esse assunto? Nós vamos ver todo o
regramento comum dos dois. Tudo o que é comum a ambos porque são muito parecidos, têm a
mesma origem. Quando terminar a parte do que é comum, aí eu examino as especialidades de
um e de outro.

5.1. GENERALIDADES SOBRE OS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS

a) São recursos de fundamentação vinculada

Os recursos extraordinários são recursos de fundamentação vinculada? O que significa


isso? Eu não posso me valer deles alegando qualquer coisa. Os recursos extraordinários não
360
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
permitem qualquer tipo de alegação. São recursos em que a fundamentação é típica, vinculada e
é constitucional. Quer dizer, é uma fundamentação vinculada e constitucional, pois as hipóteses
dos recursos extraordinários estão previstas na constituição e são típicas:

 Art. 102, III, para o recurso para o Supremo e


 Art.105, III, o recurso para o STJ.

Nesses incisos estão previstas as hipóteses típicas dos recursos extraordinários.


Exatamente por conta disso, se diz que os recursos extraordinários são recursos de efeito
devolutivo restrito. Essa é uma frase muito difundida: efeito devolutivo restrito. Ou seja, não se
pode devolver qualquer coisa para o STJ ou STF via recurso extraordinário. Os recursos
extraordinários não servem para devolver tudo. Só servem para devolver naqueles casos
tipicamente previstos na Constituição. Ou seja, os recursos extraordinários são recursos em que
só é possível devolver a análise de questões de direito. Os recursos extraordinários servem à
análise das questões de direito, questões jurídicas. Eu não posso recorrer extraordinariamente
para pedir o reexame de questões de fato. Os recursos extraordinários servem à impugnação de
questões jurídicas. Aqui, você fecha o efeito devolutivo. Não pode se devolver tudo. Pode se
devolver a análise de questões de direito e não é de qualquer direito. É de direito federal ou
constitucional. Federal para o STJ e constitucional para o STF.

Isso que acabei de falar é a chave de tudo. Agora, prestem muita atenção ao que eu vou
dizer. Quero fazer uma observação sobre isso. Agora, essa observação vai exigir de vocês que,
quando forem estudar, voltem ao que a gente viu nas últimas aulas.

Quando se diz efeito devolutivo restrito, leia-se efeito devolutivo em sua dimensão
horizontal, ou seja, extensão do efeito devolutivo, dimensão horizontal do efeito devolutivo, que
eu já expliquei a vocês. A restrição nos recursos extraordinários é uma restrição feita à extensão
do efeito devolutivo, ou seja, eu não posso impugnar qualquer coisa. Eu vou falar pela quarta
vez: a restrição ao efeito devolutivo nos recursos extraordinários é uma restrição à extensão, à
dimensão horizontal do efeito devolutivo. Quem não se lembra o que é dimensão horizontal do
efeito devolutivo, coloque aí no caderno: “estudar novamente este assunto!” (que eu acho que foi
visto na última aula).

Esse ponto no seu caderno tornará o seu caderno diferente dos seus concorrentes. Essa
frase torna o seu caderno melhor do que o caderno de quem isso não esteja anotado, porque aí é
que você vai resolver as questões mais complexas dos recursos extraordinários. Essa é a chave:
compreender que essa restrição se dá na horizontalidade, naquilo que eu posso impugnar. Eu não
posso impugnar questões de fato. Eu não posso chegar para o meu recurso extraordinário e dizer:
“STJ, o tribunal interpretou mal as questões de fato.” Isso eu não posso fazer. Eu tenho que
dizer: “STJ, o tribunal aplicou mal o direito.”

b) Não cabe recurso extraordinário para simples reexame de prova

Exatamente por conta disso (efeito devolutivo restrito), se diz que não cabe recurso
extraordinário para simples reexame de prova porque isso não é discutir questões de direito.
Exame de prova não é discutir questões de direito. Súmula 07, do STJ.

STJ Súmula nº 7 - 28/06/1990 - DJ 03.07.1990 Reexame


de Prova - Recurso Especial     A pretensão de simples reexame
de prova não enseja recurso especial.

361
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
Prestem atenção. Eu quero fazer uma observação sobre isso. E cada observação que eu
fizer, torna o seu caderno melhor do que o do seu adversário. Então anotem TUDO!

É possível recurso extraordinário para discutir questões relativas ao direito probatório.


Existe um direito probatório, é dizer, regras gerais de prova. Quer dizer, se o juiz aplica mal
regras de direito probatório é claro que eu posso discuti-las porque aí eu não estou discutindo o
exame da prova, mas a má aplicação de uma regra legal de direito probatório. Regras de direito
probatório são regras jurídicas que podem ser mal aplicadas e, portanto, posso discuti-las.

Pergunta para derrubar todo mundo: “Disserte: Recursos extraordinários em matéria de


prova”. Todo mundo vai se valer da Súmula 07. É metade da questão porque é verdade: eu não
posso entrar com recurso extraordinário para discutir exame de prova, mas eu posso entrar com
recurso extraordinário para discutir questões relativas ao direito probatório, às regras que
regulam as provas, por exemplo, proibição de prova ilícita, regras de ônus da prova. O que eu
não posso discutir é o reexame da prova.

c) Não cabe recurso extraordinário para discutir simples interpretação


de cláusula contratual

Exatamente por conta disso (por ter efeito devolutivo estrito, por não admitir simples
reexame de prova), se diz que não cabe recurso extraordinário para discutir simples interpretação
de cláusula contratual. Eu não posso entrar com recurso extraordinário para discutir a
interpretação de uma cláusula contratual porque isso não é discutir questões legais ou
constitucionais. Interpretar o contrato é interpretar fatos. Isso não é discutir lei e nem é discutir
constituição. É o que diz a Súmula 05, do STJ.

STJ Súmula nº 5 - DJ 21.05.1990 Interpretação de


Cláusula - Recurso Especial    A simples interpretação de
cláusula contratual não enseja recurso especial.

Preste atenção: Minha dica: Súmula 07 e Súmula 05 caem rotineiramente e cai a sua
simples transcrição. Mas nada impede que caia um tipo de reflexão mais aprimorada (na mesma
esteira da questão da prova) e essa reflexão é que eu quero que você observe:

Quando a interpretação de uma cláusula contratual for determinante para que se saiba
qual é a lei que se aplica àquele contrato caberá recurso especial. Caberá recurso especial por
que? Porque, a depender da interpretação que eu der àquela clausula, vai ser aplicada a lei X ou a
lei Y. Se eu interpretar de um jeito, a lei que vai ser aplicada é a lei X. Se eu interpretar de outro
é a Y. Nos casos em que a interpretação da cláusula for determinante para saber qual lei se
aplica, cabe recurso especial.

E eu vou dar em exemplo que é emblemático. Há muitos anos, os bancos que fazem
leasing, (vocês sabem que no contrato de leasing você vai pagando uma prestação e, no final,
tem um valor residual que, se você quiser ficar com a coisa, você paga esse valor residual e fica
com ela) criaram a seguinte cláusula: pegaram esse valor residual e diluíram ao longo das
parcelas, de modo que quando você terminasse a última prestação do leasing você já ficava com
a coisa. Isso estava na cláusula do contrato. Surgiu a seguinte interpretação: esta cláusula, desse
jeito, mudava o contrato para compra e venda. O contrato deixava de ser leasing e mudava para
compra e venda. Então,a cláusula contratual que diluía o valor residual nas parcelas do leasing
desnaturava do contrato de leasing para a compra e venda. Ou seja, a interpretação da cláusula
fazia com que o contrato deixasse de ser leasing e virasse compra e venda. Isso foi amplamente

362
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
discutido, foi bater no STJ e foi um dos momentos mais bizarros da história do STJ. Sim, porque
o STJ editou uma súmula, a 263, dizendo que a diluição desnatura o contrato. É a súmula 263. A
Súmula 293, foi em sentido contrário. Salvo engano, não deu dois anos entre uma e outra. Veio a
263, dizendo que desnaturava e depois veio a 293, dizendo que não desnaturava. E aí teve que
cancelar a 263.

STJ Súmula nº 263 DJ 20.05.2002 - Cancelada - RESPs


443.143-GO e 470.632-SP - 27/08/2003 Cobrança Antecipada do
Valor Residual - Contrato de Arrendamento Mercantil - Compra
e Venda a Prestação - A cobrança antecipada do valor residual
(VRG) descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil,
transformando-o em compra e venda a prestação.

STJ Súmula nº 293 - DJ 13.05.2004 Cobrança Antecipada


- Valor Residual Garantido - Contrato de Arrendamento
Mercantil A cobrança antecipada do valor residual garantido
(VRG) não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil.

Ou seja, o STJ editou duas súmulas (em sentido diverso) só para discutir a interpretação
de uma cláusula contratual. É o STJ discutindo a interpretação de uma cláusula contratual. Por
que isso foi permitido? Porque essa interpretação foi determinante para que se pudesse saber
qual era a lei aplicável àquele contrato.

Então, daí o ‘simples, a que se refere a súmula 05.: A simples interpretação de cláusula
contratual não enseja recurso especial. É assim que tem que ser entendida. E o exemplo da
cláusula do leasing é emblemático dessa ponderação que estou fazendo.

d) A figura do PREQUESTIONAMENTO

Exatamente por conta disso tudo aqui (por ter efeito devolutivo estrito, por não admitir
simples reexame de prova, por não admitir simples interpretação de cláusula contratual), surgiu a
figura muito conhecida e muito famosa do prequestionamento, uma construção jurisprudencial
que é rigorosamente, uma etapa a ser vencida no juízo de admissibilidade dos recursos
extraordinários. O prequestionamento é exigência que a jurisprudência construiu para a
admissibilidade dos recursos extraordinários que só podem ser admitidos se houver
prequestionamento. A doutrina costuma dizer que o prequestionamento faz parte do cabimento
dos recursos extraordinários, que a análise do cabimento dos recursos extraordinários passa pelo
exame do prequestionamento. O problema é saber o que é prequestionamento.

(Fim da 1ª parte da aula)

Eu falei que o prequestionamento é exigência para a admissibilidade dos recursos


extraordinários e falei que ele foi construído pela jurisprudência. E não disse (vou dizer agora),
que há três acepções sobre o que é prequestionamento:

*AS ACEPÇÕES SOBRE O QUE É PREQUESTIONAMENTO


 1ª Acepção do prequestionamento – É ATO DA PARTE

Pela primeira acepção, prequestionamento é ato da parte, que significa o seguinte: aquele
que quer se valer do recurso extraordinário tem que, antes, ter questionado aquele tema ao longo
363
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
do processo. Aquela questão que ele agora quer ver discutida num recurso extraordinário, tem
que ter sido anteriormente suscitada por ele ao longo do processo. Não pode ser uma questão que
ele suscite agora. Ele não pode, no recurso extraordinário, trazer uma questão que ele, antes, não
havia suscitado. Então, prequestionamento seria essa exigência de prévia provocação do tema.
Quer dizer, o tema teria que ter sido provocado antes da interposição do recurso extraordinário. É
o primeiro sentido que se desenvolveu o prequestionamento. Tanto que me me perguntaram no
intervalo:

Qual é o momento certo de prequestionar? Essa pergunta parte do pressuposto de que o


prequestionamento é ato da parte que tem que dizer: “olha, estou prequestionando”. Eu me
lembro que quando era estagiário, um colega meu entrou com mandado de segurança e, já ali,
colocou assim: “estou prequestionando questão constitucional porque eu vou até o Supremo.” Já
na inicial ele colocou isso, seguindo essa acepção. A seguinte é uma acepção mais rigorosa.

