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Jaqueline Taube
Ercília Hitomi Hirota
Resumo
esquisas têm demonstrado que os projetos de habitação de interesse
Abstract
Many researches have shown that social housing projects (SHP) developed in
Brazil have not been meeting the users’ real needs. As a consequence, many
adaptations and extensions have been made that imply spending already scarce
funds for this segment of the population. Moreover, very often, it results in poor
quality housing. This article presents results of a study which aimed to verify the
applicability of Mass Customization (MC), used by the manufacturing industry for
being more effective in meeting customer demands, in the context of SHP
production in the Minha Casa Minha VIda project (MCMVP). The research
consisted of a literature review, searching for a conceptual overview of MC, as
Jaqueline Taube well as the development of a case study in a housing company. This study
Universidade do Oeste de Santa
Catarina comprised a requirements analysis of a two-year SHP company to verify the
São Miguel do Oeste - SC - Brasil characteristics and diversity of users´ requirements not met, and an information
flow map from registering families interested in SHP (demand) to handing over
Ercília Hitomi Hirota
Universidade Estadual de Londrina
the keys to the families and identifying barriers and opportunities of using MC.
Londrina - PR - Brasil The results indicate the applicability of the segmented MC and, using
prefabricated technology, the possibility of including specific requirements of the
client before handing over the keys.
Recebido em 12/01/16
Aceito em 13/01/17 Keywords: Social housing. Mass customization. MCMVP.
TAUBE, J.; HIROTA, E. H. Customização em massa no processo de provisão de Habitações de Interesse Social: um 253
estudo de caso. Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 17, n. 4, p. 253-268, out./dez. 2017.
ISSN 1678-8621 Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído.
http://dx.doi.org/10.1590/s1678-86212017000400196
Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 17, n. 4, p. 253-268, out./dez. 2017.
Introdução
A adoção de projetos-padrão para empreendimentos A carência de áreas urbanas no Japão e as
habitacionais de interesse social (EHIS) no Brasil, necessidades dos clientes levaram as empresas de
produzidos segundo a lógica da produção em construção de habitação, na década de 1990, a
massa, tem resultado na insatisfação dos usuários fornecer produtos diferenciados (BARLOW et al.,
(BONATTO; MIRON; FORMOSO, 2011; 2003). A partir de então, a indústria japonesa tem
CIUFFOLINI; SHIMBO, 2013; LIMA; utilizado a CM na pré-fabricação de habitações para
FORMOSO; ECHEVESTE, 2011; BRITO; atender a necessidades dos clientes, fazendo uso de
FORMOSO; ECHEVESTE, 2011). Segundo componentes modulares produzidos em massa, o
Brandão (2011), as unidades habitacionais que permite redução dos custos, já que os
entregues não atendem à diversidade de fabricantes mantêm a economia de escala; e
necessidades dos usuários, os quais são levados a permite, ainda, que os clientes possam customizar
adequar as unidades por meio de modificações e suas residências de acordo com suas necessidades,
ampliações em suas moradias (BRANDÃO, 2011). com a combinação dos componentes do produto
Em muitos casos, essa tipologia-padrão não é (NOGUCHI; FRIEDMAN, 2002; NOGUCHI,
desenvolvida para tais intervenções, o que dificulta 2003).
a realização das adaptações com qualidade e baixo É possível transferir essa lógica de
custo (BRANDÃO, 2011), acarretando prejuízos à
desenvolvimento de produto para o contexto da HIS
qualidade da habitação e ônus ao usuário. Mesmo
brasileira?
