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COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS

XXVI SEMINÁRIO NACIONAL DE GRANDES BARRAGENS


GOIÂNIA – GO, 11 A 15 DE ABRIL DE 2005
T.95 A02

CONSTRUÇÃO DAS ÁRVORES DE EVENTOS E ANÁLISE DE RISCO DA


BARRAGEM JOÃO LEITE DA SANEAGO

João Francisco Alves SILVEIRA


Consultor – SBB Engenharia Ltda

José Augusto de A. MACHADO


Consultor – J A Machado Eng. de Projetos Ltda

RESUMO

A barragem João Leite da SANEAGO, localiza-se no ribeirão de mesmo nome, cerca


de 6,5 km a montante da cidade de Goiânia, cuja população atual é de 1.150.000
habitantes. Tratando-se de uma barragem em CCR com 53 m de altura máxima,
complementada em ambas ombreiras por diques de terra, e com um volume total
armazenado de 129 hm3, decidiu-se proceder a uma análise de risco que fosse a
mais abrangente e detalhada possível. A análise envolveu a simulação dos
principais cenários e estimativa das probabilidades de ruptura, através da
construção das árvores de eventos, montadas durante “workshops” com a
participação de especialistas nas áreas de Análise de Risco e de Segurança de
Barragens.

ABSTRACT

João Leite dam is owned by SANEAGO – Saneamento de Goiás and is located


immediately upstream of the city of Goiânia, the capital of Goiás State, a town with
1,150,000 inhabitants. The main dam is in a RCC structure with 53 m of maximum
height, complemented at the abutments with earthfill dams. With a storage volume of
129 hm3 and near a great population area, it was decided to proceed to a detailed
risk analysis, involving dam site inspection to familiarize the review team with
structure and site conditions, review available incident and failure statistics for similar
dams, construction of event trees and probability assessment, using a subjective
degree-of-belief approach. During the failure mode screening all events that could
lead to dam failure are discussed. It works like a brainstorming, and for João Leite
dam the most severe dam failure mechanisms were those piping through the
foundations or piping at the soil-concrete interface along the lateral walls of the
concrete wing dam.

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1. INTRODUÇÃO

A barragem de João Leite, da SANEAGO – Saneamento de Goiás S.A. é uma


barragem para abastecimento de água, que está sendo construída no ribeirão João
Leite, cerca de 6,5 km a montante da cidade de Goiânia. Trata-se de uma barragem
principal em CCR, com 53 m de altura máxima e dotada de aterros nas duas
extremidades, junto às ombreiras direita e esquerda, com cerca de 15 e 50 m de
altura, respectivamente.

O reservatório da barragem João Leite quando à plena carga armazenará o volume


total de 129 hm3, ou o volume útil de 117 milhões de metros cúbicos de água, o que
veio recomendar a implementação de uma “Análise de Risco” para esta barragem,
de modo completo e detalhado, envolvendo como principais atividades as seguintes:

− Avaliação detalhada do Projeto Executivo da barragem, sobre o enfoque de


suas condições de segurança;

− Levantamento do histórico de obras semelhantes, em termos de acidentes e


incidentes;

− Estudo dos cenários de ruptura em potencial e de suas implicações a jusante;

− Construção das árvores de eventos e cálculo das probabilidades de ruptura


da barragem;

− Estudo da atenuação de risco através de medidas estruturais e não


estruturais;

− Estabelecimento de um PAE – “Plano de Ação Emergencial”;

− Elaboração de “Manual de Supervisão e Acompanhamento do


Comportamento das Estruturas de Barramento”, durante os períodos de
enchimento do reservatório e operação.

2. A IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE DE RISCO

A Análise de Risco aplicada ao campo da Segurança de Barragens teve início


praticamente na década de 80, nos Estados Unidos, e posteriormente no Canadá,
Austrália, Noruega, Suíça, África do Sul, Holanda, dentre outros. No Brasil sabe-se
de algumas raras aplicações do estudo da propagação da onda de cheias, através
de programas tipo “Dam Break”, porém sem a realização de uma análise de risco
mais elaborada, o que resulta em um trabalho parcial, sem a obtenção das
probabilidades em potencial e dos cenários de risco realmente envolvidos.

