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LUIS CARLOS ARAÚJO ALVES

MEDIÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DE PRESSÃO EM


VEÍCULOS DE COMPETIÇÃO

São Paulo
2020
LUIS CARLOS ARAÚJO ALVES

MEDIÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DE PRESSÃO EM


VEÍCULOS DE COMPETIÇÃO

Monografia apresentada à Escola Po-


litécnica da Universidade de São Paulo
referente à disciplina PME5217 - Ins-
trumentação Avançada em Sistemas
Termofluidos.

São Paulo
2020
LUIS CARLOS ARAÚJO ALVES

MEDIÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DE PRESSÃO EM


VEÍCULOS DE COMPETIÇÃO

Monografia apresentada à Escola Po-


litécnica da Universidade de São Paulo
referente à disciplina PME5217 - Ins-
trumentação Avançada em Sistemas
Termofluidos.

São Paulo
2020
RESUMO

Nas últimas décadas os veı́culos de competição têm sido um ferramenta de grande


evolução para os conhecimentos de aerodinâmica, seja no desenvolvimento de novos dispo-
sitivos aerodinâmicos, aprimoramento dos métodos numéricos para simulações de dinâmica
dos fluidos computacional ou em procedimentos experimentais para validação e correlação
dos parâmetros obtidos de forma numérica com os obtidos empiricamente em testes de
túnel de vento ou em pista. A necessidade de se obter dados destes veı́culos em pista
potencializou o desenvolvimento de um sistemas de aquisição de dados, onde o veı́culo é
equipado com uma série de sensores que enviam sinais para um processador que armazena
os dados para uma análise posterior ou que utiliza telemetria, onde transmite os dados em
tempo real para uma estação podendo ser avaliados em ao vivo. Além do desenvolvimento
dos sistemas para aquisição de dados também foi necessária a evolução dos sensores, para
aplicações em condições mais severas e com necessidade de uma resposta mais rápida.
Mais especificamente para a medição das forças aerodinâmicas e correlação dos dados dos
testes com os modelos numéricos, são utilizados sensores para medição de pressão, velo-
cidade, força e deslocamento. Na avaliação do desempenho aerodinâmico de um veı́culo
de competição, a distribuição de pressões pela sua carroceria é uma das informações de
maior importância, pois possibilita desde a medição das forças aerodinâmicas até a identi-
ficação de possı́veis descolamentos da camada limite. Uma das técnicas que possibilitou a
medição desta distribuição associada ao escoamento do ar pelos veı́culos foi a transdução
de pressão, que possuem uma alta frequência de medição e pode ser aplicado à condições
dinâmicas, ao contrário dos manômetros que possuem sua aplicação restrita à situações
estáticas. Este estudo irá apresentar de forma detalhada a fı́sica envolvida no funciona-
mento dos transdutores de pressão, mais especificamente os piezoresistivos, além da sua
aplicação na área de automobilismo, tanto no ambiente de laboratório como os túneis de
vento quanto nos veı́culos em testes nas pistas.

Palavras-Chave – Veı́culos de competição, Aerodinâmica, Dinâmica dos fluidos compu-


tacional, Túnel de vento, Aquisição de dados, Telemetria, Transdutor de pressão, Piezo-
resistivos, Automobilismo.
ABSTRACT

In the last decades the race cars have been a huge tool for aerodynamics acknowledge
evolution, been a way for aerodynamic devices development, CFD numerical methodology
enhancement or at experimental procedures for validation and correlation of parameters
obtained under numerical methods with the empirical data of wind tunnel and track
tests. The need to obtain data from these vehicles at the track powered the development
of some data acquisition systems, where the vehicle is equipped with several sensors that
send signals for a processor that stores the data for a later analysis or utilizes telemetry,
where the data is trasmitted in real-time for a station for livetime analysis. Beyond
the development of data acquisition systems also was need an evolution of sensors, for
applications at harsh conditions and with the demand of fast response. More specifically
for aerodynamic forces measurements and data correlation of track tests with numerical
simulations, sensors are used to measure pressure, velocity, force and displacement. For
evaluate the aerodynamics performance of a race car, the pressure distribution throughout
the bodywork is one of the most important information, because it makes possible the
measuremennt of aerodynamic forces until the identification of boundary layer stall. One
of the techniques that makes possible the measurement of this distribution along the car
surface caused by the air flow, is the pressure transduction, that has high frequency of
response and can be applied for dynamic conditions, unlike the manometers that have its
application restricted for static conditions. This study will present in detail the physics
involved on pressure transducers operation, more specifically the piezorestives, as well its
application for motorsports, both in the wind tunnel enviroment and race tracks.

Keywords – Race cars, Aerodynamics, Computer Fluid Dynamics, Wind tunnel, Data
acquisition, Telemetry, Pressure transducer, Piezoresistives, Motorsports.
LISTA DE FIGURAS

1 W196 Streamliner . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

2 Forças Aerodinâmicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10

3 Chaparral 2E . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

4 Evolução dos tempos de volta da F1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

5 Manômetro em U . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

6 Manômetro mecânico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

7 Elementos do tubo de Bourdon . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

8 Potenciômetro angular . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

9 Transdutor eletromagnético . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

10 Transdutor capacitivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18

11 Diagrama transdutor piezoresistivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

12 Esquemático Scanivalve Model J1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

13 Escâner de pressões Scanivalve DSA3217-PTP . . . . . . . . . . . . . . . . 22

14 Esquemático Scanivalve DSA3217-PTP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

15 Tubo de Pitot . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

16 Tubo de Pitot Toyota LMP1 TS050 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

17 Tubos de Pitot Mercedes F1 W08 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

18 Tubos de Pitot Ferrari F138 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

19 Tubos de Pitot Renault F1 RS18 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

20 Medição de pressão na parede . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

21 Orifı́cios de medição de pressão na asa dianteira . . . . . . . . . . . . . . . 28

22 Aero Rake Red Bull Racing F1 RB15 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

23 Sonda Kiel . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
24 Coeficiente de pressão x inclinação do sensor . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

