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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA - UDESC

CENTRO DE ARTES - CEART


LICENCIATURA EM MÚSICA

RAFAEL PRIM MEURER

KOELLREUTTER E DALCROZE: reflexões sobre questões do


“método” a partir de uma experiência de estágio

FLORIANÓPOLIS, SC
2014
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RAFAEL PRIM MEURER

KOELLREUTTER E DALCROZE: REFLEXÕES SOBRE QUESTÕES DO “MÉTODO”


A PARTIR DE UMA EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao Curso de Licenciatura em Música do
Centro de Artes, da Universidade do Estado de
Santa Catarina, como requisito parcial para a
obtenção do grau de Licenciado em Música.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Valeria Maria Fuser


Bittar

FLORIANÓPOLIS, SC
2014
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4

AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, por me proporcionarem a oportunidade de fazer o curso de


graduação em música e por me darem liberdade para traçar meu próprio caminho.
À prof.ª Valeria Bittar pela orientação carinhosa, cuidadosa e precisa e por estar
sempre atenta às minhas vontades e às minhas experiências.
À prof.ª Simone Gutjahr pelo envolvimento e interesse nas ideias que eu trazia nas
nossas orientação de estágio e pelas suas valorosas contribuições.
Ao prof. Sérgio Figueiredo por abrir este espaço de atuação no Coral UDESC, bem
como pelo aprendizado ao longo curso.
Ao Alvanir Poster de Ávila, por tanto me ajudar, me apoiar, me esclarecer sobre os
mais diversos assuntos e me proporcionar tamanho amadurecimento nestes anos de faculdade.
À Barbara Biscaro, por abrir meus horizontes com sua arte.
À prof.ª Alicia Cupani por me incentivar a explorar esses novos horizontes.
Ao prof. Gustavo Gattino, pelo incentivo em fazer deste trabalho uma reflexão sobre a
minha experiência de estágio.
Aos que participaram da Oficina, pelo interesse e disponibilidade para com as minhas
propostas.
A todos os professores do curso de Licenciatura em Música, com quem tanto aprendi.
Agradeço aos colegas que encontrei ao longo desta jornada que é a graduação.
E agradeço à UDESC pela oportunidade de tantos encontros.
5

“[...] De que valeria a obstinação do saber se ele


assegurasse apenas a aquisição dos conhecimentos e
não, de certa maneira, e tanto quanto possível, o
descaminho daquele que conhece? Existem momentos
na vida onde a questão de saber se se pode pensar
diferentemente do que se pensa, e perceber
diferentemente do que se vê, é indispensável para
continuar a olhar ou a refletir. Talvez me digam que
esses jogos consigo mesmo têm que permanecer nos
bastidores; e que no máximo eles fazem parte desses
trabalhos de preparação que desaparecem por si sós a
partir do momento que produzem seus efeitos. Mas o
que é filosofar hoje em dia – quero dizer, a atividade
filosófica – senão o trabalho crítico do pensamento
sobre o próprio pensamento? Se não consistir em tentar
saber de que maneira e até onde seria possível pensar
diferentemente em vez de legitimar o que já se sabe?
Existe sempre algo de irrisório no discurso filosófico
quando ele quer, do exterior, fazer a lei para os outros,
dizer-lhes onde está a sua verdade e de que maneira
encontrá-la, ou quando pretende demonstrar-se por
positividade ingênua; mas é seu direito explorar o que
pode ser mudado, no seu próprio pensamento, através
do exercício de um saber que lhe é estranho. O “ensaio”
– que é necessário entender como experiência
modificadora de si no jogo da verdade, e não como
apropriação simplificadora de outrem para fins de
comunicação – é o corpo vivo da filosofia, se, pelo
menos, ela for ainda hoje o que era outrora, ou seja, uma
“ascese”, um exercício de si, no pensamento.”

Michel Foucault (1998 [1984], p. 13).


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RESUMO

MEURER, Rafael Prim. Koellreutter e Dalcroze: reflexões sobre questões do “método” a


partir de uma experiência de estágio. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em
Música) Universidade do Estado de Santa Catarina. Centro de Artes, Florianópolis, 2014.

O presente trabalho divide-se em quatro partes. A primeira é uma apresentação de


minha experiência de atuação docente como estagiário realizada entre os meses de Abril e
Junho do ano de 2014, cujo relatório é tomado como documento de análise, e cujas atividades
principais são apresentadas utilizando-se do modelo C(L)A(S)P como referência
organizacional. A segunda parte deste trabalho apresentará algumas das concepções de
educação musical de Hans-Joachim Koellreutter, relacionando-as com as experiências
práticas no estágio. Na terceira parte são apresentadas algumas reflexões a respeito da
Rítmica, proposta de educação musical de Emile Jaques-Dalcroze, do mesmo modo que são
propostas algumas relações da Rítmica com a prática pedagógica experienciada no estágio. A
quarta parte destina-se a refletir a respeito do conceito do “método” musical, sendo que este é
identificado como termo central para o entendimento das propostas de Koellreutter e de
Dalcroze. O trabalho é fruto de uma busca por maior coerência na relação entre teoria e
prática pedagógica, podendo ser assim uma contribuição neste âmbito, visto a dificuldade
encontrada por estudantes de licenciatura em música na construção desta relação teórico-
prática.

Palavras-chave: Rítmica Dalcroze. Koellreutter. Método. Estágio. Educação Musical.


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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 10

BUSCANDO APROXIMAÇÃO ENTRE TEORIA E PRÁTICA ........................................ 11


ANÁLISE DE DISCURSO .................................................................................................. 13

1 PONTO DE PARTIDA: MINHA EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO ...................... 16

1.1 RELATÓRIO DE ESTÁGIO COMO DOCUMENTO DE ANÁLISE ...................... 17


1.1.1 Considerações sobre o relatório de estágio ............................................................ 18
1.1.2 Autonomia para as decisões ................................................................................... 19
1.2 MODELO C(L)A(S)P .............................................................................................. 20
1.3 AS ATIVIDADES DA OFICINA DE MÚSICA PARA CANTORES ...................... 23
1.3.1 As modalidades - segundo o modelo C(L)A(S)P e sua aplicação na estruturação
da Oficina ........................................................................................................................... 25
1.3.2 Equilíbrio entre as modalidades ............................................................................ 30
1.3.3 Interação entre as modalidades.............................................................................. 31

2 COMPREENDENDO KOELLREUTTER ........................................................... 34

2.1 “POR QUÊ?” ........................................................................................................... 35


2.2 A “FUNÇÃO” DA EDUCAÇÃO MUSICAL A PARTIR DE KOELLREUTTER.... 37
2.2.1 Koellreutter: “humano” e a “formação integral” ................................................. 38
2.2.2 Reflexões sobre “alargamento da consciência” ..................................................... 39
2.3 “É PRECISO APRENDER A APREENDER DO ALUNO O QUE ENSINAR”. ...... 46

3 JAQUES-DALCROZE E ALGUMAS EXPERIÊNCIAS MINHAS .................... 50

3.1 REFLEXÕES SOBRE O PENSAMENTO DE DALCROZE .................................... 52


3.2 OS “MÉTODOS ATIVOS” E JAQUES-DALCROZE.............................................. 53
3.3 MINHA EXPERIÊNCIA EM EDUCAÇÃO MUSICAL A PARTIR DO
MOVIMENTO CORPORAL ............................................................................................... 56
3.3.1 Rodas de Dança: possíveis relações com a Rítmica ............................................... 57
3.3.2 Meu corpo em movimento ...................................................................................... 58
3.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS BASES DA RÍTMICA DALCROZE .................... 60
8

4 REFLEXÕES SOBRE O USO DO TERMO “MÉTODO” EM


KOELLREUTTER E DALCROZE .................................................................................. 64

4.1 MÉTHODE: UMA BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA ....................... 65


4.2 REFLEXÕES SOBRE O POSSÍVEL CARÁTER DE “MÉTODO” DA RÍTMICA.. 69
4.3 DALCROZE COMO REAÇÃO AO “MÉTODO” .................................................... 72
4.3.1 “Educação integral” no pensamento de Dalcroze ................................................. 72
4.3.2 A Rítmica Dalcroze como uma reação ao “método” ............................................. 73
4.3.3 A Rítmica Dalcroze como técnica: esquecida, porém possível .............................. 76

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 79

REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 82

APÊNDICE A – BAIÃO (PARTITURA) .......................................................................... 85

APÊNDICE B – ESTRUTURA DA ATIVIDADE DE IMPROVISO .............................. 87

APÊNDICE C – RODA DE DANÇA: CRAVO E CANELA (OPÇÃO 1) ....................... 88

APÊNDICE D – RODA DE DANÇA: CRAVO E CANELA (OPÇÃO 2) ....................... 89

APÊNDICE E – RODA DE DANÇA: CRAVO E CANELA (OPÇÃO 3) ....................... 90

APÊNDICE F – RODA DE DANÇA: CLIMBIN’UP THE MOUNTAIN ....................... 91

APÊNDICE G – RODA DE DANÇA: BAIÃO (OPÇÃO 1) ............................................. 92

APÊNDICE H – RODA DE DANÇA: BAIÃO (OPÇÃO 2) ............................................. 93

APÊNDICE I – RODA DE DANÇA: CIO DA TERRA ................................................... 94


9

APÊNDICE J – RELATÓRIO FINAL DE ESTÁGIO .................................................... 95


10

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem início em minha experiência de prática docente na Oficina de


Música para Cantores que ocorreu no primeiro semestre de 2014 sendo parte das atividades
da disciplina de Estágio Curricular Supervisionado III do curso de Licenciatura em Música da
UDESC – Universidade do Estado de Santa Catarina.
O Relatório Final de Estágio: Oficina de Música para Cantores, documento que
registra o projeto e a execução desta experiência, é tomado como objeto de análise, buscando
identificar as relações possíveis entre a teoria e a prática pedagógica.
Organizo este trabalho em quatro partes: uma de ordem reflexiva organizacional, que
irá apontar as principais atividades desenvolvidas, relacionando-as com a fundamentação
teórica; outra que irá apontar um embasamento teórico, sobre o qual me identifiquei e construí
o meu estágio; outra que irá discutir e aprofundar uma possível fundamentação para a prática
docente no estágio realizado; e a quarta de ordem reflexiva que se destina a relacionar os
autores apresentados na segunda e terceira partes. Finalizo este trabalho tecendo
considerações sobre o diálogo na didática musical entre teoria e prática, o que penso poder ser
o núcleo das disciplinas de Estágio Curricular Supervisionado.
Os temas abordados em cada capítulo são resultado de reflexões presentes na
construção de um pensamento em educação musical que busca maior coerência entre a minha
prática docente e os referenciais teóricos que vejo me ajudarem nesta construção.
O primeiro e o segundo capítulos trazem as duas referências teóricas apresentadas na
seção Projeto do relatório de estágio e que fundamentaram a prática docente. Nestes
capítulos, parto da fundamentação teórica onde apresento as atividades desenvolvidas para
verificar de que maneira se deu a relação entre a fundamentação, conceitual e teórica, e a
prática docente, identificando e discutindo possíveis coerências entre essas concepções de
educação musical que embasam o Projeto e a prática relatada nos Planos de Aula e
Protocolos.
No primeiro capítulo, apresento, inicialmente, uma breve contextualização do estágio
realizado, bem como algumas considerações a respeito do relatório final de estágio. Exponho,
a seguir, o modelo C(L)A(S)P proposto por Keith Swanwick em seu livro A Basis for Music
Education (1979) a partir da divisão do fazer musical em cinco modalidades e dos princípios
de equilíbrio e interação previstos por este modelo. Após esta breve apresentação, analiso as
principais atividades desenvolvidas ao longo do semestre, com a intenção de refletir em que
11

medida pude, na Oficina de Música para Cantores, alcançar estes objetivos de organização da
aula, tendo como suporte o modelo proposto por Swanwick (1979).
No segundo capítulo irei expor brevemente as concepções de educação musical de
Hans-Joachim Koellreutter apresentadas por Teca Alencar de Brito em seu livro Koellreutter
educador: O humano como objetivo da educação musical (2001), relacionando-as com as
repercussões práticas destas concepções nas tomadas de decisão como estagiário, relatadas
nos Planos de Aula e nos Protocolos.
No terceiro capítulo, proponho possíveis relações de minha atuação e prática no
estágio junto aos princípios desenvolvidos por Emile Jaques-Dalcroze, visando meu
aprofundamento e uma maior ampliação teórico-prática. A Rítmica Dalcroze será
contextualizada e apontada como possibilidade prática para a realização dos ideais propostos
por Koellreutter, uma vez que estes puderam me encaminhar, de minha parte mesmo que
intuitivamente, para a construção de um conceito onde educação e formação musicais
dirigem-se de mãos dadas com a percepção e a sensibilização do corpo.
No quarto capítulo, teço algumas reflexões a respeito do conceito de “método”
inserido na História da Música do Ocidente, uma vez que o identifico como termo central para
o entendimento das propostas de Hans-Joachim Koellreutter e de Emile Jaques-Dalcroze, bem
como para compreender tanto um quanto outro compositores como sujeitos históricos.
Finalizo este trabalho traçando breves considerações finais a respeito das reflexões
aqui propostas.

BUSCANDO APROXIMAÇÃO ENTRE TEORIA E PRÁTICA

A relação entre teoria e prática pedagógica é um tema tanto instigante como polêmico
e atual e que, na música do mundo ocidental remete-nos a pensadores, filósofos e teóricos da
Grécia antiga, adentrando o início da Idade Média, com Boécio (ca. 480 – ca. 524).
Não caberia aqui apresentar um estudo filosófico-histórico sobre o embate entre teoria
e prática pedagógicas, embora entenda que uma das inquietações a qual permeou toda a minha
graduação seja justamente esta dicotomia, que pude vivenciar com profundidade em meu
estágio de final de curso. Segundo Viviane Beineke (2001, p. 88), esta relação é intensamente
discutida por educadores e pesquisadores e, na área da educação, “são apontadas lacunas entre
os processos de formação de professores e os problemas concretos que eles encontram na
realidade escolar”. Ainda segundo a autora, dessa problemática derivam-se muitos
questionamentos quanto à relevância dos conhecimentos presentes nos cursos de formação,
12

pela dificuldade em aplicá-los na prática de ensino. Nesse contexto, existe, muitas vezes, uma
polarização entre pesquisadores e professores, “como se os primeiros apenas ‘pensassem’ e os
segundos, apenas ‘fizessem’”. Dessa forma, a validade dos conhecimentos teóricos é
questionada por muitos professores, uma vez que os teóricos (pesquisadores) não participam
do “mundo prático”.
Esta distância entre o conhecimento teórico e o conhecimento prático se reflete na
dificuldade encontrada pelos estudantes de licenciaturas ao relacionarem ambos, enxergando
estes dois âmbitos como “mundos diferentes” e criando assim uma dicotomia entre os dois.
Conforme Beineke (2001, p. 88), esta dicotomia é reforçada pela ideia de que a teoria
deve ser aplicada na prática pelos professores para que, através da aplicação das teorias que
derivam do conhecimento científico, estes consigam resolver os problemas da prática. De
acordo com Gimeno Sacristan (1999, p. 23 apud BEINEKE, 2001, p. 88), tal pensamento
condiciona as relações entre teoria e prática, limitando o entendimento da interação entre
conhecimento e ação em educação.
Como aponta Beineke (2001), as teorias que são aprendidas na universidade são por
vezes desconsideradas pelos professores em formação por não conseguirem visualizar a sua
aplicação na prática.
Imerso neste paradoxo, a elaboração de um projeto de estágio que contenha
fundamentação teórica, se dá muitas vezes num processo de abstração. O aluno de graduação
nem sempre consegue relacionar a sua prática docente com o conhecimento já desenvolvido
por outros autores. Construir um projeto de estágio torna-se uma condição de ter que escolher
alguns autores para com eles dialogar num trabalho escrito. Esta acaba sendo, por vezes, uma
atividade meramente burocrática e que não ganha sentido real de reflexão, de embasamento,
de construção teórica e menos ainda de aprendizado, para o futuro professor.
Objetivando aproximar teoria e prática, Schon (1983; 2000 apud. BEINEKE, 2001, p.
89) desenvolveu a teoria da epistemologia da prática profissional, na qual o professor é
entendido como ativo e reflexivo, construindo assim também um conhecimento na reflexão de
sua prática. Segundo Beineke (2001):

Na epistemologia da prática, a atividade profissional é definida como uma prática


reflexiva, explicada através de três conceitos fundamentais desenvolvidos pelo
autor: conhecimento-na-ação (knowing-in-action), reflexão-na-ação (reflection-in-
action) e reflexão-sobre-a-ação (reflection-on-action). (BEINEKE, 2001, p. 89).

Identifico que os Protocolos (presentes em meu relatório de estágio) são do tipo


“reflexão-na-ação”, uma vez que estes ocorreram semanalmente logo em seguida da prática
13

pedagógica, caracterizando-se, portanto, como uma reorganização do que foi feito enquanto a
ação estava sendo executada; já as reflexões propostas no presente trabalho caracterizam-se
em “reflexão-sobre-a-ação”, pois foram construídas depois que a ação foi concluída, com o
professor “livre dos condicionamentos da prática”.
O relatório de estágio é construído ao longo do semestre com reflexões semanais a
respeito das práticas presentes nos Protocolos. Esta é já uma excelente oportunidade de se
relacionar teoria e prática. Deste modo, vejo que a reflexão após a ação, presente neste
trabalho, é de grande valia na medida em que se pode aprofundar as reflexões com maior
seriedade sobre os reais impactos que têm as concepções, as teorias, no âmbito prático.
Ainda a respeito da epistemologia da prática, Beineke (2001, p. 90) afirma que “o
professor é considerado um profissional que reflete criticamente sobre a prática e, a partir
dela, desenvolve conhecimentos próprios relacionados ao contexto em que atua, as suas
experiências e as suas concepções sobre educação”.
Porém, é preciso ressaltar que a “reflexão-na-ação” e a “reflexão-sobre-a-ação” são
reforçadas e enriquecidas quando construídas em diálogo com o conhecimento teórico. Como
afirma Gimeno Sacristan (1999, p. 54 apud BEINEKE, 2001, p. 94) “seria ridículo renunciar a
bagagem de informação acumulada, argumentando que o professor só se forma na prática,
mas seria igualmente errôneo esperar que todo esse conhecimento substituísse a prova da
experiência”. Desta forma, a prática e a teoria estão intimamente interligadas de modo que,
em diálogo, constroem novos conhecimentos.
Considerando, portanto, a dicotomia existente entre teoria e prática pedagógica, este
trabalho tem como objetivo analisar o relatório de estágio para verificar de que modo as
teorias, ou seja, a fundamentação teórica, as ideias preconizadas no Projeto estão presentes na
prática descrita nos Planos de Aula e Protocolos. Para além desta perspectiva, objetiva-se
também identificar quais “teorias” poderiam fundamentar a prática ocorrida e discutir os
possíveis encontros e desencontros entre as referências teóricas utilizadas. Desta forma, neste
trabalho objetiva-se, num âmbito mais abrangente, relacionar e aproximar a teoria e prática
pedagógica a partir de uma experiência teórico-prática.

ANÁLISE DE DISCURSO

Algumas das concepções de educação musical de Hans-Joachim Koellreutter foram


utilizadas como fundamentação teórica para a prática docente aqui analisada. Dentre elas, a
reação ao método, uma postura importante dentro do pensamento do autor. No entanto, após a
14

realização do estágio, pude observar uma consonância entre minhas experiências de utilização
da movimentação corporal no aprendizado musical e o sistema de educação musical proposto
por Emile Jaques-Dalcroze: a Rítmica1. Esta proposta de educação musical é muito conhecida
no Brasil por “Método Dalcroze” (MARIANI, 2011, p. 27) e no próprio site do Institut
Jaques-Dalcroze (IJD) pode-se encontrar frequentemente a utilização da expressão “la
méthode Jaques-Dalcroze”.
Num primeiro contato com as propostas de Koellreutter e com aquelas de Dalcroze,
poderíamos identificar que o primeiro, por ser contrário ao “método” pedagógico musical,
seria reativo ao “Método Dalcroze”, por se tratar de um método pedagógico musical. Neste
caso, haveria uma incoerência de minha parte: num momento concordo com uma postura
“anti-método” de Koellreutter e em seguida proponho a utilização de um “método” para a
atuação em sala de aula junto aos alunos, com bases no “Método Dalcroze”. No entanto,
buscando compreender melhor como a palavra “método” ganhou significado para cada um
destes educadores musicais, e considerando os posicionamentos destes como discursos,
utilizando assim os princípios apontados por Eni P. Orlandi em seu livro Análise de Discurso
(2000), pude perceber que esta possível contradição se dá mais por um problema de palavras,
uma questão de como as palavras significaram e significam em contextos e experiências
históricas diferentes e ditas por sujeitos distintos.
De acordo com Orlandi (2000, p. 17), ao contrário da análise de conteúdo, que busca
compreender o que os textos querem dizer, a análise de discurso busca compreender como os
textos significam. Para Orlandi (2000, p. 42-43), “[...] podemos dizer que o sentido não existe
em si, mas é determinado pelas posições ideológicas colocadas em jogo no processo sócio-
histórico em que as palavras são produzidas. As palavras mudam de sentido segundo as
posições daqueles que as empregam”.
Além deste entendimento de que os discursos significam de formas diferentes
dependendo das posições ideológicas e sócio-históricas dos sujeitos, Orlandi (2000, p. 43)
afirma ainda que os discursos se inscrevem, cada um, numa formação discursiva específica,
numa ideologia, e desta forma se constituem em seus sentidos.

As palavras não têm um sentido nelas mesmas, elas derivam seus sentidos das
formações discursivas em que se inscrevem. As formações discursivas, por sua vez,
representam no discurso as formações ideológicas. Desse modo, os sentidos sempre
são determinados ideologicamente. (ORLANDI, 2000, p. 43).

1
Que será melhor apresentada no terceiro capítulo deste trabalho.
15

Desta forma, percebo que a aparente incoerência ou incompatibilidade existente entre


os dois referenciais teóricos citados acima se dão justamente porque “palavras iguais podem
significar diferentemente porque se inscrevem em formações discursivas diferentes”
(ORLANDI, 2000, p. 44).

O sentido é assim uma relação determinada do sujeito – afetado pela língua – com a
história. É o gesto de interpretação que realiza essa relação do sujeito com a língua,
com a história, com os sentidos. Esta é a marca da subjetivação e, ao mesmo tempo,
o traço da relação da língua com a exterioridade: não há discurso sem sujeito. E não
há sujeito sem ideologia. [...] (ORLANDI, 2000, p. 47).
Não é vigente, na Análise de Discurso, a noção psicológica de sujeito empiricamente
coincidente consigo mesmo. Atravessado pela linguagem e pela história, sob o modo
do imaginário, o sujeito só tem acesso à parte do que diz. Ele é materialmente
dividido desde sua constituição: ele é sujeito de e sujeito à. Ele é sujeito à língua e à
história, pois para se constituir, para (se) se produzir sentidos ele é afetado por elas.
Ele é assim determinado, pois se não sofrer os efeitos do simbólico, ou seja, se ele
não se submeter à língua e à história ele não se constitui, ele não fala, não produz
sentidos. (ORLANDI, 2000, p. 48-49).

Por fim, só se pode analisar um discurso considerando essas imagens, essas


“formações imaginárias” (relações de força, relações de sentidos) uma vez que elas se fazem
presentes no momento em que se diz. Para Orlandi (2000, p. 42), “o imaginário faz
necessariamente parte do funcionamento da linguagem. Ele é eficaz. Ele não ‘brota’ do nada:
assenta-se no modo como as relações sociais se inscrevem na história e são regidas, em uma
sociedade como a nossa, por relações de poder”.
De acordo com Orlandi (2000, p. 31-32), todos os sentidos já ditos por alguém, em
algum lugar, e outros momentos, mesmo muito distantes, têm um efeito sobre, estão
significando o que está sendo dito. Portanto, há uma relação entre o que já foi dito e o que se
está dizendo. Desta forma, os capítulos dois, três e quatro têm como objetivo contextualizar os
educadores Hans-Joachim Koellreutter e Emile Jaques-Dalcroze buscando assim compreender
melhor as implicações do discurso “anti-método” do primeiro em relação ao “método ativo”
proposto pelo segundo.
Mesmo que estes conceitos não tenham sido encarados como métodos específicos de
análise dos documentos, estes guiaram as reflexões acerca da prática pedagógica registrada no
relatório de estágio, bem como as reflexões a respeito dos discursos dos autores.
Vejo que esta é uma discussão necessária e pertinente a ser feita por aqueles
professores de música em formação que não pretendem ser meros aplicadores de métodos, na
medida em que considera-se necessária ampliação da consciência com relação às ideologias
de educação musical com as quais nos identificamos e das possíveis repercussões práticas dos
nossos discursos.
16

1 PONTO DE PARTIDA: MINHA EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO

Neste capítulo, apresento a experiência de atuação docente na Oficina de Música para


Cantores que fez parte das atividades da disciplina de Estágio Curricular Supervisionado III
do curso de Licenciatura em Música da UDESC – Universidade do Estado de Santa Catarina
no primeiro semestre de 2014. Inicialmente exponho uma breve contextualização do estágio e
posteriormente utilizo o modelo C(L)A(S)P proposto por Swanwick em seu livro A Basis for
Music Education (1979) para apresentar as principais atividades desenvolvidas. O modelo
C(L)A(S)P serviu de embasamento teórico no que diz respeito à organização das atividades
buscando, assim, equilíbrio e interação entre as mesmas. Desta forma, analiso minha prática
docente (registrada nos Planos de Aula e Protocolos, presentes no Relatório Final de Estágio)
para verificar as possíveis coerências e incoerências desta prática no que se refere aos
princípios deste modelo.
A Oficina de Música para Cantores teve início no dia 07 de Abril de 2014 e a sua
última atividade ocorreu no dia 30 de Junho do mesmo ano. Ao todo, foram 11 encontros
realizados sempre às segundas-feiras com uma hora de duração cada. A Oficina se estendeu
ao longo do segundo semestre de 2014, entretanto o presente trabalho detém-se somente às
atividades do primeiro semestre.
A oficina esteve vinculada ao Coral UDESC2, sendo oferecida como uma formação
complementar aos coralistas que tiveram poucas vivências musicais, principalmente no que
diz respeito à leitura e à percepção musicais, e que têm interesse em desenvolver-se neste
âmbito.
Na ocasião em que o Professor Sergio Figueiredo propôs de fazermos a oficina,
deparei-me com a seguinte dúvida: “como ensinar/aprender teoria e percepção musical
partindo do fazer musical dos alunos?” Não encontrando respostas prontas, o desenrolar da
Oficina se deu, com o apoio do Professor Sérgio Figueiredo e da Professora Simone Gutjahr,
numa busca de respostas ao questionamento posto.
Foi a partir das práticas do Coral e dos próprios alunos, das suas dificuldades e saberes
prévios, e a partir da fundamentação teórica apresentada e discutida no presente trabalho que a
Oficina foi construída.

2
O Coral UDESC é um órgão setorial da Universidade do Estado de Santa Catarina coordenado pelo Professor
Sergio Figueiredo desde 2006, do qual participam tanto alunos e professores de diversos cursos oferecidos pela
UDESC, quanto pessoas da comunidade.
17

1.1 RELATÓRIO DE ESTÁGIO COMO DOCUMENTO DE ANÁLISE

De maneira geral, nas disciplinas de estágio curricular supervisionado, exige-se que os


estudantes registrem suas práticas em planos de aula e em relatos. No curso de Licenciatura
em Música da Universidade do Estado de Santa Catarina, os estudantes elaboram e
apresentam ainda um projeto durante o período de preparação para a realização do estágio.
Essa preparação está inserida no programa das disciplinas de Estágio Curricular
Supervisionado, presentes no quinto, sexto, sétimo e oitavo semestres da grade curricular.
Estes planejamentos e relatos reflexivos são reunidos num único documento no final
do semestre constituindo, assim, o Relatório Final de Estágio. Estes documentos têm sido
considerados importantes na formação do professor uma vez que dão oportunidades aos
alunos de construir relações entre a teoria e a prática (MATEIRO e CARDOSO, 2003-2004) e
são recurso para a reflexão sobre a própria prática e mecanismo para o desenvolvimento
pessoal e profissional (ZABALZA, 2004).
Neste trabalho, o relatório de estágio foi utilizado como documento de pesquisa e
análise, o que tem sido uma prática comum nos cursos de licenciatura, uma vez percebida a
riqueza que estes trabalhos podem apresentar para a formação dos futuros professores.
Conforme afirma Miguel A. Zabalza (2004):

Do ponto de vista metodológico, os “diários” fazem parte de enfoques ou linhas de


pesquisa baseados em “documentos pessoais” ou “narrações autobiográficas”. Essa
corrente, de orientação basicamente qualitativa, foi adquirindo um grande relevo na
pesquisa educativa dos últimos anos. (ZABALZA, 2004, p. 14).

No Relatório Final de Estágio, o conteúdo a ser exigido no Relatório fica a cargo do


professor que ministra a disciplina, sendo que, meu relatório, intitulado Relatório Final de
Estágio: Oficina de Música para Cantores, contém as seguintes seções: Introdução; Projeto;
Estágio de Observação; Estágio de Atuação; Considerações Finais; e Referências
Bibliográficas. No caso de haver necessidade de uma consulta mais aprofundada, anexo a este
trabalho de conclusão de curso o Relatório Final de Estágio (Apêndice K – Relatório Final de
Estágio). De todo modo, apresento a seguir uma sinopse do meu relatório de estágio.

Na Introdução há uma breve apresentação do trabalho, bem como uma


contextualização da Oficina de Música para Cantores e do Coral UDESC, apresentando, por
fim, a minha relação com o mesmo.
18

A seção Projeto contém seis páginas e contempla os seguintes itens: Justificativa;


Motivação pessoal; Objetivos (Geral e Específicos); Fundamentação Teórica; Metodologia; e
Cronograma. Esta seção será tomada para análise como sendo a parte de conteúdo teórico da
experiência, uma vez que trata das idealizações projetadas para o semestre. Considero que
nesta estão presentes os princípios de educação musical que me orientaram na minha
experiência de estágio.
Na seção Estágio de Observação são apresentados, em três páginas, os protocolos de
observação de duas atividades do Coral UDESC. Vale ressaltar que houve observação das
atividades desenvolvidas no Coral durante todo o semestre, uma vez que participei do mesmo
nos ensaios e apresentações (como coralista) e também dirigindo alguns ensaios de naipe
(como atividade da disciplina de Prática de Regência III). Estes aspectos contribuíram para o
meu envolvimento e engajamento para com as atividades do Coral UDESC.
A seção Estágio de Atuação contém 35 páginas, sendo a maior parte do documento.
Nesta seção estão presentes todos os Planos de Aula seguidos sempre de seus respectivos
Protocolos3. Esta seção do documento contém o registro das práticas, sob a minha perspectiva
como professor, podendo ser observados o caráter organizacional dos Planos de Aula e o
caráter reflexivo dos Protocolos.
Nas Considerações Finais estão tecidas algumas reflexões de ordem geral a respeito
da experiência como um todo.
Por fim, são apresentadas três Referências Bibliográficas, totalizando 48 páginas.

1.1.1 Considerações sobre o relatório de estágio

Do ponto de vista da organização, pude observar que os Planos de Aula eram


segmentados, dividindo assim a aula em “partes” e estas, por sua vez, em tópicos. Em vista
disso, ao longo do semestre, os Planos de Aula caminharam para um padrão mais
tecnicamente direcionado, na medida em que algumas posturas pessoais tornavam-se mais
claras nos planos anteriores e maiores elucidações se faziam desnecessárias.
Os Protocolos foram escritos com grande liberdade, tendo como principal objetivo a
minha reflexão através do reviver das situações que ocorreram em sala, proporcionado pelo
relato. Em quatro dos dez Protocolos o texto está dividido em subtítulos, o que os deixam
mais organizados.

3
Somente a última atividade não contém seu Protocolo, devido à continuação da Oficina para além da data de
entrega do Relatório Final de Estágio para avaliação.
19

Holly (1989 p. 61-81 apud ZABALZA, 2004, p. 15) aponta diversos tipos de diários
em função da modalidade de narração que se emprega: Jornalística; Analítica; Avaliadora;
Etnográfica; Terapêutica; Reflexiva; Introspectiva; Criativa e Poética.
Identifico que foram exclusivamente utilizadas as seguintes modalidades de narração:
Reflexiva, quando tratei de aclarar as próprias ideias através do processo de escrita refletindo
sobre a prática; Introspectiva, quando o conteúdo do relato se voltou para meus próprios
pensamentos, sentimentos e vivências; e Criativa e Poética, quando os processos foram
relatados com caráter mais poético dando a possibilidade de se imaginar e recriar as situações
narradas.
Embora cada atividade tenha tido suas especificidades que demandavam necessidades
variadas de reflexão e, posteriormente, de escrita, pude observar que cada um dos Protocolos
ocupa em média uma página do documento. Os Planos de Aula, por sua vez, ocupam em
média duas páginas.
Nos Planos de Aula, ao lado das atividades, mesmo tendo posto por escrito as
estimativas de quanto tempo demandariam, no momento da aula, sempre agia com liberdade
para atender às demandas do momento, às necessidades dos alunos.

