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I CO~NlO
MEClS~
1
,PERFIS
DO DIREITO CIVIL
Introdução ao Direito
Civil Constitucional
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I
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Pietro Perlingieri
Professcrr Titular de Instituições de Direito Privado na Universidade do
Sannio (BN) e de Teoria da Interpretação na Scuola di specializzazione in
diritto civile da Universidade de Camenno, Itália.
Reitcrr da Universidade do Sannio (BN)
PERFIS
DO DIREITO CIVIL
Introdução ao Direito
Civil Constitucional
Tradução de.
Maria Cristina De Cicco
2ª Edíção.
I'
RENOVAR
Alo de Janeiro. São Paulo
2002
~'-\1"
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da Faculdade de Direito da
Conselho Editorial
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Arnaldo Lopes Sussekind - Presidente Palazzo Nuovo, 31 de outubro de 1975
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CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.
Perlingieri, Pietro
L410
Perfis de Direito Civil / Pietro Perlingieri; tradução de: Maria
Cristina De Cicco. 2" ed. - Rio de Janeiro: Renovar, 2002
369 p..
ISBN 85-7147-038-3 (broch.)
1. Direito civil. lI. Direito civil. - Brasil. I. Título.
CDD: 346.81
ff
I
r
I
!c, Esta terceira edição adquiriu uma fisionomia muito diferente
das primeiras, seja por uma mais precisa articulação interna
dividida em capítulos, seja pela abordagem mais ampla dedi-
cada à matéria que consentiu introduzir textos e problemas
necessários para realizar um mais satisfatório contacto com os
institutos fundamentais do Direito Civil. A chave de leitura
desses institutos continua problemática, mas não tanto a-ponto
de influir sobre a vocação propositiva e institucional indispen-
sávela uma obra destinada à didática.
Preciosa, inteligente e elegantíssima foi a colaboração de
Pasquale Femia, que a convicta dedicação aos estudos tomou
precocemente maduro.
Capítulo primeiro::;
Realidade social e ordenamento jurídico '.
Realidade social e ordenamento jurídico , ~:.1
.2. Regras jurídicas e regras sociais ::.2
3. O jurista e as escolhas legislativas : 3
'i. O Código CiviL 3
~. . Constitüição 4
~ chamada descodificação :;..:
5
Capítulo segundo
Fontes, técnicas, valores
7. Plmalidade das fontes normativas: oportunidade de uma
redefinição 7
8. Hierarquia das fontes e sua harmonização 9
9. Relação entre norma constitucional-e norma ordinária 10
A.A normativa. da Comunidade Européia 12
(J1) A autonomia privada (elementos introdutivos) 17
12. Ajurisprudência e o papel do precedente judiciário. O
-costume e a ambigüidade-_daremissão à praxe 20
13. O papel da doutrina e a reÍação entre o poder político e o
poder econômico 21
14. A justiça derrotada 23
15. Técnicas legislativas e individuação da normativa 24
16. Artigo e norma : 26
17. Técnica das cláusulas gerais e sua.hist9ricidade 27
18. Definiçôes legislativas ~ 28
19. Noção de "valor": acenos~ 30
í',I
I'I,
I 20.Jurisprudência dos interesses e dos valores ) 31
II 21. A caminho da "despatrimonialização" do Direito Civil.. 33 52. Caráter problemático dos significados das palavras e das
proposições lingüísticas 73
I: 53. Papel do art. 12 dispoprel. Cód. Civ. na legalidade
I, Capítulo terceiro constitucional e superação da interpretação por graus 74
I
Princípios 54. Releitura do art. 14 dispoprel. Cód. Civ 76
I
!! 22. Personalismo e solidarismo constitucional. .•....................................35
55. Exclusão da relevância constitucional das regras sobre a
interpretação ......................................................................................•
76
\i 23. Igual dignidade social (pari dignità sociale) 37
il 56. Superação da exegese como procura do significado literal 77
:: 24. Pessoa e formação social 38 57. Interpretação crítico-construtiva 80
,:.
., 25. Pluralismo das formações sociais e o problema de sua 58. A interpretação como atividade vinculada, controlada e
11
(1 avaliação 39 responsável. 81
li 26. Princípio de democraticità 40 59. Interpretação e praxe 82
27. Princípio da divisão de poderes .41 60. Normas especiais e excepcionais 83
28. Princípio de legalidade e sua diversa função histórico-política 42 61. Relevância hermenêutica da normativa comunitária 85
29. Princípio de legalidade, relativização do juízo e precedentes
jurisprudenciais 43
30. Princípio de igualdade formal e substancial. 44 Capítulo quinto
31. Igualdade e paridade de tratamento ..;................•.............................45 Fato, efeito~ Situação subjetiva, relação.
32. Pretenso antagonismo entre igualdade formal e substancial. 46
33. Igualdade na justiça social. 47 62. O fato jurídico 89
3'4. Princípio de igualdade e institutos de direito civil... .49 63. Estrutura e função do fato jurídico 94
35. Perigos e limites da atividade "de repartição eqüitativa" 64. O efeito jurídico 96
(perequativa) 50 65. Interpretação e qualificação do fato como fases de um
36. ~e~essidade ~e uma reviravolta administrativa, legislativae procedimento unitário. : 100
JUrIsprudenCial. 51 .~ l 66. Integração da eficácia ~.. 103
37. Dificuldade de individuação das fronteiras entre direito público 67. Individuação da normativa do caso concreto 104
e privado 52 68. As situações subjetivas..............................................................•........
105t'
38. Do Direito Privado ao Direito Civil 54- 69. A titularidade: a relação entre sujeito e situação 107
39. O instituto jurídico na visão unitária do ordenamento 55 70. Titularidade formal e substancial. 109
: ) 71. Titularidade temporânea e não-temporânea ll0
40. O estudo do Direito por problemas 55
72. Existência da situação e inexistência ou indeterminação
(indeterminatezza) do sujeito titular 111
Capítulo quarto 73. Co-titularidade 112
Interpretação 74. Existência, titularidade e exercício das situações subjetivas 112
75. Relação jurídica e ordenamento ~ 113
41. Os métodos e as escolas: a) reações ao "sistema" tradicional 57
76. Relaç_ãoju~ídic~ c?mo ligação entre sujeitos: a chamada
42. b) o formalismo jurídico : 58 relaçao unlssubJeuva 114
43. c) da dogmática ao dogmatismo ;..59 77. A estrutura da relação jurídica é a ligação entre situações
44. d) a dissolução da garantia jurídica na "realidade" 60 subjetivas 115
45. e) a análise econômica do direito 63 78. A função da relação é o regulamento, o ordenamento do caso
46. Ambigüidade da doutrina civilística.......................................•..........64 concreto 116
47. O direito positivo como direito interpretado : 66
48. A responsabilidade do intérprete 68
49. Ambigüidade da regra in ciaris non fit interpretatio : 70 Capítulo sexto
50. A ~lareza do texto como um posterius não como um prius 71 Aspectos das situações subjetivas e das relações
51. ~ mterpretação axiológica como superação da interpretação
79. Premissa. As situações e a relação .......................................•...........119
hteral. 72
80. O direito subjetivo 120
81. Os chamados limites ao direito subjetivo 121
82. Abuso do direito e excesso de poder. 122 120. Tutela da correspondência pessoal e confidencial 185
121. Liberdade de imprensa como função e exercício de um
83. O chamado direito potestativo 123
• . . 'd'Ica d a expec tau'va
84. RelevanClaJun . 125 direito iQdividual 186
•
85. Onus: . o b'ngaçao
dito -' potestauva . 128 122. Direito à retificação 187
123. J?ireito a~ acesso aos meios públicos e privados de
86. Poder Jurídico (potestà) como direito-dever. 129
,.
87. Interesse leglumo no d'" '1
IreItO CIVl . 130 Informaçao 190 .
88 O status na doutrina italiana 132 124. Direito à correta informação 192
125. Direito à educação e a sua função promocional: relação
~~: ~~:: ~:;::e~.::::::::::::::::::::::::::::::::::::1:::::::: :::::::::::::::::::::::::::::::::::::: ~;: entre República, instituição e pessoa
126. Liberdade de ensino e liberdade de manifestação do
193
91: Status famili~ e status pessoais civis.l.. 136
92. Status profissionais~ , 138 pensamento 194
93. Estados pessoaIs. pato I' .
ogIcos . 139
127. Norma~iva escolást}ca e igualdade de garantias: prioridade
94. Situações absolutas e relativas 140 do projeto educauvo pessoal e familiar 195
95. Situações ditas de fato 142 128. Escola particular ou pública: pluralismo efetivo 197
96. Título e fonte da relação 144 129. Do chamado direito à moradia 198
97. Correlação (collegarrumto) entre relações 147
98. Correlação (collegamento) de derivação 149 Capítulo oitavo
99. Correlação (collegamento) instmmental. 150 Situações subjetivas patrimoniais
:1
147. Merecimento de tutela (meriteuolezza) 90S estatutos privados
e reserva de lei 229
tutela da personalIdade 1
117. Direito moral do autor. 181 148. C~)O.teúdomínimo e propriedade , 230
149. limItes e servidão , 231
118. Privacidade (riscrvatez.za) nas relações familiares 182
119. Tutela da imagem, solidariedade familiar e direitos do ~~O.~t?S emula?vos. .. 232
1. Informaçao .como bem. .. 234
indivíduo 183
ó •••••••••••••••••••••••••••••••••••
152. Bens exclusivos e bens a gozo múltiplo 235
'.'"..-....1
153. Bens corpóreos e incorpóreos, informação como obra de 181. Do pri~.Cípiode liberdade das formas 293
engenho e informação-notícia
,I 154. A informação como ponto de referência de atos e de
237 182. Var:ablhdade da forma e da estrutura do negócio
183. Umdade de forma e conteúdo. Necessidade de um juízo d
295
I
pessoais e patrimoniais
156. A famma como formação social 243
157. Relações familiares, status pmonae e controle ........•.....................247
158. "Unidade da familia" ~ 250
159. Familia e relação jurídica ........................•....................................
~.2-5.2
160. A familia não-fundada no casamento , 253
161. A familia não-fundada no casamento como valor atuativo dos
princípios constitucionais 257
162. Pátrio Poder (potestà) dos genitores e liberdade dos menores 258
163. Press~l~ost?~,da s:;pa~ç~o judicial: "~tolerabilidade da
conVIVenClaou prejUlZOdos filhos 261
I
164. Divórcio e princípio de conservação da família ; 263
165. Função autônoma da separação 265
166. Regime primário das relações patrimoniais familiares 266
167. Aspectos da comunhão legal 268
168. Normas inderrogáveis e comunhão convencional 269
169. Fundo patrimonial como patrimônio no interesse familiar 270
170. Obrigações no interesse da família 272
Capítulo décimo
Ato e atividade privada
171. Fundamentos diversificadosda autonomia privada 275
172. Juízo de licitude (liceità) e juízo de valor (meriteuolezza) do ato.
Os chamados limites à autonomia privada 279
173. Autonomia coletiva 281
174. Autonomia privada "assistida" 281
175. Autonomia das comunidades intermédias 283
176. Interesse público e interesse privado: comparação e
graduação no quadro dos valores constitucionais 284
177. Incid~ncia do inter~sse pú~lico.s~bre o perfil funcional '
tambemdos atos nao-patnmoOleus , 285
178. Interesse público e estrutura do negócio.............•....; 286
179. Incidência direta e indireta do interesse público sobre a
causado negócio. Alguns exemplos..: ; : 287
180. Pretensa J;1aturezaexcepcional das prescrições sobre as
formas legais 289
Capítulo primeiro
:,
~': (:
Realidade social e ordenamento
\: , jurídico
I:
r a conjunto de princípios e de regras destinado a ordenar da realidade) é sempre fruto de demandas, de necessidades,
t
tos de um cOl"Uuntounitário e hierarquicamente predIsposto, , ,
formação social.
que pode ser definido, pela sua função, como" ordenamento"
Gurídico), e, pela sua natureza de componente d~ estrutu~ 3. O Jurista e as escolhas legislativas. - A história, sobretuto Direito Po-
social como" realidade normativa" . A transformacao da reah- . nos últimos decênios, ajuda a compreender que quando o sitivo e lei
injusta
., dade 'social em q~alquer dos seus aspe-ctos(dive~rsosdaqueIe poder Legislativo acredita estar acima e além dela própria,
o Direito ---------~--------------- - impondo prescrições que violam os direitos fundamentais da
. na total ida- aspecto nonnativo em sentido estrito) significa a transformaça?
de do real da" realidade normativa" e vice-versa.A afirmação, ao contra- }1essoahumana, termina uma ordem jurídica legítima e começa
riõ, da autonomia da ciência jurídica e as conseqüentes tenta- uma autoritária, fundada na pura força. Nesta hipótese, resta
tivas de definir a chamada ''se~lidªQ~j!!x:.ídic_a.'~
como alguma ao jurista a alte~~~va: respeitar as normas, ainda que injustas
coisa que possa viver separadamente da realidade social, eco- ou moralmente IlICltas- tome-se, como exemplo, as leis fun-
nômica ou política é herança que ainda pesa muito sobre os dadas na distinção dos indivíduos em raças, sexo ou renda -,
juristas e sobre o ensino do Direito. Isso levou à criação de fazendo coincidir a sua escolha ideológica com aquela do le-
uma cultura formalista, matriz de uma "teoria geral do direito" gislador; ou recusar-se a ser jurista, não mais exercendo no
sem (exf>lícitas)"infiltraçôes'; de caráter político, econômico, •
i '
I
sistema a própria profissão - operador do direito, magistrado,
:sociOlÓgico:' cOInü-se odirelto-fQSse-llu-uiâver,eteffiO;-â=l1ísiOri- burocrata - e se empenhando, eventualmente, em uma ativi-
co, insensível a qualquer ideologia. dade de resistência contra as escolhas ilegítimas do legislador.
Estabelecida, ao contrário, a recíproca influência entre os a jurista é aquele que interpreta, individua e aplica as leis: no Fidelidade
ao ordena-
aspectos sociais, econômicos, políticos e aqueles normativo-ju- momento em que as desaplica, exerce uma atividade, às vezes, mento
rídicos, a transformação de uI!Lª~Bect9_~conômico->-polüicQ, historicam~nte louvável, mas diversa daquela de jurista. Entre-
ético, incide - às-~ezes profundamente - sobre a ordeIn tanto, mesmo esta argumentação tem naturalmente os seus
ríiormauva- e Více~ver~a::--- ------ . limites. Basta considerar a não sujeição de alguns juristas ao
Poder Legislativo quando este não atendeu ao essencial e mí-
"Direito Po- 2. Regras jurídicas e regras sociais. - a~?_ir~~Rositivo (vale nimo respeito à pessoa humana. Na época do nazismo, uma
sitivo"
dizer, o direito expresso por Lontes pre d'etermma das e reco-
£ parte da jurisprudência italiana e alemã, algumas vezes,soube "Direito de
nhecidas, predominantemente escrito) pode exercer uma du- colocar um freio, ainda que limitado, à atividade do Poder resistência"
pla função, dependend~<!o fat()<:l~ _~~pr~eora
_ simelesme!1_te Legislativoaplicando restritivamente algumas normas - aque~
conservar as situaçôe~J~res~nt~~_~ sociedade, adaetando as las, por exemplo, que se inspiravam na distinção das pessoas
eróprias regras às ~e natureza social preexistentes; ou ~ m~di- com base na raça - ou interpretando extensivamente alguns
ficar a realidade cnando novas regras. Pode exercer hlstonca- princípios que ainda existiam, até então, de maneira apenas
mente uma função de conservaçfl.9 __<!a.isi~uações de fato ou, formal no ordenamento. .
sob o impulso de interesses contrastantes e alternativos, de A fu~ção do jurista é, P?rtanto, comPlex,a e a sua atividade
transformação _.9:~_ est.I~.!.~rase.reestabelecidas. Dado que na valoratIva envolve um conjunto de aspectos que vão do ideo-
realidade como um todo não existem somente velhas" estru- ~ lógico e político ao social, éti.co e religioso.
turas" a serem modificadas, mas também exigências - ideais
Nor~as e práticas - que requerem satisfação, também a nonna pro- 4. 6 Código Cim! - Por" código", em geral, entende-se o
promocl~ mocionaL( ou s~ª,_ a norma Q!1-u{:_r-rQP_õ_e.-à.£unção.i.u.mdm- documento (que é uma lei) contendo um conjunto de propo-
nalS ----
4 Capítulo primeiro Realidade social e ordenamento jmidico 5
sições presClitivas (das quais se extraem normas) consideradas da Comunidade Européia, as leis ordinárias (e portanto os
unitaliamente,. segundo uma idéia de coerência e de sistema, códigos, que são leis ordinárias, incluindo o Código Civil), as
destinadas a constituírem uma disciplina tendencialmente leis regionais, os decretos do Poder Executivo e outros tipos
completa de um setor. A experiência da codificação - que d~ non~as, usos, etc. A nonna constitucional, no ápice da
encontra as suas raízes na Revolução Francesa e não é carac- lllerarqma das fontes, pode ser modificada somente por maio-
terística típica de todo ordenamento estatal - deu vida na ria qualificada. d? .Parlamento, diversamente do previsto para
Itália, com referência à disciplina aqui estudada, ao Código as normas ord.ll1a~as (art. 138 Const.), e, o que mais importa,
Civil de 1865 e àquele (ainda em vigor) de 1942. a Corte ConstltucIOnal tem o poder de declarar a elilninaçã
i"
de to dos aque es at?s qu~ têm força de lei" que estiverem em
o
Cód. Civil O Código Civil de 1865 pode ser chamado de o código da
de 1865: a unidade da Itáliá, na medida em que sela uma uniformidade cOl~traste. COI~os pr~nClpI?S.constitucionais (arts. 134 e 136).
pro~~~e~ política que - não obstante os graves desequilíbrios de caráter
econômico, político e social - determina a abolição dos códi-
gos pré-unitários de cada Estado italiano. Modelado no Código
Dal a obngaçao --:-nao ~nals livre escolha.- imposta aosjuristas
de le~ar ~m c?nslderaçao a prioridade hierárquica das normas
constltucIOnals, sempre que se deva resolver um Iproblema con-
*-'
Civil francês de 1804, o Código de 1865 caracteriza-se especial- creto. . .
mente por colocar no centro do ordenamento a propriedade O cOl"tiunto de valores, de bens, de interesses que o ordeIla-
. 'd' .' A Coust
privada, sobretudo a propriedade imobiliária da terra: na ma- menta Jun ICOconSIdera e privilegia, e mesmo a sua hierar- fuuda o'or-
nutenção e no incremento desta, é predominantemente inspi- q~ia, tr.aduzem o tipo de ordenamento com o qual se opera. denamento
rada a disciplina da família e das sucessões mortis causa; e os Nao eXIste, em abstrato, o ordenamento jurídico, mas existem
contratos são disciplinados como modo de aquisição da pro- .Qs-ordenamentos jurídicos, cada um dos quais caracterizado
priedade privada. A categoria do ser é subordinada àguela do por uma fil~sofia de vid.a, isto é, por valores e por princípios
. ter: quem possui "é". fundamentaIS que constltuem a sua estrutura qualificad,ora .
Cód. Civil O Código de 1942, ao revés, coloca ao centro da atenção a O orde~lamento i:aliano constitui-se por leis e códigos q.ue A Const.
de 1942: a empresa, a atividade produtiva, a regulamentação do trabalho; foram e ~ao expressoes de uma ideologia e de uma Visão do une o orde-
produção mundo dIVersas daquelas que caracterizam a sociedade moder- namemo
a necessidade de organizar a produção, a forma política e
jurídica do intervencionismo do Estado nas relações econômi- na,_e, de qualquer mod~, ~er.:tamente diversas daquelas que
cas. O interesse do legislador é potencializar o Estado, aumen- es~o p.r~sentes. na ~onstltmçao da República. A questão da
tar a produtividade, fazendo do produtivismo a característica aplicabIlidade sllnultanea de leis inspiradas em valores diversos
precípua do ordenamento. (o Código Civil italiano, le~bre-se, é d~ 1942: pertencia, por-
Constitui- A Constituição da República assumiu, em relação a este tanto, ao ordenamento faSCIsta:;a Constituição, ao contrário
ção de problema, uma posição diversa. Uma coisa é ler o Cód.igo entrou em vigor em 1948) resolve-se somente tendo consciên~
1941;:a pes- -"- ~~
soa naquela ótica produtivista, outra é "relê-lo" à luz da opção cia de que o ?r~ena_mento jurídico é unitário. A solução para
• ,I ideológico-júrídica" constitucional'.na qual a produção en- ,cada controversIa nao pode mais ser encontrada levando em
contra liinites insuperáveis no res eito aos direitos fundamen- conta simplesmente o artigo de lei gue parece contê-la e re-
tais a pessoa umana. SOlvê-la, .mas, antes, à luz .do_i~teiro ordenam~nto jurídico, e,
"em partlc~lar, de seus pnnClpIOs fundamentaIs, considerado~
A Const. é ~~o opçoes de base que o caracterizam.
5. A Constituição. - No nosso ordenamento, as normas ex~
a fonte suo
prema pressas na Constituição, que entrou em vigor em 1948, estão
em posição de supremacia. A Constituição ocupa o lugar mais 6. A .chamada ~escodificação.- Ao lado do Código Civil de
alto na hierarquia das fontes, precedendo, na ordem, as normas 1942, amda em VIgor com algumas modificações, cabe consi-
.....--1,.
l.~.
r I'I1 . r
I
I ' 6 Capítulo primeiro
;1
. I
problemas. ser~rií.ecessãno <Eli-.umaresposta, prJ).curancio--ano- ~:;;; d; ~:~~r~' seu caráter genéric~. - I~, I.!ejinições LegisLativas, - 19.
_ 21 A ' h' acen,?s, - 2?ju:zsfrudeneta dos interesses e dos vaLores.
sistema como um todo, sem apego à preconceituosa premissa . camtn o da despatnmomaLtzação" do direito civil.
<i() caráter residual do códig~por outro lado, sem desaten- .
ções às leis cada vez mais numerosas e fragmentadas.
••
..•..
lii
..~..
'.I:.'I~.i.
r
Sentenças
conta a atividade de suplência e de estímulo que a Corte Cons- zar-se, à parte as devidas exceções em tema de competência
da Corte
Const. titucional (art. 134ss. Const.) substancialmente exerce há tem-
exclusiva, com as leis ordinárias do Estado e, sempre, com os
pos. Na teoria das f~ntes uma ~special in?uência exercem as princípios constitucionais. As leis das Províncias (assim, para
sentenças chamadas lllterpretauvas. Atraves delas a Corte, sus- algumas matérias, os artigos 4 e 5 do Estatuto do Trentino Alto
citando acirradas discussões ainda não pacificadas, entre as Adige) não podem contrariar as leis regionais, as do Estado e
possíveisinterpretações de uma disposição qu~ te~ha força de os princípios constitucionais. (Para o enquadramento hierár-
V ei, escolhe e fixa aquela que ~-esultas~r consutucIOnale, ~or- quico da normativa da Comunidade Européia v. infra, S 10.)
rI' tanto, não a elimina; ou, entao, consIdera a norma consutu-
cionalmente ilegítima, ainda que não o seja em todas as suas
A harmonização entre as fontes exige por parte do jurista
um esforço constante, contínuo, em grande parte ainda a ser
concretizado.
possíveis aplicações. .'
Corte de É preciso finalmente recordar as sentenç~ mterpretau,~as _A hierarquia das fontes não responde apenas a uma expres- Hierar-
Justiça Ce emanadas pela Corte de Justiça das Comumdades EuropeIas sao de certeza formal do ordenamento para resolver os conflitos quia: meio
as normas emanadas por diversas fontes'' é inspirada , dadeeonst.
atuação
(art.177 Tratado Cee). Tais pronúncias, assim como entend~u entre
.
a Corte Constitucional italiana, têm a mesma força normauva sobretudo, em uma lógica substancial, isto é, nos valores e na
da fonte comunitária interpretada: quando a fonte exprime conformidade com a .filosofia de vida presente no modelo
Cap£tulo segundo Fontes, técnicas, valores 11
10
constitucional. O respeito à Constituição, fonte ~uprema, im- ordinários. As opções feitas no plano normativamente superior
plica não somente a observância de certos procedl~entos para refletem-se na atividade hermenêutica, nos conteúdos e nos
emanar a norma (infraconstitucional), mas, tambem, a neces- significados das normas de nível ordinário. Certamente, o ca-
sidade de que o seu conteúdo atenda aos valores presentes (e rá.t~r sistemáti:~ da interpretação, que encerra em si a própria
Ii atlvldade cogmtlva, enquadrando cada normativa no panorama
organizados) na própria Constituição.
geral do ordenamento, deve inspirar-se nas normas constitu-
I . 9. Relação entre norma constitucional e norma ord~n?ri~,- A cionais. Todavia, a releitura da legislação ordinária à luz das
i fórmula" releitura do Código Civil e das leis e~peclals a luz, da norm~s fundam.en~i~, na dup~a as~erção de mera interpretação
a partlr dos pnnclplos constitUCIOnais e de individuação da
li
I Constituição da ~epública" deve ser e~clareclda; para ~~tar
justificativa da normativa ordinária sob a ótica funcional não
que ela possa assumir significados amblguos e problematicos
é necessário uma adequada reflexão sobre o papel glob~ q~e utiliza plenamente as potencialidades das normas consti;ucio-
,.
I' o Texto Constitucional exerce na teoria das fontes do DIreIto ~ais. (De nada adian~ o ~e~nvio aos" princípios gerais" pre-
i VistO.no art. 12 das dlSposlçoes preliminares ao Código Civil:
Civil. ' cfr. mfra, cap, 4, ~ 55.)
Segundo alguns autores, ~ norma Co~s?t~cional sen~ um
Teoria da mero "limite" ou "barreira" a norma ordmana. Os enuncIados Idêntico juízo também deve ser expresso àquela opinião - .
Const. d'lta "d a " ap I',lcab'l'd d
.1 1 a e (somente) indireta" - pela qual a Teona da
aplicabilida-
como limite normativos ordinários, enquanto não ofenderem um interesse
constitucionalmente prótegido, assumem, autonomamente, norma constltucIOnal poderia disciplinar uma relação de direi. de indireta
significado e fundamento, como expressões de um sistema to civil uni:a~~nte através .da concomitante aplicação de uma
completo e totalmente legítimo. Nesse sentido, a n~rma cons- !10rma ordmana, de maneIra que, à falta de uma norma ordi.
titucional atuaria excepcionalmente e de forma reSIdual, mas 'nária aplicável ao caso concreto, aquela constitucional não
sempre sem incidir sobre a atividade'interpre~tiva do.s enun- p~de:i~ atuar sozin~a. ,Asnormas constitucioriais- que ditam
ciados normativos ordinários. A essa afirmaçao rephc~.se. o pnnclplos de relevancla geral - são de direito substancial" e
-, '
seguinte. Não se pode negar que exi~te~ n~rmas .c~n~ti~UCIo- nao meramente mterpretativas; o recurso a elas, mesmo em
nais que se propõem a estabelecer hmlte~ as ordmanas, mas sede de interpretação, justifica-se, do mesmo modo que qual-
que essa seja, por definição, a única funçao da n~rma f~nda- qu~r ?u.tra norma,. c0r:t0 expressão de un; valor do qual a
mental, pode-se certamente refutar. O recur~o ~ noçao de propna mterpretaçao nao pode subtrair-se. E importante cons~
limite impede, outrossim, que a norma constitUCIOnal possa tatar que também os princípios são normas, .
ser utilmente reconhecida como verdadeira norma por parte ~ão ~xist~m, portanto, ar~~entos que contrastem a apli- Posição
dos operadores jurídicos, Seria co~s~~tido a e.stes tão-somente .caça0 direta. a norma constitUCIOnal pode, também sozinha aceita: apli.
interpretar e aplicar a norma ord~n~na, me~l~nte o esquema (qu~ndo não existirem normas ordinárias que disciplinem a c~bilidade
lógico da su~ (para a defimçao e a cntica de tal ~roce- latt1.S~ecieem consideração), ser a fonte da disciplina de uma direta
dimento cfr. infra, capo 4, ~ 47), com ~ reserva, t?davla, de relaçao jurídica de direito civil. Esta é a única solução possível
excepcionar, nos limites e com as modalIdades preViStas,o seu ,se se reconhece a preeminência das normas constitucionais ~
defeito de legitimidade constitucional. e~~os valores por elas expressos - em um ordenamento uni-
Do mesmo modo, contrasta com o considerar a norma cons- .táno, carCicterizado por tais conteúdos.
Teoria da
relevância titucional como verdadeira norma, a opinião que nela reco- . "~Se~a fácil extrair da análise de significativas orientações da
somente in- nhece, além de, ou mais do que, um limite à norma or~i.nária, doutnna e dos Tribunais uma confirmação da conclusão aI.
terpretativa
uma expressão de princípios jurídicos gerais ~ serem utihza~os ,fan.çada. Pode-se, portanto, afirmar que, seja na aplicação dita
somente em sede de interpretação de enuncIados normativos I mdlreta - que sempre acontecerá quando existir na legislação
,
í
Capítulo segundo
12 Fontes, técnicas, valores 13
veis da pessoa garantidos pela Constituição; se isso acontecer, rania é, de um lado, funcionalmente . " -
cobertas pelo Tratado Cee e b Clrcunscnta as materias
eles serão incons'titucionais e sem eficácia normativa no orde. , ' so retudo por t I d •
se refere aquela esfera de' m teresses e vai' ou ro" a, o, nao
namento italiano. Uma solução diversa é impossível, já que irrenuciáveis, essenciais à identidad ores caractenzantes e
estabelecer a superioridade da fonte comunitária sobre aquela Corte Constitucional tem afi d e do Estado membro. A
constitucional equivaleria a admitir uma modificação constitu- antes, que a normativa comu l~a. o, portanto, como foi dito
cional fora das hipóteses e dos procedimentos de garantia rincípios fundamental's e m d~a .nao pode ser contrária aos
P aos Irei tos , I' - . d
"Forma re- previstos no art. 138 da Constituição. A referência a essa dis- . humana que caracterizam C ., _ma lenavelS a pessoa
publicana" posição permite uma especificação ulterior. O art. 139 Consto a Onstitulçao
como sínte- dispõe que" a forma republicana não pode ser objeto de revisão Se, portanto, em um territóri d :
~e dos con- confluem fontes diversas (mesm~ ete~mado, como a Itália, Pluralida-
teúdos constitucional". A melhor doutrina observou que a "forma tos supranacionais) o que I:'ro~en~e~tes d.e ordenamen- de das fon-
republicana" não se refere meramente à alternativa entre mo- tário sistema norm ti', T conta e a mdlVlduaçao de um uni- tes e unida.
a vo, rata-se de uma' b.' de do ~iste-
narquia e república, mas tenciona subtrair ao procedimento ao jurista no respeito à hierar ui ,mcum ..enCla que cabe ma
de revisão constitucional os princípios fundamentais, estabele- zação entre as fontes (e ao (a e a consequente harmoni-
cidos na Constituição, sobre os quais é construída a identidade Por consegul'nte I s va ores a elas subjacentes),
- pe o meno t- d
. I
do vigente ordenamento. Por conseguinte, não seria legítima pular e as contem orân ' s a: quan o a vontade po-
uma lei de revisão constitucional (formada, isto é, com o pro- dos Estados mem6ros n~a; mO~fi~açoes de cada Constituição
cedimento previsto no art. 138 Const.) que atentasse contra os ropéia, fundada em uma r~on. uZlrem, a ~~a Federação Eu-
princípios fundamentais do ordenamento: tratar-se-ia de uma e com um Tn'b I p pna COnStitUlçao escrita e ríoida
una que adequada t O.
lei constitucional "inconstitucional". Afirmar que uma norma lores _ a normativa constit . m~n e conserve os seus va.
constitucional possa ser inconstitucional não é um jogo de aquela comunitária A C t ~clon~ Italiana prevalece sobre
palavras; coloca-se em evidência, assim, que a norma constitu- tanto, o poder de d~clar::,e ons.titu~ional italiana tem, por-
Leis consti-
cional é tal não somente porque foi respeitado um determinado nitária, Esta conclusa.o na.o1?conStituclOnal uma norma comu-
e contrastada p I -
tucionais procedimento formal (art. 138), mas porque é portadora de a Corte Constitucional ' I e a constataçao que Papel da
"inconstitu- determinados conteúdos (art. 139). A identidade do Estado é'j' midade das I' d JU ~a as controvérsias relativas à leoiti- Corte
cionais" eIS e os atos do Estado d R . ., O. Const
portanto, intocável: uma lei constitucional que mudasse os 1!Il força de lei (art. 134 Con t e ~ egtoes' que têm .
,; princípios ~undamentais não atuaria uma revisão, mas uma.".,.'.... '.,.'•.• das disposições normativ:S') dcom excl~~ao,. poderia parecer,
"I revolução. E, portanto, evidente que as normas comunitárias : Deve-se observar que ne te, provemencla supranacional.
:11
não podem lesar os princípios fundamentais, a identidade, a .;l> deve entender a lei ~pro~a~:rti~o, por lei do Esta~o não se
"essência" do nosso ordenamento. qualquer disposição que tenha~~ro P~rl~~ento n~c~o~al, ~as
O que se acabou de afirmar não justifica nenhum mesquinho nal. Isso acontece se e en ~a e el no tem tono naclO-
Art. 11
nacionalismo, Isso seria contrastante com as significativas aber- exercício da própria soberi~~~to ,e ,o ~~tado que, ,no máximo
Const.
turas internacionais do texto Constituciogal, que devem ser, tado, permite a a lic - on~nana, ao adenr a um Tra-
corretamente, levadas em consideração. E necessário, então, supranacional ãi a~ao mesmo dIreta de disposições de fonte
indagar sobre os fundamentos constitucionais da recepção do organismos co~un1~~s concon:e na form~lação por meio de
direito comunitário. A Constituição consente, no 'art.!I, "em soberania direta (ou i ~~' que sao expressoes, por um lado, de
condições de paridade com os outros Estados, nl!S limitações de mitação da sobem ,n lretalta)popular e, por outro, de autoli-
soberania necessárias a um ordenamento que garanta a p~z e a ma esta excl' Ra"
modo levaria à obrigató ' I ~Slva, ClOcmar de outro
justiça entre as Nações" , promovendo "as organizações inter- nitárias são ca na conc usao de que as normas comu-
, nacionais voltadas a tal objetivo", Esta autolimitação de sobe- 'j pazes de provocar modificações no texto e na
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I
i)
16 Capítulo segundo Fontes, técnicas, valores 17
hierarquia constituc,ional, com violação dos procedimentos e 11.A autonomia privada (elementos introdutivos). - Não é uma
das rrarantias ditadas no artigo 138, S 1, Const. operação simples definir a autonomia privada. Sobre o çonceito
Corte de Não se pode, portanto, sustentar que a incumbência de adensaram-se questôes das quais depende em grande parte a
Justiça Ce: tutelar os valores que caracterizam a essência.do n~sso.orde: configuração do ordenamento. A autonomia privada pode ser
uniformida- namento seja transferida da Corte ConstitucIOnal ltahan~_a
de da inter-
determinada não em abstrato, mas em relação ao específico
pretaç,io Corte de Justiça das Comunidades Européias (agora, Ulllao .ordenamento jurídico no qual é estudada e à experiência his~
Européia). Na medida em que, nos ~ermo~do ~rt. 17.1 do tórica que, de várias formas, coloca a sua exigência.
Tratado Cee, compete à Corte de JustIça ulllformlzar .a!nter: Querendo tentar uma definição inicial e considerando-a
pretação do direito c(;)lnuni~rio, pax:a.e~itar contra~lço.es, e como mero ponto de partida para os sucessivosdesenvolvimen-
necessário submeter a questao de legttImldade constItuClonal tos críticos, pode-se entender por "autonomia privada", em
de uma nonna comunitária (à Corte Constitucional italiana) geral, o poder, reconhecido ou concedido pelo ordenamento
do mesmo modo 'como a fonte comunitária é interpretada pela estatal a um indivíduo ou a um grupo, de determinar vicissi-
Corte de Justiça; o risco é que a Corte Constitucional julgue tudesjurídicas (sobre tal conceito cfr. infra, cáp. 5, S 64) como
leo-ítimauma nonna comunitária interpretando-a de um modo conseqüência de comportamentos - em qualquer medida ---..:.
di~erso da interpretação dada pelo Tribunal d~Justiça à ~esma livremente assumidos. .
norma; interpretação, esta última, que podena ser malllfesta- Na base desta concepção reside, freqüentemente, de modo, Liberdade , .
," '",
mente inconstitucional. somente tendencial, a liberdade de regular por si as próprias (não so-
NOImas Ce . . mente eco-
e reserva
Seria errado extrair do quadro acima delineado a impressão ações ou, maISpreClsamente, de permitir a todos os indivíduos nômica)
de lei de um comportamento pouco europeísta .. Pelo _contrá~o, as envolvidos em um comportamento comum determinar as re- da pessoa
normas comunitárias, corretamente entendIdas, sao destInadas gras daquele comportamento através de um entendimento co-
a exercer uma notável influência na interpretação da legislação mum. Apesar de tratar-se de um quadro ideal, com uma quase
ordinária (efr. infra, cáp. 4, S 61) e a incidir sobre a glo~al ausência de plena realização histórica, ele exerceu importante~
reconstrução do sistema, até tocar matérias - como a propne- influência no pensamento jurídico e na praxe, colocando-se
dade e a empresa ---,que, apesar de protegidas P?r r~serva de , como a marca do valor da liberdade individual. Atrás do en-
lei (arts. 41 e 42 Const.), fazem parte das competenClas comu- canto da fórmula, todavia, escondem-se tão-somente o libera-
nitárias: estas matérias econômicas são funcionalizadas pela lismo econômico e a tradução em regras jurídicas de relações
Constituição com base na própria hierarquia de valores (a de força mercantil. Esta concepção mudou radicalmente na
referência é à utilidade social e à função social nos artigos hierarquia constitucional dos valores, onde a liberdade não se
supracitados) de modo que também a norm.ativa comun~tá~a identifica com a iniciativa econômica: a liberdade da pessoa,
deve responder a tal funcionalização. RespeItando tal eXlgen- e a conseqüente responsabilidade, ultrapassa e subordina a si
cia, portanto, a normatiVa comunitária pode, legitim~ente, mesma a iniciativa econômica. A legislação ordinária, além
concernir também matérias protegidas pela reserva de leI, rea- disso, tem favorecido - não sem ambigüidade - o processo
lizando a especificaçãocomunitária de um valor constitucional: de recomposição do ordenamento no sentido constitucional.
o que representa o mais elevado grau de incidência da norma- O quadro atual deve ser examinado com atenção.
tiva comunitária pennitido no nosso ordenamento (ficam de Hão de se delinear os aspectos nos quais se manifesta a
qualquer jeito excluídas as matérias não-patrimoniais: re.lativas autonomia privada. Tradicionalmente, afirma-se que ela se tra-
aos princípios fundamentais e estranhas às competenClas co- duz, antes de tudo, na liberdade de negociar, de escolher o
munitárias: tome-se, como exemplo, a reserva feIta no art. 13 contratante, de determinar o conteúdo do contrato ou do ato,
Const.). de escolher, por vezes, a forma do ato. É necessário verificar
18 Capitulo segundo Fontes, técnicas, valores 19
se esta ou estas liberdades, em razão da fisionomia que a au- atos de autonomia têm, portanto, fundamentos diversificados;
tonomia privada ass~me com base nos princípios gerais do porém encontram um denominador comum na necessidade
ordenamento, encontram correspondência efetiva na teoria de serem dirigidos à realização de interesses e de funções que
dos atos. São esses princípios que servem de base para avaliar merecem tutela e que são socialmente úteis. E na utilidade
se a autonomia privada é digna de proteção por parte do social existe sempre a exigência de que atos e atividade não
ordenamento: ela não é, portanto, um valor em si. Revela-se contrastem com a segurança, a liberdade e a dignidade humana
indispensável o reexame da noção à luz do juízo de valor (art. 41, ã 2, Const.). A constatação que se acabou de fazer
(giudizio di meritevolezz.a) de cada ato realizado, de modo tal que acerca do diverso fundamento constitucional da autonomia
se possa deduzir se estes, individualmente considerados, podem privada é da máxima importância, ainda que ela não seja re-
ser regulados, pelo menos em parte, pela autonomia privada. conhecida adequadamente pela doutrina no seu global signi-
A atenção é dedicada, em geral, ao contrato, em virtude da ficado. Ao diverso fundamento corresponde uma diversa colo.
sua natureza de negócio patrimonial (art. 1.321 Código Civil). cação na hierarquia das fontes.
