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Palavras chave
Universidade do Distrito Federal – Anísio Teixeira – Memória Institucional
In the literature dealing with the history of Brazilian higher education, the University of the Federal
District (UDF) and its principal creator, Anísio Teixeira, have a prominent place. Anísio throughout
importance it had in the field of educational politic in course of a considerable part of the twentieth
century. The UDF was characterized by its pretensions to be a university of study and research, other
than the university model structured by agglomeration of institutions of professional education. This
paper examines, in light of studies that interdisciplinary fields of Social Memory, History and
Language, the production of meanings assigned to that institution by Anísio, in his speech made at the
time of its inauguration in 1935. Joint are made between the announcement and the issue that
characterized the structure of the university in Brazil at that time.
Keywords
University of the Federal District – Anísio Teixeira – Institutional Memory
*Universidade Federal do Rio de Janeiro, Professor Adjunto, Doutor em Memória Social pela Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)
UNIVERSIDADE: MANSÃO DA LIBERDADE
Por mais limitado que seja o âmbito de vida de qualquer povo, lá iremos encontrar,
em gérmen – por vezes, obscuras e indiscriminadas-, quatro grandes instituições
fundamentais, que lhe constroem e condicionam a vida em comum: a Família, o
Estado, a Igreja e a Escola. Desde que haja vida em comum, e vida em comum de
homens, essas instituições, sob alguma forma, hão de aparecer, e aparecem para
manter, nutrir, ordenar e iluminar a vida em comum. Existir em sociedade envolve,
com efeito, imensas complexidades. Cada indivíduo nada mais sendo do que uma
urdidura de laços sociais, toda sua vida transcorre em plano superior ao de sua
própria vida física e seus meios de expressão não podem ser outros que os das
instituições de sua sociedade. Dentre essas instituições avultam as que mais
largamente lhe compõem o quadro da existência coletiva. A Família que vela pelo
seu desenvolvimento inicial e o conduz a se tornar, por sua vez, um perpetuador de
sua espécie; o Estado que lhe defende e regula a vida em grupo; a Igreja que lhe dá
o sentido profundo do seu devotamento social. e a Escola que o humaniza e
socializa. Todas essas funções se confundem e se misturam, em cada uma dessas
instituições, de tal modo que a história de qualquer delas é, de algum modo, a
história da humanidade. À medida que marcha a civilização, melhor se
caracterizam, entretanto, essas instituições, e um equilíbrio, sem hierarquia, se vai
estabelecendo entre suas funções. Se todas visam, com efeito, tornar possível e rica
a vida entre os homens, nem por isso são menos distintos e independentes os meios
de que dispõem para esse mesmo fim comum e único. (TEIXEIRA, 1998)1
1
Todas as citações referem-se a fragmento de discurso de Anísio Teixeira, na cerimônia de inauguração da UDF
– 1935 (TEIXEIRA, 1998). Publicado com o título “A função das universidades” no Boletim da Universidade do
Distrito Federal (Ano 1, nº 1, julho-dezembro de 1935).
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social, respondendo, mesmo que indiretamente, àqueles que, como Alceu Amoroso Lima e o
grupo católico, o acusavam de “desequilibrado” ou “subversivo”. Sabe-se que, pela estratégia
discursiva (BAKHTIN, 2010; FOUCAULT, 2007 [a],[b]), o sujeito escolhe o papel que quer
para si; e que pela antecipação, desequilibra enunciados com os quais pretende se opor. Ao se
referir às instituições brasileiras Família, Estado, Igreja e Escola, procura alinhá-las aos
discursos de seus opositores, ao mesmo tempo em que demarca sua posição de defensor da
ordem estabelecida, aspecto imprescindível a um pronunciamento que se fez diante de
intelectuais e autoridades civis, políticas e religiosas no ano de 1935, quando as forças
conservadoras já se articulavam para o arrefecimento do regime que culminaria com o Golpe
do Estado Novo, em 1937.
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história, já não digo o período de sua predominância, mas de sua legítima e total
independência. Confundida sua função com a Família, com a Igreja e com o Estado,
é, ainda hoje, com esses três senhores, que ela discute sua autonomia... Ou melhor,
são ainda esses três senhores que discutem, entre si, sobre a sua tutela.
Aqui Anísio deixa clara sua posição, que esteve bastante demarcada em sua atuação como
educador, bem como no Manifesto dos Pioneiros, do qual foi um dos principais signatários: a
defesa da educação laica, o que certamente muito desagradava aos que defendiam o intenso
controle da educação por parte do Estado, bem como ao grupo católico, que historicamente
tinha a hegemonia sobre o processo educacional no Brasil até então. Ao referir-se ao
predomínio das instituições que, “confusamente” não se circunscreviam às suas funções
específicas, aponta para o seu posicionamento ideológico de defesa da educação como
“liberdade” a ser exercitada para e por uma sociedade que, somente assim, superaria etapas e
períodos históricos anteriores e ultrapassados, marcados pelo “predomínio estreito da família,
prepotência da Igreja, ditadura do Estado”. Sua construção narrativa é histórica, linear e
teleológica.
Percebemos ainda que a linguagem é palco privilegiado da luta de classes e das ideologias.
