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Experimentação no Ensino de Química: Caminhos e

Descaminhos Rumo à Aprendizagem Significativa

Cleidson Carneiro Guimarães

Este artigo trata de uma experiência com alunos da 1ª série do Ensino Médio, utilizando o laboratório como
espaço de investigação. A abordagem envolveu os educandos na tentativa de identificar a composição de um
material a partir das propriedades. A metodologia permitiu perceber a interferência do ensino formal quando
se pretende mediar aprendizagens por descoberta e em que medida a experimentação pode tornar a apren-
dizagem significativa.

experimentação, ensino de química, problematização

Recebido em 16/08/07, aceito em 20/03/09

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Muitas críticas ao ensino tradi- eficiente para a criação de problemas entre o ácido sulfúrico e o ferro” exige
cional referem-se à ação passiva reais que permitam a contextualiza- questionamentos: Observar o quê?
do aprendiz que frequentemente é ção1 e o estímulo de questionamentos A produção de gases ou a liberação
tratado como mero ouvinte das infor- de investigação. Nessa perspectiva, de energia?
mações que o professor expõe. Tais o conteúdo a ser trabalhado carac- Além disso, quando o experi-
informações, quase sempre, não se teriza-se como resposta aos ques- mento é realizado com a intenção
relacionam aos conhecimentos pré- tionamentos feitos pelos educandos de que os alunos obtenham os re-
vios que os estudantes construíram durante a interação sultados esperados
ao longo de sua vida. E quando não com o contexto cria- pelo professor, não
há relação entre o que o aluno já sabe do. No entanto, essa A experimentação há problema algum
e aquilo que ele está aprendendo, a metodologia não pode ser uma estratégia a ser resolvido, e o
aprendizagem não é significativa. deve ser pautada eficiente para a aprendiz não é de-
As informações transmitidas em nas aulas experimen- criação de problemas safiado a testar suas
sala respondem aos questiona- tais do tipo “receita reais que permitam próprias hipóteses
mentos e/ou conflitos de gerações de bolo”, em que os a contextualização ou encontrar incon-
anteriores ao aprendiz. Entretanto, aprendizes recebem e o estímulo de sistência entre sua
esses conflitos e questionamentos um roteiro para se- questionamentos de forma de explicar e a
nunca lhes foram acessíveis. Isso só guir e devem obter investigação. aceita cientificamen-
enfatiza uma visão aproblemática da os resultados que o te. Terá apenas que
ciência. Consequentemente, as aulas professor espera, tampouco apetecer constatar a teoria e desprezar as di-
expositivas respondem a questiona- que o conhecimento seja construído vergências entre o que ele percebeu
mentos aos quais os alunos nunca pela mera observação. Fazer ciência2, e o que acha que o professor espera
tiveram acesso. Então por que não no campo científico, não é ateórico. que ele obtenha. Segundo Izquierdo
criar problemas reais e concretos Ao ensinar ciência, no âmbito escolar, e cols. (1999), a experimentação na
para que os aprendizes possam ser deve-se também levar em considera- escola pode ter diversas funções
atores da construção do próprio co- ção que toda observação não é feita como a de ilustrar um princípio, de-
nhecimento? num vazio conceitual, mas a partir senvolver atividades práticas, testar
de um corpo teórico que orienta a hipóteses ou como investigação. No
Experimentação e o ensino de ciências observação. Logo, é necessário nor- entanto, essa última, acrescentam
No ensino de ciências, a experi- tear o que os estudantes observarão. esses autores, é a que mais ajuda o
mentação pode ser uma estratégia Expressões como “observe a reação aluno a aprender.

