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Anarquismo- Textos seletos 

André Tunes, Carlos Eduardo, Augusto Vostok, 


Angelo Antunes, Eikon Murilo Antunes, Rodrigo 
Lemes, Michel Felipe.

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Apresentamos a vocês uma seleção de textos feitos pelo coletivo
Consciência Subversiva​, para articulação e propaganda do ideário libertário
dentro de uma ótica teórica e crítica. Ela não possui direitos autorais pode e
deve ser reproduzida no todo ou em parte, além de ser liberada a sua
distribuição, preservando seu conteúdo e o nome do autor.

“Quereis estudar com proveito? Começais por imolar um a um


os mil preconceitos que vos foram ensinados!”​ ​Piotr Kropotkin

Anarquia e Paz @2019

Tag: Esquerda e direita, organização, direito, economia, religião, política.

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1. ​Anarquismo e jusnaturalismo

Da série jusnaturalismo e AnCom

Aqui iniciarei expondo as bases do pensamento jusnaturalista

“CREONTE
Ó tu, que manténs os olhos fixos no chão, confessas, ou negas, ter feito o que ele diz?
ANTÍGONE ergue-se, e fita-o de frente, com desassombro
ANTÍGONE
Confesso o que fiz! Confesso-o claramente!
CREONTE
(Ao guarda) Podes ir para onde quiseres, livre da acusação que pesava sobre ti! (a Antígone)
Fala, agora, por tua vez; mas fala sem demora! Sabias que, por uma proclamação, eu havia
proibido o que fizeste?
ANTÍGONE
Sim, eu sabia! Por acaso poderia ignorar, se era uma coisa pública?
CREONTE
E apesar disso, tiveste a audácia de desobedecer a essa determinação?
ANTÍGONE
Sim, porque não foi Júpiter que a promulgou; e a Justiça, a deusa que habita com as divindades
subterrâneas jamais estabeleceu tal decreto entre os humanos; nem eu creio que teu édito tenha
força bastante para conferir a um mortal o poder de infringir as leis divinas, que nunca foram
escritas, mas são irrevogáveis; não existem a partir de ontem, ou de hoje; são eternas, sim! e
ninguém sabe desde quando vigoram! — Tais decretos, eu, que não temo o poder de homem
algum, posso violar sem que por isso me venham a punir os deuses! Que vou morrer, eu bem sei;
é inevitável; e morreria mesmo sem a tua proclamação. E, se morrer antes do meu tempo, isso
será, para mim, uma vantagem, devo dizê-lo! Quem vive, como eu, no meio de tão lutuosas
desgraças, que perde com a morte? Assim, a sorte que me reservas é um mal que não se deve
levar em conta; muito mais grave teria sido admitir que o filho de minha mãe jazesse sem
sepultura; tudo o mais me é indiferente! Se te parece que cometi um ato de demência, talvez mais
louco seja quem me acusa de loucura!” Antígona pág 29-30-31(Sófocles)

Para melhor entender aí Antigone está dizendo que embora seja proibido enterrar Polinice, ela
pode fazê-lo pois é um direito natural, tendo em vista que a morte é comum a todos.

“Da justiça política, uma parte é natural e outra parte legal: natural, aquela que tem a mesma força
onde quer que seja e não existe em razão de pensarem os homens deste ou daquele modo; legal,
a que de início é indiferente, mas deixa de sê-lo depois que foi estabelecida: por exemplo, que o
resgate de um prisioneiro seja de uma mina, ou que deve ser sacrificado um bode e não duas
ovelhas, e também todas as leis promulgadas para casos particulares, como a que mandava
oferecer sacrifícios em honra de Brasidas, e as prescrições dos decretos.
Ora, alguns pensam que toda justiça é desta espécie, porque as coisas que são por natureza, são
imutáveis e em toda parte têm a mesma força (como o fogo, que arde tanto aqui como na Pérsia),
ao passo que eles observam alterações nas coisas reconhecidas como justas. Isso, porém, não é
verdadeiro de modo absoluto mas verdadeiro em certo sentido; ou melhor, para os deuses talvez
não seja verdadeiro de modo algum, enquanto para nós existe algo que é justo mesmo por

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natureza, embora seja mutável. Isso não obstante, algumas coisas o são por natureza e outras,
não.
Com toda a evidência percebe-se que espécie de coisas, entre as que são capazes de ser de
outro modo, é por natureza e que espécie não o é, mas por lei e convenção, admitindo-se que
ambas sejam igualmente mutáveis. E em todas as outras coisas a mesma distinção será aplicável:
por natureza, a mão direita é mais forte; e no entanto é possível que todos os homens venham a
tornar-se ambidestros.” Ética a Nicômaco pág 109-110(Aristóteles)

Como vimos o direito natural não é oriundo de uma arbitrariedade humana, mas sim na natureza
humana, ele está contido nela e é desvendado pelos seres humanos pela razão, ou seja, ou seja,
este direito não se dá quando é positivado, mas sim antes disso, sua validade independe da
positivação do direito.

"O direito de natureza, a que os autores geralmente chamam jus naturale, é a liberdade que cada
homem possui de usar seu próprio poder, da maneira que quiser, para a preservação de sua
própria natureza, ou seja, de sua vida; e consequentemente de fazer tudo aquilo que seu próprio
julgamento e razão lhe indiquem como meios adequados a esse fim." Pág 47 leviatã(hobbes).

"Nós não nos cansamos com tão inúteis e tão supérfluas divisões. Todo o direito ou é natural ou é
positivo. O direito, como produz obrigação, há de provir de um superior. As gentes são todas
iguais, e o que umas constituíram não pode fazer direito para as outras. Daqui deduzo que ou o
que as gentes seguem é conforme à natureza racional e exigido pelas necessidades humanas, e
então é direito da Natureza, ou que são disposições arbitrárias dos primeiros homens, e então não
são outra coisa mais do que um direito civil, seguido e abraçado igualmente por diversos povos"
Tratado do direito natural pág 121(Tomás Antônio Gonzaga)

Para Gonzaga e hobbes(ele influenciou o gonzaga), o direito nada mais é do que o fazer ou não
fazer, sendo o natural relativo a algo que está contido em nós, como já expliquei anteriormente

No ancom:

“Buscar o prazer, evitar a dor, é o fato geral (outros diriam a lei) do mundo orgânico: é a essência
da vida.

Sem essa ânsia pelo prazer, a existência seria impossível. O organismo se desintegraria, a vida
cessaria.

Assim, qualquer que seja a ação do homem, qualquer que seja sua linha de conduta,

sempre funciona obedecendo a uma necessidade de sua natureza.


O ato mais repugnante, como o mais indiferente, ou o mais atraente, são todos igualmente ditados
pela necessidade do indivíduo. Trabalhando de uma maneira ou de outra, o indivíduo faz isso
porque sente prazer nisso, porque evita a si mesmo dessa maneira ou acha que pode evitar
aborrecimentos.

Aqui está um fato perfeitamente determinado, a essência do que tem sido chamado de teoria do
egoísmo.” A moral anarquista" pág 9(Kropotkin)

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“Vimos que as ações do homem, raciocinadas ou conscientes – depois falaremos de hábitos
inconscientes – têm a mesma origem. Os chamados virtuosos e aqueles que são chamados
viciosos, as grandes adesões como as pequenas expropriações, os atos elevados, como os
repulsivos, derivam da mesma fonte. Todos os fatos respondem às necessidades naturais do
indivíduo.
Seu objetivo é buscar o prazer, o desejo de escapar da dor.” A moral anarquista pág 9(Kropotkin)
Ver também se quiser ética a Nicômaco pág 33 em diante

“O homem ouviu, então aquela voz lhe disse: você vai viver em comunidade na terra, livre e
fraterno com seus semelhantes; seja social, a sociabilidade gerará o seu ser; Repouse onde
quiser a sua cabeça, pegue as frutas, mata a presa, faça amor, beba ou coma, você está sempre
em seu domínio; tudo pertence a você assim como a todos. Se quiser usar de violência com seu
próximo, macho ou fêmea, seu próximo irá te repelir com violência, e, você sabe, a força dele é
mais ou menos igual a tua; Libere todos os teus apetites, todas as tuas paixões, mas não se
esqueça que deve haver uma harmonia entre sua força e inteligência, entre o que lhe agrada e o
que agrada os outros. E agora, vai, a terra será para você, com essa condição, o jardim das
Hespérides.” Humanaesfera pag 26(Dejacque)

"Sabemos que nenhum povo está por enquanto moralmente preparado para proclamar a anarquia
e viver nela, tendo o cidadão as necessárias virtudes para viver dentro do seu direito, sem violar
os direitos alheios. Essas virtudes há de o povo adquiri-las mediante o ensino e o exemplo dos
homens superiores que têm a peito o advento do anarquismo, isto é, da liberdade absoluta, tendo
só a restringi-la a liberdade dos outros. Nem se diga que o anarquismo trará a liberdade do crime
O criminoso convicto não ficará impune: numa sociedade anárquica, o povo reunido constituirá um
tribunal de única instância que julgará sem recurso e executará ele mesmo as suas sentenças."
Conquista do pão pág 16(Kropotkin)
“Não há um único ser que não seja um brinquedo de circunstâncias e o homem como outros
seres. Depende da sua natureza e da natureza dos objectos que o rodeiam ou, para melhor, dos
seres à sua volta, porque todos esses objectos têm vozes que lhe falam e modificam
constantemente a sua educação.

Toda a liberdade do homem consiste em satisfazer sua natureza, ceder às suas atrações. Tudo o
que ele tem o direito de exigir de seus companheiros é que seus companheiros não atentem
contra sua liberdade, isto é, contra o desdobramento completo de sua natureza. Tudo o que eles
têm o direito de exigir dele é que ele não vá contra ele.” Humanaesfera pág 33-34(Dejacque)

"Todos os trabalhadores engajados na mina contribuem, na medida de suas forças, da sua


energia, do seu saber, da sua inteligência e da sua habilidade, para extrair carvão. E nós
podemos dizer que todos têm o direito de “viver”, de
satisfazer as suas necessidades e ainda as suas fantasias, depois que o necessário esteja
assegurado a todos." Conquista do pão pág 76(kropotkin)

Para uma visão ancol disto, ver escritos de filosofia política de bakunin página 93 a 102 ou “O
homem submetido a inevitabilidade universal”

Há de se saber que tanto Kropotkin como Dejacque e Bakunin, tinham um preconceito com o
direito, principalmente Dejacque e Bakunin com o direito natural, porém de forma indireta

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refundaram ele no sentido de retirar o caráter místico do mesmo, o que retorna a hipótese
formulada por hugo Grócio em 1625 no parágrafo 11 em direito da guerra e paz, mostrada aqui>

"Entre os outros animais, de fato, alguns moderam em certa medida seus instintos egoístas, parte
em favor de sua prole, parte em proveito dos outros da própria espécie. Esta disposição neles
procede, assim o cremos, de algum princípio inteligente exterior, porquanto, com relação a outros
atos que não estejam muito acima de seu alcance, igual soma de inteligência não aparece neles.
Pode-se dizer a mesma coisa das crianças, nas quais, mesmo antes de qualquer instrução, se
pode verificar o aparecimento de certa inclinação para a benevolência, como Plutarco o observou
com sagacidade. Assim também, nessa idade, a compaixão brota espontaneamente. Quanto ao
homem feito, capaz de reproduzir os mesmos atos a respeito de coisas que tenham relações entre
si, convém reconhecer que possui em si mesmo um pendor dominante que o leva ao social, para
cuja satisfação, somente ele, entre todos os animais, é dotado de um instrumento peculiar, a
linguagem. É dotado também da faculdade de conhecer e de agir, segundo princípios gerais,
faculdade cujos atributos não são comuns a todos os seres animados, mas são a essência da
natureza humana.

8. Este cuidado pela vida social, de que falamos de modo muito superficial, e que é de todo
conforme ao entendimento humano, o fundamento do direito propriamente dito, ao qual se referem
o dever de se abster do bem de outrem , o de restituir aquilo que, sem ser nosso, está em nossas
mãos ou o lucro que disso tiramos a obrigação de cumprir as promessas, a de reparar o dano
causado por própria culpa e a aplicação dos castigos merecidos entre os homens.

9. Dessa noção do direito decorreu outra mais ampla. De fato, o homem tem a mais que os
demais seres animados não somente as disposições para a sociabilidade de que falamos, mas
também um juízo que lhe permite apreciar as coisas, presentes e futuras, capazes de agradar ou
de ser prejudiciais e também aquelas coisas que podem levar a isso. Concebe-se que é
conveniente à natureza do homem observar, dentro dos limites da inteligência humana, na busca
dessas coisas, a conformação de um juízo sadio, o fato de não se deixar vencer pelo temor nem
pelas seduções dos prazeres presentes, de não se deixar levar por um ímpeto temerário. O que
está em oposição a um tal juízo deve ser considerado como contrário também ao direito da
natureza, isto é, da natureza humana.

10. A isso se refere ainda o que diz respeito a uma sábia economia, falando individualmente, na
distribuição gratuita das coisas que são próprias a cada homem ou a cada sociedade, como a
partilha segundo a qual a preferência dada ora ao sábio sobre o que tem menos sabedoria, ora ao
parente sobre o estranho, ora ao pobre sobre o rico, segundo os atos de cada um e segundo a
natureza que o objeto comporta. Desde longo tempo já muitos autores fazem dessa economia
uma parte do direito, tomado em sentido próprio e estrito, embora esse direito propriamente assim
denominado tenha uma natureza bem diferente, porquanto consiste em deixar aos outros o que já
lhes pertence ou em cumprir para com eles as obrigações que podem nos ligar a eles.

11. O que acabamos de dizer teria lugar de certo modo, mesmo que se concordasse com isso, o
que não pode ser concedido sem um grande crime, isto é, que não existiria Deus ou que os
negócios humanos não são objetos de seus cuidados. "

Aí ele demonstra uma possibilidade de defesa do direito natural sem necessariamente requerer
uma autoridade divina como sustentáculo deste, muito além disto na posição AnCom e também

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ancol, há a questão de que o exercício do direito natural, como na posse comum por exemplo é
tratado não na forma de X, ou Y poderem exercer isto, como na propriedade mas sim que todos
de forma geral poderem exercê-lo, claro não sem também expor a validade teórica disto, tanto de
forma antropológica, demonstrando que o direito natural da propriedade nada mais é que uma
quebra das relações coletivas naturais do ser humano também apontando os problemas que isso
gerou, quanto validade prática, como a questão dos meios organizados geograficamente podendo
usar tabelamento para cálculo de produção por ex

Mas isso não quer dizer que eles não trabalhem no caráter não natural que não seja nocivo a
esses direitos também, vejamos em Kropotkin por ex>>

"Mas numa sociedade que todos comam conforme precisarem, as necessidades do que hoje
chamamos luxo serão mais vivas. E como os homens não são iguais, sempre haverá, e é preciso
que haja, homens e mulheres cujas necessidades estejam acima da média numa qualquer
direção. Nem toda a gente precisa dum telescópio; há pessoas que preferem os estudos
microscópicos ao das estrelas. Uns gostam de estátuas e outros das telas dos mestres. Há quem
deseje um piano, enquanto outros se contentam com um berimbau. O camponês adorna o seu
quarto com uma imagem d’Espinal e se o seu gosto se desenvolvesse quereria ter uma bela
gravura. Acusa-se de ordinário as nossas sociedades comunistas idéias de terem por único
objetivo a vida
material de cada indivíduo: “Tereis talvez o pão para todos, nos dizem, mas não tereis nos vossos
armazéns comunais belas pinturas, instrumentos de óptica, móveis de luxo, ornatos em suma,
essas mil coisas que servem para satisfazer a infinita variedade dos gostos humanos. – E por isso
mesmo suprimis toda a possibilidade de se obter seja o que for fora do pão e da carne que a
Comuna pode oferecer a todos, e do pano cinzento com que ides vestir todas as vossas cidadãs"
pág 44 conquista do pão (kropotkin)

Só que esses direitos não-naturais, tomando como o exemplo o que eu chamo de posse pessoal
em kropotkin, como o próprio explica estão subordinado pela naturalidade, num sentido de não
estarem acima delas, ou seja, para um faminto tanto uma fruta de morango como um suco de
morango com leite servem ao mesmo propósito natural de atendimento de necessidade natural do
ser humano de se alimentar, isso provavelmente entraria na questão do direito consuetudinário,
em sentido parecido Bakunin irá tecer raciocínio semelhante acerca do livre arbítrio e inteligência
humana onde no caso sua não naturalidade estaria subordinado a naturalidade do ser social, e do
ser se alimentar, o melhor dizendo é que tanto kropotkin quanto bakunin entendem a sociedade
como natural, pois se dá naturalmente, mas seu conteúdo não, por isso que há a necessidade de
discernir nesse sentido para evitar abusos no exercício do direito, de forma que não ultrapasse a
naturalidade contida neste¹.

Diferente de por ex: hobbes ou kant, no anarquismo o direito não surge de uma necessidade de
coexistência, mas sim de uma coexistência natural(livre organização autônoma), o comum acordo
ao respeito do direito nasce disto, o monopólio da coerção só seria usado, de forma coletiva e em
casos raros, no que tange ao ostracismo por ex(pois não é uma livre desassociação, isso é
discutível, mas por enquanto é como eu vejo).
2.​ ​Axiologia do direito
[Juízo axiológico dos direitos base do AnCom.]

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Direito de bem estar(satisfação das necessidades naturais, contida em nós)
Direito de posse comum(satisfação da necessidade natural de relação do ser-objeto,
contida em nós).
Direito de Posse pessoal(satisfação das necessidades não-naturais de relação do
ser-objeto não contida em nós, as necessidades de luxo, das quais kropotkin fala)
Vou tratá-los de forma decrescente(do maior ao menor)
O direito de bem estar é o direito de satisfação das necessidades naturais gerais, contida
em nós como por ex: necessidade de se alimentar, aprender, luz,vida etc, sendo assim ele
está acima dos outros 2
O direito de posse comum, diz respeito do direito natural, contido em nós, de se relacionar
com objetos, sendo este pressuposto para outros direitos como o de se alimentar, moradia
etc
Este não está acima do direito de bem estar, pois implicaria, por exemplo, em ferir direitos
naturais, contidos no direito de bem estar, porém não relacionados ao direito de posse,
como direito à vida, e relacionados como o direito de alimentação, mostrarei isso em um
exemplo: eu com um grupo A de pessoas me relaciono com o objeto madeira, afim de me
proteger e os demais do frio e esquentar uma carne, paralelamente, há outro grupo B
tentando realizar o mesmo fim( e sim eles também tem carne), porém embora eu não
tenha privado eles de se relacionar com a madeira, pois nosso grupo deixou madeira lá,
mas por eu e meu grupo ter pegado madeira excessiva do local para realizar isto,
acabamos por privar o grupo B de realizar sua necessidade de se aquecer e se alimentar,
pois não havia madeira o suficiente para isto, prejudicando a necessidade do grupo B de
viver e ratificar sua vida, enfim seu direito à vida.
O direito de posse pessoal, está ligado ao de posse comum, sendo este relativo às
necessidades de luxo, estando governados pelos 2 acima, como mostrarei em um
exemplo: suponhamos que eu tenha um carro e vou dirigindo, em determinada hora vejo
um cadeirante que acabou quebrar sua cadeira, tendo seu direito de locomoção
prejudicado, eu omitir socorro nisso implicaria no não-respeito ao direito de posse comum
e o direito de locomoção(que primariamente não está ligado ao direito de posse comum no
que tange as suas pernas por ex, estando primeiramente dentro do direito de bem estar), o
direito de posse pessoal está governado a eles nesse sentido, pois justamente sua posse
pessoal pode vir a se TRANSFORMAR a posse comum e direito ao bem estar, caso viole
algum dos direitos que o governam, a violação consiste então na privação, que
dependendo do caso, tal privação pode ser certa ou não(por isso ainda há o direito de
posse pessoal), mas nunca monopolista como a propriedade privada.

3. Ética do anarquismo
​A propriedade é uma relação entre ser e objeto - natural.

Propriedade privada é uma relação entre ser e objeto, é uma relação jurídica no sentido amplo.
Propriedade comum é uma relação entre ser e objeto, é uma relação social no sentido amplo.

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Como o direito natural nos diz, todos têm o direito de usufruir da propriedade ou seja, todos têm o
direito de se relacionar com um objeto específico ou objetos específicos, a relação de propriedade
se dá no âmbito social, são relações sociais de propriedade aquelas que você está usando ou
usufruindo elas e que tem uso social.
Uma propriedade privada no âmbito jurídico, e aquela propriedade que você tem uso social
(nacional, patriótico) com um valor econômico, que dizer, que as propriedades privadas são entes
como (empresas multinacionais, indústrias, laboratórios, hidroelétricas, usinas em geral, como
terras para plantio terrenos enormes *hectares), nesse caso, uma estrutura jurídica é necessária
para validar os contratos, aluguéis e assim ter um valor econômico, em todos os casos, os valores
econômicos só tem valores, pois existem trabalho neles, existem trabalhos em todos os meios de
produção que é propriedade privada, todo o trabalho gera um valor econômico , na ordem
capitalista esse valor econômico é lucro, a propriedade privada, longe de ser geral é restrita
(privada), ou seja, apenas alguns podem usufruir do valor econômico que a mesma proporciona
(já que no sentido de propriedade privada ela é uma relação jurídica), o valor econômico é
privado, o trabalhador recebe um percentual fixo do valor econômico que ele produziu.
Supondo que:
Em uma multinacional com 15.000 funcionários de todos os tipos de profissões que é necessária a
ela, os salários praticamente de todos eles, está fixo em uma escala (podendo claro, ter
comissões e ou plr, mas veja que o percentual já está definido), mas vejamos se a receita dessa
multinacional for de 10 bilhões, o gasto em torno de 6 milhões (energia elétrica, internet,
telecomunicação) e os custos em torno de 300 a 400 milhões (salários, locomoção, maquinário,
benefícios, manutenção, consultoria de advocacia e processos trabalhistas) e com o investimento
na empresa em torno de 800 a 2 bilhão (logística, investimento no funcionário, atualização de
frotas, maquinário, internet, nas outras sucursais), o valor líquido seria em torno de 7,6 bilhões
brincando (que dizer isso apenas sendo uma suposição e com um valor geral em toda suas filiais
e matriz) ou seja o trabalhador, que tem o salário fixo tem um custo de abaixo do valor que ele
produziu, pois o trabalho é produzido e o valor é mensalmente, e o que sempre vai produzir mais
valor econômico é sempre o coletivo e nunca o indivíduo isolado.
A propriedade privada, está exatamente em desapropriar todos os trabalhadores do valor total
produzido e da riqueza social coletivamente produzida, nesse aspecto, a propriedade sendo uma
relação entre ser e objeto, além dessa relação no capitalismo ser jurídica e não social, e ter um
valor econômico, nem todos tem relações com o objeto em si.

A propriedade comum, nesse aspecto é a relação entre ser e objeto no âmbito social
(internacional), o que quer dizer, é que todos têm a oportunidade, vontade ou desejo de se
relacionar com todos os objetos que podem ser produzidos ou irão ser produzidos, nesse aspecto,
o direito natural sendo a relação de ser e objeto (propriedade) o direito natural é somente se a
propriedade é de forma comum e livre a todos, a partir do momento que priva alguém ou coletivo,
não é mais um direito natural e sim privilégio antiético.

O que são esses objetos, ora, as ferramentas necessárias para a produção do produto, para você
produzir energia elétrica por exemplo, a toda uma estrutura de ação e execução para que ela seja
produzida, ou seja, ela seria propriedade comum, porque nesse aspecto, não teria um valor
econômico, e sim um valor social, o uso da energia em um sistema de propriedade comum é de
necessidade, vontade de todos (claro que pode existir pessoas que não queira energia), ou seja,
nesse sistema, as necessidades gerais vem antes das vontades e desejos, no aspecto no sistema
AnCom existem coisas de valores sociais, onde esses valores são gratuitos, pois as necessidades
são inerentes a todos os seres, privar os seres de saciar suas necessidades que são inerentes

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(eles não tem escolha, fome, saúde, casa, roupas, energia, saneamento básico, infraestrutura,
locomoção) é antiético e antinatural, os desejos isto é, objetos relativos (celulares, computadores,
skate, e outros bens de consumo) são posses pessoais, pois você irá possuir esses bens por um
tempo X, e poderá trocar ou não.

Podemos dizer que o valor econômico no AnCom é uma relação social também e não jurídica,
mas, um valor jurídico no AnCom seria exatamente o livre-desenvolvimento (uma norma, lei, regra
a todos os seres), a ignorância não é um benção, nesse sentido, todos aqueles que pensam em
dizer 'não quero me desenvolver' vai está ignorando a própria essência humana e natureza, e só o
ser se desenvolvendo plenamente, todas as suas faculdades mentais, artísticas e morais que é
capaz de alcançar uma individualidade plena e livre.
No sentido da propriedade privada é necessário intermediários para que os 'recursos' se aloquem
mais facilmente no mercado (eis a necessidade do comércio), o valor econômico produtivo é
objetivo e geral (todo produto que foi ou vai ser produzido, já tem um preço-valor, devido a gastos,
custos, investimentos e o próprio trabalho mas o lucro), o mercado tem um valor crescente em
cima do valor econômico padrão (marketing e propaganda), e um preço subjetivo a esse valor,
nesse sentindo, o comércio é um roubo a priori, rouba do produtor e do consumidor, no sentido
restrito, tanto o produtor e o consumidor não vão alcançar a felicidade, pois estão sendo lesados
pelo comerciante (mercado, intermediário), o bem-estar está marcado por isso, e devido a
objetividade do lucro, egoísmo, e o menor esforço possível, os intermediários tendem a lucrar
sempre em cima dos outros, lesando os outros dos valores reais que eles produziram de fato, ex:
Um celular na indústria com troca natural direta vale 300 reais (não levando em consideração a
economia política) pelo comércio vale 1.000,00 reais.
Claro que se colocarmos a economia política (imposto, taxação, câmbio), o preço vai para
1.500,00 a 1.800,00 reais, ou seja, no comércio o preço tem um aumento de 100 a 300% em cima
do preço real, e o valor objetivo não tem mais necessidade, devido ao valor subjetivo (marketing e
propaganda), em todos os casos, devido às relações de ser e objeto jurídico (propriedade privada)
nem todos tem o direito natural a propriedade, as relações e nem aos valores reais dos objetos.

Na propriedade comum não é necessário um intermediário, pois as trocas ocorrem de forma direta
e objetiva, os recursos são alocados conforme necessário, vontade ou desejo, em escalas
menores do que são produzidas hoje, pois mesmo as vontade e desejos humanos sendo 'infinitos'
eles são temporais, objetivos e diretos, não quer dizer que os desejos e vontades sempre irão ser
os mesmos ou que sejam em escalas astronômicas, só que eles têm desejos e vontades a serem
atendidos, nesse sentido, como a relação entre ser e objeto é social, as pessoas que têm as
mesmas vontades e ou desejos, podem usar os objetos para satisfazer suas necessidades (ajuda
mútua), ou então, delinear o projeto para que produzam isso e em troca, eles além de lançar o
projeto, produzam algo que os outros que produziram suas vontades ou desejos façam o mesmo
(reciprocidade e solidariedade), o uso do objeto (posse pessoal) é egoísta, dado que só você irá
usar da forma que lhe convém e satisfaz, a produção é e só pode ser de forma solidária, recíproca
e ajuda mútua pois é o valor social e econômico em um sistema de propriedade comum.
E como um sistema de propriedade comum só existe se este for internacionalista (ou seja em
todos os lugares), o direito natural a propriedade nesse aspecto é natural, aqui temos:

1 - Todos temos o direito natural a propriedade


2 - A propriedade só pode ser natural se for comum
3 - A propriedade é uma relação social entre ser e objeto
4 - Toda relação entre ser e objeto é natural e comum (1 a 3)

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5 - Logo, todo o direito natural referente a propriedade é comum.

A priori, toda propriedade que seja privada, está privando alguém ou grupo de pessoas de ter
relação com os objetos, fazendo assim, a propriedade privada ser antinatural e antiética por a
fortiori!

A priori, toda propriedade que seja comum, está sendo usado por todos os interessados ou grupos
de interessados em ter relação com os objetos, fazendo assim a propriedade comum ser natural e
ética por a fortiori!

4. Direito natural e guilhotina de Hume

Direito natural a posse comum e bem estar caem na guilhotina de hume??


Não, todos esses direitos são descritivos e não normativos não há um ser-dever ser mas sim um
ser-ser, começarei explicando isso na posse comum:
Toda propriedade é em si coletiva, afinal tudo que se dá na propriedade privada é resultado da
privação do valor real(mais valia) do trabalhador, assim como também da privação do valor
coletivo, sendo o valor real produto do trabalho coletivo, exemplo que pode ser verificado
facilmente se olharmos o piso salarial dos trabalhadores da
vale(https://www.indeed.com.br/cmp/Vale/salaries), a quantidade de trabalhadores da
mesma(http://prntscr.com/n2bt28) em relação ao lucro total da empresa(http://prntscr.com/n2c52j),
mesmo se desconsiderarmos varias coisa e multiplicarmos o valor máximo salarial mostrado que é
de quase 4 mil, não chegaríamos sequer a metade de 1 bilhão dos mais de 6 bilhões lucrados
pela vale no ano passado, o valor real como sendo produto do trabalho entra ai pois toda mão de
obra intelectual e física empregada na empresa que se constitui de uma trajetória evolutiva
humana milenar, até mesmo já em simples instrumentos usados pelo patrão,isso já desde um uso
de um lápis onde se tem por ex, o conhecimento para manuseio,fabricação, mão de obra física
para extrair matéria prima para fabricação, etc e etc, a um instrumento simples(no sentido de sua
função)como uma calculadora , onde o conhecimento e extração de matéria são bem mais
complexos já na bateria que fornece energia para que esta funcione, a propriedade está então a
privar todos os indivíduos de seu real valor individual anexado ao valor coletivo, ela se pauta
também no fato de que toda matéria usada antecede nossa existência e naturalmente já estava
aqui disponivel(comum) a todos, então o que temos atualmente são 2 fatos:
1-A apropriação original está a monopolizar recursos que estão naturalmente comum a
todos(privilégio arbitrário sobre a natureza)
Em toda ação de justificação do privilégio individual sobre os recursos citados acima,
pressupõe-se privilégio coletivo em detrimento ao apropriador exclusivo, seja ao dizer ou escrever
"isto é meu", a condição para que se dê a justificação é o conhecimento da linguagem escrita ou
falada, ou até mesmo em linguagens de sinais como em libras que por sua vez são produto
coletivo, ou também no conhecimento de manutenção e fabricação dos instrumentos para
demarcação de propriedades, mapa, cerca, muro, etc.
Sendo pré-existente os recursos como disponível(livre) a todos, a propriedade se dá ai na
necessidade do indivíduo em se relacionar com esses recursos, de forma a monopolizá-los para
si, mas ao monopolizá-los, ou seja ao violar o direito da posse comum, a propriedade se torna
antinatural, pois impede terceiros de se relacionar com tais recursos, assim como também ao
passar do tempo o acúmulo(assegurado pelo direito de propriedade privada) deixa tais recursos
não mais disponíveis ao coletivo mas concentrados em mãos do apropriador, tornando a lógica do

11
primeiro apropriador(quem vai ter o homestead, seja relativo ao trabalho físico ou intelectual)
como monopolista exclusivo além de arbitrária, insustentável per si
2-A apropriação original está a monopolizar recursos não naturais que estão pré existentes como
produto coletivo(privilégio arbitrário sobre produtos sociais)
Em toda ação de justificação e até mesmo do usufruto do privilégio individual sobre os recursos
citados acima, pressupõe-se privilégio coletivo em detrimento ao apropriador exclusivo, seja ao
dizer ou escrever "isto é meu", a condição para que se dê a justificação é o conhecimento da
linguagem escrita ou falada ou até mesmo em linguagens de sinais como em libras que por sua
vez são produto coletivo, ou também no conhecimento de manutenção e fabricação dos
instrumentos para demarcação de propriedades, mapa, cerca, muro, etc. Seja também ao eu usar
tal recurso, para que se dê o usufruto individual necessito antes do privilégio coletivo como
condição isto é, quando eu uso "meu" serrote, tal ferramenta é o que é hoje porque vários
apropriadores originais através do usufruto individual das matérias primas como metal e madeira,
concederam seu direito de propriedade a uma empresa de fabricadores de serrote que usaram
este conhecimento para fabrica-lo, e mesmo numa situação onde uma pessoa extraia tais
materiais e fabrique tal instrumento sozinho, o conhecimento disto ainda seria coletivo, (o próprio
conhecimento do conceito de propriedade e demais normas são coletivos, afinal não há como
justificar o direito de propriedade sem ter consciência do conteúdo deste conceito), então a
propriedade de um recurso não natural não pode ser exclusiva, ou seja, a relação com o objeto
não natural na apropriação é na verdade uma relação com o coletivo, o que invalida a apropriação
original e seu caráter monopolista.

O direito do bem estar está inteiramente relacionado com o que foi exposto, pois quando falamos
de direito ao bem estar, falamos do direito a satisfação de necessidades, a necessidade de se
relacionar com objetos(no que se dá a posse) é contida a todo ser humano, assim como também a
necessidade de se alimentar, ou até mesmo de aprendizado, moradia, luz etc, ai falamos de
necessidades básicas, essenciais ao ser humano.
Então aí percebe-se novamente a irracionalidade da apropriação original, uma vez que ao privar
o ser humano de satisfazer nossas necessidades naturais(que estão contidas em nós) a mesma
se torna além de arbitrária, antinatural.
Então numa comuna caso tal direito de posse e bem estar seja agredido, os lesados estão no seu
total direito de expropriar o agressor para restituição(sendo tal restituição regulada nos princípios
AnCom, de forma a evitar abusos e manter a proporcionalidade), e puni-lo através do reforço
positivo ou exílio(em caso de persistência).
Ademais toda privação de recursos naturais (comum a todos) não pode ser monopolista pois
acarretaria em violar o direito de bem estar, seja pela terra, alimentos, água etc, assim como
também toda privação se torna irracional se não realizada de forma sustentável, uma vez que a
contaminação do ar por ex acarretaria na violação do bem estar geral, ferindo a própria
subsistência do coletivo.
Como bem mostrei aqui a propriedade se dá do leso do coletivo(seja pela privação do bem
comum, ou uso do privilégio coletivo anexado ao trabalho como condição para justificação do
direito de propriedade) em prol individual, ou leso individual na privação das necessidades de
terceiros com fins excludentes ao apropriador(fulano quer uma maçã e eu também).

Nota: Quanto a acumulação de riqueza no que tange às necessidades de luxo(não naturais),


como ter um celular o pc, etc, é, no interesse do próprio indivíduo da comuna de satisfazer sua
necessidade subsistência, regular seu uso desta acumulação de forma que não lese a satisfação

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de necessidades de outrem(bem estar), levando em conta todos os fatores sociais, ecológicos e
etc, a posse pessoal nesse sentido não é ilimitada.

5. Direito Natural em Kropotkin

Direito natural e ética naturalista de Kropotkin.

Kropotkin já no início da conquista do pão, ressalta algo que na atualidade ainda acontece, que é
a exploração, ele demonstra que boa parte do que usamos é resultado de uma herança coletiva,
isto é, se pegarmos por exemplo o computador que uso neste momento para digitar meu texto,
houve uma vasta mão de obra para extrair a matéria prima dele , assim como também uma vasta
mão de obra intelectual para dar a devida forma dos componentes que o constituem assim como
toda estrutura de algoritmos que constitui o sistema operacional e software de texto que faço uso
aqui, logo como eu poderia monopolizar isso e dizer que é apenas meu e nao de todos?
Ele ainda mostra que o que é produzido, não é restituído de forma real na troca com o capitalista,
daí ele mostra que o direito ao trabalho, é ambíguo nesse sentido, pois o que dita a recompensa
do trabalhador não é a princípio sua produção, mas sim "o quanto vale"(no sentido de salário) a
sua obra e não o valor real dela, o fato disto por ex é um pedreiro que faz uma casa mas sequer o
capital que recebe o permite construir outra.

Nas palavras de kropotkin:


"Uma nova forma de posse requer uma nova forma de
retribuição. Uma nova forma de produção não poderia manter a antiga forma de
consumo, como não poderia acomodar-se às antigas formas de organização
política."

e ainda:
"No dia em que o trabalhador do campo puder lavrar a terra sem pagar
metade do que produz; em que as máquinas necessárias para preparar a terra para as grandes
colheitas estiverem com profusão à disposição dos cultivadores, o obreiro de oficina produzir para
a comunidade e não para o monopólio, os trabalhadores não andarão esfarrapados e não haverá
mais Rothschilds e quejandos. Ninguém terá de vender o seu trabalho por um salário que
representam só uma parte do que produziu."

