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Coprodução em Ciência, Tecnologia e

Inovação: fundamentos e visões1


Roberto C. S. Pacheco
O professor Roberto Carlos dos Santos Pacheco (UFSC) afirma no
Capítulo 1 que a pesquisa, formação e extensão em temáticas de
caráter inter e transdisciplinar exigem a coprodução entre atores
de múltiplas matizes, concluindo que somente por meio da
inteligência coletiva e por mecanismos de governança coletiva
pode-se vislumbrar formas e instrumentos de se enfrentar os
complexos desafios colocados ao sistema de educação superior,
ciência, tecnologia e inovação do País. Para consubstanciar suas
argumentações, o autor referencia a trajetória interdisciplinar do
Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do
Conhecimento da Universidade Federal de Santa Catarina
(EGC/UFSC).
Joana Maria Pedro e Patricia de Sá Freire (pg. 7)

INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 2
NOSSAS LENTES ........................................................................................................ 3
Sobre o EGC/UFSC ..................................................................................................................... 3
Sobre o Instituto Stela ............................................................................................................... 6
4 C’s - FUNDAMENTOS.............................................................................................. 8
1º C: Convergência .................................................................................................................... 8
O impacto da convergência nos atores de CTI .................................................................................. 10
2º C: Conhecimento: três epistemologias ............................................................................... 11
EGC/UFSC: Três paradigmas em um mesmo Programa de Pós-Graduação ...................................... 15
Ciclo de conhecimento: ponto focal para a construção interdisciplinar do EGC/UFSC ..................... 18
Uma definição de conhecimento para o EGC/UFSC .......................................................................... 19
Tipos de conhecimento científico ...................................................................................................... 22
3º C: Coprodução .................................................................................................................... 25
Ciência e Coprodução ........................................................................................................................ 26
Uma Taxonomia para a Coprodução ................................................................................................. 28
4o C: Commons digitais ........................................................................................................... 30
Commons ........................................................................................................................................... 30
Conhecimento como Commons ........................................................................................................ 33
Commons digitais .............................................................................................................................. 34

VISÕES E REFLEXÕES ............................................................................................... 37


Conclusões do III Encontro Nacional de Interdisciplinaridade da CAPES................................ 38
Desafios contemporâneos para a universidade brasileira ...................................................... 38
O papel das agências de fomento ........................................................................................... 40
SÍNTESE E CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 42
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 45

1
PACHECO, R. C. S.. Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: Fundamentos e Visões. Em
Interdisciplinaridade: Universidade e Inovação Social e Tecnológica. Organizado por Joana Maria
Pedro e Patrícia de Sá Freire, Curitiba, CRV., pp. 21-62. 2016.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 2
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

INTRODUÇÃO
Em maio de 2005, a convergência de objetivos e o planejamento institucional
colocaram três eventos simultaneamente na Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC): (1) o II SIIEPE - Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão2; (2) o Encontro Fórum de Pró-reitores de Pós-Graduação e
Pesquisa (FOPROP) da Região Sul; e (3) a Jornada de Coprodução Digital3.

Como parte das temáticas que deveriam integrar a reflexão sobre


interdisciplinaridade, ciência, tecnologia e educação superior, coube-nos o tema da
coprodução e sua relação com desafios e modos contemporâneos de realizar ciência.
Nos últimos anos, temos desenvolvido esses temas como parte de uma proposição de
realinhamento conceitual para o Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão
do Conhecimento (EGC/UFSC).

Assim, neste capítulo, não só retomamos o conteúdo-referência apresentado nos


eventos, como fundamentamos parte dos referenciais conceituais que temos discutido
com os colegas do EGC/UFSC. Para tal, discutimos quatro fundamentos: convergência,
conhecimento, coprodução e commons digitais. Com base nesses referenciais,
discutimos alguns desafios e oportunidades para os atores de ciência, tecnologia e
inovação do País, especialmente relevantes em tempos de turbulência e incerteza
sobre o futuro, como os que vivemos atualmente.

Antes, porém, com o intuito de posicionar esta reflexão, registraremos as “lentes”


pelas quais observamos esses temas, comentando a trajetória acadêmica e profissional
e sua relação com o histórico de duas instituições de Santa Catarina.

2
O SIIEPE e o encontro da Região Sul de um evento nacional organizado pela CAPES para tratar da
interdisciplinaridade na educação superior.
3
Evento que organizamos com a FAPESC em que foram apresentados os resultados do Programa
Estruturante II de FAPESC e FINEP. A Rede do Estruturante II desenvolveu protótipo integrado de
hardware e software e o evento promoveu uma gincana com estudantes sobre a aplicabilidade desse
protótipo em diversos setores.
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Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 3
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NOSSAS LENTES
Em discussão de temas interdisciplinares é recomendável que esteja explicitado o
ponto de vista pelo qual os conteúdos discutidos são percebidos. No caso deste
capítulo, nossas lentes têm dois referenciais institucionais: o acadêmico-científico,
desenvolvido ao longo da última década no EGC/UFSC e o de pesquisa e inovação,
desenvolvido junto ao Instituto Stela, organizações em que tivemos a oportunidade de
participar da concepção e sermos protagonistas da fundação, respectivamente. Cada
uma oferece uma lente, que têm criado as diferentes diplopias com que temos
estabelecido nossa trajetória profissional (PACHECO, 2012).

Sobre o EGC/UFSC
Em maio de 2014, o EGC/UFSC completou 10 anos de existência. Em pouco mais de
uma década, professores oriundos de 10 departamentos vinculados a sete centros da
UFSC têm realizado a pesquisa e a formação, concebendo o conhecimento como um
fator gerador de valor (PACHECO, FREIRE e TOSTA, 2011). Na Figura 1, ilustra-se essa
cronologia, em três grandes fases, conforme as visões da sociedade industrial, de
informação e de conhecimento.

Figura 1: Cronologia do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do


Conhecimento da UFSC.
Fonte: do Autor (arquivo pessoal).
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Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 4
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Como se pode verificar na Figura 14, o EGC tem gênese no Programa de Pós-Graduação
em Engenharia de Produção da UFSC (PPGEP/UFSC). Criado no final dos anos 1960, até
meados dos anos 1980, o PPGEP/UFSC concentrou-se na formação e na pesquisa da
Engenharia de Produção com ênfase na visão industrial. Em 1985, o PPGEP/UFSC
desenvolveu um novo planejamento estratégico, já prevendo as mudanças que
implicariam as TICs no papel dos intangíveis na cadeia de geração de valor. Esta etapa
está fortemente associada à transição da sociedade industrial para a sociedade da
informação. Nesse período, entre as diversas realizações do PPGEP/UFSC no plano dos
intangíveis, destacaram-se sua participação no Programa Nacional de Qualidade,
Gestão Ambiental e, especialmente, a concepção e criação de seu programa de
educação à distância (EaD), com o apoio da CAPES.

No início dos anos 2000, o PPGEP/UFSC chegou a uma estrutura excessiva para um
único programa de pós-graduação, teve questionadas suas práticas de EaD em pós-
graduação stricto senso e, especialmente, sua própria identidade enquanto lócus nas
Engenharias III da CAPES5.

É nesse contexto que nasceu a proposta do EGC/UFSC, como um novo Programa,


fundamentado na visão desenvolvida no PPGEP/UFSC sobre o papel dos intangíveis,
mas com uma nova identidade, assumidamente multi e interdisciplinar, com lócus
diferenciado na CAPES, na área de avaliação correspondente. Após dois anos de
análise na CAPES, a autorização para seu início de funcionamento ocorreu no final de
março de 2004, com o Programa tendo seu início em maio do mesmo ano6.

4
A foto na figura foi tirada no ano de 2003, nas instalações do Grupo Stela, com a presença de parte do
grupo original de concepção do EGC/UFSC. Estão presentes Gregorio Varvakis (no primeiro plano, à
esquerda), Neri dos Santos (ao lado de Gregório), Roberto Pacheco (em frente à janela), Paulo Selig
(ao lado esquerdo de Roberto) e José Leomar Todesco (no canto direito).
5
O PPGEP/UFSC chegou a ter 12 áreas de concentração e mais de 100 docentes. O Programa chegou a
solicitar a CAPES sua divisão em três programas de pós-graduação: um centrado na engenharia
industrial, outro em tecnologias e engenharia e outro na gestão de tangíveis e intangíveis na
engenharia. Sua solicitação foi negada, mas a reflexão foi essencial na gênese de uma proposta que
originou o EGC.
6
Há um fato histórico que ilustra a dificuldade deste processo de criação de unidades
multi/interdisciplinares diante da cultura disciplinar da universidade: como foi autorizado após o
calendário acadêmico da graduação e da pós-graduação já estar vigente na universidade e por não ter
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Desde o início, o EGC está estruturado em 3 áreas de concentração: Engenharia do


Conhecimento (EC), Gestão do Conhecimento (GC) e Mídia e Conhecimento (MC). Em
comum, as três áreas percebem o conhecimento como produto e/ou processo em
ciclos de criação de valor por coletivos (de pessoas ou organizações). É a existência
dessas três áreas que justifica o quadro docente do Programa, com formação em
engenharias, ciência da computação, ciência da informação, psicologia, pedagogia,
administração, economia, direito, biologia, entre outras. Com várias bases
paradigmáticas distintas, os docentes do EGC mantém têm mantido suas três áreas
com o desafio de convergirem na formação de seus mestres e doutores.

A julgar pela demanda, a proposta do EGC/UFSC tem sido compreendida e desejada


por significativa parcela de profissionais e estudantes, de diversas áreas de formação.
O Programa recebe, em média, cerca de 700 candidatos por ano para suas 60 vagas
(cerca de 30 para cada curso). Em 11 anos foram mais de 200 doutores e mais de 200
mestres formados. Pesquisas com os egressos revelam que cerca de 20% atuam fora
da academia (em empresas e no governo) e mais de 80% consideram que sua
formação no Programa foi estratégica para seu futuro e reconhecimento profissional7.

Nesse período, uma das lições aprendidas está na necessidade de que a formação,
mesmo de pós-graduação, contemple a parceira com os diferentes atores da
sociedade. Uma característica do EGC é justamente a constante busca de coprodução
com parceiros empresariais, governamentais e sociais, sempre que o desafio envolver
o papel do conhecimento como fator de geração de valor.

um referencial departamental administrativo para se basear, o EGC só conseguiu uma sala para
realizar sua aula inaugural no Núcleo de Desenvolvimento Infantil (NDI), da UFSC, que abriu seu
auditório para o primeiro momento acadêmico do programa que nascia.
7
Esses dados têm como fonte pesquisa o acompanhamento de egressos do EGC/UFSC (ZIMMER, P. ;
SELIG, P. ; LUZ FILHO, 2013).
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Sobre o Instituto Stela


A segunda8 lente com que apresentamos o conteúdo deste capítulo tem gênese em
uma instituição privada, sem fins econômicos, de pesquisa e desenvolvimento,
denominada Instituto Stela, conforme ilustrado na Figura 2.

Figura 2: Instituto Stela: missão, caracterização e reconhecimento.