A teoria dos atos, todavia, não se restringe a tais negócios e, A autonomia se apresenta, no seu mínimo e constante de- Autonomia
sobretudo, deve-se levar em consideração que as expressões de nomma . .. . d e pe 1o menos uma d as
. d or, como ato d e 1111clativa no
to econtra-
110 nCo
liberdade em matéria não-patrimonial ocupam uma posição partes interessadas na negociação: É a atuação não somente gócio
mais elevada na hierarquia constitucional. Como categoria mais de direitos subjetivos mas também de deveres de solidariedade
ampla do que o contrato coloca-se o negócio jurídico, ao qual e, por vezes, de específicas obrigações legais de contratar (art.
se intenciona reconduzir toda manifestação de autonomia, pa- 2.597 Código Civil). Solidariedade não somente econômica mas
trimonial ou não. - como preceitua o próprio art. 211 Consto - também social
Iniciativa O elemento constante na teoria dos atos e da atividade dos
privada e familiar (art. 29 Const.). Tome-se, como exemplo, o vasto
particulares é a iniciativa, não a autonomia privada, dado que,
campo dos atos de disposição do próprio corpo e especialmente
em concreto, a auto-regulamentação pode faltar. Não o poder
os transplantes. Nessa perspectiva, as dúvidas sobre a compati-
de auto-regulamentação, mas aquele de iniciativa e de impulso,
bilidade entre o adimplemento de um dever ou de uma obri.
por vezes livre, por vezes devido - caracteriza os atos e as
gação ~ a natureza negociai do ato estão destinadas a desapa-
atividades (também) dos particulares. O ato que se propõe a
obter um resultado pode encontrar o próprio regulamento em recer)'\ negociação apresenta-se cada vez mais com técnicas e
fontes heterônomas: na lei, nas competências da Administração formas diversificadas, de modo a excluir que se possa construir
Pública, na contratação coletiva, etc. . uma figura negociai unitária - representada por uma discipli-
Fundamen- Não é possível afirmar,. depois do quanto foi acima especi- na comum -, mas, na realidade, individuada exclusivamente
tosconstitu- com base naquela ditada para? contrato e considerada com-
cionaisdi- ficado, que a autonomia negociai não tem .nenhuma relevância
versificadosconstitucional, nem, de outro lado, que se pode esgotar na patível com qualquer outro atOl Esse assunto leva à inaceitável
da autoprivoautonomia contratual e, portanto, tornar-se relevante somente conseqüência de excluir a natureza negocial daqueles atos que
para dar atuação às vicissitudes de relações jurídicas patrimo- mostram intolerância ou incompatibilidade com uma ou mais
niais. A tentativa de individuar o fundamento da autonomia regras próprias do contrato; quando, na realidade, a função
na garantia constitucional da iniciativa econômica privada (art. do ato, apesar de ser sempre expressão da iniciativa privada e,
41 Const.) é parcial. A negociação que tem por objeto situações por vezes, direta realização da personalidade do homem, não
subjetivas (cfr. infra, capo 5, ã 68) não-patrimoniais - de na- é suscetível de avaliação patrimonial e exige garantias e tutelas
tureza pessoal e existencial - deve ser colocada em relação à especiais que se traduzem no plano da regulamentação: o pro-
cláusula geral de tutela da pessoa ~umana (art. 211 Const.). Os blema será examinado minuciosamente no último capítulo.
20 Fontes, técnicas, valores 21
Capítulo segundo
12. A jurisprudênciae o papel do precedente judiciário. O costume cul.tura crítica será menos p~openso ~ seguir uma regra con-
I,'
e a amiJigiiidade da remissão.à praxe- O princípio da legalidade solIdada e, por vezes, esclerotlzada. Dal a antinomia entre regra
'.1 do precedente e cultura jurídica inovadora, entre regra do
!~ (cfr. infra, capo 3, S 28) exige que o juiz seja submetido "so-
i;. . mente à lei" (art. 101 Const.), e a decisão do juiz, a sentença, precedente e desenho legislativo reformador. Uma doutrina
não é "lei". Daí a crítica às tendências que acentuam o especial ~u~altern~, e.~, posi~~o de "sujeiç~o psicol.ó~ca em relação à
papel das decisões jurisprudenciais. O conjunto das decisões JunsprudencIa , traIna a sua funçao de solICitaçãocrítica, em-
"Direito vi. representaria o direito vivente, socioloo-icamente recuperável', purrando a atividade jurisdicional para a burocratização e a
vente" O'
atividade reformadora e promocional para o insucesso.
as regras e os princípios, ao contrário, concemiriam um mundo
irreal ou constituiriam, qua~do muito, uma simples linha de Discurso análogo deve ser feito para as fontes de natureza
tendência. O juiz seria vinculado ao direito vivente. Desse espontânea. Tome-se, como exemplo, os costumes, as praxes,
modo, se existissem regras ditas abstratas que não pudessem seja aquelas que decorrem dos usos, seja aquelas negociais ou
ser aplicadas, ojuiz ou o advogado não seriam de fato obrigados c~ntra~u~s. Consi~e:and~ tudo,. num ordenamento em que
a aplicá-las, porque somente o direito vivente em'penharia o nao eXIstisseuma ngtda hIerarqUIa das fontes poder-se-ia tam-
juiz e vincularia o intérprete. Trata-se de uma solução inacei- bém admitir que os costumes, que se repetem por longo tempo,
tável. encontrem e cubram espaços que a lei não pretende recobrir
A força do É preciso considerar o papel da jurisprudência, o valor do no futuro. O chamado costume contra legem no ordenamento
precedente
precedente judiciário' (as sentenças dadas precedentemente i~liano não é admissível. Por costume contra legem entende-se
está na rntio
sobre um caso que o juiz considera análogo àquele a ser deci- seja aquele que contrasta com uma específica disposição inder-
dido) que, mesmo em sistemas diversos daquele italiano, nem rogável, seja aquele não conforme um princípio ou um valor
sempre é vinculante. Se se analisa o papel da jurisprudência do'sistemajurídico. Em um Estado social de direito o costume
como fonte, verificar-se-áque não é tanto o ato jurisdicional a não pode fraudar a lei. É a lei, com os seus princípi~s e os seus
criar o direito, mas',sim, a sua ratio decidendi, isto é, o princípio valores, que dá ao juiz os parâmetros de decisão do caso con-
que representa a idéia sobre a qual se funda a sentença; idéia, creto. Sob este aspecto, o único costume possível é aquele
Consuetudi.
aliás, sempre ligada à jattispecie concreta, ,àssuas peculiaridades secundum legem, capaz, em verdade, de superar ojuízo de valor ne secun-
que, freqüentemente, são únicas. É impossível dar ao prece- seja constitucional seja dos princípios fundamentais do ordé- dum Iegem
dente judiciário um determinado e autõnomo graú na hierar- namento jurídico globalmente considerado.
Ij
quia das fontes. Antes da lei? Antes dos regulamentos comu- Estas considerações solicitam um comportamento crítico em
t,:,',',I A rnliose nitários? Antes das normas constitucionais? Depois dos regula- relação à praxe e ao chamado princípio de efetividade. Os usos
funda no mentos ou depois dos usos? Na realidade, a eficácia normativa deveriam ser submetidos a um controle para verificar se são
sistema das ou não conformes aos princípios e aos valores fundamentais,
fontes do precedente reside na eficácia normativa das regras e dos
,princípios de direito positivo interpretados e aplicados pela com o fim de excluir a vinculatividade do uso que não obtenha
jurisprudência. Por conseguinte, no sistemajurisprudencial os uma avaliação positiva, em termos de merecimento, por parte
precedentes têm um papel relevante; o seu fundamento está do ordenamento.
na aplicação e na interpretação de normas e princípios que
não são próprios, mas que, ao contrário, pertencem ao sistema 13. O papel da doutrina e a relação entre poder político e o poder
das fontes normativas primárias, sem as quais seriam "flores econômico. - Freqüentemente, descuida-se de falar sobre o pa- A doutri.n~
I d' (' . como aUV1-
ju~?icassem_ caule" . Mas não existe, contudo, a obrigação para pe que a outnna a comumdade de estudIOSOS do direito e dade crítica
oJUIZsubsequente de não se afastar dos precedentes judiciários a;;obras por eles produzidas) deve exercer para um equilibrado
de acordo com a regra do stare decisis. O juiz mais dotado de sistema das fontes. Isso significa que, ou a doutrina perdeu
22 Capitulo segundo Fontes, técnicas, valores 23
prestígio e credibilidade, ou é a própria doutrina que I~ão tem fosse voltada a realiza: um de~enh?, ~orreria o risco de produzir
conhecimento do dever, que lhe compete, de cumpnr a sua uma 'p.erda de. coesao. esqU1zofrem~a, com uma prevalência
incumbência; nela está inéluída aquela de criticar as decisões defim?va da I~I.do mais forte. ~sta e a maior preocupação na
jurisprudenciais, para qu.e, através da interp~e.tação, possa ~on. qual e necess~no deter-se: MUI~O,se não tudo, depende da
correr à formação do sistema. O papel cntico da doutnna, cultura do paiS, da honestidade mtelectual dos operadores.
quando existe, é quase se~pre l~mitado ao. especí~co e não
analisa as razões da disfunçao. Ha desatençao, se nao mesmo 14. A Justiça derrotada. - É impossível verificar o que de
desinteresse, talvez porque a maior parte dos "doutores" está relevante aconteceu nestes últimos anos na justiça civil e na
submersa nos negócios. cultura)urídica, tã~ c?ndicionadas no nosso país por um de-
Crise da Em um coerente e adequado sistema das fontes, deveria ser senvoIV1.men:oeconomlco nem sempre apreciável pela qualida-
repre- garantida a efetiva atuação da opção polí~ca. A a~ual crise do
sentação d: e ~sslm ~tao) pr?fund~en te diversificado e desequilibrado.
política primado político é especial, porque tal pnmado e aparente e Nao e sufiCIente eVIdenCiar a grave diferença entre as garantias
formal. É completa a mesclagem entre o poder ~olítico e o formais e potenciais e aquelas que concretamente encontram
poder econômico, entre a política como p~otagomsta da eco- atuação na jurisprudência vivente, na história de todos os dias,
nomia e a política como lugar de nego~lOs. O homem d~ que é, sim, história da empresa, dos problemas produtivos
política tende a representar não apenas os mteresses de terceI- distributivos e financeiros, mas é também história dos desfavO:
ros, mas, sobretudo, os próprios: ele é protagonista do desen- recidos, dos tantos marginalizados, por escolha ou por neces-
volvimento econômico e é "acionista" deste desenvolvimento. sidade, do ciclo produtivo. Patologias velhas e novas têm raízes
Uma época de perda de m?rali~a?e e d~ d~cadênc~a: a ética sempre e apenas na desatenção para com os marginalizados e,
dos negócios prevalece. As dlsposIçoes legIslativas, e nao ape~as por outro aspecto, para com aqueles que tendem a monopo-
aquelas nacionais, são preparadas com base nos estudos feitos lizar informação e produção - e agora também a formação
pelas sociedades multinacionais ou por quem de. qual~~er - para governar não somente o mercado.
modo nelas tem interesses prevalentes. A representaçao pohtica E necessário que, com força, a questão moral, entendida A questão
tende a transformar-se em uma representação fictícia e a deixar como efetivo respeito à dignidade da vida de cada homem e, moral
que poucos os mais fortes e organizados decidam por todos. portanto, como superioridade deste valor em relação a qual.
Com o advento da lei do mais forte, é inevitável que direito e quer razão política da organização da vida em comum, seja
Justiça estejam em crise. . _. reposta ao centro do debate na doutrina e no Foro, como única
Estas observações podenam parecer fora de pr~poslto ap~- indicação idõnea a impedir a vitória de um direito sem justiça.
nas a quem ainda quisesse separar as fontes no~ativ~ formaI.s AJustiça está derrotada quando a sociedade tende a se conso-
daquelas substanciais, quando, na ve~dade, as pn~eIras s~ o~- lidar no desvalor dos particularismos individuais ou dos grupos,
'1,
ginam e sejustificam nas segun~as ~ sao, portanto, ms~p~ravels; na recomendação desvirtuada, no interesse a lucrar sempre,
ou a quem quisesse separar o dIreIto da cultura, ~ t~C~ICasda mesmo que seja sob forma de propina; quando tende a extor-
ideologia, a responsabilidade dos operadores do direIto daque- quiF ou, o que é ainda pior, quando é obrigada a utilizar formas
la do legislador, a responsabilidade dos cidadãos daquela dos ilícitas para obter o que lhe compete; quando tende a se con-
o Direito políticos. É importante lembt.;ar que d.as ~eis chAeg;a-seà no~a solidar no sistema de repartição e do loteamento entre grupos,
é cultura e ao direito com uma operaçao que nao e mecamca, mas, SIm, dos empregos nos bancos às cátedras universitárias, sem ne-
i, cultural, mediadora de interesses e de valores. Através dessa nhum respeito pelo mérito e pelas competências de cada um.
operação, a resposta da justiça do caso conc~eto assume u~ As épocas de decadência moral e civil são aquelas nas quais a
significado e o papel de uma parte do mOSaICOque, se nao justiça civil é a grande derrotada. E a esperança desaparece I
i
) I
< I
! I
I
I'
Capítulo segundo Fontes, técnicas, valores 25
24
somente se também a inteligência for completamente envolvida do e inadequado, das técnicas legislativas. O ordenamento,
no transformismo acrítico e de conveniência, perdendo o go.sto principalmente em alguns setores com maior mobilidade e, de
e a legitimação à contribuição crític~ ~ autocrítica. A cnse, um ponto de vista político, muito delicados e graves, apresen-
infelizmente, é tal e tão grave que se 111S111ua entr~ os compo- ta-secomo uma soma de textos, cada um acrescentado ao outro
nentes da justiça, especialmente advoga~os ~ magistrados;.tal com dificuldade, com sobreposição e reconsiderações muitas
e tão grave é, também, a crise da docenCla e d~ pesqUIsa, vezesimplícitas. A técnica da ab-rogação por incompatibilidade
p:
principalmente no setor das ciê.nciashun:anas ,e SOCIaIS. pou- torna-se aquela preferida e o seu abuso - que testemunha,
ca seriedade dedicada à própna formaçao e a de terceiros, a por vezes, uma falta de vontade de efetuar escolhas unívocas,
desenvoltura decadente que circunda todas as formas de re- outras, uma desenvolta desatenção para com a clareza dos
crutamento cada vez mais privilegiando o nepotismo, e a perda textos - provoca uma tal incerteza na individuação da norma-
de credibilidade das instituições contribuem à ineficiência, frus- tiva vigente que leva à superação da regra da ignorantia legis
trando toda e qualquer ilha fundada na de_dicaçã~. non excusat. Entram em crise o. princípio da legalidade e o
Responsabi- As intervenções modificativas propostas sao frequenteme~te Estado de Direito, com a conseqüente" perda de vitalidade"
lidade da de fachada: as refonnas não são sempre adequadas nas o~çoes do Estado moderno. .,.
doutrina
basilares e, quando o são, não são sustentad~ por ~elOs e Quanto à disciplina dos institutos do Direito Civil, ela sê
estruturas idôneas. Se o Direito é cultura, ele so podera vencer configura em grande parte descentralizada em relação ao CÓ-
quando, na sociedade, escola e justiça assumirem u.m papel digo. A própria centralidade de um corpo legislativoem relação
prioritário. Da derrota da ju~tiça d<.>E~tado ~o prohferar de: a outro, do código e das leis especiais, que à primeira vista
todas as formas, lícitas ou nao, de Jusuça pnvada, o passo e parece uma escolha técnica e aparentemente neutra, esconde
breve. A derrota da justiça poderá ser evitada somente ~etam- opções ideológicas tendentes a fragITIentar e a pulverizar a
bém a classe dos juristas souber estar à altura de uma 111cum- unidade do sistema, e a recompor, saudosamente, unidades
bência de base renovadora, nos métodos e nos conteúdos, mas, perdidas. A Constituição rígida assume a centralidade, corjI
sobretudo, no estilo, redescobrindo as razões de um comI?ro- função de garantia da unidade, como parâmetro de legitimí::
;;
misso. O poder da pesquisa e da f<.>nna~ão ,deve assu~l1r a dade e fonte de legitimação e de justificativa da própria ativi- ~
~j'
consciência de não ser socialmente 111fenoraquele da 111for- dade legislativa. I
mação. Também ojurista positivo é chamado a ocupar-se da ciência i,
da legislação, analisando e elaboràndo uma teoria da estrutura !
15. Técnicas legislativas e individuação da normativa. - Uma das argumentações legislativas,assumindo problemas de técni-
reflexão sobre a técnica legislativa e, sobretudo, sobre a sua ca, não apenas com o objetivo de contribuir para melhorar o
conveniência apresenta-se particularmente útil em ~m momen- texto de lei, mas, também, para aprofundar o funcionamento
to no qual, sob a premente" mudança e amadureClmen~o das da lei como sistema de comunicação. Um estudo da legislação,
necessidades individuais e sociais", acentuam-se a expenmen- portanto, como produto e atividade, como efeito e causa da
tação e a temporariedade das leis, o riuno crescente da cadu- mudança social. É' útil, mas não suficiente, meditar sobre a
cação delas. . . incógnita de como fazer as leis.
A má reda- O trabalho de reconstrução do sistema, mediante a mter- Toda questão jurídica apresenta-se sempre como o momento A i~terpre-
l
,í
ção das leis
ameaça a
pretação, faz-se sempre mais difícil por _c~usada ~ns~bilidade
e contraditoriedade das opções de pohuca do dIreito e pela
de conexão entre
.
o ordenamento, que é um dado, e a atividade na taçao ~rde-
as ,on-.
interpretativa, a qual, em função dos fatos concretos, tende a tes na uni-
Ii legalidade
do-se sempre, não possa ser construído tão-somente em função é, a relevância a ser atribuída à hipótese: se A então B. Mesmo
resolutiva do problema. Resulta, assim, reduzido às justas pro- neste aspecto, é possível distinguir o artigo da norma. Àsvezes,
porções, o aspecto da disposição topográfica da indicação le- a hipótese e a conseqüência não são previstas no mesmo artigo.
°gislativa (código ou lei orgânica), sendo mais importante indi- O art. 1.325 Cód. Civ. elenca os requisitos do contrato, sem
viduar, necessária e constantemente, as razões da sua" coexis- prever a conseqüência da falta de um deles. Será necessário
tência". O próprio caráter de generalidade atribuível a uma verificar toda a disciplina do contrato para individuá-la. O art.
disposição" não é devido à natureza formal do ato que a contém 1.418, ~ 2, Cód. Civ.estabelece que" a falta de um dos requisitos
e a dita" , mas é o resultado último da análise de cada normativa indicados no art. 1.325" produz a "nulidade do contrato". O
e de suas recíprocas contrib~ições. art. 1.325 prevê a hipótese, o art. 1.418 estabelece a conseqüên-
Do conjunto das posições evidenciadas se distingue um im- cia. A norma é dada pela síntese, pela correlação entre os dois
portante ponto de chegada: a necessidade ea possibilidade de artigos.
recriar um novo direito comum que saiba destacar-se dos in-
teresses de categorias e dos privilégios estatutários: basta pensar 17. Técnica das cláusulas gerais e sua historicidade. - Ao lado
nas leis "negociadas" ou na transformação em lei de normas da técnica de legislar com normas regulamentares (ou seja,
determinadas por grupos de pressão ou categorias sociais con- através de previsões específicas e circunstanciadas), coloca-se
sideradas, de qualquer modo, fortes (cfr. retro, ~ 13). a técnica das cláusulas gerais. Legislar por cláusulas gerais sig-
nifica deixar ao juiz, ao intérprete, uma maior possibilidade
16. Artigo e nmma. - O artigo é noção somente técnica, um de adaptar a norma às situações de fato. Tome-se, como exem-
modo de expor uma complexa normativa, por vezes em forma plo, as noções de ordem pública (art. 31 dispoprel., agora art.
extremamente concisa, outras, mais diferenciada. A noção de 16 lei n. 218 de 31 de maio de 1996 e art. 1.343 Cód. Civ.), de
artigo não coincide com a de norma jurídica. Cada artigo bom costume (arts. 1.343 e 2.035 Cód. Civ.), de solidariedade
apenas raramente encerra uma completa previsão normativa. (art. 2 Const.). A estas podem-se acrescentar, entre outras,
Todavia, um mesmo artigo pode também conter mais de uma aquelas de eqüidade, de diligência e de lealdade no adimple-
norma. O art. 1.471 Cód. Civ. (Proibições especiais de com- mento (arts. 1.176 e 1.175), de boa-fé no contrato (arts. 1.337,
prar), por exemplo, dispõe que não podem ser compradores: 1.336 e 1.375), previstas no Código.
"
,;1 " 1) os administradores dos bens do Estado, das prefeituras, das Tais expressões, numa visão global do ordenamento, assu-
L'I' províncias ou de outros entes públicos, em relação aos bens
confiados à sua guarda; 2) os empregadoS públicos, em relação
mem um significado diverso.
As cláusulas que no Código de 1942 eram inspiradas por Cláusulas
aos bens que são vendidos através de seu oficio; 3) aquele que uma ideologia produtivista e economicamente auto-suficiente gerais e
por lei ou por ato da autoridade pública administra bens de (autarcia) assumem um significado diverso se forem lidas e Const.
terceiros, em relação aos mesmos bens; 4) os mandatários, em aplicadas na lógica da solidariedade constitucional. O art. 2.087
relação aos bens que foram encarregados de vender, exceto o Cód. Civ.,por exemplo, prevê que" O empresário deve adotar,
disposto no art. 1.395". São previstos quatro diversas proibições no exercício da empresa, as medidas que, de acordo com a
de comprar ou de vender. O último parágrafo do artigo esta- particularidade do trabalho, a experiência e a técnica, são
belece: "Nos primeiros dois casos a compra é nula; nos outros necessárias para tutelar a integridade fisica e a personalidade
; , é anulável" . moral dos empregados". O art. 2.014 Cód. Civ. estabelece: "O
I
I
I, Norma re- A norma de tipo regulamentar ou casuístico prevê uma fat- empregado deve usar a diligência exigida pela natureza da
I gulamentar tispecie abstrata à qual confere uma certa relevância. A norma, prestação devida, pelo interesse da empresa e por aquele su-
geralmente, prevê uma hipótese e a relativa conseqüência, isto perior da produção nacional. Deve além disso observar na
I
28 Capítulo segundo Fontes, técnicas, valores 29
""
execução e na disciplina do trabalho, as disposições dadas pelo cerra em si, mas para indicar simplesmente o conjunto das
I
empresário e pelos seus colaboradores dos quais depende hie- regras <J,:e~stabele:em o uso d~ pala~ra correspondente. De
.: rarquicamente" . Se se interpretam estes dois artigos exclusiva- consequ.encIa: a) nao tem sentido dIscutir sobre definições
. mente na lógica do Código de 1942, diligência do empregador verdadeIras ou falsas, porque o termo de comparação não é
e diligência do empregado têm um significado diverso daquele um dado que objetivamente pode ser relevado; b) deve-se pro-
que se lhes deve atribuir não somente em presença de novas curar a coerência com a qual o legislador usa o termo definido
leis aprovadas sucessivamente (por exemplo, o chamado Esta- nos outros enunciados normativos ou a compatibilidade, em
tuto dos trabalhadores) e da contratação coletiva, mas também, geral, entre a definição do termo e a disciplina global do
e, sobretudo, à h.izdos prinçípios constitucionais; nos quais a instituto ao qual se refere; c) na hipótese de contradição entre
idéia forte é o respeito à pessoa e à sua dignidade (arts. 2 e a definição e outras normas, não se deve, necessariamente
41, 13 2, Const.). Assim, nas relações de trabalho deve-se consi- eliminar a primeira, já que em relação à coerência formal nã~
derar diligente aquele trabalhador que, para evitar um possível existe uma tal hierarquia.
j A definição legislativa não tem, por natureza, uma força Relevância
;{
perigo a um colega de trabalho ou a si mesmo, interrompe a
" cadeia de montagem. Numa lógica produtivista, este fato po- meramente indicativa ou explicativa, não vinculante para o normativa
., .
j~
deria ser considerado não diligente e, portanto, como justa intérprete. Embora com funções e fins diversos, é vinculante! direta)
(direta e in.
".!
J mas também, moral e psíquica -, o seu gesto pode ser consi- l~e atribui. As definições legislativas,portanto, mesmo'quando:
derado diligente na medida em que é orientado a evitar um dIretamente, não exprimem normas, têm sempre uma relevân-
grave perigo à vida, à saúde de um colega de trabalho ou à cia normativa, porque fazem parte de um contexto unitário
sua, pessoal. com os outros enunciados; eles também estão sujeitos a inter-
pretações e isso constitui um limite intrínseco de ordem se~,
Muito debatido, entre as questões
18. Definições legislativas. - mântica. .. - \l
de técnica legislativa,é o valor das definições~Quando uma lei O recurso às definições é, em muitas hipóteses, insubstituível
dita definições para tennos utilizados na mesma lei, ou em e, quase sempre, útil porque contribui a reduzir as margens
outras fontes, pergunta-se se a definição é, como as outras de discricionariedade interpretativa.
normas, vinculante para o intérprete. O ensino tradicional ?s contratos nominados, por exemplo, são definidos pelo
contestava, com poucas exceções, que o legislador pudesse legislador segundo uma técnica per gcnus et differentiam: o nome
inserir definições de qualquer tipo nos textos de lei, admitindo do contrato representa o definicndum enquanto que o definiens
que da sua esfera de competência fosse subtraída a atividade é a palavra contrato - noção, por sua vez, circunscrita pelo
de interpretação e de sistematização do direito, reservada ex- art. 1.321 Cód. Civ. - juntamente com as características que
clusivamente à doutrina. As definições, em tal perspectiva, ou o diferenciam de todos os outros. Vejam-se, por exemplo, as
são supérfluas ou podem levar a um engano, e, se em contraste definições de venda (art. 1.470 Cód. Civ.), de troca (art. 1.552
com a disciplina estabelecida pelas n()rmaspropriamente ditas, Cód. Civ.), de contrato estimatório (art. 1.556 Cód. Civ.), de
não devem ser observadas porque não vinculantes para o in- fornecimento (art. 1.559 Cód. Civ.) e assim por diante. Em
térprete. particular, o art. 1.470, com o nome de venda, indica aquele
A defini- contrato que tem por objeto a transferên.cia da propriedade
ção fixa as As definições, contudo, são, não somente oportunas, mas
regras de necessárias, e não só para exprimir, em conformidade com a de uma coisa ou a transferência de um outro direito contra o
uso de um lógica aristotélica, o real conteúdo que a palavra definida en- correspectivo de um. preço. Visto o convencionalismo da lin-
termo
Capítulo segundo Fontes, técnicas, valores 31
30
A lingua- guagem, Olegislador poderia ter chamado com um outro nome normativo, é,~usta~ent~, ? único ponto de apoio seguro (ainda
gem vive afiattispeciecontratual ou atribuir o nome de venda a um outro que ele
~ tambem
. seja elasuco e relativo) ' ao qual se po d e .Lazer
c:
na expe- al referencIa para.,. determinar o que é o valor . QuanomaISO t .
riência contrato. Não se trata, todavia, de um abstrato jogo form ista
Já que a opção lingüística está ligada a concretos setores da ordenamento JundIco. se identifica ou tende a se I'd en tI'ficar
experiência jurídica e social: chamar "x" à compra e venda com_ aquele social," político ' econômico , tanto m'aIS a I'd en u'fi-
provocaria o risco de incompreensões e criaria obstáculos às caça0 do valor fundado no critério normativo ser' J:
'd d J:' a con.Lorme
a re alI a , e e.Leuva.Quanto
. mais o dado norm"au'vo souber se
trocas.
adequar a realldade.social, tanto mais a realidade se ap
, d £; ~ resen-
19. Noção de "valor": acenos .•- Várias vezes foi usada a noção ~ra . e orma homogenea, e unitária. ~sso,tal~ez,não aconteça
de "valor". Encontrar um critério de identificação adequado J,ama~s,por c~usa d~ continua evoluçao do direito em relação
a tal noção apresenta extrema dificuldade. Os diversos critérios, a socIedade. E preCISO,de todo modo, ter consciência e esco-
que se encontram mais em sede de especulações de regula- lher, pelod menos - como linha de tendência " a conti'nua cons-
mentações singulares e menos como realidade efetiva, são uni- tant: a e9u~ç~0 da realidade social e econômico-política à
laterais. O valor é unitário, os seus aspecto~ são múltiplos: realIdade JundIca e vice-versa.
políticos,' sociológicos, filosóficos, jurídicos. E necessário ter Os valore~ aos quais se deve fazer referência na difícil obra
consciência da unidade da noção. O valor identificado com de construçao, de destruição e de reconstrução do sistema são
portanto, aqueles jurídicos. '
metodologia unilateral (exclusivamente sociológica, ou, exclu-
sivamente política, etc.) representa somente um de seus as- Desde as 0z:igens, o direito nasce como síntese e equilíbrio Síntese de
entre valores Impostos e valores livremente escolhidos. Estes valores im-
pectos.
O valor se torna o resultado, não de um único critério (aque- pOd:m ser individuados ~o momento em que os particulares postos e va-
lores esco-
le da racionalidade ou aquele social ou político ou econômico), preveem a regu~amentaçao das relações, em adesão às opções lhidos
mas de um critério sincrético, devido a tantos aspectos, todos de fundo da SOCIedade.O equilíbrio entre valores espontanea-
~ente criados na atividade de todos os dias e valores impostos
eles concorrentes.
Fora desta solução problemática, existe somente um critério e o problema de base do ordenamento, .
Normativi-
dade do va- ao qual ojurista pode e deve fazer referência: o dado normativo,
lor expressão e síntese da multiplicidade dos critérios que tendem 20. Jurisjmu1ência dos interesses e dos valores. - À noção de Interesse
~or, por vezes, se flanqueia e, mais freqüentemente, contra- su~je?vo e
a individuar o valor.
Somente a norma, como expressão de um sistema que possa, poe-se aque~a~e "interesse" . Por interesse entende-se a relação objetIvo
efetivamente, ser definido como vinculante, se apresenta, na entre um SUJ~I~O e um bem (interesse em sentido subjetivo: em
confusão de perspectivas unilaterais e parciais, como critério algum~ ~c~lOes falou-se de interesse como transposição, no
que tende a uniformizar a realidade. Quando se fala de norma, pl,anoJundico, _da necessidade e do desejo advertido pelo su-
faz-sereferência àquela interpretada, vivente, expressão do pro- J~ltO), C~ntrapoe-se a esta uma concepção objetiva (ou norma-
cesso cultural do qual nasceu e sobre o qual é destinada a uva~ de mteresse, como "exigência de bens ou valores para
incidir. Singular é o seu destino: ela exprime uma realidade re~lzar ou proteger", graduados hierarquicamente, em uma
historicamente passada e é chamada, ao contrário, a intervir SOCIedadee em um ordenamento historicamente determinado
(cfr, retro, ~ 8).
em uma realidade presente, às vezes muito diversa daquela
originária. , A anál~sedos int~resses tem historicamente conferido grande "Interesse"
Dialética Este contínuo processo de adequação da norma ao fato e ~mpulso a ren?va~ao dos estudos jurídicos, A revalorização do e ciência
entre fato do fato à norma, fundado em grande parte no respeito ao dado mteresse nos msututos e nas situações subjetivas constitui a do Direito
e norma
:;" i
-"~:7~~~~
, ,
,
mico, como asp,e'étoda realidade social organizada, não é eli-; 'i. ~I'.
'1.3
l(j'.:: '
I !,
I~l:.'
I~'
patrim~niais àquelas existenciais,~recOnhecendo' a estas últi-
mas, em atuação dos princípios constitucionais, umaindiscu-
tida preeminência. Mesmo interesses materiais e suscetíveis de
avaliação patrimonial, como instrUmentos de cOÍlcre,~zaçãode
uma vida digna, do pleno desenvolvimento dapessóa e da
induz a repelir a afirmação - tendente conservar o caráter
estático-qualitativo do ordenaInento - pela qual não pode s~r
"radicalmente alterada a natureza dos institutos patrimoniais
do direito privadp". Estes não são imutáveis: por yezes ,são
atropelados pela sua incompatibilidade com os princípios cons-
a
,
~
41
..
:~
,
possibilidade de libertar-se das necessidades (Iibertà daI bisogno) , titucionais, outras vezes são exaustorados ou integrados pela :1
:~I
.1'
assumem o'papel de valores. O instrumento do ressarcimento
dos 'danos e da responsabilidade civil, embota adaptado, às
legislação especial e comunitária:; são sempre, porém, inclina-
dos a adequar-se aos novos "valores", na passagem de uma
.~
exigênciaS da vida moderna, demonstra-se, freqüentemente, jurisprudência civil dos interesses patrimoniais a uma mais
~
11, inidôneo. A jurisprudência dos valores tem necessidade de atenta aos valores exis,tenciais. E~tes não podem mais ser con-
finados aprioristicamente no papel de limites ou de finalidades
.1
t.;' ; afinar as .técnicas da prevenção do ,dano, da execução especí- ~
Ij fica, da restituição in integro e de ter à disposição uma legislação exteriores, como se não fossem idôneos a incidir sobre a função
,k de.seguros obrigatória e de prevenção social: Alargam-se, nesse do instituto e portanto sobre a sua natureza.
34 Capítulo segundo
Art. 2
22. Personalismo e solidarismo constitucional - Nos conceitos Const.
de "direitos invioláveis do homem" , de "pessoa", de "deveres
inderrogáveis de solidariedade", aos quais o art. 2 Consto faz
referência, verifica-se a influência do personalismo e do soli-
darismo de tipo católico e, em tal perspectiva, tenta-se recons-
truir o conceito de "pessoa", ou melhor, de "valor" da pessoa.
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ii. -:-:'-:::"~.' •...••'.'.'
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36 Capítulo terceim Princípios
...•.~
. ,.- "1"'~.
, -:Nopersonalism<,ycorifhi'em: ãsideológiaSque,'d~pois d~~e- rísmo: Esta cessaria de constituir um m~m~nto devida demo-
gunda GU,erraMundial,.en.contI:am um' corripror~llssopohtlc? crática e representaria uma eficiência organizadora na gestão
nos princípios fundamentaIs das novas democraCias OCIdentais e na produçã?.: !::lis,f8,pnas,desolidariedade,'erÍ1bora~pfeserítes"
e, em. parte, daquelas' orientais: o esr.i,Ijtl,;l!ilismocpstão,,,com . êin'irúiitâS :riô rrnas ordinárias, não dizem respeito à solidarie-
~eias modenjas"e"Sôe;iãiS7qlrc'1êm dado vida ao .cristi~nismo dad.e con'stitucional, pel~!ial_ ap-àr~ciRaç-ªº~ºas .P~~~
social modemo; o ,existencialismo; o'marxismo,- recusado na gestão das 'forínaçõess~ciai.sJjj,O'deve djr.i.gil3.~_:aoeficientis-
'sua.integrálidade pelo peisonalismo;,mas ap~eciado pela sua lno.:...d~stas-últimas,JIl~'aQ...p1eno.desenvolVimento_<i(u~essoa.
substância .humanista de l~beração social. O tema da solidariedade constitucional; portanto, de;;--ser
Plurnlida- O solidarismo é suscetível de diversas interpretações e isso ént~ndido em rdaçã~LaÓsda ig!:!aldade e da i~al <i,ignida9-e
dedeacep-evidencia aoportu'nidáde,ae verificar a sua relevância e o seu SOCIal-. ,,'
çõesdoso- valor no âmbito' do sistema constitucional italiano.
lidarismo "Solidariedade" p6êie' significar solidariedade para fins <,io 23, 19ualdignidàde social (pari dignità' sociale). - Os princí-
Estado,",ou para um bén individu~l 'escol~ido pel()s cidadãos pios dàsólidariedadee da igualdade sãoinst~mentos e resul-
de rriododemoc;rático,'ou, imposto 'de':forma al1Í:.oritária.O tados dã'atuação 'da dignidade social do cidadãO'. ~
solidarismo funcionaliiado à manutençãóe 'à ,conservação do Uma das interpretações m~s ava1't-çadãsé'aquela que define
Estado. é,típic~dos ES~cl6s autoiÚáriose não' corre~ponde a noç~ode igual dignidade social como o instrumentoqu~
àquele constitucional, voltado à atuô,ção.do desenvolVimento "confere aIcada um o direIto ao 'respeito' inereriteà qualidad~
da pessoa~" ,, . . de homem,. assim',como a pretensão de ser colocado em.cOl;i
Promoção Pode-se falar de solidariedade em relação a comunidades dições idôneas a exercer as próprias aptidões pessoais, assu-
dapessoa,intermédias, dos membros da família,em relação à família, dos mi~<,ioaposição a estas corresporidentes". Um exemplo pod~
não-subor-
dinação ao sócios em relação à sociedade, de um associado em relação à ser encontrado no art. 4, ~ 2, Consto a propósito da escolha dQ
grupo associação, de uma comunidade em relação à comunidade mais trabalho de acordo com as próprias inclinações e os próprib!
ampla da qual faz parte. A solidariedade com os fins de ca?a desejos: Não pode existir igual dignidade social en~re os cidõ:~
comunidade específica podeconcemir o grupo menor e m-'. dãos quando existe quem tem a possibilidade de escolher õ
tennédio em relação ao maior; como o Estado, ou exaurir-se trabalho de acordo com a própria vocação e quem, ao contrá-
nó âmbito do grupo intermédio 'C"omprejuízo de pessoas que rio, não se ,encontra nas mesmas condições. . .
~ão fazem parte d(':le.Ela púdesignificar correlação, frate~ni- ~De ,,:cordo com a interpretação mais restrita, a igual digni- "Dignida-
dade entre os membros da mesma comunidade, mas, tarnbem, dadê sócial impõe ao Estado agir contra as situações econômi- de"como
posição egoísta.em relação a,quem não' faz parte dela ou a cas, cul~urais e morais mais degradantes e que tomam os su- libertação (
quem é membro de umàcomúnidade concorren,te. Esta forma jeitos indignos do tratamento social reservado.à generalidade.
de solidariedade com os objetivos da comunidade não é aquela A valoração em negativo da.igual dignidade 'social significaria
à qual faz referência o Texto Constitucional, ~ue supera o m~to apenas que a posição de uns não deve ser degradante em
do fim superindividual, não concebendo um mteresse supenor relação àquela de outros. Desse modo, não se atua a dignidade
àquele do pleno desenvolvimento do homem. Este último cons- soci~l e muito menos a igual dignidade social. Pode existir uma
titui princípio fundamental de ordem pública: ." . situação social nãó degradante que não é digna socialmente,
Com base no fundamento do princípio solidarista, tentou-se porque a noção de dignidade social não é absoluta, mas relativa
superar a economia fundada na divisão do trabalho e na livre ao contexto histórico, cultural, político e econômico de uma
concorrênGÍa, centrando a atenção nas associaçõescooperativas comunidade. Se se postula que numa mesma comunidade de-
de consumo: assim, criou-se a auto gestão como base do solida- vem existir pessoas que têm uma maior dignidade social do
38 Capítulo terceiro Princípios 39
que outras, não se atua a dignidade social e muito menos_a nida~e ~omente_à ~i~e?são socioló~ca, dado que ela tem
igual dignidade social, q;ue tem como objetivo a superaçao relevanCla tambem JundICa. A ConstItuição italiana, de fato,
desta estática contraposição. . tem a característica de dar grande realce às comunidades in-
A Corte Constitucional afirmou que a igual dignidade social term~dias, com o fi~ de integrar a personalidade do sujeito
significa que "deve ser reconhecido a ':.odocidadão ~gual.dig- atraves do grupo SOCIal(art. 2). O homem realiza-se em todos
nidade mesmo na variedade das ocupaçoes ou profissoes, ronda os grupos comunitários nos quais atua (família, escola, fábrica,
que ligadas a diferentes condições sociais; ~orque toda ativida- sindicato, partido, exército), cada um dos quais deve ser con-
de lícita é manifestação da pessoa humana, mdependentemen- siderado à luz do objetivo geral ditado pelos arts. 2 e 3, ~ 2,
te do fim ao qual tende e .das modalidades. com as ~~ai~ se Const.. Sob esta ótica, o pluralismo dos meios não significa
realiza". Na decisão pode-se verificar a tentatlva de mmlmlzar pluralIsmo dos fins: as sociedades intermédias têm como fim Fim especí-
a relevância da norma que estabelece a igual dignidade social, efetivo, na ordem constitucional, a realização' do art. 2 e do fico (políti-
ca, cultu-
não obstante seja proposta uma interpretação inovadora em art. 3. Todavia, não se pode contestar a existência de fins ra) e geral
relação à jurisprudência precedente. A igual dignidade social específicos ao pluralismo dos meios e, de conseqüência, ao (a pessoa)
não se refere somente às profissões ou às atividades que se pluralismo da sociedade e das comunidades intermédias. Tam-
exercem. Por estes motivos, não pode ser partilhada nem mes- bém o fim específico tem um limite, um conteúdo e uma função
mo a interpretação que identificou a dignidade com a estima em relação aos arts. 2 e 3 Const., nos quais, estritamente, se
no ambiente social, acrescentando nas entrelinhas que essa funda o sistema constitucional.
estima não é igual para todos (como dizer que a dignidade
social não pode ser igual para todos). 25. Pluralismo das formações sociais e o problema de sua avaliação.
