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2° SEMINÁRIO DE PESQUISA E EXTENSÃO

5 a 8 de novembro de 2019

CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS: Cooperação e


Sustentabilidade no Município de Cláudio – Minas Gerais

Cecília de Castro Sousa1


Valderí de Castro Alcântara2

INTRODUÇÃO
A atuação dos catadores de materiais recicláveis no Brasil remonta ao processo de
urbanização, no século XIX. Este segmento social é constituído por homens e mulheres de
diferentes faixas etárias, que vivem em condições de vulnerabilidade socioeconômica e
encontram na coleta seletiva uma alternativa possível de trabalho (IPEA, 2013).
Os catadores proporcionam a transformação de materiais em novos produtos e,
consequentemente, sua reintrodução no ciclo produtivo. No entanto, somente a partir da
metade do século XX, em decorrência do aumento da produção de resíduos em grande escala,
que a importância dos catadores de materiais recicláveis tanto para a sociedade quanto para a
preservação do meio ambiente foi reconhecida. Apenas em 2002 que esta categoria
profissional foi aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Em 2010, a Política
Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS, reforçou a importância dos catadores de materiais
recicláveis. Nesse contexto, os catadores de materiais recicláveis atuam de forma individual e
coletiva.
O município de Cláudio ainda enfrenta dificuldades para na adequação a Política
Nacional de Resíduos Sólidos, incluindo uma coleta seletiva limitada e com baixa adesão da
população – em 2019 o município foi contemplado com apoio técnico na ampliação da coleta
seletiva, por meio de parceria firmada entre a Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM)
e o Instituto de Gestão de Políticas Sociais (Gesois).
O objetivo deste artigo é apresentar as ações desenvolvidas, até o momento, pelo
projeto “Catadores de Materiais Recicláveis: Cooperação e Sustentabilidade a partir do
Diagnóstico Rápido Participativo Emancipador (DRPE)”. O projeto de extensão tem como

1 Graduanda em Serviço Social, bolsista do PAEx (Edital Nº 05/2019), ceciliacastro013@gmail.com


2 Doutor em Administração, professor da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Cláudio,
valderi.alcantara@uemg.br
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objetivo incentivar e capacitar catadores de materiais recicláveis a atuarem de forma coletiva,


em associação, a partir do uso de metodologias de intervenção participativa.

METODOLOGIA
A metodologia do projeto “Catadores de Materiais Recicláveis: Cooperação e
Sustentabilidade a partir do Diagnóstico Rápido Participativo Emancipador (DRPE) – PAEx –
Edital Nº 05/2019) segue os direcionamentos do DRPE que se define por uma ótica dialógica
e participativa. Segundo Pereira (2017) o enfoque participativo do DRPE está alicerçado na
capacidade criativa dos participantes com seus diferentes saberes. O DRPE é um método
qualitativo e praxiológico de diagnosticar a realidade. O método se fundamenta na noção de
crítica coletiva e mudança cultural tendo por finalidade a emancipação dos grupos envolvidos.
O caráter emancipador se estabelece em três momentos: expressão e descrição da realidade,
crítica do material expresso e criatividade (PEREIRA, 2001).
Segundo a concepção de Freire (1987) a comunicação é a essência do ser humano e a
sua vocação ontológica é a de ser sujeito. Portanto, a palavra “emancipador” revela
compromisso dialógico: “Daí que dizer a palavra verdadeira seja transformar o mundo”
(FREIRE, 1987, p. 77). Nesse caminho, segundo Alencar (1990), a educação nos proporciona
a capacidade de diagnosticar e solucionar problemas de forma coletiva. Portanto, o projeto
segue a linha da intervenção participativa. O DRPE apresenta um processo metodológico
circular e participativo que envolve deste a formação da equipe do projeto, capacitação,
levantamento dos dados, mobilização da coletividade e apresentação do relatório final. De
forma geral, o DRPE tem como ponto de partida promover a reflexão e conscientização dos
membros do grupo quanto às condições de construção de uma associação ou cooperativa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O município de Cláudio apresenta uma população estimada de 28.366 habitantes e a
população ainda não sustenta uma cultura de valorizar a coleta seletiva e o trabalho dos
catadores de materiais recicláveis. Na cidade há cerca de 9 (nove) catadores de materiais
recicláveis (o Instituto Gesois conseguiu mapear 13 catadores) que se restringem na coleta de
plástico, papelão e alumínio, não abrangendo todo o universo dos recicláveis, trabalham em
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condições precárias (sem o uso de equipamentos de proteção adequado) e a maioria deles não
tem um ambiente adequado para o armazenamento desse material.
Os catadores se organizam de forma individual, cada um é que define os seus horários
e o material que recolhem para vender. Além disso, existem alguns que catam e vendem para
catadores “atravessadores”, estes têm um local maior de armazenamento e revendem para
empresas de reciclagem dentro e fora do município.
A implementação de uma associação de catadores no município de Cláudio tem sido
diligenciada desde 2013. O projeto não é pioneiro na cidade, o setor de Meio Ambiente e
professores da UEMG, unidade Cláudio, já apresentaram propostas com essa finalidade,
porém as tentativas de montar uma associação enfrentaram diversas resistências por parte dos
próprios catadores. Um dos projetos de pesquisa é descrito por Gomes e Martins (2019 p. 28):
“Em Cláudio/MG a coleta seletiva foi iniciada no ano de 2017, porém, promovida pela
prefeitura municipal, já que não há uma associação de catadores no município. Existem
catadores individuais, mas esses não aderiram à formação de uma associação, apesar dos
incentivos da prefeitura”.
Recentemente, Cláudio “foi contemplado para receber o apoio técnico do Estado na
ampliação da coleta seletiva, por meio de parceria firmada entre a Fundação Estadual do Meio
Ambiente – FEAM e o Instituto de Gestão de Políticas Sociais – Gesois” (INSTITUTO
GESOIS, 2019). O Termos de Adesão foi assinado em 07 de março de 2019. Com isso várias
ações estão sendo desenvolvidas para ampliar o programa de coleta seletiva, dentre as ações o
incentivo à formação de uma associação de catadores. A primeira reunião que participamos
(bolsista e orientador) aconteceu no dia 03 de abril de 2019 (Figura 1).

