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Coordenação

Carlos Alberto dos Santos

Pequenos Negócios
Desafios e Perspectivas
Educação Empreendedora
Antonio Carlos Teixeira Liberato | Antonio Fernando Leal | Carlos Alberto dos Santos |
Cândida Bittencourt | Cândido Borges | Clarice Veras | Claudia A. G. Brum | Cristina
Castro Lucas de Souza | Ednalva Fernandes C. de Morais | Elyzabeth Tscha | Etel Tomaz
| Flávia Azevedo Fernandes | Genésio Gomes da Cruz Neto | Hannah F. Salmen | Juliano
Seabra | Karen Virgínia Ferreira | Luís Afonso Bermúdez | Louis Jacques Filion | Marcela
Souto de Oliveira Cabral Tavares | Marilda Corbellini |Marcos Hashimoto | Mariana
Camargo Marques | Mirela Malvestiti | Mônica Dias Pinto | Tainá Borges Andrade
Garrido | Ricardo Rivadávia Lucena Sampaio | Rita Vucinic Teles | Rodrigo Estrela de
Freitas | Rosângela M. Angonese | Wilma Resende Araujo Santos

Vol.
Carlos Alberto dos Santos
Coordenação

Pequenos Negócios
Desafios e Perspectivas
Educação Empreendedora

Antonio Carlos Teixeira Liberato | Antonio Fernando Leal | Carlos Alberto dos Santos
| Cândida Bittencourt | Cândido Borges | Clarice Veras | Claudia A. G. Brum |
Cristina Castro Lucas de Souza | Ednalva Fernandes C. de Morais | Elyzabeth Tscha
| Etel Tomaz | Flávia Azevedo Fernandes | Genésio Gomes da Cruz Neto | Hannah
F. Salmen | Juliano Seabra | Karen Virgínia Ferreira | Luís Afonso Bermúdez | Louis
Jacques Filion | Marcela Souto de Oliveira Cabral Tavares | Marilda Corbellini
|Marcos Hashimoto | Mariana Camargo Marques | Mirela Malvestiti | Mônica
Dias Pinto | Tainá Borges Andrade Garrido | Ricardo Rivadávia Lucena Sampaio
| Rita Vucinic Teles | Rodrigo Estrela de Freitas | Rosângela M. Angonese | Wilma
Resende Araujo Santos

Vol.
4
Sebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

Presidente do Conselho Deliberativo Nacional


Roberto Simões

Diretor-Presidente
Luiz Eduardo Pereira Barretto Filho

Diretor-Técnico
Carlos Alberto dos Santos

Diretor de Administração e Finanças


José Claudio dos Santos

Informações para contato


Sebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SGAS 605 – Conjunto A – Asa Sul
CEP 70200-904 – Brasília/DF
Telefone: 55 61 3348-7192
Portal Sebrae: www.sebrae.com.br
Coordenação
Carlos Alberto dos Santos

Pequenos Negócios
Desafios e Perspectivas
Vol. 4

Educação Empreendedora

Esta coletânea tem o objetivo de provocar o debate sobre o desenvolvimento bra-


sileiro na perspectiva dos pequenos negócios, a partir de abordagens que privilegiam a
reflexão teórica da prática, conectando o debate acadêmico com o cotidiano da assis-
tência técnica e dos serviços empresariais.

Com duas edições temáticas anuais, abertas à colaboração de técnicos e gerentes


do Sistema Sebrae, bem como seus parceiros na iniciativa privada, universidades e
governos, esta coletânea reúne as seguintes publicações:

Vol. 1 – Programas Nacionais


Vol. 2 – Desenvolvimento Sustentável
Vol. 3 – Inovação

Comentários, sugestões e críticas são bem-vindos: pndp@sebrae.com.br.


2013. © Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – Sebrae

Coordenação
Carlos Alberto dos Santos

Apoio técnico
Cláudia Patrícia da Silva, Denise Chaves, Elizabeth Soares de Holanda, Lorena Ortale, Mirela Malvestiti,
Sandra Pugliese, Vinicius Lages

Revisão editorial
Magaly Tânia Dias de Albuquerque, Miriam Zitz, Silmar Pereira Rodrigues, José Marcelo Goulart de
Miranda

Edição
Tecris de Souza

Projeto Gráfico
Giacometti Comunicação

Editoração Eletrônica
Grupo Informe Comunicação Integrada

Revisão Ortográfica
Grupo Informe Comunicação Integrada

S237 Santos, Carlos Alberto.


Pequenos Negócios : Desafios e Perspectivas:
Educação Empreendedora / Carlos Alberto dos Santos, coordenação. --
Brasília: SEBRAE, 2013.
384 p. : il.
ISBN 978-85-7333-583-5
1. Atendimento ao cliente. 2. Pequenos negócios. 3. Empreendedorismo. 4. Desenvolvimento
econômico. II. Título
CDU 334.012.64

As opiniões emitidas nesta publicação são de responsabilidade exclusiva dos autores, não
exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e
Pequenas Empresas.

É permitida a reprodução desde que citada a fonte. Reproduções com objetivo comercial
são proibidas (Lei n° 9.610).
Sumário

Apresentação...................................................................................... 11
Luiz Barretto

PREFÁCIO............................................................................................. 19
Aloizio Mercadante

Capítulo I
EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA DE DEBATE

29
DESAFIOS DA EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA:
REVISITANDO SCHUMPETER.....................................................................
Carlos Alberto dos Santos

DEZ CONSELHOS PARA OS CRIADORES DE EMPRESAS.............................


Louis Jacques Filion e Cândido Borges
43

61
NEGÓCIOS EM EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA:
SABERES PARA EMPREENDER...................................................................
Antonio Fernando Leal

RAZÃO E EMOÇÃO NA EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA..........................


Clarice Veras
75
NOVOS TEMPOS, NOVA EDUCAÇÃO PARA O EMPREENDEDORISMO.......
Ednalva Fernandes C. de Morais e Luís Afonso Bermúdez
85
Capítulo II
ENSINO FORMAL E EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA

113
EMPREENDEDORISMO NO ENSINO SUPERIOR: O CASO
SEBRAE NO DF E UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA......................................
Cristina Castro Lucas de Souza, Hannah F. Salmen e Karen Virgínia Ferreira

129
ADOLESCÊNCIA ADMINISTRANDO O FUTURO: UMA EXPERIÊNCIA
PIONEIRA DE EMPREENDEDORISMO JUVENIL NO BRASIL.....................
Marilda Corbellini e Rosângela M. Angonese

151
UM RETRATO DOS CENTROS DE EMPREENDEDORISMO
NAS IES BRASILEIRAS..........................................................................
Marcos Hashimoto

CÉLULAS EMPREENDEDORAS: TRANSFORMANDO O

167
MUNDO POR MEIO DE UMA EDUCAÇÃO PAUTADA NA
GESTÃO COLABORATIVA DO CONHECIMENTO..................................
Genésio Gomes da Cruz Neto e Elyzabeth Tscha

183
EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA EM SOLO POTIGUAR: UM
NOVO CAMINHO PARA O ENSINO PÚBLICO.......................................
Antonio Carlos Teixeira Liberato

EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA SOB O PRISMA DA

197
JUNIOR ACHIEVEMENT NO BRASIL – O CASO DO PROGRAMA
MINIEMPRESA...................................................................................
Wilma Resende Araujo Santos

209
EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA: DESAFIOS E
PERSPECTIVAS PARA O BRASIL............................................................
Juliano Seabra

219
EDUCAÇÃO, TRABALHO, EMPREENDEDORISMO:
NASCE O PRONATEC EMPREENDEDOR..............................................
Flávia Azevedo Fernandes, Marcela Souto de Oliveira Cabral Tavares
e Mirela Malvestiti
Capítulo III
NOVAS TECNOLOGIAS E EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA

231
EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA A DISTÂNCIA: ACESSO,
APRENDIZAGEM EM REDE E CONECTIVIDADE....................................
Rodrigo Estrela de Freitas

O DESENVOLVIMENTO DO PERFIL EMPREENDEDOR POR MEIO DA

245
COMUNICAÇÃO NA PRODUÇÃO DE CONTEÚDO PARA CURSOS
DE EAD EM EMPREENDEDORISMO ..................................................
Rita Vucinic Teles

265
MANTENDO O FOCO NO CLIENTE NO DESENVOLVIMENTO
DE CONTEÚDOS...............................................................................
Claudia A. G. Brum

281
CAMINHOS PARA UMA EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA:
ALIANÇA ENTRE COMUNICAÇÃO E EDUCAÇÃO...............................
Mônica Dias Pinto

Capítulo IV
EXPERIÊNCIAS QUE DISSEMINAM A CULTURA EMPREENDEDORA

EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA PARA UM PAÍS EMPREENDEDOR.........


Etel Tomaz e Cândida Bittencourt
299

315
O PAPEL DA UNIVERSIDADE E DO SEBRAE NA DISSEMINAÇÃO DA
CULTURA EMPREENDEDORA ENTRE OS ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS....
Tainá Borges Andrade Garrido

327
UNIVERSIDADES CORPORATIVAS: ENSINO E APRENDIZAGEM
ORGANIZACIONAL ..........................................................................
Ricardo Rivadávia Lucena Sampaio

361
DESAFIOS EM GESTÃO DAS EMPRESAS CANDIDATAS
AO PRÊMIO MPE BRASIL NO ESTADO DE SÃO PAULO..........................
Mariana Camargo Marques
Capítulo 1
INOVAR PARA SUSTENTAR O DESENVOLVIMENTO

Apresentação
Inovar para sustentar o desenvolvimen-
to: desafio para o Brasil

Os pequenos negócios e o empreen-


dedorismo inovador no século 21

Inovação para a sustentabilidade – o


imperativo de uma nova era

A competitividade e a inovação – uma


questão de capacidade

Inovação: conceitos e abordagens


Luiz Barretto
Presidente do Sebrae

O Desafio da Educação
Empreendedora no Brasil
A construção de um Brasil mais produtivo e justo depende di-
retamente da educação de seu povo. Nenhum país do mundo se

Apresentação
transforma em nação desenvolvida sem estabelecer e colocar em
prática políticas para levar o conhecimento e a capacitação téc-
nica à sua população, especialmente, à parcela mais jovem dela.

Capacitar e educar fazem parte da essência do Sebrae


desde sua criação. Promovemos o desenvolvimento competi-
tivo e sustentável das micro e pequenas empresas brasileiras –
que são 99% das empresas, responsáveis por mais da metade
das vagas de emprego e por pagar 40% da massa salarial no
país. Fomentamos o empreendedorismo como uma alternativa
viável de ocupação e renda para a população.

Um grande país não se faz apenas com funcionários, mas


também com empreendedores. Nem todas as pessoas pos-
suem um dom natural para a gestão empresarial, mas podem
aprender desde cedo. Por isso, trabalhamos para que o em-
preendedorismo avance como tema de interesse prioritário nas
três etapas do ensino – Fundamental, Médio e Superior, atuan-
do na base de formação dos estudantes desde a sua infância.

A educação empreendedora possui papel estratégico no


campo econômico e social e está se tornando uma agenda
indispensável para o século 21. É preciso aprender sobre em-

11
preendedorismo. Para o Sebrae, o tema inspira reflexões, dis-
cussões, eventos e novas possibilidades.

Nesse ambiente, estamos lançando este volume da cole-


tânea Pequenos Negócios – Desafios e Perspectivas, que tem
o propósito de pensar e discutir a educação empreendedora
voltada aos pequenos negócios. Colaboradores do Sebrae,
professores e especialistas trazem nesta edição percepções
plurais sobre o tema da educação empreendedora no universo
das micro e pequenas empresas.

O comportamento empreendedor é útil para quem vai ter o


próprio negócio ou para quem vai trabalhar em uma empresa.
O mercado de trabalho está cada vez mais competitivo e glo-
Apresentação

balizado e exige candidatos bem qualificados, mas que tenham


um diferencial. Precisamos de pessoas autônomas, com com-
petências múltiplas, que saibam trabalhar em equipe. E que te-
nham, principalmente, capacidade para aprender e adaptar-se
a situações novas e complexas, de enfrentar novos desafios e
promover transformações.

Já ensinamos empreendedorismo para cerca de 2 milhões


de pessoas, de crianças de apenas seis anos até empresários
com negócios consolidados. Há projetos, programas e cursos
voltados para diferentes perfis, idades e objetivos na nossa car-
teira de atuação. Somente no ensino formal nas escolas, mais
de 600 mil alunos do Ensino Fundamental, Médio e Superior
foram capacitados em projetos de educação empreendedora.

O projeto Jovens Empreendedores Primeiros Passos


(JEEP) oferece nove cursos para crianças e adolescentes de 6
a 14 anos que estejam cursando o Ensino Fundamental. Ele é
viabilizado por parcerias com secretarias de Educação de esta-
dos e municípios, no caso de escolas públicas, ou diretamente
com as instituições privadas. Em 2011, conseguimos ampliar o
alcance do JEEP para todo o Brasil e atingimos a marca de 25
mil alunos atendidos.

12
Professores são capacitados pelo Sebrae para tratar de
empreendedorismo de acordo com a faixa etária de seus es-
tudantes. As crianças aprendem, por meio de oficinas lúdicas,
noções sobre planos de negócio, como a importância de con-
trolar o dinheiro – essa conscientização ainda na infância vai
ajudar, no futuro, a valorizar práticas como o controle de fluxo
de caixa, por exemplo. Os conteúdos no projeto são aprofun-
dados conforme a idade dos alunos. Novos temas são inseri-
dos, como cultura da cooperação, ética e cidadania.

Voltados ao Ensino Médio, temos programas como o Cres-


cendo e Aprendendo, Despertar e Formação Jovens Empreen-
dedores, que buscam estimular a visão empreendedora como
uma das estratégias para a inclusão social e acesso ao merca-

Apresentação
do de trabalho.

No Ensino Superior, contamos com a parceria de 19 insti-


tuições de Ensino Superior para pesquisas relacionadas à visão
empreendedora e à difusão do empreendedorismo. Outra atu-
ação relevante junto ao público universitário é o Desafio Sebrae,
que estimula o espírito empreendedor por meio de jogos em-
presariais. Em 12 anos, atendemos mais de 1 milhão de alunos
no Brasil e mais de 135 mil estudantes em oito países da Amé-
rica Latina somente com o Desafio Sebrae.

Para fortalecer nosso trabalho para a educação empreende-


dora, mantemos parcerias estratégicas com instituições como o
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), Fundação
Roberto Marinho, Junior Achievement e Endeavor. Trabalhando
em conjunto com o Ministério da Educação, também estamos
inserindo o empreendedorismo na grade dos cursos de ensino
técnico: o Pronatec Empreendedor vai oferecer cursos técnicos
e profissionais de nível médio para adolescentes de todo o Brasil.

Em 2013, estamos comemorando os 20 anos do Empre-


tec, metodologia das Nações Unidas que desenvolve carac-
terísticas do comportamento empreendedor e estimula mu-

13
danças comportamentais, sugerindo que o participante reveja
conceitos e atitudes. Ao todo, 34 países promovem essa ca-
pacitação no mundo todo. No Brasil, onde mais de 185 mil
pessoas já passaram pelo seminário, o Empretec é executado
com exclusividade pelo Sebrae.

Assim, o Sebrae atua em diversas frentes para multiplicar


os empreendedores no nosso país. Os jovens são curiosos e
estão interessados em empreender. Precisamos nos valer des-
sa qualidade para estimulá-los a desenvolver comportamentos
empreendedores.

Nos últimos dez anos, constatamos a participação maior


de jovens no empreendedorismo. Pessoas com idade entre
Apresentação

25 e 34 anos respondem pela criação de 34% das empresas,


segundo a pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM),
realizada no Brasil pelo Sebrae e Instituto Brasileiro de Quali-
dade e Produtividade (IBQP). Os negócios iniciais estão mais
concentrados nesse público porque cada vez mais empreender
está se tornando uma opção de emprego e renda.

O momento econômico que o Brasil vive também está fa-


vorecendo o empreendedorismo. A taxa de juros está baixa,
temos uma situação de pleno emprego e um mercado interno
consumidor de cerca de 100 milhões de pessoas. De cada dez
empresas abertas, sete são por oportunidades de negócios. O
sonho de abrir um negócio próprio faz parte do imaginário de
44% dos brasileiros, frente a 25% que desejam seguir carreira
em uma empresa pública ou privada.

A qualidade do empreendedorismo mudou e hoje o nível de


escolaridade do empreendedor está acima da média brasileira.
Os candidatos a empreendedores e empresários estão mais
preocupados em buscar conhecimento e capacitação. E nós,
do Sebrae, estamos empenhados em colaborar na realização
desse sonho de empreender e ter sucesso.

14
Prefácio
Aloizio Mercadante
Ministro da Educação do Brasil

Empreendedorismo,
Sociedade e Educação
O Brasil apresenta hoje um perfil socioeconômico muito di-
ferente de anos atrás. Cresceu o nível de emprego e de renda;

Prefácio
houve mobilidade social – cerca de 40 milhões de brasileiros
ascenderam à “nova classe média”, reduzindo a base da pirâ-
mide – e inclusão produtiva. Há mais crédito a um custo mais
acessível. O dinamismo da economia brasileira, sustentado por
seu mercado interno, com crescimento evidente dos setores do
comércio e serviços, impõe novos desafios à nossa sociedade.

Os megaeventos esportivos nos próximos anos no Brasil


também geram novas possibilidades de negócios, empregos
e melhorias nas cidades que sediarão os jogos e seu entorno.
São inadiáveis e vêm sendo feitos investimentos em infraes-
trutura, mobilidade urbana e, principalmente, em educação. É
certo que para uma sociedade ser equilibrada, o caminho mais
eficaz passa pela educação, e não só por ela. São necessários
suportes sociais, e nesse sentido, o governo federal está aten-
to, com uma visão sistêmica de todo o processo de mudança
pelo qual o país atravessa.

Diante de desafios tão promissores para o desenvolvimen-


to brasileiro, o governo federal tem se dedicado ao esforço de
elevar o grau de instrução dos brasileiros com resultados posi-
tivos: hoje o Brasil investe 5,55% do Produto Interno Bruto (PIB)

19
em educação. Essa taxa, embora tenha crescido praticamente
a cada ano, ainda não é suficiente para fazer frente ao analfa-
betismo, à baixa escolaridade da população, bem como para
enfrentar a questão da qualidade do ensino. O Plano Nacional
da Educação (PNE) vai garantir o investimento de 10% do PIB
em educação. Aprovado na Câmara dos Deputados, porém, o
PNE ainda encontra-se em tramitação no Senado Federal.

Os obstáculos e desafios vêm sendo enfrentados siste-


mática e efetivamente pelo Governo Dilma. Temos conseguido
mudar a realidade do Ensino Básico e de nível Médio, além da
educação profissional, por meio do Pronatec, que já ofereceu
mais de 3 milhões de vagas em dois anos. Ampliamos também
a oferta de bolsas de estudos no exterior, especialmente por
Prefácio

meio do programa Ciência Sem Fronteiras, visando ao aperfei-


çoamento dos nossos profissionais, bem como ao intercâmbio
com centros de ensino e pesquisa internacionais.

O Brasil está fazendo investimentos e reduzindo a carga


tributária para aumentar a competitividade de sua economia.
Precisamos ampliar a formação profissional e tecnológica dos
trabalhadores, pois estamos próximos do pleno emprego em
alguns setores e não temos mão de obra disponível com qualifi-
cação. O aumento da produtividade, questão fundamental para
o Brasil de hoje, está ligado à capacitação dos trabalhadores.
Os institutos tecnológicos são instrumentos imprescindíveis ao
cumprimento dessa tarefa, que, na atualidade, é indispensável
para o Brasil continuar crescendo.

Nova realidade, novos


desafios e soluções

Em meio a tantas mudanças, temos uma nova realidade de


país que demanda atenção especial do governo federal e está

20
relacionada a um contexto mais amplo de transformações na
sociedade brasileira. O empreendedorismo avança e assume
contornos relevantes para o desenvolvimento nacional. Abrir o
próprio negócio passou a ser o sonho do brasileiro.

Se antes o sonho se concentrava prioritariamente na aqui-


sição da casa própria, no contexto atual, a opção de ter um ne-
gócio próprio é sustentada pelas oportunidades que o mercado
oferece em vez de servir para contrapor ao desemprego, como
ocorria na década passada. É o chamado empreendedorismo
por oportunidade e não mais por necessidade.

Soma-se o fato de, nos últimos anos, um contingente de


quase 3 milhões de brasileiros ter se formalizado como micro-

Prefácio
empreendedor individual, abandonando a condição de traba-
lhador autônomo informal. Nesse sentido, o Brasil virou uma
página importante de sua história econômica, ao registrar es-
ses empreendedores em cerca de 460 ocupações. Todos com
CNPJ. Portanto, com cidadania econômica, podendo emitir
nota fiscal, além da garantia de direitos previdenciários e aces-
so ao crédito.

Assim como precisamos ampliar e aprofundar a formação


profissional e tecnológica dos trabalhadores brasileiros, tendo
em vista a maior competitividade da nossa economia, também
esses empreendedores demandam conhecimento e informa-
ção para que possam prosperar e gerar mais emprego e renda
ao país. Há um ambiente mais favorável ao desenvolvimento
dos pequenos negócios, por isso, é chegada a hora de tratar
o empreendedorismo com a devida atenção que a educação
profissional requer.

Outro aspecto importante dessa nova perspectiva que se


abre no Brasil refere-se ao esforço de agências de fomento
e instituições de Ensino Superior no sentido de promover o
acesso à educação empreendedora, por meio de oficinas e
cursos de extensão, bem como da inclusão de disciplina es-

21
pecífica na grade curricular. São iniciativas que valorizam o
desempenho daqueles profissionais que, para sua atuação,
demandam desenvoltura em gestão de processos, pessoas
e empreendimentos ou que desejam abrir um negócio. Esse
empenho, ao longo de muitas décadas, tem transformado
realidades e contribuído para prolongar a sobrevivência dos
pequenos negócios em nosso país.

Educação, empreendedorismo e
Pronatec
Prefácio

Mas o que é educação empreendedora? Cada um dos ter-


mos contidos nesse conceito “educação” e “empreendedoris-
mo” pode ser analisado separadamente. Porém, somente jun-
tos eles fazem sentido no contexto de formação emancipatória
e autônoma de jovens e adultos da educação profissional.

Educação é o processo social pelo qual uma geração


transmite à outra a visão de mundo que define sua identidade
coletiva. Assentada nas ideias de Paulo Freire, a vocação his-
tórica e ontológica do homem é “ser mais”. A educação nesse
sentido não é somente o processo de adaptação do indivíduo à
sociedade, mas também o instrumento que possibilita aos ho-
mens transformar a realidade, por meio do trabalho, para “ser
mais”, para desenvolver suas potencialidades enquanto sujeito.

A educação é a nossa própria vida. Para autores progres-


sistas como Freire, educar é conscientização, emancipação.
Defende-se a ideia da produção de uma “consciência verdadei-
ra” e recusa-se a modelagem de pessoas, a “mera transmissão
de conhecimentos” e a pura competição.

Educação para emancipação humana é um empreendi-


mento que exige um esforço transformador, coletivo e siste-

22
mático. Esse investimento requer a assunção de responsa-
bilidades sociais por parte da sociedade de maneira geral e,
especialmente, por parte do poder público e, como parte dele,
o Ministério da Educação.

Empreendedorismo é o estudo voltado para o desenvolvi-


mento de conhecimentos e habilidades relacionados à criação
de um projeto, seja ele um projeto de vida, um projeto técnico,
científico, ou laboral. Tem origem no termo empreender, que
significa realizar, fazer ou executar. Assim, compreendemos
que toda educação é empreendedora, visto que, como prin-
cípio, educar é realizar, é inventar, é criar, é inovar, é promover
mudanças e construir transformação nos sujeitos.

Prefácio
A educação empreendedora é um processo coletivo, in-
tencional e sistemático de desenvolvimento de características
de criatividade, capacidade de organização e planejamento.
Envolve ainda responsabilidade, liderança, persistência, habi-
lidade para trabalhar em equipe, visão de futuro, interesse em
buscar novas informações e correr riscos, bem como desenvol-
ver a capacidade de solucionar problemas e inovar em sua vida
ou seu trabalho.

Dessa forma, buscamos relacionar educação, trabalho e


empreendedorismo em busca de novas políticas de inclusão
social, a exemplo do Pronatec e, agora, do Pronatec Empre-
endedor.

Criado em outubro de 2011, o Programa Nacional de


Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), do MEC,
tem como objetivo principal expandir, interiorizar e democrati-
zar a oferta de cursos de educação profissional e tecnológica
(EPT) para a população brasileira. Para tanto, prevê uma série
de subprogramas, projetos e ações de assistência técnica e
financeira, os quais, juntos, oferecerão 8 milhões de vagas a
brasileiros de diferentes perfis até 2014.

23
Os referenciais curriculares nacionais da educação profis-
sional de nível técnico (RCNEPT) preveem a construção de sa-
beres para o desenvolvimento de competências ligadas, den-
tre outros aspectos, à aplicação de conceitos e princípios de
gestão e à percepção e análise de condições de oportunidade
(mercado). Ou seja, o documento reforça a necessidade de
aprender sobre empreendedorismo, além da aprendizagem por
competências em si.

Assim, surge o Pronatec Empreendedor, que poderá agregar


ao Pronatec a perspectiva do autoemprego, além do desenvolvi-
mento de competências empreendedoras que são fundamentais
para a trabalhabilidade – conceito indicado nos RCNEPT como
componente da dimensão produtiva da vida social.
Prefácio

O público do Pronatec deve pensar no projeto de futuro


(pessoal e profissional) de forma empreendedora. A qualificação
profissional é peça-chave nesse processo. É preciso, porém,
estabelecer metas, definir estratégias e meios para alcançá-las.
O mundo está em constante mudança, e aprender a lidar com
a mudança na vida significa, também, fazer um contraponto
com a necessidade de estabilidade que, muitas vezes, aponta
para um emprego fixo.

Este volume, dedicado à educação empreendedora, reúne


textos que poderão auxiliar os operadores do Pronatec a com-
preender melhor as dimensões do empreendedorismo e sua
fundamental complementaridade com a capacitação profissio-
nal para que jovens e adultos estudantes tenham mais chances
de inclusão social e produtiva na sociedade brasileira.

24
Capítulo 1
EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA
EM DEBATE

Desafios da educação empreendedora:


Revisitando Schumpeter

Dez conselhos para os criadores de empresas

Negócios em educação empreendedora:


saberes para empreender

Razão e emoção na educação


empreendedora

Novos tempos, nova educação para o


empreendedorismo
Desafios da Educação
Empreendedora:
Revisitando Schumpeter
Carlos Alberto dos Santos1

“Se a educação sozinha não pode transformar a sociedade,


tampouco sem ela a sociedade muda.”
Paulo Freire

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


O desafio da educação empreendedora no Brasil é, antes
de mais nada, o desafio quantitativo representado pelos mi-
lhões de pequenos negócios já existentes em nosso país aos
quais se juntam inúmeros outros, diariamente.

Como levar educação empreendedora de qualidade em


grande quantidade e em todo o território nacional?

É nesse cenário que emerge o desafio de atender ao expo-


nencial aumento da demanda por capacitação empresarial sem
o comprometimento da sua qualidade. Por isso, a forte amplia-
ção das atuais iniciativas e instrumentos de educação empreen-
dedora deve ter como um de seus vetores a busca da excelên-
cia na formação dos empreendedores. A excelência é imperativo
próprio do ambiente de negócios e seu desenvolvimento, das
oportunidades e desafios colocados pela conjuntura.

1 Doutor em economia pela Freie Universitaet Berlin, diretor-técnico do Sebrae

29
Mas o que é qualidade quando se trata de educação em-
preendedora?

De forma pragmática: a qualidade da educação empreen-


dedora será tanto melhor, quanto maior for a sua capacidade
de ajudar o empreendedor a desenvolver a sua atividade em-
presarial em bases competitivas e sustentáveis.

O duplo desafio de incremento da quantidade e da quali-


dade sugere uma estratégia que esteja alicerçada para além da
expansão das atuais experiências de educação empreendedora
em nosso país. Tanto quantidade sem qualidade, como quali-
dade sem quantidade não são soluções. Não basta fazer mais,
é preciso também fazer melhor!
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

Em um país continental como o Brasil, com mais de 10


milhões de pequenos negócios, esse desafio está sendo enca-
rado não só com a vigorosa ampliação da atuação do Sistema
Sebrae em todo o país, como também pela emergência de inú-
meras e promissoras iniciativas de introdução de disciplinas de
empreendedorismo no ensino formal, em todos os seus níveis,
e o surgimento de um mercado privado de serviços empresa-
riais de capacitações e consultorias.

O desafio quantitativo diz respeito a uma ambiência favo-


rável ao empreendedorismo, traduzida em políticas e recursos
compatíveis com os volumes de investimentos necessários. Os
desafios da educação empreendedora a partir da perspectiva
da qualidade, por sua vez, coloca no centro do debate a per-
gunta: quem é o empreendedor?

Como é frequente, são as perguntas simples as mais difí-


ceis de serem respondidas. O uso sem critério do conceito em-
preendedor dificulta a construção de estratégias mais rigorosas
e consistentes – e, consequentemente, mais efetivas – de apoio
e fomento dos pequenos negócios, especialmente daquelas re-
lacionadas com a educação empreendedora.

30
As reflexões contidas neste artigo são uma contribuição ao
incipiente debate sobre essa questão. Adotamos como ponto
de partida os ensinamentos de Malcolm Knowles sobre educa-
ção de adultos e os elementos centrais do debate acadêmico
sobre empreendedorismo em uma perspectiva econômica, re-
ferenciada na obra seminal de Joseph A. Schumpeter, “Teoria
do Desenvolvimento Econômico”.

Andragogia, conhecimentos,
habilidades e atitudes empreendedoras

A complexidade e diversidade de estratégias e instrumen-

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


tos de educação empreendedora resultam da amplitude de uma
abordagem que abarque conteúdos e metodologias adequa-
dos para disseminar conhecimentos e desenvolver habilidades
e atitudes no campo do empreendedorismo.

A partir dessa perspectiva, um debate profícuo sobre os di-


versos e múltiplos desafios da educação empreendedora deve
ter como referência a perspectiva andragógica proposta por
Malcolm Knowles.

Em sua obra seminal, Knowles2 define Andragogia como


a arte e ciência que estuda as melhores práticas para orientar
adultos a aprender. O pressuposto básico é o de que a expe-
riência é a melhor fonte de aprendizagem para os adultos, cuja
motivação resulta de suas necessidades e interesses. O mode-
lo andragógico alicerça-se em seis princípios:

1. Necessidade de saber: adultos precisam saber por que de-


vem aprender algo e qual será o fruto do aprendizado;

2 Knowles, Malcolm S. (1950). Informal adult education: a guide for administrators, leaders, and
teachers. New York: Association Press.

31
2. Autoconceito do aprendiz: adultos são responsáveis por
suas decisões e por sua vida, portanto, querem ser vistos e
tratados como tal;

3. Experiências: são a base do aprendizado do adulto;

4. Prontidão para aprender: é a disposição de aprender do


adulto quando a ocasião exige algum tipo de aprendizagem
relevante para o seu cotidiano;

5. Orientação para aprendizagem: é a contextualização da


aplicação e utilidade dos conceitos apresentados;

6. Motivação: são os valores intrínsecos como autoestima,


qualidade de vida e desenvolvimento, os quais exercem
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

forte motivação no processo de aprendizagem de adultos.

A ênfase na experiência, na contextualização, na relevân-


cia prática dos conteúdos e em aspectos comportamentais
dos princípios andragógicos é referencial constitutivo a ser
observado no desenvolvimento e operacionalização de meca-
nismos e estratégias de educação empreendedora. A impor-
tância desses princípios aumenta com as possibilidades que
as novas tecnologias de informação e comunicação propiciam
para uma ampliação significativa, com grande flexibilidade e
baixo custo, da educação empreendedora, por meio de meca-
nismos de ensino a distância (EaD).

Uma parte do sucesso de instrumentos e iniciativas de


educação empreendedora dependeria, portanto, da capacida-
de de transmitir conhecimentos já existentes com metodologias
alinhadas aos princípios andragógicos.

De fato, grande parte das dificuldades de constituição e


operação de uma empresa diz respeito à legislação, regras e
normas por um lado, e conceitos, métodos e rotinas de gestão,

32
por outro lado; os quais devem ser aplicados no gerenciamento
e administração cotidiana do negócio, a partir de uma aborda-
gem racional e rotinas preestabelecidas.

A relevância prática de técnicas e métodos de gestão é au-


toexplicativa. Logo, quanto mais eficiente for o seu processo de
aprendizado, melhor será a gestão e com ela a competitividade
e sustentabilidade do empreendimento.

Nesse quadrante, o desafio da educação empreendedora


diz respeito à capacidade de implementar, em grande escala,
instrumentos e metodologias adequados para transmitir esse
tipo de conhecimento3. Por outro lado, a importância desse
aprendizado deriva da necessidade do dono do negócio exercer

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


múltiplas funções de natureza gerencial e administrativa. Uma
necessidade que é inversamente proporcional ao tamanho da
empresa: conhecimentos gerenciais são tão mais importantes
para o proprietário, quanto maior for a necessidade de seu en-
volvimento direto em funções de gestão do seu negócio.

Para estar à frente de um negócio, não basta conhecimen-


to (saber) é necessário também habilidades (saber fazer).

A racionalidade e os procedimentos operacionais da ges-


tão financeira de uma empresa, por exemplo, demandam com-
petências que podem ser adquiridas por meio do processo de
aprendizagem já descrito. O mesmo não pode ser dito para o
aprendizado de táticas de negociação, habilidade fundamental
para uma boa gestão financeira empresarial. Exemplo análo-
go pode ser encontrado no âmbito de uma capacitação sobre
formação de preços que resulte na identificação da necessida-
de de mudanças na estrutura de custos do empreendimento e
demande, portanto, habilidades negociais de seu proprietário.

3 Nesse aspecto. o sistema de ensino tradicional, público e privado, também é fundamental para
a disseminação de conhecimentos e técnicas de gestão e administração voltadas para quem já
possui ou quer criar um pequeno negócio.

33
O desenvolvimento de habilidades não se restringe à
apreensão de conhecimentos já existentes. Habilidades são
desenvolvidas por meio de observação (aprendendo com os
“casos de sucesso”, mas também e, especialmente, com os
erros próprios e de terceiros4), experimentação e treinamento
em um aperfeiçoamento constante baseado na prática concre-
ta em um processo permanente de tentativa e erro.

Interagir com outros empreendedores, trocar experiências,


participar de feiras e missões, enfim, “ver para crer” facilita e es-
timula o desenvolvimento de habilidades necessárias para uma
competente gestão do negócio. Instituições de representação
empresarial, associações de classe, sindicatos, arranjos produ-
tivos locais e cooperativas são importantes espaços de apren-
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

dizado coletivo e desenvolvimento de habilidades individuais.

A pesquisa e o debate acadêmico sobre empreendedoris-


mo da escola comportamentalista5 produziram uma vasta lite-
ratura com grande diversidade de definições de empreendedor
e suas características.

Louis Jacques Filion6 identifica cerca de 60 definições de


empreendedor na literatura e 24 características7, mais frequen-
temente atribuídas aos empreendedores pelos behavioristas.

À essa proliferação de definições e conceitos soma-se o


controverso e inconcluso debate a respeito das possibilidades
e limites de se ensinar atitudes empreendedoras. Não obstante,

4 Sobre a racionalidade de se aprender com os erros veja Santos (2012).


5 Psicólogos, psicoanalistas, sociólogos e outros especialistas em comportamento humano.
6 Renomado professor da Escola de Altos Estudos Comerciais (HEC) de Quebec e um dos maio-
res estudiosos do empreendedorismo da escola behaviorista no mundo.
7 Inovação, liderança, riscos moderados, independência, criatividade, energia, tenacidade, ori-
ginalidade, otimismo, orientação para resultados, flexibilidade, habilidade para conduzir situa-
ções, necessidade de realização, autoconsciência, autoconfiança, envolvimento a longo prazo,
tolerância à ambiguidade e à incerteza, iniciativa, capacidade de aprendizagem, habilidade na
utilização de recursos, sensibilidade a outros, agressividade, tendência a confiar nas pessoas,
dinheiro como medida de desempenho (Filion 1999).

34
a importância das atitudes e aspectos comportamentais para
o sucesso de um negócio é consenso entre os estudiosos e
especialistas que se dedicam ao tema.

Discutíveis são também concepções e representações teó-


ricas das características do empreendedor como um ser dotado
de inúmeras qualidades subjetivas ideais, as quais, em sua quan-
tidade e diversidade, encontram pouco amparo na realidade.

Do ponto de vista prático, a idealização do empreendedor


como um quase super-homem ou uma quase mulher-maravilha
pode estar na origem de estratégias de capacitação empresarial
que colocam esse tipo ideal como um objetivo a ser alcançado, na
fronteira da indução do desenvolvimento pessoal do empreende-

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


dor (a partir do ser) e a prescrição normativa e a priori do dever ser.

A qualidade da educação empreendedora será discutida


na sequência desde uma perspectiva econômica, alargando a
abordagem behaviorista tradicional.

Qualidade da educação
empreendedora

Produtos de educação empreendedora oferecidos em ba-


ses comerciais têm sua qualidade atestada pelo próprio merca-
do. Como o adágio popular: produto bom é aquele que vende!

No Brasil, como em muitos outros países, entendeu o le-


gislador que os pequenos negócios devem ter um tratamento
diferenciado e favorecido e, para tal, à legislação pertinente (LC
123/06 e LC 128/08) soma-se a própria existência do Sebrae (e
seus recursos subsidiados) para apoiar os pequenos negócios
e fomentar o empreendedorismo.

Frente a isso, como estabelecer uma oferta de serviços

35
educacionais subsidiados para pequenos negócios com a
maior qualidade possível?

Instituições de apoio aos pequenos negócios enfrentam


o desafio de ofertar serviços empresariais que correspondam,
o mais próximo possível, à real demanda de seu público-alvo.
Uma tarefa nada trivial, vista a diferença intrínseca entre ne-
cessidade e demanda.

Sempre existe uma grande quantidade de necessidades


de capacitações e consultorias nos pequenos negócios. Entre-
tanto, somente parte dessas necessidades traduz-se em de-
manda por meio da disposição dos empreendedores em pagar
por esses serviços. A disposição de pagar (ou não) por eles
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

estabelece uma hierarquia de prioridades entre as diferentes


necessidades, o que na microeconomia é conhecido como a
função de utilidade e de preferências reveladas.

Portanto, a oferta de serviços empresariais para peque-


nos negócios em bases comerciais conta com o mecanismo
de preços para identificar a real demanda de seus clientes po-
tenciais. Dito de outra forma: um mercado, no qual, como em
outro qualquer, a demanda é uma função do preço.

Na inexistência do mecanismo de preço, como estabelecer


uma oferta de serviços empresariais em bases subsidiadas que
corresponda, o mais próximo possível, à real demanda dos pe-
quenos negócios?

Em posição contrária a dos economistas do mainstream,


acreditamos que é possível utilizar subsídios de forma inteligen-
te, por meio do estabelecimento de uma proxy entre as neces-
sidades e as demandas dos pequenos negócios por serviços
empresariais.

No campo da educação empreendedora essa proxy deve


ponderar as características inerentes do negócio e de seu pro-

36
prietário, dado a sua importância para o sucesso ou não do
empreendimento, delas derivando as necessidades e, a partir
dessas, estimar-se a demanda por educação empreendedora.

A segmentação por porte, diferenciando micro de pequena


empresa e essas do microempreendedor individual, é um pri-
meiro e importante passo nessa direção. O raciocínio é simples
e intuitivo: diferentes níveis de faturamento indicam diferentes
graus de complexidade na gestão e inserção do negócio no
mercado. Diferenças que devem ser observadas no desenvolvi-
mento de produtos e estratégias de educação empreendedora,
adequadas às características e especificidades dos pequenos
negócios em seus diferentes segmentos.

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


Nessa busca por qualidade, a segmentação por porte é
condição necessária, mas insuficiente. Especialmente quan-
do prevalece uma visão “biológica evolutiva” das relações
de mercado, segundo a qual os diferentes portes de em-
presa representariam estágios de um contínuo processo de
crescimento. Uma concepção sem amparo na realidade: em
economias de mercado os pequenos negócios são sempre
a ampla maioria das empresas. É também uma concepção
problemática por sugerir que o crescimento deve ser um ob-
jetivo em si e função primordial de políticas e estratégias de
fomento dos pequenos negócios.

À segmentação por porte deve-se acrescentar uma acu-


rada análise das características e perspectivas do negócio e
de seu proprietário, elementos qualitativos que complementam
a dimensão quantitativa expressa no volume de faturamento.8

8 Na sequência, serão discutidas estratégias de educação empreendedora para empresas já


constituídas. O vasto e instigante campo do fomento e estímulo a novos negócios excede o
escopo deste artigo.

37
Empreendedor, empresário,
administrador, proprietários-gerentes:
tudo a mesma coisa?

Mundo afora, os conceitos de empreendedor e empreen-


dedorismo, em suas inúmeras variações, estão associados ao
economista austríaco Joseph Schumpeter autor da “A Teoria
do Desenvolvimento Econômico”, reconhecida como uma das
obras mais importantes da ciência econômica do século XX.

Na contramão do mainstream, que preconiza o equilíbrio


dos mercados em seus modelos econômicos, Schumpeter con-
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

cebe a economia como um processo dinâmico, orientado para


mudanças induzidas por inovações, e identifica no empresário,
ao desenvolver e implementar “novas combinações dos fatores
de produção”, o ator central no desenvolvimento econômico.

As “novas combinações” (posteriormente denominadas


inovações) concorrem com as práticas tradicionais e as supe-
ram, induzindo a chamada “destruição criadora”, o motor da
dinâmica do desenvolvimento capitalista. A inovação possibilita
ao empresário obter uma lucratividade superior à da concor-
rência, a qual reage imitando-a e copiando-a, desencadeando
uma onda de investimentos que estimula a economia e impul-
siona o crescimento econômico, a prosperidade e o bem-estar
social. Para recuperar a dianteira o empresário precisa conti-
nuar inovando – na linguagem atual: empresas inovadoras tem
na busca incessante por inovação o cerne de sua estratégia.

Para Schumpeter, só é empresário aquele que «... efetiva-


mente ‹levar a cabo novas combinações› e perde esse caráter...
quando dedicar-se a dirigi-lo, como outras pessoas dirigem
seus negócios.” (Schumpeter 1999: 56).

A quem se refere Schumpeter ao mencionar “outras pessoas”?

38
Ele estabelece uma tipologia com “...dois tipos de conduta
que, seguindo a realidade, podemos descrever como dois tipos
de indivíduos: os meros administradores e os empresários.”
(Schumpeter 1999: 59).

As outras pessoas a quem ele se refere são os “meros ad-


ministradores”?

Aqui podemos identificar um equívoco na tradução do


“Theorie der wirtschaftlichen Entwicklung”9 para o português.
Senão, vejamos.

Os dois “tipos de conduta” identificados por Schumpeter


não são, como consta na versão em português, o empresário
e o administrador. O que ele diferencia são as condutas, os

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


comportamentos do empresário (Unternehmer) e do Wirt. Ao
contrário de Unternehmer (empresário) a palavra alemã Wirt,
em seu significado econômico, não possui tradução para o
português. Exprimir Wirt como administrador,10 além de equi-
vocado, não faz sentido. Para Schumpeter, o que importa de
fato – e isso é fundamental para uma estratégia consistente de
educação empreendedora – são os dois tipos de conduta, não
as funções que o empresário eventualmente exerça em seu es-
tabelecimento11.

Wirt deve ser definido como o proprietário de empresa


que toca seu negócio de forma tradicional e que se contenta
em obter o lucro médio de seu segmento empresarial. Dito

9 Veja a “Teoria do Desenvolvimento Econômico” da Coletânea Os Economistas, Editora Abril.


10 Verwalter em alemão.
11 Como sabemos, administrador é apenas uma das muitas funções que o proprietário de um pe-
queno negócio pode assumir no dia a dia da empresa. “O empresário dos tempos mais antigos
não só era, via de regra, também o capitalista, mas frequentemente era ainda – como ainda é
hoje no caso de estabelecimentos menores – seu próprio perito técnico, enquanto um especia-
lista profissional não fosse chamado para os casos especiais. Da mesma forma era (e ainda é),
muitas vezes, o seu próprio agente de compras e vendas, o chefe de seu escritório, seu próprio
diretor de pessoal e, às vezes, seu próprio consultor legal para negócios gerais, mesmo que, na
verdade, via de regra, empregasse advogados. E era executando algumas dessas funções ou
todas que ele preenchia regularmente seus dias.” (Schumpeter 1999: 56)

39
de outra forma: Wirt é o empresário que não se comporta
como (não demonstra a conduta de) um empreendedor, no
sentido schumpeteriano.12

As consequências das dificuldades de tradução da influen-


te obra de Schumpeter para o português não se limitam a uma
curiosidade filológica ou preocupação linguística. Adiciona-se a
elas a grande influência da literatura relacionada ao empreen-
dedorismo de origem anglo-saxônica13 e tem-se um forte indi-
cativo do porquê empreendedor é utilizado na linguagem co-
loquial – refletindo e ao mesmo tempo influenciando o senso
comum – ora como sinônimo de empresário, ora sugerindo que
o empreendedor antecede o empresário (o empreendedor de
sucesso se torna um empresário).
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

Dessa forma, todos que já possuem, ou querem criar uma


empresa, são ou deveriam se tornar empreendedores. Nessa
visão a função da educação empreendedora seria transformar
todos os proprietários de (pequenos) negócios em empreende-
dores schumpeterianos.

No entanto, na linha preconizada por Schumpeter, as


evidências empíricas sugerem a predominância do Wirt na
economia. O que não diminui, ao contrário ressalta, o papel
do empreendedor no processo de desenvolvimento. Sabe-
mos que a competitividade de uma economia depende de
múltiplos fatores inter-relacionados, dentre os quais assu-
me especial ênfase a sua capacidade de inovação. Nessa
perspectiva, estimular e fomentar o empreendedorismo ino-

12 Filion (1999) define Wirt como proprietário-gerente de pequenos negócios que não assume um
papel empreendedor. Certamente uma melhor caracterização do Wirt, ao identificá-lo como
proprietário da empresa, mas insuficiente. Não a função desempenhada, mas sim a “conduta”
frente ao negócio é a diferença que caracteriza o empreendedor, segundo Schumpeter. Um pro-
prietário pode ser gerente de sua empresa e imprimir nela uma dinâmica inovadora no sentido
schumpeteriano.
13 O equivalente em inglês para a palavra alemã Unternehmer é entrepreneur, o que, por sua vez,
significa empreendedor, em português.

40
vador são tão importante quanto apoiar e induzir a grande
maioria do segmento, o Wirt, a introduzir em suas empre-
sas inovações já existentes no mercado14.

Considerações finais

Em nosso país consolidou-se, nas últimas décadas, a per-


cepção bastante disseminada de que o empreendedorismo é
um fator do desenvolvimento econômico e o empreendedor um
agente das mudanças e transformações na economia.

Assim sendo, ao facilitar e induzir uma melhoria na ação

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


cotidiana dos empreendedores à frente dos seus negócios,
investimentos em educação empreendedora constituiriam um
importante vetor para fomentar o desenvolvimento econômico.

O desafio de ampliar consideravelmente o alcance e a qua-


lidade dos instrumentos de educação empreendedora ganha,
portanto, premência na atual conjuntura.

Uma forte ampliação dos instrumentos de educação em-


preendedora depende de políticas e recursos compatíveis com
os volumes de investimentos necessários. Já o desafio do in-
cremento da qualidade da educação empreendedora deve con-
siderar os princípios do modelo andragógico, cujo pressuposto
básico é de que a experiência é a melhor fonte de aprendiza-
gem para os adultos, cuja motivação para o aprendizado resul-
ta de suas necessidades e interesses.

Para além da perspectiva behaviorista, a qualidade da educa-


ção empreendedora tem em Schumpeter um importante referen-

14 Alinhando assim a tipologia schumpeteriana referenciada na “conduta” com os conceitos de


inovação incremental e de ruptura.

41
cial teórico, especialmente a distinção entre Wirt (o “empreende-
dor não dinâmico”, voltado primordialmente para a sobrevivência e
estabilização de seu negócio) e empresário/empreendedor. A edu-
cação empreendedora, em suas estratégias de disseminação de
conhecimento e desenvolvimento de habilidades e atitudes, deve
levar em conta essas diferentes características e motivações.

Por último, mas não menos importante, deriva da sua rele-


vância empírica a acuidade do instrumental teórico de Schum-
peter como referencial para a modelagem da necessária proxy
identificadora das reais demandas dos proprietários de peque-
nos negócios por produtos e serviços no âmbito da educação
empreendedora.
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

Referências bibliográficas

FILION, L. Jacques (1999): Empreendedorismo: empreen-


dedores e proprietários-gerentes de pequenos negócios.
São Paulo: Revista de Administração, vol. 34, n. 2, p. 05-28,
abril/junho 1999.

KNOWLES, Malcolm S. (1950). Informal adult education: a


guide for administrators, leaders, and teachers. New York:
Association Press.

SANTOS, Carlos A. (2012): Desafios e perspectivas para os


próximos anos. Coletânea Pequenos Negócios: desafios e
perspectivas, vol. 1, p. 12-26. Brasília: Sebrae, 2012.

SCHUMPETER, Joseph A. (1982): Teoria do Desenvolvimen-


to Econômico. São Paulo: Abril Cultural, 1982. Tradução feita a
partir do texto em língua inglesa, intitulado The Theory of Econo-
mic Development (1934). Título Original: Theorie der wirtschaftli-
chen Entwicklung (1911). Berlin: Duncker & Humblot, 1987.

42
Este artigo foi publicado na revista L’Expansion Entrepreneuriat, nº. 6, junho 2010, pp.15
– 23. Uma versão anterior deste texto foi publicada pela primeira vez em: Filion, L.J. e
C. Ananou (sob a direção) (2010) De l’intuition au projet d’entreprise Montréal, Trans-
continental, capítulo 25, pp. 487- 500, com o título «Quelques conseils pour réussir la
création de son entreprise»

Dez conselhos para os


criadores de empresas
Louis Jacques Filion15
Cândido Borges16

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


A criação de empresas:
uma aventura desafiadora

Como passar pelo processo de criação de um novo ne-


gócio com sucesso e sobreviver durante essa travessia? De
acordo com nossas experiências práticas, segundo a análise
das pesquisas e o ensino sobre empreendedorismo, nós iden-
tificamos uma série de preceitos e conselhos e os transmitimos
para aqueles que estão se preparando para abrir uma empre-
sa. Nós escolhemos dez para compartilhar aqui. Eles estão
primeiramente na Tabela 1, a seguir, e depois cada um deles
é brevemente discutido. Dada a grande variedade de contex-
tos e situações de novos empreendimentos, esses conselhos

15 Professor titular diretor, Cátedra de Empreendedorismo Rogers-J.-A.-Bombardier – HEC


Montréal.
16 Professor-adjunto na Universidade Federal de Goiás (UFG) – Faculdade de Administração, Ciên-
cias Contábeis e Ciências Econômicas (Face) – Campus II

43
são apresentados despretensiosamente porque eles não se
aplicam forçosamente nem a todos os empreendedores nem
a todos os contextos. Estes conselhos devem ser considera-
dos com discernimento. Eles devem estimular uma reflexão
e aprendizagem para melhorar as probabilidades de sucesso
para a maioria dos empreendedores.

Tabela 1 – Dez conselhos para os criadores de empresas

1. Estruturar seu modelo mental empreendedor

2. Estabelecer seus critérios de sucesso, determinar alguns


objetivos e saber se organizar para agir
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

3. Conhecer e compreender seu setor, ouvir e estar focado


no cliente

4. Valorizar a oportunidade de negócio identificada e saber


escolher o momento oportuno (timing)

5. Contribuir com uma inovação e se diferenciar: no mode-


lo de negócio, na escolha do nome, no preço

6. Adotar ferramentas de reflexão

7. Mobilizar sua rede desde o início, ter relações de apoio e


contatos de negócio

8. Definir seu próprio espaço, o espaço dos outros e delegar

9. Saber estar rodeado de empreendedores: parceiros,


mentor, coach e comitê consultivo

10. Preparar-se para a polivalência e saber perseverar

44
Estruturar seu modelo
mental empreendedor

A preparação para a atividade empresarial requer uma in-


trodução ao conhecimento que leva a uma maneira de pensar
e de inovar. Alguns adquirem esse conhecimento estando em
contato com empreendedores na sua própria família, no seu
ambiente durante seus estudos, ou por meio de leituras. O
empreendedorismo segue a expressão de uma forma particular
de pensar, foca na novidade, na mudança e na inovação.

A cultura que está na base de toda maneira de pensar e de


agir se desenvolve em contato com pessoas que incor-

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


poram essa cultura e se integraram bem a ela. Isso se
aplica a qualquer pessoa que esteja pensando em se tornar
um empreendedor. Ele está se preparando, colocando-se em
contato com os empreendedores. Não há uma geração es-
pontânea. O empreendedor não é improvisado.

É útil fazer um balanço e identificar os papéis que nós mes-


mos temos desempenhado nas iniciativas ou nas atividades
inovadoras e avaliar os pontos fortes e fracos nesse proces-
so. Será que no passado tivemos uma tendência para definir
o contexto das atividades futuras? Será que já mostramos ter
capacidade para expressar um pensamento projetivo? Os em-
preendedores tentam antecipar o futuro e imaginar o que pode-
ria ser. Eles definem grupos de atividades que querem realizar
e como vão se organizar para conseguir. Eles são iniciadores
e agregadores em torno de seus projetos.

45
Estabelecer critérios de sucesso,
determinar alguns objetivos e saber se
organizar para agir

A criação de uma empresa, por excelência, é um exercício


de liberdade. Durante esse período o empreendedor define
o que será possível para ele. Cada pessoa mantém critérios,
quase sempre implícitos, do que ela quer realizar. Por que não
torná-los explícitos e usá-los para definir o sistema de ativida-
des que quer realizar?

O que eu quero realizar? Quais são meus objetivos? Como


Capítulo I – Educação empreendedora em debate

devo me organizar para conseguir? O empreendedor tem a van-


tagem de estabelecer os objetivos gerais, mas os objetivos
devem ser específicos e mensuráveis ao logo do tempo. Por
exemplo: atingir um nível “X” de venda em três meses;
atingir o ponto de equilíbrio em seis meses; atingir o nível “X”
de lucro durante o segundo ano de operação, etc.

O fato de estabelecer e explicitar seus próprios critérios de


sucesso, os quais poderão variar ao longo do tempo, oferece
valores de referência para definir de objetivos, determinar as fron-
teiras, definir melhor o alvo e escolher as atividades que realizará
o que vai permitir tomar decisões mais rápidas e mais justas.

O empreendedor é orientado para a ação. Ele pensa cons-


tantemente na ação. Ele sabe escolher o momento oportuno
para agir. Ele gosta de tomar decisões. Em suma, o empreen-
dedor é um “artista da ação”. É a passagem para a ação de
maneira bem articulada, com a qual ele se engaja e depois ge-
rencia que faz o sucesso do empreendedor.

Como empreendedores, é importante refletir sobre cada


uma de nossas ações e que estejamos em condições de
responder as seguintes perguntas: Por quê? Como? Com

46
quem? Quais os efeitos sobre as pessoas de dentro e de fora
da empresa? Quais as contribuições e consequências para a
realização de meus objetivos?

Conhecer e compreender seu setor,


ouvir e estar focado no cliente

Existem alguns elementos indicadores de sucesso nos


negócios. A experiência empresarial ou em gestão é um de-
les. O conhecimento do setor no qual se vai inserir é ou-
tro. Caminhar em um terreno familiar é normalmente menos
arriscado que explorar o desconhecido. Começar um novo

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


negócio não é diferente.

Ter trabalhado no setor onde a empresa será criada repre-


senta um fator positivo destacado pelos empreendedores para
ter sucesso no seu desenvolvimento. Essas experiências ante-
riores facilitam o aprendizado necessário para o desenvolvimen-
to dos produtos/serviços e de tecnologias envolvidas. O conhe-
cimento do funcionamento do setor e de alguns de seus atores,
como fornecedores e potenciais clientes, permitirão o acesso a
informações estratégicas e muito úteis para melhor adaptar e
ajustar o que se quer fazer.

Quem são meus clientes? Quem são meus clientes


potenciais? Eles precisam de quê? Quais são as melho-
res estratégias para vender a esses clientes? Quem são os
clientes de meus clientes? Quem são meus concorrentes?
Essas são perguntas que um empreendedor tem que se
fazer antes de abrir sua empresa. Os empreendedores que
evoluem no B2B (Business to Business) nos dizem que eles
foram mais bem-sucedidos no momento em que se coloca-
ram na pele do cliente para entender melhor as necessida-
des dos clientes de seus clientes.

47
As pesquisas mostram que os gestores de pequenos negó-
cios que têm as estratégias mais eficazes dedicam tempo para
encontrar os fornecedores, o que lhes permite estar mais bem
informados sobre as mudanças em curso e futuras no seu setor.

O empreendedor que anteriormente não trabalhou na área


na qual quer criar sua empresa, terá que encontrar maneiras
para corrigir essa fraqueza. Existem várias maneiras para fa-
zer isso, por exemplo, observando o funcionamento de uma
das empresas mais inovadoras desse setor ou de um setor
relacionado ao seu, caso se trate de um setor emergente. Ter
contato com os fornecedores do setor ou com os usuários de
produtos atuais ou de produtos relacionados, também pode
ajudar a enriquecer sua referência sobre o que é realmente
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

pertinente e pode gerar efeitos nas vendas dos produtos/ser-


viços a serem comercializados.

Valorizar a oportunidade de negócio


identificada e saber escolher o
momento oportuno (timing)

A oportunidade de negócio é a pedra angular sobre a qual


se constrói o plano de negócio. Deve haver uma estreita corres-
pondência entre o empreendedor e sua oportunidade de negó-
cio. Se o empreendedor tem uma paixão por um determinado
assunto, ele será altamente motivado a continuar aprendendo
e com certeza vai vencer. Os empreendedores pensam intensa-
mente sobre as maneiras originais de valorizar a oportunidade.

É preciso estar consciente que quanto mais nós avançamos


no tempo, mais a janela de oportunidades diminui. Antigamente,
uma oportunidade podia ser possível e estar disponível durante
décadas. Atualmente, na maioria das vezes é uma questão de
meses ou no máximo de alguns anos. Uma oportunidade per-

48
de sua força quando muitas pessoas conseguem identificá-la. É
importante escolher o momento oportuno, não se alongar muito,
se preparar, e agir. Muitas hesitações farão com que seja tarde
demais, muitas precipitações farão com que seja muito cedo. Os
empreendedores multiplicam os ângulos a partir dos quais eles
analisam o setor deles e acabam desenvolvendo um sexto senti-
do quanto ao momento oportuno (timing) para agir.

É importante que a oportunidade identificada satisfaça


uma necessidade. Muita gente se lança rapidamente a partir de
uma ideia que elas acreditam que seja boa, mas na realidade
ela não preenche uma real necessidade.

Não é apenas a identificação de uma boa oportunidade de

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


negócio que importa, mas também a maneira de dar forma a
essa oportunidade. A maioria das oportunidades precisa passar
por transformações e por combinações às vezes complexas. É
por isso que vários autores preferem utilizar o termo “criação
de oportunidades” em vez de simplesmente “identificação de
oportunidades”. Uma vez finalizada, é preciso testá-la no mer-
cado e ressaltá-la de maneira segura e inteligente; o momento
oportuno é muito importante. Aqui, o «artista da ação» que é o
empreendedor precisa saber ao mesmo tempo usar sua intui-
ção, usar seu talento e “manter o faro em alerta”, saber fazer as
coisas por conta própria e com os recursos disponíveis, dese-
nhar e dar uma forma ao seu projeto potencial.

Contribuir com uma inovação e se


diferenciar: no modelo de negócio, na
escolha do nome, no preço

O empreendedor é uma pessoa que apresenta uma inova-


ção, algo novo, diferente que agrega valor em relação ao que já
existe. É preciso trabalhar e retrabalhar a maneira de valorizar

49
a oportunidade de negócio e de entrar no mercado com novos
elementos de novidade e diferenciação.

Dessa forma, os empreendedores aumentarão suas


chances de sucesso se trabalharem e retrabalharem seu mo-
delo de negócio17, a coerência entre as 4P ou 5P, a escolha
do nome, a conexão lógica entre o tipo de produtos/servi-
ços, a distribuição e um preço justo. Um nome comercial
geralmente deve se referir ao que faz o negócio, deve ser um
nome fácil de ser lembrado e, além disso, deve ser “global”,
ou seja, que possa ser entendido em várias línguas, princi-
palmente se planeja entrar para o mercado internacional.
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

Para as empresas de alguns setores de serviços, pode ser


vantajoso que o nome comece com uma palavra que se refi-
ra ao serviço pertinente, por exemplo, «Viagens 4D» para uma
agência de viagens, ou com uma letra no início do alfabeto.
«Apple» aparece em primeiro lugar na lista das empresas, en-
quanto que «Microsoft» é mais explícito.

Não existe uma regra absoluta para a escolha do nome,


mas existem várias questões que devem ser consideradas de-
pendendo do setor e do tipo de negócio. É preferível escolher
um nome que seja lembrado facilmente.

Quanto ao preço, este tema é um dos pontos fraco de


muitas empresas nascentes, principalmente no setor de ser-
viço. É importante fazer vários testes de mercado antes de
estabelecer o preço definitivo de venda dos produtos/servi-
ços. Uma vez os produtos/serviços lançados será difícil fazer
grandes alterações de preço.

17 Ver em particular : Verstraet (Thierry) et Jouisson-Laffitte (Estèle), Business Model pour entre-
prendre, Paris,De Boeck, 2009.

50
Adotar ferramentas de reflexão

Para adotar ferramentas de reflexão, é aconselhável pro-


ceder com a elaboração de um quadro que vai esclarecer seu
sistema de atividades empreendedoras. Primeiramente, conce-
ber e descrever em algumas páginas a empresa ideal que você
gostaria de organizar (duas a cinco páginas). Isso vai permitir
especificar vários pontos de ancoragem sobre os elementos
fundamentais que são importantes para o empreendedor e aos
quais ele fará referência mais tarde.

Em segundo lugar, esboçar um guia de atividades para


implantar o projeto (duas ou três páginas). Em terceiro lugar,

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


após a realização de um estudo de mercado, esboçar um pri-
meiro rascunho do projeto de empresa, pode ser um resumo
de cinco a seis páginas. É importante ver essas notas como
um elemento de apoio a reflexão, a progressão e a concepção
do projeto, mas não como planos a serem implantados a todo
custo. Os empreendedores que fizeram esforços para conce-
ber um projeto estão melhores equipados para enfrentar os
imprevistos e as situações difíceis no futuro.

