Você está na página 1de 15

1

PSICOPATOLOGIA PSICODINÂMICA

OS MECANISMOS DE DEFESA

O termo defesa foi usado por Freud em 1894, no trabalho “As Psiconeuroses de defesa”.
Porém, é através do trabalho de 1926 “Inibição, Sintoma e Ansiedade” que o termo defesa
adquire seu verdadeiro grau de importância, levando Anna Freud a descrever uma variedade de
mecanismos de defesa com base em exemplos concretos (vide “O ego e os mecanismos de
defesa”)

Além de Anna Freud, Melanie Klein também descreveu mecanismos de defesa que ela
considerava muito primários.

A palavra defesa, no sentido que hoje lhe é atribuído pela comunidade psicanalítica, exprime
uma série de operações que são efetuadas pelo ego diante dos perigos que procedem do ID,
do Superego e da realidade externa.

O ego, para evitar a angústia provocada pelas situações de perigo (estímulos internos e
externos que invadem o aparelho psíquico, causando-lhe desprazer), e que ameaçam a sua
constância, lança mão dos mecanismos de defesa. Portanto, as defesas nada mais são do que
operações efetuadas pelo ego visando reduzir ou suprimir os estímulos externos ou internos
que o invadem causando-lhe desprazer.

Em que situações o ego ataca o perigo é o que mostra a maior ou menor grau de sanidade
dele. Os mecanismos de defesa existem para defender o ego do perigo, às vezes não real, mas
apenas de um sentimento de angústia. Logo, ter defesas não é patológico, o patológico é não
as ter, já que nenhuma pessoa adoece por possuir defesas, mas sim pela sua ineficácia ou pelo
mau uso que faz delas. Por exemplo, na questão da aids o não uso de preservativos deixa o
indivíduo completamente indefeso, pois a aids mata. Logo, o preservativo é uma forma de
defender-se do perigo.

Portanto, as estruturas defensivas não são exclusivas da patologia, elas fazem parte,
normalmente, no ajustamento, adaptação e equilíbrio da personalidade. A patologia está na
quantidade de defesa utilizada, na sua rigidez etc. E, cada estrutura terá tipos específicos de
defesa (ex. obsessivos: formação reativa, isolamento, anulação).

Os mecanismos de defesa são mobilizados pela parte inconsciente do ego.

SUBLIMAÇÃO

Otto Fenichel denomina a Sublimação como a defesa bem-sucedida.


A Sublimação é o processo através do qual a energia originalmente dirigida para propósitos
sexuais é direcionada para novas finalidades, com frequência metas artísticas, intelectuais ou
culturais.

Freud utiliza o conceito de sublimação para explicar as atividades humanas sem qualquer
relação aparente com a sexualidade, mas que encontrariam o seu elemento propulsor na força
da pulsão sexual. Fala-se que a pulsão é sublimada na medida em que é derivada para um novo
2

alvo não sexual ou em que visa objetos socialmente valorizados, isto é, a energia sexual é
transformada em energia não sexual, como por exemplo, a transformação da paixão em amor.

A sublimação é muito importante, mas não se pode transformar toda a energia sexual; parte da
energia pulsional deve ser satisfeita no próprio homem, como ilustra Freud: “Um determinado
vilarejo possuía um cavalo com cuja força e trabalho estavam satisfeitos. Só lamentavam que o
animal comia aveia demais e esta era cara. Resolveram tirar do cavalo esse “mau costume”,
pouco a pouco, diminuindo a ração diariamente, até acostumá-lo à abstinência completa.
Durante algum tempo tudo correu magnificamente, o cavalo comia apenas um grão e no dia
seguinte devia finalmente trabalhar sem alimentação nenhuma. No outro dia o animal
amanheceu morto, sem que os habitantes do vilarejo soubessem o porquê”.

As pulsões sexuais que são sublimadas são as pré-genitais, isto é, a sublimação incide nas
pulsões sexuais parciais, principalmente naquelas que não conseguem integrar-se na forma
definitiva da genitalidade.

Segundo Freud, a sublimação é responsável pela civilização, ele diz que a mesma é resultante
de pulsões subjacentes que encontraram vias aceitáveis da pulsão reprimida.

A sublimação se caracteriza por apresentar uma inibição do objeto e uma dessexualização, e o


indivíduo que sublima nada sabe sobre sua própria pulsão sexual.

Existe ainda uma estreita relação entre a formação reativa e a sublimação. Só que enquanto a
sublimação proporciona prazer e é benéfica tanto para o sujeito quanto para o meio externo,
na formação reativa existe um caráter forçado as vezes compulsivo que desperta a angústia se
for deixado de lado.

Toda sublimação traduziria a capacidade do ego em usar os derivativos da pulsão (trieb) na


construção da cultura sofisticada. Segundo Baggio, a sublimação seria como usar uma queda
d’água não para provocar erosões do solo, mas para gerar energia elétrica que, por sua vez,
seria geradora de imagem e música.

Vínculos afetivos como os de ternura, camaradagem, amizade, sem objeto sexual, apontam
para a sublimação como relações humanas. Assim como, interesses humanitários, amor
universal, inspiração artística, obra literária apontam para a sublimação como criatividade.

