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Adm.

Fernando Viana
Auditoria / Perícia
Cadeira 18 AMLERS
admfernandoviana@gmail.com

O BANQUEIRO QUE NUNCA SUBIU JUROS


Nelson Barbosa
2019 03

Ilan Goldfajn deixou formalmente o comando do BC no fim de fevereiro, em cerimônia fechada no Planalto, mas o
rapapé só aconteceu nesta semana.
Devido aos demais ruídos do governo, a troca de guarda monetária não chamou a atenção para um fato curioso:
Goldfajn foi o único presidente do BC que nunca subiu a taxa básica de juros na era de metas de inflação.

Mais especificamente, Goldfajn assumiu o BC com a Selic anual em 14,25% e deixou o posto com ela em 6,5%.
Essa redução foi acompanhada de queda da inflação, o que aparentemente indica sucesso na administração do
BC. O problema são os detalhes.
Goldfajn nunca subiu juros por dois motivos conhecidos, mas não enfatizados no mercado: o ajuste da Selic para
cima foi feito por Tombini, e Goldfajn resolveu comprometer a recuperação da economia para não errar na
inflação. Vejamos cada item separadamente.
A inflação acelerou a partir de 2013 e ganhou força em 2015, fruto de choque adverso nos preços de energia e
depreciação cambial, em um contexto de baixa taxa de desemprego.

A taxa anual chegou a superar temporariamente 10% na virada de 2015-16, fazendo com que os economistas de
sempre argumentassem que a política monetária poderia ter perdido efeito, que corríamos o risco de dominância
fiscal e outros exageros.
Nada disso ocorreu. Assim como na virada de 2002-03, quando a inflação anual chegou a 17%, o maior problema
estava em choques exógenos adversos. Nos dois casos, o BC elevou a Selic para evitar a propagação do
aumento da inflação e teve sucesso na empreitada.
No caso mais recente, o BC de Tombini aumentou a Selic de 7,25%, em março de 2013, para 14,25%, em julho
de 2015.
Quando Goldfajn assumiu, a Selic já havia sido elevada, a inflação já havia mudado de tendência, e a economia
passava por grave recessão. Coube ao então novo comando do BC administrar a redução da taxa de juros.
Aí entra o segundo ponto. Dois anos e meio depois, os números mostram claramente que o BC de Goldfajn
poderia ter mergulhado bem mais com a Selic.
Quais números? O crescimento do PIB continua lento, a taxa de desemprego, elevada, e, mais importante, a
inflação medida pelos núcleos do índice de preços está perto do limite inferior da meta de inflação!

Para colocar as coisas em perspectiva, utilizo o raciocínio dos economistas Bráulio Borges e Gilberto Borça Jr,
apresentado no blog do Ibre: imagine a situação contrária, economia superaquecida e núcleos de inflação rodando
perto do teto da meta do governo. Nesse caso, o BC certamente não hesitaria em elevar a Selic, atendendo ao
clamor do mercado.
Como ninguém tem bola de cristal, a condução ultraconservadora da Selic nos últimos anos pode ser justificada
pelas incertezas inerentes à política monetária e pelas turbulências políticas pelas quais passamos (Temer, greve
de caminhoneiros, volatilidade eleitoral e Bolsonaro).

Além disso, como já abordei em outra coluna há quase um ano, há uma assimetria na condução da política
monetária. Errar a Selic para cima é mais tolerado do que errá-la para baixo, pois a população tem maior aversão
à inflação do que ao desemprego, e o mercado financeiro não se incomoda em receber uma taxa de juro mais
alta, mesmo que errada.

Olhando para a frente, haverá reunião do Copom na próxima semana. A nova direção pode começar a corrigir a
política monetária, reduzindo a Selic. Temo que isso não aconteça devido à grande influência dos regulados
(mercado financeiro) sobre o regulador (BC).
De qualquer modo, desejo boa sorte e sucesso a Roberto Campos Neto.
Antes de imprimir, pense em tua responsabilidade e compromisso com o meio ambiente. Pense nisso! Sucesso! 1/1
Δ

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