Já se tira então do que foi mostrado até agora a necessidade da expropriação dos meios que
outrora foram monopolizados, justamente pela herança coletiva contida no processo que resultou
neste meio, e abolição do salário, pela remuneração irracional originada da apropriação do
trabalho contida neste.

Nestes fatos Kropotkin desvenda o direito ao bem estar e posse comum, direitos estes que antes
de servir a função da satisfação das necessidades de todos, são pautado no fato de que todos os
recursos que hoje utilizamos, estavam a princípio comum a todos, e que toda tecnologia que hoje
utilizamos além de ter sua origem destes recursos naturais, tem sua origem também num trabalho
humano, físico e intelectual, milenar, disto se pode concluir que não há nenhuma legalidade no
direito de propriedade, seja lógica ou ética, a primeira porque a apropriação original tem sua

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origem numa arbitrariedade (é de quem pegar primeiro), e um erro, ao dizer que do seu trabalho
corporal conclui-se uma exclusividade monopolística sobre x coisa, e segundamente pela
exploração contida neste direito que mostrei nesse texto.

Nas palavras de Kropotkin:


"Sabemos que nenhum povo está por enquanto moralmente preparado para proclamar a anarquia
e viver nela, tendo o cidadão as necessárias virtudes para viver dentro do seu direito, sem violar
os direitos alheios. Essas virtudes há de o povo adquiri-las mediante o ensino e o exemplo dos
homens superiores que têm a peito o advento do anarquismo, isto é, da liberdade absoluta, tendo
só a restringi-la a liberdade dos outros. Nem se diga que o anarquismo trará a liberdade do crime
O criminoso convicto não ficará impune: numa sociedade anárquica, o povo reunido constituirá um
tribunal de única instância que julgará sem recurso e executará ele mesmo as suas sentenças."

ainda mais:
"Enquanto o homem for obrigado a pagar um tributo ao detentor para ter o direito de cultivar o solo
ou de por uma máquina em movimento, e o proprietário for livre de produzir o que lhe prometer
maiores lucros ante que a maior soma dos objetos necessários à existência, o bem-estar não
poderá ser assegurado senão temporariamente ao pequeno número, e será comprado de cada
vez pela miséria duma parte da sociedade. Com efeito não basta distribuir em partes iguais os
benefícios que uma indústria consegue realizar, se se tem ao mesmo tempo de explorar milhares
de obreiros. Trata-se de produzir, com a menor perda possível de força humana, a maior soma
possível dos produtos mais necessários ao bem estar
de todos." (todas as citações até agora são do livro conquista do pão).

Quem está lendo, lembre-se que quando falamos de direito natural, estamos falando do que se
pode ou não fazer, nisso entra tudo, seja direito ao lazer por ex, direito à educação, direito ao
estupro, ao assassinato etc etc, sendo o natural algo que existe, mas que é descoberto(seja pelo
empirismo, racionalismo etc) só que é a ética que vai entrar aí como um filtro, onde ela vai dar o
caráter de certo e errado para esses direitos além do que o constitui(seu conteúdo), no caso
quando falamos de Kropotkin, estamos falando de uma ética naturalista, ética essa que irei
explicar mais abaixo, é pautada no axioma da ajuda mútua e "de a cada um, cada qual sua
capacidade e necessidade".

Em kropotkin e seu axioma da ajuda mútua, ele o desvenda através do estudo empírico, seja
estudando passarinhos, formigas, humanos, ele ainda faz um estudo antropológico e sociológico
nisso para dar mais ênfase no que está descrevendo, a ajuda mútua entra como regra aí para a
sobrevivência seja por exemplo quando formigas atacam um inseto que apesar de grande(como
baratas, escorpiões etc) em relação às formigas, sozinho ela perece em frente ao ataque massivo
das formigas, e até mesmo depois de morta onde as formigas trabalham ainda em conjunto seja
para carrega-la ou desmembrá-la, quando em abelhas no Japão uma suzumebachi invade sua
colmeia, elas usam sua temperatura formando um casulo “abelhudo” para matá-la, isso em razão
da sua resistência a altas temperaturas ser maior que a da suzumebachi, em hienas por exemplo
onde em grupo trabalham, nos humanos é também vista desde seu tempo pré histórico no que
tange a caça dos mamutes por ex, e além disso nos humanos ele mostra como a ajuda mútua
quebra com a questão tão sempre levantada por liberais e afins de competição como sendo
natural e um “fator de evolução rsrs” nisso ele descreve isso falando primeiro da questão do
homem primitivo usando evidências arqueológicas de desenhos, instrumentos de caça,
edificações etc tudo isso para mostrar que o homem não vivia de forma isolacionista seja sozinho

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ou em uma família isolada, mas sim em tribos, ainda somado a isso ele também usa estudos
sobre estas sociedades(primitivas) para apontar a questão da cooperação não para um egoísmo
ferrenho, mas de forma espontânea para o coletivo, mostra isso até mesmo em sociedades que
praticavam canibalismo, ele segue falando dos bárbaros e suas sociedades, as leis no que tange
ao reforço positivo por ex, posse comum, altruísmo etc, enfim vai explicando até chegar no seu
tempo falando de sindicatos e greves por ex, e claro ele não deixa demonstrar também em sua
explicação a antinaturalidade e impactos negativos do estado, propriedade privada e capital sobre
a ajuda mútua.

Em dar cada qual sua necessidade e capacidade, Kropotkin ressalta que esse norte de
pensamento(princípio) comunista é visto inclusive nas nossas sociedades atuais, ainda que não
as define, como por exemplo em um museu ou biblioteca, onde não se diz "paga pelo que
consome" mas sim "tome o que precisa", ou até mesmo não se pede um requisito(no sentido de
qualificação) para ter acesso aquilo, mas sim novamente se diz "tome o que precisa"
Se dá como óbvia uma relação entre o axioma da ajuda mútua e este princípio, sendo o primeiro o
pressuposto do segundo.

Por fim, conclui-se que a lei no anarco comunismo entra como fator natural e espontâneo do ser
humano, não mais algo para hierarquia, ou para o poder, mas sim de fato para a máxima do
anarquismo , que é a liberdade.

O direito natural e ética vem aí para kropotkin na sua base naturalista, ele explicita isso em “a
moral anarquista” aqui:

“Buscar o prazer, evitar a dor, é o fato geral (outros diriam a lei) do mundo orgânico: é a essência
da vida.
Sem essa ânsia pelo prazer, a existência seria impossível. O organismo se desintegraria, a vida
cessaria.
Assim, qualquer que seja a ação do homem, qualquer que seja sua linha de conduta, sempre
funciona obedecendo a uma necessidade de sua natureza.
O ato mais repugnante, como o mais indiferente, ou o mais atraente, são todos
igualmente ditados pela necessidade do indivíduo. Trabalhando de uma maneira ou de outra, o
indivíduo faz isso porque sente prazer nisso, porque evita a si mesmo dessa maneira ou acha que
pode evitar aborrecimentos.
Aqui está um fato perfeitamente determinado, a essência do que tem sido chamado de teoria do
egoísmo.”

E mais ainda, aqui:


“A ideia do bem e do mal não tem, portanto, nada a ver com religião ou com a consciência
misteriosa; É uma necessidade de espécies animais. E quando os fundadores de religiões,
filósofos e moralistas nos falam de entidades divinas e metafísicas, eles não fazem mais do que
nos lembrar o que formigas, pássaros praticam em suas pequenas coletividades:”

Ainda aqui:
“A moralidade que emerge da observação de todo o reino animal, muito superior à
precedente, pode ser resumida da seguinte maneira: Faça aos outros o que você quer que eles
façam a você em igualdade de circunstâncias.”

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E aqui:
“Você vê que um homem bate em uma criança; você entende que a criança espancada sofre; sua
imaginação faz com que você sinta o mal infligido a você, ou suas lágrimas, sua carinha triste lhe
diz; e, se você não é um covarde, você se joga no homem que bate na criança, você o rasga a
força.”

Então, quando falamos em anarco comunismo, emerge-se uma nova ordem, uma ordem que
diferente da antiga não se volta para o poder ou capital, mas sim pela pela emancipação da
humanidade como um todo, tanto os meios quanto os fins surgem disto e vão para isso de forma
harmônica e equivalente, há então de se falar na visão libertária já proclamada por dejacque no l’e
libertárie como o norte definitivo para que isso ocorra, não mais proclamar revolução em meios
corruptos per si como propriedade e estado, não mais á um norte imediatista ou gradualista ou
qualquer coisa do tipo, afinal sem emancipar primeiro a nossa mente, como faremos então a dos
demais?

6. Kropotkin cai na Guilhotina de Hume?


[Resposta a alguns questionamentos sobre a ajuda mútua em Kropotkin]

Ultraliberal:
-Ajuda Mútua cai na Guilhotina de Hume, pois Kropotkin deriva ajuda mútua dos animais e implica
como uma regra aos humanos.

R: Primeiramente, ajuda mútua não cai na Guilhotina de Hume pois ela não é uma norma, ela é
uma descrição, essa é a gênese do método do Kropotkin, descrever fielmente. Segundo erro é
que Kropotkin não deriva dos animais e aplica aos humanos, ele também estuda os humanos e
comprova por demonstração que ajuda mútua está presente em sociedades primitivas, bárbaras,
feudais e modernas.

Ultraliberal:
-Kropotkin cai na falácia anedota, pois demonstração fatos que não podem ser comprovados se
baseando apenas no "ouvi falar"

R: Kropotkin passa por todos os testes mais elementares para ver se uma teoria é empírica, ainda
além das diversas fonte citadas por ele, ajuda mútua pode ser vista empiricamente uma vez que o
próprio Kropotkin explícitos os casos de ajuda mútua.

Ultraliberal:
-Kropotkin é coletivista, mesmo que ele defenda a liberdade na prática o coletivista só levaria a
ditadura. O próprio Durkheim evidência que as sociedade primitivas tinha direito punitivo e eram
muito brutais, o indivíduo estava consumido pela consciência coletiva.

R: Primeiramente Kropotkin não é coletivista, mas uma superação desse. Criticar povos coletivista
por brutalidade é o que Kropotkin fez, porém diferente de Durkheim que foi fatalista ao determinar
os direito primitivo como unicamente punitivo Kropotkin percebe que nessas sociedades a direitos
baseados em sentimentos ou no bem estar das pessoas da comunidade. O coletivista leva ao
autoritarismo, assim como o individualismo, tanto é que Kropotkin propõe o cooperativismo (essa

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é a versão portuguesa) onde o indivíduo vive na coletividade e a consciência dele está unida a do
coletivo, porém o coletivo não tem controle total sobre ele e a moralidade não está monopolizada.

-A propriedade privada nasce da escassez, pois essa gera conflitos e por sua vez para resolvê-los
precisa-se de um direito de propriedade privada.

R: Na verdade a propriedade privada nasce de uma quebra das relações cotidianas e práticas
coletivas para relações cotidianas e práticas individuais. Uma dessas causas é a divisão do
trabalho, a divisão sexual dá sociedade, a religião ou até mesmo anomia. A sociedade primitivas
em sua maioria viviam em extrema escassez e elas apresentavam baixo nível de conflito, pois as
relações de ajuda mútua eram muito fortes nelas. Os conflitos por território ou bens geralmente
eram com outras tribos ou clãs cujo os laços de ajuda mútua ou se quebraram ou nunca existiram.
A propriedade privada implica em eu privada o outro é manter algo para mim, se de fato a
privação de bens causa conflitos então como os conflitos não seriam causados na propriedade
privada? Lembrando que ela pode causar a escassez relativa, pois se tomarmos o exemplo de
Menger onde uma sociedade ribeirinha tivesse um rio que suprisse todas as necessidades, lá não
haveria necessidade de propriedade privada, mas é se chegasse um povo que cercasse o rio?
Geraria conflito? Ou num exemplo mai hipotético, e se o rio foi comprado? Assim, a propriedade
comum não implicaria em conflitos pois ela mesma prega que ninguém deve ser privado

Nota: Conflitos não são de gênese apenas econômica, são de cunho moral, étnico, geográfico, etc

7. Quanto ao trabalho

Qual seria o incentivo para trabalhar/produzir no ancom?

Geralmente quando alguém pergunta isso, a pessoa já se encontra num estado de anestesia
mental criada pelo sistema capitalista, isso pois o sujeito não consegue imaginar uma
motivação/incentivo que não seja o lucro, entendendo isso temos que lembrar antes que esse o
lucro per si é alienante(no sentido da mais valia, onde o trabalhador é "roubado" do valor real
gerado por sua produção, por exemplo quando um trabalhador troca sua mão de obra por um
iphone) reconhecendo esta alienação devemos entender que o AnCom trabalha com um processo
revolucionário que envolve a total quebra dessa alienação existente, isto através da expropriação
dos meios de produção e recursos, onde é devolvida a classe trabalhadora o controle de produção
e posse dos recursos respectivamente, então quando alguém que pergunta isso pensa em
remuneração, remuneração e mais remuneração, saiba que não existe maior remuneração que
esta, onde os meios e recursos são comunizados, no AnCom o desemprego não é mais uma
problemática do sistema econômico(diferente do que ocorre no sistema capitalista) pois tanto
produção(onde antes se deu a comunização),consumo e distribuição são feitos de forma direta,
sem necessidade de intermédio de mercado ou moeda, se uma empresa de sla, eletrônicos falir,
as pessoas não vão ser jogadas pra fora e passarão necessidade ou precisarão de fazer
mendigagem, justamente pelas relações mútuas do sistema não se basearem na necessidade da
moeda como intermédio de troca e remuneração.

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Boa parte do raciocínio para formulação de tal pergunta vem do tão propagado valor subjetivo,
este exposto aqui:

“Utilidade é a aptidão que uma coisa tem para servir à satisfação de necessidades humanas,
constituindo, portanto (a utilidade reconhecida como tal), um pressuposto básico para que uma
coisa seja um bem. Também os bens não econômicos são úteis, pois têm aptidão para o
atendimento de necessidades humanas, tanto quanto os bens econômicos; essa aptidão deve,
naturalmente. ser conhecida por quem utiliza os bens em questão, caso contrário nem sequer se
pode falar de bens.
O que distingue bem não econômico de bem econômico é o fato de o atendimento das
necessidades humanas não depender da disponibilidade de quantidades concretas do primeiro,
mas de quantidades concretas do segundo; assim sendo, o primeiro tem utilidade, ao passo que o
segundo, além de utilidade, também tem para nós a importância que denominamos valor.”
Princípios da economia política(pág 286).

“Valor é a importância que o agente homem atribui aos seus objetivos finais. Somente a objetivos
finais é que se atribui um valor primário, original. Os meios são valorados de forma derivativa,
segundo sua utilidade e contribuição para alcançar o objetivo final. Sua valoração deriva do valor
atribuído ao respectivo objetivo. Só têm importância na medida em que tornam possível atingir
algum objetivo, algum fim. Valor não é algo intrínseco à natureza das coisas.
Só existe em nós; é a maneira pela qual o homem reage às condições de seu meio ambiente.
Da mesma forma, o valor não está nas palavras ou nas doutrinas. É a conduta humana,
exclusivamente, que cria o valor. O que importa é como os homens agem e não o que dizem
sobre valor. A retórica dos moralistas e a pompa dos programas partidários têm importância
apenas na medida em que possam influenciar ou determinar as ações dos homens.” Ação
humana(pág 129)

Bom, primeiro vamos às definições.


A) Valor é a gênese do preço
B) Preço é a manifestação do valor

Nem sempre um bate com o outro, mas podem bater. Vamos chegar nisso ainda.

Devemos entender que o conceito de valor deve ser algo que nos permita estudar a estrutura da
economia. Valor é algo que se dá nas relações sociais esse deve ser a posteriori. Qualquer
tentativa de dedução a priori do valor implica ou ignorar a complexidade da realidade ou ignorar
uma das partes ( ou o sujeito ou o objeto), coisa que senhor Mises fez. Segunda coisa em que
mundo você pode provar e demonstrar uma coisa noética surtindo efeito fora da mente e
funcionando dentro da mente. É, então, a teoria de valor de utilidade não é provável sem diversos
pressupostos. Por trás de toda a teoria de utilidade já está o pressuposto de oferta e demanda.
Esse era o ponto que eles queriam chegar fazendo todos pensar que eles estavam saindo da
gênese (valor) e indo para o fenômeno (preço), quando na verdade já estavam pressupondo o
mesmo mecanismo, só que de forma mais simples. Criticam a teoria do valor do trabalho com
coisas ridículas, todavia é claro sem provar nada deles, todo o esforço marginalistas foi um grande
mostrar, sendo que a utilidade marginal não é um axioma, mostrar só quer dizer "jogar na roda e
achar que tá abafando". Aqui vai algumas das críticas:

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A) Quando eu troco um objeto quem valorizou foi eu, eu posso achar que a caneta vale muito
mais do que parece.

B) Basta você cavar um buraco muito grande que não será adicionado valor a eles

C) Um sorvete de merda não vale nada

D) Há um pressuposto na teoria do TVT (teoria do valor do trabalho) que é funcionar apenas em


equilíbrio, sendo que nunca estamos em equilíbrio a teoria não se aplica para o geral

A crítica A) é a mais geral, todo marginalistas joga essa na roda sendo de forma mais sofisticada
ou não. A verdade é que basta olhar e vemos que ele não demonstrou nada, apenas disse que se
ele achar tal coisa logo deve ser. O B) e C) é o retardo mental em pessoa, o que vale é trabalho
útil, trabalho demandado e incorporado na mercadoria. A teoria do valor estuda a estrutura da
criação de mercadoria, o elemento primário, como você concebe um dispersivo de trabalho algo
válido? Eis que a validade está para onde o trabalho pode gerar algo, há de fato valor, mas não
manifesto. A manifestação do valor só acontece quando você pode extendê-lo a outra coisa na
produção ou à uma troca. Por isso que há um hiato entre um buraco para fazer um prédio e
encanamentos e um buraco por si só. Estamos falando aqui das condições técnicas de produção,
a sociedade é definida pela tecnologia e a técnica produtiva é nada mais que um arranjo entre
capital e trabalho, sendo que o primeiro advém do segundo. Vós lembrar que o cálculo feito pelos
capitalistas está em cima das suas condições técnicas de produção não é possível determinar a
taxa de lucro sem ter noção dessas condições, por consequência também não pode se determinar
o preço. O D) foi causado pelo Adam Smith com seu conceito de centro de gravitação, onde ele
diz que preço fica gravitando ao redor do valor e bate de vez enquanto nele. O que não podemos
pensar em termos de equilíbrio neoclássico, pois se pensarmos que a oferta é definida pela
estrutura técnica da produção, como podemos definir ela sem que a taxa de lucro esteja definida
também? Eles pressupõe que podemos dissociar o juros da produção e se definirmos um
definiremos o outro, obviamente que não, a oferta depende da técnica utilizada sendo assim, a
oferta é o que vem depois do trabalho. O problema se torna mais grave quando pensamos no
fenômeno de troca de técnicas, se trocarmos um técnica A por uma técnica B, várias vezes
durante o mesmo processo produtivo, a curva de demanda se torna indeterminada. Já a demanda
é algo estrutural que deve ser examinada como fez Luigi Pasinetti, numa "estrutura dinâmica", ou
seja, estudar a demanda como uma grande circulação de objetos, pois não há como saber o que
se passa com sujeitos.

8. Economia e Anarquismo

A base metaética AnCom é: "não faça para os outros, aquilo que não quer que façam para você
[SOLIDARIEDADE]"; dentro de um organismo socioeconômico em pé de igualdade isso é
possível.

Dentro de um escopo econômico, isso demonstra que a organização da produção, reprodução,


distribuição e locomoção se dá nitidamente por uma unificação dos setores produtivos; - Assim,
nessa questão a divisão social do trabalho é abolida, pelo fato de que não é mais a questão de

19
produção de riqueza por lucratividade (apropriação privada dos excedentes por uma minoria), pela
especialização em hierarquia através da competição das capacidades e técnicas; mas sim o
desenvolvimento pleno das capacidades do indivíduo dentro da divisão das tarefas em um
conjunto de cooperação produtiva no organismo solidário.

O que garante uma maior abrangência e autonomia como também liberdade individual na
organização da produção pelas associações livres, essa associações estariam ligadas pelo
princípio metaético [solidariedade] onde a produção deve está coordenada a maior produção com
o menor gasto de energia humana necessária, para uma maior satisfação das necessidades com
o menor desgaste produtivo e distributivo ambiental. Montando nesse quesito a base
geoeconômica.

Como também, os setores produtivos estando unificados e coordenados e gerenciados


diretamente pelos trabalhadores dentro de cada associação [autogestão]; estarão diretamente
ligados e interligados internacionalmente. Ou seja, dentro do sistema de divisão social do trabalho
[hierarquia-burocracia], fronteiras e mercado [competição, compra-venda] os setores industriais,
técnico-científicos coordenam sua produção para conquista de uma maior parte do mercado,
lutando e protegendo essa produção contra ameaças externas [espiões e ameaças que degradem
o lucro] e internas [espiões, e autonomia individual/gênio criativo], em uma organização
socioeconômica AnCom, isso não existe, já que a produção e toda sua coordenação visa uma
cooperação internacional para um desenvolvimento real e concreto de um maior bem-estar social,
individual e geral para todos e por todos, enquanto a econômica é organizada pela DSTr para uma
maior competição dentro do mercado, criando sistemas absolutistas e autoritários, se vê uma
mudança drástica no AnCom, onde a economia é organizada através da DTf pelas associações
livres de AOA's em um territorialismo que visa uma cooperação a nível nacional e intercooperação
a nível internacional, preservando a identidade de cada geografia.

A economia no AnCom, funcionaria devido exatamente a preservação real e total das liberdades
individuais de todos, pela questão de autonomia e também pela questão de maior tempo para o
lazer; o incentivo é inato a preservação do sistema.

E como o sistema econômico é baseado na metaética - SOLIDARIEDADE -, ao tentar vender ou


comprar de outro, estará não apenas quebrando com a questão de satisfação das necessidades
[base de troca] como também com todo o organismo socioeconômico em âmbito internacional, o
sistema econômico AnCom é baseado em uma questão sociometabólica conectada e
interconectada [autopoiese], ao tentar quebrar essa questão autopoiética [produção e reprodução
econômica] estará quebrando com todo o sistema econômico em si, denotando um ataque nocivo
a todos os indivíduos. Assim, toda tentativa de compra-venda dentro de um sistema AnCom, é um
ataque nocivo a todos os indivíduos.

Então temos:
- Metaética - Solidariedade - : Não faça para os outros, aquilo que não quer que façam para ti
- Igualdade, equidade, cooperação, ajuda mútua, reciprocidade, respeito e responsabilidade
[moral]
- Organização econômica: autopoiética, maior produção por um menor gasto de energia humana,
troca [satisfação das necessidades], divisão de tarefas.

20
E com isso temos a autopoiese-competitiva que nada mais é do que as associações competindo
por melhorias e benfeitorias para uma maior produção com um menor gasto de energia humana,
mas, conservando o máximo possível o ambiente, com uma maior abrangência técnico-científica
com caráter de produção de bem-estar.

As trocas, a base é a produção para a satisfação das necessidades - troca direta -, ou seja, ao
trabalhar em tal associação para tal tarefa, você estará indiretamente ou diretamente trocando
dentro do organismo econômico [autopoiese] a sua condição de vida, isso dentro de suas
capacidades, onde a melhoria e progresso contínuo dos fatores de produção é o maior e melhor
desenvolvimento de sua própria vida, quanto maior a produção e menor o gasto de energia
humana dentro de uma maior preservação do ambiente, maior será o tempo de lazer e menor o
tempo de trabalho necessário a X tarefa; quanto maior a cooperação e alopoiese-competitiva, ou
seja, a produção ou criação de condições e ferramentas que aumentem exponencialmente a
satisfação das necessidades com o menor gasto de energia humana.

Dentro do sistema AnCom, você já estará ao utilizar suas capacidades em tal associação para tal
tarefa, trocando pela satisfação pessoal os itens necessários a você [posse], sem custo ou gasto.

8.1

O anarquismo é um sistema político, sócio-econômico que quer modificar, alterar e transformar


todos os pilares da sociedade que se ergueu até hoje, não se tem como conceber o anarquismo,
mas continuar com a presunção filosófica em uma sociedade libertária, assim, esse aporte
filosófico é em grande parte não condizente com o AnCom, os sistemas filosóficos que se
ergueram, se consolidaram são excelentes em grande parte para descrever um sistema futuro,
mas que, colocado dentro de um sistema comunista anarquista se torna fechado, sofista e
alienado, o anarquismo presa pelas modificações das relações autoritárias, em relações
libertárias, de relações de poder em relações de horizontalidade e autogestão, assim, ele nega
todo o sustentáculo que o Estado, Capitalismo e Religiões estão fundados, como também nega a
forma de ensino educacional, técnico e científico que se está sustentado as instituições hoje.

Ao conceber o anarquismo (e por isso é considerado ‘utopia’) é preciso ter em mente uma nova
visão de relações sociais, econômicas, educacionais, culturais e de crença que se fundará uma
sociedade nos trâmites anarquista (as experiências menores são socialistas libertárias, as maiores
anarquista), dado essa pequena introdução vamos as trocas.

As trocas diretas/trocas naturais.

Ao conceber um sistema novo baseado na ética de ajuda mútua e autogoverno, moral de


cooperação e solidariedade mútua, o comunismo anarquista modifica as trocas até então dadas
como ‘fundamentadas na naturalidade das coisas’, os escritores clássicos observaram que o
mercado é apenas um princípio da animalidade humana (racionalidade primitiva) por assim dizer,
isso é visto com mais suporte científico e analítico em David Graeber no seu livro Debt: the first
5,000 years (Divida: os 5.000 primeiros anos), as relações mercantis surgem em concomitância
com a ascensão dos Estados, um está ligado a outro. O problema em que muitos não enxergam
ou tem medo de criar um argumento, é que o que não consegue ser sustentado sem um Estado é
o mercado, e por assim dizer, o ultraliberalismo (ancapismo)é a prova cabal e máxima disso
(milícias privadas, leis privadas, juridicismo privado) o mercado sem um suporte autoritário, sem

21
um aparato coercitivo não se sustenta, pois é as relações de trocas naturais que irá começar a
triunfar sobre as trocas voluntárias (trocas voluntárias aqui é vista como um intermediador
[comércio] entre os produtores e consumidores, por isso a tese marginalista se denota pelo sufixo
de “margem” está na margem entre o produtor e consumidor), porque as trocas naturais irão
triunfar, porque sem um aparato coercitivo, as pessoas poderão elas mesmas, sem leis, polícia,
sem o suporte coercitivo que sustenta os sistemas autoritários, a ir direto nos produtores e sem
um preço fixo, mas com valor-orgânico direto, o agorismo se torna irrelevante nisto.

As trocas naturais/direta se denota pela necessidade real dos consumidores e produtores, nesse
sentido, não é o direito ao fruto do seu trabalho que o trabalhador tem direito (aí que entra toda a
criação das trocas voluntárias pelo mercado), mas a total satisfação das necessidades e desejo
que o mesmo tem (aqui entra toda as trocas naturais/direta), compreenderam, em um sistema de
livre-mercado (uma distopia, mas supondo que exista) o comércio é a máxima e não o consumidor
ou produtor, e sim o que está existente dentro do comércio (mercado, por isso a dependência do
livre-arbítrio), e por isso as teses marginalistas fazem sentido, ao contrário, o comunismo
anarquista concebe a livre-circulação (sem mercado) isso é um estoque virtual e material concreto
a mercê de todos, uma simetria informativa mais ampla e tem tempo real que os problemas do
mercado (assimetria + preço), porque aí entra a cadeia de suprimentos interligada em todos os
estoques físicos e virtuais intermundial, o que caracteriza que cada suprimento existente, estará
constando em um database como em um projeto material, cada comuna responsável pela
informação, atualização, etc…

O sistema de trocas, produção e consumo é livre, isto é, as ferramentas são disponíveis a


qualquer pessoa ou grupo de pessoas para produção, com a ressalva que a produção que entra o
valor-orgânico, onde a produção é um valorativo real e objetivo, enquanto desejos e vontades são
valorativos e noéticos, entenda, que aqui nessa composição, a filosofia da técnica é importante e
necessário (cada pessoa desenvolverá um trabalho produtivo que se tornará atrativo), cada
organização de produção é dinâmica, autogestionada e adócrata, horizontal e direta.

Um dos principais fator de troca é o trabalho (retirando as pessoas que são debilitadas pela idade
ou algum tipo de problema mental ou físico que não conseguem ou podem fazer um trabalho, mas
que terão suas necessidades e vontades supridas, caso contrário, a cooperação e ajuda mútua
não teria sentido nenhum), o principal espantalho é sobre isso também, como se todo o trabalho
fosse individual e solipsista, é errado, em um sistema comunista libertário o trabalho é indivisível,
cada trabalho é importante em um corpo intermundial, não tem como ser ‘autossuficiente’ sem um
suporte técnico, produtivo por trás, por trabalho indivisível que dizer que, por trás do seu trabalho
existe uma variedade de trabalho conectado e interconectado e na frente existe mais uma cadeia
de variedade de trabalho conectado e interconectado, desde o fornecimento de luz até o consumo
final (anterior ao fornecimento de luz também), não tem como separar o trabalho manual do
intelectual, isso é um erro do próprio sistema que concebe desigualdade social-econômica, onde
no comunismo anarquista não existirá.

Ao pensar em um trabalho separado de outros, é possível tentar imaginar que o coração trabalha
sozinho sem os pulmões, e que a visão, fala trabalha sozinho sem a neuroconexão e consciência,
impossível né?

Um adendo, essa forma de sistema é possível, necessária e urgente, algumas tentativas já


existiram.

22
Então temos aqui:

-Trocas diretas/naturais contra trocas voluntárias.

-Livre-circulação, produção e consumo livre contra livre-mercado, mercado e comércio.

– Relações libertárias, horizontais e livres contra relações autoritárias, hierárquicas e coercitivas.

As trocas naturais/direta, livre-circulação é totalmente diferente do livre-mercado, trocas


voluntárias que grande parte dos anarquistas concebem.

8.2

Compra e Venda, trocas e trabalho.

Imaginemos uma indústria autogestionada, as divisões ali dentro é de funções e tarefas, cada
indivíduo que forma a organização dessa indústria tem alguma capacidade distinta: Um tem
conhecimentos mais aprofundados em administração, outro tem capacidade técnica em
movimentação e localização de estoque, outros estão nas funções básicas da produção e outros
estão focados na manutenção da estrutura produtiva para que tudo ocorra dentro do processo
produtivo sem nenhum problema, para isso, todos que compõe essa organização industrial
autogestionada sabem e conhecem sua capacidade e suas funções e tarefas, cada um é
responsável pela manutenção e condição do seu trabalho e todos fazem parte do processo geral e
concreto dessa indústria. Vamos imaginar que sua função é strechar e fechar os pallets dessa
produção, e movimentar esses pallets até a área logística para todo o processo de distribuição e
transporte para outras localidades, e como sabemos, as ferramentas, os materiais são da indústria
e cada um tem a autonomia conforme sua capacidade de utilizar esses materiais para tal
execução dentro do processo produtivo, mas como a indústria é organizada em PPCP
(Planejamento, Programação e Controle da Produção) e todos são responsáveis pela indústria, os
materiais e recursos lá disponíveis e feitos são para a dinâmica e desenvolvimento da economia
em um composto geral (externo), assim cada PPCP tem sua ligação com as necessidades
variadas de várias localidades em diferentes territórios ao redor do globo.

Dentro da questão AnCom, não existe um valor -preço- por seu trabalho, está dentro da condição
de usufruto direto das satisfações de sua necessidade, o que isso quer dizer? Quer dizer que as
funções e tarefas que cada um ali é capaz e responsável possui composição e condição diferente,
mas a satisfação de cada indivíduo é igual, uma pessoa que possui mais conhecimento em
administração e outra que tem mais agilidade no streche e fechamento de pallets, poderão após
sair do trabalho, usufruir de toda produção de forma igual e equitativa sem um precisar se vender
a outro, ou explorar o outro.

Supondo que o administrador queira 5 engradados, 15kg de contra filé, 7kg de linguiça,
pão-de-alho, verdura e macarrão pro churrasco e o strecheiro quiser apenas comprar apenas pão
e linguiça, porque irá almoçar normalmente em sua casa, poderão igualmente usufruir disso sem
sequer se preocupar com se "terão condições de comprar tais produtos", saberão que pelo
processo de acesso e uso livre da produção do trabalho coletivo, não precisarão se preocupar

23
com a questão do preço e disponibilidade, devido aos processos de PPCP e Inventário interligado
em todo o organismo econômico, social e internacional, isso é, não existe uma 'dispersão do
conhecimento', e nem o problema do 'cálculo econômico', por que os cálculos são feitos a partir da
quantidade real dentro dos processos produtivos e distributivos interligados, quando falamos que
não é possível ocorrer compra-venda, trocas no mercado, é porque o processo econômico é
interligado, coletivo e concreto, e não uma forma de -utopia individual- trabalho desligado e
indiferente dentro da indústria, isso é, em vez de você ter que trabalhar para produzir um valor X
para poder comprar algo no mercado, sem se interessar -sendo você apenas um assalariado- nos
processos produtivos do seu trabalho, no AnCom, o seu trabalho é expressão real da sua própria
'consciência' no processo, você saberá para que está produzindo e porque, e isso decorre que
uma condição mútua entre trabalho e usufruto; onde o usufruto não é a propriedade do seu
trabalho que é lhe entregue, e sim a condição de satisfazer suas necessidades e vontades
independentes quais sejam dentro das condições materiais e fisiológicas do seu próprio corpo.

Assumindo que todo trabalho é coletivo, todo conhecimento e técnicas é fruto de gerações
passadas e presentes, você faz parte do processo produtivo e não é o processo produtivo, já que,
para a concretização do seu trabalho, você depende do trabalho dos outros ao seu redor e é a
necessidade do próprio trabalho coletivo que dará origem a seu processo produtivo, é uma
autopoiese (ou seja, a necessidade produz o trabalho que satisfará as necessidades, que
reproduzirá mais necessidade. A necessidade produz o trabalho, a satisfação dessa necessidade
e a reprodução de mais necessidade, em um processo contínuo e recíproco entre corpo-matéria),
sempre irão produzir a si mesmas, o que não ocorre na concepção de compra-venda, já que para
a satisfação dessas necessidades, você deve produzir um valor alienante do real valor do
usufruto, ou seja, o valor-de-troca (que pode ser a comunicação da satisfação, da necessidade e
do produto em dinheiro, moeda, cupom, etc.) é uma alopoiese[1] (não é ele próprio, incapaz de se
reproduzir, isso é, nesse processo, o valor-de-troca surge como uma característica fictícia entre
necessidade e satisfação), decorre que esse processo irá criar uma situação de exploração, já que
irá construir a condição de custo e gasto nos processos produtivos e uma adição X do valor
produzido para equilibrar o déficit produtivo e a quantidade produzida, o que gera os produtos no
mercado, nesse processo não se produz a quantidade real e necessária aos interessados, mas
sim, uma quantidade artificial para o mercado.

No processo de compra-venda e mercado, você não tem como ter a 'propriedade' do seu próprio
trabalho, já que é impossível essa condição, o que você tem é o recebimento de uma forma X do
seu trabalho em moeda, dinheiro, cupom, etc... para trocar por outros produtos ou serviços no
mercado, você sempre terá a 'propriedade' do trabalho de outro e nunca o seu nesse processo.
Assim a condição de propriedade privada/pessoal/individual não existe, o que existe dentro dessa
condição é a busca pelo poder-de-compra para um aumento do privilégio, sempre iremos possuir
o produto do trabalho de outro! No AnCom isso é garantido pelo usufruto integral e real, nas
outras ideologias é pela condição da compra-venda e mercado e qualidade do poder-de-compra.

A propriedade nesse aspecto entra na forma de produção, e não de consumo ou satisfação.


