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Caso HBR: Alta diretoria deve ter um executivo "verde"?

Escrito por: Rupert Davis Eric J. McNulty –


Decidida a melhorar sua ficha ambiental, uma empresa discute a necessidade de contratar um diretor de sustentabilidade.
Presidente da fabricante americana de componentes eletrônicos Narinex, Jennifer Brown voltou a ler o alerta de notícia na tela do computador.
A empresa perdera outro contrato importante para a Glistrom, uma rival britânica que normalmente a Narinex batia. Chamou a secretária: —
Sally, quero o Herb Tyler e a Laura Dyson aqui imediatamente.
Um revés como aquele não tinha a ver com as idas e vindas normais da disputa de contratos. Brown queria ouvir a opinião de Tyler, o diretor
de operações, e de Dyson, a diretora financeira. Estava decidida a manter a Narinex no topo.
Com faturamento de US$ 3,2 bilhões e operações na América do Norte, Europa e Ásia, a Narinex se saíra reiteradamente bem com Brown no
comando. Queridinha de analistas da bolsa, a empresa segurara os custos lá embaixo mesmo com a expansão em novas linhas e novos
mercados. Hoje, Brown era considerada a um só tempo inovadora e pé no chão. Sob sua tutela, a Narinex terceirizara parte da P&D para levar
novidades ao mercado com mais rapidez. Graças aos contratos por desempenho que firmara, a cadeia de suprimento seguia enxuta. E mais: a
executiva vendera o jatinho da empresa e recusara um carro com motorista para mostrar o compromisso em controlar gastos fixos.
Em 20 minutos Dyson e Tyler estavam à espera de Brown. Estavam acostumados a serem convocados às pressas pela chefe para uma
sabatina. Tyler já tinha visto a notícia da Glistrom e sabia que Brown estaria ansiosa. Era um contrato de vários anos, cujo valor podia chegar a
US$ 50 milhões.
— Já pedi ao Ian que pusesse seu pessoal para buscar informações no mercado — disse Tyler. A diretora estava falando de Ian Jones, o vice-
presidente de vendas. — O que ele me adiantou é que a Glistrom está atraindo muita atenção no mercado.
— Isso não me ajuda muito. Quanto tempo vocês precisam para converter a informação que ele tiver em algo que nos permita agir? —
perguntou Brown.
Tyler e Dyson trocaram um olhar: — Que tal 24 horas? — perguntou Dyson. Com um aceno de cabeça, Brown despachou a dupla para
resolver o mistério.
A voz da inocência
Às 9 da noite do dia seguinte, Brown estava em casa. Sentada no balcão da cozinha, tomava uma cumbuquinha de sopa de tomate e lia o
relatório de duas páginas de Tyler e Dyson. Os dois tinham feito uma análise de solicitações de proposta ontem e hoje. Uma área parecia
causar preocupação: a da sustentabilidade.
“Esse primeiro levantamento mostra que estamos dentro do esperado em preços e condições. Relatos informais sugerem que concorrentes
estão oferecendo o codesenvolvimento de componentes customizados. Aqui, temos certeza de que podemos fazer o mesmo. Iniciativas
anteriores de terceirização parcial da P&D conectaram a Narinex a uma grande rede mundial de projetistas. A grande mudança no mercado é a
ênfase maior na sustentabilidade: para certos clientes, a conformidade com normas já não basta; querem saber que tratamento estamos dando
a resíduos, se nossos fornecedores pagam salários justos e até se paramos de imprimir documentos e jogamos tudo na internet. O governo
americano e o Walmart estão pedindo dados de sustentabilidade antes de contratar fornecedores e acreditamos que essa exigência continuará
a crescer. A Glistrom há pouco contratou seu primeiro diretor de sustentabilidade, possivelmente em resposta a essas pressões do mercado.”
— E nós, o que estamos fazendo nesse quesito? — se perguntou Brown em voz alta. A executiva examinou o resumo de iniciativas de
sustentabilidade que a empresa adotara até ali: instalar um telhado verde na fábrica na Alemanha para cortar custos de energia, reduzir
embalagens em um terço, transferir a maior parte do transporte internacional de cargas ao fornecedor com a frota aérea mais eficiente no uso
de combustível — e, sim, colocar toda a documentação em rede para imprimir menos. Brown viu que certas iniciativas tinham dado retorno
rápido e contundente; outras levariam anos para justificar o investimento. “Nossa produção está em conformidade [com as normas]. Só que a
meta muda dependendo do país de manufatura e do país de destino”, dizia o relatório. “Onde as normas são mais frouxas e as especificações
do cliente permitem, fabricamos produtos com substâncias de custo menor, que não seriam aceitas em toda região.”
