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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Fomos colocados à prova e passamos.

rova e passamos. Não vejo nenhum risco à democracia’, diz general Villas Bôas

O GLOBO › Annotations

Década de rupturas: ‘Fomos


colocados à prova e passamos. Não
vejo nenhum risco à democracia’, diz
general Villas Bôas
DECEMBER ,

Ex-comandante do Exército relata detalhes da tensão às vésperas do


impeachment de Dilma, da divulgação dos áudios de Temer e da prisão de
Lula; relembra pressão por intervenção militar e descarta medidas como o
AI-

RI- / / Especial - Thomas Traumann entrevista General Villas Boas. Foto: Fernando Lemos
Foto: Fernando Lemos / Agência O Globo

RIO — Comandante do Exército nos governos Dilma Rousseff e Michel


Temer, o general Eduardo Villas Bôas faz, nesta primeira entrevista da série
Década de Rupturas, a avaliação de que o país correu risco institucional
entre o impeachment e a divulgação dos diálogos da JBS. “Fiquei bem
preocupado”, disse, a respeito das reações dentro e fora dos quarteis quando
os áudios com Temer vieram a público. O general de  anos conta que
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elaborou teses baseadas na Constituição e na estabilidade dos Poderes para


circunscrever a ação do Exército em uma eventual crise institucional.

Vítima de uma rara doença neuromotora de caráter degenerativo, Villas


Bôas respira com ajuda de aparelho e se locomove em cadeira de rodas. Ele
conversou com O GLOBO por quase duas horas em sua casa, em Brasília,
semanas antes de se submeter a uma traqueostomia. “Quando Deus quer ter
uma conversa particular com você, ele te dá uma doença assim”.

Houve algum risco de decretação de “Estado de Defesa” durante o


impeachment da presidente Dilma Rousseff?

Esse episódio ganhou uma versão que não é totalmente verdadeira. Ao longo
do processo de impeachment, dois parlamentares de partidos de esquerda
procuraram a assessoria parlamentar do Exército para sondar como
receberíamos a decretação de um “Estado de Defesa” (possibilidade
constitucional na qual o presidente decreta por  dias situação emergencial
restringindo direito de reunião e de comunicação). Confesso que fiquei
preocupado, porque vi ali uma possibilidade de o Exército ser empregado
contra as manifestações. Contudo, corre uma versão de que a presidente
Dilma teria me chamado e determinado a decretação do “Estado de Defesa”,
e eu teria dito que não cumpriria. Isso não aconteceu. Mas que houve a
sondagem, ela de fato houve.

Houve algo além da sondagem?

Não. Absolutamente.

Ao longo do processo de impeachment, o senhor como Comandante do


Exército elaborou uma tese com os três pilares sobre as circunstâncias nas
quais as Forças Armadas poderiam ser convocadas. Quais são?
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Isso surgiu quando, nas vésperas do impeachment, o presidente Temer


chamou a mim e ao general Etchegoyen (Sérgio Etchegoyen, ministro do
GSI no governo Temer) e perguntou qual seria a reação do Exército no caso
do impeachment. Eu disse: “O Exército vai cumprir a Constituição”.
Naquele momento havia muitos movimentos pedindo intervenção militar.

“'Nas vésperas do impeachment, o presidente Temer chamou a mim e ao


general Etchegoyen e perguntou qual seria a reação do Exército no caso do
impeachment. Eu disse: ‘O Exército vai cumprir a Constituição’”

Falei ao presidente Temer dos três pilares. O primeiro é o da legalidade.


Uma instituição de Estado não pode nunca atuar fora desse preceito, até
porque já tinham lições aprendidas com a História, não é? E o Exército
poderia até ser empregado, mas de acordo com a Constituição, conforme
consta no artigo  (que diz que a pedido do Executivo, Legislativo ou
Judiciário, as Forças podem ser empregadas para assegurar a lei e a ordem).

Outro aspecto é o da estabilidade. Se o país estiver em um momento


conturbado, poderíamos agir para manter a estabilidade nacional para que as
instituições funcionassem. E o terceiro aspecto é o da legitimidade, um
preceito construído pelo Exército ao longo de muitos anos. Ademais, se
eventualmente o Exército fosse chamado, era preciso estar caracterizado da
sua imparcialidade como instituição de Estado que jamais se submeteu a
pressões políticas. A minha resposta era que o Brasil hoje é um país de
instituições já com seus espaços, seus limites de atuação definidos. Nós
temos um sistema de pesos e contrapesos que dispensa da sociedade de ser
tutelada.

Esses três pilares foram muito úteis, tanto diante das pressões para
intervenção, como também pra tranquilizar o público interno do Exército.

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Esse pilares viraram uma espécie de linha de atuação.

Em , quando o presidente Temer foi grampeado naquela conversa


indecorosa com o empresário Joesley Batista, o senhor foi no Twitter e
publicou que “não há atalho fora da Constituição”. Naquele momento havia
algum risco institucional?

Eu senti. Fiquei bem preocupado.

Em abril de , quando o Supremo discutia a possibilidade do habeas


corpus para evitar a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o
senhor escreveu no seu Twitter: “Nessa situação em que vive o Brasil, resta
perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem
do país e das gerações futuras e quem está preocupado com interesses
pessoais”. O STF acabou concluindo por recusar o HC do ex-presidente. O
senhor acha quer alterou a votação do Supremo?

Sinceramente, não acredito que a ministra Rosa Weber tenha mudado o seu
voto em função da minha declaração. Foi uma preocupação que se
desencadeasse um processo de impunidade, que a palavra-chave desse tuíte
foi impunidade. E também teve a intenção, primeiro de manifestar o
pensamento do Exército e, segundo, também de conformidade com a
vontade da população. Eu sabia que havia riscos desse tuíte, tanto que no dia
seguinte o ministro Celso de Mello (decano do STF) nos chamou de
“pretorianos”. Eu sabia que alguma reação corporativa deveria haver e até
achei que ficou barato.

Quando o senhor revê esses episódios encadeados, havia risco de retrocesso


institucional?

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Acho que risco de retrocesso institucional, pelo menos naquele momento


(julgamento de Lula), não havia, mas temia que aqueles acontecimentos
desencadeassem uma instabilidade de ordem pública que, aí sim, pudessem
levar para... Nós tínhamos na memória as manifestações de , algo que
esteve na iminência de fugir ao controle. Então o Twitter teve um caráter
preventivo.

Em outubro, o deputado Eduardo Bolsonaro falou em AI- como reação a


uma suposta radicalização da oposição e, em novembro, o ministro Paulo
Guedes foi na mesma toada. Qual a sua avaliação?

O Brasil hoje é um país que conta com instituições amadurecidas, portanto


dispensa o uso de mecanismos não constitucionais.

O senhor enxerga risco de manifestações no Brasil similar ao que está


ocorrendo no Chile?

Há algum grau de incerteza, basta nos lembrarmos do que aconteceu em


.

O Brasil enfrentou manifestações de rua com milhões de pessoas em ,


 e , sem nenhuma mudança institucional. Existe um fator
diferente agora?

O fato de termos passado esses episódios prova que somos um país


amadurecido.

O senhor enxerga alguma possibilidade de retrocesso institucional no Brasil?

Fomos repetidamente colocados à prova. Não vejo nenhum risco.

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Desde o general Leônidas Pires, ministro do Exército no governo Figueiredo,


os comandantes têm sido discretos. Por que o senhor foi diferente?

O general Eduardo Villas-Bôas, comandante do Exército nos governos Dilma Rousseff e Michel Temer, é o
primeiro entrevistado da série "Década de rupturas', do GLOBO Foto: Agência O Globo

No final do governo militar, o Exército voltou para os quartéis, teve sua


atuação de perfil bem baixo. Eu tinha preocupação de manter isso, mas me
dei conta de que a sociedade e as elites estavam se desacostumando a ouvir o
Exército e as Forças Armadas. Havia até um patrulhamento em relação a
isso. Mas considero que é legítimo as Forças Armadas se pronunciarem para
participar da discussão em tudo que diz respeito à segurança e Defesa.

O governo Bolsonaro tem muitos militares e o próprio presidente tem uma


persona militar. Como fazer agora a distinção entre as Forças Armadas e o
governo?

Temos que distinguir bem os militares que estão no governo do Exército. O


atual comandante do Exército, general Edson Pujol, tem adotado postura

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muito adequada de baixo perfil. Isso faz marcar bem o espaço que existe
entre governo e Exército.

O senhor concorda que, para o cidadão comum, é fácil confundir?

Algumas pessoas podem ter essa concepção que, imagino, pode aparecer no
futuro numa disputa eleitoral. Mas é interessante observar que, apesar da
quantidade relativa de militares no governo, ela não resulta influência direta
sobre o presidente.

Na posse do comandante Pujol, o presidente Bolsonaro disse que devia a


Presidência ao senhor. O senhor sente o presidente devedor de alguma
forma?

Absolutamente, não. Conversamos algumas vezes antes da eleição, assim


como conversei com outros candidatos para colocar questões importantes,
como a Amazônia, o papel das Forças Armadas, a necessidade de um projeto
para o Brasil. Eu tinha esperança que esses temas constassem do debate
eleitoral, mas praticamente não houve debate. Com Bolsonaro, conversei
três vezes antes da eleição. Ele interpreta como se a minha atuação tivesse
sido incisiva, mas, absolutamente, acho que não.

Em , o senhor foi diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica


(ELA), uma doença neuromotora de caráter degenerativo, enquanto exercia
o Comando do Exército. Como foi para o senhor tornar pública uma
doença que lhe incapacita quando exercia uma função tão exigente?

Quando recebi o diagnóstico, balancei se deveria continuar ou não. Mas,


como tinha uma estrutura já montada, me permiti continuar. Diminuí as
viagens, me dificultou estar em contato com a tropa, principalmente do
pessoal operacional. Por outro lado, senti que o Exército todo se voltou pra
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mim no sentido de ajudar, me proteger. Do ponto de vista pessoal, eu


costumo dizer que, quando Deus quer ter uma conversa particular com
você, ele te dá uma doença assim. Que a gente acaba se aproximando de
Deus e tem uma outra compreensão da vida. Eu tive ali. Para família, que
passou a viver em função de mim, os amigos... Apesar das limitações físicas,
eu me sinto muito bem. Estou penetrando em universos que não conhecia,
estou me sentindo muito útil. Então, encaro tudo como sendo positivo.

O General na última década

Alta patente

Promovido a General de Exército, posto máximo da carreira militar, e


Comandante Militar da Amazônia (CMA), com sede em Manaus.

Assume o Exército

Nomeado pela então presidente Dilma Rousseff como Comandante do


Exército, em sucessão ao general Enzo Martins Peri.

Momento crítico

Manifestações de rua pró-impeachment pedem também a intervenção


militar. Villas Bôas cria documento interno para delimitar eventuais ações
do Exército.

Comando mantido

Dilma sofre impeachment e Michel Temer assume a Presidência. Villas Bôas


é mantido no cargo.

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Doença revelada

É diagnosticado com a doença neurodegenerativa Esclerose Lateral


Amiotrófica (ELA). Apesar da doença, decide se manter no posto.

Clima conturbado

Os pedidos de intervenção retornam depois da divulgação de áudios de


conversas grampeadas entre o presidente Temer e Joesley Batista. Em tuíte,
Villas Bôas escreve: “Não há atalhos fora da Constituição”.

Pressão nas redes

Às vésperas do julgamento de Lula pelo STF, o general volta ao Twitter: “O


Exército compartilha o anseio de repúdio à impunidade”.

Gratidão expressa

Como comandante, se encontra com todos os candidatos. Depois de eleito,


Jair Bolsonaro diz em discurso que ele era “o motivo de estar ali”.

A hora da sucessão

Deixa o comando do Exército e assume como assessor especial do Gabinete


de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI).

Inaugura, em dezembro, o Instituto General Villas Bôas (IGVB), dedicado a


apoiar pessoas que sofrem de doenças raras, como ELA.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'Bolsonaro gera tanto conflito que pode perder a mão', diz Janaina Paschoal

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Década de rupturas: 'Bolsonaro gera


tanto conflito que pode perder a
mão', diz Janaina Paschoal
DECEMBER ,

A advogada Janaina Paschoal é uma das entrevistadas da série Década de rupturas Foto: Fernando
Lemos / Agência O Globo

RIO — Deputada estadual mais votada na história, a advogada Janaina


Paschoal, de  anos, é o símbolo do que se definiu como Nova Política, a
geração de novatos eleitos na esteira da Lava-Jato e do bolsonarismo. Cotada
para ser vice de Bolsonaro, Janaina conta nesta entrevista concedida no seu
gabinete na Assembleia Legislativa de São Paulo as condições que impôs para
aceitar o convite e faz um prognóstico pessimista do futuro do governo
depois da criação da Aliança Pelo Brasil. “Não sei como essas pessoas do PSL
vão reagir. Não tem situação pior do que alguém que amava e foi
desprezado. O melhor ingrediente para o ódio é o amor não correspondido”.

Em que momento a senhora decidiu pedir o impeachment da ex-presidente


Dilma Rousseff?
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12/01/2021 Década de rupturas: 'Bolsonaro gera tanto conflito que pode perder a mão', diz Janaina Paschoal

Eu estava na aula de pilates e virei para uma amiga e disse “eu vou pedir o
impeachment da presidente”. Ela teve um ataque de riso. “É sério!”, eu disse.
Aí ela falou, “Nossa, que doida! Você vai ficar famosa”. E eu, “imagina, só
vou fazer a parte técnica”. Isso foi uns dois meses antes da entrega do pedido
(em setembro de ). Na minha cabeça, eu tinha construído a peça, tinha
desenvolvido os fundamentos, mas ia fazer trabalho braçal. Quem ia
aparecer era o dr. Hélio Bicudo (advogado renomado e colega no pedido).
Sei que parece insano, mas nunca imaginei ficar conhecida. Por que contei o
episódio? Porque talvez para uma outra pessoa fosse muito claro que o
pedido do impeachment ia mudar minha vida, mas para mim não era.

Houve pressão de políticos para desistir do processo ?

Muita, especialmente para retirar o trecho da corrupção na Petrobras como


um dos motivos do processo. Só depois entendi que estava puxando um fio
que trouxe muita coisa. A Petrobras e o BNDES envolviam o PT, mas
também o MDB e o PSDB. Comecei a ser um incômodo. Tanto é que o
Eduardo Cunha, quando recebe a denúncia, tenta retirar a Petrobras e deixar
apenas as “pedaladas”. Respondi: “a minha denúncia é tudo”. Foi bem
traumático.

Foi o seu choque com o mundo político real?

Vi que havia mais gente envolvida (nos escândalos), veio ameaça. Foi
pesado. Mas aí comecei a achar que tinha o dever de segurar. Mas, se você
pegar as imagens de TV, vai ver que eu não saía do plenário. Você pode me
achar paranoica, mas eu achava, sem brincadeira, que se saísse para ir ao
banheiro alguém ia aprontar alguma coisa e estragar o meu processo.

Em que momento a senhora pensou em ser candidata?

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Durante o processo do impeachment, antes da eleição municipal de , o


Novo me convidou. Foram vários convites, mas fui adiando. Assinei a ficha
de filiação no PSL no último dia do prazo, e só porque o Bolsonaro me disse
num telefonema: “por que você não se habilita e depois você decide se vai ser
candidata?”.

O que fez a senhora escolher Jair Bolsonaro?

Eliminação. Não queria dar nenhuma chance para o PT. Ponto número . O
processo de impeachment e a Lava-Jato trouxeram uma série de situações
envolvendo o PSDB e o MDB. Aí, sobrava o João Amoedo (candidato do
Novo), que, com todo respeito, não achava que tinha condições de ganhar; o
Álvaro Dias (candidato do Podemos), excelente candidato, mas que que
naquela época era regional. Aí falei, meu Deus, só sobra o Bolsonaro, só
quem tem chance é ele, o que eu faço agora?

Isso foi quando?

Uns seis meses antes da eleição. Se alguém me dissesse “você vai votar no
Bolsonaro”, responderia “você é doido”. Porque não tem muito a ver
comigo. Mas daí pensei: vou me unir a ele para ajudar a bater o PT. Tanto é
que quando ele me chamou pra vice foi um dilema. Pensei: e se eu não for e
o homem perde? Vou achar o resto da vida que a culpa foi minha, ficar a
vida inteira com essa culpa.

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A senhora escolhe por eliminação, mas quando o Bolsonaro ganhou o seu


voto?

Mas que alternativa eu tinha? Olha só, quando a gente o conhece, o


Bolsonaro é melhor do que aparenta. Isso é fato. Ele é uma pessoa muito
agressiva pela imprensa, mas no trato é extremamente educado, muito
cortês. Lembra que ele teve aquela ideia de colocar mais dez ministros no
Supremo? Eu falei, “presidente, pelo amor de Deus, isso é coisa de ditadura,
não pode, temos uma Constituição”. Ele chamou a turma dele e falou “tira
isso daí do programa porque não pode”. Esse tipo de reação, de ouvir os
outros, foi quebrando aquele preconceito.