 2ª Acepção do prequestionamento – É ATO DA PARTE e do TRIBUNAL


RECORRIDO

O prequestionamento é ato da parte e do tribunal recorrido. Para essa concepção, só há


prequestionamento se o recorrente tiver suscitado antes e o tribunal tiver se manifestado sobre
ela. O recurso extraordinário só será admitido se a questão tivesse sido suscitada e o tribunal
recorrido se manifestado sobre ela. Não basta que o recorrente tenha suscitado a questão
anteriormente. É preciso que o recorrente tenha suscitado a questão e o tribunal recorrido se
tenha manifestado sobre ela. Com esses dois fatos, a questão está prequestionada, então, o
recurso extraordinário será admitido. Então, é muito mais rigoroso porque fica na dependência
do tribunal. Você pode ter passado o processo todo suscitando, se o tribunal recorrido não falou
nada, não está prequestionado.

 3ª Acepção do prequestionamento – É PREVIA MANIFESTAÇÃO DO


TRIBUNAL RECORRIDO

Uma terceira corrente diz que o prequestionamento é a prévia manifestação do tribunal


recorrido. Ou seja, para essa corrente, o que importa, para fins de prequestionamento, é saber se
o tribunal recorrido se manifestou sobre o tema. Pouco importa que você tenha ou não suscitado
a questão. É irrelevante saber se o recorrente suscitou a questão um dia. Isso é irrelevante. Para
essa concepção aqui, o relevante é saber se aquela questão foi enfrentada pelo tribunal recorrido.
Se isso aconteceu, houve prequestionamento, mesmo que o tribunal tenha enfrentado a questão
ex officio, sem qualquer provocação.

*POSIÇÕES DO STJ E DO STF


1. Ato da Parte

2. Ato da Parte + Ato do Tribunal Recorrido

3. Prévia Manifestação do tribunal Recorrido.

O que é indiscutível hoje em dia? É que se a segunda situação ocorrer, há


prequestionamento. Aí, não tem a menor discussão. Isso é o ideal. O advogado provocar e o
tribunal se manifestar. Se isso acontece, está resolvido o problema. Que nessa segunda corrente
há prequestionamento, hoje já não há discussão. É uma situação clara de prequestionamento.
364
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009

A terceira situação, hoje, já é muito bem aceita. Já é bem tranquila a idéia de que se o
tribunal se manifestou sobre a questão, está prequestionando. Isso, para que você não seja
surpreendido, porque pode ser que o tribunal invente uma questão na hora de julgar, que você
não havia suscitado e você tem que poder discutir aquilo, senão você fica numa situação de estar
submetido a uma decisão-surpresa. Então, essa terceira situação também já é aceita, para evitar
decisões de surpresa. O tribunal, de ofício, conhece uma questão, questão essa que você poderá
discutir em recurso extraordinário.

Problema mesmo é quando você suscita e o tribunal se cala. Está prequestionada a


matéria? É aí que está o problema. É aí que está a discussão sobre se há ou não
prequestionamento. A questão foi suscitada pelo recorrente, mas não foi enfrentada pelo tribunal.
Há ou não há prequestionamento? Agora, tudo mundo anotando tudo o que eu disser!

Diante dessa situação, cabe ao recorrente, embargar de declaração, por omissão. Isso é
indiscutível. Se o recorrente suscita e o tribunal se cala, cabem embargos de declaração para
suprir a omissão. Se o tribunal supre a omissão, está resolvida a questão. Aí cai na hipótese dois
e há prequestionamento indiscutivelmente.

Se, porém, o tribunal não suprir a omissão, aí há uma divergência. Ele se omitiu, você
embargou, ele se mantém omisso, há uma divergência. Para o STJ, não há prequestionamento: o
problema é seu! Ele não tem nada a ver com isso. Você suscitou, o tribunal se calou, você
embargou e o tribunal se mantém calado, problema seu! Não há prequestionamento. Súmula 211:

STJ Súmula nº 211 - Inadmissível recurso especial quanto


à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios,
não foi apreciada pelo tribunal "a quo".

Aí, veja bem, o que eu vou dizer agora eu sempre digo para me preservar. O que eu vou
dizer agora eu digo com vergonha. Eu estou envergonhado do que vou dizer. Quando eu falo
isso, todos os alunos ficam estupefatos. Com razão. É brincadeira isso? Porque todo mundo
perguntou para o STJ: E aí? Então, ele teve que criar uma solução. Vejam a solução que o STJ
criou. Anotem, com vergonha, mas anotem.

O STJ disse o seguinte (anotem!), ao editar a Súmula 211: “Entre com recurso especial
alegando violação ao art. 535 (art. dos embargos de declaração) e peça a nulidade da decisão
que não supriu a omissão. Se você ganhar nesse recurso, os autos vão descer e o tribunal agora
vai ser obrigado a se manifestar sobre a questão. Como ele vai ser obrigado a se manifestar,
então, você vai ser obrigado a entrar com aquele recurso especial que você queria ter entrado.”

Então, quando o tribunal a quo for obrigado a se manifestar (e ele vai se manifestar), aí
você, você, vírgula, já não será mais você, será o seu espólio. Aí o seu espólio entrará com
recurso especial que você, ainda vivo, gostaria de ter entrado, mas não entrou por conta dessa
súmula bizarra que é a Súmula 211, do STJ. Um momento triste e lamentável da jurisprudência
brasileira. Isso é uma vergonha, ainda mais vindo de um tribunal que se coloca como tribunal da
cidadania.

Mas eu disse que havia divergência, porque, para o STF se você embarga e o tribunal se
mantém calado, está prequestionada a matéria. Você fez a sua parte e não pode ser prejudicado
pela omissão do tribunal. E aí surge aquilo que se chama de prequestionamento FICTO. Por
que ficto? Porque faz-se de conta que houve o prequestionamento. Quer dizer, você embargou, o
tribunal se manteve calado, então, faz-se de conta que há um prequestionamento. Faz-se conta

365
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
que o tribunal se manifestou e vamos para frente. Esse é o prequestionamento ficto que o STF
admite na Súmula 356.

STF Súmula nº 356 - 13/12/1963 - Edição: Imprensa


Nacional, 1964, p. 154. Ponto Omisso da Decisão - Embargos
Declaratórios - Objeto de Recurso Extraordinário - Requisito do
Prequestionamento    O ponto omisso da decisão, sobre o qual não
foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de
recurso extraordinário, por faltar o requisito do
prequestionamento.

Aí me perguntam: o que é o chamado prequestionamento IMPLÍCITO? Aí já é outra


coisa. Ocorre quando o tribunal se manifesta sobre a questão sem citar o texto de lei. Ele,
implicitamente, examina o texto de lei sem fazer referência a ele. Quer dizer, ele enfrenta a
questão, mas sem fazer referência ao texto de lei. Agora, cuidado! Depois que eu dou essa aula, o
aluno diz assim: “Ah, mas eu já vi decisão que não admitiu o prequestionamento implícito.” É
porque, às vezes, o sujeito chama de implícito o que é ficto e o ficto o STJ não admite. O ficto
não admite por conta da súmula 211, mas o implícito se admite porque senão seria um
formalismo absurdo você dizer que o artigo tem que ser citado. Isso não teria o menor sentido.

Para terminar prequestionamento, vamos dar uma olhada na Súmula 320, do STJ:

STJ Súmula nº 320 - 05/10/2005 - DJ 18.10.2005 Questão


Federal - Voto Vencido - Requisito do Prequestionamento - A
questão federal somente ventilada no voto vencido não atende ao
requisito do prequestionamento.

Por quê? Porque é preciso que a questão discutida tenha sido enfrentada no acórdão, nos
votos vencedores. Se só foi enfrentada pelo voto vencido, não há prequestionamento. É preciso
que conste dos votos vencedores.

Agora vamos examinar, dentro desse contexto, aquilo que eu reputo a única coisa mais ou
menos difícil dessa aula. Então, vocês têm que prestar muitíssima atenção.

e) A Súmula 456 do STF

Nós vamos estudar agora essa súmula que é, em minha opinião, a súmula mais
importante em tema de recurso extraordinário. O texto dessa súmula, o seu enunciado foi
incorporado aos regimentos internos do Supremo e do STJ. Então, embora seja uma súmula do
STF, ela foi incorporada pelo STJ que a aplica com frequência.

O que ela quer dizer? Prestem bem atenção!

A gente viu que para que um recurso extraordinário seja conhecido, seja admitido, há
uma série de obstáculos: a devolutividade restrita, não pode discutir prova, não pode discutir
fato, tem prequestionamento. Há uma série de dificuldades para que o recurso seja admitido,
conhecido. E é exatamente essa série de dificuldades que torna o recurso extraordinário,
extraordinário. Quer dizer, ele é extraordinário pela dificuldade na sua admissibilidade. Ou seja,
não se pode admiti-lo em qualquer circunstância. É uma admissibilidade que tem que ser sempre

366
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
extraordinária. Quer dizer, o extraordinário nos recursos extraordinários é a sua admissibilidade.
É a dificuldade para que você encaixe o recurso, para que você tenha o seu recurso examinado.

Há trezentos quebra-molas para se dificultar que se examine o mérito de um recurso


extraordinário. Agora, se você supera esses quebra-molas, se você supera a admissibilidade do
recurso extraordinário, significa que caberá ao STJ e ao STF julgar o recurso. Quer dizer,
admitido o recurso extraordinário, ele vai ter que julgar o recurso. E se o STJ e o STF tiverem de
julgar o recurso, admitirem o recurso extraordinário, tudo se abre. Tudo se abre! Aquilo que era
difícil de ser examinado, se se supera a admissibilidade, não há mais nenhum obstáculo. O
mérito dos recursos extraordinários não tem nada de extraordinário. O julgamento de mérito de
recurso extraordinário nada tem de especial. Abre-se a porteira, vai tudo.

E aqui é imprescindível o que nós vimos sobre o efeito translativo ou profundidade do


efeito devolutivo. Os recursos extraordinários também têm profundidade no efeito devolutivo e
essa profundidade é ilimitada. Não há limite. A profundidade do efeito devolutivo é semelhante à
profundidade de uma apelação. O difícil é você admitir o recurso, mas, uma vez admitido, tudo
se abre e o STF e o STJ terão que rejulgar a causa. E rejulgar a causa, é examinar os fatos. Como
é que vai rejulgar a causa sem examinar os fatos?

