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“Não estava amando a Deus, portanto não conseguia me amar e achava que estava

amando alguém”

Tudo começou em 2014, quando eu trabalhava em um jornal grande na cidade em


que morava. Lá eu a conheci. Eu tinha 23 anos e ela tinha 30. Eu era cristão. ela espírita.
Na época, ela estava se separando e, como nos tornamos amigos, sempre desabafava
comigo para que eu pudesse aconselhá-la a respeito.
Com o tempo e a amizade, passamos a nos aproximar. Em cerca de 8 meses desde
que a conheci, começamos a sair e ficar. Era um momento da minha vida em que eu estava
questionando alguns pontos sobre a minha fé e queria viver “tudo o que tinha direito”. De
vez em quando lia a Bíblia, ia à igreja, mas não levava mais a sério.

Já no começo, embora não fôssemos um casal, ela demonstrava ter ciúmes


dos meus amigos e da minha família.

Com o tempo, tornou-se algo sério. Acredito que o que mexeu comigo para aceitar e
me manter nesse relacionamento foi o fato de ela ter uma filha. Sempre foi meu sonho ser
pai. Quando estava com as duas, sentia-me parte de uma família. Todos os meus amigos já
sabiam que estávamos juntos e me sentia feliz com isso. No entanto, da parte dela, os
amigos e família não sabiam que tínhamos algo, ela sempre escondia. Apenas supunham.
Achava curioso o porquê de não ser assumido, mas relevava.

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Percebi que a possessividade dela era tamanha a ponto de sempre reclamar das
minhas idas à faculdade.
- Se eu não for para a faculdade, não vou me formar. Desse jeito, não terei um
emprego melhor e não vou poder ajudar com um salário mais alto - respondia.
Até uma amiga minha de infância se tornou alvo de ciúmes da parte dela. Brigava
comigo para que não fôssemos mais amigos e quando a via pessoalmente na farmácia ou
no mercado da cidade, fingia que não conhecia.

Por mais que fosse difícil, na minha cabeça vinha sempre o lema “eu vou fazer
dar certo” e pensava que uma hora ela ia mudar.
Afastei todo mundo de perto de mim porque eu sentia vergonha de tudo o que eu
estava fazendo. Até minhas crenças religiosas se tornaram uma maneira de ser
desqualificado. Abandonei tudo o que eu acreditava por ela.
Tornei-me completamente um capacho, uma peça utilitária. Fazia de tudo por ela,
desde matar barata até instalar máquina de lavar. Sempre que eu tentava sair disso, ela me
segurava com persuasão. Como era mais velha que eu, de alguma forma sabia jogar com
os meus pensamentos.

Por dois anos vivemos esse padrão de relacionamento: ela me fazia me sentir bem e
parte de uma família e depois pisava em mim.

Houve um dia em que cheguei em sua casa e ela estava bebendo com algumas
amigas. Logo que abri a porta me ofereceram bebida, mas eu recusei pois tinha
compromisso no dia seguinte.
- Eu até queria, mas eu vou doar sangue amanhã pela manhã, já marquei faz um
tempo. À noite eu posso beber com você, pode ser? - expliquei. De súbito, ela fechou a cara
e ficou transtornada. Foi tão constrangedor que até as amigas se despediram e foram
embora.
- Tem tanto cara aí querendo sair e beber comigo e você desperdiça as suas
oportunidades - comentou.
- Não é que eu não queira, hoje eu não posso. Mas amanhã à noite eu bebo com
você, como te expliquei - respondi.
- Tá bom. Então vou sair e ficar com o primeiro cara que aparecer para mim!
- Olha, você que sabe. Mas suas atitudes têm consequências. Se fizer isso,
terminamos - encerrei a conversa e fui para a sala brincar com a filha dela.

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Vindo atrás de mim, ela começou a jogar a almofada com força. Pedi que parasse e
ela continuou. Disse a ela que se continuasse, eu iria embora. Novamente, jogou a
almofada com força em mim. Despedi-me da criança e fui saindo.
- Se você sair por essa porta, acabou! - gritou.
- Você está ouvindo o que você mesma está impondo, então isso é com você - Abri
a porta e fui pegar meu tênis. Ela segurou na ponta enquanto gritava que eu era um
covarde. Sem saber o que fazer, eu puxei o tênis e, como ela estava bêbada, caiu no chão.
Quando fui ajudá-la, veio me dar um tapa no rosto. Peguei meu sapato e fui para a casa de
um amigo. Pedi para minha irmã trancar a casa e não atender nada.
Ela me ligou várias vezes me dizendo que quebrou o braço quando caiu, pra eu
voltar e ver como estava. Mas eu sabia que não era verdade, apenas uma forma de
manipulação. Quis muito dar um basta nesse dia, mas sua persuasão me segurou.

Entre indas e vindas, ela veio com a notícia de que estava grávida.

Empolguei-me absurdamente com a notícia. Naquela época eu estava ganhando


bem com freela e, se conseguisse pegar um emprego fixo, poderia ter estabilidade
financeira o suficiente para cuidar da minha nova família.
- Mas nós vamos abortar, não é? - interrompeu todos os meus pensamentos.
- Não, nós temos condições de cuidar e quero ter essa criança! - respondi.
- Você é muito novo para ter filhos - disse com descaso.
- Tenho 25 anos, essa é a idade que meu pai tinha quando eu nasci. Temos
condições de sustentar e cuidar dessa criança. Vamos fazer assim: se você não quer ter,
tudo bem. Pago todas as despesas que teremos durante a gestação, desde as suas até os
preparativos para o bebê. Apenas gere a criança, eu assumo, cuido e fico com ela. Só te
peço isso. Começamos a fazer os testes e a cada negativo, eu ficava mais triste porque
essa era a concretização dos meus sonhos.