Esse exercício vai estimular o pensamento projetivo. Vai


permitir ao empreendedor especificar a informação e os recur-
sos necessários para atingir seu objetivo, preparar seu plano
de ação e se acostumar a trabalhar com vários cenários. O fato
de considerar o que se quer fazer e como fazê-lo geralmente
permite simplificar os processos e diminuir os recursos even-
tuais necessários para levar as atividades a cabo. Isso permite
também gerenciar melhor o principal recurso, que é muito curto
para a maioria dos empreendedores: o tempo.

Um mínimo de planejamento deverá levar a maioria dos cria-


dores de empresa a aprofundar as análises de mercado, a com-
preender melhor o mercado do setor assim como as necessidades

51
eventuais dos usuários quanto a produtos/serviço, para destacar
melhor as vantagens competitivas e conceber com mais coerên-
cia o sistema de recursos, particularmente, recursos humanos que
precisarão para arrancar e gerenciar a empresa com mais eficácia.

Depois do início da empresa, é normal aparecer impre-


vistos, mudanças de situações. O projeto da empresa é um
guia que não deve ser seguido “ao pé da letra” e que deve ser
modificado e adaptado às novas condições enfrentadas pela
empresa. O esboço do plano não deve limitar as ações do em-
preendedor, nem sua intuição. Toda essa preparação deve ser
usada com bom senso e discernimento.

Trata-se de uma ferramenta de orientação e de acompa-


Capítulo I – Educação empreendedora em debate

nhamento que permite dar uma direção e nos ajudar a tomar


decisões rapidamente. Ela também serve de ferramenta de co-
municação para informar aos interessados o que se quer realizar.

Mobilizar sua rede desde


o início, ter relações de apoio
e contatos – de negócio

Quais são as informações que eu preciso? Quais são os supor-


tes que poderiam ser úteis pra mim? Com quem eu posso começar
o negócio? Eu vou precisar me envolver com que tipo de pessoa?
De quais recursos vou precisar? Onde vou encontrar esses recur-
sos? Quais são os serviços e programas que poderiam ajudar a
criação de empresas e dos quais eu poderia me beneficiar?

Os empreendedores ganham em começar cedo a criar e a


mobilizar a rede de negócio deles. Primeiro, eles conversam so-
bre as ideias de negócio deles com os clientes potenciais. Em
alguns casos, esses clientes podem, inclusive, ser envolvidos
no desenvolvimento de produtos.

52
Os clientes potenciais podem fornecer informações que
permitirão ajustar melhor o produto às condições do mercado
e melhor atender às necessidades dos usuários potenciais.
Isso pode facilitar a primeira venda, momento sempre crítico
para uma empresa que está começando. Um cliente potencial
que participou do projeto poderá não apenas ser o primeiro
comprador, mas também indicar outros clientes potenciais.

Durante muitos anos, a imaginação popular manteve o mito


do herói empreendedor, ou seja, aquele que abre uma empresa
sozinho e se debate com uma coragem excepcional para sobre-
viver. No entanto, a pesquisa nos ensinou que o empreendedo-
rismo é um fenômeno coletivo, o empreendedor realizando seu

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


sonho com a participação, a assistência e o apoio de muitas
outras pessoas, parentes, parceiros, colaboradores, contatos da
sua rede, assim como membros de organizações de apoio. É
preciso ter um mínimo de pessoas na rede do empreendedor, o
que permite, em primeiro lugar, ser informado sobre o que acon-
tece no setor, estimular a reflexão e o aprendizado.

Definir seu próprio espaço, o


espaço dos outros e delegar

Se a criação de uma empresa tem uma dimensão coletiva


que garante que o empreendedor tenha vantagem em recor-
rer à ajuda externa e interagir com as pessoas de sua rede, ela
tem também, por outro lado, uma ação muito pessoal. Para
conduzir bem seu projeto, o empreendedor tem que ter con-
fiança em si mesmo, e nas suas competências e ser capaz vi-
ver em harmonia consigo mesmo e com os outros. Isso pode
exigir que ele redefina seu próprio espaço, o que lhe permitirá

53
definir melhor os espaços dos outros que vai precisar.18

Os empresários asiáticos dedicam muito tempo pensando


em formas de organizar o sistema social da empresa, integran-
do os valores que refletem a harmonia entre as pessoas. É im-
portante projetar e implantar um sistema social que reflita equi-
líbrio entre as energias exigidas e as capacidades das pessoas.
Esse equilíbrio vai fazer bem ser refletido no próprio empreen-
dedor, na empresa, na família e nas outras esferas de sua vida.

Ao contratar é aconselhável definir um contrato psicológi-


co claro entre o empreendedor e as pessoas contratadas para
fazerem parte de sua equipe: o que cada colaborador tem o di-
reito de esperar do empreendedor que dirige a empresa e o que
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

o empreendedor tem direito de esperar de cada colaborador.

É vantajoso considerar o critério de delegação eventual e


potencial de tarefas no momento de recrutamento e contrata-
ção. Não basta contratar pessoas com base no seu know-how
para completar uma tarefa num determinado prazo. O cresci-
mento de uma empresa passa pela delegação de tarefas e esta
começa pela concepção de um processo durante o qual são
definidas tarefas a serem cumpridas e depois são determinada
as tarefas que poderão ser delegadas.

Saber estar rodeado de


empresários: parceiros, mentor,
coach e comitê consultivo

A cultura empreendedora se adquire, se desenvolve e se


nutre por osmose em contato com os empreendedores. O

18 Filion (Louis Jacques) et Bourion (Christian) (Eds.), Les représentations entrepreneuriales, Pa-
ris, ESKA, 2008.

54
empreendedorismo está crescendo com as equipes empreen-
dedoras compostas de parceiros com competências com-
plementares. As pesquisas mostram que a maioria das novas
empresas é criada por equipes19. Essa percentagem está con-
firmada nas nossas próprias pesquisas. No caso das empresas
de tecnologia, esse número sobe para mais de 95%20.

É importante que o empresário ou os futuros empreende-


dores identifiquem um mentor, um coach e um grupo de acon-
selhamento. Na área prática, como é o caso do empreendedo-
rismo, não há substituto para a experiência. O empreendedor
terá interesse em estar rodeado de especialistas. Esse é um
fator importante de sucesso.

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


Mencionamos aqui uma pesquisa realizada nos Estados
Unidos (EUA) sobre a criação de empresas durante os últimos
anos. Essa pesquisa indica que 52% das empresas criadas, na
amostra, foram estudadas pelas equipes: Aldrich (Howard), Car-
ter (Nancy) e Ruef (Martin), «Teams», no Gartner (William), Shaver.

Primeiro, o empreendedor precisa de um mentor. O papel


desse último é fazer perguntas fundamentais sobre o modelo e o
percurso empresarial do empreendedor. As relações com o men-
tor devem começar assim que o empreendedor decidir começar
que quer começar um negócio. As reuniões geralmente são rea-
lizadas uma vez por mês e acontecem durante alguns anos21.

O mentor é quase sempre o empresário aposentado. Ele


não é remunerado. Ele não é nem um coach, nem um par-

19 Mencionamos aqui uma pesquisa tipo realizada nos Estados Unidos sobre a criação de empre-
sas durante os últimos anos. Essa pesquisa indica que 52 % das empresas criadas na amostra
foram estudadas pelas equipes: Aldrich (Howard), Carter (Nancy) e Ruef (Martin), «Teams», no
Gartner (William), Shaver (Kelly), Carter (Nancy) e Reynolds (Paul) (Eds.), Handbook of entrepre-
neurial dynamics: The process of business creation, Thousand Oaks, Sage, 2004, p. 299-310.
20 Filion (Louis Jacques), Borges (Cândido) e Simard (Germain) «Étude du processus de création
d’entreprises structuré en quatre étapes», Comunicação apresentada no 80 Congresso Inter-
nacional Francofone sobre a PME, Fribourg, publicada nas Atas, CIFEPME 2006
21 Ver programa de mentor da Fondation de l’entrepreneurship (www.entrepreneurship.qc.ca).

55
ceiro e não investe na empresa. Ele orienta o empreendedor
na aprendizagem de sua especialidade de empreendedor e de
gestor. Os empreendedores tecnológicos costumam recorrer a
dois mentores: um pesquisador da área da tecnologia e o ou-
tro um empreendedor tecnológico com experiência. O mentor
enquadra uma abordagem reflexiva para articular melhor a coe-
rência do conhecimento para ser empreendedor.

Após o início das operações da empresa, o empreendedor vai


precisar de um coach. No hockey, o coach está atrás do banco
dos jogadores e dá conselhos sobre o que deve ser feito durante
a ação. No mundo dos negócios, o coach pode ser um empreen-
dedor experiente, aposentado ou não, ou um executivo de uma
empresa de grande porte, aposentado ou não, que tem a expe-
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

riência no setor (no sentido amplo). Pode ser ainda um especialista


de marketing. Ele dá conselhos sobre as ações a serem tomadas,
ajuda a desenvolver cenários, a avaliar os efeitos das decisões e dá
conselhos sobre as ações a serem realizadas assim como fazê-las.

As reuniões com o coach acontecerão uma ou duas vezes


por mês e duram de dois a quatro anos. Alguns coaches são
remunerados, dependendo da quantidade de trabalho que lhe
é exigida, e da frequência das reuniões.

O empreendedor terá vantagem em implantar um grupo


de aconselhamento, composto de três ou quatro pessoas com
experiência com quem ele se reunirá três ou quatro vezes por
ano para discutir sua estratégia e as decisões de escopo estra-
tégico a serem tomadas. O empreendedor poderá transformar
seu plano de negócios, ou a descrição da oportunidade ou a
forma de apresentar seu plano empresarial em plano estratégi-
co e usá-lo como referência de base para organizar o trabalho
dos membros do grupo de aconselhamento que podem ser
tanto de gestores de pequenas empresas como executivos de
grandes empresas, ou especialistas em marketing, em finança,
em gestão de operações, em recursos humanos ou outros.

56
Eles são remunerados pelo trabalho que desenvolvem. O
mandato deles geralmente dura dois anos e pode ser renovado.
As associações que agrupam os gestores de pequenas empresas
geralmente oferecem capacitação e suporte para instalar grupos de
aconselhamento na maioria dos países22. O grupo de aconselha-
mento tem a vantagem de ser mais leve que um conselho de ad-
ministração tradicional e não requer nenhuma documentação legal.

O empreendedor que monta esses mecanismos de acon-


selhamento terá uma estrutura que vai facilitar a aprendizagem e
lhe permitirá reduzir muito seus riscos. Todas essas pessoas com
experiência dispõem também de redes de relacionamento que
poderão ser úteis ao empreendedor, principalmente durante os
primeiros anos após a abertura da nova empresa. Essa dinâmica

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


ajudará o crescimento e a lucratividade da empresa emergente.

Prepare-se para a polivalência


e saiba perseverar

Durante todo o processo de criação e operação de sua


empresa, o empreendedor vai ter que lidar com diferentes tipos
de atividades e tocar muitas áreas de gestão: gestão financeira
e administração, pesquisa e desenvolvimento, gestão de ope-
rações, promoção, relações com os parceiros.

Entretanto, algumas atividades devem concentrar sua


atenção de maneira especial: na escolha dos colaboradores e
na gestão de recursos humanos, na venda e na comercializa-
ção. Os criadores de empresa bem-sucedidos geralmente dão
uma atenção especial a essas atividades e dedicam a elas mais
tempo que outros empreendedores.

22 Ver www.groupement.ca (Reunião dos gestores de empresas).

57
O caminho que leva a criação de uma empresa é muitas ve-
zes marcado por uma série de pequenos passos e não por gran-
des passos. Poucas empresas atingem rapidamente o ponto de
equilíbrio. Leva tempo para desenvolver um produto/serviço, para
atingir a clientela e alcançar um volume de vendas satisfatório. Por
isso, os empresários precisam estar preparados para essa traves-
sia do deserto. Eles precisam, entre outras coisas, mobilizar os re-
cursos necessários para apoiar o projeto até atingir a rentabilidade,
e cobrir suas despesas de sobrevivência pessoal.

É importante estar preparado para perseverar. Será mais


fácil para os apaixonados pelo tipo de negócio que estão crian-
do. Durante todo o processo de criação de uma nova empre-
sa, os empreendedores terão que enfrentar muitos obstáculos:
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

falta de financiamento, dificuldades para vender os produtos,


rotação de pessoal, aparecimento de novos concorrentes, etc.
Somente a perseverança vai ajudar a atravessar as ondas mais
agitadas antes de atingir uma velocidade de cruzeiro mais se-
rena. A prática de um esporte vai eliminar o estresse, recuperar
as forças, manter a saúde mental e estar em boa forma física.

Um dos problemas enfrentados, rapidamente, pela maioria


dos empreendedores é o isolamento. Uma das maneiras de
combatê-lo é estar rodeado de gente, mas também implica es-
tar envolvido, algumas horas por semana, numa atividade de
voluntariado num ambiente onde a empresa opera. Isso permi-
te manter um estado de equilíbrio de si mesmo e contribui para
a vida da comunidade. Em alguns casos os clientes vão surgir
a partir dos contatos feitos durantes estas reuniões.

Considerações finais

A criação de uma nova empresa é um marco importante na


vida da maioria das pessoas que embarcam nesta aventura. É um

58
período intenso, durante o qual se aprende, rapidamente, os os-
sos do ofício da carreira de empreendedor e de gestor. Este apren-
dizado será muito mais fácil se você estiver bem preparado. A pro-
fissão de empreendedor é sempre uma profissão adicional que se
agrega a uma carreira de base. O exercício de qualquer profissão
exige um aprendizado e o empreendedorismo não é exceção.

As diversas atividades relacionadas com a criação de uma


nova empresa vão transformar a maneira de ser, de pensar e de
agir do empreendedor. Todas estas atividades precisam apren-
der novos papéis. É importante aprender a aprender tanto ouvin-
do, observando, aprender a definir a condução dos gestores e a
visão daquilo que se quer realizar, mas também saber se comu-
nicar. É preciso saber estar rodeado, amar, progredir e saber agir.

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


O empreendedorismo exige aprendizado contínuo de
transcendência. O exercício bem-sucedido de uma das mais
bonitas profissões do mundo dá acesso a uma liberdade cada
vez maior. Isso deve fornecer melhores meios para a realização
de si mesmo e a realização dos outros aos quais o empreen-
dedor está associado. Isso deveria permitir uma melhor contri-
buição para o desenvolvimento das empresas. As sociedades
sem empreendedores terminam morrendo, mas aquelas onde
os empreendedores são bem-sucedidos devem colher os fru-
tos e compartilhar as riquezas produzidas.

59
Negócios em Educação
Empreendedora: Saberes
para Empreender
Antonio Fernando Leal 23

Introdução

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


O conhecimento é imperativo, qualquer que seja a área
escolhida pelo empreendedor para iniciar um negócio. Não
somente dos aspectos mercadológicos ou econômicos-finan-
ceiros, explicitados no plano de negócio, como dos detalhes
técnicos e conceituais relativos ao próprio empreendimento.

Empreender em projetos de educação empreendedora


segue a regra. A atividade requer, do futuro empresário, tanto
informações sobre a viabilidade do negócio, como o conhe-
cimento de referenciais teóricos alusivos ao tema. Isso ajuda
a compreender, por exemplo, como as pessoas aprendem e
a forma como esse aprendizado pode se tornar mais efetivo
na formação dos comportamentos empreendedores, objeto
do empreendimento. A condução de atividade em educação
empreendedora depende, em boa parte, desse conhecimento
e do entendimento geral da importância do aprendizado no de-
sempenho do indivíduo.

23 Mestre em Educação pelo PPGE/UFPB e professor-adjunto do Centro Universitário de João


Pessoa (Unipê).

61
O que dizem os estudos?

A busca dos saberes necessários para o desenvolvimen-


to de negócios em educação empreendedora pode se dar em
ambientes formais ou informais. A consulta a órgãos especiali-
zados, a conversa com outros empreendedores, a visita a em-
preendimentos na área, tudo isso pode ajudar. Indispensável,
no entanto, é a investigação pelo conhecimento sistematizado,
que é encontrado nas pesquisas já desenvolvidas por outros
profissionais. A formação do nivelamento conceitual acerca do
negócio – empreendedor, empreendedorismo, educação em-
preendedora – começa por aí.
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

Iniciando pelo vocábulo empreendedorismo e o seu per-


curso ao longo do tempo, vê-se que

Este termo parece ter percorrido outros caminhos,


passando primeiro pelo francês, entrepreneur, utilizado
por volta do século XVI, para designar a pessoa que
incentivava brigas ou coordenava operações militares.
Mais tarde foi incorporado ao vocabulário da língua ingle-
sa e, por volta do século XVII, passou a ter conotação de
“empresário”, ou seja, pessoa que conduz um projeto ou
um empreendimento, próximo ao sentido em que lhe é
atribuído hoje, no Brasil. (Dolabela, 2003, p.32)

Segundo o próprio Dolabela, na mesma obra,

Essa migração do conceito do âmbito da empre-


sa para todos os demais atinge o empregado em or-
ganizações, chamado de intraempreendedor, alguém
capaz de inovar, de propor à instituição onde trabalha
caminhos que possam conduzir à ocupação adequa-
da de um espaço no seu ambiente de atuação, otimi-
zando os resultados institucionais. (p.36)

62
Estudo realizado por Filion (1988) identificou duas linhas
principais seguidas pelos pesquisadores do tema empreende-
dorismo: a dos economistas – que associa os empreendedores
à inovação – e a dos comportamentalistas – que se concentra
nas características da criação e da intuição dos empreendedo-
res. Como representantes da primeira corrente aparecem Can-
tillon, Say e Schumpeter, apud Filion (1988).

Na vertente comportamentalista destaca-se David C. Mc-


Clelland (1953) “o autor que realmente lançou a contribuição
das ciências comportamentais para o empreendedorismo (Fil-
lion, 1988, p. 4)”. O domínio dessa corrente de pensamento
estendeu-se até os anos 80, quando o campo do empreen-
dedorismo alargou-se para quase todas as ciências sociais e

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


administrativas. Tal fato é confirmado em pesquisa no Banco
de Teses da Capes, repositório que facilita o acesso a informa-
ções sobre teses e dissertações defendidas em programas de
pós-graduação do país, no período de 1987 a 2011. Lá estão
depositados vários trabalhos sobre o tema empreendedorismo,
em linhas acadêmicas diversas como Educação, Psicologia,
Planejamento Urbano e Regional, Engenharia da Produção,
Administração, Serviço Social, entre outras.

Quando a busca se estende à expressão educação em-


preendedora, a partir de trabalhos elaborados em instituições
de Ensino Superior brasileiras vê-se que esses estudos são
mais recentes.

O primeiro trabalho depositado no Banco de Teses da


Capes que registra o termo educação empreendedora como
palavra-chave, é do ano 2000 e foi realizado na Universidade
de São Paulo/São Carlos, na área de Engenharia da Pro-
dução. O autor da dissertação é Ricardo Correa de Oliveira
Ramos, e tem como título Perfil do Pequeno Empreendedor:
Uma Investigação Sobre as Características Empreendedoras
na Pequena Empresa.

63
Estendendo-se a busca ao doutorado, a primeira tese é
de 2004 e foi desenvolvida na Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, em Serviço Social. Trata-se de Empreendedo-
rismo Juvenil: Caminhos e Travessias, de autoria de Marilda Lili
Corbelline. A partir do ano 2000, os estudos se intensificaram,
chegando ao total de 41 trabalhos no período, entre teses (5) e
dissertações (36). Mais de 50% desses registros foram realiza-
dos nos últimos três anos.

Nessa busca pelo nivelamento de informações, dois con-


ceitos de educação empreendedora se destacam. O primeiro
deles é encontrado no Glossário Vade Mecum:

Conjunto de ações desenvolvidas pelo sistema edu-


Capítulo I – Educação empreendedora em debate

cacional com o objetivo de valorizar o papel do empreen-


dedor, disseminar a cultura empreendedora e despertar
vocações empresariais. Busca criar na escola e na socie-
dade uma mentalidade empreendedora através do estí-
mulo à geração de negócios. (Fulgêncio, 2007, p.237)

O segundo, de Fowler (1997, p.19), define a educação em-


preendedora como “formas de organização que transformam
as pessoas, desenvolvendo-as nas mesmas características e
atributos empreendedores que buscam atingir graus mais ele-
vados de realização pessoal e bem-estar social”.

Nota-se claramente, no primeiro exemplo, a as-


sociação restrita da expressão educação empreen-
dedora ao mundo da geração de negócios, visão
essa que foi ampliada por outros estudiosos do
tema, atribuindo uma maior abrangência ao termo,
como aparece no olhar de Fowler. Tal amplitude é
compartilhada por Dolabela (2003, p.21), quando
diz que “a necessidade de aumentar a capacidade
empreendedora – fruto da educação empreendedo-
ra – não é apenas resposta à retração atual do nível

64
de emprego – verdadeira – , mas decorrência direta
de novos padrões de relações sociais e políticas que
incluem o mercado, mas não se limitam a ele”.

Ressalte-se que, do número de dissertações localizadas


(36) que trazem a educação empreendedora como foco de
estudo, apenas seis delas foram desenvolvidas na linha de
Educação:

A) Educação de Jovens de Classe Média para o Empreende-


dorismo (estudo de egressos do Instituto Euvaldo Lodi,
em Cuiabá – Mato Grosso), Eber Luis Capistrano Mar-
tins, 2003;

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


B) Jovens e educação empreendedora: que discurso é esse?
Adriano Mohn e Souza, 2006;

C) O Ensino do Empreendedorismo no Curso de Graduação


em Administração da Universidade Federal de Sergipe: A
Ótica dos seus Docentes, Ângela Maria de Souza, 2006;

D) Concepções sobre Empreendedorismo na Visão de Alunos


e Professores de Cursos de Administração de Brasília, Elia-
na Pessoa, 2008;

E) Aprender a Empreender: Um Pilar da Educação de Jovens


e Adultos, Antonio Fernando Leal, 2009; e

F) Governamentalidade Neoliberal, Empreendedorismo e suas


Repercussões nos Processos Educacionais da Cidade de
Horizonte – CE, José Wagner de Almeida, 2010.

Merecem registro entre esses estudos, pela forma como


abordam o tema empreendedorismo e educação empreende-
dora, os de Adriano Mohn e Souza e José Wagner de Almeida,
pelas leituras críticas feitas ao discurso do empreendedorismo
como a “panacéia” do grave problema do emprego.

65
A incidência maior de estudos tratando de educação em-
preendedora nos últimos três anos de registros do Banco da
Capes, (20, de 2009 a 2011), demonstra a importância cres-
cente que o tema tem despertado. Esse interesse é devido em
parte à agudização das mudanças no mundo da produção e
do trabalho provocadas pela reestruturação produtiva do capi-
talismo global, e, em proporção também importante, mas com
peso relativo, à significativa exposição na mídia do Sebrae e de
suas ações em prol do empreendedorismo.

O mesmo estudo sendo feito em relação às seis teses de


doutorado identificadas na base de dados em análise, mostra
que a metade foi desenvolvida na área de educação:
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

A) Educação empreendedora Transformando o Ensino Su-


perior: Diversos Olhares de Estudantes Sobre Professores
Empreendedores . Silvana Neumann Martins, 2010.

B) Empreendedorismo: O Discurso Pedagógico no Contexto


do Agravamento do Desemprego Juvenil, Jane Maria de
Abreu Drewinski, 2009.

C) Educação para o Empreendedorismo: Implicações Episte-


mológicas, Políticas e Práticas, Marival Coan, 2011.

A análise dos estudos destacados revela a inexistência


de trabalhos dirigidos especificamente para a criação de
pequenos negócios voltados à área de educação empreen-
dedora e dos requisitos necessários para os que querem
empreender ou se desenvolver nessa área. No entanto, o
conhecimento proporcionado pela leitura desses materiais
ajuda a conformar o arcabouço necessário para entendi-
mento da temática, criando condições para a elaboração de
análises que permitam o entendimento de como construir
negócios em educação empreendedora.

66
Saberes para empreender

Como se viu anteriormente, qualquer que seja o negócio


em que se queira investir, o primeiro passo é reunir informações
sobre ele. E não só as informações de mercado, com pesqui-
sas ou observações, mas sobre o seu próprio funcionamen-
to. A existência da Universidade do Hambúrguer, associada à
McDonald’s para a formação dos seus quadros, para ficar só
num exemplo, apenas confirma essa importância.

Como seria, então, um pequeno negócio voltado para a


educação empreendedora? O que deveria compor o repertório
do gestor para dar essa característica ao empreendimento?

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


É real a dificuldade de se encontrar profissionais recém-
saídos das faculdades de Educação já prontos para atuar nas
escolas. Adequá-los ao modelo de trabalho da educação em-
preendedora é tarefa do gestor do negócio. Tudo começa com
a definição do público-alvo da escola: criança, jovem, adulto?
Há todo um embasamento que orienta o trabalho com cada um
desses públicos, por conta de suas especificidades.

Essencial para quem vai empreender voltado à área de edu-


cação empreendedora, o saber primeiro, é conhecer os Quatro
Pilares do Conhecimento, para o norteamento das ações: o que
se quer alcançar com a educação. Trata-se de estudo realizado
pela Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI,
sob orientação da Organização das Nações Unidas para Edu-
cação, Ciência e Cultura (Unesco), que funcionou entre março
de 1993 e janeiro de 1996. O documento final, coordenado por
Jacques Delors – Educação um tesouro a descobrir – Relató-
rio para a Unesco da Comissão Internacional sobre Educação
para o Século XXI – traz a informação que

A educação deve organizar-se em torno de quatro


aprendizagens fundamentais, que, ao longo de toda

67
a vida, serão de algum modo para cada indivíduo, os
pilares do conhecimento: aprender a conhecer, isso é
adquirir os instrumentos da compreensão; aprender a
fazer, para poder agir sobre o meio envolvente; apren-
der viver juntos, a fim de participar e cooperar com
os outros em todas as atividades humanas; finalmente
aprender a ser, via essencial que integra as três pre-
cedentes. (p. 90)

A importância desse conhecimento para aquele que em-


preende com o foco em educação empreendedora, pode ser
observada no próprio documento:

A Comissão pensa que cada um dos “quatro pi-


Capítulo I – Educação empreendedora em debate

lares do conhecimento” deve ser objeto de atenção


igual por parte do ensino estruturado, a fim de que a
educação apareça como uma experiência global a le-
var a cabo ao longo de toda a vida, no plano cognitivo
como no prático, para o indivíduo enquanto pessoa e
membro da sociedade. (p.90)

Alguns teóricos devem ser mais enfatizados que outros,


de acordo com a opção do nível de ensino, muito embora
o seu conhecimento geral deva ser estendido a todos eles.
O estudo de Piaget, por exemplo, e toda a sua formulação
sobre a formação e construção da inteligência. Embora seja
mais presente na educação de crianças, com as fases em
que ela se divide, trata-se de um conhecimento que deve ser
comum aos envolvidos com educação, qualquer que seja o
nível de ensino em que se trabalhe. Saber, por exemplo, que
as pessoas em crescimento e formação têm limitações para
o aprendizado de acordo com a sua evolução etária, mas que
se encerram após os 12 anos. Ultrapassada essa idade, se-
gundo os estágios piagetianos, a pessoa está apta, em ter-
mos de estrutura cognitiva, para todo o tipo de aprendizagem
coerente com a sua fase de estudos.

68
É claro que o empreendedor logo questionaria essa afir-
mativa, pela observação prática de que nem todos aprendem
da mesma forma, uns se saindo melhor que outros, mesmo já
ultrapassado o limite de Piaget. Para essa resposta auxilia o
conceito de David Ausubel, sobre a Teoria da Aprendizagem
Significativa, que é

Aquela em que ideias expressas simbolicamente


interagem de maneira substantiva e não arbitrária com
aquilo que o aprendiz já sabe. Substantiva quer dizer
não literal, não ao pé da letra, e não arbitrária significa
que a interação não é com qualquer ideia prévia, mas
sim com algum conhecimento especificamente rele-
vante já existente na estrutura cognitiva do sujeito que

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


aprende. (Moreira, 2012, p.13)

Por um bom entendimento do conceito e da forma como


os temas devem ser abordados, visando à educação empreen-
dedora, cabe aqui um exemplo que associa a música, tão pre-
sente na vida das pessoas, ao conceito ausubeliano. Consi-
dere-se o sucesso do início dos anos 80, a banda Brylho, que
emplacou o hit Noite do Prazer, do compositor Cláudio Zoli. Diz
a letra: “Na madrugada a vitrola rolando um blues, tocando B.B.
King sem parar...” A falta do subsunçor ou ideia âncora, termo
usado por Ausubel para “um conhecimento específico existente
na estrutura de conhecimentos do indivíduo, que permite dar
significado a um novo conhecimento que lhe é apresentado ou
por ele descoberto” (Moreira, 2012, p.14) faz com que muitas
pessoas troquem, ao cantar a música, o B.B. King, por “de
biquíni”. Ou seja: para quem não tem as “âncoras” do blues,
gênero musical norte-americano que tem o instrumentista B.B.
King, aclamado como o seu rei, a troca do nome do intérprete
pela peça do vestuário, é um passo.

Do exemplo vem a conclusão: para ensinar algo a alguém


é preciso saber qual o conhecimento (âncoras) que deve ter,

69
para essa nova informação poder “atracar”. Não levar em conta
esse dado, pode significar, genericamente, o entendimento do
“de biquíni”, em vez de B.B. King, em qualquer outra situação.
Em síntese: aprende-se com base no que já se sabe.

O conhecimento pedagógico, como se viu com os estu-


dos de Piaget, é importante quando se trabalha com criança,
ao passo que lidar com adulto já transporta para o conheci-
mento andragógico, sistematizado por Malcolm Knowles, que
tem o “aprender fazendo” e a experiência vivida pelo adulto,
como bases.

Outra informação relevante a fazer parte do repertório de


quem investe em educação empreendedora é a da importân-
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

cia da afetividade na aprendizagem. Fundamental aqui é o en-


tendimento da teoria de desenvolvimento de Henri Wallon e o
conjunto funcional afetividade. Segundo Mahoney e Almeida
(2011), afetividade

Refere-se à capacidade, à disposição do ser hu-


mano de ser afetado pelo mundo externo e interno por
meio de sensações ligadas a tonalidades agradáveis
ou desagradáveis. A teoria apresenta três momentos
marcantes, sucessivos, na evolução da afetividade:
emoção, sentimento e paixão. (p.17)

As autoras concluem, e esse é o conhecimento relevante


para o empreendedor, que,

em [...] atividades educacionais, principalmente na


sala de aula, não [...] só o cognitivo [...] deveria ser
considerado, mas também o afetivo, e que o investi-
mento nesse aspecto favoreceria as relações interpes-
soais e, portanto, o acesso ao conhecimento. (p.15)

Além de Wallon, para quem a aprendizagem não depen-


de apenas do ensino de conteúdos, sendo necessário afeto e

70
movimento, também Piaget e Vygotsky corroboram com esse
entendimento em seus estudos, ao dizer que a afetividade in-
fluencia positiva ou negativamente os processos de aprendiza-
gem (Piaget) e que a motivação para aprender está associada
a uma base afetiva (Vygotsky).

Todas essas informações devem estar sintonizadas com


os estudos recentes da Neurociência e a forma como ela ajuda
a entender a aprendizagem “por meio de experimentos com-
portamentais e do uso de aparelhos como os de ressonância
magnética e tomografia, que permitem observar as alterações
no cérebro durante o seu funcionamento”. (Nova Escola, 253,
jun/jul, 2012).

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


Esses conceitos levam a entender o princípio fundamental
do negócio em educação: ensino e aprendizagem. Aprender a
pensar, a discutir, a concordar, a divergir, a perguntar, a respon-
der, tudo que faz parte da formação do ser empreendedor. Os
conteúdos que levam a esse aprendizado e a forma como eles
serão transmitidos só contribuirão para que esse objetivo seja
alcançado. Em suma: o negócio baseado em educação em-
preendedora deve ser norteado pelo princípio, até elementar, de
que se deve ensinar, de acordo com os conceitos teorizados,
e que o aluno deve aprender – o resultado esperado. É essa a
condição que o levará a ter o comportamento empreendedor.

Considerações finais

De tudo o que se viu depreende-se a importância que tem


esse referencial teórico. Mas há algo mais a ser valorizado: a con-
cepção de como deve ser conduzida a educação e que deve es-
tar presente na mente do empreendedor e de seus colaborado-
res: que seja um negócio prazeroso para todos os envolvidos no
processo. Algo por exemplo, que acontece, como consequência,

71
nos empreendimentos gastronômicos. Lá os chefs trabalham para
transformar os seus saberes (as receitas) em algo saboroso (os
pratos) para os clientes. Ao final eles buscam “dar sabor ao saber.”
Bem ao estilo do que o antropólogo francês Claude Lévi-Strauss
enunciou: “Toda cultura se faz transformando o cru (natureza) em
cozido (cultura), no saber criar o sabor.” E assim também deve ser
um negócio voltado para a educação empreendedora.

Referências bibliográficas

ALMEIDA, José Wagner de. Governamentalidade Neolibe-


ral, Empreendedorismo e suas repercussões nos pro-
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

cessos educacionais da cidade de Horizonte-CE. 2010.


Dissertação (Mestrado em Educação)-Universidade Federal do
Ceará. Disponível em: <seer.ufrgs.br/educacaoerealidade/arti-
cle/download/8299/5537>, acesso em 22 de fev. 2013.

ALMEIDA, Laurinda Ramalho de e MAHONEY, Abigail Alvaren-


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Henri Wallon. São Paulo: Loyola, 2011.

DELORS, Jacques (Coord.). Educação um tesouro a desco-


brir- Relatório para a Unesco da comissão internacional
para o século XXI. São Paulo: Cortez, 1988.

DOLABELLA, Fernando. Pedagogia Empreendedora. São


Paulo: Editora de Cultura, 2003.

FOWLER, Fábio Roberto. Programas de desenvolvimento


de empreendedorismo – PDEs. Um estudo de caso: FEA-
-USP e DUBS. Dissertação de Mestrado da FEZ-USP. São
Paulo, 1997.
FULGÊNCIO, Paulo César. Glossário Vade mecum: admi-
nistração pública, ciências contábeis, direito, economia,

72
meio ambiente: 14000 termos e definições. Rio de janeiro:
Mauad X, 2007.

LEAL, Antonio Fernando. Aprender a Empreender: Um pilar na


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2009. 145 p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa
de Pós Graduação em Educação, Universidade Federal da Pa-
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teoria e textos complementares. São Paulo: Editora Livraria
da Física, 2012.

SOUZA, Adriano Mhon e. Jovens e Educação Empreende-

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


dora: que discurso é esse? 2006. Dissertação (Mestrado em
Educação)-Universidade Católica de Goiás, Goiânia. Disponível
em: http://tede.biblioteca.ucg.br/tde_busca/arquivo.php?co-
dArquivo=305>. Acesso em 22 fev. 2013.

SALLA, Fernanda. Toda a atenção para a neurociência.


Nova Escola. São Paulo, edição 253, jun/jul. 2012.

73
Razão e emoção na
educação empreendedora
Clarice Veras24

“Onde quer que vás, vá de todo o coração”


Confúcio

Em sua exitosa trajetória de 40 anos, o Sebrae tem buscado


prestar sempre o melhor serviço para seus clientes. Essa busca

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


constante pela melhoria é bastante evidente, se observarmos
a história dos cursos e atividades empreendedoras oferecidas
pela instituição: o uso de diferentes mídias e metodologias; a
formação contínua de formadores; a diversificação da oferta.
Mas há um fio condutor que está sempre presente e faz parte
da cultura organizacional do Sebrae: os aspectos emocionais
envolvidos na educação empreendedora.

Um dos conceitos mais simples para o termo empreender


pode ser resumido em uma frase com dois verbos. Fazer aconte-
cer. Empreender é, portanto, agir, mudar, transformar. Não basta
ler um livro ou assistir a uma aula. Quem quer empreender pre-
cisa beber teoria e construir sua própria prática, adaptada à sua
realidade. Para que os resultados sejam favoráveis, a educação
empreendedora precisa provocar, instigar. É com essa convicção
que os cursos, jogos, materiais didáticos, conteúdos em áudio
e em vídeo, têm sido elaborados no Sebrae ao longo dos anos.

24 Bacharel em Comunicação Social e Educação Artística pela Universidade de Brasília, com


especialização em Educação a Distância. Analista da Unicade de Marketing e Comunicação
do Sebrae.

75
Segundo Ale Bender (Bender, Apud Tibana), mestre em ciên-
cias cognitivas, a “emoção define os negócios, do começo ao
fim”. E complementa “primeiro reagimos emocionalmente depois
pensamos no que fizemos”. Para o pesquisador, é necessário o
entendimento sobre a forma como as emoções afetam as ações
e reações para evitar impulsos e frustrações. Ainda segundo ele,
o equilíbrio entre razão e emoção traz benefícios, melhorando a
qualidade das decisões tomadas pelos empreendedores.

Fernando Dolabela (2010), escritor e consultor, especialista


em empreendedorismo no Brasil, defende que uma das mais
importantes missões da educação empreendedora é contribuir
para o autoconhecimento: conhecer as limitações, forças, fra-
quezas, preferências e qualidade que podem levar o empreen-
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

dedor ao sucesso. É o que Luis Jacques Fillion (2000, p. 5), de-


nomina de “conceito de si”. Conhecer-se é também contribuir
para o equilíbrio entre emoção e razão. Dolabela afirma: faça
com que a sua razão siga a emoção. Esta mostra o caminho,
aquela lhe dá consistência. E complementa: quem quiser em-
preender deve deixar-se emocionar.

Os cursos desenvolvidos pelo Sebrae sempre preveem ex-


periências práticas, que colocam os participantes em situações
de simulação de atividades cotidianas, comuns nos negócios.
Vivenciando e experimentando, o aprendizado acontece mais
naturalmente e o empreendedor percebe de fato a utilidade da-
quele conhecimento. É uma simulação de sensações – e emo-
ções – que podem antever caminhos e poupar esforços. Afinal,
o empreendedor mede seu tempo em Reais. Não é possível
desperdiçá-lo.

Os exemplos são fundamentais para que haja identificação


do empreendedor. Se o conteúdo a ser transmitido não pode
ser vivenciado no ambiente educacional, então é preciso mos-
trá-lo por meio de relatos de outros empreendedores. São os
casos de sucesso. A busca por personagens reais que inspirem

76
outras pessoas é uma prática constante no trabalho do Sebrae.
Apreender com histórias verdadeiras, relatos de obstáculos su-
perados e caminhos percorridos é também uma forma de mo-
bilizar, mostrar que é possível, indicar que a resolução de pro-
blemas faz parte da vida do empreendedor. Não são raros os
casos em que a persistência fez a diferença: muitos desistiriam
diante das dificuldades, mas não o empreendedor de verdade.

Mas há outras formas de provocar a identificação e mobi-


lizar pelo exemplo. Programas educativos que se utilizam da
dramaturgia são frequentes no portfólio do Sebrae, por obter
bons resultados na transmissão de conteúdos. O formato no-
vela, tanto para o rádio quanto para a TV, faz parte da cultura
brasileira. Aproveitar essa linguagem facilita a aceitação de te-

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


mas, às vezes, áridos e contribui para o seu entendimento. Na
linguagem dos roteiros de tais programas são sempre utilizados
recursos dramáticos que prendem a atenção e geram empa-
tia: humor, romance, mistério, entre outros. A concepção em
partes – capítulos – provoca o interesse em continuar assistin-
do, em buscar mais informação e conhecimento nos próximos
dias. O uso do vídeo na educação é citado pelo educador José
Manuel Moran (2007, p.47) como uma ferramenta importante,
seja para instigar, seja para ilustrar. Seja para organizar o co-
nhecimento, seja para desorganizar, função igualmente útil –
incomodar, inquietar; emocionar também.

A experiência do Sebrae com educação via rádio trouxe


como retorno dos ouvintes uma série de depoimentos por te-
lefone e também por carta. As mensagens foram avaliadas por
meio de metodologia de análise de conteúdo. Esse conjunto de
manifestações ocorreu a partir de um processo de interação
imaginária entre ouvintes com os personagens e as situações
tratadas pela novela do programa. Essa identidade gerou maior
espontaneidade dos ouvintes que, muitas vezes, “se vêem na
pele e na situação” de muitos daqueles personagens que dão
vida às situações retratadas em cada episódio. Uma identifica-

77
ção que se manifesta também por meio da emoção com a qual
muitos verbalizam suas posições e de suas próprias histórias
de vida. Uma exposição de sentimentos que contribui para a
conformação de muitas das suas representações simbólicas.
(BIANCO, VILLALBA e ESCH, 2008).

Formatos mistos – ficção aliada a casos reais – têm sido


adotados com frequência a fim de reforçar o aprendizado, a
fixação dos conteúdos. O uso da dramaturgia possibilita a in-
clusão de uma série de situações comuns na realidade dos
pequenos negócios. Complementada com exemplos reais, a
dramaturgia por um lado ganha força e os casos reais – por sua
vez – tornam-se mais didáticos.
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

É possível também simular experiências em sala de aula,


não apenas nas novelas de rádio e de TV. Atividades em grupo
e individuais podem utilizar recursos dramáticos para favorecer
o aprendizado. Tais recursos são utilizados em cursos renoma-
dos como é o caso do Empretec, cuja metodologia foi desen-
volvida pela ONU e a aplicação é de exclusividade do Sebrae
no Brasil. Para quem nunca negociou um empréstimo com um
banco, fazê-lo antes em um ambiente educacional, controlado,
é uma oportunidade enriquecedora: é possível cometer erros
sem riscos para o bolso. Quanto mais real for a simulação, mais
os aspectos emocionais envolvidos com a situação estarão
presentes, mais útil será a vivência.

A experiência do Sebrae com a educação empreendedo-


ra também tem demonstrado que em alguns casos não bas-
ta transmitir um conteúdo e simular sua aplicação prática. É
preciso fazer junto. Para situações como essa foram criadas
soluções educacionais que aliam os momentos em sala de aula
e os momentos de aplicação na empresa, acompanhados por
um consultor. São casos em que apenas a consultoria não seria
eficaz, pois, após a visita, os processos não seriam incorpo-
rados ao funcionamento da empresa. O momento em sala de

78
aula favorece que a aplicação ocorra de forma consciente, en-
tendendo o significado de cada etapa de implementação. Mas
é a consultoria, o apoio direto de um profissional especializado,
que torna a prática possível. Trata-se de um apoio direto – tam-
bém envolvendo emoção (compreensão do outro, motivação)
que visa, ao final, à formação de um empreendedor indepen-
dente, autossuficiente.

Da mesma forma, nas atividades a distância, um fator tem


se mostrado essencial: a interação. Pela internet, o papel do
tutor é, fundamentalmente, o de motivador. É o fator. É o fator
humano em uma relação fria com a máquina. O conteúdo do
curso está totalmente disponível para o participante na forma
de textos, imagens e atividades. Entretanto, sem a tutoria o

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


resultado não seria o mesmo. As taxas de evasão nos cursos
do Sebrae são baixas em relação a outros cursos existentes do
mercado, em especial aos cursos gratuitos, como são os ofere-
cidos na plataforma de educação a distância do Sebrae. Ainda
assim, a evasão gira em torno de 50%. O tutor instiga, mostra
que é possível aprender, que é possível chegar ao final. Nesta
relação de apoio do tutor ao empreendedor, é preciso ainda
respeitar o conhecimento anterior, como em qualquer processo
educacional. É como diz o mestre Paulo Freire (1996, p.22) “En-
sinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades
para a sua produção ou sua construção”.

A relação entre tutores, professores e empreendedores


precisa ser de apoio, suporte. Uma relação que motiva a com-
preensão de um novo conteúdo, mas que também reforça a
necessidade do indivíduo acreditar em si mesmo, ter iniciativa,
ser persistente.

Outro recurso educacional que vem sendo utilizado com


êxito pelo Sebrae são os jogos. A disputa entre os participan-
tes, os elementos lúdicos, a simulação de situações reais, tudo
isso contribui para o sucesso de jogos educativos. O Desafio

79
Sebrae, dirigido a universitários, obteve sucesso durante cerca
de dez anos provocando nos participantes vibração, espírito
de equipe, persistência. O jogo simulava a gestão de uma em-
presa e as equipes que tomavam as melhores decisões eram
contempladas com prêmios25. Como são vários os estilos de
aprendizagem dos indivíduos, é necessário que a oferta de pro-
dutos educacionais pelo Sebrae seja ampla. Para os jovens, o
uso de jogos é uma tendência atual26, mas eles sempre foram
uma forma de entreter, divertir, graças às emoções que desper-
tam e ao envolvimento que provocam.

Não apenas para os jovens tem sido utilizada a linguagem


dos jogos na educação. O Despertar Rural, curso de gestão bá-
sica para empreendedores do campo, simulam situações do dia
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

a dia de uma propriedade rural. Com o apoio de um jogo de ta-


buleiro, os participantes se deparam com circunstâncias em que
precisam tomar decisões sobre planejamento, plantio, manejo,
colheita, compra, venda e pagamento de despesas previstas e
imprevistas. Para o meio rural, onde muitas pessoas não têm o
hábito de participar de cursos, e onde são comuns resistências
à adoção de práticas modernas de gestão, o jogo contribui para
derrubar barreiras e passar informações de forma natural, leve.

As experiências educacionais do Sebrae têm proporcio-


nado condições para se efetivar a aprendizagem significativa
sobre empreendedorismo. A aprendizagem significativa é um
conceito originário de reflexões realizadas pelo psicólogo David
Ausubel (1982) sobre o processo da aprendizagem e a prática
do ensino. Sua concepção teórica – também conhecida como
cognitivista – considera a aprendizagem como um processo

25 O Sebrae está atualmente criando novos jogos que serão oferecidos aos universitários, com
linguagem adequada às exigências das novas gerações.
26 Alguns artigos sobre o uso de jogos na educação podem ser acessados nos seguintes si-
tes: http://www.fen.ufg.br/fen_revista/v12/n2/pdf/v12n2a17.pdf , http://www.unifia.edu.br/
projetorevista/edicoesanteriores/Marco11/artigos/educacao/ed_foco_Jogos%20ludicos%20
ensino%20quimica.pdf, http://www.professorgersonborges.com.br/site/aulas_interdisciplinar/
Artigo_Matematica_Jogos_Matematicos.pdf

80
dinâmico, apoiado no conjunto de capacidades cognitivas de
que dispõe o aluno e que servem como instrumentos para um
efetivo aprendizado. Diferencia-se, assim, de outras tantas vi-
sões que tratam o aprendizado como um processo mecânico
destinado ao acúmulo e memorização de conceitos.

Sua perspectiva valoriza o conjunto de conhecimentos


prévios que o aluno detém de suas vivências e experiências
objetivas e subjetivas que estabeleceu com o mundo ao seu
redor. Quer dizer, a partir de conceitos que já são de domínio
da pessoa, podem ser construídas novas ideias que podem ser
ligadas a outros novos conceitos que promoverão a compreen-
são dessas novas informações e aportarão significado real ao
conjunto de novos conhecimentos adquiridos pelo aluno.

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


Entende-se que a aprendizagem ocorre por meio de um
processo de negociação de significados. Essa negociação de
sentido contém em si, um complexo processo de constituição
da realidade que envolve, no caso do Sebrae, os empreendedo-
res e suas necessidades de conhecimento e aprendizagem e as
soluções educacionais construídas sob a perspectiva que leva
em consideração aquilo que as pessoas já sabem a partir de sua
experiência e vivência (BIANCO, VILLALBA e ESCH, 2008).

Considerações finais

Em diferentes metodologias, canais e mensagens, o Sebrae


tem buscado relacionar a emoção à razão para contribuir para a
missão do empreendedor: a de fazer acontecer. Para tanto, tem
buscado adotar uma educação inovadora, como a defendida
por José Manuel Moran (2007, p. 39), e que deve seguir os eixos:

• O desenvolvimento da autoestima/autoconhecimento,

• O conhecimento integrador e inovador,

81
• A formação do aluno-empreendedor

• A construção do aluno-cidadão

Os eixos apresentados por Moran referem-se à educação de


forma geral, nas escolas de todos os níveis. Mas eles também se
relacionam com as necessidades do empreendedor, em especial
nas constatações de Fernando Dolabela (2010) sobre o que de
fato funciona na formação de pessoas empreendedoras:

• Paixão
• Autoconhecimento
• Elevada autoestima
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

• Ambiente de liberdade
• Ousadia para transformar sonhos em realidade

Tanto nas constatações do educador Moran, quanto nas do


consultor Fernando Dolabela estão presentes aspectos emocio-
nais; esses vão além do conteúdo a ser apreendido e consideram
anseios, desejos, autoimagem, sonhos, paixão. Não por acaso.
Na formação de qualquer indivíduo, desconsiderar sentimentos
que mobilizam é calar a alma. E sem alma, não se educa, não se
empreende, não se muda nada. Sequer se vive, afinal.

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David Ausubel. São Paulo: Moraes, 1982.

BIANCO, Nélia; VILLALBA, Clarice; ESCH, Carlos Eduardo.


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82
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Capítulo I – Educação empreendedora em debate


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levar o empreendedor ao sucesso. Em < http://www.pensan-
dogrande.com.br/o-equilibrio-entre-a-emocao-e-a-razao-pode-le-
var-o-empreendedor-ao-sucesso > Acesso em março de 2013.

83
Novos tempos, nova
educação para o
empreendedorismo
Ednalva Fernandes C. de Morais27
Luís Afonso Bermúdez28

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


Apresentação

Neste artigo fazemos uma discussão sobre conceitos sus-


citados ainda no século passado, por diferentes áreas do co-
nhecimento e pesquisadores, mas que estão cada vez mais
eloquentes quando abordamos a questão dos desafios e das
oportunidades de desenvolvimento e competitividade dos ne-
gócios, especialmente daqueles de micro e pequeno porte.
Empreendedorismo, intraempreendedorismo, competências
empreendedoras, cultura empreendedora, criatividade e inova-
ção estão sempre presentes quando o assunto é a criação de
negócios inovadores e competitivos. Contudo, o conceito mais
propalado na atualidade e que é a base estruturante dos fatores
de competitividade é o de educação empreendedora.

27 Diretora-executiva do Centro de Apoio do Desenvolvimento Tecnológico da Universidade de


Brasília. Formada em Administração. Doutoranda em Educação na Universidade de Brasília,
concentração em Educação, Comunicação e Mediação Tecnológica.
28 Decano de Administração e Finanças da Universidade de Brasília. Doutor em Engenharia Eletrôni-
ca pela Universidade de Limoges (França), concentração em Comunicação Ótica e Microondas.

85
Pior que a ausência de informação é o seu excesso. Em
decorrência de tantas Tecnologias de Informação e Comunica-
ção (TIC) presentes em nosso cotidiano é esta a realidade em
que vivemos e que provoca novos processos de trabalho e de
fazer educação formal e capacitação para o mercado de traba-
lho. A lógica de pensar e de trabalhar é diferente – é assíncrona,
é reflexiva, é autônoma. O conhecimento está em toda parte e
relativamente de fácil acesso a todos.

Dessa forma, a competitividade é mais acirrada, globalizada


e requer novas e variadas estratégias e modelos de negócios. A
educação como principal fator de diferenciação do indivíduo e
das empresas deve ser também inovadora e empreendedora,
tal qual o mundo dos negócios competitivos. Tal afirmação im-
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

plica no fato de que a educação desde as primeiras etapas deve


estimular comportamentos e atitudes diferenciadas de forma a
preparar adequadamente o indivíduo para a vida em sociedade,
para o trabalho e para a geração de emprego e renda.

A questão que se coloca é como fazer essa educação em-


preendedora capaz de formar indivíduos que vão transformar
realidades, criando ambientes férteis em oportunidades para
empreender novos negócios e superando os desafios da ino-
vação e da competitividade? Se na vida adulta o indivíduo vai
enfrentar constantemente situações-problemas em que suas
escolhas e decisões farão toda a diferença é de se esperar que
na sua formação escolar ou acadêmica ele tenha a oportuni-
dade de vivenciar tais situações, usando diferentes tecnologias
disponíveis para estar apto a tomar decisões assertivas e de
forma autônoma na vida adulta e no trabalho.

O conceito de educação empreendedora é, portanto, um


dado tipo de educação que proverá ao individuo a capacidade
de atingir níveis educacionais mais elevados, como também a
incorporação de conhecimentos e de informação estratégica
à atividade, denominado valor agregado se queremos incluir o

86
cidadão no contexto de Sociedade em Rede, conforme reco-
menda Castells (1996). A nosso ver a educação empreendedo-
ra nesse caso é diferenciada e por meio dela o indivíduo na sua
condição de Ser Integral (Individual, Social e Trabalhador) pode
adquirir a capacidade para a redefinição constante das espe-
cialidades necessárias a determinadas tarefas, atitudes e para
o acesso direto a novas e diferentes fontes de conhecimento e
de aprendizagem.

Introdução

Não foi por acaso que o conceito de aperfeiçoamento con-

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


tínuo chamado Kaizen pelos japoneses é a chave do sucesso
dos métodos de produção industrial do Japão. Segundo Rifkin
(1995), esse método enfoca a mudança e encoraja aperfeiçoa-
mentos constantes, envolvendo todo o pessoal da fábrica na
busca constante de resolução de problemas e inovações. Ele
cria um ambiente de gestão e produção mais autônomo aos
colaboradores que resulta em um ambiente profícuo para no-
vas ideias e soluções, proporcionando mais conhecimento do
processo de fabricação e de toda a organização.

Na chamada Sociedade da Informação ou do Conheci-


mento, processos de aquisição do conhecimento assumem
um papel de destaque e passam a exigir, um profissional críti-
co, criativo, com capacidade de pensar, de aprender a apren-
der, de trabalhar em grupo e de se conhecer como indivíduo
(Valente, 1996). Esse profissional tem uma visão geral, sobre
os diferentes problemas que afligem a humanidade, consi-
derando-os numa totalidade. O papel da educação é formar
esse egresso e para isso, esta não se sustenta apenas na
instrução que o professor passa ao aluno, mas na construção
do conhecimento pelo aluno e no desenvolvimento de novas
competências, como: capacidade de inovar, criar o novo a

87
partir do conhecido, adaptabilidade ao novo, criatividade, au-
tonomia, comunicação. (Mercado, 1999:30).

Na visão de Corcetti (2001) é importante que as escolas


de Administração analisem e assim adaptem seus currículos às
novas formas de empreendedorismo, que incluem o autoem-
prego e negócios familiares. Todas essas novas formas de em-
preendedorismo necessitam do desenvolvimento de novas ha-
bilidades como: interação, trabalho em equipe, comunicação,
criatividade, capacidade de realização, etc. A estratégia peda-
gógica empreendedora, que inclui disciplinas voltadas para o
empreendedorismo, proporciona o desenvolvimento dessas
habilidades, pois o professor atua apenas como impulsionador
do sonho e direcionador dos caminhos a serem tomados pelos
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

alunos para realização desses sonhos.

Nas últimas décadas, o termo empreendedorismo vem


sendo amplamente utilizado em diferentes áreas do conheci-
mento. Entretanto, a disseminação da palavra empreendedo-
rismo ocorreu juntamente com a relativa frouxidão do conceito.
Num sentido mais amplo, empreender vai além de uma ativi-
dade intrínseca à iniciativa privada, pois passou a englobar o
terceiro setor e a administração pública e os empregados das
empresas privadas. Não mais circunscreve apenas o espa-
ço da inovação, mas também das mudanças organizacionais
adaptativas (MARTES, 2010).

Foi Schumpeter quem consolidou o conceito de empreen-


dedorismo, ao relacioná-lo à inovação (FILION, 1999). De acor-
do com Shumpeter (1985), o empreendedor não se detém à
maximização do lucro de processos já existentes: ele vai além,
busca desenvolver novos processos, modificando um determi-
nado setor ou ramo de atividade em que atua, criando assim
um novo ciclo de crescimento que pode promover uma ruptura
no fluxo econômico contínuo. Mas, atualmente, o empreendedor
schumpteriano representa apenas um entre vários perfis de em-

88
preendedores que são estudados. Nesse sentido, o empreen-
dedor aparece também como um ator cujo papel é atuar dentro
de uma organização – são os chamados “intraempreendedores”,
sem os quais as ações e projetos tendem ao insucesso.

Os conceitos de empreendedorismo, empreendedor ou


intraempreendedorismo nos rementem ao de competência
simplesmente ou competência empreendedora sobre o qual
várias áreas do conhecimento têm se debruçado para delinear
um conjunto de conhecimentos, habilidades, e atitudes (CHA)
que possibilitam maior probabilidade de obtenção de sucesso
na execução de determinadas atividades. Tais características
de comportamento empreendedor são desenvolvidas, em sua
maior parte, por meio das relações sociais que o indivíduo pra-

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


tica desde sua primeira infância, na escola e no trabalho. Algu-
mas são natas ao individuo, como ética e o gosto pelo novo.

Aqui concentramos nossa discussão principalmente no En-


sino Superior onde pressupõe-se que esta deve preparar o seu
egresso para desenvolver atividades e projetos que gerem valor
social e econômico para regiões e países, isto é, gerar negó-
cios inovadores e competitivos, gerar empregos, renda e riqueza
quando este apresenta perfil para criação de empresas. E não
sendo esta a vocação do egresso que ele esteja preparado para
exercer de forma diferenciada atividades em benefício da socie-
dade e dos territórios onde este tenha influência.

Estamos considerando um novo perfil de egresso que o


torna criativo e, segundo Franco (1998), o atual contexto exi-
ge: iniciativa, liderança, criatividade, autodesenvolvimento, mul-
tifuncionalidade, agilidade, flexibilidade, gerenciar o risco, ser
educador, ter raciocínio lógico e aptidão para resolver proble-
mas, habilidades para lidar com pessoas, trabalho em equipe,
conhecimento de línguas, informática e resistência emocional.

Temos aqui, portanto, muitas das características do cons-


trutivismo, conceito que vem do campo da educação, definido

89
por Freire (1998) onde o sujeito aprendiz está acima da tecno-
logia e do projeto pedagógico para ser o centro do processo
educativo. Ao passar por cada etapa formativa ele deve ser
capaz de desenvolver autônoma e criticamente ações em prol
da sociedade, da coletividade e para ele próprio.

Vamos considerar aqui o conceito de empreendedorismo


da OECD (2007): um driver para o crescimento econômico,
geração de emprego, inovação e produtividade. O empreen-
dedorismo se relaciona com inovação, e ambos estão asso-
ciados com “fazer algo novo”. Porém, o espírito empreende-
dor sozinho não é suficiente para garantir a competitividade
de seu empreendimento frente aos grandes desafios e opor-
tunidades. Outras condições como políticas públicas adequa-
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

das e instituições de apoio são essenciais. Mas como está o


contexto da micro e pequena empresas no Brasil?

O contexto de desafios e oportunidades


para os pequenos negócios

O contexto socioeconômico brasileiro aponta para uma si-


tuação positiva no atendimento de uma série de oportunidades
geradas pelo bônus demográfico favorável também ao pequeno
empreendedor, que normalmente atua em setores tradicionais
na base da pirâmide de consumo. Para Morais et alli (2012), tal
afirmação está ancorada em alguns fatores relacionados às bai-
xas taxas de desemprego, com redução crescente nos índices;
a inclusão de segmentos da população que viviam à margem do
consumo e, agora, favorecidos com programas de distribuição e
aumento de renda das classes C, D e E que ampliou o consumo
das famílias; a expansão das fontes de crédito e investimento
para novos negócios; o incremento da Taxa de Empreendedoris-
mo Inicial (TEA). Mas onde queremos chegar? O estudo desen-
volvido pelo Ministério da Indústria, Desenvolvimento, Comércio

90
Exterior e Turismo (MDIC), em parceria com o CDT/UnB, para
elaboração da Política Nacional de Empreendedorismo aponta
para os seguintes resultados a serem alcançados até 2023:

• Melhoria de competitividade e produtividade;

• Governança dos programas e ações existentes com maior


sinergia;

• Sistema educacional em todos os níveis com pedagogia


para o empreendedorismo;

• Sistema único de informações relevantes e estratégicas ao


empreendedor;

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


• Ampla oferta de infraestrutura física e serviços estratégicos
de base para o empreendedor;

• Integração governo, empresa e universidade para a inova-


ção e a competitividade;

• Empreendedor brasileiro inserido nas cadeias produti-


vas globais;

• Empreendimentos sustentáveis com exploração de novos


mercados;

• Brasil como referência para empreendedores étnicos e


de gênero.

Para que sejam efetivos alguns caminhos previstos foram:

• Superação dos gargalos sistêmicos de infraestrutura;

• Articulação e coordenação das ações de governo para o


empreendedorismo;

91
• Indução da correção das falhas de mercado;

• Estimulo à criação de incentivos específicos ao empreende-


dorismo por estados, Distrito Federal e municípios;

• Promoção de ajustes nas normas trabalhistas, tributárias e


de falências;

• Simplificação de procedimentos para abrir e fechar negócios;

• Aprimoramento da comunicação e a integração entre as


agências governamentais;

• Fortalecimento das incubadoras de empresas e parques


tecnológicos;
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

• Promoção da cultura de exportação entre os empreende-


dores brasileiros;

• Apoio ao desenvolvimento e disseminação de metodolo-


gias inovadoras de educação empreendedora, por meio da
inserção de conteúdos e práticas empreendedoras em to-
dos os níveis de ensino;

• Promoção da visão de negócio no ambiente universitário;

• Criação de bônus creditício e de incentivos fiscais à capaci-


tação de empreendedores;

• Criação e aprimoramento das plataformas virtuais de capa-


citação empreendedora;

• Direcionamento dos investimentos governamentais para a


geração de negócios inovativos;

• Promoção da geração de negócios com uso sustentável da


biodiversidade brasileira;

92
• Adequação das exigências de garantias para crédito de
empreendedores iniciantes de alto impacto;

• Atração dos investimentos de capital semente e de risco e


estímulo à formação de angels.

• Incentivo do reconhecimento social do empreendedor e a


formação de redes;

• Apoio a empreendedores específicos, como mulheres29,


negros e pessoas da terceira idade.

Entre os principais desafios a serem superados desta-


camos os entraves de produtividade, eficiência e preços; os

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


gargalos de infraestrutura física e de acesso às Tecnologias de
Informação e Comunicação (TIC) relevantes para inserção do
pequeno empreendedor no mercado globalizado, quer para
obter informação, capacitação ou para divulgar e comercializar
seus produtos, já que é baixa a inserção das micro e pequenas
empresas nas exportações brasileiras.

Por outro lado, há um quadro burocrático e fiscal pou-


co favorável, assimetrias de desenvolvimento regional, baixa
coordenação das políticas públicas, e o tempo médio de es-
colaridade dos jovens e adultos é insuficiente para garantir as
competências requeridas no novo contexto socioeconômico e
tecnológico. As principais consequências observadas no âmbi-
to dos negócios são produtos e serviços de baixo valor agrega-
do, potencial elevação da taxa de desemprego e do índice de
mortalidade das empresas nos primeiros cinco anos.

Torna-se premente a implantação de algumas ações que


visem à melhoria de competitividade e produtividade dos pe-

29 As mulheres brasileiras estão entre as mais empreendedoras do mundo e o crescimento do


empreendedorismo por oportunidade.

