Você está na página 1de 12

PLANEJAMENTO PARTICIPATIVO NA EDUCAÇÃO FÍSICA:

ANALISANDO UMA PROPOSTA NO ENSINO FUNDAMENTAL

BRASIL, Isabella Blanche Gonçalves – (Prefeitura Municipal de Bauru-SP, UFSCar)


isabgb@hotmail.com

CORRÊA, Denise Aparecida – UNESP


decorrea@unesp.br

Eixo Temático: Didática: Teorias, Metodologias e Práticas


Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

A Educação Física como componente curricular obrigatório da Educação Básica assume a


função de pensar a educação permeada por valores e atitudes solidárias, promovendo o
desenvolvimento da autonomia e do exercício da cidadania por parte dos alunos. Inquietações
relacionadas à prática do planejamento permeiam a ação docente, e repensar essa prática
possibilitou a ação de planejar coletivamente, dialogando com os alunos numa ação conjunta
e significativa, buscando novas formas de agir e transformar a realidade. Neste sentido, o
presente trabalho tem como objetivo analisar a elaboração e implementação de uma proposta
de aulas de Educação Física pautadas no Planejamento Participativo. Participaram dessa
pesquisa alunos do quarto ano do Ensino Fundamental I de uma escola da Rede Municipal de
Bauru-SP. A referência metodológica se pautou por uma pesquisa qualitativa do tipo pesquisa-
ação, tendo como instrumentos de coleta de dados os registros em diários de campo, os quais
após análise temática de conteúdo permitiram a elaboração de três categorias: A) Tempo de
Aula; B) Resistência e Aceitação ao Diálogo e C) Participação e Envolvimento. A partir das
discussões foi possível considerar que o Planejamento Participativo apresentou diversas
dificuldades tanto na sua elaboração quanto na implementação, porém, nenhuma delas
impossibilitou a realização do mesmo, apontando que houve significativas considerações
quanto ao desenvolvimento da reflexão, autonomia e criticidade dos alunos, tornando-os
protagonistas e co-responsáveis processo.

Palavras-chave: Educação Física Escolar. Planejamento Participativo. Ensino Fundamental.

Introdução

Inquietações relacionadas ao planejamento pedagógico permeiam a prática docente,


quanto aos conteúdos desenvolvidos, à aplicação destes conteúdos, a avaliação e,
7620

principalmente, a percepção dos alunos quanto a essas ações. Dessa forma, por que não
dialogar com eles sobre o planejamento, ou melhor, por que não planejarmos juntos? Por que
não ouvi-los? Por que não construirmos juntos, e transformarmos o planejamento numa ação
conjunta e significativa para todos?
Neste sentido, o presente trabalho tem como objetivo analisar a elaboração e
implementação de uma proposta pautada no Planejamento Participativo, para as aulas de
Educação Física de uma turma do quarto ano do Ensino Fundamental ciclo I, de uma escola
da Rede Municipal de Ensino de Bauru-SP.

Planejamento Participativo e Educação Física

Segundo Dalmás (1994) o planejamento exige uma tomada de decisão que ocorre em
uma ação contínua, visando o desenvolvimento individual e comunitário, configurando a
participação e dessa forma aponta-o como Planejamento Participativo.
Vianna (1996) define Planejamento Participativo como uma estratégia de trabalho no
qual pessoas interagem em função de objetivos comuns. É flexível, pois procura adaptar-se a
cada situação específica, prioriza o diálogo, a contribuição e a colaboração de todos os
envolvidos, porém, não é uma atividade espontânea, necessita ser incentivada para que todas
as suas potencialidades se efetuem em ações criativas e participativas.
No Planejamento Participativo, o grupo toma consciência de suas necessidades, seus
problemas, da importância do diálogo pela discussão, negociação e trocas, que vão se
aperfeiçoando e promovendo uma mudança social, no sentido de aprender a conviver, pois
promove uma nova forma de pensar, decidir e agir. (DALMÁS, 1994, VIANNA, 1996).
No âmbito escolar o ato de planejar é tarefa comum dos professores, porém,
apresenta-se muitas vezes dissociado, quando pensamos a educação como um processo de (re)
construção social e de formação do ser humano, assim, o Planejamento Participativo
apresenta-se como ferramenta possível na operacionalização desse processo (GEMERASCA
E GANDIN, 2002).
De acordo com Rodrigues e Galvão (2005), na tarefa do trabalho coletivo as pessoas
se tornam agentes responsáveis pelo bem comum que ajudam a construir, dessa forma, a
implementação de ações nas quais os alunos passam a ser protagonistas de seu processo de
formação, são muito relevantes.
7621