1.1.2 Autonomia para as decisões

Como pude observar nas aulas das disciplinas de Estágio Curricular Supervisionado
III e IV, em alguns campos de atuação de estágio, como em alguns corais e bandas, já existe
um trabalho desenvolvido pelo regente do grupo, com uma concepção definida de forma de
trabalho, atividades, metodologia, inclusive com repertório já definido, seja para uma
apresentação no fim do ano ou para a liturgia semanal na igreja. Nestes casos, o que se pode
observar é que, muitas vezes, o estagiário tem pouca liberdade de atuação, devendo seguir os
caminhos já apontados pela estrutura que já existe. A atuação destes acaba se resumindo a,
por exemplo, ensaiar determinadas músicas e/ou fazer aquecimentos, exercícios de técnica e
assim por diante. Isso ocorre em maior e em menor grau, conforme a liberdade e a
delimitação de atuação que o professor/regente do campo permite ao estagiário.
Em minha experiência enquanto estagiário, posso dizer que praticamente fui o próprio
professor da turma. Naturalmente, fui orientado pela professora Simone Gutjahr e
supervisionado pelo prof. Sérgio Figueiredo, que acompanharam o trabalho contribuindo com
suas experiências, mas tive grande liberdade para atuar conforme as minhas ideias, vontades e
concepções. Nas orientações e reuniões, recebia sugestões, mas nunca imposições. Percebo
que houve sintonia de ideias entre Simone, Sergio e eu, criando uma sincronia na qual
20

facilmente nos entendíamos, possibilitando uma atuação na qual os vetores apontavam para
possibilidades consonantes.
Vejo de forma muito positiva a liberdade que me foi oferecida, pois foi através dela
que tive a possibilidade real de construir um projeto de atuação amplo e que estivesse de
acordo com as minhas ideias, minhas vontades, com a linha de pensamento em educação
musical que havia construído até aquele momento no decorrer da minha formação. Sobretudo
enxergo esta liberdade que me foi oferecida por ambos os professores, como a principal
geradora de dúvidas e inquietações, o que pôde proporcionar na elaboração deste trabalho de
conclusão de curso, um aprofundamento, tanto nas linhas de pensamento da didática musical
com os quais sinto-me atualmente identificado, como ampliar meu horizonte de
questionamentos.
Este fator de liberdade possibilitou, por exemplo, que eu partisse do seguinte princípio
de Koellreuter: “Meu método é não ter método” (BRITO, 2001, p. 29). No início da Oficina,
eu não tinha de fato um método específico, uma forma clara de como trabalhar, não havia
clareza de quais atividades eu iria utilizar no decorrer do semestre. Objetivando ter o foco nos
alunos, decidi partir das suas práticas, seus saberes prévios e suas dificuldades. Busquei
“aprender a apreender dos alunos o que ensinar” (KOELLREUTTER apud BRITO, 2001, p.
18). E esta abordagem só foi possível porque tive apoio para assim fazê-lo.
De início, na construção do “esqueleto” da Oficina, utilizei o modelo C(L)A(S)P que
me serviu, desse modo, de base organizacional da estruturação das atividades dentro da
Oficina de Música para Cantores. Para apresentar as principais atividades desenvolvidas,
inicio a próxima seção com uma breve explicação sobre o modelo C(L)A(S)P.

1.2 MODELO C(L)A(S)P

O modelo C(L)A(S)P representa, através da disposição gráfica da sigla, o que o Keith


Swanwick (1979) considera como sendo as cinco modalidades do fazer musical:

C - Composition (composição)
(L) - Literature studies (estudos acadêmicos)
A - Apreciation (apreciação)
(S) - Skill acquisition (aquisição de habilidades)
P - Performance (performance)
21

Conforme afirma Cecília Cavaliere França em seu artigo “Composição, apreciação e


performance: teoria, pesquisa e prática” (2002, p. 17), o modelo C(L)A(S)P considera como
modalidades centrais e fundamentais da “experiência musical ativa” as atividades de
composição “C” (incluindo improvisação), apreciação “A” e performance “P”, considerando
a aquisição de habilidades “(S)” (skill acquisition) e os estudos acadêmicos “(L)” (literature
studies) como atividades de “suporte”.

Os parênteses indicam atividades subordinadas ou periféricas - (L) e (S) - que


podem contribuir para uma realização mais consistente dos aspectos centrais - C, A
e P. Conhecimento teórico e notacional, informação sobre música e músicos e
habilidades são meios para informar (L) e viabilizar (S) as atividades centrais, mas
podem facilmente (e perigosamente) substituir a experiência musical ativa.
(FRANÇA, 2002, p. 17).

A respeito da centralidade do fazer musical nas modalidades de composição,


apreciação e performance, França (2002) ressalta que estas três modalidades principais são:

[...] processos fundamentais da música enquanto fenômeno e experiência, aqueles


que exprimem sua natureza, relevância e significado. Esses constituem as
possibilidades fundamentais de envolvimento direto com a música, as modalidades
básicas de comportamento musical. Cada uma delas envolve diferentes
procedimentos e produtos, conduzindo a insights particulares em relação ao
funcionamento das idéias musicais. (FRANÇA, 2002, p. 8).

Nesta perspectiva, o modelo prevê uma integração das modalidades (a coexistência


destas nos programas educacionais) e uma interação entre as modalidades (a influência mútua
entre elas), uma vez que, “acredita-se que uma modalidade pode enriquecer, aprimorar e
iluminar experiências subseqüentes, visão essa compartilhada por vários educadores.”
(FRANÇA, 2002, p. 15).
Antes mesmo de entrar no curso de graduação em música, através da Revista Nova
Escola4, tive meu primeiro contato com as propostas indicadas por Swanwick e com o modelo
C(L)A(S)P. Desde o início encarei o modelo como um esquema organizacional, como que
uma “régua”, através da qual podia medir se as atividades integravam as cinco modalidades
do fazer musical e se estas interagiam entre si. Pode ser considerado um esquema muito útil
na medida em que mantém o professor atento a esses princípios, sobretudo na organização
equilibrada das aulas.

4
Link da entrevista: http://revistaescola.abril.com.br/arte/fundamentos/entrevista-keith-swanwick-sobre-ensino-
musica-escolas-instrumento-musical-arte-apreciacao-composicao-529059.shtml acessado em 10 de Setembro de
2014.
22

Para além de uma proposta de organização, equilíbrio e interação das modalidades, o


modelo traz consigo o conceito de que uma educação musical abrangente é aquela que dá a
oportunidade ao aluno de ter acesso ao fazer musical através das três modalidades principais
relacionando-as com os estudos sobre música e as habilidades técnicas. Como tão bem elucida
França (2002):

Desses princípios filosóficos decorrem importantes implicações curriculares, mas


deve-se cuidar para não se enrijecerem os programas a ponto de esvaziar todo o
frescor e espírito de descoberta, insight e espontaneidade, quesitos primordiais dos
encontros com os alunos. (FRANÇA, 2002, p.18).

Partindo destes princípios, entendo que um curso de Teoria Musical tradicional no


qual o professor expõe os conteúdos e os alunos os assimilam, ou um curso de Percepção
Musical no qual elementos musicais são treinados isolados da prática musical, caracterizam-
se como atividades abstratas. Em tais formatos convencionais da didática musical são
explorados justamente os conhecimentos e, sobretudo, informações sobre música - (L)
Literature Studies - e a aquisição de habilidades - (S) Skill Acquisition -, modalidades estas
consideradas por Swanwick (1979) como atividades periféricas e que, segundo o autor,
deveriam estar numa esfera de suporte, sustentação, podendo assim possibilitar as outras três
modalidades: composição, apreciação e performance, que nesta dinâmica convencional são
enfraquecidas.
Considerando que a Oficina de Música para Cantores teve como função ser uma aula
de música que complementasse a formação dos coralistas do Coral UDESC, percebi logo de
início que seria necessário propiciar experiências de aprendizado musical no que se refere
tanto às questões teóricas, quanto prático-perceptivas. Portanto, o desenrolar da Oficina se deu
na tentativa de ensinar/aprender teoria e percepção musical dando início no fazer musical dos
alunos.
Vejo que esta situação aconteceu inclusive pelo desconhecimento5, de minha parte,
dos “métodos ativos” de educação musical, uma vez que muitos dos chamados “métodos
ativos” são propostas desenvolvidas com a intenção fundamental de unir a prática musical
com a teoria musical, pondo, em primeiro plano a prática musical. Estas metodologias ativas,
há mais de um século, propõem técnicas didáticas cujo núcleo é posto sobre a composição, a
apreciação e a performance – como sugere, atualmente, Swanwick.
Sendo assim, no desconhecimento destas propostas ativas de educação musical,
procurei responder aos meus questionamentos de como ensinar/aprender teoria e percepção
5
Refiro-me a um conhecimento realmente prático e consistente destas propostas de base da educação musical.
23

musical partindo do fazer musical dos alunos, refletindo sobre alguns dos conceitos vindos do
músico e educador Koellreutter, que vê a educação musical através da “superação do
currículo fechado” e que, nesta superação, o educador musical busca “aprender a apreender do
aluno o que ensinar” (BRITO, 2001, p. 31). Mais adiante, na segunda parte deste trabalho, irei
expor algumas considerações sobre as posições de Hans-Joachim Koellreutter que serviram de
suporte conceitual para a construção da Oficina e, posteriormente, para a elaboração deste
trabalho de conclusão de curso.

1.3 AS ATIVIDADES DA OFICINA DE MÚSICA PARA CANTORES

Mantendo a base da estruturação sobre o modelo C(L)A(S)P, proposto por Swanwick,


apresento abaixo um panorama geral do que foi desenvolvido na Oficina. Escolhi traçar a
seguinte tabela para que ilustrasse as principais atividades desenvolvidas em cada encontro:

Tabela 1- Principais atividades desenvolvidas em cada encontro

Fonte: produção do próprio autor.

Pode-se observar uma clara mudança de padrão de atividades a partir do 7º encontro,


caracterizando assim dois momentos distintos: até o 6º encontro, marcam presença as
atividades de Apreciação, Rodas de Dança e Manossolfa; no 6º encontro, o Registro
realizado mudou a estrutura das atividades e, portanto, o segundo momento caracteriza-se
pela abordagem da escrita da canção Marcha Soldado (Apêndice A – Marcha soldado
(partitura)) e pela atividade de Composição. Houve apenas uma atividade na qual
prioritariamente buscou-se a Improvisação (Apêndice C – Estrutura da atividade de
improviso), e houve dois momentos de Registro.
As atividades de Apreciação estiveram presentes em quatro dos seis encontros iniciais
e se deram por meio de momentos de escuta atenta de gravações das músicas do repertório
presente nos ensaios do Coral UDESC. No Projeto de Estágio (MEURER, 2014, p. 8) havia
previsto que ocorreriam atividades de Apreciação em todos os encontros, entretanto, no
decorrer do semestre, pude observar outras necessidades, o que me fez escolher caminhos que
24

considerei mais pertinentes. No segundo Registro, por exemplo, percebi ser necessário
construir o ritmo e a melodia da canção folclórica Marcha Soldado juntamente com a turma,
e esta atividade necessitava de bastante tempo, ocupando assim duas aulas inteiras. De forma
semelhante, a Composição ocupou praticamente todo o restante das aulas. Além disto,
entendi que as atividades de Apreciação que havia programado poderiam ficar “soltas” na
nova dinâmica que a Oficina havia tomado.
As atividades de Rodas de Dança serão melhor detalhadas na terceira parte deste
trabalho, uma vez que as relaciono com a Rítmica proposta por Emile Jaques-Dalcroze.
A técnica da Manossolfa, presente no Método Kodály, foi utilizada em atividades em
que os alunos se apropriavam da técnica para explorar as alturas, “reger”6 a turma ou
pequenos grupos, identificar padrões melódicos, realizar o solfejo a partir da minha
“regência” e da partitura, bem como relacionar com trechos do repertório. A técnica foi
introduzida aos poucos, iniciando com as notas mi e sol, e acrescentando a cada encontro uma
altura nova.
No primeiro Registro propus aos alunos que escrevessem, individualmente, conforme
a sua percepção, a melodia da música “Baião” de Edino Krieger (Apêndice B – Baião
(partitura)). Escolhi esta, dentre outras do repertório do Coral UDESC, por considerar como
sendo a mais singela melódica e ritmicamente. No segundo Registro, a mesma tarefa, só que
desta vez com a canção Marcha Soldado. Escolhi esta canção também pela simplicidade das
estruturas musicais e por trabalhar, justamente, com elementos musicais, em sua maioria, já
abordados na Oficina.
A partir da análise destes registros, e considerando as dificuldades do grupo na
realização dos mesmos pude traçar caminhos mais próximos da realidade de cada integrante
do grupo. No primeiro Registro identifiquei que o grupo não apresentava praticamente
nenhuma compreensão das estruturas mais básicas da notação musical. O segundo Registro
desencadeou, nos dois encontros que se seguiram, a construção em grupo da melodia da
música Marcha Soldado. O Registro mostrou a urgência de serem abordados vários
conteúdos relativos à escrita, direcionando a Oficina para este caminho.
Estava previsto no Projeto (MEURER, 2014, p. 7-8) que fossem realizados três
Registros: no início, no meio e no final do semestre. Porém, após o dois registros, optei por
fazer uma atividade especificamente de Composição que contemplasse os conteúdos já

6
Trata-se aqui de comandar um grupo para a performance de uma melodia improvisada e que é representada
pela Manossolfa.
25

abordados. A atividade se estendeu por três encontros, sendo complementada pela


performance e pela a apreciação das duas canções compostas pelo grupo.
Além destas, que estiveram mais presentes, houve outras atividades como: momentos
de conversa (buscando sempre um retorno dos alunos a respeito das atividades
desenvolvidas); atividades em que os próprios alunos escreviam no quadro determinados
trechos, num processo de construção do conhecimento com a turma; tarefas para casa; e o
destrinchar do funcionamento estrutural de algumas partituras do repertório.

1.3.1 As modalidades - segundo o modelo C(L)A(S)P e sua aplicação na estruturação


da Oficina

1.3.1.1 C – Composition (composição) na estruturação da Oficina

Numa análise mais generalizada pode-se dizer que houve duas atividades que
exploraram a “atividade composicional”: a atividade de Improviso, e a de Composição,
ambas realizadas no fim do semestre, com o objetivo de consolidar os elementos musicais que
foram explorados ao longo do curso. Vejo que, tanto uma, quanto outra atividades puderam
favorecer, como afirma França (2002, p. 16), “o entendimento do funcionamento das ideias
musicais contribuindo, portanto, para tornar a performance mais coerente e consistente.”
A atividade de Improviso foi antecedida de uma exploração mais livre através da
Manossolfa da estrutura dó-mi-sol no próprio dia da atividade e no encontro da semana
anterior. Na improvisação, utilizei um padrão de acompanhamento de um trecho da música
“Boi de Mamão”, presente no repertório do Coral UDESC, para o grupo executar enquanto
um aluno improvisava. Terminado o trecho, todos cantavam outro trecho da Canção: “Eu
caio, eu caio, na boca da noite serenou eu caio” 2x (Apêndice B). O improviso consistia na
exploração melódica da estrutura dó-mi-sol utilizando a técnica da Manossolfa, buscando
utilizá-la agora sobre uma estrutura rítmica já definida.
Desta forma, fez-se uso do improviso como possibilidade criativa de domínio das
estruturas. De acordo com Janet Mills (1991, p. 31, apud FRANÇA, 2002, p. 10), “a
composição também pode promover um progressivo domínio da técnica e controle dos
instrumentos para realização do resultado musical desejado, pois ‘fortalece a associação entre
a ação e o som’”.
Na atividade de Composição, os alunos, em dois grupos, criaram efetivamente uma
canção cada um, a partir da escolha entre estruturas rítmicas já definidas e a utilização das
estruturas melódicas exploradas durante o semestre. Posteriormente, um grupo ensaiou e
26

apresentou a canção criada pelo outro grupo, tendo, portanto, a clareza e a precisão da escrita
musical como objetivos a serem alcançados.
Observo, no entanto que, além destes objetivos de âmbito técnico, um processo como
este, no qual articula-se necessariamente aspectos que envolvam a subjetividade dos alunos,
as suas vidas e experiências, pode tornar o aprendizado mais significativo. Conforme afirma
França:

Experiências em composição podem levar os alunos a desenvolverem sua própria


voz nessa forma de discurso simbólico. Durante esse processo, idéias musicais
podem ser transformadas, assumindo novos níveis expressivos e significados,
articulando assim sua vida intelectual e afetiva. (FRANÇA, 2002, p. 10).

Percebe-se que o aspecto criativo esteve presente não somente nestes dois momentos,
mas também de forma diluída, principalmente, ao longo das atividades em que se explorou as
estruturas melódicas utilizando a Manossolfa. Como visto anteriormente, nestas atividades
especificamente ligadas à Manossolfa, os alunos eram sempre solicitados a regerem a turma,
ou pequenos grupos, improvisando uma melodia. Inicialmente, com estruturas simples, os
alunos exploravam livremente as alturas e com isso buscou-se um envolvimento mais
significativo dos mesmos para com os conteúdos, de forma que os percebessem e
compreendessem. Por vezes, alguns padrões que se utilizavam das estruturas exploradas com
a Manossolfa eram postos no quadro e os alunos eram chamados a fazer alterações nos
mesmos, interagindo de forma criativa com os elementos musicais.
Como afirma Swanwick (1979, p. 43, apud FRANÇA, 2002, p. 9), “além de formar
compositores especialistas, a composição é uma ferramenta poderosa para desenvolver a
compreensão sobre o funcionamento dos elementos musicais, pois permite um relacionamento
direto com o material sonoro”.

1.3.1.2 A – Apreciation (apreciação) na estruturação da Oficina

De acordo com França (2002, p. 12), percebo que a Apreciação é uma forma legítima
e imprescindível de engajamento com a música. Através dela podemos expandir nossos
horizontes musicais e nossa compreensão, pelo fato de que Apreciação, da maneira como é
posta por Swanwick, está diretamente ligada à percepção e à sensibilização.
Em algumas das atividades de Apreciação a escuta foi direcionada para determinado
aspecto musical, porém noutras não houve sugestão inicial da minha parte. Após a escuta, o
grupo discutia a respeito do que ouviu, sendo estimulado por questões que eu lançava e que
27

considerava pertinentes às experiências do grupo e às outras atividades daquele dia. Segundo


França:

As atividades de apreciação devem levar os alunos a focalizarem os materiais


sonoros, efeitos, gestos expressivos e estrutura da peça, para compreenderem como
esses elementos são combinados. Ouvir uma grande variedade de música alimenta o
repertório de possibilidades criativas sobre as quais os alunos podem agir
criativamente, transformando, reconstruindo e reintegrando idéias em novas formas
e significados. (FRANÇA, 2002, p. 13).

Estas atividades de Apreciação, por vezes, tinham algumas repercussões em


atividades consecutivas que relacionavam a vivência de algum aspecto musical com a sua
respectiva escrita.
Por vezes chamei a atenção dos alunos enfatizando que esta atividade tem objetivos
diferentes daqueles momentos em que cada um ouve música separadamente em sua casa,
como entretenimento ou para se isolar do mundo, para relaxar, para dançar
descompromissadamente, ou mesmo somente para se sentir bem (SOUZA; TORRES, 2009).
A escuta em sala de aula busca uma proximidade maior com a música, chegando assim a
ampliar a percepção, a atenção, a concentração, a presença. Desta forma, orientei para que os
alunos investigassem, num primeiro momento, as informações que eram capazes de perceber
e comunicar a partir da escuta. Experimentamos sentar mais na ponta da cadeira, sobre os
ísquios e “chamar” a concentração na atividade, não deixando a mente dispersar para qualquer
assunto rotineiro, cotidiano.
Cabe citar a minha experiência com a Técnica Klauss Vianna durante o ano de 2014
nas disciplinas de “Estudos Avançados em Música I [e II] – Técnica Klauss Vianna e a Escuta
do Corpo” ministradas pela professora Valeria Bittar. Nesta técnica, a ativação do corpo
“acordado” se dá partindo-se também da experiência da vetorização óssea e a utilização de
técnicas originadas no ensino do teatro pós-dramático de desconstrução do corpo cotidiano.
Dentro desta experiência pode-se encontrar um caminho que aponte para uma atenção mais
aprofundada dentro de um processo perceptivo de aprendizado, em geral, e musical (BITTAR,
2012).
Em seu livro Música na Educação Infantil (2003, p. 187), Teca Alencar de Brito
afirma: “Escutar é perceber os sons por meio do sentido da audição, detalhando e tomando
consciência do fato sonoro. Mais do que ouvir (um processo puramente fisiológico), escutar
implica detalhar, tomar consciência do fato sonoro”. Sobre a importância da ampliação da
escuta, a autora ainda complementa: “Aprender a escutar, com concentração e disponibilidade
28

para tal, faz parte do processo de formação de seres humanos sensíveis e reflexivos, capazes
de perceber, sentir, relacionar, pensar, comunicar-se”.
Ao traçar o caminho acima que descreve a minha opção em fazer uso do modelo
C(L)A(S)P proposto por Swanwick (1979), percebo que essa organização das aulas na Oficina
de Música para Cantores remete à trajetória posta por Hans-Joachim Koellreutter rumo à uma
pedagogia musical dos sentidos e à ampliação, através disso, da consciência. Mais adiante, no
segundo capítulo, proporei reflexões sobre o conceito da palavra “consciência”, tendo como
motivação o contato com os pensamentos de Koellreutter sobre educação musical para a
ampliação da consciência. Destaco já aqui que o significado de “consciência” que irei
empregar neste trabalho é originado em Awareness, palavra inglesa que se refere à
consciência que perpassa os limites do intelecto e que brota da percepção corpórea. A partir
desta concepção, sinto-me apto a pensar numa didática da música em que a sensibilização, a
percepção física e a geração do movimento do corpo passam a ser núcleo da didática e da
performance musical, como proposto pela Rítmica, sistema de educação musical
desenvolvido por Emile Jaques-Dalcroze, que será apresentado no terceiro capítulo deste
trabalho.

1.3.1.3 P – Performance (performance) na estruturação da Oficina

Abro aqui um parêntese antes de trabalhar sobre o conceito de performance em


Swanwick para expor algumas reflexões sobre o termo performance, reflexões estas traçadas
por outros autores e visitadas e relidas por mim.
De acordo com a flautista Valeria Bittar (2012), enxergo a “noção da performance
como uma operação de ordem perceptiva, e não lógica, que ocorrerá no espaço de
performance, no instante da performance, cujo eixo é o intérprete e a audiência.” (BITTAR,
2012, p. xiii).
França (2002, p. 18-19) critica a denominação (T)EC(L)A, tradução pela qual é
geralmente conhecido o modelo C(L)A(S)P no Brasil. Além dos apontamentos críticos da
autora, observo a tradução desnecessária de performance7 para execução. A palavra execução
é mais facilmente associada à “interpretação musical canonicista” (BITTAR, 2012)
consolidada no Romantismo, ligada ao princípio simples de execução e que tem o intérprete

7
Performance, Etim. ing (1531), de to perform ‘alcançar’, ‘executar’ e, este, do fr. ant. parfourmer ‘cumprir,
acabar, concluir’, de former, ‘formar’, ‘dar forma a’, ‘criar’, do lat. formãre, ‘formar’, ‘dar forma’. (HOUAISS,
2001, p. 2.187).
29

como “embaixador da vontade do autor da obra” (DUNSBY, 1995, apud BITTAR, 2012, p.
xiii).
Segundo Bittar (2012, p. 129), no modus operandi da mentalidade do método
canonicista do século XIX “a performance restringe-se à habilidade em adequação ao treino
proposto pelo método, visando desempenho = execução. Busca-se o acerto, evitando-se, a
todo custo, o erro e o improviso (motivos para a desqualificação)”. Para Bittar (2002, p. 34),
“o aprendiz de música, atualmente, é formado dentro dos princípios do método do
Conservatoire, lentamente forjado no Iluminismo e na Revolução Francesa e, mais adiante e
de maneira efetiva, no cientificismo positivista ao longo do século XIX”.
Como afirma França (2002, p.13), a performance musical é tão frequentemente
associada ao virtuosismo instrumental e a salas de concertos que se chega a questionar a
validade do ensino instrumental com fins não profissionais. Visto que a formação musical
especializada ainda se orienta pela concepção de performance-desempenho8 e de
demonstração de desempenho técnico, vejo que o músico e educador musical deve estar
atento para seus modos de compreender a função da performance dentro da didática musical.
Mesmo não caminhando exatamente na mesma direção de Bittar (2012), França
aponta caminhos também mais significativos para a utilização da performance em sala de
aula:

As crianças devem ser encorajadas a cantar ou tocar a mais simples peça com
comprometimento e envolvimento, procurando um resultado criativo, expressivo e
estilisticamente consistente. Isso deve ser almejado por ser essa a única forma pela
qual a performance - em qualquer nível – pode-se tornar uma experiência
esteticamente significativa. (FRANÇA, 2002, p. 14).

Nesta perspectiva, busquei partir e chegar da e na performance, da prática musical.


Desta maneira, os alunos se apropriavam corporal e sonoramente da música, para depois
associarem a experiência performática com a notação musical. Isto se deu mais amplamente
nas atividades de Rodas de Dança e Manossolfa, nas quais o caráter perceptivo e o
envolvimento criativo para com as estruturas musicais eram explorados. Estas atividades não
visavam, portanto, o virtuosismo técnico, mas sim um envolvimento maior com os materiais
musicais, experimentando e descobrindo possibilidades de interpretação, de dinâmica, de
andamento, de sonoridade, construindo e desconstruindo as estruturas.

8
Curiosamente o próprio editor de texto utilizado para a escrita deste trabalho sugere a troca da palavra
performance pela a palavra desempenho.
30

1.3.1.4 (L) Literature Studies (estudos acadêmicos) na estruturação da Oficina

Entram nesta modalidade proposta por Swanwick (1979) os conhecimentos sobre


músicas e músicos: informações teóricas ou notacionais e a história da música.
Houve poucas aulas expositivas9, na medida em que, concordando com Koellreutter,
“não é preciso ensinar nada que o aluno possa resolver sozinho. É preciso aproveitar o tempo
para fazer música, improvisar, experimentar, discutir e debater” (BRITO, 2001, p. 32).
Fundamentando-me nas ideias de Koellreutter, escolhi aproveitar as aulas para fazer música
com os alunos e, a partir destes, fazer relações da prática com a teoria. Como já havia previsto
no Projeto, optei, portanto, em sugerir, indicar e, sempre que possível, disponibilizar material
teórico através de e-mails enviados semanalmente aos alunos. Estão registradas em quatro dos
planejamentos e protocolos as intenções e necessidades de envio de material, mas, os e-mails
eram enviados semanalmente e com maior frequência do que está registrado.
Semanalmente, indicava páginas de livros, materiais diversos e vídeos encontrados na
internet que aprofundavam os conteúdos abordados em cada atividade. Desta forma, esperou-
se certa autonomia dos alunos, uma postura ativa que fosse para uma investigação de interesse
particular de cada aluno.

1.3.1.5 (S) Skill Acquisition (aquisição de habilidades) na estruturação da Oficina

As habilidades eram aquelas necessárias à performance (Rodas de Dança e


Manossolfa), à escrita e leitura (Notação Musical e Composição). Lembrando que estes
aspectos faziam sentido na medida em que eram necessários para viabilizar as modalidades
centrais.

1.3.2 Equilíbrio entre as modalidades

Juntamente com a ideia de que as diferentes modalidades do fazer musical devem estar
integradas num contexto de educação musical, o modelo C(L)A(S)P prevê que as
modalidades principais (composição, apreciação e performance) estejam equilibradas entre si.
Analisando a quantidade de encontros em que cada atividade foi realizada, pode-se
observar um desequilíbrio: as atividades de Rodas de Dança e Manossolfa, essencialmente
performáticas, foram muito mais exploradas que as de Apreciação ou mesmo de
Composição.

9
Quando ocorriam, geralmente derivavam de alguma dúvida do grupo ou de relação possível das atividades
práticas com o conhecimento mais teórico.
31

Porém há que se observar que, como afirma França (2002, p. 18), dentro da concepção
do modelo C(L)A(S)P, “o equilíbrio deve ser qualitativo, e não, quantitativo”. Ou seja: não é
a quantidade de tempo que é utilizado que deve ser equivalente entre as modalidades, mas a
qualidade das mesmas é que deve ser respeitada. Sendo assim, uma atividade de apreciação de
alguns minutos, por exemplo, pode sugerir uma continuidade na performance que dure
algumas aulas. Desta forma, cabe observar que o modelo C(L)A(S)P não determina que as
diferentes modalidades estejam todas presentes numa mesma aula, mas que ao longo do curso
o aluno tenha tido contato com as diferentes formas de se fazer música10.
Para compreender melhor o princípio de equilíbrio, penso ser necessária a
compreensão do princípio de interação entre as modalidades.

1.3.3 Interação entre as modalidades

Na prática, as diversas formas de se fazer música não se encaixam sempre tão


perfeitamente numa das modalidades musicais propostas por Swanwick (1979), como que
divididas em gavetas num armário. É fácil perceber que, para se compor, é necessário, por
vezes, experimentar ideias e escutá-las. Da mesma forma, as atividades de performance, como
já mencionado, devem sempre ter uma dose de criação e para se fazer música em grupo é
imprescindível estar atento ao som do grupo. Se traçarmos uma linha histórica da didática
musical, percebemos ser recente a possibilidade de apreciação musical “sem performance”,
que se dará, então, através da reprodução de músicas por meios eletrônicos, mas, ainda assim,
quando nos referimos à atividade de escuta atenta, na qual se está disponível para ouvir, pode-
se dizer que há processos criativos e performáticos, e por isso também cognitivos. Na
verdade, a própria distinção entre compositor, intérprete e ouvinte fica descabida nas
inúmeras relações e interações que a sociedade contemporânea nos proporciona.

Em uma abordagem integrada e coerente da educação musical na qual as crianças


compõem, tocam e ouvem música, as fronteiras entre os processos musicais
desaparecem. Quando elas compõem, por exemplo, não há como deixarem de
aprender enquanto performers e ouvintes, tanto quanto como compositores. Isso é a
interdependência (MILLS, 1991, p. 88, apud FRANÇA, 2002, p.16).

Enxergo, deste modo, uma interação natural entre as modalidades. Porém o modelo
C(L)A(S)P prevê que as atividades interajam entre si, de forma a darem suporte umas às

10
A disposição gráfica da sigla “C(L)A(S)P” também não determina a ordem em que as modalidades devem ser
experimentadas.
32

outras, evitando que a aula ou mesmo o curso seja uma “colcha de retalhos”, um conjunto de
atividades isoladas que não se comunicam.

Embora a interação entre as modalidades seja observada naturalmente, os benefícios


desta são potencializados quando as atividades são cuidadosamente relacionadas nos
programas de educação musical. Em uma abordagem integrada, a música – enquanto
fenômeno e experiência - pode ser percebida em sua plenitude. (FRANÇA, 2002,
p.17).

Nos Planos de Aula e Protocolos pode-se observar uma atenção de minha parte para
com a interação entre as atividades: “Cheguei a pensar que a parte de apreciação ficou um
pouco desconectada, mas creio que não. Até porque a mesma música foi trabalhada em
seguida. São só formas diferentes de experiência com a música.” (MEURER, 2014, p. 17).
Isto se reflete num padrão observável nas atividades desenvolvidas que é o de abordar
um mesmo aspecto musical de diferentes formas. Isto se deu quando, por exemplo, propus
uma apreciação da música “Cravo e Canela” (MEURER, 2014, p. 30) sendo executada ao
vivo com uma métrica diferente do arranjo que os alunos cantavam no Coral UDESC, sendo o
primeiro organizado em compasso ternário e o segundo em compasso binário. Após a
apreciação, propus a atividade de Rodas de Dança de forma a explorar 3 opções de
organização/interpretação métrica (Apêndice D, Apêndice E e Apêndice F). E, no fim desta
atividade, pudemos relacioná-la com a escrita musical, indicando como ficariam distribuídas
as semínimas nos compassos de 2/4 e de 3/4. Deste modo, observei certa ampliação nas
possibilidades de compreensão e percepção permitindo uma proximidade com as diferentes
formas de aprender de cada aluno. Começar a atividade musical pela escuta ou pela
performance, enfim, pela vivência perceptiva da música e somente depois analisá-la e
intelectualizá-la através da escrita musical é um princípio de base da Rítmica Dalcroze, como
será melhor abordado mais adiante no terceiro capítulo deste trabalho.
As Rodas de Dança se relacionavam com as questões rítmicas de pulsação e
compasso. As práticas com a Manossolfa se relacionavam com as questões melódicas: alturas
e intervalos. Pude observar que as atividades da Manossolfa eram posteriormente
relacionadas com a notação musical, o que não ocorreu na mesma intensidade com as
atividades de Rodas de Dança. Tanto foi que percebi no fim do semestre que as questões da
notação rítmica estavam menos compreendidas.
Ora pelos conteúdos, ora pelo repertório, as atividades desenvolvidas durante o
semestre interagiam entre si. Além disso, o mesmo tipo de atividade era utilizado para
33

diferentes situações, músicas e conteúdos e, no meu entender, isso deu coesão e coerência à
proposta.
34

2 COMPREENDENDO KOELLREUTTER

Hans-Joachim Koellreutter nasceu na Alemanha em 1915, tendo se naturalizado


brasileiro posteriormente. De 1934 à 1936, Koellreutter realizou estudos de flauta,
composição e direção de coro na Staatliche Akademische Hochschule für Musik, em Berlim.
Nesta época, passou a ser conhecido e respeitado na Alemanha como flautista de concerto.
Koellreutter foi aluno, em cursos extracurriculares de direção de orquestra, do famoso
regente Hermann Scherchen11 em Neuchatel, Genebra e Budapeste. Scherchen foi um regente
de grande importância e seus maiores objetivos, segundo afirma Kater (2001, p. 47), eram “o
de trazer à tona a produção musical, sobretudo, de sua época e o de propagar a música de
maneira pedagógica”.
Em 1937, Koellreutter chegou ao Rio de Janeiro e radicou-se definitivamente no
Brasil. No ano seguinte, com o desejo de dar continuidade às iniciativas de Scherchen,
Koellreutter criou o grupo Música Viva, um movimento musical que se sustentou “num
conjunto convergente de atividades - cursos, palestras, concertos, recitais, audições
experimentais, edições (revista e partituras), programas de rádio etc.” (KATER In: BRITO,
2001, p. 14). Ainda neste ano, começou a ensinar música no Conservatório de Música do Rio
de Janeiro. Para além das aulas de flauta e matérias teóricas no conservatório, a partir de
1939, Koellreutter começou a dar aulas particulares de forma intensa.