assim, tais adaptações são apontadas pelos usuários
como melhoria de qualidade de vida. Este artigo apresenta resultados de uma pesquisa
que objetivou verificar a aplicabilidade do conceito
Além dos prejuízos diretos causados aos usuários,
de CM na provisão de HIS a partir de uma síntese
essa falta de qualidade dos projetos de HIS também
conceitual analítica sobre CM, já que se observou o
é prejudicial aos programas habitacionais, já que faz
uso indiscriminado dos termos customização e
com que os usuários não permaneçam em suas
personalização aplicados ao contexto habitacional,
moradias, o que acarreta baixa retenção nos e de um estudo de caso em companhia de habitação
imóveis. Bonatto, Miron e Formoso (2011) no qual foram analisados requisitos de um
apontam em seu estudo que o principal motivo pelo
empreendimento HIS com 2 anos de uso para
qual os usuários não permanecem nas unidades é a
verificar as características e diversidade de
inadequação do espaço da habitação, ou seja, a
requisitos não atendidos, e um mapeamento de
necessidade de mais espaço. fluxo de informações do processo de seleção e
É, portanto, fundamental a busca de alternativas provisão de habitações a famílias com renda de até
para melhor atender às necessidades dessa R$ 1.600,00, desde o cadastramento de famílias
população. A Customização em Massa é uma interessadas em HIS (demanda) até a entrega das
estratégia de negócios que possibilita às empresas chaves às famílias contempladas, para identificar
fornecedoras de produtos manufaturados e de barreiras e oportunidades de uso da CM.
serviços atender a novas necessidades (FRUTOS;
BORENSTEIN, 2003) e, por consequência, Customização em massa
aumentar o grau de satisfação dos clientes
(BARLOW; OZAKI, 2003). Essa estratégia O termo CM foi primeiramente previsto por Alvin
proporciona aos clientes finais uma gama de opções Toffler, em 1970, como uma habilidade tecnológica
de produtos, com base em suas necessidades, com (PINE, 1993) e foi descrito por Davis (19871 apud
custos e tempo de entrega similares ao alcançado na DURAY et al., 2000; PINE, 1993; SILVEIRA;
produção em massa (HART, 1995; PINE, 1993). BORENSTEIN; FOGLIATTO, 2001) como “[...]
uma tendência de produção e distribuição de bens e
Sabe-se, no entanto, que o contexto da produção de
serviços customizados individualmente para um
HIS é complexo e significativamente diferente do
mercado de massa [...]” (AHLSTROM;
da produção manufaturada, mas a literatura já
WESTBROOK, 1999, p. 262, tradução nossa) em
aponta estudos desenvolvidos e relatos de empresas
que os produtos poderiam ser fabricados com as
que têm recorrido à CM para atender a um mercado
especificações dos clientes, como na economia pré-
em que os clientes apresentam uma ampla gama de
industrial; e com o custo de um item produzido em
necessidades (BARLOW et al., 2003; NOGUCHI;
massa (DURAY et al., 2000; SILVEIRA;
FRIEDMAN, 2002; NOGUCHI, 2003; NOGUCHI,
BORENSTEIN; FOGLIATTO, 2001).
2004a; SHIN et al., 2008).
Como observado, na literatura não há consenso a personalização é aquela que é feita após a entrega
entre os autores a respeito do conceito de CM, pois do produto pelo próprio cliente.
há aqueles que argumentam que a CM é aplicada a
Conclui-se então que a CM é uma estratégia de
produtos2, e outros, a produtos e serviços3. Há os
negócios (PINE, 1993) que permite proporcionar
que determinam que a customização deva ocorrer
aos clientes finais uma gama de opções de produtos
ainda durante as fases de design e produção 4 , e
com base nas necessidades desses clientes, com
outros que estendem a customização para após o custos similares ao alcançado na produção em
recebimento do produto. Por fim, há os que massa (DAVIS, 19879 apud DURAY et al., 2000;
consideram o custo um ponto crucial na CM 5 ,
NOGUCHI, 2004a; PILLER, 2004; PINE, 1993),
enquanto outros não o relacionam à estratégia de
com o uso de tecnologias de informação, processos
CM6.
flexíveis de trabalhos (GILMORE; PINE, 1997;
Em função disso, Kaplan e Haenlein (2006) PINE; PEPPER; ROGERS, 1995) e estruturas
delimitam o conceito de CM com base na análise de organizacionais flexíveis (HART, 1995).
definições estabelecidas, considerando os seguintes
A CM pode ser abordada segundo duas variações,
aspectos, conforme a Figura 1:
CM visionária e CM prática/funcional, conforme a
(a) a CM deve ser aplicada somente aos produtos, Figura 2. A primeira delas fornece uma variedade
e não a serviços7; infinita, contemplando todas as exigências dos
clientes, e é marcada pelo envolvimento do cliente
(b) o cliente deve estar envolvido no processo
durante a fase de design. Essa estratégia é voltada
durante as fases de operação da cadeia de valor do
produto8, ou seja, exclui a etapa pós-entrega; e para um mercado um a um.
