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, visto pelos outros

Ao entardecer, debruçado pela janela, Nesta cidade, onde agora me sinto Quis dizer o mais claro e o mais corrente
E sabendo de soslaio que há campos em frente, mais estrangeiro do que os gatos persas: Em fala chã e em lúcida esquadria
Leio até me arderem os olhos nesta Lisboa, onde mansos e lisos Ser e dizer na justa luz do dia
O livro de Cesário Verde... Falar claro falar limpo falar rente
os dias passam a ver as gaivotas,
Que pena que tenho dele! Ele era um camponês e a cor dos jacarandás floridos Porém nas roucas ruas da cidade
Que andava preso em liberdade pela cidade se mistura à do Tejo, em flor também, A nítida pupila se alucina
Mas o modo como olhava para as casas, só o Cesário vem ao meu encontro, Cães se miram no vidro de retina
E o modo como reparava nas ruas, me faz companhia, quando de rua E ele vai naufragando como um barco
E a maneira como dava pelas coisas, em rua procuro um rumor distante
É o de quem olha para as árvores, de passos ou aves, nem eu sei já bem. Amou vinhas e searas e campinas
E de quem desce os olhos pela estrada por onde vai Horizontes honestos e lavados
Só ele ajusta a luz feliz dos seus
andando Mas bebeu a cidade a longos tragos
E anda a reparar nas flores que há pelos campos... Versos aos olhos ardidos que são Deambulou por praças por esquinas
os meus agora; só ele traz a sombra
Por isso ele tinha aquela grande tristeza dum verão muito antigo, com corvetas Fugiu da peste e da melancolia
Que ele nunca disse bem que tinha, lentas ainda no rio, e a música, Livre se quis e não servo dos fados
Mas andava pela cidade como quem anda no campo o sumo do sol a escorrer da boca, Diurno se quis – porém a luzidia
E triste como esmagar flores em livros ó minha infância, meu jardim fechado, Noite assombrou os olhos dilatados
E pôr plantas em jarros...
ó meu poeta, talvez fosse contigo
Refletindo o tremor da luz nas margens
Alberto Caeiro que aprendi a pesar sílaba a sílaba Entre ruelas vê-se ao fundo o rio
cada palavra, essas que tu levaste Ele o viu com seus olhos de navio
quase sempre, como poucos mais, Atentos à surpresa das imagens
à suprema perfeição da língua.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Eugénio de Andrade

1- Identifica o tópico comum aos três textos.


1.1- Refere a atitude dos poetas relativamente à poesia e à figura de que se fala.
1.2- Transcreve a expressão ou expressões que melhor a traduzem.
2- Verifica a possibilidade de, nos poemas transcritos, encontrarmos elementos que nos permitam caracterizar a poesia de Cesário.
Prof. João Seixas

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