Assim como o EGC/UFSC, o Instituto Stela tem sua gênese no PPGEP/UFSC. Em seu
caso específico, no Grupo Stela, criado em 1995, para virtualizar os processos de
secretaria do PPGEP/UFSC e, com isso, viabilizar a estrutura administrativa de seu
Programa de EaD9.

8
A ordem com que estas lentes se apresentam tem relação com a aderência do capítulo à missão de
cada instituição. O Instituto Stela é um centro de pesquisa e, especialmente, de tecnologia, cuja
reflexão científica em níveis paradigmáticos não tem a prioridade de agenda com que ocorre em um
programa de pós-graduação.
9
Entre 1988 e 2000, além de adquirir nossa própria formação no mestrado e doutorado do
PPGEP/UFSC, tivemos a oportunidade de participar de grupo de pesquisa que combinava os
aprendizados das áreas de pesquisa operacional e, principalmente, inteligência aplicada na concepção
e criação de sistemas de informação em CT&I, criados no âmbito do programa estratégico de EaD do
PPGEP/UFSC. Esta virtualização da secretaria do Programa ocorreu na chamada Plataforma Stela, que,
em 1996, já integrava completamente os sistemas da CAPES (Coleta) e do CNPq (BCurr e Minicurrículo)
no âmbito do PPGEP/UFSC. Essas experiências foram descobertas pelo CNPq, que contratou junto ao
grupo a concepção e desenvolvimento do Diretório de Grupos de Pesquisa no Brasil (em 1997) e,
posteriormente, da Plataforma Lattes (entre 1998 e 2004).
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Entre 1997 e 2004, o Grupo Stela foi responsável pela concepção, desenvolvimento,
implantação e manutenção da Plataforma Lattes, do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em 2002, já estava clara a
necessidade de se criar uma organização que, ao mesmo tempo, mantivesse a missão
e competência do Grupo Stela em desenvolver inovação em sistemas de informação e
conhecimento e, também, tivesse a condição de fazê-lo com qualidade de entrega final
de sua inovação. Foi quando decidimos fundá-lo na condição de uma organização
privada sem fins econômicos dedicada à P&D em tecnologias da informação e
comunicação, sob fundamentos da engenharia do conhecimento.

Em três anos, o Instituto já se instalava em sede própria. Na década seguinte passou


pela diversificação de seu portfólio de P&D para os setores governamental e
empresarial. Atualmente as plataformas criadas pelo Instituto Stela somam mais de 6
milhões de usuários. O Instituto realiza projetos de inovação, tanto sob encomenda
(governamental ou empresarial), como em programas de inovação aberta (no caso de
empresas do setor de TIC). Possui soluções em gestão estratégica de informação para
dezenas de instituições de ensino superior e P&D.

Essas ações e sua trajetória de projetos e produtos têm trazido para o Instituto Stela
reconhecimento internacional (ex. Prêmio BID/2007), nacional (três prêmios FINEP) e
regional (prêmios Stemmer). De forma geral, no entanto, as soluções criadas pelo
Instituto (ex. Plataforma Lattes/CNPq, Portal Inovação/MCTI-ABDI-CGEE; Portal
SINAES/INEP-MEC, Plataforma Aquarius/MCTI) são mais conhecidas do que o próprio
Instituto. Um exemplo é a Plataforma Lattes, reconhecida como uma das mais
importantes bases nacional de dados sobre pesquisa e CT&I (LANE, 2010).

Na área de governo eletrônico, o principal produto do Instituto Stela é sua


metodologia denominada e-governança (PACHECO et. al, 2015), que reúne os
aprendizados de 15 anos de concepção e desenvolvimento em plataformas e-Gov em
uma metodologia integrada para concepção, desenvolvimento, implantação e
operação de soluções tecnológicas contemporâneas para sistemas públicos.
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Para efeitos deste capítulo, o relevante aqui é destacar o fato de que nossas lentes
combinam a visão acadêmica da universidade com a missão de P&D aplicada, com
impacto direto em inovação de uma instituição privada de P&D. Com essas lentes,
procuramos trazer visões complementares das óticas acadêmica, avaliativa (ex.
PACHECO, 2012), de pesquisa e de empreendedorismo inovador.

4 C’s - FUNDAMENTOS
Uma vez explicitados nossos referenciais formados nas trajetórias acadêmica, técnico-
científica e de inovação, discutimos, a seguir, as bases conceituais de nossas reflexões
atuais junto ao coletivo de pesquisadores e especialistas com quem atuamos na última
década. Tratam-se de 4 conceitos, coincidentemente todos iniciados pela letra “C”:
convergência, conhecimento, coprodução e commons.

1º C: Convergência
Segundo Jenkis (2006), a convergência de mídias está nos levando a uma “renascença
digital”, com impactos sociais, políticos, econômicos, legais, produtivos e culturais.
Essa nova renascença pode ser percebida, por exemplo, pelo surgimento de diferentes
prefixos, todos relacionados a diferentes formas de convergência, conforme
representado na Figura 3 a seguir.
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Figura 3 - Eventos que denotam a chamada "renascença digital".


Fonte: do autor.

No alto e à esquerda da Figura 3 está o prefixo “Co” e suas derivações coprodução,


colaboração, colocation, coworking e co-sharing. São exemplos de vários “cos” que
denotam uma propriedade referente aos atores formarem diferentes coletivos (cujos
nomes dependem do propósito deste coletivo). Outro prefixo ilustrado é “Multi”, que
também denota multiplicidade de atores ou fatores em um contexto convergente (ex.
multimídia, multi-institucional, multidisciplinar, multicultural). O terceiro prefixo
“Inter” denota um estágio posterior à multidimensionalidade, quando a interação
entre os fatores dá origem a novos componentes (ex. interdependência,
interdisciplinaridade, interatividade, interinstitucionalidade, etc.).

A esses prefixos a era digital acrescenta dois típicos dos tempos presentes: “crowd” e
“open”. O prefixo crowd denota múltiplo, mas em grande quantidade (multidão). Na
era digital, o significado de um agrupamento de muitos indivíduos é ampliado por
sufixos que identificam seu objetivo. Quando a meta é o financiamento coletivo
denomina-se crowdfunding (Mollick, 2014), que pode ser aplicado a diversas
atividades, tais como financiar um startup empresarial, um evento artístico ou cultural
ou, ainda, uma pessoa com problema familiar ou de saúde (Sisler, 2012). O mesmo
princípio se aplica a diversas outras instâncias de produção coletiva, como a promoção
de inovação (crowd innovation – Wang, 2013), a resolução de problemas
(crowdsourcing – Brabham, 2008), ou a realização coletiva de trabalhos profissionais
(crowd working – Kittur, et. al., 2013).

Já o prefixo “open” denota abertura de eventos e fatores. Sua relação com a


convergência está na característica de indicar um estado de aceitação para novos
atores, que se associam ao protagonista tradicional. Assim, sempre que acrescentado a
um termo, o prefixo “open” indica o acréscimo de mais atores. Isso pode ocorrer na
área pública, quando o governo se abre para o controle e para a coprodução cidadã
(open government), na ciência, quando pesquisadores aceitam participação de atores
não científicos como forma de coprodução transdisciplinar (open Science) ou na
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inovação, quando a empresa aceita a atuação de outros atores acadêmicos ou


empresariais em seu próprio processo de inovação (open innovation). Essas aberturas
implicam na aproximação de fatores e atores antes separados e exigem canais abertos
a múltiplas participações em diferentes fenômenos ou eventos convergentes.

O prefixo Trans, também representado na Figura 3, refere-se a uma característica


ainda mais aberta da convergência: a superação de limites e barreiras pré-existentes.
Significa ir para além do estabelecido, não apenas modificando arranjos ou fatores,
mas propondo a alteração de status quo vigente. Em ciência, esse prefixo está na
Transdisciplinaridade, modo de realização científica que ainda não encontrou uma
definição de consenso, mas que já tem identificadas 5 visões epistêmicas (KLEIN,
2014). Entre as mais recentes está a que considera a Transdisciplinaridade um novo
modo de produção de conhecimento com expertises de um amplo espectro de
organizações e colaborações para sustentabilidade, que integram pesquisa de
diferentes disciplinas com conhecimento de atores da sociedade (WAGNER et. al,
2011).

O impacto da convergência nos atores de CTI


Mais do que uma miríade de formas e modos de se produzir ciência e tecnologia, a
chamada renascença digital traz desafios de grandes proporções à totalidade de atores
em um sistema de educação superior, ciência, tecnologia e inovação. No Quadro 1
citam-se alguns exemplos desses desafios.

Atores Desafios em tempos da convergência (exemplos)


Encontrar estruturas ágeis e contemporâneas para acolher, promover e manter
inteligências coletivas em sintonia com a produção de serviços e produtos de baixo
Empresariais
ciclo de vida. Realizar sua operação de forma sustentável e comprometida com o
bem coletivo.
Estabelecer marcos regulatórios e exercer poder de compra e fomento para os
demais atores de bases tecnológicas, sem perder seu compromisso com toda a
Governos sociedade. Reconhecer a distinção de papéis (e portes) entre os diversos atores na
formulação de políticas e de incentivos fiscais (sem perder compromisso com
equidade).
Sociedade Organizar-se de forma plural, abrangente, consciente, participativa e exigente de
civil seus bens comuns (que devem ser claramente identificados).
Universidade Manter-se sintonizada com as necessidades contemporâneas da sociedade (ex.
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atualização curricular, formação baseada em efetividade de inserção no mercado,


constante observação das novas profissões geradas pela convergência), sem perder
sua missão principal de formação de pessoas qualificadas e de geradora de
conhecimento.
Fazerem-se presentes, representados e complementares (porém distintos) da
Institutos de universidade, para que possam cumprir sua missão de ser elo nas relações
P&D universidade-empresa-governo. Perceber em todos os demais atores as fontes de
parceria e legitimação de sua existência (ex. produção de tecnologias sociais).
Quadro 1: Desafios da convergência aos atores de ciência, tecnologia e inovação.
Fonte: do Autor

De forma geral, os exemplos de desafios apresentados no Quadro 1 encontram dois


fatores comuns: a relação do ator com conhecimento e seu papel na coprodução social.
A seguir, descrevemos nossa visão para esses dois elementos, iniciando pelo que tem
sido objeto de pesquisa e formação do EGC/UFSC na última década, o conhecimento.

2º C: Conhecimento: três epistemologias


Não há uma definição de consenso para conhecimento. A razão principal para isso está
no fato de o conhecimento ser resultado de pesquisas da totalidade de disciplinas.
Além disso, o conhecimento pode ser criado tanto no âmbito da ciência
(conhecimento científico) e tecnologia (conhecimento tecnológicos) quanto em outros
âmbitos (conhecimento popular, conhecimento tradicional, conhecimento cultural,
etc.).
Nesta última década, o EGC/UFSC conviveu com três epistemologias principais:
cognitivista, autopoiética e conexionista (VENZIN et. al, 1998), conforme representado
na Figura 4.
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Figura 4: Três paradigmas de conhecimento.


Fonte: do autor (adaptado de Venzin et. al, 1998).

