Você está na página 1de 4

Apendicite

- É o tema mais importante dessa apostila, sendo o grande representante de cirurgia


nas provas de residência. Toda prova de cirurgia tem no mínimo uma questão de
apendicite. – O tratamento sempre é cirúrgico.

Fisiopatologia
- O apêndice é como se fosse um pequeno intestino. O problema é que é um intestino
em fundo cego. O apêndice só tem entrada, então quando entra um fecalito e obstrui
essa entrada, começa a aumentar a pressão intraluminal, com congestão do órgão.
- O apêndice é uma estrutura alongada e tubular, podendo ter de 2-20cm, e nada mais
é que a confluência das tênias do intestino (tênia antimesentérica, tênia mesentérica e
não mesentérica). Na cirurgia, as vezes o cirurgião vai palpando as tênias até chegar no
final para achar o apêndice.
- O apêndice é irrigado por um ramo da artéria ileocecoapendicocólica (conhecida
como íleocólica).
- O apêndice pode se posicionar de diversas formas, sendo mais comum as posições
pélvicas (30%), pré-ileal, retrocecal e retroperitonial.
- Além do fecalito, o apêndice também pode ser obstruído por corpo estranho, por
tomate (houve uma época que os cirurgiões contraindicavam comer tomate), por um
tecido linfoide que cresce dentro do apêndice (nas situações de alguma infecção viral).

Obstrução
- Lembrando a lei de Laplace, quando há obstrução da saída do apêndice pelo fecalito,
aumenta-se muito a pressão luminal, pelo diâmetro diminuído do órgão. A primeira
coisa que comprime é a saída de sangue, levando à congestão venosa.
- O apêndice começa a se ingurgitar até que começa a ocorrer isquemia, necrose e
perfuração.
- A transição entre a isquemia e a necrose é rápida, devendo a intervenção cirúrgica
ser realizada em até 48 horas.

Quadro clínico – Evolução clínica clássica (nesta sequência cronológica)


1 – Anorexia – Alguns cirurgiões até dizem que se o paciente não começar o quadro
com anorexia, não se trata de apendicite, mas isso não é verdade.
2 – Dor abdominal difusa – Só lembrando brevemente o surgimento embriológico dos
intestinos. Nós temos o intestino I (anterior) que vai até o duodeno no ângulo de
Treitz. O intestino II (médio), onde está contido o apêndice, vai do ângulo de Treitz até
a metade do colón transverso. O intestino III (posterior) vai da metade do cólon em
diante.
- As regiões de dor abdominal tem muito a ver com essa origem embrionária. P.ex.:
uma dor de úlcera perfurada é alta, pois é originada no intestino I. O apêndice que está
no intestino II, vai doer no meio da barriga, ao redor do umbigo. São nervos do
intestino mesmo (plexo esplênico) que conduzem essa dor inespecífica.
3 – Náuseas e vômitos – geralmente originada da dor, por fenômenos vagais.
4 – Dor em fossa ilíaca direita – Nesse momento, o apêndice cola na parede da fossa
ilíaca direita e o peritônio parietal começa a se inflamar com contiguidade da
inflamação do apêndice. Nesse momento a dor fica localizada. Essa dor começa cerca
de 12 horas após o início dos sintomas, que é o tempo que o apêndice demora para
inflamar e colar na parede.
5 – Febre e leucocitose – Ocorre depois de 24 horas, quando o paciente já está
começando a sepse. Isso é algo tardio. A gente não espera o paciente fazer um quadro
séptico para intervir, então é normal um paciente com apendicite com 10 mil
leucócitos, se precocemente diagnosticado.
6 – Plastrão/massa palpável – Ocorre devido à perfuração do apêndice e eliminação
de conteúdo para o peritônio, que forma um abscesso. Esse processo ocorre após 48
horas do início do quadro.

Sinais semiológicos (cai muito em prova).

1 – Blumberg – Descompressão dolorosa na FID. Na prática, hoje se diz “Blumberg +”


para descompressão dolorosa em todo abdômen, mas conceitualmente é um sinal
semiológico exclusivo de dor à descompressão em fossa ilíaca direita.
2 – Rovsing – A partir do colo esquerdo, se faz um ordenha do gás em direção ao lado
direito. Quando esse gás chega no ceco, ele distende o apêndice e isso causa dor. Na
prova cai como “Dor à direita na palpação à esquerda”. É muito específico e sensível
para apendicite.
3 – Lapinsky – Dor na FID quando o paciente ou o examinador levantam o membro
inferior direito.
4 – Lenander – Temperatura retal > Temperatura axilar em 1°C. Isso revela um
processo inflamatório intraperitoneal.
5 – Sinal do Psoas – Com o paciente deitado de lado, nós pedimos para realizar uma
hiperextensão passiva do membro inferior direito (é como se ele puxasse a perna para
dar um chute na bola de futebol) OU com o paciente em decúbito dorsal, pedimos
para que ele tente levantar a perna esticada enquanto nós fazemos uma força ativa
contra.
6 – Sinal do obturador – Com o paciente em deitado em decúbito dorsal, realizamos
um movimento de modo que a coxa do paciente fique na vertical e o resto da perna se
mantenha na horizontal (Como se fica quando está sentado na cadeira), após isso
realizamos a rotação interna da coxa (com os pés na direção para fora do corpo).
7 – Sinal de Dunphy – Dor na FID quando o paciente tossir, por aumento da pressão
intra-abdominal.
8 – Sinal do calcanhar – A gente pede para o paciente ficar na ponta dos pés e cair o
calcanhar no chão de modo súbito. Se sentir dor é sinal do calcanhar positivo.

