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POLÍTICA EDUCACIONAL
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A Emergência da Avaliação Externa como Organizadora da Política Educacional1
João Luiz Horta Neto - Inep e Grupo TEDis
joao.horta@inep.gov.br
Silvia Cristina Yannoulas - UnB e Grupo TEDis
silviayannoulas@unb.br
Introdução
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dessas medidas e o julgamento de valor a partir dessa análise é um processo corriqueiro
em qualquer instituição educacional. No entanto, no Brasil, usam-se as expressões
avaliar e fazer teste como se fossem sinônimas. No caso da língua inglesa, é feita uma
diferenciação utilizando-se o termo “assessment” para referir-se à etapa da medida (a
realização da prova) e “evaluation” que indica a etapa de julgamento de valor e de
propostas para a ação.
O amadurecimento dos testes avaliativos passaram por diversas fases até ganharem o
destaque que possuem nas políticas educacionais atualmente utilizadas em diversos
países. Elaboramos uma periodização em três fases que, como todo processo de
classificação, poderá ser questionada e aprimorada: a era da preocupação social, a era
da qualidade e a era do accountability. Nessa última fase tem destaque o papel do
Estado na avaliação, tema que será aprofundado nesse texto.
Os primeiros surveys2 que se tem notícia na área educacional, ocorreram nos Estados
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Unidos nos anos 1930. As preocupações de ranqueamento das instituições educacionais
não faziam parte do horizonte dos pesquisadores e formuladores de políticas dessa
época. A preocupação tinha um objetivo social claro: pesquisar como as denominadas
“minorias” estavam sendo preparadas pela escola, e se a elas eram dadas as mesmas
oportunidades de aprender que as dadas à considerada “maioria”.
O período foi marcado pela grande depressão mundial, que reduziu drasticamente as
oportunidades de emprego. Nessa época amplia-se significativamente a matrícula na
high school, o equivalente às nossas escolas de ensino médio. Nessa época, Tyler
coordena um estudo longitudinal denominado Eight Years Study, no estado de Ohio,
com o objetivo de verificar como as escolas estavam lidando com o grande contingente
de pessoas que passam a frequentá-la. Segundo Tyler (2005), o ensino médio não fazia
parte dos planos dos jovens daquela época, mas passa a ser a única alternativa para a
sua ocupação pois o desemprego atingia 100% da juventude.
Koretz (2008) afirma que nos EUA dos anos 1950 muitos distritos escolares
compravam testes de empresas comerciais e os aplicavam anualmente. Esses testes
eram originalmente desenhados para ajudar professores e administradores a identificar
as forças e fraquezas no interior das escolas e dos distritos escolares, no intuito de
aprimorar os processos de ensino. Nessa época a maior parte dos testes era referenciado
desenvolvimento cognitivo dos alunos. Esses itens, que na maior parte das vezes assumem o formato de
itens de múltipla escolha, podem ter a forma de uma pergunta ou de uma frase incompleta.
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à norma, ou seja indicava o desempenho dos alunos quando comparados com outros
grupos de alunos, sem que houvesse uma referencia definida a priori.
Nos anos 1960 um grupo de pesquisadores comandados por Coleman produziu, sob
encomenda do congresso norte-americano, o estudo Equality of Educational
Opportunity, conhecido como Relatório Coleman (Coleman, 1966). O objetivo dessa
pesquisa foi identificar como a lei dos Direito Civis aprovada em 1964 estava
repercutindo nas escolas americanas, e se os negros estavam obtendo um
desenvolvimento cognitivo comparável com o dos brancos. O estudo foi aplicado a uma
amostra nacional de escolas e era composto por testes aplicados aos estudantes dos
primeiros, terceiros, sextos, nonos e décimo segundos anos de escolaridade, e por
questionários aplicados aos professores e diretores de escola. Os testes aplicados a
900.000 estudantes mediram o desempenho nas áreas de habilidades verbais,
associações não verbais, compreensão leitora e matemática. Os questionários
investigaram, entre outros temas, o background socioeconômico e as atitudes dos
professores com relação às raças.
Esse relatório teve um forte impacto na época, já que uma de suas conclusões indicou
que a instituição educacional agregava muito pouco ao desenvolvimento cognitivo, e
que o fator determinante era a sua origem social e econômica. Como consequência, não
importava qual a instituição educacional frequentada, apesar das aparentes diferenças
qualitativas entre elas (Brooke e Soares, 2008). Essas descobertas contrariavam todas as
ideias liberais da instituição educacional como promotora de igualdade de
oportunidades entre os indivíduos. Nos anos 70 a descoberta da importância da origem
social e econômica do aluno para a definição do sucesso escolar seria também
sustentada pela teoria reprodutivista desenvolvida através dos estudos liderados por
Boudieu e Passeron, Bowles e Gintis, e Baudelot e Establet. A teoria reafirmou de certo
modo que a instituição educacional não fazia grande diferença no destino educacional e
ocupacional dos estudantes.
