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Revista Brasileira de Ensino de Fı́sica, v. 37, n.

1, 1304 (2015)
www.sbfisica.org.br
DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-11173711645

Equivalência entre a mecânica quântica


e a mecânica quântica PT simétrica
(Equivalence between quantum mechanics and pt symmetric quantum mechanics)

David Girardelli, Eduardo M. Zavanin1 , Marcelo M. Guzzo


Instituto de Fı́sica Gleb Wataghin, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brazil
Recebido em 5/8/2014; Aceito em 17/9/2014; Publicado em 31/3/2015

Este artigo traz uma discussão a respeito da mecânica quântica PT simétrica, desenvolvendo alguns elementos
básicos dessa teoria. Em um caso simples de sistema de dois nı́veis, desenvolvemos o problema da braquistócrona
quântica. Comparando os resultados obtidos entre a mecânica quântica PT simétrica e aqueles obtidos usando
o formalismo padrão, conclui-se que a nova abordagem não é capaz de revelar nenhum fenômeno novo.
Palavras-chave: simetria PT, braquistócrona quântica, mecânica quântica não hermitiana.

In this paper we develop a discussion about PT symmetric quantum mechanics, working with the basic ele-
ments of this theory. In a simple case of a two-body system, we developed the quantum brachistochrone problem.
Comparing the results obtained through the PT symmetric quantum mechanics with the ones obtained using
the standard formalism, we conclude that this new approach is not able to reveal any new effect.
Keywords: PT symmetry, quantum brachistochrone, non-hermitian quantum mechanics.

1. Introdução hamiltonianas com o intuito de encontrar peculiarida-


des na mecânica quântica PT simétrica, que possivel-
É comum em mecânica quântica definirmos a hamilto- mente explicariam fenômenos fı́sicos ainda não entendi-
niana que descreve a evolução temporal dos estados de dos [1–7]. Na Ref. [8], Mostafazadeh generalizou o con-
maneira hermitiana (H = H † ). Esta imposição garante ceito de simetria PT, encontrando relações gerais nas
que os autovalores correspondentes a H e, portanto, quais matrizes não hermitianas possuı́ssem autovalores
os nı́veis de energia dos sistema, sejam reais. Tal im- reais, definindo isso como pseudo hermiticidade.
posição garante a evolução unitária do sistema que, por No presente artigo, vamos desenvolver elementos
sua vez, implica que as probabilidades derivadas dessa da mecânica quântica PT simétrica, obtendo opera-
hamiltoniana sejam preservadas. dores básicos para essa teoria. Além disso, vamos
No entanto, apesar da condição de hermiticidade ser analisar a Braquistócrona Quântica sob o ponto de
uma condição suficiente para se obter autovalores reais, vista da mecânica quântica usual e da PT simétrica
ela não é necessária. É possı́vel construir uma teoria [9–11]. Através dessa análise, podemos ser induzidos
quântica com hamiltonianas que, apesar de não serem a acreditar em comportamentos anômalos, que geram
hermitianas, possuam autovalores reais, provendo uma transições infinitamente rápidas entre estados quânticos
evolução unitária para o sistema. [11], vamos entender esse fenômeno e identificar que
O estudo desse tipo de hamiltonianas começou essa transição rápida se dá devido a uma interpretação
em 1998 com Bender e Boetcher [1], que propu- equivocada dos estados quânticos.
seram a substituição da condição de hermiticidade
por uma condição análoga, chamada de simetria PT,
P T H(P T )−1 = H, (neste contexto P se refere ao ope- 2. Mecânica quântica usual
rador paridade enquanto T se refere ao operador re-
flexão temporal) que garantia que os nı́veis de energia A mecânica quântica pressupõe alguns pontos im-
do sistema se mantivessem reais. Após a publicação portante que vamos recordar. Em seguida, iremos
deste artigo seminal, outros relacionados a este tema compará-los com aqueles da mecânica quântica PT
foram desenvolvidos, estudando uma série de diferentes simétrica.
1 E-mail: zavanin@gmail.com; zavanin@ifi.unicamp.br.

Copyright by the Sociedade Brasileira de Fı́sica. Printed in Brazil.


1304-2 Girardelli et al.