93
quenos negócios, especialmente aquelas anteriormente pro-
postas e relacionadas com as ações de governança sinérgi-
ca entre as diferentes instituições e respectivos programas
de apoio ao empreendedorismo e a reformulação do sistema
educacional em todos os níveis com pedagogia para o em-
preendedorismo.

Morais et alli (2012) constataram ainda, durante as oficinas


regionais realizadas no âmbito do projeto para elaboração da
Política Nacional de Empreendedorismo, e das quais partici-
param representantes do governo federal, estadual, municipal,
pesquisadores de universidades, representações empresariais
e empreendedores, que a obtenção de maior ou menor grau de
empreendedorismo de pessoas, regiões, organizações e em-
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

presas está diretamente relacionado à questão da educação


formal e continuada. Mas não é qualquer perfil de educação.

Há aclamação geral por um novo tipo de educação capaz


de integrar os saberes e as experiências de vida que o aluno já
trás consigo para a sala de aula, isso é uma educação baseada
no construtivismo e no sóciointeracionismo, cujo foco é o desen-
volvimento de competências empreendedoras compatíveis com
o contexto social, econômico e tecnológico, hoje denominado
por diferentes autores como sociedade em redes (Castells, 1996)
ou Sociedade de Colaboração em Massa (Tapscott, 2008).

Morais et alli (op.cit.) afirmam que os empreendedores


que têm mais tempo de escolaridade e foram estimulados
desde cedo a empreender têm maior potencial para criar
empresas de alto impacto e inovação, geram mais empre-
go e têm menor taxa de mortalidade de seus negócios. Por
outro lado, uma das principais estratégias do governo para
fortalecer o empreendedorismo deve avançar na ampliação
do acesso ao Ensino Superior ou técnico de qualidade pelo
jovem brasileiro, com inserção de conteúdos voltados ao
mercado e ao desenvolvimento do potencial empreendedor.

94
Mas será inócua a ação de estimular o processo de criação
de novos negócios se os principais agentes do ecossiste-
ma empreendedor não estiverem devidamente organizados
e sintonizados com a problemática do empreendedor, isto é,
as universidades, empresas e o governo.

Nos Estados Unidos são criados vários programas e


incentivos para estimular a cultura do empreendedorismo,
utilizando uma plataforma neutra para interação entre todos
os participantes. É comum haver a participação do governo
nos três níveis com políticas públicas bem sistematizadas e
de longo prazo, além da participação das universidades e
dos empreendedores. O resultado é a criação de ambientes
férteis e densos no estimulo e apoio ao empreendedorismo

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


inovador e de alto impacto no desenvolvimento local e glo-
bal (NBIA, 2013). Para isto, Morais et alli (2012), reforçam
que as políticas públicas para o empreendedorismo devem
atuar fortemente na inserção do empreendedorismo de for-
ma transversal em todos os níveis de ensino.

Em geral, o empreendedor brasileiro possui baixa cultura


de inovação. Por isso, não basta incentivar a criação de novos
negócios, é preciso adotar políticas para melhorar a visão es-
tratégica, qualificação e capacitação técnica do empreendedor,
de modo a gerar empresas mais competitivas, com diferencial
de mercado e incorporação de tecnologias apropriadas e pro-
piciadoras de inovação.

As pequenas e médias empresas brasileiras inovam pou-


co, desconhecem incentivos fiscais à inovação e fazem poucas
parcerias com universidades e com institutos de pesquisas. Se-
gundo pesquisa realizada com médias empresas (faturamento
de R$ 16 milhões a R$ 300 milhões), 80% delas não usam
incentivos fiscais para inovar – metade por desconhecer es-
ses incentivos e 69,4% por afirmar que a inovação não está na
ideologia da empresa.

95
As características da educação
empreendedora

Uma educação empreendedora deve preparar profissional


para atuação na sociedade em rede onde conceitos como clus-
ter, cooperação, competição devem ser extremamente valori-
zados; da mesma forma, o uso das Tecnologias de Informação
e Comunicação (TIC) e softwares funcionais. Quais habilidades
e competências devem ser desenvolvidas? Sem sombra de dú-
vidas a capacidade para acessar informações e transformá-las
em conhecimento e valor agregado é cada vez mais essencial.

Também a criação de redes de contatos gera conhecimento


Capítulo I – Educação empreendedora em debate

estratégico para o empreendedor ou para o indivíduo. A capa-


cidade de comunicação e expressão talvez seja a mais deman-
dada habilidade de toda a história, mas para isso o empreen-
dedor precisa estar capacitado a utilizar as diferentes mídias
sociais e ferramentas tais como Twitter onde ele pode obter e
expressar opiniões, divulgação de produtos e de organizações.
O Facebook permite o relacionamento pessoal e profissional,
divulgação de produtos e de organizações por meio da pos-
tagem de fotos de produtos e vídeos do empreendimento. O
Foursquare é uma base locacional que permite ao empreende-
dor buscar informações sobre localização de potenciais clien-
tes e concorrentes, como ser localizado por seus clientes. Com
o Instagram o empreendedor poderá tirar fotos de produtos,
da empresa ou do portfólio de clientes. Da mesma forma, o
Youtube permite a divulgação de vídeos da empresa, ao mes-
mo tempo em que poderão ser usados para fazer capacitação,
desde temas ou conceitos simples a outros de maior nível de
complexidade. O Linkedin favorece o desenvolvimento de rede
de trabalho e empresas. Meetup é uma ferramenta de reuniões
virtuais, como o Google+ que também favorece a construção
de redes de trabalho e círculos sociais. Pinterest é especializa-
do na divulgação e comercialização de produtos e serviços. O

96
Quora, em discussões e troca de informações e outros tantos
que ainda serão criados, para diferentes aplicações com foco
em relações sociais, profissionais ou organizacionais ou para
transações comerciais. Mas como as instituições educacionais
(formal e profissional) estão formando o empreendedor para es-
sas novas tecnologias da informação e comunicação?

O Youtube, Google+, Quora, Facebook e outras podem


ser bastante úteis como ferramentas para capacitação de em-
preendedores, especialmente jovens que estão sempre co-
nectados a esses aplicativos e que quando bem utilizados são
poderosas ferramentas determinantes no desenvolvimento de
novos modelos de negócios, produtos e serviços com alto va-
lor agregado. Contudo, ainda é pequeno o número de profes-

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


sores ou instituições de ensino que utilizam essas tecnologias
integradas ao projeto pedagógico de forma a favorecer o de-
senvolvimento das competências requeridas no novo contexto
societário, conforme já explicitado.

Uma parceria com foco em


educação empreendedora

Entre as diferentes formas de estimular a cultura do em-


preendedorismo nas universidades norte-americanas como a
de Michigan, uma das mais aplicadas é a celebração do suces-
so. Algumas técnicas utilizadas para isso, por diferentes incu-
badoras de empresas e outros mecanismos existentes que es-
timulam e apoiam o empreendedorismo são os eventos de para
formação de redes (network). Um desses eventos é a realização
de três dias com empreendedores de sucesso que contam sua
história de vida para inspirar novos empreendedores. Realiza
business pitches (apresentações rápidas de até cinco minutos
para definição pelo empreendedor sobre os cinco principais as-
pectos do seu negócio: empresa, produto, mercado, estratégia

97
de vendas e previsão de receitas), startup weekend, mentores,
coaching, painel de discussões presenciais ou nas mídias so-
ciais, recepções e outras técnicas.

Toda pessoa da comunidade que tenha uma boa ideia


pode apresentá-la individualmente ou em grupos. O resultado
anual é que mais de 50 empresários participam desses even-
tos; mais de 40 ideias de novos empreendimentos e produ-
tos são desenvolvidas por estudantes, mais de 40 grupos de
investidores participam e conseguem a colaboração de várias
universidades da região. Ou seja, há a convergência de diferen-
tes agentes de empreendedorismo e inovação que conseguem
atuar na formação ou educação empreendedora, especialmen-
te dos jovens que vão formar empreendimentos de sucesso e,
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

muitas vezes, com atuação no mercado global.

Alguns dos programas treinamentos apresentados NBIA


(2013) são: planos de negócios, opções de crédito e capital de
risco; propriedade intelectual, marketing, vendas, gestão finan-
ceira e de pessoas, planejamento estratégico e plano de vida
do empreendedor.

Essas mesmas atividades fazem parte do cotidiano dos


alunos da Universidade de Brasília (UnB) que têm a oportunida-
de de vivenciar práticas pedagógicas empreendedoras. A UnB,
por meio do Centro de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológi-
co (CDT/UnB), tem parceria com o Serviço de Apoio às Micro
e Pequenas Empresas no Distrito Federal (Sebrae DF) desde
1995, quando foram criadas duas disciplinas Introdução à Ati-
vidade Empresarial, junto aos cursos da Faculdade de Tecno-
logia, e Introdução à Atividade Empresarial em Informática para
alunos do curso da mesma área. O objetivo dessas disciplinas
foi implantar junto à comunidade acadêmica da UnB (docentes
e discentes) uma nova cultura – a do empreendedorismo em-
presarial (criação de empreendimentos de base tecnológica e
na área de formação do aluno) e do intraempreendedorismo

98
(foco no desenvolvimento ou melhoria do nível de empregabili-
dade dos egressos da UnB).

Na primeira aula em cada semestre é aplicado um ques-


tionário para avaliação inicial sobre as expectativas dos alunos
matriculados em relação à disciplina com o objetivo de orientar
os instrutores quanto ao perfil dos alunos e à necessidade de
trabalho personalizado com aqueles que pretendem abrir um
novo negócio. Vejamos as expectativas dos 344 alunos que
responderam ao questionário, dentre os 619 que cursaram a
disciplina de Introdução à Atividade Empresarial 1, no segundo
semestre de 2012.

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


Gráfico 1– Perfil de ocupação dos alunos – IAE 2/2012

56,4%

27,0%

9,3%
5,3% 2,0%
Só estuda Estuda e faz Estuda e Estuda e é Estuda e é
estágio trabalha empresário empresário
júnior

Fonte: Questionário Inicial


N = 344

Quase 50% dos alunos que cursaram a disciplina, de dife-


rentes formas já estão buscando o mercado de trabalho, sendo
que apenas 7% tem atividade empresarial.

99
Gráfico 2 – Influência da atividade dos pais
na decisão dos filhos em criar empresas
71,8%

28,2%

Sim Não

Pais exercem atividade empresarial

Fonte: Questionário Inicial


N = 344
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

Gráfico 3 – Pretensão dos alunos em criar uma


empresa – IAE 2/2012
38,4%

29,4%

20,3%

9,6%

2,0%
0,3%
Não, quer ser Não, quer Não, já é Não, já foi Sim, Não sabe
funcionário trabalhar empresário empresário pretende
público em empresa
privada

Pretensões por ser empresário


Fonte: Questionário Inicial
N = 344

Comparando os gráficos 2 e 3 percebemos que ainda há


certa influência da atividade dos pais na escolha dos filhos quan-
to à atividade empresarial ou ser um funcionário público. Espe-
cialmente em Brasília nota-se um ambiente hostil para o jovem
que está na universidade, pois ainda há na cidade a oferta de

100
empregos públicos bem remunerados. De toda forma, 28,2%
dos pais dos alunos são funcionários públicos e 20,3% dos alu-
nos afirmam que querem ter a mesma profissão dos pais.

Contudo, podemos afirmar que caminhamos para o rompi-


mento da cultura do concurso público em Brasília rumo à cria-
ção de micro e pequenas empresas inovadoras e competitivas,
por influência da ação da disciplina de Introdução à Atividade
Empresarial e de outros programas de estímulo e apoio aos alu-
nos para criação de novos negócios, como o programa Incuba-
dora de Empresas de Base Tecnológica do CDT/UnB, o Disque
Tecnologia, o Núcleo de Inovação e Capacitação Empresarial
(Nice) que disponibilizam informação, formação continuada,
consultoria e serviços tecnológicos para o empreendedor local

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


(empresários já constituídos ou que pretendam criar um novo
negócio). Além desses, outros programas do Centro promo-
vem a interação dos pesquisadores da Universidade com o
governo, as empresas, terceiro setor, capital de risco e outros
segmentos do ecossistema empreendedor local e nacional.

O Gráfico 3 mostra ainda que de cada dez alunos que cur-


saram IAE, quatro pensam criar uma empresa e três ainda não
sabem. Dentre os que não sabem é comum ao final da disci-
plina haver mudança de ideia e abertura de empresas na In-
cubadora do CDT/UnB ou diretamente no mercado. Por outro
lado, dos 38,4% que pensam abrir um negócio apenas 15,1%
já iniciam na disciplina de IAE com uma ideia bem desenvolvida,
conforme Gráfico 4. A maioria não tem nenhuma ideia ou ape-
nas uma vaga noção sobre o tipo de negócio ou mercado que
pretende atuar. O papel dos professores nesses casos é funda-
mental no sentido de utilizar técnicas adequadas para motivar
os alunos no esforço de empreender, mas, sobretudo interagir
com informações fidedignas e relevantes sobre as reais oportu-
nidades existentes no mercado, conforme denotamos ser uma
das características de educação empreendedora: o professor
também é empreendedor (mesmo não sendo empresário) e

101
está atualizado com os problemas, oportunidades e realidades
locais, nacionais e globais, e contribui significativamente com o
seu conhecimento e experiência apontando para seus alunos
caminhos diferentes e estratégicos a serem seguidos.

Gráfico 4 – Preexistência de ideias antes da


disciplina – IAE 2/2012

47,7%
37,2%

15,1%
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

Não, vou Sim, mais Sim, e já está


desenvolvê-la ainda muito bastante
ao longo prazo vaga desenvolvida

Ideias formadas

Fonte: Questionário Inicial


N = 344

Gráfico 5 – Objetivos dos alunos com a


disciplina – IAE 2/2012

39,8%
36,5%

19,6%

4,1%

Capacitar-se Conhecer o Capacitar-se Completar o


para abrir uma conteúdo pois já é número de
empresa empresário crédios

Objetivos
Fonte: Questionário Inicial
N = 344

102
Ainda sobre o papel dos professores, enquanto empreende-
dores da educação, é relevante a prática da educação empreen-
dedora. Os gráficos 5 e 6 refletem o comportamento empreen-
dedor dos professores ao indicarem a disciplina IAE aos seus
alunos e fazendo a diferença. Por outro lado, dentre os alunos
que já cursaram a mesma disciplina a percepção é positiva, pois
a indicam a seus colegas de curso ou da universidade, que con-
forme constatamos no Gráfico 6, um grupo de 43,8% dos alunos
que buscam IAE foi por indicação de outros alunos.

Gráfico 6 – Forma que os alunos conheceram a


disciplina – IAE 2/2012

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


47,6%
43,8%

4,8% 2,9% 0,9%


Cartazes Professores Site do CDT Lista de oferta Amigos

Meios de Comunicação
Fonte: Questionário Inicial
N = 344

Como um dos principais reflexos do caráter inovador e impac-


to da disciplina temos uma taxa de evasão baixíssima em relação
a outras da própria universidade – apenas 47 alunos desistiram
e 79 foram reprovados, de um total de 619 matriculados em 11
turmas no segundo semestre de 2012, conforme Tabela 1.

103
Tabela 1 – Taxa de evasão e aprovação
dos alunos frente ao total de matrículas
2/ 2012
Alunos aprovados 493 79,64%
Matriculas trancadas 47 7,59%
Alunos reprovados 79 12,76%
Total 619 100,00%

Avaliação dos alunos


sobre a disciplina IAE
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

Analisar as variáveis que geram significado e estimulam o


processo de aprendizagem e o processo empreendedor para
os alunos, nos ajudaram na categorização das características
da educação empreendedora, ao mesmo tempo em que permi-
tiram a validação da efetividade e impactos gerados pela disci-
plina na visão dos alunos. A Universidade de Brasília aplica ao
final de cada semestre um questionário para avaliação realizada
pelos alunos sobre o programa do curso, o desempenho dos
professores, autoavaliação dos alunos sobre sua participação,
desenvolvimento de competências, os impactos de cada dis-
ciplina e o suporte dado por departamento para a execução
das atividades ao longo do semestre. O nível de satisfação dos
alunos supera 70% em todos os itens, fato que nos leva a crer
na efetividade do programa e na forma de trabalho.

Considerações finais

Os desafios para empreender, inovar e competir ainda são


barreiras significativas para micro e pequenas empresas e as
instituições que direta ou indiretamente estão vinculadas a es-

104
ses processos, a exemplo das universidades e demais institui-
ções formadoras de empreendedores. É visível a necessidade
de readequação dos conteúdos de muitos de seus cursos
técnicos e acadêmicos para atender as vocações regionais,
na formação dos alunos como potenciais empreendedores.

Promover a visão de negócio no ambiente universitário, em


todos os cursos, por meio de mecanismos orientados à valo-
rização das atitudes empreendedoras de alunos e professores
é outro grande desafio para as universidades que têm um rele-
vante papel no ecossistema empreendedor.

Do lado do governo, criar um bônus creditício e de incen-


tivos fiscais à capacitação técnica e estratégica realizada pelo

Capítulo I – Educação empreendedora em debate


empreendedor para que ele seja estimulado a desenvolver
competências empreendedoras de acordo com o perfil do ne-
gócio, pode ser uma boa estratégia para reduzir o número de
empreendimentos que encerram suas atividades por falta da
adequada capacidade de gestão estratégica.

Trabalhar a cultura empreendedora na educação de forma


transversal, desde o Ensino Básico até a pós-graduação para
formar professores e alunos com atitude empreendedora requer
o desenvolvimento de um novo padrão de educação, baseado
na pedagogia do empreendedorismo, favorecendo metodolo-
gias criativas, linguagem adequada e inserção nas realidades
locais e no perfil do micro e pequeno empreendedor brasileiro.

Vai requerer a ampliação dos investimentos governamen-


tais no desenvolvimento de políticas e metodologias inovado-
ras para a educação, como ensino a distância (EaD), mas com
metodologia e práticas inovadoras que criem os laços neces-
sários entre alunos e os professores pode ser um bom come-
ço e direção. Contudo, qualquer projeto dedicado à formação
acadêmica, ou continuada, tem que acompanhar as mudanças
econômicas, sociais e tecnológicas sob o risco de resultar em
mera reprodução de conhecimentos ultrapassados, com bai-

105
xo impacto ou significado para quem o recebe. O significado
será rapidamente percebido pelo aluno ou empreendedor em
formação desde que as novas tecnologias estejam presentes e
integradas ao projeto pedagógico ou ao conteúdo e instrumen-
tal utilizado no processo educacional.

Do ponto de vista das estratégias para um ambiente cria-


tivo e empreendedor ainda permanece válido o foco sobre as
ideias e o modelo de negócios para definir reais oportunida-
des e se há agregação de valor para os clientes. O uso de
técnicas que desenvolvem competências sociais, tais como
habilidade de comunicação, trabalho em equipe, respeito
pelas ideias dos outros são valorizadas pela dita geração Y.
Dentre as técnicas estão a de grupos focais e o coaching
Capítulo I – Educação empreendedora em debate

com agregação das tecnologias que tanto encantam essa


geração de novos empreendedores.

Por fim, a educação empreendedora é o cerne e o principal


vetor do desenvolvimento dos países e de regiões que aspiram
ver seus jovens tornando-se grandes empreendedores, E como
ocorre historicamente, obter esse tão valioso prêmio ou con-
quista só será possível por meio da inovação ou revolução do
processo educacional brasileiro que em geral, ainda está na era
fordista enquanto o mercado supera o toyotismo.

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Capítulo I – Educação empreendedora em debate

108
Capítulo 2
ENSINO FORMAL E EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA

Empreendedorismo no Ensino Superior: o caso


Sebrae no DF e Universidade de Brasília

Adolescência administrando o futuro:


uma experiência pioneira de
empreendedorismo juvenil no Brasil

Um retrato dos centros de empreendedorismo


nas IES brasileiras

Células empreendedoras: transformando o


mundo por meio de uma educação pautada na
gestão colaborativa do conhecimento

Educação empreendedora em solo potiguar:


um novo caminho para o ensino público

Educação empreendedora sob o prisma


da Junior Achievement no Brasil – o caso do
Programa Miniempresa

Educação empreendedora: desafios e


perspectivas para o Brasil

Educação, trabalho, empreendedorismo: nasce


o Pronatec Empreendedor
Empreendedorismo no
Ensino Superior: o caso
Sebrae no DF e Universidade
de Brasília
Cristina Castro Lucas de Souza30
Hannah F. Salmen31
Karen Virgínia Ferreira32

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Introdução

Este texto tem por objetivo apresentar a experiência da


parceria Sebrae no Distrito Federal (Sebrae DF) e Centro de
Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Universidade de
Brasília (CDT/UnB), bem como os processos, procedimentos
e resultados da disciplina “Introdução à Atividade Empresarial
(IAE)”, ofertada a alunos de graduação dessa Universidade.

30 Professora Adjunta do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília (ICB/UnB).


Coordenadora de Extensão do Centro de Desenvolvimento Tecnológico (CDT) da Universida-
de de Brasília (UnB). Doutora em Administração (2011), UnB; Doutora em Ciência da Gestão
(2011), Université Paul Cezanne – Aix / Marseille III. Mestre em Gestão Social e Trabalho
(2005), UnB.
31 Administradora, especialista em Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing
(ESPM/RJ) .MBA em Estratégia pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Coordenadora na-
cional do Programa Sebrae Mais, na Unidade de Capacitação Empresarial do Sebrae.
32 Especialista em Gestão Escolar e Coordenação Pedagógica (2012), pela Faculdades Integradas
da Grande Fortaleza. Pesquisadora-bolsista e coordenadora pedagógica nas atividades de en-
sino da Escola de Empreendedores (Empreend) do CDT/UnB.

113
A disciplina tem por finalidade disseminar a cultura em-
preendedora no processo de ensino-aprendizagem, que é vol-
tado para a formação de indivíduos inovadores no contexto uni-
versitário, dotados do instrumental considerado essencial para
o ingresso na temática do empreendedorismo.

Para tal foram considerados os conceitos cultura, inovação


e empreendedorismo que formam o eixo principal da disciplina.
Esta se propõe, considerando as especificidades de cada de-
partamento da Universidade de Brasília (UnB), formar pessoas
com competências empreendedoras, capazes de se inserir no
atual mercado de trabalho.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

Empreendedorismo e seu histórico

Antes de qualquer definição conceitual, é fundamental que


se reconheça no tema empreendedorismo um movimento edu-
cacional e de profunda transformação, individual, coletiva e,
portanto, social. Por isso, em essência, é inovador e valoroso
em qualquer contexto que se encontre.

Os ganhos econômicos advindos desse processo são,


num primeiro momento, as consequências mais evidentemente
concretas, pois têm impacto direto no desenvolvimento e pros-
peridade de indivíduos, grupos, territórios e nações.

Quando falamos de empreendedorismo, falamos essen-


cialmente de comportamento, atitude e cultura. Torres e Nebra
(2005) definem atitudes como “respostas avaliativas relativa-
mente estáveis que são dadas a uma entidade ou situação”.
Nelas, encontramos três componentes: o afetivo, onde a pes-
soa avalia se gosta ou não da entidade ou situação; o cognitivo,
que consiste nas crenças que as pessoas têm sobre a entidade
ou situação; e o comportamental, que representa as tendên-

114
cias comportamentais em relação à entidade ou situação.

É no campo atitudinal que reside o principal desafio do en-


sino do empreendedorismo, em especial, no Ensino Superior. A
busca do diálogo permanente entre comportamento e cultura,
mediado pelas atitudes do indivíduo e, consequentemente, de
seu grupo carregam o poder transformador inerente ao em-
preendedorismo.

Segundo Souza (2005), “Os termos empreendedor e empre-


sa têm sua origem em torno do século XV, na França. A empresa
como categoria da vida econômica e social, segundo Segrestin
(1669), é um fato histórico inserido recentemente no desenvolvi-
mento da civilização. No entanto, embora os termos empreen-

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


dedor e empresa não sejam referidos, de modo significativo, nos
grandes movimentos do século XIX, eles precedem a Revolução
Industrial, tendo sua origem na ordem medieval e corporativa”.

Posteriormente, no século XVIII, a Inglaterra era a prota-


gonista da primeira Revolução Industrial, capitaneando os pro-
cessos da inovação técnica, novas transformações produtivas
e econômicas e seus impactos sociais.

Contudo, foi no século XIX, com a segunda Revolução In-


dustrial, que teve como cerne a eletricidade e o automóvel, os
ganhos econômicos, de produtividade, de escala e de mercado
tornaram-se exponenciais.

Simultaneamente, os processos gerenciais tornavam-se


mais maduros, apartados dos processos familiares e, em 1881,
originou-se o primeiro curso de Administração do mundo, na
Wharton School, nos Estados Unidos (EUA). Apenas 150 anos
mais tarde, somente nos EUA, havia mais de 1.500 novos cur-
sos de Administração. Fenômeno que pode ser diretamente
relacionado ao crescimento de novas formas de produção e
novos modelos econômicos.

115
Já no século XX, a importância das organizações no con-
texto social ganha uma dimensão nunca vista e avança em
progressão geométrica rumo ao século XI. A globalização
constitui-se como principal rota, impactando em toda a sorte
de regulações, relações e percepções. A revolução, agora não
mais industrial, de conhecimento impõe de forma irreversível a
necessidade de adequação dos modelos de gestão a novas
competências, aprendizados e aplicações.

Empreendedorismo, inovação e cultura

O conceito de empreendedorismo que adjetiva atitude


Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

como empreendedora, estudado a partir de teóricos como


Schumpeter (1997), Max Weber (1982), McClelland (1972),
Filion, (1999), Carland et al. (1992, p. 1), Souza (2005), entre
outros, é aqui considerado em função de quatro elementos:
traços de personalidade, destacando a busca de oportunida-
de e criatividade; postura estratégica, inovação e propensão
a assumir riscos. Empreendedorismo, então, pode ser defini-
do como processo, tangível e intangível, realizado por pessoa
com habilidades criativas, sendo uma complexa função de ex-
periências de vida, oportunidades, habilidades e capacidades
individuais.

Souza (2005) associa atitude empreendedora à predispo-


sição para gerenciar a vida ou a um empreendimento, obtendo
informações acompanhando-o e avaliando-o sistematicamen-
te; à predisposição para ter iniciativas, tomar decisões, atingir
objetivos, cumprir metas, buscar oportunidades e aceitar riscos;
à predisposição para liderar, influenciar nas ações e resultados
do empreendimento, estabelecer redes sociais, desenvolver a
autoconfiança, e à predisposição para agir de forma criativa,
construir diferenciais competitivos e produtivos.

116
Para desenvolver essa atitude empreendedora destaca-se
a importância da ambiência, principalmente ao levar em conta
Rodrigues (1972, p. 401) ao afirmar que “as atitudes sociais
criam um estado de predisposição à ação que, quando combi-
nado com uma situação específica desencadeante, resulta em
comportamento”.

Souza (2005), em pesquisas realizadas, encontrou como


características mais destacadas para a formação da atitude
empreendedora a inovação, a busca de oportunidades, a cria-
tividade, a propensão a correr riscos, a liderança, a persistên-
cia e a necessidade de realização. É, pois, essa atitude que
a disciplina de empreendedorismo aqui apresentada tem por
objetivo desenvolver, para formar pessoas empreendedoras,

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


ou seja, inovadoras, capazes de promover a mudança, com-
prometidos com a inovação.

Inovação é compreendida como o que é feito de modo di-


ferente, agregando valor, ou seja, toda e qualquer solução que
gere mais valor, novos conhecimentos, novas e melhores solu-
ções para problemas (DAVILA, et al, 2007). De um modo geral,
inovação aqui é o esforço para gerar novidade, novos proces-
sos, novas práticas, novos métodos, enfim, novas ações com
base em informação e conhecimento.

A ambiência das comunidades educacionais, tanto a inter-


na, como as condições gerenciais, de infraestrutura e tecnoló-
gicas, como a externa, como as redes sociais, são fatores que
possibilitam o desenvolvimento do compromisso das pessoas
com a inovação. No entanto, não é suficiente desenvolver es-
tratégias organizacionais para inovar, um dos grandes desafios
das comunidades de ensino é serem os professores agentes
inovadores capazes de implantar valores e ideias inovadoras.

A inovação pode ser considerada como um processo de-


pendente do processo de ensino – aprendizagem e, portanto,

117
fazendo parte da cultura de um grupo. Cultura, de acordo com
Hofstede (1997, p.19), é a “programação coletiva da mente”,
a qual diferencia os membros “de um grupo ou categoria de
pessoas face a outro”. Assim, cultura inclui todas as ações,
atividades, interesses característicos de uma sociedade, estan-
do condicionada aos momentos históricos, com suas regras
específicas, tendo suas lógicas próprias, moldando os seres
humanos para os seus fins.

Os grupos sociais, como diz Hall (2003), são multicul-


turais embora possuam características comuns, sendo, por
definição, culturalmente heterogêneos. Nesse sentido, para
elaborar o projeto de uma disciplina é fundamental conside-
rar as diferenças culturais, reconhecendo as distintas con-
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

tradições sociais cujas origens são diversas, bem como as


especificidades e os modos de ação. É importante para de-
senvolver o processo de ensino-aprendizagem que se tenha
claro que as práticas próprias dos contextos das comuni-
dades de ensino e delas mesmas são, na visão de Dupuis
(2007), manifestações culturais. Vários autores, diz Dupuis,
como d’Iribarne, Hofestede, Hickson e Pugh, mostraram que
“todo grupo nacional produz suas próprias representações
e práticas” e, portanto é necessário compreendê-las para
“poder interagir com êxito junto aos membros desses gru-
pos”(2007,p.216).

Assim, para a elaboração do projeto de desenvolvimen-


to da disciplina “Introdução à Atividade Empresarial (IAE)” a
cultura permeia todas as ações, e remete a consciência das
diferenças e semelhanças entre os atores das comunidades
de ensino, especialmente a partir de suas representações
sociais. Desse ponto de vista, o conteúdo, as ações e a me-
todologia da disciplina são organizados respeitando essas
diferenças e semelhanças.

118
O ensino do empreendedorismo

O setor educacional em seus diferentes níveis passa por


tensões para atender às demandas advindas das novas tec-
nologias da educação e do conhecimento, bem como as dos
fenômenos da exclusão social e das desigualdades de desen-
volvimento, das pressões entre o mundial e o local, da degra-
dação do ambiente natural. Essas demandas sociais são, pois,
próprias de um mundo em crescente processo de mudança.
Nesse contexto, um dos grandes desafios do sistema de edu-
cação é criar condições para que o processo de ensino apren-
dizagem ocorra de forma efetiva, capacitando professores que
incorporem e utilizem novas tecnologias, inovando o processo

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


didático e metodológico nas escolas e formando pessoas pre-
paradas para tomar decisão de maneira autônoma e inovadora,
escolhendo seu caminho de aprendizagem.

A questão, pois, é bem mais do que construir conheci-


mentos, é criar ambiência para desenvolver competências que
possibilitem as pessoas vivenciarem experiências, realizarem
práticas, atuarem de forma corajosa e criativa, comprometidas
com a inovação, capazes de planejar sua vida e com isso suas
ações, formando redes sociais nas quais se movimentem com
autonomia. Assim, cabe a pergunta como desenvolver compe-
tências enfrentando o que Delors (1996) apresenta como ten-
sões entre o mundial e o local, a tradição e a modernidade, o
longo e o curto prazos, as competências indispensáveis e as
igualdades de oportunidades, o desenvolvimento do conheci-
mento e a capacidade do ser humano de assimilação.

Por competência, segundo Durand (1998), pode ser con-


siderada a tríade que envolve: conhecimentos, habilidades e
atitudes, englobando de forma integrada não só questões téc-
nicas, mas, também, aspectos sociais e afetivos relacionados
ao trabalho e a vida. O conhecimento corresponde ao saber

119
o que e por que fazer, ou seja, refere-se a informações assi-
miladas e estruturadas pelo indivíduo, permitindo-lhes enten-
der o mundo. A habilidade refere-se a saber como fazer algo
no momento adequado, ou seja, é a capacidade de agir de
acordo com objetivos ou processos pré-definidos, envolvendo
técnicas e aptidões. A atitude diz respeito a aspectos afetivos
e sociais relacionados ao trabalho. Inclui a identidade do indi-
víduo com os valores da organização, por consequência, seu
comprometimento e motivação para atender aos padrões de
comportamento esperados para atingir resultados no trabalho
com qualidade. Para Ropé e Tanguy (1997), um dos aspectos
essenciais da noção de competência é que esta não pode ser
compreendida de forma dissociada da ação.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

A disciplina: Introdução à
Atividade Empresarial (IAE)

Os desafios lançados à sociedade frente às necessidades


da globalização demandam à universidade, a competência e o
compromisso de trabalhar e desenvolver pesquisa e desenvolvi-
mento que visa fortalecer o processo de inovação para o desen-
volvimento do país. Assim, formar formadores inovadores deve
ser um objetivo primordial dos institutos de educação superior.

“Há uma mudança de uma economia baseada nos fatores


de produção para uma socioeconomia baseada num siste-
ma de inovação, onde as universidades assumem um papel
fundamental ao criarem infraestruturas para o conhecimento
(CHAVES, 2009, p.22).”

Cada vez mais, a sociedade torna-se complexa, multifaceta-


da, com um mercado altamente competitivo, onde novas com-
petências de trabalho são exigidas. O tempo e a velocidade tor-

120
nam-se dimensões fundamentais. São tais mudanças que levam
ao surgimento de novidades nos espaços sociais (SOUZA, 2005).

Ser empreendedor presume o desenvolvimento de diversas


competências que se atrelam diretamente à vida cotidiana dos es-
tudantes: capacidade de decidir realizar uma tarefa, planejamento,
assumir riscos calculados entre outros. Segundo Filion (1993), o
empreendedor é visionário, enxerga oportunidades, é inovador, ele
sai de sua zona de conforto e caminha para executar o proposto.

Nessa proposta, a Universidade de Brasília (UnB) intentou para


a emergente demanda da sociedade, na busca pela discussão do
empreendedorismo, abrindo-se para processo de desenvolvimen-
to econômico social, por meio do ensino de competências em-

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


preendedoras. Para tal, em 1996, a Escola de Empreendedores
(Empreend), do Centro de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico
(CDT/UnB), cria a disciplina Introdução à Atividade Empresarial
com o “objetivo de desenvolver competências básicas e emer-
gentes na área de inovação tecnológica, empreendedorismo e
promover o autodesenvolvimento de futuros empreendedores”.

Atualmente, a disciplina tem carga horária de 60 horas


semestrais. Além disso, ela é subdividida em quatro módulos:
competência empreendedora, plano de negócio, plano de mar-
keting e plano financeiro, cujos instrutores possuem experiên-
cia acadêmica e experiência do mercado de trabalho.

A avaliação final da disciplina é feita através da elaboração


de um trabalho, onde os alunos fazem, sob a orientação dos
instrutores, um Plano de Negócio da empresa que pretendem
formar. Os alunos são instruídos a pensar de maneira inova-
dora, visando um planejamento contínuo do projeto escolhido.

A primeira oferta da disciplina de graduação Introdução à Ati-


vidade Empresarial (IAE), no 1º semestre de 1996, contou com
uma turma de 33 alunos. Desde então, em todos os semestres

121
conseguintes foram ofertadas turmas de IAE, perfazendo um total
de 6334 alunos já matriculados nesta disciplina. Atualmente a Es-
cola de Empreendedores faz uma oferta de dez turmas de IAE, por
semestre. No 2º semestre de 2012, foram ofertadas dez turmas
presenciais e uma semipresencial, com um total de 546 alunos.

No decorrer de mais de 15 anos, foram elaborados apro-


ximadamente 1.500 planos de negócios, dos quais 192 foram
encaminhados para o Programa Multincubadora do CDT/UnB.

Os participantes
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

Como exposto anteriormente, este artigo, busca descrever


a disciplina “Introdução à Atividade Empresarial (IAE)”, parce-
ria entre a Universidade de Brasília – CDT/UnB e Sebrae DF e
seus resultados, tanto quantitativos como qualitativos, que são
sistematicamente monitorados e avaliados, com vistas a sua
melhoria contínua. Para tal, será analisado abaixo as respostas
dos alunos nos semestres 1º/2011, 2º/2011, 1º2012 e 2º/2012,
respectivamente, a partir de um instrumento de coleta de da-
dos, constituído por perguntas fechadas pré-elaboradas.

No primeiro dia de aula, é entregue aos alunos o “Questionário


Inicial do Perfil dos alunos”. Esse questionário, estruturado com
questões pré-elaboradas fechadas e semiabertas, foi construído
para avaliação do perfil desses alunos na disciplina, visto que, a
mesma é aberta a todos os cursos da Universidade de Brasília,
nos quatro campi, tornando o perfil dos alunos muito amplo.

A metodologia de análise utilizada neste paper é quantitati-


va, com o intuito de determinar o perfil dos alunos ingressos na
disciplina Introdução à Atividade Empresarial.

A amostra considerada para a referida pesquisa foi com-

122
posta por alunos de graduação da Universidade de Brasília
(UnB), que cursaram a disciplina Introdução à Atividade Em-
presarial nos anos 2011 e 2012, divididos em quatro semestres
letivos, totalizando 35 turmas de aproximadamente 45 alunos
cada. A amostra, em sua maioria é composta por membros do
sexo masculino (63,3%), com idade variando de 16 a 56 anos,
dos quais 76,7% estão entre o 3º e 8º semestres, os demais
9,1% estão no 1º e 2º semestres, 13,1% entre o 9º e 11º se-
mestres e, 1,1% acima do 12º semestre.

Alunos de aproximadamente 65 cursos diferentes já pas-


saram pela disciplina IAE. No gráfico abaixo é possível obser-
var que, a incidência maior é de alunos do curso Ciência da

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Computação (8,5%), seguido de Engenharia Mecânica (7,6%)
e, Engenharia Civil com (6,7%), o curso de Administração fica
em 10º lugar, com 3,3% dos alunos.

2,4% Demais cursos


3% 2,6%
Ciência da Computação
3,3%
3,8% Engenharia Mecânica
4% Engenharia Civil
Ciências Contábeis
4,7% 35,9%
Engenharia de Redes
Engenharia Elétrica
5,5% Engenharia da Computação
Comunicação Social
5,6% Engenharia Florestal
Administração
6,4% 8,5%
Estatística
6,7%
7,6% Engenharia de Energia
Engenharia Mecatrônica

Dos 1.542 respondentes 49,2% disseram ter interesse em


cursar a disciplina visando capacitar-se para abrir uma empresa
e, 4,4% já tem uma empresa.

No item ideia de negócio, apenas 7,5% dos alunos já ti-


nham uma ideia desenvolvida, 37,4% tinham apenas uma ideia

123
inicial, e, 54,9% não tinham ideia de negócio. 49,2% da amos-
tra pretende abrir uma empresa ao longo da graduação ou logo
após a formatura. E ainda, 64,9% dos alunos respondentes não
têm pais e/ou responsáveis com algum tipo de atividade em-
presarial, que pudesse ser um fator de influência para montar o
negócio, segundo Filion (1993).

Considerações finais

Não há na história recente da humanidade qualquer grande


feito ou conquista dissociado dos princípios básicos do em-
preendedorismo, porque é em sua essência que residem ques-
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

tões fundamentais para o desenvolvimento humano, progresso


e bem estar – material e social.

Assim, torna-se incontestável que estímulo e apoio a movi-


mentos dialógicos e permanentes entre o ambiente acadêmico,
institucional e empresarial é crucial na construção de um tecido
intelectual e produtivo que seja sustentável. Desta forma, a relação
entre academia, mercado e instituições de apoio devem ser sistê-
micas, integradas e geradoras de resultados concretos e efetivos.

Percebe-se que o caso apresentado é absolutamente con-


vergente ao desafio posto, não só por levar o ensino de exce-
lência aos seus participantes, mas essencialmente por ampliar
o entendimento acerca da importância do empreendedorismo
na sociedade. O empreendedorismo extrapola, portanto, uma
oferta acadêmica tradicional, restrita aos cursos de negócios,
como Administração, Economia, Publicidade, dentre outros.
Torna-se uma proposta plural, e amplamente aplicável, e de-
mandada por toda a comunidade acadêmica.

Por fim, a experiência do ensino do empreendedorismo na


educação superior, se materializa com a excelência caracterís-

124
tica com que ambas as instituições cumprem seus papéis, o
Sebrae na perspectiva do apoio e fomento a cultura empreen-
dedora, com vistas ao fortalecimento da economia, a Universi-
dade de Brasília (UnB) na oferta de uma formação universitá-
ria de qualidade, respeitosa com todas as formas de saber e
comprometida com a cidadania. Agentes que atuam de forma
integrada, sinérgica e na mesma direção, complementando-se
no desafio da consolidação do fortalecimento da cultura e da
educação empreendedora.

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Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


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127
Adolescência Administrando
o Futuro: Uma Experiência
Pioneira de
Empreendedorismo
Juvenil no Brasil
Marilda Corbellini33
Rosângela M. Angonese34

Introdução

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Este artigo tem o propósito de apresentar os resultados de
uma pesquisa de avaliação de eficácia de proposta metodológica
para educação empreendedora, cuja experiência começou em
1993, quando o programa veio a se instalar no Brasil, no Estado
do Paraná. Fruto de uma aliança estratégica entre o Advocates
for Youth, dos Estados Unidos, o Sebrae no Paraná, o Centro de
Integração Empresa-Escola (CIEE) e a Secretaria do Estado de
Educação do Paraná, o programa Adolescência Administrando
o Futuro (AAF) foi implantado em um contexto de comparti-
lhamento de interesses, para fazer frente a um dos desafios da
agenda brasileira: a inserção socioprofissional do jovem. Para
tanto, oferecia-se uma metodologia que abria oportunidades de
educação para a vida, fundamentada em três grandes eixos: a
identidade, a convivência e o desenvolvimento profissional, com

33 Doutora pela PUC/SP, com foco na dimensão humana de empreendedorismo juvenil. Diretora e
consultora da Mace Consultoria na área de Gestão de Pessoas. Professora universitária no tema
de desenvolvimento gerencial e de equipes.
34 Mestre pela Universidade Positivo, com foco em administração estratégica. Consultora no Se-
brae. Professora universitária no tema empreendedorismo e liderança.

129
ênfase em empreendedorismo. Essa metodologia converge para
uma prática social denominada educação empreendedora.

É no entendimento do campo educativo e profissional vol-


tado à compreensão das demandas do mundo dos jovens que
o programa Adolescência Administrando o Futuro se instala,
pretendendo:

• Implantar uma metodologia que se apresenta na área so-


cioeducacional como uma nova proposta para os jovens
compreenderem e agirem no mundo do trabalho (emprego
formal e empreendedorismo).

• Apresentar um programa que contribua para o desenvolvi-


mento de competências pessoais, sociais e produtivas do
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

jovem, preparando-os para o planejamento de vida futura.

Este artigo contempla, na primeira parte, um referencial teó-


rico, abordando os quatro pilares da educação e o empreende-
dorismo com suas dimensões. Na segunda parte, a metodologia
de educação para jovens, fundamentada na teoria dos quatro
pilares da educação formulados pela Unesco35. A terceira parte
contempla a arquitetura do programa Adolescência Administran-
do o Futuro (AAF). Na última parte, a avaliação da experiência
do programa no Brasil, do ponto de vista de sua eficácia e dos
impactos junto aos jovens e educadores dele participantes.

As perspectivas da educação e do
trabalho no mundo globalizado

Quais os efeitos da globalização perante a educação? O


que esse novo quadro modifica nas relações entre educadores

35 Unesco é organismo da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

130
e educandos? Por onde começar uma nova metodologia de
ensino, levando em consideração as necessidades da agenda
do século XXI? Brunner (2002) discute essas questões, pro-
pondo algumas dimensões a serem pensadas e desenvolvidas
pela educação neste novo século:

• Acesso à informação;

• Acervo de conhecimentos;

• Mercado de trabalho;

• Disponibilidade de tecnologia de redes para a educação; e

• Mundos de vida, ou a adaptação dos jovens ao seu entorno

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


social e familiar perante a realidade globalizada.

Nesse novo cenário, algumas tendências são apontadas


quanto às competências empreendedoras que devem ser de-
senvolvidas nos jovens, para que eles sejam absorvidos pelo
mercado de trabalho. Tais competências estão relacionadas à
capacidade de tomar iniciativa e ao “jogo de cintura” nas mais
variadas situações, à coragem de assumir riscos e gerar resul-
tados, à garra, à ambição, à habilidade de liderar equipes, à
disposição para competir, além de executar múltiplos papéis
nas organizações.

De acordo com essas tendências, a educação encontra-


se diretamente em conflito com as relações de trabalho. A
exigência de novas competências, conhecimentos e habilida-
des em um mercado de trabalho que vem se estruturando
globalmente afeta, em especial, a composição de currículos
e programas das instituições educacionais, além de todo o
entorno social e econômico.

131
O empreendedorismo e suas dimensões

O empreendedorismo, além de ser o motor do desenvol-


vimento socioeconômico, é um campo fortemente relacionado
com a compreensão e construção da liberdade humana. Den-
tro das avalanches de saberes e incertezas, a capacidade em-
preendedora tem condições de se constituir em resposta para
inovações e incentivo à imaginação criadora dos indivíduos e o
estímulo ao empreendedorismo como demanda alternativa ao
trabalho dependente. Embora o ensino formal brasileiro (Funda-
mental e Médio) raramente contemple nos conteúdos progra-
máticos do ensino do trabalho autônomo, há manifestações dos
jovens em conhecer modalidades de trabalho independente, no
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

qual a dimensão da criatividade é visualizada como oportunidade


de aprendizagem e ampliação de horizontes profissionais.

O relatório GEM36, desde sua primeira edição brasileira,


vem indicando que a capacidade empreendedora do país po-
deria ser ampliada significativamente se o nível da educação
geral do brasileiro fosse incrementado e se o sistema educacio-
nal brasileiro privilegiasse o ensino do empreendedorismo em
seus currículos básicos.

Conceituar o sujeito empreendedor é entrar na discussão


de tempo e espaço, a partir da qual surgem interpretações que,
abraçadas por economistas, comportamentalistas e outros es-
tudiosos, revelam uma diversidade de definições, influenciadas
por correntes e escolas de pensamento da economia, da so-
ciologia e da psicologia.

Dentro das principais correntes do pensamento econô-


mico, há a proposição de duas categorias de empreendedo-

36 Global Entrepreneurship Monitor, pesquisa divulgada anualmente no Brasil pelo Sebrae e Insti-
tuto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBQP)

132
res: os organizadores de negócios e os inovadores. O pri-
meiro tipo inclui o empreendedor clássico descrito por Jean
Baptista Say (1803), aquele que corre riscos e o outro tipo,
o empreendedor descrito por Schumpeter (1934), é o que
inova (FILION, 1999, p.60).

McClelland (1961) foi quem iniciou as discussões do em-


preendedorismo na dimensão humana, contribuindo para as
ciências do comportamento. Contrário à posição de Schum-
peter, que não acreditava na possibilidade de aprendizagem de
empreendedorismo, McClelland preconiza que é possível ca-
pacitar pessoas para empreender, partindo da hipótese de que
a necessidade da realização do indivíduo seria a principal força
motivadora do comportamento empreendedor.

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Os quatros pilares da educação

Na segunda metade da década de 1990, a maioria dos paí-


ses empreendeu reformas educacionais. No Brasil, ocorreu a
implementação da Lei de Diretrizes e Bases de Educação Na-
cional (LDB) e os novos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs-
1996/1997). Nessa mesma direção, Delors (2001) propôs a cria-
ção de políticas diversificadas que contemplassem inclusões com
oportunidades de aprendizado para todos, propondo princípios
que norteassem as múltiplas formas de aprender: aprender a co-
nhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser.

• Aprender a conviver – compreensão do outro com noção


de interdependência para gerenciar conflitos, num espírito
de respeito pelos valores do pluralismo.

• Aprender a ser – nesse tipo de aprendizagem considera-se


que a educação deve ter como finalidade o desenvolvimen-
to total do individuo: espírito e corpo, sensibilidade, sentido
estético, responsabilidade pessoal e espiritualidade.

133
• Aprender a fazer – adquirir conhecimentos que propicie a
formação técnica para o trabalho.

• Aprender a conhecer – adquirir repertório de conhecimen-


tos que permitam compreender melhor o ambiente sobre
seus diversos aspectos.

A arquitetura do programa AAF

O programa Adolescência Administrando o Futuro (AAF) teve


como base a orientação da experiência costarricense “Como
Planear mi Vida”, que em aliança com a organização não gover-
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

namental norte-americana Advocates for Youth, elaborou um


programa de ajuda aos adolescentes, visando ao enfrentamen-
to das questões sociais, tais como a preparação para o mundo
do trabalho e o cuidado com a saúde.

Na implantação do programa no Brasil foi proposta a al-


teração nos conteúdos referentes ao mundo do trabalho37 e o
acréscimo de dois novos conteúdos com foco em empreende-
dorismo e no uso nocivo das drogas.

Nesse realinhamento, constatou-se que a preparação do


jovem em face dos desafios da realidade do mundo contem-
porâneo passa, não só pelo desenvolvimento de competências
cognitivas, sociais e pessoais, mas também pelas produtivas,
focando de forma inovadora o desenvolvimento profissional
para o mundo do trabalho e do empreendedorismo.

A alteração do programa foi sucedida pela realização de


projeto-piloto com 640 jovens do ensino médio, vinculados à
rede pública de ensino, monitorados por 28 educadores ca-

37 No contexto do programa, mundo do trabalho incluía reflexões acerca de competências e ins-


trumentalização para inserção no mercado de trabalho por meio do emprego formal.

134
pacitados na metodologia, que informaram demandas e cor-
reções na proposta. Desse primeiro momento de reformulação
da proposta, participaram dois assistentes sociais (PUC/CIEE),
dois psicólogos (Prefeitura Municipal de Curitiba/CIEE), dois pe-
dagogos (CIEE e Secretaria de Estado da Educação do Para-
ná) e um biólogo especialista em prevenção a drogas (Conen
– Conselho Estadual de Entorpecentes).

A partir desse realinhamento, e considerando os demais


eixos temáticos do programa, foram elaborados os referenciais
complementares, acrescentando os objetivos, as concepções
sobre o período da adolescência, expectativas com relação ao
educador brasileiro, as novas temáticas (inclusão dos 3 capítu-
los brasileiros) e as estratégias de aprendizagens.

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Após as proposições terem sido aceitas pela instituição
norte-americana Advocates for Youth, foram aplicados novos
testes-piloto com duas turmas de 58 jovens. As respostas tive-
ram aprovação unânime, incluindo o tema empreendedorismo.

Vale ressaltar, que o programa AAF foi viabilizado pela arqui-


tetura institucional montada, que envolvia parceiros e especialis-
tas, gerando uma aliança social articulada que permitiu a cons-
trução de alternativas de implementação do programa em uma
relação de intercomplementaridade operacional e financeira.

A proposta pedagógica

O programa AAF buscou construir propostas para o de-


senvolvimento pessoal e profissional focadas em: habilidades/
competências de empreendedorismo juvenil; políticas públi-
cas para a juventude; experiência diferenciada para os jovens;
acréscimo de saberes e habilidades para os educadores,
apresentando uma nova forma de ver, pensar, sentir e agir no
trabalho com adolescentes.

135
Os princípios que embasam o programa tiveram como
foco: possibilitar ao jovem tomar parte ativa no empreendi-
mento de uma nova sociedade; desenvolvimento de com-
petências de um fazer produtivo; viabilizar a construção de
autonomia do jovem; acreditar que a aprendizagem empreen-
dedora pode se constituir como um instrumento-resposta
para suas experiências de vida; acreditar que empreender é
transformar o sonho em realidade.

Ao trabalhar com os conceitos da educação empreende-


dora, o educador acredita e dissemina a noção da autonomia
e do agir político, considerando que cada jovem tem o direito
de participar das decisões que vão afetar a sua vida. Portanto,
para a implementação do programa, a atuação do educador foi
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

muito significativa.

A aplicação do programa AAF consistiu das seguintes uni-


dades e eixos temáticos (Quadro 1):

• A primeira unidade – Quem sou eu? – encaminharia aprendi-


zagens de aprender a ser e conviver, atendidas pelas ativida-
des dos eixos temáticos comunicação, identidade e valores.

• A segunda unidade – Aonde vou? – responde a questões


das aprendizagens de conhecimentos e papéis sociais a
serem assumidos pelas demandas de cuidados com a saú-
de. Esta unidade é atendida pelos eixos temáticos, papéis e
estereótipos, paternidade e maternidade, sexualidade, HIV
e AIDS ES uso nocivo das drogas.

• A terceira unidade – Como chegarei? – responde a ques-


tões de encaminhamento para aprendizagens de conheci-
mento de papéis sociais para competência do aprender e
fazer profissional. Esta unidade é atendida pelos eixos te-
máticos, estabelecimento de metas, tomada de decisão, o
mundo do trabalho: estou preparado?, e como posso tor-
nar-me um jovem empreendedor?

136
Quadro 1: Unidade, eixos temáticos e objetivos

EIXOS
UNIDADE OBJETIVOS
TEMÁTICOS
• Conhecer o que é uma boa
comunicação e como nos atinge.
A boa • Compreender a importância da boa
comunicação: comunicação nas relações familiares,
como posso como amigos e nas relações de
me comunicar trabalho.
bem com outras • Vivenciar técnicas para a boa
pessoas? comunicação.
• Identificar os obstáculos à boa
comunicação.
• Aprender uma definição de “valores”,
I – Quem
conhecer quais são meus valores

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


sou eu? Valores pessoais
pessoais e sua origem.
e familiares: o
• Entender de que modo meus valores
que é importante
interferem em minha conduta.
para mim?
• Aprender a comunicar meus valores
aos outros.
• Tomar consciência de minhas
qualidades positivas.
Quem sou eu
• Identificar aspectos e características
e o que posso
a meu respeito que posso modificar.
fazer?
• Identificar minhas habilidades e
potencial para o trabalho.
• Aprender sobre os estereótipos e
papéis sexuais existentes.
• Aprender de que forma os
Masculino e
estereótipos interferem em nossas
feminino: papéis
ações nos locais de trabalho e nas
e estereótipos
relações.
• Reavaliar meu próprio conceito sobre
II – Aonde
masculinidade e feminilidade.
vou?

• Avaliar como me sinto sobre tornar-


Paternidade/ me pai/mãe.
maternidade: • Conhecer as responsabilidades e
já é meu custos na criação de um filho.
momento? • Conhecer as implicações de ser pai/
mãe na adolescência.

137
EIXOS
UNIDADE OBJETIVOS
TEMÁTICOS
• Conhecer uma definição mais ampla
sobre a sexualidade humana.
• Deixar os adolescentes mais à
vontade ao falar das questões
Sexualidade :
sexuais.
como interfere
• Aprofundar o conhecimento sobre
nas minhas
a sexualidade, gravidez e doenças
relações e
sexualmente transmissíveis.
compromissos?
• Conhecer os métodos de prevenção
da gravidez e das doenças
sexualmente transmissíveis.
• Pesquisar os recursos da comunidade
em relação à saúde reprodutiva.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

• Corrigir as distorções de informações


sobre o HIV/AIDS.
II – Aonde HIV e a AIDS: • Conhecer os cuidados para proteger-
vou? como me me da AIDS.
proteger? • Desenvolver um sentimento de
empatia e solidariedade para com os
portadores do vírus da AIDS.

• Oportunizar a discussão e a troca


de informações, valori-zando os
conhecimentos do adolescente sobre
drogas.
• Identificar motivos e finalidades que
Drogas: para
levam alguém a usar drogas e os
que as pessoas
efeitos delas em nossa sociedade.
recorrem a elas?
• Aprender atitudes e habilidades
para enfrentar a pressão dos
companheiros quanto ao uso das
drogas.

138
EIXOS
UNIDADE OBJETIVOS
TEMÁTICOS
• Identificar minhas metas a curto e
longo prazo.
• Vivenciar o estabelecimento de
metas.
• Aprender a forma de atingir minhas
metas.
Estabelecimento
• Pensar sobre como a paternidade/
de metas e
maternidade pode interferir em
tomada de
minhas metas.
decisão: pensar
• Tomar consciência do processo de
sobre o futuro
tomada de decisões.
• Aprender um modelo para tomada de
decisões.
• Vivenciar as etapas de um modelo de
tomada de decisões:

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


• Coleta de dados;
III – Como • Previsão de resultados;
chegarei? • Fazer uma lista de vantagens e
desvantagens;
• Tomar uma decisão e avaliá-la.

• Conhecer as demandas globais


do mundo do trabalho e suas
justificativas.
• Identificar competências, vocações e
nível de preparação para o mercado
O mundo do de trabalho.
trabalho: estou • Reconhecer e praticar demandas
preparado? de aprendizagens para inclusão no
mercado de trabalho.
• Conhecer procedimentos básicos
para autoapresentação ao mercado,
fontes e recursos socioeducacionais.

139
EIXOS
UNIDADE OBJETIVOS
TEMÁTICOS
• Refletir sobre as características
de comportamento do jovem
empreendedor, relacionando com
competências a desenvolver.
• Definir sonhos (motivações) de ser,
Como posso conviver conhecer e ter no futuro e
III – Como tornar-me as aprendizagens necessárias para
chegarei? um jovem realização.
empreendedor? • Estudar oportunidades para
empreendimentos empresariais,
elaborando planos de possíveis
negócios e práticas de gestão.
• Aprender a trabalhar em equipes,
com liderança empreendedora.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

Na estrutura de aprendizagem do AAF estão imbricados


os pilares da educação (Dellors, 2001), o modelo andragógico
de aprendizagem (CAV – Ciclo de Aprendizagem Vivencial) e os
eixos temáticos do programa. Constituindo-se numa espiral da
aprendizagem, onde o jovem participa de dinâmicas vivenciais,
referendadas pela temática, relatando situações subjetivas em
um ambiente de relações de aprendizagens socioeducativas.

Abrangência do programa

O primeiro estado brasileiro a receber o programa foi o


Paraná, iniciando a primeira capacitação de educadores em
1993, seguido dos estados do Mato Grosso e Mato Grosso
do Sul e, por fim, Tocantins. Quando o programa se encer-
rou, em 2000, haviam sido capacitados 1.083 educadores e
60.872 de jovens, em 2.729 seminários.

A adesão dos professores, diretores de escolas da rede pú-

140
blica vinculada à Secretaria do Estado de Educação do Paraná foi
estimulada por uma ação de incentivo, denominada Vale Ensinar,
que consistia numa remuneração de valor/hora trabalho exceden-
te para o educador na prática de atividades do programa.

Avaliação da experiência
do programa AAF no Brasil

Para responder à questão:

“Em que medida os conteúdos presentes no programa


AAF e a metodologia de sua aplicação contribuíram para nor-

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


teamentos da vida futura do jovem no que se refere ao desen-
volvimento pessoal e socioprodutivo como expressão de em-
preendedorismo juvenil.”

Foi realizada uma pesquisa descritiva pós-facto em dois


momentos:

1. Em 1996/1997, a avaliação foi feita por meio de análise


quanti-qualitativa de questionários mistos, aplicados com
300 jovens, por meio de amostragem não probabilística,
onde se considerou a representatividade das regiões em
que o programa foi aplicado.

2. Após seis anos, em 2002, foi realizada nova pesquisa, por


meio da técnica de grupo focal, que permitiu conhecer ex-
pressões do impacto do programa na vida dos jovens. Fo-
ram oito grupos focais com a participação de 32 educado-
res e 33 jovens egressos do programa.

O tratamento descritivo das respostas na análise de conteúdo


das expressões verbais dos jovens, trabalhou a análise temática
que culminou com formulação de cinco categorias e dez indicado-
res da metodologia avaliativa, conforme apresentado no Quadro 2.

141
Quadro 2: Análise para Orientação de Avaliação da
Eficácia
(A numeração indica a correspondências entre os itens de cada
bloco)

OBJETIVOS
1. Construção de um saber que permita uma intervenção que contribua
para o fortalecimento de aprendizagens pessoais e sociais, preparando
o jovem para o planejamento de vida futura.
2. Apresentação de uma metodologia que subsidie a área
socioeducacional com uma nova proposta para compreender e agir no
mundo do trabalho para jovens.
3. Explicitação de representações que educadores formulam como
expressões de impacto das ações do programa.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

QUESTÕES NORTEADORAS
1. Em que medida os conteúdos presentes no programa AAF
contribuíram para ampliação de conhecimentos e aprendizagens
pessoais e sociais para a vida futura dos jovens?
2. Quais as respostas de comportamento empreendedor que expressam
aprendizagens de competências produtivas?
3. Quais as condições objetivas, presentes no desenvolvimento do
objeto de pesquisa, que podem vir a ser atribuídas e assumidas
pelos educadores e que se constituem novas formas de articular
conhecimentos, habilidades e atitudes para o desenvolvimento de
empreendedorismo juvenil?

CATEGORIAS AVALIATIVAS DA METODOLOGIA


1. Aprendizagens de autogerenciamento: aprender a ser.
Aprendizagens de relacionamento: aprender a conviver.
Aprendizagem cognitiva: aprender a conhecer.
2. Aprendizagens de fazer produtivo: aprender a fazer.
3. Apropriação da metodologia

142
INDICADORES
1. Expressões de autoconhecimento, valorização e melhoria de
autoestima.
Expressões de ganhos de comunicação e relacionamento interpessoal.
Expressões de aprendizagens de novos saberes para formulação de
projetos de vida.
2. Expressões de aprendizagens de novos saberes para o mundo do
trabalho (emprego formal).
Expressões de aprendizagens para o empreendedorismo.
Expressões de ganhos de habilidades profissionais, ampliando a
instrumentalidade.
3. Expressões de desenvolvimento pessoal e profissional dos jovens
Expressões de ganhos de competência dos educadores
Expressões de utilização da metodologia e interesse pela
continuidade do programa.

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Expressões de melhoria de interlocução com o sistema familiar

No tratamento dos resultados da pesquisa, as quatro primei-


ras categorias referem-se às aprendizagens do jovem e a quin-
ta categoria subsidia análises para entendimento das formas de
apropriação pelos educadores capacitados no programa AAF.

Observou-se nas expressões verbais dos jovens o reco-


nhecimento da importância das atividades de aprendizagem
cognitiva (aprender a conhecer): 32% dos jovens expressa-
ram aprendizagens de novos saberes “aprendi coisas que eu
não sabia...ampliou minha visão de mundo e minha respon-
sabilidade...nos ajudou a escolher caminhos de como nos de-
fender”; “uma vitória que eu vejo do curso é que eu consegui
passar isto para os meus filhos”.

A segunda categoria de maior relevância para os jovens


foram as aprendizagens de autogerenciamento (aprender a
ser), com registro de 30% dos jovens pesquisados. Algumas ex-
pressões de autoconhecimento e autoestima foram: “...não dava
vontade de ir embora, era bom escutar os outros, era como eu

143
me escutando”; ”Hoje, me compreendo melhor e sei que posso
tentar, agora”; “me ajudou a ter mais firmeza para decidir...”, “não
é qualquer obstáculo que me derrubará...”,“aprendi a lutar para
vencer...a enfrentar as coisas... a ser mais firme”.

