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net/publication/339933573
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Leonor Santos
University of Lisbon
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Abstract. In education, it is impossible not to speak about the assessment of students’ performance,
and in particular about formative assessment. Although there is a generally recognized importance and
a large number of studies available, it still exists different ways to define assessment and several
critical positions about it. The literature highlights the positive effects of a continued practice of
formative assessment on students’ learning. However, its absence is a fact and it is explained by the
inexistence of a professional knowledge that supports it. Thus, this chapter aims to discuss several
meanings of basic concepts of assessment and to present studies that focus on the professional
knowledge of the teacher for the development of assessment practices. The questioning and reflection
that we have developed, lead us to identify that there is a trend that considers that assessment is a
process that occurs in a situated social context. The modalities of assessment are differentiated by the
purpose with which they are made and their articulation takes place in a logic of complementarity and
not simultaneity. The professional knowledge required for the development of formative assessment
practices is mainly based on didactic knowledge, given its relationship with teaching and learning.
Introdução
Afirmar que é importante falar de avaliação, quando o foco é o desempenho dos alunos,
não levanta qualquer questão. Como afirmam Pinto e Santos (2006, p. 7), “A avaliação faz
hoje parte do vocabulário mais utilizado em termos pedagógicos”. Mas a sobrevalorização da
1
Instituto de Educação, Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal
avaliação, sobretudo quando assume um carácter de controlo, pode levar ao acréscimo do
papel social da prestação de contas ou ainda encarar a avaliação como a solução para todos os
problemas da aprendizagem, fazendo crescer exponencialmente o número de vezes em que é
feita.
O reconhecimento da importância da avaliação é partilhado por outros autores. Em
particular, é destacada a mudança mais marcante que temos assistido no âmbito da avaliação,
passando a perspetivá-la como um meio para a aprendizagem (Dochy & McDowell, 1997).
Segundo Black (2013), a avaliação formativa tem constituído uma indústria crescente nas
últimas décadas, não se verificando o mesmo no que respeita à avaliação sumativa.
Muito embora esta explosão de interesse, nomeadamente na avaliação formativa, uma
revisão de literatura sobre práticas de avaliação formativa na sala de aula, realizada por Black
e Wiliam (1998), feita a partir da análise de 681 artigos e capítulos publicados de estudos
desenvolvidos entre 1988 e 1997, evidencia que não existe um significado único e consensual
de avaliação formativa na literatura analisada.
Acresce a este problema de natureza conceptual, um outro de natureza prático, que tem
a ver com a ausência de uma prática frequente de avaliação formativa no quotidiano do
trabalho entre professor e alunos. Este facto, que não se confina a um único país, é um
problema a nível internacional (EC, 2011; McGatha & Bush, 2013; Torrance & Pryor, 2001),
justificado por um conjunto diversificado de razões. Uma delas destaca-se pela frequência
com que é enunciada. Falamos do conhecimento profissional, ou da sua ausência, para o
desenvolvimento de práticas avaliativas. Consequentemente, apela-se para a necessidade de
criação de programas de desenvolvimento profissional que apoiem práticas efetivas de
avaliação formativa (Looney, 2011; Pearson, 2009). Para tal, é contudo necessário conhecer-
se que tipo de conhecimento profissional é necessário para o desenvolvimento de tais práticas
de tal modo que esses programas de formação sejam adequados ao que se pretende.
Assim, este capítulo tem por propósito discutir diversos significados de conceitos
básicos de avaliação e apresentar estudos que se focam no conhecimento profissional do
professor para o desenvolvimento de práticas avaliativas. Para tal, o presente texto está
subdividido em quatro partes essenciais, para além desta breve introdução de
contextualização, de uma conclusão, e da lista final de referências. As três primeiras partes
desenvolvem uma discussão concetual em torno dos significados de conceitos como a
avaliação pedagógica, suas modalidades e possíveis relações. A quarta parte foca-se no
conhecimento profissional do professor para a avaliação.
Significados do conceito de avaliação
Falar em avaliação em Educação abarca um campo muito vasto. Nele se podem incluir a
avaliação das aprendizagens dos alunos, do desempenho dos professores, das escolas, da
qualidade do sistema educativo ou ainda de programas. Neste texto irei abordar e discutir
apenas questões relativas à avaliação das aprendizagens dos alunos. De forma a evitar
ambiguidades, passarei a designá-la por avaliação pedagógica.