1. Autofunções e autovalores 3. Produto interno e ortonormalidade das auto-


funções
As energias e os estados acessı́veis do sistema,
são obtidos através das soluções da equação de O produto interno para mecânica quântica usual
Schrödinger é definido por

H|ψ⟩ = i~
∂|ψ⟩
. (1) ∫
∂t ⟨ψ|ψ⟩D ≡ [ψ(x)]† ψ(x)dx. (10)
Para o caso particular onde a hamiltonia H não
seja dependente do tempo, podemos resolver a Neste artigo o ı́ndice D será sempre designado a
Eq. (1), obtendo operações utilizando o produto interno de Dirac

comum na mecânica quântica padrão.
−i
|ψ(t)⟩ = e ~ Hdt
|ψ⟩, (2) A ortonormalidade é obtida quando todos autoes-
tados quânticos da hamiltoniana possuem norma
|ψ(t)⟩ = U |ψ⟩, (3) unitária e o produto interno entre dois autoesta-
dos distintos é nulo,
onde U é denominado operador

de evolução tem-
−i
poral, definido por U ≡ e ~ Hdt . ⟨ψm |ψn ⟩D = δmn . (11)

2. Completeza 4. Unitariedade
A Completeza oferece uma maneira de represen- Seja um estado genérico |χ⟩. Utilizando a hermiti-
tar qualquer estado como uma combinação li- cidade de H (H † = H), e que a evolução temporal
near de autoestados que formam uma base para de um sistema quântico é descrita pela Eq. (3),
o espaço podemos calcular a norma da evolução temporal
de |χ⟩,



[ψn (y)]† ψn (x) = δ(x − y), (4) ⟨χ(t)|χ(t)⟩D = ⟨χ|U † U |χ⟩D = ⟨χ|χ⟩D = 1. (12)
n=0

∑ A Eq. (12) nos mostra que, independentemente
[⟨y|ψn ⟩D ]† ⟨x|ψn ⟩D = δ(x − y), (5) da evolução temporal de um estado quântico, a
n=0

norma deste é sempre preservada.

⟨ψn |y⟩D ⟨x|ψn ⟩D = ⟨x|I|y⟩D , (6) Da mesma forma que em mecânica quântica usual,
n=0
enunciaremos pontos importantes da mecânica quântica
onde utilizamos a notação ψn (x) = ⟨x|ψn ⟩D . PT simétrica.
Note que na Eq. (6), ⟨ψn |x⟩D e ⟨y|ψn ⟩D são es-
calares e, portanto, podem trocar de lugar dentro 3. Mecânica quântica PT simétrica
do somatório
1. Autofunções e autovetores
Os autovalores e autovetores obtidos para

∑ mecânica quântica PT simétrica também são pro-
⟨x|ψn ⟩D ⟨ψn |y⟩D = ⟨x|I|y⟩D , (7) venientes da solução da equação de Schröedinger
n=0

onde, nesse caso, o operador H na Eq. (1) é com-
∑ posto por uma hamiltoniana PT simétrica. No
|ψn ⟩⟨ψn | = I, (8)
n=0
que diz respeito a evolução temporal de um sis-
tema quântico, na simetria PT, também é pos-
tulada a equação de Schrodinger, descrita pela
ou, multiplicando por |χ⟩ pela direita Eq. (1).

∑ 2. Completeza
|ψn ⟩⟨ψn |χ⟩D = |χ⟩, (9) A relação de completeza para a mecânica quântica
n=0
PT simétrica se apresenta da seguinte maneira,
que deixa claro que um estado genérico |χ⟩ pode
ser representado por uma combinação linear de ∞

autoestados |ψn ⟩, com os devidos coeficientes (−1)n ψn (x)ψn (y) = δ(x − y). (13)
⟨ψn |χ⟩D . n=0
Equivalência entre a mecânica quântica e a mecânica quântica PT simétrica 1304-3

Essa relação nada intuitiva foi testada numerica- energia negativa. Este problema foi resolvido pos-
mente e analiticamente [12, 13] para uma certa tulando a existência de antipartı́culas, de forma
classe de teorias desenvolvidas na Ref. [14], toda- que partı́culas e antipartı́culas se relacionavam
via, uma prova matemática da mesma pode ser através de um operador, denominado conjugação
encontrada na Ref. [15]. de carga (C). Analogamente, para toda hamilto-
niana PT simétrica há uma simetria que relaciona
3. Produto interno e ortonormalidade das auto- cada estado de norma negativa a outro com norma
funções positiva e, denominaremos este operador como C.
O produto interno no caso hermitiano é descrito Note que C e C não possuem o mesmo significado.
pela Eq. (10). Para o caso da simetria PT, a C conecta antipartı́culas com partı́culas no con-
definição de produto interno não é igual ao caso texto de teoria quântica de campos enquanto que
padrão. Uma possı́vel abordagem para construir C conecta estados de normas negativas com esta-
o produto interno seria partir da transformação dos de normas positivas, no contexto de mecânica
H P T = H, sendo que H P T designa a operação quântica PT simétrica, onde estamos lidando com
H P T = P T (H)(P T )−1 . Similarmente ao produto a equação de Schrödinger, que descreve a função
interno de Dirac, o produto interno não hermiti- de onda de apenas uma partı́cula. Em mecânica
ano consiste em substituir a operação transposto quântica PT simétrica, C pode ser definido como
conjugado (†), pelo operador paridade-reversão soma sobre todas as autofunções normalizadas da
temporal (P T ), desta maneira definimos o pro- hamiltoniana,
duto interno P T como