Vale ressaltar que segundo a escola francesa, os desejos recalcados não podem ser sublimados,
razão pela qual, a sublimação haveria de ocorrer antes de qualquer recalque. Ainda é pouco
conhecido o malabarismo que o ego faz para que isso possa acontecer. Basicamente, para
haver uma sublimação será necessário que o instinto se dessexualize ou perca a agressividade e
se subordine à disciplina do ego sem, entretanto, estar reprimido e sim livre para a criação.

Exemplos de sublimação: O desejo infantil de brincar com fezes que é contrariado pelos
adultos. A criança desiste de brincar com fezes e em vez disso passa a fazer bolos de lama.
Mais tarde, a modelagem com argila substitui os bolos e poderá na idade adulta se tornar um
escultor.

 indivíduo que tem pulsões agressivas e se torna uma médico cirurgião.


 um orador é a expressão sublimada de pulsões sexuais orais.
 um indivíduo que tem pulsões exibicionistas e se torna modelo fotográfico.
3

NEGAÇÃO

Em alguns textos, este mecanismo de defesa é conhecido como denegação.

Historicamente a negação e a denegação constituem-se em dois momentos de um mesmo


mecanismo estudado por Freud nos artigos “A negativa” de 1925 e “O fetichismo” de 1927,
nos quais aprofundou suas idéias. Lacan enfatizou o termo denegação, associando-o às
perversões, cujo significado seria de “desmentido”. Aqui será usado os dois mecanismos como
sinônimos.

A negação é o processo através do qual o indivíduo desconsidera uma parte da realidade


externa ou interna, desagradável ou indesejável, seja por meio de uma fantasia de satisfação
de desejos, seja pelo comportamento.

É a tentativa de não aceitar na realidade um fato que perturba o ego. Os adultos têm a
tendência de “fantasiar” que certos acontecimentos não são assim, que na verdade não
aconteceram. Por exemplo, um rapaz que não seja popular entre as garotas pode convocar
uma fantasia que é o “Don Juan”.

Uma professora de piano que dá um concerto com seus alunos. O concerto foi um fiasco. A
professora diz que o concerto foi um sucesso. Ela nega a realidade para se proteger do
sofrimento.

Um menino pequeno que tenha medo do pai, poderia se gabar de ser ele próprio o homem
mais forte do mundo e que acaba de ganhar o campeonato mundial dos pesos pesados. Neste
caso, o menino nega seu próprio tamanho e fraqueza em relação ao pai.

Às vezes, a negação da realidade traz consequências desastrosas. Por exemplo, o indivíduo que
dirige seu carro de madrugada em alta velocidade, sem se deter nos cruzamentos. Neste caso,
está negando os outros carros, não quer parar o carro em cada esquina para não ficar com a
frustração. Porém, as consequências são catastróficas provocando o aparecimento de desastres
imensos. (negação onipotente). Ou, por exemplo, o indivíduo que diz “Eu seleciono bem os
meus parceiros”, “esse negócio da aids é bobagem”. Este tipo de negação é um mecanismo
thanático contra o próprio indivíduo. As consequências do ato são muito piores do que a dor
de não transar.

Toda negação da realidade traz um prejuízo à vida, empobrece o viver.

Na prática terapêutica, a incrível capacidade do paciente de lembrar-se incorretamente dos


fatos é a forma de negação encontrada. O paciente recorda-se de um acontecimento de forma
vivida, para mais tarde lembrar-se do fato de modo diferente e dar-se conta que a primeira
versão era uma construção defensiva.

A negação é o mecanismo herdeiro do recalque, já que geralmente o aparelho psíquico permite


a entrada parcial no espaço consciente daquilo que foi previamente reprimido. Isto é, o fator
repressivo seria, temporariamente, removido e o reprimido afloraria por um átomo de tempo
dando chance à consciência para negá-lo. Uma das provas da queda parcial das barreiras do
recalque consiste na fala dos pacientes que expressam: “não, jamais pensei isso” ou “não sei
quem é que essa pessoa representa nos meus sonhos, mas minha mãe, certamente não é”, está
querendo dizer: “sinto que esta pessoa representa minha mãe, mas ainda consigo negá-la”.
4

Embora a negação apareça nos quadros neuróticos e psicóticos, ela é um mecanismo básico
nas perversões. O pervertido é a pessoa cujo prazer sexual está bloqueado pela idéia da
castração; através do ato perverso ele tenta provar que não existe a castração.

Freud foi o primeiro a descrever o fenômeno da negação no fetichista, o qual sabe


conscientemente como é a anatomia dos genitais femininos, mas procede como se as mulheres
tivessem pênis.

PROJEÇÃO

A projeção é “o ato de atribuir a uma outra pessoa, animal ou objeto as qualidades,


sentimentos ou intenções que se originaram em si próprios”. É o mecanismo de defesa por
meio do qual os aspectos da personalidade de um indivíduo são deslocados de dentro dele para
o meio externo.

A projeção está ligada a um mecanismo de defesa primário fundamentalmente definido pela


ação de expelir, de expulsar, alguma coisa de dentro, que é desagradável, desprazerosa, mas
que fora anteriormente introjetado. Isto é, o que se projeta é aquilo que já foi introjetado.
Somente o que foi “engolido” pode ser “vomitado”.

A projeção é essencial naquele estado precoce do desenvolvimento do ego que Freud


denominou “ego prazeroso purificado” em que tudo quanto é prazeroso se experimenta como
pertencente ao ego (“uma coisa a engolir”) ao passo que tudo que é penoso ou doloroso se
experiencia como sendo não ego (“uma coisa a cuspir-se”).