A quantificação de risco é usualmente o resultado de uma avaliação da


probabilidade anual de um determinado evento, que pode implicar em perda de
vidas humanas e perdas econômicas, além de danos irreparáveis ao meio ambiente.
Esta probabilidade é multiplicada pelas conseqüências, medidas em termos

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econômicos e humanos. Árvores de eventos são utilizadas para a interação de todas
as possíveis combinações de eventos e suas conseqüências, descrevendo a
seqüência dos fatos que se desenvolvem para que uma determinada falha venha a
ocorrer, estabelecendo as relações entre o evento inicial e as interferências do
homem, dos equipamentos ou de fenômenos externos, que venham a afetar o
sistema em análise [1, 2, 3, 4, 5 e 6].

Em alguns casos as estatísticas sobre a ruptura ou falha não são suficientes para a
determinação da confiabilidade de sua aplicação à cada barragem em um sentido
absoluto [6]. Desta forma, a probabilidade de ruptura para a barragem em estudo
deve somente ser apresentada dentro de uma classificação relativa. Tem-se em
mãos, entretanto, um ferramental de extrema utilidade, que é a realização de
análises de consistência ou de sensibilidade, para a avaliação e julgamento dos
resultados finais.

A experiência adquirida mais recentemente, com a elaboração da “Análise de Risco”


das barragens de Peti e Volta Grande, da CEMIG – Companhia Energética de Minas
Gerais, da barragem de Jupiá, da CESP, e agora da barragem de João Leite, da
SANEAGO, permite assegurar que estas análises são muito valiosas e
extremamente úteis. Ao se proceder ao estudo de acidentes com barragens
semelhantes, ao histórico do comportamento real das estruturas de barramento,
tendo por base as inspeções de campo e a análise dos dados da instrumentação,
assim como ao se proceder à análise dos cenários de ruptura mais críticos e se
construir as árvores de eventos, através de “workshops”, com a participação de ~ 10
técnicos de alto nível, passa-se a dispor de um conhecimento dos pontos mais
susceptíveis à falhas, nas estruturas de barramento em análise, que antes não eram
adequadamente conhecidos. Passa-se, então, a se concentrar maiores atenções na
análise e supervisão destas áreas ou dispositivos da barragem, que seriam mais
passíveis de falha.

Além do mais, a própria experiência de países que estão empregando esta técnica
há mais de uma década, vem revelar que se trata de uma das únicas ferramentas de
cálculo disponíveis, para que os leigos possam entender o cenário em potencial de
risco de uma barragem, ao permitir comparação da probabilidade de ruptura da
barragem, com outros tipos de acidentes bem conhecidos de todos, tais como a
queda de um avião, a ocorrência de um sismo, a possibilidade de se sofrer um
ataque cardíaco, etc.

Na Austrália a Análise de Risco de barragens, através da construção das árvores de


eventos, ganhou tal importância, que a partir de outubro de 1997, o governo da
província de Victoria promulgou uma lei, que condiciona a provisão de fundos para a
recuperação de barragens, às barragens com alto potencial de risco ou problemas
significativos, indicados pelas Análises de Risco.

3. CRITÉRIO PARA ANÁLISE DAS PROBABILIDADES DE RUPTURA

Tendo essencialmente por base a experiência mundial com as estatísticas sobre


ruptura de barragens, que revela como valor atual a probabilidade de 10 -4 para uma
barragem vir a se romper por ano e também a experiência com a análise de risco
aplicada à um grande número de barragens canadenses, norueguesas e

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australianas, propõe-se o seguinte critério para a análise das árvores de eventos
construídas para a barragem João Leite.

Para uma barragem localizada a apenas 6,5 km a montante de um grande centro


urbano, como a barragem de João Leite, considerou-se que a probabilidade de 10 -
5
/ano seria aceitável, sendo mais prudente, entretanto, se trabalhar com a
probabilidade de 10-6/ano, o que será analisado a seguir através da construção das
árvores de eventos para os cenários de ruptura mais prováveis de ocorrência e o
cálculo do risco total, dado pela somatória dos riscos individuais.

