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Resumo
Historicamente, observa-se que, cada vez mais, a moda e o design se aproximam, pela prática
e pela teoria, onde o design, não somente como palavra, mas como campo teórico, passou a
fazer parte do universo da moda. Dessa forma, a partir de pesquisa bibliográfica sobre o tema,
o presente estudo tem por objetivo abordar o design como cultura de projeto aplicada a moda,
através da análise da ferramenta blue-sky, utilizada tanto no campo do design, como no campo
da moda, como recurso de pesquisa de tendências para inovação durante a fase metaprojetual
de design.
Abstract
Historically, it was observed that, increasingly, fashion and design approach each other,
through practice and theory, where the design, not only as a word, but as the theoretical
became part of the fashion universe. Thus, from literature on the subject, this study aims to
address the culture of design as applied to fashion design, through analysis of blue-sky tool,
used both in the field of design as in fashion as search capability for innovation trends during
meta design design.
Introdução
Dessa forma, a criação de produtos desse segmento pode ser caracterizada
fundamentalmente como uma atividade de projetar. Tem por objetivo o planejamento e a
configuração de produtos com soluções inovadoras, resultado de um conjunto de
conhecimentos desenvolvidos entre teoria e pratica, entre saber técnico e arte. De fato o
design de moda busca aporte teórico em outras áreas afins, como a Estética, a Sociologia e a
Antropologia, constituindo-se portanto como uma atividade transdisciplinar.
Nesse sentido, entende-se que a moda pode ser pensada de forma sistêmica e
complexa, a partir dos conceitos que cercam o universo do design. A moda também pode ser
entendida como um processo de configuração de objetos por meio de uma metodologia de
projeto que, por assimilação e similaridade, faz parte do campo do design.
Como diz Moura (2008) o design é um campo de conhecimento constituído por um
pensamento projetual orientado por um cenário futuro a partir de uma intenção destinada a ser
real, ou seja, trabalhar com design significa trabalhar com o futuro, com potencialidades, com
virtualidades, executando a concepção e o planejamento daquilo que virá a existir, anunciando
novos caminhos e possibilidades.
Assim, a cultura de projeto característica do design, presentifica-se na moda
principalmente se consideramos os métodos projetuais utilizados durante o processo de
concepção de novos produtos – processo de inovação -, onde a etapa de pesquisa de
tendências de novos cenários destaca-se como elemento fundamental de pesquisa para inovar
como parte do processo de criação.
De forma exploratória, o presente estudo tem por objetivo refletir e questionar o
universo do design de moda, a partir de prerrogativas conceituais e metodológicas próprias do
design como cultura de projeto, e para tal, utiliza-se da análise da ferramenta blue-sky
aplicada à moda. Essa ferramenta é uma referência cara ao campo do design, em particular ao
design estratégico, e, efetivamente, ao ser incorporada e utilizada no campo da moda como
recurso de pesquisa de tendências para inovação durante a fase metaprojetual do design, gera
uma ordem de questionamentos importantes sobre as fronteiras e as migrações entre moda,
arte e design na contemporaneidade.
mutação é propriamente a da moda como arte para a moda como design, como produto
industrial.
Segundo Rech (2009), o mundo da moda, através do design se conscientizou do seu
caráter estratégico como elemento condicionante de competitividade. Nesse sentido, a moda
que, no princípio estava fortemente atrelada ao conceito de arte, passou a fazer referência aos
princípios do design a partir do momento em que percebeu-se a necessidade de configuração
de objetos de uso voltados para o mercado de moda, promissor e representativo diante da
economia mundial.
Partindo-se do vestuário como uma das categorias de objetos privilegiados pelo
sistema da moda, observa-se que para sua produção, necessita-se de um conjunto de artefatos
que são articulados por meio de metodologias e processos criativos desenvolvidos por
designers na indústria. Logo, o designer de moda é o principal responsável pelo projeto do
produto, desde sua concepção até o acompanhamento da produção, é ele o articulador de todo
o processo. Uma vez estabelecida a relação entre moda e design através da noção de cultura
de projeto, cabe-nos agora aprofundar essa noção partindo do design propriamente dito.
Cultura de projeto
Segundo Flusser (2007), a palavra design, seja como verbo ou substantivo, está
relacionada a um contexto de astúcia e fraude. “O designer é, portanto, um conspirador
malicioso que se dedica a engendrar armadilhas”. (Flusser, 2007, p.182). Todavia, se o
designer engendra armadilhas para enganar a natureza por meio da técnica, o design pode ser
considerado um processo técnico e potencialmente inovador relacionado à concepção de
novos produtos. Nesse sentido, quando Flusser relaciona o design com fraude, refere-se ao
design no sentido de criar algo que até então não existia na natureza: um artefato, um projeto,
um objeto, etc. Isto posto, pode-se considerar que a palavra design está intrinsecamente
associada ao conceito de projeto.