Correia (1996) ao desenvolver o Planejamento Participativo identificou que o trabalho


nesta perspectiva contribuiu para: maior participação dos alunos nas aulas; maior valorização
do componente curricular entre alunos e direção; melhoria na qualidade da relação professor
aluno; maior repercussão do trabalho em relação aos grupos da área que não estavam
engajados. Porém o autor apontou algumas dificuldades, como: o desgaste pessoal; as
limitações de seu processo de formação profissional para avaliar sua práxis e a dificuldade de
subsídios teóricos para desenvolver discussões.
Outras propostas exploraram o Planejamento Participativo, porém a maioria ocorreu
no contexto do ensino médio, utilizando-o como estratégia para aumentar a participação e o
interesse dos alunos pelas aulas. (SOUZA E FREIRE, 2008, CARNEIRO, 2006, GOTTO,
2010). No entanto, o trabalho de Rosa (1999), utilizou o Planejamento Participativo no âmbito
do Ensino Fundamental, com alunos das 3ª e 4ª séries, para estruturar um conteúdo específico
(jogos populares), elaborando os planos de aula de Educação Física.

Trajetória Metodológica

Para este estudo utilizou-se a abordagem qualitativa e a pesquisa–ação como tipo de


pesquisa associada, pois, possibilita ao pesquisador desempenhar um papel ativo diante dos
problemas encontrados durante o acompanhamento das aulas. O instrumento de coleta de
dados utilizado foram registros em diário de campo. (THIOLLENT, 1988, LÜDKE E
ANDRÉ, 1986, BOGDAN; BIKLEN, 1991).
Assim, o presente estudo se realizou em uma escola da Rede Municipal de Bauru-SP,
com uma turma de quarto ano do Ensino Fundamental ciclo I composta por 30 alunos entre 9
a 10 anos. A escolha por esse nível de ensino foi com o intuito de possibilitar a continuidade
da proposta no ano seguinte e também pelas inquietações relacionadas ao planejamento
centrado na professora, bem como, pela escassez de propostas curriculares para o mesmo.
A proposta analisada ocorreu nos meses de fevereiro, março e abril de 2011, sendo que
no mês de fevereiro, o foco foi o diálogo para elaboração do Planejamento Participativo e os
meses de março e abril, destinaram-se as intervenções, contemplando onze aulas registradas
em diários de campo (numerados de I a XI), que foram submetidos à análise categorial
temática, que é conceituada como a unidade de significado, sendo extraída do texto, e consiste
em descobrir os “núcleos de sentido” que compreendem a comunicação e sua aparição pode
significar algo para o objetivo escolhido. (GOMES, 2010)
7622

Resultados e Discussões

A partir da análise das intervenções relatadas em diários de campo obteve-se como


resultados o estabelecimento das seguintes categorias:

A) Tempo de Aula

Nessa categoria é possível apontar que O tempo foi um elemento que permeou a
elaboração e a aplicação da proposta do Planejamento Participativo, pois este apareceu
inúmeras vezes como fator limitante do diálogo e das atividades combinadas, como foi
observado nesses trechos dos diários de campo I, VII e VIII respectivamente:

Comentei sobre o pouco tempo que tínhamos e que se fosse um jogo novo nós não
conseguiríamos executá-lo, então concordamos que fizéssemos um jogo já
conhecido e o escolhido por eles por votação foi corrida pô. (...) Foi um tempo
muito curto, dessa forma não houve conversa final, logo bateu o sinal, e ainda
ficamos uns três minutos além do horário vivenciando o jogo. (DCI)

Como o tempo foi reduzido, combinamos de conversar sobre as estratégias na


próxima aula. (DCVII)

Então fizemos algum tempo essa atividade e logo tocou o sinal para o recreio,
dispensei os alunos e guardei o material, deixando a conversa sobre a atividade para
a próxima aula. (DCVIII)

