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INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 2
NOSSAS LENTES ........................................................................................................ 3
Sobre o EGC/UFSC ..................................................................................................................... 3
Sobre o Instituto Stela ............................................................................................................... 6
4 C’s - FUNDAMENTOS.............................................................................................. 8
1º C: Convergência .................................................................................................................... 8
O impacto da convergência nos atores de CTI .................................................................................. 10
2º C: Conhecimento: três epistemologias ............................................................................... 11
EGC/UFSC: Três paradigmas em um mesmo Programa de Pós-Graduação ...................................... 15
Ciclo de conhecimento: ponto focal para a construção interdisciplinar do EGC/UFSC ..................... 18
Uma definição de conhecimento para o EGC/UFSC .......................................................................... 19
Tipos de conhecimento científico ...................................................................................................... 22
3º C: Coprodução .................................................................................................................... 25
Ciência e Coprodução ........................................................................................................................ 26
Uma Taxonomia para a Coprodução ................................................................................................. 28
4o C: Commons digitais ........................................................................................................... 30
Commons ........................................................................................................................................... 30
Conhecimento como Commons ........................................................................................................ 33
Commons digitais .............................................................................................................................. 34
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PACHECO, R. C. S.. Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: Fundamentos e Visões. Em
Interdisciplinaridade: Universidade e Inovação Social e Tecnológica. Organizado por Joana Maria
Pedro e Patrícia de Sá Freire, Curitiba, CRV., pp. 21-62. 2016.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 2
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
INTRODUÇÃO
Em maio de 2005, a convergência de objetivos e o planejamento institucional
colocaram três eventos simultaneamente na Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC): (1) o II SIIEPE - Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão2; (2) o Encontro Fórum de Pró-reitores de Pós-Graduação e
Pesquisa (FOPROP) da Região Sul; e (3) a Jornada de Coprodução Digital3.
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O SIIEPE e o encontro da Região Sul de um evento nacional organizado pela CAPES para tratar da
interdisciplinaridade na educação superior.
3
Evento que organizamos com a FAPESC em que foram apresentados os resultados do Programa
Estruturante II de FAPESC e FINEP. A Rede do Estruturante II desenvolveu protótipo integrado de
hardware e software e o evento promoveu uma gincana com estudantes sobre a aplicabilidade desse
protótipo em diversos setores.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 3
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
NOSSAS LENTES
Em discussão de temas interdisciplinares é recomendável que esteja explicitado o
ponto de vista pelo qual os conteúdos discutidos são percebidos. No caso deste
capítulo, nossas lentes têm dois referenciais institucionais: o acadêmico-científico,
desenvolvido ao longo da última década no EGC/UFSC e o de pesquisa e inovação,
desenvolvido junto ao Instituto Stela, organizações em que tivemos a oportunidade de
participar da concepção e sermos protagonistas da fundação, respectivamente. Cada
uma oferece uma lente, que têm criado as diferentes diplopias com que temos
estabelecido nossa trajetória profissional (PACHECO, 2012).
Sobre o EGC/UFSC
Em maio de 2014, o EGC/UFSC completou 10 anos de existência. Em pouco mais de
uma década, professores oriundos de 10 departamentos vinculados a sete centros da
UFSC têm realizado a pesquisa e a formação, concebendo o conhecimento como um
fator gerador de valor (PACHECO, FREIRE e TOSTA, 2011). Na Figura 1, ilustra-se essa
cronologia, em três grandes fases, conforme as visões da sociedade industrial, de
informação e de conhecimento.
Como se pode verificar na Figura 14, o EGC tem gênese no Programa de Pós-Graduação
em Engenharia de Produção da UFSC (PPGEP/UFSC). Criado no final dos anos 1960, até
meados dos anos 1980, o PPGEP/UFSC concentrou-se na formação e na pesquisa da
Engenharia de Produção com ênfase na visão industrial. Em 1985, o PPGEP/UFSC
desenvolveu um novo planejamento estratégico, já prevendo as mudanças que
implicariam as TICs no papel dos intangíveis na cadeia de geração de valor. Esta etapa
está fortemente associada à transição da sociedade industrial para a sociedade da
informação. Nesse período, entre as diversas realizações do PPGEP/UFSC no plano dos
intangíveis, destacaram-se sua participação no Programa Nacional de Qualidade,
Gestão Ambiental e, especialmente, a concepção e criação de seu programa de
educação à distância (EaD), com o apoio da CAPES.