25 Aero Rake Ferrari F1 SF90 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

26 Esteira aerodinâmicas em CFD . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

27 Conceitos Out-Washing e In-Washing . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

28 Barge boards . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

29 Turning vanes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35

30 Difusores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36

31 Esteiras aerodinâmicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

32 Distribuição de pressão na superfı́cie do veı́culo . . . . . . . . . . . . . . . 37


SUMÁRIO

1 Introdução 7

1.1 Uma breve história da aerodinâmica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

1.2 Instrumentação de um veı́culo de competição . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

2 Medidores de pressão 13

2.1 Manômetros de lı́quidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

2.2 Manômetros mecânicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

2.3 Transdutores de pressão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

2.3.1 Transdutores potenciométricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

2.3.2 Transdutores eletromagnéticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

2.3.3 Transdutores capacitivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

2.3.4 Transdutores piezoresistivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18

2.4 Escaneamento eletrônico de múltiplas pressões . . . . . . . . . . . . . . . . 20

3 Aplicação em veı́culos de competição 23

3.1 Velocidade do ar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

3.2 Pressões superficiais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

3.3 Distribuição de pressões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

Referências 38
7

1 INTRODUÇÃO

Ao se observar um carro de Fórmula 1 e toda a tecnologia de ponta e complexidade


envolvida na sua concepção, nos leva a uma dúvida muito interessante: o que foi realizado
durante todos estes anos de evolução para que estes veı́culos atingissem esta forma oti-
mizada que conhecemos? Conhecida pela sua altı́ssima competitividade dentro e fora das
pistas, o automobilismo no geral é sempre foi uma área de pesquisa e evolução tecnológica
rápida e constante. A competição começa muito antes dos carros chegarem na pista, com
as equipes trabalhando e desenvolvendo o projeto dos seus carros em uma verdadeira ba-
talha de engenharia. Esta necessidade de inovação para se manterem competitivas, levou
várias equipes a testarem em seus carros algumas tecnologias foram de forma pioneira,
abrindo espaço para aplicações em outras área e até em itens de uso diário. Aliada a
grandes incentivos financeiros, esta demanda por inovações fez com que as equipes pu-
dessem trazer para os seus carros muitas tecnologias de outras áreas como a aeronáutica,
naval e militar. Dentre os avanços realizados para se obter veı́culos cada vez mais rápidos
e seguros, uma das áreas que foi e continua sendo muito desenvolvida é a aerodinâmica.
Assim como nas aeronaves, os carros de corrida têm como objetivos a redução do arrasto
e o aumento da força de sustentação, porém esta última com o sentido oposto, gerando
uma força normal ao solo conhecida como downforce. Na redução do arrasto obtém-se
maiores velocidades máximas, reduzindo os tempos de volta e aumentando as chances de
ultrapassagens. A sustentação por sua vez tem a capacidade de aumentar a força de con-
tato na iteração do pneu com o solo, proporcionando assim maiores acelerações laterais
que aumentam as velocidades nas curvas e maiores acelerações longitudinais, que dimi-
nuem a distância das frenagens e aumentam a capacidade de tração, reduzindo também
os tempos de volta.

1.1 Uma breve história da aerodinâmica

No inı́cio dos anos 50 as evoluções dos carros de competição foram muito influenciadas
pelos desenvolvimentos obtidos durante a segunda guerra mundial. Os avanços no desem-
8

penho dos veı́culos tiveram foco em duas áreas principais: motores e pneus. Esses dois
componentes exigiam um investimento alto por parte das equipes, permitindo que somente
as equipes com maior suporte financeiro tivessem a capacidade de se desenvolverem e se
manterem competitivas. Com o intuito principal de se obter maiores velocidades máximas
e facilitar as ultrapassagens nas retas, muitas tecnologias de motores aeronáuticos foram
aplicados nos carros de Fórmula 1. No entanto podemos verificar pelas equações (1.1) e
(1.2), onde calcula-se a força de arrasto Fa e a potência P necessária para superar esta
força, pode-se concluir que para dobrar a velocidade máxima é necessário aumentar a
potência em oito vezes.

Cd A f v 2 ρ
Fa = (1.1)
2

P = Fa v (1.2)

Além da dificuldade de se aumentar a potência nesta ordem de grandeza, quando se


observa as variáveis que influenciam na força de arrasto, como o coeficiente de arrasto
Cd e a área frontal Af , uma outra área despertou o interesse das equipes e recebeu a sua
devida atenção: a aerodinâmica. Em paralelo ao desenvolvimento dos motores, a redução
de arrasto do veı́culo traria uma evolução no seu desempenho com um custo inferior. Em
meados da década de 50 a equipe Mercedes de Fórmula 1 competiu com o carro W196
Streamliner, que além de equipado com um motor desmodrômico V12 que foi desenvolvido
durante a segunda guerra para o caça Messerschmitt Bf 109, também apresentava um
design de carroceria muito inovador. Com linhas de construção suavizadas e um perfil
aerodinâmico, aliados ao conceito de rodas cobertas fez com fosse obtida uma geometria
de carroceria com baixo arrasto.

Segundo (KATZ, 1995) a redução de arrasto foi muito importante no desempenho dos
veı́culos, porém o que teve uma interferência dominante na aparência e no desempenho
dos carros de corrida foi a utilização da carroceria e de dispositivos aerodinâmicos com
foco na geração de downforce.

Com a demanda de um evolução na indústria de pneus e um maior desenvolvimento


das teorias que envolviam a dinâmica veicular, uma série de estudos e publicações foram
realizadas com o objetivo de se entender como extrair o máximo desempenho tanto dos
pneus como dos veı́culos. Como apresentado por (SMITH, 1978) estes estudos inicialmente
descreveram as forças geradas no pneu de forma simplificada pela equação (1.3).
9

Figura 1: W196 Streamliner

Fat = µN (1.3)

A partir da somatória das forças de atrito Fat geradas nas iterações pneu-solo e a
massa do veı́culo, podemos determinar pela segunda lei de Newton descrita na equação
(1.4), a capacidade de aceleração longitudinal do veı́culo, responsável pelo desempenho
nas frenagens e na tração e a aceleração longitudinal, responsável pelo desempenho nas
curvas.

