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“Arqueologia e Poder” 1
ISSN 2237-8294
Resumo:
A idéia do tema surgiu durante uma palestra do professor Neil Silberman no LAP; seu
enfoque eram os usos político e ideológico das descobertas arqueológicas, mas ele próprio
admitia que isso formava parte de um processo cultural muito maior.
Summary
Introdução
mente humana, por vezes mais concretas que a realidade consagrada na sua materialidade
(PESAVENTO, p. 23).
ocorre por acaso: um dos pilares do ideário esotérico é o conceito de Prisca Theologia,
enunciado por autores renascentistas como Marsílio Ficino e Giovanni Picco della Mirandola,
segundo a qual existe um conhecimento de tipo superior sobre os mistérios do homem e do
universo que é compartilhado por um grupo seleto de estudiosos desde os primórdios da
humanidade; o esoterismo constituiria assim uma philosophia perennis et universalis, um
conhecimento eterno e imutável (STUCKRAD 2005, p. 56). Em outras palavras, um dos
elementos fundamentais que confere autoridade ao ensinamento esotérico é sua transmissão
ininterrupta desde a mais remota antiguidade; por conta disso há uma importante produção de
narrativas históricas que descrevem esse processo de transmissão. Um dos motivos
recorrentes destas narrativas é uma profunda idealização de grupos espiritualistas dos
primeiros três séculos do cristianismo.
Os grupos herméticos do início da era cristã são conhecidos como gnósticos (do grego
gnosis, conhecimento); o movimento surge no Egito helenizado, sobretudo em Alexandria, a
partir da já mencionada fusão entre filosofia neoplatônica e mística egípcia; o sincretismo vai
logo assimilar outros valores religiosos em voga no Mediterrâneo romano, sobretudo as idéias
cristãs. O termo gnose comporta uma série de problemas: estas comunidades não se
identificam desta forma, o termo foi atribuído pela igreja como forma de diferenciá-los das
comunidades cristãs; seu uso, a principio, reforça a estratégia de exclusão, uma vez que as
comunidades gnósticas se referem a si mesmas a partir do nome de seus mestres
(valentinianos, marcionitas, etc.) ou simplesmente como “cristãos” ou ainda igreja (ekklesia)
(WILLIANS, 1996).
O segundo exemplo expressivo são a descoberta de uma série de textos gnósticos entre
o final do século XVIII e a segunda metade do XIX; o interesse pelo Egito e pelo Oriente
A primeira definição acadêmica do esoterismo foi proposta pelo filósofo francês Pierre
Riffard em 1987, logo complementada pela definição conceitual e proposta metodológica de
Antoine Faivre, em 1992. O modelo de Faivre serviu de ponto de partida para uma
profunda revisão dos paradigmas de compreensão da história das religiões na Europa; Kockhu
von Stuckrad propõe um modelo conceitual baseado na idéia de que a pluralidade de
discursos é uma constante na História religiosa europeia para sugerir que as identidades
religiosas surgem através de processos de comunicação, debate, modificação e assimilação.
Esta abordagem, em dívida para com a sociologia do conhecimento, é favorecida pelo
professor alemão de estudos religiosos Hans Kippenberg, com quem Stuckrad tem
colaborado1. Stuckrad respeita o pluralismo religioso como um elemento estrutural da história
cultural européia, e, portanto, vê o esoterismo como um elemento discursivo que pode migrar
da religião para a ciência, filosofia, literatura e arte. Para ele o "esoterismo" não existe como
um fenômeno histórico independente, considerando que o "esotérico" pode ser melhor
compreendido como um elemento de processos culturais. Na sua opinião, estes processos
culturais envolvem idéias sociológicas de discurso e de transferência discursiva entre campos
do conhecimento como ciência, filosofia, etc. (GOODRICK-CLARKE 2008).