Este é um ano [1939] já de grande dinâmica de atividades para Koellreutter e a


Música Viva. Ao lado das atividades e apresentações do movimento, ele realiza
sistematicamente uma série de audições musicais com artistas convidados, com
obras de seus próprios alunos, bem como profere uma série de 10 conferências e
ministra cursos públicos e particulares em sua própria residência. (KATER, 2001, p.
180).

Em 1940, compôs sua primeira peça atonal-dodecafônica, Invenção, e no ano seguinte,


Música 1941, utilizando esta mesma técnica de composição. De 1940 a 1946, deu aulas para
Cláudio Santoro, Mozart Camargo Guarnieri, César Guerra Peixe, Edino Krieger e Eunice
Katunda.
Por volta de 1944, segundo Kater (2001, p. 185) começou uma sistematização dos
“Cursos Independentes de Composição Musical”, em São Paulo e no Rio de Janeiro, sendo
esta uma forma de atuação pedagógica autônoma que Koellreutter passou a desenvolver de
forma regular e intensa deste então.

11
“[...] além de regente consagrado, Scherchen foi um pensador, teórico, pedagogo, conferencista, escritor,
editor e um pioneiro da rádio.” (KATER, 2001, p. 45).
35

De acordo com Kater (2001), entre os anos de 1965 e 1969, Koellreutter viajou para a
Índia, onde fundou e dirigiu a Delhi School of Music, de Nova Delhi, estudou canto
(performance vocal), com Pandit Vineay Chandra, fundou a Orquestra de Cordas de Nova
Delhi (1966), além de ter se apresentado como solista (flauta), regido duas orquestras e
composto duas peças: Sunyata, para flauta, orquestra de câmara e fita magnética, e Advaita,
para sitar e tabla, com acompanhamento de orquestra de câmara.
Depois de ter morado também no Japão, no ano de 1975, Koellreutter retornou ao
Brasil, dando continuidade a suas aulas particulares de Composição, Harmonia, Estética e
Pedagogia Musical.

Observo que, nas falas e nos depoimentos de Koellreutter, são comuns as frases de
efeito com sentido amplo e que levam a pensar: “‘Ideias são mais fortes que preconceitos’,
‘Somos os primitivos de uma nova era’, ‘Os artistas-criadores são os arquitetos do espírito
humano', ‘Arte musical é o reflexo do essencial na realidade’” (KOELLREUTTER apud
BRITO, 2001, p. 14), “A música é, em primeiro lugar, uma contribuição para o alargamento
da consciência e para a modificação do homem e da sociedade” (KOELLREUTTER, 1997, p.
72 apud BRITO, 2001, p. 26), “É preciso aprender a apreender do aluno o que ensinar”
(KOELLREUTTER apud BRITO, 2001, p. 31).
Carlos Kater comenta, na apresentação do livro Koellreutter educador (BRITO, 2001,
p. 14) que tais expressões são “florescência de princípios” que norteiam o trabalho de
Koellreutter e que “se tornaram marcantes na postura e na direção profissional, senão mesmo
de vida, de várias gerações”. Desta forma, Koellreutter é reconhecido como “o grande mestre
de muitas gerações de músicos brasileiros”. (BRITO, 2001, p. 19).
Neste capítulo busco compreender e refletir sobre o pensamento de Koellreutter,
sobretudo, a partir de três posicionamentos que considero estruturantes: 1) O posicionamento
crítico e o questionamento constantes; 2) Aquilo que considera ser a “função” da educação
musical; 3) Sua postura: “É preciso aprender a apreender do aluno o que ensinar”12 (BRITO,
2001, p. 31).

2.1 “POR QUÊ?”

“Não acreditem em nada do que dizem os


livros. Não acreditem em nada do que dizem
seus professores. Não acreditem em nada do
12
Esta é uma postura que deriva do posicionamento reativo de Koellreutter ao “método”, que será melhor
apresentado a refletido no quarto capítulo deste trabalho.
36

que vocês veem ou mesmo pensam, e também


não acreditem em nada do que eu digo.
Perguntem sempre por que a tudo e a todos.
Tenham uma placa com um ‘Por quê?’ bem
grande escrito, em cima da cama, para
lembrarem-se de perguntar ‘por que’ logo ao
acordar.” (KOELLREUTTER apud BRITO
2001, p. 32).

O aspecto do pensamento de Koellreutter com o qual mais me identifico é a sua


posição em promover o questionamento constante, incentivando, desse modo, que exploremos
o porquê das coisas. Não seria o princípio da desconfiança, mas sim o da inquietação e da
reflexão.
Num certo sentido, vejo ser este o motor do desejo humano de explorar, de descobrir
novas possibilidades de verdade sobre si mesmo, sobre os outros e sobre o mundo.
Koellreutter se refere a este seu posicionamento questionador, banhado de “por quês”, como
“a um só tempo, ‘alfa e ômega, princípio e fim da ciência e da arte” (BRITO, 2001, p. 32).
Na perspectiva de um posicionamento crítico vertical, passamos a questionar não só o
que nos é exterior, mas nossas próprias ações, desde as mais corriqueiras, cotidianas e muitas
vezes automatizadas, até mesmo as razões primeiras que nos movem.
Neste sentido, como professor em formação, por vezes me fiz a seguinte pergunta:
“Por que ensinar música?”. E a resposta mais rápida e natural era: “Porque eu gosto.”
Entretanto esta resposta, para mim, não se justificava por si mesma. Deste modo, seguia com
meus questionamentos: “Por que eu gosto de ensinar música?”. Uma resposta possível:
“Porque me faz bem”. Mas, “Por que me faz bem?”, e assim por diante. Mais que mera
divagação circular, esta estratégia busca entender com maior clareza as razões pelas quais
caminhamos em determinadas direções. Mais que isso: o porquê do porquê, o questionamento
sobre o próprio pensamento, pode nos levar a por em xeque as razões pelas quais
fundamentamos toda nossa vida. E sempre há uma resposta. Quero dizer, sempre há uma
motivação e uma razão.
É comum ouvirmos que o fazer musical se justifica nele mesmo, que “é importante
porque é importante”, “porque as pessoas dão valor a isso”, “porque gostam”. No meu
entender, essa abordagem não se sustenta, não vai a fundo a respeito das razões que justificam
a existência da música ou da educação musical. A primeira impressão é que partimos de
alguns pressupostos, daquilo que, supostamente, todo mundo já sabe, mas, efetivamente,
discute-se pouco sobre a causa fundamental da existência e da necessidade de se promover a
educação musical ou mesmo a música em si.
37

Considero o questionamento constante uma estratégia necessária aos futuros


educadores musicais, não somente para que tenhamos respostas, posicionamentos, discursos
convincentes frente à defesa da educação musical, mas para que busquemos entender com
maior seriedade onde queremos chegar com ela.
Apesar de orientar seus alunos a não acreditarem nem mesmo nele próprio,
Koellreutter expõe seu pensamento a respeito destas questões primeiras da educação musical,
e é sobre este pensamento que apresento algumas considerações a seguir, em especial sobre a
educação musical funcional, sobre a contribuição da música para o alargamento da
consciência e para a modificação do homem na sociedade.

2.2 A “FUNÇÃO” DA EDUCAÇÃO MUSICAL A PARTIR DE KOELLREUTTER

Em consonância com a busca dos “porquês”, Koellreutter defende que a educação


musical tem uma função, ou funções, na sociedade e nas pessoas, tratando-se, portanto, do
que chama de uma educação musical funcional. Neste sentido, entendo que, quando
Koellreutter pergunta “por quê?”, podemos construir uma equivalência questionando “qual o
objetivo?” ou “qual a função?” de ensinar música.
No Projeto, inicio a Fundamentação Teórica afirmando que a oficina está identificada
conceitualmente com alguns direcionamentos apontados por Koellreutter, quando também
faço referência ao seguinte posicionamento do autor: “A música é, em primeiro lugar, uma
contribuição para o alargamento da consciência e para a modificação do homem e da
sociedade”. (KOELLREUTTER, 1997, p. 72 apud. BRITO, 2001, p. 26, grifo meu).
Vejo que Koellreutter posiciona-se sempre seriamente e de maneira vertical indo em
direção às raízes do agir e do pensar humanos, um verdadeiro “radical”. Buscando sempre as
razões primeiras, Koellreutter aponta para o homem, afirmando: “O humano, meus amigos,
como objetivo da educação musical” (KOELLREUTTER, 1998, p. 45 apud. BRITO, 2001, p.
42, grifo meu).
No meu entender, estas duas frases representam um dos núcleos do pensamento do
músico e educador Koellreutter, uma vez que dizem respeito àquilo que considera ser a
função, o objetivo primeiro e fundamento da música e da educação musical: o ser humano.
Para compreender melhor o pensamento de Koellreutter, senti a necessidade de
aprofundar-me sobre o significado das expressões “alargamento da consciência” e
“modificação do homem e da sociedade”, como indicativo de uma “formação integral”
proposta por Koellreutter (BRITO, 2001, 19-20). Assim, nas seções seguintes, exponho
38

algumas reflexões sobre os termos utilizados por Koellreutter que apontam, em meu entender,
em direção à “formação integral”.

2.2.1 Koellreutter: o “humano” e a “formação integral”

Atualmente no Brasil podemos encontrar referências a este conceito de educação


musical que objetive a formação integral do ser humano. No livro Projeto Música na Escola,
na Roda de Conversa 3 que tratará a educação musical no século XX e os chamados métodos
tradicionais, o professor Sérgio Figueiredo afirma que:

[...] nos dias de hoje, o grande desafio da educação continua sendo atingir o ser
humano. Como a gente melhora o ser humano? O que temos de fazer da escola para
que o ser humano seja melhor e viva com plenitude? Essa é uma questão
absolutamente atual neste momento da educação brasileira. (FIGUEIREDO, 2012,
p. 90).

Porém, percebo que há pouco aprofundamento quanto à formação humana do futuro


professor de música e músico. Como afirma Figueiredo (2012, p. 93), “talvez este seja um dos
grandes dilemas dos cursos de formação de professor em todas as áreas. É preciso coordenar a
formação técnica da área em que o profissional vai atuar e, ao mesmo tempo, conectar essa
questão com uma maior, a formação humana”.
Conforme pude observar, no livro “Música na educação infantil: propostas para a
formação integral da criança” (2003) de Teca Alencar de Brito e no artigo “O que podemos
esperar da educação musical em projetos de ação social” (2004) de Carlos Kater13 a expressão
“formação integral” é associada ao desenvolvimento de aspectos humanos tais como a
autodisciplina, o autoconhecimento, a tolerância, a capacidade de compartilhar, de se
relacionar com o mundo etc. Segundo Brito (2001), dentro do pensamento de Koellreutter,
uma educação musical para a formação integral do ser humano seria:

Aquele tipo de educação musical não orientando para a profissionalização de


musicistas, mas aceitando a educação musical como meio que tem a função de
desenvolver a personalidade do jovem como um todo; de despertar e desenvolver
faculdades indispensáveis ao profissional de qualquer área de atividade, como, por
exemplo, as faculdades de percepção, as faculdades de comunicação, as faculdades
de concentração (autodisciplina), de trabalho em equipe, ou seja, a subordinação dos
interesses pessoais aos do grupo, as faculdades de discernimento, análise e síntese,
desembaraço e autoconfiança, a redução do medo e da inibição causados por
preconceitos, o desenvolvimento de criatividade, do senso crítico, do senso de
responsabilidade, da sensibilidade de valores qualitativos e da memória,
principalmente, o desenvolvimento do processo de conscientização do todo, base
essencial do raciocínio e da reflexão. As nossas escolas oferecem aos seus alunos

13
Vale considerar que ambos os autores, Teca Alencar de Brito e Carlos Kater, foram alunos de Koellreutter.
39

também cursos de esporte e futebol, sem pretenderem preparar ou formar esportistas


ou jogadores de futebol profissionais. (BRITO, 2001, p. 41).

Através dos escritos de seus alunos e do próprio Koellreutter, entendo que em seu
pensamento o conceito de “formação integral” está diretamente ligado à ideia de
“alargamento da consciência”. Cabe comentar aqui que Koellreutter é fruto de uma época,
como todos o somos, e que determinados conceitos implícitos em seu discurso são reflexos de
uma mentalidade, de um discurso existente no mundo entre e pós-guerra. Dentre o grande
número de pensadores, psicólogos e pedagogos contemporâneos de Koellreutter que
trabalharam questões como “formação integral do ser humano” e “alargamento da
consciência” podemos citar brevemente: Carl Gustav Jung, Mme. Blavatsky, Rudolf Steiner,
Krishnamurti. A busca pelo “humano” na educação musical teve diferentes caminhos
apontados por muitos músicos que viveram entre o final do séc. XIX até meados do séc. XX e
mesmo aqueles que ainda viveram os primeiros anos do séc. XXI, como os compositores,
intérpretes e pensadores: Emile Jaques-Dalcroze (1862-1950), Carl Orff (1895-1892), Zoltán
Kodály (1882-1967), Béla Bartók (1882-1945), Paul Hindemith (1895-1963) – de quem
Koellreutter foi aluno em um curso de extensão.

2.2.2 Reflexões sobre “alargamento da consciência”

A expressão “alargamento da consciência” tem grande importância dentro do


pensamento de Koellreutter. Entretanto, quando investigamos o termo consciência, podemos
observar que não há consenso a respeito do significado desta palavra polêmica: há uma
multiplicidade de usos do termo presente nos âmbitos da filosofia, da psicologia, da medicina,
bem como no uso popular. Para evitar que haja um entendimento qualquer, possivelmente
vago e superficial do assunto, considero importante ampliar um pouco mais o entendimento
das diversas utilizações do termo “consciência”, para tentar uma maior proximidade junto à
“consciência” à qual se refere Koellreutter.
O Dicionário de Filosofia (ABBAGNANO, 2000, p. 185) apresenta basicamente duas
definições distintas para o termo, e que se diferenciam pelas suas traduções equivalentes em
inglês: awareness e consciousness. Segundo o dicionário, a palavra awareness significa:

[...] a possibilidade de dar atenção aos próprios modos de ser e às próprias ações,
bem como de exprimi-los com a linguagem.
[...] significado comum, de estar ciente dos próprios estados, percepções, ideias,
sentimentos, volições, etc., quando se diz que um homem “está consciente” ou “tem
consciência”, se não está dormindo, desmaiado, nem afastado, por outros
acontecimentos, da atenção a seus modos de ser e a suas ações. (ABBAGNANO,
2000, p. 185, grifo meu).
40

Desse modo entendo que para o autor Nicola Abbagnano (2000, p. 185), a palavra
awareness se refere ao uso comum do termo “consciência”, significando a possibilidade de
exprimir com a linguagem os “próprios modos de ser e às próprias ações”, sendo que esta
possibilidade é o próprio estado de vigília de quando se está acordado, diferenciando-se de
quando se está “inconsciente”.
Aproximando-me do termo consciência, em arte, encontro em manifestações e
conceitos tecidos a partir do “teatro pós-dramático”, em especial nos escritos do diretor e
encenador Jerzy Grotowski do teatro de vanguarda polonês. Grotowski apresentará
considerações diferentes quanto à aplicação do termo consciência, enquanto awareness:
“Awareness quer dizer a consciência que não é ligada à linguagem (à máquina de pensar),
mas à Presença”. (GROTOWSKI, 2001, p. 235 apud. BITTAR, 2012, p. 182).
Seguindo na mesma direção da performance em arte, a educadora corporal Neide
Neves, em seu livro “Klauss Vianna – Estudos para uma dramaturgia corporal” (2008, p. 38-
39) compreende awareness como estado de alerta “do corpo e de seus movimentos”,
considerando assim, a “[...] percepção, a prontidão ou a consciência [...] como condição
fundamental para a expressão. [...] Expressão de cada corpo num determinado momento; dos
recursos e da história deste corpo e não a repetição ou execução desatenta, que ele [Klauss
Vianna] identifica como forma desprovida de verdade e vida”. Segundo a autora, awareness,
“diferentemente de consciousness, é a experiência física, que lida com conteúdos diretamente
acessíveis; um estágio indispensável ao corpo para lidar com a informação. A consciousness é
o saber da awareness. [...]” (NEVES, 2008, p. 38-39).
Tanto para Grotowski (2001) quanto para Neves (2008) o termo awareness se refere à
“consciência” como estado perceptivo de “prontidão” ou de “presença” do corpo, justamente
porque compreendem que awareness dá início na percepção e que percepção é um processo
que se dá no corpo. Um corpo automatizado (adestrado) é um corpo inconsciente e, por sua
vez, a sua desautomatização, saindo do gesto cotidiano e do movimento técnico adestrado, é
que torna possível the awareness (BITTAR, 2012). Dessa maneira, entendo que awareness
diferencia-se claramente da visão de consciência como um processo da linguagem, da
“máquina de pensar”.
Mais que um conceito, este é um posicionamento filosófico que parte das experiências
dos autores nos campos do teatro e da dança de vanguarda, nos quais, a partir do século XIX,
as práticas corporais e o corpo ganham foco e novos sentidos. Não se trata do “uso comum”
do termo, mas uma concepção específica e conceitual, na qual o núcleo da formação do
41

performador que o direciona para uma formação integral e amplia a sua consciência, está no
corpo do performador.
Prosseguindo então com o significado do termo consciousness, conforme consta no
mesmo Dicionário de Filosofia (ABBAGNANO, 2000, p. 185), entendo que este se refere ao
uso do termo “consciência” na filosofia que “tem pouco ou nada a ver com o significado
comum [awareness]”. O significado de consciousness:

é o de uma relação da alma consigo mesma, de uma relação intrínseca ao homem,


“interior” ou “espiritual”, pela qual ele pode conhecer-se de modo imediato e
privilegiado e por isso julgar-se de forma segura e infalível. Trata-se, portanto, de
uma noção em que o aspecto moral – a possibilidade de autojulgar-se – tem
conexões estreitas com o aspecto teórico, a possibilidade de conhecer-se de modo
direto. (ABBAGNANO, 2000, p. 185, grifos meus).

Há ainda a utilização mais recente do termo consciousness pela Conscienciologia.


Segundo o site14 do Centro de Altos Estudos da Conscienciologia (CEAEC),
Conscienciologia “é o termo que foi proposto publicamente em 1981 pelo médico e
pesquisador brasileiro Waldo Vieira para definir a nova ciência dedicada ao estudo da
consciência”. O termo consciência, neste caso, se refere àquilo “que se denomina por ego,
alma, espírito, essência, eu, individualidade, personalidade, pessoa, self, ser ou sujeito”.
Diferencia-se, portanto, da relação do ser consigo mesmo, para se referir ao próprio ser.
Pode-se observar que, mesmo dividindo em dois conceitos (awareness e
consciousness), não há consenso sobre ambos. No entanto, percebo que os dois termos se
referem a processos distintos e que, mesmo sem qualquer consenso, podem ser sintetizados da
seguinte forma que eu os entendo neste trabalho:
Awareness se refere à presença e à prontidão como um “estado de consciência” de
caráter perceptivo. Entende-se as operações perceptivas como processos que se dão no corpo.
Consciousness é entendido como uma relação do homem para com seu eu que se dá na
mente.
Segundo Teca Alencar de Brito,

Koellreutter define consciência como a capacidade do homem de aprender os


sistemas de relações que o determinam: as relações de um dado objeto ou processo a
ser conscientizado com o meio ambiente e o eu que o aprende; não se refere à
consciência como conhecimento formal, nem como mero conhecimento ou qualquer
processo de pensamento, mas, sim, como uma forma de inter-relacionamento
constante, como um ato criativo de integração. (BRITO, 2001, p. 47, grifo meu).

14
Disponível em: < http://www.ceaec.org/index.php?option=com_content&view=article&id=42&Itemid=20>.
Acesso em: 20 set. 2014.
42

Em meu entender, Koellreutter, ao se referir ao “alargamento da consciência”, utiliza o


termo consciência como capacidade humana de se relacionar e conhecer o mundo, bem como
a si próprio. Vejo esta abordagem como repercussão do tempo que viveu na Índia e no Japão,
no qual pôde travar contato com filosofias orientais. Para Saloméa Gandelman (In:
KOELLREUTTER, 1983, p. 7), “o encontro do misticismo oriental com o pensamento
científico do ocidente e suas naturais implicações nos campo social, filosófico, artístico e
científico constituem-se, provavelmente, no acontecimento mais notável de nosso século”.
Desta forma, compreendo Koellreutter como pertencente a uma geração que viveu e
fortaleceu o fenômeno da influência do pensamento oriental15 nas culturas ocidentais. Cabe
ser ressaltado que Jerzy Grotowski (1933-1999) viajou diversas vezes para a Índia e aplicou,
como encenador e pedagogo do “Teatro Laboratório”, técnicas para a “ampliação da
consciência”, através do corpo em busca de um “teatro pobre” e de um teatro que se
aproximasse do ritual.
A expansão da consciência, tanto awareness quanto consciousness, é objetivo comum
em muitas tradições orientais, sendo que, em muitas, pode-se pensar numa meta a ser
alcançada, por exemplo: samádhi (meta do Yôga) e nirvana (meta do budismo). Estes nomes,
principalmente quando chegam ao Ocidente, por vezes, são confundidos, trocados entre si
como que se tratassem ambos da mesma coisa: a iluminação.
Das tradições orientais, a que tive algum contato teórico e prático é a do Yôga, e por
isso me atenho a refletir brevemente sobre a concepção de consciência presente nesta filosofia
“prática”, como a maior parte das filosofias orientais. Existem inúmeras escolas e tipos de
Yôga, com algumas semelhanças e muitas divergências entre si, conforme afirma o Mestre de
Yôga DeRose16:

No Yôga, temos quatro grandes linhagens que são: Tantra-Sámkhya (Yôga Pré-
Clássico – mais de 5.000 anos), Brahmácharya-Sámkhya (Yôga Clássico – século III
a.C.), Brahmácharya-Vêdánta (Yôga Medieval – século VIII d.C.), e Tantra-Vêdánta
(Yôga Contemporâneo – séculos XIX e XX). Cada linhagem possui uma
fundamentação filosófica (Sámkhya ou Vêdánta) e uma fundamentação
comportamental (Tantra ou Brahmácharya). [...] Já os ramos, em número

15
Refiro-me às diversas expressões religiosas e filosóficas orientais que têm entre si alguma semelhança, mas
que, ao longo de mais de 5 mil anos, cada uma foi desenvolvendo suas especificidades e não devem ser
entendidas como sendo uma única expressão religiosa e/ou filosófica. Faço aqui uma referência generalizada não
para colocar todas num único rótulo, mas simplesmente reconhecendo certa unidade no que diz respeito ao
discurso, à crença e a prática sobre a “expansão da consciência”, às práticas meditativas, ao controle da
bioenergia (como por exemplo: hinduísmo, zenbudismo, taoismo), que contrastam com a maioria das práticas
religiosas ocidentais.
16
DeRose é brasileiro e nasceu em 1944. Começou a lecionar no ano de 1960, aos 16 anos de idade, e inaugurou
sua primeira escola em 1964, tendo formado desde então mais de 5.000 instrutores no Brasil, Américas e Europa.
Com 25 anos de viagens à Índia e mais de 20 livros publicados, é o sistematizador do SwáSthya Yôga.
43

homologado de 108, são como fórmulas ou receitas, que determinam quais as


técnicas empregadas por cada modalidade, e em que proporção. (DEROSE, 2008, p.
129).

O Yôga com o qual tive certa aproximação é o SwáSthya Yôga que, segundo o Mestre
de Yôga Sérgio Santos (2003, p. 15), é uma sistematização do Yôga Pré-Clássico feita pelo
Mestre DeRose, sendo este um Yôga de linhagem Tantra-Sámkhya (matriarcal, sensorial,
desrepressor e naturalista). Nada garante a ancestralidade desta tradição, mas o que pode ser
percebido é um esforço em se remontar os primórdios do Yôga.
Estando dentro desta tradição, o Mestre de Yôga Sérgio Santos (2003, p. 18, p. 111 e
p. 115) conceitua o samádhi como um estado expandido de consciência (hiperconsciência ou
megalucidez) e de autoconhecimento, sendo uma meta específica que só pode ser alcançada
pelo ser humano através do Yôga. Segundo o mesmo autor (2008, p. 15), o Yôga, por sua vez,
“é qualquer metodologia estritamente prática que conduza ao samádhi”.
O “Yôga Sútra” é o texto básico do Yôga Clássico e é tido como um dos textos mais
importantes sobre Yôga. É um texto escrito em aforismos (sútras) no idioma sânscrito pelo
sábio Pátañjali, e, conforme DeRose (2006, p. 26), “sua importância foi muito grande, pois
graças a Pátañjali o Yôga passou a ser reconhecido pelos indianos de então como um
darshana, um dos seis pontos de vista da filosofia hindu”. Utilizo aqui o “Yôga Sútra de
Pátañjali”, uma tradução de DeRose (2006), na qual os sútras são apresentados de três
maneiras distintas: em sânscrito (originalmente em caracteres devanágari), a sua transliteração
para o alfabeto latino e, por último, a sua tradução/interpretação para o português.
Faço referência à definição de Yôga presente no segundo sútra do capítulo I deste
texto:
Ilustração 1 - O que é Yôga

Fonte: DeRose (2008, p. 50).

Tratando-se de aforismos, os sútras podem receber interpretações e traduções diversas.


O mesmo autor, em seu livro “Meditação e Autoconhecimento” (2004), concebe as seguintes
interpretações:
44

Chitta, habitualmente traduzido como mente, significa mais apropriadamente


consciência. Vritti, pode ser traduzido como onda, vibração, modificação,
instabilidade. Nirôdhah significa cessação, supressão, eliminação. Assim sendo,
podemos traduzir a célebre definição do Yôga Sútra “Yôga chitta vritti nirôdhah”
como “o Yôga é a parada das ondas mentais” ou, numa tradução melhor, “o Yôga é
a supressão da instabilidade da consciência.” (DEROSE, 2004, p. 27-28).

Apesar de comumente o termo chitta ser traduzido como “mente”, DeRose (2008)
afirma que se trata de algo além da mente:

[...] chitta designa todo um psiquismo, todo um complexo mente-personalidade, que


se constitui veículo da consciência e pode ser entendido como o próprio princípio
consciente (no nível da personalidade, não no da individualidade): mente, ademais, é
a tradução de um outro termo sânscrito (manas). (DEROSE, 2008, p. 36).

É difícil identificar com clareza a qual “consciência” (awareness ou consciousness)


esta tradição do Yôga se refere. Isto se dá possivelmente pelos caminhos distintos que
traçaram a filosofia oriental e a ocidental. É possível identificar no seguinte sútra, o de
número 17, presente no capítulo I do já mencionado “Yôga Sutra de Pátañjali” (DEROSE,
2008), uma aproximação do conceito de samádhi, em seu primeiro estágio, com o de
expansão da consciência, entendida como consciousness:

Ilustração 2 - Samprajñáta samádhi - expansão da consciência

Fonte: DeRose (2008, p. 54).

De qualquer maneira, DeRose (2008, p. 37) admite que se o praticante “parar as ondas
mentais”, ele controla o pensamento, e consequentemente, estabiliza a consciência. Estas
considerações teóricas de Yôga fazem referência a práticas de concentração mental, presentes
em técnicas e práticas corpóreas17 visando à meditação e, em estados mais avançados, ao

17
Tais práticas contemplam exercícios gestuais, exercícios de identificação e sintonização com arquétipos,
vocalização de mantras, exercícios respiratórios, purificação das mucosas, posições técnicas corporais
específicas, descontração e concentração.
45

samádhi18, entendido como “estado de hiperconsciência” (SANTOS, 2003, p. 18). Considero


interessante perceber, a partir desta breve exposição desta tradição específica, a importância
que o termo “consciência” tem em diversas tradições orientais, às quais Koellreutter teve
acesso em suas viagens à Índia e ao Japão.
Como já mencionado, consciência (consciousness) pode se referir à faculdade de
conhecer-se e de autojulgar-se, considerando esta uma relação “da alma consigo mesma”, se
considerarmos a possibilidade de uma alma em cada um de nós (ABBAGNANO, 2000, p.
185). Trata-se de uma capacidade de atividade mental, intelectual (conhecer e julgar), de
“uma relação intrínseca ao homem, ‘interior’ ou ‘espiritual’” (ABBAGNANO, 2000, p. 185),
podendo construir assim um conhecimento19 de si mesmo, num âmbito de responsabilidade de
si para consigo e para com o mundo. Esta é a minha maneira de entender aquilo que
Koellreutter chama de “consciência”. Inclusive, esta relação com intelecto (“máquina de
pensar”) se dá no próprio termo utilizado, uma vez que, segundo o Dicionário Houaiss da
Língua Portuguesa (2009, p. 526), num âmbito mais informal, “alargar a consciência” seria o
mesmo que “abrir a cabeça”.
Quando se parte da expansão da consciência como objetivo, cada um dos conceitos de
consciência terá uma repercussão diferente na própria prática pedagógica.
Se entendermos “consciência” como awareness, nosso foco operará prioritariamente
numa ordem prático-perceptiva, dando início ao “acordar” da mente a partir do despertar
corpóreo. Esta ação de disponibilidade do corpo poderá gerar prontidão, atenção, presença
físico-mental, processo de constante diálogo entre corpo e mente. Tal diálogo, em si, gera
movimento corpóreo e movimento mental – no sentido de transformação mental.
Já, se entendermos “consciência” como consciousness, estaremos nos referindo a
operações de ordem puramente mental, uma compreensão mental de processos e percepções,
onde operações analíticas e de avaliação entrariam em jogo, de maneira exclusivamente
abstrata, desacompanhadas da percepção e da sensibilização corpóreas.
No meu entender, tanto awareness quanto consciousness são processos que a educação
musical deve ampliar no ser humano. Percebo que na minha prática docente no estágio, ao
optar por, primeiramente, vivenciar e experienciar aspectos musicais cantando e em
movimentação corporal, para somente depois relacionar esta experiência com a escrita

18
Para os dois mestres de Yôga aqui mencionados, atingir o samádhi implica em muitos outros esforços noutras
práticas e isto está melhor descrito em seus livros, citando aqui o “Tratado de Yôga” de autoria de DeRose, o
mais completo.
19
“ETIM lat. conscientia,ae ‘conhecimento, consciência, senso íntimo’” (HOUAISS, 2009, p. 526).
46

musical, eu buscava desenvolver nos alunos estes dois âmbitos, a awareness e a


consciousness, como caminho base para o “aprender” e o “criar” musicais.
Considero esta uma direção “natural” e orgânica do aprendizado, uma vez que, o
primeiro contato que temos conosco e com o mundo é de ordem físico-perceptiva, é sensorial,
para mais adiante, em diálogo com a percepção e com a sensibilização, criarmos uma
complexa trama a qual denominamos compreensão, entendimento, racionalização.

2.3 “É PRECISO APRENDER A APREENDER DO ALUNO O QUE ENSINAR”20.

Se, por um lado, na prática docente em meu estágio, para mim estava clara a ideia de
que não seria uma aula de Teoria da Música e nem de Percepção Musical, em suas formas
mais convencionais, nas quais o conteúdo estaria já pré-estabelecido, com metas e resultados
a serem atingidos, tinha também clareza de que pretendia partir sempre das experiências, das
vivências musicais dos coralistas/alunos com o repertório musical vivenciado no Coral
UDESC, como também das vivências musicais próprias de cada aluno. Por outro lado, não
sabia, de fato, quais atividades eu desenvolveria com os participantes da Oficina e, ao mesmo
tempo, não fazia sentido estabelecer um programa, sem ao menos conhecer os alunos.
Deste modo, posso afirmar que, no processo de educação musical, podemos partir de
ações musicais originadas em propostas trazidas pelo professor, como também por propostas
de experiências musicais trazidas pelos alunos, não se fazendo necessária uma imposição, a
priori, fechada em objetivos e metas de ordem estritamente teórico-abstratas, como esclarece
Brito, sobre o posicionamento de Hans-Joachim Koellreutter dirigido à didática da música:

Koellreutter sempre propôs a superação do currículo fechado, que determina


previamente os conteúdos a serem transmitidos, sem averiguar e avaliar
criteriosamente o que realmente é importante ensinar a cada aluno, grupo, em cada
contexto ou momento. [...] Desse modo, cabe ao educador facilitar situações para
uma aprendizagem autodirigida, com ênfase na criatividade, em lugar da
padronização, da planificação e dos currículos rígidos presentes na educação
tradicional. Mais do que programas que visam a resultados precisos e imediatos, é
preciso contar com princípios metodológicos que favoreçam o relacionamento entre
o conhecimento (em suas diversas áreas), a sociedade, o indivíduo, estimulando, e
não tolhendo, o ser criativo que habita em cada um de nós. (BRITO, 2001, p. 31).

Referindo-se ao livro Método de Edgar Morin (1999, p. 21), Brito (2001, p. 30) faz
uma relação com as considerações e propostas em educação musical de seu professor,
Koellreutter, que partem da experiência / pesquisa como fontes de toda a educação:

20
(BRITO, 2001, p. 31).
47

Edgar Morin [...] defende que o “método só pode ser formado durante a pesquisa”,
recorrendo, para salientar essa ideia, aos versos de Antonio Machado: “Caminante,
no hay camino, se hace el camino al andar”. [...] O mesmo conceito pode aplicar-se
à concepção de método pedagógico para Koellreutter (BRITO, 2001, p. 30).

