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FORMAÇÃO HISTÓRICA DE CRIANÇAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: DESAFIOS

E POSSIBILIDADES

Andressa Garcia Pinheiro de Oliveira


Professora de história na SME-Curitiba
Doutoranda PPGE-UFPR
http://buscatextual.cnpq.br/ K4268361E1
profandressagarcia@hotmail.com

Maria Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt


Universidade Federal do Paraná – LAPEDUH
http://lattes.cnpq.br/1253046260139699
dolinha08@uol.com.br

Nesse artigo será apresentada a proposta e resultados iniciais da investigação de


doutoramento sobre a potencialidade da aprendizagem histórica para a formação
histórica de crianças da Educação Infantil. A construção do problema de pesquisa
emergiu dos resultados da dissertação de mestrado “Aprendizagem Histórica na
Educação Infantil: possibilidades e perspectivas da Educação Histórica” (OLIVEIRA,
2013). Utilizando a metodologia da Pesquisa Colaborativa (IBIAPINA, 2008) foi
possível identificar a expressão do pensamento histórico de crianças entre 4 e 6
anos de idade, no contexto de uma turma de pré II de um centro de Educação
Infantil conveniado a Secretaria Municipal de Educação de Curitiba (SME). Evidência
que se contrapõe à ausência da História enquanto conhecimento específico nos
documentos orientadores da prática pedagógica produzidos pela SME-Curitiba entre
os anos de 2006 e 2010, como revelou a análise destes documentos com a
utilização da metodologia de Análise de conteúdo (FRANCO, 2007). Para debater as
possibilidades da aprendizagem histórica e da formação histórica na Educação
Infantil, essa investigação se fundamenta no campo da Educação Histórica,
especialmente a partir das contribuições da teoria da aprendizagem histórica de Jörn
Rüsen (2001, 2010a, 2010b, 2010c, 2012) e da pesquisadora inglesa Hilary Cooper
(2002,2006,2012).
Palavras-chave: Ensino de História, Aprendizagem Histórica, Formação Histórica,
Educação Infantil
Financiamento: bolsa CAPES

Apresentação

Durante a realização da investigação de mestrado “Aprendizagem histórica na


Educação Infantil: possibilidades e perspectivas da Educação Histórica” (OLIVEIRA,
2013), foram frequentes os questionamentos, tanto de pesquisadores do campo da
história, quanto da pedagogia, sobre a capacidade e potencialidade das crianças
pequenas aprenderem história. Um dos argumentos de ambas as áreas era de que
as crianças ainda não tinham desenvolvido uma “noção de tempo” que lhes
permitissem compreender fatos históricos.
Essa questão leva a pensar: em que momento da vida o agir não é orientado
pela interpretação da experiência, que é também experiência histórica? O que uma
criança almeja ser, seja herói/heroína ou professor/a, não diz respeito a
interpretação de experiências individuais e coletivas intrinsecamente também
relacionadas a cultura histórica? Elas não possuem capacidade para constituir uma
memória individual e coletiva (por exemplo, do próprio grupo familiar), que lhes
propicie a rememoração da experiência do passado?

Educação histórica e educação infantil: fundamentações teóricas

Ao tomar como referência o campo da Educação Histórica, compreende-se a


aprendizagem histórica como um processo de desenvolvimento do pensamento
histórico – ou consciência histórica (RÜSEN, 2001)-, que permita aos sujeitos
compreenderem a si e ao seu mundo na perspectiva do tempo. As investigações
nesse campo do ensino de história buscam compreender a constituição das ideias
históricas a partir de processos da cognição histórica situados em sua ciência de
referência.
A teoria do filósofo da história Jörn Rüsen, ao propor que a Didática da
História deixe de ser a ciência da transmissão/transposição do conhecimento
histórico para ser a ciência da aprendizagem histórica, coloca a aprendizagem
histórica em um projeto mais amplo, no qual se perspectiva o desenvolvimento da
consciência histórica, em um processo de formação histórica.
Para Rüsen, formação histórica não é um componente fixo de orientação
temporal, que se “adquire” e se passa a “possuir”, mas sim, que está relacionada a
reelaboração contínua das experiências correntes que a vida prática demanda no
tempo. Afirma ainda que “aprender é a elaboração da experiência na competência
interpretativa e ativa, e a formação histórica nada mais é do que uma capacidade de
aprendizado especialmente desenvolvida” (RÜSEN, 2010b, p. 104). Segundo
Rüsen, a história se encontra objetivamente em circunstâncias concretas da vida
presente, como também em outros resquícios do passado. Nesse sentido,

