Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Christopher Bollas – Eu penso que está bem, para diferentes escolas, te-
rem seus próprios congressos. Eu acho que é uma boa idéia para os grupos de
estudos Kleinianos, para os Lacanianos, para os Kohutianos e outros realiza-
rem seus congressos, uma vez ao ano, e convidar pessoas para que apresentem
estudos especiais sobre essas concentrações. Penso, também, que é importante
ter especialistas, o que requer preparar o texto a ser estudado. Mas eu também
penso que é importante entender que, quando alguém imerge numa escola de
pensamento, há uma evidente canalização de propósitos, uma perda de espec-
tro; o que se ganha na intensidade se perde em perspectiva. Mas cada pessoa
pode recuperar isso, movendo-se continuamente ou criando um mesmo fenô-
meno em diferentes perspectivas. Ver um mesmo fenômeno a partir de uma
perspectiva Lacaniana, de uma perspectiva Kohutiana, de uma perspectiva da
Psicologia do Ego e assim por diante.
Em meus escritos, eu argumento que cada uma dessas perspectivas está
mostrando um ponto importante. Nenhuma delas é um sistema total de
conceitualização. Assim, portanto, no crescimento da Psicanálise há um de-
senvolvimento intelectual que está aumentando. Diferentes pensadores sur-
gem, conceitualizam coisas de diversas formas, proporcionando-nos uma nova
perspectiva que pode ser útil. Assim penso o desenvolvimento do psicanalista:
acredito especialmente que as pessoas deveriam começar a estudar Psicanálise
na Universidade, durante sua formação, quando elas são jovens. Assim, po-
dem iniciar com Freud na juventude e não na meia idade, no tempo em que
elas estão estudando Klein, Lacan, Kohut e outros. Eles são uma parte de múl-
tiplas perspectivas: do self, da natureza, da vida psíquica e sua complexidade,
porque a realidade psíquica é extremamente complexa e é melhor, para nós,
vê-la em múltiplas perspectivas. Por isso, qualquer escola, ao tornar-se
totalística, está eliminando outras perspectivas. E esta é uma forma indesejá-
vel de destruição, e não está a favor, a meu ver, do acolhimento de um pacien-
te, em termos de recebimento da transferência, em toda a sua complexidade.
Eu sei que alguns analistas se referem ao que deveria ser pluralismo, como
terapias diferentes. Eu não penso que isto poderia tornar-se um problema, isto
é, alguém poderia ter uma relação superficial em relação a cada uma destas
escolas. Desta forma eu reconheço, aprecio e penso que é preciso que um pen-
sador se aprofunde, ele mesmo, numa escola específica. Mas então sair disso e
ir para outro tipo de concentração. Eu não acho que estas imersões devam
durar 5, 8 ou 10 anos, eu penso que um estudante de Psicanálise pode ter bom
proveito com um supervisor, em um ano. E assim, se alguém faz seminários e
supervisões poderia estar comprometido com um estudo valoroso e muito in-
tenso: o movimento Kleiniano, Lacaniano ou Kohutiano, de aproximadamente
três anos cada. Assim, dentro de um prazo de 10, 12 ou 13 anos, incluindo
especialmente o período de formação universitária, pode-se, num tempo razo-
ável, estar informado sobre estas três, quatro ou cinco perspectivas majoritári-
as, incluindo, certamente, Freud. Dessa forma, eu penso que isto seja possível.
A única coisa que se opõe a isso são os movimentos que pregam que os
membros devem ser verdadeiramente leais. E ser leal significa que, quando se
chega à leitura ou citações, se deve citar, especialmente, os membros de seu
próprio partido. E tudo o que se deve fazer para ver o efeito desafortunado
dessa dimensão particular dos movimentos psicanalíticos é ir a qualquer des-
tes movimentos, ler os trabalhos e ver as referências. Eles somente fazem refe-
rência aos membros de seu próprio exército. E isto é algo que é profundamente
desafortunado e vai contra o que a Psicanálise representa. Assim, a esse respei-
to, o movimento segue se opondo ao significado da Psicanálise. Isto é
preocupante. Muito preocupante. Nós temos que parar com isto. Temos que
insistir para que isto pare.