No início dos anos 2000, o PPGEP/UFSC chegou a uma estrutura excessiva para um
único programa de pós-graduação, teve questionadas suas práticas de EaD em pós-
graduação stricto senso e, especialmente, sua própria identidade enquanto lócus nas
Engenharias III da CAPES5.
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A foto na figura foi tirada no ano de 2003, nas instalações do Grupo Stela, com a presença de parte do
grupo original de concepção do EGC/UFSC. Estão presentes Gregorio Varvakis (no primeiro plano, à
esquerda), Neri dos Santos (ao lado de Gregório), Roberto Pacheco (em frente à janela), Paulo Selig
(ao lado esquerdo de Roberto) e José Leomar Todesco (no canto direito).
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O PPGEP/UFSC chegou a ter 12 áreas de concentração e mais de 100 docentes. O Programa chegou a
solicitar a CAPES sua divisão em três programas de pós-graduação: um centrado na engenharia
industrial, outro em tecnologias e engenharia e outro na gestão de tangíveis e intangíveis na
engenharia. Sua solicitação foi negada, mas a reflexão foi essencial na gênese de uma proposta que
originou o EGC.
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Há um fato histórico que ilustra a dificuldade deste processo de criação de unidades
multi/interdisciplinares diante da cultura disciplinar da universidade: como foi autorizado após o
calendário acadêmico da graduação e da pós-graduação já estar vigente na universidade e por não ter
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 5
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
Nesse período, uma das lições aprendidas está na necessidade de que a formação,
mesmo de pós-graduação, contemple a parceira com os diferentes atores da
sociedade. Uma característica do EGC é justamente a constante busca de coprodução
com parceiros empresariais, governamentais e sociais, sempre que o desafio envolver
o papel do conhecimento como fator de geração de valor.
um referencial departamental administrativo para se basear, o EGC só conseguiu uma sala para
realizar sua aula inaugural no Núcleo de Desenvolvimento Infantil (NDI), da UFSC, que abriu seu
auditório para o primeiro momento acadêmico do programa que nascia.
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Esses dados têm como fonte pesquisa o acompanhamento de egressos do EGC/UFSC (ZIMMER, P. ;
SELIG, P. ; LUZ FILHO, 2013).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 6
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
Assim como o EGC/UFSC, o Instituto Stela tem sua gênese no PPGEP/UFSC. Em seu
caso específico, no Grupo Stela, criado em 1995, para virtualizar os processos de
secretaria do PPGEP/UFSC e, com isso, viabilizar a estrutura administrativa de seu
Programa de EaD9.
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A ordem com que estas lentes se apresentam tem relação com a aderência do capítulo à missão de
cada instituição. O Instituto Stela é um centro de pesquisa e, especialmente, de tecnologia, cuja
reflexão científica em níveis paradigmáticos não tem a prioridade de agenda com que ocorre em um
programa de pós-graduação.
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Entre 1988 e 2000, além de adquirir nossa própria formação no mestrado e doutorado do
PPGEP/UFSC, tivemos a oportunidade de participar de grupo de pesquisa que combinava os
aprendizados das áreas de pesquisa operacional e, principalmente, inteligência aplicada na concepção
e criação de sistemas de informação em CT&I, criados no âmbito do programa estratégico de EaD do
PPGEP/UFSC. Esta virtualização da secretaria do Programa ocorreu na chamada Plataforma Stela, que,
em 1996, já integrava completamente os sistemas da CAPES (Coleta) e do CNPq (BCurr e Minicurrículo)
no âmbito do PPGEP/UFSC. Essas experiências foram descobertas pelo CNPq, que contratou junto ao
grupo a concepção e desenvolvimento do Diretório de Grupos de Pesquisa no Brasil (em 1997) e,
posteriormente, da Plataforma Lattes (entre 1998 e 2004).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 7
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
Entre 1997 e 2004, o Grupo Stela foi responsável pela concepção, desenvolvimento,
implantação e manutenção da Plataforma Lattes, do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em 2002, já estava clara a
necessidade de se criar uma organização que, ao mesmo tempo, mantivesse a missão
e competência do Grupo Stela em desenvolver inovação em sistemas de informação e
conhecimento e, também, tivesse a condição de fazê-lo com qualidade de entrega final
de sua inovação. Foi quando decidimos fundá-lo na condição de uma organização
privada sem fins econômicos dedicada à P&D em tecnologias da informação e
comunicação, sob fundamentos da engenharia do conhecimento.