Olhe qual o problema e aí a dificuldade que eu falei! Olha a sutileza: eu não posso entrar
com recurso extraordinário para pedir o reexame de prova porque se o meu recurso for para isso,
nem admitido ele vai ser. Não vai nem ser examinado. Agora, se eu entro com recurso
extraordinário por uma questão legal e meu recurso é admitido (superou todas as exigências que
a gente viu), já que superou, já que abriu, já que o STJ vai ter que julgar, abre-se tudo porque
agora cabe ao STJ, ao Supremo julgar a causa e não há como julgar a causa sem examinar os
fatos. Ele não pode admitir o recurso se for só para examinar fato. Isso ele não pode. Nem vai
admitir o recurso. Mas se admite porque preencheu as exigências, tudo se abre. É esse o sentido
da sumula 456. vamos dar uma lida nela:

STF Súmula nº 456 - DJ de 12/10/1964, p. 3699.


Conhecimento - Recurso Extraordinário - Aplicação do Direito O
Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário,
julgará a causa, aplicando o direito à espécie.

É como se fosse assim: Conheceu do recurso? Aí, abriu tudo. Conheceu, abriu tudo.
Difícil é conhecer, mas já que conheceu, abriu tudo. Não há limitação, não há extraordinariedade
no julgamento de mérito de um recurso extraordinário. E aqui, vou cumprir uma promessa que
fiz na primeira aula do curso. Eu disse, lá na primeira aula, que na segunda metade da última
aula do curso, eu falaria uma coisa que vou falar agora e estou falando.

f) As questões de ORDEM PÚBLICA

Vem as questões de ordem pública nos recursos extraordinários. Eu posso suscitar uma
questão de ordem pública pela primeira vez num recurso extraordinário? Pergunta antológica!
Essa é a pergunta que me fizeram na primeira aula e eu disse que só ia responder na última aula.
Prestem atenção! Olha a sutileza: Se o meu recurso extraordinário for para discutir essa questão,
pela primeira vez suscitada, o recurso nem vai ser examinado. Eu não posso suscitar a primeira
vez a questão no meu recurso extraordinário e o recurso nem será examinado pela falta de
prequestionamento! “Ah, agora me lembrei que o juiz é incompetente, então vou entrar com
recurso especial para alegar a incompetência.” Não posso! Por falta de prequestionamento! Isso é

367
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
o que todo mundo coloca. E está certo! Só que se você colocar só isso na prova é metade da
questão.

Por que? Porque olha a diferença: Se eu entro com meu recurso extraordinário para
discutir uma outra questão, que foi prequestionada (eu encaixei o meu recurso), e meu recurso
foi conhecido, aí abre tudo. Aí a porteira está aberta e, estando aberta, já que conheceu do
recurso, que foi interposto por conta de uma outra questão antes prequestionada, a quesetão abriu
e a questão de ordem pública poderá suscitada. E por que poderá ser suscitada? Porque, agora,
como o STJ ou o STF vão ter que julgar a causa, já que conheceram do recurso extraordinário,
eles vão poder examinar questões de ordem pública. Olha a sutileza! É uma sutileza isso, eu
reconheço! Eu não posso suscitar questão de ordem pública como objeto do meu recurso
extraordinário pela primeira vez. Não posso porque não houve prequestionamento. Mas se me u
recurso extraordinário é encaixado em questão que já foi prequestionada e o tribunal superior
admite o recurso, aí abre tudo. E se abre tudo, vai poder examinar a questão de ordem pública.

Eu vou mostrar para vocês um julgado do STJ (vou ler a ementa) e gostaria muito, muito
mesmo, que vocês, ao estudar esse assunto, lessem esse julgado. Não é uma novidade. É coisa
velha, tema velho, mas é um tema que, embora velho, vocês têm uma dificuldade grande. Eu não
sei quem foi que disse isso, mas os alunos chegam aqui dizendo o seguinte: “questões de ordem
pública não podem ser suscitadas em recurso extraordinário.” Eu não sei exatamente quem disse
essa frase perigosa. Na verdade, eu não posso suscita-la como objeto principal do meu recurso
pela falta do prequestionamento. Mas se meu recurso, interposto com base em outra questão, for
conhecido, aí já que conheceu, súmula 456, abre tudo. Vejam o seguinte recurso especial (que
tem vários precedentes, mas esse é o último que eu peguei, julgado recentemente), é exatamente
isso. Eu não posso dizer melhor do que ele disse aí:

REsp 1080808 / MG - 2008/0175206-5 DJe 03/06/2009


- PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL.
RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITOS
MODIFICATIVOS. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA IMPUGNAÇÃO.
MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. NULIDADE ABSOLUTA.
PREQUESTIONAMENTO. EFEITO TRANSLATIVO.
1. As matérias de ordem pública, ainda que
desprovidas de prequestionamento, podem ser analisadas
excepcionalmente em sede de recurso especial, cujo
conhecimento se deu por outros fundamentos, à luz do
efeito translativo dos recursos. Precedentes do STJ:
REsp 801.154/TO, DJ 21.05.2008; REsp 911.520/SP, DJ
30.04.2008; REsp 869.534/SP, DJ 10.12.2007; REsp
660519/CE, DJ 07.11.2005.

Então, se o recurso foi conhecido por outro fundamento, conheceu, abre tudo, as questões
podem ser suscitadas. Agora, se eu trago uma questão pela primeira vez, como objeto do recurso,
meu recurso nem vai ser examinado, porque ele não vai ser, sequer, admitido. O item e é
sensacional:
2. Superado o juízo de admissibilidade, o
recurso especial comporta efeito devolutivo amplo,
porquanto cumpre ao Tribunal "julgar a causa,
aplicando o direito à espécie" (Art. 257 do RISTJ;
Súmula 456 do STF).

Foi o que falei: superado o juízo de admissibilidade, o recurso especial comporta efeito
devolutivo amplo. Só que, aqui veja: efeito devolutivo profundidade. Muito importante deixar
isso registrado: Aqui é a profundidade do efeito devolutivo.

368
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
Esse julgamento é emblemático do que estou dizendo! E ele não é isolado. Ele tem
trezentos precedentes anteriores. Eu só citei ele aqui porque é o mais recente. Então você vai
fazer o seguinte, não tem opção: Você vai chegar em casa, colocar no site do STJ “Súmula 456”.
peguem as 5 primeiras decisões que aparecem e leiam. Eu digo a vocês para lerem as decisões
porque assim o assunto entra na cabeça e vocês não vão ignorar mais. Isso porque quando a
gente estuda recurso extraordinário fica com aquela idéia assim: é difícil admitir um recurso
extraordinário! È difícil, só que uma vez admitido, acabou. Perdeu todo o glamour. Você virou
um juiz de turma recursal. Não dá para falar isso para um Ministro do STJ, mas a verdade é essa:
Se ele conhece do recurso, ele é um juiz de turma recursal. Nenhuma diferença. A atividade é a
mesma. Difícil é ele conhecer do recurso. Por isso, de cada dez recursos, nove não são admitidos.
Mas por quê? Porque admitir significa ter de rejulgar a causa. Aí rejulgar, examinar tudo dá
trabalho. Então, vamos criar uma série de obstáculos porque a gente sabe que se a gente admitir,
vai ter que rejulgar e rejulgar significa examinar tudo! Então, não deixem de pegar os outros
julgados para dar uma lida.

OBS.: Fiz o que o Fredie mandou. E não é que ele tem razão? Hehe!

AgRg no REsp 900449 / RJ - SEGUNDA TURMA – Dje


23/06/2009 - PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
ILEGITIMIDADE DA UNIÃO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA NÃO
PREQUESTIONADA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO POR OUTRO
FUNDAMENTO. APLICAÇÃO DO DIREITO À ESPÉCIE. TRANSFUSÃO
DE SANGUE EM RECÉM NASCIDO. SANGUE CONTAMINADO PELO
VÍRUS HIV. TRATAMENTO REALIZADO PELO INSTITUTO
FERNANDES FIGUEIRA. DECRETO 66.624/1970. UNIDADE
TÉCNICO-CIENTÍFICA DA FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ (FIOCRUZ).
ENTIDADE DOTADA DE PERSONALIDADE JURÍDICA DE DIREITO
PRIVADO, SUJEITA A REGIME JURÍDICO E ADMINISTRATIVO
CONSTANTE DE SEU ESTATUTO.
1. O fato de a questão da legitimidade passiva não ter
sido alvo de prequestionamento não impede que esta
Corte Superior trate do ponto. É que os recursos
extraordinários (em sentido lato) também possuem o
efeito translativo, ainda que de abrangência mais
limitada, tendo em conta a necessidade de que o
inconformismo seja conhecido ao menos por algum outro
fundamento que não o que deixou de ser prequestionado.
Incide, no caso, a Súmula n. 456 do STF, por analogia.

REsp 1080808 / MG Ministro LUIZ FUX (1122) T1 -


PRIMEIRA TURMA DJe 03/06/2009 PROCESSUAL CIVIL.
TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. RECURSO ESPECIAL.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITOS MODIFICATIVOS.
AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA IMPUGNAÇÃO. MATÉRIA DE
ORDEM PÚBLICA. NULIDADE ABSOLUTA. PREQUESTIONAMENTO.
EFEITO TRANSLATIVO.
1. As matérias de ordem pública, ainda que desprovidas
de prequestionamento, podem ser analisadas
excepcionalmente em sede de recurso especial, cujo
conhecimento se deu por outros fundamentos, à luz do
efeito translativo dos recursos. Precedentes do STJ:
REsp801.154/TO, DJ 21.05.2008; REsp 911.520/SP, DJ
30.04.2008; REsp 869.534/SP, DJ 10.12.2007; REsp
660519/CE, DJ 07.11.2005.
2. Superado o juízo de admissibilidade, o recurso
especial comporta efeito devolutivo amplo, porquanto
cumpre ao Tribunal "julgar a causa, aplicando o
direito à espécie" (Art. 257 do RISTJ; Súmula 456 do
STF).
369
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009

REsp 864362 / RJ Ministro LUIZ FUX (1122) DJe 15/09/2008


RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. ADMISSÃO DO APELO
NOBRE. CONHECIMENTO DAS QUESTÕES QUE GRAVITAM EM TORNO
DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO E PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS EX
OFICIO. APLICAÇÃO DO DIREITO À ESPÉCIE. ART. 257 DO
RISTJ E SÚMULA 456 DO STF. SISTEMA FINANCEIRO DA
HABITAÇÃO - SFH. CONTRATO QUE OSTENTA CLÁUSULA DE
COBERTURA DO SALDO DEVEDOR PELO FUNDO DE COMPENSAÇÃO
DE VARIAÇÕES SALARIAIS - FCVS. LEGITIMIDADE PASSIVA AD
CAUSAM DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF. GESTORA DO
FUNDO. INTERESSE JURÍDICO PERTINENTE. INCOMPETÊNCIA DA
JUSTIÇA ESTADUAL.
1. Os temas que gravitam em torno das condições da
ação e dos pressupostos processuais podem ser
conhecidos ex officio no âmbito deste egrégio STJ,
desde que o apelo nobre supere o óbice da
admissibilidade recursal, no afã de aplicar o direito
à espécie, nos termos do art. 257 do RISTJ e Súmula
n.º 456 do STF (Precedentes: REsp 698.061 - MG,
Relatora Ministra ELIANA CALMON), Segunda Turma, DJ de
27 de junho de 2005; REsp 869.534 - SP, Relator
Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Primeira Turma, DJ de
10 de dezembro de 2007; REsp 36.663 - RS, Relator
Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, Segunda Turma, DJ
de 08 de novembro de 1993).