Quando nos restringimos ao âmbito da avaliação pedagógica, o significado de
avaliação, descrito na seção anterior, mantem-se, isto é continuamos a considerar que a
avaliação é um processo, uma construção social localizada. Necessitamos contudo de olhar os
seus significados de forma mais detalhada quando nos referimos às suas possíveis
modalidades: a avaliação formativa e a sumativa.
É de fazer notar que apenas há mais de 50 anos se começou a falar de diferentes tipos de
avaliação2, contrapondo a uma avaliação que ao longo de séculos não foi questionada quanto
à variedade de funções. Meio século para mais de vinte! Assim, é natural que possamos
encontrar diversos entendimentos do que é a avaliação formativa, ou mesmo uma definição
pouco precisa (Wiliam, 2011), enquanto o significado de avaliação sumativa se mantém
razoavelmente estável.
A avaliação formativa começou por ser vista como “uma medição intermitente da
aprendizagem” (Offerdahl, McConnell, & Boyer, 2018, p. 1), como a informação sobre a
diferença que separa o nível de desempenho do aluno do esperado com o propósito de alterar
de alguma forma essa diferença (Sadler, 1989). Por outras palavras, para este autor, a
avaliação formativa tem por objetivo perceber a forma como os julgamentos sobre a qualidade
das respostas dos alunos podem ser usados para melhorar a sua aprendizagem.
Torrance e Pryor (2001) criam um modelo de avaliação formativa tendo por base um
estudo que desenvolveram sobre práticas de avaliação formativa numa sala de aula do 1.º
ciclo. Nesse modelo definem dois tipos de avaliação formativa: a “avaliação convergente” e a
“avaliação divergente”. A primeira tem por objetivo conhecer se o aluno sabe, compreende e
é capaz de prever. Procura medir resultados, para agir em conformidade. É pós-ativa. A
segunda procura aceder ao que o aluno sabe, compreende e é capaz de fazer. Dirige-se
sobretudo aos processos, acontece ao longo do ensino e aprendizagem e recorre às interações
na sala de aula. É uma regulação interativa. Embora de tipos diferentes, em que professor e
2
Durante a década de 60 do séc. XX, Scriven cria o conceito de avaliação formativa e Bloom aplica-o no campo
pedagógico, às aprendizagens dos alunos.
alunos desempenham papeis diversos, segundo os autores, estes dois tipos de avaliação
formativa podem coabitar na prática de ensino dos professores, não sendo exclusivas.
Mais recentemente, moldado por teorias de aprendizagem sociocognitivas, o significado
do conceito de avaliação formativa está associado aos processos frequentes avaliativos
interativos do progresso dos alunos de modo a identificar e adequar o ensino (Looney, 2005).
Para Fernandes (2005), a avaliação formativa, a que associa o termo “alternativa”, “é uma
construção social complexa, um processo eminentemente pedagógico, plenamente integrado
no ensino e na aprendizagem, deliberado, interativo, cuja principal função é a de regular e de
melhorar as aprendizagens dos alunos” (p. 65).
Jorro (2000) fala-nos ainda de um outro significado de avaliação formativa, a que chama
negociação ou apóstrofe avaliativa. Para esta autora, este entendimento assenta num
paradigma da compreensão. Nesta sua proposta, o que se destaca é o papel de intervenção, de
responsabilidade no processo, do aluno. Para si, este papel passaria a entender o aluno como
coautor do projeto de aprendizagem, cuja finalidade é a apropriação do saber.
Em síntese, do exposto podemos afirmar que, de certo modo, se passou de uma
perspetiva quantitativa para uma perspetiva inquiridora (Hargreaves, 2005). Como nos explica
este autor, a primeira perspetiva concretiza-se através da recolha formal de informação de
natureza quantitativa, que procura evidenciar a aprendizagem realizada pelo aluno de forma a
produzir feedback. Já a perspetiva inquiridora favorece a recolha informal de informação de
natureza qualitativa para igualmente produzir feedback, agora visto como contextualizado
numa interação social que exige questionamento, reflexão e revisão, e que reconhece e
valoriza o aluno enquanto agente essencial na promoção da sua aprendizagem.