- Não se pode estabelecer uma paridade de valoração entre
24. Pessoa e formação sociaL - É necessário tomar poslçao pessoa e formação social, atribuindo a esta última um valor em
Direitos in-
dividuais so- contra a concepção que considera o indivíduo como valor si; a formação social tem valor constitucional somente se aten-
ciais pré-social, relevante também na ótica jurídica, pr~scindindo der à função do livre desenvolvimento da pessoa. Por conse-
da relação com os outros. Desse modo, acentua-se o Isolamento guinte, entre as formações sociais é obrigatório estabelecer uma
do indivíduo e dos seus problemas daqueles da sociedade na graduação. Não é legítimo colocar no mesmo plano sindicato,
qual vive, inspirando-se em uma visão individualista não. com- partido, cooperativa, família. O enfoque contrastaria com o
patível com o sistema constitucional. A tutela da personalIdade Texto Constitucional porque colocaria no mesmo nível situa-
não é orientada apenas aos direitos individuais pertencentes ções patrimoniais, ou melhor, atividades patrimoniais, e afetos,
ao sujeito no seu precípuo e exclusivo interesse, mas, sim, .aos comunhões de vida e funções existenciais. Entre as diversas
direitos individuais sociais, que têm uma forte carga de solIda- formações sociais existe uma grande diversidade de funções,
riedade, que constitui o seu pressuposto e também o seu fun- de modo que resulta ambíguo expor de forma unitária o pro-
damento. Eles não devem mais ser entendidos como perten- blema de seu controle. Este deve ser exercido de acordo com
centes ao indivíduo fora da comunidade na qual vive, mas, a sua específica função sócio-econômica, valorada constitucio-
I
1\ antes, como instrumentos para construir uma comunidade, nalmente, e deve ser atuado, prioritariamente, em relação à
'I A comuni- que se torna, assim, o meio para a sua realização. Ao conceber tutela da pessoa, de seus direitos inalienáveis e fundamentais.
!r dade em a comunidade em função do homem, e não ao contrário, é As formações sociais, mesmo quando se colocam em planos
, ,I
, I função do
homem possível encontrar, mesmo ao nível constitucional, uma hierar- diferentes, têm autonomia e capacidade de auto-regulamenta-
,1
"
quia de valores e de interesses que as comunidades se propõem ção, mas sempre no âmbito do ordenamento no qual são des-
a alcançar e realizar. Não se pode restringir o valor da comu- tinadas a ter precípua relevância. Homologar, aprovar, contro-
: ~ ;
I,
I' ,
I;
Capítulo terceiro Princípios 41
40
Dignidade lar atos e atividades de uma formação social, significa garantir, trutura mestra da vida do país. A esse fim, ele deve ser organi-
do associa- no seio da comunidade, Q respeito à dignidade das pessoas q.ue zado no respeito aos princípios democráticos, porque não é
do
dela fazem parte, de maneira que se possa consentir a efetlva possível ~o~lsider.á-Ioinstrumento necessário e indispensável,
participação às suas vicissitudes. talvez o umco, para a realização da República, se no seu seio
A liberdade de cada um deve ser compatível com o valor de não for respeitado o valor que deveria atuar.
Liberdade
tutela da pessoa, com a qual .qualquer .lib~r~ade é obrigada a A "demoeraticità" em função da participação e promoção da Democra-
e solidarie-
dade se medir- de outro modo, a lIberdade mdIVIdual torna-se pre- pessoa (art. 2 Const.) caracteriza, portanto, o ordenamento cia como
participa-
potência' com os" meno~es em sentid~ amplo" ~ arrogância constitucional italiano (art. 1, ~ 1, Const.). ção
contra pessoas não-orgal11z~das;afirmaçao .que nao pretende, O sistema representativo, os institutos que prevêem a parti-
minimamente, ofender o pluralismo que, Justamente, no res- cipação direta dó povo, o referendum (art. 75 ss. Const.), con-
peito à minoria afunda as raízes históricas e ideais. firmam que a "demoeraticità" é princípio de ordem pública. A
participação no setor da representação pública releva, também,
26. Princípio de "democraticità" . - O princípio de " ~erno.cr:a- em sede de interpretação das normas constitucionais relativas
ticità" ,.entendido no sentido de conformidade . com o pnnCIplO a comunidades diversas daquela estatal: as comunidades,ãs
de democracia, envolve a valoração de mUltos contratos asso- formas de associação, da família ao Estado, são condicionadiis
ciativos típicos. Ele tem relevância também em algumas asso- pelo prinCípio fundamental de " demoeraticità" , que, ao mesmq
ciações e formações sociais previstas, expressame~te, na. ~ons- tempo, caracteriza e justifica a tendência a reunir-se em assõ::
tituição. Pelo art. 8, por exemplo, todas as confissoes rehgI<:>sas ciações.
são igualmente livres perante a lei; para,o. ~ 2 ~o m~s~o artlgo,
as confissões religiosas diversas da catolIca tem dIreIto de ~e
27. Princípio da divisão de poderes. - Os Poderes Legislativo,
organizar de acordo com os próprios estatutos, ~esde que nao
judiciário e Executivo, no início só formalmente distintos -...:...
contrastem com o ordenamento italiano, espeCIalmente com
dado que eram representados por sujeitos escolhidos pela pes-
o princípio de "demoeraticità" (art. 1 Const.). Natur~lmen~e,
além da associação religiosa devem ser levadas em conslde~açao soa na qual se identificava o Estado absoluto (o rei, o príncipe
também as outras formas associativas, como a comumdade e assim por diante) -, foram, posteriormente, distintos tani-
bém substancialmente.
escolástica, a família, em relação à qual o art. 29 r:corre ~u?:
tancialmente ao princípio de " demoeraticità" . A úmca pOSSIbIlI- Ainda na vigência do Código de 1942, a Magistratura de- Poder ciário
Judi-
dade de efetivação da democracia na sociedade bilateral é o pendia do Poder Executivo e, de fato, estava sob o controle do
Ademocra-
cia no inte- respeito recíproco, a igualdade_moral .e)urídica. O pri~cípio Ministro dajustiça. Com a Constituição, a Magistratura se torna
rior dos democrático revoluciona a noçao tradICIonal de comumdade autônoma e é administrada por um Conselho Superior forma-
grupos
familiar: tome-se,. como exemplo, o pátrio poder. Entra em do, predominantemente, por magistrados eleitos e por profes-
crise toda forma de hierarquia autoritária nas comunidades sores e advogados nomeados pelo Parlamento (art. 104); o
intermédias: o sindicato (art. 39 Const.) e o partido político magistrado toma'-se inamovível (art. 107).
(art. 49 Const.), para Obterem o reconheci~~nto do ordena- Ao lado do Poder judiciário coloca-se aquele Legislativo, Poder Le-
mento devem ter um fundamento democratlco; as forças ar- independente do Executivo e expressão da soberania popular gislativo
madas' (art. 52 Const.) devem "se coadunar" com o espírito (art. 1, ~ 2, Const.), na medida em que é eleito com voto
da República. . _ estendido a todos. O povo pode participar diretamente ao
O partido, em particular, é. in~trumento ~e rea~Izaçao de- Poder Legislativo propondo iniciativas, entre as quais o referen-
mocrática de relevância conStltUClOnal.Ele e o veIculo, a es- dum ab-rogativo (art. 138, ~~ 2 e 3, Const.). Desse modo, o
I1
U:I:
Capítulo terceiro Princípios 43
42
Poder Legislativo, ainda que formalmente idêntico, é substan- O princípio de legalidade "social" não é caracterizado por
cialmente exercido por sujtitos políticos diversos. uma escolha monística, nem por uma declarada instrumenta-
O Estado moderno exige que o Poder Legislativo seja exer- lização a um fim político. O princípio de legalidade de um
ódo com uma técnica que não se exprima somente por cláu- Estado de polícia, "guardião da história" , garante as situações
sulas gerais (cfr. retro, capo 2, ~ 17), mas, também, com inter- adquiridas, não aquelas a serem adquiridas. O princípio de
venções precisas, de tipo regulamentar. Se assim não fosse, o legalidade social é característico do Estado que coloca como
Poder Judiciário poderia decidir arbitrariamente o caso con- seu fundamento um compromisso de intervenção, de progra-
creto, de acordo com opções subjetivas. O princípio de legali- mação e de controle em campo econômico e social. Um exem-
dade, isto é, o princípio do respeito às normas de uma socie- plo é oferecido pela Constituição (em particular, arts. 1, 2, 3,
dade que se transforma em relação às decisões tomadas pelo ~ 2, e 41, ~ 3) que atribui ao princípio de legalidade um
povo (art. 1, ~ 2, Const.), não encontraria atuação; a sorte do significado inovador relativamente ao tradicional. As situações
País estaria exclusivamente nas mãos do juiz, que, além de subjetivas assumem novos conteúdos e o princípio de igualdade
tudo, não é eleito, mas é vencedor de um concurso por exames. perante a lei transforma-se naquele de igualdade substancial
(cfr. infra, ~ 33).
o juiz é su-
jeito 50men- 28. Princípio de legalidade e sua diversa junção histórico-política.
te à lei - Se o juiz tivesse a possibilidade de julgar o caso concreto 29. Princípio de legalidade, relativização do juízo e precedentes
de acordo com a própria visão de mundo, subtraindo-se ao i jurisprudenciais. - A noção de legalidade é essencial e relativa
respeito ao Parlamento e ao Executivo, não existiria motivo_~ ao sistema. No ordenamento italiano, o juiz é vinculado à
para o primeiro, de fazer as leis, para o segundo, de emanar! - norma e não à sua letra. A dificuldade está na individuação da
regulamentos ou outras disposições com força de lei. O juiz é, normativa do caso concreto. O juiz, ao julgar um caso, deve Adequação
m=
sim, autônomo em relação ao Poder Executivo, mas é subme- Ievar em conta tod as as possíveis circunstâncias de fato que o concreto
tido, ainda que tão-somente, à lei (art. 101 Const.). O princípio caracterizam - a situação, mesmo econômica, dos sujeitos, a
de legalidade assume uma conotação própria no sistema. sua formação cultural, o ambiente no qual atuam -, dando-Ihe
Legalidade
A comparação e a história revelam o quanto a análise do a resposta conforme o ordenamento visto em uma perspectiva
como fideli. princípio de legalidade pode ser particularmente instrutiva. unitária. Sobre as modalidades da atividade do juiz, existe um
dade ao or- Provavelmente, nunca existiu um princípio de legalidade sem amplo debate entre as forças chamadas progressistas e aquelas
denamento
adjetivos; ele é funcionalmente ligado aos valores do ordena- chamadas conservadoras. No Direito Penal, o juiz, ao decidir
mento e deve ser valorado de acordo com um juízo de con- um "fato", deve levar em consideração, mesmo para fins de
gruidade e de adequação às opções de base, mesmo institucio- avaliação da pena (art. 133 Cód. Pen.), a formação cultural do
nais, do sistema jurídico ao qual pertence. sujeito, que pode ser justificativa de uma agravante (art. 61
O mesmo princípio assume conteúdo diverso se colocado Cód. Pen.), ou de uma atenuante (arts. 62 e 62 bis Cód. Pen.) ,
como garantia de valores diferentes. ou as condições particulares nas quais o ato foi cometido, as
No ordenamento italiano convivem duas diferentes noções condições de saúde, também mental, do acusado. O juiz penal
do princípio de legalidade: a decorrente do sistema dos códigos relativiza o juízo. Mesmo que a norma preveja uma pena para
e a derivada da Constituição. Para tentar explicar as razões o executor de um determinado ato, a mesma norma ou outras
dessa dupla concepção de legalidade - que daria a impressão prevêem para quem executa aquele ato, ou se encontra em
de imposição de uma escolha -, é necessário referir-se às certas condições, ou é um determinado tipo de sujeito, etc.,
recentes experiências que se concluíram, tragicamente, com a uma pena menor ou, em algumas hipóteses, a ausência de
Segunda Guerra Mundial. culpa ef ou de antijuridicidade. Este tipo de relativização pode
I
I
44 Capítulo terceiro
Princípios 45
i
I
uma "supemorma" , autônoma e completa com base na qual
; na e a efetiva participação de todos os' trabalhadores na or~- julgar a relevância e o conteúdo das outras e na qual se inspirar
J I
nização política, econõmica e social do País". A.intewretaçao
dada geralmente a este último parágrafo expnme, de modo
para a justiça do caso concreto.
Princípios 47
46 Capítulo terceiro
128, ~ 1, 177, ~ 1, 189, ~ 3, lei de falências). Essasopiniões não meira exprimiria um valor típico (e exclusivo) d . d d
II.bera l-democratIc.a;
-. a SOCIea e
impedem que o art. 3 possa ter utilidade para a individuação a segunda , um valor contestad or da SOCIe- .
de hipóteses que não merecem tratamentos diferenciados. To- dade .burguesa que .. encerra, em particular , uma mat .
nz marxIS-.
davia, a igualdade não se exaure na paridade de tratamento. ta. A Igualdade dIta formal, que teve o seu berço no I.lu . .
A - I .. mInIsmo
frances, e, 10Je, um patnmônio comum das sociedad ..
As disparidades de condições econômicas e sociais podem, ou .. A es CIVIS,
A desigual-
melhor, devem, ser tratadas de forma diversa, isto é, sem pari- em bora seja mgenuo _ pensar
. que a sua tradução em norma
dade nega
a paridade dade. A paridade de tratamento justifica-se, sempre, com fun- possa parecer s,!perflua; e IstOporque em parte ainda deve ser
damento na lógica da justiça retributiva e da par condicio, en- atua~a, e tambem porque sempre corre perigo a cada período
quanto que a igualdade cçmstitucional tende a realizar a igual de cnse de valor d~ home~. A exigência de justiça social (art.
I'
dignidade social, removendo os obstáculos que limitam a liber- 3~~ 2, no q~al m~Is p:o~namente se concretiza a igualdade
dade dos cidadãos, de maneira a realizar a justiça social e dIta substanCIal) nao so nao constitui uma renegação do siste-
ma, .mas, antes, assume o valor de uma escolha histórica e
distributiva.
Igualdade e solidariedade (art. 2 Const.) são aspectos de um pem:an~nt~, c~mo patrimônio cultural comum de largas con-
mesmo valor que o legislador se propõe atuar: o pleno e livre v~r?en.cI:rsI?eaIS e como instrumento de eliminação de privi-
desenvolvimento da pessoa. le~os lIyustIfica~os de ~ualquer natureza, não apenas econô-
A paridade de tratamento exaure-se no princípio retributivo. ~1Ca:A afi~~çao co~tIda no parágrafo 2 do art. 3, portanto, Nexo entre
O princípio de igualdade supera a posição formal da paridade nao e antagon~ca relativamente àquela contida no parágrafo 1 oart.3eo
a
para realizar igualdade substancial: quando existe desigual- d~ mesmo artIgo: uma e outra são expressões completas da art. 2
Const.
dade de fato, não existe espaço para o princípio da paridade claus~la geral ?e .tutela da pessoa (art. 2), da centralidade do
respeIto dos dIreItos. fundamentais no ordenamento republi-
de tratamento.
O princípio de paridade de tratamento pressupõe a paridade c~no e~~or conse~mte, da funcionalização das situações pa-
de condições e regras rígidas que se inspiram em critérios t~~omaIs - propnedade e empresa - às situações existen-
precisos, os quais podem ser somente patrimoniais, somente CIaiS.No o~denamento constitucional, todavia, propriedade e
pessoais, ou de natureza mista. Segundo uma elaboração, de- emp:esa p~vada, em todas as suas configurações, exercem uma
fronte de condições pàritárias deve reservar-se um tratamento funçao maiSgeral: garantir a liberdade de iniciativa, individual
paritário, e a partir daí se argumenta que o princípio de pari- ?u de grupo, frente a qualquer tentativa de absolutismo estatal,
dade pode ser aplicado mesmo num ordenamento que não m:ompa~vel com o respeito a~ livre desenvolvimento da pessoa
prevê o princípio de igualdade, como demonstra o ordena- e as suas lIberdades de expressa0 e de associação, mesmo quan-
,;; ,
mento civilístico de 1942. Na hipótese de contraste entre o do se. traduzem em uma atividade civil de dissenso e de con-
princípio de igualdade, presente ao nível constitucional, e o ~estaç.a~.N~s~ ótic~,. ~sume um significado fundamental a
princípio de paridade de tratamento, presente ao nível de ~artICIpa~ao nas ~CIssItudesda organização política, t;conô-
legislação ordinária, prevalece o primeiro: o princípio de pa- mIca e SOCIaldo paIS, no livrejogo de maiorias e minorias de
ridade de tratámento encontra-se em uma situação de subor- govern?e de oposições, com "plena capacidade e autono~ia
de decIsao" .
dinação relativamente ao outro.
32. Pretenso antagonisrrw entre ig;ualdade formal e suhstanciaL - 33. !./JUaldade na justiça sociaL - Resulta confirmada a inter-
Pode-se criticar, do mesmo modo, a orientação que pretende pretaçao do art. 3 como necessariamente unitária: um e outro
manter distintas, quer pela diversidade de matriz cultural, quer pará~o estão em função recíproca, e ambos ditam uma única
pelo alcance normativo, as duas proposições do art. 3. A pri- normatIva, aquela da igualdade na justiça social, como teste-
Capítulo terceiro Princípios 49
48
Qualquer munha de uma filosofia de vida orientada a impedir que' pos~a fiscal, a intervenções ocasionais em esporádicas e individuais
tratamento existir igualdade semjustiça social e vice-versa.Deve,~se~xc!u.Ir relações entre cidadãos e entre o mesmo cidadão e o Estado
diversifica- quando age iure pfivatorum.
do deve
que com o art. 3 se tenha querido estabelecer um pnnClplO
ser justifica' de igualdade em sentido absoluto" , ao mesmo tempo em que
. -p. de' / idade .. de . ,
do se deve afirmar que as razões de distinção, ou mais exatame~te, . . P. nncz zo 19ua
, 34 e ~ns~ztutos, direito civil - E neces-
de exceção à igualdade, devem ser" merecedoras de consIde- sano dIzer com clareza que nao e POSSIVel que a carga inovadora
ração", de acordo com o sistema constitucional globalmente contida no art/3, S 2 se realize em todo o seu alcance nas Interven-
considerado. Não se trata de identificar, em abstrato, critérios relações pnvadas. E isso, não porque tal norma não tenha ção do Esta-
do
ontológicos de "racionalidade" ou de "razoabilidade" da de- amplos espaços de correta utilização por parte do intérprete,
sigualdade nonnativa, mas de especificar, em rela~ã.oao ca~o mas porque ela postula que seja a República, em todas as suas
concreto, justificações que sejam tais segundo a 10lpc,ad.o SIS- articulações, a remover os obstáculos à efetiva igualdade. Isso
tema; a esta análise não pode ficar estranha a eXIgenClade não significa que o princípio de igualdade constitucional não
(s
A igualda- justiça social 2). Isso, por outro lado, não implica que toda
de não é justificativa de desigualdade de tratamento deva ter como ex-
um meroy- clusivo fundamento a ~inação de obstáculos de ordem eco-
possa ter relevância no direito civil, mas, antes, implica, sim-
plesmente, qu~ o .art. ?'. s
2 não pode sic e~simpticiter ser trans- '.
plantado no dIreIto CIVIlsem ser harmomzado e sem que se~/
I<~
\_,?'.'.te nômica e social limitativosda liberdade do homem, dado que t~me co~patível com o inteiro sistema normativo, segundo a! I""
/. ~,~ a individuação da ratio justificadora deve, de tod~ je~to, r~spon- hIerarqUIa dos valores, e, portanto, com a funcionalização dos
i~ I \ der a uma avaliação global dos institutos conStItucIOnaIS,que institutos civilísticos fundamentais constitucionalmente garan-
" podem também consistir em um valor positivo a ser.realiz~do: tidos.
'I! ao invés de um limite ou um obstáculo a ser remoVIdo.Nao e O valor da justiça social, expresso no Texto fundamental, Incidência
interpretati-
f i'
suficiente verificar que a norma ordinária não esteja em con- no sentido e nos limites antes traçados, há de incidir no direito va dajusti- ". ~
l' ,,''.1' . traste com os preceitos expressos no SIdo art. 3, porque o civil,contribuindo, em sede interpretativa, para individuar Ô ça social
~ \
conteúdo específico que, concretamente, devem assumir as
princípio de igualdade é violado seja quando, se.mju~tific.açõ~s .. t.J
1 1,
constitucionalmente relevantes, cidadãos em sItuaçoes IguaIS cláusulas gerais das quais é cravejada a legislação: da eqüidade
1 "I'
recebem um tratamento diverso, seja quando cidadãos em si- à lealdade (correttezza), do estado de necessidade à lesão (stato
1
tuações diferentes e desproporcionadas recebem um tratamen- di bisogno) e à causa não imputável, da diligência à boa-fé, etc.
to idêntico. O preceito de igualdade poderá incidir sobre a individuação
Igualdade O instrumento màis imediato para realizar o preceito do S do conteúdo das mesmas cláusulas gerais que contribuem para
substancial 2 do art. 3 é a intervenção legislativa reformadora e, principal- a definição dos institutos fundamentais do direito civil, como
e justiça fis. mente, aquela administrativa, que se tomam possíveismediante a "função social" para a propriedade e a "utilidade social"
cal
a "despesa pública" à qual o cidadão é obrigado a contribuir para a iniciativa econõmica privada, de maneira a realizar. uma
de acordo com a própria" capacidade" e segundo critérios de eqüitativa harmonização entre o interesse individual e aquele
progressividade. A contribuição fiscal é, portanto, instrumento geral.
li de justiça social e de promoção civil; a atuação efetiva do art.
53 Consto é pressuposto indispensável para a realização dos
Na valoração das cláusulas, negociais ou não, com o objetivo
de controlar se são, ou não, dignas de proteção (meriteuolez.za)
valores constitucionais, principalmente da justiça social e de por parte do ordenamento, os valores constitucionais - e entre
um sistema eficiente de segurança social. Consistiria numa eles, primeiramente, o respeito da igual dignidade - têm um
distorsão do sistema pretender atribuir a função reequilibra- papel decisivo. Isso, naturalmente, releva na esfera de aplicação
dora típica dajustiça social, realizável mediante a contribuição da invalidade negocial e do instituto do ressarcimento dos
I'
'.
I ..
I
tais e essenciais à realização de uma vida livre e digna: nessa aquele de uma "supernonna operativa", suficiente, sozinha,
~- ~
"'1
~, I1
perspectiva, a falta de disponibilidade de uma moradia insere-se para orientar o legislador e o intérprete. Nesta ótica, a legiti-
£li na noção de "obstáculo a ser removido". Do mesmo modo, a midade constitucional da norma ordinária deveria ser valorada
. ti
normativa pela qual a República assegura a todos o acesso à quase exclusivamente na sua perspectiva. Por outro lado, o
~~i propriedade privada (art. 42, ~ 2, Const.) e "favorece o acesso próprio art. 3, ~ 2, norma clara e suficientemente indicadora,
da poupança popular à propriedade da habitação" (art. 47, ~ deveria ser utilizado pelo intérprete em um exame discricional,
2, Const.) assume um fundamento bem diverso daquele mera- não da tradicional harmonização dos interesses que pressupõe
mente patrimonial. uma homogeneidade dos mesmos, mas em uma justaposição
entre a libertação das necessidades (libeJtà dal bisogno), como
35. Perjgos e limites da atividade "de repartição eq~ita~iva" (~e- valor a ser privilegiado, e a tutela do interesse econômico, como
requativa). - A cláusula geral da igualdade na Jusuça SOCIal valor a ser sacrificado. Se é verdade que todo conflito de inte-
adquire relevância, também, como instrumento útil para de- resses representa uma ocasião "para valorar, no interior da
fender posições concretamente mais frágeis, através dos meca- situação real das partes, contradições antagõnicas, cuja dinâ-
nismos sumariamente recordados e do salto de qualidade dos mica impeça, de fato e de direito, equilíbrios econômicos e o art. 3, ~
institutos tradicionais. Todavia, o uso hermenêutico da cláusula sociais; para emitir juízos não-generalizados sobre os valores 2, não su-
prime o sis-
não pode legitimar a fundação de um "direito dos contratante.s em jogo na situação; para graduar escalas de prioridades que tema, mas
frágeis" constituído por uma heterogênea, por ve_zescont:radl- pennitam fixar os interesses preeminentes, os valores existen- é parte dele
tória e de qualquer modo desordenada, produçao de leISes- ciais, as alternativas da tutela"; é, contudo, também verdade
peciais. Esta cláusula, freqüen temen te, ao invés de ~er.orien- que, em uma sociedade pluralista como é aquela prefigurada
tada para a remoção dos obstáculos que de fato hmltam a pelo constituinte, esta análise só pode ser feita pelo intérprete,
liberdade e a igualdade dos cidadãos, é voltada à criação de respeitando o desenho global do ordenamento, sem aniquilar
novos obstáculos, faltando, a próposito, uma global e progra- inteiros institutos que também concorrem a caracterizar o sis-
mática linha reformadora tendente a concretizar, realmente, tema e sem a veleidade de superar distinções sociaiscompatíveis
o desenho constitucional global. O efeito é o desencadear de com a tutela da digIlÍdade humana. A mesma não homogenei-
reivindicações corporativas, uma luta" entre subgrupos ou sub- dade social e econômica entre as partes constitui hipótese de
Atuação so- classes". Nesta ótica, seria perigoso atribuir ao art. 3, ~ 2, Consto difícil individuação e referir-se-ia sempre à microeconomia, às
mentejudi- o papel de norma eqüitativa ou de repartição eqüitativa (pere- pequenas e médias contratações e não àquelas detenninantes
ciária da
quativa) nas relações privad~: reconhecendo-a ~OI~O~m~ fon- da inteira ordem produtiva e econômica do país. Estas, sem
igualdade
substancial: te de direito que fosse legIumadora de uma mdiscnmmada intervenções legislativas, por um lado, e administrativo-fiscais,
críúca intervenção, integrativa e externa, da "mediação" da atividade de outro, ficariam substancialmente estranhas à contribuição
judiciária. Esta última levaria em consideração, exclusivamente, para a atuação da justiça social.
a tipologia humana, a "não-homogeneidade social" de" estados
de exigência ou de necessidade especiais"; ao realizar um con- 36. Necessidade de uma reviravolta administrativa, legislativa e
trole no "âmbito social", ela tende a eliminar uma discrimina- •
JUnsJ" • lO'
• 'Jw-,,,10'Y>
~,.cza- _. d'a 19uald ad e - expresso no art Desenho
pnnClplO I b I -
3 Const., sem dissociações entre o 1º e o 2- paragr a£os- postula solução
0 - g o a, nao
ção fundada no diverso status social, na desigual distribuição de
da riqueza. A eqüidade toma-se sinônimo de interferência in- algumas distinções, por vezes merecedoras de tutela segundo con~itos.
discriminada nas recíprocas esferas, de um contínuo, exaspe- o próprio ordenamento constitucional. Ele constitui, sempre, ocasIOnaiS
Capítulo terceiro Princípios 53
52
lima enunciação geral que mal se adapta a entrar na valoração privatísticos e publicísticos. A própria distinção entre direito
de interesses individuais o.casionais,por assim dizer contrapos- privado ~ públic~ está em crise. Esta distinção, que já os Ro-
tos, que prefiguram uma valoração, não em relação a todos os manos unham dIficuldade em definir, se substancia ora na
outros, mas, exclusivamente, em relação à outra parte. O ~ 2 natureza pública do sujeito titular dos interesses, ora na natu-
do art. 3 Constoexprime um "valor" que pode, proficuamente, reza pública e privada dos interesses. Se, porém, em uma so-
ser utilizado também na individuação da normativa das relações ciedad~ onde é precisa a distinção entre liberdade do particular
privadas;justifica que sujeitos iguais, em abstrato, sejam trata- e autondade do Estado, é possível distinguir a esfera do inte-
dos de forma diversa, sem exigir que o sacrifício recaia sobre res~e dos particulares daquela do interesse público, em uma
a parte que, ocasionalmente, mantém relação com o sujeito a SOCiedadecomo a atual, torna-se difícil individuar um interesse
ser favorecido. A oposta interpretação, principalmente se fosse particular q~e seja completamente autônomo, independente,
institucionalizada, configuraria uma violação da norma pela Isolado do mteresse dito público. As dificuldades de traçar
qual é da República a tarefa de remover os obstáculos que, linha~ de fronteira entre direito público e privado aumentam,
limitando de fato a liberdade e a igualdade dos cidadãos, aca- tambem, por caus~ da ca.da vez mais incisiva presença que Interesse
bam por negar-lhes igual dignidade. O ônus desta remoção ~sume_ a. elaboraçao dos mteresses coletivos como categoria coletivo
não pode recair sobre esse ou aquele sujeito escolhido ao acaso, mtennedIa (tome-se, como exemplo, o interesse sindical ou
ou com base em um ódio político (tome-se, como exemplo, os das comunidades).
planos reguladores de pequenos e grandes centros), mas deve O .in.stitut?da expropriação, que parecia ser típico do direi~o
ser suportado por todos os cidadãos, de acordo com a própria admllllstratlvo, e, portanto, utilizado para realizar somente
capacidade contributiva. int~resses públicos, é utilizado pelo atual legislador para sub-
É preciso uma mudança de tendência e de qualidade na traIr algumas formas de propriedade a particulares e atribuí-las
produção legislativa especial, que abandone a ambição de atuar a outros particulares (arts. 42, ~ 3, 43 Const.; 834, 838 Cód.
as grandes reformas incidindo sobre as relações individuais, Ci~.; ~. nº 2.359 de 25 de junho de 1865, disciplina das exprã-
concretas e "ocasionais" - fontes de injustiças substanciais e pnaçoes forçadas por causa de utilidade pública e sucessivas
de mal-eostume político -, mas que tenha na mira opções de modificações). Freqüentemente, a expropriação torna-se uma
base coerentes com os valores constitucionais, utilizando os técnica a serviço do princípio da justiça distributiva. Quando
instrumentos fisiológicos oferecidos a tal fim e, em primeiro se passa do princípio geral expresso no art. 42, ~ 3 ao art. 44
lugar, áS contri~uições fiscais de acordo com as efetivas capa- C_onst.,no~-se_uma mud:,m~aradical. É pennitida a expropria-
cidades dos cidadãos: Desse modo, o direito civil libertar-se-á ç~o de ~m llnovel quanutauvamente excessivo (latifúndio por
de muitas das ambigüidades interpretativas que o caracterizam. dImensao) e, de qualquer modo, não utilizado (latifúndio im-
Umajustiça distributiva não pode ser atuada mediante técnicas produtivo, terras improdutivas) para atribuí-lo a cidadãos, como
tradicionalmente privatísticas;estas, sendo conformes aos prin- atuação de valores como o trabalho e a dignidade da pessoa.
cípios fundamentais do ordenamento, devem estar prontas a A aquisição coativa, típica do regime administrativo, começa
sofrer um uso funcionalizado, mas sempre harmônico com o a encontrar aplicações no campo do direito civil. Se antes
sistema, sem que lhes seja atribuído um uso distorcido para vigorava, como princípio gerai, a impossibilidade de transferir
suprir as carências do aparato público e burocrático. ou adquirir direitos sem o consentimento dos sujeitos interes-
sados, atualmente o direito civil conhece numerosas hipóteses
37. Dijü;uldadi de individuação das fronteiras entre direito púhlico - :ugu~as das _quaisjá presentes no Código Civil, mas que
e privado. - A unidade do fenômeno social e do ordenamento fugrram a at~nçao e, de qualquer modo, consideradas sempre
jurídico exige <> estudo de cada instituto nos seus aspeCtosditos como exceçoes e aberrações do sistema - de aquisições e
54 Capítulo terceiro Princípios 55
apropriações de bens que não encontram u~a )ustifi~aç~o no mais correto falar de Direito Civil do que de Direito Privado.
consentimento do titula~, mas, antes, no dIreIto atnbmdo a Não é somente uma mudança de etiqueta. O Direito Civilnão
alguns sujeitos de se tornarem titulares do bem, com uma se apresenta em antítese ao Direito Público, mas é apenas um
própria manifestação unilateral ,de .vontade~. . . ramo que sejustifica por razões didáticas e sistemáticas, e que
Distinção Diante da aplicação destas tecmcas no a~bIto do DIreIto recolhe e evidencia os institutos atinentes Com a estrutura da
quantitati\"d
Civil normalmente visto como o setor da lIvre vontade dos sociedade, com a vida dos cidadãos como titulares de direitos
sujei~os,entra em crise a comu~ s~stem~tic~do direit~ subdi- civis. Retoma-se às origens do direito civil como direito dos o direito
vidido em privado e público. ,!,~cmcas_em~~tutos nasCIdosno ci~adã~s, titulares de.d~reitosfrente ao Estado. Neste enfoque, dos cida-
dãos
campo do direito privado tradICIOnal~ao uulIzad.os.na9uele do nao eXIstecontraposIçao entre privado e público, na medida
direito público e vice-versa:de maneIra qu~ a .dIsun\ao, n~ste em que o próprio direito civil faz parte de um ordenamento
contexto, não é mais qualitativa, mas quanutau~a. ~~Istem ms- unitário.
titutos em que é predominante o interesse.dos mdIVI~u.OS, mas
é, também, sempre presente o interesse dIto da coleuVIdadee 39. O instituto jurídico na visão unitária do crrdenamento. - A
público; e institutos em que, ao co.n.trário,pre~ece, em term.os superação desta contraposição pode ter uma função explosiva
quantitativos, o interesse da coleuVIdade,~ue ~ semp:e funcIO- no estudo do direito. Alguns direitos civisnão encontram tu-
nalizado, na sua íntima essência, à realIzaçao de mteresses tela, reconhecimento ou disciplina no Código Civil, mas, por
individuais e existenciais dos cidadãos. exemplo, no Texto Constitucional. Alguns direitos ou deveres,
O Estado moderno não é caracterizado por uma relação que no plano das relações sociais e civisse traduzem em situa-
entre cidadão e Estado, onde um é subordinado ao poder, à ções existenciais mesmo de relevância civilística, não encon-
soberania e, por vezes, ao arbítrio do. outro, m~ por ~m com- tram a sua disciplina no Código Civil, mas naquele Penal ou
promisso constitucionalmente garanudo de realIzar ~ mteresse nas leis" especiais" do Direito Administrativo. Daí a confirma-
A tutela de cada pessoa. A sua tarefa não é ~nto aquela de Impor aos ção da unidade do ordenamento.
dos in teres- cidadãos um próprio interesse supenor, quanto aquela de rea-
ses indivi-
duais
lizar a tutela dos direitos fundamentais e de favorecer o pleno 40. O estudo do Direito pcrr problemas. - O fracionamento da
desenvolvimento da pessoa (arts. 2 e 3, ~ 2, Const.), removendo matéria jurídica e do ordenamento em ramos tem um sentido
os obstáculos que impedem a participação de todos na vi~a ~o porque divide por competências e por necessidade de exposi-
Estado (efr. infra, capo 10" ~ 176). Ele assu~e. co~o p~opn.a ção uma matéria única em si mesma, mas não deve significar
principalmente a obrigação de r~spe~ta~os dIreItos mdlV1?U~S que a realidade do ordenamento é divisívelem diversossetores,
do sujeito - direito à informaç~o,.dIreIto ao tra~alho~dIreIto dos quais um é totalmente autônomo em relação ao outro, de
ao estudo, essenciais e caractensucos de todo cIdadao - e, tal modo que possa ser proclamada a sua independência. O
portanto, de promovê-los, de eliminar aq~elas ~struturas eco- estudo do direito não deve ser feito por setores pré-eonstituí- Unidade
nômicas e sociais que impedem de fato a utulandade substan- dos, mas por problemas, com especial atenção às exigências dos valores
cial e o efetivo exercício. O Estado tem a tarefa de intervir e .
emergen tes como, por exemp Io, a Ila bItação, a saúde, etc. Os de
cia
referên-
de programar na medida em .que realiza ~s i~teresses ~xis- problemas concernentes às relações civilísticasdevem ser colo-
tenciais e individuais, de maneIra que a realIzaçao deles e, ao cados recuperando os valores publicísticos ao Direito Privado
mesmo tempo, fundamento e justificação da sua intervenção. e os valores privatísticosao Direito Público. Resta a ser indivi-
duada uma nova sistematização do direito. Há de se superar,
38. Do Direito Privado ao Direito CiviL - Existem pontos de de qualquer modo, a mentalidade pela qual o Direito Privado
confluência tão precisos entre o privado e o público que seria é liberdade de cada um de cuidar, por vezes arbitrariamente,
56 Capítulo terceiro
Interpretação
por um lado, represente o sentido profundo de cada norma e na qual se exprime. Ilude-se de recuperar a neutralidade
através de suas conexões eom outras e das conexões destas com perdi~a da obra do jurista através da objetivação da linguagem:
os princípios; por outro, que exprima a unidade entre a cons- se a lInguagem fosse uma entidade destacável da realidade
trução jurídica e a sua aplicabilidade social, através d~ radicação global ~~ sociedade, então a interpretação poderia voltar a ser
do direito na cultura entendida em sentido amplo. A época da uma atiVIdade que exonera o jurista de assumir responsabili-
emanação do Código, o sistema jurídico era visto principal- dades sociais. O mais das vezes, o formalismo interpretativo
mente na acepção recebida pela pandectista: os dogmas impe- afunda as raízes na ideologia da separação do direito das ciên-
rantes - acreditados por uma longa tradição de elaboração cias.s~ciais, como puro dever-ser incontaminado pelo ser. Tais
do direito romano - eram o caráter sacro da propriedade pO~I~oesdevem ser repelidas, apesar de ser inegável a contri-
privada e o poder da vontade do sujeito. Grande parte do bUlçao que o estudo do direito mesmo em termos formais pode
Pretensa prestígio de tal orientação residia no seu modo de se propor oferecer.
i\ pureza lógi-
. como doutrina neutra, derivada através de operações às quais No movimento formalista deve ser colocado também quem Ciência e
! ca do méto-
do era atribuída uma natureza meramente lógica, e que como tais, isola a praxe da reflexão: o estudo se concentra nas normas sociedade
eram tendencialmente imutáveis (salvo um contínuo afinamen- ou nos conceitos e definições abstratas, considerando o fato e
11
I' to formal), a-históricas. a história como momentos" extrajurídicos" . A tentativa acaba
: Dolorosas experiências históricas e penetrantes críticas ideo- por representar a ciênciajurídica como uma técnica que tende
o método
se refere lógicas mostraram a insustentabilidade e a mistificação de um mais à exatidão e à verdade (lógica) do que à flexibilidade,
ao sistema isto é, à adequação às circunstâncias históricas e sociais. Uma
no qual
sistema" neutro": tudo assume uma dimensão histórico-relati-
opera va. O redescoberto relativismo não se traduz, todavia, na crítica teoria pura do direito e uma pura técnica de conceitos e defi-
de qualquer conceito ou técnica jurídica. As críticas se propõem nições são incompatíveis - de acordo com o critério da razoa-
não tanto à não-sistematização, à negação do caráter científico bilidade - com um adequado aprofundamento do momento
do estudo do direito, quanto à reconstrução do sistema depois fatual e aplicativo.
de corretas e rigorosas análises segundo a nova normativa e as
técnicas a elas adequadas. A tarefa da atual metodologia con- 43.... c) da dogmática ao dogmatismo. - Toda ciência que se
siste, portanto, na elaboração de um sistema fundado nos va- propõe a conhecer e comunicar deve necessariamente usar
lores presentes no ordenamento jurídicp vigente. uma linguagem constituída de conceitos rigorosamente orde-
nados (também a linguagem ordinária usa conceitos, se bem
42.... b) ojarmalismojuridico. - Um estudo puramente formal que raramen te ordenados de modo rigoroso). A tal necessidade Elaboração
do direito, concentrado em relações de semelhanças puramen- não foge a ciência jurídica. Não é, portanto, praticável um de concei.
tos para
te lógicas entre normas, institutos ou situações subjetivas (na direito que não use conceitos. Assim como não seria praticável fins práticos
deliberada exclusão de qualquer relevância de sua função) não uma linguagem ordinária que designe somente objetos sem
Formalis- constitui um mérito da investigação do jurista. Ao lado de uma poder qualificá-los: não seria possível dizer de um objeto que
mo lingüís- é "um" livro, já que "livro" é um nome comum, e nesse sen-
tico
acepção tradicional de "formalismo", vista como o estudo do
direito que não privilegia o conteúdo sobre a forma, registra-se, tido é um conceito; nem se poderia julgá-lo, porque dizer que
mais recentemente, a tendência a transformar a investigação o livro é belo ou interessante pressupõe uma faculdade dejuízo
do jurista na análise da linguagem do legislador. Esse método que se exprime em proposições que são - em um sentido da
também é formalista, já que reduz a linguagem a um mero expressão - conceitos. A reflexão sobre conceitos é usualmen-
"objeto" do conhecimento do intérprete: a linguagem seria, te definida na ciência jurídica como "dogmática". "Dogma"
portanto, separável da realidade circunstante que ela exprime tem aqui um significado diferente relativamente a outros em-
Interpretação 61
60 Capítulo quarto
que uma norma social, registrar-se-ão, sem a sup~rior mediação ilustre trad~ção com.o o direito subjetivo, indagando como de-
do ordenamento jurídiço e da sua justiça, mUltas normas so- ve~ ser hOJetradUZIdasas novas exigências no quadro consti-
ciais, praxes entre si irreduzíveis, impulsos emotivos e interesses tUCIOnal,procura-se o seu conteúdo social com um conceito
econômicos ou de domínio concretos e inconfessáveis. A esco- n.ão-crítico d~ direito subjetivo. Os dogmas fundados sociolo-
lha da nonna social é, portanto, atividade que é tudo, menos gIcamente nao oferecem a garantia formal da referência ao
°
neutra. jurista-sociólogo, assim, reserva a si mesmo um poder
muito maior do que o do seu adversário, o jurista-formalista,
texto. Uma coisa é)~stifica: uma concepção do direito subjetivo
~om b~e numa sene de dISposições escritas de lei, outra coisa
e, sobretudo, desvincula-se de qualquer exigência de demons- e f~n~a-Io em um evanescente registro de opiniões e tendências
trar a credibilidade das suas conclusões fazendo referência a SOCIaIS do momento: nesta segunda acepção é quase impossível
um texto (o direito positivo) que constitui garantia de pública o controle da argumentação p'or parte dos cidadãos. À base
controlabilidade: o seu" texto" é a inteira sociedade, mas é um deste com~or~mento não existe uma recusa da dogmática,
texto que ele pode fabricar especialmente para as suas subje- mas a amphaçao do seu objeto, na tentativa de enuclear novos
tivas propensões ideológicas. Uma coisa é sustentar que o ju- ~ogmas~ 0, subje,tivismo dos valores conduz ao arbítrio do ju-
rista, na tentativa de interpretação objetiva da norma, não pode nsta. Nao e pOSSIVel sair do dogmatismo por esta estrada; sim-
subtrair-se ao condicionamento histórico-ideológico, outra coi- plesme~te, dá-se vi~a ~ um ".dogmatismo sociológico".
sa é querer exasperar esse condicionamento no processo in- O pnmado do direIto aqUI sustentado não significa aniqui- Direito e lei
terpretativo, de maneira a recusar a interpretação do dado l~en~o dos outros componentes culturais; ele exclui a iden-
normativo e propor que seja justamente e tão-somente a baga- uficaçao do direito .~o~ a ~ei"~m uma acepção que permita
gem cultural, histórica-ideológica, a constituir garantia de jus- encon~~, na e~pe~encIa hlstonca, corretivos e adequações às
proposlçoes legIslauvas. Uma síntese, portanto, entre o aspecto
tiça.