F = ma (1.4)

Visando um evolução no desempenho do veı́culo e utilizando as equações (1.3) e (1.4),


observam se duas áreas em que os projetistas dos veı́culos de competição já desenvolviam, o
aumento do coeficiente de atrito µ do qual os desenvolvedores dos pneus eram responsáveis
e a redução de massas. No entanto, uma outra oportunidade para o desenvolvimento na
área de aerodinâmica foi observada, pois o aumento da força normal N poderia aumentar
as forças de atrito nos pneus e consequentemente a capacidade de aceleração do veı́culo.
Foi a partir desta ideia que as asas, até então utilizadas nas aeronaves foi introduzida
nos veı́culos de competição. As asas apresentavam a capacidade de gerar uma força de
sustentação nas aeronaves seguindo a equação (1.5), que se montadas de forma invertida
10

Figura 2: Forças Aerodinâmicas

nos carros iria proporcionar uma força em direção ao solo que ficou conhecida como
downforce. Este conceito foi introduzido em 1966 pelo então piloto e construtor Jim Hall,
quando apresentou o seu Chaparral 2E com uma enorme asa invertida montada na traseira
do carro.

Cl As v 2 ρ
Fs = (1.5)
2

Onde Cl é o coeficiente de sustentação do perfil da asa e As é a área da superfı́cie da


asa, obtida pelo produto entre a corda e o comprimento.

Os meados dos anos 60 foram um marco no desenvolvimento da aerodinâmica nos


veı́culos de competição, tendo iniciado uma grande tendência no desenvolvimento dos
veı́culos, aumentando o desempenho significativamente ao longo dos anos.(MILLIKEN;
MILLIKEN et al., 1995) e (HANEY, 2003) apresentaram uma abordagem mais completa
sobre a interação entre a aerodinâmica, a dinâmica veicular, o aproveitamento dos pneus
e como isto proporcionou a melhoria de desempenho. Na figura (4) podemos ver uma
evolução nos tempos de volta da Fórmula 1, com destaques para a era de desenvolvimento
mais focado em pneus e chassis e posteriormente a era aerodinâmica, onde se observa
uma evolução de forma mais rápida e expressiva. Também observamos a introdução de
algumas tecnologias que tiveram grande influência no desempenho dos veı́culos, sendo
posteriormente banidas por motivos de segurança ou equalização da categoria.
11

Figura 3: Chaparral 2E

Figura 4: Evolução dos tempos de volta da F1


12

Com as informações apresentadas fica clara a importância e a revolução da aero-


dinâmica em termos de desempenho nos carros de competição. Segundo (ZHANG; TOET;
ZERIHAN, 2006) atualmente a maior parte do downforce de um Fórmula 1 é gerado
pela asa dianteira, asa traseira e assoalho/difusores. A evolução destes componentes e
a medição das forças geradas por eles, somente foi possı́vel devido à evolução da instru-
mentação dos veı́culos de competição.

1.2 Instrumentação de um veı́culo de competição

Além de potencializar os desenvolvimentos nas áreas de projetos e modelos numéricos,


as equipes de competição tiveram um papel muito importante na evolução dos métodos
experimentais. A cada novo projeto ou melhoria dos componentes, estas mudanças ne-
cessitavam de uma verificação com um protótipo em escala reduzida ou real e posterior-
mente uma validação com veı́culo em pista para avaliar o aumento de desempenho. A
primeira e principal ferramenta de medição de desempenho de um carro de competição é
o cronômetro, pois inclusive é o que determina a posição de largada e o vencedor da cor-
rida. No entanto, para fins de desenvolvimento do conjunto carro/piloto, a medição dos
tempos de volta é muito genérica, englobando a influência de uma série de parâmetros,
dificultando com que a equipe tome uma linha de desenvolvimento. Para isso, houve
uma crescente demanda por parte dos engenheiros de que outros parâmetros dos veı́culos
deveriam ser medidos.

Com os avanços na área experimental e dos componentes eletrônicos por parte da


engenharia aeronáutica e militar, novamente as equipes de competição aproveitaram o
conhecimento desenvolvido por estas outras áreas e implementaram no seu cotidiano a
utilização dos túneis de vento e equipamentos de aquisição de dados embarcados nos
veı́culos.

Durante anos foram desenvolvidos equipamentos de aquisição de dados, sensores e


técnicas de análise de dados, para que o máximo de informação fosse obtida e auxiliasse
na evolução do desempenho. Entre os parâmetros medidos, umas das principais grande-
zas que necessitam ser medidas para o desenvolvimento aerodinâmico é a pressão. No
capı́tulo seguinte serão apresentados os principais tipos de equipamentos e as vantagens
da utilização dos transdutores de pressão piezoresistivos para este tipo de aplicação.
13

2 MEDIDORES DE PRESSÃO

A medição da grandeza pressão é essencial para uma série de estudos na área de energia
e fluidos, como os motores à combustão, transferência de calor e é claro a aerodinâmica.
Para realizar estas medições possuı́mos uma grande variedade de equipamentos e sensores,
com diferentes resoluções, precisão de medição e custos. Além disso a seleção da técnica
de medição deve levar em consideração o meio em que essa medida será realizada, no caso
dos veı́culos de competição será em um túnel de vento com um modelo em escala ou em
pista com o próprio veı́culo.

Realizar medições de pressão também é útil na determinação de outros parâmetros


de forma indireta, já que a partir dos valores de pressão, pode-se calcular grandezas como
a velocidade, fluxo de massa e auxilia na obtenção das forças aerodinâmicas que atuam
em um corpo. Neste capı́tulo iremos abordar as técnicas de medição de pressão de forma
direta.