Como representado na Figura 4, a principal referência para a área de Engenharia do


Conhecimento no EGC/UFSC é a cognitivista. Esta visão surgiu com o advento dos
computadores e com a criação da Inteligência Artificial, nos anos 1960. Um de seus
principais representantes é Herbert Simon (Figura 4), psicólogo ganhador do prêmio
Nobel de 1978, pelo seu trabalho pioneiro em processos de tomada de decisão
organizacional, a quem se unem diversos pesquisadores da Psicologia Cognitiva, como
Noam Chomsky (Figura 5), Alan Newell, Marvin Minsky e diversos outros. Para os
cognitivistas, a cognição humana pode ser compreendida por método científico, sendo
o processo mental um algoritmo de processamento de informação. Nessa visão, o
conhecimento é percebido como uma entidade que pode ser armazenada em
computadores, bases de dados, arquivos, manuais ou rotinas e, como tal, facilmente
compartilhado em uma organização. Nessa mesma escola, essa capacidade de guardar,
processar e transferir informação não é percebida como exclusividade do ser humano.
Sistemas computacionais também podem ter comportamento inteligente e realizar
processos de conhecimento.
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É justamente na caracterização do protagonista e na identificação do lócus do


conhecimento que há discordância de quem tem uma visão autopoiética sobre o
conhecimento. Para essa escola, o conhecimento reside na mente, corpo e no sistema
social de seres humanos. Proposta pelos cientistas chilenos Humberto Maturana e
Francisco Varela (Figura 4), em 1974, a autopoiesis (i.e., autoreprodução) explica a
dinâmica dos seres vivos, simultaneamente produtores e produtos e, como
“máquinas” autoreprodutoras, inalcançáveis pelo pensamento linear. Uma de suas
principais ênfases está na constatação de que humanos são indissociáveis partícipes de
seus sistemas sociais, razão pela qual o conhecimento puramente objetivo é inviável,
uma vez que há inseparabilidade entre fenômeno e observador. Em relação à
caracterização do conhecimento, essa escola é a mais antropocêntrica, pois não
considera conhecimento o que não está na mente humana (vistos como dados ou
informações). Autopoiéticos reconhecem exclusivamente a capacidade cognitiva
humana de processar informação, acrescentando contexto e semântica e,
consequentemente, dotando-a de valor e de resultados (i.e., produzindo novas
informações e/ou conhecimentos). A visão autopoiética é predominante na maioria
dos modelos da Gestão do Conhecimento, como os de Nonaka (Figura 5) e Takeuchi,
Davenport e Prusak, entre outros.

As percepções e visões trazidas pelas chamadas sociedades da informação (Daniel Bell,


1973) e conhecimento (Fritz Machlup, 1962 e Peter Drucker, 1969 e 1993) trouxeram
uma perspectiva mais sistêmica para conhecimento. Nesse contexto, um terceiro
paradigma parece mais adequado: a chamada escola conexionista considera que,
independentemente do lócus (mente ou artefatos) ou do protagonista de seu
processamento (humano ou artificial), o conhecimento necessita de conexões e da
comunicação entre os seus agentes. Para conexionistas, se o sistema social perder as
conexões entre os indivíduos que o compõem, deixará de produzir conhecimento.
Assim, para essa escola, comunicação, difusão e redes são componentes indissociáveis
do que caracteriza o conhecimento. Entre os pesquisadores que exemplificam essa
escola, estão Etienne Wenger (Figura 4), propositor das comunidades de prática, Bruce
Kogut (Figura 5) e Udo Zander, pesquisadores de conhecimento percebido como rede.
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Na Figura 5 estão apresentadas algumas das diferenças de visão entre cognitivistas,


autopoiéticos e conexionistas em relação ao conhecimento organizacional.

Figura 5: Os três paradigmas de conhecimento e sua visão sobre uma organização.

Fonte: do autor (adaptado de Venzin et. al, 1998)

Conforme ilustrado na Figura 5, para cognitivistas, o conhecimento organizacional tem


natureza lógica e pode ser planejado, inclusive ampliado por sistemas artificiais. Nessa
visão, o investimento em tecnologia não deve ser somente na que processa
informação, devendo-se estender à aquisição e desenvolvimento de sistemas de
conhecimento, que criam agentes que se adicionam aos protagonistas humanos de
conhecimento (ex. SCHREIBER et. al, 2002).

Para autopoiéticos, essa visão aproxima-se do oposto, pois, nessa escola, uma
organização é lócus de relações humanas, cultura e exercício de valores sociais que só
humanos são capazes de realizar, o que torna seu coletivo um organismo vivo (e não
uma máquina de processamento de informações).
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Conexionistas, por sua vez, definem conhecimento como um estado de indivíduos


interconectados, em que tanto competências, princípios organizacionais e fatores
socioculturais incidem sobre a capacidade global do sistema de gerar e difundir
conhecimento.

A existência de três visões de mundo pode gerar tanto oportunidades de confrontos


como de crescimento mútuo. No caso do EGC/UFSC, as três visões paradigmáticas de
conhecimento têm convivido por uma década, conforme descrito a seguir.

EGC/UFSC: Três paradigmas em um mesmo Programa de Pós-Graduação


No Quadro 2, a seguir, apresentam-se as questões-referência que dão bases canônicas
às pesquisas e à formação do EGC/UFSC, em cada uma de suas áreas de concentração,
com as respectivas áreas de trabalho (i.e., disciplinas diretas, onde os conceitos são
criados no programa) e de referência (i.e., disciplinas correlatas, consultadas no
processo de pesquisa do Programa).

Área Questão-Referência Áreas de trabalho Áreas de referência


 Ciência da Informação
 Dados Ligados e Dados Abertos
 Ciência da Computação
 Descoberta de Conhecimento
Como modelar conhecimento e  Engenharias
 Engenharia de Ontologias
 Inteligência Artificial
EC criar projetos de sistemas de  Governo Eletrônico
 Matemática e Lógica
conhecimento?  Representação de Conhecimento
 Sistemas de Informação
 Sistemas Inteligentes
 Teoria Geral de Sistemas
 Web Semântica
 Psicologia Cognitiva
 Aprendizagem Organizacional
 Administração e Contábeis
 Ativos Intangíveis
 Direito
Como utilizar conhecimento em  Gestão por Competências
 Economia
 Gestão por Processos
GC um ciclo de criação coletiva de  Gestão Pública
 Inovação e Empreendedorismo
valor?  Engenharia de Produção
 Liderança Organizacional
 Psicologia Organizacional
 Propriedade Intelectual
 Qualidade e Gestão Ambiental
 Sustentabilidade
 Ambientes de Aprendizagem  Comunicação
 Análise de Redes Sociais  Design
Como se criam e evoluem  Educação à Distância  Educação
MC conexões entre indivíduos em  Psicologia Cognitiva  Informática na Educação
sistemas de inteligência coletiva?  Mídias Digitais  Inteligência Artificial
 Semiótica  Marketing
 Visualização de Conhecimento  Psicologia
Quadro 2: Componentes conceituais das áreas de concentração do EGC/UFSC.
Fonte: do Autor
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 16
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

O Quadro 2 ilustra os diferentes enfoques, campos de atuação e as distintas disciplinas


que oferecem fundamentos a cada área de concentração do EGC/UFSC. O conjunto
dessas diferenças explica o posicionamento de cada área de concentração do
Programa, tanto na Figura 4 como na Figura 5, em relação à epistemologia de
conhecimento que melhor fundamenta cada visão.

Na Engenharia do Conhecimento (EC), engenheiros, cientistas da computação,


matemáticos e pesquisadores com formação em áreas de aplicação potencial de
sistemas de conhecimento (ex. Direito) têm no cognitivismo sua principal referência
para desenvolver suas pesquisas. Como ocorre nas demais áreas, esses profissionais
reconhecem diferentes estados de conhecimento: tácito, implícito e explícito. Na visão
cognitivista, quando é tácito, o conhecimento pode ser, no máximo, emulado
computacionalmente (ex. máquinas detectores de mentira, redes neurais artificiais).
Porém, quando estiver implícito, o conhecimento pode ser modelado e representado
computacionalmente e (ao menos parcialmente) tornado explícito. Para isso, a EC
dedica-se à modelagem, concepção e desenvolvimento de sistemas de conhecimento.
O principal desafio da EC está em modelar conhecimento e criar projetos de sistemas
de conhecimento que apoiem desafios das organizações e dos indivíduos. A EC teve
gênese na Inteligência Aplicada, portanto, na Inteligência Artificial, mas sua ênfase
está nos modelos de conhecimento, razão pela qual temáticas como Engenharia de
Ontologias, Metodologias de Modelagem de Conhecimento, Representação e
Descoberta de Conhecimento são parte de suas pesquisas.

A área de Gestão do Conhecimento (GC) do EGC/UFSC tem como principal referência


para o conhecimento a visão autopoiética. A GC preocupa-se com o conhecimento em
ciclos de criação coletiva de valor. Para tal, conta com contribuições de elenco de
diversas disciplinas, incluindo Engenharia de Produção, Administração, Psicologia,
Economia, Gestão Pública e Direito. A GC já pode ser vista como uma multidisciplina,
com diversas temáticas (subdisciplinas) de interesse, como gestão por competências,
aprendizagem organizacional, liderança, gestão por processos, empreendedorismo,
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 17
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

inovação organizacional, sistemas de inovação, propriedade do conhecimento, capital


intelectual, entre outras.

Conforme indicado no Quadro 2, a área de Mídia do Conhecimento (MC) preocupa-se


com as conexões entre indivíduos (pessoas, grupos ou organizações), em sistemas de
inteligência coletiva. Como tal, tem como sua principal referência o paradigma
conexionista. A MC estuda a conectividade entre atores de conhecimento e sua
relação com a difusão e comunicação. As áreas que contribuem para a mídia, além das
áreas que já estão na GC, acrescentam-se aqui a Psicologia Cognitiva, Educação,
Comunicação, Design e TIC. Entre os campos de pesquisa e aplicação estão a
Semiótica, a Educação a distância, a Análise de Redes Sociais, a Visualização e Difusão
de Conhecimento.

A convivência dos três posicionamentos paradigmáticos, um para cada área de


concentração, evitou que o EGC/UFSC tivesse que partir de uma definição de consenso
para conhecimento. Em pouco mais de uma década, os pesquisadores do EGC/UFSC
reconheceram que, para criarem uma definição de consenso, teriam que ou eleger um
paradigma dominante ou coproduzir (inter) ciência sem ter, ainda, convivido como um
só grupo. A primeira opção implicava alto risco de dissidência no grupo e a segunda
dificilmente seria exitosa antes que o grupo já tivesse percorrido uma trajetória
conjunta (estabelecendo laços de confiança e mútuo aprendizado).

Assim, ao invés de buscarem uma definição consensual, os docentes do EGC/UFSC


decidiram partir de uma caracterização de senso comum: conhecimento é fator
gerador de valor. Essa definição não identifica o protagonista (se é propriedade
exclusiva ou não a seres humano) nem a forma do conhecimento (se é produto ou
processo), principais fatores de discordância. A partir daí, cada área de concentração
do Programa passou a desenvolver suas pesquisas, de forma multidisciplinar,
adotando (e criando) suas próprias referências conceituais de conhecimento. Já nas
interfaces entre as áreas, o grupo foi buscando se conhecer e aprender mutuamente.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 18
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

Tanto no âmbito das áreas como em suas interfaces, um segundo ponto de referência
foi essencial: o ciclo de conhecimento, conforme descrito a seguir.

