Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
2013
Um marco importante das reformas promovidas no passado recente foi a aprovação da Lei
de Responsabilidade Fiscal - LRF. Mais importante ainda do que a aprovação dessa lei foi a
afirmação de uma nova cultura baseada no firme compromisso das lideranças políticas com o
equilíbrio das contas públicas e na adoção das medidas necessárias para preservar a estabilidade
da economia.
Essas reformas contribuíram para que a economia brasileira retomasse uma trajetória de
crescimento, que, embora exiba índices de expansão econômica inferiores aos registrados pelos
demais países emergentes, apoia-se em uma situação fiscal mais sólida e em um sistema
financeiro que goza de boa saúde, ao mesmo tempo em que as disparidades sociais diminuem
e o regime democrático se aperfeiçoa. Enquanto no Brasil se observa o crescimento da classe
média, os países desenvolvidos exibem resultados opostos, com forte aumento da concentração
da renda na pequena fração da população com rendas elevadas.
1
REZENDE, Fernando e CUNHA, Armando – A Reforma Esquecida. Orçamento, Gestão Pública e
Desenvolvimento (Rio: FGV Editora, 2013, cap. 2)
1
2
Os fatos são auspiciosos, mas a sustentação desse modelo de crescimento não está a priori
garantida. As transformações em curso na geopolítica e na economia mundial impõem grandes
desafios de natureza estratégica que demandam preparação para que o Brasil possa enfrentá-
los com maiores chances de sucesso. Os desafios que se apresentam ao desenvolvimento
brasileiro neste terceiro milênio impõem repensar o Estado sob distintas perspectivas: nas suas
relações com a sociedade, na escolha das estratégias requeridas, na reorganização de estruturas
e processos, e na necessidade de ter em conta o rico mosaico cultural do país, buscando garantir
a harmonia entre as distintas dimensões do desenvolvimento. Nessa tarefa, há que contemplar
a importância de dotar o país de condições para acompanhar o ritmo acelerado da inovação
tecnológica no terreno da informação, da produção e da capacidade gerencial.
No calor das mudanças provocadas por essas transformações avulta a necessidade de o país
definir a estratégia a ser adotada para sustentar o modelo de crescimento com inclusão social,
que nos últimos anos promoveu inegáveis avanços nos campos da redução da pobreza e das
desigualdades sociais. A par disso, cumpre promover as mudanças necessárias para recriar as
condições indispensáveis para uma eficiente implementação dessa estratégia nas quais a
reforma do processo orçamentário deveria ocupar inegável prioridade.
Em face da sua importância para a vida econômica, social e política de uma nação, o
orçamento público deve ser dotado de características que permitam responder afirmativamente
às seguintes questões que buscam aferir sua aderência a quatro atributos principais que ele
deve exibir, para obter um selo de qualidade, a saber: equilíbrio, previsibilidade, compreensão
e contribuição à vitalidade democrática.
Equilíbrio - Em que medida as decisões sobre a composição e alocação dos recursos que
compõem o orçamento, bem como a implementação das políticas nele contempladas, contribui
para o equilíbrio macroeconômico e para a distribuição dos frutos do progresso de forma mais
equilibrada na sociedade?
2
3
Em face das distorções que o processo orçamentário brasileiro foi acumulando ao longo
das últimas décadas, é impossível responder afirmativamente a qualquer das perguntas
formuladas, o que implica a existência de enormes barreiras ao alcance do objetivo de melhorar
a eficiência e a eficácia da gestão pública. Questões tais como o desequilíbrio na repartição dos
recursos, a irregularidade na execução orçamentária, a prevalência de uma visão setorial na
gestão das políticas públicas, a má qualidade dos projetos, e a ausência de garantias de
continuidade dos investimentos, impedem que o gestor governamental possa administrar com
competência seus programas. Não se trata de falta de conhecimento sobre o que precisa ser
feito, e sim de ausência de condições efetivas para uma eficiente gestão.
3
4
público, limitam o controle social, daí decorrendo baixo grau de accountability pública, e a
limitada contribuição do orçamento para a democracia.
4
5
5
6
A acomodação experimentada pelo processo orçamentário a uma nova realidade gerada pela
redemocratização do país teria, segundo a visão de alguns estudiosos da ciência política,
repercutido positivamente no relacionamento dos poderes Executivo e Legislativo, contribuindo
para a formação do que veio a ser denominado de ‘presidencialismo de coalizão’ 2. Vários estudos
que exploraram essa tese comprovaram a funcionalidade desse regime para a governabilidade
democrática. Não obstante, o fato apontado, a sustentação desse regime contribuiu para que o
foco da política da despesa pública se distanciasse de um debate estratégico sobre as prioridades
de alocação dos recursos públicos para se concentrar no processo de execução orçamentária e
não nas etapas de elaboração e aprovação do orçamento.