2.1 Manômetros de lı́quidos

Uma das formas mais simples de se realizar medições de pressão é a partir de um


manômetro de lı́quidos, sendo a sua geometria mais popular um tubo em forma de
”U”como apresentado na figura (5). O princı́pio de medição utiliza a equação de Ste-
vin (2.1) para determinar a pressão a partir de uma altura medida na escala dos tubos,
utilizando um lı́quido de peso especı́fico γ conhecido.

p2 − p1 = γh (2.1)

Este tipo de equipamento possibilita que seja realizada a medida da diferença de


pressão entre dois pontos, sendo conhecida uma das medidas como a pressão atmosférica,
pode se determinar a outra.

Esta técnica de medição pode ser utilizada apenas para medições de pressão estática e
14

Figura 5: Manômetro em U

possui como vantagem o baixo custo de aquisição e facilidade de utilização. As limitações


do equipamento serão em medições de baixa pressões (abaixo de 250 Pa), pois devido
à sua baixa resolução não tem sensibilidade para realizar estas medidas. Também não
são aplicados em medições de altas pressões, pois exigiriam colunas de lı́quidos muito
longas para que possibilitassem as medidas. Os manômetros de lı́quidos são indicados
para utilização em laboratórios e em medidas de pressões de referência. Os lı́quidos mais
utilizados para esses manômetros são a água e o mercúrio. Segundo (RUSSO, 2011) a
faixa de medição de diferença de pressão para a água é de 0,5 à 60 k Pa, para o mercúrio
é de 6,6 à 810 k Pa e para menores pressões pode-se utilizar o álcool. Outra caracterı́stica
deste manômetro é o tempo de resposta lento, impossibilitando medições de variações
rápidas de pressão.

2.2 Manômetros mecânicos

Os manômetros mecânicos, assim como os de lı́quidos, realizam medições de pressão


relativa. Esta técnica de medição surgiu da necessidade de se realizar medições de pressão
acima de 300 k Pa, já que para estas grandezas se exigia um comprimento longo dos
tubos de manômetros lı́quidos. Os manômetros mecânicos utilizam como princı́pio de
funcionamento a deformação elástica de um elemento metálico, que está conectado com
uma relação mecânica à um ponteiro que indica em uma escala um valor de pressão
15

Figura 6: Manômetro mecânico

Figura 7: Elementos do tubo de Bourdon

relacionado à esta deformação como mostra a figura (6).

Este equipamento é conhecido como tubo de Bourdon e sua forma mais comum é em
”C”, como mostra a figura (7). A pressão a ser medida é conectada à conexão inferior,
que deforma o elemento elástico e através da articulação rotaciona o ponteiro até o valor
de pressão indicado na escala. Os valores de pressão indicados na escala são relativos à
pressão atmosférica.

2.3 Transdutores de pressão

Os transdutores de pressão são sensores que alteraram positivamente a forma como


se realizam as medições de pressão em um experimento. Diferentemente dos manômetros
16

convencionais que realizavam medições apenas de escoamentos em regime permanente, os


transdutores por possuı́rem a capacidade de identificar variações com uma alta frequência,
permitiram que as medições fossem realizadas também em escoamentos em regime variável.

O princı́pio de funcionamento dos transdutores é a conversão da pressão em um sinal


elétrico. Esta é outra vantagem que foi proporcionada pela utilização dos transdutores,
já que os dados podem ser apresentados e armazenados em um computador. Segundo
(RUSSO, 2011) e (BARLOW; RAE; POPE, 1999), esta possibilidade fez com que até as
aplicações com pressões em regime permanente utilizassem este tipo de sensor.

O elemento deformável de um transdutor pode ser uma viga, uma chapa ou um dia-
fragma, sendo esta último forma a mais comum, também conhecida com transdutor em
cápsula. Os transdutores de diafragma possuem quatro formas principais de se converter
a pressão em um sinal elétrico, sendo divididos em quatro tipos: potenciométrico, capa-
citivo, eletromagnético e extensométrico ou piezoresistivo. Neste estudo vamos abordar
com mais detalhes a última técnica, que utiliza a piezoresistividade dos materiais para
converter a pressão em um sinal de resistência elétrica.

2.3.1 Transdutores potenciométricos

Os transdutores potenciométricos realizam a conversão de um movimento linear ou


angular em uma resistência elétrica. O elemento deformável é normalmente conectado a
um eixo que se desloca ao longo de um trilho que proporciona uma variação na resistência
elétrica. As pressões que serão medidas possuem uma calibração relacionada a cada valor
de resistência, permitindo assim as medições de pressão a partir de um deslocamento. Na
figura (8) podemos observar o funcionamento de um potenciômetro angular, onde os dois
terminais das extremidade possuem uma resistência conhecido e o terminal intermediário
possui uma resistência variável em função da posição do eixo em laranja.
17

Figura 8: Potenciômetro angular

Figura 9: Transdutor eletromagnético

2.3.2 Transdutores eletromagnéticos

Os transdutores eletromagnéticos são também conhecidos como induzidos devido ao


seu princı́pio de funcionamento. Neste tipo de sensor, o elemento deformável está co-
nectado a um núcleo magnético que se desloca entre duas bobinas alimentadas por uma
corrente alternada de alta frequência, como apresentado na figura (9). Com o desloca-
mento o número de espiras induzidas varia, alterando assim a tensão de saı́da do sensor.
Para cada valor do sinal de saı́da existe um pressão relacionada por meio de uma cali-
bração. As desvantagens deste tipo de sensor são os custos relacionados à potência de
alimentação e o processamentos dos sinais de saı́da.

2.3.3 Transdutores capacitivos

Transdutores capacitivos são sensores que detectam uma variação de pressão através
de uma célula capacitiva. Esta célula é constituı́da por duas placas fixas dos capacitores
e um elemento sensor em forma de diafragma entre as duas placas, como mostrado na
18

Figura 10: Transdutor capacitivo

figura (10). Do lado esquerdo as pressões P são iguais, assim não ocorre deformação do
diafragma. Do lado direito temos uma diferença de pressão com P1 > P 2 , causando uma
deformação do diafragma, aumentando a distância d1 e diminuindo a distância d2 . Pela
equação (2.2) podemos calcular a capacitância, onde K é a constante dielétrica, A é a
área da placa e d é a distância para o elemento sensor.