Probabilidade Anual de Ruptura Avaliação de Risco


10-3 Muito preocupante
10-4 Preocupante
10-5 Aceitável
10-6 Bom desempenho
10-7 Ótimo desempenho
TABELA 1: Avaliação de risco a partir das árvores de eventos

4. CENÁRIOS DE RISCO MAIS PROVÁVEIS

Na seqüência, procedeu-se, para a barragem de João Leite, à determinação dos


cenários mais críticos em termos de segurança, que poderiam em função das
características geológico-geotécnicas, das condições hidrológicas locais e do
histórico deste tipo de barragem, conduzir eventualmente à ruptura da barragem.
Dentre estes cenários as análises se concentraram nos seguintes eventos principais:

Estruturas de Concreto:

− Escorregamento através da interface concreto-rocha

Barragem de Terra:

− Galgamento da barragem

− Erosão interna através da interface solo-concreto

− Erosão interna pela fundação

Falha Tubulação Adutora:

− Rompimento da adutora por corrosão

− Rompimento da adutora por impacto de veículo

− Rompimento por sabotagem

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A possibilidade de galgamento foi analisada, tanto como decorrente de um risco
hidrológico, provocado por uma cheia decamilenar, ou decorrente da PMF, assim
como decorrente da possibilidade da ruptura de uma barragem a montante ou,
então, provocada pelo eventual escorregamento de taludes na área do reservatório.

O escorregamento através da fundação foi considerado em função das análises de


estabilidade das estruturas de concreto, adotando-se esta alternativa para o
conjunto de cinco blocos (B4 a B8), na região da ombreira direita da barragem, onde
os fatores de segurança ao escorregamento se mostraram mais críticos.

A possibilidade de erosão da barragem de terra por galgamento, e daí a ruptura


através da abertura de uma brecha, foi simulada tanto para o maciço direito, de
menor dimensão, como para o esquerdo, onde as condições foram eventualmente
mais críticas, em decorrência de suas dimensões. .A possibilidade de erosão interna
(“piping”) foi simulada através da abertura de uma brecha, para o caso da interface
solo-concreto, na lateral dos muros de ligação direito e esquerdo, enquanto que a
erosão interna através da fundação foi simulada através de um “entubamento”
através da fundação, podendo evoluir, eventualmente, para a formação de uma
brecha, chegando a atingir a crista da barragem.

5. CONSTRUÇÃO DAS ÁRVORES DE EVENTOS E ESTIMATIVA DAS


PROBABILIDADES DE RUPTURA

Tendo em vista que as árvores de eventos são normalmente aplicadas às barragens


já existentes, onde já se dispõem de informações completas sobre o projeto, sobre
as propriedades dos materiais empregados na construção, de dados da
instrumentação de auscultação das estruturas, para apreciação e análise, é
prudente ao se proceder a construção das árvores de eventos para barragem ainda
em construção, como no caso de João Leite, admitir-se duas ou mais alternativas,
que venham simular as incertezas em potencial existentes, no que diz respeito aos
resultados finais sobre a qualidade dos materiais empregados, a faixa de dispersão
dos parâmetros dos materiais empregados, os cuidados tomados na construção dos
filtros e do aterro compactado, assim como no tratamento das fundações, etc.

Dentro deste enfoque, foram simuladas 2 (duas) alternativas, para a realização das
árvores de eventos da barragem João Leite, a saber:

5.1 ALTERNATIVA I

Cenário onde foram incorporadas algumas incertezas com relação aos resultados
finais da construção, em termos de tratamento da fundação, do controle de
qualidade do aterro compactado, das dimensões exatas do sistema de drenagem
interna da barragem e das fundações, da inexistência de um plano de auscultação
confiável, envolvendo instrumentos com características e campos de leitura
apropriados, etc., de modo a constituir uma alternativa onde eram inerentes maiores
riscos;

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5.2 ALTERNATIVA II

Cenário onde foi utilizada uma boa execução das estruturas de barramento, assim
como um bom tratamento das fundações, em termos de deformabilidade, resistência
e permeabilidade, onde deveria ser atendida uma série de pré-requisitos, além de se
dotar as estruturas da barragem de um bom plano de instrumentação de
auscultação das obras civis, complementado-o com inspeções rotineiras de campo.

6. ÁRVORES DE EVENTOS PARA GALGAMENTO

O vertedouro de superfície da barragem João Leite é do tipo soleira livre,


descarregando automaticamente as cheias afluentes, sem a necessidade de
operação de comportas e outros equipamentos eletro-mecânicos, o que vem
assegurar ótima condição de confiabilidade e baixo risco, em termos de vertimento.