Ciclo de conhecimento: ponto focal para a construção interdisciplinar do EGC/UFSC


O segundo referencial geral do EGC/UFSC foi o chamado ciclo de conhecimento.
Considerado um dos pilares da Gestão do Conhecimento, o ciclo de conhecimento
consiste em uma série de processos de conhecimento, que inclui sua criação,
identificação, coleta, classificação, armazenamento, acesso, exploração, proteção e
diversas outras atividades incidentes nesse fluxo (DALKIR, 2005).

No EGC/UFSC, a EC tem tratado principalmente dos processos de modelagem,


representação, armazenamento, recuperação e criação (ex. descoberta) de
conhecimento (em diferentes áreas de aplicação). A GC, por sua vez, além de tratar de
forma sistêmica a totalidade do ciclo (i.e., no planejamento organizacional de
conhecimento) e de suas aplicações em diferentes âmbitos socioeconômicos (ex.
inovação, empreendedorismo, sustentabilidade e desenvolvimento), tem dado ênfase
à proteção (ex. propriedade intelectual), avaliação (ex. contabilização de intangíveis),
criação (ex. aprendizagem e competências) e a outras áreas ligadas à gestão
organizacional (ex. processos, liderança, inteligência competitiva, gestão pública). A
MC, por sua vez, tem ênfase nas atividades ligadas à comunicação e à difusão do
conhecimento (ex. semiótica, marketing e comunicação organizacional), à preservação
(ex. memória coletiva) e a suas aplicações (ex., educação à distância, inclusão social,
memória de conhecimento popular, etc.), além dos instrumentos e métodos para
efetivar esses processos (ex., ambientes virtuais de aprendizagem, mídias, jogos,
design thinking).

Em uma análise retrospectiva, pode-se dizer que o EGC/UFSC acertou em caracterizar


o seu objeto de formação e pesquisa - o conhecimento - no sua função principal -
gerar valor - ao invés de buscar uma definição científica para o mesmo. Isso permitiu
que o grupo de docentes mantivesse uma referência comum aos três paradigmas de
conhecimento e, como tal, uma referência de consenso para o heterogêneo grupo de
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 19
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

pesquisadores do Programa. Embora frágil cientificamente, a definição original do EGC


para conhecimento (que é, em realidade, uma caracterização e não uma definição) foi
forte o suficiente para manter um ponto de referência comum a escolas classicamente
distintas na literatura.

Com o tempo, descobrimos que esta estratégia é recomendada por estudiosos da


multi, inter e transdisciplinaridade. A adoção de caracterizações e, principalmente, a
busca por elementos de consenso em interações sucessivas entre pesquisadores de
diversas formações está entre as diretrizes para o exercício interdisciplinar bem-
sucedido (HADORN, POHL and BAMMER, 2010; STOKOLS, Daniel et al, 2010).

Embora reconheçamos aqui a trajetória adotada, consideramos que, após mais de uma
década de pesquisas e avanços conjuntos, é chegado o momento de se explicitar uma
definição para conhecimento, como objeto de pesquisa e formação do EGC/UFSC. Esta
definição deve contemplar as três epistemologias que deram bases para o Programa e
representar um avanço em sua própria identidade interdisciplinar. Nesses dois últimos
anos, temos procurado tratar desse desafio, com resultados descritos na seção a
seguir.

Uma definição de conhecimento para o EGC/UFSC


Após uma década de convivência das visões cognitivista, autopoiética e conexionista
no EGC/UFSC, notamos que os principais conflitos entre os docentes estavam em três
questões: (i) no protagonista do conhecimento (se exclusivamente humanos ou,
também, agentes artificiais); (ii) no lócus do conhecimento (i.e., se está apenas na
mente humana ou, também, em artefatos e/ou em conexões); e (iii) na forma
(natureza) do conhecimento (se conteúdo e/ou processo).

Conflitos conceituais e de visão de mundo como esses costumam ser tratados de três
formas: (a) de modo disciplinar (ex. debates entre as correntes científicas e confronto
entre as visões de mundo e teorias, para se verificar a que mais se aproxima de
explicar a realidade); (b) de modo multidisciplinar (com a convivência entre as visões
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 20
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

focada na resolução de problemas, sem a busca de consenso ou de construção de


novos conceitos baseados nas contribuições de cada visão); ou (c) de modo
interdisciplinar (com a elaboração coletiva de novos conceitos, que, mesmo
respeitando suas visões de mundo originais, buscam a convergência conceitual e se
mantém unidas não só pela resolução conjunta de problemas, mas pela construção
contínua de uma identidade interdisciplinar).

No EGC/UFSC, especificamente em relação ao seu objeto principal de formação e


pesquisa – o conhecimento – tivemos uma década de opção pela convivência
multidisciplinar. Esta experiência acumulada nos trouxe a oportunidade de avanço
para o modo interdisciplinar. Para tal, apresentamos uma nova proposta de definição
de conhecimento que contempla essas três dicotomias e preserva o consenso já
consolidado no EGC/UFSC sobre a caracterização do conhecimento como fator gerador
de valor (Figura 6).

Figura 6: Definição de Conhecimento


Fonte: PACHECO, 2014.

Conforme indicado na Figura 6, sugerimos a seguinte definição para conhecimento:


 Conhecimento é conteúdo ou processo efetivado por agentes humanos ou
artificiais em atividades de geração de valor científico, econômico, social ou
cultural (PACHECO, 2014).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
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A definição proposta é, em realidade, um meta-conceito10 de conhecimento, que


propõe a convergência das visões cognitivista, autopoiética e conexionista. Como tal,
pode ser instanciada de diferentes formas por praticantes dessas epistemologias,
como exemplificado no Quadro 3.

Fator Cognitivista Autopoiético Conexionista


Por quem Humanos e máquinas Humanos Coletivos (redes)
Com que forma Conteúdo Processo Ambos
De que modo Criação... Identificação... Comunicação...
De/Para onde Mente e máquinas Mente Relações
Para que Gerar valor Gerar valor Gerar valor
Conhecimento é
Conhecimento é conteúdo Conhecimento é processo processo e conteúdo
efetivado por agentes humanos efetivado por humanos em efetivado por
Definição
ou artificiais em atividades de atividades de geração de coletivos na geração
instanciada geração de valor científico, valor científico, econômico, de valor científico,
econômico, social ou cultural. social ou cultural. econômico, social ou
cultural.
Quadro 3: Exemplos de instanciações da definição proposta, segundo visões predominantes
em cada paradigma de conhecimento.
Fonte: do Autor

No Quadro 3, estão exemplos das visões predominantes em cada paradigma de


conhecimento. Cada construção depende da forma com que os conectivos “ou” e o
verbo “efetivar” são instanciados na definição proposta para conhecimento. O
conectivo “ou” pode identificar forma e protagonista e o verbo “efetivar” pode ser
trocado por um dos processos no ciclo do conhecimento. Assim, por exemplo, um
cognitivista pode instanciar a definição geral como: “conhecimento é conteúdo criado
por agentes artificiais...”, enquanto um autopoiético pode usar a mesma definição
para ler “conhecimento é processo criado por agentes humanos...”.

Um último aspecto a destacar na definição proposta está na necessidade de que o


conhecimento tenha seu valor reconhecido pelo seu beneficiário. Essa característica
essencial, por exemplo, em uma das definições mais difundidas para inovação,
proposta por Curtis Carlson no Stanford Research Institute (CARLSON e WILMOT,
2006). Além de ressaltar que conhecimento é fator gerador de valor, a definição

10
Meta-conceitos, também chamados “conceitos genéricos”, são conceitos que definem sistemas de
valores para se aplicar conhecimento de diferentes domínios e que podem ser instanciados pela
atribuição de valores exatos para um detentor de conhecimento específico (PAQUETTE, 1999).
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proposta reconhece que esse valor tem diferentes naturezas (científico, econômico,
social e cultural).

Portanto, a definição proposta combina epistemologias, formas, protagonistas e


propósito para conhecimento. É um termo essencialmente interdisciplinar. Uma
questão central à interdisciplinaridade é se, ao construir a sua versão, o pesquisador
de uma epistemologia rejeita a definição geral, porque ela contempla, também, outras
construções. No caso do EGC/UFSC, nossa natureza e ação interdisciplinar têm gerado
o respeito às diferentes visões e facilitado o intercâmbio de pesquisas e,
principalmente, a coprodução científica, nas três áreas do Programa. A expectativa é
que esta definição geral formalize essas ações e, mais além, crie um referencial de
trabalho comum para os próximos anos.

Por outro lado, no que se refere aos alunos do Programa, esperamos que a definição
sirva como referencial de estudos e, principalmente, ajude-os a identificar a visão
epistêmica que melhor explica cada trabalho pesquisado (dado que a multiplicidade de
escolas e definições causa ansiedade e dúvidas no processo de aprendizagem).

Portanto, da convivência de escolas e paradigmas, esperamos que o EGC/UFSC parta,


em sua próxima década, para a convergência e construção de novos paradigmas. Essa
trajetória guarda relação como que a literatura identifica em construção multi e
interdisciplinar de ciência, razão pela qual, nas seções a seguir, tratamos desses
diferentes modos de conhecimento científico.

Tipos de conhecimento científico


No Quadro 4, a seguir, estão apresentadas três definições para os modos multi, inter e
transdisciplinares de produção de conhecimento científico.

Tipo de
Definição
Conhecimento
É conhecimento que resulta da soma linear de uma ou mais unidades disciplinares
Multidisciplinar
de conhecimento relevantes em um problema específico (Gilbert, 1998).
É conhecimento cujo significado é criado pela integração de conceitos e ideias de
Interdisciplinar
diferentes disciplinas (Shin, 1986).
Transdisciplinar É conhecimento resultante da coprodução de múltiplos atores, que ultrapassam os
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

muros da academia, nos setores público e privado (Frodeman, 2013).


Quadro 4: Formas de conhecimento científico.
Fonte: do Autor

Segundo Gilbert (1998), o conhecimento multidisciplinar resulta de projetos em que as


contribuições de cada disciplina científica se somam na resolução de um determinado
problema. O foco dessa adição de disciplinas, portanto, está em solucionar, de forma
integrada, um problema reconhecidamente complexo. Desse modo, quem mais se
beneficia da integração de disciplinas é beneficiário da solução que se busca. Já as
disciplinas partícipes vivenciam pouca mudança. Os aprendizados oriundos da
colaboração, embora relevantes para uma cultura de coprodução, não chegam a
modificar métodos e instrumentos já existentes nas disciplinas. Um exemplo de
problema multidisciplinar está na criação de um dispositivo biomecânico. Especialistas
em anatomia e engenharia de materiais trabalham juntos para sua elaboração e
criação e, após seus testes e produção, retornam às suas unidades disciplinares de
origem (às vezes para não atuarem mais em problemas semelhantes ao recém-
realizado).