No entanto, a sintonia no alcance desses objetivos foi atropelada pelos eventos que
sucederam a promulgação do novo texto constitucional. A partir de 1999, a exigência de ajuste
das contas públicas provocou grande impacto no país. Para serem atingidas, as metas do
superávit primário demandaram sucessivos incrementos na carga tributária, uma vez que a
contenção de despesas esbarrava na forte rigidez de seus principais componentes. Ao mesmo
tempo, por se apoiar no aumento das contribuições sociais, o crescimento da carga tributária
2 Ver, por exemplo, Cheibub, Figueiredo e Limongi, 2009; Pereira e Muller, 2004.
6
7
A funcionalidade desse regime foi reforçada com a adoção de novos expedientes, como a
acumulação de ‘restos a pagar’, pois a negociação que trata da liberação de emendas
parlamentares passou a alcançar vários anos passados, além do corrente. Mas o peso do passado
sufocou o presente e ofuscou o futuro. A política da despesa pública se distanciou de uma visão
estratégica das prioridades nacionais para se concentrar no processo de execução orçamentária.
O ritual de elaboração e aprovação do orçamento e dos planos plurianuais tornou-se uma mera
formalidade, sendo substituído por regimes especiais de execução orçamentária para projetos
considerados prioritários pelo Executivo.
3 Para uma descrição desse efeito consultar Rezende et alii. O Dilema Fiscal: Remendar ou Reformar. Rio
de Janeiro, FGV, 2007.
7
8
8
9
Obtenção de Ideias e
suporte político e proposições de
social às mudanças aperfeiçoamento do
processo
orçamentário
Construção da
capacidade
operacional para
implementar as
ideias e proposições
de mudanças
9
10
Em decorrência, considera-se aqui como essencial que a estratégia em tela reflita: (1) os
atuais e prospectivos desafios enfrentados no processo de crescimento da produção econômica
do país; (2) os novos e prospectivos arranjos políticos e institucionais que influenciam e são
influenciados pela dinâmica orçamentária; (3) as novas demandas e pressões advindas dos
cidadãos, dos beneficiários dos serviços públicos, dos eleitores e dos contribuintes; e (4) os
imperativos práticos associados com a formulação e implementação de políticas públicas e com
a prestação dos serviços públicos que estejam alinhados com as questões anteriores.
Os caminhos a serem trilhados no rumo da reforma orçamentária tratam das cinco categorias
de mudanças a serem adotadas para que o orçamento exiba os quatro atributos essenciais a um
orçamento de qualidade que foram abordados anteriormente e sintetizados na figura1.
10
11
Oneram investimentos e
Limitações à utilização de exportações
Qualidade do créditos
Prejudicam a competitividade
financiamento
Incentivos do ICMS às nacional
exportações
Limita atividades de micro e
Carga tributária elevada pequenas e médias empresas
11
12
Como qualquer mapa, este se apoia no conhecimento acumulado sobre o tema, tanto o
propiciado por experiências internacionais quanto o advindo da experiência e de estudos e
análises sobre o caso brasileiro. Dadas as incertezas que cercam essa caminhada, as escolhas a
serem feitas para dar os primeiros passos requerem uma cuidadosa avaliação, e esses passos
precisam ser constantemente monitorados para permitir ajustes na direção e na velocidade do
avanço.
Comentários Finais
Nesse contexto, a escolha dos primeiros passos deve orientar-se pela necessidade de abrir
brechas nas limitações acima apontadas, mediante revisão dos procedimentos aplicados à
execução orçamentária, ao relacionamento entre os poderes e à identificação de iniquidades e
desperdícios, bem como apoiar-se em um debate que explore alternativas e identifique
resistências, de modo a alcançar o acordo necessário para o início da caminhada.
12
13
Referências
CHEIBUB, José Antonio; Figueiredo, Argelina e Limongi, Fernando. Political Parties and
Governors as Determinants of Legislative Behavior in Brazil´s Chamber of Deputies, 1988- 2006.
Latin American Politics and Society, 2009.
PEREIRA, Carlos e MUELLE, Bernardo. The Cost of Governing: Strategiv Behavior of the President
and Legislators in Brazil´s Budegetary Process. Comparative political Studies, v.37 n.7, Sept
2004.
13
14
14