Já a outra ramificação de CM, CM
(c) os custos devem ser semelhantes aos dos
prática/funcional, fornece uma variedade finita,
produtos produzidos em massa.
contemplando algumas das opções dos clientes, e é
Essa delimitação concorda com a apresentada por marcada pelo envolvimento do cliente durante as
Noguchi (2004a), em que a customização é aquela fases de fabricação e montagem. Esta estratégia é
que acontece antes da entrega do produto, enquanto voltada a um mercado de alguns indivíduos,
mercado segmentado, conforme a Figura 2.
2Segundo Duray et al. (2000), Kumar, Gattoufi e Reisman (2007), comprehensive framework. Advances in Strategic Management,
Mintzberg (1988* apud Duray et al., 2000), Noguchi (2004a), v. 5, p. 1-67, 1988.].
Piller e Kumar (2006) e Silveira, Borenstein e Fogliatto (2001). 5Segundo Duray et al. (2000), Gilmore e Pine (1997), Hart
*[MINTZBERG, H. Generic Strategies: toward a comprehensive (1995), Kumar (2004), Kumar, Gattoufi e Reisman (2007),
framework. Advances in Strategic Management, v. 5, p. 1-67, Lampel e Mintzberg (1996), Piller, Moeslein e Stokto (2004),
1988.]. Piller e Kumar (2006), Pine (1993), Ross (1996), Silveira,
3Segundo Alford, Sackett e Nelder (2000), Davis (1987* apud Borenstein e Fogliatto (2001), Squire et al. (2006) e Tien,
AHLSTROM; WESTBROOK, 1999), Gilmore e Pine (1997), Hart Krishnamurthy e Yasar (2004).
(1995), Lampel e Mintzberg (1996), Piller (2004), Piller, Moeslein 6Segundo Kaplan e Haenlein (2006) e Pine (1993).
e Stotko (2004), Pine (1993), Ross (1996), Spira (1996* apud
7Nosserviços, o cliente já está inerentemente envolvido no
Silveira et al., 2001), Squire (2006) e Tien, Krishnamurthy e
Yasar (2004). *[DAVIS, S. M. Future Perfect. Reading: Addison- processo durante a fase de entrega, ou seja, os serviços são
Wesley Publishing, 1987.]. *[SPIRA, Journal of Mass sempre customizados (KAPLAN; HAENLEIN, 2006).
Customization Through Training at Lutron Electronics. 8As fases de operação da cadeia de valor do produto
Computers in Industry, v. 30, n. 3, p. 171-174, 1996.]. correspondem às fases de design e produção do produto.
4Segundo 9DAVIS, S. M. Future Perfect. Reading: Addison-Wesley
Mintzberg (1988* apud Duray et al., 2000) e Noguchi
(2004a). *[MINTZBERG, H. Generic Strategies: toward a Publishing, 1987.
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Mesmo após a delimitação da estratégia de CM incorporada, customização feita pelo próprio cliente
proposta por Kaplan e Haenlein (2006), um antigo e adaptativa); e outros, ainda, se referem à
conflito entre visionários e pragmáticos envolvendo customização de serviços 12 (trabalhos adicionais,
o conceito de CM (SILVEIRA; BORENSTEIN; serviços adicionais, embalagem e distribuição;
FOGLIATTO, 2001) ainda permanece (KAPLAN; ponto de entrega customizado, serviços
HAENLEIN, 2006) e está diretamente relacionado customizados/resposta rápida, feito sob encomenda,
a quão customizado o produto será, ou seja, ao nível serviços customizados, embalagem customizada,
de customização. padronização segmentada, customização do
Há diversos níveis de customização, ou seja, produto pós-produção, customização da venda,
estética, customização da forma, BTO e
diversas formas de alcançar a CM, como enfatizam
customização mínima).
