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Leituras militares

Olavo de Carvalho

Comunistas e filocomunistas têm feito o diabo para instilar nos militares brasileiros um anti-
americanismo cretino e suicida que só servirá para transformá-los em cópias de Hugo Chávez, senão de
Saddam Hussein. Ligeiramente maquiado, o velho terceiromundismo de Lumumba e Frantz Fanon vem
adquirindo foros de “doutrina militar brasileira” e, se não for desmascarado em tempo, acabará por levar
este país à última degradação.

Qualquer pensamento estratégico-militar só pode se estruturar a partir da localização e definição de um


“inimigo”. Martelando e remartelando aos ouvidos de oficiais superiores a lenda do “mundo unipolar”, os
agentes da confusão lograram fazê-los crer que a divisão do mundo já não é mais Leste-Oeste, ou
capitalismo-comunismo, e sim Sul-Norte, pobres contra ricos. Parece lógico, não é? Num mundo
unipolar, quem pode ser o “inimigo” das “nações periféricas”? O pólo único, naturalmente. Logo, o
“establishment” militar brasileiro deve se preparar para um confronto com os EUA. Não podendo vencer
pelas armas, deve montar uma estratégia de dissuasão, que induza o adversário a desistir de uma
guerra trabalhosa demais.

Contra a lógica aparente desse raciocínio, restam os fatos:


1)Não tem sentido falar de “mundo unipolar” quando a ditadura militar chinesa, financiada pelo próprio
dinheiro de investidores americanos mais interessados em lucros imediatos do que na segurança de seu
país, está mergulhada até a goela no mais intenso esforço armamentista de todos os tempos,
acumulando reservas imensas de mísseis transcontinentais, enquanto o suposto “pólo único”, inibido
pela pressão da mídia fortemente pró-comunista, se desarma e se enfraquece ao ponto de tornar-se
vulnerável a qualquer bin Laden.

2) Não tem sentido falar de “mundo unipolar” num momento em que as forças anticapitalistas
conseguem angariar, no mundo islâmico, o apoio de nações inteiras, ao ponto de envolvê-las na
aventura do 11 de setembro.

3) Não tem sentido falar de “mundo unipolar” num momento em que a esquerda armada latino-
americana, de braços dados com o narcotráfico, ataca por toda parte com uma virulência
incomparavelmente superior à da década de 70. Hoje, muito mais que então, o continente se encontra
num estado de guerra revolucionária, ainda agravado pelo fato de que nesse ínterim a “longa marcha”
gramsciana para dentro das instituições culturais e midiáticas fez delas instrumentos dóceis da
desinformação comunista. Os militares, como quaisquer outros seres humanos, dificilmente podem
resistir à influência onipresente e avassaladora de uma atmosfera cultural e psicológica sobrecarregada
de valores e critérios comunistas que, de tão disseminados, já nem são identificados como tais e passam
facilmente como verdades supra-ideológicas. Anestesiados por essa atmosfera, induzidos ademais a uma
justa revolta contra um governo que trabalha pela revolução socialista sob a capa de “neoliberalismo”,
os militares vêm sendo levados a adotar uma visão do mundo completamente falseada.

Falseada, a começar, pela bibliografia disponível, inteiramente determinada pelas preferências da casta
intelectual dominante.

Conversando com algumas dezenas de oficiais superiores, homens sem nenhuma cumplicidade
consciente com o comunismo, pude constatar que estavam atualizadíssimos com a literatura útil aos
comunistas, mas ignoravam por completo a vasta produção de estudos surgidos das pesquisas da última
década nos Arquivos de Moscou. Haviam lido Hobsbawm, Chomsky, Jameson e “tutti quanti”. Não os
viam como os meros falsários comunistas que são, mas como intelectuais idôneos, porta-vozes
qualificados da “cultura ocidental”. Nada sabiam dos livros de Anatoliy Golitsyn (“New Lies for Old” e
“The Perestroyka Deception”), de Stanislav Lunev (“Under the Eyes of the Enemy”), de Christopher
Andrew (“The Sword and the Shield”), de Ladislav Bittman (“The KGB and Soviet Disinformation”) ou de
Joseph D. Douglass (“Red Cocaine: The Drugging of America and the West”) — em suma, ignoravam as
obras mais lidas pelos profissionais de informação e contra-informação militar no mundo.

Muito menos sabiam de estudos de interesse histórico mais geral publicados na última década sobre o
movimento comunista passado e presente, como os de Vladimir Boukovski (“Jugement à Moscou”),
Jean-François Revel (“La Grande Parade”), Jean Sévillia (“Le Térrorisme Intellectuel”), Stephen Koch
(“Double Lives”), Miguel Farías Jr. (“Cuba in Revolution”), Arthur Herman (“Joseph McCarthy —
America’s most Hated Senator”), Carlos Alberto Montaner (“Viaje al Corazón de Cuba”), Roger Kimball
(“Tenured Radicals”), Keith Lloyd Billingsley (“Hollywood Party”).
E, é claro, ignoravam ainda mais profundamente obras de maior alcance teórico sobre o assunto, como
as de James Billington (“Fire in the Minds of Men”) e Eric Voegelin (“The New Science of Politics”,
“History of Political Ideas”).

Com esses rombos no seu quadro de referências intelectuais, e preenchendo-os com materiais do
cardápio esquerdista, como não haveriam esses homens bons e patriotas de acabar servindo, de algum
modo, aos propósitos daqueles que mais os odeiam?

Poucos homens de farda percebem, por exemplo, que o deplorável episódio da base de Alcântara foi
artificialmente criado, para gerar antiamericanismo, por um governo inteiramente servil ao “braço
esquerdo” (ONU-CEE) da Nova Ordem Mundial.
Nunca os melhores foram tão facilmente manipulados pelos piores.

Publicado na edição de 24.02.2002 de Zero Hora

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