A
C=K (2.2)
d

Assim podemos verificar que ao se aumentar a distância d1 a capacitância C1 diminui


e consequentemente diminuindo a distância d2 a capacitância C2 aumenta. Com essa
diferença de capacitância podemos determinar a pressão diferencial pela equação (2.3).

C2 − C1 2∆d
∆P = = (2.3)
C2 + C1 d1

2.3.4 Transdutores piezoresistivos

Os transdutores piezoresistivos possuem a caracterı́stica de se utilizar materiais com


caracterı́sticas piezoresistivas para detectar uma determinada pressão e converter esta
grandeza em um sinal de resistência elétrica. A caracterı́stica de piezoresistividade se
refere a um material que possui uma grande variação em sua resistência elétrica em função
da sua deformação. Segundo (SOLOUKHIN; CURTIS; EMRICH, 1981) podemos definir
a resistividade total de um material isotrópico e homogêneo pela equação (2.4), onde ρ
é a resistividade do material, l é a distância dos eletrodos e A é a área efetiva da seção
19

Figura 11: Diagrama transdutor piezoresistivo

transversal.

l
R=ρ (2.4)
A

Como elemento sensor da deformação, são utilizados sensores strain gage que consis-
tem em uma resistência em forma de fio ou lâmina, depositada sobre uma base isolante,
que quando colada à superfı́cie do elemento deformável detecta a sua deformação. Es-
tes sensores são normalmente fabricados com silı́cio, que possuem uma caracterı́stica de
alta piezoresistividade. Devido à esta caracterı́stica, a resistividade do material ρ na
equação (2.4), apresenta uma grande variação em função da sua deformação, porém se-
gundo (ADAMS; LAYTON, 2010) este sinal de variação não pode ser medido diretamente
e necessita de uma ponte de Wheatstone para que possa ser medido.

A ponte de Wheatstone consiste na ligação de quatro sensores strain gage, que ali-
mentados por uma fonte de tensão conhecida, ao sofrerem uma solicitação mecânica,
sofrem uma deformação, alteram a sua resistência e produzem uma tensão de saı́da como
ilustrado no diagrama da figura

Como o transdutor alimentado por uma tensão de entrada e corrente contı́nua cons-
tantes, a variação da tensão V na saı́da do transdutor varia em função da variação da
resistência R dos strain gages dada pela lei de Ohm descrita na equação (2.5).

V = RI (2.5)

Os elementos deformáveis utilizados nos transdutores piezoresistivos normalmente são


uma viga ou uma chapa circular, que utilizam os semicondutores como o silı́cio para as
funções de elementos deformável e elemento sensor. Para se calcular a sensibilidade destes
20

sensores, segundo (RUSSO, 2011) pode-se utilizar as equações (2.6) e (2.7) para vigas e
chapas circulares respectivamente.

∆x L3
= (2.6)
F 3EI

Onde L é o comprimento da viga, E é o módulo de elasticidade do material e I é o


momento de inércia de área. A sensibilidade é definida pela relação da deformação ∆ x e
a força aplicada F.

∆x 3(1 − ν 2 )r2
= (2.7)
pπr2 16πEt3

Onde ν é o coeficiente de Poisson, r é o raio da placa circular, t a espessura e E o


módulo de elasticidade do material. A sensibilidade é definida pela relação da deformação
∆ x e a carga uniforme p.

Além da sensibilidade do transdutor para a seleção correta do equipamento, é ne-


cessário verificar se a frequência de resposta atende a demanda da aplicação. Para
aplicações em medições de baixas pressões, onde normalmente se necessita de um transdu-
tor com alta sensibilidade e consequentemente alta flexibilidade, sua frequência de resposta
será prejudicada, já que estas caracterı́sticas são inversamente proporcionais. Para a cor-
reta seleção deve-se utilizar critérios que auxiliem na obtenção do melhor compromisso
entre sensibilidade e frequência de resposta. Para determinar a frequência natural pode-
mos utilizar as equações (2.8) e (2.9) para as vigas e placas circulares respectivamente.

s
EI
fn = 0, 5596 (2.8)
µL4

Onde µ é a massa por unidade de comprimento da viga.

s
1, 6183 Et3
fn = (2.9)
r2 12ρ(1 − ν 2 )

2.4 Escaneamento eletrônico de múltiplas pressões

Pela capacidade dos transdutores de pressão piezoresistivos de se realizar medições


com uma alta frequência de resposta e uma faixa ampla de grandezas de pressão, levantou-
se a possibilidade de se realizar medições de um campo de pressões. Para isso ainda
21

Figura 12: Esquemático Scanivalve Model J1

existia uma limitação: a necessidade da instalação de vários transdutores de pressão que


realizassem a medição de diversos pontos. Na época em que surgiu a ideia, os transdutores
de pressão ainda possuı́am um custo muito elevado, o que impossibilitava esta aplicação.
No inı́cio da década de 60 com o intuito de resolver esta limitação, foi desenvolvido pelo
fabricante Scanivalve um equipamento que permitia a medição multiponto utilizando
apenas um transdutor de pressão. O sistema possuı́a várias portas de entrada, que através
de um multiplexador mecânico acionado por um rotor, conectava sequencialmente cada
porta de entrada a um orifı́cio conectado ao transdutor de pressão.

O esquema está ilustrado na figura (12) e segundo (RUSSO, 2011) este equipamento
possuı́a a capacidade de medir 20 portas por segundo. Além da possibilidade de se realizar
a medição de uma distribuição de pressões, segundo (BARLOW; RAE; POPE, 1999) este
dispositivo possuı́a mais uma vantagem, que era um menor tempo de processamento e
análise do dados por serem integrados em sistemas digitais. Anteriormente os dados
eram obtidos através de fotografias dos manômetros instalados, o que demandava um
maior tempo de túnel de vento para instalação dos sensores, verificação de vazamentos,
revelação das fotografias, organização e análise dos dados obtidos.