Na didática da música, Koellreutter toma partido de que, antes de um método e um


modelo a ser seguido pelo professor e pelo aluno, existe uma técnica que deve, por princípio,
acolher ambas as experiências, professor-aluno, para, a partir daí, construir-se um processo de
aprendizado das duas partes: é preciso ensinar “aquilo que o aluno quer saber” (BRITO, 2001,
p. 31). Entretanto, essa declaração de Koellreutter pode dar a entender que se trata, então, de
ensinar aquilo que está no âmbito de conforto do aluno, e que pode estar relacionado ao
condicionamento cultural ditado pelas diversas instâncias da sociedade: família, religião,
escola, redes midiáticas. Porém, não penso ser esta a intenção de Koellreutter, mesmo porque
esta seria uma atitude didática contrária à educação musical integral, ou à educação musical
“como expansão da consciência” e de “transformação do homem e da sociedade”, conforme o
próprio Koellreutter ansiava. No prefácio do livro Estética (KOELLREUTTER, 1983, p. 9),
Saloméa Gandelman afirma que “ir ao encontro daquilo que os alunos buscam, conscientizá-
los a respeito do que estão fazendo, estimular e desenvolver o que apresentam de mais pessoal
[...] foram sempre os princípios que nortearam sua atividade [de Koellreutter] de professor.”
Não se trata de desmerecer ou desconsiderar a importância do conhecimento e do
aprendizado da notação musical, por exemplo. Entendo que o que Koellreutter questiona é a
maneira extremamente abstrata do ensino musical, que parte, a todo momento, de um modelo
de ordem teórica de decodificação do símbolo visual do fenômeno sonoro, sem relacionar este
processo à experiência, à experimentação com o fenômeno sonoro em sua ampla constituição,
ou seja, desde a percepção física, corpórea do som, até a percepção de sua forma sonora
cultural. Buscando referências para o exposto acima, lanço mão das considerações postas por
Brito (2001) sobre os cursos de formação de professores de música, vivenciados por ela,
enquanto discípula de Koellreutter:

Os cursos de formação de professores ministrados por Koellreutter destacam-se


substancialmente dos cursos de formação ou especialização nos métodos de
educação musical; estes se caracterizam, muitas vezes, pelo enfoque exclusivo de
questões especificamente musicais e – unicamente – da música tradicional do
Ocidente: como ensinar a ler e escrever as notas (limitando-se ao pentagrama); como
desenvolver o senso rítmico (nunca deixando de lado o metro, o compasso); como
trabalhar com a escuta (de obras tonais, quase exclusivamente), com a técnica vocal
ou instrumental etc. Evidentemente, se tais questões não podem ser desconsideradas,
não deveriam, de maneira alguma, ser entendidas como fins em si mesmas. [...]
Notadamente, convém reforçar que sua maior preocupação reside na formação
integral do ser humano e para tanto procurou promover situações de comunicação e
48

relacionamento, de debate, estímulo ao pensar e à conscientização, integrando


vivências musicais e humanas. (BRITO, 2001, p. 44).

Em minha atuação docente no estágio, através dos Registros elaborados pelos alunos
coralistas, pude identificar quais os entendimentos a respeito da notação musical dos mesmos,
tanto no início do semestre, quanto no meio, buscando assim partir das necessidades dos
alunos.
Nas vezes em que trabalhamos questões específicas de notação musical, procurava não
fornecer logo no início as respostas já prontas, explicadas, tabeladas. Sempre que possível,
incentivei os alunos a grafarem e a escreverem no quadro, para todos da classe, a maneira pela
qual percebiam determinados trechos das músicas que estávamos cantando no Coral e qual
seria a maneira mais apropriada para a escrita deste ou daquele trecho. Após a proposta de
escrita ser realizada, abríamos para a discussão em grupo sobre os resultados alcançados: se
estava satisfatória aquela maneira de escrita, se a escrita era clara e precisa; fazíamos,
coletivamente, uma avaliação do processo que envolvia desde a percepção auditiva, passando
pela grafia do que se percebia pela audição, até chegarmos ao processo de interpretação do
fenômeno grafado. Muitas das vezes o próprio grupo conseguia resolver as situações de
impasse, embora em algumas situações fazia-se necessária a minha intervenção. Somente
quando percebíamos coletivamente que algo ainda não estava claro o suficiente, é que
partíamos para uma informação ou para uma explicação, tendo como fonte, um ou outro
modelos teóricos e conceituais.
Adentrando mais e mais nas propostas didáticas expostas por Koellreutter, entendo
agora que as posturas por mim adotadas na Oficina de Música para Cantores são ressonâncias
das considerações do músico e didata Koellreutter, muitas delas geradas em sua reação ao
método musical oitocentista21, o qual sempre questionou e considerou ser tolheidor de todo o
processo de ensino e aprendizado da música, conforme expõe Brito:

A melhor hora para apresentar um conceito, ou ensinar algo novo, é aquela em que o
aluno quer saber. E o professor deve estar sempre atento e preparado para perceber e
atender às necessidades de seus alunos. [...] Não é preciso ensinar nada que o aluno
possa resolver sozinho. É preciso aproveitar o tempo para fazer música, improvisar,
experimentar, discutir e debater. O mais importante é – sempre – o debate e, nesse
sentido, os problemas que surgem no decorrer do trabalho interessam mais do que as
soluções. (BRITO, 2001, p. 32).
O professor [Koellreutter] sempre defendeu como fator principal a necessidade da
presença do “espírito criador”, princípio vital ao ambiente necessário ao ensino
artístico. Presos a métodos e modelos programados, educadores acabam por minar o
espírito criativo, vivo e curioso que habita nos alunos (BRITO, 2001, p. 30).

21
Considerações históricas sobre “método” serão apresentadas no quarto capítulo deste trabalho.
49

Brito (2001, p. 30) menciona a “consonância existente entre os princípios orientadores


da ação pedagógica de Koellreutter e a pedagogia construtivista, hoje ‘popular’ na educação
brasileira, mas, especialmente, na área da música, ainda pouco praticada”.
Partindo da exposição de Brito (2001), considero que a ação pedagógica proposta por
H.-J Koellreutter nasce da prática e da percepção para o conceito e o elaborar do conteúdo.
Koellreutter parte do fazer musical, da performance musical, para, depois, se dirigir para o
“compreender” da música e, mais tarde para o “elaborar” de sua simbologia e significação,
alcançando um novo fazer musical, uma performance transformada.
50

3 JAQUES-DALCROZE E ALGUMAS EXPERIÊNCIAS MINHAS

Por encontrar afinidade também nos poucos conhecimentos que tive em meu curso de
licenciatura em música aqui na UDESC, com a Rítmica Dalcroze, apresentarei neste capítulo,
inicialmente, uma breve contextualização histórica da vida de Emile Jaques-Dalcroze,
traçando posteriormente algumas reflexões a respeito do pensamento deste educador musical,
compreendendo a Rítmica Dalcroze como pertencente à classificação de “métodos ativos” de
educação musical (FONTERRADA, 2005). Apresento, mais adiante, a minha experiência
com a movimentação corporal na educação musical nas atividades de Rodas de Dança
propostas por mim no estágio realizado. Em seguida, traço breves considerações a respeito
das minhas experiências com movimentação corporal que fazem parte do caminho traçado até
a escrita do presente trabalho. Por fim, faço algumas considerações a respeito das bases da
Rítmica Dalcroze com a intenção de aprofundar meus conhecimentos sobre esta técnica ativa
e perceptiva.
Emile Jaques-Dalcroze22, educador musical suíço, viveu de 1865 a 1950 e foi iniciado
ao piano aos seis anos de idade. Segundo José Rafael Madureira (2007, p. 269), o nome
Dalcroze foi “criado e adotado profissionalmente por Émile Jaques [sic] que esteve sempre
envolvido pela música, arte que reunia os interesses mais caros de sua modesta família
burguesa.” De acordo com Madureira (2007):

[Dalcroze] foi jornalista; ator (clown); professor de harmonia, solfejo e história da


música (no Conservatório de Genebra); regente de orquestra (na Argélia);
compositor; diretor teatral (mise en scène); e, não se pode negar, coreógrafo.
(MADUREIRA, 2007, p. 269).

Segundo Mariani (2011, p. 30), Jaques-Dalcroze “[...] antes de elaborar as bases de


sua pedagogia já era conhecido como um compositor fecundo e sua obra [...] era apreciada e
reconhecida pelo público europeu, especialmente na Suíça e na França”. Madureira (2008)
confirma que:

[Jaques Dalcroze] foi um músico virtuose, celebrado pelas suas habilidades na arte
da improvisação ao piano num momento em que o jazz ainda encontrava-se em
gestação. Na qualidade de compositor, ele produziu uma obra musical completa:
óperas, cantatas, idílios, oratórios, concertos, sonatas, poemas sinfônicos, balés,

22
Devido a controvérsias quanto à escrita correta do nome (Émile-Jacques Dalcroze, Émile Jaques-Dalcroze
etc), adotei Emile Jaques-Dalcroze (sem acento agudo no Emile, sem a letra c em Jaques e com o hífen entre os
nomes Jaques e Dalcroze) conforme pode-se encontrar no site do ijd - institut jaques-dalcroze:
http://www.dalcroze.ch/index.php?option=com_content&view=article&id=53&Itemid=61. Sendo assim, sempre
que fizer citações diretas a outros autores manterei as diversas formas de escrita utilizadas sempre que necessário
com o termo [sic] para indicar a divergência para com o padrão aqui estabelecido.
51

noturnos, suites [sic], quartetos de cordas, peças para coral, peças para piano e
centenas de canções internacionalmente premiadas e traduzidas em diversas línguas.
A necessidade criativa ocupou sempre um lugar preponderante em sua vida, basta
observar a catalogação de sua obra musical que totaliza mais de 2 mil composições.
Foi o desejo em se tornar compositor que o impulsionou, aos 19 anos, a deixar a
Universidade de Genebra e buscar no estrangeiro os meios de realizar os seus
anseios como artista. Apesar das expectativas e de todo o investimento realizado, a
carreira como compositor não alcançou as dimensões almejadas. (MADUREIRA,
2008, p. 22-23).

Aos 27 anos, tornou-se professor de harmonia e solfejo no Conservatório de Genebra,


o mesmo onde havia se formado e, desde o início de seu trabalho em 1892, decidido a integrar
seus conhecimentos e experiências, Dalcroze vislumbrou para a formação de jovens
musicistas “um novo horizonte em que a atividade criativa e o ensino poderiam ser integrados
num todo indissolúvel” (MADUREIRA, 2008, p. 23). Dalcroze constatou a precariedade do
preparo auditivo de seus alunos, que não conseguiam imaginar o som dos acordes que
escreviam nas aulas. Para Madureira (2008, p. 23), “as extremas dificuldades dos futuros
musicistas levaram-no a realizar investigações acerca da relação música-ritmo-movimento-
expressão que culminaram na criação de um sistema completo de educação musical
denominado Ginástica Rítmica ou simplesmente Rítmica.”

Diante da paralisia psicofísica de seus estudantes [...] Dalcroze foi levado a


desenvolver um sistema de educação musical inteiramente fundamentado no ritmo
que, para ele, é a própria expressão da vida, o fundamento de toda arte,
especialmente para a música, uma arte rítmica por excelência. (MADUREIRA,
2008, p. 27).

Para Madureira (2008, p. 27), “Dalcroze não foi o único a investigar a potência
estético-filosófica do ritmo.” Segundo Edgar Willems (1954, p. v apud MADUREIRA, 2008,
p. 27), a redescoberta do ritmo foi a tônica de uma época: “O ritmo ganhou, na música do
século XX, uma importância capital. Por vezes ele acabou tornando-se objeto de um
verdadeiro culto”.

O “culto ao ritmo” não se limitou aos domínios dos compositores, envolvendo ainda
filósofos, médicos, artistas e intelectuais cuja idéia central repousava no desejo em
retornar aos ritmos da natureza, recuperar no ser humano a sua Eurritmia, um termo
que Dalcroze traduz como “um estado que assegura a todas as ações um perfeito
equilíbrio natural”. (MADUREIRA, 2008, p. 27).

Marisa Trench de Oliveira Fonterrada (2005, p. 109), afirma que “as grandes
transformações artísticas e científicas produziram os pedagogos da música no século XX”.
Segundo Mariani (2011, p. 28), as ideias de Jaques-Dalcroze podem ser melhor
compreendidas se considerado o contexto do pensamento pedagógico de sua época, as
52

tendências que surgiam na educação, “as quais caminhavam rumo a uma pedagogia ativa.
Essa pedagogia, conhecida como ‘escola nova’, passou a dar valor à experiência, chamando o
aluno a participar ativamente do processo de aprendizagem”.
Suas ideias surgem também num momento em que a dança sofre uma revolução: os
moldes fixos e já pré-estabelecidos do balé clássico, cujas bases encontram-se no sistema e na
forma da música tonal dos séculos XVIII e XIX (períodos alto-Barroco, Classicismo e
Romantismo), passam a ser questionados a partir dos movimentos da dança moderna, estes
por sua vez surgem concomitantes aos movimentos de ruptura ocorridos na música no final do
século XIX e início do século XX. Segundo Bittar (2012, p. 178-179), sobretudo no teatro,
tais rupturas ocorreram desde o Teatro e a Ópera de Moscou de Stanislavsky e a
“biomecânica” de Meyerhold, até os inúmeros movimentos do chamado “teatro pós-
dramático”, que invertem o eixo, primeiramente assentado na dupla autor-texto, e que passa
então para o eixo ator-corpo.
De acordo com Matteo Bonfitto (2011, p. 10), vê-se “nos países de cultura alemã um
movimento complexo no qual podemos reconhecer como eixo a ‘redescoberta do corpo’”.
Neste contexto, destaca-se a Köperkultur (cultura do corpo) “que levou a uma revolução da
mentalidade, do gosto e do uso da higiene” (BONFITTO, 2011, p. 10) e que “pretende uma
transformação do extremo racionalismo para uma consciência do corpo” (BITTAR, 2012, p.
147). É neste contexto que Jaques-Dalcroze entende a Rítmica como não tendo somente a
função de criar belos corpos, mas sim de “desenvolver a sensibilidade sufocada pelo
intelecto” (BONFITTO, 2011, p. 12).

3.1 REFLEXÕES SOBRE O PENSAMENTO DE DALCROZE

Segundo Mariani (2011, p. 27), o Método Dalcroze23 é mais que um conjunto de


composições e exercícios elaborados por Jaques-Dalcroze para sua prática pedagógica. Este
termo faz referência também ao conjunto de ideias filosóficas que fundamentam esta prática.
Este conjunto de ideias está presente em cerca de 40 pequenos textos teóricos publicados por
Dalcroze entre 1898 e 1939. Nestes, conforme posto por Madureira:

[...] as discussões didático-pedagógicas, que eram o seu maior intuito, encontram-se


emaranhadas a reflexões morais, estéticas e filosóficas [...]. Parte desses escritos foi
publicada no compêndio Le Rythme, la Musique et l’Éducation, sua obra mais
importante que se tornou uma referência para várias gerações de artistas e
pedagogos do corpo. Os demais textos foram publicados na revista bilingüe Le

23
Mais adiante, no quarto capítulo, proporei uma reflexão crítica a respeito do uso de termo “Método Dalcroze”
para se referir à proposta de educação musical de Jaques-Dalcroze.
53

Rythme/Der Rhythmus (O Ritmo) que teve grande circulação pela Europa nas
primeiras décadas do século XX. (MADUREIRA, 2008, p. 25-26).

De acordo com Fonterrada (2005), Jaques-Dalcroze buscava a união das artes


mediante a trindade verbo, gesto, música, a mesma anunciada por Wagner no final do séc.
XIX a partir do conceito de “arte total” (Das Gesammmtkunstwerk), mas que, para Jaques-
Dalcroze, jamais ocorreu, como afirma Fonterrada (2005):

Se, realmente, houvesse a intenção de promover a unidade, não bastaria a fusão de


música, verbo e gesto, mas seria necessário que os movimentos corporais e sonoros,
bem como os elementos musicais e plásticos, estivessem estreitamente unidos, pela
base. (FONTERRADA, 2005, p. 117).

De maneira crítica, Fonterrada (2005, p. 111-115) afirma que muitas ideias de Jaques-
Dalcroze estão impregnadas pelo pensamento romântico. Para a autora, pode-se observar em
seus textos, assim como é característica dos pensadores românticos, os sentimentos de
“melancolia” e de “utopia”. A “melancolia” se mostra na sua insatisfação com a situação da
sociedade de seu tempo, de maneira geral e mais especificamente uma insatisfação com as
escolas, cujas autoridades “não conseguiram ir além dos procedimentos rotineiros” e não
tomavam conhecimento das mais recentes e inovadoras teorias educacionais. O aspecto de
“utopia” se manifesta no entusiasmo, na convicção e na crença de que a sua proposta de
educação musical seria capaz de reverter o estado das coisas, uma vez que, se implantada,
proporcionaria “o pleno desenvolvimento das capacidades sensório-motoras, sensíveis,
mentais e espirituais da criança e, em consequência, de toda a população”. Madureira (2008)
acrescenta que:

Suas ambições [de Dalcroze] não eram nada modestas. Na juventude, sonhou em
ocupar um lugar no Panteão dos grandes compositores, ao lado de Bach, Mozart e
Beethoven, que ele considerava um “pai espiritual”. Na idade madura, convenceu-se
de que a Rítmica, sistema de educação musical por ele concebido, iria garantir a
redenção da humanidade, sensivelmente empalidecida devido aos novos modos
socioeconômicos de subsistência. (MADUREIRA, 2008, p. 17).

É a partir destes princípios (pedagogia ativa, desenvolvimento integral da pessoa,


união das artes e da importância que deu ao coletivo) que Jaques-Dalcroze desenvolveu sua
proposta de educação musical pelo movimento.

3.2 OS “MÉTODOS ATIVOS” E JAQUES-DALCROZE

De acordo com Marisa Trench de Oliveira Fonterrada em seu livro De tramas e fios:
um ensaio sobre música e educação (2005, p. 163-165), durante o século XX, classifica-se os
54

mais influentes educadores musicais em duas gerações, os da chamada “primeira geração” e


os da “segunda geração”.
Os sistemas de educação musical do início do século XX criados pela “primeira
geração” são chamados por Fonterrada (2005) de “métodos ativos”. Segundo a autora (2005,
p. 107-108), dentre os “métodos ativos” de educação musical, nem todos podem ser
considerados métodos, mas antes, abordagens ou propostas. Destacam-se dentro desta
primeira geração: Emile Jaques-Dalcroze, Edgar Willems, Zoltán Kodály, Carl Orff e
Shinichi Suzuki. Referenciando Fonterrada (2005), Michelle Mantovani (2009) acrescenta
que:

Por método ativo entende-se uma educação musical pautada na experiência de vida,
na vivência prática, que aproxima a música e o educando, diferenciando-se, assim,
da prática tradicional do ensino de música, em que o contato do aluno com a música
se dá por meio da teoria e da técnica, com ênfase na compreensão racional de
conceitos, apartada da vivência musical. (MANTOVANI, 2009, p. 39).

Na segunda metade do século XX, surgem os educadores musicais da chamada


“segunda geração”, diferenciando-se dos anteriores “pela utilização de material musical
alinhado às mudanças ocorridas na música de vanguarda, em contraposição à música
tradicional e folclórica, enfatizada pelos primeiros.” (MANTOVANI, 2009, p. 39). Percebe-
se, nestas propostas, grande ênfase nos processos de criação, de composição, de improviso e
de escuta ativa. Fonterrada (2005) compreende como pertencentes a esta segunda geração:
George Self, John Paynter, Murray Schafer e Boris Porena. No Brasil, Hans-Joachim
Koellreutter foi um representante significativo desta segunda geração.
As propostas da primeira geração, os “métodos ativos”, surgiram no início do séc. XX
“como resposta a uma série de desafios provocados pelas grandes mudanças ocorridas na
sociedade ocidental na virada do século XIX para o XX” (FONTERRADA, 2005, p. 107).
Mudanças de ordem sócio-políticas, de mentalidade e comportamento resultaram nas artes em
tomadas de posições também reativas aos padrões oitocentistas. Nas artes visuais,
movimentos de ruptura como, de início, o impressionismo, e um pouco mais adiante o
cubismo, o surrealismo, o futurismo, dadaísmo, construtivismo, concretismo, dentre outros e
na música, em específico, reações às mentalidades e comportamentos gerados pelo “método”
canonicista24, principalmente aquilo que diz respeito à criação do texto musical e à

24
“Os românticos decidiram criar seus próprios modelos clássicos, valendo-se da ideia muito especial de que a
música era um meio “autônomo”, “absoluto”. Assim, a música poderia passar de ofício a arte: poderia se tornar
“clássica”. Compositores tornaram-se heróis, promovidos ao status de gênios. Panteões musicais foram erigidos,
e fábricas de gesso produziram bustos de compositores, como os de tantos imperadores romanos antigos. Um
55

performance deste texto serem ambas realizadas através da figura de um “gênio”25 cultivada
no Romantismo, refletiu em posicionamentos de ruptura para com o sistema tonal / formal
ocidental, como também em diferentes maneiras de pensar o ensino e a performance da
música.
Fonterrada (2005, p. 107-108) afirma que parte dos “métodos ativos” chegaram a ser
introduzidos no Brasil nas décadas de 1950 e 1960 em alguns grandes centros e escolas de
música, mas que, “por uma série de circunstâncias, entre as quais a exclusão da disciplina
Música dos currículos escolares, substituída pela Educação Artística desde 1971 (LDB
n.5692/71), muitas dessas abordagens ficaram esquecidas [...]”.
O “método” proposto por Dalcroze, como afirma a autora Silvana Mariani (2011, p.
32-33), foi implantado em 1937 no Brasil no Conservatório Brasileiro de Música do Rio de
Janeiro, mas tanto naquela ocasião, como na atualidade, não há escolas especializadas no
método no país. A proposta hoje é adotada apenas por alguns professores seguidores que
buscaram a formação no exterior, e que hoje oferecem ocasionalmente oficinas em festivais e
encontros de educação musical, como é o caso do brasileiro-suíço Iramar Rodrigues26.
Curiosamente, como afirma Regina Santos (2001 p. 7. apud MARIANI, 2011, p. 33),
no Brasil as “zonas de ressonância dalcroziana se instalaram nos territórios cênico-teatral e
musicoterapêutico e não repercutiram tão intensamente no meio pedagógico musical”. No
âmbito das terapias corporais, Madureira (2008) afirma que:

A preparação corporal da Rítmica, ou ainda como sistema ginástico, aproxima-se do


conceito de eutonia entendido como a justa afinação das tensões corporais. Desse
modo, o sistema de Dalcroze acabou por orientar o devir das terapias corporais que
se valiam do sentido da Eutonia27 como axioma de suas investigações.
(MADUREIRA, 2008, p. 35).

cânone de obras “clássicas” começou a se firmar, tendo as sinfonias de Beethoven como base. Essa maneira de
pensar, chamada canonicismo, foi o alicerce do movimento romântico desde seu início e representa uma
mudança fundamental na cultura musical do Ocidente. Uma expressão atual dessa atitude canônica é a
sobrevivência de várias instituições musicais fundadas no século XIX: editoras, jornais, orquestras, casas de
ópera e conservatórios.” (HAYNES, 2007, p. 5 apud SANTOS, 2011, p. 93).
25
Segundo Schlegel a definição de gênio desenvolve-se como a de “mediador entre o Infinito e o finito”
(ABBAGNANO, 1998, p. 481 apud BITTAR, 2012, p. 62); o Gênio, conforme é preconizado por Bergson, já no
século XX, “também é a encarnação do Absoluto destina-se a realizar o Absoluto no mundo.” (ABBAGNANO,
1998, p. 482 apud BITTAR, 2012, p. 62).
26
“Iramar Rodrigues graduou-se em piano pela Universidade Federal de Uberlândia, foi professor na Escola de
Música da Universidade Federal de Goiás e, algum tempo depois, conquistou na Suíça o certificado de
rythmicien. Há mais de 30 anos Iramar Rodrigues se ocupa da formação musical de crianças, jovens e
profissionais nas mesmas salas ocupadas por Dalcroze no Instituto Jaques-Dalcroze de Genebra, situado na rua
Terrassière, número 44, inaugurado em 1915.” (MADUREIRA, 2008, p. 5).
27
Gerda Alexander foi a responsável pela elaboração do conceito de Eutonia que, voltando-se para a cultura dos
helenos, “recuperou o termo eutonia (ευτονία), no sentido de um ‘tônus justo’ ou ‘tônus equilibrado’. [...] Tonus
é uma variação latina para τονος (do grego clássico: tensão). Originalmente, o termo τονος foi empregado como
tensão relativa às cordas da lira. Afinar as cordas de um instrumento musical significa ajustá-las numa tensão
precisa, para que possam vibrar na freqüência adequada à sua tonalidade original (harmônicos). Tal qual um
56

Apesar do nome “Dalcroze” ser bastante referenciado em teses, artigos e estudos


historiográficos sobre as origens da modernidade na dança e na ginástica, para José Rafael
Madureira (2008, p. 3):

[...] a referência à sua pessoa e à sua obra limita-se ao formato enciclopédico – notas
de rodapé – que em nada contribuem para o entendimento estético-filosófico de seu
pensamento. Se não bastasse a insuficiência de dados concretos, as citações
apresentam-se num conjunto de informações vagas e contraditórias. (MADUREIRA,
2008, p. 3).

Atualmente no Brasil, como no meu caso, dentre milhares de outros, os alunos de


Licenciatura em Música têm acesso à Rítmica Dalcroze nas disciplinas didáticas, estando
presente em seus conteúdos programáticos e suas ementas, mas dividindo espaço com as
muitas outras propostas de pedagogia musical e a muitas discussões necessárias e pertinentes
à área. A consequência disto, é que, neste processo de “ver um pouco de tudo” da grande
“salada” de pedagogias em educação musical, acaba-se por ter pouco contato com as
propostas que são as bases pioneiras da educação musical atual, e muitas vezes, consolida-se
em nossa formação uma “ideia”, não dita, mas presente, de que tais metodologias são antigas,
ultrapassadas e desatualizadas, “fora de contexto”. Mais adiante, na seção 4.3.3 “A Rítmica
Dalcroze como técnica: esquecida, porém possível”, partindo do esquecimento dos “métodos
ativos”, proponho uma discussão que considera o conhecimento dos métodos ativos como
possibilidades “técnicas”, propostas práticas, que tanta falta fazem na atual formação do
futuro professor de música.

3.3 MINHA EXPERIÊNCIA EM EDUCAÇÃO MUSICAL A PARTIR DO


MOVIMENTO CORPORAL

Se, neste trabalho de conclusão de curso, considero a Rítmica como abordagem prática
possível perante os posicionamentos conceituais de Koellreutter, percebo que, mesmo sem ter
tido contato especificamente com a Rítmica, este foi um caminho naturalmente iniciado por
mim já na experiência docente. Afinal, enxergo que numa ideologia de recusa ao “método”,
da busca pela expansão da consciência, da mudança do ser humano e da valorização das
experiências dos alunos, o caminho mais coerente seria o da exploração da vivência
perceptiva. Desta forma, entendo a abordagem de Dalcroze de uma educação musical a partir

instrumento musical, o corpo, constituído por feixes de músculos, precisa ser afinado numa tensão adequada,
numa Eutonia, que é justamente o ponto de equilíbrio entre a hipertonicidade e a hipotonicidade que se
constituem como disfunções psicofísicas.” (MADUREIRA, 2008, p. 35-36).
57

da movimentação corporal como uma possibilidade genuína para a ampliação da percepção,


de expansão da consciência enquanto awareness, conceito já apresentado anteriormente no
segundo capítulo.

3.3.1 Rodas de Dança: possíveis relações com a Rítmica

Em minha experiência de estágio, as práticas que partiram da movimentação corporal


se resumem, de certo modo, à experiência com as atividades as quais denominei Rodas de
Dança e que foram desenvolvidas em cinco dos onze encontros, mais precisamente nos 1º, 2º,
3º, 4º e 6º encontros (MEURER, 2014, p. 11-26, 29-32).
O nome surgiu da necessidade de organizar a atividade nos próprios planejamentos, na
medida em que se tornou frequente, e por não me sentir à vontade para chamar de Dança
Circular, por exemplo, por não conhecer com maior seriedade as diversas aplicações dessas
práticas.

3.3.1.1 Breve descrição das atividades de Rodas de Dança

Em formato de círculo e de mãos dadas, o grupo inteiro caminha para frente, para trás
e para os lados, conforme a indicação do professor que elabora uma “coreografia” para cada
música. A coreografia é composta pela combinação de determinada quantidade de passos para
determinadas direções numa sequência específica, mantendo o caminhar na pulsação da
música em questão. Uma quadratura de dezesseis compassos de quatro tempos cada pode ser
representada, como exemplo, com 4 passos para a direita, 4 para a esquerda, 4 para frente e 4
para trás, retornando, assim, ao ponto inicial e recomeçando a contagem. Desta forma,
desenvolve-se a percepção de pulso, compasso, frase e forma.
Cabe aqui o detalhamento de uma escolha minha com relação à contagem dos pulsos
na caminhada: o primeiro pulso é representado pelo movimento de uma das pernas, em
qualquer uma das direções, e o segundo pulso pelo “recolhimento” da outra perna na mesma
direção, de forma que os pés terminem juntos. Sendo assim, a contagem se dava sempre em
pares, juntando, portanto, as pernas a cada dois pulsos. Isto dá ênfase às acentuações naturais
dos pulsos ímpares, considerando as pulsações pares como que consequências das primeiras.
A execução, dá-se na prática de forma mais simples do que parece e percebo sua utilidade nos
compassos binário e quaternário. Quando enfrentamos os compassos quinário e ternário, optei
pela mudança na forma de caminhar: os passos marcavam com autonomia os pulsos,
cruzando-se uma perna na frente da outra, no caso da caminhada para as laterais.
58

Coerente com a proposta inicial da oficina, parti do repertório que os alunos entraram
em contato nos ensaios do Coral UDESC: Climbing’up the Mountain (cujo refrão contém
exatamente a estrutura exemplificada acima) (Apêndice G); Baião de Edino Krieger
(compasso binário, com duas possibilidades de percepção e compreensão da forma)
(Apêndice H e Apêndice I); Cio da Terra (alternância entre os compassos binário, quaternário
e quinário) (Apêndice I); Cravo e Canela (experimentando três possibilidades de
interpretação: ternária, binária e a combinação das duas) (Apêndice D, Apêndice E e
Apêndice F).
As atividades se davam nas seguintes possibilidades: contando os tempos de cada
compasso, em silêncio, cantando a música ou ouvindo uma gravação.

3.3.2 Meu corpo em movimento

Meu interesse pela busca da relação da música com o movimento corporal foi
reforçado por algumas experiências durante minha formação acadêmica que estiveram
relacionadas a encontros com algumas pessoas em alguns cursos de curta duração e em uma
montagem artística que ocorreram dentro da universidade: o contato com a
atriz/dançarina/cantora Barbara Biscaro, assistindo suas apresentações, trocando ideias,
participando de alguns de seus ensaios, e, mais intensamente, sendo dirigido por ela na
experiência cênica como “Narrador”, personagem criado para a montagem O Fantasma da
Ópera em 2012; a participação na oficina “O Corpo Musical” ministrada por Jean-Jacques
Lemêtre (integrante e compositor da companhia francesa de teatro Théâtre du Soleil) em
2013; a participação nas disciplinas de “Técnicas de Dança I e II” ministradas
respectivamente pelas professoras Jussara Xavier e Sandra Meyer do curso de Licenciatura
em Teatro também em 2013; o cuidado cênico nas performances musicais das disciplinas de
“Expressão Vocal I, II, III e IV” em 2012 e 2013 ministradas pela professora Alicia Cupani.
Percebo que essa abordagem do ritmo que parte da movimentação corporal utilizada
por mim na Oficina de Música para Cantores é também influência do contato com os livros
Rítmica (1999) e Rítmica Viva (2008) do brasileiro José Eduardo Gramani28 nas aulas de

28
“José Eduardo Gramani nasceu em Itapira, São Paulo, em 20 de março de 1944 e faleceu em Campinas em
1998. Músico talentoso, cedo rumou para São Paulo, onde teve aulas de violino com Moacir Del Picchia,
atuando como músico profissional em diversas orquestras e grupos de câmara. Iniciou seu trabalho pedagógico
na Fundação das Artes de São Caetano do Sul (FASCS) [...]. Em 1975 foi convidado pelo maestro Benito Juarez
para participar da renovação da Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas, exercendo funções de destaque
nesta instituição, como concertino, spalla e solista, até 1983. Neste ano, deixou a orquestra para se dedicar
integralmente às suas atividades como professor de rítmica e percepção musical na Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP), e a atuação em grupos de câmara diversos e, posteriormente, regente, compositor e
arranjador.” (FIAMMENGHI, 2008, p. 179).
59

Percepção Musical. Para Madureira (2008, p. 4), é possível encontrar na obra de Gramani
vários passos de uma tradição fundada por Jaques-Dalcroze:

[...] A “visão contrapontística do fenômeno rítmico” apresentada por Gramani e o


seu desejo manifesto em desenvolver a personalidade do músico são alguns
exemplos dessa continuidade. Em consonância com os ideais de Dalcroze, Gramani
deixou registrado os seus anseios: “Os exercícios deste livro são sugestões para que
o músico conte menos e sinta mais” (GRAMANI apud MADUREIRA, 2008, p. 4).

