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Joaquim Gama 1
Fazer teatro
Fazer teatro ou formar grupos de teatro na escola é um desa-
fio que envolve várias ações. Essas ações vão desde a constituição
do grupo de trabalho até a organização dos espaços para que
a atividade teatral se efetive.
Se o desejo é a mola propulsora para o fazer teatral, ele
sozinho não será capaz de manter a atividade na escola. É preciso
que o desejo esteja casado com o empenho e estes dois façam
parcerias com a leitura, com a pesquisa e com o estudo. Assim,
é preciso ler escritos sobre teatro, observar trabalhos realizados
por outros artistas e desenvolver um olhar atento à realidade.
Um texto sobre teatro pode nos abrir muitas portas. Pode nos
conduzir para mares nunca navegados. Às vezes lemos um texto
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e a sensação que fica é a de que muita coisa não foi compreen-
dida, que muitas palavras não foram decifradas e que estamos
imersos num universo de desconhecimento. Isso não deve ser
um imobilizador das nossas capacidades. Ao contrário, deve ser o
veículo das nossas buscas. O conhecimento surge exatamente da
nossa percepção de desconhecer algo. Muitas vezes, “re-iniciar”
a leitura, buscar no dicionário uma determinada palavra, entrar
na internet e pesquisar mais sobre um determinado assunto
fazem-nos ficar mais próximos do texto e nos tornam capazes
de dialogar com as idéias do autor.
Uma idéia está sempre atrelada a milhões de outras idéias.
O teatro exige gente que gosta de pensar, de se aventurar
pelos caminhos do conhecimento. É preciso, a cada proposta
teatral, avançar rumo ao desconhecido, ao imprevisível, para
realizar algo capaz de mobilizar todas as nossas capacidades de
invenção e organização artística.
Como já foi dito, aprendemos a fazer teatro lendo textos
teatrais, assistindo a teatro e exercitando nossas capacidades
de atuação.
Dizem que quando somos picados pelo bicho do teatro, nunca
mais seremos capazes de nos livrarmos dele. Na verdade, o teatro
é capaz de instaurar o desejo constante de aprender e criar.
Definindo o teatro
A palavra teatro suscita diversas definições. Muito provavel-
mente, ao perguntar para um grupo de pessoas o que é teatro,
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obteremos diversas respostas. Alguns dirão que é um lugar
constituído de palco e platéia. Outros afirmarão que é o espaço
do faz-de-conta, da imaginação, onde, por exemplo, atores dão
vida às personagens e os cenógrafos criam a realidade teatral.
Essas mesmas pessoas, na maioria das vezes, dirão também que
cabe a um diretor o papel de estruturação da obra teatral e à
platéia, a tarefa de assistir passivamente ao universo mágico
criado no palco.
Há os que defenderão a idéia de que teatro é vida. Dirão
também, outras pessoas, que teatro é um ritual, envolvendo o
encontro entre artistas e espectadores, sob a consigna do deus
grego Dionísio. Muitos acreditam que o teatro é o espaço para
artistas e público debaterem acontecimentos contemporâneos,
entendendo essa expressão artística como instrumento de mu-
dança social. Nessa mesma linha de pensamento estão os que
defenderão a idéia de que teatro é ensinamento e diversão.
Fernando Peixoto (1981) escreveu que teatro é “um espaço,
um homem que ocupa este espaço, outro homem que observa.”
Grotowski (1975), fundador do Teatro Laboratório, na década
de 1950, na Polônia, disse que teatro é provocação e, nessa
direção, ele deve ser capaz de desafiar a si próprio, o público.
Em determinado estágio de seu trabalho, o dramaturgo e en-
cenador alemão Bertolt Brecht (1979) proclamou que o teatro
deveria ser estritamente didático. Assim, escreveu peças didáticas
com intenções de ensinamentos sociais. Com esta proposta ele
radicalizou a idéia de teatro, propôs o rompimento da distância
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existente entre atores e espectadores, afirmando que as peças
didáticas não precisavam de público, pois todos (atores e público)
deveriam ser atuantes.