A partir dos anos 80, com os avanços obtidos na fabricação de componentes eletrônicos,
foi possı́vel a manufatura de transdutores de pressão utilizando componentes de estado
sólido. Esta capacidade fez com que fosse possı́vel realizar a fabricação de transdutores
em uma maior escala, reduzindo os custos do produto. Novamente o fabricante Scanivalve
foi pioneiro no desenvolvimento de um equipamento que poderia realizar a medição de
pressões em vários pontos, porém agora utilizando um transdutor para cada porta de
entrada. Esta evolução fez com que o tempo de aquisição e processamento dos dados
fossem reduzidos ainda mais e possibilitou frequências de amostragem de até 10 kHz por
canal, importante no estudos de escoamentos turbulentos e em regimes variáveis. Um
22

Figura 13: Escâner de pressões Scanivalve DSA3217-PTP

Figura 14: Esquemático Scanivalve DSA3217-PTP

modelo do equipamento é ilustrado na figura (13) e o seu esquema de funcionamento é


apresentado na figura (14).

O sistema é constituı́do pelas porta de entrada do equipamento que estão conectadas


aos seus respectivos transdutores de pressão e cada elemento sensor está conectado a uma
ponte que detecta a variação de temperatura. Os sinais são convertidos de analógicos para
digitais através de um conversor A/D e são enviados a um microprocessador. Através de
uma tabela que está gravada pela fábrica em uma memória EEPROM o microprocessador
realiza uma correção de pressão pela temperatura e envia os dados para uma unidade de
gravação dos dados que podem ser exibidos em tempo real.
23

3 APLICAÇÃO EM VEÍCULOS DE
COMPETIÇÃO

Uma das principais funções de um engenheiro em uma equipe de competição é a


correlação dos dados obtidos em pista com os parâmetros originais do projeto e pos-
teriormente com as alterações realizadas para melhoria de desempenho. A equipe de
aerodinâmica costuma se dividir em três grupos principais:

1. Projetos e desenvolvimento: constituı́do por aerodinamicistas e desenvolvedores de


superfı́cies, este grupo é responsável pelos desenhos das superfı́cies da carroceria,
asas, assoalhos, difusores, dentre outros dispositivos aerodinâmicos. Trabalham no
desenvolvimento da geometria utilizando softwares de CAD, CFD e em túnel de
vento;

2. Métodos numéricos de CFD: formado por engenheiros com experiência em métodos


numéricos e modelamento em CFD. Desenvolvem novas metodologias e modelos
numéricos para correlacionar da melhor forma possı́vel os resultados obtidos nume-
ricamente com os obtidos experimentalmente;

3. Desempenho aerodinâmico: são os engenheiros que trabalham na pista diretamente


com o carro, realizando modificações para melhoria do balanço e desempenho do
veı́culo baseadas nos dados obtidos em pista. Também são responsáveis pela ava-
liação de alterações das geometrias e reportam para a equipe de desenvolvimento os
resultados obtidos, auxiliando também na evolução do carro.

3.1 Velocidade do ar

A medição da velocidade do ar é essencial para os estudos aerodinâmicos, pois se


utiliza esta grandeza para auxiliar nos cálculos de coeficiente de arrasto Cd e coeficiente
de sustentação Cl . Como os veı́culos de competição atuais são muito sensı́veis aerodina-
micamente, a informação da velocidade e direção do vento é muito importante para se
24

Figura 15: Tubo de Pitot

avaliar o desempenho dos carros, já que o balanço e a estabilidade alteram drasticamente
com esta variável. Para realizar a medição das velocidades, utiliza-se um sensor chamado
tubo de Pitot, apresentado na figura (15).

O funcionamento deste equipamento se deve a medição da diferença de pressão total


e estática. Na entrada de ar em branco na figura (15) passa o ar que está com uma certa
velocidade var paralela ao tubo sob uma pressão dinâmica Pd . Nos orifı́cios perpendicu-
lares ao tubo ilustrados em amarelo é medida a pressão estática. Na parte inferior do
sensor, existe um transdutor de pressão que separa as duas medidas de pressões. Do lado
esquerdo a pressão estática é adicionada à pressão dinâmica e do lado direito está ape-
nas a pressão estática. Esta diferença de pressão é detectada pelo transdutor de pressão
separando os dois reservatórios.

Conhecida a diferença entre a pressão total pt e a pressão estática ps , podemos utilizar


a equação de Bernoulli (3.1) para determinar a velocidade, resolvendo pela equação (3.2).

v2
(ps + ρ ) = pt (3.1)
2

s
2(pt − ps )
var = (3.2)
ρ

Onde a densidade do ar ρ é determinada através da pressão e temperatura ambiente


obtida por uma estação meteorológica que normalmente é instalada nos autódromos.
Sendo conhecidas as velocidades do ar var e do veı́culo vcarro , também pode se calcular
a velocidade do vento de proa vvento pela equação (3.3). Outros parâmetros do veı́culos
25

Figura 16: Tubo de Pitot Toyota LMP1 TS050

como refrigeração do motor, dos freios, balanço do carro, tempo de volta, entre outros,
podem ser relacionados à velocidade do vento para se verificar a influência da mesma em
cada parâmetro.

vvento = var − vcarro (3.3)

Os sensores devem ser montados com o orifı́cio do tubo apontando para a direção
de movimento do veı́culo e paralelo ao solo. Também devem ser posicionados de forma a
medir a velocidade em uma área sem perturbação do fluido, sendo normalmente instalados
na região dianteira do carro em cima do bico, como mostrado na figura (16). Pode se
observar instalações com mais de um sensor para garantir esta condição de escoamento
sem perturbação, como apresentado na figura (17).

