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Diplomacia 360o – Módulo Atena – Política Internacional – Aula 19

Prof. Tanguy Baghdadi – 05.12.2018

ORIENTE MÉDIO (1)

→ Por que o Oriente Médio é tão complicado?

Durante séculos, uma boa parte do Oriente Médio foi parte do Império Otomano (1299-1922),
que permitia, com uma certa facilidade, o fluxo de pessoas e de ideias, e, consequentemente,
uma grande mistura. Porém, tal mistura não acabou com o sentimento identitário desses povos.
Depois da Segunda Guerra Mundial, os países criados na região não eram homogêneos, mas
tinham diversas camadas identitárias sobrepostas.

➢ RELIGIÃO

❖ Muçulmanos:

→ Sunitas (85% do mundo islâmico):


Sucessão do profeta Mohammed, que não teve filhos homens, deveria ser exercida pelos líderes
próximos ao profeta e, posteriormente, pelos melhores elementos da Umma (comunidade
islâmica).

*Maior parte dos grupos radicais são sunitas (Al Qaeda e Estado Islâmico).

→ Xiitas:
- Sucessão do profeta Mohammed deveria ser pelo sangue (netos de Mohammed).
- Genro do profeta, Ali, foi assassinado e sentem-se traídos.
- Linhagem do profeta voltará, refazendo o reino de Mohammed.
- Maior parte no Irã e Iraque.

→ Outras subdivisões do Islã (como os alauitas).

❖ Judeus:
- Minoria em quase todos os países da região e maioria em Israel.

❖ Cristãos:
- Maronitas, ortodoxos, etc.

➢ ETNIAS

❖ Árabes;
❖ Persas (Irã);
❖ Turcos;
❖ Judeus;
❖ Curdos (mais ligados a uma região, com menor unidade étnica); e
❖ Bérberes (Norte da África).
➢ ESTADOS DO ORIENTE MÉDIO:

→ Há diferentes formas de definir o que é o Oriente Médio:

Apesar das diversas divisões e subdivisões do que seria o Oriente Médio, usaremos o primeiro
mapa, pois representa o núcleo da região. Porém, nessa divisão, não está incluído o Egito, que
para fins de compreensão das diferentes interações políticas na região, deve ser considerado.

O Império Otomano ocupou parte do Norte da


África, as áreas mais sensíveis do Oriente
Médio e, inclusive, a região dos Bálcãs. A capital
do Império Otomano era Constantinopla
(Istambul). Apesar da maioria árabe, os turcos
exerciam a dominação política.

O Império Otomano se manteve longevo


devido ao grande respeito às particularidades
locais. Havia um padrão administrativo geral,
mas as regiões tinham a liberdade de ter seu
formato local de administração.
➢ PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL
A queda do Império Otomano, e, consequentemente, a formação do Oriente Médio como o
conhecemos hoje, se dá no contexto da Primeira Guerra Mundial. O Império Otomano entrou
na guerra ao lado da Alemanha, devido à ameaça sentida por parte da França e da Inglaterra.
Os otomanos pensavam que, se Inglaterra e França ganhassem a guerra, o Império deixaria de
existir, pois esses países tinham pretensões coloniais fortíssimas.

Como contragolpe, ingleses e franceses começarão a arquitetar um plano de como enfraquecer


o Império Otomano, sobretudo levando em consideração que, desde o final do século XIX, já
havia uma expectativa de que o Império Otomano já estava agonizando – era chamado de “o
gigante doente da Europa”.

→ 1917: DECLARAÇÃO BALFOUR


Lord Balfour: desde que não haja qualquer tipo de conflito com outros povos locais, o Reino
Unido reconhece o direito de os judeus terem um lar nacional na Palestina. Desde o século XIX,
existe o movimento sionista, que era a vontade dos judeus terem um lar nacional próprio. A
maior parte dos judeus do mundo estava concentrada na Europa (sobretudo no Leste Europeu)
e os judeus sionistas, alegando sofrerem constantes perseguições nesses países, queriam um
Estado nacional judeu. Os sionistas consideraram as hipóteses de estabelecimento desse Estado
nacional judeu no Leste Europeu, na Rússia ou na América do Sul. Importante: britânicos
também haviam prometido um Estado aos árabes.

Porém, o “sonho dourado” dos judeus era ir para a terra prometida, onde ficava o antigo Reino
de Israel. Lord Balfour diz então que, desde que essa mudança não incomodasse os locais
palestinos, a Inglaterra concordaria. Nessa época, a Inglaterra queria agradar os judeus porque
eles teriam muita influência nos EUA e pressionariam os americanos a entrarem na guerra.
Também pensavam que os judeus fossem muito influentes na União Soviética.