Em termos de vazões máximas o vertedouro foi dimensionado inicialmente para a


cheia decamilenar, tendo sido posteriormente ampliado para a cheia máxima
provável (PMP), que representa fisicamente uma cheia de possibilidade remotíssima
de ocorrência, o que vem assegurar à barragem João Leite uma elevada segurança
em termos de vazões vertidas, vindo praticamente descartar a possibilidade de
galgamento da barragem. Para a cheia decamilenar a barragem operaria com uma
lâmina d’água de 1,77 m junto à soleira vertente (N.A. El. 750,77), enquanto que
para a cheia PMP esta lâmina seria de 2,42 m, visto que o N.A. do reservatório
atingiria a El. 751,42 m.

Nas Figuras 1 e 2 apresentam-se as árvores de eventos que foram construídas para


a simulação de um eventual galgamento das estruturas da barragem, onde as
estruturas de concreto resistiriam sem maiores problemas ao galgamento, uma vez
que são apoiadas sobre rocha gnáissica sã de boa consistência, enquanto que os
maciços de terra-enrocamento poderiam vir a sofrer sérias erosões e,
eventualmente, a se romper em função da espessura da lâmina d’água e do tempo
de galgamento. Como probabilidade inicial para a ocorrência deste evento admitiu-
se o valor de 10-7, correspondente à probabilidade anual de ruptura de uma
barragem com ótimo desempenho, conforme ilustrado na Tabela 1.

Em termos de análise de sensibilidade, foram processados dois casos distintos,


onde estimou-se a influência da probabilidade de detecção antecipada da cheia,
onde no primeiro caso a probabilidade de detecção da cheia seria de apenas 10%,
correspondente à uma situação sem um sistema específico de instrumentação. Na
segunda alternativa, a cheia seria detectada com 90% de probabilidade (Figura 2),
para o que se contaria com a instalação de um sistema apropriado de
instrumentação na área da bacia de contribuição, para possibilitar que as cheias
fossem detectadas o mais prontamente possível. As probabilidades finais foram
similares, ou seja, 5,6 x 10 -8 e 4,8 x 10-8, o que pode ser explicado pela inexistência
de descarregador de fundo na barragem, pois não havendo a possibilidade de
rebaixamento rápido do reservatório, as probabilidades anuais destes eventos
seriam da mesma ordem de magnitude.

Nas Figuras 3 e 4 estimou-se a influência da variação da probabilidade de detecção


da cheia, onde no primeiro caso esta seria detectada com apenas 1% de
probabilidade, enquanto que no segundo a probabilidade de detecção da cheia
atingiria 99%. As probabilidades finais foram, também, similares entre si, ou seja, 6,2
x 10-8 e 5,3 x 10-8, que não diferiram de forma apreciável dos valores anteriores
(Figuras 1 e 2), entretanto, veio revelar como caso mais crítico o da Figura 3, que
com a probabilidade de detecção da cheia de apenas 1%, resultou em uma
probabilidade final de galgamento de 6,2 x 10 -8.

Deve-se destacar, entretanto, que apenas as probabilidades são da mesma ordem


de grandeza, porém não o risco final. Este é caracterizado pelo produto da
probabilidade versus as conseqüências da ruptura a jusante. Desta forma o risco
será muito maior para o caso de não haver instrumentação para a detecção
antecipada de uma cheia excepcional, pois as conseqüências a jusante seriam
evidentemente das mais sérias, com grandes danos materiais e humanos. Havendo
uma instrumentação para a detecção de cheias, instalada na área da bacia do
ribeirão João Leite, seria possível a detecção antecipada de cheias de grandes
proporções, o que viria atenuar drasticamente as conseqüências a jusante,
atenuando desta forma o risco inerente à existência da barragem.

7. ÁRVORES DE EVENTOS PARA EROSÃO INTERNA (“PIPING”)

A possibilidade de erosão interna na região das ombreiras foi desmembrada em


duas alternativas, a saber, erosão interna através da fundação dos aterros, o que
poderia vir a ocorrer em ambas as ombreiras, e erosão interna através da interface
solo-concreto, envolvendo principalmente o abraço direito da barragem, onde o
gradiente hidráulico é maior, pois a barragem de atinge altura bem maior (~50 m).