O Assessment reform group (Black, Harrison, Lee, Marshall, & Wiliam, 2004) passou a
utilizar as designações de “avaliação da aprendizagem” e “avaliação para a aprendizagem”
para destacar os propósitos distintos das estratégias avaliativas desenvolvidas. A primeira
responde a exigências de prestação de contas, enquanto a segunda tem por objetivo contribuir
para a aprendizagem. Mais ainda, falar de “avaliação para a aprendizagem” é referir as
atividades desenvolvidas pelos professores e/ou pelos alunos que fornecem informação a ser
usada como feedback para modificar as atividades de ensino e de aprendizagem. Segundo este
grupo, há distinção entre a “avaliação para a aprendizagem” e a “avaliação formativa”, não no
propósito, mas no principal agente responsável das estratégias que levam a esse propósito, à
promoção da aprendizagem:
Uma atividade avaliativa pode contribuir para a aprendizagem se fornecer
informação tal que professor e alunos possam usar como feedback para se avaliarem
a si próprios e uns aos outros e para modificarem as atividades de ensino e
aprendizagem em que estão envolvidos. Tal avaliação torna-se “avaliação
formativa” quando a evidência é usada para adaptar o ensino a fim de o adequar às
necessidades dos alunos. (Black et al., 2004, p. 10)
Muito se tem escrito sobre a avaliação formativa, mas a sua possível articulação com a
avaliação sumativa não tem merecido a mesma atenção (Taras, 2005). Contudo, a não
consideração desta questão, pode levar à desvalorização, nomeadamente por parte dos
professores, de práticas de avaliação formativa. Para reduzir a complexidade desta questão,
focar-nos-emos na avaliação pedagógica no contexto da sala de aula, isto é na avaliação
interna.
De acordo com Santos (2016), podemos encontrar na literatura diversas respostas
quanto à possibilidade de articulação entre estas duas modalidades de avaliação3. Esta
articulação é aqui vista como o modo como cada uma das modalidades de avaliação pode
servir a outra. A figura 3 representa de forma esquemática as diversas perspetivas que se
podem encontrar na literatura.
3
Para desenvolvimento deste tema ver Santos (2016) disponível em
http://www.scielo.br/pdf/ensaio/v24n92/1809-4465-ensaio-24-92-0637.pdf
perspetiva faz para nós todo o sentido e é coerente com o significado que anteriormente
assumimos de avaliação sumativa e formativa. O mesmo instrumento de avaliação pode ser,
em momentos diversos, trabalhado com os alunos de forma diferente. É o uso que se lhe dá
que dá sentido ao propósito e que com este deve ser coerente4.
A situação 2 traduz a posição daqueles autores que, muito embora não vejam como
possível a avaliação formativa servir a avaliação sumativa, o inverso ser viável. Argumentam
que os dados da avaliação formativa nem sempre são os mesmos para todos os alunos, nem
tão pouco a sua qualidade garante os critérios exigidos numa avaliação sumativa (Bennett,
2011). Já os elementos da avaliação sumativa poderão ser usados numa perspetiva formativa.
Esta perspetiva levanta-nos algumas questões relacionadas com a natureza dos resultados da
avaliação sumativa, também partilhadas por outros autores (por ex., Foster, & Noyce, 2004;
Wiliam, 2013), e suas implicações: Até que ponto os resultados de uma avaliação sumativa,
que são sobretudo, senão sempre, expressos em escalas quantitativas e como tal pouco
informativos sobre o que o aluno já sabe e é capaz de fazer, e as suas dificuldades, podem
contribuir para a aprendizagem, podem ser pedagogicamente eficazes? Até que ponto os
professores, ao considerarem que os testes (instrumento de avaliação por excelência para uma
recolha de dados com uso sumativo) têm um duplo propósito, os dispensa de desenvolver
outras estratégias avaliativas mais promissoras de avaliação?
Por último, a situação 3 traduz a perspetiva daqueles autores que defendem a
possibilidade de articulação entre as duas modalidades de avaliação. O uso de uma prova de
exame ou a devolução das respostas de alunos num dado teste para correção são exemplos
ilustrativos de como a avaliação sumativa pode servir um propósito ao serviço da
aprendizagem. Inversamente, a recolha de dados na sala de aula, muitas vezes através de
processo informais, pode fornecer elementos de natureza diversa e enriquecer a diversidade de
informação para a avaliação sumativa. Mas, qualquer que seja a direção a considerar, há
riscos, a considerar. Usar provas anteriores de exame, pelo menos em demasia, leva à
possibilidade de o enfoque do trabalho na sala de aula se confinar aos aspetos da
aprendizagem suscetíveis de sairem nas provas de exame futuras, logo a aspetos da
aprendizagem consideradas como mais facilmente mensuráveis (Looney, 2009). O conhecido
fenómeno de “ensinar para o exame” leva à redução do currículo (Boesen, Lithner, & Palm,
2010; Harlen, 2006). Devolver testes para os alunos corrigirem, quando estes já estão
classificados, são vistos pelos alunos como um produto acabado, não lhes permitindo atribuir
4
Em Santos (2016) tem-se acesso a três estudos que analisam práticas avaliativas distintas e que ilustram como a
partir de diversos instrumentos de avaliação se podem dar usos distintos em momentos diferentes.