A propriedade privada decorre da condição sine qua non de acumulação privada do valor
produzido no mercado, e a configuração do poder-de-compra e para isso sustenta o Estado, mas
o Estado introduz a situação de compra-venda, e isso cria um valor-fantasma (desperdício), é um
valor-fantasma, porque o produto será descartado ou resgatado conforme o poder-de-compra
oscila, a propriedade privada com sua composição de compra-venda (não existe possibilidade de
existir mercado, sem Estado e sem propriedade privada) criará a ficção entre necessidade e

24
satisfação, e desenvolverá o crédito para sustentar essa ficção, para isso também, se dará os
juros,impostos e taxas cada um relativo a ficcionalidade do valor-de-troca. Você enxerga duas
condições da propriedade privada: a) a apropriação e acumulação privada do excedente
produtivo, b) a formação da ficção do valor-de-troca e mercado, a situação a) É o processo
primitivo da origem do Estado [junto a religião, isso é a religião e propriedade privada é a base do
Estado] e a institucionalização do poder econômico e político, para isso se cria a polícia e as leis
para garantir o direito sobre o excedentes e escravos; b) com o processo de expansão econômica,
religiosa e ideológica [colonização, navegação] e novos locais, ocorre a questão do mercado,
onde os colonizados eram obrigados a comprar seus próprios produtos no mercado, pagar taxas e
impostos sobre suas próprias terras, decorre a ficcionalidade, o valor-de-troca
[compra-venda-mercado] não é onde o trabalhador troca o valor do seu trabalho
[dinheiro,moeda,cupom], mas sim o local, onde o trabalhador é obrigado a comprar ou vender
para só então conseguir ter [e isso decorre do poder-de-compra] e para ter, é necessário
trabalhar, e para trabalhar é necessário se especializar, e para se especializar é necessário
estudar, e estudar é necessário dinheiro e possibilidade, então existe um hiato, esse hiato é o
processo decorrente da ficcionalidade do mercado, já que essa possibilidade só existir a partir do
poder-de-compra. [CIRCULARIDADE]

Uma economia AnCom decorre do processo de necessidade e satisfação concreta, como descrito
anteriormente, no AnCom a ficção é extinta, e entra a realização, a realização decorre do caráter
orgânico da econômica, um processo fisiológico de possibilidade[tempo e situação] disponibilidade
[quantidade e qualidade] e realidade [usufruto], pelo processo de autopoiesis o valor-de-troca é
extinto. O seu trabalho [De cada qual segundo sua capacidade] é a troca para o seu usufruto [a
cada qual, segundo suas necessidades] o seu trabalho é uma auto-produção do usufruto das suas
necessidades [trocas diretas ou naturais], já que é impossível você medir o valor real das
contribuições ao longo de todo o desenvolver técnico, científico, econômico, artístico, educacional
e moral da humanidade, a compra-venda só existe pela força, exploração e ficção.

O que decorre é que, sendo o trabalho coletivo e social, é impossível você ter 'propriedade' dos
produtos do seu trabalho, a não ser que uma ficção se insira ali [valor-de-troca, dinheiro, mercado,
compra-venda], já que nem mesmo o valor ou a propriedade podem ser mensuradas dentro do
processo produtivo. Sempre iremos possuir o produto do trabalho coletivo, o figurante strecherista
irá possuir sempre o produto do trabalho de outros e os outros o dele. Por isso repito, é impossível
ter a 'propriedade' do seu trabalho, o que você tem é uma ficção para a reprodução dos valores de
troca, valor-fantasma e poder-de-compra.

[1] Que não é capaz de se reproduzir e cujo produto não é ele próprio. Sistemas alopoiéticos
também não são autônomos. .Um exemplo é uma linha de montagem, na qual o produto (por
exemplo um automóvel), não está, via de regra, relacionado com o maquinário usado para
produção.

[Pequena nota sobre as ciências econômicas]

Dado seu papel social, não surpreende que a economia não seja uma ciência genuína. Para a
maioria dos economistas, o "método científico (o método indutivo das ciências naturais) [é]
totalmente desconhecido" (Kropotkin). O argumento de que a maioria da economia não é uma
ciência não se limita apenas aos anarquistas ou outros críticos do capitalismo. Muitos economistas
dissidentes também reconhecem esse fato, argumentando que a profissão precisa agir em

25
conjunto para que seja levada a sério. Se pode manter sua posição como defensor do capitalismo,
se isso acontecer, é um ponto discutível, já que muitos dos teoremas desenvolvidos foram feitos
de maneira explícita como parte desse papel. Que a economia possa se tornar muito mais ampla
e mais relevante é sempre uma possibilidade, mas fazê-lo significaria levar em conta uma
realidade desagradável marcada por classe, hierarquia e desigualdade, em vez de deduções
lógicas derivadas de Robinson Crusoe. Enquanto o último pode produzir modelos matemáticos
para chegar às conclusões de que o mercado já está fazendo um bom trabalho (ou, na melhor das
hipóteses, existem algumas imperfeições que podem ser contrabalançadas pelo Estado), o
primeiro não pode.

Os anarquistas, sem surpresa, adotam uma abordagem diferente da economia. Como Kropotkin
colocou, "pensamos que, para se tornar uma ciência, a Economia Política deve ser construída de
uma maneira diferente. Deve ser tratada como uma ciência natural, e usar os métodos usados em
todas as ciências empíricas exatas". Isso significa que devemos começar pelo mundo como ele é,
não como a economia gostaria que fosse. Ela deve ser colocada no contexto histórico e nos
principais fatos do capitalismo, como o trabalho assalariado, não dado como garantido. Não deve
abstrair de fatos importantes da vida como poder econômico e social. Em suma, a economia deve
rejeitar as características que a transformam em uma sofisticada defesa do status quo. Dado seu
papel social dentro do capitalismo (e a história e evolução do pensamento econômico), é duvidoso
que alguma vez se torne uma ciência real simplesmente porque, se o fizesse, dificilmente seria
usada para defender esse sistema.

9. Cálculo econômico

O cálculo econômico não refuta o comunismo libertário, e são os neoliberais e liberais como
Mises, Hayek, Weber que concordaram com os anarquistas (Kropotkin, Malatesta, Carlo Cafiero e
o próprio Bakunin), já que os anarquistas foram os primeiros a criticar o Estado e o centralismo
estatal sobre a economia em toda sua estrutura.

Em primeiro lugar, Mises assume uma economia planificada centralizada. Como Hayek resumiu, o
cerne da questão era "a impossibilidade de um cálculo racional em uma economia centralmente
dirigida da qual os preços são necessariamente ausentes" , um que "envolve planejamento em
uma escala mais extensa - direção minúscula de praticamente toda atividade produtiva por uma
autoridade central". Assim, a "autoridade central tem que resolver o problema econômico de
distribuir uma quantidade limitada de recursos entre um número praticamente infinito de propósitos
concorrentes" com "um grau razoável de precisão, com um grau de sucesso igual ou aproximando
os resultados do capitalismo competitivo", é o que "constitui o problema do socialismo como
método". ["A Natureza e História do Problema" , pp. 1-40, op. Cit. p.35, p. 19 e pp. 16-7].

Embora essa fosse uma ideia comum na social-democracia marxista (e no leninismo que veio
dela), as organizações centralizadas são rejeitadas pelo anarquismo. Como Bakunin argumentou,
"onde estão os intelectos suficientemente poderosos para abraçar a multiplicidade infinita e a
diversidade de interesses reais, aspirações, desejos e necessidades que resumem a vontade
coletiva das pessoas? E inventar uma organização social que não será um leito de Procusto sobre
a qual a violência do Estado forçará mais ou menos abertamente a sociedade infeliz a se
estender?" Além disso, um governo socialista, "a menos que fosse dotada de onisciência,
onipresença e onipotência que os teólogos atribuem a Deus, não poderia possivelmente conhecer

26
e prever as necessidades de seu povo, nem satisfazer com justiça justa os interesses mais
legítimos e prementes". [Bakunin on Anarchism , pp. 268-9 e p. 318] Para Malatesta, tal sistema
exigiria "uma imensa centralização" e séria ou "uma coisa impossível de alcançar, ou, se possível,
terminaria como uma tirania colossal e muito complexa". [No Café , p. 65].

Kropotkin, da mesma forma, descartou a noção de planejamento central como "as mudanças
econômicas que resultarão da revolução social serão tão imensas e tão profundas ... que será
impossível para um ou mesmo um número de indivíduos elaborar as formas sociais, para o qual
uma nova sociedade deve dar à luz. A elaboração de novas formas sociais só pode ser o trabalho
coletivo das massas". [Palavras de um revoltado, p. 175] A noção de que um "governo fortemente
centralizado" poderia "ordenar que uma quantidade prescrita" de um bem "seja enviada para tal
lugar em tal dia" e ser "recebida num determinado dia por um funcionário especificado e
armazenada em armazéns, não era apenas ‘indesejável’”, mas também "descontroladamente
utópico". Durante sua discussão sobre os benefícios do livre acordo contra a tutela do Estado,
Kropotkin observou que apenas o primeiro permitia a utilização da "cooperação, o entusiasmo, o
conhecimento local" do povo. [A Conquista do Pão , pp. 82-3 e p. 137].

A própria experiência de Kropotkin havia mostrado como os "altos funcionários" da burocracia


czarista "eram simplesmente encantadores em sua inocente ignorância" das áreas que deveriam
administrar e como, graças ao marxismo, o ideal socialista "perdera o caráter de algo, isso teve
que ser trabalhado pelas próprias organizações trabalhistas, e tornou-se uma administração
estatal das indústrias - na verdade, o socialismo de Estado, isto é, o capitalismo de Estado". Como
anarquista, ele sabia que os governos se tornam "isolados das massas" e, assim, "o próprio
sucesso do socialismo" exigia "que as idéias do não-governo, da autoconfiança, da livre iniciativa
do indivíduo" fossem “pregadas lado a lado com as da propriedade e produção socializadas”.
Assim, era essencial que o socialismo fosse descentralizado, federal e participativo, que a
"estrutura da sociedade que desejávamos" fosse "elaborada, na teoria e na prática, de baixo para
cima por todos os sindicatos de trabalhadores" com "um pleno conhecimento das necessidades
locais de cada comércio e de cada localidade".[ Memórias de um revolucionário , p. 184, p. 360, p.
374-5 e p. 376] Ele reiterou isso quando os bolcheviques confirmaram suas advertências: "O
imenso trabalho construtivo exigido por uma revolução social não pode ser realizado por um
governo central ... Se tem a necessidade de conhecimento, de cérebros e da colaboração
voluntária de uma série de forças locais e especializadas que sozinhas podem atacar a
diversidade de problemas econômicos em seus aspectos locais ... O socialismo certamente fará
progressos consideráveis, e novas formas de vida mais independente serão criadas com base na
autonomia local e na livre iniciativa. ... Mas o sucesso desta reconstrução dependerá em grande
parte da possibilidade de cooperação direta entre os diferentes povos. Para conseguir isso, é
necessário que. . . deveria haver uma união de todas as organizações operárias do mundo,
federadas para entregar a produção mundial a partir de sua atual sujeição ao capitalismo".
[Anarquismo pp. 255-6].

Portanto, os anarquistas podem concordar com Mises que o planejamento central não pode
funcionar na prática como seus defensores esperam. Ou, mais corretamente, Mises concordou
com os anarquistas, pois nos opusemos ao planejamento central primeiro. Há muito tempo
reconhecemos que não se pode esperar que um pequeno grupo de pessoas conheça o que
acontece na sociedade e planeje de acordo com isso ( "Nenhum cérebro nem órgão de
inteligência pode ver essa organização". [Issac Puente, Libertarian Communism , p. 29] ). Além
disso, há também a questão premente da liberdade, por "o despotismo do Estado [socialista] seria

27
igual ao despotismo do estado atual, aumentado pelo despotismo econômico de todo o capital que
passaria para as mãos do Estado, e o todo seria multiplicado por todo o centralização necessária
para este novo Estado. E é por isso que nós, os anarquistas, amigos da liberdade, pretendemos
combatê-los até o fim". [Carlo Cafiero, "Anarchy and Communism" , pp. 179-86, The Raven , n. 6,
p. 179].

A outra suposição de Mises é igualmente falha. Isto é que sem o mercado, nenhuma informação é
passada entre os produtores além do resultado final da produção. Em outras palavras, ele
assumiu que o produto final é tudo o que conta para avaliar seu uso. É desnecessário dizer que é
verdade que, sem mais informações do que o nome de um dado produto, é impossível determinar
se o uso seria uma utilização eficiente dos recursos. Ainda mais informações podem ser
fornecidas que podem ser usadas para informar a tomada de decisão. Como os socialistas Adam
Buick e John Crump apontam, "no nível da unidade de produção individual ou da indústria, os
únicos cálculos que seriam necessários no socialismo seriam os cálculos em espécie. De um lado,
seriam registrados os recursos (materiais, energia, equipamentos, mão-de-obra) usados ​na
produção e de outro, a quantidade de bem produzida, juntamente com quaisquer subprodutos ... A
produção socialista é simplesmente a produção de valores de uso a partir de valores de uso e
nada mais”. [Capitalismo de Estado: o sistema de salários sob nova administração , p. 137] Assim,
qualquer bem usado como entrada em um processo de produção exigiria a comunicação desse
tipo de informação.

A geração e comunicação de tal informação implica uma rede horizontal descentralizada entre
produtores e consumidores. Isso ocorre porque o que conta como um valor de uso só pode ser
determinado por aqueles que o usam diretamente. Assim, a produção de valores de uso a partir
de valores de uso não pode ser alcançada por meio do planejamento central, pois os planejadores
centrais não têm noção do valor de uso dos bens sendo usados ​ou produzidos. Tal conhecimento
encontra-se em muitas mãos, dispersas pela sociedade, e a produção socialista implica
descentralização. Os ideólogos capitalistas afirmam que o mercado permite a utilização de tal
conhecimento disperso, mas, como observa John O'Neill, "o mercado pode ser uma maneira pela
qual o conhecimento disperso pode ser posto em prática. Não é . . . o único jeito". "A força do
argumento epistemológico para o mercado depende em parte da implausibilidade de assumir que
todo conhecimento poderia ser centralizado em alguma agência de planejamento particular" ,
enfatiza, mas o argumento de Mises "ignora, no entanto, a existência de instituições
descentralizadas, mas predominantemente não-mercantis, para a distribuição do conhecimento ...
A suposição de que apenas o mercado pode coordenar o conhecimento não-vocalizável disperso
é falsa”. [ Op. Cit. p.118 e p. 132].

Assim, para determinar se um bem específico é útil para uma pessoa, essa pessoa precisa
conhecer seu "custo". Sob o capitalismo, a noção de custo tem sido tão associada ao preço que
temos que colocar a palavra "custo" entre aspas. No entanto, o custo real de, digamos, escrever
um livro, não é uma soma de dinheiro, mas sim tanto papel, tanta energia, tanta tinta, tanto
trabalho humano. A fim de tomar uma decisão racional sobre se um determinado bem é melhor
para atender uma determinada necessidade do que outro, o consumidor em potencial precisa
dessas informações. No entanto, sob o capitalismo, esta informação é escondida pelo preço.

Um tanto ironicamente, dado que a economia "austríaca" tende a enfatizar que as limitações
informacionais estão na raiz de sua "impossibilidade" do socialismo, o fato é que o mercado
esconde uma quantidade significativa de informações essenciais necessárias para tomar uma

28
decisão de investimento sensata. Isso pode ser visto a partir de uma análise da discussão de
Mises sobre por que a jornada de trabalho não pode substituir o dinheiro como uma ferramenta de
tomada de decisão. A utilização de mão-de-obra, argumentou, "deixa de lado o emprego de
fatores materiais de produção" e apresenta um exemplo de dois bens, P e Q, que levam 10 horas
para serem produzidos. P leva 8 horas de trabalho, mais 2 unidades de matéria-prima A (que é
produzida por uma hora de trabalho socialmente necessário). Q leva 9 horas de trabalho e uma
unidade de A.Ele afirma que em termos de trabalho P e Q "são equivalentes, mas em termos de
valor P é mais valioso que Q. O primeiro é falso, e somente o posterior corresponde à natureza e
propósito do cálculo”. ["Cálculo Econômico na Comunidade Socialista" , Op. Cit. p. 113].

A falha em seu argumento é clara. Assumindo que uma hora de trabalho socialmente necessário é
de 10 libras, então, em termos de preço, P teria 80 libras de mão-de-obra direta, 20 libras de
matéria-prima A, enquanto Q teria 90 libras de mão-de-obra direta e 10 libras de A. custou £100
por isso é difícil ver como isso "corresponde à natureza e finalidade do cálculo"! Usando menos
matéria-prima A é uma avaliação feita além de "cálculo" neste exemplo. A questão de se
economizar no uso de A simplesmente não pode ser feita usando preços. Se P, por exemplo, só
pode ser produzido através de um processo ecologicamente mais destrutivo que Q ou se o
processo de trabalho pelo qual P é criado é marcado por trabalho insensato e sem sentido, mas Q
é mais satisfatório para as pessoas envolvidas que Q pode ser considerado melhor decisão.
Infelizmente, esse tipo de informação não é comunicado pelo mecanismo de preços.

Como John O'Neill aponta, "os argumentos anteriores de Mises contra o planejamento socialista
se baseavam numa suposição sobre comensurabilidade. Seu argumento central era que a tomada
de decisão econômica racional exigia uma única medida com base na qual o valor de estados de
coisas alternativos poderia ser calculado e comparado". [Ecology, Policy and Politics , p. 115]
Essa suposição central não foi contestada por Taylor e Lange em sua defesa do "socialismo",
significando que desde o início o debate contra Mises era defensivo e baseado no argumento de
que o planejamento socialista poderia imitar o mercado e produzir resultados eficientes a partir de
um ponto de vista capitalista.

Os anarquistas questionam se usar preços significa basear toda a tomada de decisão em um


critério e ignorar todos os outros é uma coisa racional a ser feita. Como O'Neill sugere, "a
escassez relativa de itens (...) dificilmente exaure toda a gama de informações distribuídas pela
sociedade, o que pode ser relevante para a coordenação de atividades e planos econômicos". [O
mercado p. 196] Dizer que um bem custa £ 10 não lhe diz muito sobre a quantidade de poluição
que sua produção ou uso gera, sob que condições de trabalho foi produzido, se seu preço é
afetado pelo poder de mercado da empresa que o produz, se ja é produzido de maneira
ecologicamente sustentável e assim por diante. Da mesma forma, dizer que outro, semelhante,
bem custa £ 9 não diz se a diferença de £1 é devida a um uso mais eficiente dos insumos ou se é
causada pela imposição de poluição ao planeta.

E os preços realmente refletem os custos? A questão do lucro, a recompensa por possuir capital e
permitir que outros o usem, dificilmente é um custo da mesma forma que trabalho, recursos e
assim por diante (tentativas de explicar lucros como um sacrifício equivalente como trabalho
sempre foram ridículas e rapidamente descartadas ). Ao olhar para os preços para avaliar o uso
eficiente dos bens, você não pode realmente dizer pelo preço, se assim for. Dois bens podem ter o
mesmo preço, mas os níveis de lucro (talvez sob a influência do poder de mercado) podem ser
tais que um tem um preço de custo mais alto do que outro. O mecanismo de preço não indica qual

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utiliza menos recursos, pois é influenciado pelo poder de mercado. De fato, como Takis
Fotopoulos observa, "Tanto o planejamento central quanto a economia de mercado levam
inevitavelmente a concentrações de poder, e nem o primeiro nem o segundo podem produzir o
tipo de fluxo de informação e incentivos necessários para o melhor funcionamento de qualquer
sistema econômico". [Rumo a uma democracia inclusiva , p. 252] Além disso, um bem produzido
sob um Estado autoritário que reprime sua força de trabalho poderia ter um preço menor do que
aquele produzido em um país que permitia aos sindicatos se organizar e ter direitos humanos
básicos. A repressão forçaria o custo do trabalho, fazendo com que o bem em questão apareça
como um uso mais "eficiente" dos recursos. Em outras palavras, o mercado pode mascarar a
desumanidade como "eficiência" e realmente recompensar esse comportamento por participação
de mercado.

Em outras palavras, os preços de mercado podem ser terrivelmente distorcidos, pois ignoram os
problemas de qualidade. As trocas, portanto, ocorrem à luz de informações falsas e, além disso,
com motivações antissociais - para maximizar o excedente de curto prazo para os capitalistas,
independentemente das perdas para os outros. Assim, eles distorcem as avaliações e impõem um
individualismo grosseiro, estreito e, em última análise, autodestrutivo. Os preços são moldados por
mais do que os custos, com, por exemplo, o poder de mercado aumentando os preços de
mercado muito mais do que os custos reais. Os preços de mercado também não levam em conta
os bens públicos e, portanto, as escolhas de alocação contra eles, para não mencionar o fato de
ignorar os efeitos sobre a sociedade em geral, ou seja, além dos compradores e vendedores
diretos. Da mesma forma, a fim de tomar decisões racionais relativas ao uso de um bem, você
precisa saber por que o preço mudou para que se uma mudança é permanente ou transitória
implica respostas diferentes. Assim, o preço atual não é suficiente por si só. O bem se torna mais
caro temporariamente, devido, digamos, a uma greve? Ou é porque o fornecimento do recurso foi
esgotado? Ações que são sensíveis na primeira situação estarão erradas na outra. Como O'Neill
sugere, "a informação [no mercado] é passada sem diálogo. O mercado informa por 'saída' -
alguns produtos encontram um mercado, outros não. 'A voz' não é exercida. Essa falha de diálogo
... representa uma falha informacional do mercado, não uma virtude ... O mercado ... distribui
informações ... também bloqueia muito". [Op. Cit. p. 99].

Os preços ocultam os custos reais que a produção envolve para o indivíduo, a sociedade e o meio
ambiente e, em vez disso, resumem tudo em um fator, a saber, o preço. Há falta de diálogo e
informação entre produtor e consumidor.

Além disso, sem usar outro meio de contabilidade de custos em vez de preços, como os
defensores do capitalismo sabem que há uma correlação entre os custos reais e os preços?
Pode-se determinar se tal correlação existe medindo uma contra a outra. Se isso não puder ser
feito, a alegação de que os preços medem os custos é uma tautologia (em que um preço
representa um custo e sabemos que é um custo porque tem um preço). Se isso puder ser feito,
podemos calcular os custos em algum outro sentido do que nos preços de mercado e, portanto, o
argumento de que apenas os preços de mercado representam os custos cai. Da mesma forma,
pode haver custos (em termos de questões de qualidade de vida) que não podem ser refletidos
em termos de preço.

Simplificando, o mercado não distribui todas as informações relevantes e, particularmente quando


os preços estão em desequilíbrio, pode comunicar informações claramente enganosas . Nas
palavras de dois anarquistas sul-africanos, "os preços no capitalismo forneciam, na melhor das

30
hipóteses, informações incompletas e parciais que obscurecem o funcionamento do capitalismo e
geram e reproduzem desigualdades econômicas e sociais. Ignorando o caráter social da
economia com seu individualismo metodológico, econômico os liberais também ignoraram os
custos sociais de escolhas particulares e a questão das externalidades". [Michael Schmidt and
Lucien van der Walt, Black Flame, p. 92] Isso sugere que os preços não podem mais ser levados a
refletir os custos reais que podem refletir a expressão social da avaliação de bens. Eles são o
resultado de um conflito travado sobre esses bens e aqueles que atuaram como insumos
(incluindo, é claro, o trabalho). Mercado e poder social, muito mais que necessidade ou uso de
recursos, decidem a questão. A desigualdade nos meios de aquisição, no poder de mercado das
empresas e na posição de barganha de trabalho e capital, tudo isso faz sua parte, distorcendo
assim qualquer relação que um preço possa ter com seus custos em termos de uso de recursos.
Os preços estão deformados.

Não é de admirar que Kropotkin tenha perguntado se "não estamos ainda obrigados a analisar
esse resultado composto que chamamos de preço, em vez de aceitá-lo como um governante
supremo e cego de nossas ações?" [Campos, Fábricas e Oficinas , p. 71] São precisamente estes
custos reais, ocultos pelo preço, que devem ser comunicados aos produtores e aos consumidores
para que tomem decisões informadas e racionais relativamente à sua atividade econômica.

É útil lembrar que Mises argumentou que é a complexidade de uma economia moderna que
garante que o dinheiro é necessário: "Dentro dos limites estreitos da economia doméstica, por
exemplo, onde o pai pode supervisionar toda a administração econômica, é possível determinar o
significado das mudanças nos processos de produção, sem tais auxílios para a mente [como
cálculo monetário], e ainda assim com mais ou menos precisão". Contudo, "a mente de um
homem sozinho - seja sempre tão esperto, é fraca demais para compreender a importância de
qualquer um entre os incontáveis ​bens de ordem superior. Nenhum homem sozinho pode dominar
todas as possibilidades de produção, por mais inumeráveis que sejam, a ponto de estar em
posição de fazer julgamentos evidentes de valor sem o auxílio de algum sistema de computação".
[Op. Cit. p. 102].

Uma sociedade comunista libertária deveria, deve ser enfatizada, usar vários "auxílios à mente"
para ajudar indivíduos e grupos a tomar decisões econômicas. Isso reduziria a complexidade da
tomada de decisões econômicas, permitindo que diferentes opções e recursos fossem
comparados entre si. Portanto, a complexidade da tomada de decisão econômica em uma
economia com uma infinidade de bens pode ser reduzida pelo uso de procedimentos e métodos
algorítmicos racionais para auxiliar o processo. Tais ferramentas ajudariam na tomada de
decisões, não a dominariam, já que essas decisões afetam os humanos e o planeta e nunca
deveriam ser feitas automaticamente.

Sendo assim, uma sociedade comunista libertária desenvolveria rapidamente os meios de


comparar o impacto real de bens específicos de "ordem superior" em termos de seus custos reais
(isto é, a quantidade de trabalho, energia e matérias-primas usadas mais quaisquer custos sociais
e ecológicos ). Além disso, deve ser lembrado que os bens de produção são feitos de insumos de
outros bens, ou seja, bens mais altos são feitos de bens de consumo de ordem inferior. Se, como
Mises admite, o cálculo sem dinheiro é possível para bens de consumo, então a criação de bens
de "ordem superior" também pode ser alcançada e um registro de seus custos é feito e
comunicado àqueles que procuram usá-lo.

31
Embora os "auxílios à mente" específicos , bem como os "custos" e seu peso relativo sejam
determinados pelas pessoas de uma sociedade livre, podemos especular que incluiria trabalho
direto e indireto, externalidades (como poluição), energia uso e materiais, e assim por diante.
Como tal, deve-se ressaltar que uma sociedade comunista libertária buscaria comunicar os
"custos" associados a qualquer produto específico, bem como sua relativa escassez. Em outras
palavras, ele precisa de um meio de determinar os custos objetivos ou absolutos associados a
diferentes alternativas, bem como uma indicação de quanto de um determinado bem está
disponível em um determinado nível (ou seja, sua escassez). Ambos podem ser determinados
sem o uso de dinheiro e mercados.

Os anarquistas argumentam que Mises estava errado. O comunismo é viável, mas apenas se for
comunismo libertário . Em última análise, porém, a acusação real não é que o socialismo é
"impossível", mas sim que seria ineficiente, ou seja, alocaria recursos de tal forma que muito é
usado para atingir as metas especificadas e que não haveria maneira de verificar se recursos
alocados foram avaliados suficientemente para garantir seu uso em primeiro lugar. Enquanto
alguns podem retratar isso como um caso de planejamento contra mercados (sem planejamento),
isso é falso. O planejamento ocorre no capitalismo (como pode ser visto em qualquer negócio), é
uma questão de saber se o capitalismo garante que mais planos possam ser coordenados e que
as necessidades sejam atendidas por meio de preços relativos e contabilidade de perda de lucros
do que pelo comunismo (acesso livre e distribuição de acordo com a necessidade). Como tal, a
questão é se o sistema capitalista acrescenta problemas adicionais à coordenação eficiente dos
planos?

Todas as escolhas envolvem possibilidades perdidas, portanto, o uso eficiente de recursos é


necessário para aumentar as possibilidades de criação de outros bens. Na melhor das hipóteses,
tudo o que você pode dizer é que ao escolher opções que custam menos, uma economia de
mercado disponibiliza mais recursos para outras atividades. No entanto, essa suposição depende
crucialmente de equacionar "eficiente" com lucrativo, uma situação que não pode ser prevista de
antemão e que facilmente leva à alocação ineficiente de recursos (especialmente se estivermos
atendendo às necessidades humanas). Então, há os custos de usar dinheiro para se estamos
falando de custos de oportunidade, de liberação de recursos para outros usos, então o trabalho e
outros recursos usados ​para processar atividades relacionadas a dinheiro devem ser incluídos.
Embora essas atividades (bancário, publicitário, defensor de propriedades e assim por diante)
sejam essenciais para uma economia capitalista, elas não são necessárias e improdutivas do
ponto de vista da produção de valores de uso ou da satisfação das necessidades humanas. Isso
sugeriria que uma economia comunista libertária teria uma vantagem produtiva sobre a economia
capitalista, pois a eliminação desse resíduo estrutural intrínseco ao capitalismo liberaria uma vasta
quantidade de mão-de-obra e materiais para produção socialmente útil. Isto não é para mencionar
os chamados "custos" que não são tais coisas, mas se relacionam com os direitos de propriedade
capitalistas. Assim, o "aluguel" pode ser considerado um custo sob o capitalismo, mas
desapareceria se aqueles que usassem um recurso controlassem-no, em vez de pagarem um
tributo para obter acesso a ele. Como Kropotkin argumentou, "o sistema capitalista nos faz pagar
por três ou quatro vezes seu valor de trabalho" graças ao aluguel, lucro, juros e ações dos
intermediários. Tais "custos" específicos do sistema ocultam os custos reais (em termos de uso de
mão-de-obra e de recursos) aumentando o preço em comparação a se "calculamos nossas
despesas em mão-de-obra". [Op. Cit. p. 68].

32
Além disso, um pouco ironicamente, essa "economia" de recursos que o mercado alega alcançar
não é conservar recursos para as gerações futuras ou garantir a estabilidade ambiental. Pelo
contrário, é permitir que mais bens sejam produzidos para acumular mais capital. Pode-se
argumentar que o mercado obriga os produtores a minimizar os custos, partindo do pressuposto
de que os custos menores terão maior probabilidade de resultar em lucros mais altos. No entanto,
isso deixa o impacto social de tal corte de custos fora da equação. Por exemplo, impor
externalidades a outros reduz os preços de uma empresa e, como resultado, é recompensada
pelo mercado, por mais desagradável e exaustivo que seja o trabalho, ou o aumento dos níveis de
poluição não parece uma coisa sensata a se fazer. Então, sim, é verdade que uma empresa
capitalista procurará minimizar os custos para maximizar os lucros. Isso, à primeira vista, pode ser
visto como levando a um uso eficiente dos recursos até que os resultados disso se tornem claros.
Assim, poderiam ser criados bens que não durassem o quanto pudessem, que precisassem de
reparos constantes, etc. Assim, uma casa produzida "eficientemente" sob o capitalismo poderia
ser um lugar pior para viver simplesmente porque os custos eram reduzidos cortando cantos
(menos isolamento, paredes mais finas, materiais menos robustos, etc.). Além disso, o resultado
coletivo de todas essas decisões "eficientes" poderia ser socialmente ineficiente, uma vez que
reduz a qualidade de vida dos que estão sujeitos a elas, além de levar a investimentos
excessivos, superprodução, queda de lucros e crise econômica. Como tal, pode-se argumentar
que o argumento de Mises expõe mais dificuldades para o capitalismo do que para o anarquismo.

Finalmente, deve-se notar que a maioria dos anarquistas questionaria os critérios que Hayek e
Mises usaram para julgar os méritos relativos do comunismo e do capitalismo. Como o primeiro
disse, a questão era "uma distribuição de renda independente da propriedade privada nos meios
de produção e um volume de produção que era pelo menos aproximadamente o mesmo ou até
maior do que aquele obtido sob livre concorrência". [ "A natureza e a história do problema" , op.
Cit. p. 37] Assim, a questão é reduzida para a de saída (quantidade), não para questões de
liberdade (qualidade). Se a escravidão ou o stalinismo produziu mais produção do que o
capitalismo de livre mercado, isso não tornaria nenhum dos sistemas desejáveis. Esse foi, de fato,
um argumento comum contra o stalinismo durante as décadas de 1950 e 1960, quando parecia
que o planejamento central produzia mais bens (e ironicamente, pela direita proprietarianista
contra o Estado de bem-estar, deve-se lembrar que o volume de produção, como lucratividade e
"eficiência", no mercado depende da distribuição de renda e uma redistribuição de ricos para
pobres poderia facilmente resultar em mais produção tornando-se rentável). Da mesma forma, que
o capitalismo produz mais álcool e Prozac para atender a maior demanda por entorpecer as
mentes daqueles que tentam sobreviver sob ele não seria um argumento contra o comunismo
libertário! Enquanto os anarquistas buscam satisfazer as necessidades humanas materiais, não
pretendemos, como no capitalismo, sacrificar todos os outros objetivos para esse objetivo, como
faz o capitalismo. Assim, para declarar o óbvio, o objetivo do volume máximo de produção só faz
sentido sob o capitalismo, pois o máximo de felicidade e liberdade humanas pode ocorrer com um
volume menor de produção em uma sociedade livre. As pessoas de uma sociedade sem
opressão, exploração e alienação dificilmente agirão de maneira idêntica, nem buscarão o mesmo
volume de saídas, como aqueles em um, como o capitalismo, marcados por esses traços!

A "eficiência" capitalista dificilmente é racional e, para uma eficiência totalmente humana e


ecológica, o comunismo libertário é necessário. Como Buick e Crump apontam, "a sociedade
socialista ainda tem que se preocupar em usar os recursos de forma eficiente e racional, mas os
critérios de 'eficiência' e 'racionalidade' não são os mesmos do capitalismo". [ Op. Cit. p. 137] Sob
o anarquismo comunista, o sistema de tomada de decisões usado para determinar o melhor uso

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dos recursos não é mais ou menos "eficiente" do que a alocação de mercado, porque vai além do
conceito baseado no mercado de "eficiência". Não procura imitar o mercado, mas fazer o que o
mercado não faz. Isso é importante, porque o mercado não é o sistema racional que seus
defensores costumam reivindicar. Embora a redução de todas as decisões para um fator comum
seja, sem dúvida, um método fácil de tomada de decisão, ele também tem sérios efeitos colaterais
por causa de sua base reducionista. O mercado torna a tomada de decisão simplista e gera uma
série de irracionalidades e efeitos desumanizadoras como resultado. Então, afirmar que o
comunismo será "mais" eficiente que o capitalismo ou vice-versa, não entende o ponto. O
comunismo libertário será "eficiente" de uma maneira totalmente diferente e as pessoas agirão de
maneiras consideradas "irracionais" apenas sob a lógica estreita do capitalismo.

Para outra crítica de Mises, veja Robin Cox “The 'Economic Calculation' controversy: unravelling of
a myth" [Common Voice, Issue 3].