Essa proximidade me deu uma perspectiva de poder ponderá-lo. Tanto que,


quando saí candidata a deputada, tinha ficado meio acordado que o
auxiliaria daqui.

Na convenção do PSL a senhora foi apresentada com a provável candidata a


vice. Por que não certo?

Eu propus algumas condições que não foram aceitas. Eu propus montar um


polo da Vice-Presidência em São Paulo, porque minha família não iria
comigo, mas também porque acho estratégico. Eu disse ao Bolsonaro, “fico
sediada em São Paulo e quando o senhor viajar ao Exterior, vou a Brasília e
substituo”. E enquanto ele governava em Brasília, eu visito outros estados,
pego demandas. Eu propus isso para o presidente numa reunião de
campanha, e a equipe achou que era pedantismo meu.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'Bolsonaro gera tanto conflito que pode perder a mão', diz Janaina Paschoal

'Bolsonaro gera tanto conflito que pode perder a mão', diz Janaina Paschoal Foto: Fernando Lemos /
Agência O Globo

Na minha ideia, o vice-presidente representa os outros dois olhos do


presidente. Se ele estiver mergulhado numa burocracia é inútil. Minha
intenção era que, enquanto o Bolsonaro fosse para o front na campanha, eu
iria montar o governo. Ele fica no front e eu no backup.

Qual foi a reação?

Ninguém gostou das minhas ideias (risos) Não ia dar certo. Não foi uma
coisa, “Ah, a Janaina fresca não quer”. Foi um amadurecimento de parte a
parte.

O que aconteceu depois da eleição?

Um distanciamento muito grande. Não sei se por culpa minha, porque falo
o que eu penso. Muita gente fala pra mim, “por que você não fala para ele o
que você quer dizer ao invés de dar entrevistas?” Mas como é que falo se
houve um distanciamento total? Não sei se por culpa da equipe, dos filhos...
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12/01/2021 Década de rupturas: 'Bolsonaro gera tanto conflito que pode perder a mão', diz Janaina Paschoal

Este é um governo de confrontos?

Já na campanha identifiquei isso que o presidente é um líder do conflito. Ele


só sabe liderar no conflito. O meu temor é que ele venha eventualmente a
perder a mão desse grau de conflito.

O que é perder a mão?

E se os conflitos se acirrarem num ponto que ele não consiga mais governar?
Por exemplo, na campanha eu disse, “presidente, as brigas estão demais. O
senhor tem que fazer alguma coisa”. E ele deixava a coisa rolar. Ok, foi
eleito. Ele começa o governo e a gente sente um pouco disso no governo. Ele
não quer saber, cada um que brigue, vai tocando...

Agora, ele decide criar um novo partido (o Aliança pelo Brasil) e divide o
PSL. Ele conseguiu cindir pessoas que gostam verdadeiramente dele.
Concordam com as coisas que ele diz e pensa. Ele conseguiu criar um cisma
onde não precisava. Foi um grande erro, gerou muita mágoa.

Governar por conflito é uma tática?

Pode ser que o presidente goste porque enquanto as pessoas estão


preocupadas com essas briguinhas, ele está fazendo as coisas acontecerem.
Tira a atenção do que é importante. Mas e se os conflitos crescerem num
ponto que ele não consiga mais recuperar as rédeas? Tenho essa preocupação.

A senhora imagina o presidente perdendo a mão lidando com protestos


como os de ?

Não apenas, mesmo numa situação de tranquilidade das ruas. Não sei como
essas pessoas do PSL vão reagir numa votação que eventualmente seja

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necessária para o país. Será que essas pessoas tão maltratadas por nada vão
votar a favor do que é devido ou vão votar contra (o governo) só porque
estão sendo maltratadas? Perceba, não estou falando de liberação de
emendas, nem cargo, mas de mágoa. Porque não tem situação pior do que
alguém que amava e foi desprezado, entendeu? O melhor ingrediente para o
ódio é o amor não correspondido.

Essa mágoa pode fazer o presidente não terminar o mandato?

Sim porque ele vai criando briga, briga, briga e estamos só no primeiro ano
de mandato.

Qual o futuro da Operação Lava-Jato?

O Supremo está jogando baldes de água com gelo em tudo. Porque existem
temas passíveis de interpretações, mas anular processos pela ordem das
alegações finais entre réus? Você tem argumentos jurídicos pró-prisão em
segunda instância, contra prisão em segunda instância, isso é fato. Mas
mudar de opinião em pouco mais de um ano? Fica muito evidente o desejo
do Supremo de desfazer a Lava-Jato.

Por isso a senhora está pedindo o impeachment do ministro Dias Toffoli?

O ministro Toffoli instaurou um inquérito sigiloso para investigar qualquer


um que fale contra o Supremo e distribuiu esse inquérito à revelia das regras
de distribuição; pediu pra recolher uma revista (“Crusué”) e na sequência
suspendeu todas as apurações instauradas em informações do Coaf e da
Receita Federal. Ele usou o poder dele de maneira absolutamente fora do
padrão e, no caso da instauração do inquérito, se valendo da condição de
presidente da Corte. Para mim, é flagrante crime de responsabilidade, que se
agrava quando a gente constata por força de notícias de que havia
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movimentações suspeitas por parte dele e da família dele e também do


ministro Gilmar Mendes e da sua família. Não estou dizendo que essas
movimentações existam e que, eventualmente, haja algo ilícito, mas uma
autoridade não pode usar o seu poder, usar uma roupagem de ação
institucional para se blindar

Pedir o impeachment do presidente Toffoli não ajuda as manifestações pelo


fechamento do Supremo?

A minha atuação é sempre na Constituição. Não sou do tipo que fica


chamando o povo pra ir para a rua. Mas a depender do grau de
descontentamento, de indignação que infelizmente nosso país dá margem,
pode não ter volta. Eu faço a minha parte técnica, se tiver uma audiência no
Senado, vou fazer a sustentação técnica, mas eu não vou botar fogo na
população.

A senhora acha que possam ocorrer aqui protestos similares aos do Chile?

Hoje não, mas é bom não folgar. Acho que o Supremo, digo isso
respeitosamente, está pecando muito. Não está entendendo o momento
histórico que vivemos.

Janaina na última década

Tese

Defende o impeachment de Dilma Rousseff pela primeira vez, em artigo


assinado no Jornal do Advogado de São Paulo

O texto

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Ao lado dos juristas Miguel Reale Júnior e Hélio Bicudo, escreve o pedido
de impeachment que seria aceito na Câmara dos Deputados

Na rua

Faz discurso a favor do impeachment em ato no Largo de São Francisco, na


USP. Dias depois, a Câmara aprova o processo de impeachment de Dilma
Rousseff

A guinada política

Filia-se ao PSL. É cotada para ser vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro


para a Presidência, mas acaba recusando o posto

Valores

Alinhada a opiniões conservadoras, faz discurso contrário à


descriminalização do aborto em audiência pública no STF

É eleita a deputada mais votada na História do país com .. votos


para a Assembleia Legislativa de São Paulo

Protocola pedido de impeachment contra o presidente do Supremo Tribunal


Federal, ministro Dias Toffoli

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O mecanismo está se ajustando', diz José Padilha

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Década de rupturas: 'O mecanismo


está se ajustando', diz José Padilha
DECEMBER ,

'O mecanismo está se ajustando, diz José Padinha Foto: Fernando Lemos / Agência O Globo

RIO — José Padilha chegou atrasado para as duas conversas com O


GLOBO, em um hotel em São Paulo. Aos  anos, ele tem feito entrevistas
com personagens do documentário ainda sem data para ser lançado sobre os
vazamentos do site e Intercept de diálogos dos procuradores da Lava-Jato.
“É possível ao mesmo tempo achar que existe uma corrupção sistêmica e que
o processo pode ter sido julgado e avaliado de maneira arbitrária. Não há
uma contradição entre as duas coisas”, disse.

Tropa de Elite  termina com a chegada dos milicianos em Brasília.


Olhando a cena de dez anos depois, qual que é a sensação?

Foi de certa maneira profético, mas lembrando que o miliciano que chega
em Brasília no filme é deputado. Ele não chega (risos) no Executivo.

O sistema é foda, parceiro?

O sistema está desnudo agora, está tendo que se reestruturar a olhos vistos.
O capitão Nascimento (personagem principal de Tropa de elite) estava
falando do sistema da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Você está falando do
sistema político brasileiro. O que que é foda no sistema político? É que a
corrupção não é um desvio de conduta. A corrupção é um processo
estruturante da política nacional. Eu chamei isso de mecanismo.

Como funciona o mecanismo?

O partido ou grupo político que ganha eleição precisa formar maioria na


Câmara dos Deputados pra governar. Como é que ele forma essa maioria?
Ele distribui cargos, loteia cargos dentro das empresas estatais, dentro dos
ministérios. Quanto maior o orçamento que o cargo controla, mais peso ele
tem na formação da base política. O político indica o cara para o cargo que
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12/01/2021 Década de rupturas: 'O mecanismo está se ajustando', diz José Padilha

ele quer, e o cara trabalha junto às empresas. Normalmente são empreiteiras,


mas também são fornecedores do Estado organizados na forma de cartel.
Essas empresas recebem, colocam parte do dinheiro no caixa , contratando
serviços que não existem, e etc. Doleiros então administram esse caixa .
Pessoas especializadas. E devolvem esse dinheiro para o grupo político que
colocou o cara lá no cargo. Esse grupo político, então, vota com o Executivo.

Isso não é um desvio, isso é uma regra na quase totalidade dos municípios.

Como é que eu sei isso? Porque em parte a Operação Lava-Jato mostrou,


mas hoje mesmo entrevistei uma pessoa para o meu documentário que
trabalha em São Paulo entregando valores para a Odebrecht. Ele calculou ter
entregue R  bilhão em dinheiro em oito anos para  endereços
diferentes de alguns políticos famosos, outros menos famosos, só em São
Paulo.

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Nomes como Marcelo
Odebrecht, Lemann, Villas…

05:16 20:38

Então o tamanho disso, a capilaridade disso é total. Literalmente, a política


se estrutura nessas bases.

A Lava-Jato não mudou o funcionamento do mecanismo?

Na esteira da Lava-Jato, o Congresso aprovou o financiamento público de


campanha. Em princípio, achei bom, porque desmonta a necessidade de
recursos privados via caixa  e descontamina a operação das grandes
empresas estatais e o orçamento das obras públicas. Mas ao falar hoje com
um operador da Odebrecht, ele falou “você acredita em Papai Noel? Vai
acontecer o financiamento público de campanha e o mecanismo ao mesmo
tempo”. Foi o que ele me disse, e ele tem mais experiência do que eu.

O mecanismo está se ajustando. A ideia de que vamos desmontar essa


relação entre política e corrupção através de regras de financiamento de
campanha sem mudar a forma pela qual a campanha é feita é uma ilusão.

Na minissérie Mecanismo, os políticos ou são oportunistas, ou são ladrões


ou são as duas coisas. Essa é a sua opinião?

Vamos olhar isso sobre o prisma darwinista? O que Darwin explicou é que
existem processos de seleção em certos nichos ecológicos e sobrevivem os
organismos que se adaptam melhor àquele nicho. Se você olhar a forma pela
qual a campanha política é feita no Brasil, que tipo de gente a campanha
política seleciona? Se para me eleger, preciso receber dinheiro de caixa ,

https://outline.com/B3S3XB 2/8
12/01/2021 Década de rupturas: 'O mecanismo está se ajustando', diz José Padilha

preciso ter conta na Suíça, então só gente que está disposta a fazer isso vai
jogar o jogo político. Tem exceções? Tem o Marcelo Freixo, mas
evidentemente que a estrutura seletiva do mecanismo não seleciona as
pessoas com maior apreço pela ética para serem políticos no Brasil.

Seus filmes Ônibus , Tropa , Tropa  e o Mecanismo tem uma lógica de
continuidade?

Ônibus  (documentário de ) olha para Sandro Nascimento, um ex-


menino de rua que faz passageiros de ônibus como reféns. O filme pergunta:
por que ele está sendo tão violento? E por que ele não se entrega à polícia?
As respostas temos olhando a vida dele. Sandro era uma criança que estava
na Candelária quando os policiais cometeram a chacina com meninos de rua
(em ) e foi preso numa das piores prisões brasileiras, ele sabe para onde
vai quando sair dali. Foi o Estado que produziu a violência naquele menino.
E o Estado também produziu, na psicologia dele, a certeza de que ele não
pode se entregar. Se ele se entregar, ele vai morrer. E o que acontece? Ele se
entrega para o Bope, o Bope bota ele no camburão e estrangula ele a olhos
vistos na frente das câmeras.

E Tropa é o ângulo da polícia.

O cineasta José Padilha é um dos entrevistados da série Década de rupturas Foto: Fernando Lemos /
Agência O Globo

Aí eu chamei o policial com o mesmo sobrenome do menino de rua, era


uma dica. Quando você olha o policial, você vê que a violência do policial
também é produzida pelo Estado. O policial recebe um salário muito baixo,
é instado a viver uma guerra contínua recorrente contra o tráfico. Ele vai
para a favela lutar contra caras armados de granada, fuzil AR-. A maioria
desses policiais ou se omite, ou se corrompe – a maioria se corrompe – ou
vai para uma guerra, que é o caso que acontecia com o Bope quando tinha
só  policiais. Quem provoca a violência do policial? É o Estado. Por que o
Rio de Janeiro é tão violento? É porque os criminosos que o Estado cria se
encontram com os policiais que o Estado cria.
https://outline.com/B3S3XB 3/8
12/01/2021 Década de rupturas: 'O mecanismo está se ajustando', diz José Padilha

Mecanismo é Tropa quando o inimigo agora é outro?

No Mecanismo, estou olhando para uma coisa subjacente à violência, que é


a corrupção. No Brasil, a corrupção é parte estruturante da política. Não
pelo volume, mas porque a corrupção determina a alocação dos recursos. O
político prefere fazer o estádio do Corinthians a investir em escola, prefere
fazer a usina de Belo Monte — um crime brutal — do que reformar as
cadeias. Prefere fazer isso, porque dá mais dinheiro para a campanha política.
O Mecanismo não é um detalhe, é a base do gasto público.

É uma visão extremamente pessimista de país.

É uma visão realista. Não inventei o que acontece com os meninos de rua, o
que acontece no Instituto Padre Severino, nas cadeiras superlotadas, nos
batalhões da PM, o poder da milícia e muito menos inventei o sistema
Drousys (arquivo de controle dos pagamentos ilegais da Odebrecht). É a
realidade do Brasil. Por que o Brasil não tem resultados de distribuição de
renda de crescimento econômico sustentável? Em parte, por isso.

O Capitão Nascimento libertou do armário o discurso do “tiro na


cabecinha”?

O Capitão Nascimento é um termômetro. A temperatura já estava lá. No


plano final de Ônibus , quando o Sandro desce, tem um monte de gente
que corre para linchá-lo. Isso é o Capitão Nascimento muito antes de Tropa,
do novo governador.

“Capitão Nascimento é um termômetro (do sejo por violência policial). A


temperatura já estava lá. No “Ônibus ”, quando o Sandro desce tem
um monte de gente que corre para linchá-lo”

Seus filmes mexem com temas complexos e que muita gente acha terem
soluções simples: bandido bom é bandido morto e todo corrupto deve ser
esquecido na cadeia.

No Brasil, bandidagem é tanto o traficante, quanto o político corrupto. Essa


ideia de “o cara que vai lutar contra o traficante é o mesmo que vai lutar
contra a corrupção”, não tem a ver com Tropa de Elite. É o resultado da
violência urbana mais a Operação Lava-Jato. A Lava-Jato tem características
que não existem em nenhuma operação que jamais vi. Ela é uma operação
midiática. A cada fase da operação, os procuradores e policiais davam
entrevistas. Nunca vi isso nos Estados Unidos, porque expõe pessoas que são
investigadas e não condenadas. Só que isso era feito recorrentemente e nunca
ninguém falou nada. Depois das mensagens entre os procuradores do site
e Intercept, podemos olhar de outra maneira.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O mecanismo está se ajustando', diz José Padilha

O que a Lava-Jato mostrou é mentira? Não, é verdade. A Odebrecht, a


Petrobras, a Andrade Gutierrez, a OAS faziam parte de um enorme sistema
de corrupção.

Então, na última eleição, a população viu aquilo e o fez o PT e o PSDB


tomarem uma lavada. E decidiram votar em quem? Em um cara que luta
contra a bandidagem. Que bandidagem? O conceito largo de bandidagem,
que joga no mesmo saco o político corrupto e o traficante.

Esse conceito “contra a bandidagem” elegeu o Bolsonaro?