Essas ações e sua trajetória de projetos e produtos têm trazido para o Instituto Stela
reconhecimento internacional (ex. Prêmio BID/2007), nacional (três prêmios FINEP) e
regional (prêmios Stemmer). De forma geral, no entanto, as soluções criadas pelo
Instituto (ex. Plataforma Lattes/CNPq, Portal Inovação/MCTI-ABDI-CGEE; Portal
SINAES/INEP-MEC, Plataforma Aquarius/MCTI) são mais conhecidas do que o próprio
Instituto. Um exemplo é a Plataforma Lattes, reconhecida como uma das mais
importantes bases nacional de dados sobre pesquisa e CT&I (LANE, 2010).
Para efeitos deste capítulo, o relevante aqui é destacar o fato de que nossas lentes
combinam a visão acadêmica da universidade com a missão de P&D aplicada, com
impacto direto em inovação de uma instituição privada de P&D. Com essas lentes,
procuramos trazer visões complementares das óticas acadêmica, avaliativa (ex.
PACHECO, 2012), de pesquisa e de empreendedorismo inovador.
4 C’s - FUNDAMENTOS
Uma vez explicitados nossos referenciais formados nas trajetórias acadêmica, técnico-
científica e de inovação, discutimos, a seguir, as bases conceituais de nossas reflexões
atuais junto ao coletivo de pesquisadores e especialistas com quem atuamos na última
década. Tratam-se de 4 conceitos, coincidentemente todos iniciados pela letra “C”:
convergência, conhecimento, coprodução e commons.
1º C: Convergência
Segundo Jenkis (2006), a convergência de mídias está nos levando a uma “renascença
digital”, com impactos sociais, políticos, econômicos, legais, produtivos e culturais.
Essa nova renascença pode ser percebida, por exemplo, pelo surgimento de diferentes
prefixos, todos relacionados a diferentes formas de convergência, conforme
representado na Figura 3 a seguir.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 9
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
A esses prefixos a era digital acrescenta dois típicos dos tempos presentes: “crowd” e
“open”. O prefixo crowd denota múltiplo, mas em grande quantidade (multidão). Na
era digital, o significado de um agrupamento de muitos indivíduos é ampliado por
sufixos que identificam seu objetivo. Quando a meta é o financiamento coletivo
denomina-se crowdfunding (Mollick, 2014), que pode ser aplicado a diversas
atividades, tais como financiar um startup empresarial, um evento artístico ou cultural
ou, ainda, uma pessoa com problema familiar ou de saúde (Sisler, 2012). O mesmo
princípio se aplica a diversas outras instâncias de produção coletiva, como a promoção
de inovação (crowd innovation – Wang, 2013), a resolução de problemas
(crowdsourcing – Brabham, 2008), ou a realização coletiva de trabalhos profissionais
(crowd working – Kittur, et. al., 2013).
Para autopoiéticos, essa visão aproxima-se do oposto, pois, nessa escola, uma
organização é lócus de relações humanas, cultura e exercício de valores sociais que só
humanos são capazes de realizar, o que torna seu coletivo um organismo vivo (e não
uma máquina de processamento de informações).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 15
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
Tanto no âmbito das áreas como em suas interfaces, um segundo ponto de referência
foi essencial: o ciclo de conhecimento, conforme descrito a seguir.
Embora reconheçamos aqui a trajetória adotada, consideramos que, após mais de uma
década de pesquisas e avanços conjuntos, é chegado o momento de se explicitar uma
definição para conhecimento, como objeto de pesquisa e formação do EGC/UFSC. Esta
definição deve contemplar as três epistemologias que deram bases para o Programa e
representar um avanço em sua própria identidade interdisciplinar. Nesses dois últimos
anos, temos procurado tratar desse desafio, com resultados descritos na seção a
seguir.