Através desses relatos foi possível evidenciar que o tempo da aula não era suficiente e
limitava algumas discussões e embora elas acontecessem posteriormente, já não era possível
retomar de forma tão intensa, as impressões, sensações e tensões como no momento em que
elas ocorriam.
Nesse sentido, o reduzido tempo de aula, e principalmente, sua realização apenas uma
vez por semana, como acontece na rede municipal de Bauru, comprometeu as vivências
práticas combinadas conjuntamente com os alunos. Em determinados momentos os alunos
externaram desânimo e insatisfação com a proposta dialogada, pois quando o diálogo se
prolongava a ponto de inviabilizar a realização da vivência prática, causava desmotivação,
como é observado nesse outro trecho do Diário de Campo II:

Continuamos a escolha dos conteúdos, porém mesmo assim, muitos saíram


desanimados por não terem feito vivências práticas, pois esse processo de discussão
de escolha foi prolongado até o final da aula, não restando tempo para tais vivências.
(DCII)
7623

Nas ocasiões em que o tempo para as atividades práticas ficou muito reduzido ou
inexistente gerou descontentamento e despertou inúmeras reclamações por parte dos alunos,
como pode ser observado no Diário de Campo III:

Como o sinal tocou, combinamos que na próxima aula faremos uma conversa sobre
as regras, devido as inúmeras reclamações. Os alunos saíram reclamando também do
tempo de prática que foi reduzido, pois contamos com apenas 55 minutos de aula de
Educação Física semanal, e as discussões foram extensas, sobrando poucos minutos
para a prática. Mais uma vez os alunos saíram um pouco desanimados da aula.
(DCIII)

A questão do tempo não propiciou contexto favorável de participação e envolvimento


de todos, pois implicou na adoção de medidas para administrá-lo de modo a concretizar os
combinados, o que culminou em alguns momentos, na centralização e no direcionamento das
ações na professora, como observado no Diário de Campo VI e VIII:

Nesse primeiro momento escolhi a estratégia de aula diretiva, mostrando o


movimento e os alunos repetindo. (...) Em seguida coloquei os meninos de um lado e
as meninas do outro (também para economizar tempo) e fizemos um mini jogo com
saque e retenção da bola. (DCVI)

Então, peguei uma bola de vôlei e dividi a turma em dois rapidamente para que
pudéssemos entender a dinâmica de não deixar a bola cair no chão, passando-a por
cima da rede de vôlei. (DC VIII)

Com relação à avaliação como pode-se observar no trecho do Diário de Campo VII
descrito abaixo, as estratégias tiveram participação dos alunos, porém de forma limitante
devido ao fator tempo que influenciou diretamente na escolha inicial dos mesmos:

Os alunos sugeriram as opções de avaliação oral e da observação e eu sugeri a forma


escrita. Expliquei que a avaliação oral tomaria certo tempo, porque eu teria que
ouvir um por um, a escrita também, mas este seria menor que a oral, e a observação
poderia ser através de um jogo que eles realizassem, desde a organização até o jogo
em si, que também tomaria tempo, mas também menor que a avaliação oral. Então
por votação ganhou unanime a avaliação por observação com a organização de um
jogo de queimada. (DCVII)

Dalmás (1994) aponta que no processo participativo é preciso participação nas


responsabilidades, num verdadeiro desafio pelo envolvimento de todos no processo. Assim,
quando as discussões sobre a proposta já estavam encaminhadas, o tempo foi suficiente para
as atividades propostas, no entanto as discussões finais eram sucintas e breves. Isso mostra
7624

que era possível realizá-las, mas aconteciam de forma limitada. Pode-se observar este fato nos
seguintes trechos dos Diários de campo IV e VI respectivamente:

Utilizamos 5 minutos do intervalo para nos reunirmos em roda e retomarmos o que


foi aprendido. Enfatizei que era preciso se organizar melhor para otimizar o tempo e
que se dedicassem para entender melhor as regras. (DCIV)

Em seguida conversamos sobre a aula, e que iríamos aprender aos poucos, que não
era tudo numa aula só. Alguns alunos me disseram que a aula foi muito legal. Aluno
14: “Foi muito legal professora!” Aluna 4: “Adorei Pro.” Aluna 15: “Se viu pro eu
consegui sacar!” Em seguida fomos para o recreio.(DC VI)