C(x, y) = ψn (x)ψn (y). (18)

n=0
⟨ψn |ψm ⟩P T = [ψn (x)]P T ψm (x)dx, (14)
∫ Para entender como o operador C incrementa o
fator (−1)n , podemos aplicá-lo a uma autofunção
⟨ψn |ψm ⟩P T = [P T ψn (x)]ψm (x)dx, (15)
ψn (x)

⟨ψn |ψm ⟩P T = ψn (−x)∗ ψm (x)dx. (16) ∫ ∫
⟨x|C|ψn ⟩ = ⟨x|C|y⟩⟨y|ψn ⟩dy = C(x, y)ψn (y)dy,
Uma vez que ψn (x) e ψm (x) são autoestados e (19)

soluções independentes da Eq. (1) com autovalo- onde, na última passagem utilizamos |y⟩⟨y|dy =
res distintos, o produto interno entre elas é nulo I, uma vez que |y⟩ são autofunções do opera-
sempre que n ̸= m. dor posição y, que é hermitiano, as relações de
Diferentemente do esperado, a norma dos estados completeza são exatamente iguais àquelas utili-
ψn (x)s é ligeiramente diferente, e é definido da zadas em mecânica quântica usual. Utilizando a
seguinte maneira: Eq. (19) juntamente com Eq. (18)

∫ ∞ ∫

⟨ψn |ψn ⟩P T = ∗
ψn (−x) ψn (x)dx = (−1) . (17)n ⟨x|C|ψn ⟩ = ψm (x)ψm (y)ψn (y)dy, (20)
m=0
∑∞ ∫
(−1)m
Essa relação também é verificada numericamente ⟨x|C|ψn ⟩ = ψm (x)ψm (y)ψn (y)dy, (21)
nas Refs. [12, 13]. m=0
(−1)m

Como conclusão imediata vemos que há esta- usando a relação de completeza (13), para as
dos que possuem norma negativa (n ı́mpares) e funções ψm
também há estados que possuem norma positiva
(n pares). ∫
1
Para sanar o problema referente às normas nega- ⟨x|C|ψn ⟩ = δ(x − y)δm,n ψm (y)dy, (22)
tivas é necessário a introdução de um novo opera- (−1)m
dor. Este operador terá matematicamente o ob- ⟨x|C|ψn ⟩ = (−1)n ψn (x), (23)
jetivo de incrementar um fator na Eq. (27) que C|ψn ⟩ = (−1)n |ψn ⟩. (24)
cancele o termo (−1)n . O problema aqui apre-
sentado é muito similar ao que Dirac se deparou Definido o operador C, podemos criar um produto
ao formular a equação de onda espinorial em te- interno, da mesma maneira que criamos o pro-
oria quântica relativı́stica onde, para cada estado duto interno PT, mas agora utilizando a condição
com energia positiva, havia um outro estado com H CP T = H,
1304-4 Girardelli et al.