SBPdePA – Nós sabemos que seus vínculos com a América Latina são
antigos, que sua família paterna viveu na Argentina, por alguns anos. Nós o
ouvimos falar que a América Latina desempenhou um papel importante para
o desenvolvimento da Psicanálise mundial. Numa certa oposição aos movi-
mentos recém mencionados. Poderíamos dizer que a América Latina teve a
função de um terceiro elemento ou de um terceiro objeto, nessa mudança?
Christopher Bollas na SBPdePA
Christopher Bollas – Sim. Eu estive ministrando um seminário nos últi-
mos sete anos, chamado “A Visão Européia da Psicanálise”, algo que eu não
creio ter podido ensinar há dez anos atrás. Eu não tinha claro qual era a visão
européia. Agora eu penso que tem algo surgindo: uma sensibilidade especial,
uma relação especial com a teoria, a multiplicidade de teorias de diferentes
terapeutas que me agradam, a posição de teorias, do que eu gosto, porque eu
não creio na integração delas. Não é possível integrar teorias. Elas sempre
estão justapostas. Cada uma é um ponto diferente de perspectiva.
Eu penso que o elemento que tem sido mais importante no desenvolvi-
mento da visão européia da Psicanálise é o espelho latino-americano, porque a
sociedade latino-americana já está no movimento há bastante tempo, convi-
dando psicanalistas europeus pelos quais tem especial interesse. Muitas vezes,
eram convidados membros de um movimento em particular, pela necessidade
de aprender, pelo desejo de saber, a curiosidade. O desejo de estar familiariza-
do com idéias que interessam aos grupos latino-americanos conduziu a uma
espécie de (“roofliness”/“open mind”) “abertura”/“despertar” intelectual, que
não caiu em associações políticas.
A sociedade latino-americana tem convidado pessoas pelas quais se inte-
ressa e têm trazido pessoas das sociedades européias, como da França, Grã-
Bretanha e outras partes, para as sociedades latino-americanas. Fazendo isto,
os visitantes também recebiam perguntas sobre outros analistas europeus, so-
bre suas orientações teóricas. E quando isto acontecia, implicava que os ana-
listas dos grupos europeus deveriam estar familiarizados com as principais
idéias de seus vizinhos, que estavam sendo discutidas, e assim eles eram força-
dos a entrar em contato com esses pensamentos. Agora, poder-se-ia dizer, que
isto foi no passado e foi uma evolução de geração. Eu penso que podemos ver,
agora, a emergência de um novo psicanalista, que é estrangeiro, mas que tem
verdadeiro apreço e compreensão por Klein, Winnicott, Bion, Lacan e isso é
alguém, penso eu, que encontrou, na diversidade, a riqueza de perspectiva. Do
meu ponto de vista, veria essas evoluções como certas elaborações de perspec-
tivas particulares sugeridas por Freud, que foram prioridade nessa epoca
marcada por movimentos totalísticos, mas que agora estão sendo pontos de
perspectiva de retorno e assim, penso eu, isto é encorajante. Por exemplo, o
psicanalista da América Latina, além de conhecer Freud, também tem passado
pela apreciação dos trabalhos de Klein, e o psicanalista Kleiniano também tem
feito uma imersão nos trabalhos de Lacan e Winnicott, naturalmente por Bion,
e isso tem levado, penso eu, a uma diversidade de perspectivas para os psica-
nalistas latino-americanos. Na realidade, se olharmos para Bion, a meu ver, ele
emergiu como um pensador majoritário na Psicanálise, muito estimado, pri-
mordialmente, pela maneira como foi celebrado na América Latina, nas suas
entrevistas que foram publicadas. Isto foi o que estimulou, impeliu, efetiva-
mente, o que forçou a revisão do estudo de Bion em Londres. É importante ver
que os psicanalistas sul-americanos não fazem exclusão do trabalho de outras
pessoas.
Christopher Bollas – Mas a pergunta hoje foi, acho eu, sobre a teoria de
alfa e beta de Bion no desenvolvimento da teoria da compreensão do sonho e
eu disse que pensava que esse período de alfa e beta nos ajudava a entender
uma importante dimensão da realização do sonho, mas que eu não a via tão
rica e complexa como formulação teórica do sonho, como é a teoria do traba-
lho do sonho de Freud. Assim, a este respeito, eu não penso que Bion, de forma
nenhuma e ninguém mais, nos tenha dado um entendimento mais sofisticado
do sonho do que o que Freud nos tem dado.