A formação histórica supera os limites da experiência ainda em uma


segunda forma. Ela amplia a orientação histórica por recurso a fatos
passados que não se encontram sedimentados nas circunstâncias da
vida prática atual. Ela abre o olhar histórico para uma amplidão
temporal em que o presente e a história inserida nele são
relativizados em contraste com outras histórias. Essas outras
histórias mostram ser possível existirem outros homens diversos do
sujeito particular. Com isso a particularidade da realidade histórica de
cada sujeito é posta sob uma luz que não mais admite a redução de
tudo à história própria de cada um. (RÜSEN, 2010b, p. 109, 110)

Quais seriam então as possibilidades da aprendizagem histórica para


crianças da Educação Infantil? Qual a potencialidade para a formação histórica
desses sujeitos? Para responder essas questões foi importante estabelecer um
diálogo entre a teoria de Rüsen e a proposta metodológica da pesquisadora inglesa
Hilary Cooper.

Educação histórica e educação infantil: pesquisas da Inglaterra e do Brasil

Cooper afirma que as crianças têm ciência de temporalidades anteriores a


elas próprias, e que, no entanto, a não mediação desta relação pela educação pode
implicar em compreensões incompletas e até mesmo estereotipadas (COOPER,
2012, p.17). Apontando caminhos a partir de pesquisas empíricas onde constrói
diálogos entre o “aprendizado da História” e as “teorias do aprendizado
construtivista” (COOPER, 2006, p.176), a pesquisadora propõe o desenvolvimento
do pensamento histórico a partir de “linhas do pensamento que estão no centro da
investigação histórica” que estão inter-relacionadas.
Uma delas seria a produção de inferências a partir de fontes: sendo as
fontes históricas vestígios incompletos do passado, é preciso saber fazer inferências
a respeito delas para saber o que podem ter significado para as pessoas que as
produziram e utilizaram.
A segunda diz respeito as interpretações do passado: apesar da produção
do conhecimento histórico ter compromisso com a plausibilidade, é necessário
compreender que este conhecimento é uma interpretação, realizado a partir de
determinadas fontes e permeado por diferentes interesses e perspectivas. As
crianças podem fazer interpretações sobre o passado, buscando compreender as
razões pelas quais, frequentemente existe mais de uma interpretação válida.
A terceira, seria o desenvolvimento de conceitos de tempo: que abrangem
o desenvolvimento do sentido e mensuração do tempo, causas e efeitos das
mudanças ao longo do tempo, semelhanças e diferenças entre períodos;
As investigações de Hilary Cooper não foram desenvolvidas apenas para
crianças da Educação infantil, mas também para as dos anos iniciais. No entanto,
ela demonstra como é possível desenvolver, mesmo que de forma embrionária,
essas linhas do pensamento histórico com as crianças pequenas.
Ela fundamenta-se na perspectiva da Educação Histórica desenvolvida na
Inglaterra, na qual a pesquisadora teve e tem um papel fundamental. O
desenvolvimento das pesquisas nesse campo do ensino de história - hoje
desenvolvidas também em diversos países-, tem levantado novas questões e
apontado novas possibilidades para a aprendizagem histórica, em convergência com
os debates realizados no âmbito da filosofia e didática da história. Estas indagações
dizem respeito aos ““usos” que os alunos fazem da história em termos da sua
orientação temporal” (SCHMIDT; BARCA; GARCIA, 2010a, p.11), sendo uma
referência fundamental para tal discussão a teoria da consciência histórica de Jörn
Rüsen.
No que diz respeito a aprendizagem histórica das crianças da Educação
Infantil, estes elementos ampliam a importância e a necessidade de investigações
que se preocupem com o que as crianças sabem sobre o passado, mas
principalmente como elas sabem, que relações estabelecem com o passado e
atribuem sentido, abrindo possibilidades para que esses conhecimentos sejam
mediados por um processo de aprendizagem histórica que contribua com a
formação histórica inicial das crianças.
Para Rüsen, "a autocompreensão das pessoas e o significado que dão para o
mundo sempre possuem elementos históricos específicos" (RÜSEN, 2010a, p. 88).
Essa ideia refere-se ao processo de cognição histórica humana, onde as carências
de orientação da vida prática demandam a interpretação da experiência no tempo,
que orientem o agir.
O desenvolvimento desses processos do pensamento histórico – ou
consciência histórica -, a partir dos princípios e formas determinantes da história
como ciência conferem ao direcionamento do saber histórico um valor formativo, ou
seja, “um modo de recepcionar esse saber, de lidar com ele, de tomar
posicionamento quanto a ele, de utilizá-lo” (RÜSEN, 2010b, p. 101). Para Rüsen, a
pretensão da racionalidade histórica é eficaz na prática como formação histórica,
como desenvolvimento da competência narrativa (experiência -ou percepção-,
interpretação e orientação) da consciência histórica. Essas estão correlacionadas e
podem ser compreendidas como as três dimensões de aprendizado da formação
histórica (RÜSEN, 2010b, p. 103; RÜSEN, 2010a, p. 114).
Pôde ser evidenciada na investigação de mestrado “Aprendizagem histórica
na Educação Infantil: possibilidades e perspectivas da Educação Histórica”
(OLIVEIRA, 2013), que há uma carência de pesquisas no Brasil que tenham como
preocupação o ensino e a aprendizagem da história para crianças da Educação
Infantil. É possível que isso corrobore com o fato de propostas orientadoras das
práticas pedagógicas1 produzidas pela Secretaria Municipal de Educação de Curitiba
-Departamento de Educação Infantil2, apesar de indicarem propostas que envolvem
a relação das crianças com o conhecimento histórico, apresentarem lacunas com
relação à presença da História enquanto conhecimento específico, o que se
evidenciou também nas proposições sobre “o que” e “como” trabalhar com este
conhecimento e as aprendizagens a ele relacionadas (OLIVEIRA, 2013).