Conflitos conceituais e de visão de mundo como esses costumam ser tratados de três
formas: (a) de modo disciplinar (ex. debates entre as correntes científicas e confronto
entre as visões de mundo e teorias, para se verificar a que mais se aproxima de
explicar a realidade); (b) de modo multidisciplinar (com a convivência entre as visões
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 20
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
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Meta-conceitos, também chamados “conceitos genéricos”, são conceitos que definem sistemas de
valores para se aplicar conhecimento de diferentes domínios e que podem ser instanciados pela
atribuição de valores exatos para um detentor de conhecimento específico (PAQUETTE, 1999).
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Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 22
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
proposta reconhece que esse valor tem diferentes naturezas (científico, econômico,
social e cultural).
Por outro lado, no que se refere aos alunos do Programa, esperamos que a definição
sirva como referencial de estudos e, principalmente, ajude-os a identificar a visão
epistêmica que melhor explica cada trabalho pesquisado (dado que a multiplicidade de
escolas e definições causa ansiedade e dúvidas no processo de aprendizagem).
Tipo de
Definição
Conhecimento
É conhecimento que resulta da soma linear de uma ou mais unidades disciplinares
Multidisciplinar
de conhecimento relevantes em um problema específico (Gilbert, 1998).
É conhecimento cujo significado é criado pela integração de conceitos e ideias de
Interdisciplinar
diferentes disciplinas (Shin, 1986).
Transdisciplinar É conhecimento resultante da coprodução de múltiplos atores, que ultrapassam os
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Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 23
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Como lembra Dabars (2008), a percepção da ligação entre convergência e interdisciplinaridade
começa a se difundir a partir de meados dos anos 2000. O autor lembra que, em 2004, a Revista
Science dedicou seu editorial à dimensão epistemológica da interdisciplinaridade e ao conceito de
convergência, destacando o papel proeminente que as ciências da vida, da nascente unificação de
disciplinas científicas e a convergência de tecnologias, destacando a unificação de conhecimento, em
contraposição à sua fragmentação, como uma das mais importantes transformações no
desenvolvimento das ciências da vida (DABARS, 2008).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 24
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Segundo Elinor Ostrom, “o conhecimento surge de um processo condicional de idas e vindas entre a
observação empírica e o árduo trabalho de sua formulação teórica” (OSTROM, 1990, p. xvi). O
conhecimento transdisciplinar reconhece que nessas duas dimensões – empírica e teórica – há não só
distintas naturezas, mas diferentes atores de conhecimento, igualmente importantes na ação coletiva.
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
3º C: Coprodução
Em ciência, a expressão “coprodução” surgiu com os trabalhos de Vicent Ostrom e
Elinor Ostrom, no início da década de 70. Esses pesquisadores buscavam explicar
fenômenos como o que ocorrera em Chicago, onde a polícia havia modificado o
sistema de policiais de bairro por processo formal de atendimento à segurança e,
como consequência, deu-se um aumento no índice de criminalidade. A análise do casal
Ostrom mostrou que, no modelo anterior, havia um sistema coletivo que ajudava a
“coproduzir” a segurança (i.e., guardas e comunidade formavam uma inteligência
coletiva em torno da segurança, que foi quebrada pelo novo modelo). Essas
descobertas deram origem a novos programas de relação cidadãos-governo, como o
bem-sucedido programa americano denominado “911” e o conceito de segurança de
bairros, ambos casos em que sociedade e governo se unem no cumprimento do
interesse social.
Ciência e Coprodução
Em ciência a coprodução cidadão-governo tem sua correspondente nas relações
cientistas-sociedade e cientistas-governo. Nessa visão, Schuttenberg e Guth (2015)
definem coprodução como sendo a pesquisa participativa e a governança colaborativa
que fundamenta ações e decisões segundo o melhor conhecimento disponível. As
autoras partem da premissa de que todos os atores têm a capacidade de resolver o
problema quando houver representação, capacidade, confiança e comprometimento
com o aprendizado.