Conceito de projeto é referido aqui como um método de trabalho, e é através desse
procedimento lógico que ele associa-se ao conceito de design. Para Munari (2001) um
produto de design necessariamente tem que obedecer a um método, que é próprio da razão de
ser do design. Logo, segundo Moura (2008), o design compreende o ato de projetar, que
consiste em um processo criativo de geração de idéias que conduz a um método de
configuração de objetos, desde a elaboração, passando pelo desenvolvimento até o
acompanhamento de sua aplicação. Para Lobach (2001), o conceito de design compreende a
concretização de uma idéia através da construção de projetos que resultam em um produto
industrial.
Visto por esse aspecto, o design faz referência a um processo de mercado, que oferece
soluções ou propostas industriais para determinadas demandas de consumo. Segundo Celaschi
(2007), o contexto contemporâneo é caracterizado pela hiper-proliferação dos bens
industrialmente produzidos e pela superioridade quantitativa da oferta em relação à da
demanda. O valor das mercadorias é a razão da produção e do consumo, logo o design é
inserido nesse contexto como um método qualificado de projeto que tem a capacidade de
transformação do sistema de produção em sistema de consumo de mercadorias.
O design, por sua vez, segundo Celaschi (2007), se ocupa de tudo aquilo que pode se
tornar instrumento de satisfação de um consumidor mediante sua programada e projetável
aposta em forma de mercadorias, que transforma um bem qualquer em objeto de comércio no
mercado. Ou seja, o design não se ocupa apenas da forma das mercadorias, mas oferece ao
mundo das mercadorias uma área sem limites de produção de significados.
Assim, o design torna-se cultura de projeto, entendida aqui, como o projeto da
mercadoria, que por sua vez, orienta o projetista a responder às exigências do mercado
Figura 1: Esquema linear de desenvolvimento do processo metaprojetual. Fonte: adaptado de Deserti (2007).
Contudo, o autor argumenta que esse esquema colhe apenas uma parte da
complexidade do problema, isso porque cada fase pode transformar-se em oportunidade para
o designer. Assim, a figura 2 representa tais desdobramentos.
De acordo com Scaletsky e Parode (2008), durante a etapa metaprojetual, visões
divergentes de um mesmo problema de projeto (briefing) são confrontadas visando
reposicionar o problema (contrabriefing). Esse processo exige, de um lado, um conjunto de
pesquisas visando a compreensão do contexto interno e externo do problema, e de outro, um
conjunto de instrumentos visando a configuração de tendências de projeto aplicáveis para o
problema que está sendo abordado.
Nesse sentido, com o objetivo de clarear o processo, Deserti (2007) divide a fase da
pesquisa metaprojetual em duas macroáreas: pesquisa contextual e pesquisa blue-sky.
Para Deserti (2007), a pesquisa contextual consiste em um sistema de coleta de
informações úteis acerca da empresa e do seu contexto de mercado. Esse tipo de pesquisa
gera um documento chamado “Dossiê Empresa-Mercado”, o qual orienta o designer no
processo de tomada de decisões na fase de projeto.
Já, a pesquisa blue-sky, segundo Deserti (2007), representa a construção de direções
ou oportunidades para a inovação na fase de projeto. Esse tipo de pesquisa gera um
documento chamado “Dossiê Cenários de Inovação”, o qual orienta o designer durante o
processo criativo.
Figura 2: Esquema sistêmico de desenvolvimento do processo metaprojetual. Fonte: adaptado de Deserti (2007).
pesquisa blue-sky, que por sua vez, conduz a construção de cenários de inovação, possíveis de
serem aplicados ao projeto.
Pesquisa blue-sky
A etapa metaprojetual insere-se em um espaço dinâmico e em constante mutação que
caracteriza a complexidade do ato de projetar. O metaprojeto aborda estratégias de construção
de cenários de inovação, qualificando a pesquisa blue-sky como um mecanismo de geração de
idéias de projeto.