Gilmore e Pine (1997) e Pine (1993). Os níveis de
customização são denominados por diversos Entre os níveis que se referem à CM, parte deles se
autores de diversas outras formas: estratégias de refere à CM prática/funcional 13 (fabricação,
CM, estágios da CM, tipos de customização, grau montagem, customização adaptada, customização
de CM, abordagens de CM, níveis genéricos de CM padronizada, produção modular, montagem
e arquétipos de CM. Neste trabalho a nomenclatura modular, ampla variedade de produtos,
utilizada será níveis de customização em massa. Os customização opcional, MTO, ATO montagem sob
diferentes níveis de CM foram agrupados com base encomenda e customização parcial). Nesta
na nomenclatura estabelecida Silveira, Borenstein e categoria, a maioria dos níveis descritos possui o
Fogliatto (2001) e correlacionados aos conceitos ponto de envolvimento do cliente durante a fase de
apresentados neste trabalho, conforme o Quadro 1. montagem, e só alguns durante a fase de fabricação
do produto.
Logo, percebe-se que muitos dos níveis de
customização apresentados vão além da CM. Os demais níveis de CM referem-se à CM
Alguns desses níveis referem-se à produção em visionária 14 (fornecedor, design, customização
massa 10 (padronização, padronização pura, LTO, pura, customização do núcleo,
produção em massa e nível-padrão); outros se colaborativa/transparente, DTO, CMTR, CM e
referem à personalização 11 (uso, customização customização completa), na qual a maioria dos
10Segundo definição de Noguchi (2004a). 13Segundo definição de Hart (1995) e de Kaplan e Haenlein
11Segundo definição de Noguchi (2004a). (2006).
14Segundodefinição de Hart (1995), de Kaplan e Haenlein (2006)
12SegundoKaplan e Haenlein (2006), todo serviço já é
inerentemente customizado. e de MacCarthy, Bradazon e Bramham (2003).
Spira (1996
Níveis Mintzberg apud Piller, Conceitos
genéricos de (1988 apud Lampel e Alford, Tien,
SILVIERA; Gilmore e Moeslein Squire et al.
CM Pine (1993) Mintzberg Ross (1996) Sackett e Krishnamurthy
Duray et al. , BORENSTEIN; Pine (1997) e Stotko (2006)
(1996) Nelder (2000) e Yasar (2004)
2000) FOGLIATTO, (2004)
2001)
Ponto de Customização
Trabalhos Feito sob Customização Customização
entrega do produto pós
adicionais encomenda da forma mínima Serviços
customizado produção
"Customizados",
Serviços
segundo Kaplan e
customizados
Serviços Serviços Customização Customização Haenlein (2006) todo
e fornecer
adicionais customizados da venda da forma serviço já é
resposta
inerentemente
rápida
customizado
Embalagem e Embalagem Padronização
Estética BTO
distribuição customizada segmentada
Customização
Customizaçã Personalização
Uso feita pelo Adaptativa
o incorporada (NOGUCHI, 2004a)
próprio cliente
Padronização Produção em Produção em massa
Padronização LTO Nível padrão
pura massa (NOGUCHI, 2004a)
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Vale ressaltar que, como abordado por Feitzinger e modular do processo e a cadeia de abastecimento,
Lee (1997), para customizar em massa é necessário recomendada por Feitzinger e Lee (1997).
adiar o Atraso de Diferenciação de Produto
(Delayed Product Differentiation - DPD) ou o OPP Customização em massa na
inicial, para cada cliente, até o último ponto possível habitação
na cadeia de produção por meio da integração entre
o design do produto e o do processo; e a A indústria japonesa trouxe a estratégia de CM para
configuração de toda a rede de abastecimento. o setor habitacional da indústria da construção civil
a partir de uma abordagem integradora entre design,
Dessa forma, o produto deve apresentar um design
produção e comercialização da habitação,
modular, ou seja, o produto é projetado com
denominada de sistema de design customizado em
diferentes módulos, que possibilitam a montagem
massa (Mass Custom Design System – MCDS)
de diferentes produtos, podendo haver módulos
(NOGUCHI; FRIEDMAN, 2002). Segundo esses
comuns a todos os produtos e outros não, além de
autores, esse sistema é formulado conceitualmente
um design modular da produção, ou seja, o
como: MCDS = f (PS).