No entanto, quando realizou-se as discussões iniciais sobre a distribuição dos


conteúdos ao longo do ano, houve uma reflexão sobre o tempo e acredita-se que a partir desse
momento e ao perceberem que era um fator limitante, os alunos passaram a se organizar no
sentido de otimizá-lo, como observado no Diário de Campo II e X:

Quantas aulas temos na semana?” Eles responderam: - “Uma aula!” E eu respondi: -


“Isso mesmo! E por mês? Vamos fazer as contas!” Aluno 13 me respondeu: -
“Quatro aulas! É pouco né!”– “Sim” (eu disse). “Vamos ver no ano?” “São doze
meses” (disse o Aluno 5). Eu disse: - “Sim, no ano são doze meses, mas não temos
aula todos os meses do ano então fazendo as contas, são aproximadamente 36 aulas
por ano”. Aluno 6 disse: - “É muito!”E Aluno 13 falou: - “É nada, é pouco!”E eu
completei dizendo que era pouco sim, e que precisaríamos aproveitar bem nosso
tempo, e que se fossem duas aulas na semana seria aproximadamente sessenta aulas.
Aluno 13 falou: - “Ai seria bom!”Eu completei dizendo que não teríamos número de
aulas suficiente para abordarmos tudo o que foi mencionado. (DCII)

...percebi que os alunos aproveitaram bem o tempo e se empenharam nas atividades,


pois o tempo era menor ainda. (DCX)

Assim, nessa categoria foi possível observar que o tempo apesar de limitar, permitiu
por outro lado aquisição de conhecimentos significativos quanto a organização e otimização
do tempo. Nesse contexto, o tempo se apresentou como fator limitante, porém não impediu
que a proposta acontecesse e a partir dessas limitações foram apontados outros aprendizados,
como a auto-organização dos alunos perante o que foi previamente combinado no
planejamento.

B) Resistência e Aceitação dos Alunos ao Diálogo

Nessa categoria prevaleceu como elemento central o diálogo sob duas perspectivas
que se apresentaram prevalentes nos relatos: a resistência e a aceitação dos alunos, que
demonstraram descontentes pelo pouco tempo de prática e pela “perda tempo” com as
7625

discussões. Isso fica evidente nos seguintes trechos dos Diários de campo I e II
respectivamente:

Após essas explicações e solicitações, alguns alunos, em torno de cinco ou seis,


todos do gênero masculino mostraram-se incomodados com a falta da parte prática
da aula, perguntando se iria demorar a irmos para quadra... (DCI)

O Aluno 9 disse: - “Nós não vamos ter Educação Física?” E então eu lhe respondi
que já estávamos tendo, e que aquela era a escolha do que seria feito nas aulas, ele
me respondeu: - “Mas nós já escolhemos, vamos fazer?”
Quando estávamos fazendo a contagem, o Aluno 9 disse: - “Estamos perdendo
tempo”. Iniciei um diálogo com uma pergunta: - “Por que estamos perdendo
tempo?” E ele respondeu: - “Porque não vamos pra quadra”. (DCII)

Porém, Vianna (1996) indica que o diálogo não é uma atividade espontânea, necessita
ser incentivado, desse modo, é imprescindível que o diálogo aconteça nessa proposta
participativa, mas, fica claro nos trechos dos Diários de campo citados acima que alguns
alunos têm um imaginário de que a Educação Física seja somente vivências práticas,
demonstrando que não estão habituados com a vivência do diálogo.
Entendo que como explicam Rodrigues e Galvão (2005), o diálogo é a base que
permite que as pessoas discutam, para se conscientizarem e se posicionarem a respeito dos
problemas. No entanto, que os alunos aprendem de formas distintas, pois fica evidente que
uns apresentam maior resistência ao diálogo em relação a outros, como mostram esses trechos
dos Diários de campo III, IV e VI respectivamente:

...começamos o diálogo relembrando que estávamos colocando os conteúdos


escolhidos na ordem que seriam abordados, pois já havíamos selecionado os que
seriam aprendidos no decorrer do ano. Nesse momento, o Aluno 7 falou: - “De novo
isso?” E o aluno 14 disse: - “Não é de novo é continuação!” (DCIII)

