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O Inferno Somos Nós Mesmos.

A despeito dos discursos manufaturados e aos seus professores, sou contra qualquer tipo de
censura ou controles de conteúdo de discursos - só aquele leve pedido de desculpas, tão
necessários para evitar o súbito apedrejamento virtual do tribunal do FB em tempos de
acirramento de irracionalidades. Peço perdão para ressaltar, no entanto, a inegável
monopolização das comunicações no País. Podemos fazer longa lista de outros atores sociais
desprovidos de voz - que não as poucas famílias detentoras da posse simbólica e efetiva das
principais concessões públicas de rádio e televisão.

Um Quinto Poder é evidentemente presente na manobra de massas. Ele se porta como


professor barato de ciências, detetive, apontador de inimigos (a ausência de heróis é própria
dessa prática), censor e porta o mastro da ética jornalística, enquanto oculta ilegalidades
acorridas entre seus próprios muros privad@s. Deletérios das mais tenebrosas origens e
variantes, transitando entre narcotráfico às oposições sem opositores no imaginário social.
Neste quesito é especialista na manufatura de sonhos, desejos, problemas, epidemias,
satisfações breves, maquiagem de realidades, executa(dor) da alteridade, ser das soluções
milagrosas e instantâneas.

Querem inclusive definir o presente de todos seus ditos ouvidos - Nós. Entre as muitas
soluções instantâneas para vazio existencial, temos a solução milagrosa mainstream media
para executar a alteridade. Incluímos doses diárias de pílulas instantâneas de Banalidade de
vários Males. A Banalidade do Mal autóctone (a Malignidade do Bem da família tradicional
brasileira) é complexa e alimentada por estímulos visuais e verbais constantes recheados de
sequestros, assassinatos, corpos mortos, misoginia, racismo, entre outros. Das formas e
doses mais sutis, embrutecimento sem dor e com sensação de detenção da verdade!

Bandido bom é bandido... (sic)

Utilizam-se abertamente e irrestritamente de comportamento claramente político para


favorecerem aliados ao seu bel prazer. Partiram da mansa promoção do individualismo para
nos persuadirem que o Inferno são os Outros. Acalmem-se, até neste momento histórico, a
internet não permite o total descolamento entre Narrativas e a Realidade. Você não está
sozinho no mundo.

Slash!

Sombras geopolíticas (regando chicote em óleo negro) chibatam a política nacional!


Marchou a Fé domingo passado (seria impossível não vê-la em alta definição, ao menos que
vivas voluntariamente uma experiência de desapego com a televisão). Sessões paradisíacas
VIP com cover do Bon Jovi. Banqueiros trazendo empregada-mucama para ajudar na infra da
família. Performance morador de rua enforcado com Black Face. Bolsomito no Trio Elétrico
conclamando o fim do MEC e sendo subitamente ovacionado pelo público. Os Connected
Revoltados e seu justiçamento linchador dando a palavra do Trio à pessoas vinculadas à
justiça do Paraná. Figuras políticas oportunistas sendo hostilizadas. O bloco do Fora Dilma
distribuindo abadás com dinheiro escuso. Profecias dissonantes. Infraestrutura incomparável
aos protestos quaisquer que sejam – entre os centenas que acontecem e que são unicamente
importantes – sobretudo no quesito exposição e convocação midiática de massas. O que
constela tamanho pesadelo dantesco de sincronicidades no mesmo dia e local sobre a
bandeira do fim da corrupçao?

[A despeito da curiosa ligação dos Connected Revoltados – aquele cujo criador hostilizou o
imigrante haitiano Auguste Lubain lhe dizendo “sociopata haitiano contratado por Lula para
espancar brasileiros que querem o fim dos roubos” - à figuras da justiça curitibana, a política
nacional vem curiosamente se judicializando,]

Apesar da bem paga infraestrutura, e de todos efeitos estimulantes da parafernália; o que unia
os presentes era visualmente exposto: a camiseta da CBF e símbolos nacionalistas. Acreditar
que o sonho da unidade nacional – o prometido pelas narrativas míticas e manufaturadas
após a revolução francesa, semi-consagradas aqui com a transformação do carnaval em
política pública e com o Futebol – estimularia alguém a protestar domingo passado, no atual
contexto político, só me faz pensar na Fé-Cega. Desfilar emitindo discursos breves odiosos
anticorrupção, enquanto porta emblemas da CBF no peito resulta em problema cognitivo
grave. Induzido ou não, só me faz pensar em esquizofrenia e perigo de Faca Amolada.
Mesmo não distribuído uniformemente na população em marcha (não incluímos alguns
indivíduos desprovidos de associação com tais qualidades/atos), reunir violência, arrogância,
analfabetismo político, classismo, racismo, militarismo e sensacionalismo televisivo com ódio
no mesmo espaço não respeita nenhum preceito de lógica fatual.