O próximo nível de interação entre disciplinas se dá na interdisciplinaridade. Na


produção de conhecimento interdisciplinar o objetivo não é resolver somente um
problema. Projetos interdisciplinares abrem oportunidades para a convivência
permanente de diferentes matizes disciplinares, que não só desenvolvem projetos
conjuntos, mas podem, também, estabelecer linhas de pesquisa e formação no
domínio de sua convergência11. Essa integração se reflete na criação de novos
métodos, instrumentos, modelos e conteúdos, úteis tanto às disciplinas de origem
(especialmente quando as mesmas atuarem em projetos multidisciplinares), mas de
potencial criação de novas interdisciplinas. Por vezes, a interdisciplinaridade surge da
realização continuada de projetos multidisciplinares. No caso do dispositivo

11
Como lembra Dabars (2008), a percepção da ligação entre convergência e interdisciplinaridade
começa a se difundir a partir de meados dos anos 2000. O autor lembra que, em 2004, a Revista
Science dedicou seu editorial à dimensão epistemológica da interdisciplinaridade e ao conceito de
convergência, destacando o papel proeminente que as ciências da vida, da nascente unificação de
disciplinas científicas e a convergência de tecnologias, destacando a unificação de conhecimento, em
contraposição à sua fragmentação, como uma das mais importantes transformações no
desenvolvimento das ciências da vida (DABARS, 2008).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

biomecânico discutido anteriormente, uma convivência permanente de engenheiros


de materiais e médicos especializados em anatomia pode dar nascimento a um
programa de pós-graduação ou a um grupo de pesquisa em criação de próteses. Com o
tempo, tanto a engenharia de materiais como a anatomia podem receber novas
técnicas originadas dessa convivência. Além disso, novos projetos podem mostrar a
necessidade de se agregar outros profissionais (ex. fisioterapeutas, psicólogos,
odontólogos) para criarem métodos, instrumentos e modelos conjuntos, de forma
contínua. Esse é o modo de conhecimento interdisciplinar, caracterizado por Shin
(1986).

Finalmente, para a terceira forma de desenvolvimento de conhecimento científico, o


conhecimento transdisciplinar, surge quando se agregam novas formas e/ou novos
atores no processo de integração e convergência de disciplinas. E é na variedade de
formas de fazê-lo que está a razão para não haver uma definição de consenso para
conhecimento transdisciplinar (KLEIN, 2014). No Quadro 4, está destacada uma
definição que reconhecemos no EGC/UFSC. Na definição de Frodeman (2013),
conhecimento transdisciplinar resulta da coprodução de múltiplos atores, incluindo
contribuidores não só do setor acadêmico e científico, mas também dos setores
empresarial, governamental e da sociedade organizada. Nessa visão, a
transdisciplinaridade é a convergência de saberes, que vai além de conhecimento
acadêmico e científico. Na transdisciplinaridade reconhece-se que o saber não
científico também é conhecimento, ainda que tenha bases epistemológicas distintas da
ciência. Isso exige concepções de meta-níveis para a interdisciplinaridade e novos
arranjos para participação e colaboração em pesquisa orientada a resolução de
problemas (KLEIN, 2014). Nessa visão de transdisciplinaridade, o pesquisador não faz
ciência apenas “para” a sociedade, mas, também, “com” a sociedade12. Essa é a visão
com que o EGC/UFSC tem buscado sua evolução.

12
Segundo Elinor Ostrom, “o conhecimento surge de um processo condicional de idas e vindas entre a
observação empírica e o árduo trabalho de sua formulação teórica” (OSTROM, 1990, p. xvi). O
conhecimento transdisciplinar reconhece que nessas duas dimensões – empírica e teórica – há não só
distintas naturezas, mas diferentes atores de conhecimento, igualmente importantes na ação coletiva.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

Há uma característica comum aos três modos de produção de conhecimento (multi,


inter e trans): a construção conjunta de conhecimento. É por essa razão que
agregamos, a seguir, o terceiro “C” em nossos construtos: a coprodução.

3º C: Coprodução
Em ciência, a expressão “coprodução” surgiu com os trabalhos de Vicent Ostrom e
Elinor Ostrom, no início da década de 70. Esses pesquisadores buscavam explicar
fenômenos como o que ocorrera em Chicago, onde a polícia havia modificado o
sistema de policiais de bairro por processo formal de atendimento à segurança e,
como consequência, deu-se um aumento no índice de criminalidade. A análise do casal
Ostrom mostrou que, no modelo anterior, havia um sistema coletivo que ajudava a
“coproduzir” a segurança (i.e., guardas e comunidade formavam uma inteligência
coletiva em torno da segurança, que foi quebrada pelo novo modelo). Essas
descobertas deram origem a novos programas de relação cidadãos-governo, como o
bem-sucedido programa americano denominado “911” e o conceito de segurança de
bairros, ambos casos em que sociedade e governo se unem no cumprimento do
interesse social.

Em sua percepção mais ampla, coprodução refere-se ao processo de produzir em


conjunto (cocriação), com ênfase à natureza colaborativa de se criar valor de forma
coletiva (OSTROM, 1996; FONSECA, 2010; MEIJER, 2012). Nessa visão, coprodução é
definida como sendo a participação de cidadãos na produção e entrega de serviços
públicos. Trata-se do mix crítico de atividades com que agentes de serviços e cidadãos
contribuem na oferta dos serviços públicos (BRUDNEY e ENGLAND, 1983).

A noção de atuação conjunta governo-sociedade, que dá bases para essa definição,


forma um dos construtos de uma visão contemporânea de gestão pública,
denominada Novo Serviço Público (NSP), que também adota a definição de coprodução
como “participação cidadã na produção e entrega de serviços públicos” (DENHARDT e
DENHARDT, 2007, p. 113).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 26
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

Nos últimos anos, a tendência da coparticipação cidadã em serviços públicos não


passou desapercebida por agências de fomento ao desenvolvimento científico em
países desenvolvidos e tampouco a quem tem buscado modelos de estudo sobre
coprodução em ciência, conforme descrito a seguir.

Ciência e Coprodução
Em ciência a coprodução cidadão-governo tem sua correspondente nas relações
cientistas-sociedade e cientistas-governo. Nessa visão, Schuttenberg e Guth (2015)
definem coprodução como sendo a pesquisa participativa e a governança colaborativa
que fundamenta ações e decisões segundo o melhor conhecimento disponível. As
autoras partem da premissa de que todos os atores têm a capacidade de resolver o
problema quando houver representação, capacidade, confiança e comprometimento
com o aprendizado.

Segundo essa definição, a produção de conhecimento é um processo colaborativo em


que todos os atores têm protagonismo. Nessa visão, todo conhecimento disponível,
científico ou não científico, deve ser considerado para resolver problemas complexos,
de modo a que atores científicos e governamentais e sociais aprendam juntos.

A coprodução em ciência é um dos desafios da transdisciplinaridade, que já vem sendo


buscado por diversos grupos de pesquisa, com propostas de frameworks para
integração (ex. HADORN, POHL e BAMMER, 2011; e SCHUTTENBERG e GUTH, 2015). O
objetivo é considerar conhecimentos de matizes diferentes, conflitos de visões,
comunicação e criar espaços de coprodução com confiança mútua, isso realmente é
algo desafiador. No Quadro 5 estão descritas formas de coprodução em ciência
discutidas na literatura.

Coprodução em Ciência Definição


Forma contemporânea de organização da ciência, que envolve
Colaboração Virtual em cientistas que trabalham dentro de ambientes tecnológicos,
Pesquisa desenvolvendo ciência de forma geograficamente distribuída, porém
como se fosse uma única unidade (CUMMINGS e KIESLER, 2008).
Estilo de investigação científica caracterizada pelo uso de recursos em
Big Science larga escala, tais como grandes equipes, big data e cyber-
(pesquisa em larga escala) infraestrutura, geralmente envolvendo colaboração internacional
(ORTOLL et al., 2014).
Citizen Science Envolve a participação pública na pesquisa científica (ROTMAN et al.,
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

2014)
CCT para o benefício da sociedade consiste em interações escalonáveis
Convergência de e transformadoras entre disciplinas, tecnologias, comunidades e
domínios da atividade humana, aparentemente distintos, que visam
Conhecimento e compatibilidade, sinergia e integração e, nesse processo, criam valor e
Tecnologia (CCT) se ampliam para alcançar objetivos comuns (ROCO e BAINBRIDGE,
2013).
Quadro 5: formas de coprodução em ciências.
Fonte: do Autor

Como se pode ver no Quadro 5, a coprodução pode se dar entre cientistas de


diferentes grupos, mediados por tecnologia e trabalho em rede (i.e., por colaboração
virtual ou pesquisa em larga escala), com a participação da sociedade (Citizen Science)
ou por meio da busca de convergência entre tecnologia e comunidades na criação de
valor e resolução de objetivos comuns (CCT).

Nos dois primeiros casos, a coprodução é viabilizada por laboratórios virtuais, redes de
pesquisa com objetivos comuns a vários grupos de pesquisa. Quando além de
objetivos os grupos compartilham infraestrutura científica e atuam em larga escala há
a chamada Big Science, como no caso dos grandes telescópios multinacionais
compartilhados entre vários grupos de pesquisa.

O conceito de Citizen Science, por sua vez, guarda relação com uma das visões do
conhecimento transdisciplinar de FRODEMAN (Quadro 4). Nesse tipo de projeto, a
sociedade é convidada a fazer parte do processo científico, com participação direta no
processo de pesquisa cientifica (ROTMAN et al., 2014). Há diversas origens para
motivar a sociedade a colaborar, incluindo a participação na tomada de decisão (ex.
priorização de investimentos em ciência), a ajuda na coleta e tratamento de dados e a
formação de futuros cientistas13.

O último conceito destacado no Quadro 5 é apresentado por pesquisadores e gestores


da National Science Foundation (NSF), que, ao mesmo tempo, caracterizam e destacam

13
Entre os projetos que se destacam nessa visão está o Um exemplo é o Programa Scistarter – Portal
americano (http://scistarter.com/index.html) com mais de 400 projetos em curso – e o Citizen Science
Central (http://www.birds.cornell.edu/citscitoolkit/) – Portal financiado pela National Science
Foundation para apoiar a criação de projetos de citizen sciences.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 28
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

um dos principais resultados que se pode alcançar pela convergência entre


conhecimento e tecnologia: a criação de valor sob objetivos comuns. Programas
recentes da NSF têm trazido essas expectativas para a avaliação de resultados e para a
avaliação na priorização de investimentos em CT&I.

Uma Taxonomia para a Coprodução


Nas seções anteriores discutimos definições de coprodução no âmbito da relação
governo-cidadão e entre atores de sistemas científicos. Essas definições não
distinguem os diferentes tipos de atuação coletiva que os partícipes podem ter. De
fato, não há uma definição consensual para os termos coprodução, cooperação e
colaboração. Em nosso entender, isso dificulta a disseminação da cultura de
coprodução. Atividades como planejamento, fomento, acompanhamento e divulgação
de programas de trabalhos coletivos em educação superior, ciência, tecnologia,
inovação podem se beneficiar se houver diferenciação para os distintos níveis de
participação, como discutido no Quadro 6.