Figura 1 – Primeira reunião em que participamos com o Instituto Gesois, prefeitura e outros atores

Fonte: Arquivo pessoal.


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Desde a reunião, o projeto de extensão vem desenvolvendo suas atividades em


conjunto com o Instituto Gesois, a Prefeitura Municipal (Secretaria de Meio Ambiente) e
outros professores da UEMG – Unidade Cláudio. Assim, o orientador e a bolsista vêm
participando das reuniões de organização para ampliação da coleta seletiva, análise
gravimétrica, planejamento físico-financeiro e incentivo aos catadores para a formação de
uma associação.
Em outro acontecimento, os catadores da cidade foram convidados a participar da
reunião de apresentação da proposta da criação da associação (10 de junho de 2019). A
reunião foi no auditório da UEMG. No convite se dizia o seguinte:

Em continuidade às ações previstas, o Instituto Gesois em parceria com a UEMG e


Prefeitura Municipal convida a todos para participar do Seminário de apresentação
do diagnóstico e da viabilidade de consolidação da Organização de Catadores de
Materiais Recicláveis. Trata-se de uma reunião voltada a todos os catadores Não -
Organizados, sendo imprescindível a participação e contribuição de todos os
interessados na consolidação da Associação/Cooperativa. Na ocasião, serão colhidas
sugestões e esclarecidas dúvidas. (INSTITUTO GESOIS, 2019; grifo nosso).
Nessa reunião (Figura 2) os catadores mostraram interesse em formar uma associação.
No entanto, após a dispersão a possibilidade de formar a associação voltou novamente a ser
problemática. Percebemos que de forma destoante da proposta do DRPE a possibilidade de
associação foi apresentada pelo Instituto Gesois e não pelos próprios catadores.

Figura 2 – Reunião com catadores na UEMG – Unidade Cláudio

Fonte: Arquivo pessoal.

O Instituto Gesois em parceria com professores da UEMG realizou uma


“caracterização socioeconômica dos catadores de Cláudio” – os resultados apresentados nesta
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reunião do dia 10 de junho, destacando os benefícios das organizações de catadores. A


caracterização foi realizada com um total de 13 pessoas entrevistados. Como principal
resultado destacou que apenas 46% afirmaram que tem interesse de participar de uma
associação/cooperativa (54% afirmou que não). Em reunião na Câmara Municipal no dia 08
de outubro, o Instituto Gesois também apresentou que há viabilidade na formação de uma
associação de catadores de materiais. No entanto, neste dia já não havia nenhum catador de
material reciclável presente e a secretária de meio ambiente comentou que a proposta da
associação não surtiu engajamentos dos catadores novamente.
De forma geral, o Quadro 2 resume os fatores favoráveis e limitantes na formação de
uma associação – no momento a associação ainda é apenas um potencial não-realizado.