A terceira categoria mais apontada foi a aprendizagem de


fazer produtivo (aprender a fazer), com 28% das respostas.
Exemplos de citações dos jovens: “...foi no programa que eu
comecei a ajudar meu pai, ele tem uma empresa pequena e eu
comecei a dar uns palpites”; “...às vezes a gente não tá pronto,
mas daí tem que dar a cara para bater”; “vou trabalhar agora,
primeiro quero ser empregado para depois ser patrão, tem que
adquirir essa experiência para daí montar alguma coisa”.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

A quarta categoria, aprendizagens de relacionamento


(aprender a conviver), com foco em ganhos de comunica-
ção e relacionamento interpessoal, obtendo 7% das respos-
tas, onde observamos as expressões verbais: “...é por isso que
você tem que estar com a mente aberta, tem que ser cama-
leão, se modificar, fica bem mais fácil conviver com o outro”;
“olha, eu descobri naquela época que eu sou comunicativo, eu
até me tornei líder da turma...como isso me ajudou”.

Avaliação do programa AAF na visão


dos educadores

Também para os educadores, o programa foi relevante


e impactou na vida pessoal e profissional, deu visibilidade à
aprendizagem, construiu e reconstruiu conceitos, comporta-
mentos e atitudes. Ante à surpresa com a metodologia, o edu-
cador comprometeu-se com o conteúdo a ponto de não querer
mais abandonar a instrumentalidade da proposta pedagógica.
A seguir, apresentamos expressões dos educadores quanto
aos indicadores de avaliação.

144
Expressões de ganhos de desenvolvimento pessoal e
profissional dos jovens.

“...na escola dificilmente tivemos 100% de fre-


qüência de qualquer aluno; no programa eles não fal-
tavam...”

“...a mudança era visível a cada encontro...”

“Vários momentos ficaram marcados, porém, o Ca-


pítulo sobre Empreendedorismo foi demais. Após a reali-
zação das dinâmicas, um dos meninos disse-me: aprendi
que devo valorizar o sítio do meu pai, pois tenho perfil para
empreendedor e não quero ir para a cidade grande”.

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


“...aquele menino não tinha nem muito recurso
para vir, e daí o encontrei no Sebrae e ele chegou para
mim e disse: lembra que eu falei que a sra. ia ouvir falar
de mim? Agora somos colegas!...”

Expressões de ganhos de competência dos educadores

“...a questão do empreendedorismo e do trabalho


não nasce da noite pro dia, eu me dediquei uns dois
anos a estudar e me entusiasmei tanto..”

“...quando fiz a entrevista para capacitação do


programa, eu resisti a trabalhar com alguns temas,
mas depois venci os meus próprios tabus...”

Expressões de melhoria de interlocução com a família

“...Vários pais vieram pedir pra fazer o mesmo


curso com eles, inclusive, eu falei com o Sebrae na
época, para nós montarmos um grupo para os pais.
Porque valores, autoestima, tudo mexe com todo
mundo, né não tem idade..”

145
.”..Volta e meia eu encontro o pai de um aluno
que foi um aluno nosso que eu conheço e tal. E eles
dizem: depois daquele momento, meu filho não é
mais o mesmo...”

Expressões de utilização da metodologia e interesse


pela continuidade do programa

“...meus pais são do interior e eu fui visitá-los.


Quando estava lá conversei com o prefeito e contei
do programa. Ficou tão entusiasmado que acabou
fazendo parceria com o Sebrae e ficou sendo um
programa para a zona rural.”
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

“...Depois que o programa parou na Secretaria


Municipal da Criança lamentei muito. Mas em segui-
da, apareceu o programa do Centro da Juventude e
resgatamos a posposta do AAF para lá...”

“...Quando instalamos o programa Piá, precisáva-


mos de uma metodologia e acabamos “adotando” as
dinâmicas para a proposta. Foi um sucesso! A adoção
foi definitiva!...”

“...Trabalhei com uns operários do sindicato na


semana de prevenção de acidentes. O pessoal pediu
para repetir!...”

“...Como é que um programa que preparou quase


60.000 adolescentes não tem incentivo e não conti-
nua? E os resultados? E a gente que é professor, faz o
quê? Espera por outro programa?”

Coincidem as opiniões de educadores e jovens quanto


aos efeitos da aplicação do programa. Para 30% dos jovens
houve contribuições ao crescimento pessoal, assim como

146
38% dos educadores afirmaram que o maior impacto foi no
amadurecimento de atitudes.

Quando questionados sobre o mundo do trabalho e a reper-


cussão do programa na decisão do jovem de abrir seu próprio
negócio, 35% dos educadores informaram que os jovens teriam
essa iniciativa, pois o programa AAF incentivou e auxiliou a elabo-
rar, em simulação, a formulação de um plano de negócios.

Gráfico 1 – Repercussão do programa na decisão do jovem de


abrir seu próprio negócio

Não respondeu

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Não
21%
44%
Sim
35%

No desenvolvimento da pesquisa com o grupo focal, reali-


zado seis anos após a conclusão do programa, onde participa-
ram 33 “jovens adultos” dele egressos, 15 estavam trabalhando
como empregados, oito em busca de trabalho, e dez deles,
administrando os seus próprios negócios.

Considerações finais

O programa AAF se consolidou como uma proposta es-


tratégica aos sérios desafios da agenda nacional, constituindo-
se em uma metodologia diferenciada e apropriada ao contexto
brasileiro, que abriu oportunidade de educação para a vida a
uma grande parcela da população de jovens adolescentes.

O uso apropriado dessa metodologia respondeu à amplia-

147
ção de conhecimentos que se constituíram como pilares de
aprendizagens de desenvolvimento em nível pessoal e produ-
tivo. A valorização desses conhecimentos, “das coisas que eu
não sabia” e “das coisas que me ajudaram a pensar no futuro”
repercutiram na subjetividade, pela ampliação do autoconheci-
mento e redefinição de autoconceito.

A proposta da educação empreendedora contemplou o


desenvolvimento de competências comportamentais, fazendo
com que os jovens apresentassem maior conhecimento para a
escolha de estratégias no mundo do trabalho e maior seguran-
ça para a busca da realização dos sonhos.

O programa AAF viabilizou que jovens provindos, em sua


Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

maioria, de famílias de baixa renda, conversassem sobre a es-


truturação de seus sonhos pessoais e profissionais, identifican-
do atividades que gostariam de realizar e as oportunidades de
fazer escolhas.

Para os educadores do programa, ele foi relevante e impactou


na vida pessoal e profissional; deu visibilidade à aprendizagem;
construiu e reconstruiu conceitos, comportamentos e atitudes.

No momento do encerramento dessa pesquisa, apresenta-


mos algumas proposições para futuros programas:

• Contemplar nos programas de empreendedorismo juvenil


as dimensões dos saberes ser, conhecer, conviver e fazer,
com foco no desenvolvimento integrado das competências
necessárias para o mundo do trabalho.

• Incentivar as políticas de educação e de trabalho para a im-


plementação da pedagogia do empreendedorismo no 1.º,
2.º e 3.º graus, na formação de uma mentalidade em que
os alunos acreditem no seu sonho e que poderão realizá-lo.

• Criar estratégias de aprendizagem por meio de encontros

148
entre jovens e empresários ou mentores com experiência
na vida profissional de pequenos negócios.

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Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

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PARÂMETROS Curriculares Nacionais. Brasília: Ministério da


Educação e do Desporto, 1996. Documento introdutório.

150
Um retrato dos centros
de empreendedorismo
nas IES brasileiras
Marcos Hashimoto38

Introdução

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


O tema empreendedorismo vem ganhando cada vez mais
espaço nas Instituições de Ensino Superior (IES) no Brasil como
uma resposta à tendência crescente de pessoas dispostas a
abrir um negócio próprio. Surge, assim, a necessidade de pro-
ver uma formação superior que atenda as expectativas deste
mercado emergente. Algumas IES estão indo além da criação
de disciplinas e se estruturando para prover uma formação
mais completa neste campo para o seu aluno, os Centros de
Empreendedorismo (CE).

O presente estudo traz um panorama atualizado destas


instituições no Brasil, descrevendo suas atividades e atribui-
ções. As conclusões aqui apresentadas podem subsidiar políti-
cas públicas de apoio à criação de CE em IES brasileiras.

38 Doutor em Administração de Empresas pela EAESP/FGV. Professor pesquisador pela Faccamp.


Professor e coordenador do Centro de Empreendedorismo da Fundação Armando Álvares
Penteado (Faap SP).

151
Revisão da literatura

O crescimento das iniciativas empreendedoras no mundo


forçou as IES a se posicionarem neste novo contexto. Os cen-
tros de empreendedorismo começaram a ser criados na déca-
da de 70, originalmente como um caminho para que os estu-
dantes pudessem gerar soluções na pesquisa científica para o
mercado (DEL PALACIO, 2007).

Um Centro de Empreendedorismo pode ser definido como


uma unidade existente dentro da IES que tem a missão de pro-
mover as iniciativas de natureza empreendedoras de sua co-
munidade. Conceitualmente, os CE contam com o apoio formal
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

da IES e não são uma iniciativa informal de professores ou alu-


nos que se reúnem para estudar e ensinar empreendedorismo,
como vários existentes atualmente (MENZIES, 2009).

Para Carson e Gilmore (2000), os CE contribuem com o desen-


volvimento do ensino de empreendedorismo e geram receita adicio-
nal por meio de consultoria e atividades de pesquisa. Além dessas
categorias, Menzies (2009) também sugeriu atividades de ensino:

Pesquisa: Atividades relacionadas com a geração do co-


nhecimento em empreendedorismo, aprimorando a qualidade
do conteúdo explorado em sala de aula e conduzido pelo cor-
po de professores pesquisadores (SANDBERG & GATEWOOD,
1991). Envolve a produção acadêmica de artigos, livros, relató-
rios e outras formas de publicação.

Ensino: A maior parte dos CE promove a formação edu-


cacional básica aos alunos, pela transmissão do conhecimento
em empreendedorismo. (MASON, 2000). Esta função é realiza-
da de diversas formas, sobretudo por meio de cursos, discipli-
nas de empreendedorismo, seminários, workshops, congres-
sos e outros tipos de eventos, além da revisão de conteúdos de
disciplinas em cursos curriculares.

152
Prática: Atividades relacionadas com a aplicação do co-
nhecimento em empreendedorismo. Envolve não só ativida-
des de consultoria, mas uma variedade grande de iniciativas
que englobam competições em geral: de pitching, de planos
de negócios, de inovação e criatividade, de sumários executi-
vos, feiras de negócios etc.

O CE deve atuar como um elemento central que estabe-


lece conexões de alto valor para os meios, funcionando como
um tipo de hub de interesses que usa as relações para gerar
benefícios para todos, conforme apresentado na Figura 1.

Alunos Alunos
Empresários Universidade

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Governo CE Imprensa
Doadores Comunidade
Órgãos de fomento Investidores

Figura 1: Centro de Empreendedorismo como um hub de conexões


(elaborado pelo autor)

Segundo Morris (2010), o CE precisa ter grande proxi-


midade com a comunidade local, nos dois sentidos, tanto
na prestação de serviços de apoio para o desenvolvimento
da atividade empreendedora na comunidade, como na bus-
ca de exemplos, casos e histórias que possam influenciar,
educar e inspirar alunos. Da mesma forma, o CE precisa ter
forte integração com outras partes da universidade, uma vez
que o tema empreendedorismo é transversal, não só abran-
gendo a criação de novos negócios, mas o desenvolvimento
de uma série de competências pessoais que servem para
qualquer tipo de carreira.

Finkle et al (2006) realizou o primeiro grande estudo entre


centros de empreendedorismo nos Estados Unidos, coletando

153
dados de 94 CE norte-americanos. Destacamos, a seguir, al-
guns de seus resultados:

• 49% dos CE eram orientados ao ensino, 33% à pesquisa e


18% a atividades práticas;

• A média de tempo de vida dos CE é de 11,9 anos.

• A maior parte dos CE pesquisados era independente das


universidades (48%), enquanto 24% estavam ligados às es-
colas de negócios e 16% à área administrativa da escola.

• 5,4 professores em media atuavam nos programas ofe-


recidos.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

• A média de funcionários era 2,8 por CE.

• A principal fonte de recursos eram fundos de endowment,


quando o doador bloqueia uma parte do seu patrimônio
para gerar rendimentos que mantém os CE, uma prática
comum nos Estados Unidos.

• As atividades práticas externas mais realizadas pelos CE


eram seminários e workshops, palestrantes convidados,
busca de doações e patrocínios, programas executivos,
eleição do empreendedor do ano, incubadoras de alta tec-
nologia, programas de family business e o programa Fast
Trac da Kauffmann.

• Das atividades práticas internas, as que se destacaram


foram: competições de planos de negócios, programas
de estágio, clubes de estudantes, transferência de tec-
nologia, ensino à distância, fundos de venture capital e
jornais internos.

• Os indicadores de desempenho mais utilizados pelos CE


eram (em ordem de importância): Número de alunos nos
programas, recursos financeiros, reconhecimento, avalia-

154
ções dos alunos, número de alunos formados, número de
startups, produção acadêmica, serviços à comunidade e
programas executivos.

Finkle et al (2012) atualizaram o estudo em 2012 e levan-


taram o tamanho médio do orçamento dos CE: US$ 516 mil.
Os parâmetros usados por Finkle et al (2006, 2012) serviram
como base para este estudo, de forma a propiciar uma análise
comparativa entre os estudos. Este e outros aspectos da meto-
dologia adotada estão descritos no capítulo a seguir.

Aspectos metodológicos

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


O levantamento dos dados se deu por meio de questioná-
rios, entrevistas e busca de informações adicionais nas páginas
de internet dos CE em universidades. Os contatos foram obti-
dos por meio de redes de relacionamento, contatos pessoais,
mecanismos de busca na internet, folders e prospectos, ran-
kings de universidades, bases de dados de cadastro de Insti-
tuições de Ensino Superior, associações de classe, entidades
educacionais, Sebrae, sindicatos etc. Foram enviadas mensa-
gens eletrônicas a reitores e administradores escolares. O Qua-
dro 1 resume em números parte desse processo:

Quadro 1 – Coleta de dados por meio de


questionários e entrevistas (elaborado pelo autor)

Número de Instituições de Ensino Superior identificadas 1.603

Quantidade de questionários enviados 376

Quantidade de respostas recebidas 182

Quantidade de questionários respondidos 33

155
% de respostas válidas (+ da metade das questões 94%
respondidas)

Contatos telefônicos 43

Entrevistas realizadas (telefone + pessoal) 38

Além dos dados quantitativos, entrevistas pessoais foram


conduzidas com diretores de CE. Nessas entrevistas foi possí-
vel conhecer detalhes sobre as iniciativas das IES pesquisadas,
seu escopo de atuação, os principais resultados e conquistas
obtidas assim como planos para o futuro. Acreditamos que
nenhuma instituição deixou de ser consultada e que onde ha-
via algum CE ou similar, nós conseguimos identificá-lo. Assim,
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

consideramos que os 33 respondentes do questionário repre-


sentam a totalidade dos CE instalados no país, ainda que não
todos formalmente e muitos com outros nomes.

Análise dos resultados

Natureza das atividades: Os CE não são apenas de es-


colas de negócios, embora representem a maioria. Existem uni-
versidades com mais de um CE e iniciativas informais de estu-
dantes. Metade dos CE está em instituições públicas e a outra
metade, nas privadas. 72% dos CE pertencem a universidades,
20% pertencem às faculdades e as demais a centros universi-
tários. Os CE pesquisados procuram equilibrar suas atividades
entre ensino, pesquisa e prática, mas a ênfase acaba sendo
no ensino, o que explica também porque menos de 15% do
seu tempo é alocado para serviços direcionados à comunidade
local, conforme mostra o Gráfico 1.

156
Gráfico 1 – Distribuição das atividades do CE
(elaborado pelo autor)

11%

Ensino
31%
14% Pesquisa
Prática
20% Consultoria
24% Outros

Funcionários: Os CE têm apenas seis funcionários em

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


média, sendo três deles professores. O número médio de alu-
nos que atuam nos CE por meio de voluntariado é 1,6. Os pro-
fessores são, primordialmente doutores, como mostra o Gráfi-
co 2, a seguir:

Gráfico 2 – Formação acadêmica do corpo docente


(elaborado pelo autor)

9%
10%
Doutores
Mestres
23% 58% Especialistas
Graduação

A maioria dos professores se dedica à pesquisa e ensi-


no: 64% do corpo docente dá aulas na graduação, metade
dá aulas na pós-graduação, 64% dão aulas em programas de
mestrado e doutorado e 32% dão aulas em cursos executi-
vos de curta duração. Essa proporção ganha mais importância

157
diante do fato de que nenhuma dessas IES possui programa
de mestrado ou doutorado em empreendedorismo, indicando
que uma boa parte dos professores dos CE não se dedica ao
empreendedorismo e sim a áreas correlatas, seja no campo da
Administração ou de Tecnologia e Ciência.

Ensino: Vem crescendo a conscientização do ensino de


empreendedorismo por parte das IES. Apesar da média ge-
ral ser de apenas duas disciplinas relacionadas com o tema
empreendedorismo na graduação e menos do que uma na
pós-graduação (a maioria não oferece nenhuma disciplina),
a média de alunos por curso é de 200 na graduação e 100
na pós-graduação. Essas disciplinas são oferecidas como
matérias obrigatórias de um tronco comum da grade, o que
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

justifica o alto quorum nessas disciplinas. Embora a ativi-


dade principal no ensino de empreendedorismo aconteça
nos programas curriculares das universidades, os CE têm
pouca influência sobre as disciplinas, pois a metodologia e
conteúdo estão sob as regras da coordenação do curso e do
professor. Os professores de empreendedorismo ligados aos
CE recebem apoio, orientação e materiais de ensino para
melhorar as experiências dos alunos nos cursos relaciona-
dos com empreendedorismo.

Atividades práticas: As atividades mais comuns realiza-


das pelos CE estão demonstradas, a seguir (em ordem de fre-
quência):

• Seminários e workshops

• Palestrantes convidados

• Competições de planos de negócios

• Oportunidades de estágio em pequenas empresas

• Mentoria e aconselhamento para alunos que vão empreender

158
• Feiras de negócios

• Incubadoras

• Educação executiva

Pesquisa acadêmica: A produção acadêmica de rele-


vância não passa de meio artigo em periódico internacional
em média, por ano. Em periódicos nacionais, não chega a
dois artigos por ano. Dezesseis das instituições pesquisadas
não publicam sequer um artigo por ano, sendo que dessas,
metade são universidades, ou seja, com obrigação de ter
publicação acadêmica. Considerando o número de doutores
na direção dos CE e da qualificação acadêmica do corpo
docente, é de se admirar a baixa produção. A publicação

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


de artigos em anais de congresso é um pouco melhor, 2,44
artigos por CE.

Verificamos uma relação direta do investimento do CE em


pesquisa. Os CE que dedicam no mínimo 30% do seu orça-
mento para pesquisa tem como resultado 77% do total das
publicações científicas, enquanto os demais CE que dedicam
menos de 30% do orçamento para pesquisa gerou 23% da
produção científica da amostra. A produção acadêmica é de
1,29 artigo por professor.

Orçamento: Dos CE que declararam o orçamento, 40%


não possuem nenhuma verba para conduzir suas ativida-
des. Dos CE que declararam o orçamento, a média ficou em
R$ 403 mil/ano, variando de R$ 250 até R$ 1.100 mil. A
maior parte do orçamento vem da própria universidade, res-
ponsável, em média, por 64% do orçamento do CE. Apenas
11% do total dos orçamentos dos CE vêm de fomento públi-
co e receita de prestação de serviços. O Gráfico 3, a seguir,
demonstra essa distribuição.

159
Gráfico 3 – Origem dos recursos dos CEs
(elaborado pelo autor)

6%
5%
Da Instituição
Doações
13%
Projetos
12% 64% Fundos públicos
Receitas
Outras fontes

A distribuição do uso do orçamento está demonstrado no Grá-


fico 4, a seguir:
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

Gráfico 4 – Distribuição do orçamento


(elaborado pelo autor)

9%
Salários
6%
Terceiros
39% Competições
24% Despesas adm
Eventos
Viagens
10% 9% Projetos especiais
3%

O maior peso do orçamento dos CE é no pagamento dos


salários dos funcionários, apesar de muitos funcionários serem
remunerados pela universidade e não pelo CE. Das oito institui-
ções que declararam seu orçamento para salários, verificamos
o salário líquido mensal por funcionário (considerando encargos
e benefícios de 40%) e chegamos ao valor de R$ 4.674, o que,
aparentemente, é suficiente para remunerar um diretor e alguns
auxiliares. No entanto, seis dessas instituições declararam salário
médio abaixo de R$ 2.500, que é insuficiente para remunerar
o diretor e mais três auxiliares (a média de funcionários dessas

160
instituições é quatro). Uma possível explicação que merece ser
investigada é que pelo menos parte da remuneração do diretor,
vem do seu próprio departamento na universidade e não do CE.

Mentoria: Os CE atendem uma média de 45 alunos, mas


o desvio padrão é muito alto (65,25), variando de mais de 500
a dois alunos em algumas instituições. A atividade de mentoria
é feita por professores diretamente aos alunos, de forma não
controlada pelo CE. O número médio de empresas incubadas
nos CE é de 12,3 empresas.

Realização de eventos: A média de eventos realizados


pelos CE é de 25,6, mais uma evidência do crescente domí-
nio do tema empreendedorismo nas discussões de negócios

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


no Brasil. No entanto, esse fato não se reflete ainda no fatura-
mento dos cursos de extensão ou especialização de curta du-
ração sobre empreendedorismo oferecidos pelos CE, também
chamados de educação executiva, pois a média de alunos por
curso foi de 28 participantes. Miller e Melhado (2012) também
contribuem para essa conclusão ao constatarem que apenas
23,9% das instituições pesquisadas oferecem algum curso de
educação executiva em empreendedorismo.

Principais preocupações dos diretores dos CE: As


três maiores preocupações dos diretores dos CE são recursos
financeiros (12% dos respondentes declararam ser a principal
preocupação), envolvimento dos professores (12%) e a disse-
minação do conceito de empreendedorismo (10%). Verificamos
que há uma grande preocupação em reposicionar o tema em-
preendedorismo na instituição, que já passou da fase de inser-
ção por meio de disciplinas na grade, para um viés de formação
profissional como opção de carreira para o egresso. O diretor
ainda está preocupado com o estabelecimento de uma estrutu-
ra básica de funcionamento, sendo que, em várias situações, o
CE não existe formalmente ou sequer possui uma sala própria.

161
Considerações finais

Não há dúvidas que os CE têm um papel fundamental no


desenvolvimento da atividade empreendedora. Apesar de ver-
mos em alguns CE bons exemplos de iniciativas isoladas de
desenvolvimento das competências empreendedoras fora de
sala de aula, o foco ainda está na melhoria da qualidade do
ensino, em termos de conteúdo e oferta nas IES.

Embora esteja crescendo, a produção acadêmica brasilei-


ra em empreendedorismo ainda está muito distante dos demais
países do primeiro mundo. O potencial de estudos nesse campo
deve servir de estímulo para que as IES privadas se interessem
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

em fomentar essa atividade junto ao seu corpo docente, assim


como o crescimento do número de periódicos acadêmicos so-
bre empreendedorismo e pequenas empresas no mundo, não
só para melhorar e aumentar a publicação acadêmica brasileira,
mas acima de tudo, aproximar a IES da comunidade empresarial
e fundamentar as bases da formação empreendedora no pro-
cesso de ensino, com mais uso de teorias e casos brasileiros.

O fato de cursos e disciplinas serem deliberados exclusi-


vamente pelas coordenações acadêmicas e não pelo CE pode
ser uma limitação para a atuação plena na disseminação da
cultura empreendedora na IES. A atuação do CE nesse campo
deve se dar menos pela inter-relação com o coordenador aca-
dêmico e muito mais no nível direto do professor, sobretudo
quando este é membro do CE. Cabe ao CE trazer ferramentas
úteis para despertar o interesse do docente em adotar novas
ideias na área da pedagogia empreendedora.

O alto número de alunos por disciplina de empreendedoris-


mo é uma boa notícia e demonstra um passo importante na for-
mação de uma cultura empreendedora. Enquanto a estrutura
curricular é engessada e pouco receptiva a mudanças e atuali-

162
zações, os serviços prestados pelos CE dão asas à imaginação
dos seus membros e podem representar, com pouca margem
de dúvida, o principal referencial para eventos de mudança e
geração de cultura e comportamento empreendedor. As diver-
sas possibilidades de atividades podem ser executadas fora de
sala de aula e até mesmo fora da instituição.

Ainda veremos por um bom tempo um foco maior dos


CE em eventos como palestras e rodas de debate, com grau
de execução operacional de baixa complexidade e uma natu-
ral oferta alta de palestrantes que não cobram nada para falar
e aproveitam a oportunidade para divulgar seus negócios ou
massagear seus egos. Essa proporção mudará no futuro, não
em função do menor número de eventos, mas pelo aumento da

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


ênfase em outras atividades de maior valor agregado voltado
para um público cada vez melhor formado e mais exigente.

Não existe ainda no Brasil uma cultura de doação de recur-


sos financeiros para projetos de educação. O crescimento do
público interessado em empreender pode indicar um possível
crescimento potencial de oferta de cursos e serviços de con-
sultoria como fonte de receita, evidenciando a necessidade de
divulgar mais as atividades e realizações do CE.

A baixa remuneração da equipe do CE pode representar


um problema para atrair bons talentos. Como o principal com-
ponente do orçamento é o salário e a maior fonte é a própria
instituição, é de se esperar que os salários tenham paridade
com os demais funcionários da instituição. Embora o tema em-
preendedorismo seja atraente o suficiente para atrair voluntá-
rios, sobretudo entre alunos, é preciso pensar bem em quais
tipos de projetos pode-se contar com esse tipo de ajuda. O
crescimento e visibilidade de um CE não pode ser baseado na
ação exclusiva de voluntários, assim a relevância e impacto de
um CE é diretamente proporcional à sua capacidade de levan-
tar recursos financeiros.

163
Apenas por meio de uma comunidade engajada e auto-
motivada, com uma genuína intenção de compartilhar suas
melhores práticas, dividindo técnicas e ferramentas, dispo-
nibilizando suas experiências de iniciativas inovadoras é que
todos, professores, diretores, instituições, empreendedores,
alunos e governo, poderão construir um futuro no qual a ativi-
dade empreendedora representará o principal caminho para a
transformação e geração de valor para a sociedade.

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Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

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Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

165
Células Empreendedoras:
Transformando o Mundo
por meio de uma
Educação Pautada na
Gestão Colaborativa do
Conhecimento
Genésio Gomes da Cruz Neto39

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Elyzabeth Tscha40

Introdução

A verdadeira tarefa de educar perpassa sempre pela refle-


xão sobre o futuro, o que nos coloca diante de análises sobre
as transformações que vivem as pessoas, empresas e institui-
ções no mundo contemporâneo. Hoje, com o surgimento da
sociedade do conhecimento, temos uma crescente redução
dos postos formais de trabalho e o uso cada vez mais frequen-
te do termo “empregabilidade”, o que normalmente implica ne-
cessidade de atitudes empreendedoras por parte dos indiví-
duos como uma forma de se posicionar no mercado.

Empresas hoje passam a exigir de seus profissionais mais


criatividade, liderança, espírito de equipe, capacidade de au-

39 Doutor em Ciência da Computação com ênfase em Engenharia de Software (UFPE). Professor


de Engenharia da Computação da Escola Politécnica da Universidade de Pernambuco (Poli/
UPE)
40 Doutora em Administração com ênfase em Gestão do Conhecimento (UFPE). Professora de
Empreendedorismo da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE)

167
toaprendizagem, visão de futuro etc. Em paralelo, a sociedade
vivencia uma revolução causada pela internet e suas redes so-
ciais colaborativas: “as novas mídias colaborativas estão per-
mitindo o surgimento de ações conjuntas de mudança social;
estamos em uma nova era de generosidade e criatividade cole-
tiva” (GIARDELLI, 2010).

Identifica-se assim a necessidade de um profissional desti-


nado a atuar como agente de mudanças e parceiro de criação
coletiva de novas possibilidades. Um profissional que transforme
conhecimento em atividade econômica e promova o desenvolvi-
mento impulsionado pelo desejo empreendedor. De acordo com
Mintzberg (2006), ao empreender o homem modifica a realidade
para obter a autorrealização e oferecer valores à coletividade.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

No entanto, diversas habilidades e competências hoje exi-


gidas para o profissional ter uma carreira de sucesso na socie-
dade do conhecimento não são ensinadas nas instituições de
ensino. A maioria adota modelos de ensino onde ‘tudo é dado
de bandeja’ ao aluno. Práticas educacionais criadas para a era
industrial que não contribuem na formação de jovens autôno-
mos, e que ratifica a formação de ‘empregados’ (escravos das
ideias dos outros). Existe uma latente falta de ambientes de
apoio à inovação, com as faculdades pouco interagindo com
as empresas locais e o mercado (SANTOS, 2010). Os resulta-
dos são muitos alunos desistindo dos cursos, desconhecendo
o contexto social onde estão inseridos, não possuindo defini-
ções claras de vocação profissional, e/ou simplesmente dei-
xando de viver de suas próprias ideias.

Células Empreendedoras [www.facebook.com/celula-


sempreendedoras] constitui um contraponto nessa perspec-
tiva. Caracteriza-se por um programa de extensão coletivo
no qual participam grupos de alunos, professores e profis-
sionais de diversas áreas do conhecimento que por meio de
ferramentas sociais e um ecossistema de ações de fomento à

168
criatividade e à inovação; desenvolvem empreendimentos co-
laborativos que visam firmar a ação empreendedora enquanto
meio de vida sustentável (CRUZ NETO, 2009; CRUZ NETO,
2010; CRUZ NETO et al, 2012).

A educação empreendedora aqui não é vista como uma


disciplina isolada, e sim como um conjunto de ações onde os
alunos são orientados a expandir suas próprias ideias des-
de os primeiros períodos da graduação. Objetiva-se assim,
criar um meio que se visualize e se viabilize as possibilidades
de empreender: ideias, sonhos, vidas, carreiras, sempre de
maneira colaborativa numa relação que visa promover o de-
senvolvimento de todos que são parte da rede Células Em-
preendedoras (alunos, professores, empresários, gestores

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


de ensino,..).

O programa envolve ações de pesquisa e extensão nas


áreas de Empreendedorismo, Economia Criativa e Inovação
na Educação. Já conta com cerca de 20 mentores e mais de
50 células espalhadas por seis instituições de Ensino Supe-
rior em Pernambuco (e uma na Paraíba). Em 2012, ganhou
o Prêmio educação empreendedora Brasil 2012 Endeavor /
Sebrae e o Prêmio Santander Universidades Empreendedo-
rismo (categoria Economia Criativa, por meio de projeto da
Célula Playful).

O presente artigo apresenta em primeira mão uma descri-


ção dos seus princípios norteadores e instrumentos educacio-
nais com base nas práticas usadas que evoluíram ao longo dos
anos. Mas antes disso, e não menos importante, o mesmo faz
um registro de sua história, relatando pela primeira vez publica-
mente seu processo evolutivo. O artigo termina com algumas
considerações finais e visões de futuro.

169
História e resultados

O Células Empreendedoras surgiu em 2008, no curso de


Sistemas de Informação da Faculdade Integrada do Recife – FIR/
Estácio (CRUZ NETO, 2009), por meio das iniciativas do pro-
fessor Genésio Gomes (fundador do mesmo), que como coor-
denador do curso, recém-empossados no cargo, presenciava
alunos exigindo um maior dinamismo, inovação e integração
com mercado de trabalho. Tal relação foi estabelecida a partir
da tentativa de desenvolver um projeto de curso que articulasse
uma formação mais participativa, voltada para práticas sociocul-
turais de aprendizagem (REGO 2007), contextualizada com as
necessidades demandadas pelos principais interessados, “Alu-
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

nos e Mercado”. Foi assim, que o professor incentivou a criação


de células acadêmicas, a partir da sugestão dos alunos.

O sucesso dos alunos foi imediato e, consequentemente,


outros cursos da FIR/Estácio, bem como outras faculdades de
Pernambuco, vieram a criar células acadêmicas com esse perfil
“empreendedor”. Em 2010, o projeto tornou-se então multi-ins-
titucional e passou a se chamar de Células Empreendedoras
com várias inovações incorporadas.

Atualmente há dezenas de células empreendedoras espalha-


das em seis instituições de ensino de Pernambuco. O projeto já
engloba células em cidades como Recife, Caruaru, Jaboatão, Es-
cada, Garanhuns e Mamanguape (Paraíba). Temos cerca de 200
jovens ativos. Juntos, só em 2012, foram mais de 10.000 pessoas
beneficiadas por ações geradas por líderes de células, incluindo
apenas nesse contexto palestras, grupos de estudos, eventos e
cursos oferecidos. O Congresso Pernambucano de Empreende-
dorismo – CPEJE (www.cpeje.com.br), por exemplo, é hoje um
dos melhores eventos do Norte-Nordeste e foi idealizado por Mar-
cos Rodrigues, ainda na época em que o mesmo capitaneava uma
célula empreendedora, denominada Manual do Herói.

170
Gustavo Távora
Com o sucesso das primeiras células, o projeto passou
a ganhar expansão para outras instituições de ensino, e acu-

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


mular prêmios em empreendedorismo e inovação na edu-
cação. Em 2009, ganhou o Prêmio Amadeus Partner Gold
do CIN/UFPE pelas extensões realizadas no ambiente Ama-
deus (www.amadeus.cin.ufpe.br), principal ferramenta open
source de tecnologia educacional da America Latina (www.
softwarepublico.gov.br). Em 2010, conquistou a etapa lo-
cal do Prêmio David Wilson, como melhor projeto de inova-
ção docente da Faculdade dos Guararapes. Em 2011, foi a
vez do professor Genésio Gomes receber também o prêmio
de Destaque Extensão da Poli/UPE, pelas ações do proje-
to Células Empreendedoras. Ano passado (2012), vieram os
prêmios nacionais: Prêmio Educação Empreendedora Brasil
2012 Endeavor / Sebrae (Categoria Melhor Compromisso)
e Prêmio Santander Universidades (projeto Gigamigos da
célula Playful de Economia Criativa).

A título de ilustração do potencial alcançado pelo projeto,


seguem referências de células empreendedoras de sucesso
em 2012, cujos resultados práticos tiveram ampla repercussão
e reconhecimento fora do ambiente acadêmico:

• Célula Playful (www.playful.com.br): Startup de games,

171
3ª melhor colocada na regional nordeste no Desafio Bra-
sil 2012 (www.desafiobr.com.br); Prêmio Santander Uni-
versidades Empreendedorismo 2012, com projeto GIGA-
MIGOS na categoria Economia Criativa.

• Célula Ebonito (http://ebonito.org): Rede de aprendizagem


e inclusão sóciodigital. Realiza capacitações em alunos de
escolas públicas da cidade de Bonito. Convidada para a
Ecofliporto (www.fliporto.net/fliporto2012) como uma das
ações educacionais mais inovadoras de Pernambuco.

• Célula Empreender Comunidades (www.empreenderco-


munidade.com.br): Programa que visa fomentar o em-
preendedorismo comunitário por meio das associações
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

de bairros, promovendo a autodescoberta de suas po-


tencialidades e talentos individuais e coletivas, que pos-
sam ser transformadas em um negócio autossustentável.
Prêmio Inteligência Empresarial 2010, concedido pelo
Diário de Pernambuco.

Princípios norteadores

O projeto foi evoluindo ao longo dos anos com base em


alguns princípios que retratam suas características de ser par-
ticipativo, dialógico, primar pelo autodesenvolvimento das pes-
soas, valorizar as lideranças, encorajar autonomia e o espírito
empreendedor, ser colaborativo e fazer uso de ferramentas/
mídias sociais como um instrumento de articulação e execu-
ção de empreendimentos colaborativos. Compartilhar essas
premissas possibilitou investir na realização colaborativa dos
sonhos de cada participante.

Uma Célula Empreendedora é, por definição, um grupo de


jovens, orientado (ou não) por professores, que por meio de mí-
dias sociais e um ecossistema de ações de fomento à criativi-

172
dade são encorajados(as) a terem mais autonomia e um espírito
empreendedor em parceria com empresas e incubadoras (CRUZ
NETO 2009; CRUZ NETO 2010; CRUZ NETO et al, 2012). Usual-
mente uma célula empreendedora transforma-se em uma em-
presa ou startup, se envolve em transformações de cunho social,
além de gerar profissionais de alta competência para o mercado
cada vez mais carente de pessoas com um perfil inovador. Para
mais informações sobre a estrutura e funcionamento de uma cé-
lula empreendedora, leia (CRUZ NETO et al, 2012)

Dado que exista uma comunidade de células de diversos


tipos e propósitos, a missão do projeto ou da rede Células
Empreendedoras é fomentar ações que promovam a cola-
boração entre células, mentores e empresas, sedimentando

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


assim a base para uma gestão de conhecimento da rede.
Nessa perspectiva, foram sendo estruturados ao longo dos
anos alguns princípios norteadores, aqui descritos em pri-
meira mão: Sentido do Ser, Visão Social, Visão da Co-
letividade, Espírito Empreendedor, Ação Dialógica, e
Ecologização dos Saberes.

Para o entendimento de cada princípio estabelecemos per-


guntas-chaves que definem uma premissa para que os partici-
pantes possam adquirir a competência necessária a partir de
reflexões práticas. Segue uma explicação dos princípios, sem-
pre iniciando com a premissa/pergunta associada:

• Sentido do Ser: “O que lhe traz brilho nos olhos?”

Pergunta clássica em palestras e encontros do Células Em-


preendedoras. Conecta os colaboradores com seu sentido
de existência, a sua missão. O fator de sucesso da maioria
dos projetos está na persistência dos envolvidos, visto que
os mesmos passam a fazer parte de sua própria existência.
Ideias surgidas por indivíduos que seguem essa premissa
tendem a ser mais originais e inovadoras, além de tornar

173
a pessoa feliz e satisfeita mesmo com os resultados não
acontecendo no tempo esperado. A pessoa está estudan-
do e trabalhando no que mais gosta de fazer.

Gustavo Távora
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

• Social: “Vivemos numa sociedade doente ou saudável?


como podemos mudar isto?”

Envolve a compreensão e o posicionamento do ser em re-


lação a questões sociais. Trabalha o ser como um agente
crítico, que reconhece o poder de fazer, criar e transformar
como próprio dos homens (FREIRE, 2003). Nesse sentido,
se coloca como um agente transformador de realidades
(como solucionar problemas que afligem a sociedade) por
meio dos empreendimentos que desenvolve. Aprende a ver
os problemas sociais como oportunidades.

• Coletividade: “Como construir projetos a partir da colabo-


ração de várias células?”

Como no corpo humano, acreditamos que a união de cé-


lulas pode fazer surgir algo maior e mais inovador do que
as células individualmente poderiam imaginar. A origem do
nome Células Empreendedoras vem desse princípio de raí-
zes biológicas. Assim, prima-se por ações colaborativas ou

174
conjuntas entre agentes ligados entre si por serem parte da
rede de células. Esses atores trabalham de forma colabora-
tiva em redes e interligados por laços sociais estabelecidos
por diferentes motivos, que não são [e nem devem ser]
unicamente financeiros.

• Espírito empreendedor: “Como empreender um meio de


vida sustentável para as suas próprias ideias ?”

A ação de empreender está relacionada ao ato de desenvolver


a capacidade de sonhar e de realizar esse sonho. O sonho
mencionado é aquele que se sonha acordado, que tem a ca-
pacidade de gerar autorrealização e representar um projeto de
vida (DOLABELA, 2003). Todo profissional precisa dominar as

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


ferramentas, métodos e aptidões necessárias para “vender seu
peixe”, ou seja, buscar de forma autônoma os recursos neces-
sários para tornar suas ideias sustentáveis a longo prazo.

• Ação dialógica: “Você se vê igual nas relações entre célu-


las, valorizando e prestando atenção nas ideias dos outros?”

O empreendedor necessita ser ouvido, ser olhado, que


prestem atenção na ideia dele. Mas para isso, ele precisa
primeiro aprender a valorizar e prestar atenção no que bri-
lha os olhos dos outros empreendedores. É uma premissa
baseada em uma relação horizontal e dialógica. Horizontal,
porque se coloca na condição de igual nas relações so-
ciais com os outros. É dialógico, pois se crê que só por
meio do diálogo, ou seja, do experenciar o diálogo que se
aprende ensinando e ensina-se aprendendo, pois o sujeito
dialógico crê na humanidade, é crítico, reconhece o poder
de fazer, criar e transformar como próprio dos homens e
isso pode se dar em comunhão. Ser dialógico é empenhar-
se na transformação constante da realidade, por meio do
conhecimento; e o conhecimento é tarefa de sujeitos e não
de objetos (FREIRE, 2003).

175
• Ecologização do saber: “Como integrar diversos saberes
para gerar inovação nos empreendimentos que desenvolvo?”

Envolve o compartilhamento como ecodiálogo (TSCHA,


2011), ou seja, os atores durante a comunicação/com-
partilhamento de saberes, comunicam, criam e renovam
seus conhecimentos por meio de uma pedagogia dialó-
gica com sujeitos que possuem diferentes saberes. Toda
inovação para nós é inerentemente colaborativa e multi-
disciplinar. Muitos cursos de graduação, na nossa visão,
falham por simplesmente não propiciar a experiência de
troca e geração de ideias entre pessoas de várias áreas
do conhecimento.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

Instrumentalização:
ecossistema libertador

Como forma de instrumentalizar ações educacionais que


apliquem os princípios norteadores descritos, é criado um
ecossistema educacional de apoio às células empreendedoras
nas diversas instituições conveniadas. Tal ecossistema é usual-
mente formado por ações (abaixo relacionadas) de incentivo ao
empreendedorismo e autonomia dos jovens.

1) Cadastro de Células Empreendedoras – um setor da


universidade responsável, podendo ser uma empresa júnior
ou departamento de extensão, fica responsável pelo cadas-
tro de novas células empreendedoras. Por meio desse ca-
dastro, as células empreendedoras de alunos e professores
poderão ser oficialmente registradas no portal do Células
Empreendedoras, além de permitir que os integrantes (e
professor orientador) tenham um certificado de participação
dado pela instituição.

176
2) Portal Colaborativo e Ferramentas de Mídias So-
ciais – células cadastradas são aptas a usar ferramentas
colaborativas para potencialização da gestão do conhe-
cimento da rede. Tais ferramentas hoje são um portal
institucional (que está sendo reformulado – www.celu-
lasempreendedoras.com.br) para cadastro das células,
o Facebook (www.facebook.com/celulasempreendedo-
ras) para divulgação das ações realizadas, e um espa-
ço colaborativo (AVE – Ambiente Virtual de Ensino) na
Redu (Rede Social Educacional – www.redu.com.br) para
aprendizagem colaborativa.

3) Quinta das Ideias – Promoção de eventos regulares com


palestras e dinâmicas inovadoras para a expansividade das

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


ideias dos participantes. Eventos necessários para se man-
ter a motivação dos alunos durante todo o ano letivo.

4) Palestras, Participação em Feiras e Eventos – Reali-


zação de palestras de disseminação do projeto dadas por
alunos e mentores mais experientes da rede. Comumen-
te também somos convidados para participar de feiras e
eventos de empreendedorismo, sendo esse convite uma
oportunidade para as células apresentarem suas ideias.

5) Mentorias com Base em Agenda de Oportunidades –


Encontros de mentoria focados em editais de fomento, de-
safios, premiações e rodadas de negócio. Uma agenda de
oportunidades é oferecida/divulgada aos alunos/professo-
res, informando mensalmente editais, subsídios e prêmios
nas linhas de empreendedorismo, inovação e economia
criativa. Sessões de mentoria são organizadas com base
nas oportunidades divulgadas.

6) Prêmio de Inovação – Processo seletivo de inovações


com apresentação das mesmas dentro do evento de em-
preendedorismo da instituição. As melhores ideias ganham
prêmios em forma de benefícios que auxiliem o empreendi-

177
mento das mesmas. Na Poli/UPE, por exemplo, esse pro-
cesso chama-se Polinovação.

7) Espaço Criativo: Sala para orientações, reuniões, encon-


tro de estudantes e criação colaborativa de novas ideias.
Uma sala fixa (ou horários que possam ser usados de uma
determinada sala ou laboratório) que sirva de ponto de refe-
rência para alunos e professores do projeto. O ideal seria o
ambiente ser decorado para melhor despertar a criatividade
dos que estiverem presentes no espaço.

8) Comitê Mobilizador: Composto por professores e líderes


de células mais experientes que atuam em colegiado para
definir as estratégias e ações institucionais do projeto na
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

instituição. Gestão e mobilização dos itens acima descritos.

Cadastro de Células: As células devem ser cadastradas via


formulário com as seguintes informações sendo requeridas:

1. Nome da Célula:

2. Universidade/Curso:

3. Temas Envolvidos:

4. Nome/Tel/Email do(a) Líder

5. Equipe (nome/tel/Email dos colaboradores):

6. Objetivos:

7. Impacto Social:

8. Logo Tipo (imagem):

9. Link (facebook/site/blog):

10. Vídeo-Ideia (opcional): Vídeo no YouTube de 30 segundos a


1minuto sobre a ideia

178
As novas células também são estimuladas a fazer ban-
ners digitais para melhor serem divulgadas em rede social.
Deve ser avaliada a natureza do projeto para que não seja
autorizada a criação de células que denigram a natureza ou
o ser humano.

Além das ações “tradicionais” anteriormente divulgadas,


em 2013, estamos inovando e procurando alcançar os seguin-
tes novos objetivos:

A) Realizar intercâmbio com a Babson College (www.babson.


edu), classificada como a melhor escola de empreendedo-
rismo do mundo, com o objetivo de obter formações em

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


educação empreendedora e empreendedorismo. Uma re-
compensa pelo prêmio Santander Universidades (1º Se-
mestre de 2013).

B) Lançar novo portal para o Células Empreendedoras, de


modo a ampliar a conexão entre nossos mentores, células
e parceiros, promovendo uma melhor gestão do conheci-
mento da rede (1º Semestre de 2013).

C) Ministrar curso de formação para nossos colaboradores


(células e mentores) em parceria com a Endeavor Brasil
(www.endeavor.org.br). A ideia é aliar conteúdo provindo da
Rede Células, com o Curso Bota Pra Fazer (www.botapra-
fazer.org.br) da Endeavor (2º Semestre de 2013)

Em todas as ações mencionadas do ecossistema, preza-


mos por reforçar os princípios norteadores. Assim, todos os
instrumentos citados atuam como pontos de fortalecimento do
projeto em todos os seus pilares.

179
Considerações finais

Diante do caso descrito, neste estudo, podemos afirmar


que o Células Empreendedoras é um movimento contra-he-
gemônico, que busca novas formas de ensinar e desenvolver
o empreendedorismo no contexto universitário. O projeto é
uma construção coletiva, pautado em uma educação liberta-
dora, devendo ser compreendido como um processo e, por
isso, não finalizado.

Suas ações constituem um empreendimento social que


impulsionam movimentos coletivos na região em prol do forta-
lecimento dos laços sociais e do desenvolvimento de todos os
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

envolvidos. As ações são calcadas em uma nova sociabilidade


sedimentada no Sentido do Ser, na Visão Social, na Visão da
Coletividade, no Espírito Empreendedor, na Ação Dialógica, e
na Ecologização dos Saberes de todos os envolvidos.

As experiências, vivenciadas têm contribuído para a forma-


ção de estudantes de diversos cursos, permitindo aos futuros
profissionais dispor de um ambiente real como laboratório e fer-
ramentas facilitadoras para novas possibilidades de realização
colaborativa de sonhos profissionais. Além disso, as ações do
projeto colaboram para geração de conhecimentos sobre for-
mas e práticas de empreender sonhos. Todos os conhecimen-
tos gerados como resultados do projeto retornam a sociedade
por meio de um conhecimento disponível e totalmente passível
de ser replicado em outros ambientes e situações. Salienta-se
que a contribuição mais salutar nesse processo é a de pro-
porcionar a todos os envolvidos o encontro consigo mesmo.
A questão primordial consiste em dar condições para que as
pessoas possam viver do que lhe traz brilho nos olhos de forma
digna, autônoma, assegurando sua própria identidade e con-
quistando sua sustentabilidade.

180
Diante disso, essa iniciativa pode servir de exemplo para
outras instituições (incluindo escolas) que queiram desenvolver
a capacidade de sonhar e de realizar esse sonho de forma cola-
borativa. Também entendemos que o ecossistema fomentado
pode ter a participação de pequenas empresas da região como
forma delas adquirirem competências em empreendedorismo,
ou ser implantado em grandes empresas que buscam criar nú-
cleos internos de inovação e criatividade.

Gustavo Távora

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Referências bibliográficas

CRUZ NETO. Tecnologia da informação gerando novas


oportunidades. Revista FERA. Página 28. Ago/2009.

CRUZ NETO. Células empreendedoras. Escritório de Direi-


tos Autorais. Fundação Biblioteca Nacional. No do Registro:
504.142, Livro: 954, Folha: 368, 2010.

CRUZ NETO, G. G; MIRANDA, A. L.; TÁVORA, G.; LUZITANA,


M.; FERREIRA, L. Células Empreendedoras de Engenharia.
COBENGE 2012.

181
DOLABELA, F. Oficina do empreendedor. São Paulo: Cultu-
ra, 1999.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido, São Paulo: Paz e Terra,


36ª edição, 2003.

GIARDELLI, G. A era da generosidade e criatividade cole-


tiva. HSM online (www.gilgiardelli.com.br), 2010.

MINTZBERG, H. Mba? Não Obrigado. ARTMED – BOOKMAN,


2005.

REGO, T. C. Vygotsky – Uma perspectiva histórico-Cultural


da educação. Petrópolis: Vozes, 2007.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

SANTOS, M.L.C. Inovação Pedagógica e sustentabilidade


no ensino superior: um estudo de caso do programa de
fortalecimento acadêmico da Universidade de Pernambu-
co. Tese de Mestrado. Mestrado em Gestão do Desenvolvimen-
to Local Sustentável, FCAP/Universidade de Pernambuco, 2010.

TSCHÁ, E. R. Paradigmas do Conhecimento e Comparti-


lhamento do Conhecimento: Um Olhar a Partir da Moda-
lidade de Ação Extensionista do Projeto “O Imaginário”
– UFPE / Recife: 2011.

182
Educação Empreendedora
em Solo Potiguar: Um
Novo Caminho para o
Ensino Público
Antonio Carlos Teixeira Liberato41

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


O século XXI representa um acontecimento mítico para to-
dos os que nasceram na segunda metade do século anterior.
Tempo de profundas mudanças, mediadas pela cultura tecno-
lógica e informacional que gradualmente age no cotidiano das
pessoas, transformando as suas formas de se comunicar, pen-
sar, agir e sentir.

Em educação vivemos um momento dual. De um lado,


convive-se com novos valores, sobretudo pela popularização
da internet e do outro, uma escola com valores e métodos do
passado, seletiva, que não abriga adequadamente as diferen-
ças. Convivemos com uma escola que não é para todos, e que
apesar dos avanços, ainda não foi feita a ruptura radical.

A organização escolar/curricular praticada hoje, ainda que


forte no nosso imaginário, já que nos formamos sobre ela, cor-
respondeu às necessidades de um momento histórico, hoje já
não o faz mais. Não obstante, problemas recrudescidos – a
exemplo da extrema desigualdade que preside as relações so-

41 Doutorando em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Gestor
do Projeto Despertar e Gerente de Educação e Empreendedorismo no Sebrae no Rio Grande
do Norte.

183
ciais e as oportunidades educacionais –, tornaram-se crônicos
em países como o Brasil. De um prisma, mudanças significati-
vas, de outro, a história parecendo repetir-se diante de recor-
rentes problemas não resolvidos.

Viver e conviver nessa realidade contraditória, plural e com


uma multiplicidade de visões de mundo, implica uma imediata
crítica à visão de história dominante, introduzindo assim, ele-
mentos significativos na percepção de grandes dilemas que se
refletem no sistema educacional e sobre os modelos que os
fundamentam.

O Sebrae no Rio Grande do Norte (Sebrae RN) em parceria


com o governo do estado, por meio da Secretaria Estadual de
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

Educação, desenvolve há dez anos, o projeto Despertar – Em-


preendedorismo na Escola. Compreendendo que o empreende-
dorismo é um dos caminhos para a transformação econômica e
social, a ideia básica da proposta educacional é fomentar a cultura
empreendedora no ambiente escolar, tendo como público-alvo,
os estudantes do Ensino Médio da rede pública estadual, por ser
esse segmento uma parcela significativa da nossa sociedade, que
está às portas do mercado de trabalho e na maioria das vezes,
sem perspectivas de um futuro profissional muito esperançoso.

A escola em um contexto de
transformações: avanços e dilemas

Há um consenso entre os profissionais da educação, au-


toridades, analistas da cena política e pesquisadores acerca
da necessidade de se realizar profundas transformações nos
sistemas educacionais atuais para fazer frente aos desafios
da sociedade do conhecimento, o que implica trabalhar com
outros referenciais: ‘conectividade’, ‘contextualização’, ‘cola-
boração’, ‘cocriação’, ‘inovação, ‘competências essenciais’,

184
‘aprender a pensar’ e ‘empreendedorismo’ são expressões
que estão na ordem do dia.

Focalizando o empreendedorismo, cabe aqui inicialmen-


te, elucidar que a polissemia envolvendo esse conceito é am-
pla42. Em síntese, empreender pressupõe mudança, inovação,
realização do indivíduo por meio de atitudes de inquietação,
ousadia e pró-atividade na sua relação com o mundo. Um
tipo de comportamento que favorece a interferência criativa e
realizadora no meio, em busca de um crescimento pessoal e
coletivo (Liberato, A. C. T, 2006).

Apesar de configurar-se como um campo promissor de


pesquisa e debate, no pensamento de uma corrente de edu-

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


cadores, o empreendedorismo ainda é atrelado à exploração
capitalista, como remete a proposta neoliberal, ou seja, em vez
de formar pessoas para o mundo, o empreendedorismo sugere
a formação de ‘mão de obra para o mercado’.

Esse receio de preparar “mão de obra para o mercado”


produziu não apenas críticas por parte de alguns estudiosos,
mas um grande receio em admitir que o processo de inserção
na sociedade inclui também o aprendizado de um trabalho e a
inserção econômica. Essa visão neoliberal (e distorcida) distan-
cia-se completamente de uma análise mais aprofundada, refle-
tida sobre os indicadores que se apresentam no contexto da
educação na atualidade.

Ao analisar o Parecer CEB-CNE 5/2011 que trata das Dire-


trizes Curriculares Nacionais (DCN) para o Ensino Médio, iden-
tifica-se significativos avanços na orientação curricular, dentre
eles, a ampliação do currículo numa perspectiva de educação
geral, em contraposição a uma formação específica e fragmen-

42 Existem estudos, representações e visões diferenciadas acerca do conceito de empreende-


dorismo, interpretados sob á luz de diversos autores que mesclam teorias com experiências
práticas.

185
tada. Em síntese, o eixo principal da organização curricular pas-
sa a ser interdisciplinaridade e contextualização43.

No Plano Nacional da Educação (PNE) 2011-202044, ob-


serva-se que as autoridades em nível federal, especialmente o
Ministério da Educação e Cultura (MEC) e a própria sociedade,
têm demonstrado preocupação com o quadro precário em que
se encontra a educação. Uma das prioridades são os jovens
que frequentam o Ensino Médio45, na faixa etária dos 15 aos
17 anos. Os estudos advindos do PNE apontaram que os estu-
dantes dessa faixa etária ainda buscam o Ensino Médio como
forma de estar mais preparados para o mundo do trabalho,
porém essa etapa não está sendo atraente para eles.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

Os indicadores evidenciaram que uma parcela significativa


de jovens matriculados no Ensino Médio abandonam os es-
tudos antes de concluí-lo. Os demais permanecem fora da
escola ou estão em distorção idade/série. A partir dos dados e
das avaliações oficiais, percebe-se que ainda não foi possível
superar a dualidade que tem prevalecido ao longo da história,
tampouco garantir a universalização, a permanência e a apren-
dizagem significativa para a maioria desses sujeitos.

Tais evidências refletem o perfil do novo jovem que chega à


sala de aula, com outros referenciais de vida, estimulados pela
interatividade, cores, sons dos aparelhos celulares, dos games,
dos tablets, especialmente aqueles que estão concluindo o En-
sino Médio, pressionados pelas exigências do mundo do tra-

43 Com a interdisciplinaridade pretende-se que o aluno seja capaz de utilizar os conhecimentos


das várias disciplinas para que possa solucionar problemas concretos ou para compreender
fenômenos, sob vários olhares diferenciados. Assim, é fundamental que o professor lance mão
de conteúdos significativos de forma contextualizada, como meio de articulação entre os sabe-
res constituídos historicamente pela humanidade, a realidade concreta e os novos saberes em
construção.
44 O programa estabeleceu 20 metas a serem alcançadas pelo país até 2020. Cada uma delas é
acompanhada de estratégias para que se atinjam os objetivos delimitados.
45 A meta 3 do PNE estabeleceu a universalização do Ensino Médio até 2020 para estudantes na
faixa etária dos 15 aos 17 anos de idade.

186
balho. Esse novo momento faz com que o papel do professor
passe a ser amplamente debatido e questionado. Exige-se um
profissional que seja capaz de articular os diferentes saberes
escolares à prática social e ao desenvolvimento de competên-
cias para o mundo do trabalho.

As perspectivas teóricas que orientam a formação docen-


te na atualidade, segundo Ramalho, Nuñes e Gaulthier (2002)
enfatizam que não é possível continuar formando especialistas
de perfil estreito, limitado em suas possibilidades profissionais
atuais, no qual se fragmenta e fragiliza a condição do professor
como profissional.

Ou seja, a prática pedagógica não pode mais se restringir à

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


sala de aula; extrapola os muros da escola, trabalha conceitos
sociais, políticos e emancipatórios, envolvendo em termos mais
amplos, os pais, a comunidade escolar e outros atores que in-
serem-se na cena cotidiana e porque não dizer, no cenário mun-
dial? Os conceitos de democracia, sustentabilidade, cidadania e
direitos humanos estão sempre presentes na atuação didática.

Entre os estudiosos que debatem a formação docen-


te, há um consenso geral de que a formação tecnicista e
linear do professor ceda lugar à formação de um educador
articulador de saberes, agente das inovações da sociedade,
animador da inteligência coletiva dos grupos que estão sob
seu encargo e que tenha domínio sobre as tecnologias de
comunicação e informação.

Propõe-se ainda, que as instituições de Ensino Superior


formem educadores com competências para desenvolver nos
seus alunos, habilidades para lidar com as incertezas, com
as inovações tecnológicas, com a diversidade de perspectivas,
para construir, a partir delas, o próprio juízo ou ponto de vista.

Com base nessa breve análise, compreende-se que uma


nova escola precisa ser pensada e construída para enfrentar

187
os desafios do novo milênio, mesmo sendo claro que ela não
existe isoladamente e, certamente, não será somente por meio
dela que se promoverá a transformação da sociedade, uma vez
que já não é a primeira fonte de conhecimento para os alunos
e, às vezes, nem mesmo a principal (POZO e POSTIGO, 2000).

A crítica ao seu desempenho tem se intensificado nos úl-


timos anos, tanto nos países mais ricos como nos países em
desenvolvimento, uma vez que o avanço científico e tecnológi-
co acelerado a tem colocado em descompasso. Ou seja, ainda
não estão sendo formadas pessoas para essa nova Era, ao
tempo que as mudanças ocorrem de forma muito veloz e em
grandes dimensões.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

Da diretriz para o papel, e do papel


para a concretização de um projeto

Em 2002, o Sistema Sebrae concluía um processo de re-


posicionamento institucional ao definir novas diretrizes, dentre
elas, Disseminar a cultura do empreendedorismo e da coope-
ração em todos os níveis da educação formal. Baseado nes-
sa orientação, o público jovem surgiu para o Sistema Sebrae,
como um grande foco e a escola, como um grande meio para
se fazer chegar à mensagem do empreendedorismo.

O Sebrae RN foi um dos pioneiros do Sistema ao colocar


em prática essa diretriz. O sentido de conceber um projeto vol-
tado para estudantes da rede pública, partiu da consciência
dos dirigentes de que privilegiando esse potencial segmento do
universo escolar – porém, historicamente excluído da produção
de bens, serviços e conhecimento –, estaria contribuindo para
a inclusão social e ao mesmo tempo, plantando uma semente
multiplicadora para que num curto espaço de tempo gerasse
bons frutos por meio de uma orientação empreendedora.

188
O projeto foi concebido a partir de um levantamento no
Sistema Sebrae de experiências exitosas em educação em-
preendedora. Pelas similitudes socioeconômicas, culturais e
regionais, o Sebrae RN optou pela metodologia desenvolvida
no Sebrae no Ceará (Sebrae CE), sendo considerado um pro-
jeto de referência no Nordeste em termos da disseminação da
cultura empreendedora no ensino público.

Portanto, três objetivos foram definidos:

• Despertar nos jovens a predisposição para “empreender”;

• Preparar os jovens para vivenciar aspectos da cidadania


enquanto fator de responsabilidade social, contribuindo

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


para uma mudança socioeconômica;

• Contribuir para o desenvolvimento de futuros profissio-


nais, tornando-os mais conscientes do contexto das
novas relações de trabalho, assumindo o papel de em-
preendedores em quaisquer situações que se apresen-
tem em suas vidas.

A base teórico-metodológica do projeto Despertar, esta-


belece uma correspondência entre os quatro pilares da edu-
cação para o século XXI da Unesco (Aprender a Conhecer,
Aprender a Fazer, Aprender a Ser e Aprender a Conviver) com
três correntes pedagógicas consagradas: a cognitivista, a hu-
manista e a sociocrítica.

A teoria cognitivista, também chamada construtivista,


apoia-se no desenvolvimento biológico do sujeito. Seu maior
nome é suíço Jean Piaget (1896-1980), que após longos anos
de pesquisa e observação, chegou à conclusão de que apren-
der, é, sobretudo, descobrir. Assim, o foco da ação educativa
do projeto Despertar passa a ser o aprender, e não no ensi-
nar. Ou seja, aluno é orientado a construir o seu próprio conhe-
cimento, a partir de suas experiências.

189
A teoria humanista, ou não-diretiva, tem suas origens na
filosofia existencialista, e compreende que o ser humano possui
uma capacidade e curiosidade natural de conhecer o mundo.
Seu principal nome, o psicólogo norte-americano Carl Rogers
(1902 – 1987), considera a aprendizagem um processo pes-
soal, que envolve, além da inteligência, os sentimentos.

Baseado nessa premissa rogeriana, o projeto Despertar


busca desenvolver no aluno o senso de iniciativa, a conscienti-
zação de que ele é capaz de assumir responsabilidades, fazer
escolhas inteligentes, adaptar-se a mudanças, agir de forma
criativa e realizar um trabalho cooperativo.