Análise de conteúdo dos documentos que orientam a Educação Infantil em


Curitiba – PR – BRASIL e os resultados da pesquisa no âmbito da Educação

1 Documentos selecionados para o estudo: Diretrizes Curriculares para a Educação Municipal de Curitiba
– Educação Infantil (2006); “Objetivos de aprendizagem – uma discussão permanente” (CURITIBA, 2008);
Cadernos pedagógicos: “Oralidade” (CURITIBA, 2009a), “Movimento” (CURITIBA, 2009b) e “Arte –
Linguagem visual e teatral” (CURITIBA, 2011a); e “Leitura e contação na Educação Infantil” (CURITIBA,
2010a) que integra os “Referenciais para estudo e planejamento na Educação Infantil”. Foi definido como
critério para seleção dos documentos, aqueles que apresentassem um caráter prescritivo, ou seja, que fossem
orientadores da prática pedagógica e que estabelecem objetivos e estratégias de aprendizagem.
2 A Educação Infantil, como primeira etapa da Educação Básica, é uma responsabilidade atribuída
primeiramente ao poder público municipal. Após ter identificado que neste âmbito convergem as normatizações
Federais e Estaduais, delimitou-se como objeto da investigação, o estudo do caso na rede municipal de educação
de Curitiba.
Histórica