→ APOIO INGLÊS À REVOLTA ÁRABE DE 1917


Oficiais britânicos incitam árabes a uma união contra os turcos-otomanos. Convencem o califa
de Meca e Medina, regiões de muito dinheiro e influência religiosa (duas cidades mais sagradas
do Islã), a promover revolta contra o Império Otomano, que começa a desmontar.

→ 1916: ACORDO DE SYKES-PICOT


Acordo secreto que dividia o território do Império Otomano entre França e Inglatera.

➢ ERA DOS MANDATOS (1922-1945):


A Era dos Mandatos vai do fim do Império
Otomano (1922) até o fim da Segunda Guerra
Mundial (1945). Os mandatos foram oficializados
pela Liga das Nações, que fez exatamente o que
França e Inglaterra haviam combinado em 1916.

A Arábia Saudita não entra nessa divisão, pois era


uma região muito árida que não gerava grande
interesse das potências e tinha apenas relações
tribais. Um desses chefes tribais unificou o país
em 1932. Petróleo só foi descoberto em 1936.
➢ FIM DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL (1945):

Árabes e judeus começam a cobrar as promessas feitas décadas antes e mandatos passam a ter
prazos para acabar. O mandato britânico na Palestina, por exemplo, teria que durar apenas até
15 de maio de 1948. A proposta de Estado para a região seguia o modelo europeu, com divisão
territorial e sistema presidencialista.

O problema é que havia uma sobreposição das promessas feitas pelo Reino Unido tanto para
árabes como para judeus. O Reino Unido tinha a consciência de que, se tivesse prometido a
região sagrada de Jerusalém para judeus e palestinos, não conseguiria o apoio de nenhum dos
dois. A promessa teria sido propositalmente ambígua.

O mandato francês englobava a Síria e o Líbano (este último seria um lar nacional cristão na
região) e a delimitação do Estado libanês ficou definida como uma linha que vai das cidades
sírias de Hama, Homs e Damasco. O Estado árabe começaria na região dessas cidades e se
estenderia em direção ao Leste.

O problema é que não ficou claro até onde iria essa fronteira entre o Estado cristão (Líbano) e o
Estado árabe (Síria). Não havia um consenso em relação ao que seria o fim dessa linha, em sua
parte inferior. Os ingleses disseram aos árabes que seria Damasco, mas a dúvida que fica é se
essa linha continuaria mais ao Sul ou não.

Para os árabes, essa linha ia até Damasco e, chegando até o litoral, estaria definido assim o limite
com o Líbano. Tudo o que estivesse ao Sul seria, portanto, território árabe. Porém, para os
judeus, a linha continuaria ao Sul, ao longo do Rio Jordão, e não incluiria a Palestina como sendo
parte do Estado árabe. A promessa que teria sido feita pelos ingleses aos judeus era de que
teriam seu Estado nacional na Palestina. Não houve consenso na interpretação dessas
promessas britânicas, justamente porque elas foram propositalmente ambíguas.

A partir de 1917, os judeus começam a se mobilizar para ir a essa região, indo em grandes
quantidades para o Império Otomano. Compram terras a preços muito baixos na Palestina
otomana. Naquele momento, cresciam, cada vez mais, as tensões entre judeus e palestinos. Os
judeus tornaram-se muito organizados, com cobrança de impostos organizada e a criação de um
aparato de segurança e forças militares (noção de que judeu deveria ser forte e saber se
defender; o Estado nacional judeu deveria ser forte).
Como o mandato britânico estava programado para acabar em 15 de maio de 1948, a ONU faz,
em 1945, o plano de Partilha da Palestina, com a participação importante do Brasil.

Em 1946, já se percebe uma presença significativa de judeus mais ao Norte do território.


Conforme as negociações vão avançando, os judeus conquistam mais terras (por meio da
compra). Na imagem de 1947, vemos o plano de partilha da Palestina, com uma divisão um
pouco “esquisita” do território desses dois Estados, pois não eram contíguos. Seguiam mais ou
menos o critério da presença judia e árabe nessas regiões. Em 15 de maio de 1948, os britânicos
abandonam seu mandato, antes que uma solução para o impasse territorial fosse alcançada.

Vale ressaltar o altíssimo nível de sacralidade de Jerusalém para judeus e árabes. Como a cidade
mais sagrada para judeus e terceira mais sagrada para árabes, não era possível que nenhum dos
lados abrisse mão dela. A partir do fim da Segunda Guerra, a disputa por Jerusalém e pela criação
dos dois Estados torna-se mais intensa.

➢ GUERRA DE INDEPENDÊNCIA DE ISRAEL (1948)

Com o fim do mandato britânico, os judeus declaram oficialmente a criação do Estado de Israel.
Os países árabes ao redor, que não reconheciam a legitimidade da presença judia na região,
exigem que também seja criado o Estado Palestino.