...o Aluno 3 falou: - “De novo esse papel amarelo, isso é chato.” Então, abri o cartaz
e lhes perguntei o que era aquilo, e a maioria respondeu que eram as coisas que eles
iriam aprender durante o ano.(DCIV)

O Aluno 7 falou resmungando: -“De novo vamos conversar desse cartaz, é chato!”
Então, eu disse que era importante refletirmos sobre o que estávamos fazendo, e que
era necessário agora conversarmos sobre a avaliação, e como seria feita a
verificação da aprendizagem.(DCVI)

Em diversos momentos foi retomada a questão da participação na proposta, se os


alunos estavam de acordo com o que estava sendo feito, e isso fica evidente nos trechos
relatados nos Diários de campo V:
7626

Porém o Aluno 3 disse: -“Ainda bem que hoje não tem aquele papel amarelo” (se
referindo ao cartaz com os conteúdos). Então perguntei novamente se estavam
concordando com essa proposta dialogada, se queriam continuar ou se preferiam que
eu decidisse sozinha as coisas. (DCV)

Porém, à medida que o diálogo foi sendo estimulado e exercitado, sua prática tornou-
se mais comum, como aponta Dalmás (1994), a participação é “construção em conjunto”, na
qual todos têm sua palavra a dizer.
Isso favoreceu um envolvimento maior de alguns alunos no processo de construção
coletiva, como é observado nesses trechos dos Diários de campo II e III respectivamente:

Dessa forma eles se mostraram mais animados com a proposta. O Aluno 6 disse: “-
É, dança não é só de menina!” E a Aluna 2: “É na escola de balé tem muito menino
que dança!” Mesmo assim, perguntei novamente a eles se gostariam de participar, de
continuar nessa proposta e todos se manifestaram a favor.
E o Aluno 13 respondeu: - “Cê num ta entendendo, Aluno 9?!” E a Aluna 2
respondeu: - “Nós estamos decidindo o que vamos fazer.” (DCII)

Assim, o Aluno 14 disse: - “Vamos votar?” Todos concordaram, e comecei a


votação, explicando que aquele que teria mais voto seria o primeiro e assim por
diante. (DCIII)

Assim, no decorrer da proposta foi possível observar como a prática do diálogo foi
sendo utilizada com maior frequência pelos alunos, como pode ser observado nos trechos dos
Diários de campo V, IX, e X respectivamente:

A Aluna 2 falou: -“Vale a pena aprender coisas novas”.


Novamente me responderam com unanimidade que não, que preferiam participar.
(DCV)

Chegando até a quadra, todos já sentados em círculo, conversamos sobre o conteúdo


e as estratégias, e o que eles estavam achando. Me disseram que estavam
gostando...(DCIX)

A Aluna 1 disse: “Porque a gente pode falar, não é só a sua opinião”, já o Aluno 13
disse: “A gente também decide as coisas.”(DCX)

Nesses relatos foi possível observar que esse tipo de prática despertou o interesse pela
participação, com o envolvimento critico nas discussões, mostrando o valor que foi dado a
proposta, como pode-se observar no trecho: “Vale a pena aprender coisas novas” dito pela
aluna 2 (DCV). Outro aspecto é o de protagonismo por parte dos alunos, evidente na fala do
aluno 13 “A gente também decide as coisas”. (DCX).
7627

Assim, percebe-se que o diálogo não é algo habitual nesse contexto, e que embora isso
se apresentou como dificuldade inicial, foi sendo desenvolvido e se tornando comum na
medida em que foi propiciado, estimulado e exercitado com os alunos.