A atividade de Rodas de Dança, proposta por mim na Oficina, surgiu da experiência


que tive na oficina de Danças da Renascença com o professor Mário Orlando Guimarães da
Universidade Federal Fluminense (UFF) em Outubro de 2013, como parte da programação do
evento AULOS: 1ª Mostra Internacional de Flauta Doce – Performance e Didática. Nesta
oficina pude perceber que, através do movimento coletivo feito em algumas danças circulares
presentes em boa parte das danças renascentistas (Sarabanda, Bransle, Basse Dance foram
algumas das danças trabalhadas na oficina), pode-se vivenciar, de forma lúdica, questões
musicais referentes à consciência e à incorporação rítmica como pulsação, forma, esquemas
harmônicos e divisões rítmicas. Percebi naquelas danças o potencial educativo musical para o
aprendizado de questões rítmicas. Partindo do movimento corporal, o tempo necessário para a
conexão com a teoria pode-se tornar bastante reduzido. Através da experimentação e
percepção corpóreas e do corpo em movimento, a síntese teórica segue como uma orientação
à atenção intelectiva do aluno.
Cabe aqui mencionar meu envolvimento curto, porém intenso, com o SwáSthya Yôga.
Pratiquei Yôga durante o período de três meses, de Dezembro de 2013 até Fevereiro de 2014,
numa das escolas do Método DeRose. As práticas do SwáSthya Yôga são compostas por
diversas técnicas, como já mencionado anteriormente, porém dou destaque aqui para as
posições físicas, os ásanas, que, nesta cultura, são executados sem repetições e buscando um
encadeamento coreográfico.
Destaco ainda que, concomitante ao desenvolvimento da Oficina, tive uma experiência
de dois semestres com a Técnica Klauss Vianna (1928-1992) nas aulas de “Estudos
Avançados em Música I [e II] – Técnica Klauss Vianna e a Escuta do Corpo” ministrada pela
professora Valeria Bittar. Esta Técnica trata justamente de um “acordar” do corpo para o
movimento, para a ação. Sua didática traz suas bases sobre o perceber do corpo de cada um e
não num repetir modelos corpóreos externos, a partir de uma pedagogia do modelo e da
correção (BITTAR, 2012).
60

3.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS BASES DA RÍTMICA DALCROZE

Logo no início do primeiro caderno de La Rythmique de Emile Jaques-Dalcroze


(1916), que se apresenta como material didático destinado aos alunos e professores de
Rítmica, é possível observar um “Importante Aviso ao Leitor”:

Este livro foi escrito aos alunos dos cursos de Rítmica do Instituto Jaques-Dalcroze
e às escolas que tenham adquirido o direito de ensinar a Rítmica. Seu objetivo é
auxiliar os alunos na recapitulação e análise das noções desenvolvidas durante os
estudos experimentais. A Rítmica, antes de mais nada, é uma experiência pessoal.
Os leitores deste livro, que não estão dispensados dessa experiência conduzida por
um professor autorizado, não podem pretender ao direito de ensinar este método.
Ainda mais existindo, entre a Rítmica corporal e a música que a regula no tempo e
no espaço, íntimas relações cujo estudo não se encontra neste volume. Ademais, os
leitores não encontrarão aqui qualquer instrução sobre a maneira de se conquistar as
faculdades de improvisação ao piano sem as quais o ensino da Rítmica é impossível.
(JAQUES-DALCROZE, 1916, p. 5 apud MADUREIRA, 2008, p. 74).

Dalcroze alerta-nos, portanto, que não é possível compreender seu método através de
livros, e que, para tanto, faz-se necessário vivenciar na prática as propostas coordenadas por
um rythmicien. Assim, podemos dizer que Dalcroze parte da performance da música do
começo ao fim, no ensinar e no aprender da música. Mesmo que fosse possível conhecer
verdadeiramente a proposta através de textos, os livros e materiais didáticos elaborados por
Jaques-Dalcroze, ou por seus alunos, estão traduzidos somente para o inglês, o italiano e o
alemão e não existe sequer um texto de Dalcroze traduzido em português (MADUREIRA,
2008, p. 3). O material mais completo que encontrei em português a respeito da Rítmica é a
apostila “A Rítmica de: Emile Jaques-Dalcroze – Uma Educação por e para a Música”
elaborada pelo professor Iramar Rodrigues e disponibilizada por ele aos participantes da
oficina “A Rítmica Dalcroze”29. A apostila, com 75 páginas, contém a vida e a obra de
Dalcroze, os princípios fundamentais, propostas didáticas, os objetivos e as finalidades da
Rítmica Dalcroze e diversos exercícios práticos, bem como as partituras das músicas
utilizadas na respectiva oficina.
Desse modo, encontra-se grande dificuldade de acesso à prática da Rítmica atualmente
no Brasil, e, portanto, uma dificuldade em escrever sobre esta prática. Até o término do
processo de escrita deste trabalho, o único texto em português que se dedica a ilustração de
atividades práticas de Rítmica é o capítulo “Émile Jaques-Dalcroze [sic]: a música e o
movimento” escrito por Silvana Mariani presente no livro “Pedagogias em Educação
Musical” (2011). Ainda assim, trata-se de atividades elaboradas pela autora a partir da

29
Ocorrida em Caxias do Sul/RS de 16 a 19 de Outubro de 2014.
61

experiência que teve como estagiária no Institut Jaques-Dalcroze (IJD). Antes das
exemplificações práticas, Mariani (2011) faz apontamentos amplos das diretrizes da Rítmica:

As três ferramentas básicas do Método Dalcroze são a rítmica, o solfejo e a


improvisação. A utilização do método deve contemplar, portanto, a experiência do
movimento, os aspectos do treinamento auditivo e vocal e os aspectos de
improvisação para proporcionar os pensamentos musicais próprios. O material
didático deve ser elaborado pelo próprio professor, de acordo com a necessidade dos
alunos. Deve ser de ordem progressiva, partindo de divisões rítmicas simples e
melodias menos extensas. Convém que seja adaptado a cada situação, respeitando a
cultura local, utilizando elementos da cultura popular, assim como o instrumentário
de cada região. (MARIANI, 2011, p. 40).

José Rafael Madureira (2008) fez um trabalho importante de tradução de diversos


textos de Dalcroze, mas não se propôs a expor detalhadamente os procedimentos práticos da
Rítmica.
Como dito anteriormente, Dalcroze começou suas investigações que culminaram na
Rítmica com seus alunos de Harmonia e de Solfejo no Conservatório de Genebra, uma vez
que identificou que estes tinham muitas dificuldades para perceber “internamente” a música
que eram capazes de escrever, bem como as que eram capazes de executar com grande
virtuosismo em seus instrumentos.
Deste modo, de acordo com Madureira (2008, p. 65), “Dalcroze sabia que, afundados
em suas carteiras, os estudantes jamais compreenderiam o verdadeiro sentido do fazer
musical. A primeira medida foi afastar as mesas e propor aos alunos que caminhassem pela
sala.”

Ao solicitar aos alunos para retirarem os sapatos durante as lições de Rítmica,


Dalcroze incitou a fúria dos puritanos. Na realidade, ele não tinha a intenção de
ofender ninguém, apenas quis proporcionar aos futuros musicistas um maior
conforto durante os exercícios de marcha. (MADUREIRA, 2008, p. 34).

Através da “marcha”, Dalcroze começou a perceber que o corpo em movimento


poderia ser um potencial para a compreensão de aspectos musicais uma vez que, partindo de
processos perceptivos, de dissociação e contraposição dos movimentos, os alunos têm maior
envolvimento para com o fazer artístico.

O próximo passo foi ornamentar as marchas com movimentos dos braços. Para cada
tempo do compasso havia um gesto correspondente. Dalcroze apropriou-se das
convenções preestabelecidas da regência, em especial para os compassos básicos
(binário, ternário e quaternário), alongando um pouco mais os movimentos do braço
até a extensão ou flexão total dos cotovelos. Dalcroze não negligenciou os
compassos divididos em 5, 6, 7, 8 e 9 tempos, pouco usuais no ensino de música,
criando para estes novas seqüências de movimento.
[...]
62

Plenamente consciente das necessidades inerentes ao fazer musical, Dalcroze


introduziu nas marchas exercícios de dissociação. Enquanto os braços regiam os
tempos de um compasso quaternário, por exemplo, as pernas realizavam passos mais
largos (semibreve ou semínima) ou mais rápidos (colcheias ou tercinas). Tais
relações eram constantemente invertidas impedindo que os alunos tornassem-se
“escravos de qualquer automatismo”. (MADUREIRA, 2008, p. 66).

Desta forma, em contraposição a uma educação “livresca”, não perceptiva e não


sensorial, que busca um envolvimento meramente intelectual, Dalcroze propõe que os alunos
envolvam-se mais completamente com o material sonoro: começando pelo âmbito
físico/perceptivo, visando atingir também o campo emocional, mental e espiritual.

A Rítmica criada por Jaques-Dalcroze pretendia desvencilhar o aluno de uma prática


mecânica no aprendizado da música, normalmente apoiado na análise, na leitura e na
escrita sem a participação do corpo, que ele considera fundamental para a
sensibilização da consciência rítmica. Jaques-Dalcroze deseja libertar o aluno da
inércia do corpo adquirida por meio de um processo de ensino-aprendizagem
enciclopedístico, que privilegia a mente e o acúmulo de informações sem a
participação do organismo como um todo. Assim, o pedagogo propõe o rompimento
da dicotomia corpo-mente, estabelecendo relações entre estes dois através de uma
educação musical baseada na audição e atuação do corpo. [...]
Jaques-Dalcroze entende que a consciência rítmica é resultado de uma experiência
corporal, e que essa consciência pode ser intensificada através de exercícios que
combinem sensações físicas e auditivas.
A Rítmica propõe o aumento dessa consciência através do aperfeiçoamento dos
movimentos no tempo e espaço. Pretende um refinamento dos sentidos por meio de
uma escuta atenta e da atuação do corpo como uma unidade, os quais, através da
sensorialidade e da sensibilidade, conduzem a uma consciência auditiva.
(MARIANI, 2011, p. 31-32).

Segundo Mariani (2011, p. 32), para Jaques-Dalcroze o movimento corporal tem uma
dupla função: “a manifestação visível de elementos musicais experimentados pelos sentidos,
pensamentos e emoções, ao mesmo tempo em que é estratégia para aperfeiçoar a consciência
rítmica através da expressão”.
Na Rítmica, a atividade de solfejo ganhou um caráter de “dança”. De acordo com
Madureira (2008, p. 13), “a Plastique Animée é um dos fundamentos da Rítmica de Jaques-
Dalcroze, podendo ser imaginada como solfejo corporal, ou seja, uma leitura da escrita
musical realizada através de gestos corporais”.

No concurso de suas investigações, Dalcroze organizou um sistema de relações entre


a música e a gestualidade, uma espécie de solfejo corporal, denominado como
Plástica Animada (Plastique Animée). O solfejo sempre ocupou um lugar
preponderante na educação musical da criança como instrumento eficaz para fazê-la
perceber a duração dos sons, os intervalos harmônicos, as escalas e tonalidades.
Enquanto o solfejo tradicional educa os olhos e ouvidos numa leitura fluente, a
Plástica Animada, ao incitar o corpo em sua inteireza, conduz à percepção física dos
elementos constitutivos da arte musical, quais sejam o ritmo, a melodia e a
harmonia. (MADUREIRA, 2008, p. 71).
63

A partir da minha prática em estágio, e da análise das propostas e protocolos presentes


no Relatório Final de Estágio, percebo que estes princípios – primeiramente experimentar
com o corpo, por meio de exercícios que deixem claros os elementos musicais, vivenciando
assim a dimensão temporal-espacial da música – já estavam de alguma forma presentes,
principalmente, nas atividades as quais denominei Rodas de Dança e nas atividades que
envolviam a Manossolfa30.

30
A Manossolfa é um recurso de aprendizagem presente no Método Kodály no qual cada altura possui um gesto
correspondente.
64

4 REFLEXÕES SOBRE O USO DO TERMO “MÉTODO” EM KOELLREUTTER


E DALCROZE

Numa crítica explícita aos métodos de educação musical, Hans-Joachim Koellreutter


afirma: “‘Meu método é não ter método’[...] ‘O método fecha, limita, impõe... e é preciso
abrir, transcender, transgredir, ir além...’” (BRITO, 2001, p. 29).
Percebendo as múltiplas possíveis repercussões desta posição reativa ao “método”,
vejo ser necessário, para mim, compreender melhor a qual conceito de “método” musical
Koellreutter se refere. Para tanto, apresentarei brevemente uma contextualização histórica,
traçada por outros autores, de como se dava a formação musical antes dos ideais oitocentistas
e como esta foi moldada pela “mentalidade do método conservatorial”. Em seguida, apresento
brevemente o contexto em que surgem os “métodos ativos” (FONTERRADA, 2005) e
proponho uma reflexão a respeito da forma como as propostas de Jaques-Dalcroze são
conhecidas no Brasil. Por fim, questiono a atribuição de “método” ao sistema de educação
musical proposto por Jaques-Dalcroze, uma vez que o identifico como pertencente a um
movimento de reação à “mentalidade do método conservatorial”.
Conversar com os posicionamentos e conceitos propostos por Jaques-Dalcroze e
Koellreutter fez-me confrontar com duas utilizações diversas do termo método: o primeiro
autor o utiliza para identificar o seu próprio sistema de educação musical, e o segundo para
posicionar-se criticamente ao “sistema tradicional de ensino”. Porém identifico que, mais que
uma questão de utilização de palavras, trata-se de uma questão de discurso. Desta forma,
utilizo os enunciados propostos por Eni P. Orlandi em seu livro “Análise de discurso:
princípios e procedimentos” (2000) buscando não meramente extrair sentidos dos textos de
Koellreutter e Dalcroze. De acordo Orlandi (2000, p. 17), mais que compreender o que os
textos querem dizer (o que seria a análise de conteúdo), a análise de discurso considera que
a linguagem não é transparente, não significa por si só. Para o autor é necessário compreender
como as palavras e os discursos significam e/ou significaram em determinados contextos e
por qual (quais) sujeito(s) foi ou foram exposto(s). Neste caminho proponho as reflexões que
seguem.
Segundo Orlandi (2000) a língua não é só um código entre outros. Não há uma
separação estanque entre emissor e receptor, nem tampouco eles atuam numa sequência em
que primeiro um fala, refere alguma coisa e depois o outro decodifica a mensagem. A
linguagem põe em relação sujeitos e sentidos afetados pela língua e pela história. Há, desse
modo, “um complexo processo de constituição desses sujeitos e produção de sentidos e não
meramente transmissão de informação”. (ORLANDI, 2000, p. 21).
65

Este capítulo surgiu da necessidade de um esclarecimento sobre o conceito de método


dado que, de maneira geral, acostumamo-nos a “ver”, em nossa lida cotidiana e automatizada
com as palavras, a denominação “método” sem nos debruçarmos devidamente sobre sua
contextualização histórica, e menos ainda, sua contextualização léxica. Essa necessidade de
“explicar” o nome método foi crescente na construção deste TCC pelo fato de que nos dois
autores sobre os quais fundamentei a Oficina, e também aqui usados como objetos de estudo,
Emile Jaques-Dalcroze e Hans-Joachim Koellreutter, são sinalizados como criadores de um
“método”, no primeiro, e de um “anti-método” no segundo.
Desta forma, busco entender como estes diferentes discursos ganham significado nos
seus contextos históricos e como recebem ou podem receber novos significados, por vezes, de
forma distorcida em nosso contexto atual.

4.1 MÉTHODE: UMA BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

De acordo com o violinista brasileiro Luis Otavio de Sousa Santos (2011, p. 5), a
forma de ensino musical do período anterior ao século XIX, se deu por milhares de anos por
meio da antiga tradição de ensino dos artesãos: a relação mestre-aprendiz, como exposto a
seguir:

[A] instituição mestre/aprendiz tem sua origem na forma de transmissão do


conhecimento entre os artesãos. Esse conhecimento era, na maior parte das vezes,
passado oralmente, através da prática iniciática e do ensino privado. No que
concerne ao processo de ensino musical, esse sistema concentrava todas as funções
pedagógicas na figura do tutor, ou mestre. Cabia ao tutor construir o processo de
aprendizado, de acordo com as características intrínsecas de cada discípulo.
(SANTOS, 2011, p. 5).

Como que ferramentas integradas ao contexto de formação musical mais


individualizada, os chamados “tratados”, diferentemente dos métodos que surgiriam
posteriormente, tinham a intenção de registrar o processo de ensino do mestre, conforme
define o violinista Luis Otavio Santos:

[os tratados] São os documentos musicais que relatam e descrevem uma práxis
específica de um instrumento ou da utilização prática de uma teoria musical,
normalmente escritos com caráter autoral e individual. Podem eventualmente se
chamar essay ou mesmo méthode, porém o que os define é o descompromisso com
uma lógica pedagógica progressiva e autossuficiente. Por isso, eles podem ser
ambíguos, repletos de lacunas e com opiniões autorais a respeito de determinados
temas. São frutos de um pensamento artesanal, com a intenção de registrar o métier
do autor, mas, para atingir a sua completude, sempre dependentes dos segredos
implícitos e não revelados pelo mestre. (SANTOS, 2011, p. 3).
66

Reforçando esta visão, a flautista Valeria Bittar (2012, p. 21) completa que esta
pedagogia artesanal foi substituída pela instituição do ensino de música padronizado, a partir
dos ideais de igualdade e acesso universal ao conhecimento, ditados pela Revolução Francesa.
Neste período:

[...] a didática musical começa a transformar-se e esta relação mestre-aprendiz é


lentamente substituída por um ensino institucionalizado da música, fixado na figura
emblemática do “conservatório”, como conhecemos até hoje, cujo modelo foi o
Conservatoire de Paris, fundado em 1795 sob as premissas dos novos ideais
revolucionários de acesso universal ao ensino e padronização didática por meio do
méthode. (BITTAR, 2012, p. 30-31).

Pode-se dizer, deste modo, que, em torno da época da fundação do Conservatório de


Paris em 1795 é que surgem os “métodos” que, contrastando com os “tratados”, aparecem
“carregados de linearidade e previsibilidade” (BITTAR, 2012, p. 33). De acordo com Santos
(2011), os métodos diferenciam-se dos tratados, anteriores ao método, em muitos aspectos:

[Os métodos] São os documentos musicais redigidos com o propósito de mostrar


todos os estágios de formação musical específica, de uma maneira progressiva,
abrangente e clara. Mesmo que não atinjam esse objetivo, eles diferem dos tratados
por serem mais diretos na previsão e na solução dos problemas do aprendizado,
tornando-se, assim, menos ambíguos ou herméticos. Portanto, esse tipo de
documento tem um caráter muito mais didático e funcional do que os tratados.
Nesse estudo atribuímos a esse gênero de documento o papel de principal ferramenta
utilizada no sistema de ensino coletivo, onde o método sintetiza um curso completo.
(SANTOS, 2011, p. 4).

Segundo Bittar (2012, p. 128), é possível tomar posição, mesmo hoje em dia, que na
didática metodológica da performance musical, especificamente, a mentalidade do método
conservatorial tem seu modus operandi no controle técnico, a partir do controle corpóreo,
como observamos nas seguintes afirmações:

 A técnica, proposta pelo método, existe para solucionar pontualmente


questões surgidas na decodificação do texto musical;
 A técnica é intensamente detalhada, visando a alta capacitação do
performador, como também o melhor e o correto desempenho;
 A didática e a técnica propostas têm em mente não a performance, mas o
não erro. Ou: a performance resume-se na mais perfeita emulação do
modelo externo;
 Sobre a “emoção pessoal abstrata” (VAN HAUWE, 1984) não se fala, não
se coloca em discussão, pois num método não há diálogo, diferentemente
dos tratados mais antigos, construídos à maneira clássica greco-latina, em
formato de diálogo entre a experiência do mestre e a do aprendiz;
 No método musical, a técnica é tecida separadamente de todo o processo
criativo; sendo assim, a aquisição da técnica é objetivo e finalidade;
 A técnica é entendida como uma compreensão que o corpo tem daquilo
que será necessário ser realizado no cumprimento dos padrões externos
67

apresentados pelo texto musical e pelo criador (quase que anônimo) do


método;
 Os caminhos que cada performador trilha para acionar seu corpo no intuito
de cumprir esses objetivos são desconhecidos e considerados
desinteressantes, por não estarem diretamente conectados com o material
textual da música;
 O treino é mecanizado e torna-se o centro, o objetivo final do treinador e do
treinado;
 A performance restringe-se à habilidade em adequação ao treino
proposto pelo método, visando desempenho = execução. Busca-se o
acerto, evitando-se, a todo custo, o erro e o improviso (motivos para a
desqualificação). (BITTAR, 2012, p. 129, o grifo sublinhado é meu).

Após esta breve apresentação contextual do surgimento do méthode e de seus


desdobramentos dirigidos à performance musical, retomo o posicionamento “anti-método” de
Koellreutter, conforme é apresentado por Teca Alencar de Brito (2001). Brito enfatiza que o
professor guiava-se:

[...] prioritariamente pela observação e pelo respeito ao universo cultural, aos


conhecimentos prévios, às necessidades e aos interesses de seus alunos. A
participação ativa, a criação, o debate, a elaboração de hipóteses, a análise crítica, o
questionamento... sempre foram princípios básicos presentes em todas as situações
de ensino-aprendizagem propostas e/ou coordenadas por ele, posturas derivadas de
sua vivência, experiência e reflexão, de suas pesquisas, análises e críticas aos
modelos tradicionais de ensino. (BRITO, 2001, p. 29).

Seguindo nesta direção, Brito (2001) acrescenta ainda que:

Koellreutter sempre propôs a superação do currículo fechado, que determina


previamente os conteúdos a serem transmitidos, sem averiguar e avaliar
criteriosamente o que realmente é importante ensinar a cada aluno, grupo, em cada
contexto ou momento. [...] Desse modo, cabe ao educador facilitar situações para
uma aprendizagem autodirigida, com ênfase na criatividade, em lugar da
padronização, da planificação e dos currículos rígidos presentes na educação
tradicional. Mais do que programas que visam a resultados precisos e imediatos, é
preciso contar com princípios metodológicos que favoreçam o relacionamento entre
o conhecimento (em suas diversas áreas), a sociedade, o indivíduo, estimulando, e
não tolhendo o ser criativo que habita em cada um de nós. (BRITO, 2001, p. 31).

Observando a rigidez das características do método conservatorial identificadas por


Bittar (2012, p. 129) e relacionando-a com o posicionamento de Koellreutter apresentado por
Brito (2001), percebe-se que estes são, respectivamente, movimentos de ação e reação.
Enquanto que no método há um desinteresse pelo caminho pessoal do aprendiz e um treino
mecanizado para que se atinja metas impostas por um sistema (mentalidade), evita-se “a todo
custo, o erro e o improviso” sendo, estes, “motivos para a desqualificação” e construindo-se a
técnica separadamente do processo criativo, Koellreutter defende a valorização das
necessidades e dos interesses dos alunos proporcionando atividades com ênfase na
68

criatividade. Na contramão dos ideais de “correto desempenho” (BITTAR, 2012), da “mais


perfeita emulação do modelo externo” (BITTAR, 2012), Koellreutter propõe “uma
aprendizagem autodirigida [...] em lugar da padronização”.
Identifico, portanto, que a crítica de Koellreutter refere-se à mentalidade oitocentista e
ao “método conservatorial” (BITTAR, 2012). No entanto, o professor alemão-brasileiro se
refere, no meu entender, à realidade encontrada por ele em pleno final do século XX. Isso é
possível de se compreender, uma vez que, conforme afirma Bittar (2002, p. 34), a formação
musical atual ainda se dá “dentro dos princípios do método do Conservatoire [...]”.
Percebo que o pensamento de Koellreutter se faz importante para o rompimento com a
mentalidade do método conservatorial que, apesar dos esforços dos educadores musicais da
“primeira geração”, ainda resiste incrivelmente e que ainda se faz presente na educação
musical atualmente. Porém, no discurso de Koellreutter, parece que não são considerados os
movimentos de reação aos ideais oitocentistas dos pedagogos musicais do início do século
XX cujas propostas são referências de base da educação musical: os chamados “métodos
ativos” (FONTERRADA, 2005). Os “métodos ativos”, incluindo aqui a Rítmica, são
justamente uma reação a essa mentalidade do método e que trazem propostas práticas de
atuação didática, não se fixando rigidamente, na crítica ao método e na pura reação, embora
tenham sido esquecidos e não mais se fazem presentes na formação do futuro professor de
música no Brasil.
Nesta situação, percebo que a postura “anti-método” do professor Koellreutter,
mencionada anteriormente, pode resultar numa compreensão “míope” por parte dos
estudantes de Licenciatura em Música com relação ao passado, no qual Koellreutter, que
representa de forma significativa uma visão atual da educação musical, reforça o
entendimento de que a educação musical baseada em “modelos tradicionais de ensino” está
superada, afastando ainda mais os alunos de graduação dos “métodos ativos”, pioneiros na
reação ao método conservatorial preconizada pelos métodos oitocentistas, como já tratei
acima.
Compreendo o “não-método” de Koellreutter não como uma recusa a todas as ricas
ideias, abordagens e propostas já elaboradas, mas sim como uma postura tomada por aquele
professor que não pretende ser um aplicador de métodos. Entendo que Koellreutter expõe a
perspectiva de que o professor necessita constantemente desenvolver o pensamento crítico e
autonomia para, de primeiro, conhecer o seu aluno, seu grupo de alunos e identificar suas
próprias possibilidades de contribuição para a formação do aluno/aprendiz, levando em
69

consideração condições sociais, desejos, facilidades e limitações do aluno. Conforme afirma


Brito (2001):

O professor [Koellreutter] sempre defendeu como fator principal a necessidade da


presença do “espírito criador”, princípio vital ao ambiente necessário ao ensino
artístico. Presos a métodos e modelos programados, educadores acabam por minar o
espírito criativo, vivo e curioso que habita nos alunos (BRITO, 2001, p. 30).

Sob essa ótica, entendo que o professor de música necessita traçar um caminho em
direção ao conhecimento e à experiência das mais diversas formas existentes de se trabalhar
com a educação musical e ainda estar aberto e atualizado para a ampliação e criação
constantes de seus próprios modos de ensinar.
Em meu entender, a alienação quanto à história da educação musical, o desinteresse, a
indiferença e a ignorância para com os “métodos ativos” de educação musical podem
contribuir para o fechamento, para a limitação e para a imposição muito mais que as
estruturas rígidas de alguns métodos, pois considero que para “abrir, transcender, transgredir,
ir além”, enfim, para superar o método, é preciso conhecê-lo.
Seguindo esta reflexão a respeito dos “métodos ativos” e o impacto do pensamento de
Koellreutter na formação dos futuros educadores musicais, reforço que, como já mencionado,
compreendo que o conceito de “método” utilizado por Koellreutter se refere à mentalidade
rígida do método conservatorial e não necessariamente aos “métodos ativos” de educação
musical.
Deste modo, irei refletir criticamente na próxima seção sobre o uso do termo “Método
Dalcroze” para se referir à “Rítmica”, considerando que a proposta de Jaques-Dalcroze se
difere em muito da mentalidade de la méthode.

4.2 REFLEXÕES SOBRE O POSSÍVEL CARÁTER DE “MÉTODO” DA RÍTMICA


DALCROZE

Como já mencionado, Fonterrada (2005, p. 107-108) considera que dentre os


“métodos ativos”, nem todos podem ser considerados métodos, mas abordagens ou propostas.
Observando que a postura “anti-método” de Koellreutter pode fortalecer uma visão distorcida
sobre os “métodos ativos” e, mais especificamente, sobre a Rítmica proposta por Jaques-
Dalcroze, podendo assim repercutir num entendimento superficial de que estas são
pedagogias ultrapassadas e que “já não servem mais”, percebo a necessidade de explicitar o
caráter de reação aos ideais oitocentistas e, portanto, à mentalidade do método conservatorial,
presente na proposta pedagógica de Jaques-Dalcroze.
70

Dessa forma, proponho uma reflexão crítica a respeito da utilização do termo “Método
Dalcroze” para se referir à Rítmica, observando a ideia central da Rítmica como “negação de
um modelo pré-estabelecido” e como “experiência pessoal” (MADUREIRA, 2008, p. 36).
Nas obras consultadas, percebe-se que são usados diferentes termos para se referir à
proposta de Dalcroze: “Método Dalcroze” (MARIANI, 2011, p. 27); “sistema de educação
musical – denominado Rítmica (Rythmique)” e “Ginástica Rítmica ou simplesmente Rítmica
(Rythmique)” (MADUREIRA, 2008, p. XII e p. 3); “Pedagogia Dalcroze”, “Rítmica” e
“Rítmica Dalcroze” (MANTOVANI, 2009, p. 15, p. 18 e p. 41); “método chamado
31
‘eurritmia ’” (SUQUET, 2009, p. 515), “Dalcroze Eurhythmics” são alguns exemplos.
Segundo Madureira (2008, p. 73), Dalcroze se referia a seu sistema de educação
musical como “Ginástica Rítmica”. Porém, “para evitar confusões com outros sistemas de
ginástica fundamentados no ritmo, Dalcroze passou a denominar o seu método simplesmente
de Rítmica (La Rythmique).”
No entanto, mesmo não usando o termo “Método Dalcroze”, o próprio Jaques-
Dalcroze refere-se indiscriminadamente à Rítmica como “meu método” (MADUREIRA,
2005). Compreendo que é justamente por estar inserido num movimento de transição, que
Dalcroze não vê problema algum na palavra método, visto que as discussões a respeito da
“mentalidade do método”, por exemplo, são recentes (SANTOS, 2011; BITTAR, 2012).
Penso que, atualmente, o uso da palavra “método” está diretamente relacionado à
necessidade encontrada pelos criadores e difusores de algumas propostas de educação de
registrar as suas marcas (trademark) de forma que estas tenham grande impacto comercial no
“mercado da educação”. A palavra Method, neste caso, dá força às patentes de marcas, uma
vez que faz referência a algo que está bem estruturado e que tem comprovada eficácia.
Seguem alguns exemplos de utilização do termo método por algumas propostas de “métodos
alternativos” de educação e conscientização corporais na trademark: “Método DeRose”,
“The Feldenkrais Method of Somatic Education”, “Rolf Method Body Work”, “Método
GDS” – aqui, no caso, todos métodos de educação somática.

31
Neste caso, conforme afirma Madureira (2008, p. 3), a Rítmica, a proposta de educação musical de Dalcroze, é
confundida com a Euritmia, uma técnica de movimento corporal que nasceu como uma das muitas ferramentas
pedagógicas da Antroposofia e da Educação nas Escolas Waldorf construída por Rudolf Steiner. Conforme pude
confirmar pessoalmente com o professor Iramar Rodrigues na oficina “A Rítmica Dalcroze” em Caxias do
Sul/RS, esta confusão se deve a uma tradução errônea de Rythmique (do francês) para Eurhythmics (em inglês).
71

No sítio eletrônico do ijd – Institut Jaques-Dalcroze32 pode-se encontrar


frequentemente a utilização da expressão “la méthode Jaques-Dalcroze”, porém, não há uma
trademark, não há um símbolo que represente a proposta, como por exemplo: ®.
Provavelmente, o fato de não haver uma marca registrada atualmente para a Rítmica deve
contribuir para esta confusão quanto ao termo a ser utilizado para se referir à proposta de
Dalcroze.
Quando perguntei a Iramar Rodrigues, numa conversa informal33, se a Rítmica era um
método, o professor afirmou que Jaques-Dalcroze chamava sua proposta de método, mas que
atualmente não se compreende desta forma. Segundo o professor Iramar, a proposta “não é
um método, é uma pedagogia, uma maneira de se transmitir algo, seria uma metodologia”.
A tese de doutorado de José Rafael Madureira intitulada “Émile Jaques-Dalcroze
[sic]: sobre a experiência poética da rítmica: uma exposição em 9 quadros inacabados” (2008)
trata-se fundamentalmente, segundo o próprio autor, de um primeiro trabalho de tradução dos
pensamentos de Jaques-Dalcroze para o português. Em sua tese, Madureira (2008) não utiliza
o termo “Método Dalcroze”, por exemplo, o que pode ser percebido também em Fonterrada
(2005). Estes dois autores tratam o sistema de educação musical proposto por Jaques-
Dalcroze pelo nome dado pelo seu criador: “Rítmica”, tradução para o português de La
Rythmique.
Como mencionado, esta é uma questão de palavras e que percebo poder gerar
possíveis problemas de discurso que, por sua vez, acarretam uma série de desentendidos,
como, por exemplo, as posturas postas por Koellreutter e também por Jaques-Dalcroze com
relação às suas propostas e com relação ao “método”.
Segundo Orlandi (2000, p. 38), “todo dizer é ideologicamente marcado. É na língua
que a ideologia se materializa. Nas palavras dos sujeitos”. Para o mesmo autor (2000, p. 39),
do ponto de vista da relação de forças, as palavras ditas significam de formas diferentes
dependendo do lugar que o sujeito que as profere ocupa.
Dessa maneira, a questão se dá em como a palavra “método” significou
diferentemente para Koellreutter e para Dalcroze, como também para os educadores musicais
da atualidade no Brasil, por exemplo. Cabe ser levantado que o primeiro foi um ícone
importante para o trabalho da música de vanguarda brasileira, ao apresentar enfaticamente
bases de uma música que rompe com o sistema tonal/formal ocidental. Neste caso, a palavra

32
Disponível em: <http://www.dalcroze.ch/index.php?option=com_content&view=article&id=53&Itemid=61>.
Acesso em: 27 ago. 2014.
33
Num dos intervalos da oficina “A Rítmica Dalcroze” ocorrida em Caxias do Sul/RS de 16 à 19 de Outubro de
2014.
72

“método” já está incluída no mesmo “pacote” de significados das ideias que precisavam ser
superadas da música tradicional ocidental, significando, de antemão, um conceito que remete
a algo ultrapassado. Já Dalcroze está inserido historicamente no início do século XX, o que o
coloca numa relação diferente com as transformações que a música ocidental estava
enfrentando e com os significados e repercussões contrárias à sua postura que a palavra
“método” poderia desempenhar futuramente. Relacionando com Orlandi (2000):

Se toda vez que falamos, ao tomar a palavra, produzimos uma mexida na rede de
filiações dos sentidos, no entanto, falamos com palavras já ditas. E é nesse jogo
entre paráfrase e polissemia, entre o mesmo e o diferente, entre o já-dito e o a se
dizer que os sujeitos e os sentidos se movimentam, fazem seus percursos, (se)
significam. (ORLANDI, 2000, p. 36).

Desse modo, proponho algumas considerações na próxima seção sobre a afirmação de


que Dalcroze, assim como Koellreutter, apesar de algumas décadas de distância, são sujeitos
imersos num mesmo movimento de reação ao méthode: cada um a seu modo, em seu
contexto.

4.3 DALCROZE COMO REAÇÃO AO “MÉTODO”

Como mencionado, compreendo que Hans-Joachim Koellreutter e Emile Jaques-


Dalcroze têm, ambos, propostas reativas aos ideais oitocentistas do método conservatorial
ainda muito presentes na educação musical atual.
Neste sentido, identifico que há, inclusive, grande proximidade entre aspectos centrais
dos posicionamentos dos dois autores: a concepção de que a educação musical deve servir à
uma educação integral do ser humano e à superação dos “modelos tradicionais de ensino”
num caminho que valoriza a experiência musical.