Fernando Peixoto
Em São Paulo, trabalhou no Teatro Oficina como ator. Nos anos
70 tornou-se diretor. Empenhado com o teatro de resistência, pas-
sou a ser reconhecido também como importante pensador teatral. O
teatro de resistência combatia especialmente os processos políticos
e sociais da época. Como teórico, escreveu obras vinculadas ao
dramaturgo Bertolt Brecht e sobre as tendências do teatro popular
brasileiro. Para maiores informações acessar:
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_teatro/
Jerzi Grotowski
Famoso diretor de teatro polaco. Foi considerado um inovador
do teatro no século XX. Suas idéias deixaram marcas profundas
nos movimentos de renovação teatral em várias partes do mundo,
inclusive nos Estados Unidos. Aqui no Brasil, um dos seus livros
mais conhecido é Para um teatro pobre. Nesse livro ele fala sobre o
trabalho desenvolvido no Teatro Laboratório. É uma leitura bastante
interessante.Para maiores informações acesse:
http://dramateatro.fundacite.arg.gov.ve/ensayos/n_0017/etica_gro-
towski.htm
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Bertolt Brecht
Nasceu em Augsburg, Alemanha, em 1898. Estudou medicina
em Munique. Porém, dedicou toda a sua vida ao teatro. Foi uma das
mais importantes figuras do teatro do século XX. Escreveu diversas
peças, poemas e reflexões sobre o teatro. Seus escritos versavam
sobre os “falsos padrões” da arte e da vida burguesa, corroídas pela
Primeira Guerra. Entre as peças escritas por ele, podemos destacar
O maligno Baal, Ópera dos três vinténs, A padaria e Aquele que
diz sim, aquele que diz não.
Com a ascensão de Hitler, foi obrigado a deixar a Alemanha e
exilar-se em países como a Dinamarca e os Estados Unidos, onde
sobreviveu à custa de trabalhos para Hollywood.
Fez duras críticas ao nazismo e à guerra, tema de uma de seus
mais importantes textos: Mãe coragem e seus filhos (1939).
O Pequeno Organon é outra importante obra, cujo conteúdo
discorre sobre o fazer teatral.
Em 1949, já de volta para a Alemanha, funda o Berliner En-
semble. Esse espaço passou a ser uma referência teatral mundial.
Morreu em Berlim em 1956.
Muito provavelmente, na biblioteca da sua escola há alguma
coisa da produção desse autor. Para obter mais informações acesse:
http://www.culturabrasil.org/brecht.htm
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bem diversas uma da outra. O que talvez seja possível afirmar
é que, a cada época, a cada momento histórico, ele assumirá
uma determinada tendência.
Cabe aos interessados na arte teatral definir suas próprias
propostas, realizar suas escolhas artísticas, buscar encontrar
respostas para indagações da seguinte ordem: por que desejo
fazer teatro? Que teatro quero fazer? O que pretendo alcançar
com o teatro? O que quero comunicar a partir do teatro? A
quem se dirige o teatro que faço? Quais são as tendências ar-
tísticas que me impressionam? Que estética teatral eu gostaria
de investigar e/ou experimentar?
Na comntemporaneidade, a diversidade é parte constituinte
do teatro. Assim, coexistem diversas tendências, várias possibi-
lidades teatrais, que não podem ser categorizadas como piores
ou melhores. São apenas formas diferentes de se manifestar e
fazer teatro.
Essa diversidade teatral nos instiga, tanto na forma de fazer,
como na maneira de ver teatro. Leva-nos, por exemplo, a refletir
sobre o sentido do teatro e a sua relação com a platéia.
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tadas, no teatro essa relação pode se configurar de outra forma.
No teatro, nossa capacidade de criar é exercida e compartilhada
com os demais presentes na sala de espetáculo. O teatro é algo
para ser vivenciado no coletivo. É uma atividade humana que
nos permite exercer nossas capacidades de pensar, de criar, de
percorrer os mais diversos destinos incertos que a imaginação
nos possibilita.
Tanto o teatro quanto a televisão propõem formas distintas
de assistência e de produção artística. Não se faz aqui apologia
a qualquer teatro! Há muitos espetáculos que estão mais para
televisão do que para teatro. Qual o sentido do público sair de
suas casas para ver teatro se ele pode ver a mesma coisa na
televisão?
É preciso ter clareza das diferenças de cada uma dessas
linguagens. Não se trata de dizer que o teatro é melhor que a
televisão e nem que a televisão é mais interessante que o teatro.
Não podemos entrar nesse engodo. Há muita coisa inteligente
sendo produzida na tevê e muita produção ruim sendo ence-
nada por aí.