“O cara que tem o discurso fácil da violência, da milícia, do antitudo virou


a solução. Votou-se em um cara que luta contra a bandidagem, no
conceito que joga no mesmo saco o político corrupto e o traficante”

O cara que tem o discurso fácil da violência urbana, da milícia, do anti-


tudo, a favor de criar um excludente, apesar de a polícia matar  pessoas
todo ano oficialmente no Rio de Janeiro, para dificultar a punição. Aí, esse
cara vira a solução a nível federal, porque o conceito de bandidagem é um
conceito amplo, que não vem do Tropa de Elite e não vem do Mecanismo.
Ele vem da realidade. Existe a violência urbana e existe a corrupção na
política.

O senhor se desapontou com o ministro Sergio Moro?

O Bolsonaro nunca foi apto a ser presidente da república. Não satisfazia


condições morais, éticas mínimas, para ser presidente da República. Ele foi
para a televisão no voto do impeachment da Dilma e elogiou um torturador.
Não é aceitável. Não cabe na civilização.

Se você olhar para o histórico do Bolsonaro, tem a relação do Flávio


condecorando milicianos. É aceitável isso? Evidente que não é aceitável. Isso
nada tem a ver com a Lava-Jato. O cara é desqualificado, porque ele é, se
não existisse Lava-Jato, ele ia continuar sendo desqualificado.

Aí, um juiz que julga um caso fundamental para o processo eleitoral


brasileiro, condena o ex-presidente Lula na primeira instância. Ele não pode
aceitar um cargo no governo de seja quem for que é eleito nas eleições que o
Lula não pode participar. Não pode e ponto.

Então por que ele cometeu esse desatino ? Eu conversei com ele sobre isso.
Ele falou que nas operações Mãos Limpas, na Itália, houve um retrocesso,
um retorno à impunidade, e que estando no governo, ele estaria na posição
de tentar impedir isso. Essa seria a visão benéfica desse erro. Continua sendo
erro na minha opinião

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O mecanismo está se ajustando', diz José Padilha

Quando fez Mecanismo, a esquerda reagiu com ódio. Agora, prepara um


documentário sobre os vazamentos do e Intercept , fatalmente, será
atacado pela direita. Esse Fla x Flu paralisa o país?

Ele paralisa o pensamento. Por isso eu acho que ideologia é muito ruim para
o pensamento. É como se eu botasse – eu sou de esquerda – eu boto um
óculos vermelho. Eu sou de direita, eu boto um óculos azul. A esquerda acha
que a Lava-Jato foi errada, mas não teve corrupção. A direita acha que a
Lava-Jato foi certa e teve corrupção.

Agora, não há outra alternativa ao Brasil a não ser lidar com a Lava-Jato. A
operação tem um valor heurístico. Quando o Barusco é preso e devolve US
 milhões, quando acham R  milhões na casa do Geddel, quando é
revelada a planilha da Odebrecht, a delação do Palocci... A Lava-Jato revela
uma enorme corrupção sistêmica do Brasil. Essa corrupção atinge o PT
violentamente, atinge o PMDB violentamente e atinge o PSDB, vide o
Paulo Preto. O Brasil tem que lidar com a corrupção sistêmica.

Mas, quando você vê a forma pela qual a Lava-Jato foi conduzida nos
tribunais e na mídia...

Para o meu horror, eu acho que se os processos contra o Sergio Cabral foram
viciados, o Sergio Cabral deve estar livre. Tem que lidar com esse fato. A
despeito da corrupção sistêmica, o processo de investigação que chegou mais
fundo, que teve a oportunidade de punir pessoas foi levado a cabo de
maneira democrática dentro das regras do jogo como manda a lei brasileira?
Essa é outra questão. É possível ao mesmo tempo achar que existe uma
corrupção sistêmica e que o processo pode ter sido julgado e avaliado de
maneira arbitrária. Não há uma contradição entre as duas coisas.

A revisão dos julgamentos não pode gerar uma frustração, como na Itália
com a Mãos Limpas

Mas a Lava-Jato já deu em muita coisa, revelou o mecanismo. Mas o Brasil


tem que lidar com a corrupção e o sistema político organizado a partir da
corrupção que a Lava-Jato revelou de uma forma que não tinha sido
revelado antes, e com os desmandos jurídicos e com a relação entre a
imprensa e a mídia, que causaram prejuízo às defesas, botaram o Supremo
Tribunal Federal e o STJ sob pressão e podem ter deturpado vários
julgamentos.

Precisamos lidar com a Lava-Jato como um todo: o sistema político


corrupto, corrompido, e o sistema judicial também corrompido. E as duas
coisas podem ser verdade ao mesmo tempo.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O mecanismo está se ajustando', diz José Padilha

Qual a diferença de fazer Robocop para MGM e Narcos e Mecanismo para a


Netflix?

Um filme de estúdio tem sua receita na bilheteria, então a pressão e a


interferência é maior. Uma empresa de streaming, como a Netflix, pode
lançar vinte títulos num ano e dentre esses arriscar dois ou três que talvez
não façam sucesso. A pressão é menor

Para onde vai o audiovisual?

A primeira coisa que vai acontecer é que o formato vai acabar. Na TV a


cabo, o programa vai ter  minutos,  minutos, vai ter comercial, TV
aberta também, e um filme vai ter cerca de duas horas, e esse é o formato.
No streaming, eu não preciso fazer em duas horas. Eu posso fazer uma
história de  minutos ou em quatro horas. O consumidor é que decide se
quer assistir oito capítulos de uma vez ou em vários dias. E agora serão várias
competidoras, além da Netflix.

A escolha vai ser muito mais do público do que da companhia que


disponibiliza o produto, porque é o consumidor que vai escolher se quer
assistir na TV ou na tele do celular. Isso vai criar consumidores mais
exigentes.

Padilha na última década

Recorde

Lança Tropa de Elite : O Inimigo Agora é Outro. O filme teve o maior


público da história do cinema brasileiro — mais de  milhões de
espectadores.

Internacional

Dirige Robocop, remake do filme homônimo de  e Rio, Eu Te Amo,


terceiro filme da franquia Cities of Love

Plata o plomo

Dirige a série Narcos, Aum dos grandes investimentos da Netflix, com


Wagner Moura no papel do colombiano Pablo Escobar

Ficção e realidade

Dirige e atua como produtor executivo da série O Mecanismo sobre a Lava-


Jato. A série gerou polêmica e recebeu diversas críticas, principalmente da
esquerda

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O mecanismo está se ajustando', diz José Padilha

Ação

Dirige o filme  Days in Entebbe, co-produção dos EUA e Inglaterra, que


reproduz o sequestro de um voo da Air France em 

Sucesso

Estreia “Narcos: México", quarta temporada de Narcos que virou um


seriado paralelo

Lava-Jato no alvo

Começa as entrevistas para documentário sobre os vazamentos do site e


Intercept sobre a Operação Lava Jato.

Futuro

Prepara terceira temporada de Mecanismo, quinta de Narcos, dirige filme


sobre Rickson Gracie e documentário sobre gangues em prisões americanas

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O futebol para frente do Jesus vai mexer com o jeito da seleção jogar', diz Casagrande

O GLOBO › Annotations

Década de rupturas: 'O futebol para


frente do Jesus vai mexer com o jeito
da seleção jogar', diz Casagrande
DECEMBER ,

O comentarista Walter Casagrande diz que a seleção brasileira vai mudar após Jesus no Flamengo Foto:
Renee Rocha / Agência O Globo

RIO — Centroavante nos anos  e comentarista da TV Globo, Walter


Casagrande diz que o pior efeito da derrota em  foi reforçar esquemas
defensivos, mas que isso mudou agora com técnicos como Jorge Jesus e
Renato. “Depois de ver o Flamengo, nenhum torcedor tem mais paciência
para ver o seu time se defender. O time que jogar fechadinho, cujo único
objetivo é não cair, corre o risco de diminuir de tamanho”, prevê. Em
conversa nos estúdios da TV Globo antes de uma gravação, Casagrande
falou de Neymar, a ausência de jogadores que falem além de futebol e de sua
luta contra as drogas.

O que o futebol brasileiro deveria ter aprendido com o x da Copa de


?
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12/01/2021 Década de rupturas: 'O futebol para frente do Jesus vai mexer com o jeito da seleção jogar', diz Casagrande

Não é questão de aprender, é não assumir o medo. É uma coisa psicológica.


Você tem duas saídas quando está com medo: ou fica fechadinho ou sai para
o confronto e tenta enfrentar aquele medo. O futebol brasileiro escolheu se
encolher, não combater esse medo, jogar fechadinho. Só agora o pessoal está
perdendo o medo, com o Renato Gaúcho, o Jorge Jesus, o iago Nunes e
Jorge Sampaoli. Estamos perdendo o medo.

Qual a última vez que assistiu a uma seleção brasileira com prazer?

A última geração com jogadores geniais foi a de , com Ronaldo,


Rivaldo, Roberto Carlos, Ronaldinho Gaúcho, Cafu. De  pra cá, o
futebol brasileiro ficou retraído.

Sinal de falta de craques ou de técnicos?

Tenho até dúvida se a gente tinha uma geração ruim mesmo ou se os


treinadores começavam a intimidar os jogadores. Dos anos  para trás, os
treinadores brasileiros deixavam os jogadores jogar, livres para tentar um
drible diferente, para ter uma iniciativa diferente. E aí os treinadores foram
tirando, tirando, tirando isso do jogador. Eles formaram uma geração com
excessiva disciplina tática – “vamos fechar, vamos marcar, todo mundo
acompanha” – enquanto na Europa, muito por influência do Guardiola, se
passou a jogar como os sul-americanos.

Há quase dez anos o Brasil tem um único craque, o Neymar. Qual é o risco
da Neymardependência?

Deveria ser superpositivo ter um jogador acima da média como o Neymar,


mas os outros jogadores têm que jogar o futebol deles. Só que eles pegam a
bola e jogam para o Neymar sem nem pensar. Se cada um fizesse o seu
melhor, quando passassem a bola para o Neymar era para decidir o jogo.
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12/01/2021 Década de rupturas: 'O futebol para frente do Jesus vai mexer com o jeito da seleção jogar', diz Casagrande

Sem o Neymar. o Brasil ganhou a Copa América em julho.

O Brasil ganhou jogando muito bem. E talvez os jogadores tenham


percebido que o Neymar é muito importante, mas não é a solução única.
Depende do Tite deixar os caras jogarem e depende também de o Neymar
ter foco na vida, né? Ele perdeu o bonde andando, mas o bonde ainda
continua passando perto dele, porque é um grande jogador. Ele deveria estar
disputando Bola de Ouro com Cristiano Ronaldo e com Messi.

O que falta ao Neymar?

Foco na vida, não é foco na bola. Foco na vida. Ele se perdeu, cara, se
perdeu. Não teve alguém para falar ‘Neymar, não está dando certo o que
você está fazendo, não está dando certo o que você está falando. Não está
dando certo seu comportamento’. Aquele negócio de cair e ficar rolando na
Copa do Mundo virou uma chacota mundial! E o pior: era a camisa  que
estava rolando. Meu, o Pelé levou a camisa  lá em cima, é a camisa mais
respeitada e adorada no mundo todo. Você não pode desrespeitar essa
camisa! Falta a ele saber bem a importância da camisa que está vestindo,
saber a importância do futebol brasileiro, procurar estudar um pouquinho os
grandes jogadores do passado para ver o comportamento deles, para ver
como eles se relacionavam com a torcida.

As coisas mudam para a Copa de ?

Sou otimista, porque o Flamengo está jogando um futebol maravilhoso,


coisa que a gente não via há muito tempo. O Flamengo de hoje está num
grupo de Flamengo de , da Democracia do Corinthians, da Academia do
Palmeiras. O futebol como implantado pelo Jesus, Renato, Sampaoli e

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O futebol para frente do Jesus vai mexer com o jeito da seleção jogar', diz Casagrande

iago Nunes vai mexer com o Tite. Não cabe mais no futebol brasileiro
esse negócio de ficar se defendendo para tentar ganhar no chuveirinho.

Você citou o Jesus e o Sampoli, dois técnicos estrangeiros. Os brasileiros


estão ultrapassados?

Não, o Mano Menezes, o Tite são grandes treinadores. Agora, eles têm que
clarear a mente. Depois que ver o Flamengo jogar, nenhum torcedor tem
mais paciência para ver o seu time se defender. Essa cobrança vai forçar uma
reciclada. Ficar ganhando atacando não tem prazo de validade. Você pode
perder, mas volta a ganhar.

Quando se vê a superioridade do Flamengo, não cria um risco da


espanholização do futebol brasileiro, de ficar quatro, cinco times totalmente
acima dos outros?

Se os times não se mexerem, sim. O time que jogar fechadinho, cujo único
objetivo é não cair, corre o risco de diminuir de tamanho. Porque a torcida
não tem mais paciência de torcendo para empatar, perder de pouco.
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Odebrecht, Lemann, Villas…

00:00 20:38

Mas é um futebol que ainda perde seus futuros craques aos  anos para o
exterior. Existem casos como o Vinícius Júnior e o Rodrygo que foram para
o Real Madrid, mas a maioria vai para a Ucrânia, Rússia, China...

Daí é grana. O moleque olha e não vê expectativa nenhuma. Ele quer ir para
fora. A Ucrânia é uma porta de entrada para Barcelona, Real, Bayer. Mas
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12/01/2021 Década de rupturas: 'O futebol para frente do Jesus vai mexer com o jeito da seleção jogar', diz Casagrande

tem uma coisa: veja o caso do Gerson, que fez o giro ao contrário. Ele saiu
do Fluminense com ,  anos, foi para Roma, terminou emprestado para
a Fiorentina e apostou em jogar no Flamengo. Porque ele tranquilamente
poderia jogar num time médio da Alemanha. Mas pensou grande. Ele topou
a proposta, não financeira, a proposta do jogo. Hoje, esquece Roma e
Fiorentina. Se o Gerson voltar para a Europa é para Real Madri, Juventus. O
Gerson representa uma mudança. Acho que essa volta do Gerson pode ser
uma chacoalhada na cabeça da garotada.

Ídolos de futebol hoje são celebridades. Como isso muda a relação do


jogador com a torcida, com o clube?

O sujeito precisa saber que não foi para o Real Madri porque faz a barba
legal. Ele faz a propaganda de aparelho de barba, porque joga no Real
Madri. Isso criou uma confusão na cabeça dos jogadores. Parece que eles
pensam assim, ‘eu sou tão celebridade quanto eu sou jogador’. Só que o
segredo do negócio é a bola, e eles estão deixando meio que a bola de lado.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O futebol para frente do Jesus vai mexer com o jeito da seleção jogar', diz Casagrande

O comentarista Walter Casagrande é um dos entrevistados da série do GLOBO "Década de rupturas'


Foto: Renee Rocha / Agência O Globo

É uma vida dentro da bolha?

São aqueles fones de ouvido! Antes, quando eu via os jogadores descendo do


ônibus todos com fones, pensava que eles não queriam conversa. Não! Eles
colocam o fone de ouvido para ficar no mundo deles. Porque se tira o fone
de ouvido, ele vai ouvir coisas que não está a fim de ouvir. Ele só está a fim
de ouvir “você joga pra caramba”, “tem uma festa depois do jogo”. Eles
esqueceram que existe um mundo real, que tem mancha nas praias do
Nordeste, que a crise econômica no Brasil é grande, que a violência é muito
grande. Para eles, parece que o mundo fica muito pesado se tirarem os fones
do ouvido.

É correto cobrar um posicionamento dos jogadores de futebol?

Mas eu não estou cobrando de ninguém, cada um faz o que acha. Eu acho
que é um erro um jogador de futebol que tem essa visibilidade, que tem o
poder na voz muito forte, não falar nada. Isso me incomoda, mas é um
incomodo meu.

Por terem tão poucos que falam é que a entrevista sobre racismo do técnico
Roger Machado chamou tanta atenção?

Claro, ninguém fala nada, ninguém se expõe. Deixe dar o exemplo da


Democracia Corintiana, um grupo de jogadores de futebol igual a esses. Nós
podíamos também ficar lá confortáveis e jogar nossa bola e ganhar
campeonato e deixar o Brasil correr, mas nós não pensávamos assim.

Qual a herança da Democracia Corintiana?

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O futebol para frente do Jesus vai mexer com o jeito da seleção jogar', diz Casagrande

Politicamente foi importante, porque a participação de um jogador de


futebol de um clube como o Corinthians trouxe atenção ao movimento das
Diretas Já. Mas internamente não era nada demais. Íamos concentrar antes
da partida: ‘E se os solteiros concentrassem só à noite e os casados ficassem
em casa com a família?’. Vamos viajar, mas ao invés de sábado de manhã,
vamos à tarde para o jogador ter mais tempo com a família. O time decide
contratar um jogador. Eu acho justo você conversar com o elenco e
perguntar para o elenco se o novato encaixa no grupo. Isso aí deveria ser
uma coisa normal, não deveria ser um absurdo.

Por que movimentos de jogadores como Bom Senso Futebol Clube não
deram certo?

Quando surgiu a Democracia Corintiana, os jogadores dos outros clubes


ficavam espantados. “E se romper o contrato deles? E se forem suspensos?”.
Com o Bom Senso, foram os mesmos medos. E esses jogadores estão errados
de terem medo? Não estão errados.