A projeção tem o efeito de colocar no lado de fora (fora do ego) alguma coisa julgada
indesejável, mas que surgira no lado de dentro. O perigo é então externalizado. Isto é, a
projeção mediante a externalização é um meio de autodefesa contra o interno.

A ameaça é tratada como se fosse uma força externa. A pessoa pode lidar com sentimentos
reais, mas sem admitir ou estar consciente do fato de que a idéia ou comportamento temido é
dela mesmo.

Sempre que caracterizamos algo “fora” de nós como ruim, perigoso, pervertido sem
reconhecermos que estas características podem também ser verdadeiras em nós, é provável que
estejamos projetando. Assim, a grande maioria dos nossos preconceitos são projeções. Por
exemplo, “Todos os homens só querem aquilo” - eu só penso em sexo; “Você está com muita
raiva de mim” - eu estou com raiva de você.

Um menino foi ao zoológico com o seu pai. Ao passarem diante de jaula do leão que estava
muito inquieto, o menino diz: “papai, vamos embora daqui, você está com medo”. O
mecanismo da projeção se associa com a repressão, o indivíduo reprime a percepção do que
está nele e coloca no outro.

Por exemplo, o doente mental que projeta seus impulsos violentos e, em consequência pensa
estar em perigo de dano físico por parte do FBI, ou dos comunistas que querem destruí-lo. O
delírio de perseguição tem uma psicodinâmica que se pode compreender através do mecanismo
da projeção.
5

Por exemplo, Pedro gosta de João (se houver um conflito homossexual - um homem querer
bem a outro homem),o indivíduo usa da repressão (não fica na consciência que ele gosta de
outro homem); usa da formação reativa (tem amor no mundo interno e coloca o ódio para
fora) - Pedro odeia João (se isto ainda estiver em conflito), ocorre outra repressão e aí ocorre
uma projeção - É João que odeia Pedro.

O delírio de perseguição relaciona-se com a homossexualidade. O esquizo-paranóide tem


associações com conteúdo homossexual muito intensas. As falas do tipo: “Aquele cara está a
fim de me ferrar...de me enrabar; está querendo que eu leve no rabo” - estas expressões
contém o desejo latente passivo de receber o pênis de outro homem, só que isso está
projetado.

Embora a projeção esteja presente nos quadros neuróticos e psicóticos, constituindo-se na


base para os delírios de perseguição do paranóico, a projeção como atividade defensiva está
presente no cotidiano das pessoas ditas normais.

INTROJEÇÃO

Este mecanismo está intimamente ligado à incorporação que constitui o seu protótipo
corporal.

A introjeção “é o processo que consiste na assimilação, por parte do sujeito, de atributos ou


qualidades de um determinado objeto do mundo exterior”.

Enquanto na criança em desenvolvimento este mecanismo enriquece o ego; já que a


identificação é realizada através da introjeção; assim, como tudo que agrada, que é prazeroso é
igualmente introjetado. No adulto, a introjeção cria verdadeiros espaços internos. O
relacionamento do sujeito vincula-se a fantasia, em prejuízo de um contato mais intenso com a
realidade exterior.

O campo onde esse mecanismo tem sido mais estudado é nos processos de luto,
principalmente na melancolia. Por exemplo, na perda o objeto amado, este é introjetado e o
sujeito passa a ter algumas das características do objeto perdido. É clássico o caso em que
após a morte do pai, um dos filhos passe a adotar o “jeitão” do falecido. No entanto, quando a
pessoa começa a se comportar como se fora “mesmo” o pai, provavelmente estaremos diante
de um quadro psicótico.

No luto normal, o indivíduo acaba aceitando a perda; na melancolia, o indivíduo abandonado


(real ou imaginário) pelo seu objeto de amor não consegue investir a libido em outro objeto, se
identifica com o objeto perdido ; assim, não consegue expressar sua agressividade que se volta
para dentro de si mesmo (reintrojeta o objeto perdido e identifica-se com ele, e passa a
apresentar uma situação ambivalente: necessidade de destruir o objeto odiado, para livrar-se do
mal, destrói-se por inteiro.

Assim, se as características totais ou parciais do objeto perdido tomarem conta do sujeito e


este se comportar na totalidade como se fosse o objeto perdido, aí teremos a identificação
introjetiva.

Como exemplo de introjeção, pode-se citar a tendência vampiresca de determinados pacientes.


Estes indivíduos sentem-se esvaziados e necessitam de provisões externas para satisfazerem
sua auto-estima.
6

IDENTIFICAÇÃO

A identificação é “o processo psicológico pelo qual um indivíduo assimila um aspecto, uma


propriedade, um atributo do outro e se transforma, total ou parcialmente, segundo o modelo
dessa pessa”.

É através do fenômeno da identificação que se dá a humanização do sujeito, isto é, seu


crescimento afetivo, intelectual, social e espiritual.

A identificação deve ser diferenciada do mecanismo da introjeção, já que este é apenas o


protótipo da identificação.