O teatro envolve o império da metáfora, algo praticamente
ausente na televisão. O teatro não se oferece como espelho
imediato da realidade, senão como tradutor de experiências
vivenciadas pela sociedade.
O teatro se configura como mediação metafórica da reali-
dade, onde não há a necessidade de se privilegiar a ilusão de
contigüidade. O campo do teatro está próximo da poesia, do
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mito, do sonho, da ciência e do abstrato, permitindo converter
tudo isto em metáforas que direta ou indiretamente possibilitam
indagar, decifrar e pensar o presente. Assim, podemos dizer que
são próprios do território teatral a metáfora e as suas perspecti-
vas de realidade; transversalidade imaginativa e a sua tradução
cênica (Dubatti, 2007).
Saber ler teatro e indagar-se sobre as suas formas de pro-
dução são elementos fundamentais aos interessados na arte
cênica.
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Dario Fo
O italiano Dario Fo é ator, mímico e palhaço. Ele costuma fazer
esboços das tramas em pinturas e depois apresenta suas idéias no
palco antes de colocá-las no papel. Seu trabalho está fundamentado
na improvisação. Durante as improvisações de cena, costuma mis-
turar dialetos italianos, sons onomatopaicos e palavras inventadas.
Suas comédias nascem desse jogo de cena. Seus textos já foram
traduzidos para mais de trinta idiomas.
Para ampliar essas informações acesse:
http://noticias.uol.com.br/licaodecasa/materias/ult1789u477.
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que seja oferecido um espaço propício à experiência criativa.
É exatamente na possibilidade que cada indivíduo tem para
experienciar um processo e aprender a partir dele que Viola
Spolin desenvolve o seu sistema de aprendizagem teatral, de-
nominado Jogos Teatrais.
No trabalho proposto pela autora, podemos encontrar algu-
mas alternativas para a construção de produtos artísticos teatrais.
Nele, a liberdade de expressão pessoal e do grupo é desenvolvida
juntamente com o aprendizado da linguagem teatral.
Nos seus procedimentos, o teatro não é o pretexto para o
desenvolvimento do intuitivo e do espontâneo. Os atores
aprendem a lidar com os diversos elementos envolvidos na
expressão teatral. Segundo Viola, o teatro é o objeto de estudo
e exige expressividade dos que almejam desenvolvê-lo, conse-
qüentemente podendo transformar esses indivíduos em seres
mais espontâneos e criativos na vida.
Para que isto possa ocorrer plenamente, Spolin estabelece o
jogo como espaço de aprendizagem.
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Ela observa que, no instante em que o ator está jogando,
ele está livre para envolver-se e relacionar-se com o mundo a
sua volta, que sofre freqüentes mutações, desenvolvendo uma
atuação espontânea, libertando-se de estereótipos, de recursos
técnicos que são, na realidade, descobertas de outros.
O sistema de jogos teatrais estabelece um campo lúdico de
aprendizagem, dentro do qual os atores são incentivados a so-
lucionar problemas com inventividade e de forma original.
Desde que o jogador respeite as regras que foram acordadas
coletivamente, ele tem liberdade pessoal para propor e inventar
as mais inusitadas soluções. A liberdade pessoal, segundo Viola,
leva o jogador a desejar experimentar e adquirir auto-expressão,
elemento importante também para o teatro.
A partir dos jogos teatrais, cada grupo é incentivado a cons-
truir o seu próprio processo, encontrar as suas saídas e soluções.
Nas propostas de Viola, as atitudes vinculadas à aprovação e
desaprovação estabelecidas normalmente num processo tradi-
cional de teatro, e nas posturas autoritárias de alguns diretores
em relação à atuação dos atores, devem ser substituídas pela
percepção de que o teatro é uma atividade de grupo que exige
a energia criadora de todos os envolvidos. Ela afirma que pode
ser mais recompensador para o diretor teatral se ele construir
com os seus atores um campo de relações, em que ambos lutem
por um insight pessoal. Assim sendo, o diretor teatral deixa de
ser o detentor do conhecimento, da grande idéia para a cena,
e passa agir como orientador do processo.
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Isto também evita exibicionismos teatrais desnecessários.
Podemos encontrar, na sistematização de jogos teatrais, pro-
postas que possibilitem pensar no teatro dentro da escola como
expressão do coletivo, das investigações de um grupo, em que
cada qual, com suas habilidades e competências artísticas, pode
contribuir com o fazer teatral e a construção da encenação.