Países árabes vizinhos juntam-se para atacar Israel → Egito, Iraque, Síria, Jordânia e Líbano.

Israel venceu a Guerra de Independência, sobretudo devido à dificuldade de coordenação entre


os países árabes e ao considerável investimento bélico feito pelo Estado de Israel desde o início
da ocupação. Além disso, boa parte dos oficiais do Exército Israelense haviam lutado na Primeira
e/ou na Segunda Guerra Mundial por nações europeias, acumulando, assim, muita experiência.

→ AL NAKBA: é o termo em árabe para “tragédia” – 1948 seria um marco trágico do ponto de
vista civilizacional árabe. Em contraposição com os momentos grandiosos da civilização árabe,
de expansão territorial e de avanços nas ciências, a independência do Estado de Israel
representou o fim de uma era.

*Êxodo palestino para os países vizinhos – mais da metade da população jordaniana é palestina.
Após a invasão árabe em 1948, Israel aumenta ainda mais seu território, dividindo a Palestina
em dois territórios agora separados e distantes, que são:

FAIXA DE GAZA – inicialmente administrada pelo Egito.


CISJORDÂNIA – inicialmente administrada pela Jordânia.

Jerusalém, segundo a Partilha da Palestina, seria considerada como Berlim no pós-guerra: uma
cidade internacional que seria a capital de ambos os países, mas dentro de território árabe. À
medida que Israel foi expandindo seu território, chegou até Jerusalém. A cidade passa a ser
dividida em Jerusalém Ocidental (capital de Israel) e Jerusalém Oriental (capital da Palestina).
A resolução da questão da Palestina somente acontecerá uma vez que o status de Jerusalém
esteja definido.

Nesse momento, os países árabes seguirão tentando expulsar os judeus da Palestina,


articulando planos militares para esse fim. Em geral, a liderança era exercida pelo Egito.

➢ EGITO:

→ Presidente egípcio: NASSER.


Nasser era o representante do pan-arabismo laico, que desejava o fim do Acordo Sykes-Picot,
com a extinção das fronteiras e a unificação dos países árabes. Nasser era sunita, mas sua
religião era questão privada. Nasser liderou grande parte dos movimentos árabes contra Israel.

1956: nacionalização do Canal de Suez. Vitória com ajuda dos EUA.

O Egito articulou, em 1966, uma ofensiva árabe contra Israel para um ataque em 1967.
Definiram como estratégia a invasão a Israel por terra, com ataque a estruturas militares
israelenses pelo ar.

Porém, os países árabes fizeram uma série de paradas militares dias antes, o que teria servido
de alerta para Israel. Também se acredita que Jordânia teria revelado os planos árabes aos
israelenses. No dia do ataque, antes que ele começasse, Israel bombardeia a força aérea egípcia
em solo. A Força Aérea egípcia foi quase totalmente destruída nesse ataque.

➢ GUERRA DOS SEIS DIAS (1967)

Israel aumenta seus territórios, expandido seu domínio para áreas antes dominadas pelos
árabes, inicialmente a Cisjordânia e a Faixa de Gaza (chamando-os de territórios ocupados).
Posteriormente, Israel ocupa a Península do Sinai, do Egito, e as Colinas de Golã, da Síria.

*Colinas de Golã: descoberta de aquífero e de petróleo. Dificilmente serão devolvidas à Síria.

➢ EGITO ASSINA ACORDO DE PAZ COM ISRAEL (1979)

Egito receberá, em troca, a Península do Sinai. Esse acordo teve consequências catastróficas
para o Egito, que foi considerado pelos demais países árabes como traidor. O Egito foi expulso
da Liga Árabe. Na década de 1980, o presidente árabe – Anwar Sadat – foi assassinado pela
Irmandade Muçulmana, como represália a esse acordo de paz. Depois desse acordo, o Egito
nunca voltou a ser uma liderança no mundo árabe.
➢ GUERRA DO YOM KIPPUR (1973)

Israel passa a acreditar que árabes não representam uma ameaça crível. Porém, árabes não
desistem e, em 1973, promovem a Guerra do Yom Kippur. Foi uma tentativa de pegar
israelenses de surpresa, porque israelenses estariam observando período religioso do Dia do
Perdão, estando indefesos. Os árabes chegaram a entrar nas fronteiras de Israel. Os EUA foram
em socorro aos israelenses. Israel venceu a guerra. Essa foi a última tentativa coordenada de
ataque de árabes contra Israel.