O caso de erosão interna através da fundação é apresentado nas Figuras. 5 e 6,


onde a probabilidade inicial, para o desenvolvimento de erosão interna através da
fundação foi admitida como sendo a mesma fornecida pela média mundial dos casos
de erosão interna através da fundação, ou seja, de 2 x 10 -5 por ano, tendo por base
estatísticas levantadas pelo ANCOLD (Australian Committee on Large Dams),
conforme dados apresentados na tabela a seguir. O valor adotado foi dividido por
10, para a Alternativa II, por se tratar de uma barragem bem projetada, construída e
auscultada, de modo a ser mais segura que a média mundial.

Tipo de Erosão Interna Probabilidade Anual


“Piping” através do aterro 7,5 x 10-5
“Piping” através da fundação 1,9 x 10-5
“Piping” interface aterro-fundação 4,0 x 10-5
TABELA 2: Probabilidades anuais de ruptura por erosão interna (ANCOLD)

Nas Figuras 5 e 6 investigou-se, através de análises de sensibilidade, o caso de


erosão de pé do talude de jusante, provocada pelas altas infiltrações provenientes
da erosão interna através da fundação, ser de respectivamente 10% e 90%. As
probabilidades encontradas para estes casos analisados foram de respectivamente
9,5 x 10-8 e 8,6 x 10-7, com a maior probabilidade encontrada para o caso em que as
infiltrações seriam de maior intensidade, podendo provocar a erosão do
enrocamento de pé, com 90% de probabilidade.
Nas Figuras 7 e 8 apresentam-se as árvores de eventos, também para a hipótese de
Alternativa II, na qual a barragem foi projetada e construída dentro de bons
parâmetros e hipóteses de projeto, além de ter sido dotada de um bom plano de
instrumentação, conforme já abordado anteriormente. O caso de erosão interna
através da interface concreto-solo compactado, é ilustrado nestas duas figuras, onde
a probabilidade inicial, para o desenvolvimento de erosão através da interface foi
admitida como sendo 1/10 daquele correspondente à média mundial de erosão
através da interface C/S, ou seja, de 2x10 -6 por ano, conforme dados apresentados
na Tabela 2. Esta redução de 1/10 foi admitida em função da barragem ter sido
muito bem executada, o que viria reduzir a possibilidade de um eventual problema
de “piping”, além de que sendo dotada de instrumentos de auscultação, seria
possível se detectar, já na fase inicial, eventuais problemas no desempenho da
barragem ou com sua fundação.

A investigação da análise de sensibilidade, para o caso da erosão através do pé de


jusante da barragem, provocada pelas altas infiltrações provenientes da erosão, ser
de respectivamente 10% e 90%, é apresentada nas Figuras 7 e 8. As probabilidades
mais críticas obtidas, o foram para o caso da infiltração por erosão interna ser
detectada com 95% de probabilidade, tendo-se obtido como valores finais 1,8 x 10 -7
e 1,7 x 10-6, respectivamente. O valor mais crítico para este cenário de ruptura, isto
é, de “piping” através da interface solo-concreto, na região do abraço esquerdo da
barragem, foi de 1,7 x 10 -6,sendo, portanto, mais crítico que o cenário de “piping”
através da fundação, onde se obteve a probabilidade de 8,6 x 10 -7.

8. ÁRVORES DE EVENTOS PARA ESCORREGAMENTO DAS ESTRUTURAS


DE CONCRETO

As árvores de eventos para a simulação de acidente com as estruturas de concreto,


onde se posicionam como mais críticos em termos de estabilidade, os blocos de
número B-4 a B-8, implicando em um trecho com 80 m de extensão e 39 m de altura
média, onde os coeficientes de segurança ao escorregamento apresentaram-se
mais críticos, para o caso limite (CCL). As árvores de eventos vieram revelar
probabilidades anuais entre 5,0 x 10 -7 e 5,0 x 10-8 (Figuras 9 e 10), vindo confirmar
que as estruturas de concreto são bem mais estáveis e menos sujeitas à risco de
ruptura que os maciços de terra-enrocamento. Esta constatação decorre
essencialmente das boas características da rocha de fundação, constituída por um
gnaisse são e sem descontinuidades posicionadas em direções mais críticas
(subhorizontais).