4.3.1 “Educação integral” no pensamento de Dalcroze

De acordo com Brito (2001, p. 41), Koellreutter propunha uma educação musical
como um meio “que tem a função de desenvolver a personalidade do jovem como um todo
[...]”. Por sua vez, no início do século XX, Emile Jaques-Dalcroze já preconizava um conceito
mais abrangente de educação musical que buscava a direção de uma educação integral. Como
afirma Fonterrada (2005):

O que Dalcroze entende por educação musical ultrapassa o conceito comumente


atribuído a essa expressão, de ensino de música para crianças. Para ele, toda ação
artística é um ato educativo e o sujeito a que se destina essa educação é o cidadão,
seja ele criança, jovem ou adulto. Seu sistema, muito embora se dedique ao
73

desenvolvimento de competências individuais, pois é intensamente vivenciado pelo


aluno, num movimento integrado que reúne capacidades psicomotoras, sensíveis,
mentais e espirituais, é também pensado como agente de educação coletiva. E talvez
esteja aí a atualidade de sua proposta, pois o mundo contemporâneo só exacerbou a
necessidade de promover educação e cultura a todos, crianças, jovens e adultos,
questão que, nos dias atuais, mostra-se cada vez mais pertinente. (FONTERRADA,
2005, p. 116).

Para Madureira (2008, p. 31), na concepção de Jaques-Dalcroze, “o músico completo,


antes de mais nada, deveria ser um indivíduo completo, plenamente cultivado em todas as
suas faculdades sensíveis, imaginativas e intelectuais” (MADUREIRA, 2008, p. 31).

O sistema de educação musical a que Dalcroze chamou “Rythmique” (Rítmica)


relaciona-se diretamente à educação geral e fornece instrumentos para o
desenvolvimento integral da pessoa, por meio da música e do movimento. Além
desse propósito mais amplo, atua como atividade educativa, desenvolvendo a escuta
ativa, a voz cantada, o movimento corporal e o uso do espaço. (FONTERRADA,
2005, p. 118).

Penso que podemos encontrar e construir uma ponte, uma ligação entre as tomadas de
posição de Jaques-Dalcroze e os conceitos expostos algumas décadas depois pelo músico
alemão Koellreutter, principalmente no tocante à função da educação musical como
possibilidade de desenvolvimento integral do ser humano: “O humano, meus amigos, como
objetivo da educação musical” (KOELLREUTTER, 1998, p. 45 apud. BRITO, 2001, p. 42).

4.3.2 A Rítmica Dalcroze como uma reação ao “método”

‘A Rítmica é, antes de qualquer coisa, uma


experiência pessoal’. A afirmação atravessa,
ostinato, todos os escritos de Jaques-Dalcroze.
(MADUREIRA, 2008, p. 29).

Conforme afirma Madureira (2008), e como já comentei anteriormente, Jaques-


Dalcroze questionava a metodologia convencional de música justamente por observar a
dificuldade que seus alunos de Harmonia Teórica e Solfejo tinham em associar os conteúdos
teóricos com a prática musical. Teoria e prática eram âmbitos totalmente desvinculados neste
processo de ensino dominado por uma racionalidade científica.
Para Dalcroze (apud BERCHTOLD, p. 31 apud. MADUREIRA, 2008, p. 70),
sobretudo, o aluno deve receber primeiramente uma considerável educação musical
fundamentada no desenvolvimento da sensibilidade e das faculdades auditivas para depois ser
iniciada no conhecimento da teoria musical. A esse respeito, Jaques-Dalcroze afirma: “O
objetivo do meu ensino é permitir que os meus alunos digam, ao final de seus estudos, não
74

apenas “eu sei”, mas “eu sinto”, e depois, cultivar neles um desejo de auto-
expressão.” (JAQUES-DALCROZE, 1917, p. viii apud MADUREIRA, 2008, p. 70).
Ainda, segundo Dalcroze (1948):

O ensino tradicional da música geralmente começa pelo estudo dos sinais que
servem para anotar as melodias, os ritmos, os valores e os acordes. Não seria mais
lógico fazer o contrário, ou seja, estudar a notação somente no momento em que o
ouvido tenha aprendido a apreciar as relações entre as sonoridades, suas associações,
valores e nuances? Não seria estranho ensinar a criança a escrever antes que ela
saiba falar? (JAQUES-DALCROZE, 1948, p. 170 apud MADUREIRA, 2008, p.
69).

Dalcroze não tinha a pretensão de que a Rítmica fosse autossuficiente, ou mesmo que
tivesse como meta final o desempenho virtuosístico, mas compreendia que o seu “método”
tinha uma “técnica particular”.

Na verdade, a Rítmica possui, com toda certeza, uma técnica particular. No entanto,
as relações que estabelece com a arte coreográfica não são suficientes para garantir o
seu virtuosismo. Nosso sistema de solfejo também não é completo o bastante como
técnica vocal destinada aos cantores profissionais, assim como os nossos estudos de
improvisação não podem dispensar as técnicas especializadas de piano. A Rítmica
não é, do ponto de vista corporal, uma arte para virtuoses, ela é uma preparação para
as artes especializadas. Ela realiza a educação do sistema nervoso, suaviza os
músculos em todas as nuances de energia e duração e regula os movimentos
corporais naturais no tempo e no espaço (JAQUES-DALCROZE, 1926, p. 2 apud
MADUREIRA, 2008, p. 30-31).

Dalcroze tinha consciência da rigidez do ensino tradicional ao qual foi submetido na


escola:

A maior parte dos professores do colégio, desde a tenra idade, impunha-nos deveres
sem nos explicar o seu sentido e eles não faziam – salvo raras exceções – qualquer
esforço para nos conhecer, motivar ou ajudar (JAQUES-DALCROZE, 1948, p. 195
apud MADUREIRA, 2008, p. 33).

Em contraposição às experiências de iniciação musical através de “métodos” que teve


na infância, desde as aulas de piano aos seis anos de idade até as aulas de música que teve no
colégio, que visavam um desempenho meramente técnico e virtuosístico, Dalcroze buscou
elaborar exercícios que tivessem o caráter de jogo, de alegria e que garantissem aos alunos
que as lições de música “fossem uma alegria, não mais uma tortura”. (JAQUES-DALCROZE,
1907, p. 44 apud. MADUREIRA, 2008, p. 34).

Logo nos primeiros dias do colégio, eu acabara de entrar no 6º ano do clássico, eu


pensava somente nas lições de música que me aguardavam no final da semana. Eu
era tomado de contentamento mas, oh! que desilusão! O ensino era baseado no
75

método de Galin (Paris-Chevé), cujo iniciador parece ter sido Jean-Jacques


Rousseau. A música era numerada e os ritmos eram divididos pelas palavras ta, te,
ti constantemente repetidas. Sequer uma palavra sobre as sonoridades musicais,
sobre as melodias e harmonias, sobre as acentuações dinâmicas e temporais. Não
havia emoção ou estilo, nem qualquer citação das belas obras, em uma palavra: não
havia música. Recusei-me a cantar com os meus colegas e o austero professor me
interrogou sobre a razão do meu silêncio; respondi melodramaticamente: “Não canto
por serem esses exercícios demasiado estúpidos!”. Fui severamente punido e
classificado na categoria dos incapazes. Pobre música! Quantum mutata ab illa!
(JAQUES-DALCROZE, 1948, p. 22 apud MADUREIRA, 2008, p. 33).

Jaques-Dalcroze deixou grande quantidade de escritos nos quais se encontram o seu


pensamento estético-pedagógico em relação à música, à dança e à dramaturgia, bem como
composições para serem usadas na sua própria prática pedagógica e alguns cadernos
didáticos, mas, segundo Mariani (2011, p. 40), em todo seu legado musical-pedagógico, não
há um método sistematizado e escrito. Sendo assim, seus alunos rythmiciens34, a partir da
experiência vivida nas aulas de Rítmica junto a Dalcroze, “passaram a elaborar exercícios de
acordo com a realidade de seus alunos e a especificidade artística de cada grupo. Muitos
desses exercícios e experiências foram relatados na Revista Le Rythme, que teve grande
circulação na Europa no início do século XX”. Era desejo de Dalcroze que, uma vez
vivenciados, experienciados e compreendidos os princípios, a Rítmica pudesse ser
constantemente renovada pelos professores, adaptando-se às condições sociais e culturais dos
alunos. (MARIANI, 2011, p. 40).
Relacionando estas considerações a respeito da Rítmica Dalcroze com a minha
experiência de estágio, identifico que, quando me embasei na postura de Koellreutter de
reação ao “método”, conforme exposto na seção Projeto do relatório analisado (MEURER,
2014, p. 7-8), busquei uma abordagem na direção contrária dos “modelos tradicionais de
ensino”, traçando um caminho com princípios semelhantes aos de Dalcroze.
Seguindo por este caminho, esta reflexão gerou em mim a vontade de conhecer melhor
as propostas dos educadores musicais pioneiros dos “métodos ativos” e, mais
especificamente, as de Jaques-Dalcroze, dando origem a este capítulo do trabalho e me
motivando inclusive a participar da oficina “A Rítmica Dalcroze – Uma Educação Por e Para
a Música” em Caxias do Sul/RS com Iramar Rodrigues que ocorreu nos dias 16, 17, 18 e 19
de Outubro deste ano, podendo desta forma colocar um primeiro passo em direção à
experiência e ao conhecimento da Rítmica como vivência técnica, prática, em educação

34
Segundo Madureira (2008, p. 13): “Rythmicien é uma palavra francesa que indica o profissional ou o estudante
do sistema de Jaques-Dalcroze conhecido como Rítmica (Rythmique).”
76

musical que partisse da experiência do corpo, do corpo em movimento e do som, como


ferramentas fundamentais para a Educação Musical.

4.3.3 A Rítmica Dalcroze como técnica: esquecida, porém possível

A separação entre técnica e arte é um


componente fundamental do nosso estudo. Na
tradição de ensino do modelo mestre-aprendiz,
arte e técnica são sinônimos, se não dois lados
da mesma moeda (uma herança da origem
grega da palavra tékhne, que significava as
duas coisas). É a tradição do artesão, do
“artífice”, que, para transmitir sua “arte”, ou
“obra”, dispunha de sua “técnica” e de seu
próprio meio material, ou “instrumento”.
(SANTOS, 2011, p. 58).

Enxergo que a proposta de Koellreutter de um “não-método” e de que “É preciso


aprender a apreender do aluno o que ensinar” (BRITO, 2001, p. 31) poderia significar, por um
lado, num olhar desatento, que necessitaríamos continuamente estar criando, inventando
exercícios, atividades que fossem apropriadas para aquele aluno, ou aquele grupo, naquele
momento, naquele contexto. Esta situação gera a sensação de que precisamos a todo momento
“reinventar a roda”.
Nesta perspectiva, compreendo que a Rítmica Dalcroze surge como uma possibilidade
de abordagem prática (uma técnica) para as questões de ordem conceitual expostas por
Koellreutter de não-método e de valorização das experiências dos alunos. Ao aprofundar-me
nas propostas da Rítmica Dalcroze percebo que não se trata de um método, o que me permite
aproximar a Rítmica aos conceitos sobre didática musical buscados por Koellreutter, através,
sim, das ferramentas e técnicas contidas nas propostas “ativas” dalcrozianas. A respeito de
certo esvaziamento de ações e práticas pedagógicas, técnicas, que pudessem munir os
professores de música, como se pudessem ser um “ponto de partida”, provendo o professor,
através da experiência com a música, propriamente, de escolhas que o fizesse aproximar de
cada aluno e de cada classe, com suas necessidades particulares, Fonterrada (2005) afirma:

O esquecimento dos métodos ativos de educação musical vem sendo danoso ao


ensino de música no país, provocando duas posturas opostas: a de adotar um dos
métodos acriticamente e de maneira descontextualizada, descartando outras
possibilidades, e a de ignorar seus procedimentos, investindo em propostas pessoais,
geralmente baseadas em ensaio-e-erro e, em geral, privilegiando o ensino técnico-
77

instrumental (leia-se treinamento dos olhos e das mãos) ou a diversão, dentro do


pressuposto de que música é lazer35. (FONTERRADA, 2005, p. 108).

Prosseguindo junto às reflexões de Fonterrada (2005), percebo que faço parte deste
contexto e que a minha experiência, a qual exponho e sobre a qual reflito neste trabalho de
conclusão de meu curso de licenciatura em música, foi fruto, inclusive, da minha ignorância
para com os “métodos ativos”. Isto desencadeou em minha atuação como estagiário numa
“proposta pessoal”, de certa forma, baseada em “ensaio-e-erro” e que parte e partiu de uma
minguada experiência com a realização das propostas destes grandes pensadores da música do
século XX. Isto pode ser observado na fundamentação teórica, por exemplo, pois os dois
referenciais teóricos utilizados na seção Projeto do relatório não dizem respeito à prática em
si, às atividades a serem desenvolvidas: a primeira é de cunho conceitual - o pensamento de
Koellreutter - e a segunda de cunho organizacional - o Modelo C(L)A(S)P proposto por
Swanwick (1979). Em todo o trabalho de estágio, registrado em meu relatório, salta à vista a
falta de bases referenciais no que diz respeito a técnicas e ferramentas de trabalho em
educação musical.
Enxergo uma lacuna na minha formação como professor em música naquilo que diz
respeito exclusivamente aos procedimentos práticos, às técnicas, às ferramentas e propostas
práticas que, como entendo, estão bastante fundamentadas em “métodos ativos” como
também em propostas posteriores, originadas na “segunda geração”. Vejo que se partíssemos,
no período de nossa formação para futuro músico-professor, em direção a uma proximidade e
um aprofundamento para com a prática ativa destas metodologias as quais iniciaram seus
caminhos no início do século XX e, por serem em seu fundamento, baseadas no “fazer
musical", o que, em si, já lhes delega uma boa carga de flexibilidade e possibilidades de
transformações pessoais, poderíamos, aí sim, escolher um destes caminhos como início de um
fundamento particular, próprio. Deste modo, encontro na didática musical proposta por

35
O conceito de arte e música como lazer e entretenimento tem sua origem na mentalidade construída pela
“indústria cultural”, termo desenvolvido por Max Horkheimer e Theodor Adorno e no seu prolongamento atual,
o qual denomina-se “indústria do entretenimento”. Este conceito reduz a experiência em arte ao entretenimento e
ao lazer. Percebo que há uma prática e um discurso mais ou menos aceitos que caminham na direção de trazer
músicas presentes na grande mídia impostas pela “indústria do entretenimento” para as aulas de música, sob o
pretexto de “caminhar ao encontro da realidade musical do aluno”. Vejo inclusive que esta pode ser uma
interpretação possível da concepção de Koellreutter de que devemos ensinar “aquilo que o aluno quer saber”
(BRITO, 2001, p. 31), apesar de, eu mesmo, não a entender asim. Considero esta uma posição extremamente
comodista, pois há um esquecimento de que esse “desejo”, esse “querer” infantil, de que a memória musical
possa vir a ser um discurso condicionado culturalmente e o mesmo relativo às potencialidades “criativas”. A
música veiculada e imposta pela mídia já tem significado muito forte na vida da maioria das pessoas e, a partir
daí, entendo a escola como sendo um espaço onde se apontam outras possibilidades, onde se propiciam
experiências outras, para que os alunos possam vir a ter outras perspectivas, ganhem mais autonomia, “alarguem
a consciência”, confrontem-se com o “outro” e com as “diferenças”.
78

Jaques-Dalcroze uma abordagem da práxis docente para a musicalização, principalmente


porque Jaques-Dalcroze enxerga a música não separadamente das outras artes e este
posicionamento irá ser estendido também em suas ações.
Se o professor de música não deve ser um aplicador de métodos, isto não significa em
absoluto que ele não os deva conhecer. Entendo que não existam “receitas prontas” que
resolvam todos os problemas, sendo esta uma pretensão de “método”, porém, é inegável a
importância do conhecimento destas abordagens. Conforme afirma Figueiredo (2012):

[...] Cada um desses métodos tem a sua coerência interna. Eu posso não concordar,
mas há uma coerência. Há uma tentativa de tratar o fenômeno musical de maneira
organizada.
Essa é uma questão importante não apenas para os métodos tradicionais, mas para
qualquer estudo, qualquer matéria a ser levada para a escola. Temos de estudar mais
profundamente e entender os métodos. Vamos enxergar mais coisas novas do que
estamos acostumados. (FIGUEIREDO, 2012, p. 92).

Fonterrada (2005, p. 108) destaca a importância de que os educadores musicais


pioneiros sejam revisitados para se fortalecer a área da educação musical no Brasil, “não para
serem adotados tal como se apresentam em suas propostas de origem, mas como fonte vital,
da qual se podem extrair subsídios para propostas educacionais adequadas à escola e à cultura
brasileiras.”
79

CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Não decore passos; aprenda um caminho.”


Klauss Vianna

Quando estamos dentro de um processo de prática docente, temos que dar conta do
dia-a-dia, do planejamento das próximas atividades e, em muitas das vezes, estamos
escolhendo o caminho a ser seguido. Em minha experiência pedagógica aqui analisada, o
caminho não estava já determinado, foi escolhido ao caminhar. As reflexões feitas neste
trabalho de conclusão de curso se deram numa distância temporal à prática docente o que
possibilitou uma maior percepção do processo na sua totalidade.
O relatório de estágio se mostrou um bom instrumento de [auto]pesquisa. Nele está
presente a produção reflexiva pré-atuação, realizada na elaboração do projeto, e uma reflexão
que se dá durante toda a atuação mediante a elaboração dos planos e protocolos de cada aula.
Considero também que o documento possibilita a reflexão pós-atuação, tal qual feita agora na
realização deste trabalho.
Através da análise do relatório de estágio, pude verificar como se deram: 1) a minha
formação em licenciatura em música e 2) a construção de um caminho pedagógico. Também,
através do meu trabalho analítico-reflexivo sobre o relatório de meu estágio docente junto à
Oficina, pude verificar de que forma aquilo que estava preconizado como fundamentação
teórica teve sentido na prática e quais outros sentidos foram e puderam ainda ser
acrescentados a esta.
Ao elaborar este trabalho pude deparar-me com algumas questões necessárias para se
compreender o discurso de Hans-Joachim Koellreutter, o qual utilizei como fundamentação
conceitual da Oficina com relação a sua postura perante a educação musical. Percebo que a
reflexão aqui exposta sobre como a palavra “consciência” significa no discurso de
“alargamento da consciência” proposto por Koellreutter precisaria ser muito mais ampla, uma
vez que diz respeito a uma aproximação arbitrária e pessoal minha referente a um possível
entendimento do termo “consciência” do autor H.- J. Koellreutter, a respeito da utilização
deste termo junto às filosofias orientais com as quais, em determinados períodos de sua vida,
veio a travar contato.
Considero que o posicionamento questionador de Koellreutter pode servir para nós de
inspiração para uma postura crítica e reflexiva, como futuros educadores musicais, para que
busquemos entender com maior seriedade quais são os reais objetivos da educação musical.
No entanto, observo que, assim como no meu caso, geralmente se toma conhecimento das
80

concepções de educação musical de Koellreutter através das suas expressões de efeito e com
sentido amplo.
Na inexistência de textos do próprio autor em que sejam justificadas e esmiuçadas
estas frases e axiomas, considero que, mesmo que, obviamente, tenham sido proferidas
dentro de um contexto histórico-pessoal, estes posicionamentos de Koellreutter, por não terem
sido vivenciados pelas gerações de músicos que vieram depois de seus alunos, como Kater e
Brito, podem ser interpretadas de diversas formas, abrindo precedentes para entendimentos
possivelmente vagos e superficiais, e conferindo a estes posicionamentos um caráter
“profético” ou mesmo “bíblico”, “canônico”. Isto, de certa forma, dificulta a utilização das
ideias do autor para a fundamentação de um trabalho em educação musical.
O quarto capítulo deste Trabalho de Conclusão de Curso surgiu da necessidade de um
esclarecimento sobre o conceito de método. Essa minha necessidade de “explicar” o nome
método foi crescente na construção deste TCC pelo fato de que nos dois autores sobre os
quais fundamentei as Oficinas e os quais utilizo aqui como objeto de estudo, Jaques-Dalcroze
e H.-J. Koellreutter, são sinalizados como criadores de um “método”, no primeiro e de um
“anti-método” no segundo.
Ao contrário da possível interpretação de que haveria um antagonismo entre as
proposições de Koellreutter e Jaques-Dalcroze, pude perceber que ambos defenderam uma
ação pedagógica musical que nascesse da prática e da percepção, do fazer musical, para que,
posteriormente, se pudesse analisar e intelectualizar os conteúdos musicais. Desta forma,
considerei a Rítmica Dalcroze como possibilidade de abordagem prática para os
posicionamentos de Koellreutter de reação ao “método”, de expansão da consciência,
mudança do ser humano e valorização das experiências dos alunos. Apesar de que
Koellreutter, não diretamente, abordasse o corpo como centro de seus posicionamentos sobre
a formação do músico, a sua postura perante a música, de maneira geral, pôde me encaminhar
para a construção de um conceito onde educação e formação musical caminham de mãos
dadas com a percepção e a sensibilização do corpo.
Sendo assim, na construção deste trabalho percebi ser necessário um aprofundamento
nas propostas de uma educação musical que partisse do corpo, propostas estas que
intuitivamente realizei em minha experiência de estágio e que me direcionaram para a Rítmica
Dalcroze.
Entendendo este trabalho como fruto de uma busca por maior coerência na relação
entre teoria e prática pedagógicas, considero que ter escrito este Trabalho de Conclusão de
Curso pôde contribuir de forma positiva à minha formação como futuro professor de música,
81

pois nele pude partir de uma prática minha, analisá-la e refletir sobre a fundamentação teórica
utilizada, bem como, a partir desta análise, identificar quais outras referências poderiam me
ajudar a pensar as aulas de música.
82

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ZABALZA, Miguel A. Diários de Aula - um instrumento de pesquisa e desenvolvimento


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85

APÊNDICE A – MARCHA SOLDADO (PARTITURA)


86

APÊNDICE B – BAIÃO (PARTITURA)


87

APÊNDICE C – ESTRUTURA DA ATIVIDADE DE IMPROVISO


88

APÊNDICE D – RODA DE DANÇA: CRAVO E CANELA (OPÇÃO 1)


89

APÊNDICE E – RODA DE DANÇA: CRAVO E CANELA (OPÇÃO 2)


90

APÊNDICE F – RODA DE DANÇA: CRAVO E CANELA (OPÇÃO 3)


91

APÊNDICE G – RODA DE DANÇA: CLIMBIN’UP THE MOUNTAIN


92

APÊNDICE H – RODA DE DANÇA: BAIÃO (OPÇÃO 1)


93

APÊNDICE I – RODA DE DANÇA: BAIÃO (OPÇÃO 2)


94

APÊNDICE J – RODA DE DANÇA: CIO DA TERRA


95

APÊNDICE K – RELATÓRIO FINAL DE ESTÁGIO

UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC


CENTRO DE ARTES - CEART
LICENCIATURA EM MÚSICA
ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO III
PROFESSORA DA DISCIPLINA: CECÍLIA MARCON PINHEIRO MACHADO
PROFESSORA ORIENTADORA: SIMONE GUTJAHR

RAFAEL PRIM MEURER

RELATÓRIO FINAL DE ESTÁGIO:


OFICINA DE MÚSICA PARA CANTORES

FLORIANÓPOLIS
2014
96

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 3

2 PROJETO ................................................................................................................. 3

2.1 JUSTIFICATIVA ....................................................................................................... 3


2.2 MOTIVAÇÃO PESSOAL .......................................................................................... 4
2.3 OBJETIVOS .............................................................................................................. 4
2.3.1 Objetivo Geral .......................................................................................................... 4
2.3.2 Objetivos Específicos ................................................................................................ 5
2.4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .............................................................................. 5
2.5 METODOLOGIA....................................................................................................... 7
2.6 CRONOGRAMA ....................................................................................................... 8

3 ESTÁGIO DE OBSERVAÇÃO ............................................................................... 9

3.1 PROTOCOLO DE OBSERVAÇÃO N° 1................................................................... 9


3.2 PROTOCOLO DE OBSERVAÇÃO N° 2................................................................. 10

4 ESTÁGIO DE ATUAÇÃO ..................................................................................... 11

4.1 PLANO DE AULA 1 ............................................................................................... 11


4.1.1 Protocolo ................................................................................................................. 13
4.2 PLANO DE AULA 2 ............................................................................................... 15
4.2.1 Protocolo ................................................................................................................. 17
4.3 PLANO DE AULA 3 ............................................................................................... 18
4.3.1 Protocolo ................................................................................................................. 21
4.4 PLANO DE AULA 4 ............................................................................................... 22
4.4.1 Protocolo ................................................................................................................. 25
4.5 PLANO DE AULA 5 ............................................................................................... 26
4.5.1 Protocolo ................................................................................................................. 29
4.6 PLANO DE AULA 6 ............................................................................................... 29
4.6.1 Protocolo ................................................................................................................. 31
4.7 PLANO DE AULA 7 ............................................................................................... 32
97

4.7.1 Protocolo ................................................................................................................. 35


4.8 PLANO DE AULA 8 ............................................................................................... 35
4.8.1 Protocolo ................................................................................................................. 37
4.9 PLANO DE AULA 9 ............................................................................................... 38
4.9.1 Protocolo ................................................................................................................. 39
4.10 PLANO DE AULA 10.............................................................................................. 39
4.10.1 Protocolo ................................................................................................................. 40
4.11 PLANO DE AULA 11.............................................................................................. 41

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 43

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................... 44


3

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho, intitulado “Relatório Final de Estágio”, apresenta o projeto, os


protocolos de observação e os planos de aula com seus devidos protocolos da atuação docente
prevista como uma das atividades da disciplina de Estágio Curricular Supervisionado III. Por
fim, são apresentadas as considerações finais.
Esta atuação se deu por meio da Oficina de Música para Cantores vinculada ao Coral
UDESC, sendo oferecida como uma formação complementar aos coralistas que tiveram
poucas vivências musicais, principalmente no que diz respeito à leitura e à percepção
musicais e que tem interesse em desenvolver-se neste âmbito. A Oficina foi ministrada pelo
autor deste texto, o acadêmico Rafael Prim Meurer da sétima fase do curso de Licenciatura
em Música, orientado pela prof.ª Simone Gutjahr e supervisionado pelo próprio regente do
Coral UDESC e professor da mesma instituição prof. Sergio Figueiredo.
O Coral UDESC é um órgão setorial coordenado pelo professor Sergio Figueiredo
desde 2006 do qual participam tanto alunos e professores de diversos cursos oferecidos pela
UDESC, quanto pessoas da comunidade. Atualmente o coral ensaia às segundas-feiras das
19h às 21h30min.
Eu participei do Coral UDESC há dois anos e inclusive já fui bolsista do mesmo.
Portanto, posso dizer que conheço de perto a forma de trabalhar, os princípios, as expectativas
do regente e também dos coralistas. Atualmente participo deste coral como coralista e
também como aluno, desenvolvendo atividades da disciplina de Prática de Regência III,
ministrada pelo próprio Sergio. Nesta disciplina trabalha-se com o repertório deste coral, entre
outros repertórios, para que os alunos sejam capazes de fazer ensaios de naipe das músicas e
possivelmente reger o coro. Isso significa que estou triplamente envolvido com este campo de
estágio: como estagiário (ministrando a oficina), como coralista e como aluno da disciplina de
Prática de Regência III.

2 PROJETO

2.1 JUSTIFICATIVA

O Coral UDESC tradicionalmente oferece 20 vagas para bolsistas. Os bolsistas,


atualmente, formam, para além do grande grupo que ensaia as segundas-feiras, um grupo
concomitante que ensaia às quartas-feiras um repertório diferente, além do próprio repertório
do coro maior.
4

No entanto, essas vagas para bolsistas raramente são preenchidas totalmente. Há pouca
procura. Por isso, algumas vagas são preenchidas com pessoas que tem pouca experiência
com leitura musical e que são de outros cursos, principalmente do curso de artes cênicas.
Essas pessoas são incentivadas a participarem da oficina, sendo uma das causas que justifica
esta Oficina neste contexto.
Este coral não faz teste de seleção para participar do mesmo e neste semestre entraram
muitos novos integrantes no coro que tem pouca experiência musical. Serão estes que
formarão, a princípio, a maioria dos participantes da Oficina, visto a grande procura que
tivemos quando foi anunciada a realização desta. É importante dizer que esta Oficina se
justifica não só pela necessidade dessas pessoas se desenvolverem musicalmente para terem
uma experiência melhor no coro, mas pela vontade saírem mais cedo de suas casas para
aprender coisas novas.

2.2 MOTIVAÇÃO PESSOAL

Nas disciplinas iniciais de Prática de Regência do curso de Licenciatura em Música,


coincidentemente ministradas consecutivamente pela orientadora prof.ª Simone Gutjahr e pelo
supervisor prof. Sergio Figueiredo neste estágio, despertei certo interesse pela atividade de
regência. Minha pretensão inicial, portanto, era atuar neste coro em seus ensaios: regendo,
fazendo ensaios de naipe, aquecimento, atividades dentro do ensaio. No entanto, surgiu a ideia
de fazer uma Oficina de Leitura e Percepção, sendo uma sugestão do professor Sergio
Figueiredo. Logo de inicio me senti motivado a ministrá-la.
O próprio objetivo inicial da oficina já é fonte de motivação. É possível que boa parte
dos participantes tiveram pouca ou nenhuma experiência musical formal, e através da oficina
terão oportunidade de conhecer mais de perto um universo musical, principalmente quanto à
leitura e percepção.

2.3 OBJETIVOS

2.3.1 Objetivo Geral

A partir do repertório desenvolvido nas atividades do Coral da UDESC,


instrumentalizar musicalmente os participantes que tem pouca ou nenhuma vivência musical
aprimorando a consciência e consequentemente a execução musical e vocal.
5

2.3.2 Objetivos Específicos

 Desenvolver a leitura musical.


 Desenvolver a percepção musical.
 Ampliar a apreciação musical.

2.4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Filosoficamente esta oficina esta identificada com a postura de Hans-Joachim


Koellreutter: “A música é, em primeiro lugar, uma contribuição para o alargamento da
consciência e para a modificação do homem e da sociedade” (BRITO, 2001, p.26).
Koellreutter define consciência como a capacidade do homem de aprender os
sistemas de relações que o determinam: as relações de um dado objeto ou processo a
ser conscientizado com o meio ambiente e o eu que o aprende; não se refere à
consciência como conhecimento formal, nem como mero conhecimento ou qualquer
processo de pensamento, mas, sim, como uma forma de inter-relacionamento
constante, como um ato criativo de integração. (BRITO, 2001, p.47)

Por esta razão, o foco desta oficina está nos alunos e nos seus processos de
aprendizagem. Visando uma atividade ativa dos mesmos para que possam criar relações do
objeto de estudo e os seus processos de aprendizado com as atividades desenvolvidas no
Coral UDESC e com eles próprios. Segundo Koellreutter, “o professor não ensina nada; ele
sempre conscientiza” (BRITO, 2001, p.47). Nesta perspectiva, o professor não é o detentor do
conhecimento que vai depositar a quantidade exata em cada aluno, mas sim é o vetor que
orienta e coordena.
A proposta desta oficina é inspirada e embasada no Modelo C(L)A(S)P proposto por
Swanwick no livro A Basis for Music Education (1979). Como está bem representado
graficamente na sigla C(L)A(S)P, Swanwick enfatiza a importância e o foco da experiência
musical nas atividades de composição “C”, apreciação “A” e performance “P”, considerando
a aquisição de habilidades “(S)” (skill acquisition) e os estudos acadêmicos “(L)” (literature
studies) como atividades subordinadas ou periféricas (FRANÇA, 2002, p.17).
Dentro deste Modelo, essas cinco formas de experiência musical devem estar
integradas e equilibradas dentro de um programa de educação musical. Objetiva-se um
equilíbrio entre as atividades que não diz respeito à quantidade, mas sim a qualidade. As cinco
não precisam estar todas numa mesma aula, o importante é o professor proporcionar que os
alunos tenham essas experiências no decorrer das atividades (FRANÇA, 2002).
6

Como mencionado anteriormente, esta oficina está vinculada ao Coral UDESC. Neste,
os coralistas experienciam basicamente a performance “P” e a aquisição de habilidades “(S)”,
sendo esta última diretamente relacionada aos desafios da primeira.
Portanto, à luz do Modelo C(L)A(S)P, num desejo de complementar a formação
musical dos coralistas participantes, poder-se-ia concluir que esta oficina pode contribuir no
que diz respeito às experiências de composição, apreciação e de estudos acadêmicos. Esta
afirmação é verdadeira, porém, é necessário destacar que o foco da mesma é, na verdade, a
aquisição de habilidades, só que, neste caso, as habilidades estão relacionadas à compreensão
e à apropriação da escrita musical. E a performance na oficina será um dos “carros chefe”
através de vivências e experiências direcionadas às habilidades a serem adquiridas.
Desta forma, considerando tanto as atividades de ensaio do Coral UDESC quanto as
atividades da Oficina, pretende-se oportunizar aos coralistas uma experiência musical
abrangente e integrada para que possam tornar mais rica, proveitosa e significativa a sua
participação como cantores dentro do coral.
Em consonância com o princípio do Modelo C(L)A(S)P de Swanwick, o autor João da
Cunha Caldeira Filho (1971) afirma que há uma tríplice expressão pela música: compor,
executar e ouvir.
Educação musical é portanto aquela que tem por fim tornar o indivíduo apto a
exprimir-se musicalmente pela composição, interpretação e audição. A primeira via
é apanágio dos compositores; a segunda, dos intérpretes, e a terceira, geral e não
técnica no sentido artístico, manifesta-se pelo ato de ouvir. (CALDEIRA FILHO,
1971, p. 11).