A CBF teve três presidentes em sete anos. Dois deles presos e um que não
pode sair do país. Não seria um motivo para os jogadores de futebol falarem?

Claro, mas daí o cara tem medo de ser boicotado. Falar exige coragem. Veja
o caso da americana Megan Anna Rapinoe, que se recusou a ir à Casa
Branca cumprimentar o Trump. Aí, eu penso: os jogadores de futebol no
Brasil têm os mesmos princípios: não vou me envolver e não quero saber o
que está acontecendo no meu país.

Você fala de exemplo. Ao final da Copa de , ao vivo na TV Globo, você


desabafou que aquela era a Copa mais importante da sua vida, porque pela

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O futebol para frente do Jesus vai mexer com o jeito da seleção jogar', diz Casagrande

primeira vez você saiu do Brasil sóbrio, permaneceu sóbrio e voltou para a
casa sóbrio.

Na hora, fiquei emocionado. Foi muito difícil alcançar aquilo. Eu não tinha
referência quando usava drogas. Fui me tratar, porque a minha família me
colocou numa clínica, porque se não me tratasse ia morrer. E depois que fiz
esse tratamento, que continua há dez anos, escrevi um livro (“Casagrande e
seus Demônios”). Não acho correto estar fazendo o meu tratamento e indo
bem sem que pudesse alertar aqueles que são dependentes como eu e que
ficam com medo de se tratar. Eu quero mostrar às pessoas que o tratamento
existe e tem uma luz no fim do túnel. Ela é longe para caraca! São dez anos
de tratamento e eu fico alerta o tempo todo.

Como é viver alerta?

Encontrei um ponto importante na vida de um dependente químico que é o


meu limite. Eu não posso cobrar de você que você mude o seu
comportamento porque eu sou dependente. Isso me confundia muito no
início da ressocialização. Eu pensava “poxa, quando eu sair com as pessoas,
as pessoas não podem beber, elas têm que me respeitar”. E depois eu
descobri que quem tem que respeitar elas sou eu.

Ser um exemplo para dependentes químicos é um peso?

Não sou o Superman, sou igual a todo dependente químico, só que


encontrei meu caminho. Sabe uma coisa que me mudou? Fiz um tratamento
em que a base é a verdade. Eu não minto, você pode discordar do que estou
dizendo, mas é sincero, é a minha verdade. Porque se eu falar uma mentira
para você, a minha cabeça vai pensar ‘ah já falei uma mentira aqui, posso
falar uma outra ali, uma outra ali’. E a mentira maior que eu posso falar é

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O futebol para frente do Jesus vai mexer com o jeito da seleção jogar', diz Casagrande

que vou ao cinema e vou comprar droga. Então falo a verdade sempre,
mesmo que a verdade seja ruim pra mim.

Casagrande na última década

Biografia

Lança o livro “Casagrande e seus demônios”, com o jornalista Gilvan


Ribeiro. Na obra, aborda em detalhes sua luta contra a dependência
química.

Cirurgias

Em maio, sofre infarto e passa cinco dias internado. É submetido a cirurgias


de cateterismo e angioplastia e chega a ficar na terapia intensiva.

Sócrates

Em nova parceria com Ribeiro, lança o livro “Sócrates & Casagrande, uma
história de amor”, em que evoca memórias da amizade com o também
craque do Corinthians.

“Copa sóbrio”

Participa das transmissões da Copa da Rússia, a primeira após tratar sua


dependência química. Emocionado, faz desabafo na final do Mundial, em
suas palavras, o “mais importante” da sua vida.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O medo não paralisa. Dá potência', diz Taís Araújo

O GLOBO › Annotations

Década de rupturas: 'O medo não


paralisa. Dá potência', diz Taís Araújo
DECEMBER ,

'Estou construindo a minha identidade negra', diz a atriz Taís Araújo Foto: Fernando Lemos / Agência O
Globo

RIO — Nascida no Méier, criada na Barra, filha de um economista e uma


pedagoga, a atriz Taís Araújo se define no meio de um processo de
descobrimento e afirmação de sua identidade negra. Dos primeiros cabelos
crespos em novela das h à personagem Michele Brau, Taís se diz um
veículo para interpretar personagens sob a ótica negra. “Quero pegar essas
histórias que me foram negadas a vida inteira, desmerecida a vida inteira e as
transformar numa coisa boa”, diz.

A primeira pergunta de quase toda entrevista sua começa com “você foi a
primeira atriz negra a.., a primeira modelo negra a... ”. Qual é o peso de ser
a primeira?

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O medo não paralisa. Dá potência', diz Taís Araújo

Durante muito tempo não queria tocar nesse assunto. Mas com a
maturidade entendi que isso tem importância. Qual era a referência negra
que tive na minha infância e adolescência? Nenhuma. Tenho essa lacuna na
construção da minha identidade, porque não via ninguém com as minhas
características ocupando vários lugares. Talvez esteja me tornando essa
pessoa que abre caminho para outras.

Você se sente um exemplo ou ainda a grande exceção?

As duas coisas. Tem a questão das meninas olharem para mim e se sentirem
possíveis, mas a minha história pessoal é de exceção. Meu pai é economista,
minha mãe é pedagoga. São os únicos da família da faixa etária deles que
tem curso superior. Isso foi um diferencial gigantesco na minha família. A
educação dos meus pais é que fez a transformação. A minha irmã é médica,
eu sonhava em ser diplomata e sou atriz. Quando olho as mulheres parecidas
comigo, a maioria esmagadora não teve as possibilidades que eu tive. E
minha irmã é uma completa exceção na área dela.

Na linha da primeira atriz negra, você foi quem colocou os cabelos crespos
na novela das nove. A transição capilar virou um símbolo de afirmação?

A minha mãe passou henê no cabelo da minha irmã quando ela tinha 
anos. Ela só soube como era o cabelo dela de verdade aos ! Como meu
cabelo era menos crespo, passei depois pela fase do alisante e só comecei a
transição capilar por acidente. Eu usava um aplique em uma novela, caiu
uma mecha, fiquei com medo e me assumi.

Mas hoje entendo que assumir o cabelo do jeito que ele é, apropriar-se das
suas origens, é honrar sua ancestralidade. Porque a história do Brasil é o
tempo todo a negação de ser brasileiro. Desde os povos indígenas, até as

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O medo não paralisa. Dá potência', diz Taís Araújo

pessoas que foram sequestradas no continente africano e trazidas para serem


escravizadas, a história é negar, negar, negar as nossas origens o tempo
inteiro.

O cabelo alisado era uma negação?

Toda questão é pertencimento. As pessoas querem pertencer. Até muito


tempo atrás — ainda hoje só que com uma tomada de consciência maior —
só poderia pertencer quem tivesse traços europeus. Num país tão misturado
como o nosso, se você tem um nariz mais próximo das pessoas do
continente europeu, se tem uma boca fina ainda assim te olham. Mas se você
tem um cabelo liso, você passa, amor. Quanto mais liso seu cabelo, mais
perto do ideal branco você está. O cabelo é uma forma de diferenciar. Passou
nessa fileira. Ufa, passei, agora vou pra uma outra, vou ver qual a próxima
página.

Não ceder a essa pressão é uma conquista. Entender esse nariz, esse cabelo,
essa cor, essa origem. Porque são anos negando as origens, uma vida inteira
desqualificando o negro, dizendo que é ruim, feio, que o legal é ser branco.
E você nunca vai ser branca.

Como foi esse seu processo?

Estou num processo de construção da minha identidade negra, porque a


minha identidade real me foi negada muitos anos. Essa construção inclui me
aceitar como eu sou, honrar quem veio antes de mim, tentar preencher essa
lacuna lendo pensadores negros. Entender o que eles passaram. É tijolinho,
por tijolinho. Todo livro que sai escrito por um negro ou por uma mulher
negra, eu leio, coloco mais um tijolinho.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O medo não paralisa. Dá potência', diz Taís Araújo

Quando olha para mim, imediatamente, a pessoa olha para minha cor e
imagina que tive uma infância paupérrima e que batalhei muito e que
arrastei muita corrente para estar aqui. Porque se não tiver esse background,
não sou merecedora. Aí você é metida.

A atriz Taís Araújo é um dos entrevistados da série Década de rupturas Foto: Fernando Lemos / Agência
O Globo

Uma vez, ouvi uma pessoa que trabalhou comigo “nossa, não conheço
nenhum negro bem-sucedido que não seja pretencioso”. E eu, “vem cá,
Tostines vende mais porque é fresquinho ou é fresquinho por que vende
mais? Ou é você que não está acostumada a ver negros em posições em que
são de embate, de igual para igual, só em posição de subserviência e, quando
vê, acha que é prepotência?”. A pessoa não me respondeu até hoje.

Nasci no Méier e cresci na Barra em um ambiente absolutamente branco e


rico. E eu não era nem uma coisa, nem outra. Meu pai era economista de
uma dessas construtoras e pagava muito mal a minha escola, mas meus

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O medo não paralisa. Dá potência', diz Taís Araújo

amigos tinham motorista, aviões, iates, casas em Angra. Era um mundo de


não pertencimento o tempo inteiro.

Essa construção de identidade mudou a sua carreira?

A Helena (personagem que interpretou em Viver a Vida, em ) foi


importante. Quando o (autor da novela) Manoel Carlos falou “a questão
não é ser negra, a questão é ser mais jovem”, eu ingenuamente acreditei. E
hoje vejo que não tem como você não falar sobre o seu histórico. Era a
chance de olhar para história com maturidade e entender como é que aquela
Helena, uma mulher negra, modelo internacional, rica, chegou naquele
lugar.

Porque, se a personagem fosse branca, você não teria que explicar

Sim, como é que a maioria da população vai se identificar com uma história
que não é possível para ela? Uma história que não conhece, não é a dele, do
vizinho dele, do primo dele. Depois da novela é que entendi que precisava
me reinventar enquanto artista. Entendi que o que eu tinha feito até ali
havia caducado.

Como foi essa reinvenção como atriz?

Assim como a Alice no País das Maravilhas, eu tinha que diminuir para
poder crescer. Eu tinha de recuar e me entender e arriscar. Montei uma peça
chamada “Amores Perdas e meus Vestidos” do Jô Bilac. E eu me perguntava
“o que que tenho de diferente dessas pessoas do elenco? ” Era um elenco
todo branco. “Eu sou negra e isso é um ganho nas minhas personagens. Vou
trazer para o palco a minha história, e também a da minha mãe, da minha
tia, da minha avó, da minha vizinha, a história dessas mulheres que nunca
foram contadas”. Foi então que comecei a ler autoras negras, para pegar essas
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12/01/2021 Década de rupturas: 'O medo não paralisa. Dá potência', diz Taís Araújo

histórias que me foram negadas a vida inteira, desmerecidas a vida inteira e


as transformar numa coisa boa.

Primeiro entendendo que essa história me foi contada de maneira distorcida.


Depois fazer um trabalho quase espiritual de pedir desculpas por não ter
entendido que tudo o que essas mulheres passaram não foi passividade, foi
resistência. E finalmente me deixando ser o veículo dessas histórias, que são
quase todas inéditas na dramaturgia. Por isso insisto tanto em ter autores
negros, atores negros, diretores negros, porque essas pessoas estão carregadas
de histórias vistas por um ponto de vista que não foi contado ainda. Esse
processo é o da construção da minha identidade.

A série Mister Brau (protagonizada por Taís e Lázaro Ramos) tem uma
evolução nítida sobre a presença negra na TV a partir da segunda temporada

O público quer se ver na TV. Eu e o Lázaro fomos o veículo, mas a gente foi
abrindo espaço para tornar a série mais brasileira. Todo mundo tinha voz nas
decisões. Vou contar uma história: um dia, um diretor de arte colocou um
prato pesado numa cena que parecia uma quentinha. Falei, “ah, esse prato
não é legal”. “Mas como, tem formato de quentinha e eles (os personagens
principais) vieram de Madureira?”, ele respondeu. Daí, eu levantei: “você
acha que o povo gosta de comer quentinha? Você acha mesmo que a pessoa
gosta de sair de Japeri, cinco horas da manhã, no trem, atravessar a cidade
inteira, trabalhar debaixo de sol, e correr o risco de meio-dia a quentinha
dele estar azeda? Comer quentinha é legal na Zona Sul, com salada de
quinoa”. Isso era a minha Michele Brau, uma personagem que andou muito
de metrô, mas não quer revisitar o pior da minha origem. Quer visitar o
melhor da sua origem, feliz com as suas qualidades, não querendo ser o que
o outro é.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O medo não paralisa. Dá potência', diz Taís Araújo

A sua última peça, Topo da Montanha, reconta a última noite do líder


americano Martin Luther King, debate o racismo americano de  anos
atrás. Qual a diferença com o racismo brasileiro de hoje?

Tem tanta coisa mais parecida do que diferente, né. Mas a peça não é só
sobre a questão racial. Ela reforça as nossas escolhas enquanto artistas (dela e
de Lázaro Ramos). Eu sou a favor do afeto, porque não acredito no discurso
violento. Então, manter essa peça, tem uma coisa que alimenta as minhas
escolhas. E a temporada foi toda lotada, porque tem muita gente querendo
discutir o tema, uma tomada de consciência bonita. É um processo que o
Brasil ainda não chegou, de maturidade. De olhar pra sua história de
maneira madura e crítica. Tirar aquela coisa de brasileiro cordial. Parar de
tratar o Brasil-colônia com glamour, sabe?

Qual foi o efeito da morte da vereadora Marielle Franco?

Medo, porque mostra a nossa vulnerabilidade de mulher negra. Mas este é


um medo que não paralisa, é um medo que dá potência para continuar
cobrando justiça.

Como lidar com o ódio na internet?

Quando aconteceu o caso das ofensas racistas no Facebook (em ), eu vi


como as pessoas não-negras da minha equipe ficaram arrasadas, com
vergonha. E eu respondia, “gente, essa é minha vida desde o dia em que eu
nasci”. Os ataques que sofri não dizem respeito a mim. Dizem respeito às
pessoas que atacaram, às origens delas, sobre os medos de perder seus
privilégios.

No outro ataque era sobre uma palestra na qual você falava do risco de
qualquer garoto negro no Rio
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12/01/2021 Década de rupturas: 'O medo não paralisa. Dá potência', diz Taís Araújo

Os meus filhos são absolutamente privilegiados. A gente mora na Zona Sul


do Rio de Janeiro, e eles estão “protegidos” enquanto estiverem dentro do
carro blindado. Agora, quando ele estiver na rua, é um menino igual a
qualquer menino que está sem camisa na rua vendendo bala no sinal. A vida
de um menino negro vale pouco.

Qual o próximo passo da sua construção de identidade?

Peguei a gestão de  da minha carreira tanto artística, quanto comercial.


Eu vou ler contrato, vou lidar com dinheiro. Porque eu construí essa carreira
durante vinte e quatro anos. Eu também sou uma marca – e vou decidir
quem eu quero associar à minha marca. Os bancos, por exemplo, têm
muitos projetos ligados à mulheres empreendedoras. Eu quero dizer isso
simplesmente, eu quero conhecer essas mulheres, contar as histórias delas.
Vai dar muito trabalho, mas também muito prazer.

Taís Araújo na última década

Versátil

Protagoniza a novela “Cheias de Charme” na qual atua também, pela


primeira vez, como cantora.

Internacional

Protagoniza, com Lázaro Ramos, a série “Mister Brau”. O jornal inglês


“Guardian” compara Lázaro e Taís ao casal Jay Z e Beyoncé.

Ataque

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O medo não paralisa. Dá potência', diz Taís Araújo

Sofre ataques racistas no Facebook. A hashtag em apoio à atriz,


SomostodosTaisAraujo, chega a ser trending topic no Twitter.

Reconhecimento

É eleita uma das  personalidades afrodescendentes mais influentes do


mundo, abaixo dos  anos, pela organização Mipad.

Música

Assume o comando da apresentação do reality show “Popstar”, principal


programa musical da TV Globo.

Nas telas

Protagoniza a série Aruanas (Globoplay). Está no ar como uma das


protagonistas da novela “Amor de Mãe” e do programa “Popstar”.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Judiciário está intimidado por um discurso de ódio', diz Cezar Peluso

O GLOBO › Annotations

Década de rupturas: 'O Judiciário está


intimidado por um discurso de ódio',
diz Cezar Peluso
DECEMBER ,

'O Judiciário está intimidado por um discurso de ódio', diz Cezar Peluso Foto: Jorge William / Agência O
Globo

RIO — Presidente do Supremo Tribunal Federal durante o histórico


julgamento do Mensalão, Cezar Peluso acredita que parte da sociedade busca
um punitivismo contra os acusados de corrupção. “Ao juiz não cabe a missão
messiânica de mudar a cultura da sociedade mediante condenações para não
permitir uma suposta impunidade. Ao juiz cabe julgar”, afirma. Segundo ele,
o uso judicial dos diálogos obtidos ilegalmente das conversas entre os
procuradores da Lava-Jato será decido no STF.