processo de produção é dividido em módulos,
padronizados e customizados a partir do OPP, de O sistema de design customizado em massa é
modo que eles possam ser reorganizados para dividido em dois subsistemas: o de produtos (P), do
abastecer diferentes redes de distribuição de design. qual fazem parte os componentes da habitação, que
A produção deve dispor também de cadeia de devem ser modulares-padrão; e o de serviços (S),
abastecimento ágil, de modo que o estoque tenha que envolve a interação entre fornecedores e
capacidade e esteja localizado de forma a abastecer usuários. Dessa forma, a MCDS permite uma ampla
a demanda quando necessário. É necessário também gama de habitações para seus clientes, atendendo a
que haja integração entre os três, e para isso é suas necessidades, com o envolvimento do cliente
necessário que o número de unidades de produção no PDP durante a escolha dos componentes
e de distribuição do produto seja compatível modulares, que compõem as unidades habitacionais
(FEITZINGER; LEE, 1997). (NOGUCHI; FRIEDMAN, 2002; NOGUCHI;
HERNÀNDEZ-VELASCO, 2005).
Piller e Kumar (2006) complementam dizendo que
deve haver a interação entre o cliente e a empresa A escolha da estratégia da CM a ser utilizada pelas
por meio do co-design. O co-design do produto é empresas implica um processo de tomada de
entendido como a oportunidade de o cliente decisões, para o qual Noguchi (2004b) propõe uma
interagir com a empresa no momento de criação do sistematização dividida em cinco etapas (Figura 3:
produto, ou seja, é o momento em que o cliente (a) identificação das necessidades: entender a
configura o produto de acordo com suas demanda de habitação, ou seja, eliminar as
necessidades, convertendo-as em especificação do incertezas;
produto (KUMAR, 2007; PILLER; KUMAR,
2006). Essa atividade é responsável pela criação de (b) formulação dos objetivos e especificações:
valor do produto (PILLER, 2004). elaborar as especificações;
O co-design implica, ainda, uma relação direta entre (c) geração das alternativas: apresentar
cliente e empresa, o que possibilita a construção de alternativas que contribuam para CM;
uma relação duradoura, uma vez que o cliente, (d) avaliação das alternativas: analisar o valor
tendo suas necessidades atendidas, retornará a esse das alternativas, não só os custos que envolvem o
fornecedor, o que possibilita a criação de um banco produto, mas também necessidades, desejos e
de dados desses clientes (KUMAR, 2004). No expectativas dos clientes; e
entanto, essa atividade também pode ser exaustiva
para os clientes, devido à gama de variedades (e) seleção das alternativas: entender os valores
disponíveis e ao peso das escolhas, o que acarreta, reais das alternativas.
na maioria das vezes, a desistência do cliente As três primeiras etapas são classificadas como
(PILLER, 2004; PILLER; KUMAR, 2006). fases de CM, enquanto as duas últimas são
Uma forma de integrar o processo de design e o classificadas como fases de análise de valor, que
processo de produção é considerar OPP ou CODP auxiliam na tomada de decisão final das alternativas
em ambos os processos (RUDBERG; WIKNER, de CM mais adequadas, conforme a Figura 3.
2004; WIKNER; RUDBERG, 2005), o que torna Portanto, as empresas devem seguir três decisões
possível relacionar as especificações dos clientes a essenciais: identificação das necessidades;
ambos os processos (RUDBERG; WIKNER, 2004). formulação dos objetivos; e especificações e
Esta também é uma forma de auxiliar na integração geração das alternativas (NOGUCHI, 2004b).
entre o design modular do produto, o design
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CM prática / funcional
Padronização
Montagem (HART, 1995; KAPLAN;
customizada
HAENLEIN, 2006)
Níveis de CM
Por fim, outros aspectos importantes devem ser Em seguida, deve haver comunicação entre as
considerados na adoção da CM. Primeiramente, as equipes/fases de marketing, design e produção
empresas devem ser claras sobre os níveis de apontados por Hart (1995). Portanto, o marketing
customização do produto, o tempo de espera do deve coletar as informações corretamente e também
cliente e os custos adotados por elas (BARLOW; reduzir os intermediários entre o cliente e a
OZAKI, 2003). empresa; o design deve entender as necessidades
dos clientes, e as informações devem ser
15Essesquestionários foram aplicados “face a face”, portanto, respostas são livres dentro de uma conversação guiada pelo
conforme Zeisel (2006* apud IMAI, 2007, p. 159), “[...] pode ser roteiro, diferentemente dos questionários (RHEINGANTZ et al.,
considerado como uma entrevista, ainda que geralmente as 2009).
entrevistas tenham um caráter mais aberto, enquanto que os 17Entrevista
semiestruturada é aquela em que o entrevistador
questionários buscam obter a opinião dos usuários por meio de segue um roteiro ou esquema básico composto de um conjunto
respostas do tipo sim/não ou múltipla escolha [...]”. *[ZEISEL, de perguntas que não precisam ser aplicadas sequencialmente
J. Inquiry by Design: tolls for environment-behavior research. (RHEINGANTZ et al., 2009).
New York: Cambridge University Press, 2006.].