REsp 928643 / SP Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES


(1141) T2 - SEGUNDA TURMA DJe 24/09/2008
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO.
EXECUÇÃO FISCAL PROMOVIDA PELO MUNICÍPIO. ARREMATAÇÃO.
INEXISTÊNCIA DO BEM ARREMATADO DESCOBERTA EM MOMENTO
POSTERIOR. ILEGITIMIDADE PASSIVA DAQUELE ENTE PÚBLICO.
MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. POSSIBILIDADE DE
CONHECIMENTO SEM PREQUESTIONAMENTO. PAPEL DO
JUDICIÁRIO NA CONDUÇÃO DA ALIENAÇÃO E DA ARREMATAÇÃO
JUDICIAIS.
1. O fato de a questão da legitimidade passiva não ter
sido alvo de prequestionamento não impede que esta
Corte Superior trate do ponto. É que os recursos
extraordinários (em sentido lato) também possuem o
efeito translativo, ainda que de abrangência mais
limitada, tendo em conta a necessidade de que o
inconformismo seja conhecido ao menos por algum outro
fundamento que não o que deixou de ser enfrentado pelo
Tribunal de origem. Incidência da Súmula n. 456 do
STF, aplicada por analogia, e precedentes da Segunda
Turma.

EREsp 58265 / SP Ministro EDSON VIDIGAL (1074) Ministro


BARROS MONTEIRO (1089) CE - CORTE ESPECIAL DJe
07/08/2008 EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. RECURSO ESPECIAL.
TÉCNICA DE JULGAMENTO.
1. Se o Tribunal local acolheu apenas uma das causas
de pedir declinadas na inicial, declarando procedente
o pedido formulado pelo autor, não é lícito ao
Superior Tribunal de Justiça, no julgamento de recurso
especial do réu, simplesmente declarar ofensa à Lei e
afastar o fundamento em que se baseou o acórdão
recorrido para julgar improcedente o pedido.
2. Nessa situação, deve o Superior Tribunal de Justiça
aplicar o direito à espécie, apreciando as outras
causas de pedir lançadas na inicial, inda que sobre
370
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
elas não tenha se manifestado a instância precedente,
podendo negar provimento ao recurso especial e manter
a procedência do pedido inicial.

Então, terminamos essa primeira parte. Agora vamos ver outras características gerais que
são mais singelas, são muito mais simples, mas ainda estamos dentro das generalidades.

g) Prazo: 15 dias para ambos! Vejam que coisa linda! É até um aperitivo dizer isso!
Ambos têm prazo de 15 dias.

h) Ambos não tem efeito suspensivo automático

O que isso quer dizer? Que ambos permitem execução provisória. Porque não têm efeito
suspensivo automático, ambos permitem execução provisória. E aí, surge o seguinte problema:
Como fazer para pedir efeito suspensivo em um recurso extraordinário, já que o efeito
suspensivo tem que ser pedido, não é automático, como fazer?

Reparem bem: Para vocês entenderem como se faz para pedir efeito suspensivo em um
recurso extraordinário, vocês têm que entender o seguinte: Que um recurso extraordinário é
interposto no tribunal a quo. Só depois é que ele vai para o tribunal superior. Por conta disso, o
recurso extraordinário passa por um duplo juízo de admissibilidade (exatamente porque o
extraordinário é interposto no juízo de origem): no de origem e no ad quem, que é o tribunal
superior.

E aí, como é que a gente sabe como se pede efeito suspensivo? Enquanto não for feito o
juízo de admissibilidade na origem, compete ao presidente do tribunal local decidir sobre o efeito
suspensivo. Enquanto pendente de análise o recurso na origem, enquanto a admissibilidade não
for feita na origem, cabe ao presidente do tribunal a quo, examinar o efeito suspensivo. Já feito o
juízo de admissibilidade na origem, caberá ao tribunal superior o exame do efeito suspensivo. Se
o juízo de admissibilidade já tiver sido feito na origem, caberá ao tribunal superior fazer o exame
do efeito suspensivo. Há duas súmulas que tratam disso: Súmulas 634 e 635, do STF.
Imprescindível a leitura dessas duas súmulas:

STF Súmula nº 634 - DJ de 13/10/2003, p. 2. Competência


- Concessão de Medida Cautelar para Dar Efeito Suspensivo a
Recurso Extraordinário - Objeto de Juízo de Admissibilidade na
Origem Não compete ao Supremo Tribunal Federal conceder
medida cautelar para dar efeito suspensivo a recurso
extraordinário que ainda não foi objeto de juízo de
admissibilidade na origem.

STF Súmula nº 635 - DJ de 13/10/2003, p. 2. Competência


- Decisão em Pedido de Medida Cautelar em Recurso
Extraordinário Pendente do Juízo de Admissibilidade Cabe ao
Presidente do Tribunal de origem decidir o pedido de medida
cautelar em recurso extraordinário ainda pendente do seu juízo de
admissibilidade.

i) Ambos só podem ser interpostos após o esgotamento das instâncias


ordinárias
371
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009

É uma outra característica comum aos recursos extraordinários. Eu só posso interpor um


recurso extraordinário, após ter esgotado os recursos ordinários. Eu tenho que exaurir os recursos
ordinários para, só então, entrar com o extraordinário. E como, normalmente, o último recurso
ordinário são os embargos infringentes, eu tenho que entrar com embargos infringentes antes de
entrar com o recurso especial ou extraordinário. Quando couber! Porque pode ser que não caiba.
Mas se cabem embargos infringentes, eu tenho que entrar com infringentes para, só então, entrar
com recurso extraordinário. Daí a Súmula 207, do STJ que diz:

STJ Súmula nº 207 - DJ 16.04.1998 Recurso Especial -


Admissibilidade - Cabimento de Embargos Infringentes em
Acórdão É inadmissível recurso especial quando cabíveis
embargos infringentes contra o acórdão proferido no tribunal de
origem.

Prestem atenção. Imaginem vocês um acórdão com dois capítulos, um unânime e um


outro não unânime. A gente sabe (aprendeu na aula passada) que contra o capítulo não unânime
cabem embargos infringentes. Contra o capítulo unânime não cabe. Contra o unânime, caberão,
RE ou REsp. E a gente sabe que, depois dos embargos infringentes, caberão RE ou REsp. Olhe
que situação: O acórdão tem dois capítulos, um unânime e um não unânime. Contra o unânime,
eu já posso entrar com RE e REsp. Só que contra o não unânime, eu, primeiro tenho que entrar
com embargos infringentes, esperar o julgamento dos embargos infringentes para, só então,
entrar com RE e REsp.

No final da contas, eu posso entrar até com cinco recursos. O que o legislador fez, por
conta disso, porque ia ser um tumulto generalizado no processo. Então, o que o legislador fez,
prestem bem atenção!

Olhe só: Saiu um acórdão com dois capítulos: Um capítulo unânime e um capitulo não
unânime. Há quinze dias para entrar com embargos infringentes contra o capítulo não unânime.
Saiu o acórdão, e há 15 dias para entrar com embargos infringentes do capítulo não unânime. E o
unânime? Esqueça. Faça de conta que ele não existe. Nessas circunstâncias, só se preocupe com
o capítulo não unânime (embargos infringentes em 15 dias). Opostos embargos infringentes,
julgados esses embargos, você vai poder entrar com um recurso especial ou extraordinário do
capítulo não unânime (porque você já usou os embargos infringentes), mas também vai poder
entrar com capítulo unânime que você havia deixado de lado e que agora você pode impugnar
tudo. Então, esse REsp e esse RE, interpostos após o julgamento dos embargos infringentes, vão
poder impugnar toda a decisão: seu capítulo não unânime (que agora você pode impugnar porque
já opôs os embargos infringentes) e o capítulo unânime que você sempre pôde ter impugnado.
Você já poderia ter entrado com REsp e RE lá atrás. Só que o legislador disse: Não entre!
Esqueça! Faça tudo de uma vez só! Esse foi o objetivo do legislador: Evitar que você entre com
vários recursos, resolva a parte não unânime e aí você entra com o especial e o extraordinário
uma vez só, de tudo. É uma forma de racionalizar a utilização dos recursos, o que é muito bom.

Agora, presta atenção: os quinze dias se abrem com a publicação do acórdão contendo o
capítulo unânime e o não unânime. Você não entra com os embargos infringentes. Se você entrar
acontece o que eu disse. Agora, e se você não entra com os embargos infringentes? O que
acontece? O capítulo não unânime transita em julgado. Passados quinze dias e o sujeito não
entrou com embargos infringentes, o capítulo não unânime transita em julgado. Ora, se ele não
recorreu, transita em julgado. E aí vem a pergunta? E o unânime?? Eu podia ter impugnado o
unânime? Não! Não podia ter impugnado porque o legislador disse para esquecer o unânime.
Então, se eu não poderia ter recorrido, não vai transitar em julgado. Só vai transitar em julgado o
capítulo não unânime. Não entrei com embargos infringentes, o que a lei diz? Nesse caso,
372
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
automaticamente, contam-se mais quinze dias para que eu entre com o Especial e o
Extraordinário contra o capítulo unânime. Eu tinha quinze dias para impugnar o capítulo não
unânime e eu não impugnei. Problema meu. Transitou em julgado e, automaticamente, contam-
se quinze dias para que eu entre com o Especial e Extraordinário do capítulo unânime.

Como é que você tem que estudar esse assunto? Você tem que dividir duas situações:

 15 dias entrando com embargos infringentes – se entrou com eles, espera julgar e
pode entrar com RE e REsp de tudo.
 15 dias sem entrar com embargos infringentes – transita em julgado a parte não
unânime, já que não foi impugnada, e contam-se 15 dias automaticamente, para a
parte unânime, para entrar com o RE e REsp.

Tudo isso que eu disse está no art. 498, do Código, que você, sozinho, você não consegue
entender. Mas, vamos ao que ele diz, depois de ter visto a explicação:

Art. 498 - Quando o dispositivo do acórdão contiver


julgamento por maioria de votos e julgamento unânime, e forem
interpostos embargos infringentes (1º caso), o prazo para recurso
extraordinário ou recurso especial, relativamente ao julgamento
unânime, ficará sobrestado até a intimação da decisão nos
embargos.

Parágrafo único. Quando não forem interpostos


embargos infringentes, o prazo relativo à parte unânime da
decisão terá como dia de início aquele em que transitar em
julgado a decisão por maioria de votos (contam-se mais quinze
dias para entrar com o RE/REsp da parte unânime porque a
não unânime terá transitado em julgado).

j) Recursos Extraordinários Retidos

Último ponto das generalidades. Nós já sabemos o que é um recurso retido, agora vamos
estudar o que é um recurso extraordinário retido. Eu passei anos desenvolvendo esses desenhos e
vocês vão ter que anotar.