Não se nega que a interpretação da norma e do fato sejam formal e aquele substancial procurada na constante dialética
Jurista ou entre elementos que são distintos, mas que são sempre e1emen-
legislador atos permeáveis a qualquer ideologia (é impossível separar o
~ homem do jurista); o que se contesta é que essa observação ~osde uma realidade unitária. Um amplo espaço nesse sentido
--7\, e ocut:>ado por quem reconhece na praxe um componente
legitime a completa superação, por parte do filósofo e do po-
lítico, do papel do jurista, o qual, em vez de interpretar a regra essenCIalpa~a a dinâmica e a dialética do direito, sem que seja
se toma o seu depositário. Extraem-se as normas da interpre- com~ro~eudo o princípio de legalidade, fundamento não
tação da lei, e não da imposição das preferências pessoais do subsutUIvel do Estado de Direito.
jurista à sociedade, não importando quanto seja nobre a sua
intenção. . 45.... e). a análise econômica do direito. - Quanto foi dito antes A econo-
As mesmas objeções dirigidas a esta corrente, a falta de mduz a nao aceitar as tentativas velhas e novas orientadas a mia não é
"Dogmatis- exaun'r
. _ a I'n t~rpre taçao
- d O enunCIa . di'o egIslauvo
. em uma ava- fonte
mativa
nor-
mo socioló- respeito ao princípio de legalidade e de democraticità, devem
gico" ser feitas às tentativas de deixar sobreviver a velha dogmática haçao e~cluslvamen~e econôm!ca, de maneira a legitimar uma
travestindo-a com roupas sociológicas. Não se pode manter o economIa ~om funçao normauva, que imponha a própria von-
complexo dogmático tradicional procurando o seu fundamen- ~de ao legIslador e aojuiz; uma economia elevada a parâmetro
to nas normas sociais. Certamente, também as categorias da vmculan~e de controle da própria interpretação do jurista. Uma
pandectista, do formalismo, não estão presentes na sociedade. prospecuva nesse sentido é criticável em si mesma, como me-
Trata-se, sempre, de um instrumento introduzido pelo jurista t~d~lo~~, pel~ sua unilateralidade e pela sua substancial fun-
para reduzir a sociedade em conceitos. Em vez de se interrogar çao mdIVlduallsta, materialista e conservadora, certamente em
sobre o significado atual, por exemplo, de uma categoria de contraste com a legalidade constitucional.
64 Capítulo quarto Interpretação 65
Há de se observar, particularmente, que a) a ação humana Uma "nova e espúria dogmática" (ou seja, um novo dogma- Necessida-
de do diá-
tem uma pluralidade de motivações que não podem ser ~e~u- tismo, formalista ou sociológico que seja) pode ser evitada logo
zidas em termos somente 'econõmicos e utilitaristas; b) o direito somente se a renovação respeitar o pluralismo; se renunciar a
moderno da economia, socialmente caracterizado, servindo-se tornar-se hegemônica nas indicações e fechada à real confron-
das técnicas, dos programas e dos controles, assim como, rea- tação com quem exprime solicitações e ideais diversos, na
listicamente, deve levar em consideração as leis de merca~o, marca de uma continuidade histórica aberta ao novo sem as
livre ou planificado que seja, deve também propor intervençoes infantis aventuras, destinadas a serem vencidas, da superação
de política do direito orientadas a realiza~ ajustiça e ?s ~alores da técnica jurídica, e sem assumir as posições de depositários
de quem "é", mas não possui; c) :> me.todo eco~lOmlco na da verdade. Isso não significa" desforra ideológica" , nem com-
interpretação jurídica mostra-se, a ngor, ll1COmpatlVelcom os porta tornar-se pregador desta ou daquela ideologia ou política;
institutos diretamente centrados na pessoa humana (os chama- isso postula, ao contrário, a urgente necessidade de confinnar
dos direitos da personalidade) e d) esse método descuida d~ com firmeza a normatividade e a justiça como valores, e não,
verdadeira questão jurídica que é aquela de resolver cada jattz- como infelizmente por longo tempo se tentou fazê-las parecer,
specie respeitando as suas peculiaridades subjeti~a~e objetivas. desvalores.
o Direito A" economic analysis" , como teoria global do direito conforme Não se trata de renunciar a uma reconstrução do sistema,
não é redu- a racionalidade do mercado, postula que todas as avaliações, mas de começar a propor ou a encorajar análises corretas do
zível à lin- que no sistema se apresentam como fundamento dos negócios, novo dado, uma "exegese" moderna em relação à qual não
guagem
econômica
podem esgotar-se no aspecto econômico e que todas as escolhas são compreensíveis aversões preconcebidas que testemunha-
dos sujeitos econõmicos são apresentáveis em função d~ um~ riam ou uma desconfiança na interpretação, ou uma dose de
utilidade social global. Ambos os postulados parecem dlscutl- aristocrátic~quanto perigosa distância em relação aos textos
- Técnica e
veis. O jurista sabe que nem todas as avaliações do direito são jurídicos: E forçoso evitar "o achatamento na legislação" e a política
traduzidas em avaliações econômicas: as soluções jurídicas são compilação de "obras de recuo conceitual": mas com esse
assumidas sobretudo com base no consentimento fonnulado ponto é fácil concordar - e não de hoje -, principalmente
em tennos políticos. quando, com honestidade, se afirma' que" fez-se boa técnica
Com isso não se nega que possa ser útil o emprego de oritem, assim Como hoje se continua a fazer péssima política";
esquemas e critérios microeconômicos p~ra :'escru~nar o ?i- e que, a esse fim, "o reconhecimento e a reflexão acerca dos
reito" e para avaliar a congruidade de seus ll1SUtutos.E, todaVia, interesses que constituem a referência concreta de categorias
necessário ter consciência que se é verdade que a análise cus- e construções jurídicas, não só não podem ser considerados
to-benefício contribui para realizar a eficiência, ela sozinha não elementos estranhos a uma investigação científica séria, mas se
consegue representar a especificação e a complexidade da ciên- apresentam como momentos necessários para a mesma correta
cia jurídica. definição do quadro conceitual no qual se deseja movimentar" .
É o ensinamento dos grandes conceitualistas do passado que
46. Ambigüidade da doutrina civilística. - Há de se aceitar a deve. ser atualizado à maior extensão dos materiais jurídicos e
afinnação de que nos discursos dos privatistas, e não somente à diversa qualidade e conflitualidade dos interesses e dos valores.
nos deles, existe "um elemento de ambigüidade". Não é o caso Nesta ótica, que tende à redefinição e à ampliação da lógica Método ju-
de lembrar as causas que o determinaram. Não se trata de P rivatístita, inserta cada vez mais na unidade e na complexi- rídico e_
promoçao
esperar que retorne o "sonho dogmático" , nem de esperar em dade do ordenamento, devem deslocar-se os esforços da civi- da pessoa
"bebedeiras ideológicas" , mas, sim, de reconhecer num e nou- lística. E também a este propósito os cepticismos não parecem
tro a contribuição dada à atual ambigüidade. justificáveis. Os direitos da pessoa esperam a realização concre-
Capítulo quarto Interpretação 67
66
ta mesmo através de técnicas civilísticas, sem renúncias e sem qual o sentido das proposições que exprimem o direito positivo
fugas para o panpublicismo. Não se trata de u~ ~e~omo ao pode ser procurado tão-somente no interior do direito. Se fosse
privado, mas de progresso para a atuação dos pnnClplOs cons- assim,seria errado qualquer recurso que a interpretação fizesse
titucionais. Não é de hoje que se evidenciou que o ponto nodal a elementos estranhos ao texto legislativo: legitimam-se assim
concerne à" redefinição do centro do sistema e às modalidades comportamentos formalísticos,já que o sentido do texto estaria
teóricas de tal redefinição". A "despatrimonialização" do di- fechado dentro de si mesmo.
reito civil é o caminho para a reconstrução do sistema. Não é Preliminarmente, é preciso estabelecer o significado a ser o intérpre-
uma moda, mas uma escolha de política legislativa de alcance atribuído à "positividade" do direito. O objeto do dar (o texto) te coopera
na produ-
histórico. Um caminho "difícil", mas "possível", sobre o qual é" dado" (o conteúdo do texto) porque" dado" ao destinatário, çãodo sen-
as convergências não devem ser só teóricas. não comE sujeito, passi~o da entrega, mas para que ele o possa tido
aferrar.ja conteudo nao se forma no momento da produção
Interpreta- 47. O direito positivo como direito interpretado. - A compreensão do texto por parte do legislador: a produção é uma fase à qual
ção como dos textos jurídicos é um processo que visaalcançar uma forma é preciso flanquear uma outra, ou seja, a recepção do texto
conheci- de conhecimento. A possibilidade de análise rigorosa da com- por parte do destinatário, isto é, o intérpretejA positividade
mento
preensão, o seu caráter prático como método intersubjetiva- não deriva de um universo transcendente, mas da circunstãncia
mente comunicável e controlável deriva do pressuposto de que de que o direito é "cognoscível para o observador". Portanto,
"quem trabalha com textos jurídicos parte da (admis~ãoimp.lí- o direito é positivo "se, mas também somente se, ele é inter-
cita da) compreensibilidade deles e, portanto, tambem da Clr- pretado, e é positivo só na medida em que for interpretado":
cunstãncia de que eles podem ser caracterzados como com- a positividade do direito é a sua interpretabilidade. Esta con-
preensíveis". Pode-se dizer, portanto, que~ ir:t~rpreta~ão não cepção não contrasta com a presença de uma "autoridade"
é a atribuição de significados aos textos JundIcos feIta pelo que fixa os textos: a necessidade de uma clara atribuição dos
intérprete em virtude de impulsos emotivos ou da sua capaci- sujeitos e dos procedimentos capazes de fixar normas surgiu
dade de ter acesso a experiências inatingíveis à maioria, fomo desde a tratação das fontes do direito. A ligação entre texto e
Nenhum
aconteceria se o intérprete legitimasse a própria obra porque intérprete requer a presença de ambos: ao intérprete não é intérprete
em contato com potências ultraterrestres ou porque possuidor consentido saltar ou deliberadamente ignorar o texto, como sem texto
de técnicas secretas de decifração dos sinais do legislador. Se aconteceu em alguns desvios do sociologismo.
o direito se funda no processo que consente o seu conheci- A negação do estar em si mesmo do direito positivo implica,
mento, não é necessário que tal processo assuma a forma da a recusa de métodos puramente lingüísticos da interpretação~*
lógica matemática ou simule, de qualquer mo~o, os procedi- como se a interpretação consistisse unicamente na análise da
mentos das ciências naturais - como se acreditou por longo linguagem, puramente formal, do legislador (cfr. retro, ~ 42).
tempo - para garantir o rigor e o controle público da argu- Se nenhum texto é hermético, porque tem necessidade do ato
mentação do intérprete. A razão não tem uma única forma: a de recepção do intérprete, não se pode omitir o momento
Racionali- "extralingu-ístico" . A palavra é um sinal que" além de si mesmo As palavras
racionalidade do método não se realiza com a aderência a um e as coisas
dade
método válido universalmente, seja para qual for a disciplina, remete a alguma outra coisa que, por sua vez, possui caráter
mas, sim, com a idoneidade para resolver os. problemas que essencialmente extralingüístico". a sentido não é uma "quali-
são próprios de cada disciplina, consentindo o diálogo. A ques- dade da palavra", mas a sua "relação a uma coisa", a um
o sentido tão metodológica toma-se uma questão hermenêutica. contexto material ou a um contexto de experiência. De ma-
não está fe- Deve-se criticar o dogma do "estarem si mesmo" do direito neira que com a palavra "sentido" se entende a senha "para
chado no positivo. Com essa expressão se indica a difundida opinião pela a específica relação" entre a expressão lingüística e a relativa
texto
68 Capítulo quarto Interpretação 69
coisa, que é estabelecida através da definição: não ~xiste, por- te técnico" e" os conhecimentos, as capacidades e as habilidades
tanto um sentido imanente à palavra, este é a relaçao (e nada a ele conexos" , isto é, uma "relação de experiência" com as
mais)' entre o texto e um objeto ao qual se refere. ?esse modo,. coisas das quais se fala no texto; não é, contudo, suficiente ter
então, a interpretação deve levar em consideraçao essa r~f~- uma (mera) "opinião" acerca de uma coisa. É preciso uma" es-
rência necessariamente externa ao texto, resultando estenl pecífica relação material" com a coisa, uma qualquer abertura,
qualquer interpretação fechada a um "significado pr~prio das uma "visão da coisa" que testemunhe a seriedade no esforço de
palavras" (como, ao contrário, se lê aind~ I~Oart. 12 ~hs~.prel. entendê-la e da capacidade de compreendê-la rapidamente.
Cód. Civ.: cfr; infra,. ~ 49), como se eXIstisseum sIgmficado AfIora aqui o conceito de pré-compreensão, muito difundido Pré-colll-
interno ao texto, que prescinde da sua r~lação com o mundo preensão
nas teorias hermenêuticas. Tentar-se-á, ainda que de forma
exterior. rudimentar, uma sua definição. Quem quer que tenha de re-
Texto e O sentido, de fato, não é um atributo dos respectivos te~tos solver um problema, fá~loa partir da hipótese que ele mesmo
contexto
ou palavras; o sentido de um elemento é distinto do sentido formula. No procedimento interpretativo acontece alguma coi-
da inteira estrutura. Nessa observação reside o fundamento da sa semelhante e, todavia, mais complexa. Registram-se assun-
necessidade, metodológica e hermenêutica, d~ i~di~d~~r "~ ções originárias de sentido, ou seja, uma disposição inicial do
contexto de significado, no qual uma proposIçao JundIca e
intérprete a entender o texto de um certo modo: percebe-se
situada, e a sistemática de um texto jurídico" .
o sentido que o texto nos deverá comunicar em um determi-
A superação, aSsim.proposta, do p~si~vismo~si:x.nples~~nte)
nado horizon~e de expectativa (estarmos dispostos a receber,
lingüístico evidencia a contínua remIs~ao do dIreIto POSI~VO a
a entender a mensagem do texto de um certo modo) o qual
elementos extrapositivos: são eles, seJa o eleme~to soc~al (a
influi no ato da interpretação e no seu resultado. Com refe-
necessária correlação entre norma e fato, a consIderaçao do
contexto do direito como elemento de uma realidade global), rência a essa doutrina, nota-se que é necessário impedir que
seja o "direito natural" ou, nos sistemc:sj~~dicos modern~s, "as próprias pr&opiniões entrem em jogo sem que sejam co-
as exigências de justiça racionalmente ll~dI~duad", m~ n~o nhecidas e que impossibilitem a compreensão do texto". A
adequadamente traduzidas em textos legxslatIvos~ ampl:açao pré-compreensão não se pode tornar um preconceito e colo-
Crítica da
subsunção da noção de direito positivo e a sua abertura para noçoes e car-se em meio a uma plena compreensão do texto. A guiar a
valores não literalmente e não explicitamente subsuntos nos atividade do intérprete não deve ser a sua teimosa orientação
textos jurídicos pen'nite a superação da ~écn~ca,~a SUbSUl:ção subjetiva, mas, antes, o cumprimento da Sua tarefa de respeitar
e a prospectação mais realística d~ rel~ç~~ dIaletIc~ e de mte- e, com a própria ação, de realizar a legalidade constitucional.
gração (ato-norma, em uma acepçao umtana da realIdade., (~or Isso justifica a presença na compreensão do texto jurídico Orientação
técnica da subsunção - que num tempo representava a umca de uma dupla tendência: a orientada a entender o fenômeno aos V'dlores
técnica possível correta de interper?,ção normativa - e~ten- considerado no texto e aquela, estritamente conexa à primeira, da interpre-
tação
de-se.o procedimento de reconduçao do caso c_oncreto a fat- sensível ao princípio dajustiça. Toda compreensão tem as suas
tispecie abstrata prevista na norma, com~ operaça0'puramente raízes" em uma disposição de fundo de quem compreende" e
lógico-formal.) A ideologia da subsunçao consentiu mas,c~rar que pode ser designada como "asserção axiológica". De tim
como escolhas neutras, necessariamente impostas pela logxca, lado, atenção ao fenômeno, ao dado concreto a ser colhido
as escolhas interpretativas do jurista, desresponsabilizando a na mutável e complexa realidade, e, de outro, exigência de
doutrina. asserir valores (asserção, justamente, "axiológica"): os intér-
pretes, se não são copiadores e repetidores, são autores, cria-
48. A responsabilidade do intérprete. - É verdade que a com- dores "sem. mediações", "extraindo do princípio do direito e
preensãQdeum texto pressupõe (também) um "poderpuramen- trabalhando em torno das fontes do direito"; por isso todos
Capítulo quarto Interpretação 71
70
limitar-se a levar em consideraç.ã.-º_a_fó.rmulal~~mas lência, mesmo em presença de uma nonna específica do caso,
deveinve~-!atj~;iu1~;_; ~~<:l._~I~@}}.?-_op-º-de~va~ar~~i1~~ pela escolha feita pelo constituinte de conformar-se às normas
qu~j~ ..chamado a aplicª.r:...1eis ..~.'ç. laras':J}\l.J~}.s_2mblgu~ ' de direito internacional universalmente reconhecidas (art. 10,
onde a clarÚa~.seexistç, não pode ser Ul?~~,J.!!as um_p@f!!7'us S 1 Const.). O problema preliminar é individuar, através de
d,nii.têrp~etação: não a premis~ª;'!n.as'Qr~~"!:l~tado da interpre~ uma verdadeira e empenhada atividade hennenêutica, no mare
'-----_. ----. ~~_---_ .
taçao. magnumdas fontes e das proposições legislativas, qual é a norma
vigente. Em presença de uma Constituição rígida e da plurali-
51. A interpretação axiológica como superação da interpretação dade das fontes, das regionais às comunitárias, é sempre mais
literal. - O brocardo in claris non jit interpretatio apóia-se no marginal a hipótese de um fato que seja regulado por uma
pressuposto de que a noima :eja uma unida~e ~?gica be~ "precisa disposição" ou casus l.egis e não por uma miríade de
\ isolada empiricame!lte. Mas,.a ?ao ser que se qU~lr~ cOI~fundl~ disposições ou de seus fragmentos (nonnas-princípio, normas-
'Y-a norma com o artIgo de leI VIstona sua extenondade ,ela e quadro, nonnas de detalhe). Dessa circunstância deriva uma
7\ sempre fruto da sua colocação no âmbito do siste~a. A ~orma notável restrição objetiva do campo de aplicação do parágrafo
nunca está sozinha, mas existe e exerce a sua funçao Uluda ao 1 do art. 12 dispo prei. Cód. Civ. e, portanto, da possível inter-
ordenamento e o seu significado muda com o dinamismo do pretação literal.. ir
ordenamento ao qual pertence. Neste contexto, é pelo menos otimista pensar que os "casos
Legalidade O princípio de legalidade não se reduz ao respeito aos pre- ;.''f. duvidosos" sejam em número menor do que os "casos decidi-
e sistema
ceitos individuais, implicando, ao reves,- d e um Iad o, a coor d e- dos"; e o vínculo que liga o juiz às mesmas regras hermenêu"
nação entre eles (além da hannonização com os princípios ticas, que já em condições normais são definidas pretensiosas,
fundamentais de relevância constitucional) e, do outro, o con- torna-se, a bem dizer, problemático. Em um ordenamento
fronto e o contextual conhecimento do problema concreto a "aberto", como sem dúvida é aquele italiano, os enunciados
ser regulado, isto é, do. fato, individuado no âmbito do inteiro nonnativos expressos não são exaustivos em si mesmos: eles - ::;.
ordenamento - o conjunto das proposições normativas e dos devem ser especificados. em conformidade com o que disp&e
princípios -, de maneira a individuar a normativa mais ade- a tábua de valores que é a base do ordenamento. A interpre-
quada e mais coml1atível com os interesses e com os valores tação axiológica representa a superação histórica e cultural da
em jogo. Portanto,ja interpretação é, por definição, lógico-sis- interpretação literal.
temática e teleológico-axiológica, isto é, finalizada à atuação
dos novos valores constitucionais. Na abordagem cognitiva do .52. Caráter problemático dos significados das palavras e das pr0-
texto, monnente no que se refere à utilização seja dos princí- posições lingüísticas. - O equívoco maior que se aninha no
pios implícitos ou explícitos contidos no ordenamentp, seja do brocardo in claris non fit interpretatio é o pressuposto no qual se
fato.concreto que postula uma qualificação normativa, é preciso funda, ou seja, a "clareza" do texto. A qualificação de "clara" ,
que seja banido o ensino do in claris non jit interpretatio. Ele não reservada a uma palavra, ainda mais a uma proposição lingüís-
responde, aliás, às novas técnicas legislativas que se caracteri- .
'.f'.-~ tica, é somente relativa, sobretudo quando a mensagem tem,
zam por uma proliferação e estratificação de leis com objetivos : '.','.
.' em relae;:ãoao momento da sua recepção por parte do desti- Variabilida-
nem sempre homogêneos, por um abuso da ab-rogação tácita natário, uma diversidade temporal. As palavras assumem no d~ dos sig-
(ou por incompatibilidade) prevista pela maior parte das leis, tempo significados mesmo qualitativamente diversos, segundo nificados
por um uso sempre maior de cláusulas gerais que esperam ser a cultura e a sensibilidade do destinatário. O "significado pró-
preenchidas de um conteúdo específico, por uma hierarquia prio das palavras" , de acordo com a lei, freqüentemente não
das fontes na qual as normas constitucionais exigem a preva- corresponde ao significado comum e, por outro lado, cada.vez
74 Capítulo quarto Interpretação 75
mais se acentuam as diferenças de uso das palavras por parte iuris em harmonia e em confonnidade com o sistema. Se toda
do legislador, quando isso não é nem mesmo almejado. Tome- nonna exprime sempre um princípio, este deve ser confronta-
se, como exemplo, a linguagem do código e aquela das leis de do com os princípios fundamentais. O recurso à ratio iuris isto
setor. Será sempre tarefa do intérprete determinar caso por é, à sua il~dividuação, é um problema de cotejo do princfpio,
caso em qual sentido a palavra foi usada pelo legislador. Em que a ratzo representa, com os outros princípios. Da letra de
suma, a qualificação de clara, reservada a uma expressão lin- uma disposição normativa, de fato, não é possível decidir sobre
guística, mesmo mínima, é relativa, não tem um alcance obje- a sua natureza: esta é um posterius da interpretação e não se
tivo absoluto. reduz a um fato quantitativo, mas representa uma valoração
A qualificação de clareza,que pode ser atribuída a um texto qualitativa relativamente à dinâmica do ordenamento.
legislativo tem sentido, ao contrário, quando seja o resultado, Na perspectiva henne"nêutica que tende a individuar a nor- A interpre-
um posterius da sua interpretação. Será claro aquele texto que, mativa mais adequada ao caso, a analogia legis esfuma muito os tação é
., sempre ana-
lido em conexão com os outros, com os princípios e os valores seus contornos, Ja que os casos concretos nunca se repetem, lógica
juridicamente relevantes, adquirir significado nonnativo sem quanto menos pelas diversidades de natureza te~oral, espa-
que seja necessário forçar abertamente a sua letra. Contudo, a cial e subjetiva que contribuem para individuá-los. esse modo
sua leitura será sempre influenciada pelo conhecimento do existe, de um ponto de vista lógico, uma previ ao- legislativa
universo normativo. A clareza, de qualquer modo, não implica não para aquele caso específico - salvo que não se tenha já,
um juízo de congruência entre o "significado natural" das e em fonna única, verificado (mas, V. art.ll, ~ 1, dispo prel.
palavras usadas e a solução escolhida. Cód. Civ.) - mas para uma série ou tipos de casos similares
ou 1"9atériasanálogas, entre elas necessariamente dessemelhan-
53. Papel do art. 12 dispo prelo Cód. Civ. na legalidade constitu- tes./Nesse sentido, a interpretação é sempre analógica. É, por-
cional e superação da interpretação por graus. - Revelam-se duas tanto, difícil separar as hipóteses previstas tipicamente pela lei
importantes questões: a dependência do método de interpre- das hipóteses não previstas; estas últimas seriam dedutíveis so-
tação do sistema jurídico global no qual é destinado a ser mente com base em semelhanças relevantes com hipóteses já
aplicado e, por conseguinte, a reelaboração do cânone da previstas tipicamente (somente neste caso seria necessário o
interpretação analógica (art. 12, ~ 2, dispoprel. Cód. Civ.), que recurso à analogia). A linearidade de uma tal distinção exprime
é falsamente entendida como método apenas subsidiário. uma J?gica puramente formal, que revela a própria inadequa-
Toda nor- Quanto ao primeiro ponto, a legalidade constitucional im- çã0;l-'iante da inesgotável variedade de casos concretos, a nor-
ma deve põe uma interpretação da norma ordinária ou de grau inferior, ma representa para o intérprete um modelo a ser seguido, não
ser recon~ à luz dos interesses e dos valores constitucionalmente relevan- um comando específico dado pela Autoridade para um espe- .
duzida aos
tes, de maneira que limitar-se à letra clara ou ao sentido próprio 'fi
ClICO desu' natanojf'
,. Á!. • ,
~nonna requer um mterprete •
raclOnal que . Interprete
.
valores 'b" raCIOnal,
constitucio- das palavras (é possível?) ou à intenção do legislador, passado sal a segUIr o modelo (extramdo da figura legar uma figura não imita-
nais ou presente, significaria colocar-se fora desta legalidade, em análoga para o próprio caso), não um intérprete que saiba ser dor servil
contraste também com a previsão do poder-dever do juiz de um mero imitador servil da norma: freqüentemente, atrás do
suspender o juízo e de propor a questão de ilegitimidade da respeito obsessivo à letra de uma disposição oculta-se uma
disposição normativa (art. 23, let. b, I. n. 87 de 11 de março substancial traição do modelo que a norma representa, do
de 1953). Perde sentido também a preferência ao recurso à seu espírito. Falar de regulamentos de casos semelhantes ou
"precisa disposição", devendo-se sempre operar sobre ela um de matérias análogas significa evidenciar uma maior distância
controle de valor por parte do ordenamento (meritevolezza); entre eles em um nível quantitativo e convencional, não já
controle que exige necessariamente a individuação de uma ratio qualitativo e absoluto. Ainda mais que, amiúde, a nonnativa a
.-, ~
, ,
76 Capítulo quarto Interpretação 77
ser aplicada representa o fruto de correlações (coUegamentz) pena de serem consideradas ilegítimas; de maneira que não
entre várias disposições,. ou entre fragmentos de disposições; podem ser a~ei~ ~ogmati~amente,mas devem ser interpreta-
. quando, a rigor, não se saberia se falar de precisa disposição das em respeito a luerarqUla das fontes e dos valores. Somente
ou de analogia legis, ou ainda de.analogia iuris (com esta locução ~uando um mais estrei~ovínculo do intérprete sejustifica como
entende-se comumente o recurso aos princípios gerais, aos ll1strumento de garantIa e de tutela dos valores primariamente
quais se faz referência no art. 12, ~ 2, dispo preI. Cód. Civ., in relevantes ao nível constitucional, a proibição absoluta de in-
Ab;ro~ç~o fine). Uma interpretação por graus (primeiro, a interpretação . t~rpretar analogi:a~en~e \a~~.14 preI.) ~e.legitima. O proce-
dlmphc~~ literal, depois, aquela lógica, etc.) não é, portanto, proponív~l dl1ne!l.to1!~nnen_eutJcoJU~dICO,como atiVidade cognitiva vol-
d~p~r~rel. e mal se adapta a uma C(~mcepçãodo direito na legalidade tada a 111?IViduaçao,
no Ul11versonormativo, da regulamentação
constitucional. O art. 12 dispopreI. perde qualquer justificação a ser aplIcada ao caso, não é descomponível e deve ser atuado
no ordénamento vigente. sem prejuízos conceituais ou pseudo-obstátulos de ordem lin-
" güística.
54. Releitura do art. 14 dispo preL Cód. Civ. - Não vale replicar
que a proposta ab-rogação implícita do art. 12 comportaria, .~
, 56. SU/Jeraçào da exegese como procura do significado literaL _ Exegese
contra siste-
no atual sistema, análoga - e inaceitável - interpretação Se as precedentes considerações têm fundamento, não deve ma
ab-rogante do paralelo art. 14 dispo preI. Cód. Civ., o qual ser aceito o almejado retomo à exegese literal das normas
proíbe a interpretação analógica das normas penais e das nor- consideradas individualmente. A exegese assim considerada-
superando a letra do art. 12 - e em homenagem a uma pre-
mas excepcionais. Para cada norma é preciso proceder a um -~'
~-,..
Proibição confronto com o inteiro sistema vigente, e o art. 14 sai renovado tensa autonomia das leis especiais elevadas a microssistemas
de analo- desse confronto. Como a doutrina mais atenta não deixou de separados, é proposta, ao contrário, prescindindo da presença
gia para as
sublinhar, a proibição de aplicação analógica que ele contém de clareza do texto. O jurista intérprete não deveria, portanto,
normas ex-
cepcionais deve permanecer, com contornos e dimensões diversas, para nem pressupor o sistema, nem construí-lo: a sua tarefa limitar-
as hipóteses de procedimentos analógicos aplicados a disposi- se-ia à análise textual (a exegese) de cada lei. Cada lei é elevada
ções normativas que no sistema pré-eonstitucional certamente a sistema, tendencialmente autônoma e incomunicante c~m , 1".
"."
eram consideradas excepcionais (cfr. infra, capo 10, ~ 180). outras leis: o resultado é uma pluralidade irreduzível (não
Em um sistema garantista, a proibição do procedimento { racionalizáveis, não conhecíveis) de "microssistemas". Se. tal
analógico das leis penais incriminadoras justifica-se, hoje mais enfoque não se depara com os inconvenientes de ordem se-
do que ontem, na medida em que representa um imperativo mântica acima destacados - e, isto é, prescinde do veleitário
fundado em específicas normas constitucionais (arts. 23e 25, pressuposto da clareza do texto - por outro lado, vai de en-
~~ 2 e 3). Desta releitura do art. 14 deriva a insustentabilidade contro a dificuldades de ordem geral muito mais substanciais.
do recurso à analogia como critério meramente subsidiário na I. _Um or?enamento. a-si.stemático,~sto é, feito de normas que
interpretação de regras civilísticasque nada têm de excepcional nao expnmem relaçoes mternas, nao encontrou até hoje uma
somente por deferência ao princípio in claris nonfit interpretatio. verificação histórica. A hipótese não é somente de escola mas
Sistema
é improponível porque logicamente contraditória. Se o critériO fundado
55. Exclusão da relevância constitucional das regras solne a int!ff- de fundação do sistema privilegia de modo decisivo o conteúdo nos conteú-
pretação. - As disposições preliminares ao Código Civilem tema sobre a forma (contenutistico), sendo, portanto, fiuto de elabo- dos
de interpretação geral das leis não têm, portanto, valor cons- ração, das correlações entre um e outro instituto, o sentido do
titucional, nem se situam acima da Constituição: elas devem ~ist~mase ~eduz não no esplêndido isolamento da relação do
harmonizar-se e adequar-se à normativa constitucional, sob mte rprete com o conteúdo de cada norma", mas sempre
Capítulo quarto Interpretação 79
78
confrontando cada norma com todas as outras, verificando a cí~io_sfunda~entais.~? co~trá.:io,ju~tamente porque, por de-
sua coerência constitucional. Tal" conexão" é uma necessidade fimçao, as leIS espeCIaISnao sao maIS consideradas atuativas
também lógica, como rneio de conhecimento do ordenamento dos princípios codicísticos, mas daqueles constitucionais, elas
vigente e de suas efetivas potencialidades. não podem ter lógicas de setor autônomas ou independentes
Nem mesmo no tempo presente podem-se recusar os nexos das lógicas globais do quadro constitucional; elas também de-
existentes e que obrigatoriamente se encontram entre relação vem ser sempre concebidas e conhecidas obrigatoriamente no
social, regras jurídicas e sistema, ao mesmo tempo que não é âmbito do sistema unitariamente considerado. De maneira que
produtivo propor O sistema como um mero resultado da exe- é forç?so prova~ e empiricamente verificar que a ideologia do
gese literal do enunciado lingüístico, não importando a qual pluralIsmo, e nao a sua degeneração, comporta a dissolução
Do enun- corpo legislativo ele pert'ença. U~_ ~nuI!cia~()}i~g!ii~co~ d.a.unidade normativa; que uma maciça presença de leis espe-
ciado à nor- na-se norma quando é lido e confrontadoc~J!l ~!1:~~!m_m:<ie- CIaIS,como estatutos de grupos e linguagens das instituições
ma através
namento em -dialética com os fatos históricos concr_~.!~~m do Estado contemporâneo, são - não apenas na praxe, antes
do sistema
as relaçõ~s individuais e sociais; A função -cfõ sÍstema é, portan- também nos princípios - incompatíveis com a atuação do
to necessária - não como resultado estático, mas - como o . sistema constitucional; que, por fim, as leis especiais, legitima-
in~trumento e o fim dinamicamente conhecíveis, como uma das se em conformidade com os princípios fundamentais, são
experiência cultural global, idônea a transforn~ar a le~e~ .di- interpretáveis somente exegeticamente fora do sistema. Mesmo
reito, o enunciado lingüístico em norma. O sIstema JundIco s~ ~ sociedad~ p~u:alis~ e de grupos se exprime nas leis espe-
não é puramente eventual porque as relações conteudísticas CI~S,,c?m pnncIplOs dIversos daqueles do Código Civil, tais
(contenutistiche), do qual é expressão, representam um compo- pnncIplOs devem ser reconduzidos aos que caracterizam o or-
nente essencial mesmo na interpretação do enunciado legisla- denamento no qual a mesma autonomia dos grupos funda a
tivo individualmente considerado. A unidade interna não é um sua legitimação. O direito especial tem sua peculiaridade e sua
dado contingente, mas, ao contrário, é essencial ao ordena- li~ita~a autonomia, mas sempre derivada e vinculada pelas
mento, sendo representado pelo complexo de relações e de dIretnzes e pelos valores do sistema. Uma praxe diversa repre-
ligações efetivas e potenciais entre as normas singulares e entre senta uma degeneração do pluralismo e não a sua atuação.
os institutos. O conhecimento, cientificamente apreciável, é S?mente diante da falta de uma constituição rígida poder-se-ia
totalidade, superação do finito, uma continuação sem fim, um dIzer que o direito especial é um "corpo autônomo de princí-
momento singular e coletivo de um movimento perene. pios, com espírito e diretrizes próprias"; mas a afirmação tor-
Não existem normas, portanto, que não tenham como pres- na-se improponível se voltada a justificar uma variedade de
suposto o sistema e que ao mesmo tempo não concorram a microssistemas separados. Isso não significa nostalgia da uni-
formá-lo; não existem normas que sejam inteligíveis no seu dade e do antigo primado do Código Civil,mas respeito subs-
efetivo alcance se não insertas como partes integrantes, em tancial da legalidade constitucional que garante a unidade
uma totalidade formal (sistema legislativo) e substancial (siste- histórica e jurídica. Pensar que se possa interpretar a norma
ma social). Este resultado postula a superação da exegese con- ~ingular "na sua nudez lingüística" , como realidade" solitária,
siderada exclusivamente como investigação e individuação do lrr~~lar, err~nt:" .torna-se, de um ponto de vista lógico, uma
significado literal do texto. petIçao d~ pnncIpIO e, de um ponto de vista axiológico, uma
Toda lei Fora de discussão é a igual dignidade (pari dignità) das leis escolha nao conforme à vigente hierarquia das fontes e dos
vive na uni-
dade do sis- e do código; a sua diversa relevância é dada pelos conteúdos valores. A mesma regularidade ou irregularidade da norma é "Enten-
tema e pelos valores que exprimem, pelo grau de idoneidade, quer um posterius, e não um prius da interpretação. "Entender" a der" como
da norma regular, quer da nonna excepcional, a atuar os prin- norma não é, não pode ser, o resultado da exegese puramente j~tifi_c~ção
ro{lologlca
Capítulo 'quarto Interpretação 81
80
literal, mas a individuação da sua lógica e da sua justificação mas sempre de um enunciado normativo. O que se vai inter-
axiológica; e isso é impossível sem levar em conta o resto. do pretar é uma regra que tem uma função ordenante e que é
ordenamento e dos princípios que o suportam. A humIlde necessariamente uma datità antes mesmo da sua interpretação.
fadiga da exegese e do comentário não são incompatíveis; ao.
contrário, postulam um espaço mais amplo: também os "frag- 58. A interpretação como atividade vinculada, controlada e respon-
mentos do mundo" podem ser entendidos se se conhece o sáveL - Se é verdade' que o processo interpretativo parte de
mundo ao qual pertencem. Portanto, in claris ou não, semper um enunciado e chega à individuação da normativa ou, se se
fit interpretatio . prefere, do preceito, é também verdade que o objeto da inter-
pretação do jurista é uma disposição que tem, por definição,
, 57. Interpretação crític'o-éonstrutiva. -'- É necessário colocar em uma função ordenante,juntamente ao fato concreto e a todas
movimento, com maior determinação, um processo de recons- as circunstâncias que o caracterizam. A atividade interpretatiVcl
trução da legalidade constitucional recorrendo a uma inter- não é mecânica nem unidirecional, verdadeira ou falsa, ou
pretação crítico-construtiva. U~a interpretação não é correta simplesmente declarativa: é atividade, por definição, não so-
porque é nova,' mas deve ser ngorosamente correta para ser mente endereçada, mas, antes, vinculada ao" dado" normativo.
aceita 'como nova. " Vínculo que constitui historicaniente uma conquista em temos
A formulação genérica do ditame constitucio~al, o plu~~s- de garantia contra a incerteza e a aventura, uma atuação-da
::--"'.
mo interpretativo, que facilmente se infere da leitura da JU~s- participação política e, portanto, da produção normativa, além ..•.._--
prudência, não devem conduzir ao cepticismo e à ~rmaçao da justificação da autonomia e da independência do juiz nos
de que todas as possíveis interpretações devem ser conSIderadas ordenamentos modernos que não aceitam o estadismo.
rigorosas, válidas e fundadas. Se nao é verdade que de uma A interpretação é atividade vinculada mais especificamente Concretiza-
norma seja possível uma única interpretação, e isto é, que uma às escolhas e aos valores do ordeucimerito; é controlada, porqUe lores
ção dos va-
interpretação de uma norma seja "verdadeira ou falsa", é ver-
Rigor da ar. deve ter uma motivação idônea, adequada; é responsável por- ,-
gumenta- dade que qualquer interpretação deve ser sustentada por uma W
ção
que o dolo e a culpa grave na decisão justificam a responsábi- ..-
argumentação rigorosa, cientific~ente ~álida, e q~e se deve ....:.
~ .