Por fim, a corrente sociocrítica ou sociopolítica, cujo


Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

principal nome é o educador brasileiro Paulo Freire (1921


– 1997), compreende a educação como um processo con-
tínuo de tomada de consciência de si próprio e do mundo.
Para Freire, o homem é o sujeito de sua própria educação,
uma vez que está inserido em um contexto social, político,
econômico e cultural. Fundamentada nessa corrente, a me-
todologia do projeto Despertar, incentiva os educandos a
exercitar o diálogo, a reflexão e a visão crítica da realidade
em que estão inseridos.

Essas três correntes educacionais que compõe a base teó-


rico metodológica do Projeto, articuladas acima de tudo com a
‘vontade de fazer’ das duas instituições, e de um planejamento
participativo entre as equipes envolvidas, contribuíram para os
resultados alcançados até hoje. Ao Sebrae RN cabe a “capaci-
tação empreendedora” dos professores. A Secretaria de Edu-
cação, a escolha das escolas e, especialmente a mobilização
dos educadores, sujeitos determinantes para o êxito das ações
do projeto, pois é a partir deles que a mensagem do empreen-
dedorismo chega ao aluno.

Para aplicar a metodologia, os professores previamente


selecionados pela Secretaria Estadual de Educação passam

190
por um processo de formação coordenado pelo Sebrae RN,
totalizando 60 horas-aula. A capacitação contempla mo-
mentos em sala de aula e fora dela. Os professores são
estimulados a vivenciar o dia a dia de um empreendedor, a
conhecer a realidade do mercado, indo a campo. A partir
daí, passam a refletir acerca das competências empreen-
dedoras, fazendo um paralelo com a realidade do mundo
do trabalho, a realidade do aluno e sua própria realidade
enquanto profissionais.

Durante esse processo formativo, os professores pas-


sam a compreender que educação empreendedora tem um
propósito transformador não só no âmbito de quem a recebe
(o aluno), mas especialmente, por parte de quem a ensina.

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Ou seja, os novos saberes adquiridos a partir dessa capaci-
tação, tornam-se significativos, oportunizando o desenvolvi-
mento de novas competências para ele, enquanto educador
contribuindo assim, para o aperfeiçoamento das práticas
educativas e o (re) pensar da sua identidade profissional46.

É possível implantar a educação


empreendedora na escola pública!

Sim, é possível implantar a educação empreendedora na


escola pública. O projeto Despertar – Empreendedorismo na
Escola, que ora vem se desenvolvendo em 148 escolas públi-
cas do Rio Grande do Norte é uma realidade, e consolida-se

46 De acordo com Lasky (2005), a identidade profissional é a forma como os professores definem a
si mesmo e aos outros. Inclui o compromisso pessoal, a predisposição para aprender e ensinar,
as crenças e valores, o conhecimento sobre a matéria, assim como o ensino e as experiências
passadas.

191
com resultados marcantes na vida de alunos e professores47.
Nesses dez anos de gestão, conclui-se que para manter a
chama do empreendedorismo e a motivação permanente dos
docentes junto aos alunos, muito mais importante do que estí-
mulos financeiros48 – estar lado a lado –, junto com eles, é fator
determinante para a geração de resultados.

Durante o processo de aplicação da metodologia, é fun-


damental o apoio, o acompanhamento do processo e, ao
mesmo tempo, instigá-los a ter uma visão ousada, propor-
cionando estímulos diferenciados, tais como oficinas, cursos
complementares, contatos com empreendedores e tantas
outras atividades que tenham um viés com a temática do
empreendedorismo. Tudo isso implica ‘mediação’ por meio
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

de uma relação dialógica e reflexiva no sentido de aproximá-


-los cada vez mais dos novos contextos da atualidade.

Convém ressaltar que essa “reflexividade” é essencial à for-


mação do professor sob a perspectiva da educação empreen-
dedora, uma vez que é por meio da reflexão sob a sua própria
prática, articulada com os preceitos do empreendedorismo,
que ele construirá sua estratégia didática, permitindo que o alu-
no lance um novo olhar sobre a realidade que o cerca, utilizan-
do os saberes historicamente construídos como instrumentos
de mediação entre ele e o mundo.

Num curto espaço de tempo, o projeto ampliou-se para vá-


rios municípios, evoluiu e consolidou-se de forma rápida, para
muito além das duas instituições parceiras previam. Ou seja,

47 Esses resultados foram publicados no Livro Projeto Despertar : Histórias de Alunos Empreende-
dores, publicado em 2010. Para conhecer, acessar (http://www.biblioteca.sebrae.com.br/bds/
bds.nsf/E1E738ADCFF0029A832577D70047F602/$File/ATT1K1X9.pdf)
48 O Projeto Despertar, ao contrário de outros programas do governo federal ou estadual, não
oferece bolsa ou gratificação financeira ao professor pelas horas trabalhadas. Ao professor
previamente selecionado, são negociadas horas da sua carga horária para a implantação do
projeto. Convém ressaltar que as aulas do projeto não ocorrem no horário de aula normal. São
realizadas no contra turno, e o aluno é quem decide se quer participar ou não. Esse é um dos
diferenciais do projeto.

192
integrou-se aos projetos políticos e pedagógicos das escolas
nas quais foi implantado. De 2002 a 2013, foram capacitados
22.241 estudantes e 573 educadores por meio de um proces-
so de formação dinâmico e continuado.

Convém elucidar que o processo de implantação, não é


um caminho permeado de flores. Alguns desafios se colocam
nesse percurso, dentre eles, desafios de natureza cultural e ati-
tudinal. O primeiro deles, é que no Brasil, a burocratização de
processos escolares e da própria prática docente, fruto de um
longo período de ditadura, acabou impondo regras, medos,
cristalizando as mentes de educadores sobre um jeito novo de
fazer escola, cerceando assim, a prática da autonomia.

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Um outro aspecto é que a proposta do empreendedoris-
mo é uma proposta emancipatória, uma vez que assegura
ao jovem os instrumentos de intervenção sobre a sua reali-
dade, o que implica “correr riscos” e, eventualmente errar.
Esse novo entendimento do erro como algo construtivo, ne-
cessário ao crescimento pessoal e profissional, ainda apre-
senta-se como um tema contraditório, tenebroso na cabeça
de alguns educadores e pouco explorado no ambiente esco-
lar (Penin, 2001).

Diante do contexto educacional onde os métodos tradicio-


nais de ensino ainda persistem, e de uma série de desafios que
se colocam para a escola, não se pode deixar de imaginar os
benefícios que a educação empreendedora pode trazer. Con-
tudo, é preciso “vontade de fazer” e mais ainda: sensibilidade,
compreensão, persistência e acompanhamento constantes por
parte das equipes gestoras durante todo o processo de implan-
tação e manutenção das ações do projeto.

Em relação aos jovens participantes do projeto Despertar, a


mensagem transmitida, como o próprio nome enseja, DESPER-
TA, para o surgimento de novos talentos e potenciais empreen-
dedores, muitas vezes esquecidos. Dar oportunidade especial-

193
mente, aqueles que vivem em regiões mais remotas, onde as
escolhas são quase nulas. Nessas regiões, o projeto movimen-
ta toda a comunidade, pois o empreendedorismo é transmitido
no sentido de fortalecer a crença em um futuro melhor, onde
cada um é capaz de construir e empreender.

Esse diferencial tem fortalecido laços entre a escola, os


empresários locais, a comunidade do entorno, as lideranças
políticas e os alunos, que passam a identificar oportunidades,
ter consciência cidadã, conhecer e a intervir nas suas realida-
des com uma visão diferente.

A perspectiva do empreendedorismo, como um eixo inte-


grador na educação, oportuniza o engajamento da escola nos
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

inúmeros desafios que o mundo enfrenta e em especial o Brasil.


Se constitui no “acender de luzes” para mostrar os caminhos
que permitem a renovação permanente das escolas estimulan-
do a participação, o questionamento. Provoca o jovem a bus-
car alternativas para as questões do cotidiano, incentivando a
solução deles, e a participação cidadã.

Em relação à escola pública, a educação empreendedora


abre portas e janelas para que a “brisa empreendedora” pe-
netre por todos os ambientes, inspirando a inovação. Instiga,
motiva e desperta gestores e educadores para a criação de no-
vos desenhos curriculares e ambientes de trabalho, convidan-
do-os a experimentar novas dinâmicas nas relações de ensino
e aprendizagem.

Referências bibliográficas

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despertando competências, promovendo a esperança. In:
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André Dantas (org.). Natal: SEBRAE-RN, 2006.

194
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2010. (Comentários de ZARIFIAN, Philippe).

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PENIN, Sonia Teresinha de Souza. Didática e cultura: o ensi-


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PNE 2011-2020: Metas e Estratégias. Brasília: Ministério da

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


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ed. Porto Alegre:Sulinas. 2003.

UNESCO. Tendências da educação superior para o sécu-


lo XXI. Conferencia Mundial sobre Ensino Superior (Paris,
1989). Brasília : UNESCO/CRUB, 1999.

195
Educação empreendedora
sob o prisma da Junior
Achievement no Brasil
– O caso do Programa
Miniempresa
Wilma Resende Araujo Santos49

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Introdução

É bastante comum observarmos, hoje em dia, o esforço das


nações dedicado às atividades de fomento a uma mentalidade
empreendedora, ao estímulo à formação de cidadãos empreen-
dedores, que empreendam em suas vidas pessoais e profis-
sionais, assumindo riscos, buscando e criando oportunidades,
com autonomia e conhecimento para potencializar economias
locais e o desenvolvimento sustentável e sustentado de peque-
nos ou grandes negócios, ou mesmo como intraempreendedo-
res. Compartilhado por quase todos os países do mundo, ou
especialmente pelos países cujas dinâmicas produtivas se en-
contram sob sistemas econômicos capitalistas e de livre mer-
cado, este desafio, porém, não permite soluções de facilidade.

Como formar empreendedores? Como manter acesa a


chama e o entusiasmo necessários ao empreendedor para
que este persista em seus sonhos? Como introduzir conheci-

49 Superintendente Nacional Junior Achievement Brasil – JA Worldwide Member

197
mentos, informações relevantes, desenvolver habilidades nos
jovens, ainda em idade escolar, para que o empreendedorismo
se torne uma opção considerável e possível em suas vidas?
São perguntas que têm merecido a dedicação de especialis-
tas em desenvolvimento local, economistas, administradores,
gestores e educadores em diferentes contextos e lugares, e
recebido variadas propostas de encaminhamento. A questão
é, muito antes de um indivíduo de fato enfrentar os desafios
de empreender, identificar quais são essas competências, ta-
lentos, qualidades, e perceber como atuam, de forma sinérgi-
ca e sistêmica em diferentes pessoas, sob diferentes pressões
e realidades, enfrentando diferentes estímulos e condições de
competição e viabilidade.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

Algumas sugestões, porém, parecem se encaminhar com


alguma convergência. Este texto tem como objetivo levantar al-
gumas opiniões sobre este tema, apresentando e relacionando
estes resultados com o Programa Miniempresa, suas dinâmi-
cas, conteúdos, desdobramentos, e contribuições para a edu-
cação voltada ao empreendedorismo.

Características empreendedoras,
uma breve revisão

No Brasil, o empreendedorismo se popularizou a partir da


década de 90, tendo ganho impulso a partir da entrada em
vigor da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, em 2007, e
da Lei do Microempreendedor Individual, em 2008. De acor-
do com o Portal Empreendedor (www.gov.br/empreendedor,
consulta em 20/03/2013) mais de 600 mil novos negócios,
anualmente, foram registrados no Brasil. Segundo pesquisa da
Global Entrepreneurship Monitor (GEM), o Brasil possui a maior
Taxa de Empreendedores em Estágio Inicial (TEA) em 2012
(15,4%), sendo 4,5% empreendedores nascentes e 11,3% em-

198
preendedores novos. A TEA média brasileira de 2002 a 2012 é
de 13,7%. TEA é a proporção de pessoas na faixa etária entre
18 e 64 anos na condição de empreendedores de negócios
nascentes, ou seja, com menos de 42 meses de existência.
Quanto à evolução das taxas de empreendedorismo no Brasil
no período de 2002-2012, é possível constatar que a Taxa Total
de Empreendedorismo teve um aumento expressivo, passando
de 20,9% em 2002 para 30,2% em 2012, um aumento de qua-
se dez pontos percentuais.

Nos últimos cinco anos, em média, mais de 600 mil no-


vos negócios, anualmente, foram registrados no Brasil. São
números que surpreendem, sem dúvida, mas que nada reve-
lam sobre os também inúmeros casos de falências e fracassos

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


associados aos novos negócios. Desconhecimento do negó-
cio ou do setor de atuação, desconhecimento do público-al-
vo, descompromisso com metas e resultados, ausência de
planejamento e incompetência administrativa e financeira estão
entre causas comuns e persistentes de fracassos em novos
empreendimentos.

Por outro lado, dentre as diversas características citadas


para um empreendedor de sucesso, pode-se destacar: criativi-
dade, liderança, capacidade de correr riscos, comprometimen-
to, busca por qualidade e eficiência, otimismo, persistência, fle-
xibilidade, autoconfiança, busca de oportunidades, iniciativa e
cooperação, entre tantas outras (Barreto, 1998).

Pati (1995) sugere algumas características que definiriam o


perfil do empreendedor de sucesso, a saber:

• É motivado pelo desejo de realizar;

• Corre riscos viáveis, possíveis;

• Tem capacidade de análise;

• Precisa de liberdade para agir e para definir suas metas e os

199
caminhos para atingi-las;

• Sabe aonde quer chegar;

• Confia em si mesmo;

• Não depende dos outros para agir; porém, sabe agir em


conjunto;

• É tenaz, firme e resistente ao enfrentar dificuldades;

• É otimista, sem perder o contato com a realidade;

• É flexível sempre que preciso;


Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

• Administra suas necessidades e frustrações, sem por elas


se deixar dominar;

• É corajoso; porém, não é temerário;

• Sabe postergar a satisfação de suas necessidades;

• Mantém a automotivação, mesmo em situações difíceis;

• Aceita e aprende com seus erros e com os erros dos outros;

• É capaz de recomeçar, se necessário;

• Mantém a autoestima, mesmo em situações de fracasso;

• Tem facilidade e habilidade para as relações interpessoais;

• É capaz de exercer liderança, de motivar e de orientar ou-


tras pessoas com relação ao trabalho;

• É criativo na solução de problemas;

• É capaz de delegar;

• É capaz de dirigir sua agressividade para a conquista de

200
metas, a solução de problemas e o enfrentamento de difi-
culdades;

• Usa a própria intuição e a de outras pessoas para escolher


os melhores caminhos, corrigir a sua atuação, descobrir la-
cunas a serem preenchidas no mercado, avaliar a tendência
e a variação dos negócios, e para escolher pessoas, sejam
elas sócios, fornecedores ou empregados;

• Procura sempre qualidade;

• Acredita no trabalho com participação e contribuição social;

• Tem prazer em realizar o trabalho e em observar o seu pró-


prio crescimento empresarial;

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


• É capaz de administrar bem o tempo;

• Não busca, exclusivamente, posição ou reconhecimento


social;

• É independente, seguro e confiante na execução de sua


atividade profissional;

• É capaz de desenvolver os recursos de que necessita e de


conseguir as informações de que precisa;

• Tem desejo de poder, consciente ou inconscientemente.

Mas, estamos listando condições que favorecem ou des-


favorecem a personalidade empreendedora sem uma definição
do termo. Muitas são as definições e algumas derivam de teó-
ricos de exploraram conceitos paralelos como a inovação e a
competitividade. Segundo Barreto (1998), “Empreendedorismo
é a habilidade de criar e constituir algo a partir de muito pou-
co ou de quase nada. Fundamentalmente, o empreender é um
ato criativo. É a concentração de energia no iniciar e continuar

201
um empreendimento. É o desenvolver de uma organização em
oposição a observá-la, analisá-la ou descrevê-la. Mas é tam-
bém a sensibilidade individual para perceber uma oportunidade
quando outros enxergam caos, contradição e confusão. É o
possuir de competências para descobrir e controlar recursos
aplicando-os de forma produtiva.”.

Para Pereira (1995), um empreendedor bem-sucedido é


uma pessoa como qualquer outra, cujas características de per-
sonalidade e talento preenchem um padrão determinado que o
leva a agir de tal forma que chega ao sucesso, realizando seus
sonhos e alcançando seus objetivos. Ele é, portanto, uma pes-
soa que busca realização e é auto-orientado para atingir metas
próprias. Podemos afirmar que ser empreendedor é uma for-
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

ma estratégica de contribuir para o crescimento econômico,


tratando-se de uma filosofia e de uma visão de mundo que
todo empresário deveria ter, e que muitos ainda não possuem
ao empreender o seu negócio.

Educar para o empreendedorismo.

No Brasil, as iniciativas de educação empreendedora co-


meçaram nas universidades, durante os anos 80 e foram, gra-
dativamente, sendo disseminadas nas demais etapas da edu-
cação formal previstas nas escolas, notadamente no Ensino
Médio. Para o desenvolvimento da cultura empreendedora há a
necessidade da formação de estudantes que sejam mais autô-
nomos, mais criativos, capazes de liderar e com visão ampla da
sociedade. Por meio de programas de ensino que contemplem
o desenvolvimento interpessoal, o estímulo à geração de ideias,
desenvolvimento estratégico, desenvolvimento de produtos,
tomada de decisões e resolução de problemas, prepara-se o
cenário onde futuros empreendedores possam se revelar.

202
Esse cenário prevê um conjunto de interrelações, onde pais
e educadores passam a ter um papel fundamental, não só bus-
cando novas metodologias de ensino, mas também se tornan-
do facilitadores do processo de produção do conhecimento.
Fora do ambiente escolar e da família, também uma rede de
suporte a apoio ao empreendedorismo é fundamental, com in-
cubadoras, financiadores, incluindo agentes que prestem as-
sessoria e todo tipo de apoio.

Podemos citar, ainda, a importância de um sistema nacio-


nal de inovação, como também de uma economia estável e
forte, e uma positiva inclusão do país na economia internacio-
nal, reconhecendo seus valores, patrimônio, com credibilidade
e confiança interna e externa. Claro que estamos aqui traçando

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


um cenário ideal, e que essas condições dificilmente serão en-
contradas em sua totalidade. Independentemente desse fato,
porém, lidar com a incerteza e com a imprevisibilidade também
faz parte dos riscos a serem assumidos pelo empreendedor,
desde que este esteja ciente de tais lacunas.

Junior Achievement

A Junior Achievement é uma organização fundada em


1919, nos Estados Unidos, tratando-se da maior e mais antiga
organização de educação prática e em negócios, economia e
empreendedorismo do mundo. Atualmente, está presente em
mais de 120 países e, no Brasil desde 1983, onde possui uni-
dades em todos os estados e no Distrito Federal.

Trata-se de uma associação educativa, sem fins lucrativos,


mantida pela iniciativa privada, cujo objetivo é despertar o espírito
empreendedor nos jovens, ainda na escola, estimulando o seu de-
senvolvimento pessoal, proporcionando uma visão clara do mun-
do dos negócios e facilitando o acesso ao mercado de trabalho.

203
No Brasil, já foram 3 milhões de alunos beneficiados e 115
mil voluntários envolvidos, por meio de 26 programas destinados
ao Ensino Fundamental e ao Ensino Médio. As atividades da Ju-
nior Achievement se desenvolvem por meio de programas edu-
cativos criteriosamente formulados, aplicados junto aos jovens
através de parcerias com escolas e voluntários dispostos a com-
partilhar suas experiências e conhecimentos com estudantes de
diferentes faixas etárias. Globalmente, 10 milhões de jovens ao
ano participam dos programas da Junior Achievement, consoli-
dando a formação de uma cultura empreendedora ao redor do
mundo, dentro de uma perspectiva ética e responsável. 

Portanto, é por meio de programas educativos aplicados


por voluntários corporativos em escolas públicas e privadas e
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

de ações mantidas por pequenas, médias e grandes empresas,


que os jovens estudantes brasileiros podem se beneficiar. O
sucesso da Junior Achievement é resultado da sinergia e da
dedicação de todas as partes envolvidas: empresas, escolas e
alunos, tendo os voluntários como principal vínculo entre eles.

O Programa Miniempresa

O Programa Miniempresa, primeiro programa da Junior
Achievement e o “carro-chefe” da instituição no Brasil, proporcio-
na a estudantes do 2º ano do Ensino Médio, a experiência práti-
ca em economia e negócios, na organização e operação de uma
empresa, desde a concepção do produto, sua produção, vendas
dos produtos e de ações para a capitalização do negócio, até o
fechamento do mesmo, numa experiência de intenso envolvimen-
to, quando aprendem sobre os fatores de produção, pesquisa de
mercado, e se envolvem nas áreas de produção, marketing, recur-
sos humanos e finanças, e em diferentes cargos e funções. O pro-
grama é desenvolvido em 15 encontros, em jornadas semanais,
com duração de 3h30min, realizadas nas escolas, geralmente à

204
noite, podendo também, dependendo da escola, ser trabalhado
nos turnos opostos das aulas, nas manhãs, tardes ou noites. Os
estudantes aprendem, ainda, conceitos de livre iniciativa, merca-
do, níveis de produto e serviço, segmentação e posicionamento.

O programa é acompanhado por quatro profissionais, volun-


tários com experiência nas áreas de marketing, finanças, recur-
sos humanos e produção. Durante a realização do Miniempresa,
são explicados os fundamentos da economia de mercado e da
atividade empresarial através do método “Aprender-Fazendo”,
por meio do qual cada participante se converte em um miniem-
presário, sendo naturalmente levado a ter uma visão mais ampla
de economia, mercado e da própria empresa que vão operar.

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Entre os objetivos de aprendizado do Miniempresa, desta-
camos:

• Trabalhar o conceito de empresa e suas origens, enfatizan-


do os tipos de empresas existentes;

• Mostrar que, a partir de uma necessidade, se produz bens


que geram satisfação;

• Demonstrar como funcionam as quatro principais áreas de


uma empresa: marketing, finanças, recursos humanos e
produção;

• Controlar a presença nas jornadas, fluxo de caixa, compra


de matéria-prima, controle de estoque, vendas e produção;

• Proporcionar troca de informações e conhecimento da em-


presa como um todo;

• Fabricar um produto, consciente das normas de seguran-


ça, controle de metas de produção e qualidade, dos riscos
e sucesso de um negócio;

• Mostrar os compromissos legais da empresa, referentes

205
aos encargos e impostos, não sendo pagos ao governo,
mas doados a uma instituição beneficente;

• Envolver o participante em atividades como rodadas de pa-


lestras com empresários e feiras de negócios.

Entre os materiais fornecidos, o aluno recebe o Manual do


Achiever, informativos que orientam a participação nos eventos
e certificado de conclusão. Os advisers recebem o Manual do
Achiever, Manual do Adviser e, ao final do programa, um Certi-
ficado de Mérito Comunitário. Os conceitos são passados por
meio de exposição dialogada, trabalhos em grupo, simulações,
discussões orientadas e práticas da produção, proporcionando
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

um ambiente agradável para a aprendizagem.

Na prática do trabalho em grupo, de assumir e delegar fun-


ções, na tomada de decisões, na necessidade de compromisso
com o grupo e com a Miniempresa e seus resultados, em de-
volver o investimento e dividendos aos acionistas, em preencher
relatórios e avaliações diversas, entre outras tantas atividades e
novas responsabilidades, o aluno adquire importantes noções de
como seria se envolver em um empreendimento de fato.

A despeito do grande investimento de tempo e esforços, e


do envolvimento necessário de voluntários e das escolas, o Mi-
niempresa tem sido um programa especialmente bem-sucedido
na história da Junior Achievement, beneficiando 15.998 jovens
em 2012, em todo o Brasil, num total de 71.480 alunos partici-
pantes, ou achievers, nos últimos cinco anos, de 2008 a 2012.

Esse fato, bem como a convivência com os alunos nas


feiras, formaturas, premiações e outras atividades, por meio
das quais podemos observar in loco o entusiasmo e a ener-
gia contagiantes com que se dedicam as suas empresas e
produtos, nos autoriza a afirmar, como muito orgulho, que o
Programa Miniempresa tem contribuído para a formação e

206
disseminação de uma mentalidade empreendedora entre os
jovens, ainda na escola.

Considerações finais

Embora esteja presente na agenda prioritária de muitos


países, não é tarefa fácil formar empreendedores, capacitar
educadores e forjar sistemas de fomento para o empreende-
dorismo. É certo, porém, que é um esforço desejável em eco-
nomias de livre mercado, onde o empreendedor se torna um
agente de transformação e de desenvolvimento.

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


Entre tantas iniciativas válidas e louváveis na realidade bra-
sileira, destacamos aqui o caso do Programa Miniempresa, que
desde o início das atividades da Junior Achievement no Brasil,
em 1983, já beneficiou mais de 130 mil estudantes, nestes 30
anos de atividade em todos os estados do Brasil. Nesse período,
foram inúmeros os fracassos financeiros de Miniempresas e de
seus produtos, mas muito mais numerosos foram os êxitos, sem
dúvida, com a total certeza de que todos, sem exceção, termi-
nam o Miniempresa positivamente modificados pela experiência.

Não só esses jovens adquirem novas habilidades e compe-


tências, maior segurança e autonomia, como também passam
a olhar o mundo com outros olhos, percebendo elementos e
relações antes inexistentes para seus olhares destreinados a
ver certas realidades. Tem sido recompensador perceber estas
mudanças individuais, e o tanto de criatividade e vitalidade que
dedicam aos seus empreendimentos, ao grupo e aos objetivos
fixados em busca e superação e sucesso.

Além disso, ao reunirmos as escolas, por meio de direto-


res e professores, as empresas, através de seus voluntários e
os alunos, fortalecem-se os elos, trocas e experiências sempre
benéficas para todos e para a sociedade.

207
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Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

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Educação Empreendedora:
Desafios e Perspectivas para
o Brasil
Juliano Seabra50

De acordo com a Organização para a Cooperação e De-


senvolvimento Econômico, a capacitação de empreendedores
e o estímulo ao espírito empreendedor são dois dos principais
eixos para que um país possa evoluir no impacto gerado pelos
negócios. Projetos de educação empreendedora tem um papel

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


fundamental em ambos os eixos, contribuindo para que a nova
geração de empresários domine os instrumentos de gestão
e derrube barreiras culturais que desaceleram o processo de
criação e desenvolvimento de negócios.

Ao analisar o cenário da educação empreendedora no


Brasil, é comum pesquisadores se depararem com um ce-
nário ainda hostil e pouco desenvolvido. A proposta deste
artigo é levantar os grandes dilemas enfrentados pelo siste-
ma educacional em um momento em que a disposição para
empreender atinge patamares inéditos na sociedade e apon-
tar caminhos a serem seguidos.

Um breve histórico da educação


empreendedora no Brasil

O desenvolvimento de cursos para preparar novos em-

50 Diretor geral, Endeavor Brasil

209
preendedores teve seu ciclo iniciado no Brasil na década de
1980, com disciplinas de empreendedorismo sendo criadas em
escolas de administração de empresas com a Fundação Getú-
lio Vargas, em São Paulo – quase 40 anos depois das primeiras
disciplinas criadas nos Estados Unidos com o mesmo fim, na
Universidade de Harvard. Ao mesmo tempo, surgia no Brasil o
Sistema Nacional de Incubadoras e Parques Tecnológicos. As
primeiras incubadoras, em meados desta década, traziam para
o país a ideia de espaços físicos compartilhados, com acesso a
consultorias para futuros empreendedores.

Na década de 1990, na esteira de programas de desenvol-


vimento da indústria de software, como o Softex, surgiram os
primeiros programas de educação empreendedora na área de
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

ciência da computação. O fortalecimento do Sebrae no início


dos anos 90 permitiu a adoção em escala do Empretec – progra-
ma das Nações Unidas para o desenvolvimento comportamental
de empreendedores, que tem no Brasil o principal caso global de
implantação – graças à atuação de todo o Sistema Sebrae.

É também desse período o lançamento dos livros “O Se-


gredo de Luiza” e “Oficina do Empreendedor”, de Fernando Do-
labela. O primeiro, combinando de forma inédita uma história
com hipertextos sobre como abrir um negócio, se transformou
no que ainda é hoje o principal best-seller da área de empreen-
dedorismo no Brasil. O segundo abriu caminho para o treina-
mento de milhares de professores em todo o Brasil, que tiveram
um primeiro contato com a educação empreendedora.

Nas universidades, o surgimento do Instituto Gênesis na


PUC do Rio de Janeiro foi um dos primeiros experimentos de
uma grande instituição de ensino de olhar para o tema em-
preendedorismo de forma holística. Combinando disciplinas
dadas pelo Instituto de Administração e Gestão e a criação de
uma incubadora de onde surgiram cases expressivos como a
NTime (hoje Movile, principal empresa de aplicativos móveis da

210
América Latina), o caso da PUC Rio foi reconhecido até pelo
Fórum Econômico Mundial51 e é uma experiência que deve ser
melhor estudada pelas demais instituições de ensino. Entre as
escolas de negócios, a Fundação Getúlio Vargas em São Paulo
constituiu um Centro de Empreendedorismo que se tornou um
relevante polo de atração de grandes casos internacionais e
nacionais de empreendedores, que contam suas histórias em
eventos para a comunidade acadêmica.

Os anos 2000 foram marcados pela entrada de novos ato-


res no ambiente empreendedor e de experiências em institui-
ções de Snsino Superior que rapidamente ganharam tração. A
fundação da Endeavor, em 2000, e a subsequente criação de
suas conferências e workshops, dados por uma rede de men-

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


tores com grande conhecimento prático em negócios, abriu
espaço para o surgimento da primeira videoteca virtual sobre
empreendedorismo no Brasil. Hoje transformada em um portal
de conteúdo, o acervo da Endeavor é acessado por mais de
1.000.000 de empreendedores anualmente.

No Sul do país merece destaque o trabalho realizado pela


PUC do Rio Grande do Sul, que criou um sistema de empreen-
dedorismo e inovação com um moderno Parque Tecnológico
(o Tecnopuc), uma incubadora de empresas e um Núcleo Em-
preendedor, responsável pelas iniciativas de ensino e extensão
na área de empreendedorismo por toda a universidade. Em São
Paulo, o Senac fez sua estreia na área em 2003, com a criação
de seu Núcleo de Empreendedorismo, que nos anos seguintes
foi o responsável por levar aos alunos de seu Centro Universitário
experiências inovadoras de competições de empreendedorismo,
treinamentos para professores em parceria com o Babson Colle-
ge e disciplinas de empreendedorismo e criação de negócios em
carreiras não tradicionais, como hotelaria, moda e design.

51 “Educating the Next Wave of Entrepreneurs”, World Economic Forum, 2009. Disponível em http://
www3.weforum.org/docs/WEF_GEI_EducatingNextEntrepreneurs_ExecutiveSummary_2009.pdf

211
Esta década assistiu também ao surgimento de iniciativas
para mobilizar todo o ambiente universitário do país em torno
do empreendedorismo. O Desafio Sebrae é o principal proje-
to nesse sentido: configurado como um “simulador de gestão”
on line, abre portas a mais de 100.000 estudantes anualmente
para aprimorarem na prática seus conhecimentos de gestão
enquanto competem com outros grupos de alunos de todo o
Brasil e até mesmo do exterior. Isso permite simular o mercado
e dá rodagem a futuros empreendedores no momento de cons-
tituírem suas empresas. Já o Prêmio Santander Universidades,
criado pela divisão com mesmo nome no Banco Santander,
abriu as portas para milhares de estudantes apresentarem seus
planos de negócio e concorrerem a grandes prêmios em di-
nheiro para investir na ideia.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

Em 2008, a Semana Global do Empreendedorismo passou


a acontecer no Brasil e desde o início se transformou em um
grande catalisador de ações pró-empreendedorismo, especial-
mente entre jovens estudantes. Estima-se que desde o primeiro
ano uma média de 2 milhões de pessoas tiveram contato com
iniciativas educacionais de empreendedorismo promovidas por
uma rede de entidades na qual se destacam o Sebrae, a Endea-
vor, o Senac, a Aliança Empreendedora, a Brasil Júnior e a Co-
naje. Com o apoio das Organizações Globo, que garantiram forte
cobertura de mídia para o tema, o empreendedorismo ganhou
outro patamar na agenda do país e das instituições de ensino.

Os mais recentes movimentos sinalizam para o fortaleci-


mento do ecossistema de educação empreendedora no país.
Em 2010, foi criada a Rodada de Educação Empreendedora,
iniciativa da Endeavor em parceria com o Sebrae para promover
a troca de conhecimento e melhores práticas entre professores
universitários de empreendedorismo de todo o país. Nos moldes
do Roundtable on Entrepreneurship Education, criado pela Uni-
versidade Stanford (EUA), a Rodada acontece anualmente e já
contribuiu com o desenvolvimento de mais de 500 professsores.

212
Junto com essa iniciativa surgiu também o Prêmio Educa-
ção Empreendedora Brasil, criado para identificar os professo-
res e as instituições que tem inovado em seu campo de atua-
ção e que podem inspirar os demais a fazer mais e melhor. Já
foram reconhecidas instituições como a Universidade Federal
de Itajubá (Unifei), o Instituto Federal de Picos, no Piauí, o Se-
nac São Paulo e o Insper. Todas as iniciativas mapeadas foram
consolidadas no Portal Educação Empreendedora Brasil (www.
educacaoempreendedora.org.br), iniciativa da Endeavor e do
Sebrae para perenizar o impacto de seus projetos na área de
educação empreendedora.

Na mesma linha, o Sebrae anunciou um projeto de apoio


a universidades para que elas possam fortalecer sua oferta de

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


programas de formação de empreendedores. Essa aproxima-
ção pode ser bastante benéfica especialmente para as univer-
sidades mais empreendedoras, que podem tirar do papel pro-
jetos mais ousados com o suporte do Sebrae.

O início da década foi marcado também pelo lançamento


da plataforma Bota pra Fazer, da Endeavor, e que já é utilizada
por mais de 40 instituições de ensino. Composta por material
didático impresso e online adaptado à realidade nacional e com
foco no desenvolvimento de professores para se tornarem faci-
litadores do processo de aprendizagem dos futuros empreen-
dedores, o Bota pra Fazer aproxima um pouco mais a acade-
mia e o mercado, a partir da experiência de empreendedores
apoiados pela organização.

Olhando para a frente:


desafios para o futuro

O empreendedorismo no Brasil passa por um importan-


te momento de inflexão, que demandará ações concretas de

213
todo o ambiente educacional e de suporte para se reinventar e
lidar com as novas demandas e metodologias que surgem com
rapidez. Nunca tantos estudantes universitários consideraram
empreender como uma opção concreta de carreira: mais da
metade deles se enxerga como um potencial empreendedor
no futuro, de acordo com pesquisa anual realizada pela En-
deavor52. Estariam as universidades e o sistema educacional
preparados para fazer frente a esse desafio?

A resposta para essa pergunta ainda é não. Felizmente,


o caminho a ser percorrido está minimamente mapeado, e os
desafios podem ser estruturados em quatro grandes frentes, a
saber: currículo, preparação de professores, material didático e
engajamento dos alunos.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

No que diz respeito ao currículo de empreendedorismo


nas universidades e escolas técnicas, ainda há um longo cami-
nho a ser seguido. Houve sem dúvida avanços importantes nos
últimos anos, com o surgimento de novas disciplinas e aborda-
gens de empreendedorismo que puderam ser replicadas por
inúmeras instituições. Nesse sentido, novos métodos como o
Canvas contribuíram para simplificar e democratizar o acesso a
programas de empreendedorismo. No entanto, a imensa maio-
ria das disciplinas ofertadas na área de empreendedorismo ain-
da está concentrada nos cursos relacionados à Administração
de Empresas e correlatos.

Trata-se de um contrassenso quando se observa a lógica da


ação empreendedora, que nasce em grande medida graças ao
conhecimento técnico e experiência acumulada no campo para
a solução de problemas existentes na sociedade. Embora com-
preensível em um primeiro momento dada as suas origens, a ex-
cessiva concentração de cursos na área de administração acaba

52 Disponível em http://www.endeavor.org.br/endeavor_mag/start-up/aprendendo-a-ser-em-
preendedor/empreendendo-na-universidade

214
fechando as portas para uma gigantesca massa de empreende-
dores – jornalistas, designers, físicos, médicos, engenheiros – que
acabam por desenvolver menos suas características empreen-
dedoras. A mesma lógica se aplica nos cursos técnicos: quanto
mais o empreendedorismo puder ser ofertado para estudantes de
diferentes áreas, melhor para a formação do futuro empreendedor.

A existência de programas de educação empreendedora


no currículo regular das instituições de ensino não vai resolver
automaticamente o problema se a estrutura da aula e as cone-
xões com o mercado não forem permitidas durante o processo
de aprendizagem. Um programa de aulas teóricas, que trate o
processo empreendedor de uma maneira idealizada, sem es-
paço para a tentativa e erro e sem permitir o envolvimento de

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


pessoas com pouca experiência acadêmica, mas com bastan-
te rodagem de mercado, pode levar tudo a perder.

É nesse momento que entra a perna principal desse proces-


so: o professor. Na formação empreendedora, o professor é ins-
tado a reforçar um papel de facilitador em sala de aula, aproximan-
do dos alunos o mercado, os empreendedores e suas histórias,
com foco na aprendizagem prática. Infelizmente, como ainda há
um divórcio no Brasil entre carreira acadêmica e carreira empreen-
dedora, a imensa maioria dos professores não possui experiência
própria criando ou conduzindo negócios, o que reforça a neces-
sidade de atrair para a sala de aula um personagem que está em
todas as cidades e setores do país: o empreendedor.

O papel do empreendedor como convidado deve ser refor-


çado não como um substituto,mas como um complemento ao
professor. Os erros e acertos dos empreendedores podem con-
tribuir significativamente para que o professor promova entre os
alunos reflexões sobre a carreira empreendedora e possa ele
mesmo se desenvolver para provocar seus estudantes. Além
disso, é fundamental neste processo que a facilitação promova
atividades práticas de aprendizagem e não restrinja a ação dos

215
estudantes – ainda é muito comum no Brasil que professores
direcionem estudantes nas disciplinas de empreendedorismo
para fazer projetos que o próprio professor acredita, ao invés
de deixar a conexão emocional entre aluno e ideia se formar.

A disponibilidade de material didático conectado à reali-


dade dos estudantes pode contribuir para que o aprendizado
dentro e fora da sala de aula seja acelerado. Por se tratar de
um ambiente de negócios complexo, quanto mais informação
for disponibilizada para futuros empreendedores sobre o “ca-
minho das pedras” para se fazer negócios no Brasil, melhor.
Junto com informação e dicas práticas, deve-se adicionar um
ingrediente fundamental: casos brasileiros reais. O aprendizado
pelo exemplo é uma das mais poderosas armas para conectar
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

estudantes ao processo empreendedor, mas é necessário bus-


car os exemplos que se conectem com as diferentes realidades
vividas por empreendedores em todo o país.

O risco de contar apenas as “grandes histórias”, das em-


presas e empreendedores já consagrados, está em fantasiar
em demasia o processo. As histórias de empreendedores que
estão no campo de batalha, que até poucos anos atrás esta-
vam no lugar dos novos empresários de hoje, que começaram
com diferentes cenários – muito ou pouco recurso, do zero ou
herdado da família, com ou sem conhecimento – tem um enor-
me potencial de impactar e gerar aprendizado em pessoas com
as mesmas características e histórias de vida.

Em um contexto de necessidades de mudanças profundas


na instituição de ensino, que via de regra é lenta para absorver
e promover com rapidez os ajustes com a velocidade que o
espírito empreendedor deseja, há um ator que pode contribuir
fundamentalmente para catalisar estas mudanças e articular as
instâncias decisórias acadêmicas. Não à toa, estamos falando
do principal interessado no processo: o estudante e seus me-
canismos de engajamento estudantil.

216
Cada vez mais nota-se a emergência do movimento de
empresas juniores em todo o Brasil, somado com a criação de
clubes de empreendedorismo diretamente por parte dos alu-
nos, como um saudável atalho para a implementação de pro-
gramas de educação empreendedora. Os estudantes, por não
estarem vinculados às formalidades curriculares e regras do
ambiente acadêmico, podem trazer empreendedores e outros
especialistas de mercado para programas novos ou disciplinas
já existentes, em parceria com os professores.

Uma das formas que tem sido estudada de contribuir


com o desenvolvimento de empreendedores em paralelo aos
passos que vem sendo dados pelas instituições de ensino é
a oferta cada vez maior de conteúdo e programas educacio-

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


nais online. Pelo fato de que empreendedores, em sua imensa
maioria, não buscam um diploma ou um título acadêmico, o
conhecimento disponível na internet de maneira mais ou menos
organizada tem contribuído para aproximar as pessoas dos de-
safios e tendências de mercado. Essa pode ser uma fronteira a
ser desbravada pelas organizações de apoio ao empreendedo-
rismo em todas as partes do país e um excelente investimento
para ganhar tempo, dado que a onda do empreendedorismo
chegou para ficar.

Organizações de apoio ao empreendedorismo podem


contribuir profundamente com a mudança no cenário da
educação empreendedora no país, seja a partir da oferta di-
reta de programas inovadores baseados nos erros e acer-
tos de sua própria base de pessoas apoiadas, seja forne-
cendo conteúdo e oportunidades de desenvolvimento para
as instituições de ensino e seus professores. O Sebrae e a
Endeavor têm feito esforços nessa direção e que podem
ser multiplicados nos próximos anos. Uma aproximação
ainda maior com as principais lideranças do ambiente aca-
dêmico – públicas e privadas – pode incentivar um diálogo
que ainda não ocorreu de maneira estruturada para que

217
o empreendedorismo entre de fato na agenda do sistema
educacional.

A importância da educação empreendedora no ensino formal


– especialmente Técnico e Superior – é ainda mais relevante
no Brasil dado os desafios existentes para que rapidamente
esta geração de futuros empreendedores possa economizar
caminhos e erros em seu processo de criação de empresas.
Pelo crescimento recente da disposição para empreender,
o país chegou em um momento crucial: temos uma grande
quantidade de empreendedores “de primeira viagem”, que se
não tiverem respaldo no sistema educacional, não terão outra
alternativa que não seja aprender na prática e com seus pró-
prios erros – o que pode gerar uma legião de fracassos que
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

poderiam ser evitados.

218
Educação, trabalho,
empreendedorismo: nasce
o Pronatec Empreendedor
Flávia Azevedo Fernandes153
Marcela Souto de Oliveira Cabral Tavares54
Mirela Malvestiti55

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


O mundo do trabalho e a educação

Durante muito tempo – e ainda hoje – é comum ouvir a


frase de que o conhecimento é produzido na escola. Kuenzer,
contrapondo-se a essa frase nos explica que:

O saber não é produzido na escola, mas no in-


terior das relações sociais em seu conjunto; é uma
produção coletiva dos homens em sua atividade real,
enquanto produzem as condições necessárias à sua
existência através das relações que estabelecem com
a natureza, com outros homens e consigo mesmos.
(KUENZER, 1991 p. 21)

Dessa forma, constatamos que o trabalho, como princípio

53 Pedagoga. Mestre em Educação pela Universidade de Brasília (UnB). Analista da Unidade de


Capacitação Empresarial do Sebrae.
54 Pedagoga. Doutora em Educação pela Universidade de Brasília (UnB). Analista da Unidade de
Capacitação Empresarial do Sebrae.
55 Mestre em Educação pela Universidade de Brasília (UnB). Gerente da Unidade de Capacitação
Empresarial do Sebrae

219
educativo, é também “locus” da produção de conhecimento.
Ele é compreendido como uma atividade humana por meio da
qual o homem transforma as circunstâncias, ao mesmo tempo
em que é transformado por elas.

Pensar sobre trabalho e educação significa entender que


esses conceitos não são fins em si mesmos. No âmbito da
educação, funcionam como uma aliança com o aluno traba-
lhador, o que significa que, mais do que objetos das ações ou
de estudo, eles devem ser considerados, em todo o processo,
interlocutores ou parceiros.

Esse entendimento é fundamental, sobretudo, para as


atuais mudanças no mundo do trabalho. O que era uma prática
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

comum há dez anos, hoje é considerado como atitude arcaica,


obsoleta. Na década de 80 do século passado, as pessoas
tinham como ideal ter uma profissão (de preferência de nível
superior), trabalhar numa empresa conceituada, com carteira
assinada e todas as proteções.

Hoje, essa configuração mudou. O perfil de quem está no


mercado de trabalho parece apontar para pessoas inquietas,
que mudam de ocupação e de empregador e que têm como
foco a sua própria carreira e não a empresa. Essa mudança de
foco também apresenta o empreendedorismo como ponta de
lança de uma mudança de cultura empresarial e de vida.

A qualificação profissional passou a ser, então, uma de-


manda de primeira ordem para se preparar para o mundo do
trabalho e o empreendedorismo não é mais só alinhado com o
desenvolvimento do próprio negócio.

É possível afirmar que o empreendedorismo é uma tendên-


cia mundial decorrente das relações no mundo do trabalho, e um
dos pilares do desenvolvimento econômico é a existência de in-
divíduos dispostos a empreender. Empreendedorismo, como um
campo de estudo ainda em desenvolvimento, não possui uma

220
conceituação única e consensual. Dessa forma, seus processos
de ensino e aprendizagem não se ajustam ou se submetem a
modelos tradicionais e os seus processos avaliativos não anali-
sam de forma precisa os objetivos e impactos gerados por ele.

Empreender não é uma profissão, mas sim uma postura


diante da vida. O empreendedorismo se debruça sobre o de-
senvolvimento de conhecimentos e habilidades relacionadas à
criação de um projeto – seja ele um projeto de vida, um projeto
técnico, científico, ou laboral. A essência do termo empreender
significa realizar, fazer, executar.

As atitudes empreendedoras vão muito além do conheci-


mento teórico, acadêmico para o negócio. São formas de lidar

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


em qualquer ambiente, seja ele de trabalho ou mesmo das re-
lações pessoais e essas atitudes marcam a busca e alcance de
resultados nas diversas áreas da vida.

A tríade educação, empreendedorismo e trabalho parece


se despontar como uma alternativa de inclusão produtiva para
milhões de jovens e adultos brasileiros. É possível afirmar que
incorporar a discussão e vivência do empreendedorismo nos
currículos oficiais pode aproximar o mundo do trabalho das
portas da escola.

Essa afirmação se pauta na relação estreita entre a tríade.


Está posta a exigência de profissionais com competências para
lidar com um número expressivo de fatores. Velocidade! Essa
é a palavra que melhor representa as transformações no mun-
do do trabalho e em áreas relacionadas ao desenvolvimento
cientifico e tecnológico. Essa velocidade gera novas demandas
para a produção e gestão do conhecimento, além da atividade
profissional.

Nesse sentido, o conceito de competências empreendedoras


passa pelo pensar, ler a realidade, compreender processos, iden-
tificar problemas, propor soluções. Exige articulação entre o fazer

221
e o conhecimento. Um dos desafios da educação profissional é,
sobretudo, considerar a ansiedade dos alunos (jovens e adultos)
frente ao mercado de trabalho, proporcionando essa articulação.

A faixa etária que corresponde à juventude varia de acordo


com países e organismos internacionais. Para a Organização
das Nações Unidas (ONU) é considerado como jovem, a popu-
lação com idade entre 15 e 24 anos.

No Brasil, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geogra-


fia e Estatística (IBGE), o Censo de 2010 aponta que existem
51 milhões de jovens. Os jovens brasileiros engrossam a fila da
evasão no ensino médio que, apesar da diminuição, continua
alta. Passou de 13,7% em 2007 para 9,6% em 2011, de acor-
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

do com o Censo Escolar da Educação Básica (Inep).

Na faixa etária do ensino médio, que é de jovens entre 15 e


17 anos, existem 10,4 milhões de pessoas. Desses, 1,7 milhão
estão fora da escola, segundo a PNAD56 de 2011. Muitos edu-
cadores vinculam o abandono do ensino médio à interrupção
precoce da vida juvenil, com a necessidade de trabalhar.

É consenso entre especialistas da área que o acesso, a


permanência, a qualidade do aprendizado e a conclusão dos
estudos na idade correta exigem do poder público uma amplia-
ção da rede pública de educação e oferta de vagas, bem como
de investimentos na qualidade do ensino.

No caso de jovens e adultos, não é possível garantir a sua


permanência por obrigação ou imposição. Uma escola que não
faz sentido para esses sujeitos, que não reflita o seu projeto de
vida, terá como resultados evasão e repetência. Para o aluno

56 Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios é feita pelo IBGE em uma amostra de domicílios
brasileiros que, por ter propósitos múltiplos, investiga diversas características socioeconômicas
da sociedade, como população, educação, trabalho, rendimento, habitação, previdência social,
migração, fecundidade, nupcialidade, saúde, nutrição etc, entre outros temas que são incluídos
na pesquisa de acordo com as necessidades de informação para o Brasil.

222
trabalhador, essa afirmação adquire ainda mais sentido: não há
como suportar uma escola que não responda às suas necessi-
dades cotidianas.

As expectativas dos jovens são imediatistas, sobretudo


porque a necessária aquisição de cultura, conhecimento e bens
também passa pelo ingresso no mercado de trabalho. São mi-
lhões de jovens e adolescentes que, de alguma maneira, espe-
ram por políticas que os capacite para o atual cenário.

Há um espaço fecundo para políticas públicas. Diante des-


se cenário, o governo brasileiro apresenta o Programa Nacio-
nal de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) como
forma de ampliar a oferta de cursos de educação profissional e

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


tecnológica. Dentre os principais objetivos do Pronatec estão:

1. Expandir, interiorizar e democratizar a oferta de cursos de


educação profissional técnica de nível médio e de cursos
de formação inicial e continuada ou qualificação profissional
presencial e a distância;

2. Construir, reformar e ampliar as escolas que ofertam educa-


ção profissional e tecnológica nas redes estaduais;

3. Aumentar as oportunidades educacionais aos trabalhado-


res por meio de cursos de formação inicial e continuada ou
qualificação profissional;

4. Aumentar a quantidade de recursos pedagógicos para


apoiar a oferta de educação profissional e tecnológica;

5. Melhorar a qualidade do ensino médio.

O Pronatec converge com as ações de empreendedorismo


na educação realizadas e fomentadas pelo Sebrae, que o for-
talece como parte da estratégia de desenvolvimento de todo o
país que pretende ser competitivo. Importante destacar que a
cultura empreendedora está ligada a dois aspectos principais:

223
a abertura de negócios e o desenvolvimento de competências
empreendedoras, esse último ligado à busca de oportunidades
e iniciativa, persistência, comprometimento, estabelecimento
de metas, independência e autoconfiança.

Para fins didáticos, definimos competência como um pro-


cesso que compreende as dimensões saber conhecer, ser/
conviver e saber fazer. É o conhecimento aplicado, a capacida-
de de mobilizar saberes e habilidades para a resolução de uma
questão ou situação.

Destacamos então duas competências indicadas nos Re-


ferenciais Curriculares Nacionais da Educação Profissional de
Nível Técnico (RCNEPT). O documento prevê a construção
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

de saberes para o desenvolvimento de competências ligadas,


dentre outros aspectos: à aplicação de conceitos e princípios
de gestão e à percepção e análise de condições de oportuni-
dade (mercado). Ou seja: o documento reforça a necessidade
de aprender sobre empreendedorismo, além da aprendizagem
por competências.

Como uma das ações vinculadas ao Pronatec, instituiu-se


o Pronatec Empreendedor, que poderá agregar ao programa do
governo federal a perspectiva do autoemprego, além do desen-
volvimento de competências empreendedoras que são funda-
mentais para a “trabalhabilidade” – conceito indicado nos RC-
NEPT como componente da dimensão produtiva da vida social.

Um dos pilares do Pronatec Empreendedor é o estímulo à


reflexão pelo aluno trabalhador do seu projeto de futuro (pes-
soal e profissional) de forma empreendedora. O mundo está
em constante mudança e aprender a lidar com a impermanên-
cia das coisas na vida significa, também, fazer um contraponto
com a necessidade de estabilidade que, muitas vezes, aponta
para um emprego fixo.

O Pronatec Empreendedor abrirá frentes de discussão

224
e qualificação para quem quer fazer parte de um negócio ou
prefere “ter” o seu próprio negócio. Em resumo, suas ações
permitirão a inserção de conteúdos de empreendedorismo nos
currículos da educação profissional, ampliando as possibilida-
des de inclusão produtiva.

Prevê ainda processos de ensino aprendizagem que ob-


jetivam a realização, a inovação e o “chamamento” do aluno
trabalhador ou futuro trabalhador para ser protagonista de sua
vida, promovendo mudanças e transformações nos campos
pessoal e profissional. O Pronatec Empreendedor é um apren-
dizado para a vida.

Para a antropologia, a educação é um processo social pelo

Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora


qual uma geração transmite à outra a sua visão de mundo (va-
lores, princípios, comportamentos) que definem a sua identida-
de coletiva. Para Paulo Freire, a vocação histórica e ontológica
do homem é “ser mais”. A educação, para ele, não é somente o
processo de adaptação do indivíduo à sociedade, mas também
o instrumento que possibilita aos homens transformar a realida-
de, por meio do trabalho, para “ser mais” e desenvolver as suas
potencialidades enquanto sujeito.

Autores como Mészáros, Adorno e o próprio Freire fir-


mam que mais amplamente a educação é a nossa vida. Re-
forçam que educar é conscientizar; é processo de emanci-
pação, de produção da “consciência crítica e verdadeira”,
onde, num processo legítimo recusa a modelagem de pes-
soas, a “transmissão de conhecimentos” e a competição
(2005) (1995) (2004).

Até 2014, a expectativa é de formar mais de 1 milhão de


alunos trabalhadores ou futuros trabalhadores. Agora nos
resta o convite para trabalhar por essa iniciativa, auxilian-
do na concretização de tantos sonhos: de escolas, alunos,
professores e instituições que fazem o Pronatec acontecer
de forma comprometida com e para o mundo do trabalho:

225
seja como empregado-empreendedor – que busca melho-
rias constantes na sua relação com o emprego – seja como
dono do seu próprio negócio – protagonista da sua própria
vida e carreira.

Referências bibliográficas

ADORNO, Theodor W. Educação e Emancipação. Rio de Ja-


neiro: Paz e Terra, 1995.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia, Rio de Janeiro,


Ed. Paz e Terra, 2004.
Capítulo II – Ensino formal e educação empreendedora

KUENZER, Acácia Zeneida. Educação e trabalho no Brasil:


o estado da questão. Brasília. INEP, 1991.

MÈSZÁROS,I. A Educação para Além do Capital. São Pau-


lo. Boitempo, 2005.

226
Capítulo 3
NOVAS TECNOLOGIAS E EDUCAÇÃO
EMPREENDEDORA

Educação empreendedora a distância: acesso,


aprendizagem em rede e conectividade

O desenvolvimento do perfil empreendedor por


meio da comunicação na produção de conteúdo
para cursos de EaD em empreendedorismo

Mantendo o foco no cliente no


desenvolvimento de conteúdos

Caminhos para uma educação empreendedora:


aliança entre comunicação e educação
Educação empreendedora
a distância: acesso,
aprendizagem em rede e
conectividade
Rodrigo Estrela de Freitas57

Inicia-se este artigo esclarecendo que seu propósito não


é situar a educação empreendedora em um referencial teórico

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


para definir seu conceito, fundamentos ou objetivos. Este texto
destina-se a discutir os mecanismos utilizados para tornar a edu-
cação empreendedora um conteúdo livre, de fácil acesso e, so-
bretudo, transformador. A opção por não definir um público-alvo
específico para o contexto da educação a distância empreende-
dora é justamente universalizar sua constituição respeitando as
diferentes necessidades de conteúdo e aprendizagem.

Ainda que o foco não seja fundamentação teórica é pre-


ciso reconhecer que a formação para a educação empreende-
dora está voltada para o desenvolvimento de conhecimentos,
técnicas e habilidades do mundo dos negócios. A promoção
deste desenvolvimento é justamente oferecer algum tipo de
segurança ao empreendedor ao se lançar no mercado. Com
educação empreendedora “o empreendedor estaria instru-
mentalizado para lidar com a complexidade, a incerteza e a
necessidade de aproveitar a oportunidade antes que ela deixe
de existir” (Lopes, 2010:24).

57 Jornalista, especialista em Direitos Humanos (Universidad Pontifica de Salamanca), doutorando


em Direitos Humanos (Universidad de Salamanca). Analista Técnico da Unidade de Atendimento
Individual e gestor do projeto de educação a distância do Sebrae.

231
Educação como direito do cidadão

O ponto de partida é a própria educação como um direito


social previsto no art. 6º da Constituição Federal. O resgate legal
não é apenas para legitimar o texto constitucional, mas para re-
lacionar com outro direito implícito que é a qualidade do exercício
deste direito no que se refere ao acesso, aos conteúdos com-
partilhados e principalmente a conexão destes com a realidade
do aluno. Seria uma nova perspectiva exigir que tal educação
constitucional alcançasse a promoção da construção do conhe-
cimento a partir da troca de experiências entre os indivíduos?

Para tratar desta possibilidade trazemos a educação


Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

empreendedora como exemplo prático. Não apenas por se


apresentar como um tema transversal na educação formal,
mas, por trabalhar com conteúdos que demonstram que é
possível agregar valor a todo e qualquer tipo de conhecimen-
to adquirido ou construído para aqueles que desejam abrir
ou possuem seu próprio negócio. Isso porque a educação
empreendedora pode ser um importante passo na ampliação
das capacidades do cidadão58.

O tema do empreendedorismo foi tratado muito tempo


como um conteúdo de responsabilidade individual. Ou seja, o
interesse e esforço na busca de informações são exclusivos
do proprietário do negócio. Muitos governos apropriaram-se
deste pensamento para justificar suas ausências no apoio
ao empresário, principalmente dos pequenos negócios. “Há
quem afirme que depender de terceiros não só é eticamente
problemático, como também derrotista do ponto de vista prá-
tico” (Sen, 2000:321).

58 Amartya Sen (2000) na obra “Desenvolvimento como Liberdade” trata a pobreza como uma das
principais causas de redução das capacidades do homem. Apesar da relatividade da relação ren-
da X capacidade, a condição econômica pode ser o ponto crucial para o exercício da liberdade.

232
O papel do Sebrae

O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Em-


presas (Sebrae) ao levantar a bandeira da educação empreen-
dedora não apenas ampliou as possibilidades de garantia das
liberdades sociais e econômicas como determinou que a for-
mação para o empreendedorismo é uma responsabilidade de
mão dupla. O próprio nome da instituição lhe confere o papel
de apoio ao micro e pequeno negócio. Tal palavra elimina
qualquer interpretação de ação paternalista do Estado que
nesse caso não intervém nas escolhas do indivíduo, mas, sim
cria oportunidades de escolhas.

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


A educação a distância surge no Sebrae como aliada fun-
damental na garantia de acesso ao tema do empreendedoris-
mo. Moore e Kearsley (2005:8) já diziam que os responsáveis
por políticas em nível institucional e governamental têm introdu-
zido a educação a distância para “acesso crescente a oportu-
nidades de aprendizado e treinamento, proporcionar oportuni-
dades para atualizar as aptidões e aumentar as aptidões para a
educação em novas áreas de conhecimento”. Essas são ape-
nas algumas das vantagens de utilização da EaD como meto-
dologia de aprendizagem. O foco no acesso e na ampliação de
aptidões justifica o porquê de a educação empreendedora ser
ofertada a partir de sistemas educacionais a distância, mediada
ou não pela tecnologia.

No último censo realizado pela Associação Brasileira de


Educação a Distância (Abed) em 2010 o número de matrícu-
las em cursos a distância foi de 2.261.291. O Sebrae realizou
no mesmo período em seu projeto de educação a distância
675.851 matrículas. No total, o projeto “EaD Sebrae: cursos
pela internet” já acumula nos seus doze anos de existência
mais de 3 milhões de alunos matriculados. A inserção da me-
todologia de cursos a distância vem acompanhada da preo-

233
cupação com a melhoria da qualidade do processo ensino
aprendizagem e do uso vada vez melhor das tecnologias dis-
poníveis. Isso porque o fator acesso já demonstra sucesso
absoluto no que se refere a educação empreendedora tanto
nas grandes instituições como no caso do Sebrae.

Educação aberta e massiva



Com isso trazemos à tona a discussão sobre os “Massi-
ve Open Online Courses” conhecidos como MOOC. Presen-
tes em vários países, como os Estados Unidos59, Canadá,
Escócia e França, os cursos abertos on line para as massas
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

podem deixar de ser uma tendência para compor uma reali-


dade que pode ser a solução para o problema de acesso à
educação. “A educação através da internet vai ser tão gran-
de, que vai fazer o uso de e-mail parecer com um erro de ar-
redondamento em termos de capacidade de processamen-
to que irá consumir” disse o CEO (Chief Executive Officer)
da Cisco, John Chambers, em reportagem da revista Times
(2000 apud Rosenberg, 2002:15).

O jornal The New York Times60 publicou em novembro de


2012, em sua coluna sobre educação, a matéria “The year of
the MOOC”. Parte da justificativa da referida publicação estava
no sucesso da experiência das universidades de Harvard e do
Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) que alcançaram
no outono de 2012 cerca de 370.000 alunos no projeto que

59 Milhões de dólares foram investidos para a criação desses robustos meios de aprendizagem. As
aulas são disponibilizadas com professores qualificados e equipe conhecedora dos recursos de
multimídia interativa próprios do design instrucional dos cursos eletrônicos. Harvard e MIT coloca-
ram 60 milhões dólares em um MOOC sem fins lucrativos chamado EDX. Acesso em 10.03.13:
http://blog.brasilacademico.com/2012/10/mooc-cursos-gratuitos-online-para-as.html
60 http://www.nytimes.com/2012/11/04/education/edlife/massive-open-online-cour-
ses-are-multiplying-at-a-rapid-pace.html?pagewanted=all&_r=0

234
resultou a EDX61. Porém, nada se comparava a experiência da
Coursera62 que iniciou suas ofertas em janeiro de 2012 e já ha-
via registrado na data da matéria mais 1,7 milhão de alunos, de-
monstrando um crescimento mais rápido que o do Facebook.

A questão do acesso para países como os Estados Uni-


dos não parece ser um complicador para os cursos abertos
on line, uma vez que a única exigência para realizá-los é um
computador e conexão a internet. Para o Brasil essa realida-
de ainda não é uma máxima, mas, cabe às instituições que
lideram projetos dessa natureza refletir sobre as estratégias
que garantam uma oferta de qualidade. Desde a criação dos
veículos de comunicação de massa que qualquer informação
que seja entregue em larga escala será questionada. Para a

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


educação isso não seria diferente.

No entanto, os MOOC procuram criar ambientes onde a inte-


ração e construção de comunidades (ainda que virtuais) estejam
presentes em suas ofertas. Para isso, é necessário responder
a pergunta: como criar ambientes personalizados de aprendi-
zagem quando se trata de milhares e milhões? De que forma
garantir que haja efetividade na aprendizagem em larga escala?

Os ambientes personalizados
de aprendizagem

O primeiro paradigma a ser quebrado é de que não é possí-


vel construir um ambiente de aprendizagem capaz de respeitar as

61 www.edx.org.com
62 Empresa americana que faz parceria com as melhores universidades do mundo e
oferece cursos online de graça. Inicialmente, a organização firmou parcerias com
13 universidades americanas e três estrangeiras, entre elas as cobiçadas univer-
sidades de Princeton e Stanford, oferecendo 43 cursos nas mais diversas áreas,
incluindo tecnologia, ciências humanas, saúde e astronomia.