Imaginem uma decisão interlocutória. A gente já viu que contra ela cabe agravo de
instrumento. O tribunal julga o agravo de instrumento. Surge a seguinte pergunta: Do acórdão
que julga agravo de instrumento, cabe recurso extraordinário? Resposta: Cabe. Tem até Súmula:
Súmula 86, do STJ.

STJ Súmula nº 86 - DJ 02.07.1993 Recurso Especial -


Acórdão de Agravo de Instrumento Cabe recurso especial contra
acórdão proferido no julgamento de agravo de instrumento.

Prestem atenção: Contra o acórdão que julga o agravo de instrumento interposto contra
interlocutória cabe recurso extraordinário que ficará retido nos autos. Essa é a situação em que os
recursos extraordinários ficam retidos. Nesse caso, eles ficam presos. Não sobem imediatamente.
Essa é a situação básica.

373
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
Agora, trezentas observações! Passo a passo. Anotem tudo o que eu disser. Porque eu
falei o básico, agora vocês vão ter que fazer as observações para entender bem! Isso cai MUITO
em concurso.

 Observação 01. Não haverá retenção se se tratar de execução.

Se tudo o que eu falei, estiver acontecendo em execução, não haverá retenção. O recurso
vai subir imediatamente. Isso não se discute. Isso é texto expresso de lei. Não é para discutir isso.

 Observação 02. Não haverá retenção se houver tutela de urgência ou se o


julgamento extinguir o processo.

A jurisprudência desenvolveu outras situações em que o recurso não fica retido. Não fica
retido em se tratando de tutela de urgência – Não tem porque ficar retido se há urgência. O
recurso tem que ser liberado para processamento imediato. Isso não está na lei, mas a
jurisprudência aceita normalmente.

 Observação 03. Não haverá retenção se o julgamento extinguir o


processo.

Se o julgamento do agravo extingue o processo, vai ficar retido para quê? Não tem
porquê.

 Observação 04. Haverá retenção contra acórdãos que não extingam o


processo.

É preciso que o julgamento do agravo pelo tribunal também tenha caráter interlocutório.
Ou seja, não extintivo do processo. E aí é a pedra-de-toque: contra acórdãos interlocutórios (essa
é que é a chave da compreensão), quer dizer, contra acórdãos que não extingam o processo, o
recurso extraordinário fica retido. Essa é a lógica.

 Observação 05. Como destravar o recurso extraordinário.

Então, como é que eu faço para pedir o destravamento desse recurso em situações de
urgência, por exemplo? A situação é de urgência, eu entro com o recurso e o presidente trava
porque diz que fica retido. Não deixa subir. Eu vou ficar chateado, vou fazer o quê? Qual é o
instrumento para pedir o destravamento do recurso extraordinário que ficou retido? Se aceita,
com alguma tranqüilidade a ação cautelar. Ação cautelar para destravar o recurso. Foi até
pergunta recente da prova aberta do MPT: “Qual o instrumento para pedir o destrancamento do
recurso extraordinário retido?”

Se discutiu muito. Tem julgado admitindo simples petição pedindo para destravar o
recurso, tem julgado admitindo a reclamação que avoca o recurso, mas o que mais vale e o que
mais é utilizado é a cautelar.

Interposto o recurso, ele fica retido (amarrado nos autos). Só que o processo continua na
primeira instância. Só que continua com esse penduricalho que é o recurso interposto e que ficou
retido. O processo está rolando. Sai a sentença. Da sentença, cabe apelação. Do julgamento da
apelação, cabe o quê? Vocês, a essa altura, deveriam saber, mas se não sabe, tudo bem. Do
julgamento da apelação cabem embargos infringentes. Contra julgamento de embargos
infringentes, não cabe mais nada. Contra embargos infringentes, não cabe mais nada. A gente
acabou de ver que embargos infringentes são o último dos recursos ordinários. Contra isso não
cabe mais nenhum recurso ordinário. Essa situação é uma situação curiosa porque essa decisão
374
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
nos embargos infringentes é a última das decisões ordinárias, é a última das decisões proferidas
nas instâncias ordinárias. É a última. Contra ela, só cabem recurso especial ou extraordinário e é
nesse momento, nesse momento no qual só cabem recursos extraordinários, no momento em que
a instancia ordinária acabou, no qual se encerra a instância ordinária, em que só cabem recursos
extraordinários, é que você vai reiterar aquele recurso que ficou retido. É aqui que você vai dizer
assim: já que agora acabou no plano ordinário, já que agora só tem STF e STJ, então, suba com o
meu recurso lá que ficou retido. Esse é o momento de reiterar o recurso que ficou retido. Vejam
como faz sentido isso: Já que agora já não tem mais nada para fazer nessas instâncias, só
cabendo agora STF e STJ, quando subir sobe com tudo. Esse é o momento de reiterar.

Agora, olha a pegadinha (terrível): vocês viram que o agravo retido, para reiterar, você
tem que apelar. Você apela e reitera. Aqui, não. Você pode simplesmente só reiterar: “Eu não
quero fazer mais nada. Aqui, eu só quero reiterar o que eu pedi lá atrás.” O sujeito pode entrar
só com a petição de reiteração. Só. Se quiser, pode entrar com recurso especial e reiterar. Pode
fazer as duas coisas. Mas se não quiser entrar com recurso pode, simplesmente reiterar. Então, a
reiteração do recurso extraordinário retido não depende da interposição de outro recurso.

Vamos agora examinar as especificidades do recurso especial.

5.2. ESPECIFICIDADES DO RECURSO ESPECIAL

O recurso especial SÓ cabe contra acórdão e SÓ acórdão de Tribunal de Justiça ou TRF.


Não cabe, por exemplo, de turma recursal. Súmula 203, do STJ.

STJ Súmula nº 203 - DJ 12/02/1998 - Alterada - Ag


400.076-BA - 23/05/2002 - DJ 03.06.2002 Recurso Especial -
Decisão por Órgão de Segundo Grau dos Juizados Especiais Não
cabe recurso especial contra decisão proferida, nos limites de sua
competência, por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais.

As hipóteses de cabimento do recurso especial, conforme eu disse, estão no art. 105, III,
da CF, que a gente vai examinar a partir de agora.

Art. 105 - Compete ao Superior Tribunal de Justiça:


III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em
única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou
pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios,
quando a decisão recorrida:
a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;

Então, vamos entender algumas coisas aqui dessa letra ‘a’. Lei federal aí é em sentido
amplo: envolve decreto, medida provisória, lei complementar, lei delegada.

Não cabe, por exemplo, por violação a regimento interno.

Pegadinha concursal: A CF fala em contrariar “tratado ou lei federal”. Mas houve uma
mutação constitucional aqui porque há tratados agora que tem natureza de norma constitucional
se foram aprovados com quorum diferenciado, qualificado. Envolvendo direitos humanos,
aprovados com quorum qualificado, passam a ter natureza de emenda constitucional. E aí, a
violação a esses tratados, tratados que têm natureza de emenda constitucional, não vai ser
375
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
impugnada por recuso especial. A violação a esses tratados será impugnada por recurso
extraordinário. E isso não é texto expresso. Você tem que interpretar para chegar a essa
conclusão. Essa é uma observação importante.

A outra observação diz respeito ao verbo contrariar que, aí, significa ofender de qualquer
maneira. Aplicou mal é contrariar. Deixou de aplicar, é contrariar. Contrariar é ofender, de
qualquer maneira a legislação federal, seja porque aplicou mal, seja porque simplesmente não
aplicou, de modo que contrariar é um verbo cujo sentido abrange o de negar vigência. Negar
vigência, que está no final, está contida em contrariar porque quem nega vigência contraria.
Então, rigorosamente, não haveria necessidade do verbo negar vigência aí. Coloca-se aí para não
haver margem de dúvida. Mas o verbo contrariar já é suficientemente amplo para englobar
também os casos de negar vigência.

A letra a) é, indiscutivelmente, a mais usada na prática. Normalmente, você entra com


recurso especial com base na letra a.

Art. 105 - Compete ao Superior Tribunal de Justiça julgar


causas quando a decisão recorrida: b) julgar válido ato de governo
local contestado em face de lei federal; (Alterado pela EC-
000.045-2004)

Segunda hipótese de cabimento do recurso especial. Se, no caso concreto discute-se ou


dá-se preferência a um ato administrativo local em face de lei federal, vai-se ao STJ para ver se
há essa compatibilidade. Havendo uma discussão sobre quem deve prevalecer, ato de governo
local ou lei federal, vai-se ao STJ para ver o que deve prevalecer.

Pegadinha (todo mundo prestando atenção). O texto, antes da EC/45 era outro. Antes, o
texto previa também recurso especial quando a decisão julgasse válida lei local em face de lei
federal. O texto anterior falava também em lei local em face de lei federal e dizia que quando
houvesse esse conflito entre essas leis, iria ao STJ. Não apenas ato de governo local em face de
lei federal, mas lei local também. Só que tiraram isso. Por que tiraram isso? Porque não existe
hierarquia entre lei local e lei federal. Não há diferença hierárquica entre lei federal, estadual e
municipal. Elas se distinguem pela competência legislativa. É isso que há de diferente nelas.
Portanto, porque não há hierarquia, um conflito de lei local com lei federal, é um conflito de
competência constitucional. Quer dizer, é um problema constitucional saber qual é a lei que se
aplica, se a matéria é matéria de lei federal ou de lei local. Então, não deveria ser discutido por
recurso especial. Essa situação de conflito entre lei local e lei federal foi, por isso, tirada daí e
colocada como hipótese de recurso extraordinário. Corretamente. Eu digo isso porque tem livro
que diz que isso é um absurdo, porque o Supremo já está entulhado de coisa e mais esse
problema. Quer dizer, o sujeito que diz isso não entendeu nada da mudança porque o que
acontecia na prática antes? Na prática o sujeito entrava com dois recursos: Com o especial e com
o extraordinário porque a matéria era constitucional. Desnecessariamente porque o tema era
eminentemente constitucional. Agora ficou claro: o tema é constitucional, entre só com o
extraordinário (está lá no art. 102, III, d).

Art. 105 - Compete ao Superior Tribunal de Justiça julgar


causas quando a decisão recorrida: c) der a lei federal
interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

Ora, aqui é o recurso especial que tem o objetivo de uniformizar a jurisprudência no


Brasil. Aqui é o recurso especial que tem a finalidade de uniformização da jurisprudência no
Brasil em torno da lei federal. Se eu recorro de uma decisão, dizendo: “STJ, o tribunal aqui
interpretou lei federal diferentemente do outro tribunal que, em uma mesma situação interpretou
376
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
lei federal de outra maneira.” Há uma divergência entre tribunais e é sempre entre tribunais. Não
é uma divergência no mesmo tribunal. O tribunal recorrido dá à lei federal interpretação diversa
da que outro tribunal dera. O que você vai ter de fazer na letra c, necessariamente em seu
recurso? Cuidado na hora da prova! O que você vai ter que fazer, necessariamente nesse recurso
da letra c? Vai ter que fazer uma coisa que você já aprendeu comigo e que se chama
distinguishing: Você vai ter de demonstrar que o seu caso é semelhante da decisão que você está
invocando. Você vai ter que demonstrar que a sua situação aqui é semelhante daquela que foi
decidida pelo outro tribunal e que, portanto, é a decisão correta, a que tem que ser examinada. Se
você não fizer essa comparação entre o seu caso e o caso paradigma. Se não tiver esse item no
seu recurso, ele nem vai ser conhecido. Preste atenção na hora da prova. Recurso especial com
base na letra c), tem que ter um item de confronto das decisões. Decisão recorrida com a decisão
paradigma e você vai ter que demonstrar que a sua situação é semelhante àquela. Isso é o
distinguishing. Você pode até colocar com outro nome, como confronto analítico entre decisão
recorrida e decisão paradigma. Tem de ter! Se não tiver, o recurso não vai ser examinado. É
requisito de admissibilidade do recurso especial com base na letra c).