COOPERAÇÃO – segundo o dicionário Oxford, cooperar é “ação ou processo de se trabalhar


junto para o mesmo fim”. A cooperação se dá “por meio de divisão de tarefas entre os
participantes” e cada indivíduo “é responsável por uma parte da solução do problema”
(Roschelle e Teasley, 1995, p.70). Quando cooperam, os participantes não participam da
definição dos objetivos, nem mesmo da solução integrada do problema (Détienne, Baker e
Burkhardt, 2012) e podem até mesmo desconhecer os demais cooperadores. A cooperação
pode ser coordenada por agente externo ao coletivo em ação. Por exemplo, em um ciclo de
produção industrial, a indústria montadora define e coordena seus fornecedores (que podem
nem ter contato entre eles).

COLABORAÇÃO – embora considerada, às vezes, arranjo cooperativo ou sinônimo de


“cooperação” (Oxford e Business Dictionary), a colaboração vai além, pois implica em
“sincronismo conjunto para co-elaborar um entendimento compartilhado do problema a ser
resolvido” (Roschelle e Teasley, 1995, p.70). A principal diferença entre colaboração e
cooperação está na participação dos membros da equipe na definição da tarefa e articulação
do objetivo (Gunawardena, Weber e Agosto, 2010). A colaboração envolve negociação para
alinhamento dos conhecimentos individuais sobre o processo e o conteúdo do projeto, de
forma a se estabelecer a mesma orientação dentro da equipe, e garantir uma solução conjunta
para o problema (Kleinsmann et. al., 2012). Colaboração, portanto, tem vínculos coletivos mais
formais do que a cooperação.

COPRODUÇÃO – Diz respeito a coproduzir (i.e., produzir em conjunto) e à cocriação,


enfatizando a natureza colaborativa da criação de valor (Ostrom, 1996; Fonseca, 2010; Meijer,
2012). Ao coproduzirem, os integrantes de uma equipe se tornam coautores do resultado de
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 29
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

sua atividade coletiva. Para tal, mais do que colaboração (necessária à explicitação de
responsabilidades), a ação coletiva deve produzir resultados passíveis de propriedade
intelectual aos integrantes do grupo produtor.

Quadro 6: definições para cooperação, colaboração e coprodução.


Fonte: Adaptado e revisado de Pacheco, 2014.

Em síntese, as definições no Quadro 6 representam os diferentes estágios em


atividades coletivas, com relações crescentes em cada nível. Se abstrairmos os prefixos
“Co’s” de cada termo, tem-se, primeiro, a operação conjunta, seguida da elaboração
em grupo para, no último nível, a produção (criação) de autoria compartilhada pelos
integrantes. Na Figura 7 estão apresentados esses níveis de integração acrescidos, na
base, pelo termo coexistência14.

Figura 7: Tipos de trabalho coletivo e exemplos em ciência, tecnologia e inovação.


Fonte: do autor

Na taxonomia apresentada e exemplificada na Figura 7, em cada nível de interação, os


coletivos aumentam gradativamente sua atuação, que se inicia com a simples
existência comum em um mesmo ambiente/local/organização, passa por diferentes
formas de trabalho coordenado em equipe e culmina na produção de autoria conjunta.
Para cada nível de atuação coletiva, na Figura 7, além das definições são apresentados
exemplos de atuação coletiva encontrados na educação superior, ciência e tecnologia.
14
Em Ecologia, a coexistência é definida como “duas ou mais espécies encontradas no mesmo lugar, ao
mesmo tempo”(BAETA ALACIO, et. al, 2015). Na ciência da computação, já foi definida como
“entidades copresentes em um ambiente suficientemente próximas para ser sentidas (i.e.,
descobertas) uma pela outra” (UMASHANGAR, 2009).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 30
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

Os exemplos também ilustram os níveis crescentes de interação, que vão do convívio


profissional (ex. colegas de departamento) à produção de resultados coletivos, em
coautoria (ex. produção intelectual) ou protagonismo conjunto (ex. roteiristas de um
filme).

Com essas definições, pode-se analisar o grau de cooperação, colaboração e


coprodução de indivíduos (com ou sem coexistência). Em nossas pesquisas15, temos
trabalhado para a construção de parametrização que pode, a cada contexto e domínio,
apoiar a reflexão sobre de que forma e com que intensidade diferentes coletivos se
engajam em atividades intensivas de conhecimento (i.e., que valor comum é percebido
e como se dá a governança entre os indivíduos partícipes). Esse valor comum também
é denominado “bem comum”, cuja definição é central no nosso 4º construto:
commons, conforme descrito a seguir.

4o C: Commons digitais
O quarto e último “C” que acrescentamos aos construtos do modus operandi
contemporâneo da educação superior, ciência, tecnologia e inovação, denominamos
commons digitais. Para compreendê-lo, é necessário, primeiro, entender sua gênese
que, a exemplo da coprodução em ciência, também se deve a Elinor Ostrom.

Commons
Após duas décadas de pesquisas em comunidades que compartilhavam bens
produzidos (ex. bibliotecas públicas) ou naturais (ex. pastagens e áreas de pesca),
Ostrom observou que, respeitados princípios gerais de uso do bem comum, a gestão
coletiva dos recursos se mostra mais sustentável do que a proporcionada por modelos
de propriedade privada ou governamental. A esses bens coletivos a pesquisadora
denominou commons - recursos compartilhados por indivíduos e, por essa razão,
sujeitos a conflitos sociais (HESS e OSTROM, 2007, p. 3). Seu trabalho, laureado com o
Prêmio Nobel de Economia de 2009, inclui a identificação de 8 (oito) princípios de
commons sustentáveis, conforme indicado na Figura 8.
15
BATISTA, Kedma. Mensurando a qualidade da colaboração científica. Tese de Doutorado em
andamento. Orientador: Roberto C. S. Pacheco. Programa de Pós-Graduação em Engenharia e
Gestão do Conhecimento. Universidade Federal de Santa Catarina. 2015.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 31
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

Figura 8: Princípios da gestão sustentável de commons.


Fonte: Adaptado de OSTROM (1990, p. 90).

Os princípios apresentados na Figura 8 foram resultado da compilação de mais de 5 mil


casos descritos na literatura nas áreas de sociologia rural, antropologia, história,
economia, ciência política, agricultura, irrigação, sociologia e ecologia humana, com
estudos conduzidos na África, Ásia e Europa (OSTROM, 1990, p. xv). Também foram
realizados trabalhos de campo em todos esses continentes. Tanto na pesquisa de
literatura como na de campo, Ostrom e seus colaboradores identificaram (OSTROM,
1990, p. xv): (1) a estrutura do sistema de recursos compartilhados; (2) atributos e
comportamentos dos indivíduos que apropriam esses recursos; (3) as regras que esses
apropriadores utilizam; e (4) os resultados do comportamento dos apropriadores.

A análise dos casos revela uma ampla gama de diferenças na forma como
apropriadores de commons estabelecem regras, com diversas variantes regulatórias
quanto ao uso da propriedade16. Por outro lado, além das diferenças operacionais,
Ostrom identificou semelhanças fundamentais: o compartilhamento de bens comuns
ocorre em ambientes complexos e incertos. Assim, as comunidades estabelecem
regras e ações que visam preservar seu futuro, mantém memória e aprendizado

16
OSTROM (1990, p. 89) exemplifica essas diferenças com casos de uso da terra, em que as regras
incluem a definição comunitária (montanhas japonesas), patriarcal (montanhas suíças), autoridade
por parcela de propriedade (Espanha oriental) ou contratos de longa duração sobre as
responsabilidades de uso (Filipinas).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 32
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

baseado em indivíduos experientes, que têm no cumprimento de promessas,


honestidade e confiabilidade seus principais ativos (OSTROM, 1990, p. 88-89).

Na Figura 8 apresentamos uma síntese dos princípios fundamentais descobertos por


Ostrom nos casos de commons que se mostraram sustentáveis ao longo do tempo. Em
síntese, a sustentabilidade se mostra associada: (i) à clara delimitação do commons e
de suas regras; (ii) à adequação ao contexto local (ou seja, não é “importado” de
outras comunidades); (iii) à participação dos indivíduos na alteração das regras a que
se condicionam (ou seja, as regras são coproduzidas pelos indivíduos); (iv) ao
monitoramento tanto do commons como do comportamento de seus integrantes: (v) a
sanções proporcionais à violação; (vi) à capacidade de resolver rápida e
economicamente os conflitos17; (vii) à autonomia da comunidade em relação a regras
externas; e (viii) ao exercício de responsabilidades em camadas (essa última
especialmente importante para commons de maiores proporções).

Na Figura 8, sugerimos as seguintes ampliações no texto original de Ostrom18: (i)


títulos (em itálico); (ii) referência à coprodução das regras do commons que o terceiro
princípio implica; (iii) a associação de mecanismos de avaliação ao monitoramento (no
quarto princípio); e (iv) além de sanções, a relação com mecanismos de
reconhecimento e recompensas para comportamentos que reforçam as regras
coletivas.

17
Conflitos fazem parte da própria definição de commons. Assim, ao invés de prorrogados ou evitados
devem ser enfrentados, antes que se tornem confrontos (ou seja, virem enfrentamentos entre as
partes, sem referência de bem comum).

18
A relação de princípios de Ostrom era considerada por sua autora uma relação especulativa. A autora
não acreditava ser possível ter uma relação necessária e suficiente para assegurar uma
institucionalidade, uma vez que essa requer a vontade de seus integrantes (OSTROM, 1990, p. 229).
Nossa ampliação é o registro de reflexões sobre nossa própria experiência com commons digitais,
concebidos e desenvolvidos para plataformas de governo eletrônico, em que recompensas
(visibilidade e reconhecimento) tendem a funcionar melhor do que sansões e em que a participação
na alteração de regras deve trazer o sentido de coprodução para seus integrantes (como ocorre com
os padrões de dados em plataformas de governo aberto).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
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tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

Conhecimento como Commons


O trabalho laureado de Elinor Ostrom referiu-se a commons naturais ou produzidos
pelo ser humano, em que o uso de uma unidade por parte de um integrante impede
outro integrante de utilizar a mesma unidade. Água, peixes, terra ou um livro em uma
biblioteca não são compartilháveis por mais do que um indivíduo, ao mesmo tempo e,
no caso dos recursos naturais, seu uso pode implicar em eliminação do recurso para
futuro uso. Nos últimos anos de sua vida, Ostrom uniu-se à pesquisadora Charlotte
Hess, motivada em verificar se os princípios que descobrira para commons são
igualmente verdadeiros para conhecimento e para recursos digitais, em que se
permite o uso compartilhado das mesmas estruturas, sem seu consequente
esgotamento.

Nessas pesquisas, descobriu-se que a noção de conhecimento como um commons


surgiu em meados dos anos de 1990, quando a teoria de commons se mostrou útil no
estudo dos novos dilemas advindos da informação distribuída e digital, incluindo a
sobrecarga no uso de dados, o parasitismo no uso de sistemas (free riding) e a
propriedade coletiva de conhecimento, em estudos de propriedade intelectual (HESS e
OSTROM, 2007, p. 4).