235
particularidades do indivíduo quando se trata de cursos em mas-
sa. A resposta estaria no que os estudiosos da educação a dis-
tância estão chamando de Personal Learning Enviroments (PLE)
(Ambientes Personalizados de Aprendizagem). O paper publicado
por Graham Attweel, Diretor de Pesquisa da Pontydysgu, chama-
do de “Personal Learning Enviroments: the future of e-learning”
trata exatamente da possibilidade de desenvolvimento de ambien-
tes virtuais de aprendizagem personalizados.

Attwell cita em outra publicação sobre o mesmo tema um


importante dado de Cross que revela que 85% da aprendiza-
gem é a aprendizagem informal (apud Attwell, 2006). Tal infor-
mação torna-se importante principalmente quando tratamos de
educação empreendedora, levando em consideração que gran-
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

de parte do aprendizado de um empresário se dá na rotina da


gestão do seu negócio, ou seja, em processo de informalidade.
O desafio de quem promove a educação empreendedora neste
contexto é criar mecanismos que permitam ao indivíduo con-
trolar sua própria aprendizagem e tornar sua rotina um aliado
na construção de novos conhecimentos capazes de alterar sua
realidade. É tornar o aprender fazendo menos traumático.

É importante lembrar que o PLE não é um novo sistema,


um novo LMS, e sim um novo conceito de organização da
aprendizagem (Attwell, 2006; Wilson, 2008). Esse novo concei-
to pode ser aplicado quando o aluno tem a liberdade de con-
trolar o conteúdo que está sendo apresentado, a aparência do
ambiente em que ele deseja aprender e, principalmente, quais
as ferramentas que deseja utilizar para interagir com os demais
indivíduos e com a instituição que disponibiliza os conteúdos.

Na prática qualquer espaço de aprendizagem a distância


onde o aluno é responsável por desenhar seu ambiente deve
oferecer no mínimo oito possibilidades de customização nos
seguintes espaços: bate-papo e ferramentas de mensagens;
groupware e ferramentas de comunidade; calendário, progra-

236
mação e ferramentas de gestão de tempo, ferramentas de agre-
gação de notícias, weblogs e outras ferramentas pessoais de
publicação de software; social; autoria e ferramentas de colabo-
ração e ferramentas de integração (CETIS, 2006; Wilson, 2008).

O que fica claro nesse novo conceito de educação a dis-


tância é que os ambientes personalizados de aprendizagem
devem permitir o maior número possível de recursos, compor-
tar os mais variados tipos de tecnologia. Para Attwell (2007), a
importância de agregar vários recursos é o desejo de apoiar a
qualquer hora, em qualquer lugar o processo de aprendizagem.
Por isso, os PLE devem ser capazes de também apoiar a co-
municação nos dispositivos móveis.

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


Pensando nessa possibilidade de alcance o Sebrae desenvol-
ve soluções de educação empreendedora para os empreendedo-
res individuais através de diferentes midias. Os conteúdos das so-
luções Sebrae para Empreendedores Individuais (SEI) podem ser
encontrado através de recursos como internet, SMS e áudio livro.

O desafio das instituições que oferecem conteúdos a dis-


tância é criar espaços virtuais onde o usuário possa realizar
mudanças substanciais no seu ambiente de aprendizagem. Po-
rém, as atuais estruturas permitem alterar apenas aquilo que
estão autorizados a alterar (Corlettet al., 2005). O exemplo da
dificuldade de se promover educação a distância em sistemas
com estruturas fechadas é quando se precisa trabalhar com um
novo LMS, onde alunos e tutores terão que aprender a navegar
novamente no mesmo curso em uma diferente plataforma. Isso
porque a concepção das plataformas de educação a distância
estão relacionadas a publicação e não na criação ou cocriação
de conteúdos. O ideal seria desenvolver estruturas onde o foco
é o conteúdo que será produzido e não a ferramenta.

No momento em que se consegue promover um ambien-


te personalizado, significa que a produção do conhecimento
também será personalizada. A prova desta capacidade de

237
produção está na pesquisa da “Pew Internet and American
Life Project” que indica que 64% dos jovens entre 12 e 17
anos criam conteúdo a partir de ferramentas de mídia social
(2007). Outro dado interessante é que 50 milhões de adul-
tos em idade universitária estão blogando (Downes, 2006).
Quando se estimula a produção de conhecimento a distân-
cia significa que a chance de criação de redes e conexões é
maior. Dessa forma, o indivíduo aumenta a probabilidade de
compartilhar conteúdos do seu dia a dia, criando a chamada
conectividade.

O conectivismo ou a
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

importância das conexões

Para a educação empreendedora a conectividade talvez


seja o maior dos desafios no processo de ensino e aprendi-
zagem. Pois, cabe ao aluno encontrar sentido prático do que
está sendo apresentado para o seu negócio. A exemplo dos
quatro pilares educacionais da Unesco – aprender a ser, apren-
der a conhecer, aprender a viver com os outros e aprender a
fazer – que pressupõe na sua aplicação o desenvolvimento da
capacidade de relacionar os conteúdos apresentados com a
experiência real e presente dos alunos.

Tal capacidade está intimamente relacionada ao poder das


conexões. No caso da educação a distância estas conexões são
possibilitadas pelas mais diversas tecnologias disponíveis. Por isso,
estimula-se com maior frequência que seja praticada a aprendiza-
gem em rede, pois, quando se fala em processo de aprendizagem
em rede fala-se no poder das conexões. E foi justamente no olhar
colaborativo e social da aprendizagem de Vygotsky e na valoriza-
ção da individualidade na cibercultura de Lévy que os ambientes
de construção coletiva do conhecimento são fundamentados.

238
Para Conner e Bingham (2011), a mente do século XXI é
coletiva. Nela acessamos o que sabemos no cérebro dos ou-
tros. E é na coletividade que a inteligência surge para solucio-
nar problemas mais desafiadores. Os nossos conhecimentos
isolados podem não ser tão poderosos, mas, unidos a outros
conhecimentos (através da nossa rede de relacionamento) po-
dem alcançar resultados inesperados.

Para Christakis (2010) o networking que estabelecemos é


o que irá moldar a estrutura das nossas vidas. Se a presença
do outro é tão importante na nossa formação então jamais de-
vemos excluí-lo do processo de aprendizagem. Logo, vê-se a
importância das soluções de educação empreendedora criarem
espaços de diálogo e troca de conhecimentos entre os mais

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


variados tipos de empreendedores.

Mas, como estabelecer essa conectividade entre pessoas,


tecnologias e a própria informação? Os pesquisadores George
Siemens e Stephen Downes tem se destacado no âmbito desta
discussão. Siemens, por exemplo, acredita que as conexões são
a base de uma nova teoria de aprendizagem chamada Conecti-
vismo. Antes de explica-la é importante ressaltar que esta teoria
não invalida as demais teorias da aprendizagem. Para Siemens
(2008), “todas as ideias são herdeiras de outras e todos os con-
ceitos têm raízes”, logo, existe um reconhecimento nas diversas
contribuições originárias das grandes teorias da aprendizagem.

O Conectivismo fundamenta-se na era digital e no excesso


de fontes de informação e perspectivas. A base dessa teoria é
compreender o comportamento do aprendiz do século XXI em
meio ao bombardeio de informações onde se faz necessário
desenvolver uma estratégia crítica capaz de filtrar e encontrar
um sentido ao caos. Em tempos de abundância de informação
e, principalmente, com a redução do tempo de vida do conhe-
cimento até que se torne obsoleto, a capacidade de avaliá-lo
rapidamente é muito valorizada (Siemens, 2008).

239
Para a educação empreendedora criar conexão de temas
como marketing, finanças, cooperativismo, formação de preço
de venda, compras governamentais etc com o negócio do pe-
queno empresário tona-se um objetivo cada vez mais persegui-
do. Isso porque é preciso estimular a criação de várias fontes
de informação que podem contribuir positivamente para o em-
preendimento. Por isso, torna-se necessário valorizar modelos
formais e informais para que a aprendizagem ocorra de maneira
contínua e inerente a rotina.

Parte da preocupação de pessoas e instituições que lidam


com a educação empreendedora está exatamente na lentidão
dos processos educativos que não acompanham a velocidade
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

do mercado e todas as possibilidades ofertadas por novas fer-


ramentas de aprendizagem que são colocadas a disposição.
O crescimento exponencial do conhecimento, a investigação
emergente (em neurociência e em inteligência artificial), novas
filosofias do conhecimento (knowing) e a complexidade cres-
cente, que requer um saber e uma interpretação distribuídos,
já não encontram respostas suficientes nas grandes teorias da
aprendizagem existentes (Siemens apud Mota, 2009).

Nas plataformas de ensino a distância o conectivismo


ocorre a partir da inclusão da tecnologia no processo cognitivo.
As possibilidades de troca e criação de conteúdos são inúme-
ras nas funcionalidades disponíveis. O importante é utilizá-los
a favor do usuário já que o conhecimento fundamenta-se nas
conexões que são estabelecidas com pessoas e fontes de in-
formação, como bases de dados.

Considerações finais

Em outubro de 2010, Sthephen Downes escreveu a car-

240
ta “What is democracy in Education63” para o fórum virtual da
UNESCO, o Open Educational Resources. Nesse texto Downes
elenca quais seriam os quatro princípios necessários para tor-
nar a educação efetivamente democrática. O mais interessante
destes princípios é justamente sua relação com as tendências
descritas ao longo deste arquivo e sua perfeita aplicabilidade à
educação empreendedora. Seguem os princípios:

• Autonomia – Os sistemas e recursos educacionais de-


vem ser desenvolvidos de forma que os alunos possam
ser orientados de acordo com suas próprias metas, pro-
pósitos, objetivos e valores. Na educação a distância os
sistemas de Personal Learning Enviroment (PLE) permitem
tal autonomia.

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


• Diversidade – A autonomia nos sistemas e recursos educa-
cionais só podem ser maximizados quando as experiências
pessoais de conhecimento forem reconhecidas como valiosa
contribuição para o todo. A criatividade nasce da liberdade
de exercer sua cognição sobre determinado conteúdo. A di-
versidade pode ser reconhecida nos sistemas PLE onde não
só existe autonomia como a possibilidade de conceber um
ambiente de acordo com as perspectivas do usuário.

• Abertura – O acesso aos sistemas e recursos educacionais


deve ser livre. Não apenas no que se refere a gratuidade, mas,
na liberdade de ideias e de fluxo. O aluno pode entrar e sair a
qualquer momento. Este princípio conversa diretamente com
a proposta dos Massive Open Online Courses (MOOC).

• Interatividade – Princípio basilar não apenas para a demo-


cracia como para a própria teoria do conectivismo de Do-
wnes. A imersão do aluno em sua comunidade a partir do

63 Version 1.0 – May 19, 2012 Stephen Downes.Connectivism and Connective Knowledge – Es-
says on meaning and learning networks. Disponível em: http://www.downes.ca/files/books/
Connective_Knowledge-19May2012.pdf

241
processo interativo é quem vai garantir sua conexão e acú-
mulo de diversificados conhecimentos. Afinal de contas a
sociedade é produto de interações cumulativas.

É surpreendente como o pensamento de Downes pode


tornar a educação empreendedora uma arma poderosa não
apenas para o desenvolvimento econômico, mas, principal-
mente para emancipação do cidadão.

Veja que tratou-se do acesso aos sistemas educacionais,


depois foi refletido de que forma inserir o aluno em um sistema
que não seja padronizado limitando sua autonomia e criativi-
dade e logo depois trouxe a tona a conectividade como ins-
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

trumento de respeito a diversidade, identificação comunitária e


produção coletiva de conhecimento.

A educação a distância sem sombra de dúvidas é um


importante aliado para democratizar o acesso, respeitar a di-
versidade e promover a aprendizagem em rede. Competem
as instituições públicas e privadas o desafio de tratar o em-
preendedorismo como um tema parte do direito social cons-
titucional à educação, onde de forma gratuita e livre o aluno
poderá conhecer esse universo (não restrito a acadêmicos
e grande empresários) e compartilhar com sua comunidade
possibilidades de aplicá-los e, principalmente, ampliar sua
capacidade transformadora.

E, acima de tudo, transformarem-se continuamente alian-


do à educação novas formas e conceitos, novas tecnologias e
metodologias a bem da cidadania, do empreendedorismo e do
desenvolvimento social e econômico.

242
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LHuf8&dl

244
O Desenvolvimento do
Perfil Empreendedor por
meio da Comunicação
na Produção de Conteúdo
para Cursos de EaD em
Empreendedorismo
Rita Vucinic Teles64

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


Introdução

A presente experiência do Sebrae em São Paulo (Sebrae


SP) pretende mostrar os resultados positivos para o desen-
volvimento do perfil empreendedor, por meio da inovação na
metodologia de transposição de cursos autoinstrucionais de
Educação a Distância (EaD), via internet.

O design arrojado e o desafio proposto para soluções de


problemas na área de empreendedorismo atraem e prendem a
atenção nas atividades propostas, favorecendo a prática dos
conceitos.

Os textos abriram espaço para ilustrações, fotos, vídeos,


personagens, áudio, cenário, jogos entre outros recursos tec-

64 Coordenadora de Educação a Distância do Sebrae SP. Atua como Consultora Educacional, for-
mada em Letras. Pedagoga, especialista em Gestão Empresarial e Marketing pela Fundação
Armando Álvares Penteado (FAAP-SP), especialista em Design Instrucional para Educação a
Distância pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF-MG). Mestranda em Engenharia da
Informação da Universidade Federal do ABC (UFABC).      

245
nológicos e de comunicação que facilitam o processo de apren-
dizagem nos cursos de empreendedorismo a distância.

Toda a gama de material didático e multimeios se comple-


mentam para aguçar os sentidos, estimulando assim a percep-
ção, memória e interação dos alunos entre eles e com o conteúdo.

Do Texto às Multimídias

Os profissionais da área educacional estão cada vez mais


envolvidos no processo de criação e desenvolvimento de cur-
sos via internet. Antes dominadas por pessoas ligadas à tec-
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

nologia, as equipes que desenvolvem ou transpõem cursos via


internet contam atualmente com diversos profissionais como
pedagogos, especialistas em educação a distância (EaD) e em
métodos educacionais. Os educadores estão se apropriando
das tecnologias educacionais para, por meio delas, facilitar o
processo de aprendizagem dos alunos.

Segundo Lhamas, a EaD é uma estratégia educativa ba-


seada na aplicação da tecnologia à aprendizagem e, por isso,
não obedece a limites de lugar, tempo, ocupação ou idade.
Elementos esses que demandam novos papéis para alunos e
professores, bem como novas atitudes e novos enfoques me-
todológicos (Alves; Zambayde e Figueiredo 2004).

No início da década de 1960, os cursos a distância tinham


o mesmo formato textual das apostilas usadas em sala de aula.
Além dos alunos disporem apenas do recurso de texto, sem
qualquer tratamento, ainda sofriam por estudar sozinhos. O
texto enfadonho e a solidão levavam à desistência do curso,
caso o estudante não fosse por natureza, disciplinado.

A partir dos anos 90, com o advento de cursos pela in-


ternet, para minimizar o sentimento de solidão e aumentar a

246
interação, adotou-se a figura do professor, tutor ou monitor
para estimular a troca entre os alunos de uma turma e o uso
de ferramentas interativas como o chat, fóruns, comunidades
e blogs. Os profissionais passaram a atuar como animadores
dos cursos, estes fortemente apoiados pelas tecnologias que
permitem a comunicação entre os alunos, dando, certamente,
mais dinamismo ao curso, aproximando-se do modelo de sala
de aula, ao preservar as trocas de informações e o enriqueci-
mento resultante desse processo interativo; (Morin 1996).

Por outro lado, conteúdos autoinstrucionais desenvolvidos


pensando no aluno a distância, sem o apoio da tutoria, garantem
flexibilidade de horários de estudo e separados em pílulas sobre

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


temas que se complementam, contribuem para ampliar o acesso
de pessoas, dentre essas, os empresários à capacitação.

Em um processo evolutivo de desenvolvimento do material


didático, os textos abriram espaço para ilustração, fotos, jogos,
animação e vídeo – recursos esses que se traduzem em novas
formas de comunicação pelos sentidos, que facilitam a apren-
dizagem e prendem a atenção do aluno.

Esse conjunto de recursos e alternativas compõe a oferta


de cursos autoinstrucionais. Recursos esses que se bem se-
lecionados e articulados com o tema e entre eles viabilizam o
sucesso desses cursos.

A experiência do Sebrae SP narrada a seguir apresenta


essa metodologia inovadora de design de cursos autoinstrucio-
nais para educação on line, com o apoio de tecnologias facilita-
doras do processo de comunicação, interação e aprendizagem
que contribuem fortemente para o desenvolvimento de habili-
dades e atitudes do empreendedor.

247
Metodologia Educacional Sebrae SP

Podemos afirmar que a sociedade e a academia vêm acei-


tando cada vez mais que a educação a distância representa
uma forma própria de educar que apresenta técnicas inovado-
ras com processos de comunicação que estimulam a autono-
mia crítica dos alunos; (Nascimento L 2004). A utilização dos
diferenciados canis e meios de comunicação pode enriquecer
o processo educacional, permitindo, dentre outros aspectos,
maior flexibilidade e criatividade.

Os cursos autoinstrucionais do Sebrae SP modificaram o


modelo tradicional de comunicação em que se tem um emis-
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

sor, a mensagem e o receptor da mensagem.

Quadro 1 – Modelo de comunicação Tradicional

Tradicional: Emissor – Mensagem – Receptor

Nos modelos de cursos autoinstrucionais em que o em-


preendedor aprende de forma totalmente independente e autô-
noma o emissor apresenta-se de forma oculta e é representado
pela mídia utilizada. A utilização de mediações (mídias) rompe
com o modelo tradicional de comunicação em que desaparece
o sujeito personificado (Medeiros 1990).

248
Quadro 2 – Modelo de comunicação em Cursos de EaD

Cursos EaD: Emissor (oculto) – Mídia – Mensagem – Receptor

O emissor oculto, personalizado, pode ser representado


pelo uso de personagem. O personagem dialoga com o empre-
sário durante todo curso, em linguagem de fácil compreensão
e direta, vivencia as situações-problema apresentadas no dia a
dia de um negócio e sugere soluções cabíveis para o proble-
ma em questão. Essa estratégia permite que o empreendedor
acompanhe passo a passo a implantação de todos os concei-
tos da gestão de um negócio na prática.

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


• O personagem é animado e ilustrado com características
muito próximas do perfil do público-alvo, para que haja iden-
tificação do empreendedor e simpatia com o personagem.
O empresário ao se identificar com o personagem se verá
na figura dele, favorecendo a aceitação e compreensão dos
conceitos e dicas de uma forma natural sem qualquer resis-
tência. Para exemplificar: o personagem que representa o
Microempreendedor Individual comunica-se com linguagem
e traços simples, apresenta-se vestido informalmente e viven-
cia as situações de um empreendimento que se enquadra na
legislação do microempreendedor individual. O personagem
vivencia uma história fictícia contextualizada na realidade do
empreendedor, favorecendo o seu aprendizado.

• O personagem exerce diferentes papéis, entre eles, o de


apresentador do curso – que atua na abertura e convida o
empreendedor a assistir a um vídeo, a fazer uma atividade
e ao final do curso indica outros temas de gestão empre-
sarial complementares. Esse personagem se repete em um
conjunto de cursos, estabelecendo de forma contínua a co-
municação com os empresários.

249
Arquivo Sebrae SP
Figura 01: Exemplo de Personagem
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

Fonte: Curso Qualidade no Atendimento do Sebrae SP

Já um modelo de comunicação com três tipos de mídias


ou mais terá diversas outras interferências que serão deter-
minadas pelas características das mídias utilizadas, ou seja,
abrangem recursos visuais, auditivos ou textuais.

Quadro 3 – Modelo de Comunicação com três Mídias

– Mídia ­–
Emissor (oculto) – Mídia – Mensagem – Receptor
– Mídia –

O emissor é oculto, pode ser representado por um entrevis-


tado, ou por outro empresário que conta como teve atitude em-
preendedora em sua empresa para ilustrar a aplicação do con-
ceito. Por meio de mídias como televisão, vídeos e animações,
exploram-se imagens, e sons (audiovisual), insere-se no curso
elementos que contextualizam os conceitos, exemplifica-os com
situações reais, concretas do cotidiano prático do tema.

250
• Apresentação de vídeos com exemplos práticos de empre-
sários reais que mostram como resolvem os seus problemas.
Os vídeos podem trazer os mais variados exemplos, ricos em
situações inovadoras e criatividade nas soluções de proble-
mas do dia a dia de um negócio. Vídeos com temáticas que
abordam valores que ativam a reflexão e influenciam impulsio-
nando a ação do empresário na melhoria de seu negócio.

• Entrevistas com consultores especialistas e trechos de pro-


gramas de TV são opções de recursos usados para escla-
recer e apresentar exemplos reais de aplicação de atitudes
empreendedoras.

Em relação aos vídeos e animações, a função é a de

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


sintetizar de forma visual os conceitos, contribuindo para
despertar a curiosidade do aluno (Lasser 1990). A vantagem
essencial do vídeo educacional é que o conteúdo transmi-
tido através dele pode ser retransmitido de acordo com a
necessidade de reforço do aluno em diferentes momentos,
em tempo hábil (Moore 2007).

Arquivo Sebrae SP

Figura 02: Exemplo de Vídeo

Fonte: Curso Criatividade do Sebrae SP

251
Contribuem com os modelos de comunicação midiáticos
também as metáforas, cenários, jogos, Ilustrações e fotos
entre outros, possibilitam contextualizar os conteúdos na
realidade do empresário através das imagens e do lúdico.
Eles expressam comunicação não verbal, apelo à imagem,
ao sentido da visão.

Arquivo Sebrae SP
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

Figura 03: Exemplo de ilustração

Fonte: Curso Qualidade no Atendimento do Sebrae SP

A metáfora contempla todos os elementos necessários para


criar um ambiente que acolha os alunos no contexto do curso. Em
um sentido mais amplo é a figura de palavra em que um termo
substitui outro em vista de uma relação de semelhança entre os
elementos que esses termos designam. Essa semelhança é re-
sultado da imaginação, da subjetividade de quem cria a metáfora. 

A metáfora nos cursos de empreendedorismo se traduz


no enredo para se trabalhar o tema adequado à realidade
das micro e pequenas empresas e dos empreendedores
paulistas, como por exemplo: análise da qualidade no aten-

252
dimento de um complexo de lojas com vendas em baixa para
identificação de possíveis problemas. O enredo gira em tor-
no de “busca de soluções para os problemas das baixas
vendas em lojas de uma galeria”.

Em tese, as metáforas são selecionadas de acordo com o


propósito do curso e as características do público-alvo, em sen-
do assim um tema desenvolvido para um grupo de empresários
sugere que a metáfora seja um reflexo do ambiente empresa-
rial, com personagens que interagem nas situações do ambiente
empresarial, como uma poderosa ferramenta midiática que con-
textualiza os conteúdos na realidade do aluno. A familiaridade
com o cotidiano representado nas metáforas desperta a curiosi-
dade em conhecer os temas e desafia o aluno a explorar o curso.

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


Arquivo Sebrae SP

Figura 04: Exemplo de Metáfora de um Negócio

Fonte: Curso EI – Empreendedor Individual do Sebrae SP

Os cenários ilustram o ambiente objeto da metáfora, materiali-


zando-a visualmente com todos os elementos que remetem a
realidade que o cenário inspira.

253
Arquivo Sebrae SP

Figura 05: Cenário – Palco de um Programa


Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

Fonte: Curso qualidade no Atendimento do Sebrae SP

A metáfora do programa de TV com dois apresentadores


que interagem entre si é representada no cenário de um placo,
local onde o programa acontece e a problemática do curso se
desenvolve.     

O cenário deve retratar situações de um ambiente empre-


sarial e servir de palco para a expressão de atitudes empreen-
dedoras. Os mais variados espaços são utilizados como cená-
rio, por exemplo, praças públicas, complexo comercial de lojas.

Nos cenários são colocados elementos de interação entre


os alunos e o conteúdo. São exemplos de objetos de interação
blocos de notas, quadros de aviso, câmaras de filmagem, TV,
telefone, rádio, calculadoras, agendas, janelas, entre outros.

254
Quadro 4 – Modelo de Comunicação Complexo

– Mídia –
Emissor (oculto) – Mídia – Mensagem – Receptor
– Mídia –

Em um sistema pedagógico complexo as ferramentas de co-


municação geram comunicação bidirecional em que o receptor
também é um emissor de mensagens como mostra o quadro aci-
ma. As ferramentas como chat, forúns, e redes sociais utilizadas
no curso contribuem para que ocorra a comunicação de maneira
dinânica entre os alunos, de forma que as trocas permitam que
construam e reconstruam conhecimentos (Medeiros 2001).

Durante o curso a síntese de conteúdos de relevância são

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


propostas em frases para serem disponibilizadas pelos empre-
sários nas redes sociais, levando desta forma, o conteúdo de
dentro do curso para fora na web, nas comunidades empreen-
dedoras dos empresários para reflexão dos grupos que com-
partilham e debatem as atitudes empreendedoras.

A comunicação de um para muitos ocorre, por exemplo,


com o uso de fóruns e listas de discussão na web, sendo que
todos que têm acesso enxergam as intervenções e fazem as
suas próprias. A comunicação de muitas para muitas pessoas
ocorre na criação de um grupo virtual, como é o caso de co-
munidades colaborativas em que todos participam da criação e
desenvolvimento da comunidade (Lasser 1990).

Naturalmente, a diversidade de ferramentas de comu-


nicação tem características próprias que devem ser cuida-
dosamente pensadas na concepção de um modelo de co-
municação-educação. A experiência comprova que o design
instrucional dos conteúdos com o uso das mídias tais como
personagens animados, cenários, vídeos, áudio e metáforas se
comunicam com o empreendedor a todo tempo confirmando
e reconfirmando a compreensão dos conteúdos por meio de

255
diferentes formas. E que a comunicação entre as pessoas com
participação ativa dos sujeitos de aprendizagem contribui para
a construção de novos saberes e a prática do comportamento
empreendedor.

Atividades, interação e
reforço do aprendizado

São inúmeros os elementos de comunicação não verbal,


de fotos, imagens a ícones, atividades e jogos, tudo a todo
tempo se comunica com o receptor da mensagem.
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

A) Ícones

Ícone é representação gráfica de objeto, conceito ou ação.


Ele é elemento de interface, então ele não deve ser desenvolvido
para ser apreciado, mas criar interação com o usuário. A interativi-
dade do empresário com os conteúdos do curso é reforçada por
meio de conteúdos disponibilizados ao se clicar em ícones:

• Importante: Pontos que precisam ser realçados e perce-


bidos para chamar a atenção do empresário e reforçar a
compreensão dos temas, bem como as indicações de ou-
tros cursos da grade.

• Saiba Mais: Material adicional sobre o tema que poderá ser


baixado com o intuito ainda de ampliar a visão do empreen-
dedor.

• Dicas: São elementos, sugestões de como fazer para que


o empresário possa aplicar na rotina de gerenciamento do
negócio.

• Curso para Download: Opção de estudar “online” ou off

256
line” – oferta do curso em formato para impressão para
que o empreendedor reveja os conteúdos estudados ou
opte por estudar “online” ou “off line”.

• Clique aqui – Indicação de programas, softwares que


apoiam o empresário no desenvolvimento de soluções em-
presariais.

• Central de Ajuda – Atender as dúvidas dos empresários.

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


Fonte: Ambiente Educacional do Sebrae SP

B) Exercícios

As atividades sugeridas são para que o empreendedor


possa refletir sobre o conteúdo apresentado de forma prática,
para que imediatamente tenha subsídios para pensar na sua
empresa e encontrar alternativas para os seus problemas do

257
dia a dia. São questões como: “com base no conteúdo apre-
sentado, agora reflita sobre a sua empresa, pense e construa
a sua meta, aonde você quer chegar ...”. As atividades devem
refletir o fazer – a experimentação dos conceitos e formas de
agir e tomar decisões.

Arquivo Sebrae SP
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

Figura 07: Atividades que levam a reflexão no negócio próprio

Fonte: Curso de Design do Sebrae SP

C) Jogos

Os jogos exercem papel relevante na educação, na medida


em que instigam e desafiam os alunos didaticamente a cons-
truir conhecimentos. Nos cursos do Sebrae SP o empreende-
dor é constantemente desafiado a colocar em prática a sua
criatividade por meio de jogos lúdicos que forçam a analise de
problemas complexos, de forma leve sem exaustão. São ta-
buleiros de jogos de dados, labirinto, jogos da verdade entre

258
outros que são explorados de forma intuitiva.

Arquivo Sebrae SP

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


Figura 08 – Jogos de empreendedorismo –
Perfil e Habilidades Empreendedoras

Fonte: Curso de Empreendedorismo do Sebrae SP

Planejamento Didático
Pedagógico de Cursos de EaD

O empreendedor é ponto de partida do processo de apren-


dizagem. Assim, as novas informações, conceitos e experiên-
cias colocados ao seu alcance promovem mudanças em seu
conhecimento adquirido, contribuindo a cada passo para a
construção de um novo conhecimento.

O importante é perceber que o uso das Tecnologias de In-

259
formação e Comunicação (TIC) deve buscar mapear o conjunto
de tarefas e questões para a implantação e desenvolvimento
dos cursos, respondendo às seguintes questões:

• Para quem o projeto será desenvolvido?

• Para quê o projeto será desenvolvido?

• E como o projeto será desenvolvido?

Essas questões são respondidas no momento do planeja-


mento. E é devido à utilização das TIC, que hoje a educação
tem ultrapassado, eliminado ou ao menos minimizado distân-
cias geográficas e temporais. A comunicação se dá o tempo
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

todo entre os empreendedores e entre eles e o conteúdo midiá-


tico, vídeo, texto, áudio, personagens entre outros.

A literatura acerca do tema destaca alguns princípios pe-


dagógicos para o desenvolvimento de cursos que auxiliam no
planejamento do ensino-aprendizagem em Educação a Distân-
cia, são eles:

• Coerência entre os objetivos do estudo e a abordagem pe-


dagógica: é necessário levar o educando a atuar como pro-
tagonista do estudo;

• Contextualização: de acordo com o público-alvo elabore a


melhor maneira de expor o conteúdo;

• Ênfase na formação e no desenvolvimento de competên-


cias: organize os assuntos de modo que promova suas ha-
bilidades;

• Estímulo da autonomia: procure formar pessoas capazes


de irem atrás de seu próprio crescimento;

• Aprendizagem significativa: atribua ao aluno significação


àquilo que se está sendo apresentado, de forma que ele

260
entenda a importância do tema;

Abordagem crítica-reflexiva dos conteúdos: estimule a


abordagem dos temas dentro de uma perspectiva crítica, le-
vando o aluno a refletir e posicionar-se diante do assunto.

Diante das atividades chaves, as instituições de ensino uti-


lizam as funções de equipes multidisciplinares para planejar,
desenvolver e fazer adaptação didáticas específicas em seus
cursos de EaD, valendo-se ainda das potencialidades das tec-
nologias da informação e comunicação (Moore 2007). E é nes-
se contexto que o professor tem atuado em educação a distân-
cia, fazendo parte indispensável dessas equipes, favorecendo
a capacitação pautada na didática e no desenvolvimento de

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


competências empreendedoras.

Considerações finais

No sentido de minimizar o sentimento de solidão e propor


a interação entre os empreendedores, este artigo mostra como
as ferramentas tecnológicas de comunicação cumprem o seu
papel dando maior dinamismo aos cursos autoinstrucionais,
aproximando-os do modelo de sala de aula, preservando as
trocas entre os empresários e o enriquecimento resultante des-
te processo interativo.

Os pressupostos básicos de uma metodologia para edu-


cação a distância são que as pessoas têm ritmos diferentes de
aprendizagem. Sendo assim, todos os recursos pedagógicos
somados aos tecnológicos propiciam um conteúdo recheado
de estratégias que favorecem o estudo autônomo e o envolvi-
mento pessoal no processo de aprendizagem.

A oferta de novas formas de comunicação não verbal, tex-

261
tos, imagens, incluindo aplicativos, jogos, como apresentado
contribui para ilustrar e facilitar o aprendizado dos empresários
que estudam a distância. A estratégia educacional deve ser cui-
dadosamente estudada para que o curso atinja os objetivos
traçados e para que o aluno compreenda de forma simples,
fácil, lúdica e agradável os conteúdos propostos.

A evolução tecnológica com a oferta de novas formas


de comunicação, como redes sociais, fórum, chats, MSN,
entre outros contribui certamente para a interação e trocas
entre os alunos estudam a distância. Toda a gama de ma-
teriais didáticos multimeios se complementa para aguçar os
sentidos, estimulando, assim, a percepção, a memória e a
interação entre as pessoas na construção conjunta do co-
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

nhecimento.

Por essas razões é necessário que os recursos didáticos


sejam bem estruturados para serem facilmente compreendidos
por meio de linguagem clara contribuindo no sentido de propi-
ciar o desenvolvimento de habilidades empreendedoras e forta-
lecer a atuação do empresário no mundo dos negócios.

É dessa forma que o Sebrae SP atua na capacitação a dis-


tância em massa de alta qualidade e significado ao empreende-
dor paulista que não tem tempo para aprimorar seus conheci-
mentos, tornando-o apto a empreender em um mercado cada
vez mais competitivo.

Referências bibliográficas

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Cristhiane  Xavier. Ensino a Distancia. UFLA/FAEPE. 2004.

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262
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UNED), 1994.

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lo de; COLLA, Anamaria Lopes. Op. Cit., 2001. 36. MEDEIROS,
Marilu Fontoura de – Concretizando um Paradigma em
Educação a Distância com o uso se Mídias Integradas.
VIII Congresso de Educação a Distância – Brasília/DF-2001.

MOORE, Michael G.; KEARSLEY, Greg. Educação a distân-


cia: uma visão integrada. Traduzido por Roberto Galman.
São Paulo: Thomson Learning, 2007.

MORIN, Edgar. Seven Complex Lessons in Education of the Fu-


ture. Paris: UNESCO, 2001. ANTUNES, Celso. Manual Cons-

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


trutivista de como estudar. RJ, Editora Vozes, 1996.

NASCIMENTO, L.; COSTA, G. Educação e Treinamento a


Distância Mediados por Computador: em busca da Apren-
dizagem Significativa. In: Novas Tecnologias na Educação. Rio
Grande do Sul: CINTED-UFRGS, v.2, n.1, março, 2004.

263
Mantendo o Foco no
Cliente no Desenvolvimento
de Conteúdos
Claudia A. G. Brum65

Introdução

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


O desenvolvimento de um produto ou serviço envolve diver-
sos fatores no que concerne, principalmente, à definição de um
modelo adequado aos objetivos da instituição que o oferece, e
ao alcance do público-alvo consumidor. Estabelecer requisitos
norteadores garante a qualidade do produto, bem como a efeti-
vidade da ação, reduzindo a incidência de eventuais desvios de
foco ou feedbacks negativos em pesquisas qualitativas.

Parafraseando CRUZ (2011), que trata sobre os desafios


da produção de produtos e serviços inovadores, as empresas
precisam constantemente, definir estratégias que sejam inova-
doras para ampliar a qualidade de seus produtos, fidelizar e
garantir o efetivo atendimento das necessidades dos clientes
para, com isso, atingir as metas institucionais. Porém, esse pro-
cesso não é automático, e para que isso aconteça; inserem-se
nesse contexto as práticas de educação empreendedora.

65 Pedagoga e advogada. Coordenadora pedagógica e de conteúdo para educação a distância do


Sebrae SP. Analista educacional, especialista em Educação a Distância pelo Senac RJ.   

265
É notório que diversas são as motivações dos clientes
para a aquisição de um produto ou serviço de uma determi-
nada empresa. Algumas instituições como o Sebrae, gozam
do status de serem reconhecidas pelo alto grau de domínio
de identificação da realidade de seu público-alvo e por pos-
suírem uma marca querida.

Com isso, basta o envolvimento destas instituições em um


projeto para gerar confiabilidade e garantir que algo importante
seja produzido para o público. Isso, por si, gera uma constante
busca pela estrutura de atendimento e de didáticas aplicadas por
instituições como o Sebrae no Brasil e até mesmo fora do país.
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

Além da confiabilidade, da qualidade e da efetividade, exis-


te outro aspecto motivador para aquisição de produtos ou ser-
viços, que é o custo. Quando se pensa em custo é importante
considerar, principalmente, o aspecto “custo/benefícios”.

Nota-se que nos últimos anos, mudanças ocorreram na


sociedade, e também na realidade que envolve os clientes em-
preendedores.

No âmbito social, com os avanços das tecnologias de co-


municação, destaca-se o amplo compartilhamento de infor-
mações sobre gestão empresarial por meio de publicações,
de livros e de uma infinidade de profissionais e instituições
que se especializam em atendimento a este perfil de clien-
te. As instituições de ensino, de consultoria e de capacitação
técnica, detectaram um nicho de mercado potencial e fértil.
Com isso, a estrutura organizacional das micro e pequenas
empresas passou a ser alvo de incontáveis propostas de apri-
moramento e capacitação.

Nesse novo universo de percepções da realidade desta-


cam-se, também, mudanças de posicionamento perante o

266
cliente envolvendo a necessidade do atendimento às metas
quantitativas e qualitativas, a consciência das crescentes inves-
tidas de potenciais concorrentes, além da constante elevação
do nível de criticidade que existe no perfil dos clientes e a rápida
difusão das informações por meio das redes sociais e das mí-
dias formadoras de opinião.

Os medos nossos de todos os dias

Diante isso, faz-se necessária a seguinte reflexão: como ga-


rantir a produção de conteúdos que sejam efetivos e sejam pro-

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


curados pelos clientes? Como entregar respostas às perguntas
que surgem no dia a dia da gestão em um pequeno negócio?
Que estratégias devem ser utilizadas para serem produzidos
conteúdos que possam garantir vida e continuidade a empreen-
dimentos dos mais diferenciados perfis e segmentos? Como ser
efetivo a ponto de atingir empresários que possuem alto nível de
instrução e, ao mesmo tempo, empresários que, envolvidos pela
realidade de seus empreendimentos, não conseguem ter acesso
à instrução formal mas empreendem com as mesmas dificulda-
des enfrentadas por qualquer outro empreendedor comum?

Uma estratégia de educação empreendedora exitosa que


pode responder a esses infindáveis questionamentos é a ne-
cessária manutenção do foco no público alvo!

Público-alvo, o chamado “target” pelos profissionais de


marketing, pode ser entendido como uma fração de pessoas
cujas características e interesses são compatíveis com algo
que se tem a dizer ou oferecer.

Os princípios do marketing apontam para o cliente-con-


sumidor que seleciona os produtos e serviços que atendem

267
às suas necessidades e, nesse sentido, em meio à heteroge-
neidade, que caracteriza o público de uma instituição como
o Sebrae, algo é comum: os clientes possuem as mesmas
necessidades!

Conhecer essas necessidades e desenvolver conteúdos


totalmente focados nelas pode ser o diferencial para que os
clientes avaliem positivamente os produtos e serviços e tor-
nem-se fiéis consumidores.

E, para que esse foco seja mantido, o desenvolvedor


deve direcionar ao cliente cada nuance do conteúdo, como
se estivesse em sua mente e soubesse, exatamente, o que
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

precisam e anseiam naquele momento.

Lendo o Pensamento do Cliente

Mas como saber se os conteúdos são úteis para o cliente?


Como saber se as reais necessidades dos empreendedores
estão contempladas em publicações, informações produtos
ou serviços? O primeiro passo é conhecer profundamente o
público-alvo, sabendo, exatamente quem ele é, como pensa,
o que gosta, o que faz, o que quer, suas limitações e suas
potencialidades.

Quem é o foco do conteúdo: lideranças? Empreendedo-


res? Potenciais empresários? Empresários com empreendi-
mentos formalmente estabelecidos?

Conhecer as pesquisas, as investigações sobre o perfil do


empreendedor é crucial. Informações como: idade, como vive,
se possui família, qual grau de instrução, se tem domínio do
negócio e outras informações infinitas, podem ser base para

268
definir o perfil pessoal do cliente e com isso, formar uma ima-
gem do alvo do conteúdo.

Definindo o perfil criam-se direcionamentos que conduzam


a uma adequada identificação de necessidades e tomam-se
decisão sobre o que precisa ser feito para que o conteúdo ade-
quado seja entregue ao cliente correto da forma mais compatí-
vel com sua realidade.

Um cliente mais jovem, por exemplo, pode ser mais rápido


e, em regra, costuma estar mais aberto às soluções avança-
das, ágeis e diretas. Por outro lado, clientes mais velhos podem
ser mais impacientes, mais resistentes às propostas muito ino-

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


vadoras e, com isso, podem não se identificar com o conteúdo.

Saber se o cliente possui experiência na gestão de negó-


cios é outro exemplo de domínio das necessidades do público-
-alvo. Clientes que já vivem ou viveram a realidade da gestão
de uma pequena empresa, por um lado acreditam que sabem
muito sobre a gestão do seu negócio, mas, por outro lado, po-
dem se identificar com as problemáticas do conteúdo, afinal,
ele se vê nos problemas que ocorrem na empresa, ele já viveu
e vive isto de forma intensa.

Cabe ao conteúdo conectar essa realidade do cliente com


alternativas de soluções para seus males.

E, para ter esse conhecimento sobre os clientes é preci-


so ouvi-los naquilo que querem, naquilo que sabem, naquilo
que pensam que sabem, em como estão suas empresas e
em como os problemas são resolvidos em seus empreendi-
mentos. Pesquisas, entrevista, relatos de atendimento, da-
dos sobre o mercado onde os clientes se inserem, necessi-
dades e oportunidades do setor; todas essas informações
são necessárias e, quando devidamente identificadas, faz

269
com que se tenha propriedade e assertividade no conteúdo
que será proposto.

Ouvir o cliente é fazer com que ele, de diferentes for-


mas possíveis, participe da construção do conteúdo, confor-
me sabiamente defendido por Oona Castro na 4ª edição do
Seminário de Educação Empreendedora66 ao abordar uma
visão dos “consumidores de informação como também pro-
dutores de conteúdo”.

Ter em mente que a cartilha “x” é direcionada para os em-


preendedores que já atuavam na informalidade há cerca de
cinco anos e que acabaram de se formalizar motivados pelos
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

benefícios trazidos pela lei dos empreendedores individuais li-


mita e direciona o conteúdo. Nesse caso específico não há que
se tratar de questões que envolvam os primeiros passos de
uma gestão financeira como se essa área do empreendimento
estivesse saindo do zero. Esse empreendedor já tem uma rea-
lidade de funcionamento, embora possa não ter conhecimento
formal sobre gestão financeira, ele já tem práticas, já tem ex-
periências (positivas e negativas) e, considerar essa experiência
no desenvolvimento do conteúdo enriquece e torna coerente
qualquer produto ou serviço que seja desenvolvido.

Saber quem é a pessoa a quem se direciona o conteúdo


pode garantir a identificação do público e, com isso, a efetivi-
dade da estratégia de atendimento ou capacitação, afastan-
do os perigos de pensar ter conhecimento das necessidades
do cliente, mas não saber, efetivamente, o que ele precisa;
ou o erro de contratar terceiros que não conhecem o público

66 Resumo da palestra disponibilizado pelo NTE Caxias do Sul (Núcleo de Tecnologia Educacional)
realizada em 27/12/2013 na 4ª edição do Seminário de Educação Empreendedora, disponível
para consulta em: http://ntecaxiasdosul.blogspot.com.br/2012/09/seminario-de-educacao-
-empreendedora-4.html.

270
(embora tenham domínio do tema proposto); ou o descuido
de buscar conteúdos acadêmicos isolados da realidade des-
se público específico e, por não realizar adaptações, propor
produtos e serviços desconectados da realidade dos em-
preendedores.

Uma Receita de Sucesso

Um exemplo de estratégia educacional estruturada consi-


derando essa realidade de desenvolvimento são os produtos
remotos oferecidos pelo portfólio do Sebrae SP. O principal

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


norteador desses cursos on line, vídeos, palestras, e-books e
Quizz é o público-alvo. Segundo TONELLI (2003), em seu arti-
go “Educação a distância e o longo caminho para a experiência
do aprendizado efetivo”: “(...) o sucesso de uma aplicação EaD
está diretamente vinculado ao público-alvo e aos objetivos de
ensino e aprendizagem.”

Esses produtos remotos são desenvolvidos com base em


pesquisas de perfil dos clientes, considerando características
específicas como: impaciência, escassez de tempo, linguagem
regional, entre outras.

Nos produtos palestra on line e vídeos, por exemplo, o for-


mato de capacitação foi estruturado para propiciar ao cliente/
aluno uma experiência com o tema e um alinhamento/nivela-
mento de conhecimentos.

A proposta desse produto é que o cliente conheça o su-


ficiente sobre o tema para que, ele mesmo, decida sobre o
direcionamento que deve dar em sua trilha de conhecimento,
de acordo com as necessidades mais emergentes de seu em-
preendimento. Trata-se se de uma importante estratégia para

271
eliminar a sensação de total desconhecimento do assunto e
favorecer o sentimento de familiaridade e identificação tão im-
portantes para a aprendizagem de adultos.

A definição dos temas considera um ponto focal no con-


teúdo que seja compatível com as principais necessidades dos
empreendedores, ou seja, é definido o centro do conteúdo em
torno de uma dificuldade encontrada na gestão da pequena
empresa em situações de atendimento do próprio Sebrae.

Nesses produtos são abordados os conteúdos de forma


sintética em formato de pílulas para otimizar o tempo de capa-
citação do empresário. Produtos como esse, levam o empreen-
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

dedor a perceber que o seu problema não é só seu e servem


como norteadores do caminho instrucional, como um mapa,
um leve mergulho sobre os principais assuntos que envolvem
o tema na medida certa que os clientes precisam para tomar
decisões sobre seu processo de aprendizagem.

Em razão dessa estratégia, nesses produtos não são


apresentados cálculos exaustivos, raciocínios demasiadamen-
te complexos ou conteúdos que não sejam de rápida e prática
absorção, posto que, em razão do tempo e do formato o alcan-
ce do objetivo pode ser prejudicado.

Outro importante fator resultante da análise do perfil do


público alvo que foi considerando no desenvolvimento desses
produtos é a linguagem. Por se tratar de conteúdo a distância,
a linguagem precisou ser direta e dialógica, ou seja, falar direta-
mente com quem assiste ou lê o conteúdo. O diálogo minimiza
a sensação de distância, de solidão que pode acontecer em
produtos disponibilizados remotamente e aproxima o conteúdo
de quem o está consumindo.

272
Banco de Prática: Alternativa de Ligação
do Conteúdo com a Realidade do
Público Empreendedor

A experiência é a maior fonte de aprendizado para o adulto


e o conhecimento surge a partir da captação e transformação
destas experiências (KOLB; KOLB, 2005). Neste sentido, uma
forma muito utilizada para garantir a prática no desenvolvimen-
to do conteúdo utilizando depoimentos de empresários e casos
de sucesso. Estas experiências podem ser consolidadas em
formato de bancos de práticas com relatos de atendimentos e
de soluções de problemas de gestão a serem consideradas em

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


todos os desenvolvimentos.

Todo o processo de construção do conteúdo deve se sub-


meter às informações sobre a realidade dos clientes, no que
tange às mais variadas nuances do desenvolvimento: temática,
forma de abordagem, foco, objetivos e até o formato ou tecno-
logia de disponibilização, como bem abordou MASETTO:

Como o processo de aprendizagem abrange o de-


senvolvimento intelectual, afetivo, o desenvolvimento
de competências e de atitudes, pode-se deduzir que
a tecnologia a ser usada deverá ser variada e adequa-
da a esses objetivos. Não podemos ter a esperança
de que uma ou duas técnicas, repetidas à exaustão,
deem conta de incentivar e encaminhar toda a apren-
dizagem esperada (MASETTO, 2000, p.143).

Ser coerente com o foco favorece que o desenvolvimento


considere as diferentes perspectivas de cada perfil de clientes
o que resulta em estratégias que antecipam as necessidades
institucionais e dos clientes. O material acessível é um exem-

273
plo desta coerência. Uma visão com foco no cliente considera
todas as variáveis de características possíveis de impedir ou
contribuir para a total efetividade do conteúdo.

Avaliando a realidade das micro e pequenas empresas


não é difícil observar que, mesmo quando conduzidos ao
empreendimento por uma necessidade, grande parte das
escolhas por empreender são resultantes de influências de
outros empreendedores, como defendido por FILION em sua
palestra “O Empreendedorismo como Tema de Estudos Su-
periores”:

Dessa forma, a maioria dos empreendedores se


Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

tornou empreendedor graças à influência de um mo-


delo no seu meio familiar ou próximo, um modelo com
o qual ele quis se identificar. Os empreendedores ad-
quiriram, então, uma cultura empreendedora pela prá-
tica, por assim dizer, no seio da família. (FILION).

O empreendedor observa as experiências de outros em-


preendedores e, sob a influência de suas práticas, promove
mudanças para a melhoria de sua empresa. Estabelece-se
uma oportunidade para que, no desenvolvimento de con-
teúdos, esta troca seja contemplada de forma intencional e
provocativa.

A inserção de práticas contribui para superar os chamados


“conteúdos estáticos”, pois permite que se tenham sempre no-
vas respostas sobre novos questionamentos que surgem na reali-
dade do público-alvo, minimizando a visão de conteúdos obsole-
tos, ultrapassados e sem qualquer identificação com a realidade.

Andrea Cecília Ramal em seu artigo: “Educação com tec-


nologias digitais: uma revolução epistemológica em mãos do
desenho instrucional”, defende que, mesmo na Educação for-

274
mal, não há mais como fugir da realidade que invade as salas
de aula e os ambientes de aprendizagem:

Na educação da era da informação, será preci-


so implementar um ensino mais próximo do cotidia-
no. Porque aprender será algo cada vez mais próximo
de preparar-se para ser um cidadão capaz de cumprir
seu papel no mundo. (RAMAL, 2003).

Quando os produtos são desenvolvidos tomando por base


a realidade do público alvo, cria-se maior garantia de que o
conteúdo está adequado e atenderá a necessidade do cliente,
ou seja, será entregue ao cliente correto, mais compatível com

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


a realidade daquele cliente.

Trajetória Empresarial
Orientada pelo Foco no Cliente

Em um caso relatado por consultores do Sebrae SP que


realizam consultorias remotas, uma empreendedora procurou
o atendimento porque fizera um curso de fabricação de sabo-
netes e, entre os colegas de turma, foi dito que tratava-se de
uma alternativa para abertura de uma pequena fábrica. Com
isso em mente ela buscou quem acreditava apresentar possí-
veis soluções e possibilidades para o seu negócio, e por ouvir
falar que o Sebrae era que era referência no assunto, sentiu
segurança para relatar sua necessidade.

Avaliando o relato da cliente e com base no portifólio dis-


ponível foram oferecidas soluções que orientassem a cliente da
composição do plano de negócios e na análise de viabilidade
do novo empreendimento.

275
Seguindo as orientações iniciais, a cliente passou a realizar
diversas capacitações voltadas para todas as áreas da empre-
sa até que, uma vez definida a estratégia de negócios, iniciou o
empreendimento.

O contato inicial dos clientes com o conteúdo precisa aten-


der às suas indagações, precisa mostrar a trilha de conheci-
mento que leve o cliente a definir uma trajetória exitosa em suas
propostas e projetos. Apresentar conteúdos com complexida-
de superior às necessidades do cliente ou com base insuficien-
te para direcioná-lo em suas expectativas pode desapontá-lo
e levá-lo a crer que aquela instituição não possui condições de
atendê-lo. Porém, entregar ao cliente conteúdos compatíveis
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

com sua necessidade, de pronto gera uma imagem positiva,


de atendimento, de coerência e é o primeiro passo para um
processo de fidelização.

Em outro momento empresarial a cliente, já com a empre-


sa estabelecida, buscou o Sebrae para a definição de estra-
tégias de ampliação do negócio. O empreendimento crescera
e a procura por seus produtos se ampliara; agora a empresa
precisava expandir e, por sentir-se mais uma vez segura ante
a competência do Sebrae para atender às suas necessidades
de orientação e capacitação em gestão de sua pequena em-
presa, novamente buscou atendimento. Por isso, ao analisar o
momento empresarial, a proposta de orientação e capacitação
foi apresentada, englobando soluções para aprimoramento e
expansão da empresa. Os atendimentos (capacitações e orien-
tações) envolveram conteúdos que foram condutores no plane-
jamento da expansão da empresa e, seguindo as orientações
do Sebrae SP, a cliente elaborou um mapa da empresa com a
previsão de investimentos para ampliação do empreendimento
no mercado nacional e internacional.

276
A sequência de atendimento ao cliente também precisa
manter a coerência e total conectividade com as necessidades
do momento empresarial. Essas conexões devem acontecer
por meio de conteúdos que atendam às necessidades de em-
preendimentos mais maduros, em fases mais avançadas de
gestão. A ausência destes conteúdos pode transmitir ao cliente
uma imagem de ausência de aprofundamento, de superficiali-
dade. O cliente precisa ser conquistado com conteúdos coe-
rentes, mas é necessário também que estes conteúdos acom-
panhem esses clientes, ou seja, que sejam compatíveis com
seu nível de desenvolvimento para na gestão de sua empresa.

Os direcionamentos do produto a esse cliente foi realiza-

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


do considerando o perfil da cliente como um todo, desde a
seleção de conteúdo, perpassando pela forma e pela tecno-
logia adequadas à realidade da cliente. Um exemplo desse di-
recionamento foi o fato de que a cliente, sendo parte de uma
geração mais conectada às tecnologias de comunicação e in-
formação, demonstrou afinidade com produtos remotos e, em
grande parte dos contatos com o Sebrae SP optou por utilizar
esses produtos remotos.

Esta cliente voltou ao Sebrae SP, e voltou várias vezes. Em


alguns momentos remotamente e em outros presencialmen-
te, conforme seu ritmo e as necessidades que surgiam com o
desenvolvimento de seu empreendimento. A avaliação desta
cliente sobre o Sebrae SP é positiva porque reflete a confiança
que ela desenvolveu nos conteúdos dos produtos e serviços
que consumiu no decorrer de sua trajetória empreendedora.

A efetividade de todas estas experiências e outras tantas


que ocorrem no dia a dia do atendimento foi garantida pelo
total foco no público-alvo. Os clientes deixaram de ser consu-
midores passivos e assumiram o papel de colaboradores na

277
construção dos conteúdos com suas mazelas, com suas con-
quistas e com suas ideias de melhorias para a gestão de micro
e pequenos empreendimentos.

Esses clientes retornam ano após ano, fazem propagan-


da positiva a outros clientes, se sentem atendidos de manei-
ra assertiva e eficiente, identificando-se com cada letra de
conteúdos que são disponibilizados por meio destes produ-
tos e serviços.

Referências bibliográficas
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

CRUZ, Renato. “O desafio da inovação: A revolução do co-


nhecimento nas empresas brasileiras.” 1ª ed. São Paulo:
SENAC São Paulo, 2011.

TONELLI, Marcio. “Educação à distância e o longo cami-


nho para a experiência do aprendizado efetivo” AM-625 A
– Seminários Avançados I – Multimídia. Disponível em: http://
www.iar.unicamp.br/disciplinas/am625_2003/Marcio_Tonel-
li_artigo.html. Acesso em: fevereiro de 2013.

MASETTO, Marcos T. Mediação Pedagógica e o uso da


tecnologia. In: Novas tecnologias e mediação pedagógi-
ca. Campinas, SP: Papirus, 2000, p.143.

FILION, Louis Jacques. “O Empreendedorismo como


Tema de Estudos Superiores”, Palestra apresentada na 4ª
edição do Seminário de Educação Empreendedora: Conhe-
cimento Colaborativo – Um desafio para a educação. Dis-
ponível em: http://ntecaxiasdosul.blogspot.com.br/2012/09/
seminario-de-educacao-empreendedora-4.html. Acesso em
fevereiro de 2013.

278
KOLB, Alice Y.; KOLB, David A.; The Kolb learning style in-
ventory version 3.1 2005: Technical Specifications. Lon-
don: Hay Group, 2005. Disponível em: < http://www.whitewa-
ter-rescue.com/support/pagepics/lsitechmanual.pdf>. Acesso
em: 04/03/2013.

RAMAL, Andrea Cecilia. “Educação com Tecnologias Digi-


tais: Uma Revolução Epistemológica em Mãos do Dese-
nho Instrucional”. IN Educação Online – Teorias, práticas, le-
gislação e formação corporativa. Marco Silva (org.). São Paulo:
Loyola, 2003.

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

279
Caminhos para uma
Educação Empreendedora:
Aliança entre Comunicação
e Educação
Mônica Dias Pinto67

Breve cenário da educação no Brasil

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


É quase consenso, pelo menos retórico, que o Brasil preci-
sa de uma educação básica de qualidade para todos. Contudo,
chegamos à segunda década do século XXI mergulhados ainda
em questões estruturantes com relação à educação pública:
Quais expectativas de aprendizagem deverão ser estabelecidas
para cada nível de ensino? Quais habilidades e competências
pretendemos desenvolver em nossos estudantes, para que te-
nham uma vida plena, gerem bem-estar para si e na comunida-
de na qual estão inseridos?

Além dos cerca de 50,9 milhões de estudantes matricu-


lados em escolas de educação básica, temos também um
contingente enorme de jovens e adultos, em idade economica-
mente ativa, que abandonaram os bancos da escola antes de
concluir o ensino médio, por diferentes motivos. Há pesquisas
que estudam e comprovam esse fenômeno de entrada preco-

67 Pedagoga. Gerente de Desenvolvimento Institucional na Fundação Roberto Marinho/Canal Fu-


tura. Mestre em Educação pela PUC do Rio de Janeiro. Pós-graduação em História e Cultura
Contemporânea pela Universidade Bennett.

281
ce do jovem brasileiro no mundo do trabalho, com formação e
escolaridade incompletas, aquém do que a vida irá exigir. Como
possíveis causas, esses estudos apontam: a necessidade de
gerar renda para complementar o orçamento familiar e um co-
tidiano escolar pouco atraente, pobre em atributos que gerem
a permanência dos jovens e que representem para eles uma
perspectiva real de desenvolvimento e aprimoramento.

Somado a isso, vivemos em um país com dimensões con-


tinentais, com adolescentes e jovens vivendo em grandes cen-
tros urbanos, em periferias, no meio rural, em comunidades
tradicionais ribeirinhas e nas florestas, no semiárido, no panta-
nal...nos mais diversos biomas, com as suas sazonalidades e
características muito próprias. Na década de 90, conseguimos
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

universalizar o acesso ao Sistema de Ensino, porém sem a qua-


lidade e as especificidades necessárias para um contingente
populacional tão amplo, oriundo de diferentes contextos cultu-
rais e sociais. Ainda amargamos um percentual significativo de
crianças, adolescentes e jovens de 4 a 17 anos fora da escola
– 3,7 milhões (IBGE/PNAD, 2009), além dos índices conside-
ráveis de evasão escolar, que mesmo tendo decrescido nos
últimos anos, produzem o cenário descrito anteriormente.

Os seja, chegamos ao século XXI com uma população jo-


vem e adulta com níveis de escolaridade básica inferiores ao
desejado. Nos países desenvolvidos a média de anos de es-
colaridade é de 12 anos. Podemos ver nas duas tabelas abai-
xo os percentuais de adultos analfabetos e de escolaridade da
população adulta brasileira. Nela observamos que a média de
escolaridade da nossa população fica em torno dos 7,3 anos
(IBGE/PNAD, 2011).

282
Taxa de Analfabetismo das pessoas de 15 anos ou mais de
idade, por grupo de idade, segundo as Grandes Regiões – 2011

35,6
26,3

18,7
18,6

17,1
12,4
11,5

11,5
11,0
8,1

6,2

5,9

5,3
5,2

3,9

3,6

3,4
3,3

2,9
2,8

2,3

2,1

2,1

1,9
1,7

1,4

1,2

1,4
1,2

1,2
0,9
0,8
0,8

0,7
0,6

0,5
Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

15 a 17 anos 18 a 24 anos 25 a 29 anos 30 a 39 anos 40 a 49 anos 50 anos e mais

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisa, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios 2011

Isso posto, fica claro que necessitamos de um conjunto de


medidas que garantam a formação continuada de jovens e adultos
já inseridos no mundo do trabalho. Sabemos que, mesmo popu-
lações com altos níveis de escolarização, possuem mecanismos
com foco na atualização de conhecimentos e competências. E
cada vez mais, a aliança entre educação e comunicação, apresen-
ta-se como uma eficaz estratégia para os desafios educacionais.
Isto porque esta aliança pode agregar conhecimento e atrativida-
de, bem como a superação de barreiras geográficas, geracionais,
e é capaz de atender a um grande contingente de pessoas.

Especialistas em Educação já evidenciaram a importân-


cia da exemplaridade no processo ensino-aprendizagem, bem
como da disseminação de boas práticas, como tática que gera
identificação e mudança de comportamento efetivo. Se bem
explorados, bons exemplos e ações bem sucedidas, podem
gerar novas práticas e inovações, desde que a autonomia e
a criatividade sejam pressupostos do processo educacional

283
implementado. Outro componente bastante interessante, pre-
sente em metodologias que mesclam educação e comunica-
ção é o “edutainment”, ou seja, ensinar e aprender de forma
prazerosa, instigante, que gere interesse, engajamento, curio-
sidade no indivíduo que estuda. Por fim, um outro aspecto que
gostaríamos de destacar, trata-se dos pressupostos adotados
por projetos sociais e educacionais, que consideram a comuni-
cação um elemento fundamental para a transformação social.
Esses pressupostos, amplamente explorados pela Rockefeller
Foundation, consideram que:

• Pessoas e comunidades são sujeitos de suas vidas;


Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

Distribuição percentual das pessoas de 25 anos ou mais idade,


segundo o nível de instrução – Brasil, 2009/2011

35,9

31,5

24,5
23,0

15,1
13,0
11,5
10,6
10,0
8,8

4,0 3,9 2,5 3,4

Sem Fundamental Fundamental Médio Médio Superior Superior


instrução incompleto ou completo ou incompleto ou completo ou incompleto ou completo
equivalente equivalente equivalente equivalente equivalente

2009 2011

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisa, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios 2011

• A comunicação, como diálogo, gera a participação efetiva


de todos na troca e produção de conhecimento;

• A comunicação para transformação social empodera e dá


voz a todos;

284
• Esse processo gera um fluxo cíclico de compartilhamento
das informações que conduz ao mútuo entendimento;

• Tão importante quanto a transmissão das informações por


parte de especialistas, é o diálogo e a proposição de temas
de relevância para as pessoas e comunidades.

Sendo assim, acreditamos que essas são as bases ne-


cessárias e capazes de atender aos desafios educacionais de
nossa população jovem e adulta, que busca aprimorar sua
formação, como também permanecer e desenvolver-se no
mundo do trabalho.