4. Hamiltoniana PT simétrica

⟨ψn |ψn ⟩CP T = [ψn (x)]CP T ψn (x)dx, (25) 4.1. Autoestados

⟨ψn |ψn ⟩CP T = [CP T ψn (x)]ψn (x)dx. (26) Para entendermos melhor a mecânica quântica PT
simétrica, vamos desenvolver os elementos básicos dessa
onde teoria para o caso do sistema de dois nı́veis.
Seja M a matriz quadrada de ordem 2
[ ]
⟨ψn |ψm ⟩CP T = δnm . (27) α β
M= , (35)
γ θ
E, portanto, o produto interno entre os estados
é positivo definido, desaparecendo o problema de com α, β, γ e θ ∈ C. Calculando os autovalores λ desta
normas negativas. matriz
[ ]
4. Unitariedade α−λ β
detM = det = 0. (36)
Para verificar a unitariedade notamos que γ θ−λ
H P T = P T H(P T )−1 = H, (28)
e, usando a equação de Schrödinger (α − λ)(θ − λ) − γβ = 0,
d λ2 − λ(α + θ) − γβ = 0,
i |ψ(t)⟩ = H|ψ(t)⟩, (29) √
dt (α + θ) ± (α + θ)2 + 4γβ
λ= . (37)
aplicando P T pela esquerda e utilizando que 2
(P T )−1 P T = I, onde I é o operador identidade,
obtemos Como queremos sentido fı́sico para essa hamilto-
nina, precisamos que seus autovalores λ sejam reais.
d
− i P T |ψ(t)⟩ = P T H(P T )−1 P T |ψ(t)⟩, (30) Para isso, devemos respeitar as condições
dt
utilizando a Eq. (28)
d (α + θ) ∈ R, (38)
−i P T |ψ(t)⟩ = H P T P T |ψ(t)⟩, (31) (α + θ)2 + 4γβ ∈ R+ . (39)
dt
e, usando que para o caso de PT simetria ⟨ψ(t)| =
Para garantir a relação (38), definimos que α =
(P T |ψ(t) >)t , onde t é referente a operação trans-
a + i.b com a e b ∈ R e θ = c + i.d com c e d ∈ R,
por usual de cálculo matricial, transpondo dos
deste modo: d = −b.
dois lados da Eq. (31), obtemos
Para garantir a condição dada pela Eq. (39) é ne-
d cessário que o produto γβ ∈ R+ . Uma das maneiras
−i ⟨ψ(t)| = ⟨ψ(t)|H P T . (32)
dt de satisfazer todas as condições impostas é supor que
Para estudar a unitariedade, queremos analisar a γ = β = s, α = reiψ e θ = re−iψ com s, r e ψ ∈ R.
evolução da norma ⟨ψ(t)|ψ(t)⟩P T e, portanto Desta maneira, Imα = −Imθ.
Substituindo em M a parametrização encontrada,
d d
⟨ψ(t)|ψ(t)⟩P T = ⟨ψ(t)| |ψ(t)⟩P T + (33) obtemos a matriz não hermitiana HN H
dt [ dt ]
d [ ]
⟨ψ(t) |ψ(t)⟩P T , r.eiψ s
HN H = . (40)
dt s r.e−iψ
utilizando as Eqs. (32) e (29), obtemos
Por construção, esta matriz possui autovalores reais,
d ϵ+ e ϵ− que são dados por
⟨ψ(t)|ψ(t)⟩P T = −i[⟨ψ(t)|H|ψ(t)⟩P T − (34)
dt
⟨ψ(t)|H P T |ψ(t)⟩P T ] = 0, √
ϵ± = r cos ψ ± s2 − r2 sen2 ψ. (41)
e, portanto, vemos que a norma dos vetores não
muda com a evolução temporal, o que nos garante Note que é explicitamente necessário que para ϵ ser
a unitariedade. real, r seja menor ou igual a s. Isto permite definir
Após implementados estes conceitos, iremos agora um ângulo α que satisfaz (r/s)senψ = senα. Reescre-
aplicar estas ideias a uma hamiltoniana não her- vendo os autovalores em termos desse novo parâmetro,
mitiana 2x2. obtemos
Equivalência entre a mecânica quântica e a mecânica quântica PT simétrica 1304-5

Devido a isto, o operador T também é comumente


denominado operador de conjugação complexa.
ϵ+ = r cos ψ + s cos α, (42)
ϵ− = r cos ψ − s cos α. (43) 2. Operador Paridade P : Reflexão espacial
O operador P é um operador gerador de reflexões
Os autovetores não normalizados obtidos por estes
espaciais, dadas pela transformação: ⃗x → −⃗x,
autovalores são dados por
onde ⃗x, é o vetor posição.
[ iα ]

→ e2 Usando a relação de completeza descrita por (13)
ϵ+ = −iα . (44) e, relembrando que ⟨x|P |y⟩ = ⟨x| − y⟩ = δ(x + y),
e 2
[ ] podemos escrever o operador paridade para o caso
−iα

→ ie 2 de simetria PT da seguinte maneira
ϵ− = iα . (45)
−ie 2


Note que, se usarmos a definição de produto interno
de Dirac, estes vetores não são ortogonais, mesmo sendo P = (−1)n ψn (x)ψn (−y) = δ(x + y), (50)
n=0
autoestados da hamiltoniana
que pode ser escrito em sua representação matri-
⟨ϵ± |ϵ∓ ⟩D ̸= 0, (46) cial, usando a completeza (13), conforme
⟨ϵ± |ϵ± ⟩D ̸= 1. (47) ∞

Assim, se faz necessário redefinir este produto I= (−1)n |ψn ⟩⟨ψn |. (51)
através da imposição das matrizes CP T . n=0
Aplicando P pela direita,
4.2. Operadores