Escala modificada de Alvorado (acurácia de 83% na vida e 100% na prova)


1 ponto – Dor que migra para fossa ilíaca direita.
1 ponto – Anorexia.
1 ponto – Náuseas/vômitos.
1 ponto – Descompressão brusca dolorosa em FID.
1 ponto – Temperatura > 37,5°C.
2 pontos – Dor à palpação em FID.
2 pontos – Leucocitose.
**1 Ponto – Desvio à esquerda – alguns autores consideram, outros não.
- Nos pacientes com mais de 7 pontos, está indicada a apendicectomia. Isso mesmo!
Apendicite é um diagnóstico clínico (pelo menos na prova), não dependendo de
imagem.
- Nos pacientes com 0-3 pontos, o diagnóstico é improvável. Devemos avaliar outras
causas.
- Nos pacientes com 4-6 pontos, há uma boa indicação de realizar tomografia, embora
alguns autores considerem observação por 12 horas.

Na dúvida, posso solicitar USG para todos?


- Até pode, mas é um exame examinador dependente, sendo ruim para pacientes
obesos. Quando for em condições ideias, com paciente magro, podemos observar o
famoso “sinal do alvo” na usg da apendicite.
- Na mulher em idade fértil o USG pode ser muito útil para descartar diagnósticos de
gravidez ectópica ou DIP.

Qual o melhor exame de imagem então?


- Tomografia computadorizada com contraste. Se tiver inflamação Peri-apendicular;
se o apêndice tiver mais de 7mm de diâmetro e se encontrarmos fecalitos na luz do
apêndice, o diagnóstico está fechado.

Então podemos pedir TC para todos?


- Não. Ele só está indicado em casos duvidosos (4-6 na escala de Alvorado) e em
pacientes idosos. Os pacientes idosos as vezes tem um quadro clínico atípico de
apendicite.

O tratamento é com laparotomia ou Videolaparoscopia?


- Nos EUA, se o cirurgião não operar uma apendicite por Videolaparoscopia, ele
responde processo.

Diagnósticos diferenciais.
1 – Linfadenite mesentérica – É comum de acontecer em crianças, após infecções
respiratórias virais. Assim como aparecem linfonodos grandes em região cervical,
também aparecem na região mesentérica. Lembrar que há bastante tecido linfoide no
íleo terminal e apêndice.
2 – Doença inflamatória pélvica – Aqui que a Videolaparoscopia é muito importante.
3 – Cisto ovariano – Aqui a USG transvaginal ganha grande destaque.
4 – Mittelschmerz - A dor de rotura folicular que ocorre todo mês, no meio do ciclo
menstrual. O líquido do folículo de Graaf quando cai no peritônio dói bastante.
5 – Gastroenterite e até litíase urinária, mas com uma boa anamnese e exame físico
se descarta.
6 – Divertículo de Meckel (anomalia congênita mais comum do delgado) – Na mucosa
desse divertículo, pode ter uma mucosa gástrica ectópica, com produção de ácido.
Quando esse ácido cai no íleo, essa porção do intestino não está preparada para isso,
como o estomago e acaba doendo. Por vezes a dor é muito intensa, simulando uma
apendicite aguda.
7 – Prenhez ectópica – Sempre deve ser um diagnóstico diferencial em mulheres em
idade fértil, com dor em andar inferior do abdome. Sempre devemos pedir B-HCG,
mesmo nas mulheres que falam que não tem relações sexuais. Normalmente a
prenhez ectópica é subaguda, mas nas mulheres com anemia devemos nos atentar
para prenhez ectópica tubária rota, que sangra muito e é até mais mortal que a
apendicite.

Tratamento
- O tratamento ouro é com a videolaparoscopia.
- Se liga o ramo apendicular da artéria íleocólica.
- Normalmente se faz um acesso umbilical, um supra púbico e uma no lado esquerdo.
Às vezes a gente estranha quando o paciente fala que operou de apendicite, mas tem
uma cicatriz do lado esquerdo. Isso acontece para se ter uma melhor visão da fossa
ilíaca direita.
- Quando se operava por laparotomia, primeiro era preciso achar o ponto de
Mcburney, que é achado no terço distal de uma linha imaginária, traçada entre a
cicatriz umbilical e a crista ilíaca. Nesse ponto que é da descompressão dolorosa do
Blumberg.
- São dois tipos de incisão. Podemos fazer uma incisão horizontal (transversa) ou
obliqua, que é um pouco melhor para abordagem. O nome dessas incisões vive caindo
em prova, então tem que saber.
- Incisão horizontal = Incisão de Davis Rockey
- Incisão obliqua = Incisão de Mcburney.

Você também pode gostar