A pesquisa blue-sky remete, assim, a busca de elementos para direcionar a criatividade
e o desenvolvimento do projeto através de estímulos que podem ser definidos como
facilitadores do pensamento, favorecendo a intuição do designer durante o processo de
projetação. De acordo com Scaletsky e Parode, “a pesquisa blue-sky busca exemplos e
estímulos [...] a fim de, por transferências através de raciocínios analógicos, obter-se
indicativos do que poderão ser cenários para a construção de respostas a um problema de
design” (2008, p.1).
Por sua vez, a construção de cenários corresponde a construção de mundos possíveis,
onde o designer poderá atuar na busca de respostas ao problema de design. No entanto, ao
contrário da pesquisa contextual, a pesquisa blue-sky não precisa manter, necessariamente, um
vínculo de dependência com o problema de design, mas sim, trata-se de uma busca
organizada de elementos que favoreçam insights criativos em direção a inovação. Segundo
Cautela (apud Scaletsky e Parode, 2008), a pesquisa blue-sky pode ser considerada um tipo
de pesquisa não-filtrada, onde não existe uma direção pré-definida ou um modelo de ação
codificada.
A partir dessa perspectiva, Scaletsky e Parode (2008) enfatizam a importância da
imagem na dinâmica da pesquisa blue-sky. Para os autores, a imagem e seus mecanismos de
produção de sentido está no cerne da problemática que suscita a pesquisa blue-sky.
A imagem se constitui de signos, produzindo textos carregados de mensagens, que no
seu conjunto formam os limites daquilo que a percepção define em tal imagem. Logo, a
imagem funciona como um dispositivo, ou ainda, como um signo produtor de sentidos que
leva o designer a construir novos conceitos ou visões de mundo.
Nesse sentido, instrumentos como o moodboard, storyboard e outros gráficos podem
ser altamente eficazes para a organização e visualização de referências em uma pesquisa blue-
sky, facilitando o pensamento associativo por imagens.
Pode-se dizer que o pensamento associativo por imagens é fator relevante na dinâmica
da pesquisa blue-sky. Isso porque a construção de pesquisas do tipo blue-sky, segundo
Scaletsky e Parode (2008), poderia estar associada a um processo de busca e externalização de
um conhecimento tácito, decorrente de experiências e modelos mentais trazidos pelos
designers que trabalham sobre o projeto.
Assim, o pensamento associativo por imagens e a externalização desse pensamento
através de um conhecimento tácito, leva o designer a construir metáforas, que por sua vez
representam espaços conceituais para o projeto. A construção desses espaços, não busca a
elaboração direta de resultados concretos, mas sim, a busca de novos significados para o
projeto.
Observa-se também, a presença de uma dinâmica de busca por novos conceitos de
projeto no desenvolvimento de produtos de moda que, da mesma maneira, utiliza-se de
técnicas de pesquisa, como estímulo para a criatividade do designer.
Conclusões
Com a evolução e expansão do conceito de moda, a criação de produtos desse
segmento, passou, nos últimos anos, a buscar referência nos conceitos de design, sobretudo no
que se refere a configuração de projetos. Na moda, como em qualquer outro segmento da
indústria, os métodos de planejamento se fazem presentes durante todo o processo de
projetação de um novo produto, principalmente se considerado o metaprojeto como estratégia
de inovação.
O processo de projetação de um produto de moda, assim como no design, também
pode ser dividido em duas etapas: a etapa metaprojetual e a etapa projetual. A partir dessa
perspectiva, a pesquisa blue-sky pode ser evidenciada na criação de produtos de moda como
um mecanismo de geração de idéias de projeto. Na moda, a pesquisa blue-sky, representada
através da “Pesquisa de conteúdo de moda”, está associada à construção de painéis de
tendências, ou seja, ao moodboard onde são agrupadas imagens de referência para construção
de possíveis cenários para o projeto e, que por sua vez, se transformarão no conceito da
coleção de moda.
Assim, a pesquisa blue-sky exerce papel fundamental nesse processo, pois atua como
uma ferramenta de busca de informações para a construção de cenários de inovação, que por
sua vez conduzirão a definição de conceitos de projeto.
Nesse sentido, se o design é considerado um processo de projetação com ênfase na
criação e geração de idéias que conduzem a um método de planejamento e configuração de
novos produtos, a criação de moda, a partir do design, pode ser caracterizada como design de
moda, onde a “Pesquisa de conteúdo de moda”, aqui relacionada a pesquisa blue-sky, exerce
papel fundamental.
Referências
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LOBACH, B. Design industrial: bases para a configuração dos produtos industriais. 1ª ed.
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MORAES, D. de. Metaprojeto: o design do design. In: 7º. Congresso Brasileiro de Pesquisa
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