C) Participação e Envolvimento

Gadotti (1999) coloca que educar significa formar para a autonomia, permitindo a
reflexão sobre a prática e consequentemente a necessidade de sistematizá-la e organizá-la.
Assim, nessa categoria é possível analisar a proposta de acordo com a participação,
observando que esta não atingiu a totalidade dos alunos de forma efetiva, como mostra os
trechos dos relatos em Diários de campo, pois nem todos os alunos participaram com
opiniões, sugestões ou criticas, mas é possível identificar que os alunos estão começando a
perceber esse fato e que com incentivo pode-se promover maior envolvimento dos mesmos.
Este fato se evidencia nos seguintes trechos dos Diários de campo II e XI
respectivamente:

Percebi que aproximadamente seis alunos, não se manifestavam e que pareciam até
alheios a tudo. (DCII)

Perguntei se eles acharam que todos estavam participando igual, e o Aluno 10


respondeu: “Eu acho que não!” Assim, falei da importância de todos participarem,
porque uns são mais desinibidos que os outros, mas que todos têm o direito de
participar, de opinar e de discutir. (DCXI)

Outra observação é de que o professor também apresenta dificuldades de trabalhar


nessa proposta, pois não fomos educados nessa perspectiva de participação, dessa forma fica
claro que é uma ação conjunta de professor e aluno, um aprendizado de duas vias que ocorre
nesse processo participativo que pode ser muito rico também para quem ensina e não só para
quem aprende, como aponta Freire (1996) quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende
ensina ao aprender, num trabalho de ação e reflexão. Isso se evidencia nos seguintes trechos
dos Diários de campo I e VII

Percebo que é necessário motivar e conscientizar sobre a participação dos alunos nas
escolhas e decisões sobre as aulas e ainda sobre as responsabilidades e
consequencias desse processo, pois como estão habituados a cumprirem o que lhes é
imposto, nem sempre é fácil para o professor planejar de modo participativo, já que
não fomos educados nesse sentido. (DCI)
7628

...como participante desse processo de construção, coloquei meu ponto de vista,


dizendo que para mim como professora era difícil avaliar dessa forma, pois foi
possível ver a participação de algumas pessoas, mas de outras não, então ficava
complicado ter que dar uma nota se não foi possível observar todos da mesma forma
e cada um teve uma participação diferente do outro. (DCVII)

Nessa categoria observou-se a dificuldade de envolver todos os sujeitos pertencentes


no contexto do processo participativo, pois quando solicitada a participação indireta dos pais
na escolha de conteúdos, através de uma pesquisa realizada pelos alunos, essa não teve um
resultado positivo, como mostra o trecho do Diário de Campo II:

A proposta inicial era que alunos fizessem uma pesquisa com os pais sobre o que
deveriam aprender nas aulas de Educação Física, para que houvesse uma
participação da família nessa construção coletiva, porém tal pesquisa não foi
realizada pela maioria dos alunos, e as que foram realizadas, apresentaram
informações confusas. (DCII)

Fica evidente que a participação dos alunos deve ser estimulada, assim como o diálogo
mencionado na categoria anterior, porém, a participação efetiva nas decisões deve ser
incentivada como direito e dever de se envolver no processo, de protagonizar o ensino. Como
aponta Vianna (1996) a ação dialógica caracterizada pela discussão, negociação e trocas, vai
se aperfeiçoando e promovendo uma mudança social, no sentido de aprender a conviver. E na
visão dos alunos sobre a proposta não houve comentários desfavoráveis, apontando que há

uma “vontade” de participação por parte deles, como observado nos trechos do Diário de

Campo XI.

Assim, perguntei aos alunos o que eles achavam sobre o planejamento, nesta
perspectiva da construção coletiva com a seguinte pergunta: “O que vocês estão
achando de trabalhar desse jeito, de decidir junto os conteúdos e as formas de
avaliar?” Aluno 3: “Legal”. Aluna 11: “Porque todo mundo deu opinião do que
queria.” Aluno 14: “Pra gente saber o que a gente ia fazer o ano inteiro.” Aluno 9:
“As meninas escolheram coisas que elas gostam e os meninos coisas que a gente
gosta.”. Conversamos também sobre as formas de avaliar, novamente perguntei-lhes
se foi difícil colocar no papel o que aprenderam na aula prática. Aluno 14: “A gente
pode pensar sobre o que aprendeu!” Aluna 1: “Foi fácil.” Aluna 4: “Eu
gostei.”(DCXI)

Assim, Vianna (1996) ressalta as vantagens, desse planejamento, pois ele assume uma
imagem de credibilidade, e o grupo se responsabiliza, tomando consciência de suas
necessidades, num processo contínuo. Dessa forma, observa-se nesses trechos que quando
incentivados, os alunos se mobilizam e se organizam, apontando que o ensino torna-se mais
7629

significativo, e isso se evidencia na fala do aluno14 descrita no trecho acima do Diário de


Campo XI: “A gente pode pensar sobre o que aprendeu”, possibilitando assim, perceber a
importância de um trabalho coletivo e participativo, no despertar da criticidade e da reflexão.