Em termos de análise de sensibilidade, decidiu-se pelo estudo da influência da


perda de eficiência do sistema de drenagem (na fundação das estruturas de
concreto), no sentido de assegurar a redução das subpressões, a jusante das
galerias de drenagem e garantir, desta forma, boas condições de estabilidade para
as estruturas de concreto. Na Figura 9 considerou-se que a probabilidade de perda
de eficiência do sistema de drenagem seria de 1%, enquanto que no segundo caso
esta foi admitida com probabilidade a 0,1%, ou seja, 1/1000. Os resultados finais
diferiram em 10 vezes, tendo-se obtido respectivamente 5,0 x 10 -7 e 5,0 x 10-8 como
probabilidades de ruptura, para um eventual deslizamento através da interface
concreto-rocha de fundação.
9. ANÁLISE DOS RESULTADOS

Para cada um dos casos de risco foi computada a probabilidade anual


correspondente ao maior valor encontrado através das árvores de eventos, dentro
das análises de sensibilidade realizadas, conforme dados sintetizados na Tabela 3,
a seguir. Nesta tabela está expressa também a probabilidade total, dada pela
somatória das probabilidades parciais dos vários cenários de ruptura analisados,
conforme árvores de eventos apresentadas anteriormente.

Alternativa I Alternativa II
Tipo de Risco Probabilidade Desempenho Probabilidade Desempenho da
anual da barragem anual barragem
Hidrológico
6,2 x 10-8 Ótimo a bom 5,3 x 10-8 Ótimo
(galgamento)
Erosão interna
1,6 x 10-5 Aceitável 8,6 x 10-7 Bom
fundação
Erosão interna Aceitável a
3,2 x 10-5 1,7 x 10-6 Bom
interface C/S preocupante
Escorregament
o 5,0 x 10-7 Ótimo a bom 5,0 x 10-8 Ótimo

Sismo
≈0 Ótimo ≈0 Ótimo

Aceitável a
TOTAL 4,9 x 10-5 2,7 x 10-6 Bom
preocupante
TABELA 3: Tabela resumo das probabilidades de risco estimadas através das
árvores de eventos

Na Alternativa I os cenários analisados revelaram probabilidades anuais finais da


ordem de 5,0x10-7/ano, para os casos de risco hidrológico e de escorregamento das
estruturas de concreto, o que pode ser classificado como ótimo a bom desempenho,
para as estruturas da barragem. Para os casos, entretanto, de erosão interna
através das fundações ou da interface concreto-solo, dos aterros direito e esquerdo,
as probabilidades finais foram da ordem de 3,0x10 -5/ano, o que vem classificar o
risco como aceitável a preocupante. Em termos de risco total, resultante da
somatória dos riscos individuais, chegou-se ao valor de 4,9x10 -5/ano, classificado
como aceitável a preocupante, que para uma barragem localizada próxima de um
grande centro urbano, como é o caso da barragem João Leite, não constitui,
evidentemente, um risco aceitável.

Na Alternativa II os cenários analisados revelaram probabilidades anuais finais da


ordem de 5,0x10-8/ano, para os casos de risco hidrológico e de escorregamento das
estruturas de concreto, o que pode ser classificado como ótimo a bom desempenho
para as estruturas da barragem. Para os casos, entretanto, de erosão interna
através da fundação ou da interface concreto-solo, nos abraços direito e esquerdo,
as probabilidades finais foram da ordem de 2,0x10 -6/ano, o que vem classificar o
desempenho da barragem como bom. Em termos de risco total, resultante da
somatória dos riscos individuais, chegou-se ao valor global de 2,7x10 -6/ano,
classificado como bom desempenho e que ser considerado aceitável e adequado
para a barragem João Leite.
10. CONCLUSÕES

Destacam-se como principais conclusões das considerações aqui apresentadas,


referentes à Análise de Risco da barragem João Leite, da SANEAGO, as seguintes:

− Tendo em vista que a barragem João Leite encontra-se ainda em construção,


as árvores de eventos foram analisadas dentro de duas Alternativas I e II, das
quais a primeira viria incorporar maiores incertezas e riscos em potencial,
enquanto que a segunda viria simular um cenário de boa qualidade, em
termos de projeto, construção e fiscalização na execução das estruturas de
barramento. Na Alternativa I o risco final de acidente com a barragem atingiu
a probabilidade anual de ruptura de 4,9 x 10 -5, enquanto que na Alternativa II
este valor atingiu o valor de 2,7 x 10 -6. Este foi classificado como bom,
enquanto que aquele foi classificado como aceitável a preocupante, para uma
barragem localizada próxima à um centro urbano. Daí a importância de se
cuidar apropriadamente de todos os detalhes da barragem, envolvendo o
projeto, a execução, a fiscalização, o monitoramento, assim como sua
operação e conservação futuras;