2014)
CCT para o benefício da sociedade consiste em interações escalonáveis
Convergência de e transformadoras entre disciplinas, tecnologias, comunidades e
domínios da atividade humana, aparentemente distintos, que visam
Conhecimento e compatibilidade, sinergia e integração e, nesse processo, criam valor e
Tecnologia (CCT) se ampliam para alcançar objetivos comuns (ROCO e BAINBRIDGE,
2013).
Quadro 5: formas de coprodução em ciências.
Fonte: do Autor
Nos dois primeiros casos, a coprodução é viabilizada por laboratórios virtuais, redes de
pesquisa com objetivos comuns a vários grupos de pesquisa. Quando além de
objetivos os grupos compartilham infraestrutura científica e atuam em larga escala há
a chamada Big Science, como no caso dos grandes telescópios multinacionais
compartilhados entre vários grupos de pesquisa.
O conceito de Citizen Science, por sua vez, guarda relação com uma das visões do
conhecimento transdisciplinar de FRODEMAN (Quadro 4). Nesse tipo de projeto, a
sociedade é convidada a fazer parte do processo científico, com participação direta no
processo de pesquisa cientifica (ROTMAN et al., 2014). Há diversas origens para
motivar a sociedade a colaborar, incluindo a participação na tomada de decisão (ex.
priorização de investimentos em ciência), a ajuda na coleta e tratamento de dados e a
formação de futuros cientistas13.
13
Entre os projetos que se destacam nessa visão está o Um exemplo é o Programa Scistarter – Portal
americano (http://scistarter.com/index.html) com mais de 400 projetos em curso – e o Citizen Science
Central (http://www.birds.cornell.edu/citscitoolkit/) – Portal financiado pela National Science
Foundation para apoiar a criação de projetos de citizen sciences.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 28
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
sua atividade coletiva. Para tal, mais do que colaboração (necessária à explicitação de
responsabilidades), a ação coletiva deve produzir resultados passíveis de propriedade
intelectual aos integrantes do grupo produtor.
4o C: Commons digitais
O quarto e último “C” que acrescentamos aos construtos do modus operandi
contemporâneo da educação superior, ciência, tecnologia e inovação, denominamos
commons digitais. Para compreendê-lo, é necessário, primeiro, entender sua gênese
que, a exemplo da coprodução em ciência, também se deve a Elinor Ostrom.
Commons
Após duas décadas de pesquisas em comunidades que compartilhavam bens
produzidos (ex. bibliotecas públicas) ou naturais (ex. pastagens e áreas de pesca),
Ostrom observou que, respeitados princípios gerais de uso do bem comum, a gestão
coletiva dos recursos se mostra mais sustentável do que a proporcionada por modelos
de propriedade privada ou governamental. A esses bens coletivos a pesquisadora
denominou commons - recursos compartilhados por indivíduos e, por essa razão,
sujeitos a conflitos sociais (HESS e OSTROM, 2007, p. 3). Seu trabalho, laureado com o
Prêmio Nobel de Economia de 2009, inclui a identificação de 8 (oito) princípios de
commons sustentáveis, conforme indicado na Figura 8.
15
BATISTA, Kedma. Mensurando a qualidade da colaboração científica. Tese de Doutorado em
andamento. Orientador: Roberto C. S. Pacheco. Programa de Pós-Graduação em Engenharia e
Gestão do Conhecimento. Universidade Federal de Santa Catarina. 2015.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 31
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
A análise dos casos revela uma ampla gama de diferenças na forma como
apropriadores de commons estabelecem regras, com diversas variantes regulatórias
quanto ao uso da propriedade16. Por outro lado, além das diferenças operacionais,
Ostrom identificou semelhanças fundamentais: o compartilhamento de bens comuns
ocorre em ambientes complexos e incertos. Assim, as comunidades estabelecem
regras e ações que visam preservar seu futuro, mantém memória e aprendizado
16
OSTROM (1990, p. 89) exemplifica essas diferenças com casos de uso da terra, em que as regras
incluem a definição comunitária (montanhas japonesas), patriarcal (montanhas suíças), autoridade
por parcela de propriedade (Espanha oriental) ou contratos de longa duração sobre as
responsabilidades de uso (Filipinas).
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
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Conflitos fazem parte da própria definição de commons. Assim, ao invés de prorrogados ou evitados
devem ser enfrentados, antes que se tornem confrontos (ou seja, virem enfrentamentos entre as
partes, sem referência de bem comum).