Considerações Finais

O Planejamento Participativo apresenta-se como uma prática relevante para auxiliar no


processo de ensino, incentivando ações protagonistas, apontando que a elaboração
participativa do planejamento é uma “utopia possível”, usando as palavras de Freire (1996).
Contudo, a elaboração e a implementação da proposta apresentaram diversas
dificuldades como: a questão do tempo reduzido de aula, a resistência ao diálogo e a não
participação efetiva de todos no processo. No entanto, apesar das limitações foi possível
apontar inúmeras conquistas como: a organização em relação ao tempo escasso de aulas; a
aceitação pelo diálogo, à medida que foi sendo estimulado e exercitado pelos participantes;
maior envolvimento e participação na proposta, pois houve a mobilização e organização dos
alunos ao apontarem que o ensino dessa forma, torna-se mais significativo.
Penso que propostas como estas são um desafio aos que pretendem desenvolvê-la. É
necessário que acreditem em uma proposta dialogada, em que transponham os obstáculos,
construindo coletivamente e possibilitando uma educação democrática na qual os alunos se
tornem protagonistas desse processo.

REFERÊNCIAS

ANDRÉ, M. E. D. A. A pesquisa no cotidiano escolar. IN: FAZENDA, I. (org), Metodologia


da pesquisa educacional, 2 ed. São Paulo: Cortez, 1991. (Biblioteca da educação. Série 1,
Escola, v. 11).

BOGDAN, R. C, BIKLEN, S. K. Investigação qualitativa em educação. Portugal: Porto,


1991.

CARNEIRO, E. B. Planejamento Participativo nas aulas de Educação Física no ensino


noturno: um relato de experiência. Revista Digital Educación Física y Deportes, Buenos
Aires, Ano 11, nº 98, jul. 2006.

CORREIA, W. R. Planejamento Participativo e o Ensino de Educação Física no 2º grau.


Revista Paulista Educação Física. São Paulo, 1996, supl. 2 p. 43-48..
7630

DÁLMAS, A. Planejamento Participativo na escola: elaboração, acompanhamento e


avaliação. Petrópolis: Vozes, 1994.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25ª ed.


Coleção leitura. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

GEMERASCA, M. P., GANDIN, D. Planejamento Participativo na Escola: o que é e como


se faz. São Paulo: Edições Loyola, 2002.

GOMES, R. Análise de dados em pesquisa qualitativa In: DESLANDES, S. F.; CRUZ NETO,
O.; GOMES, R.; MINAYO, M. C. S.(org.) Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 30ª
ed., Petrópolis: Vozes, 2011.

GOTTO, V. M., FERREIRA, L. A. Planejamento Participativo na Educação Física


Escolar: uma análise de uma turma do ensino médio. 2010. Trabalho de conclusão de curso –
Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2010.

LÜDKE, M. ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. 1ª ed.


São Paulo: EPU, 1986.

RODRIGUES, L. H., GALVÃO, Z. Novas formas de organização dos conteúdos. In:


DARIDO, S. C., RANGEL, I. C. A. (org). Educação Física na Escola: implicações para a
prática pedagógica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.

ROSA, A. A. Planejamento Participativo: estruturação e vivência dos jogos populares no


Ensino Fundamental. 1999. Trabalho de conclusão de curso – Universidade Federal de São
Carlos, São Carlos, 1999.

SOUZA, A. G., FREIRE, E. S. Planejamento Participativo e Educação Física: envolvimento e


opinião dos alunos do ensino médio. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte. São
Paulo, 2008, vol. 7, nº 3, p. 29-36.

THIOLLENT, M. Metodologia da pesquisa-ação. 4ª ed. São Paulo: Cortez: Autores


Associados, 1988.

VIANNA, I. O. A. Planejamento Participativo na escola: um desafio ao educador. São


Paulo: EPU, 1986.

Você também pode gostar