sentido ao que estão a fazer, tendo como possível consequência a redução da eficácia do
feedback (Santos & Pinto, 2018; Wiliam, 1999). Reduzir as práticas avaliativas formativas às
que resultem da avaliação sumativa, transformam-nas em práticas formais e como tal
redutoras.
No sentido contrário, usar dados recolhidos num contexto formativo, numa certa cultura
de sala de aula, em que, por exemplo, o erro é visto como algo natural num processo de
aprendizagem e como tal não penalizável, pode constituir um grave atentado à ética das
relações estabelecidas entre professor e aluno. Para além disso, o ser informal pode colocar
em risco a exaustão e completude da informação necessária na avaliação sumativa.
Em síntese, na posição tomada ao longo desta seção, procurei que ficasse claro que
perspetivo a articulação entre a avaliação sumativa e formativa “não em simultaneidade, mas
em complementaridade, em relação” (Santos, 2016, p. 27). Esta articulação não está isenta de
complexidades, nem tão pouco pode ser prescrita, dadas as variáveis presentes em cada
contexto particular de sala de aula.
Creio ter ficado também evidente que a articulação entre a avaliação sumativa e
formativa está longe de estar resolvida e carece de mais investigação sobre o tema, quer
teórica, quer empírica. O desenvolvimento desta área certamente que ajudará os professores a
desenvolver na sala de aula cada vez mais práticas de avaliação formativa, de modo a
adequarem o seu ensino aos alunos que têm e a apoiá-los na sua aprendizagem.
Da leitura da figura 4, pode ainda ver-se que o conhecimento didático é moldado pelo
conhecimento que o professor tem da escola e de si próprio que o fará tomar certo tipo de
decisões e abandonar outras (por exemplo, porque acha que a cultura da sua escola não
receberia bem uma dada medida ou porque não sente autoconfiança para usar certo tipo de
metodologia de ensino com os seus alunos).
Uma ideia que surge com uma certa frequência é que os professores têm falta de
formação e, consequentemente, escasso conhecimento declarativo e processual sobre
avaliação, confirmada aliás em alguns estudos empíricos (Black & Wiliam, 1998; Clark,
2012), e apontada como uma das razões para que uma prática frequente de avaliação para
aprender não seja uma realidade nas salas de aula no ensino não superior (Fernandes &
Gaspar, 2014).
Heitink et al. (2016), reconhecendo que a identificação de fatores potenciadores ou
condicionantes de uma prática de avaliação ao serviço da aprendizagem tem recebido pouca
atenção por parte da investigação, desenvolveram um estudo que procurou identificar estas
possíveis variáveis através da análise de 60 estudos publicados em revistas com revisão por
partes ou trabalhos para obtenção de graus académicos, empíricos e desenvolvidos no
contexto da educação geral, ensino básico e secundário, e vocacional, e em que a avaliação
para a aprendizagem era desenvolvida na sala de aula. Entre estes, 17 estudos, publicados
entre 2006 a 2014, referiam conhecimentos ou capacidades de professores de diversas áreas
disciplinares relacionados com a avaliação formativa.
A nível global, estes autores referem a ausência de literacia avaliativa entendida como
“o conhecimento e capacidade que os professores têm de ter para recolher, analisar e
interpretar evidência da avaliação e adaptar o ensino em concordância” (Heitink et al., 2016,
p. 54). Clyatt (2014) vai mais longe ao afirmar que num estudo desenvolvido com 15
professores americanos experientes de Matemática, a maioria desconhecia a terminologia
associada à avaliação e as opções que se poderiam colocar. Estes resultados vão no mesmo
sentido de outros estudos desenvolvidos em Israel com professores de Matemática com e sem
experiência (Hoch & Amit, 2013; Liora & Miriam, 2012).