10. Do neologismo "libertário"

a) O termo Libertário de fato surge contra o termo an-arquia utilizada por Proudhon, Proudhon
utilizou-se da propaganda, isso é, ele ao mesmo tempo que se intitulou "an-arquista" o foi também
intitulado de "an-arquista" pelos seus inimigos contemporâneos, em Proudhon o uso e emprego do
termo "an-arquia" é derivado apenas pelo seu sentido etimológico, isso é, uma ocorrência, uma
situação de caos, de desordem política, um fato; e em nenhum momento uma doutrina política. A
essência da teoria mutualista é e se dá apenas na sua concepção econômica, não
necessariamente na concepção política, assim, utilizando-se da noção historicista, a
superestrutura seria determinada pela infraestrutura, ocasionando dessa forma a organização
econômica-política do mutualismo a partir do Federalismo, o que de fato não redime ou aboli o
Estado, apenas modifica as relações (superestrutura) através das condições do mutualismo
(infraestrutura), em Proudhon tanto o governo como a organização social no geral parte da
necessidade do contratualismo e consequentemente do autoritarismo. O termo Libertário por sua
vez, sendo um neologismo, que representa necessariamente e se faz presente a noção
etimológica da "anarquia" (aqui sem hífen), em francês "libertaire" possui a mesma questão
significativa do termo "anarchiste" [Libertaire-isme está associado ao anarchie-isme-iste (a
frequência de uso desses últimos termos sendo de outra forma significativamente maior).
Geralmente o equivalente exato do anarchie-isme-iste, o libertaire-isme pode se distinguir dele
para conotar mais precisamente a noção de radicalismo anárquico (e é além disso a motivação de
sua criação). É realmente uma questão de se opor ao homem que, aos olhos dos
contemporâneos, que primeiro identificou-se com o conceito de anarquia *anarchie*, Proudhon.]
{1}.

b) Na AIT o uso do termo "an-arquia/quista" estava ligado diretamente a ala do proudhonianismo e


que denotava uma forma de reformismo econômico, Bakunin e demais socialistas libertários
evitavam o uso do termo "an-arquia", se intitulando de socialistas revolucionários ou libertários, ala
dos socialistas libertários nesse sentido se opunha fervorosamente contra a ala dos mutualistas ou
do partido proudhoniano que era identificado na época como "an-arquista", nesse aspecto,
Bakunin chegou através de votações, conceder poderes a ala socialista autoritária (Marx e Engels)
contra a ala mutualista. Nesse aspecto, o termo "an-arquia" era apenas uma denotação e não uma
doutrina, assim o uso de "an-arquia" ainda para Bakunin na época, era apenas o resultado do

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caos e desordem ocasionada por uma grande comoção popular, o uso do termo em Bakunin
ainda é negativo, e com isso distingue o movimento socialista em três partes distintas e repartida
em duas categorias: 1 - Socialistas moderados ou burgueses; e 2 - Socialistas revolucionários,
este último se subdivide em duas partes; os "estatistas socialistas revolucionários" e "os
anarquistas socialistas revolucionários". E mesmo assim, em Bakunin o uso do termo anarquia,
possui uma definição ambivalente, a primeira como "é a organização livre das massas
trabalhadoras de baixo para cima”, e a segunda, como "caos caos político, para transformá-la em
revolução social", e não como de fato uma doutrina política. {2}

c) Porém, mesmo a definição de anarquia em Bakunin sendo ambivalente, ela assume um caráter
de doutrina política, devido ao embate entre os socialistas revolucionários/libertários contra os
socialistas autoritários, e é a partir da Internacional Anti-autoritária, que conta com os comunistas
libertários (Carlo Cafiero, Kropotkin, Malatesta e outros) que o termo anarquia/libertário se tornam
uma doutrina social e científica, superando a ambivalência em Bakunin, e retirando toda a carga
etimológica utilizada pelos mutualistas, colocando assim, que é a partir da filosofia política e social
em Bakunin e com o desenvolvimento econômico, moral, ético, histórico, geográfico nos
comunistas libertários que o anarquismo passa a ser conotado como "doutrina social" e ou
"doutrina libertária", já que o uso do termo "anarquismo" provém apenas a partir da Internacional
Anti-Autoritária. Temos uma condição pre-anarquista (Proudhon, Dejacque e Bakunin) e uma
condição anarquista (Cafiero, Kropotkin, Emma, Louisa Benevigton, Malatesta, Reclus...) que
começa a partir de 1876.

Então temos um uso do termo de "an-arquia" em Proudhon em seu sentido liberal, isso é, não
como abolição do Estado, e sim com sua adequação ao "direito natural", onde o emprego da
palavra só ocorre em poucos escritos. O uso do termo "anarquia" em Bakunin com definição
ambivalente, porém, desenvolvendo a partir dele a doutrina política que desenvolverá por fim a
equivalência entre a doutrina política e doutrina libertária, formando assim a composição do
Comunismo Libertário/Comunismo-Anarquista/Anarco-Comunismo que é o movimento anarquista
real. {3}

Temos assim, que enquanto em Proudhon o uso "an-arquia" era relativo a um reformismo
econômico, em Dejacque o termo "libertário" é oque formaria a base da doutrina política em
Bakunin (mesmo este não mencionando Dejacque) em sua situação antiteísta, antiestatista,
antiproprietarianista e por fim antimercantilista.

Por isso hoje o libertário é anarquista e o anarquista é o libertário, dentro da doutrina libertária
(organização socioeconômica comunista).

{1}Joseph Déjacque et la création du néologisme "libertaire" (1857): https://bit.ly/2YwUx6y

{2} Para mais informações sobre o termo "anarquia", consultar o escrito: O emprego do termo
"Anarquia" em Bakunin, René Berthier.

{3} Proudhon anarquista? Estado, mercado e o pensamento econômico proudhoniano:


https://bit.ly/2w8a00v

11. Anarquismo e organização(O Defeito Anarquista).

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O problema da organização, até onde eu consigo enxergar, está de fato na sua disfuncionalidade
econômica, os grupos ou coletivos se formam com um caráter anarquista, mas, que mantém essa
disfunção em um corpo econômico mais abrangente, ou seja, eles [grupos/coletivos] não
conseguem se sustentar por muito tempo, logo assumem um caráter de empreendedorismo, e, ali
começam a se misturar com outras tendências que a princípio estão diretamente oposto ao
anarquismo; disputar diretórios acadêmicos e estudantis para tentar criar uma força, algo como,
uma tentativa de criar uma prospecção para o futuro, mas que, no final acaba deteriorando a
própria organização.

Os grupos libertários têm que compreender que a organização e o desenvolvimento da idéia


anárquica inevitavelmente começa dentro da organização libertária que se fundou, para só depois,
cair nas graças das lutas sociais “O remédio não está na organização, mas na consciência
perfectível dos membros.”[1] — Se os membros são incapazes de se organizarem e formalizarem
uma afinidade que consiga manter a liberdade e autonomia dos indivíduos, e com isso, através da
prática desenvolver e expandir a ideia da organização a outros grupos, para criar uma União
Libertária, a organização vai inevitavelmente sucumbir, se ainda continuar com os ideais
libertários, e, se mesmo assim continuar, não poderíamos chamar mas esse grupo ou coletivo de
anarquista, mas sim de uma organização de ramificação esquerdista e reformista.
A organização anarquista, deve se ater ao fato que se ela quer uma mudança radical, tanto no
nível micro quanto no macro, deve não ser um movimento isolado em uma localidade X, mas sim,
uma condição permanente de mobilidade em todos os níveis. Então, essas organizações devem
mudar sua estrutura clássica de formação e ação, e, assim se estruturar em um novo tipo de
organismo [sociometabolismo comunista [2]] que dará margem tanto a uma movimentação
autônoma e liberta dentro das organizações, como, dentro da UL, e isso podemos chamar de
Núcleo de base autônomo em síntese com a auto-organização autônoma.
O que é o Núcleo de Base Autônomo e Auto-Organização Autônoma ?
O NBAt como fala Alfredo Maria Bonanno[3], não é uma concepção nova, e já é tentada na Itália,
com o “Movimento Autônomo dos Trabalhadores Ferroviários de Turim” (Bonanno,2013), esse
NBAt “são as estruturas das massas e constituem o ponto de encontro entre a organização
anarquista informal e as lutas sociais.”[4] Ou seja, os Núcleos de base autônomos são coletivos
anarquistas, agindo com objetivos diretos e concisos, não chega a ser um ataque ao Capital e ao
Estado na sua estrutura completa, e sim nas suas estruturas menores, seja recorrendo ao método
insurrecional ou a ocupação. É uma organização informal que liga os anarquistas as lutas sociais,
mas que, não retira o objetivo do programa anarquista dessas lutas, claro que essa organização
informal é apenas a base que irá desenvolver ao que iremos chamar de União Libertária, dentro
de um sociometabolismo comunista.
A Auto-Organização Autônoma antes de tudo, nunca aparece como um partido político, sindicato
ou qualquer organização de viés representativo, esse tipo de representatividade se apropria da
luta dos excluídos e explorados, reclamando agir em seu nome, mas que não passa de um jogo
de politiques para continuar no poder e impondo sua visão autoritária de mundo. Ao contrário
disso, a AOA aparece quando as pessoas, descontentes com seus representantes e delegados
que agem por elas, decidem, elas mesmas, agirem por conta. Quando esse tipo de
auto-organização surge, os partidos políticos, tentam interagir com esse tipo de organização
“autônoma apenas sob a forma de recuperadores da luta, guerreando-se para tomar a liderança e
se imporem como porta-vozes da luta — normalmente com o objectivo de negociar com os
governantes. Assim, eles podem ser vistos apenas como potenciais usurpadores onde quer que
uma revolta auto-organizada esteja a ocorrer.”[5] Tanto o NBAt quanto a AOA, tem princípios
gerais:

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Não-hierárquica, não há uma liderança ou autoridade institucional permanente.
“Enquanto que alguém que se evidencie particularmente conhecedor no que respeita a assuntos
específicos relacionados com a luta que se tem em mãos ser-lhe-á dada a
atenção devida por tal conhecimento, não se pode permitir que isto se torne a base para qualquer
papel de liderança, pois isso iria minar outro traço essencial da auto-organização autônoma.”
Comunicação e relações horizontais.
“Isto é uma questão de pessoas falarem umas com as outras, de interagirem umas com as outras,
de expressarem necessidades e desejos abertamente, discutindo realmente os problemas que
enfrentam em conjunto e em termos práticos, sem qualquer liderança para ajustar esta expressão
a uma linha rígida.”
Unidade básica da Auto-Organização Autônoma é o Indivíduo
“Portanto, auto-organização autônoma é acima de tudo o indivíduo a organizar-se a si mesmo, sob
os seus próprios termos, contra as condições que este mundo lhe impõe, encontrando os meios
necessários para levar a cabo essa luta. Mas entre os meios necessários estão as relações com
outras pessoas, portanto a auto-organização autônoma é também uma prática coletiva. Mas essa
prática coletiva não se baseia em conformar indivíduos a uma organização que se lhes impõe, é
sim baseada no desenvolvimento de relações de mutualidade entre eles, nas quais descobrem as
áreas comuns nas suas lutas e necessidades, afinidade nos seus sonhos e desejos.
Poder-se-ia dizer que auto-organização autônoma é o desenvolvimento de uma luta partilhada
baseada na mutualidade para a completa realização de cada indivíduo envolvido.[6]
Assim, é nítido que tanto o NBAt quanto a AOA partem do mesmo princípio básico, que consegue
unir e ainda sim continuar com sua autonomia e liberdade, sem perder seu princípio, e isso é um
traço importante, para um desenvolvimento real da União Libertária.
Um dos pontos fundamentais da doutrina libertária é a questão da organização do Federalismo
Libertário, uma organização social territorial de subdivisão de tarefas em federações,
confederações, associações, etc… O que difere o Federalismo libertário do Estatal é a
descentralização das ações em escala territorial e uma maior autonomia as confederações, uma
organização que visa partir de Baixo para Cima nas tomadas de decisões, para não entrar muito
nessa concepção, podemos dizer que o Federalismo Libertário é o braço direto das concepções
de ações diretas em uma forma territorial, para soluções de emergências, ou seja, o pilar do
desenvolvimento do anarquismo como ações contra o Estado e o Capital, é a organização
horizontal e autônoma a partir do Federalismo Libertário.
A um enorme conteúdo sobre isso, tanto análises e críticas que não iria caber aqui, por isso não
quero mencionar nenhum juízo além do necessário. Começaremos a explicar o que pode ser
entendido por uma União Libertária.
O NBAt e a AOA, se daria de uma forma espontânea a partir do momento em que as pessoas se
levantam em revolta, longe de jogar seu destino a delegados ou representantes, a partir da
auto-organização iriam planejar seus ataques, desenvolver suas teorias, dentro de um principio
libertário (autonomia e liberdade), ou seja, em vez de impor decisões coletivas envolvendo
compromissos, ela tentaria achar um método de entrelaçar as diferentes ideias, desejos ou
necessidades de um modo que não diminui-se ou limita-se a autonomia e liberdade de outros,
assim “a liberdade do outro, longe de ser um limite ou a negação da minha liberdade, é, ao
contrário, sua condição necessária e sua confirmação[7].” A partir das AOA se fundamenta esse
princípio que pode ser expandido necessariamente e conforme for a necessidade da própria
organização, e que ao se constituir dessa organização, não sofra mudança nenhuma em sua
liberdade e autonomia; — Mas para uma AOA é necessário um corpo que cerque esse princípio
de organização, é o que chamamos de União, as AOA’s são células independentes e livres que se
formam para tais ações, projetos e diretrizes, não tem uma liderança ou delegação e muito menos

37
é vertical em suas relações; a União seria o corpo funcional dessas células, ou seja, ela faria a
reunião dos grupos e unidades individuais; ela surge a partir das organizações e a partir da
formação desses grupos é que irá precisar de um corpo que a sustente e fundamente, o que é a
princípio a União, que cobriria apenas a camada inferior das AOA’s, assim a União surge como
finalidade da auto-organização autônoma.
A União garante uma flexibilidade dado que ela é um corpo de não-ação, já que é a AOA que irá
está incumbida da organização, e a função de reunir esses grupos para garantir uma liberdade
interna é dessa União, que não possui uma prerrogativa normativa da sociedade, ela não emana
nenhuma lei e nem mesmo a proteção do direito de instituição, a única responsabilidade dessa
União é garantir e preservar a liberdade de organizações livres, seja contra inimigos externos —
principalmente contra esses -, como das ameaças a retrocessos nos estágios iniciais da revolução
até sua conclusão. Assim a gestão da coisa pública ficaria pelo princípio da auto-gestão autônoma
tomada como processo “normativo”.
A União nesse sentido é um produto alopoiético[8], sendo a AOA como organismo autopoiético, a
União seria apenas a finalidade desse organismo de suas células independentes, garantido a
liberdade de organizações e autonomia ilimitada. Sendo uma das funções da União a proteção
dessas AOA’s, não existe um ordenamento inverso, são as AOA’s que irão programar a União,
como unidades segregadas criando uma capacidade de ordem que só pode partir de Baixo, a
União é uma função externa que nasce das AOA’s, assim, ligam-se pontos necessários qual sem
ela nunca seriam possíveis.
Já o Federalismo libertário tem como uma ação, a divisão de poderes, a União é o contrário, isto
é, substitui a divisão de poderes pela divisão de tarefas como princípio ético, essa divisão de
tarefas é a que irá manter a saúde da União, já que abre um espaço enorme para ações, sem
causar sobrecarga de computação, as tarefas seriam quase nulas retirando a sobrecarga, já que a
União garantiria as tarefas de proteção e manutenção da saúde interna.
Essa União só apareceria quando surgisse outra comuna por exemplo, como ligamento de
agregação, protegendo a comuna de ações externas, e teria uma finalidade exata, a proteção da
estrutura e tão somente isso. Sua influência não se estenderia até a AOA’s pois é as AOA’s que
se estende até a União, os membros se reuniram para decidir planos de defesa e nada além
disso. O tamanho das cercas, o melhor lugar para colocar pontos de observação, a proteção de
zonas extra territoriais, a proteção da estrutura logística, etc… Isso tudo deveria ser ligado pelo
princípio de divisão de tarefas, seriam pastas de ação dentro do princípio de União, ela não teria
uma função operativa de base normativa clássica, um organismo máximo que defende os
interesses por instituições ligadas, o que existiria seria a União como arranjo organizativo mas
divididos em funções imediatas, então se uma questão é resolvida ela deixa de existir, passando
então para outras tarefas, deixa de existir em tese, pois a AOA engoliria aquela tarefa que antes
era da União. A União é um organismo que nunca mantém sua tarefa indeterminadamente.
Assim que ela entende que a AOA pode assumir a tarefa que antes era da sua alçada ela a deixa
por conta própria. A União é um organismo de ligação e manutenção. E se um grupo interessado
em integrar outro grupo mas, é distante, nesse caso a União serviria para a ligação desses dois
grupos através de seus serviços de organização logística. Serviria para aumentar nosso contato e
aderência e de organismo orientador, porém sem a exigência de comando e controle, essa última
tarefa é de exclusividade da AOA. O que a União faria é acatar aos planos estipulados e
trabalhá-los da forma que melhor atendesse as exigências da tarefa. A União nunca seria
diferente, pois sua função é mesmo a proteção do corpo social em sua independência. Não seria
uma organização normativa mas de finalidade.
Finalidade essa que visa a garantia da independência do corpo social. Ela é um órgão volátil, se
existe a necessidade de se criar uma pasta os interessados entram com seu requerimento e a

38
União dá seu aval, daí essa pasta fica na União por determinado tempo e depois se desprende
dela, essa é sacada da União servir de base de unidade sem exigir nada da unidade, é a unidade
das AOA’s que exigem e reclamam as funções da União, ela é um substrato da AOA’s, é uma
organização conceitual.
A União não se incube de nada, ela apenas protege a estrutura, tanto macro como micro, vamos
pegar um exemplo sobre a questão de rodovias.
Ela não teria nenhuma função aqui, só entraria nessa questão caso solicitada para resolver algum
problema de causa externa, e mesmo assim não faria nada, apenas criaria uma força tarefa
dissolúvel, vamos dizer que essa rodovia liga duas comunidades, e surge um problema de caráter
insolúvel, quem criaria essa resposta para esse problema seria a AOA que criaria uma pasta, e a
União teria outra pasta para acompanhar o desenrolar das atividades com a única finalidade de
manutenção e proteção da pasta da AOA, vamos dizer que essa rodovia passa por um território
onde o agronegócio tenta destruí-la dada a competição que estaríamos ganhando, acontece que
um grupo nosso foi atacado, a União seria convocada para resolver isso uma vez solicitada e teria
uma força tarefa local para resolver isso, especificamente, agentes de proteção armada e de
inteligência para conter esses ataques. A finalidade global da União é ser uma estrutura de
proteção global mesmo. A União resguarda a sociedade de qualquer ataque ou ação de
dissolução externa.
Assim temos uma perspectiva do que queremos falar da União Libertária e sua Auto-organização
autônoma, uma organização que ligue os variados grupos ao redor e agregue através de
especificações gerais para um maior desenvolvimento e proteção do ideário anarquista-comunista;
sem limitar ou impor ações, mas sim, atribuir uma maior autonomia para ações, sem
compromisso, mas, objetivo e coerente com os princípios da doutrina libertária.
Em vez de continuarmos com grupos soltos e totalmente incomunicáveis no espaço social[9],
criaríamos uma rede horizontal de comunicação nos diferentes níveis sociais, para uma melhor
resposta e abordagem metodológica, criando uma unidade estrutural que garanta a prática de
forma autônoma, direta e libertária. Ao invés de fazer ações em tempos variados, atacaríamos em
todos os níveis em todos os momentos, com todos os grupos ligados e abordando problemas a
partir da União, já que essa mesma da uma condição de transição recíproca diante a sociedade
capitalista para a sociedade comunista; sem esperar pelo momento de revolução, esse ultimo se
originando exatamente de maior adesão dos grupos de AOA’s dentro da União, formando uma
organização forte e uma percepção concreta do que colocar no lugar do Estado e Capital.
II.
Falamos da estrutura e noção da União, vamos tentar entender a questão econômica.
Como já sabemos, o processo de mudança socioeconômica e política da sociedade é algo
grandiosamente complexo, já que envolve vários problemas a serem resolvidos, desde a questão
de cultura chegando até a visão ética dela, a sociedade não será comunista de um dia para o
outro, isso todos sabemos, e para isso tentam resolver-se de várias maneiras, seja pelo
socialismo marxista (Estado proletário), seja pelo próprio anarquismo (coletivismo libertário), é
nítido que uma fase de transição é necessária, o problema de se pensar nisso, está exatamente
na noção que essa fase só se dá na revolução, nunca antes, sempre no começo e depois da
revolução, com isso esquece-se, que a transição que ganhará, é aquela que atende a ideia de
defesa da revolução e não só sua organização futura, em muitos casos, a organização futura é
deixada de lado, o principal é continuar com a revolta.
A condição que melhor explica essa noção de transição se dá em dois aspectos, o primeiro
expressa pelo comunista-libertário Joseph Déjacque[10], e uma outra pelo marxista István
Mészáros[11].

39
Déjacque será um dos primeiros a observar a questão do trabalho e do capital, ele diz: “ Alguém
seria enganado se acreditasse que na sociedade como está organizada, basta fazer com que o
chefe desapareça para que o trabalhador retire do trabalho uma soma muito maior de
bem-estar[12].” Assim, não é modificando a estrutura da sociedade, mas em nada alterando a
estrutura do trabalho, que a sociedade comunista surgirá. Uma visão concreta será apresentada
por Mészáros em seu trabalho “Para Além do Capital”, onde demonstra como funciona o
sociometabolismo do capital[13], o sociometabolismo nada mais é do que o trinômio do capital —
trabalho — Estado, que advém da divisão social hierárquica do trabalho, portanto, mantendo a
condição da divisão social do trabalho, em uma condição estatista, não altera praticamente nada,
porém, preservar a classe proletária como precursora da libertação do próprio proletariado e das
massas é ainda a reformulação do trinômio que constituirá as bases do sociometabolismo do
capital. A base do capitalismo é também o sociometabolismo, a noção de abolir apenas o
capitalismo, sem sequer tocar na estrutura do sociometabolismo é impossível, e muito mais
impossível por via parlamentar e institucional.
Então, para constituir uma abolição real das relações capitalistas, precisamos não apenas abolir o
capitalismo como sistema de produção e reprodução, como também o sociometabolismo que o
produz como o sistema de divisão social hierárquico do trabalho, isso é, temos que superar essa
divisão e dependência estrutural do capital em todas as suas determinações. E para isso, a
concepção da AOA e a União é um fator concreto dessa superação. Já que podemos delimitar
uma forma de autoemancipação do trabalho visando uma emancipação social em uma escala
macroeconômica e social.
Irei continuar em breve esse texto ….
[1] MALATESTA, Errico. A Organização II, Editora Faísca.
[2] dada a inseparabilidade das três dimensões do sistema do capital, que são completamente
articulados — capital, trabalho e Estado –, é inconcebível emancipar o trabalho sem
simultaneamente superar o capital e também o Estado. Isso porque, paradoxalmente, o material
fundamental que sustenta o pilar do capital não é o Estado, mas o trabalho, em sua contínua
dependência estrutural do capital (…).
Enquanto as funções controladoras vitais do sociometabolismo não forem
efetivamente tomadas e autonomamente exercidas pelos produtores associados, mas
permanecerem sob a autoridade de um controle pessoal separado (isto é, o novo tipo de
personificação do capital), o trabalho enquanto tal continuará reproduzindo o poder do capital
sobre si próprio, mantendo e ampliando materialmente a regência da riqueza alienada sobre a
sociedade. MÉSZÁROS, István. Para Além do Capital, pg. 593. Boitempo Editorial
[3] Alfredo Maria Bonanno é um anarquista italiano nascido em 1937, há décadas envolvido no
movimento, ativo na resistência contra a ditadura dos coronéis Gregos (1967–1974), e autor e
editor de muitos textos anarquistas. (WIKI)
[4] A organização dentro do núcleo distingue-se pelas seguintes características: autonomia em
relação a qualquer força política ou sindical; o conflito permanente (uma luta constante e efetiva
em direção aos objetivos decididos, não intervenções esporádicas ocasionais); o ataque (a
rejeição do compromisso, a mediação e a acomodação que questionam o ataque ao objetivo
escolhido). BONANNO M., Alfredo. Núcleo de Base Autônomo.
[5] LANDSTREICHER, Wolfi. Auto-Organização Autônoma e a intervenção Anarquista. Pg.4.
Raiva, 2006.
[6] Ibidem.
[7] “Só sou verdadeiramente livre quando todos os seres humanos que me cercam, homens e
mulheres, são igualmente livres […] Apenas a liberdade dos outros me torna verdadeiramente
livre, de forma que, quanto mais numerosos forem os homens livres que me cercam, e mais

40
extensa e ampla for a sua liberdade, maior e mais profunda se tornará a minha liberdade.”
BAKUNIN, Mikhail. Textos Escolhidos. Pg. 32–33.Porto Alegre: L&PM, 1983.
[8] “As Máquinas autopoiéticas têm individualidade; isto é, através da manutenção invariante de
sua organização, elas preservam ativamente uma identidade que não depende de suas interações
com um observador. As máquinas alopoiéticas têm uma identidade que depende do observador e
que não é determinada em sua operação porque o produto disso é diferente de sua organização.
[…] As máquinas autopoiéticas são definidas como unidades apenas pela organização
autopoiética: suas operações estabelecem seus próprios limites no processo de autopoiese. Este
não é o caso das máquinas alopoiéticas, cujos limites são definidos pelo observador que,
especificando as superfícies de entrada e saída, determina o que é pertinente ao seu
funcionamento.” ROMESÍN, M. Humberto & GARCÍA, V. J. Francisco. De máquinas y seres vivos
— AUTOPOIESIS: LA ORGANIZACIÓN DE LO VIVO. PG. 74, 5º ed. Editorial Universitária, 1998.
[9] Nesse caso a incomunicação se dá na coerência e organização conjunta de ações, como o Uri
Gordon coloca em Anarquismo Vive, existem redes interligadas e descentralizadas que conduzem
a uma solidariedade internacional entre os vários grupos e coletivos libertários ao redor do mundo.
[10] Joseph Déjacque (1821-1865) foi um operário, poeta, escritor e comunista libertário francês.
[11] István Mészáros (1930-2017) foi um filosofo húngaro e um importante intelectual marxista.
[12] “Ao nos limitarmos a essa supressão, acabaríamos apenas com uma melhora insignificante.
Os lucros auferidos pelo empregador, uma soma grande para um, seriam muito pouco, divididos
entre todos, e dificilmente mudariam a posição do trabalhador na relação material; seria sempre
miséria física. Que amanhã o escravo negro vai libertar-se do plantador, ele será livre? Ai! Não;
ele cairá novamente, como um proletário, sob um novo chicote e um novo mestre; ele terá
mudado suas correntes para os outros um pouco menos pesado, isso é tudo. Seria o mesmo para
o escravo branco se ele se libertasse do chefe sem socializar o trabalho; ele teria apenas
alongado um pouco a corrente. A melhoria seria mais sensível na relação moral: o trabalhador não
estaria livre ainda, mas seria seu mestre; Seu amor social não seria satisfeito, mas seu ódio seria.
O trono da exploração burguesa assim queimada, permaneceria sempre a coisa pública do
trabalho a ser organizado, a Revolução do Trabalho a ser realizada. Os tronos queimados são
restaurados quando os reis são demolidos apenas pelos emblemas, não pelas instituições.”
DÉJACQUE, Joseph. A organização do trabalho. 1860.
[13] O papel totalizador do Estado moderno é essencial.
Ele deve sempre ajustar suas funções reguladoras em sintonia com a dinâmica
variável do processo de reprodução socioeconômico, complementando politicamente e reforçando
a dominação do capital contra as forças que poderiam desafiar as imensas desigualdades na
distribuição e no consumo. Além do mais, o Estado deve também assumir a importante função de
comprador/consumidor direto em escala sempre crescente. Nessa função, cabe a ele prover
algumas necessidades reais do conjunto social (da educação à saúde e da habitação e
manutenção da chamada “infraestrutura” ao fornecimento de serviços de seguridade social) e
também a satisfação de “apetites em sua maioria artificiais” (por exemplo, alimentar não apenas a
vasta máquina burocrática de seu sistema administrativo e de imposição da lei, mas também o
complexo militar-industrial, imensamente perdulário,
ainda que diretamente benéfico para o capital) — atenuando assim, ainda que não para sempre,
algumas das piores complicações e contradições que surgem da fragmentação da produção e do
consumo.
Reconhecidamente, a intervenção totalizadora e a ação corretiva do Estado
não podem produzir uma unidade genuína neste plano, porque a separação e a oposição de
produção e consumo, com a radical alienação do controle dos produtores, pertencem às
determinações estruturais mais internas do próprio sistema do capital, e constituem portanto

41
requisito indispensável para sua reprodução constante. Não obstante, esta ação corretiva
empreendida pelo Estado é de suma importância. Os processos reprodutivos materiais do
sociometabolismo do capital e as estruturas política e de comando de seu modo de controle
sustentam-se reciprocamente enquanto o desperdício inevitável que acompanha esse
relacionamento simbiótico não se tornar proibitivo, do ponto de vista da produtividade social.
Em outras palavras, os limites externos em que se pode reconstituir e administrar, dessa maneira
singular, a correlação problemática entre produção e consumo na base fragmentada da ordem
sociometabólica do capital são determinados pela extensão em que o Estado moderno pode
eficazmente contribuir para a necessidade irresistível de expansão e acumulação do capital, em
vez de tornar-se para ele um peso materialmente insustentável. MÉSZÁROS, István. Para Além
do Capital, A ordem da reprodução sociometabólica do capital; pg. 110–111. Boitempo Editorial

12. Existe anarquismo de esquerda ou de direita?

Esquerda-Direita, espaço político e política.

Embasamento prático da antipolítica anarquista.

Vamos nos imaginar em uma região que um rio a divide, esse rio tem várias pontes, para os
cidadãos passar de um lado a outro; um condição natural quebra e destrói várias dessas pontes,
limitando o acesso e a livre-passagem dos cidadãos dessa região, com a condição natural
estabilizada, os membros dessa região chamam uma Assembleia para decidirem todo o processo
restaurativo das pontes, se irão restaurar as pontes da forma que continha, se irão adicionar algo
a mais para durabilidade e força da ponte, como será divida a restauração em quais escalas e
quais grupos com capacidades necessárias, ou seja, todo o processo de solução de problemas
para essa ponte.

Ocorre um amplo debate entre os membros, e uma das soluções é: diminuir o número de pontes e
criar um túnel subaquático com materiais resistentes e de forte condição de aguentar impactos por
m³ de água. A outra é continuar com as pontes, só melhorar o material das mesmas para resistir
mais. Essas soluções são apresentadas como a que as pessoas mais se identificaram, e para
selecionar qual fazer, ocorre uma votação para um consenso! Assim o resultado irá para o túnel
subaquático por consenso, onde através de uma demonstração de organização, tempo que levará
e materiais que serão usados, derivará quase o mesmo tempo que se o processo fosse a
modificação dos materiais e a restauração das pontes-padrão. E o consenso além da condição
econômica, se deu pela questão de mudança estética e uma maior segurança, onde a
livre-passagem estará disponível, caso aja uma necessidade em uma condição natural de
desastre, esse túnel ser a 'segurança' imediata e até mesmo garantida para uma maior estratégia
de fuga. Assim as soluções apresentada por esse projeto é melhor, mais viável e mais abrangente
que a apresentada pelo projeto da ponte-padrão, e o consenso opta por essa solução ao invés da
outra.

Essa situação hipotética, decorre de algumas práticas [reformuladas hipoteticamente no texto]


pela organização econômica e política anarquista, uma ação antipolítica é a solução imediata
através de assembleias e auto-organização autônoma popular, cada participante no processo de
tomada de decisões está sabendo o que está ocorrendo e está livre para apresentar soluções ou
projetos, como críticas e reformulações dentro da comunidade ou região que faz parte, não

42
depende de uma autoridade ou licitação para tal empreendimento, e sim apenas de seu gênio
criativo e autonomia para falar e se expressar.

O processo político institucional é diferente, os projetos e soluções são apresentadas pelo


representante público [vereador, prefeito, deputados, governadores, senadores] cada um deles
tem sua função bem determinada e limitada pela função do outro; Você contribuinte pode
apresentar projetos, e o projeto pode ser uma condição emergencial para seu bairro ou cidade; e
isso só poderá se aprovado após: Cálculo de custo e gasto, orçamento disponível e prioridades
legais a serem atendidas, atendimento a interesses do partido e dos financiadores da campanha,
aprovação de outros projetos do lado opositor para um maior voto na casa a seu projeto, e após
tudo isso, caso seu projeto seja aprovado, o processo de licitação para então, a empresa licitada,
calcule o custo e gasto, orçamento disponível e empresas que irão vender os materiais
necessários para a obra e a que preço, se pode ser negociado por materiais 'mais baratos', etc...
O processo político de solução e mediação é envolto de burocracia, centralismo, jogos de
interesses que as necessidades reais do povo, das massas acaba se perdendo no 'mar-de-merda'
do governo e do Estado.
Caso você queira optar pela ação antipolítica, e isso através da associação dos moradores do seu
bairro ou uma Assembleia popular para tal solução e decorra o processo descrito acima, a
prefeitura e o seus órgãos competentes irão travar e até mesmo quebrar o projeto em execução,
já que você contribuinte não pode solucionar os problemas do seu bairro, para isso, o candidato
eleito é 'necessário', se você apela para o setor público é uma burocracia e gasto de tempo
enorme, se você o faz através das condições materiais disponíveis e usa a autogestão, o setor
público quebra, trava e destrói sua autonomia e liberdade (não é necessário apresentar exemplos
que isso ocorre, todos já viram isso); O que não que dizer que o processo antipolítico não
contenha sua fundamentação no ato político, esse ato reduzido e administrado pela apresentação,
desenvolvimento e conclusão do projeto, solução, crítica ou restauração ... isso é o Ato político ou
a política no anarquismo é a sua organização em Assembleias dentro das Comunas ligadas na
União para soluções diretas e reais dos problemas que à de surgir no decorrer do tempo em uma
sociedade anárquica.

E nesse sentido, apresentamos a conclusão que a noção de esquerda/direita é e faz parte da


institucionalidade da política e dos atos políticos, apenas um espaço político dinâmico que muda
de lado a outro, como uma bola de futebol, onde ela percorre os dois lados do campo, e no
momento que o juiz apita a bola para, no momento que a 'conclusão' das pautas políticas, a
direita/esquerda inexiste. Vejamos a imagem abaixo: Diz-no muita coisa, primeiramente que para
uma visão real da política e do que é direita/esquerda se deve analisar o que está sendo pautado
e disputado na casa, ou seja se existe 10 projetos e esses 10 projetos favorecem a classe
trabalhadora, e todos votam, você tem um 'centro', mas se, desses 10 projetos, 4 favorecem a
classe trabalhadora e os outros 6 a classe exploradora, então terá uma fissura, assim, a definição
espacial de direita/esquerda será definida pela aprovação ou negação dos projetos, supondo que
a 'esquerda' vote a favor de 2 projetos para a C.T. e 4 para a C.E., temos uma mutabilidade
dessa 'esquerda' para um centro-esquerda ou direita, e se a 'direita' vota a favor dos 4 projetos
para a C.T. e 4 para a C.E., temos a mutabilidade da 'direita' para um centro-direita ou esquerda, o
que muda todo o aspecto do espaço, a esquerda/direita não pode ser apenas definida pela sua
condição ideológica, mas sim prática através dos votos e projetos, e nessa condição, a
direita/esquerda muda a cada reunião na casa [vide a imagem abaixo], a política institucional não
pode ser reduzida e posta como a visão anarquista, já que para tal ato e condição, ela mesma se
diluiria em contradição e insuficiência. Ocorre que a política e sua condição de antagonismo

43
representativo [direita/esquerda] é um processo de manutenção das condições do mercado e
propriedade privada, sua ação está voltada a 'equilibrar' e 'desenvolver' a econômica e política ao
mesmo tempo que está presa a sanções de quem tem maior poder-econômico. Temos duas
classes distintas mas não totalmente opostas; a classe econômica [explorador-explorado] e a
classe política [governante-governado], uma classe é produto da outra, uma, não existe sem a
outra, como a direita não existe sem a esquerda, o Estado não existe sem a propriedade privada.

A img retrata bem isso e bem as condições de como o espaço político [direita/esquerda] muda
conforme projetos, pautas e votos, algo institucional e inerente a estrutura do poder político
institucional [Estado], então a base dessa mudança, é a manutenção da propriedade privada, se
vai ser melhor para a C.T. ou C.E., mas que sempre é uma concessão, nunca um direito
conquistado. Já que a propriedade privada é a base de exploração da C.E., é só através das
ações antipolíticas e auto-organizadas que a pressão social contém um aparato forte contra o
Estado, Capitalistas e seus asseclas, mas essa condição infelizmente se esvazia no momento em
que as ideologias políticas do espaço político tentam se apropriar e controlar a ação antipolítica
das massas, e como em suma, o poder-econômico e poder-político está institucionalizado e
protegido pelo exército e polícia e as leis, o povo é persuadido a largar ou a acatar
consensualmente as medidas e prerrogativas dos exploradores e governantes. Então
praticamente todo o ato social que visa uma luta direta e medidas agregacionais contra o Estado e
o Capital é um ato antipolítico e sem está ligado a um espaço político, apenas conforme cresce
essa ação e se torna uma pressão popular é que o espaço político se infiltra ou tenta se apropriar
[exemplos históricos e modernos é que não falta disso], das lutas sociais. Assim uma posição
antipolítica é antes de tudo uma luta social contra as autoridades! A luta política começa com a
questão apresentada acima, isso é Assembleias populares onde reina o consenso e a democracia
direta, e como falado o consenso não é todos aceitarem, e sim apresentar a proposta ou
resolução melhor que não contenha ou as outras resoluções não sejam boas ou não abarque
tudo. O consenso e democracia direta sempre estará ligada a soluções ou resoluções que se
apresentem como a melhor, e nenhuma outra é descrita ou falada.

Assim, concluo que através das condições materiais e contextuais desde a Revolução Francesa, a
esquerda/direita é o processo de manutenção e concessão dos governantes e apenas dos
governantes sobre a sociedade, uma esquerda/direita fora da institucionalidade do poder, é vazia
e sem sentido.