A criança, durante o desenvolvimento, logo percebe que a avaliação que outras pessoas fazem
dela depende, em grande parte, de sua família e de outros grupos a que pertença. A posição de
seu pai, o tamanho de sua casa, a importância de seus parentes - tudo isso ajuda a determinar
sua posição e seu prestígio pessoal, e seu sentido de identidade passa a incluir essas fontes
internas de força e prestígio. Por essa razão, o mecanismo de identificação se amplia mais
tarde, de maneira a incluir grande diversidade de situações e pessoas, e permite ao indivíduo
ter, através de suas diferentes identificações, a experiência de realizações indiretas, sentimentos
de adequação e outras satisfações.

É comum, os pais se identificarem com as realizações de seus filhos, ou os empregados se


identificarem com o poder e o prestígio da empresa em que trabalham, assim como, os adultos
se identificarem com suas profissões etc. Através disso, o indivíduo considera como seus
alguns dos atributos desejáveis de grupos e instituições a que pertence.

Como exemplo de identificação pode-se citar a que é dada dentro da própria psicanálise.
Conta-se que James Stracey, tradutor e crítico da obra Freudiana, identificou-se tanto com o
mestre vienense que até a sua postura física se moldou à silhueta de Freud.

Pode-se falar em vários tipos de identificação na psicanálise:

Identificação primária: refere-se à que ocorre na fase indiferenciada do recém-nascido,


quando este é dependente e está “amalgamado” com a mãe. Isto é, a identificação primária
predomina em etapas muito arcaicas do desenvolvimento, onde reina o mais puro narcisismo,
momento este onde não existe diferença entre ego e objeto. O único diferencial, é que o sujeito
sente prazer ou desprazer, e será através deste parâmetro prazer e desprazer que o ego e os
objetos começarão a ser construídos.

Identificação secundária: refere-se à que ocorre ao longo da vida, a partir da fase de


reconhecimento do outro. Isto é, após as primeiras fases de constituição narcísica o sujeito se
dirige ao mundo objetal, reconhecendo cada vez mais as amplitudes do objeto. O que
inicialmente era fusional e fragmentário começa a ser cada vez mais diferenciado e totalizado.
Isto significa que se vai abandonando esse absolutismo da relação primária narcísica para se
observar, cada vez mais que os objetos são relativos. Ou seja, que os objetos se relacionam uns
com os outros e nem sempre, sobretudo com o sujeito. Em outras palavras, quando a criança
chega à idade do édipo, pela primeira vez na história seus desejos são negados (proibição do
incesto). A identificação secundária constituirá, portanto, o superego.
7

Identificação introjetiva: resultado da introjeção do objeto dentro do ego com qual passa a
se identificar totalmente ou parcialmente

Identificação com o agressor: Mecanismo descrito por Anna Freud, e que estaria na raiz da
formação do superego. Como o nome diz, a pessoa, ao se defrontar com uma agressão vinda
do exterior, passa a identificar-se com o agressor. A agressão poderá ser: uma crítica, uma
bronca, um xingamento, uma ameaça física, uma agressão real, uma pressão ideológica, uma
discriminação, um preconceito.

O agredido identifica-se com o agressor a ponto de assumir não só a sua ideologia ou atitude
agressiva, mas também o seu compromisso social, seus conceitos morais, o simbolismo de suas
vestes ou de sua postura física. E com a identificação chega-se ao cúmulo de o agredido passar
a agredir, da mesma forma, pessoas mais fracas. Geralmente, filhos violentos resultam de pais
violentos.

Pode-se ainda falar de outros tipos de identificação, tais como: identificação histérica,
identificação total, identificação parcial etc... além da identificação projetiva, abordado
anteriormente, por ocasião da teoria das posições de Klein.

FORMAÇÃO REATIVA

A formação reativa é o mecanismo no qual o indivíduo exibe comportamentos, sentimentos,


atitudes contrárias aquilo que inconscientemente se rejeita. Isto é, conscientemente o
indivíduo apresenta uma atitude aposta ao desejo reprimido que constitui uma reação contra
ele.

As formações reativas são compromissos transformados em traços de caráter, capazes de se


constituírem numa barreira defensiva constante contra a volta das tendências reprimidas.

Por exemplo, o indivíduo que procura arduamente agradar o outro quando seu motivo real
pode ser o medo de desagradá-lo.

Se o indivíduo é muito solícito, modesto ou muito afetuoso as possibilidades são de que esteja
disfarçando sentimentos opostos.

Exemplos:
reprimido formação reativa
crueldade compaixão
coprofilia repugnância a sujeira
hostilidade obediência
exibicionismo timidez
desejo sexual amor platônico
ódio amor
ira piedade
arrogância humildade

A formação reativa é um mecanismo de defesa típico dos quadros obsessivos embora possa ser
encontrado nos quadros histérios. Por exemplo, a mulher histérica que trata com ternura
excessiva o filho que no fundo odeia. Só que na histeria, a formação reativa não toma a forma
de um traço de caráter como é o caso das neuroses obsessivas compulsivas, isto é, esta mulher
nem por isso se torna mais afetiva do que outras mulheres.
8

Já, na neurose obsessiva compulsiva as formações reativas tomam a forma de traços de caráter
que se manifesta por rigidez, inflexibilidade etc... Por exemplo, o asseio ou ordem do
obsessivo compulsivo que luta, através destes traços caracterológicos contra as exigências
instintivas da sujeira e desleixo. Ou, a dona de casa que limpa continuamente e
incessantemente a sua casa afim de controlar e conservar inconscientes seu prazer pela sujeira.
Ou, o indivíduo que desenvolve uma atitude de grande ternura pelos seres humanos ou pelos
animais com o fim de controlar e conservar inconscientes os impulsos sádicos em relação a
eles.

