RESUMO: OLIVEIRA, Maria da Glória de e GONTIJO Rebeca.
“Sobre a história da historiografia brasileira: um breve panorama” In: Revista IHGB, Rio de Janeiro, a. 177 (472):13-38, jul./set. 2016.
Neydson Guilherme Silva Corrêa
Universidade Federal do Pará
História – Bacharelado 2016
A História enquanto campo e disciplina vêm passando ao longo das últimas
décadas por fundamentais e significativas reformulações que sobremaneira contribuíram para consolidar a História como discurso autônomo com pretensões científicas. Portanto, é importante estabelecer as linhas gerais dos debates que têm sido fomentados em torno da natureza da História, a fim de que possamos ter uma visão mais completa do devir da historiografia.
Desde os iluministas, com sua visão da História como progresso da humanidade,
passando pelos “positivistas”, historiadores da escola metódica, que viam a História como a tradução objetiva da verdade, do fato, até a Nova História, que prefere não oferecer uma explicação única para a questão, todo historiador se defronta com o problema inicial de definir seu próprio ofício. Essa questão passa muitas vezes pela definição ou não da História como ciência, o que oferece dificuldades, pois desde o século XIX, até hoje, a própria definição de ciência está em constante mutação. Marc Bloch, percursor da conceituada revista “Anais de História Econômica e Social” por exemplo, ao conceituar a história como um “estudo do homem no tempo”, eventualmente reconhecendo a ação deste no espaço, rompe com a ideia de que a História deve examinar apenas e necessariamente o Passado. O que ela estuda na verdade são as ações, transformações ou permanência humanas que se desenvolvem ou se estabelecem em um determinado recorte temporal, mais longo ou mais curto. Então, estudar o momento presente, com vistas a perceber como este momento presente é afetado por certos processos que se desenvolvem na passagem do tempo, ou como a temporalidade afeta de diversos modos a vida presente passava a ser também uma das tarefas do Historiador. Logo Definir a história como o estudo do homem no tempo foi um passo decisivo para a expansão dos domínios historiográficos que se seguirão. Dado um breve panorama da historiografia geral, faz-se pertinente olhar também para o campo de estudo que, reconhecendo a historicidade da própria historiografia, dedica-se a compreender e explicar seus desdobramentos dentro da epistemologia do fazer histórico.
No Brasil, como apontado por Gontijo e Oliveira, em linhas gerais, identificam-
se dois momentos específicos nos estudos sobre historiografia brasileira no século XX: o período que vai do fim dos anos 1940 até os anos 1960, quando as obras de José Honório Rodrigues estabeleceram um modelo que se tornou referência obrigatória nos cursos de graduação; e os anos 1970, quando outras propostas de escrita dessa história entraram em cena. José Honório Rodrigues destaca-se como o pesquisador que mais investiu no exame da produção historiográfica brasileira. Seu alvo principal é aquela historiografia que o autor considerava distante dos interesses nacionais, incapaz de dar conta do processo de emancipação do país. Em sua opinião, essa historiografia a ser ultrapassada só tinha olhos para a história colonial, não sendo capaz de desenvolver seu oposto: uma história nacional. José Honório expôs as linhas gerais para a interpretação da história da história do e no Brasil, listando nomes e obras, estabelecendo uma cronologia da produção historiográfica, tecendo relações entre essa produção e as teorias da história. De acordo com as autoras Seu alvo principal é aquela historiografia que o autor considerava distante dos interesses nacionais, incapaz de dar conta do processo de emancipação do país. Rodrigues buscou desenvolver um exercício crítico que considerava fundamental para situar o ponto em que se encontrava a historiografia naquele momento: o revisionismo. Tal empreendimento deveria ser aplicado tanto aos fatos históricos quanto às ideias, ou melhor, às ideologias que estivessem vinculadas as produções históricas até então. Seu alvo principal seria aquela historiografia que o autor considerava distante dos interesses nacionais, incapaz de dar conta do processo de emancipação do país. Isso implicava em buscar um distanciamento em uma historiografia voltada ao mundo colonial e marcada por uma visão de colonialidade, marcada por valores estrangeiros. Desta feita, Rodrigues almejava uma História nacional que ainda estava por ser rigorosamente formulada.
O modelo de história da historiografia proposto por José Honório perdurou por
longo tempo, tornando-se referência obrigatória nos cursos de História ao menos até a década de 1970, quando outros autores procuraram refletir sobre a história da historiografia, introduzindo novos elementos as discussões. Uma demanda por renovação nos estudos sobre historiografia brasileira pode ser observada no I Seminário de Estudos Brasileiros, realizado no IEB em 1971. Dentre os objetivos do evento estava rever, rediscutir o que tinha sido alcançado dentro da disciplina até aquele momento no país: como os autores entenderam e escreveram a História do Brasil, métodos e técnicas, fontes, falhas e lacunas etc. É neste período que também surge a figura de Carlos Guilherme Mota como propositor de novas abordagens para a historiografia a partir de sua obra Ideologia da cultura brasileira.
Apontam Gontijo e Oliveira, que, o empreendimento de Mota não se tratava
meramente de uma história da cultura brasileira, nem de uma história intelectual tradicional, preocupada com o arrolamento sistemático dos principais pensadores com indicação de suas respectivas influências. A proposta era apresentar uma história da consciência social no Brasil, por meio de uma “história das ideologias”, feita a partir da crítica das interpretações a propósito da chamada cultura brasileira. seu objetivo era compreender os pressupostos ideológicos que fundamentavam as interpretações de cunho histórico sobre a cultura brasileira.
Entre os esforços de análise da produção historiográfica nacional estiveram envolvidos
diversos atores como Maria de Lourdes Monaco Janotti partindo da constatação de que a historiografia brasileira vinha sendo abordada por dois tipos de estudo – as histórias da literatura e os trabalhos com foco em obras e historiadores específicos; Raquel Glezer se ocupando de um “estudo do processo de evolução do conhecimento histórico”, compreendendo-o como um setor particular, distinto da filosofia da história, da teoria da história e da metodologia da história entre outros.
Em síntese, O breve esforço de apresentar os modelos de história da
historiografia produzidos entre os anos 1940 e 1970 empreendido por Gontijo e Oliveira nos permite tecer alguns comentários acerca dos caminhos desse domínio de estudos entre os estudiosos da História. Por fim, nos anos 1970, a emergência de uma preocupação em desenvolver a história da historiografia parece estar relacionada, ao menos em parte, com uma transformação interna do campo dos estudos históricos no Brasil.