Diversos livros de Viola Spolin foram traduzidos no Brasil
(vide bibliografia). Recentemente, foram lançados aqui Jogos
teatrais na sala de aula (2007) e O fichário de Viola Spolin (2001).
Estas publicações trazem diversos jogos e indicações capazes de
estabelecer um ambiente propício para uma experiência criativa
e inspiradora, na qual o processo teatral e a criação de uma en-
cenação tornam-se o caminho para a aprendizagem teatral.
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ginação e a capacidade para atuar. Diversas áreas de estudos
buscaram delinear a capacidade de atuação dos indivíduos. Por
exemplo, a sociologia afirmará que atuamos todos os dias com
os amigos, com a família, com os estranhos. Para a psicologia,
o nosso eu está escondido por detrás de muitas máscaras
que assumimos durante as mais diversas relações do dia-a-dia.
Para essas áreas, atuar é o método pelo qual convivemos com
nosso meio. Poderíamos também citar Jean Piaget. Através
dos seus estudos sobre a evolução dos Jogos Simbólicos no
desenvolvimento da criança, é possível encontrar muitos pontos
que revelam a capacidade humana para criar símbolos, para a
representação. Nas suas pesquisas encontramos a gênese para
a atividade dramática.
Se a atuação é uma capacidade inerente a todos nós, então
podemos sistematizar métodos que auxiliem os iniciantes nesta
arte de comunicação e expressão a desenvolver suas habilidades
para o teatro. No teatro, atuar significa saber lidar com a nossa
capacidade imaginativa, com as infinitas possibilidades do faz-
de-conta.
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dramática quem, o quê, onde e o processo de avaliação podem
ser utilizados, com o intuito de propor aos atores diversas formas
de investigação e compreensão dos elementos que envolvem a
linguagem teatral.
Com os jogos teatrais não só será possível a constituição
de grupos de teatro, detentores dos seus próprios processos de
criação e investigação artística, como também de estabelecer
uma maneira diferenciada de ver e fazer teatro (Spolin, 1979).
O teatro dentro da escola deixa de ser uma atividade de pou-
cos, para ser o lugar privilegiado do coletivo, capaz de propiciar
um campo lúdico de criação e experimentação estética.
Fisicalização
É um recurso utilizado na sistematização de jogos teatrais. Trata-se
de usar o próprio corpo para dar vida aos objetos. É uma maneira
de mostrar objetos imaginários. Com a fisicalização é possível tor-
nar a realidade do palco visível. Ela permite aos atores utilizarem
da ação física para dar forma a um objeto, para torná-lo concreto
para a platéia.
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o princípio da arte teatral estará fundamentado na relação de
que ora alguém está no papel de atuante, ora alguém está na
condição de espectador, e a estruturação dessa relação pressupõe
a delimitação de um espaço teatral.
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com o espaço e são essas experiências sensoriais com o lugar
que os atores compartilham com o público.
Grupos como o Teatro Oficina (http://www.teatroficina.com.
br), o Teatro da Vertigem (http://www.rabisco.com.br/25/verti-
gem.htm) e Grupo XIX de Teatro (http://www.grupoxixdeteatro.
ato.br), todos em São Paulo, são exemplos de construção de
propostas teatrais a partir das relações estabelecidas com o lugar
escolhido para a apresentação da encenação e suas possibilida-
des de transformações cênicas. Assim, ruas, hospitais, edifícios
abandonados passam a ser palco para os espetáculos.
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que possibilitam formalizar o convívio social. O lugar do teatro
é um espaço de criação artística, mas também um espaço de
convívio e troca.
Tendo em vista que o lugar do teatro não está circunscrito
apenas em edifícios teatrais construídos para esse fim, qualquer
espaço onde seja possível estabelecer ou partilhar uma experiên-
cia teatral, coletiva, de convivência entre atores e espectadores,
como quadras de esporte, pátios, jardins, estacionamentos, a rua
da escola ou a própria sala de aula, todos esses lugares tornam-se
espaços cênicos possíveis para a representação. Isso possibilita
ao grupo desvincular-se da idéia de que para existir teatro será
necessário haver um palco à italiana. O desafio é transformar
os espaços da escola em espaços de representação.