Ao mesmo tempo que se vale de forças centrípetas, na concepção de Bakhtin (2009, 2010),
pela qual afirma e estabiliza o discurso, aproximando-o de formações discursivas tradicionais,
aponta para as forças centrífugas do enunciado, marcadas pela desestabilização, quando
propõe uma reconfiguração dos papéis a serem desenvolvidos por tais instituições, bem como
para as demarcações / separações necessárias entre as respectivas funções e áreas de atuação
dessas instituições: “ a independência e separação entre elas não é, assim, contingência
política, mas o próprio imperativo experimental para seu bom funcionamento”.
É explícito em sua posição ao afirmar que haveria a necessidade de separação entre as funções
das instituições, sobretudo no que se referia ao plano educacional. Podemos perceber que seu
enunciado tem uma perspectiva claramente dialógica com os representantes dos diversos
modelos pretendidos para o campo educacional. Como sabemos, a palavra não é monológica,
mas sim plurivalente e o dialogismo é uma condição constitutiva do sentido do enunciado. A
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forma como Anísio vai construindo sua linha argumentativa aponta para o que podemos
chamar de “formação ideológica” de sua discursividade que se evidencia quando empregará a
metáfora “a Mansão da liberdade2” ao final de seu pronunciamento para designar a
grandiosidade do empreendimento, ao mesmo temo em que evidencia sua posição ideológica
alinhada ao liberalismo e, consequentemente, contrária às medidas autoritárias que se
anunciavam no campo político.
Acreditamos que parte do que temos na “memória social” (e até mesmo no imaginário
simbólico) e na bibliografia que trata da história da educação considera mais as intenções
ideais defendidas e expressas por Anísio do que propriamente as características constitutivas
de toda e qualquer instituição universitária onde os saberes das (e entre) as diversas áreas e
campos sempre estão em disputas. Nesse sentido, seria a UDF uma utopia vedada por estar
fora de seu tempo ou por não ter tido tempo de mostrar as possíveis contradições e impasses
internos que certamente vivenciaria?
Na sua construção enunciativa, Anísio já vai abrindo espaço para a defesa do modelo da UDF,
sabedor que era do conturbado processo social e político que já configuravam o ano de 1935.
Segundo Brandão (2004), “em todo processo discursivo o emissor pode antecipar as
representações do receptor e, de acordo com essa antevisão do ‘imaginário’ do outro, fundar
estratégias de discurso” (BRANDÃO, 2004:.44).
E qual a universidade que abre, hoje, aqui as suas portas? É, por acaso, mais uma
universidade para o preparo puro e simples de profissionais, de médicos, bacharéis,
dentistas e de engenheiros civis? Não. É uma universidade cujas escolas visam o
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preparo do quadro intelectual do País, que até hoje se tem formado ao sabor do
mais abandonado e mais precário autodidatismo. Uma escola de educação, uma
escola de ciência, uma escola de filosofia e letras, uma escola de economia e
direito, e um instituto de artes, com objetivos desinteressados de cultura, não podem
ser demais no País, como não podem ser demais na metrópole desse país. (...)
E acrescenta:
Remetemo-nos a Becker (2007) quando nos diz que a realidade é complexa e não pode ser
pensada numa perspectiva de linearidade (2007, p. 31). Sendo assim, sempre atribuímos,
implícita ou explicitamente, um ponto de vista, uma perspectiva e motivos às pessoas cujas
ações analisamos. Daí o cuidado que devemos ter com as imagens que já possuímos para
evitar que as imagens estereotipadas entrem em ação. Daí a proposta de pensarmos as pessoas
pelas atividades que desempenham em determinado momento e contexto social. Segundo
Becker “as pessoas fazem o que fazem ou o que devam fazer em função do que nos pareça
bom no momento” (2007, p.32). Dessa forma, há “sempre que se evitar cair nas ‘mentiras’
que as organizações contam de si mesmas” (idem), por intermédio das diversas formações
discursivas que controlam seus discursos e conferem o status de credibilidade e verdade aos
enunciados de suas autoridades reconhecidas.
A UDF àquele momento estava em processo de constituição: nem todos os seus institutos
estavam prontos para o pleno funcionamento. Diversas aulas seriam ministradas por
professores que eram pesquisadores de outras instituições; diversos laboratórios a serem
utilizados não pertenciam à universidade. Ou seja, boa parte de uma pretensa identidade da
UDF era, na verdade, uma aposta de Anísio e dos grupos que com ele se alinhavam, em uma
nova perspectiva de organização institucional e de uma nova concepção de construção do
saber. Se ela seria bem sucedida ou viável, nunca o saberemos, já que sua curta duração
acabou por abortar o projeto.
REFERÊNCIAS
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BAKHTIN, Mikhail; VOLOCHÍNOV, V.N. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo:
Hucitec, 2009.
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
BECKER, Howard. Segredos e truques da pesquisa. Rio de Janeiro: Zahar, 2007.
BRANDÃO, Helena H.N. Introdução à análise do discurso. Campinas, SP: Ed. Unicamp,
2004.
FOUCAULT, Michel. [a] A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: forense Universitária,
2007.
_____. [b] A ordem do discurso. (Aula inaugural no Collège de France, pronunciada em 2 de
dezembro de 1970). São Paulo: Loyola, 2007.
TEIXEIRA, Anísio. Educação e universidade. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 1998.