82 Capítulo quarto Interpretação 83
l
I'
r,
1\.,
dissociar-se dela é necessária uma adequada motivação. Se a regular as vicissitudes da vida quer na fase fisiológica, quer
argumentação for convincente, poderá inverter a interpretação naquela eventualmente patológica, e possibilitar a convivência
e modificar a praxe jlltisprudencial; diversamente, esta terá a sem recorrer à força.
força de interpretação oficial. Os enunciados normativos são Superado o mito da incerteza do Direito e da destruição do
expressão direta e indireta do Poder Legislativo, têm natureza sistema, a nossa época convida a participar em sua reconstru-
normativa, especificam-se na experiência e adquirem uma in- ção, com o contributo crítico e com a redescoberta do gosto
terpretação, que será por vezes consolidada ou mesmo pacífica, de contribuir para o debate cultural no país, conscientemente,
ou prevalente, outras vezesfortemente controvertida. Não, por- recuperando, também no estudo, os valores da seriedade, da
tanto, às opções pessoais; sim, à exposição das possíveis corre- tensão civil e moral; os quais constituem os pressupostos para
lações e à avaliação dos 'princípios, no respeito à hierarquia viver o novo período de renascimento dos direitos civis.
normativa e à racionalidade do sistema e da experiência, re-
cusando qualquer abordagem silogística de caráter fonnalísti- 60. Normas especiais e excepcionais. - Podem-se distinguir as
co. Não se trata de individuar a interpretação verdadeira, mas ,
.-- normas segundo a matéria e o ãmbito de aplicação: as que
1 '
l.'.
aquela rigorosa no plano científico, pela linguagem (como regulam uma matéria comum são comuns, as que disciplinam
coerência entre proposições lingüísticas) e pela argumentação matérias especiais, especiais.A distinção não deve ser confundida
(como coerência lógica). com aquela entre nonnas regulares e normas excepcionais.
O interesse nesta distinção é fundamental porque somente
as normas excepcionais, e não aquelas especiais, não são inter-
59. Interpretação e praxe. - O ordenamento não constitui um
pretáveis por analogia (art. 14 dispoprel. Cód. Civ.). As normas
sistema imóvel, fechado entre os confins de sua completeza
do Código da Navegação poderão ser aplicadas ou não por
formal e lingüística, mas um sistema aberto e sensível à mu-
analogia segundo seja ele considerado lei especial ou excep-
dança dos fatos e da história, resultado de uma contínua, in- cional. Alguns institutos - não estranhos ao transporte terres-
cessante obra de conhecimento científico amparado por uma tre -, por exemplo, o frete (art. 384 ss. Cód. Nav.), não são
investigação empírica que não se limita a operar com símbolos, disciplinados no Código Civil,mas no da Navegação. Também
mas com fatos, isto é, com conteúdos verificáveis. Ciência e o transporte amigável é disciplinado apenas no Código da
praxe, norma e fato, longe de se confundirem, operam em Navegação (arts. 414 e 942 Cód.-Nav.). Se estas normas não
planos distintos mas convergentes, em uma contínua, indecli- fossem consideradas excepcionais, mas especiais, poderiam ser
I'
nável dialética que é vital para evidenciar - não a sua contra- aplicadas por analogia.
posição, mas - a sua complementariedade. O conhecimento A distinção entre normas regulares e excepcionais inspira-se Excepciona-
jurídico não tende a descobrir a verdade e a solução absoluta, . ,.
nos pnnclplOs .
que constltuem o f un d amento raClon
. ald as nor- lidadee
. _'
pnnClpIOS
além do mais empiricamente não verificável, mas aquela mais mas. Se estas são, em um certo sentido, conformes aos princí-
idônea às escolhas predeterminadas, expressas-em regras con- pios e ao sistema normativo, são regulares; se se inspiram num
vencionais que, no seu fluxo histórico, constituem o filtro da princípio diverso da regra que caracteriza o sistema, são ex-
experiência geral em contínua verificação, em contato com os cepcionais. Existe, por exemplo, no Código Civil,o art. 1.348,
singulares fatos concretos. que dita o princípio geral pelo qual as prestações podem ter
o Direito Da dialética entre ciência e praxe adquire legitimação a por objeto" coisas futuras" . A prestação de coisas futuras pode
COlHO ciên- própria definição do Direito como ciência empírica, não no ser prevista no contrato, salvo as proibições especiais da lei.
cia pr.ítica
sentido de um conhecimento que tende ao pragmatismo, mas, Tome-se, como exemplo, o construtor que vende o edifício
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antes, de uma ciência social que tem como escopos práticos mesmo antes de tê-lo construído, ou a venda dos produtos
j:,"'-'~,~!
Capítulo quarto
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84 ~d"': . Interpretação 85
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agrícolas mesmo antes da semeadura (art. 1.472 Cód. Civ.). O ~"I
que se pode atribuir à norma somente depois de ter individua-
princípio geral é que ~stes contratos são válidos e juridicamen- Ll\ do o. seu conteúdo e de tê-lo confrontado com o s 'pnnClplOS
. _.
L,
tes vinculantes, mas o legislador no art. 1.348acrescenta" salvo
. as proibições especiais da lei". O art. 771 Cód. Civ., por exem.
pIo, prevê a proibição de doações de bens futuros. Esta norma
r I;'
geraIs,~o ordenamento, de modo que se possa exprimir uma
valoraçao sobre a sua relevância no âmbito do sistema.
~/,
faz exceção ao princípio geral e por esta característica é, junto r I' 61. Relevância hernumêutica da narmativa comunitária. - As
com outras, excepcional. No art. 1.348 é prevista uma norma ~',\ I. "~ profundas mudanças que o sistema das fontes - e a corres-
geral e regular, no art. 771, uma excepcional, mesmo se neste :r." ','; pondente teoria - sofreu ,(cfr. retro, capo 2, S 8) exigem uma
último, no final do parágrafo 1, existe um retomo à regra (é t,:;' correspondente mudança radical na teoria da interpretação
possível a doação de frutos aiüda não separados, ainda que os {, i. ',:i: ~dic~onal~ente elaborada pressupondo-se uma fonte legisla: Teoria da
frutos ainda não separados sejam considerados, de um ponto r..
,.:. -t
1'
I!, .
.i-.
uva centralIzada (de provemência estatal) e produtora de atos
com força de lei ordinária. As regras sobre a interpretação'
interpreta-
ção e plura-
de vistajurídico, bens futuros).
Relalivida- Qualificar uma norma como sendo regular ou excepcional
de do juízo . não é um juízo absoluto~ Olhando o sistema normativo para
'\ ..•.
. 1
r
, ..•. :'..•" ..~.-t_" •.: .. , .',
.,,',,:-,".~.:'\'::,'.~.:,,:
devem
seja pelaadequar-se
presença ao
do quadro que hoje se encontra
direito comunitário, mudado
nas suas áreas de ~~:: das
trás, percebe-se que algumas normas, em um tempo tidas como competência, sejapelo respeito aos princípios imodificáveis de'
excepcionais (portanto, não aplicáveis por analogia), devem .'i ordem pública constituCional de cada Estado membro da cá-
hoje ser consideradas regulares, porque expressões de um prin- 1- ~unidade .Européia. Desta revisão da teoria da interpretaçãq
cípio geral (portanto, aplicáveis por analogia) se se interpretar
o inteiro sistema; acrescentando ou eliminando normas, à luz
dos valores emergentes. Ao contrário, normas que em um' tem-
r;
",.' J: 1
1'~
llus~r-se-ao algumas coriseqüências, recordando, porém, pre~
venu~damednted"que a aplicação dos princípios hermenêuticas
,} ,extra.l ?S o lreito c~rriu~itário será paralisada em todas aque-
".~i'
,t;'
(cfr. retro, capo 2,S 10). '
. a) Relevância dos princípios comunitários na interpretação da lei
mas em regulares e excepcionais é histórica, e em contínua
evolução na dinâmica do ordenamento. Considere-se, em tema '.:,1 zntema. A produção legislativa interna, de atuação da normativa'
de propriedade, o art. 833 Cód~Civ.:"O proprietário não pode '
:'1"':""
t co~unitária, legítima no plano comunitário e naquele consti-
..•...•
praticar atos que tenham como único objetivo"aquele de pre- .. '. ,'~. tuclOnal, deve ser interpretada à luz dos princípios de direito
judicar ou causar danos a outros". Relativamente à oitocentes- .".1 c?muni~ri.o, autonomamente indicados e elaborados pela ju-
'i, . .~ rysprudencIa da Corte de Justiça das Comunidades Européias.
ca, tradicional concepção da propriedade, que consentia a
máxima liberdade ao proprietário, o arL 833' exprimia uma ,f
t~ E sign~ficativoque a lei italiana antitrust disponha que a inter- Art. 3, ~ 4,
norina excepcional, não suficiente a incidir substancialmente ',Ú ':~ p.retaçao das normas sobre as práticas empresariais circunstan- J. n" 287
assume hoje, em presença dos novos princípios constitucionais ~::'~,.,. "",f,}, nante e sobre as operações de concentração "é efetuada com
de soiidariedade (arL 2) e de funcionalização da propriedade ,"'" ~ base nos princípios do ordenamento das Comunidades Euro-
." ~. péias em matéria de disciplina da concorrência" (art. 3, S 4).
(art. 42) e das outras situações patrimoniais, uma fisionomia e
~. Mais amplainente, entre as possíveis interpretações de uma lei
um papel diversos, totalmente respondentes àqueles gerais do
,(t nacional, seja ou não de origem comunitária, deve ser escolhida
sistema, de modo que perde a qualificação de excepcional.
., aquela conforme às prescrições comunitárias" e pelo mesmo
Resultado A distinção entre normas regulares e normas excepcionais
da interpre- não é um "prius••.•mas um "posteriui', isto é, uma qualificação i.' motivo, ao dispositivo constitucional que garante a observância
tação ':,,,:
....
do Tratado de Roma e do direito dele derivado",
Interpretação 87
Capítulo quarto
86
b) Diretivas comunitárias e normas italianas de recepção. As dis- mativa comunitária . e principalmente os seu s pnnclplOs . ,. assu-
Diretiv",
como ralio posições adotadas por um Estado com o objetivo de atuar uma
mem" uma espeCial relevância na interpretaça-o-' In tegraçao - d as
diretiva (que ao contrário do regulamento não é diretamente clausulas gerais e, em . geral
. ,.de cada dI'SpOSI' - Iegts
çao . Ia o'va [.or-
aplicável: dr. retro, capo 2, ~ 10) devem ser interpretadas à luz mulada com '. conceItos Indeterminados ' COInc t 'd
on eu ovanave. ., I
da mesma diretiva, como exigência ligada ao procedimento de , .O respeIto ao
... pnncípio de legalidade eXI'ge .
que o raClOCInIO ,.
formação da norma interna: a fonte comunitária apresenta-se Iogtco-valoraovo, IndISpensável
. .. à aplicação
. da cI'
ausu a gera I ao
I
como a medida inicial - o momento no qual se toma subs- caso concreto,
. _' d seja
,. InspIrado no respeito aos vai ores e d os
tancialmente a decisão de adotar uma certa disciplina -, a pnnClplOs. esumIVelSdos
_ diversos
. , . níveis normao' . IUSIve
vos, Inc .
qual assume o papel de rai:ãojustificadora da lei nacional. Esta aos deI' denvaçao comUl1ltana
-' sem limitações aos d d'
e envaçao -
última, como produto final do procedimento, será interpretada estata , sejam ou nao constitucionais. Desse modo 1'.--
" I' I" . ' a ap Icaçao
d e uma
. ,. c ausu a geral deve ser harmonizada tam b em ' com
à luz da diretiva que pretendeu atuar.
c) Diretivas comunitárias não atuadas. As diretivas comunitárias os .pnncIplOs
. I '. e a normativa comunitária ' ainda qu e com res-
(não diretamente eficazes e) não atuadas, ainda que não sejam : peIto ao'duerarqUla das fontes e dos valores conso'tuc'IOnaimente
fonte de normas aplicáveis, representam já determinados Índi- % garan a.
ces e paràmetros de avaliação. Por conseguinte, se elas contêm
por exemplo, cláusulas gerais que caracterizam umá determi-
nada matéria regulada pelo direito estatal, podem ser utilizadas
como integrativas e explicativas de tal disciplina. Uma inter-
Interpreta-
ção confor- pretação em conformidade com a diretiva não atuada, todavia,
me a dire- pode ser adotada pelo intérprete somente se a norma interna
tiva não se apresenta em aberto e insanável contraste e, ao mesmo
~.
62. o fato jurídico. - 63. Estrutura e função do fato jurídico. - 64. O .,.., ._~
efeito jurídico. - 65. Interpretação e qualificação do fato como fases de um .
".
:::~~
procedimento unitário. - 66. Integração da eficácia.' - 67. Individuação
da nonnativa do caso concreto. - 68. As situações subjetivOs. - 69;' A
titula7'Ídade: a relação entre sujeito e situação. - 70. Titularidade fo~l e
substancial. - 71. Titularidade temporânea e não-temporânea. - 72. E.xis-
tência da situação e inexistência ou indeterminação (indeterminatezza} do
sujeito titular. - 73. Co-titularidade. - 74. Existência, titularidade e e-;;er-
cicio dlU situaçõ~s subjetivas. - 75. Relação juridica e ordenamento. - 76.
Relação juridica como ligaçao entre sujeitos: a chamada relaçãà unissubjetiva.
- 77. A estrutura da 1'elaçãoju7idica é a ligação entre situações subjetivas.
- 78. A função da relação é o regulamento, o ordenamento do caso concreto.
denamento lhe atribui uma qualificação e uma disciplina. O denamento como garante das situações adquiridas. A história
fato concreto quando se realiza constitui o ponto de confluên- tem demonstrado, ao revés, que os fatos socialmente vinculan-
cia entre a norma e o seu tomar-se realidade: é o modo no tes e empenhados, aparentemente indiferentes à ordem jurí-
qual o ordenamento se atua. A norma existe na sua atuação, . dica, eram fatos que o ordenamento queria que fossem livre-
quando é individuada pelo intérprete em relação ao caso con- mente realizados: a teoria do fato irrelevante satisfazia uma
creto: o momento fático atribui a concreteza e a historicidade pretensa neutralidade do ordenamento relativamente às liber-
essenciais à norma. dades privadas. Tendo sido atribuída ao ordenamento (e ao
Relevância O fato concreto é sempre juridicamente relevante; não sem- direito) uma função "promocional", incidente nas estruturas
jurídica de
pre, todavia, a ríorma lhe atribui conseqüências jurídicas tan- sociais e econômicas (dr. retro, capo 1, ~ 2), por conseguinte,
todo fato
gíveis, que podem ser individuadas de modo específico e de-
muda também a ótica: o fato, no âmbito dos valores funda-
terminado como o nascimento, a aquisição, a extinçã.l;l,a mo-
mentais, não é mais indifer~nte, mas juridicamente relevante.
dificação de uma situação subjetiva (dr. infra, ~ 64). O contrato
Todo fato na realidade social, mesmo o mais simples e aparen-
(fato jurídico) produz conseqüências dificeis de determinar,
temente insignificante, temjuridicidade. A sua problemática é
pelo menos em um primeiro nível (arts. 1.372 e 1.374 Cód.
Civ.); o nascimento do homem é igualmente um fato jurídico, representada pela concreta individuação dos parâmetros nor-
já que ele é considerado por uma série de normas como pro- mativos de referência e pelo seu impacto no ordenamento.
dutor de conseqüências jurídicas e, em particular, constitui o O mesmo fato é juridicamente relevante não somente e
momento no qual, para o direito, nasce um sujeito titular de necessariamente a um único fim, antes, a vários fins. Ele tem
determinados direitos e deveres (art. 1 Cód. Civ.) Se Fulano uma diversa qualificação jurídica, uma diversa função segundo
estipula uma doação em favor de um nascituro (art. 784 Cód. se encaixe em uma ou em outra ordem de interesses. Isso
Civ.), ao nascimento é relacionado a aquisição não somente esclarece a diferença entre o fato, como evento, como aconte-
da subjetividade jurídica, mas também daqueles direitos que cimento, que é sempre e somente um, e a sua qualificação (dr.
tinham sido previstos na doação. infra, ~ 64).
Cada fato, mesmo aquele aparentemente indiferente para o Muito importante é a valoração do fatojurídico. Esta implica Fato lícito
e ilícito
direito, tem sempre o seu aspecto de juridicidade. Tome-se, um juízo que comporta não poucas dificuldades, apesar de se
como exemplo, as normas que estabelecem o direito de liber- exaurir na seguinte alternativa: o fato pode ser conforme ou
dade pessoal (art. 13 Const.), o direito de expressão e de não ao direito; quando é não conforme, pode ser também
pensamento (art. 21 Const.), o direito à liberdade de circulação ilícito (v., por exemplo, os arts. 1.218 sS., 2.043 sS. Cód. Civ.).
(art. 16 Const.), etc. O simples fato de Fulano subir no carro Em linha de máxima é lícito o que não é ilícito para o
e andar alguns quilômetros éjuridicamente relevante, enquan- ordenamento. O fato (aqui: contrato) é ilícito quando é con-
to é manifestação exterior de um valor, de um princípio jurí- trário a normas imperativas, à ordem pública e ao bom costume
dico, como é aquele da liberdade de circulação. (art. 1.343 Cód. Civ.). Com a ajuda de outras normas é possível
Fato juridicamente relevante não é somente aquele produtor especificar ainda mais a noção de ilicitude. Em tema de res-
de conseqüências jurídicas que podem ser bem individuadas, ponsabilidade extracontratual, isto é, de responsabilidade fora
mas qualquer fato, enquanto expressão positiva ou negativa de uma relação específica, o art. 2.043 Cód. Civ. define como
(fato ilícito) de valores ou de princípios presentes no ordena- ilícito" qualquer fato (aqui: ato) doloso" - portanto, inten-
mento. Não existe fato que não tenha uma valoração expressa cional-" ou culposo, que provoque a outros um dano it~usto" .
Crítica da ou implícita no âmbito do ordenamento. Mesmo prescindindo do perfil da responsabilidade, isto é, da
teoria da ir- A teoria do fato juridicamente indiferente, aqui rejeitada, obrigação de ressarcir o dano .que é a cargo de quem responde
relevância
jurídica entra naquela corrente ideológica disposta a considerar o or- pelas conseqüências do fato, não se pode dizer que toda forma
92 Capítulo quinto Fato, efeito. Situação subjetiva, relação. 93
de responsabilidade tem. a sua causa em um fato doloso ou te, não todo ato lícito é merecedor de tutela. A simples licitude
culposo (arts. 843, ~ 2, 924, 925, ~ 1, 2.045, 2.054, ~ 3, Cód. exime, de regra, ~omente da responsabilidade (veja, todavia, Ó
Civ.). . art. 2.050 Cód. ClV.).
F.ssencialmente ilícito é o fato doloso ou culposo que causa O juízo de valor foi rel~cionado àquela espécie do mais Fato; ~to,
um dano injusto. Nem todos os fatos não conformes ao, orde- amplo gênero dos fatos, denominada ato. Apesar da classifica- negocIo
namento são ilícitos, porque nem todo o ordenamento e,co.m- ção dos fatos ser controvertida (e o. aprofundamento do dis-
posto de normas imperativas, de prin~ípio~ ~e or.dem,publIca cu.rso aqui acenado evidenciará isso), parece oportuno fazer
e de bom costume. Existem normas dlsposluvas, lstO e, derro- referência, somente para fins de orientação, à distinção tradi-
gáveis pelos sujeitos. Os .atos (portanto: fatos) dos parti~ulares cional dos fatos humanos em operações (modificações do mun-
que derrogam normas dispositivas são não conformes, dlferen- do externo assumidas no ordenamento quase como fatos na-
tes da lei, não ilícitos. . turais, com um significado sobre o qual não influi a conside~
Licitude e
Em um ordenamento no qual o Estado não assiste passivo ração do autor do comportamento) e declarações (fatos hu-
merecimen- à realização dos atos dos particulares, mas exprime juízos sobre manos. comunicativos). Estes últimos distinguem-se em decla-
to de tute- eles o ato meramente lícito não é por si só valorável em tennos
Ia do ato rações de ciência (com as quais se comunica alguma coi1!a
positivos. Para receber um juízo positivo, o at<;>
deve ser também acerca de um fato que já aconteceu ou, segundo alguns, taJil-
o."
merecedor de tutela (meriteuole). O ato deVido - como, por bém estados de ânimo) e declarações de vontade (esta categO-
exemplo, o adimplemento de uma obrigação (art. 1.176 Cód.
ria, que era pacífica quando imperava o dogma da vontade
Civ.) - é por definição merecedor de tutela. O mesmo pode-se
individual como fonte privilegiada do direito privado, foi for-
dizer do adimplemento de uma obrigação natural.(a:t. 2.034 , '~
. f-'
<~.
"Como é" 63. Estrutura efunção do fato jurídico. - É da máxima impor- do efei~o,~az-seem relação à ordem de interesses sobre a qual
e "para tância identificar a estrutura e a função do fato jurídico. Pre- o fato InCIde. No caso da remissão, dever-se-á verificar se o
que serve" devedor tem ou não um interesse juridicamente relevante em
liminarmente, pode-se dizer que estrutura e função respondem
a duas indagações que se põem em torno ao fato. O "como ~~nter viva a obrigação. Se d.e ~em e~e interesse, deverá par-
é?" evidencia a estrutura, o "para que serve?" evidencia a fun- tiCIpar da estrutura, e a remIssao sera bilateral' se falta esse
ção. Como para o fato, também para a relação - isso se verá int~ress~, ele não deverá participar da estrutura: e a remissão
infra, ~ 75 - é possível identificar um perfil estrutural e um sera umlateral (com declaração do credor: nesse caso uma
funcional. Estrutura e função da relação e estrutura e função sucessiva declaração de assenso do devedor não terá ne~hum
do fato não devem ser cOl1fundidas,ainda que se deva observar valor em .:elação à eficácia). Deve-se precisar que o interesse
que a correlação entre o fato e a relação, no procedimento de em questao deve ser reconhecido pelo ordenamento como
individuação da disciplina do caso concreto, imponha a con- merece.d?r de tutela; um simples interesse de fato, manifestado
sideração global dos dois perfis. pelo s~J.eIto,.mas não tutelado pelo ordenamento, não legitima
Classifica- Relaciona-se com a estrutura do fato a distinção entre fato a pa:tIClpaçao na estrutura. Em síntese: todo sujeito que tenha
ção dos fa- instantâneo (por exemplo, a conclusão do contrato: art. 1.326, um mteresse que, segundo o ordenamento, é merecedor de
tos tutela (mcriteuole) em razão do efeito que um fato venha a
~ 1, Cód. Civ.), continuativo (por exemplo, a realização de
uma assembléia em uma sociedade por ações: art. 2.363 ss. produzir, ~eve participar da estrutura daquele fato que produz
Cód. Civ.) ou periódico (por exemplo, o pagamento de salários aquele efeIto.
ou de aluguéis). Relaciona-se, pois, com a estrutura, sobretudo, Um~ me~ma fun.ção (no exemplo acima proposto: a extinção Nexos en-
perguntar-se quantas partes são necessárias para dar vida a um da obngaçao) realIza-se, portanto, através de várias estruturas. tre estrutu-
fato jurídico idôneo a provocar um certo efeito. A escolha da estrutura, corno se falou, não é deixada ao arbítrio ra e função
Veja-se, por exemplo, a remissão da dívida (art. 1.236 Cód. da parte ou das partes~ a variabi~i~ade da estrutura negociai
Variabilida-
«,
de da estru- Civ.). Trata-se de um fato jurídico que produz o seu efeito pode d~pender da funçao do negocIO (função, aqui, entendida
tura próprio (a extinção da obrigação) com estruturas diversas: por no sentido d: "~íntese dos efeitos essenciais": cfr. infra, neste
vezes será necessária uma estrutura bilateral (declaração do ~),em relaçao a qual por vezes urna determinada estrutura
devedor e do credor), outras vezes, será suficiente uma estru- torna-se in~ompatível; mas, o mais das vezes, depende da con-
tura unilateral (só declaração do credor). A atuação da remis- ~reta relaçao (no exemplo precedente: a obrigação a ser ex-
são com estrutura unilateral ou bilateral não é uma livre escolha tinta) que se pretende constituir, modificar ou extinguir. Re-
das partes, nem é confiada ao acaso: a remissão não é unilateral vel~-se, plenamente, as conexões entre o fato jurídico e a
ou bilateral de acordo com o número de partes que faz a relaçao. Deve-se, portanto, concentrar a atenção, por um lado,
própria declaração, já que é preciso verificar se aquela decla- no _~erfil estrutural da fattispecie que é estritamente conexo à
ração que foi feita é necessária à realização do efeito. Se é análIse da estrutura e da função da relação (cfr. infra, ~ 75 55.)
necessária, à sua falta a fattispecie não se forma e não produz sobre a qual.a fa.ttispecie deve. incidir (conexão entre negócio
nenhum efeito; se não é necessária, a jattispecie é já completa - c?mo jattzspecze ~ e relaçao); e, por outro lado, no perfil
e idônea à produção do efeito antes mesmo que a declaração funCIOnaldesta fattzspecie negocial, para individuar os interesses
supérflua seja emitida. A estrutura, portanto, é variável em que as partes entenderam realizar e tutelar. A importância do
I
'I abstrato, mas para cada caso concreto é possível verificar a ~oment~ funcional requer urna consideração específica. De-
priori qual é a estrutura necessária. lInear-se-a antes a função do fato, reservando-se a um sucessivo
Incidência Este juízo de necessidade, esta verificação em concreto da pará~o a discussão sobre a função (e sobre a estrutura) da
da situação
estrutura do fato que o ordenamento requer para a realização relaçao. Os problemas afrontados na teoria da função do fato
inicial
96 Capítulo quinto Fato, efeito, Situação subjetiva, relação, 97
r
c
correspondem, em matéria negocial, àqueles discutidos em ~X,ti~lÇ~O de ,~ma rel~çã? jurídica: Fal~-se,freqüentemente, de
sede de causa do contra,to. . , " VIcIssitudes (consutuuvas, modIficauvas ou extintivas) da re-
Todo fato juridicamente relevante e, em parucular, todo '. ,i lação para individuar o mesmo conceito de outro ângulo visual
Função
como ra- fato humano voluntário, todo ato de iniciativa privada tem uma { I~. (cfr. infra, capo 6, S 96).
zão justifi- função, a qual ou é predeterminada pelo ordename~~o nos ~. Definiu-se, antes, a função do fato como síntese dos efeitos
cadora
esquemas típicos, ou é modelada pela iniciativa dos sUJeItos.A
(
f ti , .. A afi Qualifica-
essenCIaiS. Innação deve ser considerada com muita aten- ção através
função, portanto, é a síntese causal.do fato, a sua profu~lda e 1.. .~
" ção, dado que é através desta síntese que se qualifica o fato: da síntese
r •
~::. );
complexa razão justificadora: ela refere-se não so~ente a von- em outras palavras, é pela síntese dos efeitos essenciais _ e dos ef~i~os
.. - , essenCIaIS
tade dos ~ujeitos que o realizam, mas ao _fat? e~ SI,enqu~nto " portan.tO,pe Ia fiunçao concreta - que se compreende se o fato .
social e juridicamente refevante; ~ razao }usufic~~ora e ao j . ..;.. jurídico é, por exemplo, uma venda ou uma doação ou uma '
mesmo tempo normativa, economIca, SOCIal,pohuca e por
vezes também psicológica (assim é, por exemplo,_em mu~t?s
atos familiares com conteúdo não patrimonial). E necessana
t~. .(
,.
I
figura negociaI atípica .
_In~eres~a, ago~, aprofundar o procedimento de qualifica-
çao, ISto e, os meios necessários para individuar a função de
uma avaliação circunstanciada e global do fato. Avaliação e 1, :!
I-
um determinado ato ou fato. O ato, ,acabou-se de dizer, é
Função
como sínte-
qualificação são uma coisa só, porqu~ o fa:o s~ qu~ifica com
base na função prático-social que realIza. Nao e sufiCientepro-
curar somente os efeitos próprios e qualificar um fato como
produtivo, modificativo ou extintivo de ef~itos.Limitar-se.aisso
t I.
r
"
f:
"-
t
i
~,
,}.
constitutivo, se é idôneo para produzir um efeito, uma nov~
situaçã? jurídica; é modificativo, se é idôneo para modificar
um e~elt~,uma situação; é extintivo, se é idôneo para produzir;
a exUnçao de um efeito, de uma situação. Não deve causar
-~
significa não considerar a natureza dos mteresse~ e .a.dIVer~a t surpresa o uso aparentemente promíscuo de efeito, relação ,e Efeito. si-
se dos efei-
tos essen- relevância que, em concreto, os atos assumem. A mdIVlduaçao "
! t situaç~o: que, a relação seja,o efeito de um fato já ficou claro; tuação. re-
ciais
deve compreender a razão da constitui7ão, modificaçã? ou I {
1> se vera daqUi a pouco -:- mfra, S 77 - que a situação é um lação
extinção (são os três possíveistipos de efeitos do fato: cfr. mfra, ~ elemento inseparável da relação, de maneira que dizer situação
S 64) em relação ao concreto regulamento de interesses. ~.
t
equivale evidenciar a relação da qual a situação é um elemento;
Individuar a função não significa, portanto, descrever os [ e dizer. relação equivale evidenciar o efeito ou os efeitos que
fatos atando desordenadamente uns aos outros. A função do
fato jurídico é expressa não pela descrição, mas pela síntese dos
..." .),
I,
(,
I
t:
a consUtuem, ou a regulam.
Ao lado da constituição, modificação ou extinção devem ser
seus efeitos esseiúiais. j analisados os possíveisefeitos relacionados à concreta fattispecie,
I,-
.. ao seu particular regulamento de interesses, de maneira a va-
64. Q' efeito jurídico. - A relevância de cada e~eitojurídiCo 1>. J "
t:
lorar o ~tOnão somente estruturalmente, mas teleologicamente
encontra a própria expressão toda vez que, depOIsda contem- , ~, (vale dizer, de um ponto de vista do "para que serve"). Por
','
porânea avaliação do fato e das pr?po,si7ões norm~tivas .(rela- ~ vezes o fato exaure-se na produção de um só efeito, noutras, Efeitos "es-
1:,
cionadas e elevadas a sistema), se mdlVldua, atraves da mter- ): produz uma multiplicidade de efeitos. Nesta hipótese, é preciso senciais"
pretação, a disciplina do mesmo fato. Esta disciplina, (corr~s- 1,; verific~r se :odos os efeitos contribuem do mesmo modo para
pondente a situações subjetivase ao seu regulamento) ~o,efeIto
:t a qualificaçao do f,,:to,ou se, entre eles, se devem distinguir
;
Vicissitudes
que o ordenamento jurídico imputa ao ~to. ~ e~ca~l~ e, por-
tanto, a idoneidade do fato para produzir efeltosJundlcos. Os
1
~:t
aqueles que determmam a função prático-jurídica (efeitos es-
senciais) daquele fato dos outros que. para isso não contribuem
da relação
efeitos qu~o fato "produz" podem ser classificadosem efeitos :~ (efeitos não-essenciais).
~.
constitutivos, modificat:.ivose extintivos, segundo que, em con- O problema apresenta-se seja de um ponto de vista teórico,
seqüência do fato, se dê o nascimento, a modificação ou a '1
-If; em relação a um tipo abstrato de fato, seja de um ponto de
" "
'r.
r
!
t
r
98 Capítulo quinto Fato, efeito. Situaçào subjetiva, relação. 99
Efeitos dire- Uma disúnção ulterior é aquela entre efeito direto ~ efeito gência de tutela
. . que o fato manifesta ' exig encla por tad ora d e
A
'
aquisição tem a sua causa não no ato de renunCia, mas ex. lege fato .ou d~ fato comparado à norma. O momento sucessivo à .ficaçao - "\õ~.
no efeito - aqui entendido como fato - por el: produZld.o: qu~hficaçao, esse também autônomo e distinto lógica eerono- .~~
a existência de um bem imóvel vacante. Não eXiste confusao lOgIcar~ent: do precedente, seria aquele dasubsunção dó ato ~
entre fato e efeito: o efeito direto, vale dizer, a vicissitude (no na /at~zspeCle abstrata prevista pela norma. Feita a subsunção, ~. :c:
nosso exemplo, a perda da titularidade da propriedade) que a~nbU1-se ao fato UI?a eficácia, uma relevância jurídica, enten-
uma nonna produziu em conseqüência do fato (no nosso exem- dida ora como efeito a ser relacionado diretamente ao fato
plo, o negócio de renúncia) é considerado por uma outra ora .C01~Oefei~o que reconhece no fato apenas a ocasião. Diss~
nonna (no exemplo, art. 827) como fato que produz ~m _u~te- denva~aIn .a l11tegração da normativa em sentido ampló: e a
rior efeito. Este ulterior efeito é, relativamente ao fato JundICo sua aphcaçao ao fato.
considerado na primeira nonna, reflexo. _ _ Encontra-se~ todavia~ mais de um motivo favorável à supera-
.-.•.
Para individuar a função prático-jurídica de um fato e ne- ç~o daseparaçao ~ntre mt~rpretação e qualificação. Adistil~ção
cessário precisar os efeitos diretos e não aqueles reflexos. nao deve ser aceIta por dIversos motivos, alguns dos quais se
tentará individuar.
65. Interpretação e qualificação do fato c~mo fa:es de um frr..0cedi- Interpretaç~o e qualificação não são entidades ontológicas Interpr. e
menta unitário. - Já foi discutida a questao da mterpretaçao da estanqu:s, dOIS momentos que têm objetos diversos, mas são qualif. fa-
ses de um
lei (retro, capo 4). O estreito relacionamento entre ~to e norma expressoes e aspectos d~ _u~ mesmo processo cognitivo que
procedi.
_ e, portailto, entre fato e efeito,.entre fa~o e relaça~ - revela ?ele encon.tra ~ se~ ullItano modo de atuação. O objeto da mento uni.
a intrínseca unidade do procedimento mterpretatlvo. Nesta Il1t:rpretaçao nao e a vontade psíquica, nem o regulamento tário
Inseparabi- perspectiva a di~tinção tradicional entre interpretaçãoda.l~i e SOCIalmente relevante, mas é o contrato como realidade social
lidade da ~jurídica ao mesmo tempo. O contrato não deve ser somente
interpreta-
interpretação do negócio (do fato) ~e~ mero val~r descn~vo,
ção da lei não configura duas atividades se~aravels por fin~hda~e, m~to- Il1terpretado,. mas também qualificado à luz dos princípios do
e do negá- dos ou tempos. O êxito do p:oc~~lmen.to de q~al~fi~açao aCima or~~n~e~t? O problema está na individuação da função
cio pra~co-Jundica .de cada ato visto singularmente. A qualificação
delineado (retro, ~ 64) é a mdlVIduaçao da dlsclphna do ~at?
concreto: trata-se de individuar a resposta em termos de diSCI- e ~ Il1terpretaçao fazem parte de um procedimento unitário
plina que o ordenamento globalmente considerado dá à exi- onentado a reconstruir aquilo. que aconteceu em uma pers-
:-::;."
Capítulo quinto Fato, efeito. Situação subjetiva, l"elação. 103
102
pectiva dinâmica, vol~do não a? pass_ado,mas à fase de atuaçã~~ 66. Integração da eficá~ia. - Tam.bém os efeitos que, com
I: Portanto, interpretaçao e quahficaçao do ato devem s~r rea!1 base no chamado procedImento de mtegração, se relacionam
il
I''I
zadas em forma evolutiva. A interpretação dita evolutiva nao ao ato ~~vem ser levados em consideração para a qualificação
'I"", se refere somente à lei, mas também ao atú, ao regulamento deste ultimo: O art. 1.374 do Cód. Civ. estabelece que "o
negociaI, e significa.cons~nte ~dequação e congruência do ato contrato,obnga as partes não somente em relação a quanto
historicamente reahzado a realIdade do momento da sua atua- nele esta expresso, mas também em relação a todas as conse-
ção, da sua execução. Tome-se, como exemplo, um contrato a qüências que dele derivam de acordo com a lei ou, na sua falta,
prestações periódicas ou dif~rid~s: a sua execução pode acon- se~n?o os usos e a eqüidade". Trata-se de uma integração da
tecer em uma realidade mUlto dIversa daquela da sua conclu- eficacIa.do c?ntrato que se refere, mais que ao contrato em si,
são,já longe no tempo; isso'ímpõe uma in~e~r~tação evolutiva. aos ~feItos, Isto é, à relação jurídica entendida, no aspecto
Arts. 1.369, Reconhece-se mais de um dado normativo Idoneo a derrubar funclOnal, como regulamento de interesses.
1.371 e
1.364 Cód.
a pretensa prioridade da interpretação s~bre a qualificação. A integração, a aplicação da norma, não são efeitos lómcos N
- .. 0- ormas re-
Ci\'o Segundo o art. 1.369 Cód. Civ. a~ e~pressoes contId~ ~la ma- conseq~enC1aIs,mas fases essenciais da qualificação do contrato gulamellta-
nifestação de vontade assumem sIgnIficado em relaçao a natu- como tipo e como fato individual. A qualificação não é ou não res, cláusu-
reza e ao objeto do negócio: a qualificação é pressupost~ es: é apenas, valoração em relação a esquemas típicos de :naneira I~ ge_~is e
sencial da interpretação, na medida em que ~ ll1terpretaçao e . 'fi - ' pnllClplOS
a JUstI Icar a subsunçao dos fatos concretos em modelos abs-
estritamente relacionada à natureza e ao objeto do contrato. tra.tos. A disciplina é expressa não apenas com técnicas legis-
Para o art. 1.371 Cód. Civ. a interpretação depende da quali- lativas regulamentares, mas também com cláusulas gerais (cfr.
ficação, onerosa ou gratuita, do mesmo .ato: O procedi~ento retro, capo 2, S 17), princípios fundamentais: isso aumenta a
de conhecimento do ato não pode prescll1dIr da valoraçao, ~a
pos~i?ilid~de de adequação dos efeitos da disciplina à específica
sua tipificação. Isso não implica a prio~dade da q,:alificaça?
mdIV1duabdade do fato e faz com que se possa criticar o método
sobre a interpretação, mas significa_que ~n,te.rpretaçaoe quah-
que se limi~ a uma abstrata tipicidade. Por outro lado, os tipos
ficação são aspectos de uma ope~açao ul1ltan~. Analogamente,
por ve:es ~ao.s?mente nomeados mas não disciplinados, outras
para a interpretação das e,xpr~sso~~contratua~s, segun~o o art.
1.364 Cód. Civ., é necessano mdIvIduar o objeto que as vezes vezes sao mdlV~duados pela norma integrativa do Código Civil.
incide sobre a função e sobre a qualificação do contrato. A Se a recond~çao do fato concreto a um tipo abstrato prefigu-
doutrina mais atenta demonstrou que o procedimento de in- rado pela .lel fosse a única modalidade interpretativa, seria
terpretação varia de acordo com o objet? a ser inte~pretado, programatIcamente excluída a compreensão do fato concreto
de acordo com o tipo de ato. A natureza dIversa do objeto deve enquanto tal. A recondução ao tipo (quando a lei o prevê) é
incidir sobre a técnica da interpretação, e isso equivale a dizer uma fase do procedimento interpretativo, mas não o exaure.
que interpretação e qualificação dev<.:n:proceder .sem ~istin- Uma modalidade à primeira vista acessória (modalidade que
ções dos momentos lógicos ou cronologIcos. A quahficaçao, de em abstrato não faria desviar do tipo o contrato que a prevê)
resto, pelo menos no campo do direito, não tem um fim teóri~o, pode em concreto resultar essencial ao regulamento daquele
mas, sim, prático, isto é, aquele de individuar. a normatI~ contrato, mudando assim a sua função: não se tratará mais de
adequada. Deste ângulo visual, as normas sobre a ll1terpretaç.ao um contrato típico com modalidades acessórias, mas de um
são úteis a individuar oS efeitos jurídicos do ato; de maneIra diver.s~ contrato, atípico. Por exemplo, como ensina a doutrina
que a violação delas integra o "recurso por cassação" (ricorso tradiclOnal, entre comodato e precário existe a única distinção
per cassazione; art. 360, SS 1 e 3, Cód. Proc. Civ.), porque elas de um termo: o precário é considerado um comodato sem
são expressões de um inseparável procedimento lógico-norma- term.o. O termo, cláusula geralmente acessória, na hipótese
tivo. conSIderada torna-se um elemento que qualifica o instituto.
Fato, efeito. Situação sub'l'etiva,. ¥elaçao.
.. 105
Capítulo quinto
104
parecer condições ou modalidades mar' . , .
67. Individuação da normativa Recuperada
do coso concreto. - individuar a normativa d . gm~ls ou acessonas, de
Superação . _' o caso concreto a luz d
da antítese a qualificação da relação e dos efeitos para a qualificação_do dos pnnClplOs procurand ~ b' as normas e
fato-direito contrato, supera-se a antítese entre fato e direito, entre fato e
. r'" o no am ltO do ordenamento d' lS
~IPma compatível" com aquele determinado regulamenato d -
relação, isto é, entre fato e efeito; e não no sentido de que não mreress~ e
são entidades distintas - dr. retro, S 64 - mas no sentido de Qualificação é individua ã d 1 ~ . . _. .
que é impossível colocar fato e efeito como entidades antitéti- isto é, individuação da no~a~ a;e evanClaJu~dlca do fato, Através da
cas, vale dizer, como entidades incoinunicáveis, cada uma por- ração do ~a. ara ela contnbuem a supe- qualif. se
._ _ _' es~u~a _?~~U~Ǫ£:Lc:':_ a consideração de gu individua a
tadora de uma lógica própria. Este é o comportamento mental ~g[aç_ao_n,C!.º~~a-p-enasUlll "de o~~el .-~ , - ~ ~ normativa
típico do formalismo, Q. qual conduz à total separação do in- caça0 (retro R 66) -~= ----p ..- ..ª1J.y'<gIlente
a gu<ilifu do caso
~ -' ~ ,mas um sçu momento ess 'al A d'
térprete da realidade, fazendo-o tornar-se insensível aos êxitos caça0 da d'~-Ii~ cC -----. - - enCI,. mo lfi-
práticos do próprio operar. A qualificação põe-se como ponto 'fi _ISClPma e um contrato podeincidir=so'bre a sua
de confluência entre a teoria do ato e aquela da relação, como qua lI lcaçao
. toda vez que a mu d ança d'e uma Ul1lcacláusula
-,
um momento de superação da interpretação do contrato por ql,uo-e,
se~da,prodvoque a mudança do título, isto é da função só-
um lado e, por outro, da lei, representadas como estranhas C jun . lca o regulament o contratual (cfr. infra, ' capo6, ~ 96) ..
uma à outra. O ordenamento vive nos fatos COll.cretosque
68. As situações subjetivos. - O efeito jurídico é u d
historicamente o realizam. Tome-se como exem I' m ever-ser.