Por que hoje em dia é mais fácil para um brasileiro médio saber os nomes
dos onze ministros do Supremo Tribunal Federal do que dos titulares da
seleção brasileira?

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Judiciário está intimidado por um discurso de ódio', diz Cezar Peluso

Começou com a transmissão das sessões de julgamentos do STF pela TV


Justiça. Embora se trate de um fato irreversível — ninguém conseguiria
evitar que a TV transmita as sessões, pois haveria acusações de falta de
transparência —, é da natureza humana ter comportamento diferente
perante as câmaras. Onde a televisão foca os juízes decidindo, os juízes
deixam, de certo modo, de ser juízes, e passam a agir como atores. Duvido
que discussão sobre qualquer dos assuntos objeto das decisões do Supremo
provocaria os mesmos excessos verbais se fosse travada em ambiente
reservado.

Na sua experiência, algum ministro teve o seu voto influenciado por estar
exposto às câmaras?

Não sou capaz de fazer avaliação de caráter subjetivo a respeito, mas há o


risco, e isso já basta. E não se restringe aos ministros do Supremo, mas
alcança os juízes em geral, porque está dentro do quadro de intimidação que
os juízes vêm sofrendo. É subproduto desse ambiente de ódio, em que as
pessoas já não suportam a diversidade de pontos de vista. Os juízes estão
sendo objeto dessa pressão.

O senhor enxerga uma intimidação ao Judiciário?

Sem dúvida. O Judiciário se defronta com intimidação exercida, dentre


outros meios, pelos canais da internet, que expressam aspirações imediatistas
das multidões. Por exemplo, é fato conhecido que certo juiz, ao conceder
habeas corpus de procedência claríssima, que não podia ser negado, relativo
à Lava-Jato, concedeu o habeas, mas fez uma advertência: “olha, estou
concedendo o habeas corpus, mas não sou contra a Lava-Jato”. Ou seja, há
preocupação de salvaguardar a imagem própria diante dessa pressão.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Judiciário está intimidado por um discurso de ódio', diz Cezar Peluso

Mas a sociedade não tem direito de fiscalizar o Judiciário?

Sim, lógico, mas o problema é a cultura de punitivismo, inspirada no caldo


dessa revolta justa contra a corrupção, mas também incentivado por setores
da imprensa. É uma fase de ódio absurdo na sociedade brasileira, sobretudo
dirigida contra o STF, mas também contra todo o Judiciário. Alguns
ministros do STF, em certas circunstancias, não podem sair à rua.

A origem dessa atenção toda ao STF está no julgamento do Mensalão, em


. Qual o saldo do julgamento?

O processo e o julgamento da Ação Penal  (Mensalão) foram admiráveis.


Tínhamos no relator, ministro Joaquim Barbosa, um juiz muito rigoroso,
mas em nenhum passo do processo o STF foi leniente com a legalidade.
Teoricamente admitimos que algumas teses que o Supremo adotou podem
ser discutíveis, como a questão da ‘teoria do domínio do fato’, mas nada
sobre a irrepreensibilidade do processo e do julgamento dos réus. Aí nasceu
essa expectativa distorcida de que o Judiciário tem que ser sempre punitivo.
Se é divulgado que certas pessoas são culpadas, independentemente do que
se apure no processo segundo as regras legais e garantias constitucionais,
setores da sociedade, inclusive da imprensa, pretendem que esses réus sejam
punidos de qualquer maneira.

Qual efeito da pressão do punitivismo?

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Judiciário está intimidado por um discurso de ódio', diz Cezar Peluso

“Alguns (juízes) têm mais vocação de políticos do que de magistrados, o


que acaba sendo confirmado pelo fato de assumirem novas carreiras”

As pessoas não percebem que juízes não estão aqui para condenar ninguém.
Essa não é a função do Judiciário. A função do Judiciário é julgar,
condenando quando as provas produzidas segundo as regras legais e
constitucionais assim determinem, ou absolvendo, em caso contrário.

E aí entra outro aspecto: alguns juízes, com mais vocação política do que de
magistrado, assumem papel messiânico de responder aos apelos da sociedade
e, nisso, podem transformar o Judiciário em órgão de persecução penal, de
condenação. Nesse caso, corremos riscos de arbitrariedades a título de dar
satisfação à pressão de setores da opinião pública.

O senhor está se referindo à Lava Jato?

Em relação à Lava Jato, reservo-me a não dizer o que penso a respeito das
revelações do site e Intercept (sobre os vazamentos de diálogos dos
promotores obtidos ilegalmente por um hacker). Mas, se, por hipótese, as
revelações forem verdadeiras, a ilicitude na sua aquisição vai provocar uma
discussão que terminará no Supremo Tribunal Federal: embora como prova
ilícita não possam condenar ninguém, podem ser usadas para absolver
alguém? Ou para anular processo? O Supremo tem encontro marcado com
essa questão.

Qual a sua posição?

Diálogos obtidos ilegalmente não podem ser usados para condenar


ninguém, mas seria iniquidade dizer que não se pode usar prova ilícita para

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Judiciário está intimidado por um discurso de ódio', diz Cezar Peluso

absolver um réu que ostensivamente, segundo esses dados, não cometeu o


crime. O Direito não foi feito para isso.

Qual sua avaliação sobre os juízes que entram na política, como o ministro
Sergio Moro, o governador Wilson Witzel, a senadora Selma Arruda?

Alguns juízes têm mais vocação de políticos do que de magistrados, o que


acaba sendo confirmado pelo fato histórico de deixarem a função
jurisdicional para, legitimamente, assumir nova carreira.

Presidente do Supremo Tribunal Federal durante o histórico julgamento do Mensalão, Cezar Peluso é um
dos entrevistados da série Década de rupturas Foto: Jorge William / Agência O Globo

Mas isso pode de algum modo suscitar a suspeita de que alguns juízes
estariam mais propensos a tomar atitudes ditadas menos pela interpretação
da lei do que pelo impulso de exercer, ainda que inconscientemente, a
missão política de fazer revolução cultural ou social. Ao Judiciário não cabe
função primordial de combater a corrupção; isso é do objetivo e da
competência da polícia e do Ministério Público.

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Ao juiz, não cabe a tarefa messiânica de mudar a cultura da sociedade


mediante condenações para não permitir uma suposta impunidade. E acho
que nem toda a sociedade quer juízes-celebridade.

Como assim?

Há setores que querem juízes justiceiros, mas noto uma saudável nostalgia
dos velhos juízes, recatados, circunspectos, dotados de gravidade, com uma
vida pública e privada irrepreensíveis, discretíssimos.

Qual a sua opinião sobre o novo julgamento do STF sobre condenação em


segunda instância?

Fui um dos ministros que levaram à revisão da jurisprudência do Supremo


(em julgamento em ). Muitas pessoas, inclusive alguns juízes, dizem
que a norma constitucional estabelece a presunção de inocência. Não é isso.
Que é que essa regra diz? Diz apenas que, enquanto não haja, por parte do
Judiciário, seja no processo, seja antes do processo, uma sentença transitada
em julgada, isto é, contra a qual não caiba recurso e que reconheça a culpa
do réu, os juízes não podem aplicar a esse réu, nem a investigado, nenhuma
medida restritiva a seu patrimônio jurídico considerado no sentido amplo,
isto é, não apenas à liberdade física, mas também a seu patrimônio material.
Ponto.

Em , o STF mudou essa jurisprudência sem justificativa, salvo a pressão


da sociedade contra suposta impunidade de suspeitos de corrupção. Aí que
houve a revisão. O que aconteceu agora (com o julgamento de novembro)
foi restabelecer o julgamento de .

O que o senhor acha da iniciativa de parte do Congresso que discute hoje


mudar a Constituição para permitir a prisão em segunda instância?
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A meu juízo, a norma constitucional, de garantia individual, não pode ser


modificada de jeito nenhum.

Mas o senhor fez uma PEC sobre o tema.

Sim, mas eu não estava preocupado em prender ninguém, mas em acabar


com a crise sistêmica do Judiciário, da indústria dos recursos, em que
manobras protelatórias retardam o fim dos processos e adiam a execução das
sentenças.

A PEC dos Recursos, que inspirei, alterava o termo do ‘trânsito em julgado’.


Ao invés de ser a última decisão de todos os recursos previstos na
Constituição, fixaria o trânsito em julgado das decisões, sejam civis,
criminais, trabalhistas, em segundo grau.

Pela minha sugestão, os processos terminariam depois do julgamento do juiz


de primeiro grau e do tribunal competente de segundo grau. Os recursos às
cortes superiores não impediriam a execução imediata das decisões dos
tribunais estaduais e regionais. Os recursos e outras vias continuariam
existindo como hoje, em especial o habeas corpus, mas os recursos
extraordinários já não poderiam ser usados para travar a execução das
sentenças. Isso significa, por exemplo, que União, Estados e Municípios
teriam de pagar os precatórios, ao invés de protelar seu pagamento. Acho
que a sociedade não estava preparada para proposta tão ousada.

Nesses dez anos, o Supremo decidiu sobre aborto de fetos anencéfalos,


criminalização da homofobia, cotas nas universidades. O STF está tomando
o lugar do Congresso?

Essa acusação de ativismo do STF, no geral, é exagerada. Há uma dialética


entre Parlamento e Judiciário, em todo lugar. Se decisões judiciais não são
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aceitas pela sociedade, toca ao Parlamento alterar a legislação em que o


Judiciário se baseia. Se o Parlamento não muda essa legislação, se o
Judiciário é chamado a se pronunciar em análise da Constituição, ele terá
que tomar uma atitude, exercendo sua função de zelar pela integridade da
Carta.

Como o senhor avalia as manifestações de rua pedindo o fechamento do


Supremo?

Demonstram que o Supremo é visto como grande artífice da legalidade e


que atrapalha os propósitos de sua quebra. São resultado do clima de
intimidação a que me referi. Todo mundo é contra a corrupção, porque a
corrupção é um mal, é crime, é danosa ao país. E como se combate a
corrupção? Nos limites da lei. O fato de o crime ser de corrupção não
justifica que a lei não seja observada. E é extremo exagero dizer que a
corrupção é o grande mal do país. Somos a segunda ou terceira maior
concentração de renda do mundo, e não raro a multidão sai às ruas para
fazer campanha contra esse estado de coisa, mas alguma vez assistimos a
manifestações públicas que clamem por um pouco mais de justiça social, de
redistribuição de renda? Não. Mas, se é para combater a corrupção, muitos
saem à rua. Por quê? Porque supõem que a corrupção seja a coisa mais
importante. Não acho que seja. E, depois, porque corrupção no Brasil é
endêmica e atávica, cuja cultura só pode ser erradicada pela educação.
Ninguém faz campanha de rua contra sonegação de imposto, faz? Não faz.
O sonegador de imposto não causa dano ao país? Causa e muito, mas isso
não move as pessoas, porque quem sai as ruas às vezes sonega imposto,
corrompe o guardinha da esquina, o policial rodoviário.

A última década de Peluso


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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Judiciário está intimidado por um discurso de ódio', diz Cezar Peluso

Presidente

Assume a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF). No mesmo ano,


o Supremo decide contra a revisão da Lei da Anistia.

Direitos

Em um julgamento marcante, STF reconhece a união estável homoafetiva,


com voto favorável de Peluso.

Eleições

Pela primeira vez, o STF decide pela constitucionalidade da Lei da Ficha


Limpa. Peluso votou contra, e ficou entre os quatro ministros vencidos na
ocasião.

Saída

Preside o início do julgamento do Mensalão. Por limite de idade, se aposenta


durante o processo. Depois, passa a atuar como consultor jurídico.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

O GLOBO › Annotations

Década de rupturas: 'Caminhamos


para a paralisia do governo', afirma
Sérgio Abranches
DECEMBER ,

'Há risco institucional e, até agora, pouca reação articulada a essas ameaças', afirma Sérgio Abranches
Foto: Gabriel de Paiva / Agência O Globo

RIO - Em , quando a Constituição ainda estava sendo debatida no


Congresso, o cientista político Sérgio Abranches, hoje com  anos, cunhou
a expressão “presidencialismo de coalizão” para definir as novas relações entre
o o Executivo e o Legislativo. Sem maioria no Congresso, o presidente seria
forçado a compor seu governo com aliados. Essa relação complexa dominou
a política até Jair Bolsonaro se eleger. “Este presidente se recusou a fazer a
coalizão e se nega a se articular com os partidos. Não há possibilidade de
funcionar”.

Passados seis anos, quais foram os gatilhos das marchas de ?

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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

Primeiro havia uma insatisfação generalizada com a economia, sinais de que


o poder de compra da população estava comprometido. Isso criava uma
insatisfação difusa. O segundo componente foram as redes sociais, a
possibilidade de as pessoas saberem que existem outras tão insatisfeita
quanto elas. Aí, um grupo mais organizado chamou para discutir a questão
das tarifas de ônibus, e o que começou como uma coisa pontual se espalhou
como um protesto generalizado porque havia gente descontente com o
desemprego, outros com a política, outros com a corrupção.

Esses são movimentos de contágios, igual à Primavera Árabe (na África e


Orienta Médio) ou dos Coletes Amarelos (França). É um movimento que
reflui quando vai para a violência, com os Black Blocs, mas deixa nas pessoas
a sensação de “foi legal ter ido para a rua. Pelo menos eles nos ouviram em
algumas coisas”.

A partir de  as ruas foram tomadas pela direita. Por quê?

Depois do lacerdismo (do ex-governador Carlos Lacerda, -) não


apareceu ninguém capaz de legitimar o sentimento de direita. Ele ficou no
armário, enrustido, enquanto PSDB e PT dominavam o debate. Mas
quando os direitistas encontram outros falando sem censura o que eles só
pensavam, passamos a ver a verdadeira cara do espectro ideológico brasileiro.

Por que uma das novidades nas manifestações recentes é a defesa da


intervenção militar?

Não é saudade, é ignorância. Aquela maioria com cartazes dizendo “volta” é


de gente que nunca viveu a repressão, não teve pais perseguidos e mortos.
Nunca me preocupei com a demanda de volta dos militares porque é de

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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

gente que não sabe o que está falando. E os que sabem são uma minoria que
não vão vingar.

O que achou das declarações de Eduardo Bolsonaro e Paulo Guedes sobre


AI-?

As menções ao AI- são feitas como ameaça. Nos dois casos referiam-se aos
protestos do Chile e prometiam o AI- se ocorresse algo assim por aqui. Por
outro lado, mostra que eles têm medo das ruas.

O mais importante são as muitas transgressões à democracia que o governo


vem fazendo ou estimulado seus simpatizantes a fazer, como perseguições
aos que pensam diferente, ameaças a professores que dão tópicos que eles
consideram “ideológicos”; aparelhamento do estado para desmontar
mecanismos de fomento à cultura e às artes; censura, que chamam de
“filtragem” nas concessões para áreas de pesquisa; ameaças a funcionários
que querem cumprir o seu dever, no Ibama e, no ICBMBio.

O ministro da Educação promete deixar as áreas de filosofia e ciências


humanas sem apoio. Há muita vingança e retaliação por parte de membros
do governo contra instituições nas quais não conseguiram entrar ou
progredir por mérito. São inúmeras as ameaças à liberdade de expressão e à
liberdade de cátedra. A tentativa de Bolsonaro de tirar a "Folha de S. Paulo"
da licitação para renovar assinaturas, os ataques à TV Globo. Estão fazendo
o país escorregar para o autoritarismo. Há risco institucional e, até agora,
pouca reação articulada a essas ameaças

Por que o discurso anticorrupção é tão popular?

Somos uma sociedade muito desigual, que se urbanizou tardiamente e muito


rapidamente. Nossa classe média por muito tempo era toda estatal ou
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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

trabalhava em empresas fornecedoras do setor público. Com a crise dos anos


 e as privatizações, temos a formação aceleradíssima de uma classe média
capitalista, urbana, civil, que trabalha em empresas independentes do
Estado.

'Nossa história é de seguidores fiéis versus uma massa que rejeita esse líder', diz Sérgio Abranches Foto:
Fernando Lemos / Agência O Globo

É uma classe média que convive com o risco da demissão, sensível à inflação
e com visão de curto prazo, que produz uma memória curta também. Quer
dizer, eu me lembro das minhas aflições mais presentes. As minhas aflições
passadas já não lembro porque eu tenho mais com o que me preocupar.
Portanto, é uma nação que se desaponta rapidamente, muda de opinião
constantemente e culpa o establishment político por essa frustração
recorrente.

A antipolítica é uma regra?

Se formos pegar o período pós-militar, todos os candidatos tentaram de


alguma forma se apresentar como fora do establishment: o Collor era o
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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

caçador de marajás; Fernando Henrique, o pai do Plano Real; Lula, o cara


que veio da pobreza; a Dilma era a gerente e o Bolsonaro, apesar de tantos
anos como deputado, também se vendeu como antipolítica.