Redefinir o produto interno com respeito a simetria PT, P = (−1)n |ψn ⟩⟨ψn |P. (52)
pode trazer algumas complicações, principalmente de- n=0
vido a existência de arbitrariedades na escolha das ma-
Lembrando que ⟨ψn | é o conjugado PT simétrico
trizes envolvidas. Uma boa referência para este tipo
do estado, ou seja, ⟨ψn | = (P T |ψn >)t , sendo
de problema pode ser encontrada em [16]. No entanto,
t o sı́mbolo de transposto e, usando o fato que
nesse artigo, vamos desenvolver uma abordagem bem
(AB)t = B t At e também que P t P = I, podemos
simples afim de se obter os operadores para o caso de
escrever
matrizes 2x2.
As matrizes C, P , T , necessárias para a construção
do produto interno devem satisfazer as condições que ∞

serão enumeradas a seguir P = (−1)n |ψn ⟩(T |ψn ⟩)t , (53)
n=0
1. Operador T : Reversão temporal
P = (−1)|ϵ− ⟩(T |ϵ− ⟩)t + |ϵ+ ⟩(T |ϵ+ ⟩)t , (54)
O operador T é conhecido na mecânica quântica
P = (−1)|ϵ− ⟩(|ϵ− ⟩∗ )t + |ϵ+ ⟩(|ϵ+ ⟩∗ )t . (55)
usual, especialmente em teoria de campos. A
função do operador T é trocar o sinal dos ele-
Note que para obter os operadores P e C é ne-
mentos que possuam o número imaginário i em
cessário definirmos os vetores normalizados |ϵ+ ⟩ e
sua estrutura.
|ϵ− ⟩, deste modo,

T |ϕ⟩ = |ϕ∗⟩. (48)


Assim o operador T é o responsável pela trans- |ϵ+ ⟩ = aϵ⃗+ , (56)
formação i → −i em objetos que o sucedem. Uma |ϵ− ⟩ = bϵ⃗− , (57)
maneira intuitiva de entender o que ocorre é lem-
com a e b sendo constantes reais, sem perda de
brar do operador de evolução temporal U descrito
generalidade. Substituindo os valores dos autoes-
pela Eq. (12). Aplicar uma transformação de re-
tados normalizados na Eq. (55), temos como re-
versão temporal (t → −t) neste operador é equi-
sultado o operador P em função dos parâmetros
valente a apenas conjugá-lo,
aeb
[ ( )] ( )
−iHt iH ∗ t [ ]
T U = T exp = exp = U ∗. a2 − b2 b2 e−iα + a2 eiα ,
~ ~ P = 2 −iα . (58)
(49) a e + b2 eiα a2 − b2
1304-6 Girardelli et al.

3. Operador C
Para se obter a representação matricial do operador C, utilizamos a Eq. (18).


C= |ψn ⟩⟨ψn |, (59)
n

C= |ψn ⟩(P T |ψn ⟩)t , (60)
n
C = |ϵ− ⟩(P |ϵ− ⟩ ) + |ϵ+ ⟩(P |ϵ+ ⟩∗ )t .
∗ t
(61)

Usando o mesmo procedimento para o fator de normalização realizado em P , segue que


[ ]
a4 − b4 + ia2 b2 sin(2α) a4 eiα + b4 e−iα ,
C=2 . (62)
a4 e−iα + b4 eiα a − b4 − ia2 b2 sin(2α)
4

Com os operadores P e C em função dos parâmetros a e b, finalmente definimos a operação CP T e, portanto, a


construção de nosso produto interno é dado pela Eq. (26).

5. Normalização CPT
16a8 cos4 α = 1, (68)
Sejam |ϵ+ ⟩ e |ϵ− ⟩ os autoestados normalizados dos ve-
logo,
tores ϵ⃗+ e ϵ⃗− , respectivamente.
Como |ϵ+ ⟩ e |ϵ− ⟩ são autoestados da hamiltoniana 1
PT simétrica, eles são ortonormais com respeito a CP T . a= √ . (69)
2 cos α
Desta maneira, os estados devem satisfazer as condições
Deste modo os operadores P e C normalizados são
de ortonormalidade
dados por
[ ]
1 i sin α 1
⟨ϵ∓ |ϵ∓ ⟩CP T = 1, (63) C= . (70)
cos α 1 −i sin α
⟨ϵ± |ϵ∓ ⟩CP T = 0. (64) [ ]
0 1
Destas condições podemos calcular explicitamente P = . (71)
1 0
os parâmetros a e b. Aplicando a Eq. (26) a condição
E, finalmente, os autoestados normalizados são dados
(64), segue que
por
[ iα ]
1 e2
− 16a3 (a − b)b3 (a + b) cos2 α sin α = 0. (65) |ϵ+ ⟩ = √ −iα , (72)
2 cos α e 2
Na Eq. (65), sabemos que α é um parâmetro livre [ −iα
]
da hamiltoniana e pode assumir qualquer valor, além 1 ie 2
|ϵ− ⟩ = √ −iα , (73)
disso, os parâmetros a e b, não podem ser nulos, pois 2 cos α −ie 2
assim |ϵ∓ ⟩ seriam nulos e não formariam uma base orto-
onde os operadores normalizados obedecem as seguintes
gonal. Deste modo, as únicas maneiras de se satisfazer
regras de comutação
a Eq. (65) são dadas por