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Ao propor transformar o espaço escolar em espaços de
representação teatral, faz-se um convite explícito e cheio de
significado para que todos os envolvidos com a escola possam
enxergá-la por um outro ângulo. O ângulo da estranheza de
perceber que corpo, mente e prazer não precisam estar por
detrás das carteiras; podem coexistir, sem que isso cause qual-
quer ameaça às regras disciplinares da escola e à qualidade da
aprendizagem dos alunos.
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envolvendo relações familiares durante o ato de comer. E desse
conjunto de cenas estruturamos a nossa encenação. O público,
durante a apresentação do espetáculo, sentava-se às mesas, junto
com os personagens, e com eles jantava e, ao mesmo tempo,
assistia aos conflitos da família Silva. A platéia era o público, mas
também assumia o papel de parentes distantes que vieram visitar
os Silvas em plena crise existencial daquele núcleo familiar.
A transformação e apropriação dos espaços de representação
podem ocorrer a partir da elaboração de cenas denominadas
como produtos preliminares ou produtos confluentes.
Cena constituinte de um
produto confluente, apre-
sentada no pátio da escola
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É importante ressaltar que a existência de uma platéia, desde
o início do processo teatral do grupo, ajuda a compreender o
público como cúmplice das reflexões e investigações teatrais,
ao invés de tê-lo como uma ameaça crítica ao desempenho
artístico dos atores.
Como prevê a sistematização de jogos teatrais, ora parte
do grupo é de atuantes, ocupando o espaço do jogo, ora esses
mesmos atores trocam de papéis com outros jogadores e pas-
sam a ser espectadores, contribuindo para a leitura das cenas
e para as discussões acerca das propostas dos jogadores e suas
capacidades de comunicação teatral.
Presente no processo de trabalho, a platéia deixa de estar
escondida atrás da quarta parede (princípios defendidos pelo
teatro naturalista) para estar frente a frente com os atores, às
vezes no mesmo espaço da cena, estabelecendo uma relação
direta, um encontro importantíssimo para a avaliação das pro-
postas e para a realização teatral.
A atuação em coro
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da encenação, sem com isso privilegiar um ou outro atuante,
evitando justificativas pautadas no talento. Além de se tornar
também um grande desafio para se pensar o teatro a partir das
perspectivas do coletivo.
Já que os processos de experimentação teatral, dentro das
escolas de educação básica, em geral, priorizam as relações de
grupo, a atuação em coro não seria algo a ser investigado?
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Instaura-se um processo contínuo de experimentação e investi-
gação coletiva, objetivando tornar as oficinas um espaço aberto
não só para os alunos e o aprendizado artístico, mas a todos que
desejarem compartilhar e contribuir com o fazer teatral.
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som, figurinos, cenários e todos os outros elementos contidos
num espetáculo.
O texto pode ser inserido no experimento teatral tendo
como objetivo contrapor-se ao processo tradicional de leitu-
ra de mesa. Nesse processo de leitura (do texto dramático)
enfatiza-se a teoria de que o texto deve ser estudado minu-
ciosamente antes de ser transposto para a cena (texto cênico).
Normalmente, os envolvidos na encenação (atores, diretor e
produção) sentam-se em torno de uma mesa com a intenção de
ler o texto escrito. Nesses ensaios de leitura de mesa, o diretor
e os atores buscam analisar e compreender o conteúdo expresso
no texto, estabelecendo alguns princípios para a interpretação
e para a concepção estética do espetáculo. É comum também,
nesse momento, ocorrerem leituras acompanhadas por uma
contextualização histórica, social e política, com a função de
abranger um estudo mais aprofundado sobre as idéias do autor
e do texto. Isso pode acrescentar muito ao trabalho dos grupos.
No entanto, pode tornar também o processo de representação
mecanizado. A fala torna-se declamatória ao invés de ser natural,
de ser a extensão do pensamento das personagens.
Outros caminhos podem ser percorridos na apropriação do
texto dramático por parte dos atores, bem como a compreensão
dos seus conteúdos pode nascer durante a própria ação de jogar,
da atividade lúdica. O texto pode ser desvelado gradativamente,
sempre em ação, com o objetivo de permitir que os atores se
impregnem sensorialmente dele.
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Aprendizagem dos gestos e das atitudes
Por intermédio do jogo teatral, o texto cênico pode ser
materializado a partir do aprendizado dos gestos e das atitudes.