18
A relação de princípios de Ostrom era considerada por sua autora uma relação especulativa. A autora
não acreditava ser possível ter uma relação necessária e suficiente para assegurar uma
institucionalidade, uma vez que essa requer a vontade de seus integrantes (OSTROM, 1990, p. 229).
Nossa ampliação é o registro de reflexões sobre nossa própria experiência com commons digitais,
concebidos e desenvolvidos para plataformas de governo eletrônico, em que recompensas
(visibilidade e reconhecimento) tendem a funcionar melhor do que sansões e em que a participação
na alteração de regras deve trazer o sentido de coprodução para seus integrantes (como ocorre com
os padrões de dados em plataformas de governo aberto).
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Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 33
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
Por outro lado, essas distinções não removem os conflitos sociais no uso do
conhecimento que são observados em recursos naturais e bens produzidos. Hess e
Ostrom (2007, p. 10) discutem um caso bem característico de sistemas de educação
superior e inovação: as relações universidade-empresa, em que as partes interessadas
- empresários e academia - devem criar formas de resolver uma gama de conflitos (ex.
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
Commons digitais
Ao combinarmos o histórico de pesquisas do EGC/UFSC com o portfólio de concepções
e desenvolvimentos do Instituto Stela, propomos a seguinte definição para commons
digitais (Pacheco, 2014):
19
Definido em Pacheco (2014) como “recursos imateriais (intelectuais) que integram a cadeia de valor
de um bem ou serviço de propriedade privada, pública ou coletiva”.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
commons digitais. Commons digitais podem ser instrumentos valiosos para promoção
de transparência, participação, accountability, efetividade e outros princípios de
governo aberto (GAVELIN et al., 2009 ). O governo pode também usar commons
digitais para implementar inovação colaborativa baseada em rede, parcerias e outras
formas de cooperação com atores sociais. É o caso de agências de CTI, em que suas
plataformas de coleta de dados junto a pesquisadores, cursos, universidades e demais
atores podem ser somente uma versão digital de seus processos operacionais (e
burocráticos) ou, alternativamente, instrumentos de promoção de e-Science e
Cyberinfrastructure, com bases de conhecimento para acesso futuro tanto pela
comunidade científica como pela sociedade20.
Além disso, os exemplos no Quadro 7 permitem notar que commons digitais não estão
restritos somente aos espaços públicos. Seus princípios podem ajudar clientes e
empresas a construir novos canais de relacionamentos (ex. prosumers), novas formas
de prover inovação (ex. open innovation, crowd innovation) ou apoiar
empreendedores e investidores para criar novos empreendimentos (ex.
crowdfunding).
20
Nos últimos 20 anos, tivemos a oportunidade de coordenar projetos de governo eletrônico em ciência
(Plataforma Lattes e sua integração Lattes/CNPq e Coleta/CAPES), educação superior (projeto SINAES/INEP/MEC),
tecnologia aplicada (ex. DC-VISA, para ANVISA e DC-SIBEA para MMA - plataformas nacionais de competências em
vigilância sanitária e educação ambiental, respectivamente), inovação (Portal Inovação MCTI/CGEE e seus
recortes para ANPROTEC e MDIC) e governança (Sistema SIFAPS/CONFAP e Plataforma Aquarius/MCTI/CGEE).
Considero que apenas a Plataforma Lattes conseguiu alcançar o estágio de um commons digital que cumpre
(ainda que parcialmente) a totalidade dos 8 princípios descobertos por Elinor Ostrom. Os demais estão ou em
estágios intermediários (ex. Portal Inovação) ou talvez não alcancem o senso de propriedade coletiva sem uma
mudança de projeto que vise atender princípios de commons digitais. Nosso aprendizado está materializado em
uma metodologia integrada, denominada e-governança, que não só busca atender os princípios de commons
digitais como, também, os de governo eletrônico contemporâneo (PACHECO et. al., 2015).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
Uma análise desses diversos casos em curso indica que, na visão de quem faz parte de
um commons digital, os bens coletivos são mais importantes do que seus equivalentes
individuais. Participar de commons digitais requer plena consciência do que seja
coprodução, equidade e desprendimento (humildade) de concessão.