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Aprendizagem significativa por recepção. Conforme o autor, na Aprendizagem significativa e ações em sala
aprendizagem por recepção, o que de aula
A teoria da aprendizagem signifi- deve ser aprendido é apresentado O professor pode considerar, em
cativa é uma abordagem cognitivista ao aprendiz em sua forma final. En- aulas expositivas, as descobertas dos
da construção do conhecimento. quanto, a por descoberta, o conteúdo aprendizes para trabalhar significati-
Segundo David Ausubel (apud Morei- principal é descoberto pelo aluno. vamente os conteúdos pretendidos,
ra, 2006), “é um processo pelo qual Tanto uma quanto a outra pode ser pois ao trabalhar com as dificuldades
uma nova informação se relaciona, significativa, basta, para isso, que o e explicações dos alunos ao fenôme-
de maneira substantiva (não literal) e novo conhecimento se relacione aos no, ele aliará as concepções prévias
não arbitrária, a um aspecto relevante subsunçores. aos novos conhecimentos. Não se
da estrutura cognitiva do individuo” Apesar de a ideia parecer muito trata de trabalhar a química que só
(p. 14). A ideia parece muito sim- simples, as suas implicações são existe no livro e para a escola. Ao utili-
ples. Se a pretensão do educador é complexas. Primeiro, para ensinar zar a experimentação, associando os
ensinar significativamente, basta que significativamente, é necessário conteúdos curriculares ao que o edu-
este avalie o que o aluno já sabe e conhecer o que o aluno já sabe, cando vivenciou, o educador traba-
então ensine de acordo com esses embora o saber pertença à estrutura lhará de forma contextualizada, pois
conhecimentos. Portanto, o fator cognitiva do sujeito e seja de natureza não é o problema proposto pelo livro
isolado mais impor- idiossincrática. Isso ou a questão da lista de exercício,
tante, segundo Au- significa que não é mas os problemas e as explicações
subel (apud Moreira, Ao ensinar ciência, no um processo simples construídas pelos atores do aprender
2006), que influencia âmbito escolar, deve-se avaliar o que o sujeito diante de situações concretas.
na aprendizagem levar em consideração que sabe para em segui- A experimentação pode ser utili-
significativa, é aquilo toda observação é feita a da agir de acordo. No zada para demonstrar os conteúdos
que o aluno já sabe. partir de um corpo teórico entanto, é possível trabalhados, mas utilizar a experi-
Nesse processo, que orienta a observação. encontrar vestígios mentação na resolução de problemas
a nova informação dos conhecimentos pode tornar a ação do educando 199
interage com uma estrutura de conhe- existentes na estrutura cognitiva do mais ativa. No entanto, para isso, é
cimentos específicos, ao qual Ausu- sujeito que aprende. O enfrentamento necessário desafiá-los com proble-
bel chama de “conceito subsunçor”, de problemas pode ser um momento mas reais; motivá-los e ajudá-los a
estabelecendo ligações ou “pontes em que o professor pode encontrar superar os problemas que parecem
cognitivas” entre o que ele sabe e o tais vestígios, pois para enfrentar os intransponíveis; permitir a coopera-
que ele está aprendendo. Por isso, problemas, não basta ao aprendiz ção e o trabalho em grupo; avaliar não
pode-se dizer que a aprendizagem ter memorizado os conceitos, as in- numa perspectiva de apenas dar uma
significativa ocorre quando uma nova formações. É necessário transformar nota, mas na intenção de criar ações
informação ancora-se a conceitos o conhecimento original em ações que intervenham na aprendizagem
relevantes preexistentes na estrutura e expressá-lo em forma de lingua- (Hoffmann, 2001; Perrenoud, 1999;
cognitiva do aprendiz. Vale ressaltar gens oral ou escrita. Situações que Luckesi, 2003).
que não se trata de uma mera união, permitem ao educador ter indícios
mas um processo de assimilação daquilo que o aluno já sabe são Desafio proposto e questionamentos
em que a nova informação modifica aquelas que exigem transformações Pensando nessas premissas é
os conceitos subsunçores, transfor- do conhecimento aprendido. Essas que foi proposto aos alunos da 1ª
mando-os em conceitos mais gerais situações podem ser criadas a partir série do Ensino Médio um desafio
e abrangentes. de um problema real ou até de uma no início do ano letivo: Identificar, a
Em oposição à aprendizagem questão de prova escrita a qual não partir de parâmetros orientados pelo
significativa, está a aprendizagem pode ser do tipo que exige uma res- professor, qual(is) a(s) substância(s)
mecânica ou automática, como sen- posta direta e memorizável, mas sim que está(ão) presente(s) em reci-
do aquela em que a nova informação uma situação nova que exija trans- pientes contendo líquidos com com-
é aprendida sem que haja interação formação do conhecimento original, posições diferentes. Para superar
com informações existentes na estru- fazendo-o, por exemplo, reescrever o desafio, formaram-se grupos de,
tura cognitiva do sujeito. A informação com suas próprias no máximo, quatro
é armazenada de forma literal e arbi- palavras aquilo que Se a pretensão do componentes. Antes
trária, contribuindo pouco ou nada aprendeu ou apli- educador é ensinar de investigar, era ne-
para a elaboração e diferenciação car o conhecimen- significativamente, basta cessário saber o que
daquilo que ele sabe. to para explicar um que este avalie o que cada grupo estava
Segundo Moreira (2006), a distin- fenômeno novo ou o aluno já sabe e então indo pesquisar. Por
ção entre aprendizagem significativa tomar uma decisão ensine de acordo com isso, a turma foi pro-
e mecânica não deve ser confundida baseando-se num esses conhecimentos. vocada com alguns
com aprendizagem por descoberta e determinado saber. questionamentos:

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 O que você faria para identificar identificação da composição do cimento químico, que é dotado de
quais são os produtos químicos material que estamos usando? simbologia, significado e linguagem
presentes na água de uma la-  O que a literatura informa sobre própria, em que a construção dos
goa? o aquecimento dos materiais? significados aceitos pela comuni-
 Como você identificaria se um Ocorreram várias aulas temáti- dade de químicos, acontece pela
material é composto por apenas cas: “Densidade: uma propriedade interação entre professor e aluno. Tal
um tipo de substância ou por específica?”; “Ponto de fulgor: o atividade permite relacionar novas
várias? que é isso?”; “Liberação de luz pelo informações às que os aprendizes
 Como as propriedades es- material: pode nos já sabem, conduzin-
pecíficas podem nos ajudar ajudar a identificar a do o grupo rumo à
a identificar quais os tipos de composição?”; “So- A aprendizagem aprendizagem sig-
substâncias fazem parte de um lubilidade em água: significativa ocorre quando nificativa.
material? o que é isso? Pode uma nova informação Após o grupo ter
 Se o material escolhido for uma nos ajudar?”; “Acidez ancora-se a conceitos identificado as subs-
mistura, então como podemos e basicidade: o que relevantes preexistentes tâncias – a partir da
isolar as substâncias que a é isso e como o pH na estrutura cognitiva do comparação entre
compõe? pode nos ajudar?”; e aprendiz. os dados coleta-
 Em que medida as nossas pró- “Reações químicas: dos no laboratório
ximas atividades podem nos como podemos usá-las para identifi- e aqueles presentes em uma lista
ajudar a compreender o traba- car a presença de uma determinada contendo o nome de substâncias,
lho de investigação científica? substância?”. sua fórmula e suas propriedades
O trabalho abrange uma quantida- específicas –, deveriam produzir uma
Ações para superar o desafio de de conteúdos maior do que aquele monografia explicitando objetivos,
O próximo passo do desafio pretendido numa unidade de estudo. metodologia, dados coletados e
proposto foi a visita ao laboratório, Portanto, o projeto se estendeu ao apresentar uma discussão teórica. A
200 mas antes disso, os educandos longo das duas primeiras unidades e realização dessa tarefa foi facilitada
receberam orientações sobre os os dados coletados serviram para tra- pelo resgate dos relatos de cada
cuidados no manuseio dos materiais balhar os demais assuntos ao longo aula temática, pois neles estavam
que seriam utilizados; informes sobre do segundo semestre do ano letivo. presentes os dados e os caminhos
os riscos do trabalho nesse local; Diante disso, é necessário considerar percorridos.
estabelecimento de a atemporalidade do
regras de conduta; projeto e saber que Avaliando o processo
e socialização das O fator mais importante que o trabalho de inves- Para compreender o que os alu-
questões. No labora- influencia na aprendizagem tigação é muito len- nos afirmam sobre a atividade, foi
tório, existiam vários significativa é aquilo que o to inicialmente, mas sugerida uma avaliação por meio da
balões volumétricos aluno já sabe. permite avançar as qual pudessem expressar o que con-
contendo diferentes discussões posterio- sideram erros e acertos da metodolo-
líquidos, e a equipe deveria escolher res, “compensando” o tempo gasto gia adotada e apresentar sugestões.
apenas um para realizar suas inves- com a investigação. Segundo eles, as aulas expositivas
tigações. Para evitar acidente, cada Ao final de cada aula no labo- são fundamentais durante e após
balão volumétrico foi identificado ratório, os aprendizes produziram as investigações no laboratório, pois
com um número que servia como um relato no qual registraram as sem elas “o conteúdo ficaria solto”,
um código para o professor. Assim atividades e as informações obti- dando a sensação aos aprendizes
era possível identificar a composição das. Essa atitude permitiu utilizar a de que o conteúdo não tivesse sido
dos materiais a qualquer momento. produção textual como ferramenta trabalhado. Isso significa, segundo
As aulas seguintes foram te- pedagógica, pois com ela é possível dizem os alunos, que os melhores
máticas no intuito de orientar as resgatar em sala o que cada grupo resultados na aprendizagem ocorrem
investigações. Foram feitas algumas afirma ter aprendido, suas prováveis quando há aulas de reflexão conco-
mediações como, por exemplo: “Hoje dúvidas e os dados coletados. Para mitante e após a investigação.
vamos estudar se o nosso material isso, basta solicitar que cada grupo Os educandos expressaram crí-
tem ponto de ebulição fixo”. Para leia em voz alta o texto produzido. ticas quanto à estratégia utilizada,
nortear a busca, a turma era instigada Nesse momento, é muito oportuno principalmente porque foi diferente
com questionamentos do tipo: utilizar a aula expositiva para redefinir daquelas que estão habituados
 É possível aquecer um material conteúdos, tirar dúvidas e sistemati- a conviver ou observar em outras
sem que haja aumento da tem- zar os conceitos trabalhados, numa escolas. Outras porque a estratégia
peratura? perspectiva de construir significados, era nova e estava sendo construída
 Por que os pontos de fusão usando uma forma especifica de ver pela interação do professor com seus
e ebulição podem auxiliar na e interpretar fenômenos: o conhe- alunos. No entanto, de forma geral,