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apresentavam maiores ganhos nos desempenhos medidos pelos testes. Mesmo assim, é
importante destacar que, sob o impacto dos resultados do Relatório Coleman,
desenvolveu-se o primeiro sistema nacional de avaliação externa, o americano National
Assessment of Educational Progress, NAEP, com o objetivo de acompanhar o gap
existente entre os que aprendiam e os que não o faziam.
Um outro survey, conhecido como Relatório Plowden, dessa vez sob encomenda do
governo inglês, acontece em 1967. Seu objetivo foi verificar a relação entre o papel
desempenhado pela família e as condições da escola no desenvolvimento cognitivo dos
alunos. Apesar de ser um estudo muito menor que o americano, indicou três fatores
importantes para garantir o sucesso dos alunos: o interesse da família no desempenho
dos filhos, as condições dos domicílios e as condições das escolas (Booke e Soares,
2008). Novamente são os fatores externos à escola os considerados mais importantes
para o desempenho dos alunos.
A era da qualidade
Em meados dos anos 1960 Shultz começa a desenvolver uma nova linha de pesquisa
conhecida como Economia da Educação. O objetivo era verificar os impactos da
educação no desenvolvimento econômico das nações. Surge a Teoria do Capital
Humano, apontando o fator humano como um dos mais importantes para o
desenvolvimento, pudendo explicar os ganhos de produção quando diversos outros
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fatores eram mantidos constantes. A educação é tida como pressuposto para o
desenvolvimento econômico e para o desenvolvimento do indivíduo. Essa teoria teve
um forte impacto e estimulou vários cientistas a pesquisarem as possíveis relações entre
a educação e o desenvolvimento econômico.
Pode-se dizer que a Teoria do Capital Humano foi a raiz dos estudos internacionais com
o objetivo de comparar e ranquear diferentes países. Surgem o Trends in International
Mathematics and Science Study, TIMMS, Progress in International Reading Literacy
Study, PIRLS, o Programme for International Student Assessment, PISA e os estudos
latino-americanos produzidos pelo Laboratório Latino-americano de Avaliação da
Qualidade da Educação. No Brasil em fins dos anos 1980 é criado o Sistema Nacional
de Avaliação da Educação Básica, SAEB. Além dele, diversos outros testes são
desenvolvidos pelo INEP: em 1998, o Exame Nacional do Ensino Médio, ENEM; em
1999 o Exame Nacional de Certificação de Competências de Jovens e Adultos; em 2008
a Provinha Brasil.
A era do accountability
Nos anos 1980 começam a ser implementadas em larga escala as políticas neoliberais,
com a consequente privatização progressiva dos serviços públicos, mantendo a provisão
pelo Estado (mínimo) de apenas daqueles serviços consideramos essenciais. Além
disso, os agentes públicos passam a ser fortemente responsabilizados pelos serviços
prestados à população. Nesse contexto, os testes avaliativos ganham uma centralidade
sem precedentes nas políticas educacionais. A preocupação das políticas
definitivamente deixa de ser com o aprendizado e passa a estar fortemente focada no
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desempenho dos alunos nos testes. Parte-se do princípio de que matemática e leitura são
áreas essenciais para a vida em sociedade, e que um bom resultado dos alunos dessas
áreas é um excelente preditivo para a formação de cidadãos e garantia de
desenvolvimento econômico.
No caso brasileiro, o governo federal cria a partir de 2005 a Prova Brasil, aplicada de
forma quase censitária em todas as escolas públicas. Mesmo assim, cerca de 17 estados
da federação montam sistemas próprios de avaliação, muitas vezes aplicados nos
mesmos anos escolares que o teste avaliativo federal. Além deles, muitos municípios,
individualmente ou consorciados com outros, também desenvolvem seus testes (Horta
Neto, 2007). Como cada um dos instrumentos necessita que os itens que os compõem
sejam pré-testados antes de comporem os testes, não é incomum que em determinados
anos os alunos respondam a mais de quatro testes por ano. Com os resultados da Prova
Brasil o governo federal orienta o repasse de recursos, o mesmo acontecendo com os
governos locais com os resultados das suas avaliações. Outra consequência é o
aparecimento do IDEB em 2007, um indicador de grande apelo junto aos gestores
educacionais.
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proposts de fechar instituições com baixo desempenho, como vem acontecendo na
Inglaterra e nos EUA. Ou ainda, o arrendamento de escolas públicas para a iniciativa
privada, que receberia financiamento do estado em troca da garantia de elevação do
desempenho dos alunos (escolas Charters), como vem acontecendo nos Estados
Unidos. As mais novas iniciativas nos EUA propõem outorgar um bônus por
desempenho aos professores individualmente, ou às equipes escolares, com base no
desempenho dos alunos nos testes avaliativos.
O Estado Avaliador
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estratégico global através de mecanismos políticos menores em número, porém mais
precisos, constituídos pela definição de metas para o sistema e o estabelecimento de
critérios e processos de controle de qualidade do produto. Poucas áreas de atuação do
Estado escapam ao controle exercido pelo Estado Avaliador, pois o resultado da
avaliação é utilizado para distribuir os recursos humanos e financeiros entre as
instituições que oferecem um serviço (educacional, de saúde, etc.). O conceito está de
acordo com um modelo de gestão pública que se orienta por resultados atingidos pela
instituição potencialmente beneficiária dos recursos financeiros. O foco do controle por
parte do Estado Avaliador não está nos processos pedagógicos, mas nos seus resultados.