Ou seja, fragmentos de textos dramáticos são associados a diver-
sos contextos sociais, confrontados com o cotidiano dos atores
e com as suas diversas visões de mundo, configurando cenas
que enfatizam os gestos e as atitudes como forma de expressão
simbólica e a construção de quadros de cena.
O aprendizado dos gestos e das atitudes traz ao trabalho
teatral um conceito central do teatro de Brecht. Para Brecht,
não se deve compreender gesto como a simples ação de
gesticular.
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Quadro de cena apresentado no estacionamento da escola
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Ao pensar na perspectiva do texto à cena, aprofunda-se a
relação do texto como fonte para a construção dos gestos e das
atitudes. Por exemplo, após lerem o fragmento de um texto,
silenciosa e individualmente, os atores podem ser organizados
em grupos e estabelecerem discussões acerca do conteúdo do
texto. Podem buscar identificar uma atitude e um gesto que
determinariam as relações expressas no texto e, ao mesmo tem-
po, sintetizariam o resultado das discussões e das descobertas
sobre o que acabaram de ler. A apresentação dessas discussões
seria demonstrada em forma de imagens congeladas, quadros
de cena, atribuindo novos significados ao texto. Enquanto os
atores apresentam seus quadros de cena, a platéia efetua a
leitura da imagem, destacando o que vê, relacionando a ima-
gem com outras situações do cotidiano. As leituras, efetuadas
a partir da leitura dos gestos e das atitudes dos atores, buscam
ampliar as interpretações sobre o texto. Assim, os quadros de
cena instauram uma reflexão sobre o conteúdo apresentado no
texto e auxiliam os atores a analisar a estrutura da cena. Cada
grupo, ao apresentar o seu quadro de cena, busca dar uma for-
ma estética, gestual para a imagem congelada. Diversos pontos
de vista são apresentados para um mesmo texto. Isso permite
discutir com o grupo de atores as diversas possibilidades que
podem ser investigadas em um texto. A preocupação primeira
é jogar com o texto e estabelecer uma intimidade com as pa-
lavras contidas nele. A investigação não se inicia com o estudo
sistemático sobre o autor ou a sua época, mas com a descoberta
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das relações humanas existentes nele, a partir da atuação dos
jogadores com o texto.
Na avaliação das cenas, pode-se verificar como o grupo so-
luciona o problema em sintetizar as discussões sobre a relação
entre o texto literário e o jogo teatral, através do quadro de
cena que é apresentado.
A idéia é que os quadros de cena não sejam reproduções
teatrais literais do texto, mas a interpretação dele e as possibi-
lidades de representá-lo teatralmente.
A continuidade desses jogos de apropriação do texto,
a partir dos quadros de cena congelados, pode evoluir para
quadros de cena em movimento: cenas.
O trabalho com os quadros de cena possibilita ao grupo de
atores desenvolverem a capacidade de síntese, de ênfase aos
gestos e atitudes. Há nesse trabalho o esforço para passar o texto
da superfície do papel para a tridimensionalidade do corpo do
ator e para o espaço cênico.
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c. Quadro de cena com legenda: um grupo cria um quadro
de cena congelado a partir do texto; o restante dos alunos procura,
no texto, uma frase ou uma palavra que sirva de legenda para a
imagem; um grupo apresenta o quadro de cena e os outros dizem
as legendas em voz alta.
d. Apenas um em movimento: andando pela sala de aula,
enquanto um aluno lê o texto já buscando um significado para ele
(gestos e atitudes), os outros permanecem parados. Um outro aluno
inicia a leitura, o que estava lendo congela, assim como todos os
outros. Outro inicia a leitura e a estrutura se repete.
Ensaios de teatro
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cenas, até que todos possam atuar com destreza. Eles devem ser
um espaço para avançar no processo de investigação, instaurado
com os jogos teatrais.
Evitar a idéia de ensaios como forma de se ter cenas acabadas,
finalizadas e perfeitas, garante a ausência de qualquer erro no
momento da apresentação pública. O erro é também fonte de
aprendizagem e de novas descobertas.
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ção e de tateio antes da adoção da solução definitiva. Assim, a
confiança dos atores na suas capacidades de atuar de forma livre
e natural em cena é estabelecida pelas possibilidades que cada
um tem para jogar com os papéis e de investigar, em conjunto
com os outros atores, formas e processos de criação.