Agora, preste atenção: como é que se comprova essa divergência? Hoje em dia, essa
discussão perdeu um pouco da importância por conta da internet. A prova hoje é eletrônica. Essa
discussão em tempos jurássicos era relevante porque para saber se a decisão era daquele tribunal
mesmo, era preciso ligar para a telefonista e pedir a ela que conseguisse uma ligação para Boa
Vista, em Roraima, depois de três horas, você conseguia falar com o tribunal e checar se, de fato
saiu a decisão e pedir para mandar pelo correio. Era uma dificuldade para comprovar. Nessa
época, as exigências para comprovar era terrível. Na prática, você tinha que pegar decisão
autenticada e juntar ou então pegar cópia de publicação autorizada pelo tribunal. Era dificílimo.
Com a possibilidade de se provar com a extração da decisão do site do tribunal. Agora, a única
coisa que você tem que saber é isso: eu posso comprovar essa divergência com a extração da
decisão no site do próprio tribunal. Por quê? Porque é muito fácil você provar que é falsa. Basta
você acessar o site e ver que o cara está juntando uma decisão que não existe. O controle é muito
fácil. Isso hoje é quase que um não-problema.

(Fim da 2ª parte da aula)

5.3. ESPECIFICIDADES DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Art. 102 - Compete ao Supremo Tribunal Federal,


precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: III -
julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em
única ou última instância, quando a decisão recorrida:
a) contrariar dispositivo desta Constituição;
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei
federal;
c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em
face desta Constituição;
d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.
(Acrescentado pela EC-000.045-2004)

O recurso extraordinário cabe contra qualquer decisão. Não há necessidade de ser


acórdão. Basta que seja a última decisão. E cabe contra última decisão de qualquer órgão
jurisdicional do país, inclusive juizados. Por isso cabe recurso extraordinário em juizados.
Inclusive Justiça do Trabalho, Justiça Eleitoral. Até mesmo decisão de juiz. Há caso de decisão

377
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
de juiz impugnável por meio de recurso extraordinário, o que é inimaginável em sede de recurso
especial.

Exemplo de decisão de juiz impugnável por recurso extraordinário (é raríssimo, mas


existe), que é a decisão do juiz que, em execução fiscal, julga aqueles embargos infringentes de
alçada (que a gente já estudou aqui). Esses embargos infringentes são julgados pelo próprio juiz
e, contra essa decisão, pelo menos em tese, cabe recurso extraordinário. Tem até Súmula: 640,
do STF.

STF Súmula nº 640 - DJ de 13/10/2003, p. 2. Cabimento -


Recurso Extraordinário - Decisão de Juiz de Primeiro Grau -
Causas de Alçada ou Turma Recursal de Juizado Especial Cível
e Criminal É cabível recurso extraordinário contra decisão
proferida por juiz de primeiro grau nas causas de alçada, ou por
turma recursal de juizado especial cível e criminal.

Eu quero que vocês anotem (só anotar, porque não há nenhuma peculiaridade) duas
súmulas do STF sobre recurso extraordinário: A 733 e a 735. Anotem aí: isso é importante
porque cai muito em prova de marcar:

STF Súmula nº 733 - DJ de 11/12/2003, p. 2. Recurso


Extraordinário em Processamento de Precatórios – Cabimento –
Não cabe recurso extraordinário contra decisão proferida no
processamento de precatórios.

Entende-se que decisão proferida em processamento de precatórios é decisão


administrativa, portanto, não impugnável por recurso extraordinário. Cai muito, mas só cai a
transcrição literal.

STF Súmula nº 735 - 26/11/2003 - DJ de 9/12/2003, p. 2;


DJ de 10/12/2003, p. 2; DJ de 11/12/2003, p. 2. Recurso
Extraordinário contra Acórdão que Defere Medida Liminar –
Cabimento Não cabe recurso extraordinário contra acórdão que
defere medida liminar.

Porque aí se entende que se trata de acórdão proferido em cognição sumária e que decisão
fundada em cognição sumária não poderia ser discutida em recurso extraordinário. É uma
súmula muito esquisita essa, mas o certo é que ela está aí. Então acórdão que decide medida
limitar não seria impugnável por recurso extraordinário porque se funda em cognição sumária.

Vocês sabem que o recurso extraordinário serve para, basicamente, discutir a


constituição. Serve para discutir eventual contrariedade à Constituição. Sucede que essa
contrariedade à Constituição, que autoriza o recurso extraordinário tem que ser uma
contrariedade direta. A ofensa à Constituição, que permite a interposição do recurso
extraordinário tem que ser uma ofensa direta, frontal, não pode ser uma ofensa reflexa. Não pode
ser uma ofensa indireta. E o que é uma ofensa indireta para o STF, que não autoriza o RE? É a
ofensa que só é percebida após o exame da legislação. Você só percebe a ofensa à Constituição,
examinando primeiro a legislação. A ofensa passa pela legislação para chegar à Constituição. Por
essa razoa, a ofensa é indireta e não permite recurso extraordinário.

Quero que vocês anotem o seguinte: “Quando o exame da legislação fica entre o exame
da Constituição, não permite recurso extraordinário.” Eu nunca entendi isso. Isso é muito
complexo para a minha cabeça porque a Constituição fala em contrariar a Constituição. Não fala
378
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
contrariar diretamente, indiretamente. Essa é mais uma forma de não se admitir recurso
extraordinário. Tranquilamente. No concurso, o fato de a gente não entender isso, não prejudica.
A gente simplesmente vai dizer que a ofensa tem que ser direta, não pode ser reflexa (aquela que
só pode ser percebida pelo exame da legislação). Você diz isso, fica bonito. E é impossível errar
isso em concurso. Vão perguntar e a gente vai dizer que a ofensa é direta, entendida ofensa direta
como aquela que pode ser percebida diretamente na Constituição sem interferência do texto
legislativo. E vai citar uma súmula:

STF Súmula nº 636 - DJ de 13/10/2003, p. 2.Cabimento -


Recurso Extraordinário - Contrariedade ao Princípio da
Legalidade - Revisão da Interpretação Dada a Normas
Infraconstitucionais pela Decisão Recorrida    Não cabe recurso
extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da
legalidade, quando a sua verificação pressuponha rever a
interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão
recorrida.

Se, para eu examinar a legalidade, tiver que examinar leis infraconstitucionais, não caberá
recurso extraordinário porque a violação tem que ser direta! A Súmula 636 consagra essa
exigência de que a ofensa tem que ser direta, não cabe a ofensa reflexa.

Agora, vamos falar sobre o último assunto, que exige que vocês se lembrem de duas
coisas que vocês viram ao longo desse curso. Jamais esquecer:

 Da transformação do direito brasileiro em um direito que valoriza o precedente.

O papel do precedente é importantíssimo. Se o precedente no Brasil hoje tem um papel


importantíssimo e se o tribunal mais importante no Brasil, que é o Supremo, julga a maioria das
causas em recurso extraordinário, vocês devem imaginar que o julgamento de um RE hoje tem
importância que não tinha outrora.

Antigamente, quando se julgava um recurso extraordinário se dizia: João ganhou ou João


perdeu. Isso beneficia João, ou prejudica João. A partir do momento que a gente reestrutura
nosso sistema para dar aos precedentes importância capital, e o Supremo é o ápice do Poder
Judiciário brasileiro; quando chega o RE de João ao Supremo e o Supremo decide o RE de João,
cria-se um precedente que pode ser aplicado a outras situações semelhantes, precedente que,
vindo do Supremo é ultravalorizado. Se você continuar achando que o RE serve apenas para
quem está recorrendo, você está ignorando o papel do STJ na formação de precedentes com
eficácia erga omnes, muitos dos quais com eficácia vinculante.

Porque, vejam, inclusive, que toda súmula vinculante nasce de um controle difuso que o
Supremo faz. Ele julga a causa em controle difuso, decide, cria um precedente, o sumula e o
controle difuso é feito, praticamente, sempre, pelo RE. Então, o RE é o instrumento de controle
difuso de constitucionalidade. Se um estrangeiro lhe perguntar onde está previsto o controle
difuso de constitucionalidade na constituição brasileira, meu professor de constitucional, nunca
me disse isso. A ADI, a ADC estão lá, mas são controle concentrado. Mas por que o Brasil prevê
o controle difuso? Cadê o texto da constituição admitindo isso? A previsão constitucional do
controle difuso é o recurso extraordinário, quando a Constituição diz que cabe RE quando o juiz
disser que uma lei é inconstitucional. O RE é controle difuso por excelência.

 A transformação do controle difuso: A interpretação da CF para todos

379
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
E por ser controle difuso, aí vem o segundo ponto que vocês têm que lembrar (e
estudaram com Novelino): O controle difuso está se transformando no Brasil. Está se
transformando, mas são fenômenos paralelos. O Brasil reforma o sistema de precedente e, por
conta disso, transforma o controle difuso. E qual é a transformação do controle difuso? Ele passa
a ser um controle em que o STF fixa uma interpretação da Constituição para todos, mesmo sendo
um controle difuso, mesmo sendo um controle envolvendo João contra José, quando o Supremo
faz esse controle de constitucionalidade num processo de João contra José (difuso), essa
interpretação que o Supremo dá passa a valer para todos. Veja como isso tem tudo a ver com os
sistema de precedentes. Se o Supremo cria um precedente em tema de interpretação
constitucional, isso vale para todos e o Supremo faz isso em controle difuso, tanto que já há até
um nome: o controle difuso está se abstrativizado ou está se objetivando. É a objetivação do
controle difuso ou abstrativização do controle difuso, assunto que vocês já devem ter estudado.

Há quatro anos atrás eu escrevi um artigo sobre isso, em que eu falava disso. Mas, assim:
havia três pessoas no Brasil que falavam isso. Eu chegava nessa aula aqui e era um problema
porque eu tinha que explicar isso tudo. Só que de lá para cá isso virou moda. As expressões
objetivização do recurso extraordinário e a abstrativização do recurso extraordinário que, na
verdade, é objetivação do controle difuso e abstrativização do controle difuso, são expressões
bastante consolidadas.