O senhor cunhou a expressão “presidencialismo de coalização” para definir


as relações entre o Palácio do Planalto e o Congresso. Por que existe a
imagem de que essas relações são sempre espúrias?

Talvez porque ela tenha sido espúria mesmo, né? Agora, a realidade é mais
sofisticada do que a noção de que um bando de ladrões entrou na política
para assaltar os cofres públicos.

Tem a ver com o nosso sistema institucional, que desde os militares está
baseado em um governo central que arrecada tudo, manda em tudo, e em
governos estaduais e municipais dependentes demais da União. Então, o
presidente é o que tem recursos para doar e os deputados e senadores são os
demandantes dessas verbas. Para se reeleger, eles precisam que o governo
federal atenda suas comunidades. E essa necessidade de atender os estados
produz uma distorção na função do Legislativo.

O congressista deixa de se preocupar com legislação e fiscalização do


Executivo e passa a ser uma espécie de despachante, de vereador federal. Por
isso, a pauta do Congresso é sempre fiscal. É sempre “me dá um dinheiro aí
porque meu estado está com problema”. E a pauta do governo federal é
sempre uma pauta de reforma porque essa pressão fiscal é insustentável
financeiramente. Então, ficamos presos a uma armadilha. Temos um
problema estrutural que não se resolve exclusivamente com leis
anticorrupção, é preciso preparar os estados e municípios para serem
autossustentados.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

Olhando em perspectiva o cenário de , com as primeiras manifestações


do impeachment, o governo Dilma perdendo a maioria no Congresso, a
explosão do desemprego e da inflação, o impasse político era evitável?

Só se Lula tivesse escolhido outra pessoa em  e tirado a Dilma.

Em , o desemprego já afligia  milhões de trabalhadores, o ex-


presidente Lula estava preso, houve o atentado em Juiz de Fora... A eleição
do Bolsonaro era inevitável?

Para isso era preciso que o candidato do PSDB não fosse o Alckmin e o PT
tivesse lançado o Haddad logo no começo. Mas a quantidade de condições
necessárias para manter a polarização PSDB-PT era tamanha que
provavelmente o Bolsonaro era mesmo inevitável.

Em um artigo recente, o senhor escreveu que a desilusão dos eleitores com o


poder de voto para mudar a suas vidas pode aumentar.

A minha sensação é de que os eleitores brasileiros em  vão querer votar.


Porque como o presidente Bolsonaro vai governar o tempo todo em
confronto e isso produz uma reação negativa na sociedade em busca de
alguém que os eleitores imaginem ser capazes de derrotar o Bolsonaro

Haverá um antibolsonarismo em  como houve um antipetismo em


 e ?

Sim, nossa história é de seguidores fiéis versus uma massa que rejeita esse
líder.

Já está dado que a campanha de  será entre Bolsonaro e o PT?

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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

É cedo, muito cedo. Qualquer candidato que se apresente agora será alvo de
vários lados. É desgaste na certa. Antecipação de campanha nunca funciona
como os candidatos querem. A conjuntura é muito dinâmica. Pode
alavancar ou fazer naufragar os que se lançam afoitamente. Muita coisa pode
ainda acontecer, que crie condições propícias ao surgimento de uma
candidatura alternativa à polarização que elegeu Bolsonaro.

Qual a sua avaliação dos discurso de Lula pós-soltura?

Se Lula persistir na ideia de polarizar com Bolsonaro e não conseguir afastar


sua inelegibilidade, decretará a derrota de quem saia pelo PT em seu lugar.
Facilitará a recandidatura de Bolsonaro. Se fizer uma campanha com o
discurso que usou na saída da prisão, corre certamente o risco de perder.
Lula tem condições de formar uma frente pela democracia, mais ampla. Até
agora não mostrou querer assumir este papel.

Muitas lideranças políticas e intelectuais do PT continuam a atacar setores


democráticos que não apoiaram o partido, principalmente no governo
Dilma. Fazem como Bolsonaro. O presidente declara qualquer um que
pense diferente dele como “petista”, “vermelho" ou “comunista”. Parte dos
petistas trata opositores como se fossem “bolsonaristas” ou “golpistas”. Há,
no entanto, lideranças importantes e mais conscientes no PT que defendem
uma frente mais ampla, pela democracia. Espero que elas prevaleçam e
convençam Lula.

A que o senhor atribui a queda de popularidade do governo?

Bolsonaro prometeu uma mudança instantânea, gerou uma expectativa


muito difusa e produziu frustração por causa do amálgama muito disforme
do eleitorado que o elegeu. Uma parte grande queria alguém que fosse o

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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

anti-PT. Hoje esses olham o caso Flávio Bolsonaro e falam “qual é a


diferença?”. Por outro lado, a situação econômica piorou. Embora a inflação
tenha caído, o desemprego persistiu, portanto, a renda real continua muito
baixa. E as pessoas querem um alívio imediato.

Essa frustração ameaça o futuro do governo?

Se olharmos o modelo que organizou a política brasileira desde a


Constituição de , Bolsonaro precisa de uma coalizão no Congresso,
uma articulação política eficiente, uma pauta substantiva que gere também
mudanças de curto prazo. Ele não está cumprindo nenhuma dessas
condições. Portanto, por esse modelo, o governo não vai dar certo e não vai
terminar o mandato. Só que...

...esse modelo não existe mais.

Teve a ruptura. O presidencialismo de coalizão não está funcionando, qual é


a previsão do modelo? É de que vai haver um conflito crescente entre
Executivo e Legislativo, vai haver uma paralisia decisória, produzindo uma
piora generalizada das condições da sociedade e o governo cai. É o que diz o
modelo, mas o modelo pode não funcionar. Mas este é o governo mais frágil
desde Collor do ponto de vista de sustentabilidade.

Mas o Congresso hoje não dissipa os confrontos e leva adiante as reformas?

Tem um mito hoje no mercado financeiro sobre o poder do Congresso. Só


que o protagonismo do congresso no presidencialismo tem um nome:
chama-se crise política. Se o presidente não tem protagonismo significa que
alguma coisa está errada. Este presidente se recusou a fazer a coalizão, se
nega a se articular com os partidos e prefere falar com os congressistas
individualmente. Não há possibilidade de funcionar. O presidente precisa
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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

ocupar a agenda legislativa não é só para aprovar as coisas que quer aprovar;
é para evitar que sejam aprovadas coisas que possam atrapalhar o seu
governo.

Falta coordenação?

Sim, o desalinhamento das eleições deixou o Legislativo sem um partido


pivô. No caso do FHC, era PSDB e PFL. Com Lula e Dilma, era PT e
PMDB. Sem um pivô, a tendência é a dispersão. O Congresso ou vota
pontos já consensuados, como a reforma da previdência, ou para retaliar o
governo, como nas derrubadas de vetos. Esse suposto protagonismo do
Congresso é efêmero. A tendência é a divisão. Caminhamos para uma
paralisia do governo.

A criação da Aliança pelo Brasil afeta essa sustentação no Congresso?

O governo não tem base governista, por escolha. O presidente decidiu ficar
sem coalizão e, agora, sem partido. Está criando uma casca sem miolo com a
tal Aliança, se vai virar ou não um partido, a ver, a partir das próximas
eleições gerais. Sem coalizão, não se pode falar em base governista. O que
Bolsonaro tem é viabilizadores, políticos do DEM e do PSDB que usam sua
liderança, experiência e penetração entre os parlamentares para patrocinar
reformas, que o governo não se dispôs a articular e liderar. Mesmo revistas
ou até redigidas por deputados e senadores, elas vão para a conta do
presidente. Afinal, nosso regime é presidencialista e não parlamentarista.

Qual o efeito de o Bolsonaro ser o primeiro presidente com forte vinculação


com as igrejas evangélicas?

A adesão das igrejas evangélicas ao Bolsonaro foi brutal. A questão é saber se


a defesa da pauta de costumes basta. Porque os eleitores evangélicos também
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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

comem, trabalham, são demitidos…

Os sinais de uma economia melhor não ajudam?

Depois de um ano de governo, as pessoas já começam a culpar o governo


Bolsonaro pelo seu desconforto. Não é mais o governo do PT. E não estou
falando só de percentagem do PIB, mas do que acontece realmente na vida
das pessoas. A economia brasileira está parada há muito tempo. Muita
capacidade ociosa. Com pouco impulso, tende a crescer, porém
moderadamente.  está muito longe neste sentido.

Qualquer previsão que ultrapasse  é muito imprecisa, condicional a


mudanças na conjuntura interna e internacional. Para o ano que vem, há
dois problemas novos. O acordo, precário, vá lá, entre EUA e China, que vai
fazer os chineses trocarem parte da importação de soja brasileira, por soja
americana. E o imposto que o governo argentino decidiu impor sobre as
exportações de trigo pode pressionar a inflação interna. Sempre haverá muita
pedra no caminho desta transição global, que primeiro se manifesta como
uma sucessão de crises.

Abranches na última decada

Clima

Lança “Copenhague: antes e depois”, pela Civilização Brasileira, um ano


depois da cúpula da ONU sobre mudança climática realizada na Dinamarca.

História

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12/01/2021 Década de rupturas: 'Caminhamos para a paralisia do governo', afirma Sérgio Abranches

Lança “A era do imprevisto – A grande transição do século XXI”, pela


Companhia das Letras. O livro recebeu o Prêmio Literário Nacional PEN
Clube do Brasil.

Lança “Presidencialismo de coalizão”, pela Companhia das Letras,  anos


depois do artigo em que o autor cunhou o termo.

Intolerância

Após protestos, a ª Feira do Livro de Jaraguá do Sul (SC) cancelou as


presenças de Abranches e sua mulher, Miriam Leitão, no evento.

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Os juros baixos vieram para ficar e mudar a economia’ , diz Ilan Goldfajn

O GLOBO › Annotations

Década de rupturas: ‘Os juros baixos


vieram para ficar e mudar a
economia’ , diz Ilan Goldfajn
DECEMBER ,

Ilan Goldfajn diz que os juros baixos vieram para ficar Foto: Fernando Lemos / Agência O Globo

RIO — Presidente do Banco Central no período em que o Brasil iniciou


uma queda constante nas taxas de juros, o economista Ilan Goldfajn acredita
que o país se encaminha para um ciclo de crescimento entre  e ,. “O
Brasil é um transatlântico que se continuar na direção correta, vai chegar em
bom porto. Mas não será rápido”, diz. Nessa conversa no seu novo emprego,
a sede do banco Credit Suisse, em São Paulo, Goldfajn conta como acalmou
o mercado na crise da JBS. “Haveria um risco de fuga de capitais se o
mercado percebesse que poderia haver uma mudança na equipe econômica.
Aí, o mercado não ia voltar rápido. Nosso trabalho foi de assegurar que não
haveria guinada”, contou.

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Os juros baixos vieram para ficar e mudar a economia’ , diz Ilan Goldfajn

Dez anos atrás, a revista e Economist trouxe a capa com o Cristo


Redentor como um foguete e saudando o Brasil como um novo player
global. O que deu errado?

Haviam coisas que não tinham mudado e a e Economist achava que


tinham mudado, e coisas que agora a gente acha que pioraram, mas na
verdade não pioraram. Estávamos no auge das commodities, onde a
economia global estava se recuperando do crack de , e o Brasil estava
exportando muito, com um crescimento da renda média nacional. Mas era
um crescimento baseado num boom que não era permanente.

Esses dez anos foram uma década perdida, como os anos ?

Não, nós evoluímos nessa década. Voltamos a ter uma inflação de país
civilizado, entre  e  e finalmente nos transformamos em um país
normal em termos de taxa de juros. Também percebemos a necessidade de
um ajuste de despesa a longo prazo, avançamos na reforma da previdência.
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Nomes como Marcelo


Odebrecht, Lemann, Villas…

00:00 20:38

Mas foram os anos de uma recessão brutal e da recuperação mais lenta da


história. A recessão a partir do final de  era inevitável?

A desaceleração já estava contratada, porque a China passou a crescer menos.


Foi mundial. O que não estava na conta era uma queda tão grande no PIB,
na ordem de  a .

Por que o Brasil sofreu mais?


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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Os juros baixos vieram para ficar e mudar a economia’ , diz Ilan Goldfajn

Além da desaceleração global, temos dois motivos. O primeiro foi a política


econômica de excessos (no governo Dilma). Acreditou-se que o boom das
commodities veio para ficar e isso levou a achar que as receitas eram muito
superiores ao real. Veja o caso do Estado do Rio, que passou a contratar
servidores como se o petróleo fosse permanecer com o barril acima de U
 para sempre, com o agravante que esses servidores tem estabilidade e se
tornam despesas permanentes. Os gastos públicos foram elevados de forma
incompatível com a realidade. Tivemos problemas com a Petrobras, com o
controle nos preços dos combustíveis, uso de bancos públicos nas políticas
de estímulos. Acreditaram (a equipe econômica do governo Dilma) que a
política econômica era infalível, cometeram erros que não achavam que
eram erros. Quando se aperceberam da nova realidade, a queda foi maior e
mais brusca, porque os Estados estavam quebrados, a Petrobras tinha
problemas...

Outro fator que multiplicou o impacto foi o combate à corrupção, que é


uma coisa boa, mas que, no curto prazo, acabou paralisando setores
relevantes. O setor de construção civil caiu . Por um objetivo de médio
prazo positivo, você acabou desestruturando setores que só agora você está
voltando a reestruturar.

Por que a recuperação econômica é tão lenta?

O crescimento vai voltar devagar. A mudança da direção de política


econômica (com o governo Temer), trouxe uma nova equipe que apresentou
novas reformas e uma nova agenda. As pessoas diziam, “Ah, não poderia
piorar”. Só que sempre pode piorar! Tem países vizinhos que acabam
piorando mais...

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Os juros baixos vieram para ficar e mudar a economia’ , diz Ilan Goldfajn

A guinada na política econômica não necessariamente significa que você


consegue resolver todos os problemas criados, mas ao invés do desemprego
aumentar, o desemprego começa a diminuir, em vez de as reformas serem a
favor de mais gastos públicos, elas são de menos gastos, as projeções das
dívidas públicas que estavam subindo começam a melhorar. O Brasil é um
transatlântico, navega devagar, muda de rota devagar. É um país
democrático, o que significa que você precisa formar consensos para aprovar
reformas. Então, você quer fazer a reforma da Previdência, começa a falar, no
dia  não tem consenso. Lá no terceiro ano do debate, gera o consenso e
aprova a reforma. E agora começamos a falar da reforma tributária. O Brasil
é um transatlântico que se continuar na direção correta, vai chegar em bom
porto. Mas não será rápido.

Quando o senhor tomou posse como presidente do Banco Central, a


inflação estava perto dos . Qual era a prioridade?

O pior momento para um Banco Central é quando você tem uma inflação
muito alta com uma recessão muito grande, porque os sinais são
contraditórios. Uma recessão recomenda estímulo à economia (baixar a taxa
Selic), e uma inflação recomenda segurar (aumenta a taxa). A minha
responsabilidade era a de gerar credibilidade porque o ajuste de preços
naquele momento não era pela demanda, era porque as pessoas estavam
incertas sobre o que ia acontecer. As pessoas aumentavam os preços por uma
inércia da inflação passada.

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Os juros baixos vieram para ficar e mudar a economia’ , diz Ilan Goldfajn

O economista Ilan Goldfajn é um dos entrevistados da série Década de rupturas Foto: Fernando Lemos /
Agência O Globo

Nas minhas primeiras semanas, houve um pedido para mudar a meta da


inflação porque havia a noção que o Banco Central com a inflação na casa
dos dois dígitos não conseguiria entregar a meta de ,. Mas aí estava
armadilha. Se mudássemos a meta naquele momento, iriamos cair na visão
de no Brasil, quando não cumpre a meta, muda a meta. A credibilidade
sairia arranhada. Eu fui então na minha primeira entrevista coletiva de
imprensa, meus diretores sequer haviam sido sabatinados no Senado, e falei
“nós vamos manter a meta. Ela é desafiadora, mas é factível”.

E era factível?

Foi uma situação difícil, porque foi contra o consenso. Todo mercado
defendia mudar a meta, mas eu achava que era melhor tentar, não cumprir e
explicar, do que iniciar a gestão com uma perda de credibilidade.

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Sabemos o final da história, não só cumprimos a meta no próprio ano, mas


no ano seguinte ficamos abaixo da meta. E daí as pessoas reclamaram que a
inflação estava baixa demais...

Um ano depois da sua posse, surge o escândalo da JBS e abre-se a


possibilidade de afastamento do presidente Temer. Como o mercado reagiu?

Tivemos que atuar vendendo dólar, intervindo no mercado de títulos,


garantindo que haveria liquidez. Só haveria um risco de fuga de capitais se o
mercado percebesse que poderia haver uma guinada na equipe econômica.
Aí, o mercado não ia voltar rápido. Então nosso trabalho foi de assegurar
que não haveria guinada e depois tem que ver o que vai acontecer em termos
da política e da política econômica. Naquele momento ninguém sabia. A
nossa dificuldade de crescer (em  e ) veio dessa instabilidade, desses
ruídos.