Brown soltou o relatório. Resolveu ler outra análise, agora sobre as práticas de sustentabilidade da Narinex — redigida por ninguém menos
que sua neta de 17 anos. Era um trabalho de escola. A garota mandara o material por e-mail à avó dias antes, com um breve recado:
Vozinha, obrigada por me ajudar com os dados. Leia, por favor. A sua empresa não foi a pior que a gente viu, mas tampouco foi a melhor! bjs!
Dava gosto ler a análise da neta. Era direta: não tinha nada do jogo político da empresa, nem ambições pessoais. A principal recomendação da
adolescente: contratar um diretor de sustentabilidade.
— Falou a voz da inocência —, refletiu. Brown sabia de várias empresas que já tinham um diretor desses. Em geral, não gostava de contratar
um “diretor-de-não-sei-o-quê” para lidar com o desafio competitivo da vez. Mas será que com a sustentabilidade era diferente? Teve de admitir
que não sabia a resposta. Pelo celular, mandou uma mensagem a Tyler e Dyson. Queria a opinião deles.
A voz da experiência
Brown atravessou a passarela que cortava o saguão da sede da Narinex. Lá fora, viu as nuvens que se formavam. Pingos de chuva
começaram a salpicar a parede envidraçada. Em poucos minutos, ia se reunir com a equipe executiva para discutir a situação envolvendo a
Glistrom. Debaixo do braço, levava o relatório de Tyler e Dyson. No alto da folha, copiara à mão um trecho do trabalho da neta: “A nova ‘melhor
prática’ é fazer da sustentabilidade uma responsabilidade da diretoria”.
Já de frente para a sala de reuniões, Brown respirou fundo antes de escancarar as portas. De um lado da mesa estavam Dyson; Stanley
Samson, diretor de comunicação; e Hans Stevenson, diretor mundial de P&D (Stevenson tinha assumido o cargo havia pouco, depois de uma
bem-sucedida temporada na sede europeia da Narinex, em Hamburgo). Do outro lado estavam Ian Jones e Herb Tyler. Brown abordou
primeiro o diretor de vendas: — Muito bem, Ian, vamos lá. Que diabos está acontecendo?
Ian Jones deu um sorriso pesaroso. Tinha 20 anos de casa. Fora subindo aos poucos no departamento de vendas. Trabalhara com três
presidentes antes de Jennifer Brown. Gostava do estilo direto da executiva, de sua disposição a dialogar com os clientes.
— A Glistrom está numa boa fase —, disse ele. — Não estamos perdendo para eles no preço. Mas o atendimento deles sempre foi bom. A
Laura me falou sobre essa questão da sustentabilidade, acho que há algo disso. Ultimamente, a diretora de sustentabilidade deles está em
todas: em congressos, no noticiário da TV, até em blogs. O interesse dos clientes nesse tema está crescendo e a Glistrom tem uma história
melhor a contar do que a gente. Meu pessoal de vendas é muito interrogado sobre isso.
Stanley Samson aproveitou a deixa: — O nome dela é Maria Capelli. Venho acompanhando o que ela diz.
Brown lembrava de ter ouvido falar da nomeação de Capelli. Samson prosseguiu: — Ela ficou na dela durante uns seis meses, provavelmente
para se familiarizar mais com a situação. Mas agora, não passa dois dias sem aparecer. Não sei se a Glistrom está mesmo fazendo mais do
que nós no tema ambiental, mas a empresa sem dúvida está se mostrando mais. Adoraria poder fazer o mesmo por nós.
— Bom, e a gente também não deveria estar recebendo alguma atenção? — perguntou Dyson. — Também temos o que dizer, a Jennifer
poderia contar essa história. Não é mais contundente ainda que essa mensagem venha do alto? Aliás, a única crítica que ouvi sobre a Glistrom
é que falar por um porta-voz enfraquece a mensagem.
Herb Tyler concordou com a cabeça.
— Estamos muito bem em certas áreas. Mas, em geral, foi porque investimos na sustentabilidade para derrubar custos — disse Samson. —
Não quero ninguém nos acusando de “greenwashing”, pois tudo de bom que fizemos podia ir para o espaço.
Samson olhou para Tyler: — Sinceramente, nosso progresso foi bastante involuntário. Não foi, Herb?
Tyler concordou: — Em termos de produção e operações, foi basicamente uma questão de custos e conformidade. Não somos os primeiros da
turma. Para chegar lá é preciso gastar: gastar para monitorar e divulgar não só nosso impacto direto, mas também o de fornecedores, o de
fornecedores dos fornecedores. Sinceramente, não gostaria de ver certas partes de nossa cadeia de suprimento no jornal da noite na TV.
Lembram quando a Global Green Action partiu para cima da gente em Taiwan?