A análise destes documentos, não remete à intenção de revelar “o que


acontece” nas instituições de Educação Infantil, pois compreende-se de acordo com
Rockwell & Ezpeleta (1989), que é a partir da expressão local, “que tomam forma
internamente as correlações de forças, as formas de relação predominantes, as
prioridades administrativas, as condições trabalhistas, as tradições docentes, que
constituem a trama real em que se realiza a educação” (ROCKWELL & EZPELETA,
1989, p.11). Destarte, os documentos são tomados como artefatos da cultura
escolar, não referem-se a um retrato do real, mas podem ser elementos
significativos na constituição da cultura escolar.
Nos documentos analisados, a criança é concebida como sujeito capaz, “que
participa ativamente da construção do conhecimento sobre si e o mundo e de sua
própria história, o que reflete na cultura de seu grupo social” (CURITIBA, 2008, p. 9);
enfatizam a relação entre identidade e cultura, compreendendo que os sujeitos
fazem parte de uma cultura determinada historicamente, da qual sofrem influências
em sua constituição identitária e ao mesmo tempo interferem nela. Em convergência
com a concepção das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
DCNEI/2010 (BRASIL, 2010), a criança é então sujeito histórico, que constrói
sentidos sobre a natureza e a sociedade e produz cultura.
Parte-se do pressuposto, que o trabalho educativo deva ser também uma
oportunidade para o auto-reconhecimento como sujeito histórico, do
desenvolvimento da percepção de que se é parte da história, de perceber o presente
como resultado de ações humanas no tempo e que desta forma as ações
desempenhadas também constituem a história. Essa compreensão abarca as
relações entre passado, presente e futuro, e diz respeito a formação de uma
identidade que é também histórica.
Apesar das possibilidades apontadas a partir da análise dos documentos
citados e dos avanços obtidos na dissertação de mestrado (OLIVEIRA, 2013) em
relação as possibilidades de ensino e aprendizagem histórica com crianças
pequenas, faz-se necessário o avanço de pesquisas referenciadas na ciência da
História sobre essas potencialidades ou mesmo limites do ensinar e aprender
História na educação infantil.
Em contrapartida aos resultados supracitados, durante a investigação no
campo empírico através de práticas que se constituíram em colaboração (IBIAPINA,
2008) com professoras da Educação Infantil e da Observação Participante (VIANNA,
2007), foi possível abordar de forma intencional o passado com vistas a identificar as
ideias históricas das crianças, permitindo constatar que crianças entre quatro e seis
anos de idade pensam historicamente.
Os estudos apresentados na dissertação (OLIVEIRA, 2013), revelaram que
elas demonstram ideias sobre a experiência humana no tempo reconhecendo que a
passagem do tempo incide em mudanças. Que são capazes de pensar o passado
buscando aspectos que caracterizam sua alteridade temporal, imaginando
historicamente e explicando de forma plausível como poderia ter sido determinada
situação no passado. Constatou-se ainda que há uma diferença qualitativa na forma
como as crianças correspondem, ao abordar fatos do passado, com e sem a
possibilidade de buscarem evidências nas fontes históricas.
O trabalho com as fontes parece despertar nas crianças “o fascínio pelo
passado”, o que de acordo com Rüsen “pertence aos impulsos mais importantes de
aprender história” (RÜSEN, 2010b, p. 112). Elas são capazes de superar “o impulso
gerado pela fascinação”, ao buscar interpretar esse passado, buscando evidências,
fazendo perguntas, e construindo explicações.
Crianças demonstraram buscar nas evidências, elementos para avaliar a
plausibilidade de suposições acerca do passado e para construir suas
interpretações; revelando uma posição ativa e não passiva diante da explicação
histórica fornecida, respaldando-a em outra evidência. Apesar de não mesurarem o
tempo através dos meios padrões (relógio, mês, ano, século), revelam formas
próprias de sequencializar acontecimentos no tempo, tendo como referência
elementos de sua própria experiência. Nas oportunidades de conversarem sobre o
passado e principalmente ao trabalharem a partir de fontes históricas, as crianças
utilizam a linguagem do tempo, flexibilizando verbos no passado e utilizando
palavras que indicam a passagem do tempo, como: antigamente, antigo, mais velho,
há muito tempo, antes, ainda, primeiro, mês e ano (utilizam essas palavras para se
referirem à passagem do tempo, ainda que não correspondam ao significado formal).
Compreende-se que essas experiências presentes no âmbito da cultura
escolar, mesmo sem mediação intencional voltada ao pensamento histórico,
constituam, em conjunto com conhecimentos adquiridos em outros contextos
(família, programas de tv, filmes, etc.), o que a pesquisadora inglesa Hilary Cooper
aponta como uma certa “consciência do passado”(COOPER, 2006). A forma pela
qual as experiências dessa consciência do passado, são manejadas e interpretadas
para a atribuição de sentido ao tempo (que remete a compreensão de si e do mundo
na perspectiva do tempo), é a operação mental humana que se realiza na
consciência histórica. Assim, a maneira como os sujeitos se relacionam com a
história em suas diversas formas, desempenha diferentes papéis na formação de
sentido sobre a experiência temporal, que remete a orientação do agir, a identidade
e a identificação dos sujeitos.
A aprendizagem histórica então, se volta não apenas ao passado, mas à
possibilidade de constituição de “sentido histórico” para orientação temporal, que
abarca as relações entre passado, presente e futuro; é a capacidade com a qual as
pessoas
organizam temporalmente o âmbito cultural da orientação de sua
vida prática e da interpretação de seu mundo e de si mesmas. Essa
competência de orientação temporal do presente, mediante a
memória consciente, é o resultado de um processo de aprendizado.
Formação baseia-se no aprendizado e é, simultaneamente, um modo
próprio de aprendizado.(RÜSEN, 2010b, p. 104)

O processo de formação histórica das crianças pode estar relacionado ao


desenvolvimento de seu sentido de temporalidade, que encontra potencialidade de
desenvolvimento pela aprendizagem histórica. No entanto, parece haver uma lacuna
sobre o que seja, como se realiza e qual a potencialidade da constituição de sentido
temporal, que corrobore para a já constatada carência nas proposições que
envolvem a relação das crianças com o conhecimento histórico. Que concepções
sobre a constituição do sentido de temporalidade permeiam essas propostas?