12.1

O anarquismo sendo considerado uma ideologia política apenas faz parte da ala esquerda por
isso, o que supõe duas coisas.
1- a esquerda é doutrinária na base "igualdade social e econômica"
2- O Anarquista nessa visão e dentro da base doutrinária esquerdista, tem por obrigação moral
votar em candidatos de esquerda para barrar o avanço do Fascismo e neoliberalismo.

Isso é uma concepção puramente falaciosa, primeiro que o anarquismo é uma doutrina social com
ideologias substanciais e um ideário muito mais amplo do que ideólogo; - já que dentro desse
ideário e doutrina se tem uma filosofia sintética abarcando a totalidade da realidade e do
ser-social em sua essência, sendo a negação esporádica da administração da coisa pública pelos
regimes políticos em um governo, não faz parte de nenhuma forma per si, o anarquismo seria de

44
esquerda, se e só se, fosse um regime político puro, mas ele não é um regime político
(constitucional, liberal, monárquico, ditatorial ou socialista), ele é uma topologia política com a
ideologia socialista de organização social.

Ele é um sistema e não regime, é um sistema político antipolítico, suas ações são sociais e
econômicas visando a libertação da política como discurso metafísico, a uma condição de
administração autogestionária da coisa pública.

Em nenhuma condição o anarquismo pode ser considerado como fazendo parte de um regime
político que por vias de regra, é ordenado por algum governo dentro do Estado.

Ou seja a condição moral do voto que colocam ao anarquista, por "fazer parte da esquerda" não
tem condições epistêmica nenhuma, isso é, o fato de considerar o anarquismo de esquerda, já é
um ato ideológico discursivo imoral, que serve como pressuposto de dominar o gênio livre-criativo
para homogeneizar as ações políticas sociais em uma práxis para subir um regime ao poder.

12.2

O anarquismo não é de esquerda, isso é, ele não faz parte da esquerda, não se encaixa na
esquerda e muito menos possui orientação de esquerda/direita.

O anarquismo é um sistema político antipolítico (cara isso já foi debatido aqui, Amorós coloca,
Bonanno Coloca, Bakunin coloca, Rocker coloca), o que quer dizer? Que dizer que o anarquismo
se compõe como antagonismo da política como forma de luta e de ação, como também nega toda
a estrutura política derivada da visão da polis. Para ser mais claro, o anarquismo é político,
apenas enquanto forma de estruturar a nova sociedade, ou seja, a organização da sociedade
libertária: sem governantes e governados.
Francis Dupuis-Déri em um de seus artigos, coloca a anarquia/anarquismo como um sistema
político puro, ou, uma tipologia política pura, ou seja, o anarquismo pode ser enxergado como se
enxerga a democracia, monarquia ou aristocracia.
Monarquia: o reinado de um
Aristocracia: o reinado de uma minoria
Democracia: o reinado da maioria
Anarquia: o governo autônomo de todos, por consenso

Se enxergamos a anarquia como uma tipologia, como podemos dizer que a anarquia é de
esquerda ou direita? É como pressupor que a democracia é de direita ou esquerda, a monarquia é
de direita ou esquerda (lembrando da visão progressista de monarquias, como o caso dos países
nórdicos), a anarquia enquanto tipologia é inclassificável dentro de uma orientação política. E
enquanto antipolítica, se torna impossível e até mesmo idealista imputá-la como de
esquerda/direita.

"Equacionar a anarquia com uma forma distorcida de democracia direta é um grave erro que
empobrece a filosofia política. Eu argumento, pelo contrário, que uma tipologia de regimes
políticos deve incluir a anarquia não como uma forma distorcida de democracia, mas sim como um
dos tipos ideais de regimes políticos legítimos. Identificarei a anarquia como um quarto tipo de

45
regime político puro em que todos os cidadãos se governam diretamente através de uma
deliberação consensual, sem recorrer a uma autoridade com dispositivos coercitivos." (Francis
Dupuis-Déri)

Por isso digo que o anarquismo não é a expressão de uma "democracia direta", já que essa
última, é ainda uma forma de tipologia política sobre a estrutura anarquista, as estruturas de
tomada de decisão no anarquismo se levarmos em consideração as expressões recentes do
antidesenvolvimentismo (Amorós), nos mostrará que é uma condição de autonomia-territorial e de
luta territorial, onde as organizações deliberam entre elas por consenso, as medidas e diretivas a
serem executadas ou planejadas sem qualquer intervenção de órgãos políticos ou econômicos
(mercado).

"Em vez de formular uma proposta e simplesmente se preocupar em acumular votos suficientes
para aprová-la, o consenso exige que os participantes levem as preocupações da minoria a sério
e apresentem propostas para suas perspectivas. A ideia não é que todos tenham que concordar o
tempo todo (o retrato do consenso do homem de palha), mas sim que a maioria é forçada a fazer
concessões à minoria e, para o grupo funcionar, a minoria deve se acostumar a tolerar as
decisões que considera menos que ideais." (Mark Bray)

O consenso aqui dentro de uma ótica anarquista reflete a preocupação com o todo ou, - o
bem-comum -, isso quer dizer que o consenso é a característica de análise contextual e concreta
de aplicação da ideia,solução, prospecção e planejamento que melhor se adapta e é adaptado ao
seu meio que está em ação. Não quer dizer que todos devem concordar, e muito menos que uma
maioria ou minoria imporá sua visão ou perspectiva sobre a comunidade ou território, e sim que
através das reuniões e discussões, e por cálculo real a alternativa X se mostrou melhor e mais
abrangente que as alternativas A, CD, OP, Y e L, pois devemos lembrar que a condição da
anarquia está ligada a condição comunista, ou seja, a organização política é derivada da
organização econômica (retroalimentação).

Para completar, o anarquismo está a esquerda da extrema-esquerda (marxismo), podendo não


precisar ser classificado, e se analisarmos apenas dentro da visão política socialista, e só ali, o
anarquismo é de esquerda, enquanto que os marxistas, social democratas, comunalistas são de
direita, mas lembre-se, dentro da ontologia socialista e só ali o anarquismo é de esquerda.

12.3

Uma coisa que é negligenciada no movimento libertário, principalmente por dois grupos: a) Os
que colocam o anarquismo como de esquerda não-institucional, b) os que detestam o marxismo e
o esquerdismo, mas estão presos no mutualismo e no Proudhon como "pai do anarquismo", é a
ciência.

A doutrina libertária é um corpo de fundamentos e teorias (com hipóteses testáveis) científica,


social e ética, abarcando a totalidade das relações sociais-humanas dentro das organizações
sociais vigentes e a partir disso - do que se oculta nessas relações - transfere para sua proposta
de reorganização socioeconômica da sociedade, por isso o movimento libertário irá possuir duas
concepções de reorganização social em escala global: O Comunismo e o Coletivismo de viés
anárquico.

46
Ocorre que, a doutrina libertária sendo científica, supõe exatamente aquilo que é ciência: "A
ciência não é nem mais nem menos que uma maneira de explicar o mundo, de estabelecer mapas
para se mover nele de maneira racional, de lançar mapas errôneos e fazer mapas novos. A
ciência é também um método que pode ser usado por todos para provar ou rejeitar esses mapas:
não há verdades absolutas na ciência, mas sim teorias que funcionam na realidade ou não
funcionam. A ciência é também uma estrutura de conhecimento e uma maneira de expressá-la,
cujas normas e princípios devem ser universais para que todos possam contrastar sua veracidade
e, por sua vez, comunicar inequivocamente os resultados desses contrastes." (Iker Dobarro del
Moral). Assim quando o anarquismo irá tecer críticas contra o Estado e governos, ele não irá tecer
essa crítica pq o imposto sobre boneca inflável ou jogos de PC ou VG é caro, ele irá tecer pq o
imposto parte da manutenção da propriedade privada e da força armada do Estado contra
qualquer forma de insurgências e revoluções, irá ver na estrutura do Estado a forma de
exploração e dominação de alguns sobre todos, o privilégio e a lei a favor sempre dessa minoria
exploratória, a injustiça e a miséria como resultado da lei e da ordem [grito de guerra de todos os
estadistas], ou seja, ele irá analisar o Estado desde seu desenvolvimento histórico e até o atual, e
com isso concluir um resultado que pode ser aplicado e replicado por outros que visam criticar ou
refutar, como desenvolver e melhorar tal resultado.

Da mesma forma que irá analisar a propriedade privada e o mercado, ele analisará e enxergará
que organização baseada no salário, no dinheiro e no valor-de-troca, como na hierarquia e
autoridade do chefe, patrão, no acúmulo privado e no lucro, é a razão-de-ser do Estado, e que um
não vive sem o outro, ainda mais dentro da divisão socioespacial do trabalho, o que pode ser
identificado como sociometabolismo do capital, enxergará que a "troca" possui várias formas, seja
ela pelo valor-de-troca (compra-venda) programa essencial do mercado, seja troca direta baseada
no valor-de-usufruto, seja nas trocas de dom, presentes, etc.., assim verifica que nem a
propriedade privada e muito menos o mercado é necessário para a reorganização socioeconômica
de viés comunista anárquico, esse resultado pode ser aplicado e reaplicado, e passível de crítica,
refutação, desenvolvimento ou melhoramento do resultado, e a mesma coisa ocorre para a
religião, acadêmia, economia mainstream, marxismo, e com isso é que o anarquista criticará
posições como: "Anarco"-Capitalismo/Libertarianismo, "Anarco"-Cristianismo,
"Anarco"-Nacionalismo, Mutualismo, Comunalismo, propostas de entrismo de esquerda, inserção
burguesa, negação do socialismo/comunismo na doutrina libertária, isso seria o famoso: "retirar a
carteirinha de anarco".

Por mais que alguns "anarquistas" neguem a ciência, neguem a doutrina, neguem o
ateísmo/antiteísmo e neguem que não se pode dizer "X não é anarco, enquanto Y é", eles estão
errados e são fundamentalmente ignorantes [e acredite, o/a anarquista visa sempre o
conhecimento, e nunca a ignorância] que fantasiam a rebeldia com anarquia. Como dito, a
organização libertária é um mapa para se mover, e enquanto existir buracos nesse caminho, o
movimento libertário irá se afundar cada vez mais.

12.4

[Resposta ao texto "A Miséria do Apoliticismo]

47
O pensamento de Bobbio tem um grau de a proximidade ao que tange o que é esquerda e direita,
e que a concepção dele de igualitarismo e libertário é totalmente diferente da propagada por nós
anarquistas.

Assim situo que mesmo na concepção do Bobbio, o anarquismo não se encaixa na


direita-esquerda (díade), vamos às 4 teses principais:

1: Os dois termos da díade governam-se uma a outra; onde não há direita; não há esquerda e
vice-versa, uma forma de se colocar é que: existe uma direita na medida que existe uma
esquerda, existe uma esquerda na medida que existe uma direita. (pg 43 e pg 90)

2: Direita e esquerda, não são conceitos absolutos, mas sim relativos. Nem são conceitos
substantivos ou ontológicos, também não são qualidades intrínsecas ao universo político, mas sim
lugares no “espaço político”; representam uma determinada topologia política, que nada tem haver
com a ontologia política, não se diz que é de direita ou esquerda, no mesmo sentido em que se
diz que é “comunista, liberal ou católico”. O fato da “direita e esquerda” representarem uma
oposição, diz simplesmente que não se pode ser simultaneamente de direita e esquerda, mas não
diz nada sobre o conteúdo das duas partes contrapostas. (pg 91-92)

3: A tese apresentada aqui, refere-se aos diversos juízos positivos e negativos sobre o ideal de
igualdade, a discussão coloca-se num ponto tão alto de abstração, que serve para distinguir dois
tipos-ideais. (pg 107)

4: a tese do igualitarismo como distinção entre direita e esquerda é respaldada pela concepção de
exaltar mais o que faz os homens iguais do que os faz desiguais, e de outro, em termos práticos, a
favorecer as políticas que objetivam tornar mais iguais os desiguais. (pg 110)

E aqui uma conclusão do Bobbio referente a seu desenvolvimento das concepções:

O critério para distinguir a direita e a esquerda é a diversa apreciação [apprezzamento] da ideia de


igualdade, e o critério para distinguir a ala moderada da extremista, tanto na direita quanto na
esquerda é a diversa postura [atteggiamento] diante da liberdade, assim se reparte em quatro
partes:
a) na extrema-esquerda estão os movimentos simultaneamente igualitários e autoritários, dos
quais o jacobinismo é o exemplo histórico mais importante, a ponto de ter se tornado uma abstrata
categoria aplicável, e efetivamente aplicada, a períodos e situações históricas diversas;
b) no centro-esquerda, doutrinas e movimentos simultaneamente igualitários e libertários, para o
qual hoje podemos empregar a expressão “socialismo liberal”, nela compreendendo todos os
partidos políticos sociais-democratas, em que pesem suas diferentes práxis políticas;
c) no centro-direita, doutrinas e movimentos simultaneamente inigualitários e libertários, entre os
quais se inserem os partidos conservadores, que se distinguem das direitas reacionárias por sua
fidelidade ao método democrático, mas que, com respeito ao ideal da igualdade, se prendem à
igualdade diante a lei, que implica unicamente o dever por parte do juiz de aplicar imparcialmente
às leis, e à liberdade idêntica, que caracteriza aquilo que chamei de igualitarismo mínimo;
d) na extrema-direita, doutrinas e movimentos antiliberais e antiigualitários, dos quais creio ser
supérfluo indicar exemplos históricos bem conhecidos como o nazismo e fascismo. (pg 118-119)

Assim eu tiro umas conclusões:

48
a)A esquerda e direita tem alguns pressupostos comum: - democracia, os poderes executivo,
legislativo e judiciário como organização dos interesses políticos de ambos os lados; -a
organização econômica sendo derivada da propriedade privada/individual; e assim criando a
concepção antitética de igualitarismo e inigualitarismo.
b) não existe uma esquerda e direita libertária/anarquista (mesmo o mesmo colocando esse
termo, o que no geral significa liberdade por si só), já que ao existir uma "esquerda libertária" a
sua antitética aparece naturalmente "os dois termos governam-se um ao outro", assim sendo, se
existe uma esquerda libertária/anárquica, o seu antagônico surgirá exponencialmente.
c) A base comum da díade (não entrarei na concepção da tríade que ele chama de terceiro
incluído e terceiro inclusivo), é a democracia e a propriedade individual/privada, e assim tornará
um suporte prático e teórica para concepções de maior ou menor repartição e maior ou menor
liberdade, dependerá da forma do regime que o governo adotará.
d) Fica nítido nas teses, que o escrito do Rafael Viana (as misérias do apoliticismo) ignora e
parcialmente omite todo o desenvolver da concepção igualitarista/igualitarismo que o Bobbio faz; e
por sinal, ignora que na concepção de Bobbio, se pudéssemos colocar o anarquismo como
espectro da díade, colocaríamos ele na mesma condição da socialdemocracia, i.e
centro-esquerda.

Assim, atribui-se que não existe causa e nem correlação em colocar o anarquismo como parte de
uma díade (espaço político) sendo o anarquismo um movimento político-anti político (ontologia
política) que supera a concepção da direita/esquerda.

12.5

A esquerda e direita é definida pela suas concepções econômicas, o igualitarismo (distribuição de


renda, etc...) e o inigualitarismo (menos intervenção do Estado na economia, etc..) assim sendo, o
centro gravitacional em que a direita/esquerda/centro gira é a propriedade privada (maior ou
menor manutenção), ambas fazem parte de um processo institucional de tal manutenção.

O anarquismo é um movimento político anti-político como Bakunin ressalta no escrito "A Comuna
de Paris", Makhno em plena revolução russa, vai condenar a esquerda socialista (bolcheviques e
comunalistas) de estancar o processo revolucionário, Joyeux irá criticar o entrismo esquerdista
dentro do movimento anarquista, e como isso no futuro, iria envenenar o movimento libertário, Bob
Black critica essa noção que o anarquismo é de esquerda (mesmo utilizando de uma noção de
"pós") e com isso limita toda a crítica do Bookchin.

Kropotkin em seu livro "A Grande Revolução", irá ressaltar que a esquerda/direita só existe dentro
da Constituinte, e que o povo fora de tal instituição, é que estava levando a cabo a revolução
francesa, e com isso, irá provar que a esquerda na época se aliou a direita para redimir e limitar a
revolta popular, quando a República entra em voga, a esquerda junto a direita comemoram e
reprimem qualquer fagulha de insurgência pós-Revolução.

Na AIT existia marxista (socialistas autoritários), o que seria chamado de anarquistas (socialistas
libertários), os que eram considerados "anarquistas" (mutualistas proudhonianos), a esquerda

49
(reformistas) e toda organização que visava ou estava dentro da luta de classes, a única tentativa
de unir a classe proletária (e não a esquerda).

O anarquismo como movimento político antipolítico, nega essa noção de manutenção da


propriedade privada pelo órgão legislativo (Estado), ele se foca na organização real e concreta da
classe proletária na materialidade da sua vida, por isso não é de esquerda/direita/centro, e sim um
movimento antagônico (da mesma forma que a classe proletária é uma classe em antagonismo
com a classe burguesa, sem necessariamente a classe proletária ser burguesa), a sua
organização política (associações e assembleias livres, autônomas e libertárias) é uma concepção
antipolítica (já que tais associações, assembleias retomam e controlam a responsabilidade da sua
vida material, sem precisar de um governo ou autoridade para tal), essa noção que anarquismo é
de "esquerda e extrema" não possui nenhuma fundamentação, ao contrário, ao analisar a questão
de Maio de 68, fica nítido que dentro do movimento libertário houve uma inserção trotskista e
comunalista de vies socialista autoritário, vide Debord por exemplo, e com isso através da
contrarrevolução sindicalista da CNT, se "tem uma noção de esquerda do anarquismo", isso
porque, a CNT ao se tornar um fator contrarrevolucionário (exterminando o próprio movimento
libertário na Espanha) e instaurando a República (e com isso conquistando cargos de chefia para
alguns anarquistas), se coloca como uma "esquerda revolucionária e libertária", mas isso, não é
de se louvar, e sim de se ter uma autocrítica fundamental, e verificar que essa noção de
"esquerda libertária/revolucionária e anarquista" é o princípio e prática reformista republicana e
alienadora.
Ou seja, as bases de se afirmar que o anarquismo faz parte da esquerda, ou que existe uma
esquerda fora da institucionalidade, é uma concepção alienada e deslocada da própria teoria
materialista anarquista.

A ideia de "conquistar direitos dentro do Estado", mesmo sendo uma forma de imediatismo, é uma
forma idealista de conceber o anarquismo como "luta revolucionária", "prática política" e "trabalho
de base"; isso porque, o imediatismo das conquistas é apenas uma fuga da real luta anarquista,
conquistar algo de imediato, derivado apenas para uma parte da divisão social do trabalho (seja
professores, caminhoneiros, operários, etc...) não altera ou afeta nada a necessidade de
"consciência de classe" ou "luta de classes", é sempre bom lembrar que a classe burguesa, não é
uma classe desconectada da luta de classes, e que para garantir sua soberania e imortalidade,
ela irá conceder e autorizar "direitos" aos trabalhadores, mas, sem que com isso, gere ou limite
seus privilégios e interesses.

A luta dos anarquistas está em formar uma união libertária coerente, real e concreta, mas para
isso, é necessário superar o sindicalismo, federalismo e práxis, se fundar na teoria-prática
(doutrina) e seguir um caminho honesto e racional dentro da organização, é também importante
ter um suporte material que desenvolva as redes interligada das organizações libertárias e o
sectarismo como princípio moral (isso é, nada de alianças com a esquerda, marxistas, chefes,
patrões, governantes) onde essa moral eleve a consciência de classe e luta de classes ao seu
ápice antagônico nas massas; mostrando o processo de despolitização e despossuir do Estado e
da propriedade privada, que praticamente sustenta toda a teoria econômica, sociológica,
geográfica, biológica e filosófica do mainstream.

Se organizar um movimento emancipador, libertário e autônomo fosse fácil, não estaríamos


estagnados e amordaçados territorialmente hoje. Ou criamos as bases materiais do movimento
anarquista para então entrar em solo de "trabalho de base" coerente com os princípios

50
anarquistas, ou continuaram a contribuir com a despolitização liberal da classe trabalhadora pelo
imediatismo.

12.6

Em "Direita e Esquerda: Razões e significados de uma distinção política" do Bobbio, aparece além
da questão de "igualdade-desigualdade" a expressão "artificialismo-naturalismo" e por fim a
máxima: "Tratar os iguais de modo igual, e os desiguais de modo desigual", onde o lado igualitário
tende a "atenuar as diferenças" enquanto o lado inigualitário "tende a acentuá-las".

Nesse aspecto a esquerda se contém em igualizar os desiguais, isso é, uma síntese entre a
condição "natural e artificial", através da categoria fundante do ser, o "ser-racional", isso mostra
que a racionalidade e irracionalidade é posta já no indivíduo, existe toda a visão poética-divina de
direitos naturais, direito divino dos reis, entre outras concepções que a partir da ótica do
"ser-racional" torna o desenvolvimento de toda a forma ideológica (economia, política, sociologia,
história...) como algo sempre "racional" para um lado (o que levará a visões como "o cristianismo
civilizou o mundo"; "o Ocidente é mais civilizado que o oriente", entre os pré-conceitos e formas
racistas de conceber o indivíduo humano), o que na direita se contém em acentuar as diferenças
[diversidade], também pela categoria fundante do ser [ser-racional], onde naturalmente pessoas
ricas, reis, profetas, gênios nasceu naturalmente com esse "dom" ou "essência divina" e por isso
mesmo pode governar, mandar, submeter, dominar os outros a bel-prazer, a categoria fundante
do ser [ser-racional] é uma categoria por si mesma irracional [sem razão suficiente] em um
processo aristocrático e soberbo escravista e mítico.

Porém, podemos dizer que entre "acentuar e atenuar" as desigualdades-igualdades, contém em


sua estrutura o privilégio: Privilégio [Do Latim PRIVILEGIUM, “lei aplicada a apenas uma pessoa”,
de PRIVUS, “individual, pessoal”, mais LEX, “lei”] que podemos responder categoricamente uma
pergunta que se apresenta a partir da máxima: "Quem são os iguais, quem são os desiguais?"-
Obviamente o privilégio é a forma das relações de poder que se dá no processo atenuante ou
acentuante do espaço político da díade. Assim a igualdade é a forma substancial de qualquer
logração para o privilégio! Desde Aristóteles, passando por Platão, Epicuro, pelo renascimento,
medievo, iluministas ... é o privilégio [Deus, Estado, Rei, Chefe, Proprietário] que organiza e
reproduz a cultura das condições miseráveis, ignorantes e dilacerantes daqueles que não são
privilegiados, o privilégio é sempre a condição sine qua non da verticalização, centralização e
autoritarismo da sociedade, isso é, a organização socioeconômica a partir da forma do privilégio,
produz e reproduz as classes, a autoridade, a verticalização, a centralização, a limitação, a
ignorância, a miséria ... Pois seja Deus, Estado, Rei, Chefe, Presidente, qualquer que esteja no
topo da pirâmide socioeconômica é o privilegiado, e sua lei é uma lei que é aplicada a todas, a
propriedade privada só provém da condição do privilégio, o lucro é uma forma além de agiotagem,
de produção de privilégio a um indivíduo ou grupo de indivíduos minoritários que submete os de
baixo a suas leis.

Por isso, mesmo a noção de "igualdade-desigualdade" sendo o pretérito de toda forma de localizar
o que é "direita/esquerda", podemos concluir, que é o privilégio o radar concreto de achar tal local,
não contendo assim a visão de fato igualitária, e sim privilegiada das pessoas a partir da categoria
do ser-racional, onde naturalmente alguns "nascem para serem escravos e outros senhores"
(Aristóteles), negando por isso mesmo a própria razão, já que a categoria do ser-humano, é antes

51
de tudo, o ser-geográfico [que contém todo o desenvolvimento do racional, social e empírico],
como Pelletier diz:

"A geograficidade do ser humano implica muitas coisas. Conhecer a geografia torna-se
conhecer-se a si mesmo. Isto pode com certeza ser dito de todas as outras ciências, da
medicina à sociologia, passando pela psicanálise. Mas a geografia fornece a especificidade de
permitir ao indivíduo, de entrada, movimentar-se no espaço, guiar-se. É uma técnica e uma prática
de autogestão espacial, em primeiro lugar, pela orientação. Esta capacidade é individual, mas
também social. Sobre esta segunda dimensão, os trabalhos geográficos contemporâneos revelam
bem o que a empiria deixava supor: quanto mais o nível socioeconômico de um indivíduo é fraco,
mais reduzida é a sua capacidade de deslocar-se livremente, mais é magro seu conhecimento do
mundo e seus diferentes lugares. É isto o que leva à pobreza espiritual e humana, o que permite o
poder exercer a sua dominação através do espaço."

Literalmente a partir da geograficidade do ser [ser-geográfico] podemos fundamentar não só uma


pedagogia libertária como todo o sistema socioeconômico [comunismo libertário] compatível com
o fim do privilégio, poder centralizado, autoritarismo, verticalização, classes sociais, propriedade
privada, mercado, dinheiro ... Sem com isso perder o ser-humano do ser-humano e cair nos
misticismo marxianos, liberais, reacionários, conservadores e tradicionalistas. A antipolítica é a
ação do ser-geográfico através da poética reclusiana: "o homem é a natureza adquirindo a
consciência de si própria".

[Nota]

Como vemos o sectarismo?

A questão do sectarismo é a unicidade teórica-prática dentro do corpo revolucionário da doutrina


libertária, isso é, através das análises experimentais do movimento libertário nas revoluções
socialistas do século passado e nas comunas experimentais atuais, se vê uma necessidade
explícita de criar um corpo estruturado e coeso para manter o equilíbrio dentro do movimento
libertário sem perder seu caráter autônomo e revolucionário.

Quer dizer, criar uma base econômica concreta e forte que reproduza as relações libertárias
internacionalmente, nacionalmente e localmente, nos grupos de afinidades e núcleos de base
autônomos, seja ele um coletivo de mais de 200 pessoas ou com 2, a condição indispensável de
sustentar ações, propagar informações e desenvolver teoria-crítica para gradativamente manter
uma propaganda direta e simples no seio das massas oprimidas globalmente, para isso, devemos
dar o status de realidade a apenas uma visão ideológica ou doutrinária que no nosso caso é o
comunismo libertário, não é questão de não necessariamente aceitar "visões ideológicas
diferentes", mas sim criar uma base econômica e social forte o suficiente para manter a estrutura
inicial (ou embrionária) coesa e em constante processo de crescimento e desenvolvimento e
assim se adaptando ao clima social posto.

E porque isso? Em toda a participação libertária nas revoluções, houve uma fraqueza enorme,
não no seu projeto econômico-social, que foi um dos maiores acontecimentos (ocultado e negado
por setores tanto da esquerda quanto da direita), do século passado, mas sim na sua estrutura
interna e principalmente aliancionista (necessidade de alianças para enfrentar um "inimigo
comum" ou para "armamento e objetos bélicos"), claro que no calor da revolução e seu contexto,

52
as alianças ocorreram a malgrado, mas demonstra a insuficiência do movimento libertário em não
ter um projeto econômico concreto e coeso antes da revolução, para sustentar o processo por
tempo que for necessário e também colocando o projeto como fundamento da nova sociedade, a
organização de proletários levada a cabo pela CNT-FAI na revolução espanhola criou uma
condição econômica favorável por exemplo, mas pq seu projeto estava vingando a mais de 10
anos, e nesse tempo, a materialidade da revolução era iminente, mas errou ao deixar os princípios
anarquistas de lado, em uma histeria republicana contra o fascismo.

O sectarismo surge não como segregação estereotipada e dogmática, e sim como objeto concreto
de sustentar ações de N grupos dentro dessa ótica, e aí entra a necessidade da União Territorial,
isso é, criar uma base econômica concreta, forte, coesa e condizente com toda a doutrina
libertária e a partir disso e com isso caminhar rumo às massas oprimidas, para agregação e
demonstração real da "anarquia em ação", não como um comitê central, minoria ativa, e sim como
retroalimentação nas redes interligadas dos grupos ou núcleos agitados dentro da União e da
locus sectária, o sectarismo visa impedir, restringir e delimitar ações e reações que fogem do
campo libertário, para adentrar a um campo romântico ou reformista, ele não visa disputar os
movimentos sociais per si, e sim condicionar ou direcionar os movimentos sociais dentro da sua
própria estrutura organizacional, ou seja, em vez de disputar arduamente por hegemonia nos
movimentos sociais já estruturados (estudantis, de greve, etc..) ele converge para grupos criarem
bases libertárias que se sustentam em retroalimentação com a União, quebra com a questão do
pragmatismo político, e insere uma modificação nas formas de luta e estratégia, em vez de
caminhar para um procedimento imediatista levada a cabo por partidos políticos pressionando os
3 poderes, o sectarismo junto a União visa criar e manter (como sustentar - materialmente,
eticamente, teoricamente), os grupos e núcleos em simbiose com os oprimidos, atendendo os
critérios reais e sociais deles, e não separando-o para o abismo entre o social e político.

O sectarismo é uma forma de organização, uma forma sistêmica e consistente de manter a


coesão entre teoria-prática libertária, um projeto socioeconômico que visa sempre manter a
autonomia, liberdade, responsabilidade, igualdade e horizontalidade dos agregados a União, e
não dispersa-los em grupos atomistas, pelo contrário, fazer esses grupos manter uma relação de
ajuda mútua conforme suas necessidades e capacidade, manter uma rede de informação e teoria
em vários pontos, como defesa interna tanto contra a inserção reacionária, quanto a ataques
externos, seja no modo de advocacia, ou até mesmo de ataque a grupos extremistas de direita.

Com o sectarismo temos uma constante necessidade de construção de base que visa essa
agregação dentro do projeto econômico (unicidade teoria-prática) da doutrina libertária
(comunismo anarquista), visa a propaganda (escola de propaganda) nos setores mais dispersos
das massas oprimidas, como mantém em constante movimento, a crítica, a teoria e a prática,
combatendo e disputando conjuntamente contra todas as ideologias ou doutrinas, mas sem se
perder no pragmatismo (imediatista, reformismo, reformulismo)e perder-se no campo libertário, o
sectarismo é a visão metaética do princípio antimaquiavélico: "os fins devem ser coerentes com o
meio", se o fim de toda a ação libertária é a sociedade anárquica, seu meio deve ser coerente a tal
fim, e por isso a construção de base atrelado ao sectarismo na estrutura da União territorial é a
coesão teórica-prática no social, político, econômico, científico, etc...

Essa visão do sectarismo e construção de base, tenta fazer a imersão dos grupos em um projeto
duradouro e acionário fazendo um programa forte na propaganda e nas estruturas dos
movimentos a fim de fazer a anarquia ser a ideia-forte ou até mesmo a razão-de-ser da revolução

53
social, para isso uma base econômica anterior é imprescindível e necessária, não queremos
libertar as massas e sim que elas se libertem, mas sabemos que para isso, devemos estar com
elas e mostrar para elas as ferramentas de sua própria libertação, essas ferramentas devem ser
construídas e demonstrada sua capacidade libertadora e emancipatória.

13. A respeito do Pan-Anarquismo.

Tem como existir uma coexistência econômica pacífica pela concepção do anarquismo sem
adjetivo ou pan-anarquismo?

O sem adjetivo surge como proposta política, onde a concepção econômica é um segundo plano,
dada os embates entre anarquistas comunistas, anarquistas coletivistas e individualistas, para o
sem adjetivo o importante é a destruição do Estado e do capitalismo, a concepção econômica só
pode vir depois disso. Comete um erro essencial, que é negar a questão econômica para a ação
política (ou antipolítica), a economia é um determinante da política (veja determinante e não
determinismo), então para ter coerência entre ação política e proposta econômica, a teoria
econômica deve ser colocada como pressuposto inicial.

O problema não é nem isso, e sim a visão de após o fim do Estado e do capitalismo, economias
antagônicas podem coexistir pacificamente, como se a sociedade pudesse fragmentar seu
território e com isso criar uma autossuficiência local! Por exemplo, o comunismo libertário aboli o
mercado (valor-de-troca), o dinheiro (e a ideologia monetarista), a propriedade individual/privada,
o Estado, cria uma espécie de economia da dádiva, isso é, acesso livre e produção livre para as
associações de produtores e consumidores, a economia passa a ser uma função retroalimentada
no desenvolvimento da sociedade, dinâmica e que visa diminuir o gasto de energia humana
disposto na produção e distribuição dos produtos.

Já o coletivismo anarquista possui formas de crédito, um livre-mercado anticapitalista dentro de


um valor-de-troca e valor-trabalho, já cria uma forma de estagnação e limitação econômica. Esse
antagonismo entre economias foi o que ocorreu entre a experiência comunista libertária no
Território Livre da Ucrânia com a URSS em questão, literalmente o governo bolchevique proibiu a
troca direta entre o campesino libertário da Ucrânia com os operários das indústrias na cidade
russa, ou seja, já limitou o acesso e a troca entre o campo e a cidade!

A situação piora quando compreendemos o que é a sociedade, e porque é impossível medir o


valor-de-troca dos produtos disponíveis e produzidos, para produzir um Lápis é necessário todo
um trabalho coletivo que vai desde as usinas elétricas, extração de recursos, planeamento,
design, qualidade, questões de segurança e integridade, embalagem, manutenção das
ferramentas de produção, organização e capacitação das equipes, fora a externalidade, como
transporte coletivo, infraestrutura, alimentação, conhecimento, especialização e experiência, cada
movimentação de qualquer indivíduo para produzir algo ou fazer o processo logístico da produção
já está em constante troca com outros indivíduos nesse processo, como medir exatamente o
valor-de-troca real de todo o processo até você? Desde o conhecimento de milênios até o
conhecimento atual? Como medir todo o tempo gasto de todos os envolvidos no processo
internamente e externamente? Se não através de valores artificiais (fictícios) produzidos a partir
do valor-de-troca!

54
A produção econômica não é ação de um indivíduo fragmentado, mas de toda a sociedade. Da
mesma forma não há como coexistir economias paralelas, ou então, deixar para "escolher a
economia depois", ela é essencial para o projeto revolucionário. Quando falamos de trocas
diretas, falamos do valor real, que é imensurável, por isso deve ser disponível a todos, diferente
do valor-de-troca e do mercado que se baseia em valores fictícios, e por isso mesmo mensuráveis
e com isso forma problemas como a força de mercado, escassez artificial, produção de crises,
taxa de produção maior do que a taxa de distribuição, uma economia comunista baseada no
cálculo in natura, afere a quantidade real dos recursos e produz conforme tais conformidades
dentro de análises fisiológicas de produção para atender as necessidades gerais da sociedade
(cada associação interligada globalmente com outras associações), como isso poderia ocorrer em
um local onde para poder produzir é necessário ter um valor-de-troca embutido no valor-real,
perdendo assim o real para dar lugar ao fictício?

É uma impossibilidade coexistir uma economia sem mercado com economias de mercado, da
mesma forma que é impossível existir uma sociedade sem Estado com uma com Estado, em
algum ponto o atrito, a resistência e a luta ocorrerão.

14.​ ​Sobre o antiteísmo.

Uma breve introdução.

Aqui acho que todos sabem ou conhecem a crítica de Bakunin a religião, a ideia de Deus, a
ligação íntima entre a religião e o Estado, como também a visão do liberalismo está ligada com as
asserções cristãs (e principalmente ela) de individualismo atomista.

Só que o antiteísmo não busca apenas quebrar com a retórica teísta e muito menos demonstrar o
absurdo que é a visão teísta de mundo (social e espiritual), é também uma crítica às formas de
idolatria ou fixação de pessoas a alguém ou a algo.

Bakunin ao decorrer sobre o antiteísmo, vai também demonstrar que é uma crítica necessária
para de fato sair da lógica burguesa - ou da classe dominante, seja ela qual for -, e isso vai
aumentar a capacidade crítica e analítica de compreender as formas da propriedade, do Estado,
mercado, dinheiro, salário, exploração, etc...

Não é em Proudhon, e sim em Déjacque que teremos uma das primeiras críticas de antiteísmo, é
a partir dessa crítica que o senso de igualdade e equidade nasce, já que tira um dos principais
pontos da religião/religiosidade que é implícita em sua forma de adestramento e alienação -
SENTIR-SE ESPECIAL -, através dos ritos, dos cultos, das oferendas, dos mantras, se cria uma
visão especial de viver, como se através do "nirvana, da iluminação, epifania" o indivíduo
descobre-se uma "nova forma de vê o mundo", só que essa "nova forma" é incompatível com o
mundo em que vive, pode-se aumentar o senso de justiça, o espírito de mudança, mas começa e
termina ai, em algum momento tais formas religiosas irão criar uma forte negação do mundo para
manter a "nova visão do mundo".