Neste sentido, poder-se-ia dizer que esta oficina visa desenvolver a segunda expressão
do ciclo da obra de arte musical, o da execução. Isso não é totalmente incorreto. No entanto,
no processo de aprendizado, cada uma das expressões é complementada pelas demais, e, cada
uma das expressões contém elementos das outras. Sendo assim, existem processos necessários
de composição e de apreciação dentro da performance musical que serão abordados nesta
oficina.

Em uma abordagem integrada e coerente da educação musical na qual as crianças


compõem, tocam e ouvem música, as fronteiras entre os processos musicais
desaparecem. Quando elas compõem, por exemplo, não há como deixarem de
aprender enquanto performers e ouvintes, tanto quanto como compositores. Isso é a
interdependência (Mills 1991, p. 88, apud. FRANÇA, 2002, p.16).

Essas relações entre as diferentes atividades musicais são evidentes, mas o processo
deve ser direcionado a fim de valorizar essas relações, a interdependência.
7

2.5 METODOLOGIA

Teca Alencar de Brito em seu livro “Koellreutter educador: o humano como objetivo
da educação musical” conta um princípio de seu professor: “‘Meu método é não ter método’,
disse-nos o professor inúmeras vezes. ‘O método fecha, limita, impõe... e é preciso abrir,
transcender, transgredir, ir além...’” (2001, p.29).
Os métodos tem o foco no ensino, ou seja, na atividade do professor. Como essa
oficina tem o foco no aprendizado dos participantes, não se utiliza de nenhum método. Ela
está sim embasada no modelo C(L)A(S)P que não se propõe a ser método, e não o é. É apenas
um princípio de integração e equilíbrio da experiência musical, que pode se dar de diferentes
maneiras.
O estudo do que se chama comumente de “Teoria da Música”, quando não
informalmente entre músicos, se dá formalmente nos cursos de Teoria da Música oferecidos
nas escolas de música, com diversas finalidades. Nesses cursos o que geralmente é ensinado
primeiramente é aquele conhecimento que envolve o decifrar e a apropriação da escrita
musical, em seguida vem conteúdos como construção dos acordes, relações tonais, escalas...
Sendo assim, posso afirmar que um dos objetivos desta oficina é assimilação dos conteúdos
desta primeira parte relacionada à leitura e escrita.
Da mesma forma, existem cursos de Percepção Musical, estes mais restritos,
geralmente são encontrados nos cursos de graduação em música. Mas, nesta oficina o termo
“percepção” está relacionado com habilidades perceptivas inerentes ao canto coral como:
afinação com o grupo, sonoridade e a expansão da consciência musical e vocal.
No entanto, esta oficina é em suma diferente de um curso de Teoria da Música
tradicional, com aulas expositivas sobre o assunto, seguindo uma apostila ou um dos livros
tradicionais. E é diferente também dos cursos de Percepção Musical, onde há um treinamento
técnico que pode não se relacionar com o que os participantes fazem como seres musicais.
Esta oficina parte da prática musical.
Todos os integrantes estarão envolvidos numa mesma prática musical, que é o Coral
UDESC, e toda a atividade estará voltada para as necessidades dos coralistas com relação ao
repertório e as atividades feitas nesta prática comum. Dessa forma os participantes já vão
encontrar certo significado para os conteúdos e habilidades que serão adquiridas, pois estarão
vinculados diretamente a uma prática da qual todos fazem parte.
8

A estrutura não é fragmentada por conteúdos ou habilidades técnicas, mas sim os


conteúdos e estas habilidades de percepção permeiam as atividades que são desenvolvidas a
partir do repertório trabalhado nos ensaios objetivando o aprendizado dos integrantes.
As atividades são essencialmente de práticas musicais que estarão focadas na vivência
e na experiência dos participantes, diferentemente de aulas expositivas tradicionais. Desta
forma, busca-se uma experiência ativa, integrada, significativa, contextualizada, na qual os
conhecimentos não são depositados, mas sim experienciados.
Através do repertório do Coral UDESC as atividades serão compostas essencialmente
de performance, leitura (foco na assimilação dos conteúdos necessários), apreciação e
composição, buscando sempre manter cada aula equilibrada e integrada nessas diferentes
vivências musicais. Como complemento das atividades desenvolvidas em aula, serão enviados
materiais teóricos a respeito dos temas abordados naquela semana.
Para que eu e cada participante possamos acompanhar o seu próprio processo de
desenvolvimento, bem como seu estado atual neste âmbito, serão realizados três registros
durante o semestre. Serão como os tipicamente chamados “ditados musicais”, apesar de que
não darei essa intenção e nem usarei este termo. Trata-se mais de um registro de melodias que
já estão assimiladas, que podem ser trechos do repertório ou mesmo melodias folclóricas
conhecidas. Um logo no início, na primeira atividade mesmo, outro no meio do processo e
outro no fim do semestre (vide cronograma), sendo o primeiro mais livre, e os outros dois
mais direcionados.
Está previsto também que em todas as aulas haverá atividades de apreciação
propriamente ditas.
A Oficina iniciará suas atividades no dia 07 de Abril, sendo uma vez por semana
sempre às segundas-feiras, das 18h até às 19h, ou seja, uma hora antes do ensaio do próprio
coral.
2.6 CRONOGRAMA

24/03 Observação
31/03 Observação
07/04 1ª atividade
14/04 2ª atividade
28/04 3ª atividade
05/05 4ª atividade
12/05 5ª atividade
19/05 6ª atividade
26/05 7ª atividade
02/06 8ª atividade
9

09/06 9ª atividade
16/06 10ª atividade
23/06 Não houve atividade devido ao jogo do Brasil na copa.
30/06 11ª atividade

3 ESTÁGIO DE OBSERVAÇÃO

3.1 PROTOCOLO DE OBSERVAÇÃO N° 1

Data: 24/03/2013
Horário: 19h às 21h30min

Primeira observação... Que nada!


Vejo ser necessário explicitar que, na verdade, observo o Coral da UDESC há pelo
menos dois anos.36 Por tanto, conheço bem o regente Dr. Sergio Figueiredo, as regentes
auxiliares, muitos dos integrantes do coro, ou seja, estou já bem contextualizado no meio.
Essas observações se fazem necessárias para que eu possa acompanhar um pouco melhor o
processo dos novos integrantes do coro que serão, em suma, os que participarão da oficina
que ministrarei e também para que eu tenha tempo de elaborar o projeto deste estágio com os
cuidados e o carinho necessários.
Sendo assim, observemos:
Muito do que é feito em conjunto na vida humana acaba por caracterizar-se como
ritual. Isso se deve muitas vezes às normas, acordos e regras estabelecidos para que haja o
encontro. Refiro-me à palavra “ritual” de uma forma mais abrangente e não específico como
um ritual religioso, secreto, mágico... falo dos rituais comuns da vida. Antes de começar a
atividade do ensaio, já podemos observar um fato recorrente: as pessoas se aglomeram no hall
do Departamento de Música da UDESC gerando o burburinho, aquela situação onde as
pessoas se encontram, conversam, trocam cumprimentos, olhares e sorrisos. Isso já é um
clima característico do pré-ensaio, um ritual natural e descompromissado.
“Vamos entrar, pessoal?”
O ensaio em si começa quando todos entram no auditório e relativamente distribuídos
entre os bancos, aos comandos de Simone Gutjahr - que é preparadora vocal do coro e
também minha orientadora -, começam os exercícios de alongamento, respiração, vocalizes,
percepção vocal e musical. Creio que esta primeira parte dura em torno de trinta minutos e

36
Isso está mais bem descrito na Introdução deste projeto.
10

serve para as pessoas olharem um pouco para si mesmas, para seu corpo, sua voz, também
serve de “ritual” de concentração para as atividades que vem logo em seguida.
O regente Sergio Figueiredo assume então a condução das atividades dando avisos e
fazendo comentários referente principalmente aos que estavam chegando pela primeira vez no
coro - neste dia, muita gente estava ali pela primeira vez - orientando para não se
preocuparem com nada, que mesmo não tendo experiência, todos poderiam cantar e, com
certeza, se desenvolverão.
Foram passadas as músicas “Baião de Ninar” e “Cravo e Canela”. E depois o grande
grupo se desfez para realizar ensaios de naipe da música “Cio da Terra”.
Como parte da disciplina de “Prática de Regência III”, eu tenho atividades no próprio
Coral da UDESC que são determinadas pelo próprio regente e professor desta disciplina -
Sergio Figueiredo. Neste dia, até meio de surpresa para mim, Sergio perguntou, na hora do
ensaio, se eu poderia realizar o ensaio de naipe dos tenores, e claro, eu aceitei. Como já havia
estudado bastante a música, foi até tranqüilo fazê-lo, mas se estivesse consciente que o faria,
talvez o tivesse feito mais organizadamente. No entanto, a impressão que tenho é que o recado
do Sergio foi: “se você pretende ser regente, fazer um ensaio de naipe deve ser uma
brincadeira de criança”. E sinto que teve um impacto positivo, pois eu fiquei tranqüilo, até
porque eu era capaz de fazê-lo.
Após o ensaio de naipes, todos retornaram ao auditório ensaiamos as músicas agora no
palco do mesmo.

3.2 PROTOCOLO DE OBSERVAÇÃO N° 2

Data: 31/03/2013
Horário: 19h às 21h30min

Mais um ensaio, aprimoramento, rotina, disciplina.


A estrutura básica do ensaio descrita no protocolo anterior permanece em todos os
ensaios, e assim o foi neste dia: 1) exercícios de alongamento, respiração, vocalizes... 2)
Ensaio do repertório no grande grupo ou em naipes.
Então, foi tudo igual...!?
Não. Nunca é igual. A estrutura é semelhante até para se criarem os hábitos do ensaio.
A primeira parte tem exercícios que se repetem, o que é importante para a assimilação e
aprimoramento dos mesmos, mas sempre tem exercícios diferentes com desafios diferentes. E
11

a segunda parte que diz respeito ao ensaio propriamente dito das músicas geralmente tem
sempre dinâmicas específicas para aquele dia, para aquela música.
E, como numa peça musical, houve uma “variação sobre o tema”. Logo depois da
primeira parte, ao invés de sentarmos cada um no seu lugar, o regente convidou os homens,
baixos e tenores, para subirem no palco do auditório de frente para as mulheres, explorando
assim uma disposição diferente da usual. Imagino que o regente tinha a intensão de que
pudéssemos escutar-nos sob outra perspectiva e nos olharmos e percebermos questões de
expressão corporal, abertura da boca nos colegas. Nessa disposição ensaiamos a música
“Baião” de Edino Krieger fazendo o cânone.
Sentamos todos no nossos lugares e o regente passou a letra da música que comento a
seguir e depois tivemos 15min de intervalo.
Vai que é tua, Rafael!
Como aluno da Prática de Regência III fiquei incumbido de realizar o ensaio de naipe
dos tenores de uma música cuja primeira parte já havia sido ensaiada em naipes num outro
ensaio, mas para alguns que ainda não pertenciam ao grupo esta era a primeira vez que
estavam ensaiando-a: Climbin’up The Mountain. O ensaio ocorreu bem e considerando que a
letra estrangeira foi trabalhada em separado com todos juntos pelo regente, quando nos
separamos para o ensaio de naipe, somente reforcei questões de pronúncia e partimos para a
junção da letra com a melodia ensaiando a música do começo ao fim: sentados, em pé, bem
piano, agora mais acelerado. Creio também que não cabe tanto avaliar em maiores detalhes a
minha performance neste protocolo. Assim como foi no outro ensaio, percebo que essas
experiências estão sendo importantes para a minha formação como professor/regente/ser
humano.
“Por hoje é só, pessoal.”
Após os ensaios de naipe, todos se reuniram novamente no auditório onde ensaiamos a
“Climbin’up The Moutain” e “O Cio da Terra” com o regente fazendo apontamentos do que
deve ser aprimorado.

4 ESTÁGIO DE ATUAÇÃO

4.1 PLANO DE AULA 1

Data: 07/04/2014
Horário: 18h – 19h

Repertório:
12

Baião / Edino Krieger


Climbin’up The Mountain
Cio da Terra

Conteúdos Musicais:
Forma, compasso, classificação vocal e disposição das vozes na partitura,
funcionamento básico da escrita musical.

Recursos Didáticos:
Aparelho de som, gravação do Coral UDESC cantando o Cio da Terra, gravação de
Climbin’up The Mountain com sopros, folhas, lápis, canetas.

Atividades:
1. Climbin’up The Moutain (20min)
Convido a todos para formarem um círculo, ou um ovo conforme for possível na sala
16. Chamo todos a fazer o que vou fazer: 8 passos para a esquerda, 8 para a direita, 4 para a
esquerda, 4 para a direita, 2 para a direita, 2 para a esquerda. Nas primeiras vezes, contarei
junto os números dos tempos, mas depois executaremos tudo em silêncio.
- Agora, vamos ficar só no quatro. (quatro tempos/passos para cada lado)
(...)
- Isso é um compasso quaternário, ou seja, de quatro tempos cada.
Ponho a gravação da música Climbin’up The Mountain com sopros
Vamos ficar repetindo, pelo menos duas vezes, até que eu vou indicar o momento em
que acrescentaremos o andar para frente e para trás, também 4 passos para cada movimento.
(...)
- Portanto, quantos compassos tem essa melodia?

2. Registrar (10min)
Entregar algumas folhas de papel, lápis, caneta e pedir que registrem como acharem
mais adequado a música “Baião” que acabamos de vivenciar.
Comunicar o grupo que este registro será refeito na metade curso e também no fim do
mesmo, afim de que todos possam acompanhar seu desenvolvimento e também para que eu
possa ter um retorno do aprendizado de cada participante.
13

3. Apreciar (10min)
Ouvir gravação do próprio Coral da UDESC cantando “Cio da Terra”. Discutir a
respeito (abrir para discussão, o que se pode dizer dessa peça? O que se consegue analisar?
levantar questões importantes de serem percebidas: o que está bom, o que pode melhorar, por
quê?)

4. Classificação vocal (10min)


Mostrar a partitura no projetor do “Cio da Terra” e problematizar: o que vocês tem a
me dizer sobre essa partitura? Onde está a sua voz?
Acompanhar 2 vozes individualmente, uma de cada vez, e, enquanto acompanha na
partitura, ir evidenciando elementos importantes para compreender aquela partitura:
ritornello, ligaduras, notas longas/curtas, tercina, casa 1 / casa 2.
Se der tempo, no fim, fazer uma leitura como se fosse uma “linha de regência”,
acompanhando as entradas ou movimentos importantes de atenção.

5. Conversa (10min)
Tempo para esclarecer algumas coisas
Condição de estagiário.
Esclarecer os objetivos iniciais da Oficina e que, pode-se mudar os rumos conforme as
necessidades dos integrantes e do próprio Coral.
Certificado?
Qual a melhor comunicação: e-mail ou FACEBOOK?
Tempo para o pessoal conferir seus dados.

Material complementar a ser enviado por e-mail:


Teoria da Música / Bohumil Med – o início do cap. sobre compasso, p.114-115.

4.1.1 Protocolo

Como o planejado.
Fizemos tudo que foi planejado. Tudo ocorreu de forma fluida. Senti que estava
bastante concentrado e que sabia bem quais atividades eu queria fazer, como fazer e o que
queria com elas. Houveram alguns pontos técnicos: na hora o cabo do som estava
desconectado (eu havia desconectado antes e esqueci de conectar), na lista de reprodução do
14

Windows Media Player haviam duas músicas, e sempre que terminava uma, começava a
outra, mas isso causou na verdade boas risadas.
Num momento, algumas pessoas tiveram que sair das suas cadeiras para poder ver a
projeção, mas isso não foi nenhum inconveniente. Algumas pessoas mais jovens se sentiram
muito a vontade e sentaram no chão, outros permaneceram em pé e muitos puderam
permanecer sentados.
Foi uma atividade muito boa. Eu gostei muito de como as pessoas se envolveram nas
atividades e, pelo que percebi, elas também gostaram. Eu já estava animado, agora estou
ainda mais.
Apreciação
Nessa seção, após ouvirmos a gravação, perguntei se tinham algo a dizer a respeito do
que acabaram de ouvir: alguns comentaram questões com relação ao resultado sonoro (que
não conseguiam ouvir nos ensaios quando estavam cantando, por estarem muito concentrados
nas suas linhas; que perceberam que várias vezes o som estava embolado). “Mas e com
relação à música em si? Deixemos a nossa interpretação um pouco de lado. O que acontece
primeiro?” A partir daí, comentamos a respeito da classificação vocal.
Atividade!
Nessa oficina espero uma relação totalmente ativa dos participantes, e é isso que está
acontecendo. Eles fazem muito, e eu oriento, coordeno, observo e, claro, quando é preciso,
explico.
A Conversa
Na conversa que tivemos no fim da atividade, pedi sugestões. Falaram de enviar as
partituras por e-mail e muitos se interessaram em que eu mande por e-mail materiais teóricos
a respeito dos conteúdos abordados na oficina.
A Senhora
Uma senhora participante que diz ser formada em comunicação e ser professora de
português, fez algumas sugestões: listar, por música, os diversos signos que eles tem que
saber, e lá escrever o conceito, para que serve... mas acho que isso não vai ajudar as pessoas a
cantarem melhor, e esse não é foco da oficina, pelo menos agora. Creio que ela pensou que,
com a olhada rápida que demos em aula na música Cio da Terra, eu já esperava que ela
tivesse compreendido tudo que lá está presente. Também por isso, deixarei claro num e-mail
pros participantes qual a intenção daquele exercício.
Será?
15

Tive uma percepção: Logo no início, quando convidei a todos para formarem um
círculo, pedi para que as pessoas dessem as mãos para o círculo ficar melhor distribuído. Na
hora que demos as mãos, eu senti uma coisa boa, aconchegante. Isso não estava previsto, mas,
o que aconteceu é que fizemos toda essa primeira parte de mãos dadas. Terá isso contribuído
para um decorrer saudável e amigável de todas as atividades? Isso contribuiu para as pessoas
se sentirem à vontade? Refletindo agora, tenho a impressão que sim.
Ah, os registros!
Já percebi que a ideia de fazer esses registros foi muito boa. Pude perceber, através de
uma rápida análise sobre os registros da música “Baião”, que a maioria dos participantes
conhece pouco ou não conhece a escrita musical. O único integrante que foi mais longe
registrou a letra dando indicações de altura e de ritmo através de pontos (notas curtas) e de
traços (notas longas).

Vinte e um coralistas participaram desta primeira atividade da oficina.

Análise dos registros da música Baião:


Organizei assim: O que pude perceber: número de pessoas que fizeram assim.
 Só a letra em versos: 6
 Só a letra com uma ou outa indicação (ex. setas, desenhos): 8
 Letra e várias indicações: 1
 Letra e indicações de altura: 2
 Letra + altura + ritmo: 1
 Sem a letra, só “tá, tá, tá”: 1
 Erros da letra: 7

4.2 PLANO DE AULA 2

Data: 14/04/2014
Horário: 18h – 19h

Repertório:
Cio da Terra, Baião, Climbin’up The Mountain

Conteúdos Musicais:
16

Escrita das alturas, células rítmicas (colcheia e semicolcheia), ligaduras.

Recursos Didáticos:
Caneta para escrever no quadro; gravação do pout pourri das músicas “Baião” e
“Barra da Lagoa” feito pelo coral Portal do Sol.

Atividades:
1. Roda de Dança. (15min)
De forma bem objetiva, convido todos a formarem um círculo, damos as mãos e digo:
- 8, 8, 4, 4, 2, 2, vamos lá, comigo.
Fazemos umas 2 vezes este ciclo.
- Só que agora, bem próximos uns dos outros, ombro com ombro, em silêncio, quem
determina o ritmo é o grupo. Olhando os colegas.
Agora, distanciando-se um pouco, de mãos dadas, 4 pra cá, 4 pra lá, 4 pra frente, 4 pra
trás. Canta uma vez o “Climbin’up The Mountain” em cima desta “dança”. – Agora vamos
ver se o Baião encaixa nesse mesmo ritmo?
Cantar duas ou três vezes.
- E, então, quantos compassos tem essa melodia? Quantos tempos tem cada compasso?
Usando essa base, poder-se-ia dizer que tem 8 compassos de 4 tempos cada, como
acontece no “Clibin’up The Moutain”. Porém, esta música é dividida em compassos de dois
tempos.
- Experimentemos então fazer assim: dois passos para cada lado, dois pra frente e dois
pra trás. Mas para termos uma dimensão maior de como a música é estruturada, podemos
fazer quatro compassos (ou seja, 8 passos) para cada lado.

2. Apreciação (10min)
Ouviremos a gravação de um pout pourri da música “Baião” com a música “Barra da
Lagoa” gravado pelo coral Portal do Sol.
Discutir a respeito. Quantas vozes nós ouvimos? Que vozes são essas? Como sabemos
disso? Que instrumentos estão tocando? O que acontece de diferente? Essa interpretação é
diferente que cantamos?

3. Cio da Terra (parte de composição e de informações técnicas da escrita)


(20min)
17

Com a minha regência. Proponho uma nota inicial (lá) e determino uma altura do meu
gesto para ela (peito). Brincamos um pouco só com ela ritmicamente. Depois proponho a nota
“si” com o gesto na altura da cabeça. A turma canta a minha improvisação com essas duas
notas a partir do meu gesto. Peço que alguém comande uma improvisação para a turma cantar
com essas duas notas. Acrescento a nota “dó” na altura acima da cabeça. Improvisamos
novamente. E chamo outra pessoa para reger com as três notas.
Agora proponho uma melodia que chega descendentemente na nota “sol” e faço
somente com o gesto (agora na região pélvica) para ver o que acontece. É bem provável que
as pessoas intuitivamente cantem a nota sol. Se não, eu canto e mostro qual nota eu quero ali.
Agora faço, exatamente com esses gestos, a melodia das sopranos no início da música
“Cio da Terra” e pergunto se alguém reconhece a melodia. Escrevo, no quadro que contém a
pauta musical, só o início da melodia e só com as “cabeças” das notas (lá-lá-lá-si-dó-si, ou
seja, “debulhar o trigo”).
Questiono quanto ao ritmo. Como podemos representar melhor o ritmo deste trecho?
Insiro as hastes e os colchetes (no caso das colcheias)
Proponho que alguém siga com as próximas notas da melodia (se ninguém se arriscar,
eu mesmo proponho, mas aí farei com algum erro proposital). Discutimos se está certo e, se
não estiver, o que precisa ser feito para ficar melhor?
Logo no início aparecerá a nota “sol”. Se for necessário, posso propor uma dinâmica
para mostrar isso, ou seja, que há uma nota nova que é mais grave que aquelas três primeiras.

Comentar também que vou aproveitar o feriado para enviar alguns vídeos com
gravações diversas do repertório.

Obs: terminar uns 5min antes para dar tempo para o pessoal assinar a lista de
presença.

4.2.1 Protocolo

“É só pra ver se vocês estão ligados!”


A primeira atividade foi bem interessante, pois além de ser divertida de vivenciar,
deixou claras algumas coisas: o que é compasso; e como esta estrutura organiza as músicas
“Climbin`up The Moutain” e “Baião” de formas diferentes. Obs: como dou algumas
coordenadas durante a atividade, às vezes acontece de eu dar um passo fora, e aí, todos olham
18

pra mim, me denunciando! E, é claro que digo: “era só pra ver se vocês estavam ligados!”.
Esse clima inicial é muito leve, e isso tudo acaba sendo bastante divertido.
Apreciação
No momento de apreciação, as pessoas tiveram percepções bem interessantes: “parece
que eles estão indo pra lavoura”; “tem umas horas que alguém faz um movimento com a voz
que parece uma foice”; “eu não gosto dessa versão, não é harmoniosa como a que a gente
canta, parece um monte de gente cantando forte pra ver quem canta mais alto”... Nesta última
fala, fiz um comentário destacando a diferença das duas propostas: uma tem quatro vozes,
sendo que muitas pessoas cantam a mesma voz, na outra são muitas pessoas cantando, cada
uma numa voz diferente.
Cheguei pensar que a parte de apreciação ficou um pouco desconectada, mas creio que
não. Até porque a mesma música foi trabalhada em seguida. São só formas diferentes de
experiência com a música. Mas, faltou comentar sobre a sonoridade, a colocação das vozes...
fica pra próxima.
Um próximo direcionamento para apreciação pode ser algo que se relacione com a
escrita...
Cio da Terra
A terceira atividade fluiu bem, a não ser na hora em que escrevemos no quadro, que eu
não tinha muito claro qual a lógica que eu ia usar para abordar o ritmo. Mas na hora eu
improvisei e tudo foi bem. Esta atividade fluiu mais rápido do que eu imaginava.
Quero propor atividades que eles estejam mais ativos. Eu poderia ter propiciado mais
momentos em que eles comandam a turma. Fá-lo-ei na próxima semana.

Entrou mais um integrante e no fim ainda vieram me procurar mais duas pessoas que
queriam participar da oficina, e eu permiti.
Como na semana que vem é feriado, nos encontraremos só daqui a duas semanas.

4.3 PLANO DE AULA 3

Data: 28/04/2014
Horário: 18h – 19h

Repertório:
Cio da Terra; Climbin’up The Mountain
19

Conteúdos Musicais:
Compasso de cinco tempos, altura (notas dó, mi e sol), intervalos (3ª menor, 3ª Maior
e 5ª justa), figuras rítmicas (semínima e mínima).

Recursos Didáticos:
Caneta para escrever no quadro; câmera para filmar

Atividades:
1. Manossolfa (20min)
Optei por utilizar como recurso de aprendizado o “manossolfa”, modelo de
representação das notas a partir de gestos feitos com as mãos elaborado por Kodaly.
Peço para que façam um semicírculo na sala. Espero que caibam todos. Se não
couberem, arranjamos uma forma que de certo, talvez em duas filas. O importante é que todos
consigam me ver.
A partir do meu gesto (manossolfa), peço que todos cantem a nota mi e façam o gesto
comigo. Agora acrescento a nota sol, e, também com gesto, todos repetem comigo. Brinco
um tempo razoável com as duas notas.
Para que todos possam experimentar a sensação de improvisar melodias e de
comandar o grupo, optei pela seguinte estratégia:
Dentro da formação que estão, dividiremos em quatro grupos de mais ou menos cinco
pessoas cada. Agora, cada grupo será “regido” por um dos integrantes do grupo. Quem vai
reger utilizará somente essas duas notas e seus respectivos gestos, que são simples, e os
“regidos” também devem executar os gestos. Momento de experimentação. Todos
experimentam isso.
Agora, chamo a atenção de todos para mim.:
- Eu vou fazer uma melodia só com os gestos e vocês cantam em seguida o que eu
acabei de fazer, certo?
Faço algumas vezes isto.
Proponho que, dividindo a turma em dois grupos e usando, para cada um, uma das
minhas mãos, eles cantem conforme as indicações das minhas mãos. Usando, portanto, duas
mãos, valorizarei o intervalo de 3ª menor e os uníssonos, observando e instigando-os a
afinarem.
Peço para que tragam as suas cadeiras para perto do quadro que contém as pautas
musicais.
20

Ainda seguindo o meu gesto, peço que cantem com os gestos a seguinte melodia:

Como podemos escrever essa melodia? As notas nós já sabemos. Alguém pode
escrevê-las pra mim? Enquanto isso, vamos pensando na questão rítmica... Como podemos
fazê-lo?
Ótimo! Agora, enquanto este grupo faz esta melodia, quero que este outro cante e
sustente a nota dó. Como podemos escrever?
A partir dessa questão, vamos discutindo e vendo quais as soluções (figura pontuada,
ligadura de valor) para este caso.
O resultado da escrita deve ser este:

Comentar a respeito dos intervalos que estudamos: mi-sol; dó-mi e dó-sol.

2. Apreciação (é possível que não dê tempo, aí, pulo para a próxima atividade).
Vamos ouvir uma gravação de um grupo de homens cantando um arranjo bem
semelhante ao que cantamos no coral, só que com uma interpretação, caráter e sonoridade
totalmente diferente.
Pretendo que só escutemos (sem ver o vídeo) e discutamos a respeito. Acho
importante discutirmos a respeito da interpretação, da sonoridade, do tipo e o número de
vozes, o possível local em que está sendo executada a peça.
Depois, assistiremos ao vídeo, primeiramente, por que é muito interessante ver o
grupo, e também para ver se o visual cumpre com as expectativas e as especulações que
tivemos/fizemos a partir do áudio.
Segue o link do vídeo no youtube:
https://www.youtube.com/watch?v=ITS_bPH5ZRE
21

3. Roda de dança (Cio da Terra) (20min) Ou seja, temos que começá-la às


18h35min.
Vamos relembrar rapidamente como estabelecemos nas semanas anteriores as danças
das músicas “Climbin’up the Mountain” e “Baião”. Cantando e dançando uma ou duas vezes
cada uma.
- Pessoal, vamos agora fazer uma força tarefa: em 30 segundo vamos colocar todas as
nossas cadeiras no lugar.
(...)
- Agora, pessoal, vamos ver se esses dois padrões, esses dois tipos de compasso, o
quaternário e o binário se encaixam na música Cio da Terra?
Aí experimentamos e, claro, não vai dar certo.
- O que deu errado? O que está faltando? Qual então a regra que organiza essa música?
Podemos aí experimentar algumas sugestões, e pode ser que alguém já tenha olhado na
partitura e diga como é, ou tenha uma sugestão plausível. Podemos experimentar bastante. De
qualquer forma, faz-se importante mostrar como é a divisão escolhida pela autora do arranjo.
É desafiadora com relação ao que havíamos feito nas outras duas músicas, pois há alternância
entre três tipos de compasso e ainda um compasso de cinco tempos.
Para tanto, vamos primeiramente fazer o compasso de cinco tempos. Depois juntamos
com os demais.
Imagino que será desafiador e, muito provavelmente, divertido, pois se trata daquele
tipo de jogo que quando as pessoas erram, gera-se uma situação engraçada.
Escrever como ficaria a sequência das fórmulas de compasso na pauta.

Conversa:
Pretendo terminar uns 5min mais cedo para ter uma conversa, um retorno deles,
enquanto assinam a lista de presença, sobre as atividades que estamos desenvolvendo, se eles
estão aprendendo, se está interessante...

Enviar por e-mail vídeos e imagens que ilustrem o manossolfa.

4.3.1 Protocolo

Troca
22

Observando a possível dificuldade da moção de cadeiras em dois momentos da aula,


optei por mudar a sequência das atividades. Fiz uma troca da primeira com a terceira
atividade, começando novamente com a atividade de roda, que é sempre muito gostosa.
A atividade de roda é bem interessante porque dá uma mexida nos corpos dos
integrantes, acho que os acorda um pouco para o aqui-agora. Os novos desafios (alternância
de compasso e a inserção dum compasso de 5 tempos) foram na medida, nada de
complicadíssimo. Mas já trabalhou com questões de percepção de corpo, de espacialidade e
de grupo.
A atividade com a manossolfa foi rica. Gostei dessa forma de abordar, essa dinâmica
dos grupos, na qual todos os participantes experimentam cantar e fazer o gesto o tempo todo:
na maioria das vezes cantando e fazendo o gesto, noutras regendo o pequeno grupo. E nessa
atividade eu pude acompanhar os grupos fazendo observações pertinentes e dando orientações
diversas necessárias (alguns faziam um gesto, cantavam o nome da nota, mas invertia as
alturas).
Poderia ter aproveitado mais musicalmente este exercício, explorando a sonoridade, a
afinação, andamentos e dinâmicas variadas. Podemos partir dele na próxima aula.
E, por fim, tenho a impressão de que foi bem esclarecedor o momento em que
escrevemos no quadro o exercício proposto a duas vozes (vide plano). Pretendo partir desta
ideia para ir acrescentando outras notas, além de acrescentar trechos do repertório em que isto
é evidente. OBS: faltou cantar agora olhando no que acabamos de escrever.

Obs: vieram somente 10 coralistas, metade dos outros dias. O que aconteceu?

4.4 PLANO DE AULA 4

Data: 05/05/2014
Horário: 18h – 19h

Conteúdos Musicais:
alturas (notas dó, mi e sol), figuras rítmicas (colcheia, semínima, mínima), indicações
de dinâmica.

Recursos Didáticos:
Caneta para escrever no quadro; câmera para filmar,
23

Atividades:
Obs: deixar escrito no quadro o exercício da aula passada e, num canto superior, as
figuras rítmicas utilizadas com seus nomes.

1. Roda Cio da Terra (5min)


Relembrar os passos do Cio da Terra feitos na semana passada. Contando, em silêncio,
e, por fim, cantando.

2. Manossolfa – dó, mi e sol


(Próximos do quadro, em formato de pequeno coral para que todos me vejam)
a. Ao meu comando, cantam as notas dó, mi e sol com seus nomes e
gestos (manossolfa). (2min)
b. Relembramos o exercício da semana passada. “como é mesmo que se
lê? Este grupo canta a linha de baixo e este outro a linha de cima. Um,
dois, três...” Eu acrescento as dinâmicas “p” e “f” (piano e forte). “E
agora, o que mudou?” Altero uma ou outra nota e experimentamos para
ver o que fica de diferente.
c. “Tarefa pra casa: Trazer na próxima semana uma variação deste
exercício, assim como eu acabei de fazer, modificando aqui ou ali,
utilizando dos conteúdos que nós já vimos. Pode fazer o que quiser,
mas, pode ter somente 5 alterações. Por tanto, utilize bem as cinco.
Faça no seu caderno mesmo, aproveite para comprar um, se ainda não
tem.” (5min)
d. Pequenos grupos. Mesma dinâmica da semana passada. Fazer
pequenos grupos em que, um por vez, cada um dos integrantes vai reger
o seu grupo, mas agora com as notas dó, mi e sol. (3min)
e. Memória. Eu faço uma melodia com essas três notas somente com
gestos e todos repetem cantando com os nomes das notas e fazendo os
seus respectivos gestos. Chamo voluntários para reger o grupo. Peço
que venham pessoas que ainda não experimentaram isto. (5min)
f. “Ditado”. Eu canto uma melodia com uma sílaba somente, “lá”, por
exemplo, e o grupo canta a melodia com nome de nota e gestos. (2min)
3. Improviso (15min)
24

a. Cantamos este recorte de dois trechos da música “boi de mamão”:


b. Peço que todos cantem e, na parte do “Tum, xtum, Tum, tum” eu

improviso uma melodia usando somente as notas dó mi sol. Eu


improviso duas vezes, pro pessoal se encorajar, aí sugiro que quem
estiver do meu lado improvise na próxima vez. Assim começamos a
nossa roda de improviso. Podemos parar se for preciso, mas o objetivo
é seguir em frente, sem ‘travar’. Vamos fazer a roda de improviso duas
vezes, para que, portanto, cada um improvise duas vezes.