ISOLAMENTO

O isolamento consiste em separar um pensamento ou comportamento, de tal modo que se


acham quebradas as suas conexões com outros pensamentos ou com o resto da existência do
indivíduo.

É a tentativa de distanciar-se das experiências ameaçadoras. Por exemplo, um pensamento


ameaçador é literalmente separado dos pensamentos que o precederam e dos que o seguem
por um breve período de tempo.

Um dos exemplos típicos na prática terapêutica é a dificuldade dos pacientes em associarem


livremente suas idéias para não entrarem em contato com algo perturbador.

Ao privar o pensamento isolado de qualquer conexão associativa na mente, o ego tende a


reduzir a possibilidade de sua reintrodução na consciência. É um modo de separar as partes da
situação provocadora de angústia, do resto da psique.

Por exemplo, o indivíduo que relata fatos, acontecimentos sem demonstrar sentimentos, neste
caso, o conteúdo emocional fica isolado dos fatos, o indivíduo não entra em contato com seus
próprios sentimentos. Há uma separação entre a representação insuportável e o seu afeto; a
representação permanece na consciência isolado do afeto; por isso o indivíduo dá a impressão
de ser frio, distante e impassível, como ocorre com os obsessivos, já que este mecanismo é
típico dos quadros obsessivos.

Ou, ainda os pacientes que tentam impedir o efeito terapêutico da análise, isolando-a do
restante de sua vida; aceitam-na apenas quando estão deitados no divã.

Um exemplo de isolamento muito comum é dos homens que se relacionam com prostitutas,
separando a ternura da sensualidade. Ou seja, só fazem sexo com quem não amam, não o
conseguindo fazer quando tem amor pela pessoa.

ANULAÇÃO

Mecanismo básico das neuroses obsessivas compulsivas.

A anulação consiste no aparecimento de ações que tem por finalidade contestar ou desfazer
um dano que, inconscientemente o indivíduo imagina que seus desejos possam causar, sejam
desejos sexuais ou hostis.
9

Um exemplo clássico é o da pessoa que vai verificar se a torneira do gás está fechada:
primeiramente ela abre a torneira para depois fechá-la novamente.

Prazeres simultâneos seriam formas de anulação, como o que acontece no fato de se fazer
leitura durante o ato de defecar: a expulsão das fezes seria compensada pela introjeção da
leitura.

As dúvidas obsessivas algumas vezes significariam dúvidas quanto ao êxito da anulação: foi ou
não possível anular determinado pensamento, sentimento ou ato? Pergunta-se.

Uma criança cuja hostilidade para com o irmão menor causa-lhe grande angústia se se tornar
consciente, poderá em vez disso sentir um desejo consciente de salvar animais doentes ou
feridos e tratar deles até que recuperem a saúde.

Neste caso, a criança com seu esforço para curar está inconscientemente anulando o dano que
seus desejos hostis poderiam causar a seu irmão.

Ressalta-se que toda ideía de anulação é uma idéia mágica. Por exemplo, o Homem dos Ratos
que retirava a pedra do caminho para que a carruagem não batesse, como uma forma de anular
o desastre que seu ódio poderia causar à mulher que amava.

Assim como, lavar-se repetidamente é a forma mágica de anular um ato anterior de sujeira. Os
atos compulsivos são a forma mágica de anular as idéias obsessivas.

DESLOCAMENTO

É um mecanismo básico das fobias.

O deslocamento consiste em transferir as características ou atributos de um determinado


objeto para outro objeto, que se encontra articulado ao primeiro por um elemento comum
(em geral). Ocorre apenas a mudança de objeto já que o ato é o mesmo.

É a medida defensiva comum no cotidiano de qualquer pessoa, sem que ele tome consciência
dela.

O exemplo clássico é a do funcionário massacrado pelo chefe que, ao chegar em casa, dirige
toda sua agressividade contida sobre a mulher e os filhos. De certo modo, a pessoa até tem
consciência da tensão a que está submetida, apenas não se dá conta da causa original, do
porquê de sua agressão à família.

A fobia do pequeno Hans é manifestada pelo temor do menino a cavalos. Segundo Freud, o
objeto cavalo possui atributos comuns ao objeto pai que o menino temia: força, tamanho etc.

Outros exemplos que podemos destacar: a criança que apanha da mãe e bate no irmãozinho ou
vencer o rival num jogo, que simbolicamente significa derrotá-lo no plano pessoal.

IDEALIZAÇÃO

A idealização é um mecanismo no qual o indivíduo atribui a outro indivíduo qualidades de


perfeição; isto é, vê o outro de um modo ideal.
10

O indivíduo atribui a outro qualidade de perfeição que o outro não possui porque se ele
perceber que o outro tem defeitos, isto será doloroso para ele.

É a defesa que nos faz acreditar na bondade e beleza dos objetos. A pessoa por quem se está
apaixonado, a moto do ano desejada servem como exemplos de objetos em que a idealização é
utilizada. A amada será a mais bela e carinhosa do mundo; a moto será a melhor até hoje
fabricada. Ninguém e nada terá defeitos para o idealizador.