Resolvi conversar com Deus em uma das orações mais sinceras que fiz na minha
vida.

- Senhor, eu te peço para que essa criança não pague o preço do meu erro. Se
alguém tem que pagar, que seja eu. Se ela realmente estiver grávida, eu vou cuidar dessa
criança e vou criar nos Teus caminhos sozinho. Mas se não for verdade, terminarei esse
relacionamento de uma vez por todas. Faço um voto com o Senhor, nesta madrugada, de
que nunca mais colocarei algo entre mim e Ti.
O teste de farmácia deu negativo, assim como o de sangue. Por último, vinha o
ultrassom. Sem falar para ninguém, aguentei tudo isso e não terminei pensando em como
ela ficaria. Esperei o quanto pude.
No entanto, há algum tempo eu não visitava minha família no interior e como era
aniversário do meu pai, decidi fazer uma surpresa. Quando estava terminando de arrumar
minha mala para ir, ela me ligou dizendo que o resultado do ultrassom havia sido negativo.
Respondi que, assim que voltasse de viagem, conversaríamos sobre nós.
Em uma semana no interior, decidi que era o término mesmo que eu queria. Meu
medo era conversar com ela pessoalmente, porque com certeza seria manipulado. Então
decidi mandar um textão no whatsapp explicando todos os problemas e motivos para não
estarmos mais juntos. Naquele exato momento, quebrei meu chip no meio e excluí tudo o
que tinha dela.
No dia seguinte, enquanto conversava com a minha mãe no escritório da loja do
meu pai, ele me chamou dizendo que ela estava na porta me esperando. Minha mãe entrou
em desespero. Sempre a chamei para visitá-los, mas nunca quis.

Dessa vez, seu esforço foi tamanho a ponto de sair batendo de porta em porta na
cidade até descobrir onde era o comércio do meu pai.

- Tudo bem, vou enfrentar isso sozinho! - saí pelo balcão e fui ao seu encontro. Ela
me tratou como se nada tivesse acontecido, como se fosse apenas uma visita. Bati o pé
dizendo que era um término e que não queria mais vê-la. Meu medo era que ela quisesse
quebrar a loja.
- Beleza. Eu vou ficar aqui até à noite e vou embora amanhã. A gente pode sair para
comer alguma coisa? - perguntou, mais uma vez, como se nada tivesse acontecido. Talvez
desacreditada de que era um término mesmo.
- Não, não podemos. Estamos terminando e minha família não vai querer recebê-la.
Você perdeu as oportunidades de visitá-los em dois anos em que estivemos juntos - fui
firme
- Ah sim, então está bom. Quero chamar alguém para se despedir de você -
respondeu, enquanto trazia a criança. Essa era a maior forma de me manipular, ela sabia.
Doeu-me o coração deixar que a menina fosse, mas eu tive coragem e me despedi dela
com um abraço. Aos poucos, vi a imagem delas se perdendo no caminhar da estrada.
Ao voltar para o escritório da loja, minha mãe estava aos prantos. Junto dela, eu
também chorei. Mas era um choro de liberdade, pois havia acabado.

Comecei a compreender o sentido do papel bíblico do homem que é amar como


Cristo amou a igreja.

Eu estava tentando fazer isso, mas no sentido errado. Foram dois anos em que eu
não existi. Não estava amando a Deus, logo não conseguia me amar e achava que estava
amando alguém. Entendi que masculinidade não é aquele negócio de ter barba grande e
cortar árvores, como a sociedade prega, mas justamente entender a responsabilidade
daquilo que você faz e sobre outras pessoas.
Pensava eu, naquela época, que isso não acontecia com homens, apenas com
mulheres. Minha família me ajudou a me reerguer de diversas formas. Desde meu
emocional, até meu espiritual. Algumas amizades eu não consegui recuperar, mas fiz outras
ao longo do tempo.

Dois meses depois eu vim para São Paulo. Passei a receber mensagens dela por
perfis fakes, números desconhecidos e até por amigos em comum.

No meu primeiro aniversário na capital, ela mandou entregar uma encomenda no


meu trabalho (que descobriu o endereço não sei como, provavelmente pelo linkedin). Fiquei
com medo de abrir o envelope. Tive que sair do escritório e, quando abri, era um livro com
fotos e cartinhas da menina. Nem li, apenas joguei fora.
A última vez que ela me contatou foi no final de 2018, dizendo que mora no centro
de São Paulo, que é onde eu moro. Não a respondi. Mas juro que, um dia num almoço, a vi
me olhando de longe. 99% de certeza que era ela, até travei de medo.

O conselho que eu dou para quem está lendo a minha história é:

1. Não abra mão da sua identidade. Só mude se você precisar, por você e não por
outra pessoa. Mude apenas falhas de caráter.
2. Homens, existem relacionamentos abusivos para nós. Se você se identificou com
essa história, “é bilada, cino”. Vai doer, mas pula fora.
3. Não descontem nos próximos relacionamentos as frustrações que tiveram antes.
Existem pessoas boas e honestas. Façam terapia.
4. Quando saírem do relacionamento, deem um tempo antes de ir para outro.
Precisa de tempo para se curar. Uma coisa de cada vez. Dá para ser feliz sozinho.

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