C 2 = I, (74)
(a + b) = 0 ⇔ b = −a, (66)
[C, H] = 0, (75)
(a − b) = 0 ⇔ b = a. (67)
[C, P T ] = 0. (76)
Nota-se que, tanto a escolha da solução da Eq. (66) É importante ressaltar que vetores que eram ortogo-
ou da Eq. (67), irá gerar o mesmo resultado, pois nais com respeito ao produto interno de Dirac, descrito
os operadores em questão dependem apenas de fatores pela Eq. (10), podem não ser ortogonais com respeito a
quadráticos e quárticos destes parâmetros. Isto sem- esse novo produto interno, como por exemplo os estados
pre mantém uma ambiguidade em relação ao sinal dos |ν1 ⟩ e |ν2 ⟩,
parâmetros. Assim, sem perda de generalidade, esco-
[ ]
lhendo a = b, positivos, e aplicando este resultado na 1
Eq. (63), segue que |ν1 ⟩ = , (77)
0
Equivalência entre a mecânica quântica e a mecânica quântica PT simétrica 1304-7

[ ] Aplicando esta evolução temporal ao estado |ν1 ⟩,


0 sucede que
|ν2 ⟩ = . (78)
1
Estes estados são evidentemente ortogonais com −itr cos θ [ ]
−iHN H t e ~ ωt
cos( 2~ − α)
respeito ao produto interno convencional, dado que: e ~ |ν1 ⟩ = . (85)
cos α −isen( 2~
ωt
)
⟨ν1 |ν2 ⟩D = 0. Entretanto, para o produto CP T temos
o seguinte cálculo Queremos calcular o tempo que o estado |ν1 ⟩ de-
mora para evoluir até o estado |ν2 ⟩ e, portanto, equa-
cionamos
⟨ν2 |ν1 ⟩CP T = (CP T |ν2 ⟩)t |ν1 ⟩ = −i. tan α. (79) [ ] [ ]
2~ − α)
cos( ωτ
=
0
. (86)
Se α ̸= h.π com h ∈ Z, tan α ̸= 0 e, portanto, os −isen( ωτ2~ ) 1
estados |ν1 ⟩ e |ν2 ⟩ não são mais ortogonais e dependem
Deste modo, com n ∈ N, o tempo de transição τ é
explicitamente do parâmetro α da hamiltoniana.
dado por

6. Evolução temporal ωτ π
− α = + n.π, (87)
2~ 2
A hamiltoniana estudada por [11] se apresenta como ca- ωτ π
paz de obter um comportamento anômalo com respeito = α + + n.π, (88)
2~ 2
a transição de estados, segundo os autores, é possı́vel 2~(α + π2 + n.π)
obter uma transição de maneira mais rápida do que no τ= . (89)
ω
caso da mecânica quântica usual.
Para entender melhor este fenômeno, vamos deta- Note que o menor tempo possı́vel é alcançado
lhar os raciocı́nios desenvolvidos em [11]; afim de rela- quando o natural n é nulo e, portanto, o tempo oti-
cionar a mecânica quântica usual com a PT simétrica, mizado para o processo é dado por τ ∗ = τ (n = 0)
vamos calcular o tempo de transição entre os estados ~(2α + π)
nas duas situações. O cálculo do tempo mı́nimo de τ∗ = . (90)
ω
transição entre estados é o famoso problema da bra-
quistócrona quântica. Se tomarmos o limite em que α → −π/2, na
Usando a equação de Schrödinger para governar a Eq. (90), é possı́vel obter um tempo de transição in-
evolução temporal do sistema, que possui como hamil- finitesimalmente pequeno entre o estado |ν1 ⟩ e o estado
toniana a matriz HN H , e supondo que os parâmetros α, |ν2 ⟩.
β, γ e θ não dependam do tempo, a evolução temporal Podemos ainda calcular a distância entre esses dois
de um estado genérico |ϕ⟩ é dada por vetores, lembrando que o produto escalar entre dois es-
tados normalizados é relacionado com o ângulo entre
|ϕ(t)⟩ = e
−iHN H t
~ |ϕ⟩, (80) eles. Para calcular a distância angular entre |ν1 ⟩ e |ν2 ⟩,
é necessário primeiramente normalizá-los com respeito
conforme descrito pela Eq. (12). a CP T . Este procedimento é análogo ao realizado para
Como estamos trabalhando com matrizes 2x2, po- os autoestados |ϵ+ ⟩ e |ϵ− ⟩, conforme a condição de nor-
demos expandir a hamiltoniana em termos das matrizes malização (63).
de Pauli Deste modo os estados |v1′ ⟩ e |v2′ ⟩ normalizados são
[ ]
0 1 √
σ1 = , (81)
1 0 |v1′ ⟩ = cos α|v1 ⟩, (91)