4. Apreciação: Cravo e Canela


Assistir ao vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=XCS9QOBFDQo
- O que tem de diferente na versão que nós cantamos?
- Qual o caráter da música?
- Que tipo de compasso é esse?
- A versão original da música, e essa que acabamos de ouvir, são em compasso
ternário, mas a versão que nós cantamos é escrita em dois. Vamos experimentar contar das
duas formas? O que fica diferente?

5min pra conversa (que não aconteceu na semana passada)


Quero um retorno deles, enquanto assinam a lista de presença, sobre as atividades que
estamos desenvolvendo, se eles estão aprendendo, se está interessante...
Lembrar da Tarefa de casa!
25

Enviar por e-mail:


- quadro das figuras rítmicas
- material sobre as notas musicais.

4.4.1 Protocolo

A Improvisação
O momento da improvisação foi bastante desafiador. Na verdade, antes mesmo, no
exercício em que eu cantava (sem nome de nota e gesto) uma melodia para que eles
repetissem com gesto e nome de nota, eu já percebi uma dificuldade geral na turma.
Confundiam bastante as coisas. Quando eu fazia os gestos, era mais fácil para a turma, mas
neste caso, no qual eu não indicava quais eram as notas, houve maior dificuldade. Eu fiquei
num embate, será que arrisco botá-los pra improvisar... pois muitos ainda estavam inseguros,
alguns haviam faltado na semana passada, e , por tanto, havia muita coisa nova para eles...
Fato é que na hora eu optei por arriscar.
Alguns conseguiram ir bem, mas a maioria teve dificuldades. Empacavam. Quando
isso ocorria, às vezes, eu pedia para pararmos e aí relembrava as notas, noutras eu corria do
lado da pessoa, pedia ao grupo que ela tentasse novamente, e aí eu sugeria uma melodia
simples para ela ir me acompanhando e depois a “soltava” (como quando a gente aprende a
andar de bicicleta e que alguém vai nos segurando até que uma hora este solta a bicicleta e
nos aventuramos por conta própria). Alguns foram mais soltos e faziam, mesmo que errando
notas, desafinando, mas faziam. Outros ficavam envergonhados e se fechavam. Mas quando
eu chegava perto e os ajudava, eles topavam a proposta e a maioria conseguia explorar
alguma coisa.
Quando terminamos um rodada, eu disse algo do tipo:
- “Pessoal, é claro que este é um exercício desafiador para todos nós. E nós somos
ainda iniciantes nisso tudo... mas, afinal, a gente está aqui para ser aquilo que nós somos,
então não tenhamos medo das nossas limitações, estamos aqui para aprender. Então, se
arrisquem.”
E fizemos mais uma vez.
Muitos ainda tiveram dificuldades, e aqueles que foram bem na primeira, se enrolaram
nesta. Com alguns eu ainda cheguei junto e ajudei, mas alguns que antes, por timidez ou
vergonha, empacavam, estes já se arriscaram e fizeram aquilo que conseguiam.
26

Quando chegou o fim, eu fiquei pensando: “nossa, agora eu corri com todo mundo da
oficina!”. No entanto, quando chegamos ao fim da roda de improviso, todos se aplaudiram!
Isso é muito significativo, pois mostra que, em vez de terem achado chato, acharam
desafiador, e encaram o desafio, e se aplaudiram, ou seja, “nós encaramos!”.
Penso que devemos retomar este exercício na semana que vem, mas eu vou propor de
uma forma diferente que dê mais segurança a eles, pois talvez, o desafio tenha sido grande de
mais. Mas ninguém vai “morrer” por causa disso, a vida é assim mesmo.
A música é um potente transformador. Esta experiência foi muito forte para mim.
Muita coisa que diz respeito àqueles sujeitos, às suas subjetividades, foi aflorada, foi colocada
na mesa... eles se mostraram e se viram. Eu acredito que é esse tipo de experiência que reforça
e intensifica a visão que concordo com Koellreutter de que “A música é, em primeiro lugar,
uma contribuição para o alargamento da consciência e para a modificação do homem e da
sociedade” (BRITO, 2001, p.26).
Retorno
No fim, sentamos todos em roda e eu pedi um retorno deles do que estavam achando
da oficina. Algumas frases:
“Eu estou adorando”; “Gosto muito da tua didática”; “As coisas que nós estamos
trabalhando aqui na Oficina estão fazendo com que eu perceba outras coisas no ensaio do
coro”; “Eu estou aprendendo muito”; “Muitas coisas estão fazendo sentido”; “E é muito bom
porque nós usamos o corpo, e quando usamos o corpo aprendemos melhor, fica registrado”;
“Você é bastante paciente”.

Obs:
No meio do caminho, optei por seguir na atividade de improvisação em vez de
retomarmos o exercício feito na aula passada. Por consequência, dei uma outra tarefa pra
casa: assistir, cantando e fazendo os gestos, o vídeo que eu enviei sobre a “manossolfa”, e
brincar com as três primeiras notas dó, ré e mi. Ficamos também sem a atividade de
improvisação.

4.5 PLANO DE AULA 5

Data: 12/05/2014
Horário: 18h – 19h

Conteúdos Musicais:
27

Alturas (notas dó, ré, mi e sol), figuras rítmicas (colcheia, semínima, mínima),
indicações de dinâmica (p, mf, f).

Recursos Didáticos:
Caneta para escrever no quadro; câmera para filmar; gravação do coral cantando As
Cantigas do Boi de Mamão

Atividades:
Obs: deixar escrito no quadro o exercício da aula passada e num canto superior,
as figuras rítmicas utilizadas com seus nomes.
1. Manossolfa – dó, ré, mi e sol. (30min)
(Próximos do quadro, em formato de pequeno coral para que todos me vejam)
a. Ao meu comando, cantam as notas dó, mi e sol com seus nomes e
gestos (manossolfa). (2min)
b. Relembramos o exercício da semana passada. “como é mesmo que se
lê? Este grupo canta a linha de baixo e este outro a linha de cima. Um,
dois, três...” Eu acrescento as dinâmicas “p” e “f” (piano e forte). “E
agora, o que mudou?” Altero uma ou outra nota e experimentamos para
ver o que fica de diferente. Uma ou outra pessoa faz uma alteração
também e conferimos como fica. (3min)
c. “Mas e se eu quisesse escrever assim: (aí canto um exemplo onde
necessita do uso de colcheias). Como escrevemos isto?
d. Exploração do uso das colcheias. Monto diferentes disposições de
colcheias e semínimas no quadro para lermos. (5min)
e. Acrescento à sequência, um compasso de 4/4 com a seguinte estrutura:

Que trecho do repertório é este? (“vamos


moreninha”, do “cantigas do boi de mamão”).
f. Mas e se eu mudasse essa nota? (colocar um ré ali no meio). (5min)

g. Ao meu comando, cantam as notas dó, ré, mi e sol com seus nomes e
gestos (manossolfa).
28

h. Pequenos grupos. Mesma dinâmica da semana passada. Fazer


pequenos grupos em que, um por vez, cada um dos integrantes vai reger
o seu grupo, mas, primeiramente com as notas dó, ré, mi; depois
acrescentamos a nota sol.
i. Memória. Eu faço uma melodia com essas três notas somente com
gestos e todos repetem cantando com os nomes das notas e fazendo os
seus respectivos gestos. Chamo voluntários para reger o grupo. Peço
que venham pessoas que ainda não experimentaram isto.
j. Ao meu comando, cantam as notas dó, ré, mi e sol só que sem o nome
das notas, só com o gesto e tá, tá, tá.
k. “Ditado”. Eu canto uma melodia com uma sílaba somente, “tá”, por
exemplo, e o grupo canta a melodia com nome de nota e gestos.
(15min).
l. “Tarefas pra casa:
i. Trazer na próxima semana uma variação deste exercício, assim
como eu acabei de fazer, modificando aqui ou ali, utilizando dos
conteúdos que nós já vimos. Pode fazer o que quiser, mas, pode
ter somente 5 alterações. Por tanto, utilize bem as cinco. Faça
no seu caderno mesmo.”
ii. Localizar nas músicas “Climbin’up The Moutain” e “Cio da
Terra” onde essa célula rítmica aparece: quatro colcheias e duas
semínimas. (2min)

2. Apreciação: Cravo e Canela (10min)


Assistir ao vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=XCS9QOBFDQo
- O que tem de diferente na versão que nós cantamos?
- Qual o caráter da música?
- Que tipo de compasso é esse?
- A versão original da música, e essa que acabamos de ouvir, são em compasso
ternário, mas a versão que nós cantamos é escrita em dois. Vamos experimentar contar das
duas formas? O que fica diferente?

3. Cantigas do Boi de Mamão (10min)


5min pra ler duas vezes:
29

1º Acompanhando a voz da soprano e, na


2ª vez, acompanhando as contraltos.
5min para esclarecer eventuais dúvidas.
- Destacar o trecho em que as vozes vão entrando uma por uma com rítmicas
diferentes.

Lembrar da Tarefa de casa solicitada na semana anterior.

Enviar por e-mail:


- quadro das figuras rítmicas
- material sobre as notas musicais.

4.5.1 Protocolo

No “frigir dos ovos”, acabei deixando a parte de exploração do uso das colcheias para
o fim dessa primeira parte, e não fiz o exercício de “ditado”. Quando terminamos essa
primeira parte, já eram 18h50min! Mas tudo bem, achei bem proveitoso. Ao mesmo tempo
que, vimos e experimentamos muitos conteúdos (anacruse, figuras rítmicas, dinâmicas outras
que eu não havia previsto, mudanças de compasso, tempo e contratempo), e partirmos,
diferentemente das outras vezes, da notação musical para a prática, cuidamos também da
qualidade da emissão vocal. As alterações que os alunos iam fazendo no quadro serviam de
motivação para compreender novos conteúdos e revisitar alguns outros. Até pelo
envolvimento da turma é que acho que rendeu tanto, e ao mesmo tempo não ficou cansativo,
monótono. Foi uma atividade dinâmica, como havia sido prevista.
Como já era o fim da aula, decidi “pularmos” pra o entendimento da partitura do
“Cantigas do Boi de Mamão”. Foi um pouco corrido, mas creio que deu pra dar um
entendimento geral das funções de ritornelo, casa 1 / casa 2, Da Capo e Coda.

4.6 PLANO DE AULA 6

Data: 19/05/2014
Horário: 18h – 19h

Conteúdos Musicais:
30

Alturas (notas dó, ré, mi, fá e sol), figuras rítmicas (colcheia, semínima, mínima),
indicações de dinâmica (p, mf, f), compasso (alteração de), interpretação, forma, quadratura.

Recursos Didáticos:
Caneta para escrever no quadro; câmera para filmar; gravação em vídeo da música
Cravo e Canela

Atividades:
Obs: deixar escrito no quadro o exercício da aula passada e num canto superior,
as figuras rítmicas utilizadas com seus nomes.

1. Apreciação: Cravo e Canela (10min)


Assistir ao vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=XCS9QOBFDQo
- O que tem de diferente na versão que nós cantamos?
- Qual o caráter da música?
- Que tipo de compasso é esse? Experimentar diferentes formas propostas para ver
qual se encaixa melhor.
- A versão original da música, e essa que acabamos de ouvir, são em compasso
ternário, mas a versão que nós cantamos é escrita em dois. Vamos experimentar contar das
duas formas? O que fica diferente?

2. Roda de dança (10min)


Experimentar dançar e cantar (nos moldes das atividades de dança em roda que
fizemos nas outras atividades) sobre a gravação da música “Cravo e Canela” em duas
fórmulas de compasso distintas: 3/4 e 2/4. Nos dois casos, vamos seguir o padrão utilizado já
anteriormente: direita, esquerda, frente e pra trás. Só que, respectivamente, é três pra cada
lado (alternando os pés e, por isso, cruzando-os) e, no outro caso, dois para cada lado.
Isto é para experimentarmos as formas diferentes de divisão/organização de uma
mesma música.
Como isto fica na escrita?
Darei exemplos mais simples, pois as figuras rítmicas desta música ainda são
complexas para aquilo que nós já vimos.

3. Registro (15min)
31

Propor a segunda atividade de registro, agora sobre a música “Marcha


Soldado”.
No processo, podem surgir dúvidas de escrita ou outras, e aí eu auxiliarei se for
preciso.

4. Versão do Exercício (10min)


Peço para que alguém coloque a sua versão no quadro. A turma canta a versão.
O interessante é que podem surgir conteúdos, dificuldades, erros mesmo de
escrita e que a própria turma pode ajudar no processo e, claro, eu posso
aproveitar para esclarecer.
(dependendo da dinâmica que surgir e do tempo que ficarmos na primeira
versão, podemos ver no mesmo processo mais uma ou duas versões).

5. Manossolfa (10min)
a. Ao meu comando, todos cantam, primeiramente, as notas dó, mi e sol
com seus nomes e seus gestos.
b. Acrescento a nota ré
c. Agora, acrescento a nota fá
d. Pequenos grupos. Mesma dinâmica da semana passada. Fazer
pequenos grupos em que, um por vez, cada um dos integrantes vai reger
o seu grupo, mas, agora com as notas dó, ré, mi, fá e sol.
e. Vocalizes

6. Repertório (5min)
Ver rapidamente o que as pessoas acharam, cantar os trechos e comparar a
escrita.

4.6.1 Protocolo

18h43!
Ao fim da primeira proposta (apreciação da música Cravo e Canela e a vivência dos
dois tipos de compassos), surpreendi-me ao espiar as horas no celular: 18h43! Eu não
imaginava que ficaria tanto tempo nesta atividade. Mas isso não é nenhum problema. A
32

atividade realmente despendia desse tempo, e este tipo de vivência amplia a consciência
musical do ritmo. Além do que é muito divertida.
Registro
Fizemos, por fim, a atividade de registro. Fui auxiliando conforme as pessoas iam me
solicitando. Vejamos a análise que fiz dos registros, criando categorias a partir dos elementos
que os integrantes usaram para o registro:
Só a letra: 1
Só a letra com acentos nas sílabas fortes: 2
Só a letra com os pulsos por sílabas: 1
Ritmo correto: 2
Ritmo e melodia, mas falhos: 6

Concluo que é possível que tenhamos vivenciado bastante as relações das notas, mas
fizemos pouca relação com a escrita. Faz-se importante relacionar mais com o repertório, por
exemplo.

Tarefa
Somente duas pessoas fizeram a tarefa que eu propus, mas, pelo visto, as duas se
envolveram bastante, pois fizeram várias alterações e compuseram até uma letra para a
variação.

4.7 PLANO DE AULA 7

Data: 26/05/2014
Horário: 18h – 19h

Conteúdos Musicais:
Alturas (notas dó, ré, mi, fá e sol), figuras rítmicas (colcheia, semínima, mínima),
indicações de dinâmica (p, mf, f), compasso, ponto de aumento.
Recursos Didáticos:
Caneta para escrever no quadro; câmera para filmar.

Atividades:
Obs: - Deixar escrito no quadro a letra de Marcha Soldado.
33

- Enquanto o pessoal vai chegando, já ir olhando se fizeram a tarefa, para


ver qual utilizar.

1. Parlenda: (10min)
Com os pés: “Um, dois, três.”
Com as mãos nas coxas: “Quatro, cinco, seis.”
Com as palmas das mãos: “Sete, oito, nove, para doze faltam três.”

Ensinar por trechos:


“Repitam comigo: (com os pés) Um, dois, três.” Todos repetem. “Agora: (com
as mãos nas coxas) quatro, cinco seis.” Todos repetem...
“Agora, juntando tudo. [...] Uma vez forte, outra piano e outra sem a letra. [...]
Vamos dividir em três grupos, vamos fazer em cânone. [...]”

2. Marcha Soldado (20min-30min)

a. Ritmo
i. Transformando a música Marcha Soldado numa parlenda,
falamos o texto batendo palmas junto conforme o ritmo do
texto.
ii. “Repitam comigo: (com palmas) Marcha soldado cabeça de
papel. [...] e seguindo (com as palmas das mãos no peitoral)
Quem não marchar direito vai preso pro quartel.”
34

iii. Uma vez piano, outra forte, e outra sem a letra decrescendo.
No quadro
iv. 1ª abordagem: “O ritmo é sempre igual? Vamos utilizar as
figuras semínima e colcheia. Em quais sílabas vamos utilizar as
semínimas? E nas outras? Muito bem, onde podemos perceber
uma acentuação natural no ritmo? Portanto, onde podemos
colocar as barras de compasso? Qual a fórmula de compasso?”
v. 2ª abordagem: “Vamos marchar? Como que podemos marchar
enquanto cantamos? Alguém tem alguma ideia? Ver pelos
menos três possibilidades de marcha (em semínimas, em
colcheias e em mínimas). Qual fica melhor?”.
vi. Apagar o que foi feito e recomeçar. Vamos agora anotar em
quais sílabas nós tocamos o pé no chão, ou seja quais sílabas
estão no tempo, no pulso. Muito bem, e quanto a essas sílabas
que não estão no pulso? Temos portanto momentos em que
temos duas sílabas por tempo. O que isso significa? [...] Como
escrever a marcha?”
Nestas duas abordagens, pretendo chamar as pessoas para irem elas mesmas
respondendo no quadro as questões que vou fazendo. Desta forma, possíveis
dificuldades e facilidades dos alunos surgirão, o que contribui para que eu e a
turma tenhamos consciência das mesmas e possamos esclarecer o que for
necessário.

3. Retomar a tarefa (15min)


Eu enviei um e-mail para todos avisando que vamos retomar a tarefa que foi enviada
já na outra semana, mas que só duas pessoas fizeram. Outras disseram que não tiveram tempo.
Bom, agora terão mais um tempo.
Caso alguém mais tenha feito a tarefa, darei uma olhada rápida para ver qual ou quais
poderia utilizar para colocar no quadro e a turma toda cantar e discutir a respeito.
4. Tarefa de casa (Cio da Terra)
Tarefa:
 Escrever os nomes das notas da sua linha.
 Copiar a sua linha do Cio da Terra.
 Cantar utilizando e não utilizando a manossolfa:
35

o com a letra
o com nome de nota
o só com a manossolfa (cantar interiormente)

4.7.1 Protocolo

Gostei muito desta aula. A dinâmica de ir pedindo ara que as pessoas fossem
escrevendo no quadro é muito boa, pois, desta forma, posso fazer apontamentos e
esclarecimentos pertinentes às diversas compreensões da escrita musical da turma.
Eu fico me perguntando às vezes se não estou fugindo da proposta inicial da oficina
que é partir do repertório... e acho que estou sim. Mas por uma demanda da própria turma que
estava interessada numa compreensão mais aprofundada da escrita musical, e acho pertinente
este aprofundamento que estamos fazendo na música Marcha Soldado, uma vez que ela
trabalha justamente com elementos simples, de fácil assimilação e que nós já vivenciamos na
oficina em outros momentos. Um cuidado se faz importante: não perder o aspecto vivencial e
de experimentação musical.
Ao mesmo tempo em que, claro, as pessoas estão expondo se “erros”, e isso sempre
desestabilizar alguns, tudo isso se acontece num clima leve e divertido: as vezes a escrita se
pareceu com minhocas e com flores. E todo mundo riu.
Obs: a minha orientadora prof.ª Simone esteve presente na aula.

4.8 PLANO DE AULA 8

Data: 02/06/2014
Horário: 18h – 19h

Conteúdos Musicais:
Alturas (notas dó, ré, mi, fá, sol e lá), figuras rítmicas (colcheia, semínima, mínima),
indicações de dinâmica ( >, <).
Recursos Didáticos:
Caneta para escrever no quadro (pegar uma melhor, pois aquela já está acabando);
câmera para filmar; arquivo da partitura do Cio da Terra para ser projetada.

Atividades:
Obs: - Deixar escrito no quadro o ritmo de Marcha Soldado
36

- Deixar o computador e o projetor afinados.

1. Marcha Soldado (melodia) (25-30min)


a. Ao meu comando, cantam em frases curtas as notas dó, mi e sol
com seus nomes e gestos (manossolfa). (2min)
b. Pequenos grupos. Fazer pequenos grupos em que, um por vez,
cada um dos integrantes vai reger o seu grupo, com as notas dó,
mi e sol, procurando criar pequenas frases.
c. “Em qual destas três notas começa a melodia de Marcha
Soldado? ... Quais são as cinco primeiras notas da melodia?”
Vamos construindo a melodia no quadro até surgir um
problema: uma nota nova além daquelas três. Que nota é
essa? (10min)
d. Ao meu comando, cantam as notas dó, ré, mi, fá e sol com seus
nomes e gestos (manossolfa). (2min)
e. Vivenciar novamente em pequenos grupos, agora com as notas
dó, ré, mi, fá e sol. (3min)
f. Construir o restante da melodia experimentando as
possibilidades até chegarmos num consenso. Aproveitar o
momento para pedir para que os integrantes escrevam no
quadro, podendo tirar eventuais dúvidas. (10min)

2. Retomar a tarefa de casa (Cio da Terra) (20min)


Com a partitura do Cio da Terra projetada refazer um pouco da tarefa solicitada na
semana passada para ver se entenderam o que era pra fazer e auxiliá-los no processo.
 Escrever os nomes das notas do início da linha das contraltos.
 Cantar utilizando e não utilizando a manossolfa:
o com a letra
o com nome de nota
o só com a manossolfa (cantar interiormente)
 Se tivermos tempo e vozes o suficiente, fazer a três vozes o início da música
(soprano, contralto e tenor) variando as dinâmicas (com letra, com nome de
nota, com/sem manossolfa, só com a manossolfa).
37

3. Vocalizes
Começar a atividade com diversos vocalizes, chamando a atenção para as notas
que estão sendo utilizadas
a. Boca chiusa – glissando da nota dó para a nota sol e glissando
novamente para dó. Como se escreve isto?
b. Brim brim brim – dó mi sol mi dó.
c. Mei, mai, mei, mai, mei... sol, fá, mi ré dó mi sol mi dó
i. Ressaltar a diferença entre graus conjuntos e saltos.
ii. Escrever e utilizar as chaves de som (> e <)
iii. Subindo e descendo em semi-tons, ressaltar que tratam-
se de modelos que podem ser executados em diversas
alturas.
Observar hoje no ensaio quais padrões a Simone vai propor

4.8.1 Protocolo

Ficamos bastante tempo na primeira atividade. O que era já de se supor. Mas ficamos
bastante tempo nela porque estava rendendo muito. Existia um espírito investigativo no
descobrir quais eram as alturas da melodia. Fomos experimentando as possibilidades que
eram sugeridas pelos participantes, e esforçamo-nos para ler o que escrevíamos e conferir se
era assim mesmo. Acho que foi bem esclarecedor.
Na verdade, ocupamos a aula inteira com ela, e, portanto, no fim, quando faltavam 5
minutos, optei por mostrar as como as estruturas dos vocalizes experimentados por eles na
prática coral podem ser identificadas a partir do que já vivenciamos na oficina.
As pessoas tem dúvidas e elas estão à vontade pra perguntar. Considero isso bastante
positivo. Se a aula tem o foco no aluno, as suas dúvidas são importantes:
A partir de um comentário de alguém, falamos sobre intervalos. Aproveitei e fiz um
exercício que deixa isto evidente: dó, ré, dó, mi, dó, fá, dó, sol, dó, fá, dó, mi, dó, ré, dó, dó.
Falamos dos intervalos de terça, geralmente utilizados pelas duplas sertanejas nos seus
cantares.
Eu tenho conversado mais com as pessoas antes de iniciar a atividade, vendo se
fizeram os exercícios, se tiveram dúvidas, e isso me ajuda a compreendê-las. Eu me permito
direcionar as atividades para as necessidades e interesses dos alunos. Claro que as
38

“necessidades”, muitas vezes, sou eu que identifico “o que é necessário”. Mas é uma
constatação minha a partir deles, das suas práticas.
No fim da atividade, tirei algumas pequenas dúvidas de alguns.
Eu comentei com eles sobre continuarmos no semestre que vem e da possibilidade de
ampliarmos o tempo da oficina pra 1h30min.

4.9 PLANO DE AULA 9

Data: 09/06/2014
Horário: 18h – 19h

Conteúdos Musicais:
Alturas (notas dó, ré, mi, fá, sol e lá), figuras rítmicas (colcheia, semínima, mínima).
Recursos Didáticos:
Caneta para escrever no quadro; câmera para filmar; arquivo da partitura do Cio da
Terra para ser projetada.

Atividades:
Obs: - Deixar o computador e o projetor afinados.

4. Retomar a tarefa de casa (Cio da Terra) (20min)


Com a partitura do Cio da Terra projetada refazer um pouco da tarefa solicitada há
duas semanas para ver se entenderam o que era pra fazer e auxiliá-los no processo.
 Escrever os nomes das notas do início da linha das contraltos.
 Cantar utilizando e não utilizando a manossolfa:
o com a letra
o com nome de nota
o só com a manossolfa (cantar interiormente)
 Se tivermos tempo e vozes o suficiente, fazer a três vozes o início da música
(soprano, contralto e tenor) variando as dinâmicas (com letra, com nome de
nota, com/sem manossolfa, só com a manossolfa).

5. Cartelas de ritmo37 (5min)

37
São cartelas rítmicas em 4/4 que alternam em figuras de semínima e colcheia.
39

a. Eu vou mostrando cartela por cartela e todos solfejam “ti-ti”


para duas colcheias e “tá” para uma semínima.
b. Memória. Mesmo exercício só que enquanto o grupo solfeja
uma cartela, eu já apresento a próxima, e desta forma, utiliza-se
a memória para cantar sempre de olho no que está por vir.

6. Composição (35min)
Em dois grupos. Cada grupo vai compor uma canção. O ritmo deve ser composto pelas
estruturas das cartelas, escolhendo quais estruturas rítmicas utilizar. A melodia deve ser criada
a partir do ritmo escolhido. Claro que pode ou não haver letra, mas pelo que conheço do
grupo, isto não será uma dificuldade e sim uma alegria.
Todos devem escrever em seu caderno a versão final e o grupo deve elaborar uma
partitura final com tudo que tem direito: Nome da canção e os compositores.

Anexos:

4.9.1 Protocolo

A primeira atividade exigia mais dos alunos do que eu imaginava. Mas talvez o tenha
sido porque eu decidi na hora (até pela logística da projeção) fazer, logo muito no começo, a
duas vozes, inserindo, portanto as sopranos com as notas lá e si, que havíamos visto pouco.
Mas tudo bem, deu pra tirar diversas dúvidas.
A atividade das cartelas foi rápida e não apresentou grandes desafios para a turma.
Na atividade de composição, eu sugeri que os grupos ficassem, cada um numa sala e
assim o fizeram. Utilizando o piano, os grupos foram escolhendo as figuras rítmicas e as
alturas. É interessante que um grupo escolheu 4 cartelas e o outro fez 7, mas só não fizeram 8
porque faltou tempo. Os grupos tinham, pelo visto, uma concepção já de quadratura. Ficou só
faltando colocarem uma letra.

4.10 PLANO DE AULA 10

Data: 16/06/2014
Horário: 18h – 19h

Conteúdos Musicais:
40

Todos os conteúdos que estiverem presentes nas composições.

Recursos Didáticos: Câmera para filmar

Atividades:
1. Finalização da canção (15min)
Tempo para os grupos terminarem a composição e elaborarem a partitura oficial.

2. Ensaio (15min)
Agora, um grupo vai ensaiar para apresentar a composição do outro.

3. Apresentação (5min)
Um grupo apresenta para o outro.

4. Discussão (10min)
Discussão a respeito das performances:
Um grupo avalia se a música aconteceu da forma esperada. Se não, o que
aconteceu? A escrita estava clara? O que pode ser melhorado?

5. Conversa sobre a avaliação


Informar a turma de que, diferentemente do que eu havia dito na semana passada,
teremos ainda mais uma atividade no dia 30, na qual utilizaremos o tempo para fazer uma
avaliação.
4.10.1 Protocolo

Um dia atípico. Às 18h, haviam apenas duas pessoas na sala, sendo que uma delas não
estava presente na aula passada. Como a atividade dependia de quem participou na outra
semana, eu comecei a pensar em uma atividade alternativa. Pedi para que uma delas
escrevesse a melodia que estava pronta no quadro (para trabalhar encima desta colocando
letra, arranjando...), liguei o computador cogitando a possibilidade de uma atividade de
apreciação, uma vez que tenho ainda vários áudios selecionados para isto. Mas as pessoas
foram chegando aos poucos e às 18h15 haviam 8 pessoas na sala. Aí eu optei por fazermos o
que estava previsto mesmo, já que eu havia planejado com tempo sobrando.
41

Mas, o que eu pensava que seria rápido, demorou muito. Um dos grupos havia feito
uma melodia mais complexa e longa com alterações (sustenidos), e ainda demorou muito para
terminar de elaborar uma versão mais compreensível da sua partitura. Isto dificultou o ensaio
do outro grupo que, portanto, teve menos tempo para ensaiar algo mais sofisticado e longo.
Por fim, não tivemos tempo para tudo. Na hora eu fique bastante incomodado com a
situação e creio que isto ficou claro para os alunos. Da minha parte, percebo que não deixei
claro, na semana anterior, qual seria a continuidade da atividade de composição e também que
deveria ter delimitado melhor: só utilizar as notas que nós trabalhamos.
Mas o grupo é interessado. Foram eles mesmos que sugeriram de começarmos mais
cedo, às 17h30, no dia 30 para terminarmos a atividade. Eles mesmos se organizaram para
digitalizar e enviar para todos as partituras das composições.
Acho que são acidentes de percurso que vão nos dando experiência e maturidade,
servindo de referência para próximas ações.

4.11 PLANO DE AULA 1138

Data: 30/06/2014
Horário: Excepcionalmente das 17h30 – 19h

Conteúdos Musicais:
Todos os conteúdos que estiverem presentes nas composições.

Recursos Didáticos: Câmera para filmar, cópias dos questionários de avaliação

Atividades:
1. Ensaio (10min)
Tempo para os grupos ensaiarem para apresentar a composição do outro.

2. Apresentação (5min)
Um grupo apresenta para o outro.

3. Discussão (10min)
Discussão a respeito das performances:

38
A ser realizada e, por tanto, sem protocolo.
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Um grupo avalia se a música aconteceu da forma esperada. Se não, o que


aconteceu? A escrita estava clara? O que pode ser melhorado?

4. Avaliação
Eu entrego as folhas com os questionários de avaliação. Leio com o grupo as questões
e as comento esclarecendo eventuais dúvidas.
43

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta parte final do trabalho, trago algumas reflexões a respeito da atuação docente no
estágio ao longo deste semestre.
A oficina que começou com vinte participantes, terminou com dez. Pelo que pude
avaliar, isto se deve a alguns fatores: houve uma baixa de integrantes do próprio coral,
algumas pessoas (como comentaram comigo) não poderiam continuar por que o horário não
era viável, e, suponho, algumas não se identificaram com a proposta da oficina. As pessoas
que permaneceram são muito interessadas e se envolvem com as propostas.
Os alunos tinham interesse pelo que era pelas propostas
Apesar da seriedade, construiu-se um clima leve e de bom humor na relação professor-
aluno e entre alunos, um fator importante que demonstra a construção de relações afetivas
saudáveis.
Formação e identificação
Esta foi uma experiência bastante nova para mim. Em momentos anteriores, em que
atuei como professor, tive experiências bastante diversas desta: PIBID (inicialmente em dupla
e depois sozinho, atuei dentro do currículo escolar dividindo espaço com um professor em
sala), Estágios I e II (inicialmente em trio e depois em dupla, atuei na educação infantil num
projeto interdisciplinar com alunos do curso de Teatro). Por tanto, vejo esta experiência como
uma grande contribuição para a minha formação como professor de música, uma vez que,
nesta, os alunos são adultos, estão lá porque querem, portanto, são interessados e eu sou
próprio professor.
Apesar de ter gostado muito das outras experiências que tive, nutro um carinho e uma
identificação especial com esta. Naturalmente entusiasmado, fiquei muito à vontade para agir
com liberdade dentro daquilo que julgava importante.
O que foi alcançado?
Sendo a ampliação da consciência musical um objetivo amplo, esta oficina tinha clara
a ideia de ser “de música” e não só “sobre música”. Ou seja, o intuito inicial era proporcionar
experiências práticas a partir do repertório do Coral UDESC que tornassem possível, claro,
num âmbito intelectual, o conhecimento, a compreensão, a análise, a síntese de conteúdos,
mas que também necessariamente, considerando o caráter vivencial e perceptivo do fazer
musical, essas experiências práticas fossem significativas não só por estarem vinculadas à
assimilação intelectual, mas por fazerem sentido no que diz respeito à ampliação da percepção
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sonora e musical de si e do mundo experienciando as relações e interações musicais consigo,


com os outros e com a prática coral.
Desta forma, muito do que se esperava foi alcançado e a experiência nos acrescenta
maturidade para perceber o que, neste momento, parece estar bom, e não temer as mudanças
de rumo revisitando os conceitos que pareciam já consolidados.

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRITO, Teca Alencar de. Koellreutter educador: O humano como objetivo da educação
musical. São Paulo: Peirópolis, 2001.

CALDEIRA FILHO, João da Cunha. Apreciação musical: subsídios técnico-estéticos. São


Paulo: Fermata, 1971.

FRANÇA, Cecília Cavalieri. Composição, apreciação e performance na educação musical:


teoria, pesquisa e prática. Em Pauta, v.13, n.21, p. 5-41 dez. 2002.

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