A inflação poderia ter se descontrolado em  com a greve dos


caminhoneiros?

Tivemos um aumento de inflação de , em junho, e a dúvida era: será


que esse repique vai acabar voltando ou vai virar inflação. Será que o PIB vai
gerar desabastecimento, será que o PIB vai ficar pior? E isso você, de novo,
tem que estar lá no mercado tentando acalmar, tentando dizer: olha, a coisa
está sendo resolvida, está sendo vista. Já teve algum acordo. O acordo com os
caminhoneiros acabou custando, em termos fiscais, custou menos do que o
efeito na economia. Mesmo assim teve consequências, teve uma tabela de
fretes, que tem consequências negativas para frente.

Como se acalma o mercado num momento em crise como a JBS e dos


caminheiros?

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Só se você constrói credibilidade.

Em que momento que vocês perceberam que a queda dos juros era
irreversível?

No Banco Central, você não baixa a guarda, mas na metade de  já


estava claro que havíamos quebrado a espinha da inflação, os sinais de que
teríamos índice na casa dos  eram definitivos e que os juros iriam cair
continuamente. Agora, até onde a taxa Selic pode chegar, ninguém sabe. É
um mundo novo. Mas estamos em outro patamar, os juros baixos vieram
para ficar e mudar a economia.

A Selic caiu, mas a dona Maria quando olha o crediário, o cheque especial
ainda vê taxas de , . Por que essa queda demora tanto a chegar ao
consumidor?

Vou dividir a resposta em dois. Primeiro, onde além da Selic os juros caíram?
As grandes empresas vão para o mercado de capitais e pagam um pouco mais
que o CDI (Certificado de Depósito Interbancário), ou seja, nunca pagaram
tão pouco. Só para o governo, a queda nos juros vai provocar uma economia
de quase R  bilhões. Para o consumidor, as taxas de hipoteca estão entre
 e  para dez ou trinta anos, as taxas de crédito consignado, de
financiamento agrícola, de financiamento de veículos, todas caíram.

Onde a queda dos juros não chegou? Onde não há garantias: empréstimos
pessoais, crédito para pequenas e médias empresas que tem mais dificuldade
de dar garantias. No Brasil, você consegue retomar  centavos de cada real
emprestado, enquanto a média mundial é . Por isso, para quem tem
garantias, a queda dos juros chega mais rápido.

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A queda dos juros básicos foi muito rápida, uma coisa fora do comum, mas
a queda dos juros da economia está ocorrendo e vai continuar ocorrendo,
mas é um processo.

Por décadas, se ouviu políticos dizerem que bastava um choque de juros para
fazer o Brasil crescer. É mais complicado?

A redução dos juros tem um efeito estimulativo, tira um pouco do custo do


capital, reduz os financiamentos, mas o impacto dos juros é no curto prazo.
Quer pensar no longo prazo, vamos pensar na educação básica. Quer pensar
no médio prazo, pensa como é que se vai financiar a infraestrutura, como é
que se dar a segurança jurídica para investimentos. A queda dos juros é uma
conquista, mas é apenas uma parte.

Como se resolve o dilema em que em um lado o Estado faliu e do outro não


há confiança suficiente do setor provado para investir?

É uma mudança dos motores. Por muitos anos, o governo era o motor do
gasto. Agora vai ter que ser o investimento privado, vai ter que ser o
consumo privado, vai ter que ser produtividade... Essa mudança é algo que
vai ocorrer, mas leva tempo. Leva tempo, porque ainda é preciso resolver
carga tributária, contencioso judiciário, infraestrutura.

É um rumo de um estado menor?

É de um estado mais eficiente, que está por exemplo na educação básica, na


saúde, em ajudar no transporte público, presta serviço onde a população
precisa e sai fora de estatais.

Um dos efeitos colaterais dessa situação dos juros é a volatilidade do câmbio.


Isso é natural ou isso reflete alguma desconfiança nos fundamentos da
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economia?

Há muitos anos, quando acontecia uma crise, você tinha o risco Brasil
subindo, você tinha o câmbio subindo, a inflação subindo, estamos
acostumados a olhar o câmbio como termômetro do risco, mas às vezes o
câmbio não é um termômetro do risco. Esse patamar de juros bem menor,
tem uma implicação sobre a parte do câmbio que é determinada pelo fluxos.
Tem muito dinheiro que vem e que vinha para levar o retorno que a gente
aqui oferecia relativo ao retorno que as pessoas tinham lá fora. Trazer o
dinheiro de lá pra cá, ou arbitrar de cá pra lá, gerava uma quantidade de
recursos que levava o nosso câmbio a ser um câmbio mais baixo, mais
apreciado. Isso tornava o Brasil mais caro em dólares comparado com o resto
do mundo. Na medida que você resolve essa questão da composição fiscal
versus monetária, você tem uma nova estrutura de juros, é natural que você
tenha um novo patamar de câmbio. Você acabou com essa arbitragem. No
longo prazo, a média nos próximos dez anos vai ser de um câmbio mais
depreciado do que a média dos últimos dez anos.

Por que os investidores locais estão tão mais otimistas que os estrangeiros
sobre o Brasil?

Cada um vive um momento. O brasileiro passou por uma recessão, o início


da recuperação, a eleição de  que foi um ano conturbado, as reformas, a
mudança no patamar de juros. Para ele, há uma sensação de que algo está se
movimentando. O investidor estrangeiro não tem essa mudança. Para eles,
qualquer queda de juros é um sinal ruim. Nós não chegamos nesse estágio,
para nós abriu-se a circunstância para que as firmas invistam, que você
produza.

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Mas o Brasil não pegou o bonde atrasado demais, ou seja, estamos fazendo
reforma em um momento em que a perspectiva mundial é de um
crescimento mais baixo, com a briga EUA-China, Brexit, desaceleração da
China?

Por isso que uso a imagem do transatlântico, que se move devagar. A


reforma tributária? Demora, mas vai acabar saindo. Por isso que a ideia de
persistência é fundamental para um país como o Brasil.

Em um país com  de desemprego e  de desalento, vindo de uma


economia que caiu  , não é natural que a sociedade esteja impaciente pelo
crescimento?

É absolutamente natural. Eu fico impaciente em muita coisa, você fica, todo


mundo fica, e os desempregados ainda mais. Mas qual é a solução? A solução
não pode ser populismo. Já fizemos isso, tentamos as soluções de curto
prazo, aumentamos o gasto público... Tentamos pelos atalhos e não deu
certo. Vamos tentar fazer as coisas pelo lado certo? Se você está no setor
privado, é hora de investir. Se você está no governo, vamos tentar gerar esses
consensos um pouco mais rápido, em vez de o tempo todo estar em
conflitos.

O crescimento, portanto, demora?

Depende. As condições da queda dos juros estão dadas. Mas temos o setor
público com muitas dificuldades. Precisamos de várias reformas que
demoram... no curto prazo, podemos dobrar o crescimento de hoje, mas é
de  a , ano. Agora, em cinco, seis, dez anos, estaremos em outro
patamar. Porque não é só a reforma da Previdência, o novo patamar de juros,

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a reforma tributária, é o acúmulo de mudanças que vai nos levar para outro
patamar.

E o risco político?

O conflito na política sempre atrasa os consensos e, portanto, atrasa as


reformas e afetam o crescimento lá na frente.

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

O GLOBO › Annotations

Década de rupturas: ‘Desde os anos


, a Odebrecht fazia pagamentos
não declarados, diz Marcelo
Odebrecht
DECEMBER ,

Marcelo Odebrecht concedeu entrevista em dois dias em sua casa em São Paulo Foto: Fernando Lemos /
Agência O Globo

RIO — Preso por dois anos e cinco meses em Curitiba, condenado a mais
de  anos de cadeia por corrupção, o engenheiro Marcelo Odebrecht, hoje
com  anos, virou o símbolo da Operação Lava-Jato. Nunca antes um
empresário tão poderoso havia sido alvo de uma ação tão dura. Em sua casa,
em São Paulo, Odebrecht recebeu O GLOBO por duas ocasiões. Com
limitações legais para falar sobre processos em andamento e em meio à
disputa familiar sobre o futuro do grupo, ele contou como a empresa tinha a
prática de fazer pagamentos não contabilizados — não apenas para
campanhas eleitorais —, detalhou seu papel na “conta italiano”, exclusiva de
recursos para o PT e o Instituto Lula. “Sempre fomos tolerantes com o caixa

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

dois”, disse. “A crença de que os fins justificam os meios foi um grande


pecado”.

Em , o Brasil estava crescendo ,, havia ultrapassado a crise


financeira de  e tudo indicava que seria a grande década brasileira. O
que deu errado com o Brasil?

O Brasil cresceu? Sim, mas tudo ajudava: havia o bônus demográfico, os


preços das commodities estavam lá em cima, o pré-sal apareceu, nós
tínhamos um líder popular, agregador, um verdadeiro chefe de torcida. Por
outro lado, abdicamos das reformas estruturais que precisávamos. O governo
era onipresente em toda a economia. Era um crescimento que embutia várias
distorções que o tornavam insustentável.

Em , a Odebrecht era líder no setor de infraestrutura, mas também


estava em petroquímica, bioenergia, defesa, construção naval. Aquela
ambição era sustentável?

A maior parte do nosso crescimento e diversificação era sustentável: a


internacionalização da companhia que vinha desde os anos , a Braskem,
óleo e gás... mas nos aventuramos no setor de etanol a pedido do governo, e
tivemos muito prejuízo, assim como no estaleiro na Bahia. O estádio do
Itaquerão foi uma dessas missões em que perdemos muito dinheiro.

Para os seus negócios, fazia diferença contratar o ex-presidente Lula para dar
palestras?

Sim, fazia diferença, mas nós tínhamos uma situação ambígua. Por um lado,
Lula tinha uma enorme influência e era muito querido, tanto na América
latina como na África. Por outro lado, ao contrário da maior parte das nossas
competidoras, nós já estávamos presentes nesses países. Neste sentido, a
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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

presença de Lula nos trazia algum desconforto porque a intenção dele era
abrir o mercado para todas as empresas brasileiras. Nós então procurávamos
influenciar as pessoas no entorno do Lula, e preparávamos notas detalhando
a nossa operação para que no momento em que ele fosse defender as
empresas brasileiras, não o fizesse de uma maneira tão genérica que pudesse
passar a impressão ao governo local que estava despriorizando a única
empresa brasileira que já estava presente naquele país há muito tempo.

A Odebrecht era uma das “campeões nacionais” da política de financiamento


do BNDES?

Discordo. Não havia uma preferência nem de Lula, nem de Dilma para fazer
tal empresa crescer. O que havia eram políticas públicas influenciadas e
disputadas por vários setores e empresas. A Odebrecht já era, desde a década
de , a maior exportadora de serviços do Brasil. No governo Lula houve
uma boa política pública de incentivo à exportação de serviços e nós, pela
nossa presença internacional, fomos os maiores beneficiários. Jorge Paulo
Lemann: 'O Brasil precisa brigar menos e investir mais em educação'

Havia algum tipo de esquema de corrupção na liberação dos financiamentos


do BNDES?

Que eu tenha conhecimento, nunca houve esquema de corrupção no


BNDES. Apenas no contexto de uma negociação bilateral para ampliar uma
linha de crédito entre o governo de Lula e de outro país, negociação da qual
a Odebrecht nem era parte, houve um pedido de apoio financeiro ao PT, e
que é objeto de uma ação penal em andamento (referência ao inquérito
sobre Angola).

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

Em dez anos, a Odebrecht passou de um faturamento acima de R 


bilhões para uma empresa em processo de recuperação judicial. O senhor se
sente responsável pelo que aconteceu?

Tenho minha responsabilidade. Nem eu, nem outros líderes da empresa nos
eximimos. Muitos de nós tivemos a coragem de assumir nossos erros, e
estamos pagando por isto.

O que quebrou a Odebrecht?

É fácil dizer que o que quebrou a Odebrecht foi a Lava-Jato. Sim, a Lava-
Jato foi o gatilho para nossa derrocada, mas a Odebrecht poderia ter saído
dessa crise menor, mas mais bem preparada para um novo ciclo de
crescimento sobre bases até mais sustentáveis. Só que nós não soubemos
conduzir o processo da Lava-Jato. A Odebrecht quebrou por manipulações
internas, não apenas pela Lava-Jato.

Por partes: por que a Odebrecht demorou tanto a fechar um acordo de


leniência, depois de quase todas as concorrentes?

Éramos uma empresa extremamente descentralizada. Cada líder de um


projeto tinha autonomia para tomar suas decisões e nem sempre os demais
executivos conheciam detalhes de outra operação. Ninguém sabia de fato o
que o outro havia feito de errado, e quando a Lava-Jato começou muitos se
omitiram. Havia ainda uma preocupação em não trazer para o âmbito do
inquérito da Lava-Jato temas e pessoas que estavam fora da investigação de
Curitiba, que, devemos lembrar, era inicialmente exclusiva sobre
acontecimentos ligados à Petrobras. Não queríamos trazer para a Lava-Jato a
nossa relação política, que não necessariamente envolvia toma lá, dá cá, mas
que podia ser mal explorada, como aliás acabou sendo.

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

“A informação que me davam (na cadeia) é a de que a empresa não estava


pronta para um acordo (com a Justiça). Depois vim a descobrir que a
informação que levavam para a empresa é a de que quem não estava
disposto a colaborar era eu”

Mas, já em outubro de  (três meses após a prisão), eu e outros


executivos presos em Curitiba entendíamos que deveríamos colaborar com a
Justiça. Nesse momento foi que começaram as manipulações internas, até
pela minha dificuldade de me comunicar estando preso. Assim, a informação
que me davam é a de que a empresa não estava pronta para um acordo.
Depois vim a descobrir que a informação que levavam para a empresa é a de
que quem não estava disposto a colaborar era eu.

Quais os interesses dessa desinformação?

Algumas pessoas da Odebrecht à frente das negociações com a força-tarefa


não desejavam assumir seus erros. Contudo, mais do que a postergação das
negociações com Curitiba, o que mais prejudicou a Odebrecht foi a maneira
como se conduziu o acordo com o Departamento de Justiça dos EUA.

Por que a Odebrecht precisava fechar acordo nos EUA?

Quando uma empresa que atua em vários países decide colaborar com a
Justiça, ela tem que conduzir um acordo global, conciliando o timing em
cada país. A partir do momento em que a Odebrecht decidiu fechar acordo
no Brasil, precisava colaborar também nos Estados Unidos, na Suíça, porque
uma parte dos pagamentos indevidos passaram por lá, mas também nos
demais países em que atuávamos: Peru, Panamá, República Dominicana,
Equador... Por isso, o negociado com a força-tarefa de Curitiba pressupunha
um sigilo em relação aos fatos no exterior.

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

Marcelo Odebrecht é um dos entrevistados da série Década de rupturas Foto: Fernando Lemos / Agência
O Globo

Houve, porém, interesses escusos dentro da Odebrecht e da Braskem de


pessoas que sabiam que seriam expostas se ocorresse uma investigação
independente. Essas pessoas anteciparam o fechamento do acordo nos EUA
baseado em relatos parcialmente manipulados por elas mesmas. O
Departamento de Justiça dos EUA divulgou esse acordo e, de uma hora para
outra, não apenas nossos funcionários em outros países passaram a correr
um enorme risco, como perdemos entre US  bilhões a US  bilhões de
dólares em ativos. Sofremos arrestos, intervenções, bloqueios de bens e não
tivemos chance de negociar um acordo em bases normais. E US  bilhões
era dinheiro suficiente para pagar várias Lava-Jato. Ou seja, se isso não
tivesse ocorrido, a Odebrecht hoje estaria viva.

Quem na Odebrecht fez isso?

Isto deve ser objeto de investigação por parte das autoridades, a quem caberá
denunciar os responsáveis.

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

O caixa dois era necessário?

Se eu disser que era necessário, estaria mentindo. Havia empresas que


corretamente não aceitavam fazer. Nós, porém, sempre fomos tolerantes com
o caixa dois. E não faltavam motivos para justificá-lo. Seja porque o político
tinha uma referência de orçamento oficial de campanha que não queria
ultrapassar, seja porque o político não queria aparecer recebendo muito
dinheiro de uma empresa com interesses na região, ou cujos projetos ele
defendia.

“Se eu disser que era necessário (pagar no caixa dois), estaria mentindo.
Havia empresas que corretamente não aceitavam fazer. Nós, porém,
sempre fomos tolerantes com o caixa dois”

A própria empresa, por sua vez, também não queria aparecer, porque havia
uma criminalização na mídia com relação às contribuições oficiais de
campanha. Posso me estender aqui por inúmeras justificativas que nos
levavam a optar pelo caixa dois e todas elas têm um erro comum: tiravam a
transparência e a legitimidade de nossas relações. Mesmo que grande parte
das relações políticas não envolvessem um toma lá, dá cá, a existência do
caixa dois tirava da sociedade o direito de fazer um julgamento.