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percebeu-se um significativo envol- só discutindo em sala, já estaríamos titua a busca de explicações convin-
vimento da turma tanto na investiga- bem adiantados.” centes pela fé na palavra do mestre,
ção, análise de dados e construção “Por que fazer monografia? Isso pode ser tudo menos um verdadeiro
da monografia quanto nas aulas pos- cai no vestibular?” ensino da ciência. É antes de mais
teriores ao trabalho, em que se resga- “Professor, se ao invés de inves- nada um ensino de obediência cega
tou os dados coletados para discutir tigar estivéssemos dando assunto incorporado numa cultura repressiva.
conteúdos como tabela periódica, e resolvendo lista de exercício, não (p. 108)
ligação química e adiantaríamos o as-
funções inorgânicas. sunto?” Considerações finais
Ao estudar esses as- Na aprendizagem por “Acho que só de- Uma experiência dessa natureza
suntos, pretendeu-se recepção, o que deve ser veríamos ir ao labo- demanda tempo e o apoio dos ato-
mostrar que as pro- aprendido é apresentado ao ratório após ver a res que compõem a escola (direção,
priedades por eles aprendiz em sua forma final. teoria.” coordenação, pais e alunos). O tra-
estudadas depen- “Ficar fazendo balho nas primeiras unidades é lento,
diam da composição da substância pergunta só faz confundir a gente.” porém se observa que a utilização do
(daí a necessidade de estudar os “Qual a relação entre este tra- conteúdo como ferramenta de resolu-
elementos químicos) e do tipo de balho e aquilo que é cobrado no ção de problemas concretos facilita a
ligação entre eles. vestibular?” compreensão das abstrações neces-
Outra dificuldade, apontada pe- Acredita-se ser necessário dar sárias à compreensão do conheci-
los aprendizes, foi quanto à utiliza- oportunidade para que os estudantes mento químico expresso numa forma
ção dos livros didáticos, os quais possam se expressar e, para isso, o de linguagem própria e incomum ao
apresentam o conteúdo de forma professor precisa ter abertura para cotidiano dos estudantes.
fragmentada, sem um contexto e ouvir as críticas e convicção no que Parece impossível realizar mais
que favorece a aprendizagem me- está fazendo para contra-argumentar, de um projeto dessa dimensão ao
cânica. O livro que demonstrou ser reforçando para os estudantes a longo de um mesmo ano. Todavia,
potencialmente significativo à nossa importância da re- não demonstrou ser 201
proposta foi Química para o ensino alização do traba- necessário, afinal ao
médio de Eduardo Fleury Mortimer e lho e, inclusive, as É necessário transformar o projetá-lo, pensou-
Andréa Horta Machado (2002). Nesse implicações futuras. conhecimento original em se em sua atempo-
contexto, o que os alunos apontaram O educador precisa ações e expressá-lo em ralidade. Ou seja,
como dificuldade, o professor clas- estar atento ao fato forma de linguagens oral ou os dados coletados
sifica como conquista, pois a escola de que o contexto de escrita. ao longo do traba-
não adota um livro didático. Então outras escolas é dife- lho foram retomados
os aprendizes puderam usar livros rente daquele gerado por sua ação constantemente ao longo do ano leti-
didáticos diferentes e pesquisas na pedagógica, e isso interfere na forma vo no intuito de trabalhar os assuntos
internet, exercitando, explicitamente, como os estudantes veem o trabalho. das unidades posteriores a partir das
o aprender a aprender (Delors, 2001) Quando se pretende inserir uma informações obtidas no laboratório.
e, com isso, emitir pareceres sobre estratégia pedagógica que fuja às Percebeu-se que a investigação foi
diferentes abordagens do mesmo práticas comuns, é necessário ficar um processo lento, mas que a coleta
assunto. Naturalmente, outros pilares, atento ao desafio de aliar as meto- de dados de cada grupo deu sub-
apontados por Delors (2001), como dologias tradicionais às novas pro- sídios e facilitou o trabalho com os
aprender a fazer e a ser fizeram parte postas de construir o conhecimento, conteúdos subsequentes. Isso não
do trabalho. Afinal, as ações em labo- caso contrário o trabalho pode tender significa que se deva abandonar o
ratório foram em grupo e o respeito às ao fracasso. Essa tendência só será laboratório, mas trabalhar todos os
regras e o cuidado consigo e com os percebida e combatida se o educador assuntos do ano a partir da investi-
outros foi fundamental para proteger estiver aberto às outras perspectivas gação inviabiliza qualquer proposta
a si mesmo e os colegas. de avaliar e não abandonar provas devido à quantidade de conteúdos
escritas, resolução de listas de existente no currículo. Concordamos
Resistência ao projeto exercício, aulas expositivas, cobrar com Moreira (1999) quando afirma
Durante o processo, surgiram empenho dos educandos e promo- que seria impossível e desnecessário
resistências por parte dos aprendi- ver reflexões sobre a natureza do ao educando redescobrir todos os
zes expressas em algumas falas dos trabalho científico como nos aponta conteúdos da grade curricular e que
estudantes, tais como: Schatzman (apud Medeiros e Bezerra “o que é descoberto torna-se signi-
“Professor, a outra escola já está Filho, 2000): ficativo da mesma forma que aquilo
em tabela periódica, quando é que A ciência não pode ser ensinada que é apresentado ao aprendiz na
nós vamos trabalhar esse assunto?” como um dogma inquestionável. Um aprendizagem receptiva” (p. 16). Para
“Nós estamos perdendo tempo ensino da ciência que não ensine a isso, basta que haja relação entre
indo ao laboratório. Se estivéssemos pensar, a refletir, a criticar, que subs- aquilo que o aprendiz já sabe e o que