Brown e os demais lembravam bem dos manifestantes que, no ano anterior, tinham atirado barris vazios com o desenho de uma caveira e dois
ossos cruzados na fonte ornamental em frente à principal instalação da Narinex na Ásia. Por sorte, apenas o capítulo local da organização
ativista participara do protesto; e a cobertura da imprensa fora mínima. Brown despachara Tyler para acalmar os manifestantes com o
compromisso de rever as práticas da empresa. Depois de melhorarem um punhado de coisas sem impacto sobre o custo, o problema
terminara. Mas ainda era fácil achar imagens do protesto na internet.
— Voltemos ao que realmente importa — disse Brown. Embora incentivasse a equipe a travar uma discussão animada, o resultado às vezes
era o caos. — Já estou convencida de que a questão de sustentabilidade é para valer. O desafio é o que fazer quanto a isso. Não podemos
nos acostumar a perder negócios para a Glistrom, ou quem quer que seja. Por outro lado, ser o “primeiro da turma”, como disse o Herb, em
geral significa gastar muito.
Laura Dyson entrou na conversa: — E a maioria dessas coisas é novidade para nós; calcular o retorno é complicado. Grande parte da
economia é baseada em projeções feitas a partir de hipóteses que, com o tempo, podem ser desmentidas. Em certos casos, talvez tenhamos
de absorver um aumento de custos a curto prazo para conseguir um benefício lá na frente.
— O que me preocupa é que estamos falando de táticas, não de estratégia — disse Brown. — Um diretor de sustentabilidade poderia juntar
isso tudo? Hans, você acaba de voltar da Europa, qual sua opinião?
— Acho que estamos fazendo a pergunta errada — respondeu Stevenson. — A questão não é se vamos fazer o mesmo que a Glistrom e
contratar um novo executivo. Daqui a pouco a Maria Capelli vai parar de atrair atenção. Com o devido respeito, não tem nem a ver com a
disputa de contratos. A questão é se deixar a empresa mais “verde” do que a Glistrom e o resto das concorrentes vai trazer alguma vantagem
competitiva. Se só com a conformidade conseguirmos todas as vantagens possíveis, paremos por aí. Mas acho que há uma oportunidade
estratégica maior, e um diretor de sustentabilidade podia ser um catalisador.
Brown, que sempre gostara de Stevenson, imaginou que ele talvez quisesse ser esse diretor. O executivo gostava do tema e conhecia o setor
de cabo a rabo. Para ele, seria um desafio, profissionalmente falando.
Stevenson contou, em seguida, como o maior corte de custos de sua divisão nos últimos três anos — uma substituição de matéria-prima que
derrubara em 20% o custo de produzir a linha de componentes Emerald — se devera às normas da União Europeia sobre substâncias
perigosas: — Se um diretor de sustentabilidade, alguém de dentro, puder usar todo problema de conformidade para catalisar a inovação de
verdade aqui na empresa, vamos deixar a Glistrom comendo poeira. E aí teremos uma bela história a contar —concluiu.
— Olha, Hans, fiquei muito impressionada com o que sua equipe fez com a Emerald, mas não vamos esquecer que você conseguiu um
resultado excelente com recursos que já tinha. — disse Dyson. — Não tivemos de criar outra diretoria, com todo o custo fixo que isso traz. E
um departamento novo leva até um ano para estar operando a toda.
Dyson lançou um olhar a Brown. — Hans, você, o Herb e o resto da equipe podem se juntar para resolver essa questão.
Ian Jones jogou a bola de volta para Brown: — Jennifer, qual sua opinião?
Brown fez uma pausa: — Não quero que a equipe executiva tenha mais gente do que o necessário, sobretudo se for só para mostrar. E já vi
um porta-voz diluir a mensagem. Mas essa questão talvez seja um desafio a coisas profundamente valorizadas em nossa cultura. Não
podemos achar que isso vai passar, e a equipe de vendas precisa de uma história para contar agora. Às vezes, é preciso alguém para
defender um novo ponto de vista.
— Não é para isso que serve um consultor? — perguntou Dyson. — Uma consultoria pode aportar rapidamente um conhecimento
especializado, podemos pedir especificamente que lide com vacas sagradas. Temos cancha em contratar consultores que dão conta do
trabalho.
— Só alguém de dentro pode fazer disso parte do nosso DNA — retrucou Stevenson. — Um consultor não terá um compromisso a longo
prazo.
— Ou se tiver, vai custar uma fortuna — disse Dyson. — Seja de dentro, seja de fora, só quero ter certeza de que as prioridades de alguns
clientes não vão impedir que a gente atenda às necessidades dos demais. Ainda temos um monte de clientes que se preocupam mais com o
custo do que com materiais biodegradáveis.
Não tantos quanto antes — emendou Brown. — Não tantos quanto antes…
A Narinex deve contratar um diretor de sustentabilidade?
Fonte: http://www.hbrbr.com.br/materia/alta-diretoria-deve-ter-um-executivo-verde#sthash.7KOTSa2k.dpuf

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