“Como todos sabem ainda não chegamos ao fim das nossas surpresas com as
famosas e periódicas descobertas de manuscritos do Mar Morto. Todos os dias quase
aparecem novidades. Quando menos se espera lá vem o telégrafo anunciando o
encontro de jarras enterradas aquí ou acolá contendo segredos que ainda estão
Foram descobertas na região de Qumran cerca de 900 rolos com inscrições; a maior
parte dos achados foi feita em março de 1952, cerca de 600 rolos; os pergaminhos que
estavam em bom estado de preservação foram todos publicados no periodo entre 1950 e 1956,
à exceção do chamado “Manuscrito do Templo” e de uma pequena série de rolos que foram
publicados apenas em 1977. Restaram, no entanto, cerca de 560 manuscritos fragmentários
cujo trabalho de restauração avança lentamente e que em sua maioria ainda não foram
publicados (STEGEMANN, p. 1-5).
“La Iglesia Católica fue en sus comienzos Gnosis-católica; pero luego hubo
una separación de los gnósticos porque la gnosis administra todos sus sacramentos
sin costo alguno. Sus miembros activos de entonces fueron perseguidos y
exterminados en el mundo físico. Ahora salimos nuevamente a difundir sus
enseñanzas. Roma entonces se llamó "Amor" cuando Pedro fundó la Iglesia
Gnóstica Católica, pero con el tiempo fue invertido el nombre de la ciudad y
también los motivos de la Iglesia. Los Gnósticos fueron torturados y perseguidos
pero no liquidada la Iglesia Gnóstica porque ella está dirigida por Cristo”. (WEOR
1950, p. 3)
Conclusão
Samael Aun Weor declara que seu conhecimento do passado é baseado em suas
capacidades espirituais superiores: ele tem plena recordação de suas encarnações anteriores.
Isso é afirmado de maneira muito clara na maioria de seus livros e é tido como verdade
inquestionável por seus seguidores: “Conheci os impérios egípcio e romano. Pelas portas da
antiga Roma dos césares, muitas vezes vi Nero sair sentado em sua liteira, carregado nos
ombros de seus escravos” (WEOR 1953, p. 60). Ou ainda: “Yo conoci a Simon el mago em la
antigua Roma, y lo oi predicarndo a sus discípulos” (WEOR 1954, p. 37)
Além disso, Samael se declara dotado de outra capacidade que seguramente causaria
inveja aos historiadores: ele tem acesso a uma dimensão superior do cosmos onde ficam
armazenadas todas as memórias do universo, os “arquivos akáshicos”.
Samael se refere a Jesus como um mestre gnóstico em suas primeiras obras da década
de 1950; mas a partir do final da década de 1950 e em seus livros posteriores ele passa a
definir Jesus como um essênio, assimilando a teoria que ligava as ruínas de Qumran à
comunidade descrita por Flávio Josefo, hoje seriamente contestada por alguns estudiosos
(ULLMANN-MARGALIT): “(…) y en todos los Grupos Cristianos Primitivos tales como el
Grupo de los Esenios que tenían su convento a orillas del Mar Muerto y uno de cuyos
miembros más exaltados fue JESÚS, EL DIVINO RABÍ DE GALILEA”. (WEOR 1978, p.
125)
Samael também reproduz o equívoco cometido por Hiram Bingham III, o descobridor
das ruinas de Machu Pichu; em seu livro Lost City of the Incas (1948) ele menciona que a
maioria dos cadáveres encontrados no local são de mulheres jovens e sugere uma romântica
hipótese de que Machu Pichu teria sido um refúgio das virgens que oficiavam no templo do
Sol, em Cuzco. Descobriu-se mais tarde que a equipe de Bingham cometeu uma série de erros
ao analisar os esqueletos encontrados no local, sobretudo ao estabelecer idades e gênero. Mas
já era tarde demais, o mito já havia se estabelecido. Samael utiliza o mito das virgens incaicas
como parte de seus argumentos de que todas as civilizações do passado conheciam e
praticavam as técnicas de tantrismo sexual que ele havia aprendido de Krum-Heller:
Poderíamos continuar citando diversos outros exemplos: Samael tira proveito ainda do
debate arqueológico sobre o fim súbito das cidades maias e do enorme interesse que o México
nacionalista vai ter sobre seu passado pré-colombiano; o presidente José Lopez Portillo vai
escrever um livro sobre o mito de Quetzalcoatl que será tema de uma impotante cerimônia de
homenagem presidida por Samael, em 1977, poucos meses antes de sua morte.
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