Da confrontação fato-nonna pode-se individuar o valor mais
idôneo para ser reservado àquele fato concreto e' o ordena- fato jurídico, deste se~ ~a:c;sm:~r~ir~e dU~ cheq~e: Deste
mativa _ a obri _ u e a preVlsao nor-
mento assume um significado real sem perder a sua intrínseca dever-ser A ob ,gaç~o ~e pagar, A obrigação é um efeito, um
função de "ordenar" . Fato e norma - não já as palavras que , ngaçao e pagar não é o pagamento ( quaI -
os descrevem - são o objeto do conhecimento do jurista, execução: adimplemento da obrigação), ela não é umjo t e
destinado a passar do particular ao particular, reduzindo tudo um conCetto que permIte . avaI'lar um comportamento O a o, mas
à unidade dos valores jurídicos sobre os quais se funda a con- mento (fato) é o compo'rtamento conforme à ob: ya~a- O agir hu-
vivência social e a justiça dos casos individuais. ~~gar (efeito), que deriva da emissão do cheque (fat~ga~~~eit~ ;:~~ ~~:..
Atenção Difícil é a individuação dos corolários de tal concepção. É ~;~~::e~to de a~aIiaçãodo agir humano entendido'segundo ceitos
voltada aj necessário, em especial, uma teoria da interpretação que, su-
oefi'elto e,_'~lt~ ..R~.@!.g~J,ª.i.s_gtegoriaséasituaçãojurídica
:~~~~~;D perando as contraposições entre jattispecie abstrata e jattispecie , ,_
portanto um coniunt . I
• _' :J
=---, ._~ ~~-<=ol
o slmp es ou complexo de COllS-
OU
Perfil do As situações jurídicas subjetivas devem ser consi~e~das sob ~enta:. O primei~o ~ particularmente importante para a indi-
efeito diversos aspectos entre ~les concorrentes; estes, ~m~nament~ Viduaçao da re~eva~Cla,para a qualificação da situação, isto é,
entendidos, dão a exata dimensão delas. Um pnmelro perfil e para a determmaçao da sua função no âmbito das relações
aquele que se refere ao\efeitº;_tºdª-sittlª~~contr-a-a--sua sóci.o-j.urídicas.O or:Ienament? italiano atribui a cada situação
"Q.Pgem-em um fato, vol]lntárjo.-illLIlatural,Jund1Cam.e~ subJeuva uma funçao social. O fenômeno pode ser mais ou
menos relevante; às vezes é tal que chega a transfigurar a
~e.-- . situação subjetiva. Existem situações que" são" funções sociais,
Perfil do in- De um ponto de vista objetivo, a situação é um mte.resse
teresse que essencial à sua existência,. constitui o seu n1icleQ,Vitale outras que" têm" função social. No ordenamento, o interesse
car~cterístico. Interess ode ser orá~onial •• ora de é tutelado enquanto atende não somente ao interesse do
::..::-="-----~:....::,.:..--- • ,
,~~-natUreza pessoal e existencial ora um e nos, ja qu~ titular, mas também àquele da coletividade. Na maior parte
- .-'algumas-situações patrimon~~s são instru~entos para a realI- das hipóteses o interesse dá lugar portanto a uma situação
zação de interesses existencIaIs ou peSsoais. ~o o~denam~nto subjetiva complexa, composta tanto de poderes quanto de de-
dito privatístico encontram espaço seja~,~ sltuaçoes ~~c: veres, obri-gações, ônus. A complexidade das situações subje-
niªis~_entr.e_e~~-ª5_(l_p.x:.<?pdec!.ªde,
I o credlto,_a_e~pJ:eS'7-~.m1< tivas - pela qual em cada situação estão presentes momentos
dativa econQIllica.privada; sejamaql,!.e.lasnão 2_~,!!:~.m<!.l!.la~S~ de poder e de dever, de maneira que a distinção entre situações
l~a;ªgQs.'J:lj[~itQ.~ gª.p~rs9.!!~idade) _~_quai~_ç~~a-:l11~r~r~ ativas e passivas não deve ser entendida em sentido absoluto
(q~ das situações su.?j~É~~ val~!~~!.?EI~p-el p-nma~ - exprime a configuração solidarista do nosso ordenamento
. .. ~JiSe-ilc;tôii--qúe a situaça.- o subjetivaJ9.LP_~~ª-dª-.para dar t ;
constitucional.
Perfil dUla- ' ... -' - .--,.. •
mico {orrn..ª-~mºç:çim~l_a,_:comp()rt<!gl~I!~~~ TaiS .c~mpor~~ntos Aspe~to essencial das situações subjetivas é, enfim, aquele Peml nor-
cõ~stituem,o--perfil dinãmico da situação subj~ ~ at1V1dade normaUvo ou regulamentar; é ele que atribui relevância jurí- mativo
ou o ato jurídico outr<U!coisas não são 9~e a reallzaça~ de uma dica à situação. A juridicidade traduz-se no poder de realizar
situação, de um poder conferido ao SUjel~o ..O pod.er e um dos r:;-
ou de exigir que outros realizem (ou que se abstenham de
aspectos que caracterizam a situação subjeuva. O mteresse r~- realizar) determinados atos e encontra confirmação em prin-
conhecido a um sujeito traduz-se, no momento ~~ seu exerCI- cípios e em normas jurídicas. Nesse aspecto, a situação constitui
cio, em comportamento e, normalment~, em au~d~~e: o re- uma norma de conduta que pode significar atribuição ao su-
conhecimento, isto é, a existência de um mteresse jUndlCamen- jeito - no interesse próprio e/ou de terceiros, no interesse
te relevante, precede logicamente o exercício, a atuação e as individual e/ou social - do poder às vezes de realizar, outras,
de não realizar determinados atos ou atividades.
vicissitudes do interesse.
Perfil do Para o exercício da situação é preciso a manifestação de
exercício vontade de um sujeito, não necessariamente do titular do in- -69._I
A titularidade: a relação
'. entre sujeito e situação. -
nao e.e ~~ento essenCIalpara a eXlstênciada situação, poden-
°
suieito
:J
Si~ç~es
subjetivas
teresse. Por exemplo, o tutor que exerce os direitos (alguns sem sujeito
deles) que são do menor (art. 357 Cód. Civ); ~ int~r~sse é do do eXlsUrmteresses - e, portanto, situações - que são tute- (atual)
menor a vontade, ao revés, do tutor: o pnmelro e utular do lados pelo ordenamento apesar de não terem ainda um titular.
interes~e, isto é' da situação subjetiva, o segu?-do é legitimado Tome-se, por exemplo, a doação a favor de nascituros ou dos
a exercê-la. Exercício significa também capacIdade de exercer, não concebidos (arts. 784 e 462 Cód. Civ.). A partir do mo-
capacidade de fato; uma coisa é o sujeito titular do interesse, mento do fato doação até o possível, futuro momento do nas-
Perfil [un-
outra aquele que o exerce.
As situações subjetivas podem ser conSIderadas ainda sob
.' .;
.. cimento do sujeito, existejá o interesse juridicamente tu~elado,
a situação da qual o donatário, ou de qualquer forma, o sujeito
cional dois aspectos: aquele funcional e aquele normativo ou regula- nascituro, será titular; mas ainda não existe o sujeito titular do
Capítulo quinto Fato, efeito. Situação subjetiva, relação.
108 109
interesse. O ordenamento prevê alguns ofícios de direito civil Em fenômenos diversos inspira-se a distinção entre titulari- Titularida-
(efr. infra, capo6, S 86) a;tribuídos a sujeitos (arts. 784, ~ 3, 643, .
da de ocaslOna I e InstltuclOna
. . . I (~
ou organica) . A primeira en- de ocasio-
I . .
. na e Instt-
I 715 Cód. Civ.) legitimados a agir judicialmente, a reahza~ atos contra-se em todas as hIpóteses nas quais uma situação pode tucional
de direito substancial, conservativos, cautelar~s em relaçao ao pertencer ou tocar (spettare) a um sujeito qualquer; em outros
individuado interesse temporariamente sem utular. . _ termos, o sujeito é ilimitadamente fungível. A titularidade ins-
Esclarecido que o sujeito não é parte imanente da sltuaçao titucional ou orgânica, ao revés, caracteriza-se pela impossibi-
subjetiva e que esta última constitui um interesse - ou um lidade da aquisição, por outros sujeitos, da situação subjetiva,
centro de interesses mais ou menos comp~exo,-:-' deve ser já que vindo a faltar o titular originário, extingue-se também
ainda especificado em que sentido um s~JeIto_e tttul~r desta a situação. Estas situações ligadas organicamente ao titular,
situação. A titularidade é á ligação entre slt~açao ~ ~bJet.o.Ela ditas situações intuitu personae, estabelecem um liame tão es-
se apresenta sob diversas formas que permItem dIsunguIr, em treito com um sujeito, que encontram exclusivamente naquele
uma primeira classificação, a titularid~de. atu.al daque~a po~en- liam~ a sua razão de ser, a sua função. A titularidade orgânica
cial, a titularidade ocasional daquela InstttuclOnal, a utulanda- encontra aplicação sobretudo no setor das situações existenciais
Titularida-
de atual
de substancial daquela formal. . .
Atual é a titularidade existente e Imediatamente rel.ev.:mt~.
A titularidade atual pode ser indicada e.mte~os de perunencla
(a arterumza):a situação que pode ser Imediatamente colocada
Il
,
I
(cfr. infra, capo 7), principalmente, nos direitos fundamentais
da pessoa. Todavia, a titularidade orgânica não exaure o seu
âmbito de aplicação nas situações existenciais em sentido eS-
trito. Se Fulano procura um cirurgião para ser operado, ou um
e!relaçãO a um sujeito lhe pertence. Isso vale para qualquer advogado para ser defendido, a escolha deve-seà qualidade do
, , ,
.'-IJ
situação patrimonial. . _ profissional, às referências recebidas, à confiança que inspira.
A titularidade potencial (ou virtual) expnme-se c.o~ a ~oçao
Titularida-
de poten- de potencialidade (spettanza). Enquanto que a perunenc~a
cial
d~P-
partenenza) concerne à atualidade da situa~ã?, a .spettanza In, l~a
A prestação do devedor (debitória), e, portanto, a relação,
caracteriza-se pelo fato de que o titular da dívida é tão-somente
aquele sujeito, escolhido pelas suas qualidades: a situação de-
a potencialidade da situação, isto é, a eXlstenc~a.de um ti.t~o bitória é intuitu personae porque se funda em uma relação de
idôneo para a aquisição da titularida~e de~n~uva. O ~,!Jelto I confiança, de estima. A extinção do sujeito devedor comportará
não tem a titularidade atual da situaç~o subJeuva, m~ Ja tem
um título para adquiri-la. Não se exclUlque em relaçao a uma I a extinção não apenas da titularidade (como sempre acontece),
mas também da mesma relação. Nas situações intuitu personae No~ç.ão
. . - d o d eved or por um outro nao - provoca uma subjetIva
situação subjetiva possam existir contextualmente ~bas ~ ~o:- a su b sutUlçao
mas de titularidade. É ahipótese da substituição fid~l~~mlssana
I
vicissitude modificativa, mas, sim, novativa (novação subjetiva:
(art. 692 SS.CO. 'd Civ). , pela qual se tem a posslblhdade
., d' d de art. 1.235 Cód. Civ.). Mudando o sujeito de uma prestação
instituir herdeiro ou legatário um sujeito que,e~teJaInter .lta. o infungível, muda o objeto da obrigação: a novação subjetiva é,
(ou que possa ser interditado) - o qual sera u~lar_ do dir~lto
I
portanto, uma forma especial de novação objetiva.
objeto da herança ou do legado .---:.com a obn~çao, p~rem,
de "conservar" a situação heredItana, de maneIra que a sua 70. Titularidade formal e substanciaL - Não propriamente
morte ela possa ser adquirida por u~ out:r0 determInad~ su: técnica é a distinção entre titularidade substancial e formal .
.eito. Têm-se contextualmente duas utulan~ades em r~laç~o ~' Ela inspira-se na quantidade de poder que um determinado
Jmesmasituação: aquela do interditado (aqUlchamado InSutUl- sujeito tem e é relevante, sobretudo, na teoria dos direitos reais
do), titularidade imediata, atual, de pertinência ~al1artenenza): e, especialmente, da propriedade. Esta última situação é a mais
e aquela do outro sujeito (aqui chamado subsutUldo), carac idônea para descrever a referida distinção: sucede freqüente-
terizada pela potencialidade, pela spettanza. mente que a um sujeito seja recOlihecida a titularidade (formal)
\
...•
..
Fato, efeito. Situação sublJ'et"
lua, Tela çao,
- 111
Capítulo quinto
110
72. Existência da situação e inexisr' cza .
da situação enquanto que o conjunto de poderes e faculdades terminatezza) do sujeito titular. _ Etm. ou ~ndete::ninação(inde-
que constituem o seu conteúdo seja atribuído a outr~s, ou que são juridicamente relevant xlstem sItuaçoes existenciais
.. es mesmo ant d .,.
propried~- mesmo seja excluído por lei. Existem hipóteses nas quaIs um d o SUjeIto.Para as pessoas natu'raIS,a subjetividad . es a eXIstencla
de formal
sujeito é, para determinados fins, ainda considerado proprie- I
e substan- em termos tradicionais se con tit . e, pe o menos
tário, titular (formal) da situação proprietária, mas se encontra C ' d C' ) , s UIcom o nasci (
cial o. IV., fato jurídico que atrib . . mento art. 1
privado, por vezes irreversivelmente, dos direitos ou dos pode- como aptidão geral a ser titular d .UIa :apacldade de direito
res característicos daquela propriedade. Por vezes é negado o . h" e sItuaçoes subi ti T .
eXIstem Ipoteses,. determinadas e especIficas ,;}e n vaso odavIa,
.
poder de dispor, como acontece, por exemplo, quando se trata centro d e mteresses é J'uridicam tI' as qUaiSum
de propriedade de um bem de grande valor artístico (art. 34 . t' . ( - en e re evante a d'
XIS enCla
h' , o nao-nascimento) d '"
o SUjeItotitular d . pesar a me-'...
l. nº 1.089 de 1º de junho de 1939, "Tutela das coisas de a Ipotese do nascituro conc b'd . o mteresse. E SUjeito am-
interesse artístico ou histórico"), outras vezes, ao contrário, é problemáticas limitações I .e 1. o, o qual, ainda que com as da nã<rexÍs-
negada a faculdade de gozo, enquanto que o gozo efetivo é 2 3 ~ 2 31 R 2 C ) egIs lativas, tem direito à vida (arts tente
" , , ;j onst .. De fato a atual d' . r .
atribuído por lei a outros. o aborto em forma generaliz d ' O IS~IPm~ não tutela
Vice-versa, há quem assume substancialmente os poderes e suprimido sem que exista ur: a. _ concebIdo nao pode ser
os -direitos _ ou de qualquer jeito, a maior parte deles - que parte do ordenamento O . ta raza~ que mereça tutela por
são típicos do proprietário, apesar de não o ser. Nesta hipótese . 'd' . m eresse a conserva - d .
jun Icamente relevante. çao a Vida é
tem-se uma titularidade substancial. Tome-se, como exemplo, Podem-se verificar, além disso' -. ,
o enfiteuta: ele pode dispor, pode gozar do bem objeto da sujeito que ainda não nas C' sItuaçoesja destinadas a um
. _ ceu. orno nas doaç-
enfiteuse do mesmo modo que o proprietário (art. 959 Cód. SIçoestestamentárias a f: d' oes e nas dispo-
C' ) avor e nasCIturos (arts 784 462
Civ.). IV.. Mesmo antes que o tit I . , Cód.
em termos de lógica formal u:r P?s~a ser considerado sujeito
71. Titularidade tempurânea e não-tempurânea. - Outra distin- tutela: o doador não pod e, ebdIreItopositivo,já existe uma
era o servar comp tam
ção é aquela que recebe o nome de titularidade temporânea possam destruir o bem doad ( 78 or entos que
e não-temporânea. os terceiros serão obrigad o arts.. 4, ~ 3, 789 Cód. Civ.) e
(attesa). os a respeItar esta situação de espera.
A temporaneidade ou não da titularidade não se identifica
com a temporaneidade ou perpetuidade da situação subjetiva
à qual a titularidade se refere (por exemplo, o art. 979 Cód.
I
I Mesmo depois da morte do sujeito o ord
dera
. , certos
. interesses tutel'aveIS.
. AI'guns requis'tenamentoI' consi- S .. -
uJeltO nao
Civ., pelo qual" O usufruto não pode exceder a vida do usu- eXIstencIa,à personalidade do defunto _ I os re atIvos à mais exÍs-
I
frutuário": a titularidade do usufruto é indefinida no tempo honra, a sua dignidade' _ por exemplo, a sua tente
_ ' a mterpretaçao exata d h" .
porque não se conhece quanto durará a vida do usufrutuário). _ sao de qualquer modo .d a sua Istona
Esta última, entendida como ligação entre sujeito e situação, tempo (art. 597 ~ 3 C'dP~tef. os p,or um certo período de
pode ser temporânea mesmo quando concerne a uma situação vantes também ;ociaime~t~ ~. , IS~O~'.enq~an.t~ forem rele-
tendencialmente de tempo indefinido (é o que acontece com ordenamento serão I .ti 'd guns SUjeItos,md1V1duadospelo
o direito de propriedade: de fato, mais que de perpetuidade
da titularidade da propriedade, é oportuno falar de titularidade
a tempo indefinido, mas suscetível de extinguir-se de um mo-
mento para o outro; existem também hipóteses de propriedade
I
I
Às vezes p~r fim ~n;a os a ~telar o interesse do defunto.
a morte d~ sujeito, ~uand: ~~: ~eja no i~t~ress~ de terceiros,
perda de eficácia da proposta o~ ~~~;;~~n~, nao comporta a
que conceme à ativid d d
' a e e empresa e que . d
çao de um contrato
• .
temporânea,já que a indefinição do tempo da titularidade não conc IUldo (art. 1.330 C'd C' ) , am a nao fOI
O. IV..
é característica essencial da propriedade).
"-._ .. _ ..,.",.. -------------.,...---------~------:-:-~----~-------
modificação e extinção de relações jurídicas, isto é, o conjunto bor~ e~cepcionalmente, não existem dois sujeitos. Assim, na
aceltaçao da herança com benefício de inventário (art. 484 ss.
das suas vicissitudes.
CÓ~.Civ.), ~s dois patrimônios, aquele do de cuius e aquele do
76. Relação jurídica como ligação entre sujeitos: a chamada relaç~o aceItante, nao se co~fundem: mas fic.amdistintos, permitindo
unissubjetiva. - A doutrina prevalente detém-se na re~a~ao aos credores do de cuzus agredIr o patnmônio hereditário. Pode
Relação en-
entre sujeitos. A relação jurídica seria relação entre SUjeItos acontecer que o mesmo herdeiro com benefício de inventário
tre sujeitos: se~acre?or do defunto. A obrigação não se extingue (art. 1.253
críticaregulada pela norma, isto é, pel? ordenamento no seu co~-
plexo. A opinião tem diversos me~~os: esta~e.lecea corre~açao Cod. ClV.) pelo fato de que as duas qualidades de credor e
entre termos homogêneas - SUjeItoe SUjeIto-, consIdera devedor se reúnem em um só sujeito - o herdeiro - mas
juridicamente relevante a correlaç~o (colleg~mento~ ou o con- continua a existirjunto com as duas distintas responsabilidades
flito de interesses presentes na realIdade SOCIal.EXIstem.'toda- patrimoniai~. Seja a sit~a~ão dita ativa, seja aquela dita passiva,
via, hipóteses de relaçào que não têm .s~jeitos.determmados ambas conUnuam a eXIsUrembora o titular seja o mesmo su-
ou individuados OU,às vezes, não têm SUjeItoseXistentes de um jeito., Outra hip~te~e, ~inda mais freqüente na prática, é aquela
ponto de vistajurídico-formal. Segundo uma tec:ria, ~ relaçã? dos tlt~los de credIto a ordem, que voltam, através de endosso,
entre sujeitos dificilmente é concebível nas relaçoes dI~ re~s a,? emItente: devedor (o emitente) e credor (o endossante)
e com estrutura absoluta - notou-se, então, que a sItuaçao sao o mesmo sujeito. A legislação especial sobre títulos de
~\propriedade não tem uma. estrutura.int~~a porqu~ não ~ crédito permite que o mesmo título seja recolocado em circu-
.um~centro contraposto de mteresses mdIVlduaão e ~ma- lação (art. 15, ~ 3, 1. cambiária), o que significa que medio
tempore a relação não se extinguiu.
~ (efr., e~ propo~I~in~:.2:Jr94) " ae
mIDelra que
~or.tanto,. na relação jurídica a relação é entre situações
nestãS hlp"Oteses-sen-alJIfpOsslVel,
co~o :ugue.~ sustentou, falar
de relação. O relevo é justo, mas nao e decIsIvo para negar a subjeuvas, ainda que confluentes na titularidade de um mesmo
existência da relação de propriedade. Se existe um sujeito que sujeito.
é titular de uma situação de propriedade, existe da outra parte,
não um sujeito determinado, mas a coletividade, que tem o ~ 77. A estrutura da relação jurídica é a ligação entre situações
subjetivas. - A ligação essencial de um ponto de vista estrutural
dever de respeitá-la, de não se ~~'
Relações Todavia, para excluir validade absoluta a conce.pç,aoque se é aquela entre centros de interesses. O sujeito é somente um
sem sujeitos está examinando, é útil a individuação daquelas hlpoteses que elemento externo à relação porque externo à situação; é. so-
se encontram no ordenamento positivo, nas quais existe uma mente o titular, às vezes ocasional, de uma ou de ambas as
. relação entre centros de interesse det~~ina~os (P?rtanto, re- situações que compõem a relação jurídica .
açoes e situações com estrutura interna), maS~ ~isp~vel fazer referimento à ~e o su'eito
de uma ou de ambas as situações não existe ainda. Se a atua- ',SUJeIto
---.,_ ara mdlVlduar o ucleo da relação ., Nele o que e' nao - ~e e Ie-
lidade do sujeito não é essencial à existência da situação, sig- sempre presente e a 19ação entre um mteresse e um outro, menta es-
nifica que pode existir uma relação juridicamente relevante <;ntreuma situação, determinada ou determinável, e uma outra. sendal
entre dois ou mais centros de interesses sem que ela se traduza E preferível, portanto, a doutrina que define a relação jurídica
necessariamente em relação entre sujeitos. como relação entre situações subjetivas. A conclusão nào é
A doutrina, com uma fina análise, conseguiu individuar al- contraditada pela possibilidade de que as situações tenham
gumas hipóteses previstas no código e nas leis especiais (ar~. '--.!!-~nfungibilidade subjetiva, i~o é, devam pertencer ou spet-
2.272, n2 4, 1.320, 661 Cód. Civ.), nas quais existe uma relaçao tare a determinados SUjeitos (situações ditas intuitu personae).
juridicamente relevante entre centros de interesses mas, em- Na chamada titularidade necessária, não é configurável uma
Fato, efeito. Situação subl)'etl'
va, rela çao.
-' 117
Capítulo quinto
116
aspecto causativo da obrigação pec ',.
sucessão na relação: mudando o sujeito extingue-se a situação. a disciplina que a caract' S u~'lIa.na,o seu regramento,
enza. e se lImitas
Nem por isso.o sujeito é elemento da situação. tural, isto é à relação e t . _ se ao aspecto estru-
. .. ' ,n re as SItuaçoes n - . , 1
Não se pode distinguir as situações subjetivas - a não ser
Complexi- md1Vlduarefetivamell'te"
_' a 'â~"
lSClP'1...'
ma, a fun.' - ao. d sena posslve
.
dadedas si- em termos quantitativos - em ativas e passivas,já que aquelas çao. Ela assume uma dl'sc'Ipl'ma .segundo a çao aquela obnga-,
.
tuações sub- ditas ativascpmpreendem também deveres e obrigações e aque-
expressão, da sua disciplina' o aspecto {"; ~ua causa, a qual e
jeúvas
las ditas passivas contêm freqüeI?-temente alguns direitos e po- " . lunclOnal e 1
saUvoexpnmem
. a mesma ,exl'g". enCla Isto. é i d' 'daque e cau-,
deres. A relação não está na li -o entre direito subjetivo. de pletar. uma relação entre situações s~bjetiv~ ~ IV!~ar e com-
um_!~i _,_e_deverou obrigacão, do outro.>-É difícil imaginar
~,__ do seja a causa uma ou outra t ... cre or, segun-
díreitos subjetivps quenão.sejustificam no âmbito de situações poderes, obrigações' odecl : em, ou nap, determinados
mais complexas, das quais fazem parte também deveres, ônus, ss. Cód C") d .? agir para a resolução (art. 1.453
, .' IV., po era ,defender-se excepcionando . .
obrigações, isto é, posições,que, analiticamente consideradas, plencla da outra parte (art. 1.460 Cód. Civ.). a madlm-
podem ser definidas como passivas. A relação sob o perfil es-
trutura:l érelação entre situaçõescomplexas, que pode ser ora
de simples correlação (coUegamento) (assim, entre potestà e in-
teresse legítimo), ora, e são as hipóteses mais freqüentes no
campo do direito civil, de contraposição e de conflito (assim,
nas obrigações onde a situação debitória contrapõe-se àquela
creditória) .
CapÍtulo SextO
I ~~:
ir~~--'--~-~'-
!
I
120
Capítulo sexto Aspectos das situações subjetivas e das relações
, :, I .' dade lógica do dever ou ' do d"tIreI o, como se. um provocar danos excepcionais a outros sujeitos, em harmonia
~I
'[,'.,i, :
.
tensa pnon . . ,. tão somente a parar do
devesse representar o termo ongmano -'fi uando
. ~. com o princípio de solidariedade política, econômica e social
, I A' - ven lcou-se q (art. 2 Const.). Isso incide de tal modo sobre o direito subjetivo
qual seria conceblVe o outro. ngor . . tem-
se tratou da relação jurídica - ~~~a~~~e--~:I!~ qu~,.e.!!LV..e,?:
de1esult,a...!.~omoeXEressãode um poder arbitrário,
oraneamente, seffi-.qua-lqlle~e
~~um
e.nCla 00, , '.'
direito na ~d~da ~ que
correlato dever e só existem uma obnga~ao e um
ê::~~
n-
' acal.?~_E~!func.~~~~~~~-loe por socializá-lo~
No ordenamento moderno, o interesse é tutelado se, e en-
quanto for conforme não apenas ao interesse do titul<:tr,mas
edida em que existem interesses protegidos que se su~sta "i
, também àquele da coletividade. Na maior parte das hipóteses,
~ no' adimplemento 'daquela obrigação e daquele ever. ~i o interesse faz nascer uma'€ituação subjetiva cO-EPlexj, com-
clam 'mples co'modidade de exposição trata-se, por eosta tanto de p.oderes quanto de deveres, obrigações, ônus.
Apenas por SI . d . d brigação
I ntes do direito subjetivo e epols a ~ ' E nesta perspectiva que~oca a cn~o direito subjetivo.
ex~mJeo;o~ente falando da relação, isto é, da relaç~o entre a Este nasceu para exprimir um interesse individual e egoísta,
~i~u~çãodita ativa e a situação dita passiva, poder-se-a colher a enquanto que a noção de situação subjetiva complexa confi-
exata relevância de uma e de outra. gura a função de'(,'iolidariedadepresente ao nrrel constitucio.n.alt
'.
80. O direito subjetivo. - Contrapõem~se: tradic~Ol~almente, 81. Os chamados limites ao direito subjetivo~ - São facilmente Limites "ex-
duas definições de direito subjetivo: dlre.lto subjeavo c~~o criticáveis aqu~las concepções que, para salvar a noção de di- tenlos":
tica
crí-
ode r da vontade e direito subjetivo como mteresse prot~gI o. r~ito subjetivo, identifjcam, no poder da vontade que se expri-
Poder dai P . d fensores das duas teorias subtende dIversas me em forma arbitrária e absoluta, o princípio; e, nos limites,
vontade ou A disputa entr~ os e. '. lha a diversidade
interesse) avaliações e diversas Ideologtas, nela se ~spe. . de a exceção. Por exemplo, quem é proprietário de um terreno
protegidO; entre as concepções liberalistas e as pnme~ ten~a~~ ão só pode constiuir a determinadas distâncias das ruas e das
1;
entender o direito de um ponto de vista teleol~gI.co. e mç estradas; para o proprietário que queira construir no solo ob- '.
-. .,' t alda os dois aspectos' o direito subjetivo e, afinna-se jeto do direito, é necessária a licença para construir (concessione
corren e s . d t a um
usualmente, o poder reconhecido pelo or, e~amen o. . edilizia:. arts. 1 e 4 1. n2 10 de 28 de janeiro de 1977) que,
su'eito para a realização de um interesse propno do ~Ujeito. diversamente da licenza edilizia prevista na lei urbanística ante-
9O vício metodológico está na crença de q,:e u~ mteresse rior (art. 31 L n2 1.150 de 17 de agosto de 1942) - é consÍ-
telado pelo ordenamento seja finali~a~o a Simesmo. N~ma derada atributiva e não recognitiva da faculdade de construir.
realidade na qual à atribuição de dIreI,tos. se _acompan am Estes vínculos, mesmo sendo numerosos, seriam sempre e so-
deveres e obrigações, as situações favo~veis nao podem ser mente exceções: limites colocados no interesse da coletividade,
consideradas isoladamente. .~~~n~~~~s de qualquer modo qualificados, mas,
D rma. paracu
. Iar 1,\
. .' S~~P!~~~~~~ ex~ernos ao díreil()(jUe, como tais, não muda- \
Freqüentemente, exige-se do SUjeitouma o . ,.
ara 6 exercício de um direito. Por exemplo, o pr~pnetano :......nam
a sua essencla.---1
pode doar o seu direito a um terceiro, mas a doaçao, ~o~o O en~Gque não é correto. No vigente ordenamento não Os chama-
~to de disposição do titular, deve ser estipulada po: a~opubhco existe um direito subjetivo - propriedade privada, crédito, dos limites
782 2699 Cód. Civ.). Nesta hipótese, ao dIreito (doar) usufruto - ilimitado, atribuído ao exclusivo interesse do su- decon:em
(arts. ,. b . - de usar uma do princí-
se acompanha o ônus e às vezes a o ngaçao jeito, de modo tal que possa ser configurado como entidade pio
determinada forma. . - pré-dada, isto é, preexistente ao ordenamento e que deva ser
Funcionali. O perfil mais significativo é constituído pela obngaçao, ~u levada em consideração enquanto conceito, ou noção, trans-
zação dever, do sujeito titular do direito de exerce-lo de modo a nao mitido de geração em geração. O que existe é um interesse
-~,.
{
Capítulo sexto Aspectos das situações subjetivas e das relações 123
122
juridicamente tutelado, uma situação jurídica que já ~~ si excesso de pode~ P?de ser, traduzido, outrossim, em um poder
mesma encerra limitações para o titular. £s chamados. h~.mt~s que, apesar de hmltado, e de qualquer modo exercido além
~~de um ponto ae ViStalõgico,-nãu se~em a eXlstenCla do limite consentido, isto é, à falta de uma objetivajustificação
do princípio (direito subjetivo), mas nascem Junto com ele e jurídica. O excesso, portanto - ao contrário do abuso -, não
constituem seu aspecto qualitativo. O ordenamen:o tutela ~m postula uma relação com a função da situação e pode ser
(interesse somen_t~_~p.quantQ'ªt~nder àqu.e1(!lu:aZQes',:,J~mb~~ caracterizado mais facilmente. Uma hipótese pode ser indivi-
,cremrtureza coletiva, gar~.nti~_~.E!lill.é!. ~é.ç!!icaJ;t~_Jlnu~aç~u:
••• duada naquela prevista no art. 1.015 Cód. Civ. em tema de
e
dos víi-ícufos.,Os limites, que se definem externos ao direito, usufruto, se bem que a rubrica fale de abusos do usufrutuário:
'11a reaÚclade ~ão modificam o interesse pelo externo, mas "O usufruto pode também cessar pelo abuso que o usufrutuário
contribuem à identificaçã~ da sua essência, da sua função. faça do seu direito, alienando os bens ou deteriorando-os ou
Limites "in- As situações subjetivas sofrem uma intrínseca limitação pelo deixando-os arruinar por falta de reparos de conservação".
temos" conteúdo das cláusulas gerais e especialmente daquela de or. :Vgu~s dos comportamentos previstos poderiam também ser
dem pública, de lealdade, de dil~gê~c~a e de ~oa-~é, que se mclmdos no abuso do direito: todavia, o usufrutuário que alie-
tomaram expressões gerais do pnnClpl~_sºbdaried~de.- ? na a propriedade que não é sua não abusa, mas exerce um
ordenamento reconhece a propriedade de um bem, a utul~n. p~de: 9ue não é seu e que o ordenamento atribui ao nu-pro-
dade de um crédito, somente enquanto o direito for exercido pnetano.
emrconformidade com as regras\\se assim não.acontecer, o
int~ressenao sm"üem-reconhecidt> e nem tutelado. Apresen- 83. O chamado direito potestativo. - O chamado direito potes- D' ,
. d' b'" trelto po-
tam-se, assim, duas importantes figuras: o abuso da situação tauvo, lto tam em direito discricionário ou poder formativo, testativo e
representa uma situação subjetiva, cujo exercício determina l1e~cio
~~j.e~v!~ R~~~j
~_~_~c~~~_~~ uma Vi'C' 't Ud e d e uma re Iaçao
lSSl - Jun
. 'd'lca: o Utu
. Iar do chamado um1ateral
82. Abuso do direito e excesso de poder. - O não-exercíci~ e o poder formativo pode unilateralmente constituir, modificar ou
exercício segundo modalidades diversas daqu~las que denvam extinguir uma situação subjetiva, apesar de isso implicar uma
I da função da situação subietiva devem ser conSiderados a.busos. in te~erência na esfera jurídica de outro sujeito, impossibili tado
! Abuso: ;] d de eVitar, em termos jurídicos, o exercício do poder.
exercício O abuso é uma noção que não se exaure na configuraçao os
contrário à limites de cada poder, mas, sim, na correlação (collegamen!o) à Exemplos de direito potestativo podem ser encontrados: no
função do mais ampla função da situação global da qual o poder. e ex. direito de aceitar a herança (art. 459 ss. Cód. Civ.); na comu-
ili~~
pressão. Dele, portanto, é possível apresentar uma vane dd a e nhão forçada do muro (art. 874 Cód. Civ.:quando se verificam
de comportamentos em relação a cada situação e à sua c?ncre.ta as condições prescritas, o proprietário do terreno confinante
função. A sua avaliação é complexa porque postula a venficaçao pode adquirir a co-propriedade do muro de confim e da parte
da existência de interesses contrários juridicamente relevantes do solo ,!ue se .tornou comum; isto é possível com uma simples
que devem ser considerados segundo uma ~qüâ~ime h.arJI.1~ dedaraçao umlateral, sem que o outro proprietário - que
nização, isto é, segundo critérios de proporclOn~ldad~ mdiVl- perde uma parte do próprio direito ~ possa se opor); na ruína
dual e social (v., por exemplo, arts. 833 e 844 Cod. ClV.): . total ou parcial do edificio em comunhão (art. 1.128 Cód. Civ.:
Excesso: O excesso de poder - figura típica e atormentada, ~o direito se um consorte não pretende participar na reconstrução do
exercício administrativo - configura-se não tanto como exerC1ClO contra edificio, os outros - ou um deles - podem unilateralmente
de um po- adquirir a propriedade do consorte que não é concorde); no
der ausente
os tempos e as modalidades do direito subjetivo, mas como
exercício de um poder não atribuído pelo ordenamento e, direito do sócio de retirar-se da sociedade por ações (art. 2.437
portanto, como substancial violação da lei. O fenômeno do Cód. Civ.). Exigências de igualdade substancial, solidariedade
\~'.""f_;~.'-r'
;o -i,
~ <' l
Princípio
1990 e nll 223 de 1991) au a denúncia (recesso) nas cantratas
de lacaçãa (arts. 4 e 79 1. nº 392 de 1978).
A categaria fai elaborada pela dautrina que individuau uma
)/,
1.
n ~uenc!as ~b~m em autras situações deve ter, cama qualquer
sltuaçaa subjetl~a, uma razãO'justificadara que mereça tutela.
de intangi-
série de hipóteses nas quePs um sujeita tem a pader, cam sua
~"'
.~.' Nesta p~rsp.e~tlva recanhece-se a legítima existência de um
bilidade 'C<
'ili. p~d~r_ dlscnclanal e verificam-se uma au mais situações de
das esferas unilateral manifestaçãO'de vantade, de canstituir, madificar au
jurídicas: extinguir uma situaçãO'na qual nãO'é a única materialmente ,
't.."
,'o SUjelçaa em relaçãO' a este poder e aas seus efeitas.
'
crítica h . A.análise can~uzi~a p~rmite afirmar que a maiar parte das Dir. potes-
interessada. Nestas hipóteses seria vialada o princípiO' da inde-
pendência das esferas jurídico-patrimaniais. Segunda este pre- r l
d~rel~aspatesta~vas mdlVIduadas pela dautrina e pelajurispru- tativo e si-
d.encla, na ~ealldade, se justifica na âmbitO' de situações rela- mações co- .
•......
tensa e não-aceitável princípiO', cada um pade exprimir a sua
vantade, campartar-se de um certa mada, desde que os efeitas
de tais atas au campartamentas repercutam exclusivamente
:t
.....•.
,":.
'.
clanadas a mteresses ulteriares e mais amplas. Canstatau-se nexas
"':".
não permitem a individuação de uma consistente relevância a doutrina considera expectativa de fato, na realidade configura
medio tempore uma situação juridicamente relevante.
unitária.
Aquele que à morte de um parente lhe poderi~ suc~der por ~iverso relevo ~su~em, as posições de dois sujeitos que Responsabi-
lei acha-se em uma situação que pode ser defil11da, a luz da estejam na fase prehmmar a conclusão do contrato. A fase das lidade pré-
disciplina das sucessões, expectativa de mero fato, sem reco- tratativas cria entre os contratantes uma situação de expectativa contratual
nhecimento jurídico (o pressuposto da tutela é, de fato, a que o contrato seja concluso. Nesta fase as partes devem com-
aquisição, ex lege ou por testamento, da qualidade de chamado portar-se de acordo com o princípio de boa-fé (art. 1.337 Cód.
a aceitar a herança; isso acontece porém apenas no momento Civ.) e são obrigadas a responder pela não conclusão, semjusta
da morte do sujeito ao qqal a herança se refere, e não antes). causa, do contrato.