Mas tais resultados são demasiado amplos e pouco acrescentam ao esperado. De uma
análise mais fina, vejamos os que os estudos nos apontam. Uma primeira constatação é a de
que existe um resultado bastante referido e transversal a muitos estudos que diz respeito à
emergência da necessidade de um conhecimento didático para o desenvolvimento de práticas
avaliativas. Tal, aliás, não é surpreendente, uma vez que o foco recai sobre práticas avaliativas
desenvolvidas na sala de aula onde o conhecimento didático está presente de forma
inequívoca. Para uma análise mais particular, passarei, de seguida, a sintetizar os resultados
dos estudos considerados agrupando-os pelas diversas etapas do processo avaliativo: a
planificação do processo avaliativo, a recolha de evidência, o julgamento sobre a
interpretação dessa evidência e a ação decorrente do julgamento realizado.
A planificação de uma prática avaliativa pode ou não passar pela construção de um
instrumento de recolha de evidência. Num estudo desenvolvido por Lee e Na (2007), que
seguiu o design de investigação-ação, um professor de Matemática da Coreia do Sul,
simultaneamente investigador, evidenciou que a experiência de construção de um conjunto de
itens com uma grelha de classificação, sua aplicação, análise e reflexão sobre o processo,
permitiu-lhe melhorar o seu conhecimento prático sobre avaliação. Este conhecimento não só
fez apelo ao conhecimento sobre o currículo, como ao conhecimento de instrução.
Para o professor recolher evidência necessita naturalmente de construir contextos
favoráveis para fazer emergir informação relativa ao modo como os alunos pensam e
aprendem e aos raciocínios erróneos que vão construindo nesse processo. Tais contextos
podem passar pelo questionamento a usar na prática diária da sala de aula e pela
monitorização de discussões entre professor e alunos ou entre alunos, incentivando-os a
participar (Heitink et al., 2016). Estas capacidades por parte do professor estão sustentadas
pelo conhecimento que este possui sobre os alunos e a aprendizagem.
A interpretação da evidência recolhida e consequente julgamento levanta desafios ao
professor. Rubio, Font & Gimenéz (2010) num estudo que desenvolveram com futuros
professores espanhóis de Matemática do ensino secundário concluíram que a determinação do
nível de complexidade de questões do PISA5 (2003) bem como a avaliação das competências
que podem ser inferidas a partir das produções dos alunos constituíam dificuldades para os
participantes. Contudo, inferir sobre as aprendizagens dos alunos a partir das suas produções é
uma competência necessária para uma prática avaliativa que procure promover a
aprendizagem. Por outras palavras, para esta prática, o professor tem de fazer recurso ao
conhecimento da matéria a ensinar e do conhecimento sobre os alunos. Tais resultados são
consistentes com um estudo realizado por Leuders e Leuders (2014) que envolveu futuros
professores alemães. Estes autores concluíram que a qualidade da interpretação realizada a
partir das respostas de alunos a um teste diagnóstico de perguntas abertas estava relacionada
com a capacidade de perceção de aspetos específicos das resoluções dos alunos.
Dificilmente, num contexto de avaliação ao serviço da aprendizagem, é possível
dispensar-se o fornecimento de feedback. Este feedback, para ser adequado e com
potencialidade de ser eficaz, tem de estar sustentado na interpretação prévia que o professor
realizou. Uma vez mais estamos em presença do recurso a conhecimentos da matéria a ensinar
e dos alunos:
Não posso deixar aqui uma nota respeitante ao uso cada vez mais recomendado de
recursos tecnológicos. Não sendo específico de práticas avaliativas, também neste campo a
tecnologia pode ter as suas potencialidades e quando tal acontece naturalmente é pedido ao
professor que para além de conhecimento didático também domine este tipo de ferramentas
para delas poder tirar partido (Heitink et al., 2016), nomeadamente através de software que
forneça feedback aos alunos (Broughton, Hernandez-Martinez & Robinson, 2013; Lin, Hung
& Hsiao, 2009).
Por último, o conhecimento que o professor tem de si mesmo, associado à
autoconfiança que possui ou não, pode ter relação com uma prática avaliativa mais ou menos
eficaz em termos da aprendizagem que promove:
5
O PISA (Programme for International Student Assessment) é um estudo da responsabilidade da OCDE com a
periodicidade trienal e aplicado a alunos com 15 anos de idade.