− As árvores de eventos vieram revelar como cenários mais prováveis de


ruptura, aqueles decorrentes de erosão interna através da fundação dos
aterros ou através da interface concreto-solo, na região dos abraços direito e
esquerdo, com valores da ordem de 2,5 x 10 -5 para a Alternativa I e de 1,0 x
10-6, para a Alternativa II;

− Em termos de risco hidrológico, as probabilidades de galgamento das


estruturas de barramento foram estimadas em 6,2 x 10 -8 e 5,3 x 10-8, para as
Alternativas I e II, respectivamente;

− O cenário de risco de ruptura através das estruturas de concreto da


barragem, que se mostrou mais provável, foi aquele de um eventual
escorregamento através da interface concreto-rocha, na região dos blocos B4
a B8 (ombreira esquerda), onde as análises de estabilidade revelaram
coeficientes de segurança um pouco menores. Mesmo assim, este cenário de
ruptura apresentou-se com probabilidade bem menor que os cenários de
ruptura através de erosão interna, através dos maciços de terra, conforme
seria de se esperar. As probabilidades de ruptura anual para as Alternativas I
e II, foram de respectivamente 5,0x10-7 e 5,0x10-8.

11. AGRADECIMENTOS

Os autores vêm expressar os seus agradecimentos à SANEAGO – Companhia de


Saneamento de Goiás S/A a possibilidade de realização destes estudos referentes à
análise de risco da barragem de João Leite, assim como a autorização para a
divulgação dos dados referentes ao PAE – Plano de Ação Emergencial aplicado à
esta barragem.
12. PALAVRAS-CHAVE

Análise de risco, segurança de barragem, cenários de ruptura, árvore de eventos,


probabilidade

13. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] LESLEIGHTER, E.J. (1987) – “Dam Failure Mechanism and Selection of Modes
and Conditions of Breaching”, ANCOLD Bulletin, N° 87, Apr/87;

[2] SALMON, G.M. (1995) – “Integrating Risk Assessment Into a Dam Safety
Program”, ANCOLD Bulletin N° 101, Dec/95.

[3] SALMON, G.M., HARTFORD, D.N.D. (1995) – “Lessons from the Application of
Risk Assessment to Dam Safety”, ANCOLD Bulletin N° 101, Dec/95.

[4] JOHANSEN, P.M., VICK, S.G., RIKARTSEN, C. (1997) – “Risk Analysis of Three
Norwegian Rockfill Dams”, Anais III International Conference on Hydropower,
Trondhein, Noruega.

[5] ACHTERBERG, D., HENNIG, C., REDLINGER, C. (1998) – “Implementation of


Risk Analysis Principles into the Bureau of Reclamation’s Dam Safety Program
Actions”, Congresso Anual da ASDSO – Association of State Dam Safety
Officials, Las Vegas, USA.

[6] SILVEIRA, J.F.A. (1999) – “Análise de Risco Aplicada a Segurança de


Barragens”, Revista do Comitê Brasileiro de Barragens, Novembro/99;
FIGURA 1: Árvore de eventos – Erosão por Galgamento (Cheia Excepcional).

FIGURA 2: Árvore de eventos – Erosão por Galgamento (Cheia Excepcional).


FIGURA 3: Árvore de Eventos – Erosão por Galgamento (Cheia Excepcional).

FIGURA 4: Árvore de Eventos – Erosão por Galgamento (Cheia Excepcional).


FIGURA 5: Árvore de Eventos – Erosão Interna pela Fundação.

FIGURA 6: Árvore de Eventos – Erosão Interna pela Fundação.


FIGURA 7: Árvore de Eventos – Erosão Interna pela Interface C/S.

FIGURA 8: Árvore de Eventos – Erosão Interna pela Interface C/S.


FIGURA 9: Árvore de Eventos – Escorregamento através da Fundação.

FIGURA 10: Árvore de Eventos – Escorregamento através da Fundação.

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