Todavia, se se consideram outros institutos, como a interdição Sustentou-se que a situação que nasce da promessa de casa- Promessa
ou a inabilitazione, revela-se a possibilidade de uma tutela, ainda ment~ (art. 79 Cód. Civ.) cria uma expectativa de fato, A ex- de casa-
que indireta, de tal expectativa: será, I?or ex~m~lo.' possí~el,aos Pectativa , ao reves,_
' t e~ re Ievan.claJun
- , . 'd'lca; por exemplo, quan- mento
futuros prováveis herdeiros preservar o patnmol11o da dISSIpa- do .a p~omessa nao e cumpnda sem justo motivo, existe a
ção - à qual o exponha o comportamento do idos~ ~ facul~o~o o?ngaçao de ress~rcimento do dano (art. 81 Cód. Civ.). No
parente que não seja são de mente - recorrendo a mterdIÇao cálculo ~o r~ssarclme~to levar:se-á em conta as despesas feitas
ou à inabilitazione. A tutela, insista-se, é somente indireta, por- e as obngaçoes contraldas, e nao a possível vantagem que uma
que a função da interdição ou da inabilitazione reside nos cui- das partes poderia ter conseguido, mesmo no plano econômi-
Tutela indi- dados à pessoa do interdito ou do inabilitato (cfr. infra, capo c~comerclal, ~aquele casamento. Os promitentes, apesar de
reta ejudi- nao serem obngados ao casamento, são obrigados ao ressarci-
dai 7, ~ 107), e não em manter as expectativas patrimoniais de se~s
parentes. Diverso é o caso do pai que conclui. uma, venda SI- mento (dito negativo) do dano.
mulada: o filho tem interesse em fazer declarar ImedIatamente Igualmente interessantes e freqüentes são as hipóteses dos. -
, . b'd . - Sltuaçoes
que aquele ato, na realidade, não é venda, mas doação, p~~ negocl~s su meti oS,a condlçao ou a termo. Um contrato pode instrumen-
bloquear os eventuais direitos que o~ terceiros, p.ossam.a~qUl.nr ser estip~l~do tam~em subordinando, total ou parcialmente, tais
daquele ato, O poder do filho herdeIro necessano (legzttzmano): a sua eficacla ao venficar-se de um evento futuro e incerto (art.
art. 536 ss. Cód. Civ. de impugnar as doações feitas pelo pai 1.3~3 ss. Cód. Civ.). Ora, ~ necessário estabelecer se a estipu-
(art. 553 ss. Cód. Civ.) pressupõe que seja declarada a simulação l~çao .de. u~ .contrato asSIm configurado cria, ou não, uma
da venda: ato simulado com o qual o pai tenta subtrair o bem slt~açao ~undlcamente relevante; se medio tempore, isto é, da
à ação que o filho pode exercer sobre a doação. Apesar de o estipulaçao do contrato à verificação do evento colocado em
filho poder exercer a ação de redução da doação som.ente condição, existe uma situação tutelada. Foi mesmo em relação
depois da abertura da sucessão (no nosso exemplo, depOiS da a essa hipót~se que a doutrina elaborou e aprofundou a figura
morte do pai), existe quem seja orientado a atribuir ao herdeiro da ~xpectativa. Quem contrata sob condição não alcança, na
necessário (legittimario) o direito de agir para fazer declarar a reahdade,.o res~ltado previsto no contrato, porque ele depen-
simulação (art. 1.414 ss, Cód. Civ.) mesmo antes da morte do de da venficaçao do evento futuro e incerto. Isso não basta
de cuius. Desse modo, a eventual declaração judicial da simu- para excluir que o interessado seja titular de uma situação de
lação poderá servir quando, morto o de cuius, se poderá im- espera tutelada pelo ordenamento. O contrato sob condição
pugnar a doação. Uma coisa é demonstrar, com testemunhas é uma hipótese na qual o resl.lltado definitivo não se verifica
no momento da estipulação do contrato mas sucessivamente'
e provas, pouco depois da realização do ato, que este não é . ~ . "
~a medto tempwe, contudo, a parte é titular de uma situação dita
uma venda, mas, sim, uma doação; outra é demonstrá-lo muitos
anos depois da morte do de cuius. Portanto, esta hipótese que mstrumental, isto é, de meio para a atuação final (cfr. infra,~
Capítulo sexto Aspectos das situações subjetivas e das relações 129
128
99). Pode ser tutelada não apenas em relação à outra ~arte obrigação para o oficial público (art. 2.671 Cód. Civ.) que
(arts. 1.358 e 1.359 Cóq. Civ.),. mas também em relaçao a estipulou o ato. O mesmo comportamel).to cria duas diversas
terceiros, de maneira que ao verificar-se do evento colo~a~~ situações subjetivas: para o oficial público, a obrigação da trans-
em condição, o titular dessa situação instrumental adqumra crição (arts. 2.671, 2.674, 9 2, Cód. Civ.), para o sujeito cons-
automaticamente a situação final. tituído, ao contrário, a simples possibilidade de transcrever.
Este último, se transcrever, pode alcançar um resultado a ele
85. ônus: dito obrigação potestativa. - O ônus pode ser ~efi- favorável (art. 2.644 Cód. Civ.), mas se não transcrever, não é
nido - com expressão de conveniência - como uma o~n_ga- sttieito a sanções pecuniárias; conseqüência, esta última, pre-
ção potestativa, no sentido ~e que .0 seu titul~r ~ode r~ahza-Io vista para0 oficial público (arts. 2.671, 9 1, 2.674,9 2, Cód.
Situação
pa$siva ou não. Poder-se-ia,justamente, objetar que nao e POSSIVel falar Civ.; e também, especificamente para os tabeliães, arts. 51 e
de obrigação ôu de dever deixado à discricionaried~d~ do 137 1. n2 89 de 16 de fevereiro de 1913), o qual é também
sujeito obrigado, de maneira que falte a um out:0 sUJ.e.ltoo civilmente responsável pelas conseqüências danosas (arts.
direito de exigir o adimplemento. A confi~raçao u~hza~a 2.671, 9 1, 2.674, 9 2, Cód. Civ.).
;:yudaa evidenciar que existem situações pasSIVa:'q~e na~ Vl?-
culam o sujeito titular o qual, com ba,:;enu~a pro~n~ avalIaçao
discricional, poderá exercê-las, ou nao. O onus nao e somente
uma" obrigação potestativa" deixada ao arbítrio do obrigado,
86. Poder jurídico (potestà) como direito-dever. - Uma situaçãq
híbrida que não pode ser reconduzida às situações subjetivas'
tradicionalmente definidas ativas e passivas éa potestà. A potestà,
dos pais (pátrio poder) (art. 315 ss. Cód. Civ.), a tutela (arts,:
í
antes, representa uma situação instrumental para alcançar um
resultato útil (interesse) do titular. .
357 S., 360 sS.,419, 9 3, 424 ss. Cód. Civ.), a curatela (arts. 48,
334,9 2, 392, 419, 9 3, 424 sS.,486, 9 2, 528 ss. Cód. Clv.), as
~'!
:••.. -.~ c..
daquele do herdeiro" (art. 490, 9 1, Cód. Civ.) e é o remédio nadas potestà. Esta constitui um verdadeiro oficio, uma situação Poder-de-
"
ao qual o chamado a aceila;r aAh~rança r~c?~e ~ em. geral - de direito-dever: como fundamento da atribuição dos poderes", ver no inte-
quando duvida que o patnmomo heredltano se}a atlv?. Para .
eXIsteo. d ever dAI
e exerce~ os. O exerClClO
,. d a potesta,-nao .e- l'lvre,. trem
resse de ou-
conservar o beneficio é necessário proceder ao Inventano no arbitrário, mas necessário no interesse de outrem ou, mais
prazo estabelecido pel~ lei, s~~ pena de ~ec~dência (art ..484 especificamente, no interesse de um terceiro ou da coletivida-
ss. Cód. Civ.). Fazer o Inventano - nas hlpoteses normaiS - de. Assim, o tutor não é titular de uma situação subjetiva no
pode ser considerado não.um~ simples o.brigaçã?, mas,. sim, seu interesse, mas, sim, de uma situação composta de poderes
um ônus, isto é, uma obngaçao potestatlva no Interesse do - administrar os bens, cuidar e representar o menor (art. 357
Sujeito one- °
titular da situação subjetiva.
mesmo comportamento pode ser configurado para um
rado ou sujeito como ônus e para um outro como obrigação ..Os a~os
Cód. Civ.) - e de todos,()s deveres que àqueles poderes se
relacionam (arts. 362 ss., 367 sS., 377 ss. Cód. Civ.), aos quais
é obrigado no interesse do menor e, mais genericamente, da
obrigado
que modificam, constituem, extinguem ou regulam sltua~o:s coletividade que vê na tutela do menor um interesse seu. Por-
reais imobiliárias são submetidos à publicidade da transcnçao tanto, o oficio deve ser realizado de acordo com as regras da
(art. 2.643 ss. Cód. Civ.). Sem se fixar na letra do Código (ar~ diligência (art. 382 Cód. Civ.), da lealdade, da boa-fé. A potestà
2.643), que daria a impressão de atribuir:-Ihenatureza de obn- é, portanto, uma situação complexa, que atribui não simples-
gação, pode-se ver na transcrição um ônus para as partes, ou mente poderes, mas deveres que devem ser exercidos no inte-
para o particular, constituídas no ato e, ao mesmo tempo, uma resse (não do titular da potestà, o tutor, mas) do representado,
130 Capítulo sexto Aspectos das situações subjetivas e das relações 131
Múnus de Ao lado das diversas normas de tutela e de curatela, o Código , É neces~á~o, p~r~nto, ~rm~r a existência desta figura tam-
Direito Civil Civil prevê hipóteses - que não define como potestà - nas bem no. ~I.reIto Cl\;l e eVidenCIarque o interesse legítimo do
quais ora se atribuem alguns deveres, no pressuposto da atri- qual o CIVilIsta
fala e sempre correlato à potestà. A conseqüência
buição ou do reconhecimento também dos relativos poderes, deste :nfoque é relevante. Tome-se, como exemplo, o tutor
ora se atribuem direitos com a obrigação de exercê-los. Situa- que nao exerce o seu ofício em conformidade com o interesse
ções, estas, que se encontram em alguns sujeitos ou órgãos de ~o menor .e in.vest~, v.g., o dinheiro que deve administrar em
pessoas jurídicas que têm o dever-direito de intervir, de realizar tItulo~ ~bngaclOnals (art. 2.410 ss. Cód. Civ.) ou em depósitos
determinados atos, de comportar-se de determinado modo. bancanos (art. 1.834 ss. Cód. Civ.) sem levar em consideração
Por exemplo, o conselho fiscal (collegio sindacale) nas sociedades a de~re~iação monetária, de maneira que o menor, alcançando
por ações (art. 2.397 ss. Cód. Civ.) tem o dever de controlar a
~ ~alOnd~de, entr~rá na posse de uma soma com poder aqui-
atividade dos administradores. Apesar de o Código falar de
SIUVO mUlto redUZido em comparação àquele que tinha no
deveres (art. 2.403 ss. Cód. Civ.), a tal órgão são relacionados
mo~ento do depósito. O sujeito que é titular de um interesse
necessàriamente também poderes e direitos que permitem o
qualIficado pode propor ao tutor melhores investimentos e na
cumprimento daqueles deveres. Tal função consiste na reali-
hipótese de resposta negativa, como titular de um interesse
zação de um direito-clever.
legítimo, pode propor uma ação contra o tutor solicitando a
Existem, portanto, ofícios de direito civil. Os seus titulares
verificação (accertamento) da validade dos inve~ti:Uentos.Os in- Illterven-
_ sujeito único ou colegial- que não obedecem de modo
teresses podem ser os mais diversos, patrimoniais e não: o ção no
exaustivo a esta função são responsáveis pelo seu comporta-
irmão, que não quer ver depauperado o patrimônio do menor exercício
mento negligente (v., por exemplo, o art. 2.407 Cód. Civ.), sob . d' do poder
ou O Uo em esta o de neceSSIdade que espera a maioridade jurídico
pena de decadência ou de revogação (arts. 2.399, ~ 1 e 2.400,
para pedir-l~~ alim~ntos (art. 433 ss. Cód. Civ.). A figura do
~~ 1 e 2, Cód. Civ.).
mteresse legtumo nao se exaure no aspecto processual, poden-
do ter relevância também em atividades de gestão voluntária
87. Interesse legítimo no direito civiL - É necessário a essa altura
.(e por. v~~es não totalx:?'ente~oluntcí:ria) do patrimônio por
resexvar alguma atenção à individuação da situação subjetiva
ImpOSSIbIlIdadetemporanea e impreVista do tutor. O interesse
que a potestà cria em outros centros de interesses. O menor, os
legí~mo atribuído ~ determinados sujeitos permite que sejam
credores do falido, os sócios, na hipótese em que os ofícios
consl~era~os ter~elros qualificados, isto é, interessados a que
que lhe dizem respeito não sejam, segundo a própria opinião,
o OfíCIOseja realIzado de modo vantajoso para o menor.
exercidos corretamente e com diligência, podem intervir para
Mais fácil de compreender é o aspecto do interesse exis-
que o juiz verifique a lealdade e a diligência utilizada no exer-
tencial do :nenor ..Tome-se, como exemplo, o menor que tenha
cício da atividade. Correlativamente à potestà se apresenta. a
um~ relaçao .af~Uv~com outra p_ess~a .. O tutor poderia, por
situação denominada interesse legítimo.
Situação razoes pessoais lllspIradas pela propna Visãodo mundo, obstar
A potestà, .que no Direito Administrativo cria a figura do
correlativa a.possibili~ad~ de um encontro amigável deles. Ajurisprudên-
ao poder interesse legítimo tutelado em sede de jurisdição administrati-
cla tem atnbUldo ao menor o direito de freqüentar as amizades
jurídico va, no Direito Civil configura um ofício ao qual corresponde
o interesse legítimo de um ou mais sujeitos, acionável em sede que considera mais oportunas, desde que não sejam claramente
de jurisdição ordinária. Será justamente esta situação que per- ~e "mau exemplo". Do mesmo modo, no que diz respeito ao
mitirá, em mais de uma ocasião, a concretização de certas upo de estudo que o menor queira empreender.
formas de tutela- mormente em tema de desenvolvimento Ao menor, porém, não é reconhecida a capacidade proces-
sual (que cabe ao tutor): quando existe um contraste entre
~~~ .,
da_~essoa humana - e sua justificativa de um ponto de vista
menor e tutor, o legislador intervém com a figura do curador Controle
!
i
132 Capítulo sexto Aspectos das situações subjetivas e das relações 133
.especial para que o assista em relação ao interesse e~ conflito Uma segunda orientação entendeu o status como um "estado o status
(art. 360, ~ 2, Cód. Civ.). O titular do interesse legitImO, q,ue como vín-
de vínculo onde se encontra o indivíduo no agregado". Na culo do in-
como se falou pertence a terceiros qualificados (art. 321 C<:>d. 'base está a concepção que individua algumas comunidades divíduo a
Civ.), pode vigiar- até com o próprio comportamento atIvo originárias (Estado, família) sobreorderiadas relativamente ao um grupo
em juízo - para que a potestà seja exercida no interesse do indivíduo. O status exprimiria a posição (subordinada) do in-
menor. divíduo nestas comunidades: os status seriam, portanto, somen-
te dois: status civitatis e status jamiliae. Se bem que a teoria
88. O status na doutrina italiana. - No âmbito da problemá- fizesse referência aos tradicionais status do direito romano, a
tica das situações subjetivas enfrenta-se, geralmente, o tema do intenção principal residia em exprimir a superioridade do gru-
status ao qual a doutrina reservou uma alternada atenç~o. O po relativamente ao indivíduo; isso comportava uma concepção
'maior perigo reside em realizar inoportunas generalizaçoes e, publicista (de superioridade do direito público em relação ao
portanto, em individuar uma noção vaga e genérica de status direito privado): não somente a cidadania, mas também o Di-
na qual inserir realidade e situações muito diversas entre si: reito de família era visto como matéria de Direito público ou,
renunciando assim a colher as particularidades de cada jattt- de qualquer modo, superior ao Direito privado visto de u!U
specie. . . _ _ ponto de vista tradicional, ou seja, como lugar da senhoria q'a
o status . De acordo com uma .primeira onentaçao, o status nao re- vontade. A inaceitabilidade das premissas de tal teoria no atuai
como crité- preséntaria uma autônoma situação subjetiva, antes um "crité- ordenamento constitucional é evidente: a concepção do statUs
rio.de eco-
nomia legis- rio de economia legislativa",um ••meio de técnica jurídica" .
O status de cidadão, por exemplo, não teria, segundo esta
deve moldar-se ao seu conteúdo e
ao interesse ou' valor q1.fe
latiV"d representa no vigente ordenamento. A distinção entre público
teoria, nenhum conteúdo' autônomo: "status" faria referência e privado está em crise (cfr. retro, cap.' 3, ~ 37). A concepção
simplesmente ao complexo das normas e dos efeitos l~gado_sà criticada, ao contrário, não somente exclui que o conteúdo
nacionalidade. Esta perspectiva reduz o problema das situaçoes possa definir o status, mas identifica o seu fundamento na razã.:"9
subjetivas em geral a uma questão de nomenclatura e, mera- de Estado ouna razão de família, isto é, em pretensos interesses
mente, de linguagem. Ela entende negar que do levantamento superindividuais desses agregados. A Constituição efetuou'~
dos dados normativos - que atribuem um conjunto homogê- escolha oposta, colocando as formações sociais - entre eLaso
neo de podere~, deveres, etc. em função de tutela de um inte- Estado e a família - em posição serviente à pessoa (cfr. retro,
resse ou de um valor - possa derivar a construção de uma capo 3, ~ 24 e infra, capo 9,'~ 156).' .
situação subjetiva' autônoma (6 status), ainda que exista a pos- Uma terceira orientação estendeu notavelmente o conceito o status
sibilidade de obter uma sentença ~specificamehte voltada a de status. Em relação à posição precedente notam-se duás va- como quali-
verificar a titularidade da situação. E uma teoria criticável: ela riações: o status, em primeiro lugar, não é considerado como dade pessoa
da
não conside~ que o status precede, de um ponto de vista lógico a posição do indivíduo no agregado, antes, como uma conse-
e, sobretudo de um ponto de vista funcional, as ações colocadas qüência do fato de que o indivíduo pertence ao grupo, e, em
à sua tutela. Trata-se de um interesse ou valor juridicamente segundo lugar, os estados pessoais não são mais somente dois
relevante, de um conteúdo próprio, não de um mero recipiente (civitatis e jamiliae), mas podem ser muitos e de variadas im-
de previsões normativas. A concepção lingüística aqui criticada, portâncias, "de acordo com o alcance das relações jurídicas
que tende a excluir da própria análise qualquer momento que que a eles se relacionam" . O status é, segundo essa orientação,
privilegie o conteúdo sobre a forma (contenutistico) e teleológi- simplesmente uma qualidade da pessoa: qualquer real ou apa-
co, representa uma metodologia própria do formalismo (cfr. rente qualidade da pessoa, independentemente darelação com
retro, capo 4, ~ 42). uma comunidade ou agregado social. Isso conduz a uma no-
Aspectos das situações subjetivas e das relações 135
Capítulo sexto
134
tável extensão (até chegar a um excessO de generalização) do formação da pessoa física - não se identifica com a capacidade
conceito: considera-se status a qualidade de herdeiro, de tutor, que se adquire co~ o nascimento (art. 1 Cód. Civ.) e se perde
de hebreu, de empresário, de comerciante, de trabalhador, de com a morte:<:le e a tradução subjetiva de um valor objetiva-
aposentado, de consumidor. Resulta com evidência o peri?"o mente 5utelado, desse-modo não-dispol1ível, modificável ou
de aceder a enfoques neocorporativos. A noção de status, assIm cont~s.tavel.Todo homem é, como tal, titular de situações exis-
entendida, identifica-se com a titularidade de qualquer situação tencI~ls representadas. no status personae, das quais algumas
adquirida pelo sujeito na sua vida de relação, perdendo em P!escmdem das capacidades intelectivas ou pelo menos de
determinação e em utilidade prática. algumas formas de inteligência comumente entendida. De um
É preciso, sobretudo, aVq.liarestas orientações em relaç~o ao ponto .de vista do conteúdo, o status personae tem função de
Status e
princípio princípio de igualdade (cfr. retr~, capo 3, ~ 33). A afin:n~çao ~o garanua expressa por uma cláusula geral de tutela (art. 2
de igualda- princípio de igualdade formal urou dos estados o ongmal sIg- C0r.t-st.)e por uma série de previsões explícitas: por um lado,
de o dIreIto de pro:essar liv:emente a própria fé religiosa (art. 19
nificado de "condição social" , evidenciando a igual dignidade
das pessoas. O princípio de igualdade substancial legitima es- Const.), de mam~festar.h~remente o próprio pen~_amento(art.
tados diversificados, libertadores para a pessoa e reequilibra- 2~ Const.), de agtr emJUlZOpara a tutela dos próprios direitos
dores de justiça. Do status como categoria abstrata e neutra e mt~resses le?,ítimos (art. 24 Const.); por 0titro lado, agarantia
chega-se a uma noção instrumental de status, como técnica de nao ser pnvado da capacidade de direito, do nome (art. 22
idônea para criar ou dar tratamentos desiguais, estatutos sin- Const.) e da liberdade pessoal (art. 13 Const.), aresenra'de lei
gulares. Assim, pode-se falar de status de tabelião, demagist:a- para as prestações pessoais (art. 23 Const.) e para as medidas
do, etc., mas uma coisa é a qu'alidade da pessoa (sexo, nacIO- de segurança (art. 25, ~ 3, Const.), o juiz natural e a irretroa-
nalidade), outra é a função exercida ou ainda mais atitulari- tividade da nonna penal (art. 25, ~~ 1 e 2, Const.), o caráter
dade da função. O uso do status reservado a ambas as hipóteses voluntário e os limites do tratamento sanitário (art. 32, ~ 2,
exige a consciência do diverso significado que elas têm. Por Const.).
Diversida-
de de signi- conseguinte, de uma noção unívoca de status, à qual uma parte O status personae, portanto, constitui uma situação perma-
fi<:ados da doutrina propende, deve-se chegar a um uso polivalente. ,~ente _de b~~,. originariamente adquirida, que resume, como
Trata-se, portanto, de individuar e catalogar, ainda que de sltuaçao umtana e complexa, os direitos "invioláveis" e os de-
forma aproximada, os vários significados atribuídos ao status e veres "inderro~veis", ~íP.icose atípicos, conexos, segundo o
a sua diversa relevância jurídica, de maneira que se possa pro- ~rdenamento VIgente, a VIda do homem na sociedade civil: as
por uma distinção que não seja simplesmente formal e descri- sltuaçõ~s s~bjetivas que o compõem são diretamente (e não
tiva, mas, sim, fundada nos conteúdos e na função. ~penas mdlretamente) funcionalizadas à satisfação das neces-
s~dades existenciais. Sob esse aspecto ele tem uma autonomia
89. Status personae. Em um primeira e fundamental acep- absoluta e pode .' prescindir de qualquer outro status. O status Con fi19ur.t_
ção, o status se configura como estado do homem relevante P ,!!sonae e:cpnme um ser:tle representa a pessoa. Como situa- ção subjeti.
em si: valor primário e unidade de direitos e deveres funda- çao;expnme a condição global da pessoa configurada em um va de um
. _. d' valor
mentais (art. 2 Const.) da pessoa, considerada seja singular- momento Illstonco o seu desenvolVImento e, à diferença da
mente, seja nas formações sociais onde se desenvolve a sua capacidade -:- aptidão à titularidade e, portanto, forma neutra .
05. pcmr personalidade. O status personae exprime a -posição jurídica da subjetividade -, representa a configuràção subjetiva de um
ntU: tr.tduz
unitária e complexa do homem em uma determinada socieda- valor, ?~seus necessários e não apenas potenciais conteúdos
o valor da
pessoa em de civil, adquirida desde o momento da sua existência como eS~enC1aIs.Neste aspecto, não é concebível um status personae
situ~ções valor humano. O status personae - contextual à concepção e à mais perfeito do que um outro.
subj.
Aspectos das situações subjetivas e das relações 137
Capitule sexto
136
deveres que em função de tais qualificaçõe~ competem aos seus
90~Status civitatis. - O homem, no momento em que par-
titulares. Assim, a mesma pessoa. pode assumir também cumu-
ticipa de uma organização política estatal, assume o statuS eivi-
lativamente mais. de uma qualificação,-como na hipótes~ de
tatis, isto é, o estado de cidadão como autônoma situação sub-
fiUío natural e de filhô adotado. Por outro lado, não todos
jetiva complexa constituída de direitos e-deveres: ó eleitorado
esses estados pessoais podem ser relacionados à comunidade
(art. 48 Const.), a admissão aos oficios públicos e aos cargos
familiar, entendida como comunidade fundada no casamento
eletivos (art. 51 Const.), o direi to de petição às Câmaras (art.
(tome-se, como exemplo, a filiação natural). A observação in-
50 Const.), os deveres do serviço militar (art. 52, ~' 2 Const.),
duz a considerar os estados pessoais não necessariamente como
das contribuiçôes fiscais (art. 53 Const~) e da fidelidade à Re-
~tat~ jami!iae - portanto achatados pela única, genérica e não
pública (art. 54 Const.) .• ll1dispensavel qualificação - mas. no seu específico caráter
o estran- Quem, ao contrário, não tem o status civitatis - ou porque
geiro tem apólide (art. 16 L n2 91 de 5 de fevereiro de 1992, sobre a
normativo extraído do conteúdo e da função. Mésmo a vicis-
o status per- cidadania italiana) ou porque estrangeiro (v. art. 2 ss. d,P;R. situde ~~n~titutivado status varia de caso a caso. De regra, título
sonae
n2 .,572 de 12 de outubro de 1993) - não tem os 'direitos e de aqUlsiçao do estado pessoal civil éum especial ato público,
o ato de estado civil: ato d~ nascimento (art 236 Cód. Civ.),
.deveres do cidadão, mas conserVa sempre o status personae.
ato:da celebração de casamento (art. 130, ~ 1 Cód. Civ.), r~-
Nesse aspecto, a norma (art. 16, ~ 1, dispopre1. Cód. Civ.) que
conhecimento do filho natural (art. 89, n21, r.d. n2 1.238 de
atribui ao estrangeiro" o gozo dos direitos civis" em condições
9 dejulho de 1939 - .ord. st. civ.), sentença do juiz (em teni-~
de reCiprocidade (vale dizer: somente se análogo direito for
de adoção: art. ..25, ~ 1, 1. n2 184 de 4 de maio de 1983' ar'&.
reconhecido pelo Estado estrangeiro ao cidadão italiano) deve-
. 298 e 313 Cód,.Civ.). Do título constitutivo do statusdistin~e-s~
se referir aos direitos civis "atribuídos ao cidadão"; o estran-
a posse de estado que é, segundo as hipóteses; elemento sanante
geiro, como homem, terá as garantias que se relacionam. ao
dos defeitos de forma do título de estadó (art. 131 C<>d.Civ.).
status personae. Uma diversa interpretação do art. 16,'~ 1, dispo
e prova legal do fato do qual depende o nascÍmentodo estado
pre1. contrastaria com a normativa constitucional, pela qual a
pess~al civil: assim, a filiação pode ser' pro~da com a posge
tutela do homem, como tal, não é condicionável nem mesmo
continuada deduzida de uma série de fatos; tipicam~nte indJ.-
por razão de reciprocidade de tratamento (assim já o art. 3
cados pela lei (arts. 236, ~ 2, e 237 Cód. Civ.); o estado d'e
dispo pre1. Cód. Civ. de 1865). cônjuge pode ser deduzido, ainda que somente em determi-
nadas' hipóteses, do fato de que duas pessoas "tenham publi-
91. Status familiae e status pessoais civis - Mais complexa,
camente vivido como marido e mulher" (arts. 130, .131 e 240
articulada e específica é a noção de status nas, relações, em
Cód. Civ.).
sentido amplo, familiares. A qualificação de status jamiliae é
Por conseguinte, a individuação do conteúdo do status re- ~tatus fami.
pouco condizente, não se caracterizando de modo unívoco, . 1" b harestalus
presenta um jmus 0gtco,esu stancial, não desprovido de re- da pessoa
seja pelos aspectos substanciais, seja pelos instrumentos e meios
levância social, relativamente à individuação das ações coloca-
processuais: ela assume um significado descritivo em relação à
das para a sua tutela. Se o árt. 2 Consto reconhece e garante
possível posição de um sujeito no âmbito de uma determinada
os direitos invioláveis do homem quer como indivíduo, quer
comunidade familiar. Muito mais útil, ao revés, é a individuação
nas formações sociais onde se qesenvolve a sua personalidade,
da concreta posição do sujeito, entendida como autônomo e
não há razões para atribuir aos direitos que cabem ao indivíduo
qualificado efeito jurídico relacionado a uma específica fatti-
Plurnlida- como membro da "família'! uma natureza diversa daquela que
speeie ou às circunstâncias objetivas previstas' pela lei. Filho
de de s/a- cabe ao indivíduo como pessoa. A indisponibilidade do stCúus
tusfamilia- legítimo, legitimado, natural reconhecível; adotado, são situa-
pessoal não deriva da natureza pública da família, mas do
res ções distintas, conceitualmente autônomas dos direitos e dos
'lI
'" Capítulo sexto Aspectos das situações subjetivas e das relações 139
l '
138
li significado de ordem pública q';le assu~e. o li~e e pl~no de- dos cidadãos (art. 3, ~ 1 Const.): estes têm o dever de trabalhar
i senvolvimento da pes~oa: essa ClrcunstanCla nao permIte .que "segund~ as próprias possibilidades e as próprias escolhas"
I,J,
lo tais estados sejam objeto de transações ou de compromlss.os (art. 4, ~ 2 Const.) e o poder de se organizar livremente em
.1 arbitrais (art. 806 Cód. Proc. Civ.) e requer, nas causas relaclO- sindicatos (art. 39, ~ 1, Const.) sem natureza pública ou estatal.
i~ Se este é o quadro normativo, não obstante o reaparecimento
j nadas com o estado, a intervenção do Ministério Público (art.
I 70, nl!3 Cód. Proc. Civ.). Assim, as ações de estado, que tendem de instâncias neo-corporativas, o papel do status profissional,
em via principal a reclamar, contestar ou modificar os estados que é sempre adquirido, modificável e, freqüentemente, de
:1 fato e de direito, acumulável, perde em grande parte a sua
pessoais, de regra, são imprescritíveis quando a pessoa age para
afirmar a veracidade do próprio status (arts. 248, ~ 2, 249, ~ 2, principal razão de ser, exprimindo uma qualificação que com-
270, ~ 1, Cód. Civ.; não' assim o art. 244, ~~ 2 e 3, Cód. Civ.) pete ao sujeito e que é adquirida de uma vez por todas de
e são prescritíveis quando o legitimado age para contestar ou modo formal, com enquadramento nas chamadas funçôes
modificar o estado de outrem. (tome-se, como exemplo, a Administração Pública), ou a pos-
Qualidades Deve-se precisar que nem todas as qualidades pessoais cons- teriori, depois de uma atividade exercida (v., por exemplo, art.
que não in- tituem status pessoais civis, nem são destinadas a influir neces- 2.082 Cód. Civ.). Em ambas as hipóteses, todavia, trata-se de
cidem so- qualificaçôes não-incidentes sobre a qualidade pessoal, mas
bre o status
sária e diretamente nestes últimos. Nesta ótica, o sexo, que
certamente não incide sobre o status personae, nem sobre aquele úteis para evocar um determinado tratamento normativo e para
de cidadão (art. 3, ~ 1, Const.), não pode ser considerado um justificar comportamentos de favor para alguns deles (arts. 1,
status pessoal "civil": ele, mesmo resultando do ato de nasci- ~ 1 e 35, ~ 1, Const.). De maneira que os estatutos singulares
mento (art. 71, ~ 1, r.d. nl! 1.238 de 9 de julho de 1939), não - no sentido esclarecido -, que cada status profissional poderá
se modifica mediante ação contenciosa de estado, mas com o ter, deverão sempre atender, sem perturbações, à hierarquia
procedimento camerale de retificação .(art. 1 ss. 1. n~ 164 de 14 dos valores e às finalidades de justiça social que caracterizam
de abril de 1982). O que não exclm que a questao do sexo o ordenamento constitucional (arts. 2 e 3, ~~ 1 e 2, Const.).
tenha os seus reflexos em questões de estado; ele, por exemplo,
influi indiretamente no particular status de cônjuge. 93. &tados pessoais patológicos. - Com outro significado, fala-se Condições
de estado naquelas hipóteses que se relacionam a fatos na maioria patológicas
92. Status profissionais. - O uso da noção de status para das vezes episódicos, contingentes, mas de qualquer modo pato- ou episódi-
indicar um estatuto normativo profissional e, mais amplamente, lógicos, devidos a motivos psicológicos, morais ef ou materiais, cas
a qualificação que o sujeito assume no mundo da produ00 e que de regra não modificam a condição pessoal (estado de perigo
i l Categorias do trabalho, tem natureza e significado completamente dIver- ou lesão [stato di bisogno]: arts. 1.447 e 1.448; estado de necessi-
, 1: profissio- sos. Fala-se de status econômico e normativo; distingue-se o dade: art. 2.045; estado de incapacidade: art 2.046 Cód. Civ.),
'I
nais
:1 I
status do trabalhador subordinado daquele de trabalhor autô- salvo que não tenham ou adquiram uma certa estabilidade in-
;'"j nomo; faz-se uma menção de status também a propósito do fluente na idoneidade para a realização de uma série de atos e
i'~ 1;1
íú empresário, quando se fala de artesão, coUivatQTe diretto, etc. ": de atividades (por exemplo, o estado do interdito: art. 414 Cód.
fi!i idéia do status profissional e a conseqüente tentativa de subdI- Civ.) e, de qualquer modo, na possibilidade de desenvolver ade-
:',l
vidir os operadores econômicos e os trabalhadores em catego- quada e livremente a própria perSonalidade (por exemplo, o
I"j
estado do abandonado: art. 81. nl! 184 de 4 de maio de 1983; o
\t" li:'
J
li
"r,
"
:1 rias - quando historicamente se traduziram em enqu~~ramen-
tos segundo critérios rígidos e autoritári~s -: proplcl.a~ _o surdo-mudo e o cego não suficientemente autônomos: art. 415,
II
li.
,:1:,
':1
Igual digni-
dade
sistema corporativo. Na atual ordem consutuclOnal, a dlsUnçao
por" condição social" não invalida a "igual dignidade social"
~ 3 Cód. Civ.). Igualmente relevante a este fim são os estados
biológicos particulares - não necessariamente patológicos, mas
f ~
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Ii ~
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"
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Capítulo sexto
Aspectos das situações subjetivas e das relações 141
140
_ incidentes na normal potencialidade do sujeito ou em via A obri~~~.~~.~~sentaria c£.~?_a situação relativa por exce-
transitória como, por e,xemplo,a gravidez, oUem via definitiva e lência, que encerra as situações dodeVeaor e"d6-credor como
irreversível, como a invalidez permanente. A Constituição, em i.~~um~p~.r~,~~~~~e'l1? in~~ri;~r£io@~~Ci.~~Ei~ção r~cebe
; ,
propósito, mesmo em sede de tutela do trabalho, fala em geral ~SenLHl!~q,?~r:_E~I.<:~~~!~_~mx~taç~9_4.Q __ ~extçrI!Q.~
de "inapto" e "deficiente" (minorato) (art. 38, ~ 3). Os estados '~~19~lI:Q.~~ Outras sItuaçoes, como a empresa e a propriedade
em questão postulam uma verificação de mérito e são pressupos- privada seriam absolutas porque não teriam como centro de
tos de possíveisdisposições concementes à validade e/ou à ava- int~resses contraposto uma situação ~ete~ina~ maS a gen..:=.
liação de cada ato e atividades realizadas pelo sujeito ou ao estado E"~~ os mem ros a sociedade, toaos IguãImente graVãaos
pessoal, como as hipóteses de interdição, de inabilitazione e de \-~, u~o.£l~~~~_de~~~~~e~nç~~ ,: _C:!~_.~~<.?
i?.z~.I:{~Quando se-'-
adoção. Eles não são expressões de normalidade, mas estados tenta m<:tlVlduarde tal moao as SItuações absolutas, se é obri-
patológicos e, de fato, influentes de maneiras diversas na ativida- gado a limitar a investigação à propriedade, à iniciativa econô-
de humana. Servindo como paràmetro de valoração do ato, eles mica e aos chamados direitos da personalidade. Isso porque
podem justificar indiretamente, quando assumem uma fisiono- mesmo entre os direitos reais diversos da propriedade é possível
mia crônica, medidas que incidem sobre o estado pessoal, visto notar em contraposição a cada um deles um centro de inte-.
como estatuto normativo: sentença de interdição (art. 418 Cód. resses já indiyi!J!1aQ..Q:...
ao usufrutu~rio contrapõe-s;;- o nu-pro-
Civ.)ou declaração do estado de adotabilidade (art. 8 ss.I. nº 184 prietário, ao~uIar do_~E!"~.i!9_<le_s~ryiQ.ão,_o titular'dn peso n~
de 1983). qual conSIste a servidão e assim por diante ..
Pode-se fundar 'a disti~çã{;-;r'ít~~~ft~açÕ~sabsolutas e rela-
94. Situações absolutas e relativas. - A distinção entre situações tivas na estrutura se se considera que existem algumas situações
absolutas e relativas freqüentemente é identificada injustamen- subjetivas que encontram a sua relação ou contraposição em
te com aquela entre situações reais e situações de crédito. Tal outro centro de interesses determinado a priori, e outras que
identificação é desmentida pela mesma doutrina tradicional a encontram a posteriori: as primeiras podem ser denominadas
quando especifica que existem direitos não-patrimoniais, os situações que têm uma estrutura intema; as outras, situações
chamados direitos da personalidade, que seriam absolutos ape- que se exaurem em um interesse em relação a todos. A distinção
sar de não serem reais. entre situações com situação correlativa determinada a -ftrjori Estrutu:-,
. . . In • determma-
Eficácia e Esta distinção freqüentemente é baseada na eficácia ou na ( estrutura mterna) e a postenan
oponibilida-
(estrutura relevante somente da a priori
de
oponibilidade: a situação absoluta seria aquela eficaz - ou ao extemo) não corresponde todavia à classificação tradicional e! a posteriori
oponível - em relação a todos, aquela relativa seria eficaz - dos direitos reais e de crédito. Se a propriedade está, de fato,
ou oponível - somente em relação a determinados sujeitos. entre as situações a posteriori (ao proprietário não se contrapõe
Objetou-se que eficácia e oponibilidade são aspectos do fato um centro de interesse predeterminado; a relação específica
jurídico e não da situação subjetiva. Já foi evidenciado que a será individuada a posteriori, no momento em que um sujeito
eficácia se relaciona ao fato (cfr. retro, capo 5, ~ 64); o assunto violar ou tentar violar a situação do proprietário), os chamados
não é diverso para a oponibilidade: ela refere-se ao conheci-
direitos reais limitados apresentam dificuldades: o usufruto,
mento, ao regime de publicidade; e o objeto da publicidade
por exemplo, tem uma estrutura interna (existe uma contra-
não é o efeito (isto é a situação subjetiva), mas o fato do qual
posição precisa entre usufrutuário e nu-proprietário), mas é
se origina o efeito (arts. 2.643 sS.,2.827 SS.,1.153 ss. Cód. Civ.).
O critério discretivo mais convincente é aquele da estrutura. sempre uma situação que tem uma relevância extema, já que
Estrutura
As situil~õ..,ÇsJ_eIativas
seriam aquelas nas quais a uma situação os terceiros são obrigados a respeitar o direito de usufruto do
mesmo modo como respeitam o de propriedade.
~~S~~~_~de i~te!~s:: bem individuado.
Capítulo sexto Aspectos das situações subjetivas e das relações 143
142
.'l\ u.
,.t.':
_"
° c~digo fala da p.osse, no art. 1.140, como do "poder sobre
a COIsaque se mamfesta em uma atividade correspondente ao
lesivo concretamente imaginável consistiria no inadimplemen- "'.]j
to do devedor e na conseqüente responsabilidade dita contra- exercício da propriedade ou de outro direito real". Tome-se,
tual (na realidade, responsabilidade derivada do inadimple- como exemplo, um proprietário que abandonou um terreno
mento de qualquer relação obrigatória, qualquer que seja a e um ~ul~~o que ~ntra no terreno (fondo) e se comporta como
sua fonte, contratual ou não: art. 1.218 Cód. Civ.); ao contrário, propnetano: cultIva-o, colhe os frutos e até mesmo constrói
uma casa. A doutrina define esta situação como sendo "de
a lesão do,4C::~~Lgenéric~ qtle incun;J.l::>_~~_g!!ªlqJJer um de
fato" . Com. essa expressão certamente não se pretende afirmar
!_~~~~ __ situaçõe~_ab~olutas ~~E~as
ressarcimento co~Ja1o-ilicito
formas ~
~ue prov09!!C um dano
que tal situ~ção é juridicamente irrelevante) °
Código, no art.
1.1~0ss., nao somente define aposse, mas prevê também uma
i!:1justo([~p-ºns<lqilidade extracontratual;.Jlt:t..2...0.43Cód, Ci~
metI~~disciplina: tutela os direitos do possuidor. regula o
Esta opinião não pode mais ser aceita: é verdade que a obri-
se_~-"erc~!!>_~_ Quando um sujeito se apossa (aposs~ento) de
gação é relação que interessa ao devedor e ao credor, mas
~a~o,se:n q.ue se tenha um direito de se apossar, segue uma
também é verdade que esta relação tem relevância externa,
1~~t~~~a~_~I~defato juridicamente relevante"J A posse não é
Mesmo o crédito é, de um certo ponto de vista, um bem (cfr. um poder de fãfo s06re a coisa, mas. ~E.9Eer juridicamente
infra, capo 8, ~ 135), um interesse juridicamente relevante, e re!~vante (art.. 1.148 ss. Cód. Civ.) q~e se manifeSta em uma
enquanto tal deve ser respeitado por todos. Tome-se, como atIVIdad.e~orrrespondente ao exercício da propriedade ou de
exemplo, o fato ilícito do terceiro que provoque a morte do outro dIreIto real. .
devedor impedindo assim ao credor de satisfazer o próprio Análogas considerações podem ser feitas em relação ao fe- Família de
Tutela aqui- interesse; o dano do terceiro não configura um inadimplemen- nômeno da convivência more uxono, estável e séria. Esta, ainda fato
Iiana do
to (o terceiro não era devedor), mas um fato ilícito relevante que não seja fundada no casamento, não pode ser qualificada
crédito
nos termos do art. 2.043. Há, portanto, uma ampliação das "?e .fato" ~já que é por diversos aspectos, relevante para o
fronteiras da responsabilidade extracontratual, em relação ao dIreIto, nao somente civil (cfr. infra, capo 9, ~ 160). Além da
princípio de solidariedade constitucional (arts. 2 e 3 Const.): sua relevância como idônea formação social onde os indivíduos
se o comportamento do sujeito é lesivo de uma situação juri- d~senvolvem a própria personalidade (art. 2 Const.), a família
dicamente relevante (absoluta ou relativa) de maneira a pro- nao fundada no casamento cria relações internas e externas
vocar um dano ir~justo, não há motivo de excluir a responsa- caracterizadas por deveres genéricos e obrigações específicas
bilidade de quem provocou a lesão. de c?~portamento e por poderes, alguns dos quais previstos
A distinção entre situações absolutas e relativas perdeu por- exphcItamente também na novella de 1975 que reformou o
tanto a sua justificação histórica na medida em que, com fun- direito de família (art 317 bis Cód. Civ.).
damento no dever de solidariedade e da conseqüente respon- 0. mesmo discurso pode ser feito para a obrigação natural, Obrigação
sabilidade, todos devem respeitar qualquer situação e o titular preVIsta no art 2.034 do Código Civil. O dever moral e social natural
da mesma tem uma pretensão à sua conservação em relação a ~ jurid~c~ente relevante, tanto que o ordenamento prevê a
IrrepettbIhdade de quanto foi espontaneamente prestado em
todos.
sua, execução (cfr. infra, capo 8, ~ 136).