A confiança no seu julgamento profissional foi também identificada como um fator
que leva a uma implementação bem sucedida [de uma prática avaliativa]. (Heitink et
al., 2016 , p. 56)
A concluir
Muitas foram as opções que se me levantaram ao iniciar a escrita deste texto. O intitulá-
lo “Reflexões sobre a avaliação pedagógica” traduziu a decisão de aproveitá-lo enquanto
espaço de questionamento e de reflexão em torno sobretudo de significados de conceitos base
relativos à avaliação pedagógica.
Se é certo que necessitamos de uma teoria robusta sobre a avaliação (Scriven, 1994), e
em particular sobre a avaliação formativa (Black & Wiliam, 2006; Taras, 2010), não é menos
verdade que, na literatura, os significados do conceito de avaliação e das suas modalidades
não são consensuais, como procurámos evidenciar ao longo deste texto. Tal situação
compromete a clareza das relações que se podem estabelecer entre as diferentes dimensões da
avaliação pedagógica ou, por outras palavras, a definição de uma teoria. É necessário ser-se
capaz de distinguir para relacionar (Vial, 2012), mas se existe diversidade de significados nos
conceitos essenciais, essa distinção fica dificultada.
Para a construção de uma nova teoria, há diversas formas de encarar o papel das teorias
e das práticas. Seguindo uma perspetiva dicotómica, há quem considere que esta deve emergir
de outras teorias, há outros que consideram que é a partir das práticas que tal deve ser feito.
Nenhuma destas opções é por nós seguida, o que desde já explica a razão pela qual
recorremos ao longo destas páginas de textos de natureza teórica e de artigos que apresentam
estudos empíricos. Recusamos a dicotomia entre teoria e prática. Consideramos que é na
relação dialógica entre uma e outra que o conhecimento se gere construindo uma teoria cada
vez mais robusta. Perfilhamos, assim da perspetiva de Fernandes (2010) quando afirma que:
A teoria pode não ser ideal, mas está longe de ser inútil e a prática não pode ser
inevitavelmente encarada como não reflexiva, como uma versão incompleta da
teoria ou como a sua mera concretização. (p. 38)
Tal opção permite-nos reduzir a natureza prescritiva com que habitualmente a teoria é
marcada e simultaneamente atender à importância das práticas avaliativas na aprendizagem
dos alunos. Quando falamos de avaliação pedagógica, o seu interesse é tanto maior quanto o
seu contributo para o objetivo primeiro da educação, o de proporcionar a aprendizagem dos
alunos. Reconhecemos que há outros objetivos de natureza social igualmente envolvidos, mas
cremos ter ficado claro que a aprendizagem no seu sentido mais global é o fim primeiro para a
existência de Educação e, como tal, da Escola.
Um dos temas discutidos neste capítulo disse respeito ao conhecimento profissional do
professor necessário para sustentar de forma informada e fundamentada as suas práticas
avaliativas. Os estudos em análise evidenciam que os professores participantes revelavam
falta de literacia avaliativa, entendendo-a pelo conhecimento de terminologia associada à
avaliação e às opções que se podem tomar. Mas foi um conhecimento didático, nas suas
diferentes componentes, que mais se destacou como necessidade primeira para o
desenvolvimento de práticas avaliativas, nomeadamente de avaliação formativa. Embora desta
análise tenham emergido grandes tendências, continuamos a afirmar que se trata de uma área
que requer mais atenção por parte dos investigadores. Não basta enunciar a falta de
conhecimento que os professores revelam ter. É necessário saber do que falamos, quer quando
nos referimos aos professores em exercício, quer na formação inicial de professores.
Por último, uma chamada de atenção. Poder-se-ia pensar que uma área que se pretende
científica, a avaliação, fica enfraquecida com a existência de tanta diversidade de
entendimentos conceptuais. Mas tal não é a nossa interpretação. Uma área científica que tem a
capacidade de problematizar e questionar os seus conceitos básicos revela dinamismo, revela
que está viva, dá garantias que vai prosseguir! Isto é tanto mais importante quanto o papel da
Escola é cada vez mais desafiante. Os alunos que nela frequentam devem ser preparados, e
adquirir ferramentas, que lhes permitam desempenhar profissões ainda não criadas, usar
tecnologias ainda não inventadas, e resolver problemas sociais ainda não antecipados (OCDE,
2018). Não tenhamos dúvidas, a Escola necessita de uma avaliação pedagógica cada vez mais
eficaz no que ao contributo que se espera que dê, mais do que à aprendizagem, a uma
Educação que se quer para todos os alunos.
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