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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE-UFF

PSICOLOGIA E CAMPO DE SAÚDE MENTAL

O NORMAL E O PATOLÓGICO E A PATOLOGIZAÇÃO DO USO DE


DROGAS

LUANA ROGÉRIO DA SILVA

CAMPOS DOS GOYTACAZES, RJ

2020
O presente trabalho visa discutir questões relacionadas sobre o normal
e o patológico entrelaçando a discussão a patologização do uso de drogas. O
tema em questão foi escolhido devido a curiosidade sobre e o desejo de
aprendizado, visto que tem sido algo cada vez mais discutido na sociedade, e
também devido a urgência e a importância do mesmo. Foi utilizado o
dispositivo audiovisual chamado “Um novo olhar sobre as drogas, Carl Hart”,
que foi uma entrevista feita pelo Dr. Drauzio Varella ao professor de
neurociências da Universidade Colombia nos EUA, chamado Carl Hart, mais
dois textos da disciplina, o “Torna-se mulher usuária de crack: trajetória de
vida, cultura de uso e política sobre drogas no centro de Salvador, Bahia” da
Luana Silva Bastos Malheiros e o texto “Fazer falar a loucura” da Luana da
Silveira e como texto acréscimo para a discussão utilizei o livro “O normal e o
patológico” de George Canguilhem.

O que é normal? O que é patológico?

Em contraposição ao positivismo muito presente no século XVII, George


Canguilhem vem nos falar que “o estado patológico não é a ausência de uma
norma, pois não existe vida sem normas de vida, o estado patológico também é
uma forma de se viver.” (CANGUILHEM, G. 2012.) As concepções positivistas
estão baseadas na apologia da norma, da ordem, reduzir o organismo a uma
máquina, e em seguida comparar a sociedade a um grande organismo, é
querer planejar tudo, programar tudo. Tendo isso em vista, a discussão sobre o
normal e o patológico vem nos clarificar a ideia de que o estudo da vida não
pode reduzir-se a uma análise físico-química, portanto a doença não é
simplesmente um disfuncionamento a se reparar, um desequilíbrio químico a
se corrigir, é antes de tudo, uma vivência individual. Ele diz também que é
impossível julgar o normal e o patológico de forma limitada à vida fisiologia e
vegetativa, usando como exemplo o astigmatismo que, em uma sociedade
agrícola poderia ser considerado completamente normal, mas seria visto como
algo patológico se a pessoa estivesse na marinha ou na aviação. Tudo isso nos
aponta e nos faz refletir sobre a necessidade de enquadramento daquilo que é
por si diferente, do que é novo, sem ao menos pensar a possibilidade de
entender esse diferente, e vê-lo como alguém que existe, ainda que com suas
limitações e é completamente normal.