Além destas áreas mais comuns de instalação dos sensores, também observamos alguns
posicionamento menos comuns, quando a equipe deseja obter alguma informação sobre
certa região especı́fica do veı́culo, como mostrado nas figuras (18) onde a equipe Ferrari
F1 realiza medições durante um treino das velocidades do ar sem influência da carroceria
do veı́culo. Essas configurações não usuais são importantes para realizar medições em um
treino onde não se exija desempenho dos carros, pois esta estrutura utilizada na imagem
agregaria muito arrasto ao veı́culo, prejudicando o resultado final. Outra configuração não
muito usual é esta apresentada na figura (19) onde a equipe Renault F1 realiza medições
para avaliar a influência do capacete do piloto no escoamento próximo da tomada de ar
26

Figura 17: Tubos de Pitot Mercedes F1 W08

Figura 18: Tubos de Pitot Ferrari F138

do motor.
27

Figura 19: Tubos de Pitot Renault F1 RS18

3.2 Pressões superficiais

A medição de pressões superficiais é também muito importante no estudo aerodinâmico


de um veı́culo de competição. Essas pressões permitem a correlação dos dados obtidos
por métodos numéricos e em modelos testados no túnel de vento com os dados obtido em
pista com o veı́culo. Para se obter estas medidas de pressões é necessário se realizar um
orifı́cio tangente à superfı́cie desejada e conectar a uma mangueira até um transdutor de
pressão. Na figura (20) podemos observar o funcionamento, com o orifı́cio perpendicular
ao escoamento do fluido, onde é realizada a medição da pressão estática a partir de um
transdutor de pressões.

Estes orifı́cios onde são instalados estes tubos com sensores para medição de pressão
pontual são determinados desde os teste em túnel de vento, onde o posicionamento destas
medições é pré-estabelecido a partir dos estudos em CFD. O posicionamento dos pontos
de medição é o mesmo para o veı́culo, para que seja possı́vel correlacionar com os dados
do túnel de vento e das simulações por métodos numéricos. As medições são realizadas
em componentes que apresentam uma grande influência no desempenho aerodinâmico do
veı́culo, como a asa dianteira mostrada na figura (21), assoalho, difusor e asa traseira.

Os valores medidos permitem os cálculos de forças na superfı́cie e a identificação de


possı́veis descolamentos do escoamento. Este último pode ser identificado por uma queda
de pressão abrupta ao longo da superfı́cie. Os descolamentos ocorridos principalmente
nos assoalhos/difusores podem ser associados à altura do veı́culo, a partir da correlação
28

Figura 20: Medição de pressão na parede

Figura 21: Orifı́cios de medição de pressão na asa dianteira


29

com um sensor de altura infra-vermelho instalado na região inferior do veı́culo ou a partir


de sensores de deslocamento instalados nos amortecedores.

Um cuidado importante durante a instalação dos sensores no veı́culo é a utilização


de tubulação ou mangueiras com o menor comprimento possı́vel para evitar um pro-
blema com a frequência de resposta. Também deve-se procurar estruturar o esquema de
medições utilizando mangueiras com os mesmo comprimento para diferentes pontos, evi-
tando também um problema de frequência de resposta e sincronismo. Os orifı́cios devem
ser realizados de forma a não deixar rebarbas que possam interferir e influenciar no esco-
amento, além de necessitarem uma limpeza da superfı́cie constante para evitar o acúmulo
de impurezas que também possam interferir nas medidas.

3.3 Distribuição de pressões

É muito comum se observar durante os treinos de pré-temporada as equipes utilizando


enormes estruturas equipadas com sensores para medição de pressões, como apresentado
na figura (22). Estas estruturas que são conhecidas como Aero Rakes, são equipadas com
um conjunto de sondas Kiel e são utilizadas para se monitorar as pressões e velocidades
pontuais, possibilitando a avaliação de um gradiente de pressões e velocidades. A sonda
Kiel apresentada na figura (23) é um medidor de pressões de estagnação e estática, seme-
lhante a um tubo de Pitot. No entanto as sondas Kiel possuem uma geometria cilı́ndrica
com um canal interno semelhante a um tubo de Venturi, que canalizam o escoamento
para dentro do sensor, possibilitando realizar medições em escoamentos com direções des-
conhecidas ou que não são muito bem definidas.

A capacidade de medir uma maior faixa de escoamentos é uma grande vantagem sobre
os tubos de Pitot e sondas cilı́ndrica. A faixa de medição recomendada é para escoamentos
com ângulos de até 30 graus. Segundo (KIM, 2016) que realizou experimentos variando
as inclinações de incidência do fluido, foi observada uma limitação de até 15 graus para
os tubos de Pitot, já as sondas cilı́ndricas e sondas Kiel toleraram uma inclinação de 25
e 40 graus respectivamente, como apresentado na figura (24).

Essas medições são muito importantes para avaliação de um dos maiores desafios para
os engenheiros de aerodinâmica em um veı́culo monoposto, que é o controle do escoamento
turbulento gerado pelas rodas dianteiras. As esteiras formadas pelas rodas dianteiras
influenciam no escoamento por toda a superfı́cie da carroceria do carro, fazendo com que
as equipes desenvolvam dispositivos aerodinâmicos que possam manipular e direcionar o
30

Figura 22: Aero Rake Red Bull Racing F1 RB15

Figura 23: Sonda Kiel


31

Figura 24: Coeficiente de pressão x inclinação do sensor

escoamento para as regiões de interesse. Os dados obtidos pelos Aero Rakes posicionados
atrás das rodas dianteiras como observamos na figura (22) e atrás do veı́culo como na
figura (25), são correlacionadas com os dados obtidos pelos modelos numéricos, como no
exemplo da figura (26).

