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Ama de três figuras históricas: Ernest Bevin, organizador sindical, dirigente do

Partido Trabalhista e Ministro do Trabalho a partir de 1940 no governo de coligação


de Winston Churchill; Aneurin Bevan, Ministro da Saúde a seguir à vitória
trabalhista de 1945, arquitecto do Serviço Nacional de Saúde, e Ministro do
Trabalho a partir de 1951, cargo de que se demitiu em protesto contra a introdução
de taxas moderadoras destinadas a financiar a participação britânica na Guerra da
Coreia; ou William Beveridge, parlamentar do Partido Liberal cujo relatório,
apresentado em 1942, veio a servir de base à instituição do Welfare State no Reino
Unido.
Bev Jones é, assim, simultaneamente a continuação e o oposto de Winston Smith,
facto que se reflecte nas óbvias diferenças e nas surpreendentes semelhanças entre
os dois textos.
Ambas as tiranias descritas são pavlovianas ou skinnerianas: Winston Smith e Bev
Jones são ambos "reeducados" a dado passo. Em ambas está presente, como de resto em
Fahrenheit 451 de Ray Bradbury, a aversão do intelectual a qualquer poder de facto
ou de direito que se dedique à destruição de livros; mas o que imediatamente salta
à vista quando lemos os dois textos é o relevo que Orwell e Burgess dão à
manipulação da linguagem. Em 1985 proibe-se às escolas que ensinem a norma culta da
língua inglesa e impõe-se em vez dela o chamado Worker's English; em Nineteen
Eighty-Four o consenso artificial de que a tirania necessita é construído
recorrendo ao Newspeak.
Apesar de partirem de princípios ideológico-políticos aparentemente opostos, os
dois textos partem de princípios morais muito semelhantes e de concepções muito
próximas da liberdade. Para a personagem principal de Orwell, ser livre significa
poder acreditar que 2+2=4; para Burgess, ser livre significa ser capaz de escolhas
morais.
Hoje, olhando à nossa volta, podemos concluir que o erro e a ingenuidade que
Burgess aponta a Orwell podem não ter sido erro nem ingenuidade: o hiperfascismo de
Nineteen Eighty-Four pode ser uma figura retórica, uma hipérbole, da qual não se
espera que o leitor faça uma interpretação literal, mas tem afloramentos numerosos
e óbvios nas sociedades actuais, mesmo nas mais democráticas.
Já o erro de Burgess é mais difícil de levar à conta de retórica. O Alex de A
Clockwork Orange reaparece em 1985 sob a forma de um gang juvenil particularmente
violento que acolhe e protege Bev Smith em troca de lições de História, Latim e
Grego. Faz rir a ideia dum bando de skinheads ou equivalente a interessar-se pela
cultura clássica, mas Burgess justifi

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