A idealização é necessária em certos momentos da vida porque seria insuportável se o outro


não fosse idealizado. Por exemplo, ao fazer uma cirurgia - idealizo o médico: “é o melhor;
jamais vai ocorrer algo errado; ele jamais esquecerá uma tesoura na minha barriga”. Se não
houvesse essa idealização como alguém se entregaria nas mãos do médico.

A patologia ocorre na persistência da idealização, como Hitler - poucas foram as pessoas que
puderam vê-lo de um modo mais realístico; viam-no como um líder carismático (qualidades
que gostariam de ter).

A idealização está relacionada ao narcisismo (ideal de ego) - ideal que alguém gostaria de ser e
é projetado em outra pessoa.

CONVERSÃO

A conversão consiste numa transposição de um conflito psíquico e numa tentativa de


resolução deste através de expressões somáticas.

Para alguns autores esta seria uma atividade defensiva relativamente benigna com o
deslocamento das catexias em direção a órgãos do sentido e musculatura estriada, resultando
disfunções, tais como: tremores, paralisias, anestesias etc... O estudo da conversão está unido
à clínica da histeria, onde o emprego simbólico das inervações corporais serve como expressão
substitutiva das tendências alheias ao ego. A função do mecanismo de conversão é aliviar a
tensão afetivo-emocional por via de expressões somáticas.
Assim, o choro copioso, risos imotivados são também conversões que precisam ter seu
diagnóstico diferencial feito com as expressões emocionais normais.

Toda conversão explicitada através da musculatura voluntária sempre tem um significado


simbólico. Um braço paralisado poderá significar o medo da atividade masturbatória; uma boca
fechada em trismo (cerrada), com o maxilar endurecido, poderá significar o desejo proibido de
dizer impropérios, assim como, pernas contraídas significarão conflitos com o órgão sexual
masculino.

Certos músculos lisos também seriam atingidos pela conversão levando a náuseas, vômitos,
vontade de defecar e de urinar, talvez pela complexidade das invervações voluntárias e
involuntárias que se combinam.

REGRESSÃO

A regressão representa o retorno a níveis anteriores do desenvolvimento sempre que o


indivíduo se depara com uma frustração.
11

Este mecanismo de defesa é ativado todas as vezes que o indivíduo se depara com um conflito
que não consegue resolver, retornando para antigas formas de organização da conduta,
geralmente àquelas onde o conflito poderia ter sido resolvido.

Logo, a regressão é o ressurgimento de modalidades de funcionamento mental que


caracterizam a atividade da psique do indivíduo durante as fases primitivas do seu
desenvolvimento.

Do ponto de vista psicopatológico, a regressão se caracteriza por uma persistência (fixação em


uma determinada fase - intensidade com o que o indivíduo fica regredido, e, por uma repetição
da atividade mental primitiva).

Quase toda simbologia do comer, beber, fumar, drogar, alcoolizar, seria concomitantemente
aos fenômenos regressivos ou eles próprios.

A maior presença das atividades regressivas está na infância, quando a ansiedade permanece
em luta com o avanço das tendências genitais em crescimento. O urinar na cama do púbere é
uma regressão diante dos novos desafios escolares.

A regressão acontecida com o adulto não é exatamente como se fora ele uma criança: há uma
mistura de traços da personalidade adulta com traços infantis, oferecendo-nos uma visão de
uma figura desarmônica.

Os momentos de doenças, cirurgias, exames de vestibular, perdas afetivas ou qualquer stress


são propícios a comportamentos regressivos.

Alguns tipos de regressão se dizem que estão a serviço do ego, não sendo considerados
patológicos, tais como: o sono, o sonho etc.

Um acesso de fúria de um adulto equivale à “birra” da criança e são ambos, a seu tempo,
regressões diante de frustrações. O homem ou mulher que ameace abandonar o casamento
diante da primeira dificuldade; pessoas idosas que se voltam às lembranças do passado, são
outros tipos de regressão. Frases típicas do sentimento regressivo: “eu era feliz e não sabia”,
“bons tempos aqueles”.

Otto Fenichel fala em dois tipos de regressão:

a) regressão de formas adultas de sexualidade a formas infantis (regressão parcial)


É pré-requisito das neuroses. Por exemplo, o histérico oralmente fixado que exprime seus
desejos edipianos genitais em fantasias de felação ou em sintomas orais. Ou o obsessivo que
regride a fase anal sádica retentiva.

b) regressão ao narcisismo primário (regressão total)


É pré-requisito das psicoses, por exemplo, o esquizofrênico que regride a fase oral primária.

Vale ressaltar que no estudo da regressão deve-se ter especial atenção ao seu complemento
chamado fixação. A fixação seria uma tendência de se manter cristalizado, ou cronificados
sentimentos ou condutas referentes a determinada época do desenvolvimento psicológico.
Juntos, fixação e regressão constituiriam perigos ameaçadores ao desenvolvimento afetivo-
sexual iniciado no nascimento. Com a fixação, exigências de gratificação imaturas e infantis
são encontradas no comportamento do adulto.
12

Vale lembrar como acentuou Freud que toda neurose implica uma fixação, mas nem toda
fixação leva à neurose.

RACIONALIZAÇÃO

A racionalização é o processo pelo qual o indivíduo procura apresentar uma explicação


coerente do ponto de vista lógico, ou aceitável do ponto de vista moral, para uma atitude,
uma ação, uma idéia, um sentimento, etc..., de cujos motivos verdadeiros não se apercebe;
pode ser a racionalização de um sintoma, de um delírio, de uma compulsão defensiva, de
uma formação reativa, resultando numa sistematização lógica.