O Futura: um projeto de comunicação e

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


educação para a transformação social

Foi inspirada pelos desafios descritos anteriormente que,


na década de 90, a Fundação Roberto Marinho desenvolveu o
Canal Futura68. O Canal foi concebido como um projeto social
de comunicação e educação, com o propósito de abordar
valores e informações úteis ao cotidiano da população, de ge-
rar e disseminar conteúdos, que contribuam para a forma-
ção educacional e profissional dos brasileiros. Para tanto, o
Canal desenvolveu metodologias de produção de conteúdos
em diálogo e de articulação social, por acreditar que, somen-
te promovendo o encontro e a expressão de diferentes seg-
mentos da sociedade, seria capaz de gerar desenvolvimento
integral e bem estar nas comunidades. Aborda temas rele-
vantes na agenda contemporânea como empreendedorismo,

68 O Futura é resultado da parceria entre organizações da iniciativa privada, unidas pelo compro-
misso de investir em educação e criar ações de efetivo impacto na superação de demandas
sociais brasileiras. Fazem parte desse grupo: Fundação Bradesco; CNI (Confederação Nacional
da Indústria); CNN; Fiesp; Firjan; Fundação Itaú Social; Fundação Vale; Gerdau; Sebrae; TV
Globo e Votorantim.

285
educação, trabalho, inovação, juventude, meio ambiente e
cidadania, envolvendo na produção, diferentes redes e seg-
mentos sociais: universidades, especialistas, ONG, empresas,
governos, agências internacionais, fundações e institutos.
Elege formatos e linguagens, que estejam à altura da diversi-
dade cultural brasileira e que gerem interesse para diferentes
públicos, sempre aliando conhecimento e entretenimento de
qualidade. Ou seja, adotamos recursos narrativos, estéticos e
lúdicos, que valorizem a experiência de especialistas e anôni-
mos, e que expressem de forma clara e consistente os conhe-
cimentos abordados. Mesclamos ficção e realidade, novelas e
histórias de vida, animações e documentários, programas de
longa e curtíssima duração.
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

A grade de programação é estruturada para atender às ne-


cessidades de formação do brasileiro e é pautada em valores,
oferecendo serviços e informações úteis ao dia-a-dia:

• Espírito Empreendedor: divulga a cultura empreende-


dora, valorizando a iniciativa, o risco, a criatividade e a
tomada de decisão, incentivando a responsabilidade
de cada um no seu próprio crescimento e no desenvol-
vimento de seu país.

• Espírito Comunitário: incentiva a solidariedade, a par-


ticipação das pessoas na construção da sociedade, a
busca de soluções inovadoras e o compromisso com o
bem comum.

• Ética: dissemina o respeito aos valores éticos, aos di-


reitos e às responsabilidades presentes no dia a dia de
indivíduos, grupos e instituições;

• Pluralismo: dá visibilidade à diversidade cultural brasi-


leira, valoriza os modos de viver, produzir, pensar e se
expressar de nosso povo.

286
Lançado em setembro de 1997, seu sinal de TV atinge
todo o território brasileiro, de norte a sul, durante as 24 ho-
ras do dia, sendo distribuído nacional e gratuitamente através
de antenas parabólicas, a partir de sua Geradora Educativa
(Canal 18) no Rio de Janeiro. O Canal conta também com
uma rede de TVs Universitárias parceiras em vários estados
da federação. Além disso, pode ser assistido via sistema NET
Brasil, canal 32, e pela SKY canal 37.

Segundo o Instituto Datafolha (dez 2012), o Futura hoje é


assistido por milhões de brasileiros. Cerca de 84 milhões de
pessoas têm acesso ao seu sinal, dos quais 40 milhões de pes-
soas o assistem regularmente. Considerando as pessoas aci-

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


ma de 16 anos, (33 milhões) temos o seguinte perfil de público:

• Escolaridade: Ensino Fundamental 45%; Ensino Médio


43%; Ensino Superior 13%;

• Classe social: A/B 28%; C 51%; D/E 21%;

• Faixa etária: 16 a 24 anos 22%; 25 a 40 anos 35%; 41 e


mais 43%;

• Educadores: 1,7 milhão;

• Distribuição geográfica: proporcional à distribuição demo-


gráfica da população no território brasileiro pelas cinco re-
giões, com maior concentração nas cidades de interior do
país: 39% do público estão nas capitais e nas regiões me-
tropolitanas e 61% no interior.

Segundo pesquisas qualitativas, o público que tem o há-


bito de assistir ao Futura considera a TV como um recurso
importante para o seu crescimento profissional e/ou pessoal,
para ir mais longe individualmente, para adquirir conhecimen-
tos capazes de trazer melhorias para a comunidade e para

287
mudar a postura diante do meio ambiente e do mundo69. Ou
seja, este público tem uma postura ativa em relação à vida,
buscando sempre informações para aprimorá-la.

Já em outra pesquisa do Instituto Datafolha70, observa-se


que o público que assiste ao Canal Futura apresenta um en-
gajamento bem maior que os não telespectadores. Na mesma
pesquisa, ficou evidenciado que o público do futura é compos-
to por brasileiros mais propensos a respeitar diferenças (gêne-
ro, regionalismo, referências culturais e estéticas) e a pensar em
abrir seu próprio negócio.

Além da distribuição de conteúdos via TV, o Canal lança


mão de diferentes estratégias de atuação. Ele disponibiliza con-
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

teúdos via web (www.futura.org.br e www.futuratec.org.br), por


meio de maletas e kits educativos, bem como interage com
diferentes públicos nas redes sociais (Twitter, Facebook, canal
do Youtube). Vale o destaque para o Futuratec, uma videoteca
virtual, com indexação temática, que possibilita às instituições
cadastradas, o Download gratuito de programas. Atualmente
estão disponíveis 1500 vídeos (720 horas de programação) so-
bre diferentes temáticas: empreendedorismo, ciências, educa-
ção, sustentabilidade etc. Temos o registro de mais de 10 mil
usuários cadastrados (na grande maioria escolas e universida-
des) e cerca de 15 mil downloads.

Ou seja, o Futura foi desenvolvido para estar em contato


constante com diferentes instituições produtoras de conhe-
cimento, redes da sociedade e para ser “usado”. Telespec-
tadores, internautas, universidades, empresas, fundações e
institutos empresariais e ONG desenvolvem diversos tipos
de interação com o Canal. Além das equipes responsáveis
pela produção e disponibilização de conteúdos via TV e web,

69 Fonte: Capital Pessoal – maio 2008.


70 Fonte: Instituto Datafolha – dez/06 pesquisa nacional quantitativa.

288
temos uma equipe de mobilização comunitária, que articula
organizações sociais e educacionais, para o uso de conteú-
dos e metodologias em seus projetos sociais e educacio-
nais, de acordo com as necessidades específicas dessas
instituições.

Uma contribuição para uma


educação empreendedora:
a parceria entre Futura e Sebrae

Como vimos, o Canal Futura tem no empreendedorismo

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


e na busca de soluções inovadoras princípios orientadores de
sua ação. A parceria com o Sebrae é imprescindível para dar
concretude e consistência a esse valor fundante do Canal. Des-
ta feita, elegemos como objetivos que regem a nossa interface
e relacionamento:

• Promover a cultura empreendedora;

• Divulgar experiências exemplares de micro e pequenas


empresas;

• Difundir informações e boas práticas de gestão, inovação


e acesso a novos mercados voltados às micro e pequenas
empresas;

• Prestar serviços aos empresários de micro e pequenas em-


presas e àqueles que pretendem abrir um pequeno negó-
cio, informando sobre cursos, seminários, workshops, con-
gressos e serviços disponíveis.

Para atender às necessidades de atualização, formação e


apoio aos empreendedores brasileiros, criamos um portfólio de
produtos audiovisuais e kits educativos:

289
• Produção de seriados temáticos, abordando conceitos e in-
formações sobre o empreendedorismo. Os programas aliam
dramaturgia a casos reais para falar sobre empreendedo-
rismo de um modo claro, instrutivo e envolvente ao mesmo
tempo. Esses seriados compõem kits educativos, disponibi-
lizados em DVD, acompanhados de livros didáticos.

• Produção de interprogramas, dando visibilidade a casos


de sucesso de empreendedores, identificados e reco-
nhecidos por prêmios promovidos pelo Sebrae como o
Mulheres de Negócio (Prêmio Mulher de Negócios) e
o Técnico Empreendedor (Prêmio Técnicos Empreen-
dedores); Em Jogo, que presenta casos de jovens em-
presários que fizeram parte do Desafio Sebrae e hoje são
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

empresários; Ficou Simples, sobre a Lei Geral, expli-


cando seus pontos básico; Horta de Mudar que mostra
casos de sucesso de empresários de micro e pequenos
negócios que foram apoiados pelo Sebrae; Super Ideias
em formato de histórias em quadrinhos, mostra peque-
nas empresas, que se destacam pelas suas iniciativas
sustentáveis.

• Uma grade de programação voltada ao empreendedorismo,


totalmente dedicada à divulgação da cultura empreendedora
e à formação do empresário de micro e pequenos negócios,
com a veiculação de programas sobre empreendedorismo,
educação financeira, técnicas de gestão etc; Essa grade com-
põe a faixa Conexão Futura, que tem também três entradas
ao vivo, visando estabelecer interatividade com o público, com
foco em prestação de serviço e esclarecimento de dúvidas.
A faixa Conexão Futura é exibida ao vivo na TV e na internet.

• Notícias sobre o setor de micro e pequenas empresas, le-


gislação, pesquisas etc. Em todos os programas jornalísti-
cos – Jornal Futura, Sala de Notícias, Sala em Debate,
Você faz a Diferença – este tema é recorrente, como tam-

290
bém a divulgação de projetos e pesquisas tais como: a pes-
quisa GEM – Global Entrepreneurship Monitor, MPE Brasil,
Desafio Sebrae, Prêmio Sebrae de Jornalismo, Semana do
Empreendedor Individual, dentre outros.

• Semana do Empreendedorismo em novembro: exibição


de uma programação temática voltada à cultura empreen-
dedora e apresentação de inúmeros programas e matérias
sobre experiências bem-sucedidas de micro e pequenos
empreendimentos.

• As séries temáticas realizadas em parceria com o Sebrae


também estão disponibilizadas gratuitamente para down-
load na plataforma www.futuratec.org.br.

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


Considerações finais

“Comunicação para a mudança social


É um processo de diálogo público e privado atra-
vés do qual as próprias pessoas definem quem são,
do que precisam e como conseguir o que precisam
para melhorar suas vidas.

Utiliza o diálogo que leva à identificação coletiva


de problemas, a tomada de decisão e implementação
de soluções com base comunitária, para questões de
desenvolvimento. “

Rockefeller Foundation

Uma educação transformadora terá sempre como princí-


pios a participação de todos na construção do conhecimento, a
criatividade, a valorização da iniciativa e da tomada de decisão,
o desenvolvimento da responsabilidade e do comprometimento
de cada um consigo próprio e com o desenvolvimento do país.

291
O Futura, comprometido com essa causa, busca reunir, poten-
cializar e disponibilizar conhecimentos e metodologias em larga
escala, procurando, ao mesmo tempo, contemplar a riqueza e
as especificidades dos diferentes contextos que compõem o
caldo cultural e social brasileiro.

A Educação e a Comunicação comungam de alguns pres-


supostos como o diálogo, a produção e disseminação do conhe-
cimento, cada um com características e intensões próprias, que
se bem articuladas, geram prosperidade social. Em um país onde
muito há ainda a consolidar no tocante à formação de seu povo
– da Educação Básica à formação para o mundo do trabalho – é
fundamental lançarmos mão deste interessante casamento. Aqui
destacamos em especial algumas iniciativas já disponibilizadas
Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

pelo Futura em parceria com o Sebrae, com foco na educação


empreendedora de jovens e adultos. Esperamos que elas pos-
sam inspirar outros projetos, já que sabemos o quanto é necessá-
rio realizar para a disseminação de uma educação empreendedo-
ra de qualidade e acessível para milhões de brasileiros.

Títulos de algumas séries produzidas em


parceria com o Sebrae

• Aprender a Empreender – a série acompanha as ale-


grias e os conflitos de uma família, que herda uma loja
de variedades. Ao longo da série eles se deparam com
dificuldades típicas de um pequeno empreendedor e li-
dam com elas ora acertando, ora errando. A partir daí,
o programa explora as atitudes que devem ser tomadas
por um empreendedor na administração de seu negócio.
A série conta também com depoimentos de empreende-
dores de sucesso reais, que descrevem sua trajetória, dão
dicas de gestão: metas; estudos de viabilidade, busca de

292
oportunidades, marketing, planejamento e administração
financeira, relação com fornecedores e concorrentes, mo-
nitoramento do resultados da empresa.

• Outras séries temáticas, como o mesmo enfoque e formato


da série Aprender a Empreender: Aprender a Empreen-
der Serviços; Aprender a Empreender Pousadas e
Hotéis; Aprender a Empreender Têxtil e Confecções;
Sabor e Gestão; Boas Vendas!

• Cooperar é um bom negócio – série sobre empreendi-


mentos coletivos, em formato documental, com experiên-
cias exemplares e especialistas, apresentando os aspectos
mais relevantes para estimular esta modalidade de em-

Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora


preendimento e associativismo no Brasil.

• Comércio Justo e solidário – série que explora como


acessar mercados de forma diferente e mais justa? Preser-
vação do meio ambiente, comércio exterior e negócios in-
ternacionais, gestão democrática, transparência comercial,
igualdade de gênero.

• Globo Ciência – Inovação e Tecnologia – série voltada


ao público jovem, trata dos desafios enfrentados pelos em-
preendedores, para viabilizar a redução de custos, agilizar a
produção e desenvolver novos produtos. Em cada um dos
episódios, há entrevistas com cientistas, empreendedores
e estudantes sobre as pesquisas e os produtos inovadores
criados por eles, que modificam a vida de milhares de pes-
soas e geram emprego e renda.

• Juntos Somos Fortes – série sobre iniciativas de partici-


pação associativa no mundo dos negócios

• Juntos Somos Fortes – agronegócios – série sobre ini-


ciativas de participação associativa de produtores rurais no
mundo dos agronegócios.

293
Referências bibliográficas

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Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

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nia, democracia e participação. Rio de Janeiro: Editora Se-
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Capítulo III – Novas tecnologias e educação empreendedora

295
Capítulo 4
EXPERIÊNCIAS QUE DISSEMINAM
A CULTURA EMPREENDEDORA

Educação empreendedora
para um país empreendedor

O papel da universidade e do Sebrae na


disseminação da cultura empreendedora entre os
estudantes universitários

Universidades corporativas: ensino e


aprendizagem organizacional

Desafios em gestão das empresas candidatas ao


Prêmio MPE Brasil no Estado de São Paulo
Educação Empreendedora
para um país
empreendedor
Etel Tomaz71
Cândida Bittencourt72

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


Nos últimos anos, o empreendedorismo entrou para o vo-
cabulário do brasileiro como uma palavra difícil de pronunciar,
mas com um significado repleto de possibilidades para milhões
e milhões de pessoas. Ainda que não seja um conceito tão cla-
ro para grande parte da população, a maioria entende o sentido
com que é usado.

Tanto que um em cada quatro brasileiros economicamente


ativos tem um negócio próprio ou está envolvido de alguma for-
ma na criação de uma empresa. São 27 milhões de empreen-
dedores no Brasil, mais da metade pertencentes à revigorada
classe C. Um grande exército que precisa ser capacitado, não
apenas para práticas pontuais e corriqueiras, como acompa-
nhar um fluxo de caixa ou precificar produtos e serviços, mas
para mudar a cultura de toda uma geração de empreendedores
que tende a duplicar na próxima década.

71 Administradora de Empresas, Mestre em Engenharia de Produção, Analista Técnico e Ouvidora


do Sebrae
72 Jornalista, MBA em Gestão de Marketing, Gerente da Unidade de Marketing e Comunicação do
Sebrae

299
Não podemos esquecer que o empreendedor possui mais
escolaridade do que a média do cidadão brasileiro. Entre os 21
milhões de empreendedores, 78,6% têm acima de cinco anos
de estudo. Considerando a população total, apenas 64,7% dos
brasileiros têm este nível de escolaridade. Entre 1995 e 1999,
64% dos novos empresários possuíam ao menos o ensino mé-
dio (até 11 anos de estudo). Em 2010, esse número aumentou
para 74,5%.

Por outro lado, existem muitas iniciativas educacionais para


o empreendedorismo no país, mas a educação empreendedo-
ra, com uma perspectiva de longo prazo que contribua para a
formação de uma cultura empreendedora de inovação e de de-
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

senvolvimento no Brasil, ainda merece grande atenção e requer


políticas públicas ainda mais consistentes que os avanços que
o país já vem conquistando na área.

Partindo de uma atuação focada no fortalecimento das


empresas de menor porte, somente em meados dos anos 80,
o Sebrae, então Cebrae, passou a atuar no sentido de reduzir
as dificuldades para quem queria empreender. Começou por
estabelecer parcerias com as juntas comerciais para reduzir o
tempo de registro de uma pequena empresa e criou capacita-
ções para esse público.

O Curso Iniciação Empresarial, por exemplo, foi um pro-


duto amplamente difundido e implementado pelo Sistema Ce-
brae. Mesmo com recursos escassos, eram ministradas pales-
tras e realizados eventos com foco no empreendedorismo em
universidades e em cursos técnicos de nível médio.

No início dos anos 90, o tema ganhou força na sociedade,


especialmente durante o processo de privatização das estatais,
que seguiu o modelo da Inglaterra, o berço da primeira Revo-
lução Industrial, que apresentou na segunda metade do século

300
XX uma estrutura produtiva obsoleta, com baixa produtividade
e pequena capacidade competitiva, muito em função da emer-
gência tecnológica. A necessidade de conhecimento e inova-
ção ganhava força nos quatro cantos do mundo.

O movimento das incubadoras de empresas, tanto nos Es-


tados Unidos quanto na França, foi outro fator responsável pelo
interesse despertado nas universidades brasileiras. A abertura
comercial no Governo Collor teve grande importância nesse
período, pois além de despertar para a ênfase da qualidade na
gestão e nos produtos abriu espaço para um novo posiciona-
mento dos empreendedores que estavam iniciando seus negó-
cios. Eles passaram a buscar conhecimento e realizar plane-

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


jamento para reduzir as incertezas dos primeiros anos de vida
dos pequenos negócios.

Nesse contexto, surgiram as primeiras pesquisas sobre


o tema empreendedorismo e a geração de mais informações
para quem desejava ser o seu próprio patrão. Numa época em
que o emprego era o grande sonho dos brasileiros, os resul-
tados dessas pesquisas passaram a influenciar e fortalecer o
posicionamento da população que gostaria de ter seu próprio
negócio.

O Empretec73, um curso ainda hoje muito procurado em


todo o Sistema Sebrae, teve uma importante contribuição para a
capacitação dos empreendedores de todo o país. Iniciando um
Pequeno Grande Negócio (IPGN), um curso que partia de um
conceito claro sobre a importância do conhecimento do cliente e
do mercado para iniciar os negócios, com orientações para um
plano inicial para os negócios, teve muitos clientes oriundos dos
programas de demissão incentivada das estatais que estavam

73 Empretec – Pnud /Sebrae atualmente Unctad/Sebrae

301
passando por processos de privatização ou de reestruturação.
Vários outros produtos Sebrae foram importantes para a divulga-
ção do empreendedorismo, como a Feira do Empreendedor; o
Desafio Sebrae74; o Aprender a Empreender, cursos e consultoria
para elaboração de Plano de Negócios, entre outros.

O empreendedorismo foi sendo propagado e surgiram


muitas iniciativas para sua disseminação nas universidades e
em cursos de nível médio. As disciplinas sobre criação e desen-
volvimento de negócios e também as incubadoras de empre-
sas que foram implantadas, principalmente nos cursos de nível
superior, contribuíram para que o tema prosperasse no meio
acadêmico e gerasse negócios inovadores.
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

Outro fator que impactou positivamente na disseminação do


empreendedorismo no país foram as muitas ações de políticas
públicas de grande alcance que nos últimos anos trouxeram re-
sultados positivos para o empreendedor. A Lei Geral das Micro
e Pequenas Empresas trouxe, por meio do Simples Federal, a
simplificação tributária, mas também o uso do poder de compra
dos governos federal, estadual e municipal para o fortalecimento
dos pequenos negócios brasileiros e a formalização de milhões
de empreendedores com o surgimento do Microempreendedor
Individual. Um novo país surgiu a partir dessas medidas.

A educação e o empreendedorismo

Que estamos em um país empreendedor todos concorda-


mos e as pesquisas confirmam a nossa vocação. No Brasil,

74 Desafio Sebrae – Premio para universitários que participam de jogo de empresas – parceria
Coppe/UFRJ e Sebrae

302
as pessoas querem crescer e se arriscam ao criar negócios,
seja por oportunidade ou necessidade. Há um elevado grau
de incerteza, mas a crença dominante é que é possível realizar
e ter sucesso. Isso requer um ambiente econômico, legal e
social favorável para a sobrevivência e o desenvolvimento dos
pequenos negócios. Nesse sentido, o Brasil efetivamente vem
trilhando caminhos que contribuem para reduzir as chances de
não dar certo.

De acordo com a pesquisa Global Entrepreneurship Moni-


tor (GEM), (2012 p.9), ter seu próprio negócio é um dos maio-
res sonhos dos brasileiros, precedido apenas pelos sonhos de
viajar pelo Brasil e comprar a casa própria. O sonho de ter um

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


negócio próprio (43,5%) superou em muito o desejo de ter uma
carreira em uma empresa (24,7%).

Nesse contexto, a educação empreendedora tem relevante


papel. Por meio da educação é possível ampliar as possibilida-
des de êxito das pessoas que sonham em ter seus negócios e
necessitam de apoio para planejar e definir processos opera-
cionais adequados.

Para Farrel (1993, p.166) “a maioria dos empreendedores


automotivados não são muito diferentes de você e de mim. A
maioria deles nem mesmo planejou ser empreendedor. Acon-
tece em função de circunstâncias, frequentemente uma crise,
por serem muito pobres, por estarem cheios de frustração, por
serem despedidos. Circunstâncias são a razão número um que
fazem uma pessoa estabelecer-se por conta própria. São pes-
soas comuns que simplesmente se encontram em situações
extraordinárias.”

Pode-se acrescentar que todos os empreendedores bus-


cam conhecimento, de forma sistematizada ou não, para al-
cançar os seus objetivos. Atualmente, o conhecimento sobre

303
empreendedorismo e plano de negócios está disponível na in-
ternet, em cursos específicos sobre o assunto e mesmo nas
universidades. Muitos empreendedores já planejam os seus
negócios de forma estruturada, com base nos modelos dispo-
níveis que enfocam os diversos aspectos do negócio, com o
objetivo de reduzir os riscos e de orientar as diversas etapas da
implantação da empresa. O modelo Canvas BMG, disponível
em www.businessmodelgeneration.com tem sido muito difun-
dido para ser utilizado no planejamento de startups.

Existem, no entanto, pessoas que obtém informações de


forma aleatória, às vezes visitando uma empresa similar ou con-
versando com fornecedores de equipamentos e insumos, for-
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

ma essa que pode resultar em maiores custos de implantação


e operação. A falta de planejamento e de obtenção de conheci-
mento de forma sistematizada contribui para aumentar o risco
de empreender, conforme comprova pesquisa do Sebrae sobre
Fatores Condicionantes e Taxas de Sobrevivência e Mortalida-
de das Micro e Pequenas Empresas no Brasil, realizada entre
os anos de 2003 e 2005.

Muito além do sucesso empresarial, a educação empreen-


dedora contribui para que o país possa se tornar ainda mais
empreendedor. A perspectiva da educação empreendedora vai
muito além de uma capacitação para operacionalizar processos
empresariais, por meio dela o empreendedorismo pode contar
com a adesão de toda a sociedade e se tornar uma política
pública de grande valor para o país. A educação empreende-
dora, a médio e longo prazo, poderá favorecer o surgimento
de negócios inovadores e contribuir para o fortalecimento dos
pequenos negócios no Brasil.

Uma educação para que os jovens desenvolvam habilida-


des, e que dissemine conhecimentos para o empreendedo-

304
rismo e para a inovação em todos os níveis, desde o ensino
fundamental ao ensino médio, superior e nos programas de
pós-graduação.

O empreendedorismo por oportunidade – 69,2% dos en-


trevistados – avançou muito no Brasil em relação ao empreen-
dedorismo por necessidade, segundo a pesquisa GEM (2012,
p 13) “há indicativos de que as oportunidades criadas pelo di-
namismo recente do mercado interno da economia brasileira
vêm motivando empreendedores iniciais de faixas etárias mais
jovens e com maior escolaridade em atividades com potencial
de rendimentos relativamente mais elevados”.

O conhecimento consiste num dos principais insumos no

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


mundo dos negócios, tanto para os empreendedores por opor-
tunidade quanto para os empreendedores por necessidade,
ambiente fértil para o avanço da educação empreendedora. O
fomento ao desenvolvimento de habilidades empreendedoras e
ao conhecimento das funções empresariais junto à população
mais jovem irá contribuir decisivamente para a inovação e o
empreendedorismo.

Ao promover a educação empreendedora estamos consi-


derando a dimensão individual, enfocando os conhecimentos
necessários para os educadores, estudantes e comunidade,
mas também uma dimensão mais ampla, mobilizando a so-
ciedade para o tema e facilitando o acesso a programas de
educação empreendedora em todos os níveis.

Para Morin (2008 p.126) não há de um lado o individuo,


do outro a sociedade (...), de um lado a espécie, do outro os
indivíduos, de um lado a empresa com o seu diagrama, o seu
programa de produção, os seus estudos de mercado, do outro
os seus problemas de relações humanas, de pessoal, de re-
lações públicas, os dois são inseparáveis e interdependentes.

305
Dessa forma, o conhecimento para o empreendedorismo
por meio de um processo educacional que permita o desen-
volvimento de comportamentos e atitudes empreendedoras e
ainda, que os estudantes acessem conhecimentos sobre as
funções gerenciais que são fundamentais para os pequenos
negócios, podem contribuir e potencializar o surgimento de mi-
cro e pequenas empresas mais competitivas e inovadoras, com
importantes reflexos na sociedade e na economia.

O empreendedorismo na escola
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

Várias podem ser as perspectivas da educação empreen-


dedora, desde o ensino infantil, o Ensino Fundamental, o Ensino
Superior aos programas de pós-graduação. Esse artigo está
direcionado para as possibilidades do ensino do empreendedo-
rismo no nível médio, de forma integrada ou concomitante ao
ensino profissionalizante e também ao Ensino Superior.

A educação empreendedora pode ter seu início na infância


e ter importantes espaços na adolescência, período em que os
estudantes tendem mais a consumir do que pensar em formas
de obter os recursos que precisam para as suas necessidades
e desejos. Várias podem ser as oportunidades de abordar o
tema e despertar os estudantes, especialmente considerando
as possibilidades lúdicas do empreendedorismo.

Para Filion (2003), a educação representa um papel funda-


mental no desenvolvimento de uma sociedade empreendedora.
É nesse campo que os especialistas estão menos debruçados
e, muitas vezes, o empreendedorismo é visto pelas pessoas de
negócios como uma simples prática de negócios, mas supõe e
requer dimensões mais ligadas à aprendizagem da liderança e

306
outros conhecimentos que vão além das práticas de negócios.

O empreendedorismo é rico em oportunidades de autoco-


nhecimento, considerando especialmente que não há um ramo
do empreendedorismo e sim uma enorme variedade de cami-
nhos que podem ser explorados. Outro aspecto fundamental
é a elevação da autoestima dos estudantes, pois eles conse-
guem identificar oportunidades considerando os seus interes-
ses e sua realidade socioeconômica.

O assunto permite dinâmicas muito interessantes, desde


jogos e “brincadeiras sérias” que lhes permitam sonhar e que
despertem os alunos para a importância de encontrar caminhos
para realizar os seus sonhos e desejos. As dinâmicas e jogos

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


possibilitam elaborar situações criativas e elevar a consciência
de que eles mesmos podem obter, com maior independência,
os recursos que necessitam para “viabilizar os seus negócios”.

Dependendo da idade dos estudantes, é possível introduzir


textos mais densos, reportagens sobre empresários e empresá-
rias de sucesso, sempre considerando a necessidade de uma
linguagem adequada, que os levem a refletir sobre as práticas
vivenciadas nas dinâmicas e que os instiguem a incluir posturas
empreendedoras em seus scripts de vida.

Também para os professores e professoras, é importante


considerar que precisam participar de programas de forma-
ção empreendedora que considerem a necessidade de que
estejam preparados e sensíveis às possibilidades do assunto
empreendedorismo, mas que não onerem significativamente a
carga horária complementar as salas de aula. Trabalhar o tema
com materiais, exercícios, textos, desenhos e dissertações, por
exemplo, sem que para isso necessitem acrescentar muitas
horas de estudo de dedicação na elaboração das estratégias
de ensino e dos seus planos de aula.

307
O tema requer preparo, mas não é assunto apenas para
especialistas, quanto mais os professores e professoras pu-
derem trocar experiências e escrever sobre as práticas e os
resultados que estão obtendo, maiores as chances de disse-
minação de conhecimentos e de fomento à postura empreen-
dedora, tanto por parte desses educadores, quanto por parte
dos estudantes.

Empreendedorismo no Ensino Médio

Nessa etapa da vida, os estudantes já começam a se pre-


parar para decidir o seu futuro profissional. Em geral, são abor-
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

dados pelos amigos e familiares com perguntas sobre qual a


carreira que pretendem escolher. Ainda que seja um período de
sonhos e incertezas, os jovens são muito receptivos às infor-
mações sobre a realidade do mundo dos negócios, mas ainda
se o tema continuar a trazer conteúdo prático e possibilidades
de juntar colegas para “brincar” sobre o tema e enfrentar os
desafios que se apresentam.

Junto às estratégias de ensino para essa realidade, há


espaço para que as escolas integrem conhecimentos iniciais
sobre empreendedorismo e algumas funções empresariais ou
gerenciais nos seus currículos. Esses conhecimentos servirão
para os alunos mesmo que decidam optar pela busca de uma
vaga no mercado de trabalho tradicional. O empreendedorismo
para aqueles que irão se tornar empregados e não empregado-
res também é um recurso fundamental como forma de elevar o
intra-empreendedorismo nas empresas em que irão trabalhar.

Para Filion (2003), o ensino do empreendedorismo é pos-


sível e as suas práticas podem ser aprendidas em qualquer
idade, mas requer estratégia pedagógica específica. Segundo

308
ele, porque trata-se principalmente da transmissão de valores,
que geralmente é possível pelo contato com empreendedores
e pela troca de saberes entre os que o praticam.

Ao comportamento empreendedor são complementares


conhecimentos gerenciais, importantes para o empreendedo-
rismo e úteis à vida pessoal dos estudantes, sejam para torna-
rem-se trabalhadores autônomos, patrões ou empregados. As-
suntos como finanças, relacionamento interpessoal e qualidade
no relacionamento com os clientes, por exemplo, são temas
que podem significar o êxito de um pequeno negócio no inicio
de suas atividades, reduzindo as dificuldades típicas dos seus
primeiros anos.

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


No Brasil, existem várias iniciativas para o ensino do em-
preendedorismo no nível médio, um exemplo valioso é a Escola
Técnica de Formação Gerencial do Sebrae em Minas Gerais.
O Prêmio Técnico Empreendedor realizado em parceria com o
Ministério da Educação e o Sebrae foi outra experiência bem
sucedida de estímulo e despertar do empreendedorismo, no
entanto, ainda há uma grande oportunidade para se desenvol-
ver no Brasil um processo educacional mais consistente para o
empreendedorismo.

A experiência do Sebrae, após 40 anos de apoio e fomen-


to às micro e pequenas empresas, aliada ao esforço do go-
verno federal, é fundamental para a promoção do ensino do
empreendedorismo. No ensino médio, de forma integrada ou
concomitante, a educação empreendedora pode ser ministra-
da com recursos metodológicos já testados e que apresentam
bons resultados em diversos segmentos da sociedade.

Publicações como as histórias de sucesso que o Sebrae


catalogou junto a empresárias e empresários ao longo de sua
trajetória são insumos muito interessantes para integrar as me-

309
todologias de ensino do empreendedorismo. Outro aspecto
que pode ser estimulado é a tutoria a ser oferecida aos alunos
por empresários das comunidades em que estão inseridos. A
exemplaridade é um recurso pedagógico de grande alcance
nessa fase da vida estudantil dos jovens.

A partir da mudança da realidade da própria escola com


práticas empreendedoras, os educadores terão a oportunida-
de de envolver os seus alunos em um processo educacional
dinâmico e ampliado, de forma a promover o desenvolvimento
pessoal desses estudantes e das próprias comunidades.
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

Empreendedorismo no ensino superior e


nos programas de pós-graduação

Foi nos anos 1980 que o Brasil iniciou o ensino do em-


preendedorismo nas instituições de ensino superior, mas foi
só na década seguinte que a introdução de disciplinas de em-
preendedorismo, bem como a criação e o desenvolvimento de
pequenos negócios, principalmente nos cursos superiores de
administração e economia, se deu em maior escala.

Hoje, 30 anos depois, o desenvolvimento de programas e


cursos de empreendedorismo é parte do currículo e tem gran-
de visibilidade por professores e estudantes, mas ainda são
ofertados como matéria opcional em muitos cursos superiores.

As incubadoras de empresas estimulam o empreendedo-


rismo e fortalecem as empresas nos seus primeiros anos e as
preparam para competir e sobreviver no mercado. A partir das
primeiras experiências exitosas no país, como Santa Rita do
Sapucaí, em Minas Gerais, e São Carlos, em São Paulo, os

310
polos tecnológicos e as incubadoras se desenvolveram e apre-
sentaram resultados muito interessantes. No Brasil, a criação
da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreen-
dimentos Inovadores (Anprotec) e o apoio às incubadoras, em
parceria com o Sebrae, permitiram a ampliação do estímulo à
criação de empresas de estudantes universitários e de pesqui-
sadores em todo o país.

Os modelos de negócio têm sido modificados a partir


do avanço das tecnologias de informação e comunicação.
Ainda temos o surgimento de muitas empresas chamadas
tradicionais, mas elas passaram a surgir com algum aporte
tecnológico.

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


As startups, empresas nascentes com modelos de negó-
cios inovadores, atualmente contam com o interesse das uni-
versidades e dos organismos de fomento ao empreendedoris-
mo, como o Sebrae, por exemplo. Essas empresas surgem,
em geral, em ambientes de pesquisa e desenvolvimento e que
estimulam a agregação de valor pelo conhecimento e tecnolo-
gia. O potencial de negócios das startups é objeto de interesse
de investidores, que aportam capital de risco para fomentar es-
ses negócios e tem possibilitado o crescimento de várias des-
sas empresas nascentes.

Pesquisa qualitativa realizada pelo Sebrae, em 2012, junto


ao público da Campus Party, em São Paulo, indica que os jo-
vens criadores de empresas de base tecnológicas querem ob-
ter conhecimentos sobre empreendedorismo e gestão de ne-
gócios, mas querem em linguagem e plataformas adequadas à
sua realidade.

De acordo com Lopes (2010, p. 36), as habilidades em-


preendedoras, habilidades relativas à prontidão para o em-
preendedorismo e as funções de negócios indicam os con-

311
teúdos básicos para as habilidades acadêmicas na educação
empreendedora.

Há uma experiência importante em instituições capazes


de fomentar o empreendedorismo e a inovação. Vários re-
cursos metodológicos estão disponíveis no país. Desde o
elenco de programas e metodologias do Sebrae para elevar
a competitividade dos pequenos negócios e o conhecimento
gerencial dos empreendedores formais, sejam eles de MEI,
micro ou pequenas empresas urbanas e rurais até outros
recursos como filmes e jogos que podem ser utilizados com
motivação empreendedora:

• Jogos empresariais – games que além de proporcionar co-


Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

nhecimento possibilitam o entretenimento e a integração


dos estudantes com conteúdos que podem ser explorados
e associados ao empreendedorismo.

• Filmes do mercado cinematográfico – partes e cenas de


filmes que abordam temas gerenciais como recurso de re-
flexão sobre o empreendedorismo.

• Dinâmicas – explorar temas que desenvolvam conhecimen-


to, habilidades e atitudes empreendedoras.

• Debates – a partir das vivencias, de textos, dos filmes e dos


jogos utilizados para disseminar o empreendedorismo.

• Estudos de caso – tomando por base os livros editados


pelo Sebrae com Histórias de Sucesso.

É possível, portanto, desenvolver programas de em-


preendedorismo muito dinâmicos e também aulas teóricas,
com os recursos disponíveis no país. A partir dessas expe-
riências e da literatura disponível, estimular a reflexão sobre
o empreendedorismo no ambiente acadêmico e fomentar o

312
surgimento de novos recursos pedagógicos para a educação
empreendedora.

Nos programas de pós-graduação o empreendedorismo


está sendo objeto de pesquisas, teses e dissertações. As uni-
versidades estão oferecendo programas de pós-graduação ou
indicando o empreendedorismo como área de pesquisa, dis-
ponibilizando orientação de professores com conhecimento e
especialização na área.

Muitos são os estudos e pesquisas que mostram o em-


preendedorismo como ‘bola da vez’ no interesse de estudan-
tes, do ensino técnico, graduação ou pós-graduação e, em-

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


bora muitos deles sonhem em ser empreendedores no futuro,
poucos se preparam para abrir um negócio. O ambiente edu-
cacional ainda pode receber e oferecer uma contribuição muito
grande desse conhecimento e, com isso, ampliar as possibi-
lidades de sucesso dos empreendedores, desenvolvendo ha-
bilidades e competências no plano individual e fortalecendo o
empreendedorismo na sociedade, para se construir um país
ainda mais empreendedor.

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Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

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314
O papel da universidade e
do Sebrae na disseminação
da cultura empreendedora
entre os estudantes
universitários
Tainá Borges Andrade Garrido75

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


Introdução

A universidade é um ambiente de desenvolvimento inte-


lectual e técnico que prepara os estudantes para o mercado
de trabalho. O perfil profissional esperado pelas empresas é
aquele em que o profissional deve ser não só possuidor do
conhecimento teórico e técnico, mas também ter competên-
cias que vão além do explícito na matriz curricular dos cursos
superiores.

Dessa forma, o conhecimento técnico disseminado no am-


biente universitário, não é, por si só, capaz de garantir a absor-
ção desta mão de obra qualificada oriunda do universo aca-
dêmico. Surge então a necessidade das universidades serem
moldadoras de mão de obra tanto para a as empresas quanto
para futuros donos do seu próprio negócio.

75 Engenheira eletricista. Mestranda em Engenharia de Sistemas Eletrônicos e de Automação


(PGEA) – Universidade de Brasília (UNB). Analista da Unidade de Capacitação Empresarial (UCE)
do Sebrae.

315
Este artigo tem o propósito de apresentar, de maneira bre-
ve, alguns elementos para o debate objetivo do importante
papel da universidade e do Sebrae como disseminadores da
cultura do empreendedorismo.

O perfil empreendedor universitário

A transmissão de conceitos ligados ao empreendedorismo


no contexto universitário é de suma importância, visto que os
estudantes querem empreender, mas muitas vezes não sabem
como. Segundo o estudo da Endeavor (2012), que realizou a
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

pesquisa em 46 Instituições de Ensino Superior no Brasil, 60%


dos alunos pensam em abrir seu próprio negócio.

Devido a esse novo perfil universitário, é preciso atender, de


forma diferenciada, esses empreendedores em potencial, seja
o atendimento feito por universidades ou pelas instituições de
fomento ao empreendedorismo.

Segundo a Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9.394/96), em


seu artigo 43, a Educação Superior tem por objetivo formar
diplomados aptos para a inserção em setores profissionais e
para a participação no desenvolvimento da sociedade brasilei-
ra, além de estimular o conhecimento dos problemas do mun-
do presente, o que tem feito à sociedade esperar muito mais
das Universidades do que ser uma instituição centrada basi-
camente no ensino tradicional. Segundo AUDY et al., (2006) o
conceito de Universidade Empreendedora surge para satisfazer
essas novas demandas sociais.

Segundo o Censo (2010), em 2010, há 2.378 instituições


de Ensino Superior no Brasil, das quais 88,3% são privadas e
somente 11,7% são públicas.

316
Mesmo já existindo algumas universidades que ofertam
disciplinas ligadas ao tema empreendedorismo, ainda há muito
a ser feito. Segundo a pesquisa da Endeavor (2012), as univer-
sidades devem:

• Incentivar o ensino através da experiência;

• Aprofundar o ensino do empreendedorismo;

• Distribuir melhor a oferta de cursos;

• Entender melhor os estudantes, enquanto empreendedores


em potencial;

• Aproximar ainda mais a universidade do mercado de tra-

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


balho;

• Fazer com que o estudante se sinta capaz, e;

• Estimular o empreendedorismo entre as mulheres.

O estímulo ao empreendedorismo, porém, requer esforços


paralelos. Além das universidades, várias instituições têm se
manifestado a favor da disseminação do empreendedorismo
na educação.

Nesse sentido, a Organização das Nações Unidas para a


Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) (Delors, 1999), ao
acrescentar o “aprender a empreender” como pilar da política
educacional, procura estabelecê-lo como eixo da educação,
atrelando-o à missão de gerar alternativas para o desemprego
de modo a assegurar que mesmo em tempos de crise a huma-
nidade mantenha a produção coletiva de riquezas preservando
a apropriação privada.

O Sebrae também tem atuado visando atender os anseios


desses universitários que desejam empreender, fomentando
e apoiando o empreendedorismo através de seus projetos de

317
educação empreendedora voltados para o Ensino Superior, a
exemplo do Desafio Sebrae, dos convênios com as universi-
dades, além do estímulo a publicações de pesquisas e teses.

Desafio Sebrae

O Desafio Sebrae é um produto de sucesso criado em 2000,


que atua com foco em educação empreendedora e tem como
público os universitários. Esse produto começou a ser idealizado
em 1997 e foi realizado por meio da parceria entre o Sebrae e o
Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenha-
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

ria (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Em 2000, foi lançada a versão piloto do Desafio Sebrae e


apesar da divulgação ter sido feita exclusivamente nas univer-
sidades, as inscrições se esgotaram em apenas três dias com
800 inscritos, reunindo 200 equipes, espalhadas por 67 cida-
des em 20 estados brasileiros.

O tema do jogo virtual na versão piloto foi uma empresa de


objetos de mármore, inspirado na Saito76. Depois de uma acir-
rada disputa, a equipe Camorra, da Universidade Federal de
São Carlos (UFSCar), sagrou-se campeã. Em julho do mesmo
ano, os vencedores embarcaram para a Califórnia (EUA), para
conhecer o Vale do Silício.

O Desafio Sebrae é um ambiente de simulação empresa-


rial, voltado para o público universitário, que simula o dia a dia
de uma empresa, onde é possível testar a capacidade de ad-
ministrar um negócio, tomar decisões e trabalhar em equipe.

76 Saito Indústria e Comércio DE Mármores Artísticos Ltda.

318
A participação no jogo é por equipes, de três a cinco
alunos universitários de Instituições de Ensino Superior cre-
denciadas pelo Ministério da Educação (MEC). O jogo tem
duração de aproximadamente seis meses, acontecendo em
duas fases: a presencial e a distância (pela internet). Cada
fase representa um período de três meses, onde as decisões
são tomadas em função da dinâmica do mercado em que a
empresa está inserida. O jogo reproduz a dinâmica da vida
empresarial, que requer conhecimentos e comportamentos
específicos para cada situação.

Os conteúdos de gestão empresarial são transmitidos atra-


vés do jogo de forma lúdica e as características do comporta-

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


mento empreendedor (MCCLELLAND, 1961) são desenvolvi-
das a cada etapa do jogo.

Segundo Ferreira (2010), o Desafio Sebrae consiste em um


jogo que simula situações vividas por empresários e os partici-
pantes devem estar aptos a resolver situações como se fossem
verdadeiros executivos.

Dessa forma, o Desafio Sebrae, enquanto jogo de simula-


ção de empresa, estimula o raciocínio e expõe os jogadores a
situações em que ele terá de aplicar conhecimentos de gestão
empresarial. É um cenário simulado que representa modelos
reais, tornando possível a reprodução do cotidiano, desenvol-
vendo nos participantes do Desafio Sebrae, habilidades na to-
mada de decisões estratégicas, levando em consideração as
diversas áreas funcionais da empresa, de modo a coordenar os
esforços para o alcance dos objetivos traçados.

Para que os participantes conheçam o funcionamento de


diferentes setores empresariais, a cada nova edição o jogo é
apresentada uma temática inspirada em uma empresa espelho
como é mostrado na Tabela 1.

319
Tabela 1 – Temas do Desafio Sebrae

Ano Tema
2000 Indústria de Mármore
2001 Velas decorativas
2002 Perfumes
2003 Moda surfwear
2004 Bolas Vôlei
2005 Floricultura
2006 Moveleira
2007 Cosméticos
2008 Calçados femininos
2009 Brinquedos artesanais
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

2010 Instrumentos Musicais


2011 Veículos Sustentáveis
2012 Fruticultura

Fonte: Sebrae (2012).

A competição no Desafio se dá pela tomada de decisão


estratégica de cada equipe, em que a empresa simulada se
encontra inserida em um mercado, com outras empresas con-
correntes de outros estudantes, que analisam aspectos como
a produção, marketing e o gerenciamento da empresa como
um todo.

O Desafio Sebrae é uma ferramenta educacional que pos-


sibilita o aprendizado e aperfeiçoamento do jogador em múlti-
plas facetas como:

• Desenvolver capacidades no uso de ferramentas quantita-


tivas;

• Evitar que os erros se repitam em uma situação real, através


da tentativa e erro no ambiente de simulação;

320
• Possibilitar que os jogadores façam experiências no pro-
cesso de tomada de decisões em gestão empresarial, atra-
vés do simulador;

• Desenvolver habilidades e comportamentos empreendedo-


res, além da análise e interpretação de relatórios econômi-
cos e financeiros das empresas.

Desafio Sebrae no Brasil

Desde a sua criação, o Desafio Sebrae vem alcançando um

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


número cada vez maior de participantes em todo o Brasil. Em
2010, o Desafio alcançou sua maior marca: 158.484 estudan-
tes inscritos. No Gráfico 1 apresentamos a evolução do número
de inscritos desde a sua criação até 2012.

Gráfico 1 – Desafio Sebrae (2000-2012)

160.000
140.000
Número de inscritos

120.000
100.000
80.000
60.000
40.000
20.000
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

Fonte: Sebrae (2012)

Analisando o período de 2010 a 2012, constatamos que


a maior participação por região brasileira foi do Sudeste em

321
todo o período. Observa-se que em 2012 a Região Nordeste
teve participação no Desafio Sebrae semelhante à do Sudes-
te (Gráfico 2).

Gráfico 2 – Desafio Sebrae (2010-2012)

60.000
Número de participantes

40.000

20.000
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

0
Norte Nordeste Centro-Oeste Sul Sudeste

2010 2011 2012

Fonte: Sebrae (2012).

A participação no Desafio Sebrae quanto ao gênero é bem


distinta quando se analisa cada estado individualmente (Gráfico
3). Em sua maioria, o número de participantes do sexo mas-
culino supera as inscrições de estudantes do sexo feminino,
fazendo com que as mulheres representassem 30% dos parti-
cipantes do Desafio Sebrae no ano de 2012.

Gráfico 3 – Participação por gênero nos Estados:


Desafio Sebrae 2012

9.000
8.000
7.000
6.000
5.000
4.000
3.000
2.000
1.000
0
AC AL AP AM BA CE DF ES GO MA MT MS MG PA PB PR PE PI RJ RN RS RO RR SC SP SE TO

Masculino Feminino

Fonte: Sebrae (2012).

322
Internacionalização do Desafio Sebrae

Em 2002, teve início o processo de internacionalização do


Desafio por meio de um projeto-piloto, realizado na Argentina.
No ano seguinte, o jogo foi implantado na Argentina, de forma
definitiva, e foram iniciados pilotos no Paraguai, Uruguai e Chile.
Em 2006, foi realizado o piloto no Equador. Em 2007, Argenti-
na, Paraguai, Uruguai, Peru, Colômbia e Equador realizam as
edições completas do jogo.

O Desafio Sebrae está presente, além do Brasil, em mais


oito países da América Latina: Argentina, Chile, Colômbia,

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


Equador, Panamá, Paraguai, Peru e Uruguai. Em 2012, o De-
safio obteve mais de 1 milhão de inscrições na América Latina.

Nota-se então, a abrangência do Desafio Sebrae também


em países vizinhos, estando hoje consolidado no mercado in-
ternacional. Para isso, o jogo sofreu algumas adaptações para
atender os requisitos de outras nações.

Considerações finais

O Ensino Superior precisa ser encarado como uma ala-


vanca para o desenvolvimento brasileiro para que deixe de ser
somente fornecedor de conhecimentos técnicos, tornando-se
um guia para os futuros empreendedores universitários. Des-
sa forma, na universidade, devem ser reproduzidos não só
conhecimentos técnicos de gestão empresarial, mas também
devem ser desenvolvidas as características do comportamen-
to empreendedor.

323
O aluno, enquanto futuro empreendedor deve ser capaz de
desenvolver projetos, colocando em prática os conhecimentos
adquiridos em gestão empresarial e em sua área de formação.

Para atender os anseios dos universitários e colaborar


no desenvolvimento socioeconômico brasileiro através do
fomento aos pequenos negócios, o Sebrae apresenta aos
universitários instrumentos como o Desafio Sebrae, uma im-
portante ferramenta para disseminar o empreendedorismo
entre os jovens no país.

O Desafio Sebrae começou, em 2000, com 800 inscritos,


ultrapassando, em 2010, a marca de 150 mil estudantes inscri-
tos. Desde a sua criação, o Desafio Sebrae promoveu o acesso
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

à cultura empreendedora a mais de um milhão de universitários


no Brasil e América Latina, com índice de 95% de satisfação.
A abrangência do projeto é percebida pela participação, em
2012, de mais de 87% das de instituições de Ensino Superior,
em todas as regiões do país, e pelo grande número de partici-
pantes inscritos todos os anos.

Os dados demonstrados neste artigo traduzem a solidez e


relevância desse jogo, nos levando a entender os motivos de o
Desafio Sebrae ser considerado um dos projetos mais bem su-
cedidos na difusão da cultura empreendedora do Sebrae: sua
forte aceitação entre os universitários, o grande número de parti-
cipantes todos os anos e por ser um dos elos do Sebrae com as
Instituições de Ensino Superior, em prol da difusão da educação
empreendedora no Ensino Superior do Brasil e da América Latina.

Em 12 anos (2000-2012) de existência, o Desafio Sebrae,


um jogo virtual de negócios com a finalidade promover a edu-
cação empreendedora, passou por adequações de conteúdo
e evoluções tecnológicas. Ano a ano, foi registrado aumen-
to no número de participantes inscritos. No primeiro ano, em

324
2000, 800 estudantes universitários participaram da competi-
ção. Os números evoluíram bastante, chegando a 1 milhão de
estudantes, em 2012, em todo o país. É possível afirmar que
nesse período o Desafio Sebrae cumpriu seu papel na difusão
da cultura empreendedora junto ao público universitário, pois
trata-se de um jogo voltado à capacitação de seus competi-
dores frente ao desafio de fazer a gestão de um determinado
empreendimento, competitivamente.

Cada vez mais a sociedade em rede exige que os produtos


passem por inovações radicais, já que muitas vezes a inovação
incremental não é suficiente para atender as expectativas do
consumidor, a cada dia mais exigente e bem informado. É pre-

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


ciso pensar em soluções criativas para serem implementadas
em curto prazo. A proposta do Sebrae para os próximos anos
é ampliar o atendimento aos universitários, se beneficiando de
games como estratégia de fomento ao empreendedorismo e
capacitação, de modo a alcançar um número ainda maior de
jovens engajados em torno do tema.

Nesse sentido, foi realizado em 2012 um extenso estudo


sobre o mercado de jogos e oficinas de ideias, que teve por
objetivo criar novos formatos para o Desafio Sebrae, buscando
possibilidades para um novo produto que de forma lúdica, além
de desenvolver e potencializar conceitos de gestão de negócios,
bem como competências empreendedoras junto ao público uni-
versitário. Em 2013, o projeto está sendo construído e seu lança-
mento está previsto para o segundo semestre. O objetivo desse
novo formato do Desafio é desenvolver a capacidade gerencial
em pequenos negócios e habilidades empreendedoras de for-
ma interativa e descentralizada, por meio de atividades on line
e presenciais, que atuem, de forma complementar, na difusão
dos conceitos de competitividade, ética, associativismo, além de
possibilitar a capacitação do estudante universitário.

325
Referências Bibliográficas

AUDY, Jorge et al. Inovação e empreendedorismo na uni-


versidade = Innovation and entrepreneurialism in the university
/ org. Jorge Luis Nicolas Audy, Marília Costa Morosini. – Porto
Alegre : EDIPUCRS, 2006. 461 p. ISBN 85-7430-595-2

DELORS, Jacques (org.). Educação – um tesouro a desco-


brir. 3. ed. São Paulo: Cortez. Brasília, DF: MEC: UNESCO,
1999. 288 p.

Endeavor. Pesquisa Endeavor (2012). <http://promo.endeavor.


Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

org.br/pesquisa>. Acesso em: 18/02/2013.

FERREIRA, Thiago Spiri. Jogos de Empresas: ênfase no


Desafio Sebrae, 2010, 50f. Trabalho de Conclusão de Cur-
so (Bacharelado em Administração) – Faculdade Pitágoras de
Londrina. Londrina, 2010.

IBGE. Estimativa de população 2012. www.ibge.gov.br/


home/estatistica/populacao/estimativa2012. Acesso em:
25/02/2013.

Lei nº 9.394 de 1996. Lei de Diretrizes e Bases – LDB.


MCCLELLAND, David. The Achieving society. New York:
VanNostrand, 1961.

SEBRAE. http://www.organizador.desafio.sebrae.com.br/
Acesso em: 26/02/2013.

326
Universidades Corporativas:
Ensino e Aprendizagem
Organizacional

Ricardo Rivadávia Lucena Sampaio77

Introdução

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


Este artigo busca oferecer informações sobre o fenôme-
no educacional das universidades corporativas enquanto fer-
ramentas inovadoras e estratégicas, utilizadas pelas empresas
para garantir competitividade e permanência no mercado, com
a concepção de que o maior e melhor capital das empresas é
o conhecimento disponível e a competência instalada de seus
integrantes.

A atual mercado de trabalho, com o crescimento da de-


manda por bens e serviços inovadores, e o surgimento da acir-
rada competitividade nos postos de trabalho, cenários onde
profissionais tradicionais e profissões inéditas veem a cada dia
a mudança em suas regras e estruturas de empregabilidade,
impõe novas propostas e novas metodologias educacionais.
Mais do que nunca na história, há a necessidade de maior
aproximação entre a Universidade e as empresas. A lógica e

77 Economista. Mestre em Planejamento Educacional pela Universidad Alcalá (Espanha). Gerente


da Unidade de Capacitação Empresarial no Sebrae AM.

327
velocidade com que se processam essas mudanças de exi-
gências e demandas do mercado obrigaram as organizações
atuantes a adotar medidas de qualificação constante e intensi-
va de mão de obra, revendo não apenas conteúdos, etapas e
processos tradicionais de treinamento, mas também buscando
estratégias e metodologias flexíveis e adequadas, capazes de
auferir resultados efetivos, de forma rápida e acessível. Essas
alterações têm impacto não apenas na forma, mas também
nos processos e metodologias utilizadas na capacitação dos
aprendizes, motivadas pela flexibilidade, interatividade e aces-
sibilidade que esse novo propõe. A universidade corporativa
demonstra diversos ganhos em ambas as partes – empresas e
indivíduos – sendo, portanto, uma das razões da rápida propa-
gação do modelo.

Embora sua eficiência e viabilidade sejam questões compro-


vadas pela teoria e pela prática, recomendamos que não se adote
o modelo de Universidade Corporativa como panaceia para todos
os problemas de uma organização; ela é válida e até lucrativa, mas
não é o único fator isolado a responder pelo sucesso. A adoção
do modelo exige que sejam observadas de forma intensiva suas
peculiaridades próprias, em todas as etapas do processo: plane-
jamento, implantação, gestão estratégica, monitoramento e ava-
liação de resultados. As universidades corporativas precisam ser
entendidas como caminhos eficazes de otimização de competên-
cias, e não apenas atalhos para a competitividade.

Contexto Histórico

A primeira concepção de “Universidade Corporativa”, com


esse termo, um neologismo interessante da administração mo-
derna, foi configurada por Meister (1999, p. 56), com as pesqui-
sas realizadas pela empresa norte-americana de consultoria em
educação corporativa, a Corporate University Xchange. Nessa
pesquisa, de 1998, foram catalogadas as melhores práticas
realizadas pelas cem melhores universidades corporativas, nos
Estados Unidos, e identificados aspectos importantes para a
estruturação do modelo: planejamento e projeção, administra-
ção, funcionamento, programas de aprendizagem, público de
interesse da universidade, entre outros.

Embora se fale de universidades corporativas há pelo me-


nos 40 anos, ou seja, desde que a General Electric lançou a
Crotonville Management Development Institute, em 1955, um
verdadeiro surto de interesse na criação de universidades cor-

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


porativas ocorreu no final da década de 80, como complemento
estratégico do gerenciamento, aprendizado e desenvolvimento
dos funcionários da organização.

Historicamente, no entanto, a adoção de um modelo intera-


tivo “empresa + indivíduo”, de formação profissional, não é tão
antiga. As primeiras manifestações da atividade de treinamento
profissional que se tem registro foram feitas a partir da Primeira
Guerra Mundial, quando para suprir as vagas deixadas pelos
trabalhadores, convocados para essa Guerra, foi necessário à
Europa formar mão de obra qualificada para o atendimento da
força de trabalho das indústrias.

Anteriormente a esse período, as poucas e esparsas ini-


ciativas de treinamento e de manualização de processos regis-
tradas eram consideradas desnecessárias e até inúteis, uma
vez que o modo de produção artesanal centrava o valor do
produto na habilidade nata e pessoal do trabalhador. Era o mo-
mento da existência dos mestres e aprendizes de ofício para os
quais, “muitos eram chamados e poucos escolhidos” para de-
sempenhar a função, posto que habilidades manuais, destreza

329
laboral e criatividade pessoal eram os únicos determinantes da
qualidade do trabalho do indivíduo. Nem todos os que se can-
didatavam a um ofício conseguiam aprendê-lo, somente uma
minoria era habilitada para o trabalho. Com a massificação da
produção, esse quadro precisava mudar. Tradicionalmente, no
entanto, a maior parte das empresas ainda adota um modelo
de Capacitação focado no Treinamento Empresarial, nos mol-
des educacionais de aula presencial e cursos com conteúdos
genéricos.

Após a iniciativa e os resultados apresentados pela General


Eletric, seguida pela Chrysler, Ford e outras grandes empresas,
o número de indústrias que aderiu à proposta cresceu mais que
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

15 vezes nos últimos 20 anos, com experiências exitosas. Há


relatos de sucesso nas mais diferentes culturas, de cidades tão
diferentes como Texas, Yokohama, e países como Cingapura,
Pequim, China, Brasil, Austrália e Nova Zelândia – e isso mostra
que as UC são uma tendência mundial. Somente nos Estados
Unidos existiam, em 1999, segundo Meister (1999), pelo me-
nos 2.000 empresas com modelos de Educação corporativa
implantada. Dados mais recentes da internet, em sites públi-
cos, já indicam a existência de pelo menos 8.000 empresas
norte-americanas adeptas ao modelo.

Antes do advento da “Divisão do Trabalho”, a partir da fa-


mosa intervenção feita por Adam Smith, em 1778, com a publi-
cação do clássico “A Riqueza das Nações” que trata o célebre
modelo de fabricação de alfinetes, no qual todo o processo
produtivo era desenvolvido pelo “artesão” – todos os processos
de produção ainda estavam concentrados em uma só pessoa.
O caso histórico da produção de alfinetes, por exemplo, foi re-
partido em 17 etapas diferentes, e ao invés de empregar um, se
criavam mais 16 postos de trabalho, o que em suma, era bom
para todos, empregadores e empregados. Destaque-se, con-

330
tudo, que essa mão de obra barata possuía pouca ou nenhu-
ma habilidade de domínio do processo como um todo e, por
isso, a atividade de treinamento era simplória – e muitas vezes
desenvolvida na própria empresa. Com isso, o empregado não
conhecia o processo como um todo, apenas parte dele.

Mas com a velocidade da competitividade e a necessidade


de aumento da produção, a indústria começou a desenvolver
métodos e sistemas operacionais baseados na divisão do tra-
balho, que até então se mostrava muito eficaz. Utilizando um
cronômetro, começaram a desenvolver experiências impac-
tantes nos resultados das empresas, atribuindo um valor e um
tempo a cada etapa do processo produtivo, consolidando o

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


modelo por muitas décadas seguintes – e ainda usado até hoje.

Esses processos e métodos de capacitação e de produ-


ção foram detalhados posteriormente pelo engenheiro estadu-
nidense Frederick Winslow Taylor (1856-1915) e Henri Fayol,
na publicação de outro referencial da administração moderna,
com a publicação do livro “Princípios de Administração Cientí-
fica”, em 1911. Com a estruturação do treinamento com base
científica como meio de formação profissional, o sistema de
treinamento evoluiu muito. Academicamente, comenta Martins
(1980), passou a vigorar uma proposta de estruturação do tra-
balho de forma coordenada,

Esta forma de treinamento é tida como “científica”,


por fundamentar-se em critérios estritamente racionais
e significar a saída e o avanço sobre um antigo méto-
do de trabalho artesanal, onde a autonomia do traba-
lhador lhe permitia alterar constantemente o processo
produtivo e, nem sempre, por esta razão, desenvolver
produtos com a mesma especificação ou qualidade.
(MARTINS, 2009, p. 224, cap. 31).Foi neste contexto

331
que surgiram os primeiros espaços para o treinamento
e capacitação de trabalhadores em bases puramen-
te operacionais, com baixa intervenção humana no
processo e a adoção de movimentos padronizados
e autômatos. Segundo comentários de Fleury (2006,
p. 99), esta tendência de desqualificação do trabalho
operário atingiu seu momento crítico na virada do sé-
culo XX, sendo Taylor e Fayol seus principais artífices.

Um dos mais conhecidos expoentes citados na literatura


acadêmica sobre a prática destes princípios foi a Fábrica de
Automóvel Ford, de Henry Ford, empreendedor americano que
revolucionou a história da indústria ao inserir estes conceitos na
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

fabricação de automóveis; um feito inédito, se considerarmos


que a produção de um carro, na época, tinha mais de 7.882
etapas diferentes.