Mas não é só isso que a crítica antiteísta analisa e critica, ela irá ver as formas materiais de
dominação, por isso a crítica antiteísta não é só e para a religião, mas também contra os "savants
da ciência", se enquanto antiteísta e ateu não aceitamos, acatamos e nem servimos a uma
autoridade divina ou mística (as mitologia dos jovens modernos), muito menos faremos para as

55
autoridades impostas na terra, por isso a negação e consequentemente o ateísmo que irá
extinguir a ideia de submissão e alienação religiosa para com algum ente divino, é também o
começo da negação e extinção da ideia de submissão e alienação a autoridades impostas!

Do antiteísmo e ateísmo é que surgirá toda a crítica as autoridades, seja ela divina, mística ou
humana, mas só diante a última o ser humano pode aceitar ou não ser dominado - sentimento da
revolta -, enquanto as duas primeiras (divina e mística) são idolatrias do sentimento de "ser
especial", esse sentimento fará de antemão defender o sentimento - que se mantém na expressão
de liberdade individual e ou liberdade de crença -, contra qualquer coisa que demonstre o quão
irracional e alienado é o sentimento.

15. O Individualismo anarco-comunista

[...] “O indivíduo livre, completamente livre em todos os modos de atividade, eis o que nós todos
pedimos; e quando há aqueles que rejeitam a organização, que dizem que não dão a mínima para
a
comunidade, afirmando que o egoísmo do indivíduo deve ser sua única regra de conduta, que a
adoração de seu ego deve vir antes e acima de toda consideração humanitária — crendo, com
isso,
ser mais avançados que os outros —, esses em questão nunca se ocuparam da organização
psicológica e fisiológica do homem, não se deram conta de seus próprios sentimentos, não faziam
ideia do que é a vida do homem atual, quais são suas necessidades físicas, morais e intelectuais.”
Estas palavras são do libertário Piotr Kropotkin, o maior teórico do anarco-comunismo, em
meados
do fim do século XIX e começo do século XX. Nelas, Kropotkin já revela e ressalta o ponto
principal da filosofia anarquista-comunista: a importância da questão individualista.
Quando falamos na palavra “individualismo” lembramos imediatamente das mais variadas
ideologias burguesas do século XX: o satanismo ateísta de Anton LaVey
, o egoísmo esotérico de
Aleister Crowley
, as filosofias de Friedrich Nietzsche e Ayn Rand
, o ultraliberalismo de alguns
economistas, enfim, todo o pensamento da pós-modernidade que afirma as relações sociais,
econômicas e políticas da burguesia.
Este pensamento, apesar de levar o nome de “individualista”, passa muito longe de ser pró-
indivíduo. Pois:
a) Nega, sobretudo, a questão da evolução do ser social humano. Neste "ver-o-indivíduo", ele
rechaça as bases ontológicas materialistas da essência humana, ou seja, fecha os olhos para a
abordagem dialética entre o Eu e o Outro
. Nesta análise irracionalista, o sujeito “individualista”
pensa o indivíduo em si como único, isto é, ele defende a “isolação” egoísta (no pior sentido da
palavra).
b) Como provado acima, ele, o “individualista”, vê o indivíduo irracionalmente como algo abstrato
e idealista. É uma proposta de base stirneriana que leva à negação da universalidade, isto é, nega
o
ser social humano na práxis.
Já ditas as propriedades filosóficas que os “individualistas” negam o indivíduo em si, falarei agora
do contexto social, político e econômico.

56
Ora, se o “individualista” não vê o indivíduo de forma materialista, ele proporá uma visão
puramente ideal do indivíduo. Não é um fato novo ver correntes a favor da manutenção do
capitalismo fazerem defesas ao indivíduo. Mas a principal objeção é que: onde e como o indivíduo
se verá livre dentro do sistema socioeconômico vigente que, opostamente, põe barreiras em todos
níveis para a liberdade do indivíduo? Como já disse, o “individualista” não vê o indivíduo concreto,
mas o indivíduo abstrato. Relacionando à sociedade, ele defende com todas as forças um único
indivíduo: o indivíduo capitalista, o burguês, o indivíduo não-concreto, o indivíduo isolado. Assim,
o conceito real de indivíduo (com todas as suas relações) é esquecido pelo sujeito que defende
apenas aquele modo de indivíduo. Consequentemente, não só se mostra evidente que os
“individualistas” não concebem a individualidade efetiva, mas somente sua parcela mínima dentro
do status socioeconômico. Em outras palavras: o “individualista”, por incrível que pareça, não
defende o que parece defender.
1Anton Szandor LaVey, nascido Howard Stanton Levey (Chicago, 11 de abril de 1930 — São
Francisco, 29 de outubro de 1997),
fundou a Igreja de Satã.
2 Edward Alexander Crowley (Royal Leamington Spa, 12 de outubro de 1875 — Hastings, 1 de
dezembro de 1947), foi um
membro da Ordem Hermética da Aurora Dourada e influente ocultista britânico, responsável pela
fundação da doutrina (ou
filosofia; dependendo do ponto de vista) Thelema.
3Friedrich Wilhelm Nietzsche (Röcken, Reino da Prússia, 15 de outubro de 1844 — Weimar,
Império Alemão, 25 de agosto de
1900) foi um filósofo, filólogo, crítico cultural, poeta e compositor prussiano do século XIX, nascido
na atual Alemanha.
4 Alisa Zinov'yevna Rozenbaum (São Petersburgo, 2 de fevereiro de 1905 — Nova Iorque, 6 de
março de 1982) foi uma
escritora, dramaturga, roteirista e filósofa norte-americana de origem judaico-russa, mais
conhecida por desenvolver um sistema
filosófico chamado de Objetivismo e por seus romances.
5Alusão à filosofia fichteana, mais precisamente às suas Conferências de 1804.
6Menção à filosofia de Max Stirner (Bayreuth, 25 de outubro de 1806 - Berlim, 26 de junho de
1856), filósofo alemão do século

16. Especifismo

A retórica da organização especifista (esquerdismo "libertário") e dos marxistas na necessidade de


criar um poder popular da base é a mesma, a imposição como o ápice da organização anarquista,
como se só existisse a organização especifista como perfeição do movimento libertário é
semelhante a visão marxiana de que a interpretação e aplicação do socialismo só se dá pela via
autoritária e dimensionada de Marx.

A cobrança do "trabalho de base" de ambos nega a própria condição material das pessoas, claro
que classe média não está preocupado com mais nada que o status da militância, mas chega a
ser repugnante a forma como os ativistas da organização especifista e marxistas tratam as
pessoas que não fecham com a ótica deles, e como se só eles e mais ninguém, estariam
contribuído com a conscientização classista nas massas.

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Outro erro é a visão do "dualismo organizacional", a visão que a minoria específica anarquista e a
maioria não anarquista, e que essa minoria deve se inserir na massa e disputar a predominância
ideológica, se por um lado a uma verdade nisso, por outro o sectarismo é explícito na minoria que
não aceita a revogação do status de "esquerda" em sua vanguarda.

Que é necessário uma organização a nível nacional especificamente libertária não resta dúvida
(mais depois irei fazer um texto sobre a diferença entre o plataformismo e o neoplataformismo),
mas que essa deve disputar a predominância ideológica no meio da massa através de atribuições
institucionais da política (esquerda/direita) está muito longe da realidade.

Um dos primeiros passos para objetividade e clareza de nosso ideário libertário é a denúncia e
crítica dos reacionários de qualquer matiz que insiste em impor a redução do movimento libertário
à esquerda/direita, ao mutualismo e individualismo, como o sindicalismo.

Não nos enganemos, a organização especifista (ou o """anarco"""-esquerdismo, esquerdismo


"libertário") é uma das várias formas organizacional do movimento anarquista, e sejamos sinceros,
sabemos que as inserções de elementos falsificadores está impregnado no movimento, Joyeux já
avisava que o esquerdismo seria um cancro no movimento, e sua previsão está correta.

16.1

A expressão máxima do individualismo é a responsabilidade (auto-responsabilidade); ou seja,


você ser responsável pelo seus atos e consequências desses atos; assim é onde a ética imanente
aflora; dessa relação de assumir a responsabilidade e auto-responsabilidade, pois você não vive
sozinho em uma bolha; está fortemente influenciando e sendo influenciado pela sociedade; seus
atos tem consequências diretas tanto sobre você, como sobre os outros; pode demorar, mas a
consequência é algo que não tem um limite de tempo para ocorrer, as vezes pode chegar à não
ocorrer, dependendo o ato desencadeado; - disso nasce o princípio social inerente que é a
solidariedade e cooperação; pois a partir do momento que você assume as rédeas da sua vida
(responsabilidade e auto-responsabilidade) e assume que seus atos podem influenciar outros e
assim ocorre pelo inverso, a existência digna se denota pela moral social que é também seu
princípio social à solidariedade, cooperação e ajuda mútua, mas porque isso?

Vamos tentar enxergar além do que nos foi ensinado desde os tempos memoráveis, tanto
culturalmente, como educacionalmente e religiosamente - a separação; por muito tempo os
seres-humanos por taxonomizar as espécies, acabaram eles mesmo fazendo-o isso, assim,
existem as etnias, religiões, culturas, artes, filosofia, etc... Não vamos também pensar ou negar
que existe as diferenças presentes em cada canto da terra; mas que em termos gerais, são
diferenças baixas e restritas a cada desenvolvimento temporal-espacial de cada tribo, comunidade
ou nação. Somos descendentes de um processo longo e lento, ou seja, somos descendentes de
espécies anteriores pela adaptação e seleção natural; assim, por sermos uma espécie em
processo de evolução ainda; deveríamos nós, como seres evoluídos de espécies primevas, nos
salientar que uma evolução mais propícia e qualitativa se dá pelos princípios morais e éticos do
comunismo libertário: Solidariedade, Cooperação, Ajuda mútua, equitatividade e igualdade, como
responsabilidade e dignidade, por sermos uma espécie evoluída, sabemos que tudo o que hoje
existe é derivado desse processo, todo o desenvolvimento humano social e individual é
caracterizado por todo trabalho passado até hoje, e continuará para novas gerações; Hoje temos
estradas, água encanadas, saneamento básico, bens diversos; mas que é um longo processo de

58
produção, descoberta, renovação, inovação e técnica, elas começaram em um tempo memorável
e conforme avançávamos, procriávamos, sobrevivíamos, nos aglomerávamos, foi percebido que
isso é uma herança social-humana apodítica; todo o trabalho do passado e do presente é usado
para a continuação para o futuro; assim, todos que estão nascendo hoje, irão nascer amanhã e
assim sucessivamente, como todos as pessoas que estão vivas hoje e continuarão por um tempo
X; usufruem dessa herança social-humana que é feita por todos nós, em maior ou menor grau;
seja o catador de latinhas ou seja o CEO de uma multinacional, não existe uma equivalência exata
de qual contribui mais ou menos na sociedade, mas que, em dados momentos, uns podem fazer
mais ou menos por um determinado tempo!

Ou seja, não existe uma forma monetária de conceber todo o trabalho social-humano, pois o
mesmo é uma herança comum de todos os aglomerados humanos pelo globo terrestre; o valor
desta herança, é um valor-social e orgânico, pois uma parcela enorme é de necessidade objetiva
de qualquer ser humano, assim, a luz, água, telefonia + internet, saneamento básico, alimentação,
vestuário, moradia, trabalho atrativo, lazer e artes, ciência e educação são valores inatos e
orgânicos que todos precisam e necessitam; esse valor é derivado diretamente do direito a
satisfazer suas necessidades (e como podemos perceber, a necessidade abarca vários pontos de
produção social da herança humana); conforme o desenvolvimento da humanidade vai surgindo,
as necessidades sociais-orgânicas vão também, não estamos preso na época do atrito das pedras
para o fogo, e hoje mais do que nunca, não estamos lutando pela nossa sobrevivência como
antigamente!

A herança humana é caracterizado por não ter um dono, ou um grupo de donos, muito menos por
ter um Estado administrando ou Empresas; a herança humana é comum, toda a riqueza social
que já foi produzida e ainda é e continuará sendo, é fruto direto do próprio desenvolvimento da
humanidade.

Assim, toda forma de assalariado, chefes, donos, proprietários, governantes, Estado, Reis,
Aristocratas, Padres, Papas, Bispos, toda hierarquia e autoridade é imposta sobre o pretexto de
transcendência da própria herança humana comum que é e foi materialmente produzida.

A herança humana é comum, como diabos as pessoas continuam a aceitar chefes, reis,
presidentes, papado, governantes, sobre algo que foi produzido e é continuamente produzido para
o bem-estar de todos? Toda a filosofia autoritária, prática hierárquica que concerne em (sempre foi
assim e nunca vai mudar) é a negação de todo o organismo social-humano, é a negação de tudo
que nossa humanidade anterior produziu com tanto suor, amor e paixão para a permanência de
todos nós.

17. Apoliticismo ou Antipolítica?

Uma concepção apolítica é parcialmente a visão distorcida da realidade social, ora, muitos que
contenham essa visão, são parcialmente conservadores ou de direita; pois nega em alguns graus
as condições políticas, e fica apenas na solução pragmática de acordo com o "meu-ver" sobre a
política; e com isso podemos tirar vários preceitos:
Um deles é o ultraliberalismo, o ultraliberalismo é apolítico no momento que nega ou quer o Fim
do Estado, mas, conserva e defende ainda toda a estrutura designatária do Estado, mantém a

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mesmo ordem autoritária e hierárquica, mantém a mesma condição socioeconômica a classes
mais abastadas; isso é, o ultraliberalismo é apolítico na medida principal de "fim do Estado", dado
que não tem na sua teoria, uma concepção real e criativa do que opor a esse Estado, a não ser, a
privatização total de todas as categorias articuladas pelo Estado; nesse meio-termo, os poderes
executivos, legislativos e administrativos teriam sido privatizados, mas iriam manter a mesma
atitude, se banisse essa condição, eles colocariam a mesma coisa com outro nome.

Assim, toda a teoria ultraliberal é apolítica, pelo seu duplo sentido; a negação do Estado (ou fim) e
a ações dentro da visão dominante ideológica da burguesia, isso é, eles querem o Fim do Estado,
mas, como eles não tem qualquer forma estrutural e organizacional condizente com esse "Fim do
Estado"; se articulam em comícios eleitoreiro para se postar diante o mesmo órgão com que quer
destruir, para de uma forma idealista, retirar as ações do Estado da economia, não mudam nada
na estratégia política, apenas discursam de forma apolítica sobre!

Então, nós anarquistas ou o próprio anarquismo só seria apolítico, na medida em que nega o
Estado (e sua estrutura política) no momento em que advogamos a visão ideológica da esquerda
sem nenhuma outra forma de contrapor o Estado e a situação de exploração; o que não é o caso.
O anarquismo tem o federalismo (ou territorialismo) como contraposição ao Estado, tem o
internacionalismo e autodeterminação como contraposição a democracia e
nacionalismo/patriotismo, então, não somos apolíticos, por que não somos simplesmente uma
ideologia paliativa de uma vontade restrita dentro de um corpo político.

Somos antipolíticos, mantemos sim um sistema político (ingovernabilidade ou sem governantes e


governados) dentro de uma organização antipolítica e autônoma (núcleo de bases autônomos,
movimentos sociais autônomos) para uma sociedade política-antipolítica, que tem as assembleias
e prospecções sobre a demanda da comuna, mas que não tem um poder constituído, órgãos do
poder, ou autoridade imposta, simplesmente surge como princípio básico de solução ou
movimento de ação para tal ou qual proposta ou situação.

Exemplificando:
Apoliticismo: ter uma visão restrita e subjetiva (idealista-ideóloga) da política; no caso do
ultraliberalismo se ater apenas ao "Fim do Estado"; no caso dos pseudoanarquista se ater apenas
a pautas políticas defendidas pela esquerda como base geral do anarquismo.

Antipoliticismo: ideário dentro de um corpo político que não possui autoridade, liderança
constituída, sendo uma base autônoma e dinâmica que não simplesmente nega o Estado ou quer
o fim dele; e sim que expande esse ideário a todos os domínios da vida cotidiana (cultura,
educação, ética, moral, intelectualismo, ciência, filosofia, etc..) projetando através dessa critica,
autocritica e analise uma sociedade condizente com as aspirações sociais (coletivas e individuais)
criando seu corpo econômico naturalmente disso.

18.O erro do ultraliberalismo

"A praxeologia não é uma ciência histórica, mas uma ciência teórica e sistemática..... Não
esta sujeita a verificação ou falsificação com base na experiência e nos fatos"

-Mises, Ação Humana, Página 32.

60
Mises, Rothbard e Hoppe.
Sobre dualismo, Mises diz:
“O monismo ensina que existe apenas uma substância básica; o dualismo diz que existem duas; o
pluralismo, que existem muitas. Não tem sentido discutir tais questões. São meras disputas
metafísicas insolúveis. O presente estado do nosso conhecimento não nos proporciona os meios
de resolvê-las com uma explicação que um homem razoável considerasse satisfatória.
O monismo materialista afirma que vontades e pensamentos humanos são o produto do
funcionamento dos órgãos, das células do cérebro e dos nervos. O pensamento, a vontade e a
ação são produzidos apenas por processos materiais que um dia serão completamente explicados
pela investigação no campo da física ou da química. Essa também é uma hipótese metafísica,
embora seus adeptos a considerem como uma verdade científica inegável e inabalável.
Várias doutrinas têm sido formuladas para explicar a relação entre corpo e mente. São meras
conjecturas sem qualquer referência a fatos reais. Tudo o que se pode afirmar com certeza é que
existem relações entre processos mentais e fisiológicos. Quanto à natureza e ao funcionamento
desta conexão, sabemos muito pouco, se é que sabemos alguma coisa.
Julgamentos concretos de valor e ações humanas definidas não são passíveis de maiores
análises. Podemos honestamente supor ou acreditar que sejam inteiramente dependentes de (ou
condicionados por) suas causas. Mas, uma vez que não sabemos como fatos exteriores — físicos
ou fisiológicos — produzem na mente humana pensamentos e vontades definidas que resultam
em atos concretos, temos de enfrentar um insuperável dualismo metodológico. No estado atual de
nosso conhecimento, os postulados fundamentais do positivismo, do monismo e do panfisicalismo
são meros postulados metafísicos, desprovidos de qualquer base científica, sem sentido e sem
utilidade na pesquisa científica. A razão e a experiência nos mostram dois mundos diferentes: o
mundo exterior dos fenômenos físicos, químicos e fisiológicos e o mundo interior do pensamento,
do sentimento, do julgamento de valor e da ação propositada. Até onde sabemos hoje, nenhuma
ponte liga esses dois mundos. Idênticos eventos exteriores resultam, às vezes, em respostas
humanas diferentes, enquanto que eventos exteriores diferentes produzem, às vezes, a mesma
resposta humana. Não sabemos por quê.” — Ação Humana, páginas 42 e 43.
Seu dualismo a princípio se trata sobre epistemologia, não metafísica, ele não diz que mente e
corpo são separados embora o faça quando comete o salto lógico de justificar esse dualismo
epistemológico dizendo que matéria e mente implicam em mundos (há um dualismo, nessa
passagem, de mente/matéria),
além de claro, cometer o erro de dizer que o dualismo é necessário pela imprecisão dos modelos
atuais, seja ela factual ou não.
E Rothbard segue com o salto lógico de Mises:
“E assim o homem, por não possuir conhecimento inato, instintivo e automaticamente adquirido de
seus próprios fins, ou dos meios pelos quais eles podem ser alcançados, precisa aprendê-los, e,
para aprendê-los, ele precisa exercer suas capacidades de observação, abstração e reflexão: em
suma, sua
razão. A razão é o instrumento do conhecimento e da própria sobrevivência do homem; o uso e a
expansão de sua mente, a aquisição de conhecimento sobre o que é melhor para ele e como ele
pode obter isso é um método exclusivamente humano de existência e de realização. E,
exclusivamente, esta é a natureza
do homem; o homem, como Aristóteles destaca, é o animal racional, ou para ser mais preciso, o
ser racional. Através de sua razão, o homem, individualmente, observa tanto os fatos do MUNDO
exterior quanto o modo como ele funciona e os fatos de sua própria consciência, incluindo suas

61
emoções: resumindo, ele emprega tanto a introspecção quanto a extrospecção.” — A ética da
liberdade, página 87.
“O homem, através da introspecção de sua própria consciência, também descobre o fato natural
primordial que é sua sua liberdade: sua liberdade de escolher, sua liberdade de usar ou de não
usar sua razão em qualquer assunto existente. Em resumo, a ocorrência natural de seu “livre
arbítrio”. Ele também verifica o fato natural do comando de sua mente sobre seu corpo e suas
ações: ou seja, de
sua propriedade natural sobre si mesmo.” — A ética da liberdade, página 88.
Nesse salto lógico de mente = mundo / matéria = mundo ele dá mais outro ao usar esse dualismo
para explicar como a mente ter posse do corpo implica numa propriedade deontológica e jurídica
do mesmo.
Esse salto lógico é ainda mais realçado aqui:
“A ilustre contribuição de Rothbard para a tradição do direito natural é sua reconstrução dos
princípios de autopropriedade e de apropriação original como a pré-condição praxeológica —
Bedingung der Moeglichkeit — da argumentação, e seu reconhecimento de que o que quer que
deva ser pressuposto como válido a fim de tornar a argumentação possível, não pode por sua vez
ser contestado argumentativamente sem que se caia em uma autocontradição prática.
Como Rothbard explicou em uma passagem, infelizmente resumida mas centralmente importante,
do A Ética da Liberdade: uma proposição se eleva ao status de um axioma quando aquele que a
negar recorre precisamente a ela no decorrer da suposta refutação. Pois bem, qualquer pessoa
que participa de
qualquer tipo de discussão inclusive sobre valores, está, em virtude desta participação, vivo e
ratificando a vida. Pois se realmente fosse contrário à vida, não teria interesse algum na discussão
ou mesmo em continuar vivo. Consequentemente, o suposto opositor da vida está realmente
ratificando-a
no próprio curso de sua argumentação, e por isso a preservação e proteção da vida de alguém
assumem a categoria de um axioma incontestável. (págs. 41–42)” — A ética da liberdade, página
38.
Obs: No anarcocapitalismo tanto quem prescreve quanto quem garante a propriedade é o
indivíduo.
Hoppe também não fica para trás:
Obs: não vou entrar no mérito de explicar qual é a justificação da autopropriedade para Hoppe
(ética argumentativa) apenas demonstrar onde está o dualismo do mesmo.
“Uma pessoa só pode propor alguma coisa e esperar que o oponente se convença da validade do
argumento - ou o negue e proponha outra coisa — se o seu direito e o do seu oponente sobre o
controle exclusivo de seus respectivos corpos e espaços forem pressupostos. De fato, é
exatamente esse reconhecimento mútuo que o proponente e o oponente têm a respeito da
propriedade de seus próprios corpos e do espaço que respectivamente ocupam que constitui o
characteristicum specificum de todas as argumentações proposicionais: embora uma pessoa
possa não concordar quanto à validade de uma proposição específica, ela pode no entanto
concordar com o fato de que ela discorda de algo. Ademais, esse direito à
propriedade que alguém tem sobre o próprio corpo e sobre o espaço que ele ocupa deve ser
considerado, tanto pelo proponente como pelo oponente, aprioristicamente (ou
incontestavelmente) auto-evidente. Qualquer um que afirme que a sua argumentação é que é
válida vis-à-vis a de um oponente, já estaria automaticamente pressupondo que ele e seu
oponente têm controle exclusivo sobre seus respectivos corpos e espaços ocupados por eles.
Quando uma pessoa diz “Eu afirmo que isso e isso é verdade e desafio você a provar que estou
errado”, ela está automaticamente assumindo as condições acima.”

62
— The Economics and Ethics of Private Property, página 386.
Viu como ele cai no mesmo salto lógico do Rothbard?
Sobre o dualismo metodológico, Hoppe trata especificamente sobre ele na página 366.
Ainda realça esse problema que apontei ainda mais aqui:
“A economia política começa com O RECONHECIMENTO DA ESCASSEZ. É apenas porque não
vivemos no Jardim do Éden que nos preocupamos sobre o problema da eficiência econômica.
Segundo a economia política, os meios mais eficientes de aliviar, se não superar, a escassez é a
instituição da propriedade privada. As regras que subjazem esta instituição foram corretamente
identificadas na sua maioria por John Locke. Elas são as seguintes:
Cada pessoa possui seu próprio corpo, bem como todos os bens escassos que ele
coloca em uso com a ajuda de seu corpo antes que qualquer outra pessoa o faça. Esta posse
implica o direito de empregar esses BENS ESCASSOS de qualquer maneira que se considere
adequada, conquanto que ao fazê-lo não se agrida a propriedade de outrem, i.e., conquanto que
não se altere, sem ser convidado,
a integridade física da propriedade de terceiros ou se delimite o controle de terceiros sobre ela
sem o seu consentimento.” — The Economics and Ethics of Private Property, página 333.
“Toda ação de uma pessoa requer o uso de algum MEIO ESCASSO (pelo menos o uso do corpo
dessa pessoa e do espaço que ele ocupa).” —The Economics and Ethics of Private Property,
página 384.
“Mais ainda: seria igualmente impossível uma pessoa incorrer em alguma argumentação e
depender da força proposicional de seu argumento se essa pessoa não pudesse ser a proprietária
(controle exclusivo) de outros meios escassos (além de seu corpo e do espaço que ele ocupa). Se
essa pessoa não tivesse esse direito, ela já estaria morta. Expandindo-se essa situação
universalmente, todos nós já estaríamos mortos, e todo o problema de ter de justificar regras —
bem como qualquer outro problema — simplesmente não existiria. Logo, unicamente pela virtude
do fato de essa pessoa estar viva, o direito de propriedade sobre outras coisas deve ser
pressuposto como válido, também. Ninguém que esteja vivo
pode argumentar o contrário.
Se uma pessoa não pudesse adquirir a propriedade sobre esses bens e espaços por meio de um
ato de apropriação original — isto é, estabelecendo um elo objetivo (intersubjetivamente
averiguável) entre ela própria e o bem e/ou espaço específicos antes de qualquer outra pessoa.”
— The Economics and Ethics of Private Property, página 387.
A praxeologia diz que o Homem age usando meios escassos para atingir fins.
Se os meios não fossem escassos não haveria necessidade do homem agir.
“Chamamos contentamento ou satisfação aquele estado de um ser humano que não resulta, nem
pode resultar, em alguma ação. O agente homem está ansioso para substituir uma situação
menos satisfatória, por outra mais satisfatória. Sua mente imagina situações que lhe são mais
propícias, e sua ação procura realizar
esta situação desejada. O incentivo que impele o homem à ação é sempre algum desconforto. Um
homem perfeitamente satisfeito com a sua situação não teria incentivo para mudar as coisas. Não
teria nem aspirações nem desejos; seria perfeitamente feliz. Não agiria; viveria simplesmente livre
de preocupações.
Mas, para fazer um homem agir não bastam o desconforto e a imagem de uma situação melhor.
Uma terceira condição é necessária: a expectativa de que um comportamento propositado tenha o
poder de afastar ou pelo menos aliviar o seu desconforto. Na ausência desta condição, nenhuma
ação é viável. O homem tem
de se conformar com o inevitável. Tem de se submeter a sua sina.” — Ação Humana, páginas 37
e 38.

63
“O homem tem condições de agir porque tem a capacidade de descobrir relações causais que
determinam mudanças e transformações no universo. Ação requer e pressupõe a existência da
causalidade. Só pode agir o homem que percebe o mundo à luz da causalidade. Neste sentido é
que podemos dizer que a causalidade é um requisito da ação. A categoria, meios e fins pressupõe
a categoria causa e efeito. Num mundo sem causalidade e sem a regularidade dos fenômenos,
não haveria campo para o raciocínio humano nem para a ação humana. Um mundo assim seria
um caos no qual o homem estaria perdido e não encontraria orientação ou guia. O homem nem é
capaz de imaginar um universo caótico de tal ordem” — Ação Humana, página 47.
“O que a economia tem a dizer sobre essa conversa fiada é que a economia lida com os
problemas que o homem tem que enfrentar devido ao fato de que sua vida é condicionada por
fatores naturais. Lida com a ação, isto é, com os esforços conscientes para diminuir tanto quanto
possível o desconforto. Não tem nada a dizer sobre o que sucederia num mundo, não só
inexistente como também inconcebível para mente humana, onde as oportunidades fossem
ilimitadas. Em tal mundo, pode-se admitir, não haveria nem lei de valor, nem escassez, nem
problemas econômicos. Essas coisas não existiram porque não haveria escolhas a serem feitas,
não haveria ação nem tarefas a serem resolvidas pelo raciocínio. Os seres que porventura
tivessem florescido num tal mundo jamais teriam desenvolvido o raciocínio e o pensamento. Se
algum dia um mundo assim fosse dado aos descendentes da raça humana, estes seres
bem-aventurados veriam sua capacidade de pensar se atrofiar e deixariam de ser humanos.
Porque a tarefa primordial da razão é enfrentar conscientemente as limitações que a natureza
impõe ao homem, é lutar contra a escassez. O homem que age e que pensa é o produto de um
universo de escassez onde qualquer gênero de bem estar que possa ser alcançado será fruto de
esforço e preocupação, de uma conduta que comumente chamamos de econômica.” — Ação
Humana, página 291.
Como então dizer que o corpo é um meio para um fim não seria por um dualismo de mente/corpo
na praxeologia, pois se disséssemos que não teria dualismo nisso assumiríamos que um meio
poderia agir para atingir um fim, e Mises diferente dos anarcocapitalistas pelo menos não cometeu
esse erro (pelo menos não explicitamente) de que um corpo pode ser considerado bem escasso
ou um meio para algo (embora isso esteja de acordo com a praxeologia como demonstra
Rothbard e Hoppe) dizer que tal afirmação de que o corpo é um meio escasso não implica em
dualismo de corpo e mente é contradizer a própria praxeologia, na verdade eu poderia dizer que
Hoppe e Rothbard talvez demonstraram uma falha prática na praxeologia sem nem mesmo
perceberem.
Obs: sobre praxeologia e autopropriedade em Rothbard e Hoppe, ver Manifesto Libertário páginas
42 e 43 & A ciência econômica e o método austríaco páginas 55 a 57.

[Nota]

A natureza estatista da propriedade privada pode ser vista nas obras da direita "Libertária" (ou
seja, "liberais clássicos") que representam os extremos do capitalismo laissez-faire:

"Se eu começar uma cidade privada, em terra cuja aquisição não violou e não viola a condição
lockiana [de não-agressão], as pessoas que escolheram se mudar para lá e permanecer não
teriam direito a uma opinião sobre como a cidade foi administrada, a menos que lhes fosse
concedido pelos procedimentos de decisão para a cidade que o proprietário havia estabelecido".
[Robert Nozick, Anarchy, State and Utopia , p. 270]

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Tais cidades são muitos similares às relações do feudalismo e, de fato, essas cidades privadas
existiram, mais notavelmente as infames cidades da história dos EUA. Howard Zinn resume as
condições de tais "cidades privadas" nos campos de minas do Colorado:

"Cada campo de mineração era um domínio feudal, com a empresa atuando como senhor e
mestre. Cada campo tinha um marechal, um policial pago pela empresa. As 'leis' eram as regras
da empresa. Toques de recolher foram impostos, estranhos "suspeitos" não foram autorizados a
visitar as casas, a loja da empresa tinha o monopólio dos produtos vendidos no campo. O médico
era um médico da empresa, os professores contratados pela empresa ... O poder político no
Colorado estava nas mãos daqueles que mantinham o poder econômico. Isso significava que a
autoridade da Colorado Fuel & Iron e outros operadores de minas era virtualmente suprema. . .
Funcionários da empresa foram nomeados como juízes eleitorais. OOs médicos legistas e juízes
dominados pela empresa impediram que os empregados lesionados coletassem danos". [The
Colorado Coal Strike, 1913-14 , pp. 9-11]

Sem surpresa, quando os trabalhadores se rebelaram contra essa tirania, eles foram despejados
de suas casas e os agentes de segurança privados foram extremamente eficientes em reprimir os
grevistas: "No final da greve, a maioria dos mortos e feridos eram mineiros e suas famílias". A
greve logo assumiu as características de uma guerra, com batalhas entre grevistas e seus
partidários e os bandidos da empresa. Ironicamente, quando a Guarda Nacional foi enviada para
"restaurar a ordem", os "mineiros, tendo enfrentado nas primeiras cinco semanas da greve o que
consideravam um reinado de terror nas mãos dos guardas particulares,. . . esperavam" sua
chegada. Eles "não sabiam que o governador estava enviando essas tropas sob pressão dos
operadores das minas". De fato, os bancos e corporações emprestaram os fundos do Estado para
pagar pela milícia. Foram esses bandidos da companhia, vestidos com o uniforme da milícia do
Estado, que assassinaram mulheres e crianças no infame Massacre de Ludlow, em 20 de abril de
1914. [Op. Cit. p. 22, p. 25, p. 35]

19. Formas de organização

É fato que existe uma fragmentação e cisão interna no movimento anarquista, as questões acerca
do sintetismo, insurrecionalismo, construtivismo, especifismo e plataformismo são características
nata e inata dessa fragmentação e cisão.

Mas também é correto que todos eles advogam uma forma de economia e organização societária
baseada no comunismo [libertário] e se fragmentam é de fato na forma de se chegar a tal
organização.

Inevitavelmente cada uma delas tem seus limites e erros, acertos e devaneios, nenhuma delas é
infalível e lendo-as percebe-se que não querem ser demagogas; O sintetismo por exemplo, além
de ser uma forma de ''resposta'' ao plataformismo, parte de erros, ele vê o sindicalismo como a
organização que levará a revolução social, e o individualismo como fator emancipatório e de
bem-estar social, só que ao propor o sindicalismo como organização revolucionária e o
individualismo como autocrítica autonomista contra a inserção de formas autoritárias dentro da
organização, se esquece que o centro gravitacional é de fato a organização socioeconômica
[comunismo libertário], e o contrário do que é concebido, os limites [acertos, erros, possibilidades
e impossibilidades] do comunismo libertário está inalado na suas formas de posição [por em
movimento] dentro das organizações.

65
O construtivismo é uma organização sindicalista mais pura, isso é, é do sindicalismo ao
sindicalismo, e também irá criticar o plataformismo, porém, não com a mesma base teórica que o
sintetismo, eles demonstram alguns limites da plataforma, e esquecem dos limites do sindicalismo
[ que se limita a apenas a questão do trabalho, independente a forma econômica preestabelecida
e colocada no local do trabalho ], o sindicalismo enquanto organização do local do trabalho em
ações diretas para conquista de ''direitos'' aos que ali trabalham, fragmenta a luta nas massas, já
que estará fechado a coalizões e defesa do local de trabalho e apenas ali, e depende de apoio e
alianças fora para sobreviver [vide a quantidade de empresas estatisticamente colocadas pela
ANTEAG - Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Autogestão e Participação
Acionária] isso é, o sindicalismo enquanto proposta anarquista ou conselhista [autogestionária]
estará inerte a própria reprodução do capitalismo, já que se retira do hipocentro gravitacional
[comunismo libertário] para se por no epicentro da reprodução e produção das forças alienantes
do capital, mesmo que sua conduta de ação direta seja exuberante, só ela, estando fora do
hipocentro gravitacional, não condiz com uma realização mesmo que parcial de uma forma de
estrutura revolucionária.

O especifismo [neoplataformismo] é junto com a proposta sindicalista, uma das mais velhas dentro
do movimento libertário, através de sua proposta de dualismo organizacional, se coloca nos
mesmos limites do sindicalismo no que tange o seu núcleo [modelo ideológico de atuação] e
fragmenta ainda mais, quando a partir de um idealismo abstrato forma sua concepção dualista:
Nível Político e Nível Social, já que através da minoria ativa [nível político] irá para a concepção da
maioria social [nível social] em sua visão classista, que paradoxalmente, faz com que essa
>minoria ativa politicamente< seja engolido pela maioria social e com tendências ideológicas
variadas, sendo a interação dessa organização limitada e muitas vezes românticas com as
necessidades da classe explorada, em certo aspecto o sindicalismo é o que é, porque de fato,
mesmo que parcialmente, conquista "algo" de forma mais direta, do que qualquer outra
organização anarquista. A sua concepção idealista abstrata [inserção social] limita a adesão do
anarquismo só para aqueles que mesmo que de forma preconcebida tenha uma certa aderência
aos ideais libertários, sem pelo menos ter conhecimento, sendo influenciável apenas para aqueles
que já tenham -mesmo que de forma não-consciente- uma visão antiestatista e antiautoritária
contra o Estado e suas ações. E o principal erro é achar que aqueles que não são "especifistas" é
porque negam o modelo organizacional e a luta de classes, criando assim uma visão acrítica e
romântica da própria massa, que visam fazer seu trabalho social.