Ainda assim, não conseguimos descobrir como a marcha poderia se conformar pela Fé-Cega.
Preciso será ressaltar algumas epidemias contemporâneas. Diante da distribuição epidêmica -
não da Zika, já exausta - da ausência da capacidade de visionar-se, de individuação, vemos
emergir um exercício coletivo de apolítica. Pessoas estão desprovidas de capacidade de ver-
se a si mesmo na política. A redução da política à identificação com uma manufatura
ideológica fez surgir esperanças de milagres na morte do semi-deus-pai traidor, o partido-
corrupção-único e sua grande jararaca paterna. Meio Deus, porque a maioria ali presente até
então só participou politicamente pelo voto. A identificação estética da pulsão de paixão-morte
dobre Lula o dignifica - Lucifer é um anjo caído - no inconsciente de quem mais o despreza.
Crença, crionça, criança, crença, crionça, criança...

Entretanto, a Fé fundamentalista respinga amarga em sonhos de um mundo absoluto e


seguro de incertezas. Por isso existe o Inferno, lá se deposita tudo aquilo que não queremos
aceitar em nós mesmos, incluindo o inaceitável pelo qual nos identificamos e julgamos
inconscientemente parte de nós. Felizes estão aqueles julgando saber como erradicar a
corrupção do Brasil de forma instantânea. Ainda, sem mesmo se questionarem uma única vez
sobre a corrupção na cultura. Mata-se a Jararaca – como quem segue o impulso de morte a
destruir sua fonte de prazer edipiana. Crucifica-se e resolve-se. Linchamos o PT e seremos
justos com a nação brasileira. Não, julguem todos os corruptos (mas degolem o que mais
desprezamos)! A Malignidade do Bem, inconsciente salvadora. A Faca Amolada é mais do
que útil contra o inimigo-outro.

Alteridade morta...

O Inferno são os Outros.

Como abrir diálogo com o fundamentalismo manufaturado?

A hostilização de Aécio e Alckmin foi festejada por muitos. Sinceramente, apesar de uma
breve e primitiva sensação de justiçamento por vê-los enfim julgados por alguém, fiquei triste.
Quero justiça, não justiçamento. ‘A justiça não os julgou, então o próprio povo que linche’ –
isso é errado. A Justiça existe para seguir preceitos e normas que devem ser respeitadas.

Para uma massa apolítica só consigo vislumbrar a abertura de portas ao facismo


generalizado, ou outra ideologia autoritária da matiz que seja. A polarização atual é inútil para
ajudar a compreender a dimensão das tensões políticas e beira um fruto de Lacerdismo meia-
boca. A falsa dualidade política nacional deu ignição à chama do ódio - alimentada pelo
combustível da preguiça ideológica da maioria desinteressada em ir além (de seus privilégios).
Impulsionar a reunião de Fé-Cega e Faca Amolada para a execução política de quem quer
que seja, parece-me incompatível com preceitos democráticos básicos. Só serve a alimentar
ainda mais a vontade de ver sangue derramado, de desrespeitar a democracia, entre outros
males banalizados adicionados à lista.

A escalada da violência política e fundamentalismo ideológico já é fato. Quem vai ser o novo
Pai dessa multidão ressentida? Tenho nenhuma esperança numa hipnose coletiva induzindo
autocríticas. Domingo passado amolaram a Faca. Resta observar se o inferno irá de encontro
finalmente à vida desses indivíduos que o negam – e que possam colocar o óculos que lhes
permita ver as ideologias por traz dos discursos e atos. Ou se ele transbordará em Facas
desembainhadas sobre a vida de todos nós...

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