Quadro 3 – Associação: fatores favoráveis e limitantes para a formação de uma associação

Fatores Favoráveis Fatores Limitantes


 Melhores condições de trabalho  Falta de conhecimento dos catadores
 Apoio de diversos atores interessados  Falta de interesse
 Já existir um galpão para separação do material  Presença de atravessadores
 Parceria com a UEMG  Os catadores tem pouca confiança na prefeitura
 Mais segurança para os catadores  Prefeitura incentiva em uma visão economicista
 O apoio da prefeitura e outros órgãos  A iniciativa não é dos próprios catadores
 O diagnóstico realizado pelo Instituto Gesois  Iniciativa partir dos órgãos/grupos interessados
 Aumentar o rendimento e reconhecimento  O comodismo dos catadores com a situação atual
Fonte: Elaborados pelos autores.

Outro fator limitante é que, em geral, os catadores são profissionais que devido à falta
de recursos e por necessidade inicia a atividade de catação de resíduos. Por sua vez, em
Cláudio, os catadores, em sua maioria, recolhem e vendem esse material apenas para
complemento da renda. Portanto, até o momento existem fatores marcantes que estão
dificultando a formação de uma associação de catadores de materiais recicláveis.

CONCLUSÃO
Os catadores de Cláudio ainda atuam de forma individual. Diversos atores vêm
buscando contribuir para que eles formam uma associação de catadores. A Secretaria de Meio
Ambiente (vê na associação uma forma de ampliar e melhorar a coleta seletiva), o Instituto
Gesois (por meio da parceria vem construindo estratégias para incentivar a criação da
associação e ofereceu um diagnóstico da viabilidade), UEMG – Unidade Cláudio (realiza
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parcerias tendo em vista práticas de extensão e aproximação com a sociedade), atravessadores


(há indicativos que tem medo de perder retorno financeiro se os catadores formarem uma
associação), dentre outros atores. Inserindo nessa complexa relação as atividades do projeto
vem buscando incentivar a formação da associação. Todavia, a proposta do DRPE impede
qualquer imposição da forma associativa, ela pode ser somente incentivada, mas, a decisão
tem que ser dos catadores. Além disso, precisa ser compreendida em sua dimensão social e
não somente econômica.
Considerando isso, uma grande dificuldade encontrada é a real possibilidade de formar
uma associação, já que os catadores ainda não despertaram para esse arranjo que exige
confiança e cooperação. Além disso, a formação de uma possível associação ocorre de “cima
para baixo”, ou seja, não parte da iniciativa dos grupos interessados – a prefeitura é que busca
junto a outros atores fazer com que os catadores atuem de forma conjunta. Também se
identificou que a lógica da formação da associação é apenas econômica.
Buscando superar os limites encontrados até aqui, a aplicação do DRPE está sendo
organizada para novembro, assim, como uma oficina com um psicólogo para incentivar os
catadores a romperem certas barreiras em relação a possibilidade de formar uma associação
de catadores, além da realização de palestras sobre associativismo, trazer experiências de
catadores e associações já existentes em outros municípios. Também está sendo realizado um
diagnóstico dos resíduos sólidos no município por meio da aplicação de um questionário.

REFERÊNCIAS
ALENCAR, E. Intervenção tutorial ou participativa? Cadernos de Administração Rural,
Lavras, v. 2, n. 1, p. 23-43, jan./jun.1990.

FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

PEREIRA, J. R. Diagnostico Participativo: o Método DRPE. Tubarão: Perito, 2017.

PEREIRA, J. R. Visões mediadoras e o papel dos diagnósticos participativos na organização


de assentamentos rurais. Organizações Rurais e Agroindustriais, v. 3, n. 2, p.3-11, 2001.

GOMES, J. V. L.; MARTINS, F. C. Coleta seletiva de resíduos sólidos: estudo em um


município de pequeno porte. AGUILERA, J. G.; ZUFFO, A. M. (Orgs.). Enfoque
Interdisciplinar na Educação Ambiental. Atena Editora, 2019, p. 28-42.

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