16Entrevistaestruturada é aquela em que o entrevistador segue
um roteiro programado, semelhante a um questionário, e as
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Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 17, n. 4, p. 253-268, out./dez. 2017.
18Questionárioé “[...] um instrumento de pesquisa que contém a presença do pesquisador [...]” (RHEINGANTZ et al., 2009, p.
uma série de perguntas relacionadas com um determinado 79).
assunto ou problema, que devem ser respondidas por escrito sem
Customização em massa no processo de provisão de Habitações de Interesse Social: um estudo de caso 263
Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 17, n. 4, p. 253-268, out./dez. 2017.
UH, e os primeiros dados dessas famílias são interesse por ele, e os dados dos clientes são
levantados; na fase 7, quando um empreendimento levantados novamente, conforme apresentado na
é lançado, os clientes interessados manifestam o Figura 4.
Dessa forma, seria possível capturar as envolvimento com o processo são cruciais para
necessidades dos clientes no início do PDP e implementar a CM, pois proporcionam o
transferi-las para o produto ao longo de todo o conhecimento das necessidades de cada cliente e o
processo, de forma a proporcionar o atendimento momento em que elas são inseridas no PDP, desde
dessas necessidades e, consequentemente, maior que o processo esteja preparado para isso.
satisfação do cliente.
Os resultados obtidos na pesquisa desenvolvida
As barreiras atuais identificadas para a CM são: indicam que há barreiras e oportunidades para CM
nas HIS destinadas a famílias com renda de até R$
(a) as necessidades dos clientes não são
1.600,00. Foram identificadas opções de
capturadas na etapa de cadastro de famílias
customização requeridas para a faixa de renda
interessadas (demanda);
mensal de até R$ 1.600,00 de HIS, realizada por
(b) os projetos das UHs são desenvolvidos sem meio da análise da base de dados coletados em uma
considerar as necessidades dos clientes; APO.
(c) a tecnologia adotada nos EHIS é a tradicional, A partir do mapeamento, foi identificada a
o que acarreta longo período de execução e, por possibilidade de inserção de pontos de
isso, a obra precisa ser iniciada antes da seleção envolvimento do cliente no processo de provisão de
das famílias, tendo como consequência a não HIS em Londrina-PR nessa faixa de renda, nas fases
consideração das necessidades dos clientes no 1 e 7.
PDP; e
Por fim, acredita-se que a combinação da estratégia
(d) a definição das famílias (aprovação da de CM segmentada com uso de tecnologia pré-
concessão de financiamento) e a designação das fabricada deve possibilitar a inserção de captura de
UHs a essas famílias só ocorrem após a conclusão requisitos específicos do cliente.
das unidades, o que inviabiliza, mais uma vez, a
consideração de necessidades específicas da Nesse sentido, podem ser desenvolvidas pesquisas
sobre ferramentas de análise e segmentação das
família no processo de desenvolvimento do
famílias que demandam por habitação,
produto e aumenta o risco de baixa retenção das
considerando o perfil das famílias e os requisitos
famílias, conforme já apontado por Bonatto, Miron
demandados por elas; formas para facilitar e
e Formoso (2011).
sistematizar a transformação dos requisitos dos
Para aumentar a permanência das famílias nas clientes em atributos do produto; possibilidades de
unidades habitacionais, considera-se importante unidades de customização e de espaço de soluções
aumentar a eficácia no atendimento às necessidades possíveis de ser implementadas, buscando atender a
dessas famílias, o que implica abordar, de forma um número maior de necessidades dos clientes.
simultânea e convergente, os dois processos: de
desenvolvimento do produto, incluindo a produção
das habitações; e de seleção das famílias.
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maior retenção das unidades. A interação entre os
dados coletados do cliente e o ponto de
Customização em massa no processo de provisão de Habitações de Interesse Social: um estudo de caso 265
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Jaqueline Taube
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