A esse respeito, Fleury (2006 p. 100) faz as seguintes ob-


servações:

Das 7.882 etapas de espécies distintas de ope-


rações... 949 eram classificadas como trabalho que
exigia homens sãos e fortes, de perfeita saúde; 3.338
espécies exigiam o desenvolvimento físico comum
e força normal. Entre as 3.595 espécies restantes,
nenhuma exigia esforço físico, de modo que podia
efetuá-las o homem mais fraco e débil, mulheres ou
meninos.Os trabalhos mais fáceis foram, por sua vez,
classificados, para verificar quais deles exigiam o uso
completo das faculdades; comprovou-se, então que,
670 trabalhos podiam ser confiados a homens sem
ambas as pernas; 237 requeriam o uso de uma só
perna; em dois casos podia-se prescindir dos dois
braços; em 715 casos, de um braço, e em 10 casos,

332
o trabalho podia ser feito por cegos (apud BRAVER-
MAN, 1977, p. 145-148).

Oportunamente, essa situação não perdurou até os nossos


dias. Já a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, a produção
de bens de consumo se viu novamente às voltas com uma de-
manda imensa, que nos moldes tradicionais era impossível de
ser suprida. Embalada pelos anos de gigantesco crescimento
populacional do pós Segunda Grande Guerra, e com o adven-
to do Baby Boom, um fenômeno demográfico que provocou
uma superexpansão das taxas de natalidade nos países oci-
dentais nas décadas de 50 e 60, a única saída encontrada pela
indústria para o provimento de suas demandas foi implantar

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


o processo de mecanização e posteriormente, a robotização;
chega-se à década de 70 com novas e intrigantes questões na
atividade empreendedora.

De acordo com Fleury (2006, p. 102), nos últimos 50 anos,


as empresas que começaram a adotar processos de produção
calcados na mecanização, informatização e, posteriormente, a
robótica, tiveram de repensar seu papel na cadeia de relações
sociais; ontem, a empresa detinha um papel de absorvedor da
mão de obra preparada pela universidade e escolas; hoje, elas
atuam como colaboradoras e complementadoras do proces-
so de formação desses profissionais; não apenas para obter a
melhor qualificação de sua mão de obra interna, mas também
como uma estratégia de competitividade e permanência no
mercado ou ambos, empresa e indivíduo.

O aumento da complexidade dos processos operacionais


migrou a atividade laboral para uma complexidade crescente
de manuseio e programação de maquinário, que exigiam do
operador não apenas o exercício de um movimento ritmado e
repetitivo, mas um processo cada vez mais complexo de ope-

333
rar máquinas e equipamentos sofisticados e, para as quais,
o treinamento empresarial, por si só, já não podia atender as
competências devidas.

Segundo Martins apud Chiavenato apud Meister (2006, p.


235), é nesse contexto que surgem as primeiras iniciativas de
Universidades Corporativas. Componente importante na Ges-
tão do Negócio, quando os Recursos Humanos passaram a
figurar como parte importante – talvez a mais importante – para
o sucesso e permanência no ramo da empresa ou instituição.

A partir daí, então, surge esta nova configuração de ca-


pacitação, que não é um resultado abrupto e inesperado da
nova era da Informação, e sim, a consolidação da sofisticação
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

dos processos produtivos, que têm seu marco desde o final


da Idade Média e primeiros momentos do século XIX. O valor
agregado mais importante que se tem na industria moderna,
passou do insumo para o conhecimento.

Quadro 01 – Organizações em Transição

Modelo Antigo Item Protótipo do Sec XXI


Hierarquia Organização Rede de Parcerias e
Alianças
Desenvolver a Missão Criar mudanças com valor
maneira atual de agregado
fazer negócios
Autocrática Liderança Inspiradoras
Domésticos Mercado Globais
Custo Vantagem Tempo
Ferramentas para Tecnologia Ferramentas para
desenvolver a desenvolver a colaboração
mente
Homogênea Força de Trabalho Diversa

334
Modelo Antigo Item Protótipo do Sec XXI
Funções Processos de Equipes de trabalho
de Trabalho Trabalho Interfuncionais
separadas
Segurança Expectativas do Desenvolvimento Pessoal
Funcionário
Tarefa das Educação e América Corporativa mais
Instituições de Treinamento um leque de empresas
Ensino Superior educacionais com fins
lucrativos

Fonte: Martins (2009)1997 Corporate University Exchange, Inc. (p3)

No início do século XXI, Éboli (2002, p. 186) estimava que,

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


em 2010, o número de universidades corporativas nos Esta-
dos Unidos ultrapassasse o volume de universidades tradicio-
nais, tornando-se o principal veículo de educação de estudan-
tes pós-secundaristas. Essa previsão tem se mostrado muito
acertada. Nesse ponto, Éboli (2004, p. 18) cita o trabalho de
pesquisadores como o chileno José Luis Brunner, da Fundação
Chile, a projetar, no que talvez seja um otimismo excessivo, que
em 2020 o conhecimento registrado dobrará a cada 73 dias.

Dessa forma, a única maneira de um profissional manter-


se atualizado é transformar-se, como na música, num eterno
aprendiz. Os autores dizem ainda, que com o advento das uni-
versidades corporativas, o treinamento nas empresas ganhou
dimensão institucional. O que era função da administração de
recursos humanos ganhou caráter estratégico e passou de
centro de custos a centro de lucro.

Com isso, cria-se uma relação bilateral de dependência, as


empresas precisam de mão de obra qualificada, que por sua
vez precisa das empresas para a manutenção do status social
e melhoria das condições de vida de todos.

335
Modelo de gestão por competências

Universidade corporativa, conforme sugere a expressão,


é, uma forma de aprendizagem permanente, diversificada, em
que competências são desenvolvidas pelas oportunidades de
aquisição de novos conhecimentos, pelo exercício de habilida-
des e pela reflexão acerca de valores e atitudes importantes
para o negócio.

Conforme Meister, (1999, p. 31), o modelo de Universidade


Corporativa é baseado no modelo de Gestão de Pessoas por
Competências, e vincula a aprendizagem às necessidades es-
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

tratégicas da empresa. Em segundo lugar, o termo corporativo


sinaliza que essas amplas oportunidades têm estreita e inarre-
dável vinculação com as definições estratégicas mais relevan-
tes da organização.

O conceito de competência é diverso entre vários autores.


Zarifian (1996, p.57) faz uma distinção entre competência x
competências; conceitua “competência”, no singular, como a
capacidade de assumir responsabilidade pessoal em relação
às situações produtivas sob sua égide, com a mobilização de
sua inteligência e de sua subjetividade, e também no exercício
sistemático de uma atitude reflexiva frente ao próprio trabalho e
as implicações disso no processo, trabalho dos outros.

Meister (1999, p.105), por outro lado, define competência


como qualquer conhecimento, habilidade, conjunto de ações
ou padrões de raciocínio que diferenciem de, alguma forma
inequívoca, os profissionais de nível superior dos médios. Por-
tanto, competência, mais do que um conjunto de capacidades
e habilidades que o indivíduo deve ter para ocupar um determi-
nado posto de trabalho, é uma “atitude social de implicação”.

336
Os citados autores dizem ainda, quando trazem à tona a
noção de reflexividade (ação – reflexão- ação do seu próprio
trabalho), que para ser um recurso positivo na atividade laboral,
o trabalhador precisa responder afirmativamente a três fatores:
da possibilidade de os indivíduos buscarem, de fato, a com-
preensão dos eventos, indo até suas causas finais, tendo, para
tal, tempo e disponibilidade; da organização do trabalho, de
modo a estruturar momentos para seu questionamento, fora
das situações de pressão; e da importância que a hierarquia
atribui ao desenvolvimento da atitude reflexiva.

De acordo com Carvalho (1987, p.50) apud Carrion (1998,


p. 26), no interior das organizações, a construção da compe-

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


tência pode ser entendida como uma “competência socialmen-
te construída”, que tem de um lado, o conjunto de saberes
cognitivos, práticos e sociocomportamentais que o indivíduo
mobiliza para fazer frente aos desafios do trabalho e, de ou-
tro, os procedimentos que a empresa adota para se assegurar
do provimento da força de trabalho nos termos em que avalia
como mais adequados à valorização do capital.

Outra citação digna de nota é a de Zarifian (1996, p.39),


que identifica três grandes domínios a serem levados em conta
na capacitação dos colaboradores:

A) As Competências técnicas, traduzidas no domínio dos pro-


cessos e dos equipamentos;

B) As Competências de gestão, relativas à gestão da qualida-


de e dos fluxos da produção (seu planejamento e seqüên-
cia) e

C) As competências de organização, concentradas em torno


da comunicação e do binômio iniciativa-autonomia.

337
Nesse aspecto, o autor considera também o envolvimento
da alta liderança como fator primordial para que uma empresa
esteja focada no desenvolvimento das competências a partir de
objetivos estratégicos. Ele afirma também que

A experiência tem demonstrado reiteradamente


que a condição isolada mais importante para o su-
cesso é o senso de propriedade e o envolvimento ati-
vo da equipe executiva. Seu destaque quanto a esse
assunto se dá pelo fato de que nos diversos casos
analisados de empresas que atuam em um ambiente
altamente competitivo, a acirrada mudança no mer-
cado impõe a implantação de mudanças constantes.
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

Por essa razão, se as pessoas do topo não atuarem


como líderes vibrantes do processo, as mudanças não
ocorrerão e a estratégia não será implementada, per-
dendo-se a oportunidade de desempenho extraordi-
nário. (KAPLAN, 2000, p. 26 e 27).

A compreensão da ideia é simples. A alta gerência que bus-


ca resultados efetivos precisa ser exemplo e padrão de desen-
volvimento e comprometimento com os resultados. É necessá-
rio não apenas mobilizar as pessoas, mas comprometê-las de
forma pessoal com o alcance das metas; o ideal mesmo, como
recomenda o autor, é que se consiga aproximar o máximo pos-
sível, as escolhas estratégicas (competências empresariais) das
escolhas pessoais (competências humanas), para a obtenção
dos melhores resultados.

Em concordância a estes pressupostos, Meister (1999, p.


39) ao observar o currículo básico das universidades corpora-
tivas, destaca de forma didática essa visão na escolha do que
ela chama de três C:

A) Cidadania Corporativa – Proporcionar aos colaboradores o

338
aprendizado das crenças, valores e cultura da organização,
de forma a incluir a todos em um programa de crescimento
profissional orientado.

B) Contextualização – Oferecer uma noção de “pertencimen-


to” de gerar valores gregários que comprometam o colabo-
rador com os resultados e metas desejados pela empresa,
visando sua cumplicidade no alcance destas metas e resul-
tados. Com isso, é possível fazer com que o colaborador
compreenda o grau de importância do seu e do trabalho
dos outros, atuando mais como uma equipe e não mais
como um grupo.

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


C) Competências Básicas – Dotar os colaboradores de in-
formações, conceitos e conhecimentos complementares
e inter-relacionados, colaborando assim com a criação
das Universidades Corporativas, de forma que favoreça
o fortalecimento das vantagens competitivas da empre-
sa. Abrange assim desde momentos conceituais básicos,
pertinentes a operação de máquinas e equipamentos,
até o conhecimento da tecnologia do negócio, desenvol-
vimento de lideranças e autogerenciamento da carreira,
oferecendo o know how técnico necessário para operar
com sucesso na organização.

Universidade corporativa no mundo

Desde a época da Revolução Industrial até os dias atuais,


a visão do papel da educação na formação do profissional vem
crescendo a passos lentos, porém, decisivos, tanto quanto
crescia em importância, o papel da inteligência humana como
parte importante da produção de bens e serviços.

339
Nos dias atuais, várias mudanças se fizeram nas estru-
turas produtivas, com destaque para as telecomunicações,
informática e transportes, com uma sensível melhora na dis-
ponibilidade de capital e dos demais meios de produção, ao
longo do tempo. Dentre estes, o conhecimento desponta
como o fator mais relevante e decisivo para a competitivida-
de, sendo até, de uma forma mais pragmática, o mais impor-
tante capital do investidor. Por essa razão, a maior parte das
empresas modernas aposta na Educação como o fator de
autossustentabilidade no mercado.

De acordo com Fleury (2006, p.46), as experiências mais


famosas e de maior citação na literatura de grandes exemplos
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

na América são as de empresas como a AT&T, Dell, Disney, First


Union Bank, Ford, General Eletric, General Motors, Lucent, Mc
Donald’s, Motorola e Xerox, dentre outras.

O autor destaca ainda, a experiência de outras empresas e


outros países como a Volvo na Suíça, SAAB Scania na Suécia,
a Shell e a Corning Glass na Inglaterra, e a sua versão cana-
dense, a Philips, na Holanda, e da Renault, na França. No Bra-
sil, Fleury destaca os casos inovadores da Rhodia, Alpargatas,
Cibié, Método, Vale do Rio Doce, entre outras. Em todos estes
casos, o destaque do estudo é o alto grau de desenvolvimento,
e de aperfeiçoamento contínuo, o melhoramento, incluindo to-
dos, gerentes e operários.

As relações e a velocidade com que se processam as mu-


danças no mundo corporativo tiveram uma radical ascensão
nos últimos anos.

Como destaca Meister (1999, p. 212), foram necessários


38 anos para que a indústria telefônica chegasse a 10 milhões
de consumidores, mas apenas dois anos para que a internet
atingisse o mesmo número de clientes. Oito anos depois, ela

340
estava em 50 milhões de lares. Da mesma forma, o advento da
UC redefiniu o relacionamento entre empresas e educação; o
novo perfil do empregado é o de quem precisa estar disposto
a reinventar sua base de conhecimentos continuamente, sob
pena de perder sua empregabilidade; a empresa, por sua vez,
precisa rever seus conceitos sobre formação de colaboradores;
ela não mais é um receptáculo do conhecimento das universi-
dades, mas é a continuadora deste.

Como exemplo deste conceito, Meister (1999, p.169) sa-


lienta, com base em uma manifestação pública de Christopher
Galvin – presidente e CEO da Motorola – que a empresa não
mais deseja admitir engenheiros com diploma de um curso de

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


quatro anos de duração; quer que seus funcionários tenham o
diploma de um curso de 40 anos de duração.

Muito embora a palavra universidade nos leve a pensar em


um Campus físico, um corpo docente estável, a versão corpo-
rativa é diferente e inovadora. Muitas das universidades cor-
porativas não dispõem de uma sede física que as distinga das
outras. Ao abordar a compreensão do conceito de Universida-
de Corporativa, Junqueira e Vianna (2010) apud Meister (1999)
entendem-na como um guarda-chuva estratégico para o de-
senvolvimento e educação de funcionários, clientes e fornece-
dores, buscando otimizar as estratégias educacionais. Por essa
definição, entende-se que a UC é uma forte evolução qualitativa
da tradicional área de treinamento e desenvolvimento a qual,
longe de caracterizar um rótulo, uma embalagem redesenhada,
ou muito menos um modismo, virá representar um poderoso
instrumento viabilizador de uma base humana que sustente o
desenvolvimento estratégico das empresas.

Para os profissionais do novo século, um conjunto de no-


vas competências passou a ser exigido; da mera repetição

341
de funções e tarefas, migramos para uma postura muito mais
tecnicista, mais focada no pensar e na interligação de conhe-
cimentos diversos. Do mesmo modo, as organizações produ-
tivas precisam repensar sua estrutura: flexibilidade, inovação
e interatividade com o mercado passaram a ser palavras de
ordem; a tecnologia e o conhecimento sobrepujam o volume
e o custo do produto como diferenciais de competitividade. Já
não é mais suficiente apenas entender e acompanhar as mu-
danças, é necessário prevê-las e enfrentá-las com novas ferra-
mentas de gestão.

Universidade corporativa no Brasil


Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

No Brasil, os primeiros indícios de instalação de universi-


dades corporativas surgiram por volta de 1990, impulsiona-
dos pela alta competitividade do mercado e com o objetivo de
preencher as lacunas de conhecimento existentes nos funcio-
nários. Isso é reflexo do crescimento do investimento de em-
presas brasileiras em T& D, em parte pela inserção do país nos
mercados globalizados, e em parte por que essa é uma exi-
gência do mercado, face ao alto nível de especialização que a
produção dos tempos modernos exige.

De acordo com o Relatório do Anuário Brasileiro Estatístico


de Educação Aberta e à Distância – ABTD/2006-2007

O número médio de horas anuais de treinamento


por funcionário é de 47 ou o equivalente a 5,8 dias de
trabalho, se considerada uma jornada de oito horas.
Contudo, no mesmo artigo, Martins explica que 18 %
das organizações dedicam mais de 80 horas anuais

342
de treinamento e esse contingente vem crescendo,
colocando o Brasil em posição superior aos países lí-
deres em desenvolvimento de pessoas, como os EUA
e a Austrália. Por se tratar de uma economia emergen-
te, integrante do “BRIC” (Países com maior potencial
de crescimento na próxima década – Brasil, Rússia,
Índia e China). (MARTINS, 2009, p. 228).

De acordo com os dados expostos, isso dá uma média de


investimento anual de T & D por treinando e a Folha de Paga-
mento da ordem de 3,2% no Brasil, 3,7% de países europeus e
de 2,5% nos Estados Unidos pelo que conclui-se, que o Brasil

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


está em posição privilegiada dentre os demais países do glo-
bo econômico. Abordando o crescimento das iniciativas bra-
sileiras de universidades corporativas, Ricardo (2009, p. 236)
cita o trabalho desenvolvido pelas revistas Exame e Você S/A,
que anualmente publicam a matéria “Melhores Empresas para
Trabalhar”. Divulgam os números e as razões que fazem com
que milhares de trabalhadores se sintam satisfeitos com o local
onde trabalham.

O citado autor diz que, até o ano de 2005, não era do obje-
tivo da reportagem destacar as ações educacionais das empre-
sas como elemento motivador da permanência do empregado
no ambiente de trabalho. Contudo, para o empregado, que
é quem responde a pesquisa, o item “Desenvolvimento”, que
aborda as iniciativas educacionais da empresa, responde por
49% das razões para a eleição da melhor empresa, por parte
dos seus colaboradores.

Ricardo (2009, p. 236) diz ainda que, entre as dez pri-


meiras empresas eleitas, figuravam com destaque aquelas
que desenvolveram universidades corporativas como ferra-

343
menta de desenvolvimento de pessoas, tais como: Amil, Ac-
cor, Citigroup, Laboratório Sabin e Eurofarma. Além dessas,
o pesquisador destaca também o trabalho desenvolvido pela
Petrobrás, Vale do Rio Doce, Banco do Brasil e Correios,
iniciativas da área pública e que serão relatadas com mais
detalhes no tópico seguinte.

A pesquisa brasileira mais recente nesse campo foi realiza-


da entre 2006 e 2007, pela Associação Brasileira de Treinamen-
to e Desenvolvimento, em parceira com a empresa Movimento,
Organização e Treinamento (ABTD/MOT), sobre a qual informa
números interessantes, identificando que:

70% das empresas respondentes planejavam in-


Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

vestir mais em T& D em 2007. Segundo a pesquisa,


instituições com até 200 e até 500 funcionários inves-
tem em ações de educação continuada, destinando
em média 148 horas anuais a cada empregado em
programas de pós-graduação, MBA internos, Progra-
mas de Desenvolvimento de Liderança e cursos de
média duração. (RICARDO, 2009, p. 238).

Esse é um poderoso indicativo de que o cenário brasileiro


de qualificação de mão-de-obra tende a mudar radicalmen-
te nos próximos anos. Com as iniciativas públicas e privadas
de oferta de cursos superiores, em pouco tempo o candida-
to ao emprego no país não ficará nada a dever aos demais
países desenvolvidos. È certo que ainda há uma grande parte
da demanda por trabalhadores qualificados por ser atendida,
especialmente engenheiros, pesquisadores, médicos e outros
profissionais, mas a compreensão necessária é de que a Edu-
cação não é um fenômeno de curto prazo.

Éboli (2004, p. 19) destaca que os avanços na área educa-


cional no país criam um bom pano de fundo para a melhoria

344
e reforço dos índices e que conseguimos colocar, nos últimos
quatro anos, 97% das crianças de 7 a 14 anos na escola, e
contamos com um crescimento expressivo de jovens que con-
cluem o ensino médio convencional, da ordem de 102%, e aler-
tando ainda para o ensino supletivo, com um aumento ainda
mais espetacular, de 398%, de 1995 a 2001.

Apesar dos números favoráveis, o autor ainda enfatiza al-


gumas informações preocupantes:

De acordo com a Secretaria de Cultura do Esta-


do de São Paulo, 50 % das crianças de 4ª serie não
entendem o que lêem. Apenas 26 % dos adultos con-
seguem ler e entender um livro, enquanto 74% tem

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


problemas de leitura. O mercado de trabalho valoriza
cada vez mais competências associadas a concep-
ção, solução de problemas, preparo técnico, utilização
eficiente e inovadora de ferramentas modernas e sa-
ber trabalhar em grupo. (EBOLI, 2004, p.19-20).

Outro destaque a considerar é que ainda no ano de 2006,


por demanda do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior, por meio da Secretaria de Tecnologia e Ino-
vação e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (MDIC/STI/CNPq), por intermédio de pesquisa en-
tre as empresas de médio e grande porte no Brasil, verificou-se
que 39% eram do setor de serviços, 2% eram do setor indus-
trial, 5% do comércio e 15%, empresas governamentais.

De acordo com Ricardo, apud Aguiar (2006, p. 238) eviden-


ciou-se a existência de no máximo 100 universidades corpora-
tivas registradas no Brasil. Como curiosidade, estudos como os
de Carvalho (2001, p.13) publicado na internet, informam que as
primeiras instituições de educação corporativa no Brasil regis-
tradas foram a Accor (1992); Brahma (1995); e Algar (em 1998).

345
No mesmo estudo, a autora menciona que, no Brasil já
foram catalogadas, até o ano de 2002, instituições similares.
São instituições que se comprometeram em mudar estrutu-
ras de atuação para a adaptação a uma inovadora tendência
de mercado – o do gerenciamento da empresa a partir dos
capitais intelectuais instalados. Com essa postura, que tem a
competência como fator básico da competitividade, foi possível
às empresas brasileiras participar de novos mercados globais,
criar relacionamentos mais profundos com os clientes e impul-
sionar a organização para um novo futuro.

A chamada Concepção Brasileira de universidade corpora-


tiva (UC), portanto, mais que uma adequação do modelo nor-
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

te-americano, é uma ferramenta de gestão de pessoas, intro-


duzido principalmente pelas multinacionais instaladas no país
e que, pelos resultados benéficos, gerou outras unidades simi-
lares. Isso ocorreu principalmente, após a análise dos estudos
de pesquisadores no Brasil (principalmente professores das
universidades de educação superior, como USP/FEA, UFRGS,
UFMG, FGV, e diretores de unidades de educação corporativa,
a partir do qual se construiu uma concepção de universidade
corporativa brasileira).

No Brasil, as experiências pioneiras de universidades cor-


porativas com registro, pertenceram às empresas Accor Brasil,
Algar, Amil, Brahma, BankBoston, Elma Chips, Ford, McDonal-
d´s e Motorola – a maior parte delas multinacionais com insta-
lações no Brasil.

Segundo Éboli (2002, p.188) há ainda outras experiências


exitosas de empresas que, embora não usem o nome de “uni-
versidade corporativa”, apresentam sistemas educacionais nos
seus princípios conceituais e estão pautados por uma aborda-
gem de gestão do conhecimento e competências, como: Ges-

346
sy Lever, Volkswagen/Audi, Datasul e Rhodia. Outros exemplos
dignos de nota são Alcoa, Algar, BankBoston, Elma Chips, Mi-
crosiga, Nestlé, Orbitall, Tigre e Xerox.”

Mais recentemente, na área de Administração Pública, te-


mos o caso de empresas governamentais aderentes ao pro-
cesso com resultados muito bons, tais como a Vale do Rio
Doce, Banco do Brasil, Serasa e a Universidade Corporativa
Sebrae (UCSebrae).

Éboli (2004, p. 24) coordenou uma pesquisa nas empresas


brasileiras, em 2003, em parceria com a Fundação Instituto de
Administração da Universidade de São Paulo (FIA/USP), e iden-

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


tificou que as empresas que possuem universidades corpora-
tivas são normalmente grandes empresas, que têm cadeias
de produção globais e complexas, envolvendo competências
estratégicas que compreendem muitas partes interessadas
ao longo dessa cadeia. Nestas, as pessoas responsáveis pela
Gestão das Unidades de educação corporativa também são
pessoas com alto nível de maturidade e capacidade técnica
reconhecida na empresa, além do que 70% dos programas das
54 empresas respondentes são presenciais. Essa situação é
agravada, se pensarmos que 56% desses sistemas são inter-
nacionalizados.

Éboli (2002, p. 32) diz que no tocante as tendências da uni-


versidade corporativa no Brasil, há o fato de ser cada vez mais
freqüente o uso contínuo de tecnologia e sistemas de infor-
mação; a presença de parcerias com outras empresas, com a
formação de universidades corporativas setoriais; a integração
entre ações da educação corporativa e das demais áreas da
empresa; a consolidação das práticas existentes no mercado;
e a educação corporativa como elemento indutor da sustenta-
bilidade na empresa.

347
Para atender aos princípios de sucesso de um Sistema
de Educação Corporativa, deve ser contemplada seriamente
a utilização de práticas consistentes não só de e-learning,
mas de Educação a Distância (EaD) de modo geral. E isso
só será possível se o gestor da Educação Corporativa ou
Chief Learning Officer e seu staff possuírem as competências
requeridas para o exercício completo de suas atribuições e
responsabilidades.

No Brasil, a experiência exitosa com a utilização da metodo-


logia de universidades corporativas na iniciativa privada rendeu
frutos também na área pública. Algumas instituições brasileiras
aderiram ao sistema e apontam um desempenho muito bom
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

em termos de resultados operacionais para o serviço público.


Como exemplo, podemos citar a atuação de empresas como a
Mineradora Vale do Rio Doce, a Petróleo Brasileiro S/A – Petro-
brás, os Correios, o Serasa (empresa brasileira que presta ser-
viço aos bancos e outras instituições financeiras – operadores
de cartão de crédito, financeira, referente a empréstimos, dívi-
das no cartão de crédito etc.), a Eletrobrás e o Serviço Brasileiro
de Apoio as Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

Essa tendência aponta as UC como um novo aspecto na


criação de uma vantagem competitiva saudável: o comprome-
timento das empresas com a educação e o desenvolvimento
das pessoas. O novo estilo de gestão exigirá que se forme uma
verdadeira cultura empresarial de competência e resultado, o
que supõe profundas mudanças não só na estruturação dos
sistemas, nas políticas e nas práticas, mas também na menta-
lidade organizacional e individual. Essas organizações denotam
a busca pelo favorecimento da inteligência e do alto desempe-
nho da organização, com foco no alcance de melhores resulta-
dos organizacionais.

348
Para Ricardo (2009, p. 237), como essas iniciativas, em
sua maioria, são ainda recentes, há pouco material disponível
sobre os resultados alcançados, mas dentre os disponíveis,
destacamos a ação da UC Petrobras, Universidade Corpora-
tiva da Vale do Rio Doce (Valer), Universidade Corporativa do
Sistema Eletrobrás (Unise) e UCSebrae.

Ricardo destaca que, com relação à Petrobrás, no tra-


balho desenvolvido em 2003, foram 120 horas de treina-
mento por empregado; 1978 trainees em curso, 22 mil alu-
nos a distancia em 280 cursos on line. A empresa recebeu
em 2007 o título de Melhor Universidade Corporativa pelo
prêmio Corporate University Best in Class 2007 nos EUA.

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


A pesquisadora também registra o trabalho e os números
alcançados pela Valer, que são bastante significativos. Em
2006, somente em atividades de e-learning e tutoria, foram
43 conteúdos on line, 120 turmas conduzidas por tutores,
22 mil participações em cursos de autoestudo e uma média
de 14 mil horas de capacitação virtual para todos os pú-
blicos da cadeia de valor da CVRD. Petrobrás e Valer são
emblemáticos no que diz respeito à Educação do Traba-
lhador, tanto pelos anos de desenvolvimento quanto pelas
iniciativas em pesquisas realizadas.

No que tange à Unise e à UCSebrae, a autora ainda desta-


ca a criação de uma TV Executiva, o Canal Unise pela DTCOM,
e o Canal Sebrae. Por meio desse canal, foi possível a realiza-
ção de diversas teleconferências em tempo real para quase a
totalidade dos empregados. Além disso, ambas as experiên-
cias implantaram cursos on line, com a adoção de plataformas
e trilhas de desenvolvimento.

349
Universidade corporativa Sebrae

O Sebrae, ao longo de seus 40 anos de existência, vem


aprimorando e inovando com experiências relevantes para o
ensino-aprendizagem organizacional. Várias são as formas uti-
lizadas e muitas delas vêm sendo praticadas por meio de pro-
cessos de treinamento e desenvolvimento dos seus colabora-
dores, tanto individuais como em grupo.

Ao se propor um modelo para a Universidade Corporativa


Sebrae, buscou-se suprir as lacunas verificadas no desenvol-
vimento e na implementação das ações educacionais existen-
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

tes, levando em consideração toda a bagagem e experiência


acumulada. A Universidade Corporativa Sebrae surgiu com o
propósito de promover condições para a educação continuada
dos colaboradores, diretos e indiretos do Sistema Sebrae, con-
dição, hoje, indispensável para uma atuação compatível com a
evolução do conhecimento e com as exigências da complexi-
dade da sociedade contemporânea.

Nessa linha, estruturou-se a Universidade Corporativa Se-


brae, com a convicção de que a aprendizagem baseia-se na
ação educativa, que estabelece paralelos entre conhecimento e
prática, e leva à compreensão dessa interdependência perma-
nente, onde a prática é, em última instância, quem faz e refaz a
teoria. Esses foram os grandes motivos da adoção de um mo-
delo de educação para adultos, cuja concepção é centrada no
aprendiz, na aprendizagem significativa e no desenvolvimento
de competências.

É mediada pela ação comunicativa e interativa entre os in-


divíduos, entendida como um processo de relações recíprocas,
fundamentais para aprendizagem, apoiadas em uma estrutura

350
tecnológica que possibilite diferentes níveis de interação: entre
aprendiz e conteúdo; entre aprendiz e aprendiz; entre aprendiz
e educador; entre aprendiz e contexto empresarial; entre apren-
diz e comunidade virtual. Tudo convergindo para a construção
do conhecimento.

A Universidade Corporativa Sebrae tem pautado sua atua-


ção, desde o seu nascedouro, em princípios andragógicos e
com propostas educacionais heutagógicas, pensadas a partir da
necessidade, vivência e viabilidade dos indivíduos. Com isso, o
processo de ensino aprendizagem se mostrou não apenas ade-
quado, mas muito mais que isso, parte vital dos processos de
trabalho; haja vista sua constante mutabilidade e atualização. Tal

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


estratégia se mostrou muito eficaz, em função dos registros dos
resultados alcançados nos últimos anos, e como uma das mais
eficientes ferramentas de Gestão de Pessoas da Instituição.

Os dados levantados no último Relatório de Atividades apon-


tam para a capacitação de 16.200 colaboradores, mais de 85%
de toda a força-tarefa institucional. Os educandos em questão
ocupam todas as áreas e espaços ocupacionais, desde conse-
lheiros, dirigentes, corpo técnico, parceiros e colaboradores, o
que denota uma visão universalista do processo. Destaque-se
que desses, quase 400 colaboradores tiveram acesso à educa-
ção superior ou mesmo cursos de pós-graduação.

Foram utilizadas 32 mil horas de capacitação continuada,


por meio da estruturação das “Trilhas de Conhecimento”, na
verdade mapas estratégicos pessoais, traçados com a Institui-
ção e sob seu foco de negócio. Isso capitaliza o Sebrae com
um banco de competências precioso, de alta empregabilida-
de e visibilidade no mercado; o que na sua área de atuação é
de valor inestimável. Nas Avaliações de Eficácia, aplicadas em
todas as 49 diferentes soluções educacionais, com todos os

351
alunos concludentes, este esforço institucional comprovou que
há mais de 86% de satisfação e superação de expectativas dos
participantes. E 30% dos treinandos optaram por soluções “on
line”, desmitificando o paradigma brasileiro de que a educação
a distância não é efetiva ou interessante para o aluno.

As universidades corporativas e a
educação empreendedora no Brasil

O número de trabalhadores sem formação superior no Brasil


ainda é uma realidade. Essa formação tem como pré-requisito o
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

perfil de pessoas ousadas, inovadoras e decididas. Essa falta de


profissionais qualificados gera um problema grande a ser supe-
rado pelo país, para manter-se no nível de competitividade com
o mercado global. Embora seja um tema em voga e, atualmente,
muito discutido, a educação pelo e para o trabalho não é um
conceito novo.

A educação, assim, precisa saltar dos bancos de escola


para as cadeiras de comando das grandes empresas; a partir
de agora não apenas vistas como gerenciadoras de insumos,
capital financeiro ou tecnológico, mas também como formadora
de profissionais competentes e conscientes de seu papel social.

Quadro 02 – Razões para o ensino do


empreendedorismo nas empresas
Aprender sobre empreendedorismo
Aprender a comportar-se de forma empreendedora (foco no indivíduo)
Aprender a se tornar empreendedor (foco no negócio)
Outros

Fonte adaptada da autora de Entlearn ( 2007) tabela 4. p 42

352
Dessa forma, Fleury (2010, p 134) ainda esclarece que,
no tocante a Aprendizagem Organizacional é preciso também
considerar que

Em uma organização, o processo de aprendiza-


gem pode ocorrer em 3 níveis;

1. Nível do indivíduo – é o primeiro nível do pro-


cesso de aprendizagem. Está carregado de emoções
positivas ou negativas, por meio de caminhos diver-
sos.

2. Nível do Grupo – A aprendizagem pode vir a


constituir um processo social, partilhado pelas pes-

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


soas do grupo.

3. Nível da Organização – O processo de apren-


dizagem individual, de compreensão e interpretação
partilhados pelo grupo torna-se institucionalizado, e se
manifesta em diversos artefatos organizacionais como
a estrutura, regras, procedimentos e elementos sim-
bólicos. As organizações desenvolvem memórias, que
retém e recuperam informações.

No entanto, a entidade “Organização” não existe no plano


concreto. Ela é uma abstração que tem como personalidade, vi-
são e pensamento a personalidade, visão e pensamento dos seus
integrantes. Portanto, qualquer mudança organizacional só será
efetiva se primeiro ocorrer na mente dos dirigentes e integrantes.

Ao adotarmos essa perspectiva, podemos pensar então


na educação profissional realizada pelas universidades corpo-
rativas como parte importante do negócio, e não um acessório
deste; isso será fundamental para a competitividade empresa-
rial em qualquer ramo de atividade, no próximo milênio.

353
Considerando todas as questões anteriormente apresen-
tadas, é certo que há hoje uma preocupação muito maior por
parte das empresas com a qualificação e formação educacio-
nal dos seus colaboradores, posto que esta é uma excelente
estratégia de competitividade no mercado. Contudo, precisa-
mos entender mais profundamente o conceito de aprendiza-
gem e de aprendizagem organizacional, valores que permeiam
essa nova relação, por que seu foco vai muito além de apenas
obter resultados de qualificação; a ideia é que se busque a in-
tegração, interação e multidisciplinaridade de conhecimentos,
aplicados e estimulados em áreas específicas e importantes
na execução de todo o processo.
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

Ainda tratando do assunto, Éboli (2002, p.201) comenta


que as UC são a evolução dos centros de treinamento para
uma proposta mais estratégica, mas próxima da visão e valo-
res da empresa, além de ser um excelente meio de retenção
de talento. Em concordância com essa postura, pode-se citar
Carvalho (2001, p. 88) apud NISEMBAUM (1998, sem citação
de página) que informa:

“O que diferencia a Universidade Corporativa de


um centro de treinamento tradicional é a sua pos-
tura proativa, o estabelecimento de uma filosofia de
aprendizagem centralizada, as ações de aprendiza-
gem customizadas, opera como uma unidade de ne-
gócio, a utilização racional de investimento em edu-
cação, a continuidade dos esforços de treinamento,
a relevância que a direção da empresa dá ao trabalho
por ela realizado.”

354
Quadro 03 – Comparativo de um Processo de
Educação Formal e Educação Corporativa

EDUCAÇÃO FORMAL EDUCAÇÃO CORPORATIVA


Necessita de credenciamento e Dispensa credenciamento ou
reconhecimento oficial reconhecimento oficial – o seu
reconhecimento é pelo mercado
Diplomas para terem validade têm Diplomas não necessitam
que ser registrados de registro – o que vale é a
aprendizagem
Cursos e programas são regulados Cursos e programas são livres,
por lei e estruturados segundo atendendo às necessidades
normas regidas no MEC das pessoas que integram as
organizações
Estrutura organizacional baseada Estrutura organizacional livre de

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


em colegiados, burocratizando e/ órgãos colegiados burocráticos –
ou dificultando decisões rápidas e decisões estratégicas mais ágeis
estratégicas
Qualidade mensurada por padrões Qualidade avaliada pelo mercado
quantitativos e alheios à realidade
Rigidez na oferta de períodos letivos Flexibilidade na oferta de períodos
(anuais ou semestrais) letivos – módulos diferenciados
– fins de semana, quinzenais,
bimestrais etc
Preponderância de aulas Preponderância de metodologias
expositivas, teóricas que privilegiam a aprendizagem
por meio de atividades práticas,
de exercícios, estudo de casos,
simulação, jogos de empresas etc
Currículo ou diretrizes curriculares Currículo “sob medida”
nacionais
Sistema educacional formal Sistema integrado de gestão de
talentos humanos de um negócio
Aprendizagem temporária Aprendizagem continua
Modelo baseado na graduação: Liga o conhecimento, nem sempre
liga o conhecimento estruturado à estruturado, às necessidades
formação técnica e científica de um estratégicas de uma organização
individuo
Vínculo aluno-escola Vínculo empresa-talento

Ênfase no passado Ênfase no future

355
EDUCAÇÃO FORMAL EDUCAÇÃO CORPORATIVA
Instalações físicas (campus) Redes de aprendizagem

Aprendizagem baseada em Aprendizagem baseada na prática


conceitos acadêmicos do mundo dos negócios
Ensino não acompanha a Ensino em tempo real
velocidade das mudanças
Aprendizagem individual Aprendizagem coletiva
Corpo docente acadêmico Corpo docente altamente
dissociado da realidade profissional profissional, praticando o que
transmite ao educando
Ensina a estudar e pesquisar Ensina a pensar e praticar
Ensina crenças e valores universais Ensina crenças e valores do
ambiente de negócios
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

Fonte: Martins (2009 p. 226) Monteiro, 2001.

Considerações Finais

Ao considerar o conhecimento como o diferencial estraté-


gico do futuro, as empresas estão passando da adoção das
Universidades Corporativas como uma “formação complemen-
tar acadêmica”, no sentido de ampliar as competências dos
seus colaboradores, para uma visão alternativa e customizada
de capacitação, gerando profissionais perfeitamente adequa-
dos ao perfil tanto da empresa quanto do indivíduo. Dessa for-
ma, isso possibilita que os colaboradores não apenas atualizem
os conhecimentos, mas sejam capazes de alterar modelos pro-
dutivos instalados, aprimorando-os, inovando e renovando-os
completamente, seja em processos ou em produtos.

De um modo geral, observamos que, por se tratar de uma


tecnologia educacional relativamente nova, ainda não totalmen-
te desvendada e massificada, e dado ao custo operacional que

356
envolve em sua implantação, as UC possuem grande efetivi-
dade, mas ainda permanecerá por um tempo convivendo com
métodos tradicionais de formação profissional.

Essa é uma percepção atestada até mesmo por pedago-


gos e gestores educacionais nas organizações. É senso comum
que as universidades corporativas, apesar de serem ferramentas
efetivas e modernas de formação educacional, além de serem
um excelente diferencial estratégico para a competitividade, nes-
ta era da informação, oferecem diversas vantagens estratégicas
de médio e longo prazo para as empresas, tais como redução
do custo per capita, rapidez e massificação de ensino e impac-
to direto nos resultados. Nenhum desses resultados poderá ser

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


alcançado sem o uso intensivo da capacitação a distancia, que
é capaz de atingir em pouco tempo um número grande de pes-
soas, com um custo per capita baixo e grande efetividade; há
que se investir em tecnologia, produtos e serviços diferenciados.

Contudo, alguns fatores ainda precisam ser melhor traba-


lhados e estruturados para que a universalização das UC se
consolide no mercado educacional, quais sejam:

• Redução do Custo de Implantação e Operacionalização.

• Necessidade de Investimentos em Hardwares e Softwares


adequados e customizados a setores ou áreas específicas.

• Para uso por pequenos negócios, a necessidade de estrutura-


ção de produtos coletivizados, passíveis de utilização conjunta
por grupos de empresas ou setores, minimizando os custos.

• A formação de conteudistas capazes de criar, a baixo custo


e com alta aplicabilidade, soluções de capacitação compo-
níveis, passíveis de customização, para a aplicação a em-
presas ou grupos de empresas específicas.

357
Mais do que nunca, há a necessidade, tanto por parte da
empregabilidade do trabalhador, quanto pela flexibilização de
função necessária ao empregador; de que o conhecimento
seja compartilhado, pois o capital mais importante do futuro é
o conhecimento. Esse perfil universalista, no entanto, ainda não
pode ser achado com disponibilidade no mercado. É fato que
um dos fatores causadores disso seja a diferença de velocidade
com que ocorrem os processos de mudança das escolas e uni-
versidades, que não acompanha a velocidade dos processos
de mudança do mercado.

Vai daí, urge que os agentes de fomento ao desenvolvi-


mento regional atuem conjuntamente, no sentido de minimizar
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

essas diferenças, e oportunizem a “construção do conheci-


mento e a formação contínua” do empregado, customizando-a
à sua necessidade e viabilidade.

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Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


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Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

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Acesso em 17 de Julho de 2010.

360
Análise das Dificuldades
em Gestão das Empresas
Candidatas ao Prêmio
MPE Brasil no Estado
de São Paulo
Mariana Camargo Marques78

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


Apresentação

O projeto estuda as dificuldades em gestão identificadas


nas empresas candidatas ao Prêmio MPE Brasil no Estado do
São Paulo no ano de 2010 a partir da aplicação do diagnós-
tico de gestão da Fundação Nacional da Qualidade, que tem
como base o Modelo de Excelência da Gestão®, adaptado à
realidade das micro e pequenas empresas. O ponto de partida
é o estudo da base de dados gerada a partir das informações
prestadas pelas próprias empresas candidatas a esse prêmio
na consolidação da sua candidatura, analisando as oportuni-
dades identificadas a partir da aplicação desse modelo como
método de gestão e avaliação de desempenho.

Espera-se que os resultados indiquem os gaps de ges-


tão existentes, focando os oito critérios de excelência da

78 Jornalista. MBA em Gestão Empresarial. Analista da Unidade de Desenvolvimento e Inovação


do Sebrae SP.

361
gestão que representam a base do diagnóstico: liderança,
estratégias e planos, clientes, sociedade, processos, pes-
soas, informações e conhecimento e resultados. Pretende-
se, ainda, contribuir para o aperfeiçoamento da capacidade
de competitividade das micro e pequenas empresas paulis-
tas a partir da análise desses resultados.

Introdução

De acordo com pesquisas feitas pelo Sebrae em São Pau-


lo em série histórica sobre o monitoramento da sobrevivência e
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

mortalidade das empresas de micro e pequeno porte, foi consta-


tado no ano de 2010 que 27% das empresas ainda fecham suas
portas no primeiro ano de vida, tendo como principais causas
dessa mortalidade o comportamento empreendedor pouco de-
senvolvido, a falta de planejamento prévio, gestão deficiente do
negócio, insuficiência de políticas de apoio, flutuações na con-
juntura econômica e problemas pessoais dos proprietários.79

Aquele número torna-se ainda mais alarmante quando a


pesquisa em questão demonstra que 58% das empresas em
atividade fecham até seu quinto ano de vida. O impacto finan-
ceiro também é considerável, uma vez que apenas 39% das
empresas encerradas declaram ter recuperado em sua totalida-
de os recursos investidos, 27% recuperaram apenas parte des-
tes recursos e 34% declaram ter perdido os recursos investidos
no empreendimento em sua totalidade. Apenas 16% desses
empresários voltam a empreender formalmente, o que significa
uma perda de potenciais empreendedores.

79 Sebrae SP. (2010) Mortalidade das Empresas – 12 anos de monitoramento da sobrevivência e


mortalidade das empresas. passim.

362
Segundo a pesquisa, o custo social do fechamento destas
empresas no estado de São Paulo representa um montante de
84 mil empresas, 348 mil ocupações e 19,6 bilhões se somar-
mos poupança pessoal (capital investido) e faturamento.

Diante desse cenário, surge a necessidade de estudar a


aplicação de um modelo comprovadamente eficaz em institui-
ções de grande porte, em empresas de pequeno porte, visan-
do minimizar a taxa de encerramento destas empresas.

Nesse caso, o modelo escolhido foi o Modelo de Excelência


da Gestão®, da Fundação Nacional da Qualidade, que foi adap-
tado à realidade dos pequenos negócios por meio do MPE Brasil
– Prêmio de Competitividade para Micro e Pequenas Empresas,

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


realizado por meio de parceria entre Sebrae, Fundação Nacional
da Qualidade, Movimento Brasil Competitivo e Gerdau.

Para viabilizar essa investigação, foi feita uma análise da


base de dados gerada a partir da aplicação do diagnóstico du-
rante o processo de avaliação do Prêmio MPE Brasil no Estado
de São Paulo, no ano de 2010.

Estratégia Competitiva

A estratégia de uma organização deve considerar a neces-


sidade de um modelo de gestão que tenha como ponto forte a
capacidade de se antecipar aos acontecimentos do mercado,
interagindo, conhecendo e monitorando as relações de interde-
pendência da empresa com as variáveis externas e internas e
os diversos segmentos de mercado onde atua.

Porter (1980, p.28) descreveu que “[...] o objetivo do


estrategista empresarial é encontrar uma posição na qual a

363
empresa seja capaz de melhor se defender contra as forças
competitivas ou influenciá-las a seu favor.”
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

Figura 1 – As Cinco Forças de Porter (1979)

Nesse cenário, as empresas de micro e pequeno porte


ganham vantagem competitiva no sentido de terem estruturas
menos densas e, portanto, maior flexibilidade para se adequar
às mudanças do ambiente.

Por outro lado, nota-se uma postura reativa ou mesmo


uma grande falta de conhecimento sobre métodos e modelos
de gestão capazes de auxiliá-las nesse desafio adequadamen-
te. Embora essas empresas notem o contexto sistêmico, insis-
tem em ações pontuais e soluções isoladas para lidar com seus
problemas de gestão.

364
A Fundação Nacional da Qualidade, por meio do Mode-
lo de Excelência da Gestão® (MEG), entende o processo de
formulação estratégica como uma decisão da liderança que,
após ouvir clientes e sociedade, define suas estratégias e pla-
nos. O diagnóstico de gestão adaptado à realidade das micro
e pequenas empresas proposto pela instituição, torna-se, en-
tão, uma ferramenta capaz de inserir essas organizações em
um contexto de busca pela excelência, onde a estratégia deve
pautar o ciclo de planejamento, execução, controle e ações no
contexto destas organizações.80

MPE Brasil – Prêmio de Competitividade

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


para Micro e Pequenas Empresas

O MPE Brasil – Prêmio de Competitividade para Micro e


Pequenas Empresas é um reconhecimento estadual e nacio-
nal concedido às empresas de micro e pequeno porte que se
destacam em sua gestão e cuja atuação sirva de referência no
esforço de mobilização para a melhoria da competitividade no
segmento.

A avaliação dos empresários participantes do Prêmio MPE


Brasil é feita baseada no Modelo de Excelência da Gestão®,
preconizado no Brasil pela Fundação Nacional da Qualidade.
Ele baseia-se em um conjunto de fundamentos que expressam
práticas encontradas em organizações líderes de elevado de-
sempenho internacional. Os fundamentos da excelência refle-
tem valores reconhecidos internacionalmente.

80 Ciclo PDCA – ciclo de Deming que tem por princípio tornar mais claros e ágeis os processos
envolvidos na execução da gestão, dividindo-a em quatro principais passos.

365
O modelo em questão foi adaptado à realidade da micro e
pequena empresa e a avaliação é baseada em um questionário
sobre gestão composto por 30 perguntas distribuídas entre os
oito critérios de excelência. A partir da análise deste questioná-
rio, as empresas com as maiores pontuações são seleciona-
das para a etapa de checagem de documentos e visita técnica,
onde são conferidos os dados prestados na inscrição.

Os fundamentos da excelência são desdobrados em oito


critérios que representam a aplicação prática do Modelo. A re-
presentação gráfica segue na figura abaixo e é explicada pelo
conceito do PDCL, segundo a lógica: O direcionamento da
organização, dado pela Liderança, ouvindo os Clientes e a
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

Sociedade, é definido por meio das Estratégias e Planos;


a sua implementação é realizada por meio das Pessoas, que
compõem a força de trabalho, utilizando-se dos Processos
existentes na organização; e todo esse ciclo, ao ser executa-
do, deverá conduzir a Resultados, que devem ser analisados
e entendidos, gerando Informações e Conhecimento para
serem utilizados no processo de tomada de decisão, gerando
um novo ciclo de gestão.

366
Figura 2 – Critérios de Excelência

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


Fonte: Critérios de Excelência – Fundação Nacional da Qualidade 2009

Metodologia

O método utilizado para esta produção acadêmica é um


estudo de natureza aplicada, abordagem quantitativa e objetivo
exploratório sobre os resultados do diagnóstico de gestão do
MPE Brasil – Prêmio de Competitividade para Micro e Peque-
nas Empresas – 2010.

A documentação utilizada para este estudo foi coletada


em fontes primárias de dados, disponibilizada pelo Sebrae SP

367
por meio do sistema que contempla os resultados do MPE
Brasil – Prêmio de Competitividade para Micro e Pequenas
Empresas, onde as empresas fazem um autodiagnóstico,
ao responder a um questionário de avaliação de sua gestão,
composto por 30 questões, sendo 29 de múltipla escolha
com quatro possibilidades de resposta (A, B, C ou D) e uma
para preenchimento de indicadores.

Prioritariamente foi feita uma análise da pontuação das em-


presas baseada nos oito critérios macro de avaliação, visando
identificar quais critérios tiveram os melhores e os piores de-
sempenhos. A nota de corte determinada para identificar os cri-
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

térios com melhor desempenho versus os piores desempenhos


foi de 40% em relação ao máximo que poderia ser alcançado
em cada um deles.

Em seguida, foi feita uma análise do detalhamento das


informações solicitadas às empresas dentro de cada critério,
questão a questão, visando identificar quais práticas de gestão
são comuns às empresas avaliadas e quais são identificadas
como oportunidades de melhoria.

Considerando que a alternativa A é a pior situação e D a


melhor, o método utilizado para identificação das principais
dificuldades em gestão foi a somatória das duas alternativas,
de modo que quando A e B somados representam mais de
40% do total de respostas, considerou- se que o tópico da
questão é uma prática de gestão a ser melhorada, saindo de
uma perspectiva macro (critério) para um detalhamento que
permita o desenvolvimento de ações com foco em práticas de
gestão efetivamente.

368
Perfil das empresas estudadas

Faturamento anual em 2010

• 63% informaram possuir faturamento entre 0 (zero) e 240


mil reais.

• 26% informaram ter faturamento entre 240 mil e 1.200.000


mil reais/ ano.

• 8% informaram ter faturamento entre 1.200 mil e 2.400.000


mil reais/ ano.

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


• 2% informaram faturar mais que 2.400.000 mil reais/ ano.

Número de empregados

• 60% das empresas declararam possuir de zero a 5 em-


pregados.

• 18% das empresas declararam possuir de 6 a 10 empre-


gados.

• 11% das empresas declararam possuir de 11 a 20 em-


pregados.

• 8% das empresas declararam possuir de 21 a 50 empre-


gados.

• 3% das empresas declararam possuir mais de 51 em-


pregados.

369
Distribuição em relação a setor/ segmento

Tabela 3 – Distribuição em relação a setor/ segmento

Categoria Inscritos Percentual


Serviços de saúde 56 2%
Serviços de turismo 69 2%
Serviços de educação 73 3%
Agronegócio 84 3%
Serviços de tecnologia da informação 247 8%
Indústria 460 15%
Outros serviços 781 26%
Comércio 1233 41%
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

Escolaridade

Tabela 4 – Escolaridade dos empresários inscritos


Analfabeto 4 0%
Ensino Fundamental Incompleto 34 1%
Ensino Fundamental Completo 70 2%
Ensino Médio Incompleto 111 4%
Ensino Médio Completo 671 22%
Superior Incompleto 574 19%
Superior Completo 1070 36%
Especialização 389 13%
Mestrado 63 2%
Doutorado 19 1%

370
Distribuição em relação à localização no estado

• 65% estão localizadas no interior do Estado de São Paulo.

• 35% estão localizadas na capital e Grande São Paulo.

Considerações finais

Das 3005 empresas que se inscreveram na premiação em


2010, 994 concluiram o preenchimento do diagnóstico. Por
esse motivo, as análises foram feitas considerando apenas
essa parcela de empresas que finalizaram sua candidatura ao

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


prêmio com o preenchimento do questionário de avaliação em
sua completude.

Analisando os resultados globais por critério e consideran-


do o desempenho individual, sem contar os pesos de cada um,
nota-se que a maior dificuldade está na mensuração e controle
dos resultados da empresa, que atingiu um desempenho de
apenas 18% em relação ao que foi exigido pelo questionário.
Seguido do critério “Resultados”, observa-se uma grande difi-
culdade no critério “Estratégias e Planos”, que atingiu apenas
42,44% do que poderia ser alcançado. Nesse mesmo patamar
ficou o critério “Informações e Conhecimento”, com desempe-
nho de 43,83%, demonstrando uma complementaridade com
o critério “Estratégias e Planos”.

Tabela 6 – Média de desempenho por critério

Critério Pontuação
1. Clientes 57.33%
2. Sociedade 51.17%
3. Liderança 55.20%

371
Critério Pontuação
4. Estratégias e Planos 42.44%
5. Pessoas 53.78%
6. Processos 57.75%
7. Informações e conhecimento 43.83%
8. Resultados 18.00%
Total: 42.44%

Diante das análises estabelecidas nesse trabalho e, par-


tindo do pressuposto que esse modelo de gestão é aplicável
às micro e pequenas empresas, trazendo benefícios à gestão
desse segmento empresarial, independente de suas limitações,
ficaram latentes dificuldades relacionadas aos elementos que
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

compõe uma estratégia empresarial, principalmente em relação


à definição de informações estratégicas, estabelecimento de in-
dicadores, planos de ação e segmentação de clientes.

Em complementaridade a esse fato, verifica-se também


um problema relacionado à comunicação dentro da empresa,
com uma resistência por parte do líder em disponibilizar e com-
partilhar informações aos colaboradores por meios formais. A
mesma falha na comunicação pode ser interpretada nos crité-
rios “Processos” e “Pessoas” quando é identificada a ausência
na maior parte das empresas de mecanismos que formalizem a
execução das atividades na empresa, bem como as definições
de responsabilidades de acordo com o cargo.

Partindo dessa referência, não apenas o Modelo de Exce-


lência da Gestão®, assim como um outro modelo de gestão
estruturado conferiria à pequena empresa uma melhoria em
sua competitividade, uma vez que as ações na micro e peque-
na empresa, na sua maioria, são resultantes da simples reação
à mudança do ambiente, não sendo um processo sistemático.
(LONGENECKER; MOORE; PETTY, 1997).

372
Para conclusão da pesquisa de forma mais assertiva, as
respostas dos questionários foram organizadas em uma lista
demonstrando quais questões apresentaram piores resultados.

Seguindo essa lógica, quando a soma de A e B represen-


tam mais de 40% do total de respostas, considerou- se que o
tópico da questão é uma prática de gestão a ser melhorada,
saindo de uma perspectiva macro (critério) para um detalha-
mento que permita o desenvolvimento de ações com foco nes-
sas oportunidades de melhoria.

Foram ranqueadas 18 questões nessa situação, conforme


tópicos que seguem:

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


1. Desenvolvimento de ações ou projetos sociais (critério “So-
ciedade”): 78,47% das empresas estudadas não realizam
ações com esse foco, demonstrando desconhecimento da
importância de atender um dos principais stakeholders da
micro ou pequena empresa que é a comunidade no entor-
no do empreendimento.

2. Definição de informações estratégicas (critério “Informação


e Conhecimento”): 69,85% das empresas estudadas não
as têm definidas, demonstrando dificuldade em estabelecer
quais são essas informações e desconhecer a importância
de conhecê-las para melhor gestão da empresa.

3. Definição da visão da empresa (critério “Estratégias e Pla-


nos”): 69,82% não têm definida formalmente a visão da em-
presa, demonstrando reatividade em relação aos aconteci-
mentos do mercado.

4. Estabelecimento de indicadores (critério “Estratégias e Planos”):


69,82% não estabelecem indicadores para o gerenciamento do
negócio, corroborando a inter-relação com os tópicos 2 e 3.

373
5. Avaliação da satisfação dos clientes (critério “Clientes”):
66% não avaliam a satisfação de clientes por métodos for-
mais e periódicos.

6. Saúde e segurança no trabalho (critério “Pessoas”): 64,89%


não tratam questões de saúde e segurança no trabalho,
demonstrando com isso também a falta de conhecimento
da legislação em relação a este aspecto.

7. Definição de funções e responsabilidades (critério “Pes-


soas”): 63,28% das empresas estudadas declararam não
definir as funções e responsabilidades de acordo com o
cargo, deixando esse processo ocorrer informalmente. Mui-
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

tos dos problemas das micro e pequenas empresas em re-


lação à gestão de pessoas ocorrem por conta da ausência
desse tipo de prática, que é de fácil implementação e traz
benefícios na organização e gestão das empresas, evitando
conflitos com o líder ou entre os próprios colaboradores.

8. Definição de estratégias (critério “Estratégias e Planos”):


62,68% das empresas estudadas não têm definidas formal-
mente as estratégias da empresa, demonstrando forte inter-
-relação com as dificuldades explicitadas nos itens 2, 3 e 4.

9. Segmentação de clientes (critério “Clientes”): 62,27% das


empresas não agrupam clientes de acordo com tipo e per-
fil, o que certamente dificulta o desenvolvimento de ações
de propaganda e marketing com resultado assertivo, uma
vez que os recursos para essas práticas são escassos em
empresas de micro e pequeno porte. A segmentação per-
mitiria o desenvolvimento de ações focadas com maiores
resultados e menor custo.

10. Benchmarking (critério “Informações e Conhecimento”):


59,39% das empresas entrevistadas declaram não conhe-

374
cer informações sobre outras empresas. Estas respostas
podem ser interpretadas com um viés sobre o aspecto cul-
tural brasileiro, que de certa forma considera essa prática
como algo desleal ou “espionagem”. Obviamente, seria
necessário um estudo acerca desse tema específico para
solidificação dessa possibilidade, embora a experiência no
trabalho com micro e pequenas empresas demonstre que
há uma inter-relação nesses aspectos.

11. Disponibilização de informações aos colaboradores


(critério “Informações e Conhecimento”): 59,36% não
disponibilizam informações para os colaboradores, de-
monstrando o quanto o empresário de micro e pequeno

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


porte é multitarefa, cuidando de todos os aspectos da
empresa, porém, sobrecarregando-se muitas vezes com
atividades que poderiam ser delegadas sem receio a um
colaborador, por exemplo.

12. Definição de planos de ação (“Estratégias e Planos”):


58,55% não definem planos de ação para a empresa,
estando esse dado em consonância com as questões 2,
3, 4 e 5 acerca de assuntos relacionados ao planejamen-
to estratégico.

13. Meio ambiente e Sustentabilidade (critério “Sociedade”):


54,72% responderam não conhecer os impactos negativos
que a empresa causa ao meio ambiente. Nota-se, empiri-
camente, que o assunto é ainda novo sob a perspectiva
dos pequenos negócios, embora já seja evidente um mo-
vimento nesse sentido impulsionado pela própria exigência
dos clientes.

14. Padrões para execução das atividades (critério “Proces-


sos”): 54,22% não possuem padrões definidos para execu-
ção das atividades. Esse resultado pode ter sido impulsio-

375
nado pelo fato de 82% das empresas estudadas serem do
segmento de comércio e serviços, que historicamente têm
maior dificuldade nesse aspecto, se comparado à indústria.
Esse dado possui relação com o item 7 sobre definição de
funções e responsabilidades.

15. Ética (critério “Liderança”): 52,92% não têm regras for-


malizadas que assegurem o comportamento ético na or-
ganização.

16. Ações de bem-estar das pessoas (critério “Pessoas”):


46,17% das empresas candidatas não executam ações
para o bem-estar dos colaboradores, sendo esse dado
Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora

complementar ao item 6.

17. Compartilhamento de informações da liderança com os


colaboradores (critério “Liderança”): 43,16% não comparti-
lham informações com colaboradores, apresentando com-
plementaridade com o item 11.

18. Fornecedores (critério “Processos”): 42,35% das empresas


não fazem uma seleção ou avaliam os desempenhos dos
fornecedores.

Diante das análises estabelecidas neste trabalho e, partindo


do pressuposto que esse modelo de gestão é aplicável às micro e
pequenas empresas trazendo benefícios à gestão desse segmen-
to empresarial, ficaram latentes dificuldades relacionadas aos ele-
mentos que compõem uma estratégia empresarial, principalmente
em relação à definição de informações estratégicas, estabeleci-
mento de indicadores, planos de ação e segmentação de clientes.

Complementarmente a esse fato, verifica-se também um


problema relacionado à comunicação dentro da empresa, com
uma resistência por parte do líder em disponibilizar e comparti-

376
lhar informações aos colaboradores por meios formais. A mes-
ma falha na comunicação pode ser interpretada nos critérios
“Processos” e “Pessoas” quando é identificada a ausência na
maior parte das empresas de mecanismos que formalizem a
execução das atividades na empresa, bem como as definições
de responsabilidades de acordo com o cargo.

Partindo dessa referência, não apenas o Modelo de Ex-


celência da Gestão®, assim como outros modelos de gestão
estruturados confeririam à pequena empresa uma melhoria em
sua competitividade, uma vez que as ações na micro e peque-
na empresa, na sua maioria, são resultantes da simples reação
à mudança do ambiente, não sendo um processo sistemático.

Capítulo IV – Experiências que disseminam a cultura empreendedora


(LONGENECKER; MOORE; PETTY, 1997).

Por outro lado, nota-se uma postura reativa ou mesmo


uma grande falta de conhecimento sobre métodos e modelos
de gestão capazes de auxiliar adequadamente as empresas de
pequeno porte nesse desafio. Embora essas empresas notem
o contexto sistêmico, insistem em ações pontuais e soluções
isoladas para lidar com seus problemas de gestão.

O diagnóstico de gestão da Fundação Nacional da Qua-


lidade adaptado à realidade das micro e pequenas empre-
sas por meio de parceria com o Sebrae, torna-se, então,
uma ferramenta capaz de inserir essas organizações em um
contexto de busca pela excelência, onde a estratégia deve
pautar o ciclo de planejamento, execução, controle e ações
no contexto dessas organizações. Pode-se afirmar que se
trata de um processo pedagógico, em que a busca pela ex-
celência possibilita conhecimento pelos empreendedores e
aprimoramento da gestão, bem como um melhor desempe-
nho desses empreendimentos.

377
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