Em geral, não se costuma classificar a racionalização como mecanismo de defesa visto que
apesar de sua manifestação defensiva, ela não é diretamente dirigida contra a satisfação
pulsional, mas antes vem disfarçar secundariamente os diversos elementos do conflito psíquico.

Por exemplo, o patrão que justifica o baixo salário pago à sua secretária por achá-la
inexperiente e muito jovem.

Ou, o pai que espanca o filho por estar com raiva, dizendo que age assim para o seu bem, para
que ele cresça como um homem honrado.

Ou, o estudante que deixou de estudar para a prova para divertir-se, e diz que tirou notas
baixas devido a má qualidade do ensino; aos exames que foram injustos etc...

A fábula da uva verde, em que a raposa desdenha as uvas que não alcança é um bom exemplo
de racionalização.

Uma forma peculiar de racionalização é a intelectualização, pela qual, com muita teorização,
conhecimentos, especulações, tenta-se entender ou negar um conflito, sem propor ou aceitar
mudanças.

DOIS MECANISMOS BÁSICOS

Freud, desde o principio de sua obra, preocupou-se em encontrar um mecanismo básico para
as estruturas neuróticas e psicóticas.

Admite-se que a Repressão, Recalque do alemão “VERDRÄNGUNG” é o mecanismo básico


da neurose, enquanto que, a Forclusão (termo Lacaniano) do alemão “VERWERFUNG”,
também chamado de Rejeição, Desmentido, Repúdio, constitui a base das psicoses.

1) A REPRESSÃO / RECALQUE

A Repressão / Recalque constitui o primeiro e grande mecanismo investigado por Freud, que
implica na operação psíquica que exclui da consciência representações indesejáveis
mantendo-as à distância do espaço consciente.
13

Embora, o termo repressão tenha um uso consagrado e venha sendo usado como sinônimo de
recalque, vale ressaltar suas diferenças terminológicas, conforme salientaram Laplanche e
Pontalis que insistem no seu uso correto do ponto de vista dos franceses.

Segundo esses autores, a repressão consistiria na operação psíquica que exclui da consciência
um conteúdo desagradável, inoportuno, mas sem que haja transposição para o inconsciente,
isto é, as características da operação permaneceriam no pré-consciente, atingindo apenas os
afetos.

Já, o ato do recalque implica na operação de excluir da consciência as representações


indesejáveis transpondo-as para o inconsciente, isto é, as características da operação
permaneceriam no inconsciente, atingindo apenas as representações ideativas ligadas a pulsão,
tais como: pensamentos, imagens e idéias. Os conteúdos afetivos não seriam considerados,
ficando fora do recalcamento, sendo remetidos ao conceito de repressão.

A função do recalque é manter afastadas do plano consciente determinadas representações, o


que demanda um esforço permanente e contínuo.

Segundo Tallaferro, o recalque “é o trabalho que precisa fazer um homem que deseja manter
afundado na água um barril vazio; deverá usar uma força constante e a interrupção da mesma
permitiria que o barril voltasse bruscamente à superfície”.

Sem dúvida, o que se chama de “recalque propriamente dito” recai sobre os derivativos ou
ramificações das representações que sofreram o desejo primeiro, o assim chamado de primeiro
momento do recalque (recalque original). Por essa razão, os sintomas neuróticos, assim como
os sonhos e os lapsos, são derivativos ou deslocamentos das representações originais, que
emergem para a consciência, é o que se chama de “retorno do recalcado”.

O que, efetivamente aparece na consciência são os derivativos que deixaram de ser perigosos
exatamente pelo fato de serem substitutos daquelas representações originais.

Disso, pode-se deduzir o conceito de Resistência (que se constitui na evidência clínica do


recalque), impedindo as lembranças do esquecido, como se pode observar, quando cessam as
livres associações do paciente e o mesmo “tropeça” em silêncios, hesitações, negativas etc.,
constituindo-se em sinais indiretos de que o trabalho associativo se aproxima perigosamente da
representação original.

2) DIVISÃO / CISÃO - REJEIÇÃO / RECUSA / DESMENTIDO / FORCLUSÃO

A cisão foi inicialmente abordada por Freud em seus “Estudos sobre a Histeria” (1895), ao
reconhecer a existência de núcleos psíquicos independentes, autônomos, que não entram no
circuito associativo do resto do psiquismo. Entretanto, a cisão que interessa destacar é
proveniente dos artigos após 1927: “Fetichismo”, “Sexualidade Feminina” e o trabalho tardio
de 1937 “A Divisão do Ego no Processo de Defesa”. Neste, Freud aborda a divisão que ocorre
no âmago do próprio Ego, salientando a existência de dois núcleos antônomos e independentes
que coexistem simultaneamente, um ligado à realidade exterior e o outro ligado à realidade
instintiva.

Porém, o aspecto mais significativo de se salientar, que aparece na divisão do ego é que esses
dois núcleos possuem um lógica diferente. Enquanto um deles admite a existência da castração
e a ausência do pênis na mulher, tendo por isso saído na narcisismo, e portanto, ligado ao
14

principio de realidade, o outro núcleo permanece submisso ao principio do prazer, rejeitando,


rechaçando a castração, permanecendo no narcisismo, o que significa que a mulher tem pênis,
como se observa no Fetichismo, onde o objeto de fetiche é tratado pelo indivíduo como um
pênis.