É fato inegável que o hipocentro gravitacional de toda forma de organização anarquista dentro do
movimento libertário é o comunismo libertário, o porém é que as organizações ficam no epicentro
[superfície] ou fora, vêem o hipocentro como um devir condicionado a revolução social, vêem
apenas a sua forma a partir das insurgências populares para uma revolução social, o comunismo
libertário para todas as organizações, mesmo que de forma implícita é uma utopia [lugar que não
existe] e que só poderá existir através e pela revolução social [talvez].

[Nota]

Sintetismo: a síntese da nova organização sócio-politica-economica comunista-anarquista,


organização revolucionária sindicalista e condição de emancipação individual (Síntese entre:
Comunismo-Anarquista - Anarco-sindicalismo e Anarco-individualismo) contra a ideia de transição.

66
Sem Hífen/adjetivo: organização e anti organização anarquista, baseada nos critérios de
anticapitalismo, antiestatismo e contra toda a dominação, não tem ou possui programa sólido,
sintético ou concreto socioeconômico, sua apologia e consciência está na idéia de "inimigos em
comum", e que a organização social e econômica pós Revolução e segundo plano (não vê
diferença no hífen ou adjetivo que se coloca após o "anarco-") muito menos se preocupa se é
classista ou não, contendo até mesmo a ideologia mutualista (proudhonianismo).

Pan-anarquismo: posição ideológica que abarca toda forma de hífen e adjetivo, programa
antiestatista sem necessariamente ser anticapitalista, antiautoritário e antiteista, o inimigo
substancial e absoluto de tal posição ideológica é o Estado, a adesão a tal ideologia não precisa
ser coerente e honesta, podendo abarcar o "anarco"-fascismo, "anarco"-nacionalismo,
"anarco"-capitalismo, "anarco"-monarquismo, georgismo e o mutualismo e o principal fomentador
de revisionismo e relativismo histórico, político, social e científico do anarquismo, entrelaçando
posições antagônicas e excludentes dentro da doutrina libertária.

Especifismo (neoplataformismo): Ideologia da esquerda-anarquista, que possui o programa


comunista-anarquista como organização socioeconômica -pós-revolução-, uma abordagem
reducionista e idealista, que reduz e limita o movimento anarquista há esquerda como uma
simples ideologia do socialismo libertário, não é a única e nem a mais promissora dentro do
movimento anarquista, sua visão de esquerda e mais coerente que sua percepção anarquista de
fato.

Plataformismo: Organização comunista-anarquista teorizada pelo Dielo Truda pós experiência


libertária do Território Livre da Ucrânia (makhnovitchina), sua condição é uma organização
sectária, que desde antes da revolução, os adeptos de tal Organização se disciplinem e
desenvolta as bases da nova organização socioeconômica.

Insurrecionalismo: Organização Comunista-Libertária que visa ataques organizados contra o


Estado, Capitalismo e Religião, criando células autônomas (Base de Núcleo Autônomo) insurgindo
de formas diversas contra as ações repressivas do Estado e Capitalismo, melhor desenvolvido
pelo anarquista Alfredo Maria Bonanno.

O movimento anarquista possui uma diversidade de tendências e organizações, para ser reduzida
na forma de "preto-branco", uma ideologia diz que é de esquerda, enquanto que a doutrina
(totalidade do movimento) diz que não, não é.

E cada uma dessas organizações ou tendências, possui seus limites e falhas, é necessário um
corpo organizacional que suporte o programa comunista-anarquista e crie uma autonomia e
liberdade, como uma disciplina e estratégia dentro de uma base ética e moral sectária de sua
doutrina, que o corpo seja o suporte de tal doutrina, e não organizações soltas e fragmentadas
com unidades separadas e restritas pelo globo tentando criar o corpo a partir e depois da
revolução.

20. A Anarquia e o Caos

“Anarquia é o caos”;

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Eis a frase que todo anarquista e libertário já deve ter escutado na vida, por seus familiares,
amigos, mídia, sociais-democratas, liberais, etc… Essa fraseologia não é nova, acompanha o
movimento anarquista desde seus primeiros passos, antes ainda, dado que a palavra anarquia
(sem governo, hierarquia) sempre foi pressuposto para o “caos e a desordem”, sobre a realidade
da desordem, acho que nenhuma palavra seria mais necessária ou acrescentada depois da
resposta de Piotr Kropotkin.
O caos, na concepção das pessoas com intuitos falsos e errôneos é tido como uma
impossibilidade de ordem e harmonia, uma perspectiva idealista e dogmática de que uma
sociedade sem governos, autoridades, hierarquias, sem imposição de leis pela força e coerção,
traduzindo, uma sociedade “selvagem, bruta, preguiçosa e ignorante”; assim, todas as pessoas
que viveriam sem os governos, sem as autoridades, sem as hierarquias … Lutariam umas com as
outras, é a preservação do mais forte sobre o mais fraco, é uma sociedade onde o animal mais
selvagem e brutal seria o rei da selva. Na visão dessas pessoas, o Estado surgiu exatamente pelo
caos e a desordem, pela anarquia. O Estado na crença dessas pessoas é a perfeição e ordem
autossuficiente, as pessoas se matam, digladiam, fazem as piores atrocidades, mas o sistema de
Estado e lei, direito a propriedade privada e divisão de classes, são eternos e imutáveis, é esse
sistema que garante a ordem e a perfeição das sociedades vindouras, todos morreremos, mas
não o sistema, pois é o contrato harmonioso entre toda a humanidade, e que sem esse contrato
social feito pela criação dos Estados e da própria sociedade civil a humanidade voltaria a seus
primórdios caóticos e desordeiro!
Não precisa de muito tempo para enxergar o quão errado, o quão falso e o quão irracional é a
concepção dos estatistas sobre o ordenamento organizacional da sociedade civil, uma concepção
vista apenas pelos olhos da nobreza, da autoridade, uma ideia apenas semeada pela parcela que
explora e controla todos os meios de emancipação das pessoas em sua totalidade. Aqui vamos
tentar analisar o caos em uma perspectiva anarquista se assim eu puder.
Antes de qualquer desenvolvimento, assumirei com todas as palavras contidas no pressuposto:
“Anarquia é o caos”! O que é o caos de fato?
Na concepção básica da teoria do caos (matemática) é um sistema complexo (sistemas que
interagem entre si e exibem propriedades emergentes coletivas) que apresentam uma certa
instabilidade que podem recorrer em condições não-previsíveis ao longo do tempo. Esse sistema
complexo também pode ser explicado de uma forma onde são compostos de variadas partes que
interagem entre si gerando novas habilidades e qualidades no comportamento coletivo, no sentido
de uma auto-organização1.
Podemos facilmente identificar com uma simples averiguação social, que a sociedade é
organizada de uma forma caótica, determinada e auto-organizada, onde o corpo estranho é a
perfeição, imutabilidade, atemporalidade e poder do Estado e suas estruturas políticas diversas, a
humanidade na sua permanência é caótica, não aceita a imutabilidade, não é perfeita e é muito
menos atemporal, a humanidade é fruto da não-previsibilidade natural das estruturas complexas
da natureza, não tem como ser diferente, é apenas o caos e a imperfeição que faz a vida fluir, faz
a vida se desenvolver, e inevitavelmente cria a harmonia diante dos componentes que interagem
entre si e criam uma dimensão visível na coletividade que o cerca.
Então sim, a anarquia é o caos, é a fluidez da vida sem uma programação imposta, é a
adaptabilidade de cada indivíduo diante as diversidades da vida em sua total completude, é o total
desenvolvimento intelectual, moral, artístico e científico fazendo surgir a harmonia entre pensar e
agir, entre entender e fazer, o caos aniquila tudo que se interpõe no livre-desenvolvimento
aleatório dos componentes dentro dos sistemas, o caos é a interação do simples ao composto, é a
organização da simplicidade da vida em formas complexas auto-organizadas, é do caos que surge
o progresso, a harmonia, o respeito, o desenvolvimento, as ações, reações … Em sistemas

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imutáveis, perfeitos nada é necessário, nada é preciso, nada é possível … não à ação na
perfeição, não a desenvolvimento na imutabilidade, apenas condições precárias de ilusão de
escolha e caminho, não importa qual caminho você escolha, não importa sua fé no livre-arbítrio …
no fim você está limitado pela perfeição do Estado, na imutabilidade da vida dentro dessa
perfeição, todos os caminhos que você queira trilhar, todas as escolhas possíveis são limitadas e
totalmente precarizadas pela perfeição! É importante lembrar-se que a perfeição nada pode fazer,
nada pode agir, nada pode criar, nada pode inventar, pois a perfeição é o máximo de totalidade de
algo sem mais nada acrescentar e ou modificar, ela não precisa, necessita, tem vontade ou
desejo, pois tudo já tem, tudo já é, a perfeição é a inexistência da vida, do progresso, é a
inexistência de tudo que existe, pois a perfeição ela própria é contrária a tudo que é imperfeito,
mutável, adaptável e modificável.
E assim é o Estado, ele é contrário a livre-iniciativa, a autonomia, a liberdade, a igualdade,
equidade, ao respeito, a própria vida simples e imperfeita; — o Estado é a negação da
humanidade, da vida em sociedade … ele preserva o que diz combater, e também é o alicerce do
privilégio, poder, autoridade e hierarquia … a limitação de fronteiras demonstra o quão contrário o
Estado se faz diante as diversidades de indivíduos pelo mundo, o Estado não consegue prover a
paz, tranquilidade, justiça, igualdade, equidade pelo simples fato que é ele que produz a guerra,
genocídio, injustiça, desigualdade, é o Estado com sua imutabilidade que sustenta o direito a
propriedade privada e assim dá base para a exploração do homem sobre outros homens, o
Estado conta com a previsibilidade, com a ordem, conformação das pessoas em acatar que sem o
próprio Estado, as pessoas viveriam sobre uma organização selvagem, bruta e preguiçosa,
quando é exatamente isso que ocorre dentro das rédeas de todos os Estados.
Muitos à de falar que nós anarquistas vemos o Estado como um monstro, mas que, devemos tudo
o que temos hoje para o próprio Estado; utilizam de preceitos voláteis e totalmente supérfluos,
alguns argumentos são:
a) O Estado é que investe em ciência e tecnologia;
b) O Estado que criou a internet;
c) O Estado que garante que os trabalhadores não sejam mais explorados pelos proprietários e
que a cada direito conquistado a favor do trabalhador é uma vitória contra a burguesia e os
capitalistas.
O primeiro ponto, estamos de acordo, é o Estado que investe na ciência e na tecnologia, se
pudermos chamar de investimento os impostos, taxas e tributos que nós pagamos como
investimento, então sim, existe um investimento do Estado na ciência e tecnologia, o que decorre
algumas ponderações: os motivos do Estado investir nessa área tem alguns pontos, um dos
principais é derivado em uma concepção de soberania nacional, já nos inícios de seu artigo,
Bakunin já mostra os motivos do investimento que o Estado faz nas áreas diversas de ciência e
tecnologia, como o mesmo diz “No fundo, a conquista não é somente a origem, é também o
objetivo supremo de todos os Estados, grandes ou pequenos, poderosos ou fracos, despóticos ou
liberais, monárquicos, aristocráticos, democráticos e até mesmos socialistas”, o que mostra é que
os Estados investem nessa área não pelo progresso e desenvolvimento da sociedade, mas
totalmente o contrário, é a necessidade de conquista, colonização, dominação, competição e
expansão do Estado subjugando a todos e a tudo.
A premissa que o Estado é o que investe em tecnologia e ciência é supérflua, não consegue
desenvolver além disso, mesmo as teorias econômicas públicas são superficiais nessa questão, e
sempre cai na ponte “estratégica e competitiva do Estado diante outros Estados”, porém, não é
mais falso e ridículo achar que o Estado deve e tem por obrigação investir nessa área, um
professor de direito tributário em um curso disse a sala que a coisa que importa para o Estado é o
dinheiro, é a força motriz e o principal objetivo de todos e qualquer Estado, não importa o resto,

69
ora, isso é mais do que fatídico, não precisa nem de observação, não existe pessoa que não
reclame da extorsão pelos impostos, taxas, tributos, nessa condição, o Estado é estratégico e
empresarial, ele à de investir na ciência e tecnologia, mas não porque vê alguma qualidade ou
visão futurística, e sim porque utiliza as ferramentas como suporte militar, disposição de controle e
dominação da própria nacionalidade que está instaurado, pois para o Estado só a premissa que
existem pessoas que querem viver sem governo, autoridade, hierarquia é um motivo mais do que
necessário para espionar e controlar todas as informações pessoais de cada indivíduo dentro de
seu próprio território. A condição de “segurança nacional, dado às ameaças terroristas” não é
verdadeira, o terrorismo tem financiamento integral dos Estados, é condição geopolítica o
terrorismo, algum Estado financiará algum grupo terrorista, onde a única condição é que esse
grupo terrorista institua toda a constituinte do patrocinador; — outra questão importante é que, o
investimento promovido pelo Estado é insuficiente, precário e condicionado a falhas, caso do
Brasil, onde é noticiado o corte de luz devido a falta de pagamento, a saída de vário(a)s cientistas
devido a falta de incentivo dos mesmos setores que dizem serem necessários para a ciência e
tecnologia.
Em países onde a ciência e tecnologia são impulsionadas condiz exatamente com o que Bakunin
já tinha dito “Ridículo, tanto quanto se quiser, é seu sonho, assim como é o sonho do menor
proprietário camponês, aumentar seu domínio em detrimento de seu vizinho; aumentar, crescer,
conquistar, a qualquer preço e sempre, é uma tendência fatalmente inerente a todo Estado,
qualquer que seja sua extensão, sua fraqueza ou sua força, porque é uma necessidade de sua
natureza. O que é o Estado senão a organização da força! Mas é da natureza de toda força não
poder suportar nenhuma outra, nem superior, nem igual –, não podendo a força ter outro objetivo
senão a dominação, e a dominação só é real quando tudo o que a entrava lhe está subjugado.
Uma força só suporta a outra quando a isso é obrigada, quer dizer, quando se sente impotente
para destruí-la ou derrubá-la. O simples fato de haver uma força igual é a negação de seu
princípio e uma ameaça perpétua a sua existência, pois é manifestação e prova de sua
impotência. Consequentemente, entre todos os Estados que existem, um ao lado do outro, é a
guerra é permanente e a paz apenas uma trégua.
É da natureza do Estado apresentar-se, tanto para si quanto para todos os seus governados,
como objeto absoluto. Servir sua prosperidade, sua grandeza, sua força, é a suprema virtude do
patriotismo. O Estado não reconhece outra: Tudo o que o serve é bom, tudo é contrário a seus
interesses é declarado criminoso, tal é a moral do Estado”. Outra explicação simples, é nítido que
os investimentos promovidos pelo Estado não é mais do que sua perpetuação pelas ferramentas
de dominação e controle que essas áreas podem prover e inventar; não é atoa que empresas
como Facebook, Google empresas de tecnologias digitais estão todas devidamente financiadas
pelo Estado, não é preciso colocar as avalanches de notícias e manchetes que mostram como as
empresas de cunho estatal, como também as de cunho privado que são financiadas pelo Estado
abrem suas portas a informações sigilosas, tudo em favor da permanência da “ordem, soberania
nacional e estratégia competitiva a mercados externos”.
Isso nos leva ao segundo ponto, o Estado criou a internet, outro ponto que podemos concordar,
mas que os estatistas que utilizam esse argumento não desenvolvem mais do que o conceito; a
internet foi criada exatamente pela consequência de duas concepções políticas, o liberalismo
estadunidense e o socialismo autoritário (URSS), surge em plena guerra fria, não como
ferramenta de progresso e desenvolvimento para a humanidade, mas como corrida pela soberania
internacional e competição mercantil, a internet hoje é uma ferramenta importante para a
humanidade no geral, por isso hoje ela é vista como criminosa pelo Estado, quantas leis virtuais
não estão em voga contra a liberdade da internet, controle de informação, e mesmo assim o
próprio Estado utiliza a internet para controlar e conter as informações, sim o Estado pode ter

70
criado a internet, mas não porque é do feitio do Estado prover desenvolvimento a sociedade, e
sim para se sobrepor diante as ameaças de sua soberania, ordem e perfeição.
Esses dois pontos são muito utilizados por sociais-democratas e liberais de toda estirpe, nada
mais falso do que utilizar essa condição como pressuposto que o Estado é necessário e preciso; a
ciência e tecnologia são frutos do caos, isso é, frutos da fluidez da vida em sua diversidade,
somente fora da tutela dos Estados e da iniciativa privada “As letras e a ciência só tomarão o seu
verdadeiro lugar na obra do desenvolvimento humano no dia em que, livres de toda a servidão
mercenária, forem exclusivamente cultivadas pelos que as amam e para os que as amam”
(Kropotkin), enquanto os cientistas, apaixonados pelo conhecimento, pelo mistério da natureza,
acharem ou cogitarem que é necessário um Estado e investimento do mesmo para o
desenvolvimento pleno e integral das ciências, letras e tecnologia, para o avanço moral e ético da
humanidade, estarão presos na ferocidade, selvageria e despotismo total do próprio Estado; — a
ciência e tecnologia podem caminhar livremente sem o Estado e incentivo da propriedade privada,
isso é, quando a ciência e a tecnologia, junto a toda humanidade puderem caminhar livres de toda
a autoridade, hierarquia, dominação, poder e controle que o Estado e a propriedade privada
impõe, o pleno desenvolvimento, o progresso racional e ético tomará forma, sua consequência
emergente e imediata é a anarquia.
Por último, esse argumento não é só utilizado por estatistas reformistas, mas também por uma
parcela de anarquistas, que optam por negar toda as atrocidades, desigualdades, se negam a
enxergar a calamidade gerada pelas estruturas do Estado e da propriedade privada, para dar
margem a um “evolucionismo” ou então “pacifismo” … um egoísmo descarado, uma petulância
irracional em cogitar que o ser humano não pode viver a anarquia agora, porque é “muito mal e
egoísta” ou que “a anarquia decorre de uma evolução das mentes das pessoas”, a história da
humanidade é ignorada, a situação é romantizada e por fim a tranquilidade no espírito desses
anarquistas é mantida sobre tempestuosidade dos miseráveis.

Uma retórica falsa, incorreta e incoerente é utilizada nisso, como mostrado o Estado tem o
interesse apenas no dinheiro para sua expansão e conquistas de novos Estados, como utiliza as
ferramentas socialmente produzidas a sua propagação e permanência diante sua moral e virtude
exacerbada e capciosa; o Estado não tem outro interesse que o próprio, sua organização não é
mais do que a própria sintonização da corrupção em escalas hierárquicas, sua exploração é
territorial, sua lei é universal, sua autoridade é inquestionável, eis a totalidade de qualquer e todo
Estado.
O Estado não protege o trabalhador contra a exploração do capitalista, o Estado não pode dar
direitos, os direitos só podem ser conquistados contra o próprio Estado, o Estado é a garantia
inteiramente e inesgotavelmente do direito dos proprietários sobre os explorados, o Estado se alia
a aquele que tem poder, o Estado garante a sobrevivência dos “mais fortes”, e são exatamente os
capitalistas diante o direito a propriedade privada que obtêm essa condição, mas, os socialistas
autoritários estão enganados em pensar que assumir o poder do Estado é garantia de sua
proposta revolucionária, pois “A ditadura do proletariado é um conceito e uma fórmula do
imperialismo classista, equivocada e absurda. O proletariado deve desaparecer, não governar. O
proletariado é proletariado porque desde o berço até a morte está sob o peso de pertencer à
classe mais pobre, menos instruída, menos suscetível à emancipação individual, menos influente
na vida política, mais exposta à velhice e à morte prematura, etc. Resgatado dessas injustiças
sociais, o proletariado deixa de ser uma classe em si, porque todas as outras classes foram
destituídas de seus privilégios. O que resta quando as classes desaparecem? As categorias
humanas persistem: inteligentes e estúpidas, educadas e semi-cultas, saudáveis e doentes,
honestas e desonestas, boas e más, e assim por diante” (Berneri), não existe uma racionalidade

71
em que determine que conquistando o Estado, vai alterar sua virtude e natureza em uma luta de
“emancipação”, o Estado é contrário a qualquer tendência de igualdade, liberdade e justiça.
A concepção que o Estado “não deixa os capitalistas explorarem mais o trabalhador” é uma
fórmula errada e cruel, sendo o Estado a garantia do direito a propriedade privada e
consequentemente deriva uma exploração legalizada e sobre a tutela das leis do Estado, essa
retórica é incoerente e incorreta, o Estado não serve para impedir a exploração do trabalhador
pelo proprietário, e nem “do camponês pelo latifundiário? Será para assegurar-nos o trabalho?
Para defender-nos do agiota? Fornecer-nos alimento, quando a mulher possui apenas água para
acalmar o filho, que chora em seu seio seco? Não, mil vezes não! O Estado é a proteção da
exploração, da especulação, da propriedade privada –, produto da espoliação. O proletário, que
só possui como riqueza seus braços, nada pode esperar do Estado; encontra nele apenas uma
organização feita para impedir a qualquer preço sua emancipação. Tudo para o proprietário
ocioso, tudo contra o proletário trabalhador: a educação burguesa, que desde a primeira infância
corrompe a criança, inculcando-lhe os preconceitos antiigualitários; a Igreja, que confunde o
cérebro da mulher; a Lei, que impede a troca de ideias de solidariedade e igualdade; o dinheiro,
se necessário, para corromper aquele que se faz apóstolo da solidariedade dos trabalhadores; a
prisão e a metralhadora, à vontade, para calar daqueles que não se deixam corromper. Eis o
Estado” (Kropotkin), a visão tanto estatista e as concepções dos sociais-democratas “anarquistas”
é irracional e controvérsia.
Como podemos ver, o anarquismo é caos, não o caos propagado pelos estatistas e autoritários,
mas sim pela sua concepção de fluidez, auto-organização, descentralização e livre-iniciativa
(não-previsibilidade), a teoria dos sistemas e a teoria do caos é um corpo de pesquisa
inerentemente anárquica, libertária e indiscutivelmente contra o Estado, a propriedade privada,
autoridade e hierarquia, essas teorias conduzem a uma fluidez sem entraves, sem imposição, é
simples de enxergar que um anarquista deve abraçar o caos se quer mudar verdadeiramente a
sociedade em toda sua estrutura ordenada e imutável.
Não tem como mudar a sociedade com medo de abraçar o caos e continuar a fazer as mesmas
coisas.
1 Podemos dizer então que a auto-organização é a capacidade apresentada por alguns sistemas
de criar padrões de comportamentos não previsíveis, descentralizados. Em alguns casos de
crescente adaptabilidade.
Os sistemas auto-organizativos são caracterizados por apresentar descentralidade na organização
dos padrões de comportamento que são formados pelas interações locais de seus constituintes.

21. Marxismo, ou Capitalismo de Estado.

[Capitalismo de Estado para Lênin era “(...) um laço intermediário entre a pequena
produção e o socialismo, como um meio, um caminho e um método de incrementar as
forças produtivas” (LENIN apud RODRIGUES & DE FIORI, 1978, p.28)]

"Camaradas!
O Poder Soviético está convidando capitalistas estrangeiros que queiram receber concessões na
Rússia.

O que são concessões? São um acordo entre o Estado e capitalistas que se disponham a montar
ou melhorar uma indústria (por exemplo, extração e transporte fluvial de madeira, extração de
carvão, petróleo, minério etc.), pagando ao Estado, por isso, com uma parcela do produto
extraído, e a outra parcela recebendo em forma de lucro.

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Está o Poder Soviético agindo bem, tendo destronado os latifundiários e capitalistas russos, e
agora convidando os estrangeiros? Está sim, pois tendo a revolução operária arrefecido em outros
países, precisamos fazer alguns sacrifícios, desde que consigamos de modo rápido, ou até
imediato, melhorar a situação dos operários e camponeses. Os sacrifícios consistem em
cedermos centenas de milhares de toneladas de víveres importantes aos capitalistas durante
alguns anos, e a melhora na situação dos operários e camponeses consiste em recebermos de
pronto quantidades adicionais de petróleo, querosene, sal, carvão, utensílios agrícolas etc. Não
temos o direito de recusar a melhora imediata na situação dos operários e camponeses, pois ela é
indispensável, visto estarmos devastados, e os sacrifícios que citei não vão nos arruinar.

Mas não é perigoso convidar capitalistas, não significa estimular o capitalismo? Sim, significa
estimular o capitalismo, mas não é perigoso, pois o poder continuará nas mãos dos operários e
camponeses, e as propriedades dos latifundiários e capitalistas não serão restituídas. A
concessão é uma espécie de acordo de arrendamento. O capitalista se torna arrendatário de parte
da propriedade estatal, por contrato, por um determinado prazo, mas não se torna dono. A posse
continua com o Estado.

O Poder Soviético velará para que o capitalista arrendatário respeite o acordo, que ele nos seja
vantajoso e que se dê a melhora na situação dos operários e camponeses. Sob tais condições, o
estímulo do capitalismo não é perigoso, e a vantagem para operários e camponeses consiste em
receber mais produtos."

-Vladimir Lenin

“O Estado moderno, qualquer que seja a sua forma, é máquina essencialmente capitalista, é o
Estado dos capitalistas, o capitalista coletivo ideal” (ENGELS, 1945, p. 100). Sim, a frase que citei
é de Engels e se encontra na tradução não adulterada pelo stalinismo da obra “Do Socialismo
Útópico ao Socialismo Científico”. De todo o modo, temos a famosa passagem do “Manifesto do
Partido Comunista” que diz: “O poder estatal moderno é apenas uma comissão que administra os
negócios comuns do conjunto da classe burguesa” (MARX & ENGELS, 1998, p. 9).

O Estado como forma autonomizada do poder político é uma alienação no modo de organização
da reprodução social em conformidade com a alienação dos pressupostos objetivos da atividade
produtiva humana (dos meios de produção feitos propriedade privada por uma classe dominante).
Neste sentido, quando só resta o Estado e a classe operária assalariada, podemos dizer que se
trata do capitalista coletivo ideal tornado real pela sua unificação no Estado que passa a
concentrar a grande maioria dos meios de produção na forma de propriedade pública.

Esta nacionalização da propriedade não pode ser confundida com a socialização/comunização,


pois o controle sobre a produção é exercido pela centralização administrativa dos quadros
burocráticos do Estado que aprovam este ou aquele planejamento central. Mesmo nessa forma
pública, podemos dizer que existe propriedade privada no sentido estrito do termo: privação da
apropriação direta dos meios de produção pelas pessoas. Mesmo o Estado sendo o capitalista
coletivo ideal, ainda existe concorrência. O que muda é a forma dessa concorrência interna e
externamente. Nas relações interiores, os capitalistas disputam cargos como membros de seu
corpo coletivo administrativo: a burocracia. Nas relações exteriores, eles aparecem unificados

73
como o capitalista coletivo de Estado e concorrem com outros Estados concorrentes através de
uma hostilidade belicosa (isso explica a corrida armamentista entre URSS e EUA).

A acumulação de Capital se converte em investimento progressivo nas forças produtivas do país


através dos Planos Quinquenais e Grandes Saltos Adiante. A Lei do Valor perde um pouco da
dissociação entre forma e conteúdo (com relativa autonomização da primeira sobre a segunda) e
passa a operar mais “concretamente”, daí o sistema de preços ter uma função meramente
contábil.

De todo o modo, o proletariado continua alienado de seus pressupostos objetivos, isto é, não tem
poder sobre a produção, apenas a função de obedecer aos dirigentes do Partido, sem a
possibilidade de oposição, mesmo que se coloque fiel ao regime. O proletariado agora é
dominado por um capitalista coletivo unificado que lhe impõe uma ditadura de classe disfarçada
de vermelho.

_________________________________

ENGELS, Friedrich. Do Socialismo Útópico ao Socialismo Científico. Rio de Janeiro: Horizonte,


1945.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Estud. av., São Paulo, v. 12, n.
34, p. 7-46, Dec. 1998.

21.1

A China é realmente comunista?

Depois da afirmação de Bolsonaro de que a China seria um “país capitalista”, algumas pessoas
começaram a zoá-lo e outras a questioná-lo por se tratar de uma afirmação supostamente
“questionável” do ponto de vista literal. Independente dos motivos que o levaram a afirmar isso,
acredito que seria importante responder à questão levantada de forma séria para que as
piadinhas não assumam como “dado” aquela que seria, supostamente, a “realidade chinesa” (que
é sempre analisada segundo uma perspectiva determinada).

Em primeiro lugar, vamos explicitar de onde vamos partir: de uma crítica materialista histórica da
economia política clássica feita por Marx, Engels, Bakunin, Kropotkin e demais
comunistas/anarquistas que contribuíram para construir um campo prático-revolucionário e
teórico-crítico da perspectiva capitalista das humanidades. Em outras palavras: nosso referencial
não assume as “ideias dominantes” da teoria social mainstream (a despeito das deturpações dos
autores citados).

Os ideólogos do capitalismo frequentemente chamam sua visão parcial de “objetividade” e a


produção de suas ideias como partindo de uma “neutralidade axiológica” do método científico
(veja-se Max Weber a esse respeito). Nós nos diferenciamos deles, em primeiro lugar, por
assumir que todas as ideias que concebemos possuem implicações políticas (tanto na forma
como as produzimos como no conteúdo delas) e envolvem os interesses em disputa acerca de

74
como o mundo se constitui (pois explicar “porque as coisas são assim e não de outra forma” faz
parte da disputa). Somente depois de termos isso bem evidente é que podemos proceder com
nossa própria perspectiva.

1. Modos de Produção e Estados Nacionais:

Os seres humanos, como quaisquer seres vivos, são seres sociais, ou seja, organizam sua
atividade socialmente, coordenando suas práticas entre si. Um formigueiro, por exemplo, é uma
unidade de produção e reprodução da vida social de determinada sociedade de formigas. Os
animais humanos também organizam sua produção e reprodução material socialmente. Vamos
nos limitar a caracterizar o modo como a humanidade faz isso e deixar de lado os demais seres
vivos. Utilizamos, para este fim, o conceito de “modo de produção”, criado por Marx em conjunto
com Engels.

O que é um modo de produção? É o modo pela qual os seres humanos se organizam


socialmente para produzir e reproduzir sua existência material através de processos
político-econômicos amplos e historicamente determinados. Neste sentido, é necessário destacar
que o conceito de modo de produção é de outro nível que o de sociedade. Enquanto a sociedade
se refere às “interações, reais ou imputadas, entre as pessoas” (WOLF, 2005, p. 107), o modo de
produção implica “os relacionamentos político-econômicos que fundamentam, orientam e
restringem a interação” (idem). Em outras palavras: o modo de produção é um conceito analítico
e descritivo de um nível maior do que as sociedades isoladas, assim como a sociedade serve de
conceito para um nível maior do que os “indivíduos isolados”. Ou seja: uma nação não pode
conter um modo de produção, pois modos de produção englobam muitas nações e sociedades,
uma vez que são sistemas macro-históricos.

Com a definição que utilizamos, podemos entender o motivo pela qual não é possível existir um
“país comunista”. Sobretudo porque aquilo que chamamos de “país” é apenas um Estado
Nacional, isto é, uma forma histórica de organização política que, em seu desenvolvimento
moderno, surge com a tomada de poder pela burguesia em determinadas sociedades
concomitantemente com o nascimento do capitalismo enquanto modo de produção dominante.

Por isso que, no manuscrito da Ideologia Alemã, Marx e Engels já afirmavam que, para os
ideólogos da classe burguesa, as contradições do modo de produção capitalista “parece apenas
existir como contradição dentro da consciência nacional, parece então a essa nação que a luta se
confina a essa porcaria nacional” (MARX; ENGELS, 2009. pp. 45-46). Mas a luta (e aqui eles se
referem à “luta de classes” mesmo) não se confina à “porcaria nacional”, pois ela é uma
contradição do modo de produção como um todo e não de uma nação isolada da história
mundial.

O capitalismo é o modo de produção histórico atualmente existente. O comunismo é um modo de


produção que surge como programa de libertação do proletariado na luta de classes e depende,
para se realizar, da destruição do modo capitalista. Por isso que eles diziam que “o comunismo
não é para nós um estado de coisas que deve ser instaurado, um Ideal para o qual a realidade
deverá se direcionar. Chamamos de comunismo o movimento real que supera o estado de coisas
atual. As condições desse movimento resultam dos pressupostos atualmente existentes” (MARX;
ENGELS, 2007, p. 38).

75
Agora que sabemos disso, resta saber se a China representa algum avanço no “movimento real
que supera o estado de coisas atual”, afinal esse país participa das contradições do modo de
produção capitalista e, portanto, sua luta de classes em ato também é capaz de avançar no
sentido comunista. A China representa um momento de “transição” para o comunismo? Seria um
“país socialista” como alguns poderiam chamar? Nossa resposta para essas questões é negativa
e vamos explicar o porquê a seguir.

2. A China é uma variação histórica das sociedades do modo de produção capitalista:

Com efeito, afirmamos que um modo de produção contém necessariamente várias sociedades.
As sociedades variam conforme as possibilidades concretas de expressão do modo de produção.
Vamos tomar como exemplo o modo de produção tributário.

No modo de produção tributário temos a variação feudalista (como foi a Europa medieval e o
Xogunato japonês) e a variação “despótica” (como foi o Egito Antigo, o Império Inca, algumas
dinastias chinesas). O modo de produção tributário variou conforme dois eixos: de um lado havia
uma tendência para a centralização política da extração coercitiva de tributos de unidades
domésticas autossuficientes (geralmente camponeses) que impedia o desenvolvimento de
relações comerciais mais amplas e de acúmulo de poder por parte de classes intermediárias; de
outro lado havia uma tendência para a pulverização política da extração coercitiva de tributo por
parte de classes de senhores da guerra (como os xoguns japoneses ou os senhores feudais
europeus) e pressão, ao mesmo tempo, para aberturas comerciais da parte dos mercantes. Na
Europa, vemos que, após a intensificação da luta de classes (principalmente devido às revoltas
camponesas), o feudalismo teve que ceder espaço para uma forma de despotismo, constituindo
o Estado Absolutista, como demonstra Perry Anderson em “Linhagens do Estado Absolutista”.

Com o modo de produção capitalista se sucede o mesmo. Devido a uma intensificação das lutas
de classe, tanto na China, quanto na Rússia (ou URSS) e demais países tidos como “socialistas”
(mas só no nome), as classes dominantes precisaram reorganizar a forma de dominação política
que exerciam contra o proletariado. Na Europa de alguns séculos atrás, os senhores feudais
abdicaram de alguns de seus privilégios para formar o Estado Absolutista contra os camponeses
insurgentes. Em alguns países do modo de produção capitalista, existiu um processo que ficou
conhecido como “capitalismo de Estado”, que nada mais é do que uma unificação burguesa
nacional contra o proletariado em revolta.

De todo o modo, a China entrou num processo de retorno às unidades produtivas privadas e
controladas pelas diferentes frações da burguesia que exploram “seus próprios proletários”
segundo seus próprios “investimentos produtivos”.

Mas imaginemos por um instante um país que tenha conseguido chegar no cume da variante
estrutural do “capitalismo de Estado”. Podemos descrever como seria usando alguns exemplos
históricos.

Ainda que nós já tenhamos escrito sobre isso alhures (veja-se:


[https://www.facebook.com/groups/1619071008307697/permalink/2406156452932478/](https://ww
w.facebook.com/eikonmurilo.antunes/posts/1113704842156026)), parece conveniente retomar
alguns pontos.

76
A nacionalização da propriedade não pode ser confundida com a socialização/comunização dos
meios de produção, pois o processo de engendramento e apropriação da produção é exercido
pela centralização administrativa dos quadros burocráticos do Estado que aprovam este ou
aquele planejamento central e não pelos “produtores livremente associados” (expressão utilizada
por Marx n'O Capital).