Os dados obtidos a partir da medição do escoamento atrás das rodas dianteiras guiam
três frentes principais de estudo:

1. A escolha do conceito das asas dianteiras, onde duas frentes de abordagem principais
são desenvolvidas: Out-Washing e In-Washing. A primeira procura direcionar o
fluxo turbulento das rodas dianteiras para longe da superfı́cie do veı́culo, mesmo
que esta solução proporcione um maior estressamento das estruturas aerodinâmicas.
Já a segunda solução, procura direcionar o fluxo de ar das rodas dianteiras para a
superfı́cie do carro, gerando um menor estressamento das estruturas e procurando
direcionar o ar para dispositivos aerodinâmicos. Podemos observar os dois conceitos
na figura (27);

2. Desenvolvimento e avaliação da influência dos barge boards. Este dispositivo aero-


dinâmico apresentado na figura (28), tem como objetivos captar na sua face interna
o escoamento menos turbulento e direcionar sobre a superfı́cie do veı́culo (indicado
pelas linhas tracejadas em verde) e na sua face externa direcionar o fluxo de ar mais
32

Figura 25: Aero Rake Ferrari F1 SF90

Figura 26: Esteira aerodinâmicas em CFD


33

Figura 27: Conceitos Out-Washing e In-Washing

turbulento proveniente das rodas para longe do veı́culo (indicado pelos pontos em
rosa).

3. Desenvolvimento dos turning vanes, um outro dispositivo aerodinâmico que atua


com o fluxo de ar com origem da região dianteira do carro e de trás das rodas
dianteiras. Este dispositivo apresentado na figura (29), possui como objetivo gerar
vórtices que irão formar uma espécie de vedação nas laterais do assoalho, impedindo
que o fluxo da parte inferior do carro escoe pelas laterais, aumentando assim o
aproveitamento e a eficiência aerodinâmica do assoalho/difusor.

Já os dados obtidos na parte traseira do veı́culo, como apresentado na figura (25)
possui outros três objetivos principais:

1. Desenvolvimento dos difusores, que possuem seu funcionamento baseado em um


tubo de Venturi. Os difusores apresentados na figura (30), segundo (KATZ, 1995)
atuam como um tubo de Venturi, pois a difusão do ar na região traseira do veı́culo irá
proporcionar uma desaceleração do ar e um aumento de pressão, consequentemente
a região mais próxima do solo irá apresentar um aumento da velocidade proporcio-
nando uma região de baixa pressão. Esta baixa pressão fará com que apareça uma
força que ”puxa”o veı́culo na direção do solo, essa força é chamada de downforce e
como já explicado no capı́tulo 1 ela aumenta o desempenho do carro.

2. Redução das esteira aerodinâmicas geradas pela geometria do veı́culo. Ao se mover o


carro forma esteiras pelo caminho em que percorreu por uma distância relativamente
grande, entre 10 a 20 carros de comprimento como apresentado na figura (31).
Esse efeito ocorre devido a separação do fluxo de ar, proporcionando assim um
escoamento turbulento que proporciona arrasto induzido. Esta força de arrasto
produzida limita o desempenho do veı́culo para atingir velocidades máximas. Os
34

Figura 28: Barge boards


35

Figura 29: Turning vanes


36

Figura 30: Difusores

vórtices gerados pelas esteiras também podem ser facilmente quando observamos as
aeronaves.

3. Influência do trânsito no desempenho do carro que está atrás. Conforme já mencio-
nadas, as esteiras aerodinâmicas formam uma região turbulenta e de baixa pressão
na parte traseira do veı́culo. Quando um carro está próximo a outro carro na sua
frente, o fluxo de ar que atua na sua superfı́cie é mais turbulento do que se ele esti-
vesse no fluxo livre. Essa proximidade apresenta dois efeitos para o carro que está
atrás: primeiro ocorre a redução da força de arrasto e consequentemente o aumento
de velocidade, o que em algumas situações pode ser vantajoso. Porém um segunda
reação prejudica o veı́culo que vem atrás, conhecido como efeito Slipstream, reduz
o downforce gerado, limitando o desempenho do carro e aumentando o desgaste
dos pneus. Segundo (NEWBON; SIMS-WILLIAMS; DOMINY, 2017) a redução do
arrasto é de 19% e de downforce é 59%.

Além do desenvolvimento do desempenho aerodinâmico, os dados de pressão obtidos


auxiliam em outras áreas, ajudando a identificar regiões de alta pressão que são ideais
para entradas de ar e regiões de baixa pressão para saı́da de ar. A figura (32) mostra a
distribuição de pressão na superfı́cie do veı́culo.
37

Figura 31: Esteiras aerodinâmicas

Figura 32: Distribuição de pressão na superfı́cie do veı́culo


38

REFERÊNCIAS

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[S.l.]: Springer, 2010. p. 211–230.

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Wiley & Sons, 1999.

HANEY, P. The racing & high-performance tire: using the tires to tune for grip and
balance. [S.l.]: McFarland, 2003. v. 351.

KATZ, J. Race car aerodynamics: designing for speed. [S.l.]: R. Bentley, 1995.

KIM, K. Pneumatic measurements for pressure, velocity, and flow-direction. In:


Application of Thermo-Fluidic Measurement Techniques. [S.l.]: Elsevier, 2016. p. 61–100.

MILLIKEN, W. F.; MILLIKEN, D. L. et al. Race car vehicle dynamics. [S.l.]: Society of
Automotive Engineers Warrendale, PA, 1995. v. 400.

NEWBON, J.; SIMS-WILLIAMS, D.; DOMINY, R. Aerodynamic analysis of grand prix


cars operating in wake flows. SAE International journal of passenger cars. Mechanical
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RUSSO, G. P. Aerodynamic measurements: from physical principles to turnkey


instrumentation. [S.l.]: Elsevier, 2011.

SMITH, C. Tune to win. [S.l.]: Aero Publishers Fallbrook, 1978.

SOLOUKHIN, R.; CURTIS, C.; EMRICH, R. 5. measurement of pressure. In: Methods


in Experimental Physics. [S.l.]: Elsevier, 1981. v. 18, p. 499–610.

ZHANG, X.; TOET, W.; ZERIHAN, J. Ground effect aerodynamics of race cars. 2006.

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