Essa idéia de que as decisões em controle difuso produzem efeito erga omnes, você tem
que casar: decisões em controle difuso produzem efeitos erga omnes como força de precedente.
É a idéia do precedente. O precedente é erga omnes. Quando o STF diz que uma lei tal é
inconstitucional em controle difuso, cria o precedente que a lei tal é inconstitucional e, qualquer
situação semelhante, tem que ser aplicada.

Então, olha o que pode acontecer: João entra com RE, chega ao STF, discutindo se uma
lei é inconstitucional. O STF diz que aquela lei é inconstitucional. João foi para discutir o
problema dele, mas se o Supremo disse que a lei é inconstitucional, a lei passa a ser
inconstitucional para todo mundo. Quer dizer que um carinha pode gerar uma decisão que valha
para todo mundo? Pode! Isso é uma das grandes maravilhas do direito brasileiro porque qualquer
cidadão, qualquer um, pode levar a discussão à interpretação da Constituição ao Supremo e
levada essa discussão, ele vai se manifestar. E foi por conta disso, por casos individuais como
esse, que o Supremo deu decisões belíssimas ao longo da historia:

Aquela decisão do racismo vs. Antissemitismo foi no controle difuso. Não foi em ADI e
ADC. Foi em controle difuso.

O problema da lei de crimes hediondos, saber se era inconstitucional impossibilitar a


progressão do regime, foi em controle difuso. Foi com um HC. Não fosse aquele sujeito começar
a discussão, não se resolveria o problema.

Modo de calcular vereador de município. Foi um município do interior de SP, até


pequeno que foi discutindo e chegou ao Supremo e o Supremo disse que a forma de calcular o
número de vereadores estava errada e aí o Supremo faz uma fórmula para calcular vereador de
município que serve para o Brasil todo. As eleições de 2004 foram reestruturadas a partir do
julgamento de um recurso extraordinário proveniente de um pequeno município do interior de
SP. Porque o TSE pegou essa decisão do Supremo, em controle difuso, e editou uma resolução
para regulamentar as eleições de 2004. Aí, entraram com uma ADI contra essa resolução,
dizendo: não pode porque o TSE está legislando. Controle difuso é interpartes. Vale para o
município em questão. O Supremo julgou a ADI e disse o seguinte: O TSE não fez mais do que
a obrigação dele, que foi generalizar o entendimento do Supremo, para que todos se submetam as
mesmas regras.
380
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009

5.4 A REPERCUSSÃO GERAL

Quem não percebe a transformação do nosso sistema em um sistema de precedentes e,


paralelamente a isso, a transformação do controle difuso, não vai entender a repercussão geral no
recurso extraordinário, que é o que vamos estudar agora porque é um instituto criado nesse
contexto histórico. Ora, se o RE de João pode repercutir no Brasil todo, quer dizer, o Supremo
vai examinar uma questão que pode afetar outras pessoas, só permita o exame de RE com
repercussão geral. Ou seja, não admita um RE que não possa repercutir para além do recorrente.
Só admita RE que traga uma questão que pode afetar outras pessoas porque se o sujeito quer
entrar com o RE para uma situação que é só dele, bem peculiar dele, o Supremo não pode parar o
trabalho para poder examinar uma questão individual, daí a exigência de repercussão geral.

E aí o paradoxo. Por isso as pessoas têm dificuldade para entender repercussão geral.
Olhe só: Exatamente porque o recurso de um pode atingir vários existe a repercussão geral. Se o
RE só servisse a João, não tem sentido exigir a repercussão geral. Exigir a repercussão geral do
RE quer dizer: o recurso tem que discutir questão que transcenda o indivíduo, que vá além dele,
há que ser uma questão que transborda o indivíduo, que transborde para além do recorrente.

Atenção: há um presunção constitucional de que RE tem repercussão geral porque discute


matéria constitucional. Em sendo assim, a princípio, tem repercussão geral. Essa presunção
constitucional de que o recurso tem repercussão geral, ela só pode ser afastada com voto de oito
ministros do STF. Só não haverá repercussão geral se oito ministros disserem que não há
repercussão geral. O Supremo tem 11 Ministros. Se 8 disserem que não há repercussão geral, não
há. Vejam que onda: Se sete dos onze disserem que não há repercussão geral, há repercussão
geral. Isso é uma onda! Se sete dos onze disserem isso, há repercussão geral. Por que? Porque é
como se a CF tivesse começado com 4 votos. É como se o constituinte dissesse que tem quatro
votos pela repercussão geral. Então, só não há repercussão geral se 8 disserem. Sete dizendo que
não há, é porque HÁ. Porque O constituinte tem uma carta que vale quatro.

Supremo: Presidente, cinco numa turma e cinco em outra. O RE vai para a turma. Se
chegar na turma do STF, composta por cinco, e quatro dos cinco ministros, disserem que há
repercussão geral na turma, pode-se dizer que há repercussão geral? SIM. Se 4 na turma de cinco
disserem que há, faltam sete. Se outros sete disserem que não há, há. Porque eu já disse que se
sete disserem que não há, há. Consequentemente, se 4 ministros do STF disserem que há
repercussão geral é porque há repercussão geral.

Tendo em vista o que acabei de dizer, vamos examinar o que diz o art. 543-A. O difícil da
repercussão geral é você compreender a mudança do sistema.

Art. 543-A. O Supremo Tribunal Federal, em decisão


irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário, quando a
questão constitucional nele versada não oferecer repercussão
geral, nos termos deste artigo. (Acrescentado pela L-011.418-
2006)

Portanto, a repercussão geral é um requisito de admissibilidade do recurso extraordinário.

§ 1º Para efeito da repercussão geral, será considerada a


existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista

381
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os
interesses subjetivos da causa.

§ 2º O recorrente deverá demonstrar, em preliminar do


recurso, para apreciação exclusiva do Supremo Tribunal Federal,
a existência da repercussão geral.

Isso é muito importante, notadamente do ponto de vista prático. Quer dizer, agora, em
todo recurso extraordinário tem que constar um item intitulado “da repercussão geral”. Será
preciso demonstrar, com a sua argumentação, que aquela questão transcende a sua pessoa, vai
além de você. Se não constar na sua prova de concurso o item repercussão geral, ele nem
examina. Não adianta você batalhar por meio ponto. Escreva mal, mas escreva tudo, escreva mal,
mas coloque seu recurso para ser conhecido porque se nem conhecido vai ser, é zero! Então, tem
que ter lá o item da repercussão geral.

§ 3º Haverá repercussão geral sempre que o recurso


impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudência dominante
do Tribunal.

Esse parágrafo traz um caso de presunção absoluta de repercussão geral. O objetivo é


fazer valer a jurisprudência do STF. Quando isso acontece, se o TJ/BA julga contra decisão do
STF, o STF nem vai discutir se tem repercussão geral ou não porque tem! Decisão que decide
contra decisão do STF, sumulada ou não, tem repercussão geral, presunção absoluta.

§ 4º Se a Turma decidir pela existência da repercussão geral por,


no mínimo, 4 (quatro) votos, ficará dispensada a remessa do
recurso ao Plenário.

O § 4º trata da matemática que eu já disse: Se a turma decidir pela existência da


repercussão geral por, no mínimo quatro votos, fica dispensada a remessa ao plenário. Se quatro
dizem que há, HÁ. Se sete dizem que não há, HÁ e se oito dizem que não há, NÃO HÁ.

Olha como ficou o regulamento da repercussão geral: remeteu ao plenário para decidir se
há repercussão geral ou não. A decisão sobre a existência da repercussão geral é só do Supremo
(só ele pode dar essa decisão). Eu não posso entrar com recurso extraordinário lá embaixo e o
presidente do tribunal dizer que não vai nem mandar subir porque não há repercussão geral. Ele
não pode fazer isso porque quem vai dizer se há repercussão geral é só o Supremo. O que o
Supremo disser, se há ou se não há repercussão geral, vale para todas as situações semelhantes.
Todas. Então, a fixação da tese de que se há repercussão geral vale para todos. Então, se o
Supremo disser que há repercussão geral naquela questão específica, todas terão. Ou seja, todos
os recursos que discutirem aquilo, terão.

E aqui vai uma dica, que tem acontecido no Supremo: Em se tratando de causas
repetitivas, sempre há repercussão geral. Ora, se há múltiplas causas no Brasil discutindo aquela
tese, ora, há repercussão geral, por isso, o altíssimo percentual de repercussão geral que o
Supremo tem admitido. São poucos os recursos que o Supremo não admite como repercussão
geral porque a maior parte é composta de recursos repetitivos. Só que aí, qual é a inteligência do
negócio: é que se o Supremo disser que aquela questão repetitiva tem repercussão geral, o que
ele disser no julgamento de um, vale para todos. Todos de uma vez. Ele vai julgar um? Não. Ele
vai julgar esse um e mais um milhão. Ele vai pegar o processo de João, decidiu que é questão
repetitiva e fixa a tese, vale para todos.

382
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
Remetido ao plenário para fixar a tese da repercussão geral, surge um incidente aí curioso
porque é um incidente que vai fixar a tese que serve para todos os recursos em situação
semelhante. Todos. E por conta disso, nesse incidente (que vai fixar a tese para todo mundo), vai
caber intervenção de amicus curiae. Por conta disso, nesse incidente, intervém o MP porque esse
incidente, rigorosamente, o STF transforma uma ação individual em uma ação coletiva. Ele
transforma uma ação que era de João numa ação que é coletiva.

E tem mais: como são milhares de causas repetitivas, você já pensou se o Supremo
tivesse que reuni-las todas por conexão? Então, o que o legislador fez? Subiu o recurso de João,
remeteu para a fixação da tese, todos os outros recursos que discutem aquele mesmo tema,
travam para a fixação da tese. É uma grande novidade. O recurso de João travou todos os
recursos do Brasil que discutiam esse assunto. E a decisão desse recurso vale para todos. E olhe
que situação curiosa: se o recurso de João foi acolhido, significa que João tem razão e todos os
tribunais que decidiram de maneira contrária estão errados. Se João recorre e ganha e é
inconstitucional a lei, todos os tribunais que diziam que era constitucional, estão errados.

Sabe o que a lei diz? Saiu a fixação da tese, os tribunais podem se retratar. Se a tese for
contrária ao que o tribunal tinha dito, o tribunal pode se retratar. Surge aí um efeito de retratação
que não existia antes. O recurso extraordinário pode gerar retratação do tribunal se, fixada a tese
geral, essa tese for contrária à posição do tribunal. E se não se retratar? Não quer, não se retrate.
O que vai acontecer? O recurso estava parado (porque tinha o recurso modelo lá para ser
julgado), julgou-se o recurso contrariamente à posição do tribunal, o tribunal tinha que se
retratar, não se retratou, o recurso que estava preso, vai subir. Subindo, o que vai acontecer no
STF? Vai ter um carimbo ou algo semelhante a um carimbo: “Tendo em vista a decisão no
recurso de João, número tal, fixou-se a tese tal, portanto, julgo procedente o recurso
monocraticamente.” Sua decisão vai ser revista por um carimbo. Se já fixou a tese e a tese
vincula todo mundo, pelo regimento interno do Supremo, nem distribui esse recurso. Esse
recurso sobre o qual não foi exercido o juízo de retratação, não vai ser nem distribuído. O
presidente do Supremo já vai poder dar provimento monocrático a ele: “Já que fixamos a tese,
dou provimento monocrático.” Como é que você entende repercussão geral se você não sabe a
eficácia de um precedente? Isso é eficácia do precedente. Para todo mundo!