Conclui-se que o conhecimento é um tipo distinto de commons, pois pode ser


cumulativo e sujeito a ter no interesse público fator impulsionador de sua criação na
forma de commons (ex. pesquisas de curas de doenças). Além disso, diferentemente
de recursos naturais e dos bens concretos produzidos pelo ser humano, o uso do
conhecimento por um indivíduo não impede que outro possa acessá-lo.

Por outro lado, essas distinções não removem os conflitos sociais no uso do
conhecimento que são observados em recursos naturais e bens produzidos. Hess e
Ostrom (2007, p. 10) discutem um caso bem característico de sistemas de educação
superior e inovação: as relações universidade-empresa, em que as partes interessadas
- empresários e academia - devem criar formas de resolver uma gama de conflitos (ex.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 34
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

copyrights versus acesso aberto, nondisclosure versus publicação, fomento público


versus financiamento privado, prioridade em formação ou na inovação, etc.).

É no contexto de visão de conhecimento como um tipo de commons que encontramos


um caso particular, referente aos commons digitais, que, ao encapsularem
conhecimentos em tecnologias da informação e comunicação, criam novas formas de
commons, como descrito a seguir.

Commons digitais
Ao combinarmos o histórico de pesquisas do EGC/UFSC com o portfólio de concepções
e desenvolvimentos do Instituto Stela, propomos a seguinte definição para commons
digitais (Pacheco, 2014):

 Commons digital é um recurso baseado em conhecimento, disponível em


plataformas de tecnologia de informação e comunicação (portanto, digital),
compartilhado por grupos (portanto, commons) e integrado em uma cadeia de
valor (portanto, ativo intangível19), sob princípios de equidade, coprodução e
sustentabilidade.

Figura 9: Definição e construtos de Commons Digitais.


Fonte: Pacheco (2014).

Como ilustrado na Figura 9, a definição de commons digitais está fundamentada nas


definições de commons, conhecimento e ativos intangíveis. Essa última ressalta a

19
Definido em Pacheco (2014) como “recursos imateriais (intelectuais) que integram a cadeia de valor
de um bem ou serviço de propriedade privada, pública ou coletiva”.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 35
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

característica neutra (não valorativa) do conceito de commons em relação à natureza


do tipo de propriedade que se pode dar a um commons digital. Segundo Hess e
Ostrom, deve-se ter claro o fato de que ao se caracterizar algo como um commons não
se está intrinsecamente atribuindo-o valores virtuosos, ou seja, "commons é um
conceito não valorativo - sua saída pode ser boa ou ruim, sustentável ou não" (Hess e
Ostrom, 2007, p.14).

A definição sugerida, no entanto, permite verificar a distância entre recursos digitais e


commons digitais. Ser digital é uma característica necessária, mas insuficiente.
Commons digitais referem-se ao acesso coletivo e devem ser verificáveis quanto aos
princípios de equidade, coprodução, eficiência e sustentabilidade, além dos princípios
de commons sustentáveis.

Muitas áreas de pesquisa e desenvolvimento de soluções digitais podem se beneficiar


de commons digitais. No Quadro 7 estão exemplos de commons digitais, em diferentes
áreas de aplicação.

Tipos de Commons Digitais Objetivos da ação coletiva Exemplos


Educacionais Criar e difundir conhecimentos MOOCs; Khan Academy
Científicos Promover avanço científico e-Science; Virtual Labs; Plataforma Lattes
De Informação Criar e difundir informações Digital Commons Network; e-Institute (World Bank)
De Inovação Promover cooperação tecnológica innovationcommons.co.uk; Portal Inovação
De Saúde Ambientes coletivos em saúde SERMO; Observatório de Saúde OMS
Industriais Sustentabilidade e efetividade ecopatentcommons.org
Legais Marco legal coletivo Creativecommons; futurelaw.org
De sustentabilidade Promoção de sustentabilidade sustainlv.org
Quadro 7: Tipos e exemplos de commons digitais.
Fonte: do Autor

Ao definirem seus recursos tecnológicos como commons, agentes públicos e privados


ganham uma nova perspectiva para avaliar seus ativos digitais quanto à promoção de
bem coletivo.

No caso de organizações governamentais, projetos de plataformas de governo


eletrônico podem ser elaborados e conduzidos para que essas tecnologias se tornem
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 36
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

commons digitais. Commons digitais podem ser instrumentos valiosos para promoção
de transparência, participação, accountability, efetividade e outros princípios de
governo aberto (GAVELIN et al., 2009 ). O governo pode também usar commons
digitais para implementar inovação colaborativa baseada em rede, parcerias e outras
formas de cooperação com atores sociais. É o caso de agências de CTI, em que suas
plataformas de coleta de dados junto a pesquisadores, cursos, universidades e demais
atores podem ser somente uma versão digital de seus processos operacionais (e
burocráticos) ou, alternativamente, instrumentos de promoção de e-Science e
Cyberinfrastructure, com bases de conhecimento para acesso futuro tanto pela
comunidade científica como pela sociedade20.

No setor acadêmico, commons digitais podem ajudar a entender e a melhorar as


plataformas de ensino à distância e educação coletiva (ex. MOOC), promover
transdisciplinaridade (ex. virtual labs) e oportunidades de cooperação universidade-
indústria.

Além disso, os exemplos no Quadro 7 permitem notar que commons digitais não estão
restritos somente aos espaços públicos. Seus princípios podem ajudar clientes e
empresas a construir novos canais de relacionamentos (ex. prosumers), novas formas
de prover inovação (ex. open innovation, crowd innovation) ou apoiar
empreendedores e investidores para criar novos empreendimentos (ex.
crowdfunding).

20
Nos últimos 20 anos, tivemos a oportunidade de coordenar projetos de governo eletrônico em ciência
(Plataforma Lattes e sua integração Lattes/CNPq e Coleta/CAPES), educação superior (projeto SINAES/INEP/MEC),
tecnologia aplicada (ex. DC-VISA, para ANVISA e DC-SIBEA para MMA - plataformas nacionais de competências em
vigilância sanitária e educação ambiental, respectivamente), inovação (Portal Inovação MCTI/CGEE e seus
recortes para ANPROTEC e MDIC) e governança (Sistema SIFAPS/CONFAP e Plataforma Aquarius/MCTI/CGEE).
Considero que apenas a Plataforma Lattes conseguiu alcançar o estágio de um commons digital que cumpre
(ainda que parcialmente) a totalidade dos 8 princípios descobertos por Elinor Ostrom. Os demais estão ou em
estágios intermediários (ex. Portal Inovação) ou talvez não alcancem o senso de propriedade coletiva sem uma
mudança de projeto que vise atender princípios de commons digitais. Nosso aprendizado está materializado em
uma metodologia integrada, denominada e-governança, que não só busca atender os princípios de commons
digitais como, também, os de governo eletrônico contemporâneo (PACHECO et. al., 2015).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 37
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

Quando commons digitais são aplicados em domínios específicos, surgem projetos


como o Sermo - rede onde cerca de 500 mil médicos podem “falar abertamente com
outros médicos sobre qualquer assunto que seja importante para eles (...) sem temer
por repercussões”21. Esses ambientes têm no conhecimento coletivo seu bem comum.
Outro commons no setor de saúde apresentado no Quadro 7 é o Observatório de P&D
em saúde, da Organização Mundial de Saúde (OMS), projeto em que participa o
pesquisador do Instituto Stela egresso do EGC/UFSC, José Salm Jr., em que diversas
fontes de informação em saúde serão compartilhadas por pesquisadores da OMS,
como insumos à tomada de decisão e resolução coletiva de problemas (TERRY et. al.
2014).

Commons digitais têm sido veículos de compartilhamento mesmo em ambientes


privados, de clássica relação comercial. Um exemplo é o ecopatentcommons.org,
espaço em que grandes indústrias americanas depositam e abrem patentes de
processos que causam bem ao meio ambiente. Seus partícipes podem utilizar (ou
ofertar) gratuitamente patentes de outras indústrias afiliadas.

Uma análise desses diversos casos em curso indica que, na visão de quem faz parte de
um commons digital, os bens coletivos são mais importantes do que seus equivalentes
individuais. Participar de commons digitais requer plena consciência do que seja
coprodução, equidade e desprendimento (humildade) de concessão.

VISÕES E REFLEXÕES
Nesta seção, retomamos parte do nosso compromisso original com este capítulo:
registrar as reflexões nos eventos na UFSC acerca do I SIIEPE. Para tal, inicialmente
destacamos as principais conclusões do evento de 2014 e, posteriormente, discutimos
as possíveis implicações para os diferentes atores de ciência, tecnologia e inovação.

21
http://www.sermo.com/what-is-sermo/overview
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 38
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

Conclusões do III Encontro Nacional de Interdisciplinaridade da CAPES


No Erro! Fonte de referência não encontrada., a seguir, estão indicadas algumas das
conclusões sobre o III Encontro Acadêmico Internacional Interdisciplinaridade nas
Universidades Brasileiras, realizado na CAPES em maio de 2014 (PHILIPPI JR et. al,
2014).

ATOR RECOMENDAÇÕES DOS ENCONTROS REGIONAIS DE INTERDISCIPLINARIDADE


Estrutura organizacional: deve ser flexível em sua governança (ex. fim dos departamentos) e
revista nos espaços físicos (para encontros, convivência e trocas de experiências).
Pesquisa, Ensino e Pós-Graduação: devem articular produção e transferência de
conhecimento e novas formas de coprodução (ex. múltiplos orientadores).
Revisão curricular: quanto ao contexto e atualidade (ex. mobilidade discente e docente).
Revisão Pedagógica: com aprimoramento das formas de ensino, afastando-se de aulas
Universidades tradicionais e massivamente teóricas, promovendo a autonomia discente.
Liderança: aumentar diálogo institucional e destacar líderes de planos institucionais
Concursos públicos: devem rever exigências de formação disciplinar específica. Aceite de PPG
Multi e Interdisciplinares.
Egressos e mercado de trabalho: vencer barreiras de ingresso do profissional multi/inter.
Pós-Graduação e Educação Básica: universidades devem formar professores de visão
multi/interdisciplinar.
Geral: rever procedimentos de avaliação, regulamentação e sua estrutura organizacional.
Editais temáticos: aperfeiçoar financiamento a projetos inovadores (multi e inter)
Agências de Comitês de Avaliação: abordagens multi e interdisciplinares
Fomento Novos critérios de análise de mérito e impacto em problemas nacionais
Valorização da colaboração entre diferentes matizes de conhecimento
Quadro 8: Recomendações do SIIEPE I (2013) e Encontro Nacional na CAPES (2014).
Fonte: PHILIPPI JR et. al, 2014 (adaptado pelo Autor)

No Erro! Fonte de referência não encontrada. estão as principais recomendações e


conclusões das discussões realizadas em 2014 por especialistas do País e do exterior,
que abordamos a seguir, primeiro para universidades e, em seguida, para agências de
fomento.