Como num treino esportivo, em que os jogadores adquirem
competências e habilidades técnicas na própria ação de jogar o
jogo, criando partidas amistosas e simulando jogadas, os atores,
a partir dos jogos de improvisação, passam a assimilar itens para
o arranjo cênico da encenação. Tais itens, como a marcação dos
atores, a posição dos objetos cenográficos na cena e a assimilação
do texto, surgem durante os ensaios.
O estabelecimento de uma partitura cênica (roteiros ou tra-
jetórias) é uma outra possibilidade de organização do processo
e estruturação da encenação. Pode-se pensar em diversas formas
de construir, reconstruir e
compartilhar as cenas com o público. Essas formas organiza-
cionais tornam-se o roteiro, a partitura cênica a ser desenvolvida
pelo grupo.
Tanto os ensaios individuais das partituras cênicas de cada
cena, como os ensaios coletivos envolvendo a partitura total
do espetáculo, são extremamentes importantes para que,
aos poucos, cada ator encontre o seu lugar na construção
do projeto e os papéis de cada um sejam definidos dentro da
encenação.
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Partitura cênica
A inclusão do termo partitura no trabalho teatral, muito
utilizado na área musical, consiste em registrar (em palavras ou
imagens) todas as ações presentes no texto cênico.
A partitura contém o roteiro da cena, a descrição dos gestos
e das atitudes, o deslocamento em cena das personagens, a
planta-baixa do cenário, etc.
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defenderam a idéia de que o teatro na escola deve priorizar o
processo de auto-expressão e criação dos alunos. Esses autores
defendem o processo em contraposição à idéia de um teatro
que tem a função apenas de animar festas comemorativas, tais
como datas cívicas e festividades, sem nenhum entendimento do
texto dramático, sem nenhuma instauração de um processo que
priorize a criação dos alunos-atores ou a construção da linguagem
teatral. Geralmente, o trabalho desenvolvido no espaço escolar,
por meio de ensaios que atendam às expectativas do professor,
ou seja, tudo bem decorado e bem ensaiado para que demonstre
a capacidade do docente em desenvolver a memorização dos
atores e suas habilidades de atuação. Nesse tipo de trabalho há
um esforço concentrado por parte dos professores em escolher
os mais desinibidos para decorar as falas do texto e, no momen-
to da apresentação, não esquecerem nenhuma das instruções
dadas. Porém, estudos nesta área avançaram nas discussões e
declararam que não se trata de optar pela primazia do processo
em detrimento do produto ou vice-versa, e sim pela escolha de
métodos que favoreçam a construção do conhecimento teatral
dentro de parâmetros educacionais e artísticos claros, participa-
tivos e criativos (Gama, 2000).
O teatro não precisa estar relegado a alguns momentos das
atividades escolares, nem circunscrito no âmbito curricular da
disciplina Arte, e muito menos apenas como estratégia de ensino
de outras disciplinas da matriz curricular.
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O teatro hoje na escola
A concepção moderna do ensino de Arte na escola propõe
que o Teatro seja encarado como área específica do conheci-
mento humano e não como uma simples atividade que venha
a preencher os momentos sociais e de lazer da escola. Dessa
forma, processos e produtos irão se tornar não dicotomizados,
gerando processos investigativos que possibilitarão aos alunos
e aos professores uma compreensão maior dos elementos en-
volvidos na Arte Teatral.
A criação de grupos de teatro dentro das escolas deve fazer
parte dos esforços coletivos de gestores escolares, professores
e alunos, das propostas dos projetos pedagógicos, das políticas
educacionais das secretarias, envolvendo formação de profes-
sores e ações didáticas.
A prática efetiva do teatro dentro das escolas virá a ser uma
experiência criativa se propiciar aos envolvidos espaços de fan-
tasias, de criação e de realização artística, assim como também
uma relação dialógica profícua entre professores e alunos, entre
as pessoas e o mundo.
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Notas
Referências bibliográficas
35
GROTOWSKI, Jerzi. Para um teatro pobre. Tradução de Rosa
Macedo e J. A. Osório Mateus. Lisboa: Forja, 1975.
36
______. Jogos teatrais: o fichário de Viola Spolin. Tradução
de Ingrid D. Koudela. São Paulo: Perspectiva, 2001.
37