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DOI 10.5380/2238-0701.2019n19-07
Data de Recebimento: 29/08/19
Data de Aprovação: 08/11/19
Nostalgia, distopia e ficção seriada: relações entre
passado e futuro no imaginário contemporâneo
AÇÃO MIDIÁTICA, n. 19, jan./jun. 2020 Curitiba. PPGCOM - UFPR, ISSN 2238-0701
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Introdução
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2 Sabrina é um remake produzido pela Netflix e adaptado do universo das HQs da Archie Comics. Conta a
história de uma meia-bruxa adolescente que vive com as tias e frequenta uma escola de bruxaria. Já teve outras
versões para a TV.
3 Gilmore Girls foi uma série de comédia originalmente exibida pelo canal The WB/CW, da Warner Bros. Conta
a história de uma mãe solteira e sua filha. Foi cancelada em 2007, mas ganhou quatro episódios especiais pela
Netflix em 2016.
4 Altered Carbon é uma série da Netflix, inspirada no livro do autor de ficção científica Richard K. Morgan.
Imagina um futuro onde seres humanos podem ser “baixados” em corpos sintéticos.
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5 Black Mirror é uma série britânica exibida originalmente no Channel 4 e adquirida em 2015 pela Netflix. Por
ser uma antologia, seus episódios não possuem uma relação direta entre si. Sua correlação está nos temas
abordados, como o impacto das tecnologias nas organizações da vida social, vigilância, redes sociais, entre
outros.
6 The Walking Dead, da Fox, é uma série inspirada na HQ de Robert Kirman. Conta a história de um grupo
de sobreviventes após um apocalipse zumbi. The 100 é uma série distópica adolescente da The CW baseada
em um livro de Kass Morgan. Uma guerra nuclear fez com que os seres humanos abandonassem a Terra para
viver em estações espaciais. Anos depois, um grupo de jovens prisioneiros deve verificar se o planeta pode ser
habitado. American Horror Story: Apocalypse é a 8ª temporada de uma série antológica do FX. Às vésperas de
um evento nuclear, uma organização seleciona jovens para serem salvos. No entanto, o abrigo se mostra um
calabouço de tortura e maus-tratos.
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As origens da crise
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Imaginário e tecnologia
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que o termo foi cunhado pelo médico Johannes Hofer no século XVII ao
observar um sentimento familiar entre mercenários suíços distantes da
terra nativa. Um desejo doloroso de retornar ao lar que deixava os solda-
dos melancólicos e anoréxicos, e até induzia ao suicídio. A nostalgia era
um quadro patológico relacionado com a espacialidade e distância. Mas
uma virada semântica desvinculou a nostalgia da medicina e da ação
militar, sendo hoje uma emoção positiva, de que se tem de algo que era
bom e se perdeu. Aproxima-se de questões temporais, implicando os
sujeitos a buscarem no passado lembranças de pessoas e lugares para
conceder novos significados. Por isso, tem algo sobre o vivido, ainda
que imaginado.
Jameson (1991) discute a relação entre a realidade, os fatos históri-
cos e as representações feitas de um determinado período nos mei-
os de comunicação. Para o autor, a nostalgia elabora uma percepção
ilusória e idealizada que, ao evadir o presente, fetichiza o passado e
opera como um objeto estético reduzido. Em sua análise dos “filmes
nostalgia”, Jameson (1991) argumenta que essas obras trazem aspec-
tos sobre passados ou momentos específicos geracionais por meio de
um conjunto consumível de imagens marcadas por músicas, estilos e
objetos de consumo; narrativas previsíveis que necessitam de imagens
impactantes. Mas reconhece o papel ativo das audiências, que devem
identificar os estereótipos pré-estabelecidos. Em relação à televisão,
Jameson (1991) a acusa de ser um meio historicamente amnésico, mas
Holdsworth (2011) contrapõe essa percepção ao argumentar que a TV
constrói memórias diariamente com a repetição de passados culturais e
particulares. Nesse sentido, a mídia é capaz de acionar emoções nos-
tálgicas por meio de elementos narrativos e estéticos, sendo que sua
própria assistência induz a esse sentimento familiar que depende do vín-
culo sentimental construído entre o espectador e a série (NIEMEYER e
WENTZ, 2014).
Mas e a distopia? O conceito identifica as obras que imaginam
possíveis versões negativas do futuro. Contrapõe a noção de utopia, ter-
mo criado no século XVI por Thomas More para designar a construção
de um modelo socioeconômico perfeito e sem conflitos. Contudo, a dis-
topia tem suas origens nos tempos mais modernos, ainda que haja dis-
cordâncias a respeito do primeiro trabalho publicado sobre a temática.
Livros como A Máquina do Tempo (1895) e The Sleeper Awake (1910),
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7 Baseada em um livro de Margaret Atwood, a série retrata um futuro distópico onde um ataque terrorista
derruba o governo dos Estados Unidos e funda a República de Gilead, um estado cristão militarizado, totalitário
e fundamentalista.
8 A série mostra um universo paralelo distópico onde o Eixo ganhou a 2ª Guerra Mundial. É baseada em um
livro de Philip K. Dick.
9 Minissérie britânica da BBC/HBO. Sua narrativa tem início em 2019 e avança 15 anos, enquanto mostra
como os eventos políticos e sociais da contemporaneidade afetam os membros da família Lyons.
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sileira, adquirida pela Netflix e lançada em 2016. A série, cujo piloto foi
publicado em 2011 pelos seus criadores no YouTube, retrata um futuro
distópico onde o mundo é dividido entre Continente, marcado pela fome
e miséria, e Maralto, uma ilha onde há vida digna e confortável. Porém,
para ter acesso ao local, é preciso passar no Processo, uma seleção que
ocorre todos os anos e seleciona apenas 3% dos participantes, todos
jovens de 20 anos. A produção mistura elementos globais e locais e
problematiza questões como meritocracia, hereditariedade, sustentabil-
idade e desigualdade. No entanto, curiosamente, teve um desempenho
em audiência melhor no exterior do que no próprio Brasil. Por essas
razões, foi escolhida como o objeto central da Tese em desenvolvimento
que este trabalho faz parte. A intenção da pesquisa é realizar uma leitura
de seu texto por meio da Análise Televisual (BECKER, 2016) associa-
da a um estudo de recepção, focalizando os sentidos da distopia que
circulam entre os membros da audiência da série. Afinal, se a distopia
realmente consiste em um tipo de alerta sobre as possibilidades futu-
ras, é preciso entender até que ponto o público realmente enxerga tais
questões como, de fato, um aviso.
Assim, acreditamos que é necessário aprofundar estas investi-
gações, identificando as manifestações desse imaginário distópico. Es-
pecialmente nas obras ficcionais televisivas, já que, ao revisitar os tra-
balhos sobre imaginário, notamos uma certa ênfase no cinema sobre as
outras formas tecnológicas. Hoje, a televisão continua a ser o principal
meio de comunicação e informação em diversos países, enquanto nos
Estados Unidos o número de produções televisivas já se equipara aos
lançamentos no cinema. Daí a urgência de se voltar para a televisão
como um lugar privilegiado, buscando entender a relação deste imag-
inário, a contemporaneidade, estas produções e suas respectivas au-
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