A existência dessas duas atitudes psíquicas, diferentes tem como parâmetro central a questão
da castração. Enquanto uma das atitudes aceita a castração e por isso mesmo, o mecanismo
fundamental foi o do recalque, o que acarreta no aparecimento de sintomas neuróticos. A outra
atitude, recusa, exclui o conhecimento da não existência do pênis na mulher, não tendo acesso
ao conhecimento de uma parte da realidade, ficando submisso ao princípio do prazer, razão
pela qual, o mecanismo básico é o da cisão onde uma porção do ego rejeita a realidade criando
uma outra “realidade” que pode ir desde o objeto do fetiche (perversão) até um delírio
alucinatório (psicose).

No entanto, modernamente o mecanismo básico das perversões e das psicoses recebeu


denominações diversas como: Recusa, Rejeição, Desmentido, para traduzir a palavra alemã
“VERWERFUNG”. Em francês, apoiando-se no trabalho de Freud, “O Homem dos Lobos”
(1918), Lacan sugeriu o termo forclusion (forclusão) referindo-se a uma rejeição próxima do
recalque, mas que não se confunde com ele.

A forclusão implica que o ego rejeita a idéia incompatível juntamente com o seu afeto, e
comporta-se como se a idéia jamais tivesse ocorrido. No caso, o que é forcluído, rejeitado, é a
idéia da castração como se a mesma jamais tivesse existido.

Serge Leclaire utiliza a seguinte metáfora para explicar esse complicado mecanismo:
“Se imaginarmos a experiência como um tecido, quer dizer, ao pé da letra, como um pedaço
de fazenda constituído de fios entrecruzados, podemos dizer que o recalque será representado
por algum rasgão ou corte, mesmo grande, sempre passível de ser recosido ou cerzido,
enquanto que a forclusão seria representada por alguma abertura devido a própria tessitura
do tecido, em suma, um buraco original que não seria suscetível de reencontrar sua própria
substância, que não teria sido jamais outra coisa que não substância de buraco, o qual só
poderia ser preenchido, sempre de modo imperfeito, por um remendo, para retomar o termo
Freudiano”.

Deste modo, a alucinação, o delírio será a realidade que “tampará” o buraco a que se refere
Leclaire.

Vale ressaltar que, enquanto o recalcado - neurótico adquiriu o uso do simbolismo e ocultou,
empurradas para o inconsciente, experiências já - estruturadas, o psicótico - forcluído, rejeita
pura e simplesmente, risca o que vivenciou. Um elemento vivido, mas forcluído não poderá
jamais reaparecer. A forclusão é anterior a toda possibilidade de recalque, pois o recalque, para
ter lugar, exige um reconhecimento anterior qualquer do elemento a recalcar.

Serge Leclaire imagina o seguinte exemplo que se segue: dois companheiros absolutamente
bêbados foram perseguidos e conduzidos à sua casa por dois policiais que a gíria popular
chama de “andorinhas”. No dia seguinte, nenhum dos dois se lembrava deste acontecimento e
ambos se espantam com as contusões que sofreram. O acontecimento é, portanto,
radicalmente excluído de sua memória. Mas, alguns meses depois, um deles é presa de uma
delírio no qual se sente perseguido por numerosos pássaros, principalmente andorinhas, e isto
acontece cada vez que sai à rua.
15

Um acontecimento forcluído, riscado da memória, que vai, contudo, reaparecer sob a forma de
delírio: o que ilustra a implicação da psicose e da forclusão.

Classificação dos mecanismos de defesa segundo Kusnetzoff

NEUROTISMO PSICOTISMO
Projeção Identificação Projetiva
Repressão / Recalque Divisão/Cisão
Deslocamento Forclusão/Rejeição/Desmentido/Repúdio
Regressão Parcial Regressão total
Introjeção Identificação Introjetiva
Isolamento
Formação Reativa
Anulação
Negação
Conversão
Sublimação

Referências Bibliográficas

Almeida, W.C., Defesas do Ego: Leitura didática de seus mecanismos, São Paulo, Ágora, 1996
Chermama, R. Dicionário de Psicanálise, Porto Alegre, Artes Médicas, 1995
Fages, J.B., Para Compreender Lacan, Rio de Janeiro, Ed. Rio, 1977
Fenichel, O., Teoria Psicanalítica das Neuroses, São Paulo, Livraria Atheneu, 1981
Freud, A., O Ego e os Mecanismos de Defesa, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1990
Freud, S., Obras Completas, Rio de Janeiro, Imago, 1974
Kusnetzoff, J.C., Introdução à Psicopatologia Psicanalítica, Rio de Janeiro, Nova
Fronteira,1982
Laplanche J. e Pontalis, J.B., Vocabulário da Psicanálise, São Paulo, Martins Fontes, 1977
Leclaire, S. Mata-se uma Criança, Rio de Janeiro, Zahar, 1977
Palmier, M. J., Lacan, São Paulo, Melhoramentos, Edusp, 1977

Texto elaborado por Armando Chibante P. Coelho para ser utilizado na cadeira de
Psicopatologia Psicodinâmica.

Você também pode gostar