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Uma influência marcante na produção brasileira sobre o conceito de Estado Avaliador
é o autor português Afonso (1999). Para esse autor a discussão recente sobre avaliação
externa estaria centrada na redefinição do papel do Estado com vistas à revalorização da
ideologia do mercado, através de uma avaliação estandardizada com publicização dos
resultados, em contraposição à uma perspectiva menos reguladora e mais
emancipatória, dada pela avaliação formativa. Com a crise do Estado Provedor,
assistimos o surgimento do Estado Avaliador associado ao neo-conservadorismo, que
propõe uma intervenção mais forte do Estado no controle da oferta de serviços e o
surgimento do Mercado Avaliador associado ao neoliberalismo, que propõe a regulação
dos serviços pelo mercado e menos intervenção do Estado. Para Afonso a emergência
do “Estado Avaliativo” não se constitui num fenômeno que pode ser atribuído
exclusivamente às modificações do final do século XX. A avaliação se faz sempre
presente onde se opera algum controle público sobre as instituições públicas,
propiciando verificações administrativas (supervisões de rotinas) e controles formais,
estando frequentemente contida em minuciosos instrumentos legais prescritos. Assim,
as ações avaliativas são constantes em todos os momentos da evolução do ensino;
sendo, muitas vezes, pouco perceptível, pois deve-se à acumulação de pequenas
respostas às circunstâncias de diversa índole: algumas econômicas, outras ideológicas.
3 Foi realizada uma procura intensiva em bases abertas visando localizar produções acadêmicas
que utilizem o conceito de Estado Avaliador. Para os artigos a procura foi realizada na Scielo, e
complementarmente Google Acadêmico. No caso de dissertações e teses a procura foi realizada na
BDTD. O período considerado foi 1990-2009, e a delimitação geográfica foi o Brasil. Foram analisadas
em profundidade 48 produções científicas, sendo 10 teses, 5 dissertações e 33 artigos. Os
principais resultados foram publicados em: YANNOULAS, SOUZA e ASSIS (2009).
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dos artigos científicos, grande parte concentra sua análise na relação entre o Estado e as
Instituições de Educação Superior (51% dos artigos analisados). Uma considerável
quantidade dos artigos fazem referência ao sistema educacional como um todo (39%
dos artigos considerados), e apenas 03 artigos analisa outra esfera do sistema (estadual
ou municipal). No caso das teses e dissertações, o maior percentual concentra-se na
análise da relação entre o Estado e as Instituições de Educação Superior (60% das teses
e dissertações). A outra parte das teses e dissertações considera outra esfera do sistema
(estadual ou municipal), e nenhuma faz referência ao sistema educacional como um
todo.
Conclusões
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Procuramos com esta comunicação recuperar a história dos processos de avaliação
educacional, e apontar seus desdobramentos quanto ao direto social à educação e às
políticas educacionais. Nesse sentido, salientamos as nuances próprias de cada um dos
três períodos, para logo depois aprofundar no último deles.
Quando sua origem, Neave captou a emergência do Estado Avaliador com a utilização
do método comparado, estudando comparativamente as diferenças que assumia a
função avaliadora do Estado em países europeus com tradições muito diferentes quanto
a relação entre Sociedade Civil e Estado em matéria educacional (por exemplo, França
e Inglaterra). Entretanto, não foi objetivo do autor aprofundar nas nuances que poderia
diferenciar a presença do Estado Avaliador em diferentes níveis do sistema educacional
(escola fundamental, ensino médio, ensino superior), matéria que deverá ser ponderada
sob pena de desconhecer que a educação básica é direito social garantido
constitucionalmente (e, consequentemente, o Estado deverá accionar os poderes
públicos envolvidos para garantir sua realização), e que a educação superior ocupa um
papel preponderante na inserção ocupacional e profissional dos cidadãos.
lReferências Bibliográficas
esboço para uma rearticulação crítica. Campinas: Educação e Sociedade, v. 20, n. 69,
Dezembro, p. 139-164.
BRUNNER, José J. (1990). Universidad, sociedad y Estado en los 90. Buenos Aires:
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COLEMAN, James S. (1966). Equality of Educational Opportunity Study (EEOS),
1966. U.S. Department of Health, Education and Welfare. Ann Arbor, MI: Inter-
university Consortium for Political and Social Research.
KORETZ, Daniel. Measuring up: what educational testing really tells us. Cambridge,
MA: Harvard University Press, 2008.
RAVITCH, Diane (2010). The Death and Life of the Great American School System:
How Testing and Choice Are Undermining Education. New York: Basic Books.
YANNOULAS, Silvia C., SOUZA, Camila R. F., ASSIS, Samuel G. (2009). Políticas
Educacionais e Estado Avaliador - Uma relação conflitante. Pelotas, RS: Sociedade
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em Debate, v.15, p.55 - 67.
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