O que aconteceu: O STJ gostou disso. E aí, sem exigir repercussão geral, saiu uma lei que
cria o julgamento por amostragem dos recursos especiais repetitivos. Mesma coisa, só que
agora, em recurso especial, sem exigir repercussão geral. Havendo recursos especiais repetitivos,
você instaura um incidente de fixação de uma tese. Mesma coisa. Tese fixada, vale para todo
mundo. O julgamento dos REsp’s repetitivos segue exatamente o mesmo modelo que eu
especifiquei dos julgamentos extraordinários repetitivos. Copiado. E aí, você começa a fixar
precedentes do STJ com eficácia vinculante para todo mundo. A prática é uma desgraça porque a
galera estava se empolgando com isso. Os advogados, mente do mal, olhe só o que aconteceu.
Isso daí, eu tenho a certeza absoluta que vai ser cobrado. A OI entra com recurso especial para
discutir uma tese lá. O recurso especial da OI é escolhido como recurso que vai ser julgado como
amostra, que vai ser a amostra para poder criar o precedente. Instaura-se um procedimento para
fixar a tese, procedimento dos recursos repetitivos. O advogado da OI diz assim: Desisto do
recurso, quando viu que o recurso ia gerar a tese vinculante porque aí, a OI ia se dar mal porque
ela foi para discutir o problema do consumidor dela, José e pode tomar uma porrada para todos
os milhares de casos em que se discute aquilo. Ela, então, percebendo a rebordosa que poderia
vir, desistiu do recurso. Acabou a brincadeira. Desistindo do recurso, não vão fixar a tese e eu
vou continuar ganhando no varejo. O pessoal do STJ ficaram putos (agora que a gente vai fixar a
tese para resolver o cara vai e desiste??).

Surgiu a seguinte pergunta (de concurso): Escolhido um recurso para ser julgado como
amostra, cabe desistência? Anotem essa pergunta! Sabe o que o STJ disse? Não pode mais
383
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
desistir! O STJ passou o facão, nitidamente. Minha interpretação é a de que, quando acabar a
raiva, vai prevalecer o seguinte: eu recorri, meu recurso foi escolhido para fixação da tese, se eu
quiser desistir dele, eu desisto, mas a tese vai ser fixada. A minha desistência não impedirá a
fixação da tese. Mas ela não pode ser negada, se eu não quero mais discutir aquilo. Eu sou um
indivíduo e não quero mais discutir aquilo. Então, escolhido um recurso como modelo, o sujeito
pode até desistir, mas a tese continuará a ser discutida, independentemente da vontade do
recorrente. A fixação da tese independe da vontade do recorrente. O espírito do STJ está certo: A
fixação da tese independe da vontade do recorrente, mas o recurso dele, depende dele. Ele não
quer mais o recurso dele. O cara fez um acordo! Quer desistir! Não há nenhum a ilicitude nisso,
mas essa desistência não pode impedir que a tese seja fixada porque há várias causas repetitivas
que se discute aquilo. Eu acho que vai prevalecer esse raciocínio, mas por enquanto o STJ afirma
que não se pode desistir de recurso escolhido para servir de amostra.

E aí vem a segunda pergunta: Milhares de recursos ficaram travados nos tribunais. Você
quer pedir o efeito suspensivo a esse que ficou travado. Como vimos que pode pedir efeito
suspensivo a recurso extraordinário, quem é o competente para examinar o pedido de efeito
suspensivo a um recurso extraordinário que ficou travado por conta do julgamento por
amostragem? Decidido o julgamento por amostragem, os recursos ficam travados. Quem julga os
efeitos suspensivos desses recursos? Os tribunais locais. O Supremo entendeu isso. Tem sentido
isso? Não. Só prático. Isso é o contrário do que eu falei. Se o Supremo já examinou os recursos,
eles estão vinculados ao que o Supremo vai dizer e é o supremo que tem que verificar o efeito
suspensivo. Só que, ora, o Supremo não é maluco. Se ele disser que a competência é dele, só vai
fazer isso da vida, daí eles disseram: Você vai pedir efeito suspensivo é lá embaixo. Então,
travado o recurso pelo julgamento por amostragem, o efeito suspensivo é pedido pelo tribunal a
quo. Leiam o art. 543-B e o art. 543-C e leiam também um editorial que tem no meu site sobre
essa desistência nos recursos repetitivos. Um editorial de dezembro do ano passado.

Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento


em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos
termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o
disposto neste artigo. (Acrescentado pela L-011.418-2006)
§ 1º Caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos
representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal,
sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da Corte.
§ 2º Negada a existência de repercussão geral, os recursos sobrestados
considerar-se-ão automaticamente não admitidos.
§ 3º Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos
sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou
Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se.
§ 4º Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo
Tribunal Federal, nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar,
liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada.
§ 5º O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal disporá sobre
as atribuições dos Ministros, das Turmas e de outros órgãos, na análise da
repercussão geral.

Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento


em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos
deste artigo. (Acrescentado pela L-011.672-2008)
§ 1º Caberá ao presidente do tribunal de origem admitir um ou mais
recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao
Superior Tribunal de Justiça, ficando suspensos os demais recursos especiais
até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de Justiça.

384
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
§ 2º Não adotada a providência descrita no § 1º deste artigo, o relator
no Superior Tribunal de Justiça, ao identificar que sobre a controvérsia já existe
jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá
determinar a suspensão, nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos
quais a controvérsia esteja estabelecida.
§ 3º O relator poderá solicitar informações, a serem prestadas no prazo
de quinze dias, aos tribunais federais ou estaduais a respeito da controvérsia.
§ 4º O relator, conforme dispuser o regimento interno do Superior
Tribunal de Justiça e considerando a relevância da matéria, poderá admitir
manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia.
§ 5º Recebidas as informações e, se for o caso, após cumprido o
disposto no § 4º deste artigo, terá vista o Ministério Público pelo prazo de
quinze dias.
§ 6º Transcorrido o prazo para o Ministério Público e remetida cópia
do relatório aos demais Ministros, o processo será incluído em pauta na seção
ou na Corte Especial, devendo ser julgado com preferência sobre os demais
feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus.
§ 7º Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos
especiais sobrestados na origem:
I - terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido
coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou
II - serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese
de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça.
§ 8º Na hipótese prevista no inciso II do § 7º deste artigo, mantida a
decisão divergente pelo tribunal de origem, far-se-á o exame de admissibilidade
do recurso especial.
§ 9º O Superior Tribunal de Justiça e os tribunais de segunda instância
regulamentarão, no âmbito de suas competências, os procedimentos relativos ao
processamento e julgamento do recurso especial nos casos previstos neste
artigo.

Editorial 55
29/12/2008
Os recursos extraordinário e especial, quando têm por objeto uma questão repetitiva em várias causas, serão
submetidos à técnica de julgamento dos arts. 543-B e 543-C, ambos do CPC. Significa que, em casos repetitivos,
um ou alguns dos recursos são escolhidos para julgamento pelo STF ou STJ, ficando os demais sobrestados, no
aguardo de tal julgamento. É o que se chama de julgamento por amostragem. Realizado o julgamento pelo STF ou
STJ, os demais recursos devem ter o mesmo destino daquele que foi destacado para julgamento.
Se, selecionado um recurso para julgamento, quando já pronto para ser levado a debate no órgão do STF ou STJ,
pode o recorrente desistir dele? Em outras palavras, é eficaz a desistência de recurso destacado, por amostragem,
para julgamento? A desistência do recurso, como se viu, produz efeitos imediatos (CPC, art. 158), não
necessitando de homologação judicial, nem de concordância da parte contrária (CPC, art. 501). É dizer: não se
pode, em princípio, rejeitar a desistência, pois não se pede a desistência; simplesmente se desiste e a desistência
produz efeitos imediatos.
Há, contudo, um detalhe a ser observado.
Quando se seleciona um dos recursos para julgamento, instaura-se um novo procedimento. Esse procedimento
incidental é instaurado por provocação oficial e não se confunde com o procedimento principal recursal, instaurado
por provocação do recorrente. Passa, então, a haver, ao lado do recurso, um procedimento específico para
julgamento e fixação da tese que irá repercutir relativamente a vários outros casos repetitivos. Quer isso dizer que
surgem, paralelamente, dois procedimentos: a) o procedimento recursal, principal, destinado a resolver a questão
individual do recorrente; e, b) o procedimento incidental de definição do precedente ou da tese a ser adotada pelo
tribunal superior, que haverá de ser seguida pelos demais tribunais e que repercutirá na análise dos demais
recursos que estão sobrestados para julgamento. Este último procedimento tem uma feição coletiva, não devendo
ser objeto de desistência, da mesma forma que não se admite a desistência em ações coletivas (Ação Civil Pública
e Ação Direta de Inconstitucionalidade, por exemplo). O objeto desse incidente é a fixação de uma tese jurídica
geral, semelhante ao de um processo coletivo em que se discutam direitos individuais homogêneos. Trata-se de
um incidente com objeto litigioso coletivo.
Quando o recorrente, num caso como esse, desiste do recurso, a desistência deve atingir, apenas, o procedimento
recursal, não havendo como negar tal desistência, já que, como visto, ela produz efeitos imediatos, não
dependendo de concordância da outra parte, nem de autorização ou homologação judicial. Ademais, a parte pode,
realmente, precisar da desistência para que se realize um acordo, ou se celebre um negócio jurídico, ou por

385
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 24 – Prof. Fredie Didier – Intensivo I – 11/07/2009
qualquer outro motivo legítimo, que não necessita ser declinado ou justificado. Demais disso, o procedimento
recursal é, como se sabe, orientado pelo princípio dispositivo.
Tal desistência, todavia, não atinge o segundo procedimento, instaurado para definição do precedente ou da tese a
ser adotada pelo tribunal superior. Esse procedimento incidental é, inclusive, instaurado por provocação oficial, o
que revela o interesse público que lhe é subjacente.
Em suma, a desistência não impede o julgamento, com a definição da tese a ser adotada pelo tribunal superior,
mas tal julgamento não atinge o recorrente que desistiu, servindo, apenas, para estabelecer o entendimento do
tribunal, a influenciar e repercutir nos outros recursos que ficaram sobrestados.
Em determinada questão repetitiva, foram selecionados para julgamento no STJ dois casos, contidos nos REsp
1.058.114 e REsp 1.063.343. Em tais casos, o recorrente desistiu dos recursos, mas o STJ negou a desistência. Em
tais casos, o STJ rejeitou a desistência do recurso, não fazendo a distinção ora proposta. Parece mais adequado,
como visto, entender que há revogação do recurso, pela desistência, mas deve realizar o julgamento no tocante ao
procedimento instaurado com a seleção dos recursos para definição da tese pelo STJ.

FIM

386

Você também pode gostar