Portanto, mesmo nessa forma pública de apropriação da produção podemos dizer que ainda
existe propriedade privada no sentido estrito do termo: privação da apropriação direta dos meios
de produção e produtos pelas pessoas (sem intermediários). Além disso: mesmo o Estado sendo
o “capitalista coletivo ideal” (ENGELS, 1945, p. 100), ainda existe concorrência. O que muda é a
forma dessa concorrência interna e externamente. Nas relações interiores, os capitalistas
disputam cargos como membros de seu corpo coletivo administrativo: a burocracia. Nas relações
exteriores, eles aparecem unificados como o capitalista coletivo de Estado e concorrem com
outros Estados concorrentes através de uma hostilidade belicosa (isso explica a corrida
armamentista entre URSS e EUA, por exemplo).

A acumulação de Capital se converte em investimento progressivo nas forças produtivas do país


através dos Planos Quinquenais e Grandes Saltos Adiante (o primeiro proposto por Stalin e o
segundo por Mao). A Lei do Valor perde um pouco da dissociação entre forma e conteúdo (com
relativa autonomização da primeira sobre a segunda) e passa a operar mais “concretamente”, daí
o sistema de preços ter uma função meramente contábil.

De todo o modo, o proletariado continua alienado de seus pressupostos objetivos, isto é, não tem
poder sobre a produção, apenas a função de obedecer aos dirigentes do Partido, sem a
possibilidade de oposição, mesmo que se coloque fiel ao regime. O proletariado agora é
dominado por um capitalista coletivo unificado que lhe impõe uma ditadura de classe disfarçada
de vermelho.

______________________________________

Referências:

ANDERSON, Perry. Linhagens do absolutismo. São Paulo: Brasiliense, 2004.

ENGELS, Friedrich. Do Socialismo Útópico ao Socialismo Científico. Rio de Janeiro: Horizonte,


1945.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã. São Paulo: Boitempo, 2007.

WOLF, Eric. Modos de Produção. In: _____. Europa e os Povos sem História. São Paulo: EDUSP,
2005. (pp. 103-134).

22. Metafísica x Materialismo

[Metafísica é sempre uma moralidade que afirma ser uma descrição do ser; é uma
moralidade (ser) disfarçada de verdade (isto é) para corrigi-la erroneamente,
apresentando-a como a expressão de uma necessidade supra-experimental, sua
legitimidade não reside em sua capacidade de produzir conhecimento, mas em visões do

77
mundo e da vida com um propósito ético universalmente compreensível à luz da
experiência subjetiva humana em geral, com esse limite, que esse objetivo não é, ao
contrário do que afirma, a verdade, mas a produção de proposições prescritivas
(normativas) da vida humana, proposições infinitamente questionáveis à luz da experiência
desejante de cada um na redução de sofrimento e busca de alegria.]

Se é impossível conhecer a "verdadeira natureza das coisas" é impossível" conhecer a coisa


apenas pela razão ou experiência. Assim, tanto na forma racional (lógica ou matemática) quanto
na forma experimental (ciência) a verdade é apenas uma conjuração impossível.

Mas se a natureza das coisas pode ser conhecida, então é só através da experiência sensível
(ciência, técnicas, tecnologia) que a verdade pode ser atestada; assim a verdade equivale na
capacidade experimental e acumulativa de fatos e evidências;

A própria metafísica da verdade é uma inverdade metafísica. É a filosofia que surge da física
(Filosofia natural) e não o contrário, a filosofia só tem base real a partir de bases da natureza

Toda filosofia apologética (tomista, aristotélica) perdeu e foi enterrada, nesses dois momentos
cruciais: Teoria da relatividade e Teoria quântica.

Quando se entende o "Campo" toda a metafísica perde o sentindo.

[...]

na visão de Jean-Marie Guyau, sobre a questão da religião/religiosidade na sociedade, ele


praticamente decifra as bases de tal continuidade religiosa (superando muitos ateístas modernos,
e apologistas religiosos tanto modernos quanto antigos), e não só isso, ele através de alguns
pontos decifrados, nos mostra o porque a religião não pode ser separada da política e do Estado
(independente qual seja), e como a metafísica se não aceita ser apenas uma hipótese dentro dos
limites da razão e ciência, é apenas uma categoria imaginativa e ilusória (literalmente ele quebra
com Kant e Hegel aqui), ou seja, a metafísica é um subproduto do materialismo, isso é, uma
hipótese que depende dos testes de comprovação e exatidão para se tornar algo, enquanto isso,
se ela está dentro das hipóteses configuradas pelas asserções científicas é uma metafísica, se
não (coisa-em-si, imperativo categórico, Espírito e coisas do gênero nas filosofias idealistas) é um
miticismo e mitismo baseado em uma parafísica que inevitavelmente interpreta os fenômenos
materiais a luz de pseudociência e filosofismo.

Agora, se a metafísica é verdadeira, ela só existe pelo niilismo solipsista, isto é, a concepção
pré-discursiva, pré-linguistica e não simbólica dos seres humanos, ou seja, quando o
recém-nascido não tem racionalidade e nem discernimento, uma forma de pureza não-simbólica,
após a aquisição da fala e representação simbólica, a metafísica não existe mais.

A metafísica, pois, a "ciência" filosófica que argumenta em favor da existência de deus, se


mantém no niilismo filosófico há séculos.

22.1

78
Se Deus existisse, não faria sentido falar da inexistência de deus.

Pois deus seria a existência máxima de tudo.

O ser-humano enquanto questionador e buscador da razão, não questiona a inexistência da


gravidade, da luz, do som dentro de seus critérios, e por que isso ocorre com algo que "existe e
pronto"?

E Deus também não é, já que o universo é ser na totalidade:

"A inteligência emprega, ao desenvolver sua concepção do ser supranatural, o método que os
teólogos designavam pelo nome de método negativo, que consiste em tirar do ser supranatural
sucessivamente cada um dos atributos que nos são conhecidos.
(...)
A inteligência humana, uma vez lançada nos espaços, não pôde senão descrever uma órbita cada
vez maior em torno da realidade. Uma religião mítica não é uma construção completamente
racional e a priori; ela se apoia sempre em pretensas experiências, em observações e analogias
que estão precisamente maculadas de erros; ela se assenta, portanto, em um falso a posteriori, e
é isso que coloca o mito em uma divergência insuperável com a verdade."

O Universo enquanto campo sempre existiu, em qualquer perspectiva que se analisa o universo,
ele sempre esteve, o que ocorre é o desenvolvimento da sua forma latente em objetos concretos.
Para um deus "certamente" existir, teria que existir provas de qualquer coisa disso, e para tal, para
Deus existir ou ser, se deve quebrar com a própria ontologia.

E claro ignorar todo o aspecto histórico, antropológico, científico da linguagem "deus".

O problema de Deus é o ato criativo do mesmo e a condição da "providência", isso é, a estrutura


argumentativa dos apologistas (idealistas em sua essência) é que tudo tem um causa que condiz
com o efeito, porém, o universo deve ter sido obra de um "algo" incausado e atemporal, e aí mora
o perigo da argumentação em dois aspecto: 1) A questão da aniquilação dentro da ótica do
não-ser, ou seja, é como imaginar o dia e a noite, enquanto o dia é, a noite não é, para ser mais
claro, enquanto o dia é ser, a noite é o não-ser, só que quando a noite é ser, o dia é não-ser e
como isso pode ser racional e lógico? Já que o não-ser não é e não pode ser? Esse paradoxo só
pode ser resolvido (se quisermos guardar a ontologia do Ser e a racionalidade) pela eternidade do
Ser, onde o Ser é a totalidade em volta da transformidade (modificidade), tudo está no Ser, nos
aspectos das transformações correntes e recorrentes de tudo que constitui ele (por isso o
universo), a segunda é o filosofismo e a parafísica atribuída a providência que em suma é a base
lógica de toda a argumentação para a existência de deus, mesmo que contenha uma retórica
sofisticada e quase-racional.

Aqui contém um salto-lógico: Se tudo que existe tem uma causa, menos deus, é pq deus é a
providência magnânima de quebrar todas as leis da natureza, da física, química, biologia ... de
tudo que é lógico e racional, para providenciar uma coisa de "causa-efeito" na estrutura casual e
reativa do universo, é um salto lógico é uma falácia indevida, já que para o universo ter sido criado
(ignorando a eternidade do ser que não deixa existir ato criativo de tal magnitude) ele foi
providenciado por um "algo" além de qualquer coisa racional ou lógica.

79
Enquanto eternidade do ser, a causa-efeito é inquebrável, enquanto paradoxalmente o não-ser (o
nada) a causa-efeito é ignorada. Porém pela própria capacidade racional nossa, percebemos que
o ato de "providência" (isso é, quebra das leis naturais, casuais e reativas da natureza/universo) é
impossível e inexistente, por isso se assume a inexistência de deus (ou qualquer ato fora da
estrutura do universo) já que a impossibilidade de existir uma quebra daquilo que chamamos de
leis do universo é improvável, a-lógico, a-racional e totalmente baseado em parafísica e misticismo
(e isso entra toda o filosofismo idealista, seja ele o Kantiano ou Hegeliano, seja ele o teólogo).
Levando em consideração que o ser só pode existir enquanto eternidade, dado que o "não-ser"
cria um paradoxo intransponível em tal condição, isso é, o universo é ser porque sempre foi algo.

23. Leis trabalhistas e negociação empregador-empregado

Dentro do sistema capitalista, um dos principais motores de seu funcionamento e reprodução é a


divisão socioespacial do trabalho, ou seja, há toda uma hierarquia disfuncional em qualquer
empresa que gera uma cadeia de comando e dominação até a sua base, e como a base é a
principal função dinâmica da empresa, sempre, dentro do capitalismo haverá a necessidade do
trabalhador pobre e ignorante, para exercer o serviço bruto e degradante; A partir da
especialização é que irá se ter uma tenra possibilidade de negociação com o patrão - quando
você sai da CLT e entra para a PJ -, enquanto trabalhador braçal, existem duas consequências:

A primeira é que o mercado do trabalho gera o desemprego para sua movimentação que dá a
forma da competição e com isso a manutenção do salário para o patrão, isso quer dizer que
enquanto trabalho braçal e de mão-de-obra o salário é nivelado de acordo com a quantidade de
trabalhadores disponíveis e sem experiência ou com uma experiência minima em tal função ou
setor, o salário-base é imposto para exercer uma participação e procura maior - quem será que
iria trabalhar com as condições miseráveis de estudo atual, por um salário de R$ 0,30/1,45 a
hora? -, isso é a própria "lei trabalhista" faz parte do processo de dinâmica do capital para
funcionalidade do mercado de trabalho e maior agregação da divisão socioespacial do trabalho,
por isso, a totalidade das empresas dificilmente irão pagar-lhes um salário maior que o piso,
apenas pela sua proatividade, vestir camisa da empresa e outros mitos que o RH discursa é que
tu terá alguma chance de crescimento e com isso aumento do salário e continuidade dos
benefícios, e vale lembrar que ainda sim terá que se especializar para poder ganhar um aumento
exponencial, caso contrário, terá que esperar os reajustes dos sindicatos para tal aumento
mínimo, assim a própria CLT, leis trabalhistas, etc..., são as formas negativas da dinâmica do
capitalismo que exerce uma influência enorme no desemprego e aumento do exército de
proletariado na cidade.

A segunda é que o trabalhador braçal como sendo apenas um número dentro do mercado de
trabalho que está abarrotado de código de barras igual a ele, não tem a mínima chance de
negociar um salário maior ou melhor, uma pq o que move todos os investimentos -preferência
temporal- é o lucro imediato, se com a CLT, leis trabalhistas, etc... o patrão tem um custo e gasto
com o funcionário uniforme e base, sem ela, ele terá uma desproporcionalidade entre custo e
gasto que dificulta a sua preferência a curto prazo, e isso acarretará uma maior dificuldade em ter
lucro, outra porque, apesar dos pesares, os benefícios são um dos fatores da busca por
empregos, e se de fato houvesse uma forma de "coerência" por parte das empresas, tais
benefícios não iriam ser descontados em folha, porém como sabemos, os descontos em folha

80
demonstram o valor real das horas trabalhadas e o seu preço, assim se tu tem um salário de R$
1.300,00 e recebe líquido R$ 900,00 é porque o seu serviço custa tal valor e não o fictício. A
categoria da divisão socioespacial do trabalho beneficia apenas os proprietários e não o
trabalhador, já que a especialização decorre de uma duração de anos e um investimento pessoal
tão maior quanto o salário que irá receber, assim se cria mercados para cada transtorno que
açoita o trabalhador, se a faculdade está cara ou é difícil para entrar, vamos criar formas onlines
de tais cursos (EAD) mesmo sabendo que o trabalhador pouco ou quase nenhum tempo terá para
estudar e se formar, pois dependendo a localidade de tais sujeitos, é o tempo de chegar em casa
e dormir para levantar outro dia e ir trabalhar, e em suas folgas resolver tudo aquilo que está
acumulado ou então espairecer a cabeça e se divertir, o sacrifício exigido para "crescer
merecidamente" no sistema capitalista, será todo o gasto real da sua vida, da sua saúde mental,
da sua condição física e do tempo que não pode ser reposto.

A divisão socioespacial do trabalho impossibilita para o trabalhador o aumento do salário, seja por
meio de leis trabalhistas ou seja sem elas.

24. A propaganda anti-comunista soviética e a experiência Makhnovista.

Desde a traição bolchevique, estabelecida em 26 Novembro de 1920, ao acordo político-militar


assinado com o Exército Negro em 10 Outubro do mesmo ano, consolidou-se uma ampla máquina
de propaganda anti-anarquista e revisão histórica contra Makhno e o Território Livre, assim como
contra todas as experiências anarquistas práticas posteriores a esse evento, em especial, à
revolução social na Espanha e na Coreia.

No presente texto, tenho como objetivo analisar as acusações realizadas pelos bolcheviques com
relação à personalidade de Nestor Makhno e do movimento insurrecional ucraniano, que podem
ser enumeradas da seguinte forma:

1. "Os bolcheviques foram os grandes idealizadores e responsáveis pela revolução russa,


enquanto que os anarquistas cuidaram somente de agir na contra-revolução em oposição
ao poder soviético"

O mínimo de compreensão a respeito do processo histórico que desencadeou a revolução russa


pode nos explicitar o quão falho é esse argumento.

Primeiramente, por ignorar o papel plural e polissêmico expresso pelas massas revolucionárias,
sem partido político específico, segundo, por se sustentar num falso protagonismo bolchevique
que, a todo custo, tentou apropriar-se dos principais eventos de tal processo, reescrevendo a
história de acordo com o interesse de seu partido político.

Vale destacar aqui, que os conselhos operários, conhecidos por Soviets, foram fruto de uma
iniciativa anarquista, tida entre Vseldov Voline, Nossar, e grupos de estudantes e operários, que
objetivavam ​"criar um organismo permanente: uma espécie de comitê, ou melhor, conselho, que
vigiaria os acontecimentos, servindo de ligação entre todos os operários, informando-os sobre a
situação e que poderia, em caso de necessidade, reunir em torno dele as forças operárias
revolucionárias"(​ Voline, A revolução desconhecida, páginas 91 e 92).

81
Tal conselho, na ausência de sindicatos -o movimento sindicalista àquele período era inexistência
na Rússia- tomou força e, apesar da extrema repressão fomentada pela reação czarista,
consolidou-se como forma de luta dos trabalhadores russos.

No entanto, como descreve Voline ​"a ação das massas foi uma ação espontânea que coroou
logicamente, fatalmente, um longo período de experiências vividas e preparação moral. Tal ação,
​ ágina 128).
não foi nem organizada nem guiada por partidos políticos"(P

Nesse meio, os anarquistas desempenharam um crucial papel, junto a grupos de


extrema-esquerda, de propagandistas radicais, dentro dos soviets, buscando orientar as massa
rumo à autogestão "​os anarquistas e anarco-sindicalistas, pouco numerosos, mas muito ativos,
fazem de sua parte tudo que podem para sustentar e organizar a ação das massas contra
Kerensky"(​ Página 150).

Lenin, por outro lado, havia se expressado já em 1905 da incompatibilidade de seu sistema com o
modelo soviético "​ Os bolcheviques nunca foram partidários do verdadeiro sistema Soviets. Até o
próprio Lenin explicou em 1905 ao presidente dos soviets de Petrogrado que seu partido não
poderia se relacionar com o sistema soviético,
que era, em sua opinião, uma instituição vegetativa. Mas as primeiras fases da revolução russa
foram desenvolvidas com base no sistema dos sovietes e quando os bolcheviques chegaram ao
poder, eles foram forçados a aceitar a herança indesejável para eles. E toda sua atividade se
concentrou em reduzir o poder dos soviets e submetê-lo ao governo central"(R ​ ocker, Bolchevismo
e anarquismo, página 13).

Tendência a qual era expressamente oposta à dos anarquistas que, desde o princípio do processo
revolucionário, defendiam a autonomia dos conselhos frente às sucessivas tentativas de controle
impostas pelo governo soviético(Arshinov, História do movimento makhnovista, página 81).

Observa-se, através disso, que a acusação marxista recai sobre eles próprios: enquanto
identificam no anarquismo tendências de natureza contra-revolucionária, foram eles que tentaram
frear a atividade emancipatória e por fim a auto-organização autônoma das massas populares.

Os anarquistas, mesmo em menor número, foram responsáveis por derrubar, em Kronstadt, os


deputados apoiados por Denikin, combateram os guardas brancos em Ekaterinoslav, penetraram
nas mais profundas camadas da classe trabalhadora com seus jornais e propagandas, e
organizaram levantes em Kronstadt, Odessa e Ekaterinoslav, enquanto os leninistas à esta altura
permaneciam em favor da Constituinte. Sob o lema criado pelos anarquistas "todo poder aos
soviets", os trabalhadores organizavam-se contra a social-democracia de Kerensky, sendo os
primeiros a organizarem as massas em organizações revolucionárias (Rocker, Bolchevismo e
Anarquia, páginas 15, 16 e 17).

Como, pois pode-se argumentar que seriam os anarquistas em alguma escala, um tipo de
contra-revolucionário? Foram o filamento mais ativo no que antecede a atuação bolchevique, e
deram sequência, principalmente na Ucrânia, Kronstadt e Sibéria[​Ver "Uma Makhnovtvhina

82
Siberiana?", de Frank Mintz]​, à sua atuação junto à classe trabalhadora, recusando-se, no
entanto, a exercer uma função de comando sobre os trabalhadores, e ensinando-os a gerir sua
própria vida econômica( A Revolução Desconhecida, página 92).

Esquecendo-se, ou ignorando este fato, todavia, os marxistas afirmam que:

2. "Makhno aproveitou-se do processo iniciado pelos bolcheviques, para assumir o controle


de um desorganizado grupo anarquista no sul da Ucrânia e opor-se, desta forma, à
revolução".

Mais uma vez, no entanto, recai sobre eles a falta de aprofundamento teórico a respeito de como
se deu inicio o processo revolucionário na Ucrânia. Pois, no país, o partido bolchevique sequer
tinha representantes ou apoio popular, concentrando-se somente nos grandes centros urbanos
russos. Aqui, a atividade anarquista foi mais enérgica, entorno da aldeia de Goulai-Polé:​ "Assim,
enquanto na Grande Rússia o
poder dos sovietes significava ao mesmo tempo o poder do Partido Comunista, na Ucrânia, a
impopularidade e impotência do partido, fez a passagem "todo poder para os sovietes" significar
outra coisa.
Os sovietes eram reuniões de delegados operários sem força efetiva,
sem a possibilidade de subordinar as massas. Eles eram os trabalhadores da
fábricas e camponeses nas aldeias que tinham a força real.
Mas essa força estava desorganizada e, portanto, o perigo
de cair sob a ditadura de qualquer partido sólido
constituído era uma ameaça em todos os momentos"​ ( História do movimento makhnovista,
página 47).

Os grupos que se opunham ao regime Czarista, em sua maioria, haviam já a esta altura se
retirado da Ucrânia, exilando-se no Ocidente, longe das massas camponesas, de forma que, os
trabalhadores makhnovistas àquela altura constituíam o único grupo socialista em todo sul da
Ucrânia, e um dos únicos presentes no país(Makhno, A Revolução contra a "Revolução", página
76).

Dessa forma,a acusação leninista perde todo sentido: o makhnovismo constituía a única força
revolucionária no sul da Rússia, apenas contanto com alguns resquícios, sobreviventes de
Socialistas Revolucionários, em Alexandrovsk(A Revolução contra a "Revolução", página 77).

3. Incapazes, no entanto, de sustentar ambas as afirmações, recorre-se à tentativa de


associar, seja a qualquer custo, a makhnovtchina à desorganização, a ponto de se afirmar
que dependera no curso da revolução totalmente do Exército Vermelho, ou ainda que teria
conspirado contra o poder soviético ao lado de kulaks.

83
Podemos somente opor à dita acusação propagandística a experiência prática, demonstrada pela
imperiosa vitória Makhnovista sobre o Exército Branco em Peregonovka( Capítulo VII da obra
"História do movimento makhnovista"), sem a qual, muito provavelmente, a contra-revolução teria
triunfado, e a tomada de Simferopol por Simon Karetnik(Arshinov, História do Movimento
Makhnovista, Página 163), forçando Wrangel a retirar-se a Perekop, onde seria derrotado em 14
Novembro de 1920. Sem dúvidas, a participação e triunfo anarquista contribuiu imperiosamente ao
processo revolucionário, assim como a todo esforço organizativo dos mesmos, que, pela primeira
vez na história da Rússia, organizaram sindicatos autogeridos e classistas que, operando em
Jarkov, Odessa, Kiev e Ekaterinoslav, organizaram o campesinato russo e ucraniano(Avrich, Os
Anarquistas Russos, página 208).

A segunda acusação se apresenta na justificativa para a traição bolchevique ao acordo


político-militar(houveram várias "justificativas", das quais essa foi preponderante).

Seja por uma suposta conspiração com Kulaks, ou por algum grupo de banditismo branco atuando
no sul da Ucrânia, a empresa bolchevique tentou de todas as formas distorcer a personalidade de
Makhno, a fim de convencer a opinião pública da necessidade de se destruir a Makhnovtchina
para se preservar a "revolução" bolchevique.

Não é necessário dizer o quão falsa e infundada é essa afirmação. Primeiramente, é necessário
frisar que, de fato, Wrangel, enganado pela imprensa bolchevique, tentou aproximar-se de Nestor
Makhno, chegando a enviar uma delegação do Exército Branco a Goulai-Polé( História do
Movimento Makhnovista, páginas 157-159), tal aproximação, no entanto, foi não só rechaçada,
como toda sua delegação fuzilada a vista de todos, para que não se restasse dúvidas sobre a
posição dos anarquistas. Assim, quebra-se com toda teoria de conspiração do dito complô
makhnovista, cujas incoerências já são demonstradas nesse trecho(História do Movimento
Makhnovista, págs 169 e 170): ​"Em segundo lugar, no dia seguinte ao ataque a Goulai-Polé, em
27 de novembro, os makhnovistas encontraram
nos prisioneiros proclamações do Exército Vermelho intituladas:
'Avante contra Makhno!' Morra Makhnovismo! '
publicado pela seção política do 4º exército, sem data.Os soldados capturados disseram ter
recebido aquelas proclamações no dia 15 ou 16 do mês; eles continham um chamado à luta
contra o makhnovismo"​ .

Makhno tentou à todo custo manter a disciplina, unidade e coerência dos anarquistas com sua
doutrina, baleando insurgentes que organizassem saques contra outros trabalhadores, tomasse
seus bens ou animais, ao mesmo tempo que buscava uma relação amistosa e de proteção desta
massa, em troca do suprimento à suas tropas( Skirda, MAKHNO: Cossaco da Anarquia, página
336).

Ainda, de acordo com o marxista Kubanin, após uma ​"inescrupulosa análise dos arquivos
makhnovistas, ele afirma que o comando tomou todas as medidas necessárias medidas para
evitar atos de roubo ou banditismo, especialmente em 1918 e 1919 (que
ou seja, durante o tempo em que não estavam lutando contra o Exército Vermelho" ​e o próprio
relata que, durante a ocupação a Ekaterinoslav ​"não houveram saques em massa, como na
ocupação dos brancos e Makhno causou uma ótima impressão à população local"(​Skirda,
MAKHNO: Cossaco da Anarquia, página 337).

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4. A Makhnovtchina era um grupo antissemita e nacionalista que visava a construção de um
estado ucraniano.

É comum, por parte de historiadores marxistas, a associação da figura de Makhno a movimentos e


grupos nacionalistas de cunho separatista, que exaltavam valores nacionais ucranianos e, por
conta disso, perseguiam a judeus e outros povos minoritários habitantes do território ucraniano.

Não obstante, tal apresentação nos parece desconexa da realidade; desde seu princípio, o
movimento makhnovista contou com uma enorme pluralidade de grupos étnicos de diferentes
regiões: gregos, judeus, russos, ucranianos, etc. Cada grupo constituía seus próprios
destacamentos, organizados de acordo com suas afinidades(História do Movimento Makhnovista,
Página 187).

Tais grupos rejeitavam, em sua maioria, assumir-se como pertencentes a alguma nacionalidade,
referindo-se a si mesmos como anarquistas. Nas palavras do Conselho Militar do Exército
Makhnovista: "​Ao falar sobre a independência da Ucrânia, entendemos essa
independência, não como nacional, no sentido petliuriano, mas como
a independência social e laboriosa de operários e camponeses.
Declaramos que os trabalhadores ucranianos (como
qualquer outro) tem o direito de forjar seu próprio destino, não como
nação, mas como uma união de trabalhadores​ ”(História do Movimento Makhnovista, página 187).

Os makhnovistas também contavam com um grande número de judeus comandando as mais


diversas seções do movimento anarquista: "​havia 200 soldados de infantaria judeus em um dos
destacamentos de Gulyai-Polye e muitos outros se espalharam pelos vários territórios
makhnovistas. Vários comandantes, incluindo Taranovsky, o último chefe do movimento
e Lev Zinkovsky, comandante da escolta pessoal de Makhno na época
de sua passagem para a Romênia, eram judeus. Três dos cinco membros da
seção cultural do movimento - Helen Keller, Yasha Sukhovolsky e Josef Got-
homem, também conhecido como "O emigrante" (os dois últimos foram assassinados mais tarde
pela Cheka)
- eram de origens semelhantes. Isaak Teper, editor da "A voz Makhnovista" em Kharkov até 1 de
outubro de 1920, e · outros membros importantes do Nabat, como Mratchny, Gorelik, Aron Baron e
Voline, também eram de origem judaica.(MAKHNO: O Cossaco da Anarquia, página 338).

Quanto a língua, o exército makhnovista optou por deixar a cargo das instituições de ensino a
decisão sobre quais opções de língua ofertar, havendo pouco mais de 4 escolas judias em
Goulai-Polé, assim como escolas modernas russas e ucranianas(Seção cultural e de instrução do
Exército Insurrecional Makhnovista, Put k Svobode, N° 10, de Outubro de 1919).

Os judeus, passaram então a figurar colônias, livres das perseguições e pogrom que os
assombravam na era Czarista, nas regiões de Mariupol, Berdyansk, Alexandrovsk, participavam
das assembleias de camponeses, compunham, com inúmeros outros representantes, seções
importantes do exército Makhnovista, e organizavam grupos de auto-defesa, incentivados por

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Makhno, a fim de proteger-se de atos de anti-semitismo(Nestor Makhno, A Makhnovtchina e o
Anti-Semitismo).

Tais apontamentos, compõem apenas alguns dos inúmeros fatos que podemos contrapor às
acusações caluniosas dos bolcheviques, que demonstram sua tentativa histórica de difamar o
movimento anarquista e desqualificá-lo frente às massas populares.

25. O pensamento geográfico de Élisée Reclus

Ensaio: anarquismo, evolução e potência coletiva.

Volta e meia somos lembrados de que “a natureza não dá saltos”, de que o curso das mudanças é
lento e gradual. De fato, isso é o que Élisée Reclus (que foi um geógrafo e militante anarquista
francês) chama de Evolução. Mas Reclus não admite apenas o gradualismo, pois existem atos
disruptivos que acabam por coroarem acúmulos (que muitas vezes podem simplesmente se
dissiparem) ou, até mesmo, mudar o curso dos acontecimentos. Esses atos são verdadeiros
“saltos” que geram novas formas de existência no mundo. Eis a diferença entre Evolução e
Revolução para nosso geógrafo anarquista. Contudo, para não sermos exaustivos, nesse texto
nós focaremos apenas nas questões relacionadas com a Evolução, considerando que a história
natural, como bem compreendiam os libertários, não é linear, mas possui uma forma espiral
(influência que receberam de Vico).

Apesar de sua pluralidade, o conjunto do movimento anarquista moderno, como bem sintetizou
Moriyón, “desenvolveu-se em torno de três grandes temas: a) o questionamento da ordem social
existente; b) o projeto de uma nova ordem social; e, c) o processo capaz de fundar essa nova
ordem social” (1989, p. 7). No que diz respeito ao último tema mencionado, o autor acrescenta: “a
educação ocupava uma importante posição estratégica no processo da revolução social” (idem).
Contudo, deve-se destacar que a “educação, de acordo com os anarquistas, não era o único nem
o mais importante agente responsável pelo desencadeamento da revolução social e pela
consolidação das mudanças por elas provocadas” (MORIYÓN, 1989, p. 8).

Élisée Reclus, junto com seu irmão Elie Reclus, o “ex-príncipe” anarquista russo (também biólogo
e geógrafo) Piotr Kropotkin, dentre outros, desenvolveram juntos uma rede de divulgação e
produção científica articulada com o movimento operário de sua época (FERRETTI, 2018). Dentre
algumas questões que preocupavam estes libertários, estavam aquelas relacionadas com a
pedagogia e a importância da “instrução integral” (como dizia Bakunin) para a libertação social.
Esse forma de atuação cultural pode ser considerada, conservando-se os termos de Reclus, como
práticas no registro da Evolução, enquanto voltam-se para o desenvolvimento coletivo das
pessoas com base nos princípios de solidariedade e liberdade.

Estas questões não ficavam apenas na dimensão do conteúdo, pois a forma também era
importante. Em outras palavras: não bastaria “ensinar liberdade” se a forma como se promove
esse conteúdo não seja, igualmente, libertária. Portanto, a congruência entre conteúdo e forma,
discursos e práticas, enfim, são imprescindíveis. Isso expressa um dos princípios da ética
libertária segundo a qual: os meios exprimem os fins na práxis social. É neste sentido que Érrico
Malatesta defendia a perspectiva de que o anarquismo é uma “doutrina social” que se constitui a

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partir de um conjunto de princípios (libertários). Por isso que David Graeber (2011, p. 14)
considerava que “marxismo tendeu a ser um discurso analítico e teórico sobre estratégia
revolucionária”, enquanto que o “Anaquismo tendeu a ser um discurso ético sobre prática
revolucionária”. Isso não significa que o marxismo não tenha discursos éticos e o anarquismo não
proponha análises e teoria revolucionária (sem mencionar o fato de que existem tantas correntes
de um quanto de outro).

Enfim, a perspectiva anarquista do comunismo libertário geralmente afirma que uma doutrina
compreende em si os fins que visa, colocando-os em prática nos meios que utiliza. Tomando
emprestada uma ideia de Isabelle Stengers, podemos considerar o comunismo libertário (ou
anarco-comunismo) como uma “cosmopolítica”, isto é, um conjunto de discursos e práticas que
exprimem uma potência acerca da “disputa do que o mundo pode ser”. Os libertários não
reservaram suas preocupações com questões políticas convencionais, considerando também
relações afetivas (amor livre – ver, a esse respeito as proposições de Emma Goldman) e relações
com animais, como é o caso de Élisée Reclus também (“A Anarquia e os Animais”). Piotr
Kropotkin, por exemplo, se empenhou em elaborar uma concepção segundo a qual o fator
preponderante da evolução dos seres vivos seria a ajuda mútua (a cooperação) e não o combate
recíproco pelos recursos (a competição). Ele, inclusive, coloca um continuum entre biologia e
antropologia usando esse conceito de ajuda mútua. “As formigas e as térmites renunciaram à
‘guerra hobbesiana’ e passam muito bem, obrigado” (KROPOTKIN, 2009, p. 27).

Para ampliar essas discussões, podemos levar em consideração a teoria de Lynn Margulis da
endossimbiosse. Divulgada em 1981, a teoria da endossimbiose propunha que as células dos
seres, incluindo as do corpo humano, são o resultado de uma ancestral simbiose entre bactérias e
micro-organismos (como, por exemplo a atualmente organela celular que conhecemos pelo nome
de mitocôndria). Além disso, numa de suas teses mais desafiadoras dos paradigmas biológicos
hegemônicos, ela “defende que o próprio núcleo das células tem origem em um simbionte. Isso
significa que a magnífica revolução que transformou procariontes em eucariontes há mais de um
bilhão de anos, e que pode ter sido o impulso mais poderoso para o desenvolvimento da
diversidade dos seres vivos, foi obra de uma simbiose em vez de uma ‘natureza, rubra em dentes
e garras…’” (PINHEIRO, 2010, p. 19).

Outro complemento que insisto em fazer é a contribuição de Spinoza a esse respeito (que o
anarquismo pode muito bem se apropriar e, inclusive, influenciava Kropotkin). Vale destacar que,
para este filósofo holandês, a passagem de um direito natural para um estado civil não era algo
racional, pois, diz ele, “se os homens vivessem sob a condução da razão, cada um desfrutaria
desse seu direito sem qualquer prejuízo para os outros” (Ética, IV parte, prop. 37, esc. 2). Mas, pra
alcançar tal estado em que se poderia viver conforme o “direito supremo da natureza” (isto é: sem
um “estado civil”), era necessário o desenvolvimento individual (pelos afetos de firmeza) e coletivo
(pelos afetos que derivam da “ajuda mútua”, expressão que o próprio Spinoza utiliza em: Ética, IV
parte, prop. 35, esc. e esc. 2 da prop. 37 da mesma parte). Conforme seu Tratado Político: “Se
dois se põem de acordo e juntam forças, juntos podem mais, e consequentemente têm mais
direito sobre a natureza do que cada um deles sozinho; e quantos mais assim estreitarem
relações, mais direito terão todos juntos”. Ou na Ética: “Com efeito, se, por exemplo, dois
indivíduos de natureza inteiramente igual se juntam, eles compõem um indivíduo duas vezes mais
potente do que cada um deles considerado separadamente” (Ética, IV parte, prop. 18, esc.). Outra
afirmação: “Todo aquele que busca a virtude desejará, também para os outros homens, um bem
que apetece para si próprio” (Ética, IV parte, prop. 37). Portanto, Spinoza contribui com os

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libertários na medida em que corrobora afirmações como as de Bakunin que dizem: 1) “a liberdade
de outrem, longe de ser um limite ou a negação da minha liberdade, é, pelo contrário, a sua
condição necessária e a sua confirmação” e 2) “a uniformidade é a morte, a diversidade é a vida”.

A despeito da diferença entre Spinoza e Hobbes, diz o primeiro: “Quanto à diferença entre mim e
Hobbes, acerca da qual me interroga, ela consiste em que eu mantenho sempre intacto o direito
natural e sustento que, em qualquer urbe, não compete ao supremo magistrado mais direito sobre
os súditos senão na medida em que ele supera em poder o súbdito, coisa que tem sempre lugar
no estado natural” (SPINOZA, 2009, p. XVII). O que, por sua vez, vai de encontro com as teses de
Kropotkin de que, na vida cotidiana, a ajuda mútua subsiste enquanto potência expressiva da
natureza humana, que não fica alienada, senão constrangida por uma potência superior que lhe
subjuga (o Estado), mas que pode ser suprimida com uma Revolução que disponha de uma
potência maior e contrária.

________________________________________

FERRETTI, Federico. Evolução e revolução: os geógrafos anarquistas Elisée Reclus e Pëtr


Kropotkin e sua relação com a ciência moderna, séculos XIX e XX. Hist. cienc.
saude-Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 25, n. 2, p. 553-568, jun. 2018. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702018000200553&lng=pt&nrm=
iso>. acessos em: 26 dez. 2018. Epub 10-Maio-2018.
http://dx.doi.org/10.1590/s0104-59702018005000001.

GRAEBER, David. Fragmentos de uma Antropologia Anarquista. Porto Alegre: Deriva, 2011.

KROPOTKIN, Piotr. Ajuda mútua: um fator de evolução. São Sebastião: A Senhora Editora, 2009.

MORIYÓN, F. G. (Org.). Educação Libertária. Tradução de José Cláudio de Almeida Abreu. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1989.

PINHEIRO, Jorge Luiz Abrantes. A Evolução do Altruísmo e do Senso Moral. 2010. Dissertação
(Mestrado em Programa de Pós-Graduação em Filosofia) - Universidade Federal de Uberlândia.

SPINOZA, Benedictus. Tratado Político. São Paulo: Martins Fontes, 2009.

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