Possíveis considerações para a continuidade da pesquisa

Para responder a questão anterior, no primeiro semestre de 2016 foi realizado


um levantamento de investigações acerca da aprendizagem histórica e do
desenvolvimento do sentido de tempo de crianças entre 0 a 6 anos, na base online
de anais da Associação de Pós-graduação e Pesquisa em Educação (ANPED),
publicados entre os anos de 2000 a 2015. Esse recorte contempla trabalhos de 14
encontros nacionais disponibilizados no site da instituição. Foram selecionadas para
a análise, pesquisas publicadas nos seguintes Grupos de Trabalho (Gts): Didática;
Educação da criança de 0 a 6 anos, Currículo; Educação matemática e Psicologia
da Educação.
Destes trabalhos apenas o artigo “Minha rotina, meu relógio” (EISENBERG;
LEMOS, 2009) apresentado no Grupo de Trabalho “Psicologia da Educação” propõe
discussão sobre o desenvolvimento de conceito de tempo na Educação Infantil, ao
discutir a relação da construção de conceitos de tempo das crianças em sua rotina
na instituição.
Assim como identificado na análise dos documentos orientadores da prática
pedagógica da SME-Curitiba, esse trabalho fundamenta-se na perspectiva da
sociologia da infância, em uma abordagem histórico-cultural sobre as concepções de
criança, cultura e aprendizagem. Esse escopo teórico têm sido importante para a
constituição da investigação sobre a aprendizagem histórica das crianças na
Educação Infantil, por contemplar uma análise cultural e não psicologizante dos
processos de aprendizagem e desenvolvimento humano.
As análises prévias, indicam que os trabalhos produzidos na perspectiva
histórico-cultural se preocupam com a “formação de sentidos”, compreendendo
portanto, o espaço da educação como meio para uma formação humana e propondo
a discussão de temáticas que contribuam para a superação de enfrentamentos da
sociedade atual, como questões “étnico-raciais, consumo, preconceito “estético”,
gênero,” uma formação “pra cidadania”, para a “participação infantil”, temáticas
recorrentes também nas DCNEI/09 e nos documentos analisados da SME-Curitiba.
Estes objetivos sugerem uma preocupação com o desenvolvimento de uma
determinada compreensão sobre o presente e de atitudes voltadas a preservação e
melhoria das condições da vida humana e do meio ambiente. Com isso pode-se
indicar duas questões relacionadas ao pensamento histórico; a primeira é a auto-
compreensão no fluxo do tempo em que as ações estão relacionadas às condições
futuras. A segunda, é de que compreender os problemas a serem solucionados no
presente, remete a determinada compreensão de ações humanas no passado, das
mudanças no tempo, possibilitando a percepção da continuidade e de projeção do
futuro.
O sentido de temporalidade, pode ser percebido como algo implícito ou uma
possibilidade para o desenvolvimento de aprendizagens relacionadas as questões
apresentadas. Elas não mencionam a relação com o passado, mas são questões
relevantes para um trabalho que envolva a experiência do passado, e significação do
presente a partir de sua historicidade. Ao integrar a aprendizagem histórica, podem
propiciar um contexto argumentativo que envolve as relações entre presente,
passado e futuro, e a possibilidade de constituição de sentido histórico.
Ao tratar de um contexto argumentativo, compreende-se como uma
oportunidade de as crianças desenvolverem narrativamente o sentido atribuído ao
tempo, visto que envolve o conhecimento delas sobre o problema - suas
experiências - , formas de interpretá-las para compreender e agir no presente, tendo
em vista uma perspectiva de futuro com a possibilidade de mudar o mundo em que
vivem.
Até o momento foi possível perceber uma consonância entre a documentação
e os artigos analisados, no que se refere a proposições que envolvem o pensamento
histórico, e lacunas quanto a contribuição do desenvolvimento do sentido de
temporalidade para esses processos de aprendizagem. Ao serem identificadas
também críticas ou a não utilização de uma visão inatista de desenvolvimento infantil
por “fases de desenvolvimento”, como interpreta-se a teoria piajetiana, é possível
que a mudança teórica, que, como revelam os dados da investigação, contemplam
de forma expressiva a perspectiva histórico-cultural, tenha encontrado um vácuo
sobre as possibilidades do desenvolvimento do sentido de temporalidade, não
considerando objetivamente o pensamento histórico.
Dessa forma, é preciso avançar nas investigações sobre como a
aprendizagem histórica pode contribuir com a formação histórica das crianças, para
que a retórica das palavras não seja mais forte do que a proposição de processos de
aprendizagem, que, efetivamente possam contribuir com a formação de sujeitos
conscientes e ativos perante aos problemas da atualidade, em uma perspectiva
humanizadora.

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