Quando a Lava-Jato explodiu, descobriu-se que o volume de recursos de


caixa dois da Odebrecht era tamanho que havia um setor específico, o
famoso Departamento de Operações Estruturadas.

Isso é folclore. Esse tal departamento de propina nunca existiu. A verdade é


menos espetaculosa. Desde os anos , bem antes de meu ingresso na
empresa como estagiário, havia pessoas na Odebrecht que apoiavam os
executivos na realização de pagamentos não contabilizados. Eram bônus não

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

declarados para executivos, pagamentos em espécie a fornecedores,


especialmente em zonas de conflito, investimentos em que não queríamos
aparecer, caixa dois para campanhas, e eventualmente até propinas. Essas
pessoas iam se sucedendo, e todas eram identificadas por algum programa
dentro da Odebrecht para ocultar sua real função, sendo que as últimas
pessoas se autodenominaram responsáveis por operações estruturadas.

Não existia o departamento de operações estruturadas?

Existiam pessoas que faziam pagamentos não contabilizados, sendo que, em


algum momento, sem que fosse de conhecimento meu ou de qualquer outro
executivo, elas começaram a criar sistemas para controlar estes pagamentos.
Uma maluquice total! Quanto à natureza desses pagamentos, só os
executivos que os aprovaram é que podem responder e definir o que pode ser
caracterizado como propina. Não estou negando o fato de que houve
pagamento de propinas, só estou dizendo que não era nem de longe na
dimensão que foi divulgada. E a prova de que as propinas eram uma parcela
mínima de nossos pagamentos não contabilizados é que a grande maioria
das ações judiciais fruto das delações da Odebrecht foi direcionada para a
Justiça Eleitoral.

Mas as demais empresas não tinham a sofisticação da Odebrecht

A maior parte das empresas se utilizavam de notas frias. Como éramos


extremamente descentralizados, foi tomada uma decisão na Odebrecht lá no
início dos anos  de que, para não contaminar toda a contabilidade da
empresa com notas frias, faríamos uma geração mais planejada de caixa .
No Exterior, esse caixa  seria colocado em contas offshores à disposição dos
nossos executivos. Quando precisavam, esses executivos solicitavam às
pessoas que cuidavam desse caixa  para fazer os pagamentos não

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

contabilizados. Nenhum executivo da empresa, eu entre eles, sabia que havia


registros destes pagamentos e várias pessoas podiam autorizar estes
pagamentos não contabilizados de forma descentralizada.

Mas o volume de dinheiro em caixa dois...

Representavam menos de  do nosso faturamento. Não sejamos hipócritas:


era bem usual no mundo empresarial as empresas terem até  de seu
faturamento direcionado para pagamentos não contabilizados.

De acordo com as investigações da Lava-Jato, o senhor administrava a conta


Italiano, usada exclusivamente para o PT. Como ela surgiu?

Prefiro não entrar no caso específico de temas que fazem parte de ações
penais em andamento. De maneira geral, era um registro de um lado dos
valores de contribuição que eu e meu pai acertávamos com os governos do
PT, e de outro dos pagamentos que eles pediam. Era uma conta fictícia na
qual debitávamos os pagamentos que nos eram solicitados primeiro por
Antonio Palocci e depois por Guido Mantega para atender os interesses do
PT e, dentro dos interesses do PT, do Instituto Lula.

Qual a lição para o senhor desse período?

Nós, da Odebrecht, cometemos nossos dois grandes pecados: a falta de


transparência do caixa dois, e a crença de que os fins justificavam os meios.

Qual é o futuro da Odebrecht?

Primeiro temos que vencer o desafio da recuperação judicial, e levantar o


moral de nossa tropa, voltando a valorizar a nossa cultura empresarial. Tinha

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

um antigo diretor nosso que dizia: “Enquanto tiver bala, atire”. E é isso que
temos que fazer.

A partir da Lava Jato, o Congresso proibiu as contribuições empresariais.


Isso limita o caixa ?

Um dos pontos positivos dessa década é que sairemos dela com menos
governo. Quanto menos o empresário tiver que viajar para Brasília para
defender seus interesses, quanto menos governo tiver dificultando a vida do
empresário, - aquela dificuldade criada para vender facilidade - menos
problemas teremos. A melhor maneira que você tem de evitar de ter relações
indevidas entre a iniciativa privada e o governo é ter menos governo

Odebrecht na última década

Bonança

O grupo quebra recorde de faturamento, R  bilhões, e de lucro, R,


bilhões. A companhia tem  mil funcionários e atua em quase dez setores.

Sinal amarelo

PF deflagra a Operação Lava-Jato. Presidentes e executivos da Camargo


Corrêa,

OAS e UTC são presos. Policiais fazem buscas na Odebrecht

Marcelo Odebrecht aparece em º lugar na lista dos brasileiros mais ricos


feita pela Forbes, com fortuna estimada em R , bilhões.

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12/01/2021 Década de rupturas: ‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

Marcelo Odebrecht é preso pela Polícia Federal. Seis meses após a prisão,
renuncia à presidência da empresa.

Sentença

É condenado a  anos e quatro meses de prisão por corrupção ativa,


lavagem de dinheiro e associação criminosa.

Depois de meses de negociação, assina um acordo de cooperação com a


Justiça junto ao pai, Emílio Odebrecht, e outros executivos.

Mais Lava-Jato

O ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras Aldemir Bendine (foto) é


preso, suspeito de receber R  milhões da Odebrecht.

Em dezembro, Marcelo Odebrecht sai da prisão e passa a cumprir a pena


domiciliar.

Na Justiça

É condenado a dez anos e seis meses por corromper o ex-presidente da


Petrobras Aldemir Bendine.

Retorno

Obtém progressão de regime e autorização para voltar a trabalhar.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Brasil precisa brigar menos e investir mais em educação', diz Jorge Paulo Lemann

O GLOBO › Annotations

Década de rupturas: 'O Brasil precisa


brigar menos e investir mais em
educação', diz Jorge Paulo Lemann
DECEMBER ,

O empresário Jorge Paulo Lemann, em março de Foto: Marcos Alves / Agência O Globo

RIO - Homem mais rico do Brasil, o investidor carioca Jorge Paulo Lemann
revolucionou a gestão empresarial com o seu foco em metas, resultados e
prêmios baseados em meritocracia. Agora, tenta repetir o feito no setor
público.

Através da Fundação com seu nome, Lemann criou projeto para replicar a
experiência de Sobral, a cidade cearense de resultados acadêmicos
consistentes, concede bolsas para servidores públicos e financia grupos de
renovação na política.

Década de rupturas:‘Fomos colocados à prova e passamos. Não vejo nenhum


risco à democracia’, diz general Villas Bôas

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Brasil precisa brigar menos e investir mais em educação', diz Jorge Paulo Lemann

Em duas raras entrevistas, em seu escritório em São Paulo, Lemann falou de


política ao GLOBO. “Eu não influencio ninguém, não digo a ninguém
como deve votar, não vou me meter em política partidária”.

Quais as lições para o Brasil desses últimos dez anos?

A de que a corrupção não funciona. Não estou nem falando apenas no


sentido moral, porque é obvio, mas no sentido de resultado econômico. A
corrupção distorce a competição entre as empresas e elimina a meritocracia.
O produto final, digamos uma estrada, passa a ser decidida pelo suborno
pago, não pelo encurtamento da distância ou pela qualidade do asfalto ou o
que seja. A corrupção produz uma economia ineficiente. Acaba
contaminando toda a sociedade, todo o sistema econômico.

Qual lição o Brasil não aprendeu nesses dez anos?

O Brasil briga demais. Briga-se muito na política. Isso é ruim. Esse clima
todo de divergência impede a produção de consensos. Todo mundo
concorda que o Estado é ineficiente e perdulário, mas por que não é possível
sentar e descobrir consensos básicos de como fazer o Estado entregar serviços
públicos de maior qualidade? Todo mundo concorda que é preciso investir
mais e melhor na educação, mas como fazer a decisão certa com tanta briga?
O Brasil precisa brigar menos e investir mais em educação.

A elite brasileira, tanto política como empresarial, entende a importância da


educação?

Não tem atalho para o Brasil crescer no longo prazo fora de oferecer uma
educação de qualidade para todas as crianças. País bom é onde as pessoas
têm a mesma oportunidade. É a educação é que gera oportunidade. Nós
temos que educar melhor todas as nossas crianças brasileiras. A possibilidade
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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Brasil precisa brigar menos e investir mais em educação', diz Jorge Paulo Lemann

de um país competir em um mundo moderno depende da educação que dá


para suas crianças. Um país que educa bem vai progredir.

É possível que o Brasil nunca vire uma Singapura, mas já seria ótimo virar
uma grande Sobral (cidade cearense com bons índices de educação).

Privacy Policy
Nomes como Marcelo
Odebrecht, Lemann, Villas…

00:00 20:38

O Brasil vale à pena?

Quer ver três coisas que funcionam bem no Brasil? A educação em Sobral, o
vôlei do Bernardinho e Zé Roberto e a Ambev. São três exemplos
brasileiríssimos de metas, cobranças e foco. Por que não podemos atingir
esta excelência em todos os setores do País?

Os alunos das escolas públicas de Sobral disputam as olimpíadas mundiais


de matemática, mostrando que é possível ter educação de qualidade em
cidades pobres. Os técnicos Bernadinho e Zé Roberto ganharam várias
Olimpíadas e mundiais e mudaram a mentalidade do esporte brasileiro.

A Ambev começou como uma grande cervejaria brasileira e hoje é a maior


do mundo (através da ABI, Anheuser-Busch InBev).

São três exemplos brasileiros de excelência mundial. Todos têm


características parecidas: metas muito claras, medições constantes dos
resultados, meritocracia e todos têm fanáticos que trabalham lá, gente que
sonha grande, que prova que é possível.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Brasil precisa brigar menos e investir mais em educação', diz Jorge Paulo Lemann

Os três exemplos que o senhor deu lembram os mesmos eixos do que ficou
conhecido como cultura da G, a companhia de private equity, na qual o
senhor é sócio com o Marcel Telles e o Carlos Alberto Sicupira.

Sim, a nossa experiência tanto lá atrás no Garantia, como depois na G tem


um peso. Trouxemos questões como metas e planos de meritocracia. Muitos
executivos que trabalharam conosco, seguiram suas carreiras e levaram um
pouco dessa cultura para outras empresas. Então pensando assim, sim, acho
que ajudamos o sistema empresarial brasileiro a se aprimorar.

Escute mais podcasts


de graça no Spotify.

ESCUTE JÁ
Esclareça suas dúvidas sobre a vacin
25:40

O senhor falou do que deu certo. O que da cultura G não funciona mais?

Viemos do mercado financeiro, nosso foco eram os resultados, nossa


capacidade de cortar gastos e produzir com menos custos. A ABI produzia a
melhor cerveja ao menor custo e isso gerava um resultado final ao acionista.
Isso deu muito certo por muito tempo, mas hoje é um momento diferente.

Como é esse momento diferente?

Vivíamos em um mundo no qual você podia apenas focar em ser mais


eficiente e o resto estava dado. A cerveja de boa qualidade a um custo menor
chegaria ao consumidor e tudo ficava bem. Só que as coisas mudaram, o
comportamento do consumidor mudou e continua mudando. Não basta ser
eficiente dentro da fábrica. Tem que ser eficiente compreendendo todas as
mudanças na cabeça do consumidor. Eles querem produtos diferentes todos

https://outline.com/tM4e4V 4/9
12/01/2021 Década de rupturas: 'O Brasil precisa brigar menos e investir mais em educação', diz Jorge Paulo Lemann

os dias, querem que seja entregue de uma forma mais fácil. Nós realmente
temos que nos adaptar.

Essa mudança explica o fracasso da Kraft Heinz (grupo alimentício


adquirido pela G em )?

Quando compramos a Kraft Heinz, tentamos repetir o êxito da ABI, de


fazer na indústria de alimentação o que fizemos no mundo da cerveja. Ser
eficiente no controle de custos e manter a qualidade do produto. Só que isso
não basta mais. O consumidor mudou e erramos ao não perceber isso a
tempo. O sonho com Kraft Heinz não andou direito e agora estamos
consertando.

Qual a lição do fracasso?

Não existe zona de conforto. É nos negócios, é no esporte, é na vida. Você


não pode parar, não pode descuidar um minuto. Nos especializamos em
produzir, em cortar custos. Nunca fomos bons na aproximação com a
clientela. Agora, estamos aprendendo.

Depois da crise da Kraft, senhor se definiu no ano passado como um


dinossauro apavorado.

Eu já fui dinossauro apavorado, sim. Hoje eu continuo um dinossauro, mas


um dinossauro que está aprendendo.

O que o senhor está aprendendo?

Estamos reestruturando nossas companhias e investindo em novos negócios.

O que o senhor faria se estivesse começando sua carreira agora?

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Brasil precisa brigar menos e investir mais em educação', diz Jorge Paulo Lemann

Se eu tivesse  e poucos anos iria passar dois anos no Vale do Silício ou em


Singapura, em um lugar de ponta de tecnologia. Iria aprender tudo o que eu
pudesse e montaria meu próprio negócio.

Eu voltaria ao Brasil. Aqui tem muita oportunidade.

Por que o empresariado brasileiro reclama tanto do Brasil?

Os outros países também têm confusão, tem briga politica, mas eles se unem
para resolver alguns pontos. Tem vários países asiáticos mais pobres do que
nós, mas que estão na nossa frente em termos de Educação. A Malásia, por
exemplo, está atacando a questão da educação.

Como empresário, o senhor manteve uma posição politica discreta. Por que
hoje está ajudando pessoas a entrar na política?

Quando eu era jovem, era o tempo dos militares, ninguém nem olhava a
política. E eu queria ficar rico. Hoje, talvez eu me interessasse pela política.

Por que a Fundação Lemann entrou na política?

Não entramos na política partidária. Investir em educação não é uma


questão de esquerda ou de direita. Vamos resolver, como é que resolve?
Vamos fazer o prático. Provavelmente, isso é mais ou menos pelo meio, nem
de esquerda nem de direita. Então, não estamos na política para eleger
ninguém, mas para ajudar com a nossa experiência a produzirmos políticas
públicas mais eficientes.

A Fundação concedeu  bolsas para jovens estudarem políticas públicas na


Kennedy School, Oxford e em Columbia para voltarem ao Brasil e
preencherem funções publicas . Isso é importante. Apoiamos a Vetor Brasil,

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Brasil precisa brigar menos e investir mais em educação', diz Jorge Paulo Lemann

a ONG criada pela Joice Toyota, que ajuda prefeituras e governos de todos
os partidos a contratar pessoas com os melhores critérios profissionais. É
uma headhunter de graça para o serviço público. Na Fundação, chamamos o
ex-prefeito de Sobral, Veveu Arruda, do PT, amigo dos irmãos Gomes, para
montar um projeto para replicar a experiência de sucesso de Sobral em
outras cidades brasileiras com menos de  mil habitantes. Estamos
testando atualmente em  cidades com prefeitos de vários partidos que tem
interesse no programa. Se der certo, vamos fazer mais  cidades.

Hoje se fala em uma bancada Lemann no Congresso

Isso não existe. Eu não influencio ninguém, não digo a ninguém como deve
votar, não vou me meter em política partidária. Ajudamos os movimentos de
renovação na política porque acreditamos que a política é importante. A
minha intenção é ajudar em termos de consensos.

Como é o processo de escolha desses bolsistas?

São pessoas de todas os campos políticos, todas comprometidas com o bem


público. Tem o Felipe Rigoni, a Tábata Amaral... Aliás, a Tábata está bem à
minha esquerda no espectro político. Levei o Flávio Dino (governador do
Maranhão, filiado ao PCdoB) para falar em Oxford, o Fernando Haddad
(candidato presidencial do PT em ), o importante não é se o politico é
de esquerda ou de direita, mas se ele dialoga.

O senhor acredita que esses movimentos de renovação vão um dia eleger um


presidente da República?

A Tábata é jovem, tem  anos. O Eduardo Leite tem . Eles têm uma vida
pela frente.

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12/01/2021 Década de rupturas: 'O Brasil precisa brigar menos e investir mais em educação', diz Jorge Paulo Lemann

E o Luciano Huck?

Nem sei se ele será candidato.

Qual a sua avaliação sobre esses primeiros meses do governo Bolsonaro?

O rumo do Paulo Guedes está correto. Poderia ter menos agito na parte
política.

Lemann na última década

Expansão

A G compra a rede de fast-food americana Burger King por U  bilhões

Fome de negócios

A G, fundo de investimentos de Lemann, compra a Kraft, gigante do ramo


de alimentos

Instável

A Kraft Heinz perde mais de um terço do valor de mercado em  e em




Bolsas

Apoio a movimentos de renovação política, elegendo deputados como


Tabata Amaral e Felipe Rigoni.

No topo
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A revista Forbes o lista como o brasileiro mais rico, º do mundo.

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