VISÕES E REFLEXÕES
Nesta seção, retomamos parte do nosso compromisso original com este capítulo:
registrar as reflexões nos eventos na UFSC acerca do I SIIEPE. Para tal, inicialmente
destacamos as principais conclusões do evento de 2014 e, posteriormente, discutimos
as possíveis implicações para os diferentes atores de ciência, tecnologia e inovação.
21
http://www.sermo.com/what-is-sermo/overview
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.
Além dos aspectos físicos, a estrutura universitária também deve ser revista nos
currículos ofertados em seus cursos, que, além de atualizados, devem contemplar
atividades acadêmicas curriculares que visem a mobilidade discente, a promoção de
liberdade para a multi-formação. Esses aspectos guardam relação com a
recomendação de revisão pedagógica nas estruturas acadêmicas, que levem a um
estudante mais autônomo.
infantil e que esta formação seja sistêmica e condizente com alunos autônomos,
trazendo isso para o seu processo e para sua matriz de avaliação.
22
Passada uma década, a Lei de Inovação tem tido pouca efetividade em seus objetivos originais. Mais
do que um marco regulatório adequado, a inovação requer uma cultura de coprodução. Nos Estados
Unidos, a equivalente Lei Bayh-Dole trouxe segurança jurídica para o setor empresarial buscar a
universidade (permitiu que o governo renunciasse participação na propriedade). Já no Brasil, a
operacionalização da Lei de Inovação trouxe mais burocracia ao pesquisador empreendedor e mais
incertezas no setor empresarial (especialmente no nível de parceria comercial pretendido pela
universidade a cada interação que a empresa realiza).
23
Pode-se constatar a importância da estrutura organizacional de avaliação pela comparação entre os
modelos do CNPq e da CAPES. Enquanto a CAPES diferencia a avaliação de cursos multi e
interdisciplinares há mais de 15 anos, o CNPq mantém a avaliação de candidaturas
multi/interdisciplinares por comitês disciplinares. Com isso, o Conselho tem gerado inúmeros casos de
aprovação por mérito com recusa por enquadramento. No evento da CAPES, o presidente do CNPq
disse temer que a criação de comitês multi/interdisciplinares impeça a difusão desses modos de se
fazer ciência para todas as áreas. Caso a CAPES tivesse adotado a mesma estratégia, é muito provável
que o País não contasse hoje com mais de 370 programas de pós-graduação interdisciplinares e com
os cursos em ciências ambientais. Em setembro de 2015 coordenadores de pós-graduação da CAInter
elaboraram a terceira quarta de solicitação de criação de comitês inter/multidisciplinares no CNPq.
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são definidas as temáticas dos editais (ex., se quem as define é a agência isoladamente
ou comitês com atores científicos, empresariais, governamentais e sociais), os critérios
e protagonistas da avaliação e a forma de acompanhamento e divulgação de
resultados.
24
O Programa Estruturante II foi resultado de fomento conjunto entre Financiadora de Estudos e
Projetos (FINEP) e FAPESC. A proposta catarinense contemplada foi o projeto SCTIC – Tecnologia da
Informação e Comunicação para Serviços Multiplataforma em Larga Escala: Sistemas Ubíquos a
Serviço da Qualidade de Vida, encaminhado por diversos laboratórios da Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC), Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Universidade do Vale do
Itajaí (UNIVALI), Instituto Stela e outras instituições do Sistema da Associação Catarinense das
Fundações Educacionais (ACAFE).
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Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 43
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Esta definição representa uma integração dos quatro construtos discutidos, pois
commons digitais estão entre os principais instrumentos promotores da convergência,
resultam e estão sujeitos à coprodução em atividades intensivas em conhecimento.
Não há problema complexo que dispense algum desses construtos para alcançar
efetiva resolubilidade. Em CTI e educação superior, destacamos a necessidade de que
a totalidade de seus atores institucionais, nos setores acadêmicos, governamental,
empresarial e da sociedade civil organizada, primeiro busquem meios de uma efetiva
identificação do que consideram commons e, a partir dessa continua referência de
bem comum, busquem ações e instrumentos de coprodução que tornem seus
commons duradouros.
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Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 45
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