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está aprendendo. por eles demonstrados e compará-los completamente diferente de fazer
O uso do laboratório pode esti- aos aceitos cientificamente. ciência no campo científico. O que
mular a curiosidade dos alunos, mas é ensinado na escola são conceitos
para isso, é necessário que estes Notas construídos em outro ambiente: o da
sejam desafiados cognitivamente. 1. Estamos considerando contex- ciência. Entretanto, não podemos
Muitas vezes, a falta de estímulo de- to numa perspectiva de relacionar os dizer que aquilo que é ensinado
monstrado pelos alunos poderá ser conteúdos estudados ao que está na escola é mera cópia da ciência.
um reflexo do tipo de aula utilizada próximo da experiência sensível do O conhecimento escolar tem uma
pelo professor. Conforme observa- educando. Naturalmente, à medi- epistemologia própria. No entanto,
mos neste trabalho, a mera inserção da que os conceitos químicos são este texto não pretende se aprofundar
dos adolescentes em atividades construídos, há um distanciamento nesse assunto.
práticas não é fonte de motivação. É da experiência sensível. Isso significa
necessário que haja o confronto com que o contexto se torna mais abstrato,
Cleidson Carneiro Guimarães (cleidsonguimaraes@
problemas, a reflexão em torno de visto que será muito mais próximo gmail.com), engenheiro civil pela Universidade Es-
ideias inconsistentes por eles apre- dos significados e das linguagens tadual de Feira de Santana, é mestrando em Ensino,
sentadas. Para isso, deve levar-se em próprias da química. Filosofia e História das Ciências pela Universidade
consideração os modelos alternativos 2. Ensinar ciência na escola é Federal da Bahia.

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Abstract: Experimentation in chemistry education: Roads and detours towards a meaningful learning. This article is about an experience with pupils of the first year of high school using the laboratory
as a research space. The approach involved the learners in the attempt to identify the composition of a material from the properties. The methodology allowed noticing the interference of formal
education when it is intended to mediate learning by discovery and in which way the experimentation can become a meaningful learning.
Keywords: experimentation, chemistry education and problem-solving.

VII Evento de Educação em Química


O VII Evento de Educação em Química (EVEQ) será realizado no Instituto de Química da
UNESP em Araraquara (SP), no período de 27 a 30 de agosto de 2009, com o tema Materiais
Didáticos: suas aplicações e avaliações.
O evento busca trazer informações referentes ao cenário do ensino de Química, buscando
discussões de ideias e projetos a partir dos minicursos, oficinas, palestras, mesas redondas
e apresentação de trabalhos.

Informações adicionais: http://www.iq.unesp.br/EVEQ


Contato: eveq@iq.unesp.br
Luciana Caixeta Barboza (editoria QNEsc)

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