→ Impacto da Guerra de Yom Kippur:


Choque do Petróleo: OPEP combina de diminuir produção do petróleo e proíbe que certos
países comprem diretamente deles. Ocorre uma explosão de preços do petróleo no mundo.

➢ LÍBANO:

Por ser considerado o lar dos cristãos na região, era relativamente protegido pelos países
europeus, sobretudo pela França.

→ 1943: Pacto Nacional Libanês

O Líbano era uma nação cristã, mas com população muçulmana considerável. Para evitar
conflitos entre os diferentes grupos, estipulou-se no Pacto Nacional o seguinte:

- Presidente: seria sempre um cristão maronita.


- Primeiro-Ministro: seria sempre um muçulmano sunita.
- Presidente do Parlamento: seria sempre um xiita.
- Parlamento: para cada 6 cristãos, haverá sempre 5 muçulmanos.

Com a Guerra do Yom Kippur, há um fluxo enorme de palestinos entrando no Líbano. Essa
imigração palestina não é impedida, pois muçulmanos libaneses queriam aproveitar o aumento
da população muçulmana para aumentar sua participação política no país, por meio de um
pedido de revisão do Pacto Nacional.

Os cristãos já não eram mais a maioria da população, quando, na década de 1970, os


muçulmanos pedem a revisão do Pacto Nacional de 1943. Os cristãos maronitas não aceitam
essa revisão e conseguem o apoio de Israel, usando como justificativa a ameaça de crescimento
da população muçulmana.

Muitos dos palestinos que entram no Líbano já eram muito engajados na guerra contra Israel e
faziam parte da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), que começa a utilizar o
território libanês para atacar Israel. A populações xiita e sunita do Líbano também começam a
ter mais força e demandam mais participação.

→ GUERRA CIVIL LIBANESA (1975-1990)

Uma enorme diversidade de grupos, de falanges e de milícias entra em conflito no Líbano. O


governo passa a ser apenas mais uma parte nesse conflito (dividido inclusive entre si), até que
o próprio governo chega ao fim.

*Entre 75 e 90, o Líbano era visto como o lugar mais violento do mundo, como hoje é a Síria.
→ 1989 – Acordos de Taif
- Restabelecem o Pacto Nacional.

Ao longo das últimas décadas, tem ocorrido um aumento das tensões entre a Arábia Saudita
(que influencia muito os sunitas) e o Irã (que influencia muito os xiitas). O Irã tem uma voz dentro
do Líbano por meio do Hezbollah, que é a maior força xiita do Líbano e controla a presidência
do Parlamento. Do outro lado, a Arábia Saudita influencia o Primeiro Ministro.

→ 2005: assassinato de Rafik Hariri (Primeiro-Ministro sunita, que também era Saudita).
O Primeiro Ministro, que trabalhava para diminuir a influência xiita do Hezbollah no Líbano,
sofre um atentado a bomba em Beirute. Acredita-se, portanto, que Hariri tenha sido morto pelo
Hezbollah. A Síria, que desde a Guerra Civil tem a presença de tropas dentro do Líbano, vai se
aproximando do Hezbollah.

Ocorre uma polarização dentro do país, com a população cristã e sunita acusando os xiitas de
matarem o Primeiro Ministro e exigindo a saída das tropas sírias do Líbano. Do outro lado, os
xiitas dizem que o atentado foi armado para parecer que havia sido o Hezbollah. A Síria se retira
do Líbano e passa a ficar muito claro que xiitas e sunitas não se toleram.

→ LÍBANO HOJE:

Presidente (maronita): Michel Aoun.


Primeiro-Ministro (sunita): Saad Hariri – filho de Rafik Hariri.
Presidente do Parlamento (xiita): Nabih Berri.
*Mudança no Parlamento: para cada 6 cristãos, haverá sempre 6 muçulmanos.

O Primeiro Ministro Saad Hariri, que também tem nacionalidade saudita, afirmou recentemente
estar correndo risco de assassinato pelos xiitas, mesmo que alguns membros de seu gabinete
sejam do Hezbollah. Em viagem à Arábia Saudita, Hariri envia vídeo dizendo estar renunciando
e que estaria incomunicável por alguns dias.

Algumas semanas depois, Hariri regressa ao Líbano e volta atrás, dizendo que ainda era o
Primeiro Ministro. Especula-se que Hariri teria sido pressionado pela Arábia Saudita para
combater o Hezbollah, que representa, no plano regional, o Irã – o grande antagonista dos
sauditas. No fim das contas, o Líbano continua com seu Pacto Nacional (reformado), mas vive
em sua política interna hoje uma “guerra fria” entre o Irã (xiita) e a Arábia Saudita (sunita).

Hezbollah: mais poderoso do que o próprio Exército libanês, pois recebe ajuda militar do Irã.

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