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Claro, que fui logo convidado para a nova festa com instância para não
faltar.
Como só Deus é que dispõe, bastantes anos passaram sem que lá
voltassem; mas a ideia estava fixa, até que lá foi uma caravana dar o passeio
mas já com o almoço preparado, regado com vinho e bom chá, bem quente,
transportado em frascos termus.
Comido o almoço, em plena falda da serra, aquecidos pelo sol, abrigados
da aragem cortante e fria que havia, depois de lembrados Amigos, que estavam
– longe, bem longe -; fomos ver a capela, tomar contacto com o povo e conhecer
da festa, com as suas originalidades.
Abeirámo-nos dela, onde entramos e oramos, mas nunca vi capela
semelhante; a impressão que tive quando por lá passei, foi ainda prejudicada,
pois que o vão era térreo, tinha dois altares laterais – pequenos – e um ao
centro, tudo feito a picão grosso, na própria rocha; o telhado muito baixo, e o da
sacristia tão baixo que o padre para se paramentar, se não tivesse cuidado,
bateria com a cabeça nos barrotes; limpeza pouca, deixava mesmo muito a
desejar.
Desolados com o que vimos, fomos ao arraial; muita gente, algumas
juntas de gado – fraco – dando voltas à roda da capela; na abada da serra que
fica para o norte e que é mais plana, dois cordões de gente, colocados
paralelamente onde se viam homens, mulheres e crianças, tudo em mistura.
Perguntei o que estava aquela gente a fazer?
- Estão à espera do mordomo com o carro das merendeiras. Os Senhores
ponham-se também na linha.
Passado algum tempo, houve-se o estralejar de foguetes e os desafinados
sons da gaita de foles, com o seu respectivo acompanhamento de caixa e
bombo, e a seguir a estes musiqueiros, vinha um carro de bois com um toldo
coberto com colchas encarnadas.
Um velhote volta-se para mim e diz: - lá vem o carro com as merendeiras,
o Senhor não saia daqui que também lhe dão.
Assim foi.
O casso foi lentamente passando por entre duas filas de povo, e atrás do
carro, homens que entregavam a cada pessoa uma pequena merendeira de pão
frequentadores sem fé, que vão para ver os outros ou porque não pareça bem
não ir, porque vai o Sr. F., etc.
Que diferença de pureza de crença, com a que vemos, por vezes, por
algumas vilas e cidades!
Com uma fé assim, tão pura e tão despretensiosa, que fácil seria com a
explicação das diferentes orações, em linguagem correntia, criar-lhes um
carácter e consciência religiosa, tornando-os humildes, cônscios do seu proceder
para com os outros e exemplares na prática do bem.
Os sermões que lhe pregam, com citações em latim e figuras de retórica,
que eles não compreendem; só serve, para passarem tempo.
Enfim, não é a mim, simples mortal, que me compete remodelar ou
insurgir-me com a forma como a nossa sociedade é constituída; só me compete,
acatar.
Todavia, todos estes pensamentos que me vieram à mente e o que por lá
ouvi, fez-me lembrar, a fé com que minha Mãe me dizia quando pequeno: - «Vês
aquele ponto branco, na serra, muito longe; vês, vês bem, é a Capela de Nossa
Senhora de Belém».
È que minha Mãe, logo de pequeno, me incutiu a adoração pela Virgem
Nossa Senhora, pela sua infinita bondade, como salvação e guia para toda a
nossa vida.
Não fora ela santa!