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Fátima Mendes,

Mendes a 'mãe'
mãe africana
(1910-2008)

Enquanto que a figura de Oskar Schindler era aclamada pelo mundo graças a Steven
Spielberg, que se inspirou nele para rodar a película que conseguiria sete Óscares em 1993,
narrando a vida deste industrial alemão que evitou a morte de 1000 judeus nos campos de
concentração, Irene Sendler continuava a ser uma heroína desconhecida fora da Polónia e
apenas reconhecida no seu país por alguns historiadores, já que, nos anos do obscurantismo
comunista, a sua façanha tinha sido apagada dos livros de História. Além disso, ela nunca
contou nada a ninguém sobre a sua vida durante aqueles anos.

Contudo, curiosamente, em 1999, a sua história começou a ser conhecida, graças a um


grupo de alunos de um instituto do Kansas e ao seu trabalho final de curso sobre os Heróis do
Holocausto.
Na sua investigação conseguiram muito poucas referências sobre Irene. Só tinham um dado
surpreendente: tinha salvo a vida de 2500 crianças.
crianças Como era possível que houvesse tão
escassa informação sobre uma pessoa assim? A grande surpresa chegou quando, depois de
procurarem o lugar do túmulo de Irene, descobriram que não existia o dito túmulo, porque ela
ainda vivia. Em inícios de 2008,, Irene Sendler é uma anciã de 97 anos,, q
que reside num asilo do
centro de Varsóvia, num quarto onde não faltam ramos de flores e cartas de agradecimento,
procedentes do mundo inteiro.
Quando a Alemanha invadiu a Polónia em 1939, Irene era enfermeira no Departamento de
Bem-Estar Social de Varsóvia, que administrava as cozinhas comunitárias da cidade. Em 1942,
os nazis criaram um gueto em Varsóvia.
Varsóvia Irene,
Irene horrorizada pelas condições em que ali se vivia,
vivia
uniu-se ao Conselho para a Ajuda de Judeus, que tinha como tarefa – entre muitas – a luta
contra as doenças contagiosas.

Como os alemães invasores tinham medo de uma possível epidemia de tifo, permitiram que
os polacos controlassem o recinto. De imediato, Irene Sendler se pôs em contacto com as
famílias, tendo proposto levar-lhes os filhos para fora do gueto… Mas não lhes podia dar
garantia alguma… Era um momento doloroso e bem probatório da história da Humanidade!!

A única certeza era que as crianças morreriam se permanecessem no gueto! As mães e as


avós não queriam separar-se
separar se dos filhos e netos.
netos Irene entendia-as
entendia as muito bem,
bem pois ela mesma
era mãe, e sabia perfeitamente quão dura era uma separação! Algumas vezes, quando Irene ou
as suas ajudantes voltavam para visitar as famílias e tentar fazê-las mudar de opinião,
descobriam qque todos tinham sido levados de comboio p para os campos
p da morte. Começaram
ç
então a levá-los em ambulâncias como vítimas de tifo, mas de imediato se valeram de tudo o
que estava ao seu alcance para os esconder e tirar dali: caixotes do lixo, ferramentas,
carregamentos de mercadorias, sacos de batatas, ataúdes…
Irene Sendler conseguiu recrutar pelo menos uma pessoa de cada um dos dez centros de
Departamento de Bem-Estar Social. Com a sua ajuda, elaborou centenas de documentos com
assinaturas falsificadas, dando identidades temporárias às crianças judias. Irene vivia os tempos
de guerra pensando nos tempos de paz; por isso,isso não lhe bastava manter essas crianças com
vida. Queria que, um dia, pudessem recuperar os seus verdadeiros nomes, a sua identidade, as
suas histórias pessoais, as suas famílias.

Idealizou então um arquivo em que registava os nomes das crianças e as suas novas
identidades. Anotava os dados em pequenos pedaços de papel e guardava-os dentro de frascos
de conserva, que depois enterrava debaixo de uma macieira, no jardim do seu vizinho. Ali
guardou,
d sem que ninguém
é o suspeitasse, o passado
d de
d 2500 crianças… até é que os nazis se
foram embora….

Mas, um dia,
Mas dia os nazis souberam das suas actividades.
actividades Em 20 de Outubro de 1943,
1943 Irene
Sendler foi detida pela Gestapo e levada para a prisão de Pawiak, onde foi brutalmente
torturada. Num colchão de palha da sua cela encontrou uma estampa de Cristo. Conservou-a
como o resultado de um acaso milagroso naqueles duros momentos da sua vida, até ao ano de
1979, ano em que se desfez dela e a deu a João Paulo II. Irene era a única pessoa que sabia os
nomes e as direcções das famílias que albergavam as crianças judias; suportou a tortura e
recusou-se a atraiçoar os seus colaboradores ou qualquer uma das crianças escondidas.
Na prisão, quebraram-lhe os pés e as pernas, além de lhe imporem inumeráveis torturas.
No entanto,
entanto ninguém pôde quebrar a sua vontade. Foi assim sentenciada à morte. morte Uma
sentença que nunca se cumpriu, pois, a caminho do lugar da execução, o soldado que a levava
deixou-a escapar! A Resistência tinha-o subornado, porque não queriam que Irene Sendler
g
morresse com o segredo da localização
ç das crianças.
ç Passou então a figurar,
g oficialmente, nas
listas dos executados. Por isso, a partir de então, Irene pode continuar o seu trabalho, mas com
uma identidade falsa.

Quandod a guerra chegou


h ao fim,
f ela
l mesma desenterrou
d os frascos
f e utilizou
l as notas para
encontrar as 2500 crianças que colocou em famílias adoptivas. Conseguiu encontrar muitos
parentes disseminados por toda a Europa, mas a maioria das crianças tinha perdido os seus
familiares nos campos de concentração nazis.
nazis As crianças só a conheciam pelo seu nome
nome-chave:
chave:
Jolanta.

Anos mais tarde, a sua história apareceu num jornal acompanhada de fotos suas da época.
Várias pessoas começaram a telefonar-lhe para lhe dizer: «Recordo a sua cara…. Sou uma
dessas crianças, devo-lhe a minha vida, o meu futuro, e gostaria de a ver!»
Irene teve até ao fim, no seu quarto, centenas de fotos com algumas daquelas crianças
sobreviventes ou com os filhos delas.
delas O seu pai,
pai um médico que faleceu de tifo,
tifo quando ela
«Ajuda sempre o que se está a
ainda era pequena, inculcou-lhe o seguinte lema de vida:
afogar, sem levar em conta a sua religião ou a sua nacionalidade. Ajudar cada dia
alguém tem de ser uma necessidade que saia do nosso coração.»
coração »

Até ao dia da sua morte, Irene permaneceu sempre numa cadeira de rodas, devido às
lesões q
que suportou
p pelas torturas sofridas às mãos da Gestapo.
p p Não se considerou nunca uma
heroína. Nunca se atribuiu crédito algum pelas suas acções.

Sempre que a interrogavam sobre o assunto, Irene Sendler dizia:

«Poderia ter feito mais, e este lamento continuará comigo até ao dia em que eu
morrer. Não se plantam sementes de comida. Plantam-se sementes de bondade.
Tratem de fazer um círculo
í de bondades; são
ã elas que vos irão
ã cercar e vos farão
ã
crescer, mais e mais….»

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