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O Brasil vive uma crise na segurança pública e isso não é segredo.

No ano 2018
foram registrados 51.589 mortes, dessas mortes, 6.220 foram decorrentes de
intervenções policiais em serviço e fora de serviço. Em 2013 esse número era 2.212, o
que dá um aumento aproximadamente de 35,5%.
A polícia do estado do Rio de Janeiro matou mais de 8.000 pessoas na última
década, incluindo ao menos 645 em 2015. Três quartos dos mortos eram negros.
Considerando que a polícia no estado enfrenta ameaças reais de violência por parte de
facções criminosas, muitas dessas mortes foram, provavelmente, resultado de atos de
legítima defesa. Muitos outras, todavia, foram execuções extrajudiciais.
As mortes cometidas por policias em serviço aumentaram bastante. Um
exemplo: somente no primeiro semestre de 2020, sob comando do governador João
Doria (PSDB), os policiais do estado de São Paulo mataram 498 pessoas, a maior
quantidade de homicídios cometida por agentes da segurança pública desde 1996 –
quando a estatística começou a ser contabilizada pelo governo.
Segundo o Fórum Brasileiro De Segurança Pública – FBSP de 2019, entre 2017
e 2018 o crescimento foi de 19,6%, mesmo diante da redução dos homicídios,
latrocínios e dos crimes contra o patrimônio. Os estados que apresentaram maior
crescimento foram Roraima (183,3%), Tocantins (99,4%), Mato Grosso (74%), Pará
(72,9), Sergipe (60,7), Goiás (57,1), Ceará (39%) e Rio de Janeiro (32,6). Ainda de
acordo com o FBSP de 2019, a cada 100 mortes violentas intencionais (MVI) que
ocorrem no país, 11 são de autoria da polícia. Ao se adotar a proporção acima como
referência, identificamos que, em 2018, há indícios de uso abusivo da força letal por
parte das polícias em 9 estados brasileiros (em 2017, eram 5 estados). Estes números
colocam o Brasil em um ranking bastante ingrato da América Latina, dentre as polícias
que mais produzem mortes em suas intervenções.
O uso abusivo da força policial, principalmente vindo da Polícia Militar, é
histórico e recorrente no Brasil. Um dos principais pontos em jogo nesse sentido é
quando o policial mata uma pessoa em serviço. Geralmente ele fica amparado no artigo
23do Código Penal, ao ser cometida “em estado de necessidade, em legítima defesa ou
em estrito cumprimento do dever legal”. Esse último item enquadra a atividade policial.
Entretanto, vemos o argumento de legítima defesa sendo usado mesmo quando um
policial mata, pelas costas, uma pessoa desarmada.
Casos de mortes não são os únicos que demonstram o quanto nossa polícia é
violenta, as abordagens policiais também são. Vemos todos os dias em jornais policiais
dando tapa na cara de pessoas, sendo extremante truculentos em suas abordagens, e isso
configura uma violência policial e abuso de autoridade.
As autoridades do estado do Rio de Janeiro adotaram recentemente medidas
importantes para solucionar o problema dos homicídios cometidos pela polícia. Além de
criarem um grupo especial de promotores de justiça dentro do Ministério Público do
estado que se encarrega especificamente de abusos cometidos pela polícia e nas prisões,
o GAESP, as três delegacias de homicídios da polícia civil começaram a investigar uma
parte dos homicídios cometidos pela polícia, e a polícia militar instituiu um programa
piloto para equipar policiais com câmeras acopladas aos seus coletes. Essas medidas,
ainda que bem-vindas, estão muito aquém do necessário para acabar com a impunidade
para execuções extrajudiciais e acobertamentos, e quebrar o ciclo de violência que tem
impedido a polícia fluminense de proteger adequadamente as comunidades a que serve.
Em junho de 2016, a polícia militar do Rio iniciou um projeto-piloto para
equipar a polícia com câmeras acopladas ao colete. O uso das câmeras acopladas ao
corpo usadas pelos policiais durante sua patrulha pode desempenhar um papel
fundamental na redução da impunidade nos casos de execuções extrajudiciais
perpetradas por policiais. O vídeo e o áudio gravados antes, durante e depois de um
confronto podem fornecer à polícia civil e aos promotores de justiça, informações
extremamente valiosas para determinar se o uso da força era legal, se o depoimento dos
policiais condiz com a realidade, se houve alteração da cena do crime, das provas ou
qualquer outra iniciativa com o objetivo de acobertar os fatos. O uso de câmeras
acopladas ao corpo também pode trazer outros benefícios importantes para os policiais.
Nos casos em que o uso da força foi realizado dentro dos parâmetros legais, as
gravações poderiam protegê-los de falsas acusações. Nos casos em que alguns agentes
usem a força de maneira ilegal, a câmera poderia ajudar a proteger outros oficiais da
pressão para participarem de um eventual acobertamento, uma vez que as gravações
tornariam esses esforços inúteis. Melhorar as condições de trabalho e salário
teoricamente também seria uma boa alternativa para aliar às outras para que a polícia
brasileira seja menos violenta.
REFERÊNCIAS

FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA – FBSP. Anuário brasileiro de


segurança pública. Edição XIII. São Paulo, 2019.

Misse, Michel; GRILLO, Carolina Christoph ; Neri, N. E. . Letalidade policial e


indiferença legal: a apuração judiciária dos 'autos de resistência' no Rio de Janeiro
(2001-2011). Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, v. 1, p. 43-72,
2015.

HUMAN RIGHTS WATCH (HRW). 2016. O Bom Policial tem medo – Os custos da
violência policial no Rio de Janeiro. ISBN 978-1-6231-338726. Brasil.

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