Drogas

Embora a muito tempo as drogas tenham sido alvo de proibição,


tornando-se recentemente uma questão de saúde pública e não apenas de se
segurança pública, por volta do século XX é que elas se tornaram de fato, um
problema, devido ao contexto histórico mundial de violências, ditaduras,
guerras e censuras ideológicas ocorridas nessa época. Mesmo havendo desde
sempre muita repressão ao consumo de drogas, foi nesse período em que se
deu o proibicionismo legal e institucional e internacional, segundo Luana Silva
(2018), devido ao empenho do EUA em erradicar de vez as drogas e enfrenta-
la com política de guerra. Ela também diz que o estatuto do proibicionismo
separou a indústria farmacêutica, a indústria do tabaco, a do álcool entre outras
da indústria clandestina de drogas. Dentro desse contexto é possível refletir
sobre o quanto a cultura do proibicionismo contribuiu e contribui para uma
visão de patologização do consumo de drogas, separando o que se enquadra
como normal e habitual para uso, do que é, segundo eles, fora da norma. Todo
esse conservadorismo sobre o assunto, consequentemente fez com que
também surgisse vários PL’s afim de culpabilizar o usuário, aumentando a
penalização deste, como se isso dissesse de um erro de conduta e não como
uma possível escolha. Essas PL’s além de aumentar a ideia de patologização
do uso de drogas, também contrariam a Política Nacional sobre drogas, que
visa estabelecer medidas de melhor acolhimento e tratamento do usuário e a
garantia de acesso a políticas públicas. Em contrapartida, temos visto que até a
Política Nacional de Drogas tem sido um fiasco quando se diz respeito a vida
do usuário, pois ainda recente o governo alterou a lei que garantia a redução
de danos como forma de tratamento destes, que tinha esta o intuito de reduzir
os danos de drogas psicoativas em pessoas que por algum motivo não podem
ou que não querem parar de usá-las, colocando a abstinência como forma
única de tratamento, e ainda fazendo estímulo a uso de comunidades
terapêuticas. Tudo isso diz também de uma loucura institucional, dada e
forçada pelo próprio Estado ao forçar que as pessoas sejam enclausuradas
para tratamento de algo que muitas das vezes não diz desse lugar de
tratamento, mas sim de um lugar de acolhimento e aceitação das necessidades
do sujeito. E como forma de denúncia, busca-se a luta para combater essa
lógica manicomial, que “aprisiona a noção de doença mental — lógica que se
atualiza e nos surpreende em tempos de produção de lógica antimanicomial e
de outros sentidos” segundo Luana da Silveira (2009) em seu artigo Fazer falar
a loucura.

Ainda para reiterar, o dispositivo audiovisual “Um novo olhar sobre as


drogas, Carl Hart” vem nos falar desse lugar. Ele se trata de uma entrevista
feita pelo Dr. Drauzio Varella, médico e cientista com o Dr. Carl Hart, primeiro
professor titular de neurociências negro da Universidade Columbia, nos
Estados Unidos desafiando o senso comum e oferecendo um novo olhar sobre
as drogas. Nela ele aborda sobre a necessidade de se oferecer outros
caminhos, pensar em outras possibilidades para lidar com a política de drogas
bem como também os dependentes/usuários. Num estudo por ele feito, ao
colocar um rato enclausurado em uma gaiola apenas com substancias
psicoativas como cocaína, nicotina, metanfetamina (dentre outras), ele
percebeu que eles usavam drogas até morrer se ele permitisse que o animal
apertasse uma alavanca que servia para dar a eles as substancias. Porém,
observando ele com mais cuidado, ele percebeu que os animais estavam
isolados nas gaiolas, que não havia mais nada para fazer a não ser apertar
mesmo as alavancas. Isso nos faz refletir sobre a necessidade de repensar as
políticas sobre drogas, que são baseadas apenas na repressão e violação de
direitos, contribuindo cada vez mais, como supracitado, para a patologização
do usuário/dependente do que pro seu tratamento. Não se esquecendo que
todas essas políticas feitas pelo Estado contribui cada vez mais para práticas
racistas que só exclui e penaliza pretos e pobres na sociedade, assim como diz
a Luana da Silveira (2009) “mas justamente por ser deste mundo, deveria ser
excluído, pois as significações que são atribuídas à loucura assemelham-se
àquelas atribuídas aos pobres. A loucura, juntamente com a pobreza e a
ociosidade, está na dialética imanente dos Estados. Entretanto, como o louco
perturba a ordem social, será despojado dos direitos da miséria e de sua glória
(ibidem).” Em resumo, a famosa necropolítica, onde se é o Estado quem visa
quem se deve morrer ou viver, que tem dado certo.
Referencias bibliográficas

Canguilhem, G. (2002). O normal e o patológico. 5.ed. rev. aum. Rio de


Janeiro: Forense Universitária.
DA SILVEIRA, Luana. Fazer falar a loucura. Mnemosine, v. 5, n. 2, 2009.
MALHEIRO, Luana Silva Bastos. Tornar-se mulher usuária de crack: trajetória
de vida, cultura de uso e políticas sobre drogas no centro de Salvador-BA.

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