[ ] |v2 ⟩ = cos α|v2 ⟩. (92)
0 −i
σ2 = , (82)
i 0 Com isso, seja |u⟩ e |v⟩, dois estados normalizados
[ ] quaisquer, assim
1 0
σ3 = , (83)
0 −1
⟨u|v⟩ = cos β, (93)
e da Identidade, afim de calcular o termo exponencial.
Assim a hamiltoniana pode ser descrita da seguinte ma- β = arccos |⟨u|v⟩CP T |, (94)
neira onde β é a distância angular entre os estados |u⟩ e |v⟩.
1 E, portanto, a distância angular entre os estados
H = (r cos θ)I + ω⃗σ .⃗ µ, (84) |v1′ ⟩ e |v2′ ⟩ é dada por
2
onde ω representa a diferença de energia dos dois auto-
estados (ϵ+ − ϵ− ) e µ
⃗ = ω2 (s, 0, ir sin θ). βP T = arccos |⟨v1 ′|v2 ′⟩CP T | = arccos(| sin α|). (95)
1304-8 Girardelli et al.

É interessante frisar que quando o tempo de E então, como conclusão, se comparamos um estado
transição vai a 0 (τ ∗ → 0), β → 0. Ou seja, a distância |ϕi ⟩ = (1, 0)t com um estado |ϕf ⟩ = (a, b)t = (0, 1)t
entre os estados se torna pequena, produzindo vetores (lembre-se que |a|2 + |b|2 = 1 e se b → 0, a → 1), vemos
praticamente paralelos. Isto deve-se ao fato de que es- que o tempo de transição entre 2 estados ortogonais não
tes dois vetores não são mais ortogonais com respeito pode ser maior que
ao produto interno da simetria PT, dependendo expli-
citamente do parâmetro α da hamiltoniana. ~π
tf = . (104)
Vamos também refazer esses cálculos para uma ha- ω
miltoniana hermitiana, para efeitos de comparação. Note que o tempo de transição depende explicita-
Seja HH uma hamiltoniana geral hermitiana, encon- mente do estado final, Eq. (103). Escolhendo o estado
trada de maneira análoga a hamiltoniana HN H . final como |ϕf ⟩ → (1, 0)t , temos que b → 0, e segundo
[ ] a Eq. (102), segue que t → 0.
s r.eiψ
HH = . (96) Assim como o realizado para o caso não hermiti-
r.e−iψ u
ano, podemos calcular a distância entre os estados,
Nesta hamiltoniana a diferença de energia entre seus |ϕi ⟩ = (1, 0)t e |ϕf ⟩ = (a, b)t
dois estados ortonormais é dada por ω ′

ω′ = (s − u)2 + 4r2 . (97) βh = arccos(| < ϕi |ϕf > |) = arccos (|a|). (105)

Expandindo a hamiltoniana em termos das matrizes E então, quando calculamos o tempo de transição
de Pauli, exatamente como o realizado para a matriz entre estados para o caso da mecânica quântica PT
HN H , obtemos simétrica (40), notamos que quando o parâmetro α
tendia a −π/2 (α → −π/2), obtı́nhamos um tempo
1 1
HH = (s + u)⃗1 + ω ′⃗σ .⃗n, (98) de transição t tendendo a 0 (t → 0), enquanto que,
2 2 quando o parâmetro α tendia a 0 (α → 0), obtı́nhamos
onde, ⃗n = ω2′ (r cos ψ, −r sin ψ, s−u
2 )
um tempo de transição t tendendo a ~π/ω (t → ~π/ω).
Supondo que o estado inicial seja dado por |ϕi ⟩ = Para o caso da hamiltoniana hermtiana, (96), quando
(1, 0)t (Aqui t também se relaciona a operação trans- nosso parâmetro b vai a 0 (b → 0), o tempo de transição
por), a evolução do sistema pode ser descrita conforme t também vai a 0 (t → 0), no entanto, quando o
a Eq. (1) parâmetro b tende a 1 (b → 1), o tempo de transição
( ) t tende a ~π/ω ′ (t → ~π/ω ′ ). E através disso pode-
a mos entender o que está acontecendo com os estados,
exp[−iHt/~]|ϕi >= , (99)
b no caso de simetria PT, quando α → −π/2, os estados
são praticamente degenerados, uma vez que
onde, uma vez que a evolução é unitária, |a|2 + |b|2 = 1.
E então