Desafios contemporâneos para a universidade brasileira


Para universidades, pode-se verificar que, de forma geral, o desafio da multi e da
interdisciplinaridade exige novas estruturas. Entre essas, está a criação de espaços
físicos mais adequados à coprodução, que facilitem o encontro de alunos, a
mobilidade discente e a existência de espaços coletivos (em contraponto à cultura
expressa nas visões “a sala do meu professor”, “os corredores do meu departamento”
ou “o prédio do meu curso”).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 39
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

Além dos aspectos físicos, a estrutura universitária também deve ser revista nos
currículos ofertados em seus cursos, que, além de atualizados, devem contemplar
atividades acadêmicas curriculares que visem a mobilidade discente, a promoção de
liberdade para a multi-formação. Esses aspectos guardam relação com a
recomendação de revisão pedagógica nas estruturas acadêmicas, que levem a um
estudante mais autônomo.

No conjunto de recomendações estruturais, também enquadramos o indicativo sobre


a necessidade de lideranças que estejam sintonizadas com essas demandas
contemporâneas à educação superior (e que tenham resiliência para promover as
mudanças necessárias, mesmo diante de todas adversidades e resistências que a
cultura vigente vier a contrapor).

Especificamente na pós-graduação, deve haver articulação na formação e produção de


conhecimento tanto entre cursos como com a sociedade. Práticas como múltiplos
orientadores, em nível de igualdade de orientação de diferentes áreas e colaboração
empresarial na definição de currículos podem ser incentivadas.

As três últimas recomendações para o sistema acadêmico apresentadas no Erro! Fonte


de referência não encontrada. referem-se à expectativa de revisão de instrumentos
(concursos), a uma formação e inserção de egressos adequadas aos desafios
contemporâneos e ao compromisso com uma educação básica de mais qualidade para
o País.

Ainda no campo da universidade, a questão dos concursos públicos foi desafio


mencionado unanimemente nas cinco regiões. Concursos devem aceitar a formação
de doutorado e mestrado em programas das áreas multi e interdisciplinar e ter sua
visão baseada em matriz de competências e não de formação. Em relação à educação
básica, considera-se necessário maior conscientização da universidade (especialmente
de sua pós-graduação) de que ela forma seus professores que atuarão com a educação
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 40
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

infantil e que esta formação seja sistêmica e condizente com alunos autônomos,
trazendo isso para o seu processo e para sua matriz de avaliação.

Em síntese, verifica-se que a clássica missão universitária, materializada na tríade


ensino, pesquisa e extensão, deve ser realizada por novas estruturas, instrumentos e
por efetivo impacto perceptível pela sociedade. Esse desafio é, em realidade, uma
excelente oportunidade para que a universidade assuma-se como partícipe de
sistemas de coprodução (ex. relações universidade-empresa22, programas multi-
institucionais de extensão social, programas de citizen Science).

O papel das agências de fomento


Em relação às agências de fomento, as reflexões no evento realizado na CAPES em
2014 voltaram-se aos seus procedimentos de avaliação, regulamentação e à sua
estrutura organizacional.

Uma das estratégias sugeridas é a adoção de editais temáticos, programas voltados a


problemas complexos e de impacto para a sociedade. Isso exige, também, mudanças
nos processos de avaliação, com a troca de comitês por área de conhecimentos para
equipes multidisciplinares de avaliadores23, com critérios que não só verifiquem mérito
científico de proponentes, mas também o potencial de impacto social e econômico de
suas propostas. Em termos concretos, essas sugestões impactam na forma com que

22
Passada uma década, a Lei de Inovação tem tido pouca efetividade em seus objetivos originais. Mais
do que um marco regulatório adequado, a inovação requer uma cultura de coprodução. Nos Estados
Unidos, a equivalente Lei Bayh-Dole trouxe segurança jurídica para o setor empresarial buscar a
universidade (permitiu que o governo renunciasse participação na propriedade). Já no Brasil, a
operacionalização da Lei de Inovação trouxe mais burocracia ao pesquisador empreendedor e mais
incertezas no setor empresarial (especialmente no nível de parceria comercial pretendido pela
universidade a cada interação que a empresa realiza).
23
Pode-se constatar a importância da estrutura organizacional de avaliação pela comparação entre os
modelos do CNPq e da CAPES. Enquanto a CAPES diferencia a avaliação de cursos multi e
interdisciplinares há mais de 15 anos, o CNPq mantém a avaliação de candidaturas
multi/interdisciplinares por comitês disciplinares. Com isso, o Conselho tem gerado inúmeros casos de
aprovação por mérito com recusa por enquadramento. No evento da CAPES, o presidente do CNPq
disse temer que a criação de comitês multi/interdisciplinares impeça a difusão desses modos de se
fazer ciência para todas as áreas. Caso a CAPES tivesse adotado a mesma estratégia, é muito provável
que o País não contasse hoje com mais de 370 programas de pós-graduação interdisciplinares e com
os cursos em ciências ambientais. Em setembro de 2015 coordenadores de pós-graduação da CAInter
elaboraram a terceira quarta de solicitação de criação de comitês inter/multidisciplinares no CNPq.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 41
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

são definidas as temáticas dos editais (ex., se quem as define é a agência isoladamente
ou comitês com atores científicos, empresariais, governamentais e sociais), os critérios
e protagonistas da avaliação e a forma de acompanhamento e divulgação de
resultados.

Esses desafios para as agências de fomento também remetem à coprodução, às


diferentes formas de conhecimento e, em última instância, à capacidade dessas
organizações fazerem com que seus objetivos e resultados sejam commons para a
sociedade a que se destinam. Agências governamentais fomentam a formação de
recursos humanos, a produção e difusão de conhecimento científico, tecnológico e de
inovação. O desenvolvimento socioeconômico é o principal resultado do cumprimento
da missão de uma agência de fomento, mas sem que isso seja compreendido e
apoiado por sua sociedade, haverá dificuldade na garantia de seus recursos.

Um exemplo de ações de associação entre o fomento e a difusão com impacto social


ocorreu no Programa Estruturante II – ação de parceria FAPESC e FINEP. Na Figura 10
estão ilustrados elementos apresentados no evento da Jornada de Coprodução Digital,
em maio de 2015, na UFSC, como parte desse Programa.

Figura 10: Definição e construtos de Commons Digitais.


Fonte: Instituto Stela - Projeto Estruturante II e Fotos da Jornada de Coprodução Digital

Na última fase do Programa Estruturante II, a FAPESC adotou modus operandi


diferenciado para a conclusão, prestação de contas e difusão de resultados de
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 42
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

financiamentos públicos. Realizado por grupos de pesquisa de diversas instituições do


Estado24, o Programa Estruturante II permitiu a dotação de estrutura laboratorial para
diversos grupos, bem como o avanço nas pesquisas e na formação em suas áreas de
contribuição ao projeto. No entanto, somente quando a Fundação definiu o setor de
saúde como foco de demonstração, os grupos de pesquisa puderam articular-se, de
forma multidisciplinar, em torno da criação de protótipo integrado com todos os
dispositivos criados pelos laboratórios e um software que combina em um mesmo
ambiente as informações capturadas pelos diferentes dispositivos.

Na Figura 10 há uma foto com a demonstração de uso integrado de dispositivos que


facilitam a análise por parte de profissionais de saúde. Além disso, durante o evento da
Jornada de Coprodução Digital, jovens foram capacitados em criação de modelos de
negócios e propuseram diversas outras aplicações para o protótipo para diferentes
setores (ex. segurança, educação, suprimentos, etc.). Trata-se de um exemplo de como
uma agência de fomento pode articular um programa de fomento com objetivos
estratégicos que levem pesquisadores a buscarem prototipar suas soluções, de forma
integrativa e considerando impacto socioeconômico.

SÍNTESE E CONSIDERAÇÕES FINAIS


Neste capitulo abordamos 4 construtos que consideramos essenciais ao
enfrentamento dos atuais desafios da educação superior, ciência, tecnologia e
inovação. Dois desses construtos referem-se a uma tendência contemporânea – a
convergência – e a um modus operandi resultante – a coprodução. A convergência
enfatiza a tendência de integração de fatores tecnológicos, sociais e culturais que
caracterizam a sociedade do conhecimento. A coprodução destaca a relevância da
criação coletiva, em diversos âmbitos da atividade humana. Discutimos, também, a

24
O Programa Estruturante II foi resultado de fomento conjunto entre Financiadora de Estudos e
Projetos (FINEP) e FAPESC. A proposta catarinense contemplada foi o projeto SCTIC – Tecnologia da
Informação e Comunicação para Serviços Multiplataforma em Larga Escala: Sistemas Ubíquos a
Serviço da Qualidade de Vida, encaminhado por diversos laboratórios da Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC), Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Universidade do Vale do
Itajaí (UNIVALI), Instituto Stela e outras instituições do Sistema da Associação Catarinense das
Fundações Educacionais (ACAFE).
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 43
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

relevância de se estabelecer uma taxonomia para coprodução que considere os


diferentes modos de ações coletivas, com a coprodução sendo necessariamente
associada à coautoria entre os partícipes.

Além disso, tratamos dois produtos de ações coletivas: conhecimento e commons.


Durante uma década, no Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do
Conhecimento da Universidade Federal de Santa Catarina, pesquisadores de diferentes
formações (e epistemologias) estabeleceram uma definição pragmática para seu
objeto de pesquisa (conhecimento é fator gerador de valor). A experiência acumulada
na atuação interdisciplinar nos permitiu propor uma nova definição para
conhecimento, colocada na forma de um meta-conceito. Nessa nova definição, supõe-
se que conhecimento tem a forma tanto de processo como de produto, é
protagonizado tanto por agentes humanos como artificiais e tem diferentes contextos
para de percepção do valor que gera.

Além de um meta-conceito, conhecimento pode resultar de diferentes formas de


integração de saberes. Neste capítulo, abordamos os modos disciplinar,
multidisciplinar, interdisciplinar e transdisciplinar como níveis crescentes de
combinação de disciplinas científicas na coprodução de conhecimento. No caso
transdisciplinar, em uma de suas visões, admite-se, também, a coprodução com atores
de conhecimento não cientifico.

Como quarto construto discutimos commons e apresentamos uma definição que


propomos para commons digitais. Commons referem-se ao bem comum. Sua área de
estudos, criada por Elinor Ostrom, trata de princípios e fatores da atuação coletiva que
pode impactar na criação e gestão de bens comuns duradouros. Commons digitais são
bens ou serviços coletivos e digitais, baseados em conhecimento e que podem ser
avaliados segundo princípios de commons.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 44
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

Esta definição representa uma integração dos quatro construtos discutidos, pois
commons digitais estão entre os principais instrumentos promotores da convergência,
resultam e estão sujeitos à coprodução em atividades intensivas em conhecimento.

Não há problema complexo que dispense algum desses construtos para alcançar
efetiva resolubilidade. Em CTI e educação superior, destacamos a necessidade de que
a totalidade de seus atores institucionais, nos setores acadêmicos, governamental,
empresarial e da sociedade civil organizada, primeiro busquem meios de uma efetiva
identificação do que consideram commons e, a partir dessa continua referência de
bem comum, busquem ações e instrumentos de coprodução que tornem seus
commons duradouros.
Coprodução em Ciência, Tecnologia e Inovação: fundamentos e visões
Autor: Roberto Carlos dos Santos Pacheco. Livro: Interdisciplinaridade: universidade e inovação social e 45
tecnológica. Joana Maria Pedro e Patrícia de Sá Freire (Organizadoras). Curitiba. CRV. 2016.

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