|v1′ ⟩ = cos α|v1 ⟩, (106)
( ) ( ) √
a

cos( ω2~t ) − i s−u ω′ t |v2′ ⟩ = cos α|v2 ⟩, (107)
= e−i(s+u)t/(2~) ω′′ sin( 2~ ) .
b −i ω2r′ sin( ω2~t )e−iψ
|v1′ ⟩ ≈ |v2′ ⟩ e por isso βP T → 0 e, portanto, espe-
(100) rarı́amos poder fazer uma transição tão rápida quanto
Analisando a segunda linha das matrizes é possı́vel desejada. Quando α → 0, temos justamente o caso
encontrar a relação onde a hamiltoniana (40) se torna hermitiana, uma
( ′ ) vez que 0 = sin α = (r/s) sin ψ ⇒ ψ = 0, como con-
2r ωt
|b| = ′ sin . (101) sequência, o produto interno CP T se torna o produto
ω 2~
interno usual de Dirac, assim, |v1′ ⟩ se torna ortogonal
E portanto o tempo de transição é descrito por a |v2′ ⟩ e por isso βP T → π/2. Analogamente, para o
( ′ ) caso da hamiltoniana (96), quando o parâmetro b → 0,
2~ ω |b| estamos fazendo a evolução entre dois estados quase
t = ′ arcsin . (102)
ω 2r degenerados |ϕi >= (1, 0)t e |ϕf >= (a, b)t e por isso
βh → 0, todavia, quando b → 1, temos a transição entre
Para otimizar essa relação podemos encontrar o va-
dois estados ortogonais e por isso βh → π/2. Ou seja, o
lor máximo de r em função de ω ′ , a Eq. (97) nos diz
′ efeito é o mesmo nos dois casos, apenas há uma má in-
que isso ocorre quando s = u e, portanto, r = ω2 . E
terpretação dos estados no artigo [11] e, portanto, não
com isso podemos escrever
existe nenhum comportamento de transição mais rápida
2~ entre estados em mecânica quântica PT simétrica em
τ= arcsin (|b|) . (103) contraste à mecânica quântica usual.
ω′
Equivalência entre a mecânica quântica e a mecânica quântica PT simétrica 1304-9

7. Conclusão [2] C. M. Bender, D. C. Brody, H. F. Jones, Phys. Rev.


Lett. 93, 251601 (2004).
Ao analisar as condições de simetria PT pode-se mos- [3] M. Znojil, arXiv:math-ph, p. 0104012 (2001).
trar a equivalência entre a mecânica quântica usual
e a mecânica quântica PT simétrica. Aplicar as ba- [4] C.M. Bender, D.C. Brody, H.F. Jones, Phys. Rev. Lett.
ses deste novo formalismo não fornece novidade al- 89, 270401 (2002).
guma ao sistema, em contraste ao que é sugerido [5] C.M. Bender, S. Boettcher, Physica Scripta 87, 017001
por [11]. Sem perda de generalidade pode-se des- (2013).
crever todo sistema quântico com matrizes hermiti- [6] Y.-G.M. Jun-Qing Li, Phys. Rev. A 85, 042110 (2012).
anas. Uma demonstração matematicamente formal
[7] D.I. Borisov, Proceedings of the Steklov Institute of
desta afirmação pode ser encontrada em [17]. Nesse
Mathematics 281, 5 (2013).
artigo concluı́mos que o efeito de transição entre es-
tados quânticos de maneira mais rápida que mecânica [8] A. Mostafazadeh, J. Math. Phys. 43, 205 (2002).
quântica usual apenas se trata de uma interpretação [9] A. Carlini, A. Hosoya, T. Koike, Y. Okudaira, Phys.
equivocada do comportamento dos estados. Quando Rev. Lett. 96, 060503 (2006).
analisamos o comportamento fı́sico dos estados através [10] D.C. Brody, D.W. Hook, J. Phys. A: Mathematical and
de suas distâncias angulares, percebemos que o efeito General 39, 167 (2006).
de transição rápida ocorre tanto em mecânica quântica
[11] C.M. Bender, D.C. Brody, H.F. Jones, B.K. Meister,
PT simétrica quanto em mecânica quântica usual, no
Phys. Rev. Lett. 98, 040403 (2007).
entanto, essa transição infinitamente rápida somente
ocorre entre estados quase paralelos e que, tanto em si- [12] G.A. Mezincescu, J. Phys. A : Mathematical and Ge-
metria PT, quanto em mecânica quântica usual o tempo neral 33, 4911 (2000).
de transição entre estados ortogonais é limitada por um [13] C.M. Bender, Q. Wang, J. Phys. A: Mathematical and
tempo mı́nimo de t = ~π/ω, sendo ω a diferença de General 34, 3325 (2001).
energia dos dois estados ortogonais. [14] C. Bender, Rep. Prog. Phys 70, 947 (2003).
[15] S. Weigert, Phys. Rev. A 68, 062111 (2003).
Referências [16] C.M. Bender, S. Klevansky, Phys. Lett. A 373, 2670
(2009).
[1] C.M. Bender, S. Boettcher, Phys. Rev. Lett. 80, 5243
(1998). [17] A. Mostafazadeh, Phys. Rev. Lett. 99, 130502 (2007).

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