95. Situações ditas de fato. - É útil deter-se brevemente em f: As vezes o ordenamento
. se refere a uma situação dita de Empresa
três institutos: a posse, a família não fundada no casamento e a~~ para qua:ificar, ,de um ponto de vista jurídico, a própria
as obrigações naturais, isto é os deveres morais e sociais. atIVIdade realIzada. E significativo a propósito o art. 2.082 Cód.
------------------- ---------------------------------.,....------
Civ., que define o empresário como" aquele q~e exerce pro- tinuam idênticos: o que mudou foi o título da obrigação, dado
fissionalmente uma atividade econômica orgamzada para fins que. a quantia antes era devida a título de aluguel e agora é
de produção ou troca 'de bens ou serviços". Empresário comer- deVIda a título de preço: a obrigação, portanto, novou.
cial não é tanto quem está inscrito no registro das empresas A mudança do título não é relevante somente em tema de
As situa-
quanto quem efetivamente exerce essa ativid_ade. . no~ação. A compensação, de regra, opera" qualquer que seja
ções ditas Quer na posse, quer nas chamadas obrigaçoes natUraIS,quer o ~ltulo de uma ou da outra dívida" (art. 1.246 Cód. Civ.);
de fato em tema de definição de empresário, etc., é o ordenamento asSIm, se um sujeito é devedor a título de mútuo e o outro
têm rele-
vância jurí-
que estabelece a relevância jurídica dos fatos. deve ao primeiro a mesma quantia a título de pagamento do
dica preço, a extinção se verifica. A primeira obrigação tem como
96. Título e fonte da re1.ação.- A função constitui o aspecto título o mútuo, a segunda, a venda. Elas, de um ponto de vista
interno, que caracteriza a relação. Ela não é uma qualquer estrutural, são idênticas: ambas são obrigações pecuniárias e é
coisa que se acrescenta à noção de relação, quase um aspecto idêntica a quantidade de dinheiro reciprocamente devida. Di-
autônomo e heterogêneo relativamente àquele estrutural. Ao versificam-se sob a ótica da disciplina, dado que diverso é o
contrário, é parte integrante dele. - título, a razão justificadora da relação. ._
Título A função da relação obrigacional, por exemplo, deve ser re- Emerge a importância da distinção entre a noção de "fonte" Fonte
conhecida não tanto no conteúdo da prestação ou no tipo de e de "título" da relação. A fonte é o fato causativo, o títlilô.é
obrigação (de dar, de fazer ou de não fazer), quanto naindi- a causa, a razão que justifica e caracteriza a relação. Pode
viduação do título da obrigação e da sua incidência sobre a parecer árduo distinguir o fato causativo da causa.Se, todavia,
disciplina. Isso é confirmado no parágrafo 1 do art. 1.230 Cód. se fixa bem a idéia da possibilidade que uma mesma função
Civ. ("Novação objetiva") onde o título é a causa da obrigação, seja realizada através de várias estruturas (cfr. retro, cap; 5, ~
a sua fllnção prático-jurídica. Quando muda a função da rela. 63) e de que ao lado do aspecto estático é necessário com-
ção, isto é quando muda umaspeeto da disciplina que constitui preender aquele dinâmico da relação COmoregulamento (retio,
um elemento que caracteriza a sua causa, muda a relação (esta capo 5, _~78), compreender-se-á que à tutela de determinados
relação, de fato, se extingue e nasce uma outra: a extinção de interesses ou valores se pode chegar através de diversas estradas
uma preexistente obrigação relacionada com nexo de recipro- (vale dizer: com diversas estruturas, diversos fatos causativos)
cidade ao nascimento de uma nova --'-nova porque tem objeto e que vic~-versa,uma mesma estrutura pode realizar diversas
ou título diverso ~ é a síntese dos efeitos essenciais da novação ). funções. E forçoso, então, individuar a disciplina, compreender
Mudança Quando se aluga uma habitação, por exemplo, nasce uma qual seja a razão que justifica a relação, além do fato que a
do título obrigação pecuniária (a obrigação do pagamento do aluguel) originou; ainda mais que a relação se desenrola no tempo,
que, sob o aspecto estrutural, consiste na relação existente entre revelando exigências que não são previsíveis no momento da
a situação do locatário e aquela do locador e que se justifica t:
LOrmaçao - dOLatocausauvo
c: . (fr
c . retro, capo5, ~ 65). O fato tem, Momento
estático e
com a função práticojurídica da locação. Se o proprietário em como já se viu (retro,cap. 5, ~ 63), uma própria função; a momento
um segundo momento vende o apartamento ao seu inquilino, circunstância de esta função se refletir no título da relação dinâmico
estabelecendo que uma parte do preço seja dada imediatainen- pode ser intuída facilmente (basta pensar nos exemplos pro-
te e o restante seja pago em prestações mensais do mesmo postos precedentemente): o aspecto da relação como regula-
valor do precedente aluguel, assiste-sea um fenômeno interes- mento, porém, revela a sua consiqeração autônoma. Se por
sante. Os centros de interesses (inquilino-compradore proprie- um lado a fonte da relação refere-se, prevalentemente, àfatti-
tário-vendedor)e o objeto da prestação (a quantia antes en. specie enquanto estrutura - como ato ou conjunto de atos e
tendida como aluguel e depois como prestação do preço) con- de fatos produtores do efeito~, por outro, o título tem uma
146 Capítulo sexto Aspectos das situações subjetivas e das relações 147
autonomia relativamente à jattispecie, ainda que constitua a sua lamento pode-se revelar, em concreto, essencial, incidente so-
substância, a sua função. bre a função da relação (cap. 5, ~ 66).
Tome-se, como exemplo, as servidões coativas. Segundo o
art. 1.032 do Código Civil, a situação subjetiva" servidão coati- _97. Correlação (colIegamento) entre relações. - Entre as rela-
va" pode ser constituída por contrato ou com sentença cons- çoes pod~m-se es~bele?er ~orrelações com conteúdos e signi-
titutiva ou, ainda, através de um ato administrativo. A fonte da ficados diversos, as qUéUs,amda que brevemente, dedicar-se-á
servidão pode variar (existe mais de um modo para constituí- alguma atenção. Distinguem-se, em primeiro lugar, quatro ti-
la), mas o título da situação não mudará, porque a servidão pos de correlações (correlações diretas):
encontrará sempre a própria justificação na ratio da previsão a) correlação de acessOTiedade. é o caso das relações de garantia. Garantia
legislativa da própria situação subjetiva. A uma relação principal (por exemplo, a obrigação de paga-
Todavia não há dúvidas de que entre a problemática da mento de uma quantia em dinheiro) se correlaciona uma re-
fonte e aquela do título existe uma estreita correlação, do lação de garantia real (penhor, hipoteca) ou pessoal (fiança
mesmo modo que entre estrutura e função, entre fattispecie e típica ou atípica). As vicissitudes da relação principal (a dívida
Modifica- efeito (cfr. retro, capo5, ~ 64). É possível uma variação da fonte garantida), especialmente a sua extinção ou a sua redução
ção da fon-
quer em presença, quer à falta da modificação do título. Um ainda que quantitativa, incidem sobre a existência ou sobre a
te e/ou do
título sujeito pode-se obrigar a título de aluguel ou a título de preço: entidade da relação de garél;.ntia(cfr. arts. 1.939, 2.878, n!! 3,
obrigações com títulos distintos e com fontes diversas; umr' o 1.232, 1.238 ss. Cód. Civ.). As vezes as vicissitudes da relação
contrato de locação (ou a lei, se a relação de locação foi c&ns- acessória incidem na relação principal (arts. 1.186 e 2.743 Cód.
tituída diretamente por uma previsão legislativa, prescindindo Civ.);
de qualquer declaração de vontade das partes), a outra, o b) correlação de integração: é o caso de. uma relação única à
contrato de venda. Inversamente, as fontes podem ser diversas, q~al se flanqueiam uma série de prestações. Fala-se de integra-
mas o título pode ser o mesmo. Pode sobrevir uma lei que çao porque as relações correlacionadas se apresentam como
mude a fonte da obrigação e considere a fonte negocial irre- especificação do perfil funcional da relação de base. Tome-se,
levante e a relação existente como pressuposto para que surja co~o exempl~, ~ relação de servidão. O art. 1.030 prevê que
Relações
automaticamente (e por lei) aquela relação (imagine-se uma o tItular do predio sobre o qual grava a servidão normalmente com fun-
lei que estabeleça que todas as relações de locação existentes não é obrigado a prestações acessórias. Todavia, a lei e o ato ção não-au-
em uma determinada data sejam prorrogadas por tempo inde- constitutivo podem prever que, como integração da relação, tônoma
terminado e reguladas pela mesma lei). A fonte será a lei; o existam obrigações acessórias: estas não têm uma função autô-
negócio jurídico originário será o fato jurídico ao qual a lei noma, mas constituem com a relação de servidão uma unidade
relaciona um efeito análogo. Parece que nada mudou: o título que concretiza a função jurídica que lhe é própria segundo o
da obrigação é, tudo considerado, o mesmo. Tem-se, porém, ordenamento (aqui também fala-se de prestações" acessórias",
uma diversa fonte: antes o negócio, agora a lei. Diverso seria m~ a razão da correlação é muito diversa daquela que se
o caso de uma lei que modificasse a substância, a razão justifi- venfica na correlação de acessoriedade devido à garantia);
cadora da relação: nesse caso, além da fonte mudaria também c) correlação de solidariedade. é o caso das obrigações solidárias
o título e se assistiria a uma novação legal da relação. e, em geral, das hipóteses de co-titularidade (cfr. retro, capo 5,
Na individuação do título - vale dizer, na qualificação da ~ 73). Ainda que ao externo a relação entre os co-devedores
relação - é necessário valorar a concreta ordem de interesses. seja única, tem sentido falar de correlação porque, quer na
Nesse sentido uma cláusula aparentemente acessória do regu- solidariedade passiva, quer naquela ativa, existem relações ditas
Capítulo sexto Aspectos das situações subjetivas e das relações 149
148
internas, as quais têm uma própria relevância (basta pensar à g) correlação por identidade de prestação: quando várias relações
ação de regresso: art. 1.299 Cód. Civ.); _ . têm a mesma prestação, o adimplemento do devedor extingue
d) correlação por junção: é o caso das relaçoes correspectIvas. contemporaneamente todas as relações. Um exemplo desse
Correspecti-
vidade Cada relação se justifica em função .da outra. No contrato de tipo de correlação é dado pelas empresas de espetáculos pú-
locação, por exemplo, a obrigação do locatário de pa?a~ o blicos. Imagine-se uma companhia de atores que deva encenar
aluguel é correspectiva à obrigação do locador de deIxa-lo em um teatro: entre a companhia e os compradores dos in-
gozar o bem. Quando a relação é correlacionada a ~ma ou~ gressos surge uma pluralidade de relações obrigacionais (cada
em termos de correspectividade se justificam especIficas co.?- espectador é um credor): todas as relações extinguem-se com
seqüências de disciplina:.por exemplo, o instituto da resoluçao a execução de uma única prestação (o espetáculo). Aqui a Incidência
correlação não é ocasional, mas decorrente da natureza da sobre as vi-
(art. 1.453 Cód. Civ.). ., . atividade debitória; "issoreleva em relação às vicissitudes da cissitudes
Das correlações até aqui examinadas devem-se distInguir
algumas formas de correlação, em sentido amplo; indiretas. relação, em particular com a finalidade de excluir que exista
um interesse do devedor a que o credor cumpra a obrigação
Trata-se de: de cooperação. Esta falta de interesse tutelado do devedor,_à
e) correlação par identidade de referência objetiva: Aqu~ndo.u~a
cqoperação creditória comporta a inaplicabilidaçle da discipli-
pluralidade de relações tem como ponto de r~fefenClaobjetIva
na da mora do credor (art. 1.206 ss. Cód. Civ.):o devedor não
o mesmo bem. Imagine-se um bem que seja dado em nua
pode colocar em mora o credor porque a sua liberação fi-e-
propriedade a um sujeito, em usufruto. a um o~tr~ ~ que o diante adimplemento se dá de qualquer jeito, prescindindo da
usufrutuário alugue o bem a um terceIro. As disClplInasde presença do credo.r (a companhia de atores não poderia logi-
cada relação deverão ser harmonizadas para individuar quais .camente colocar em mora o sujeito que, depois de ter com-
poderes de gozo, de disposição, de utilização, de controle(cfr. prado o ingresso, não se apresente para assistirao espetáculo).
infra, capo8, S 142) tenham,. e em_qualc~rc~mstânciaconcreta, O credor pode renunciar ao seu direito sem que o devedê>r
os respectivos titulares das sltuaçoes subJetIvas; possa se opor. Este exemplo mostra a necessidade de valorar
f) correlação por identidade do titular. uma pluralidade de re- a disciplina da obrigação além da procura de meras simetrias
lações conflui na titularidade de um mesmo sujeito. A ~orre- formais (cfr. infra, cap.8, S 135).
lação explica como essasérie de relações possa ter ~m~~mdade
Vicissitudes
'1-0 ponto de assumir a configuração ~e um patnmomo. Este 98. Correlação (collegamento) de derivação. - A correlação constitutivo-
último define-se, de um ponto de Vista estrutural, como o de derivação encontra a suajustificação na vicissitudedita coos- derivativas
conjunto de situações subje~~ ou de relaç~e~jurídicas que titutivo-derivativa:uma situação subjetiva é constituída como
têm como titular o mesmo SUJeIto.Uma relaçao mserta em um ~erivação de outra. Quando o usufrutuário constitui uma re-
determinado patrimônio tem uma disciplina; uma relação ~- lação de servidão, estabelece-se uma correlação entre servidão
bém idêntica à precedente, mas inserta em um outro patnmo- e usufruto: uma deriva da outra. O usufrutuário perde um
nio, tem outra disciplina. A disciplina da: locação ~udará se- poder que atribui, em concorrência ou em exclusividade, a
gundo faça parte do patriniônio de ~ s~e~to pnvado que outro. Individuar essa correlação é importante para estabelecer
tenha um grande ou um pequenopatnmomo (art. 44, S.I, até quando existirá a relação derivada: esta, de regra, existe
Const.; art. 1.350 Cód~Civ.), que produza uma renda maior enquanto perdurar a relação que lhe deu origem. A relação
ou menor de uma determinada cifra (art. 6, d.l. n!!505 de 17 de servidão constituída pelo usufrutuário continua enquanto
de outubro de 1979); e, principalmente, segundo este patri- existir o usufruto; extinguindo-se este, extinguir-se-á tainbém.
mônio tenha um tipo, em vez de outro, de destinai;ão; a outra. Avicissitudeque permite o nascimento de uma situação
Aspectos das situações subjetivas e das relações 151
Capítulo sexto
150
preliminar de natureza condicional em correlação instrumental Comporta-
derivada chama-se constitutivo-derivativa. A correlação de de-
rivação - não permitindo fracionamentos de direitos, mas, com aquela final. As partes têm a obrigação de deixar que o mento du-
r'dnte o es-
sim, concurso de situações jurídicas - pode ser individuada even to colocado como condição se verifique inde- tado de
também fora da problemática tradicional das relações reais. penden~eme~te de uma atividade impeditiva do evento (art. pendência
Tome-se, como exemplo, o fenômeno do subcontrato. O art. 1.358 Cod. CIV.).Un;a ati.vida~~,portanto, conservativa que por
2, ~ 2, lei n!!392 de 27 dejulho de 1978, afastando-se em parte ve~esse torn~ ta~b~m dlSPOSltIva,no sentido de que são possí-
Subcontrd- V~ISatos de dlsposIçao em defesa da expectativa (art. 1.356 Cód.
to do art. 1.594 Cód. Civ., prevê que, salvo pacto contrário, o
inquilino tem a faculdade de sublocar parcialmente o bem, ?IV.); O co~prador ~ob condição suspensiva, medio tempore, isto
assumindo assim, a duplp feição de inquilino, em relação ao e.•ate 9ue nao se venfique a condição, é titular de um direito à
locador originário, e de locador, em relação ao subinquilino. s~tuaçao fin.al. ~ireito que é meio, para que ele possa automa-
Entre a relação principal de locação e aguela de sublocação ticamente, Isto e, sem necessidade de ulterior manifestação de
instaura-se uma correlação de derivação. As vezes, mesmo para vontade, sua ou de outros, adquirir a situação final.
fins de interpretação, o conteúdo da relação derivada será . ~ corrc:,lação entre a relação preliminar e aquela final se
estabelecido per relationem à relação originária. Não apenas isso; Jus~~ca nao apenas I~gicam~nte, mas atende a uma exigência
pratica e a uma funçao preCIsa. A primeira mesmo tendo um
.a relação subcontratual, onde for possível, sofrerá as vicissitudes
mínimo dc:nominador comum no art. 1.353 ss. Cód. Civ.,varia
,
que são típicas da relação principal: se esta se extingue, extin-
guir-se-á, de regra, a dependente. O credor-locador tem direito
.
. nos con~eudos, nos poderes, nas obrigações, segundo o tipo
de relaçao ~~al que se quer constituir, modificar, extinguir. A
de crédito do aluguel em relação ao inquilino, mas pode tam-
ven~a condICIOnada, por exemplo, é um negócio que se propõe
bém exigir o crédito do subinquilino (art. 1.595 Cód. Civ.). reallz~r :- como função prático-social - a transferência de
Diversamente, quando a lei estabelecer que se mantenha a um dIreIto contra ~ ~o:respectivo pagamento de um preço:
sublocação e, ao mesmo tempo, a extinção da locação para P?r .um lado, uma VICISSItudetranslativa (transferência de um
evitar, por exemplo, possíveis especulações por parte dos in- dIreIto) .e, por ou.tro, em função correspectiva, a obrigação de
quilinos que pretendessem sublocar com aluguéis mais altos transfenr a propned~d~ ~e u~a.quantia em dinheiro (preço).
(v., de fato, a proibição prevista no art. 2, ~ 1, l. n2 392 de 27 A venda te~ uma dlsclplma tlpIca, prevista pelo código (art. Eficácia
de julho de 1978). A relação derivada poderia assumir nesse • f 1.470 ss.), aInda que possa ser integrada pela autonomia das parcialme~-
Partes
. . Na rei açao
caso uma própria autonomia. - pre I"
Immar d e natureza condicional (faz-se date suspendI'
,
-~
"
1,
llltegrante da relação preliminar condicional. Isso porque a
É necessário individuar o tipo de relação que deriva e a 'f ordem fin~ que se quer atuar é aquela da venda, de maneira
;
correlação existente entre a relação medio tempore pendente e l
q~e as relativas normas, compatíveis com a função conservativa
aquela final que se espera instaurar quando se verificar a con-
(
~ lI~strumental da relação preliminar, são aplicáveis à fase pre-
dição. Na fase de pendência, durante a qual a eficácia ou parte ~Imlllar que tem como função, justamente, a conservação, a
dela é impedida pelo evento condicionante, tem-se uma relação lllstrumentalidade relativa à situação final. .
"
152 Capítulo sexto
. '.
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",~,.'.'"":,.c"".""",,,,' ;', '
dem a reconhecer um "direito geral da personalidade" e teo- capo3, ~ 22). O art. 2 Constoé uma norma diretamente aplicável
rias que sustentam a ef(istência de uma pluralidade de direitos e exprime uma cláusula geral de tutela da pessoa humana: o
da personalidade. No âmbito destas últimas - ditas concepções seu conteúdo não se limita a resumir os direitos tipicamente
"atomísticas" - apontam-se aquelas que consideram a existên- previstos por outros artigos da Constituição, mas permite es-
cia de uma série aberta de direitos (atipicidade dos direitos da tender a tutela a situações atípicas.
I personalidade) ou fechada (tipicidade). A contraposição entre Afirmada a natureza necessariamente aberta da normativa, Pluralida-
I
i'
tipicidade e atipicidade, aparentemente apenas técnica, encer- é da máxima importância constatar que a pessoa se realiza não de das si-
tuações
ra opções ideológicas e culturais. através de um único esquema de situação subjetiva, mas com existenciais
Na maioria das vezes, afirma-se que os direitos da persona- uma complexidade de situações que ora se apresentam como
Tipicidade:
crítica lidade são típicos: fora das hipóteses expressamente previstas, poder jurídico (pótestà), ora como interesse legítimo, ora como
ou pelo Código Civil, ou pelas leis especiais, ou pela Constitui- direito subjetivo, faculdade, poderes. Devem ser superadas as
ção, não existiriam outras. Limita-se, freqüentemente, a men- discussões dogmáticas sobre a categoria do direito (ou dos
cionar o art. 6 s. Cód. Civ., sobre o direito ao nome e o art. 9 direitos) da personalidade. Nestas discussões controvertia-se
sobre a tutela do pseudônimo. Esta perspectiva exaure a rele- principalmente sobre a possibilidade de assimilar a personali-
vância de tais direitos no aspecto patrimonial, no ressarcimento dade à categoria (em aparência "geral" e, portanto, vista -
dos danos. O próprio Código, todavia, prevê a possibilidade sem razão - como "universal") do direito subjetivo, como
de requerer em juízo, independentemente do ressarcimento tinha sido elaborado pela tradição patrimonialística. Não pa-
do dano, a cessação do fato lesivo (art. 10 Cód. Civ. em tema rece fundada, portanto, a opinião de quem nega uma tutela
de direito à imagem): existe uma diferença entre o poder de jurídica, ainda que na fase patológica, a tais situações porque
agir em juízo para pedir que o dano que já se sofreu seja não qualificáveis como direitos, ou no pressuposto de que elas
ressarcido (ação de perdas e danos) e o poder de obter que a não representariam interesses substanciais.
atividade danosa cesse e que não provoque danos ulteriores; A esta matéria não se pode aplicar o direito subjetivo elabo- o direito
esta ação (azione inibitma) não pode ser limitada às hipóteses rado sobre a categoria do "ter". Na categoria do "ser" não s~bjetivo
. t a d ua l'd
eXlse I ad e entre sUjeItoe
. . ob'~eto, porque ambos repre- modelo
nao é um
típicas, mas é um instrumento geral de tutela. Além daqueles idô-
indicados, existem interesses da pessoa mais decisivos e quali- sentam o ser, e a titularidade é institucional, orgânica (cfr. neo
ficantes, os quais, salvo alguma hipótese especial (v. art. 1.580 retro, capo 5, ~ 69). Onde o objeto de tutela é a pessoa, a
Cód. Civ.), não têm tutela jurídica no Código Civil, apesar de perspectiva deve mudar; toma-se necessidade lógica reconhe-
tê-la em alguma lei especial. cer, pela especial natureza do interesse protegido, que é justa-
Art. 2: cláu- Na opinião de uma parte da doutrina, o advento da Cons- mente a pessoa a constituir ao mesmo tempo o sujeito titular
sula geral do direito e o ponto de referência objetivo de relação. A tutela
de tutela
tituição não teria mudado substancialmente o quadro, porque
da pessoa os direitos da personalidade continuariam a ser típicos: às hi- da pessoa não pode ser fracionada em isoladas fattispecie cOn-
póteses preexistentes, deveriam se acrescentar aquelas previs- cretas, em autônomas hipóteses não comunicáveis entre si, mas
tas em algumas disposições (arts. 4, 13-19, 21 s., 24, 32 e 36 deve ser apresentada como problema unitário, dado o seu
Const.). Tal orientação seria sustentável apenas se o art. 2 fundamento representado pela unidade do valor da pessoa.
Const., na parte em que se tutelam os "direitos invioláveis do Este não pode ser dividido em tantos interesses, em tantos bens,
homem", fosse uma norma meramente recapitulativa (sem em isoladas ocasiões, como nas teorias atomísticas.
conteúdo próprio) e programática (não diretamente aplicá- A personalidade é,.portanto, não um direito, mas um valor A personali-
vel). Na realidade, tanto a natureza programática quanto aque- (o valor fundamental do ordenamento) e está na base de uma dade é um
la recapitulativa devem ser recusadas (cfr. retro, capo 2, ~ 9 e série aberta de situações existenciais, nas quais se traduz a sua valor
I
!
F
!
incessantemente mutável exigência de tutela. Tais situ~ç~es sual não é legítimo constitucionalmente, porque não consegue
subjetivas não assumem ~ecessariamen.te a for:na do dIreIto tutelar interesses primários, constitucionalmente relevantes.
subjetivo e não devem fazer perder de VIstaa um~a~e do valor Desconhecer a tutelabilidade dos interesses juridicamente Direito
envolvido. Não existe um número fechado de hIpoteses tute- ":....
relevantes, em presença do art. 24 Consto que prevê o direito constitucio-
ladas: tutelado é o valor da pessoa sem limites, salvo aqueles de agir em sua defesa, significaria sustentar a existência de uma nal de
ação (art.
colocados no seu interesse e naqueles de outras pessoas. A contradição no sistema. Não se pode esconder-se atrás do fato
elasticidade torna-se instrumento para realizar formas de pro- -.:~ 24 Const.)
-.~. . de que não existe o instrumento típico, previsto expressamente,
teção também atípicas, fundadas no interesse à existência e no ''.;-;'.
,";'," para tutelar aquele interesse. O processo não é uma variável
livre exercício da vida de relações. independente, mas serve para realizar interesses substancial-
, Nenhuma previsão especi~ pode ser exaustiva e deixaria de mente individuados; ese ele é inadequado, o intérprete deve
fora algumas manifestaç?es e exigê.nciasda pessoa.que, ~esmo ter consciência disso. É preciso evitar as generalizações. Não
com o progredir da socIedade, eXIgem uma consIderaçao po- se determina a tutelabilidade de um direito se não se examina
sitiva. O fato' de a personalidade ser considerada como valor em qual outra situação ele influi. Também os direitos da per-
unitário tendencialmente sem limitações, não impede que o sonalidade devem ser apresentados em chave relacional. A
orden~ento preveja, autonomamente, ~~m~ expressões investigação sobre a sua coercibilidade não deve ser conduzida
mais qualificantes como, por exemplo, o direito a saude (art. em abstrato. Não se pode sustentar que as obrigações de fazer
32 Const.), ao estudo (art. '34 Const.), ao trabalho (art. 35.ss. e de não fazer se exaurem naquelas previstas nas relações
Const.). O juiz não poderá negar t.utela a q~em peça ~~ntIas conjugais e familiares, como não se podé utilizar apenas a
sobre um aspecto da sua existência que nao te~ p~eVIsao,es- experiência trabalhista, formada sobre o art. 18 do Estatuto
pecífica, porque aquele interesse já tem uma rel~vanCIa~o ~l1v~1 dos trabalhadores, como extensíveis a todas as relações civis.
de ordenamento e, portanto, uma tutela tambem em VIaJudi- Pode-se estender o art. 18 a algumas relações, que se inspiram
cial (art. 24 Const.). na mesma mtio, à tutela, isto é, da dignidade da pessoa e do
trabalho.
101. Coercibilidade das situações existenciais. - A falta de apro-
fundamento, por parte dos civilistas,da temática concernente 102. -, Os chamados direitos da personalidade e as pessoas jurí- Diversida-
à atuação das relações não-patrimoniais se explica com nume- dicas. - E possível remover o equívoco sobre a extensão' dos d~ das ra-
rosos fatores, e principalmente com três. A identificação a) do d..Ireitos d a pessoa h umana as
' pessoas Jun
"di casoSe a tuteIa d a zoes de tu-
tela
direito privado com o direito das relações pa~~oniais; b! d~ pessoa humana afunda as suas raízes na cláusula geral presente
"
!I
juridicidade com o específico momento coercItIvo; c) da Jun- no art. 2 Consto e qualquer aspecto ou interesse concernente
dicidade com a mera tutelabilidade do interesse mediante o à pessoa é tutelado na medida em que sejam essenciais ao seu 11
processo, ainda que muitas das té.cn~casde atua~ão dos direitos pleno e livre desenvolvimento, é também verdade que qualquer
sejam previstas por normas de direIto substanCIal. .
° ,processo
deVe garan-
Os interesses e os valores que emergem das normas constI-
interesse, referido às pessoas jurídicas, não somente assume
significados diferentes, mas recebe também uma tutela que
tir o desen- tucionais são, de um ponto de vista substancial, juridicamente encontra um distinto fundamento. Para as pessoas jurídicas o
volvimento relevantes. É necessário verificar se o aparato, mesmo proces- recurso à cláusula geral de tutela dos" direitos invioláveis" do
da pessoa sual, é adequado a esta escolha. Das duas, uma: ou se tenta homem constituiria uma referência totalmente injustificada,
individuar, no âmbito do sistema, técnicas que, apesar de terem expressão de uma mistificante interpretação extensiva fundada
surgido por razões diversas, sejam idõneas para a tutela destes em um silogismo: a pessoa física é sujeito que tem tutela; a
valores, ou Se deve afirmar com decisão que o sistema proces- pessoa jurídica é sujeito; ergo, à pessoa jurídica deve-se aplicar
ir
1I .'1'
Situações subjetivas existenciais 159
Capítulo sétimo
158
I
I Não se pode individuar, em termos de interesse protegido Aspecto in-
:1 a mesma tutela. Daqui uma concepção dogmática e unitária r OUde bem, uma autonomia conceptual da saúde como - separável
1
!;
! 'j
da subjetividade como fato neutro. O valor do sujeito pessoa
física é, todavia, diverso daquele do sujeito pessoa jurídica.
- I d d . '
pO~lve em se e e .mtere~es patrimoniais; ela apresenta-se
e da pessoa
Assistência Mesmo na perspectiva civil-eonstitucional seria limitativa mana. A tutela de u~ ~e~sesperfis traduz-se naquela da pessoa
sanitária no seu todo, e a dlsclplma na qual consiste esta tutela é de Integrida-
também a concepção do direito à saúde como direito do ho-
regra~ ~tilizáv~l também para cada um de seus aspectos. Deve de psíquica
mem à assistência sanitária, vista como posição jurídica em
se~u~hzada nao somente a normativa específicada integridade
relação ao aparato burocrático do Estado. A saúde assume
ps~qU1ca,~as, também, aquela prevista para a defesa da inte-
importância também nas relações intersu~~tivas, como parâ-
gndade fíSIC~que ~ sempre inspirada pela garantia da pessoa.
metro da licitude ou da ilicitude dos comportamentos e da
A tutela da mtegndade psíquica é atuáve1 também onde a
meriteuolezza da atividade, em sentido lato, do homem. Ela é < - norma ordinária ~e li~itou a tutelar a integridade física (por
noção que se exprime não apenas sob um ponto de vista estri-
exemplo, a:t:5 Cod. ClV.).A n0n,na que estabelece a obrigação
tamente sanitário, mas também, sob aquele do comportamento do empresano de adotar as medidas;necessárias para tutelar a
social e ambiental.
Capítulo sétimo Situações subjetivas existenciais 161
160
integridade física e a personalidade mo:al ~o.s trab~hadore_s s,:b~etê-Io a? tratamento n~ces~ário, mesmo aquele psicotera-
(art. 2.087 Cód. Civ.) é extensível tambem a m~eg:xd~de PSI- pe~tIco. AqUl ? tratamento Justifica-se não tanto por uma ob-
quica. Isso nem tanto porque a norma faz referencla a perso- Jetiva oportul1ldade, mas por estado de necessidade. O orde-
nalidade moral, mas pela observação de que ela, em um orde- namento, ainda que com as devidas garantias, prevê a interna-
namento fundado nos valores da pessoa e do trabalho, deve ção coativa (arts. 33-351. n2 833 de 23 de dezembro de 1978).
ser interpretada como garantia da personalidade do trabalha- Digna de atenção é a dúvida de inconstitucionalidade dos arts.
dor. As normas constitucionais permitem, na unidade do or- 33 e 34 da lei de reforma sanitária, porque existe a suspeita de
denamento, considerar a norma ordinária, colocada a favor da que a intervenção coativa possa ser simulada sob a forma de
pessoa, não mais excepcional e suscetível de sofrer limitações intervenção obrigatória e submetida, portanto, ao regime ad-
aplicativas, mas como expressão de um princípio geral aplicável ministrativo e não ao controle e à garantia jurisdicional, devida
por analogia. -juntamente à reserva de lei - com base no art 13, ~ 2, Consto
Em tema de psicoterapias é necesOO.J;io discutir sobre a opor- O art. 32, ~ 2 e o art ' ~ da Constituição, além de conterem Finalidade
tunidade e sobre a legitimidade dod'<ratamento psiquiátrico, uma reserva de lei, est..:.Jdecem o princípio de que motivos de da interven-
assim como é preciso individuar os sujeitos legitimados a efe- "saúde" e de "segurança" podem justificar limitações da liber- ção
tuar as intervenções e a sua responsabilidade na especial relação dade. O respeito à pessoa é sempre um limite insuperável para
de sujeição que, mesmo em diversas graduações, se estabelece o legislador ordinário. O tratamento sanitário, e, especifica-
com o paciente. . mente, aquele psicoterapêutico, para ser conforme ao ditame
A integridade psíquica é um aspecto do maIS amplo, ~or constitucional, deve ser respeitoso da pessoa e das suas excen-
Ausência
de um po- que é a pessoa; como autônomo" bem" , analogamente a mte- tricidades; é permitido intervir coativamente somente quando
der disposi- gridade física, não é suscetível de válida disposição se não for estas últimas constituirem um sério perigo para a pessoa e para
tivo ilimita- a comunidade na qual vive. A intervenção deve ser orientada
em razão de sérios e ponderados motivos de saúde. Do mesmo
do
modo que a intervenção no corpo do sujeito, aquela destinada a eliminar ou a atenuar a periculosidade. Excluída esta, desa-
a modificar em modo considerável e permanente a psique se parece a causa legitimadora do tratamento feito contra ou sem
justifica, como ato em si, exclusivamente com base numa ava- a vontade do interessado.
liação global do estado de saúde feita por pessoa legitimada. Quando o enfenno mental não é perigoso, o tratamento Avaliação
Ficam fora desta perspectiva todas aquelas atividades que, vol- sanitário e, portanto, psicoterapêutico é legítimo se, em pre- da utilida-
tadas a incidir sobre a formação sócio-cultural, não tenham sença d os extremos d a oportunl .d a d e e d a utI.l'd
I a d e para o de do trata-
mento vo-
uma finalidade terapêutica e que l"lãoassumam objetivamente paciente, este der o seu consentimento. O consentimento em luntário
o valor de tratamento médico. Estes atos e intervenções, ainda si não é idôneo para legitimar a intervenção; determinante é
que estejam na livre disponibilidade de quem os realiza e de a avaliação objetiva, de competência do especialista: frente a
quem é destinado a recebê-los, para serem juridicamente me- um juízo negativo sobre a oportunidade e sobre a utilidade do
recedores de tutela, devem respeitar a pessoa. tratamento, o pedido do interessado, a sua solicitação a ser
submetido a psicoterapia, não legitimam a eventual intervenção
Interven- .105. Legitimidade do tratamento sanitário. - A solução do pro- e não exoneram o médico das relativas responsabilidades. Em
ção coativa blema da legitimidade do tratamento não deve e não pode presença de umjuízo positivo, o consentimento do paciente é
inspirar-se exclusivamente no aspecto subjetivo do consenti- necessário para que a intervenção seja legítima. A esta última
mento do interessado. Se o enfermo mental se apresenta pe- hipótese corresponde a figura da internação espontânea (art.
rigoso para a vida ou a incolumidade sua e dos outros, seria 33, ~ 1 da lei n2 833 de 1978; e, em precedência, o art. 4 da
impossível, além de supérfluo, pedir o seu consentimento para lei n2 431.de 18 de março de 1968): aceitar a internação es-
Capítulo sétimo Situações subjetivas existenciais 163
162
pontânea com base numa utilidade objetiva p~ra o pacie~te; da~e. S~m entrar na definição médica de estado patológico,
recusá-la quando a mesma.representar um capncho do pacwn- se, Isto e, se trata de doença ou insuficiência mental, deve-se
. te e for, portanto, não oportuna. Na ausência de verdadeiros o~servar a varied~de das po~síveis.hipóteses que dependem
motivos de periculosidade que justifiquem a internação coativa, nao apenas das diferentes ongens - congênita ou adquirida
o consentimento do paciente à internação e ao tratamento - ,-"as,so~ret~do, da diversidade de graduação e de qualidade
psicoterapêutico deve ser permanente: se cessar tal consenti- da mS~~~lencla men~. A maior ou a menor possibilidade de
Handicap e
mento, o paciente terá direito à sua liberdade e, portanto, r~verslbl~ld~dede tal msuficiência postula um tipo de interven- capacidade
deverá ter alta. ç.aoqualItatIvamente diverso. Não se pode nem mesmo iden- de enten-
É, também, um problema; de sensibilidade: intervir sobre a tIficar tout courto insuficiente desenvolvimento intelectual com der e de
querer
psique apenas porque o sujeito manifesta sintomas de, por a incapacidade consistente na falta das fàculdades volitiva e
assim dizer, anormalidade é arbitrário (além de perigoso) e intelectiva (incapacità naturale) (arts. 428 e 2.048 Cód. Civ.). Tal
pode apresentar-se como instrumento de repressão voltado a figura refere-se mais ao ato individual que ao estado da pessoa,
atuar uma mudança das idéias do paciente, fazendo violência mesmo porque seria diffcil definir o significado geral do saber
sobre as suas convicções. A história da loucura é, freqüente- ent~~der e, ainda mais, aquele do saber querer. A falta de
mente, a história dos livre-pensadores, dos indivíduos que não aptIdao para entender não se configura sempre como absoluta,
são bem vistos pela sociedade, destinados a ficarem excluídos; apr~sentando-se, no mais das vezes, por setores ou por esferas
. de maneira que é errado negar à loucura, e de forma absoluta, de mteresses; de maneira que a incapacità naturale construída,
a função expressiva de uma verdade diversa e anticonformista, de um ponto de vistajurídico, como lima noção permanente,
às vezes destinada a se tomar a verdade de amanhã. O caráter geral e abstrata, se pode traduzir em uma ficção e, de qualquer
relativo e histórico da normalidade na "ida social deve induzir
modo, em uma noção que não corresponde à efetiva inidonei-
a um maior respeito às excentricidades do homem e, portanto,
dade psíquica para realizar determinados atos e não outros,
a garanti-lo contra as intervenções tendentes a deixá-lo confor-
para orientar-se em alguns setores e não em outros. Dessa
me ao modelo dos maiorais ou ao modelo proposto pelo po-
situação deriva, por um lado, a necessidade de recusar precon-
lítico.
A psicoterapia é um tratamento sócio-sanitário que não pode t ceitos jurídicos nos quais pretender armazenar a variedade do
Direito ã
psicoterapia continuar sendo uma cara terapia de elite, excluída da assistên-
cia obrigatória; não constitui um interesse juridicamente me-
tr fenômeno do déficit psíquico; por outro, a oportunidade que
o próprio legislador evite regulamentar a situação do deficiente
recedor de tutela quando for expressão de uma moda em de maneira abstrata e, portanto, rígida, propondo-se estabele-
expansão nos ambientes mais abastados. Se o tratamento foi cer taxativamente o que lhe é proibido e o que lhe é permitido
julgado oportuno, o sujeito, tendo sempre presente a sua li- fazer. .
berdade de decisão, a ele tem direito (arts. 32 e 38 Const.; art. O assunto refere-se não apenas ao deficiente psíquico, per- Os meno-
1, ~~ 1 e 3, lei n2 833 de 1978). manente ou não, mas, em geral, ao imaturo, em uma acepção res em sen-
que compreende tanto o menor em idade evolutiva, como, tido amplo
eventualmente, também o idoso em idade em involução. Todos
Variabilida- 106. Heterogeneidade e graduação da insuficiência mental - O
esses tipos de sujeito podem ser definidos menores em sentido
de da no- handicap psíquico permanente configura um estado pessoal
ção amplo - titulares de um direito ao tratamento - quer porque
patológico caracterizado por uma estabilidade que influi na
apresentam problemas (minoratz) desde o nascimento, quer
idoneidade para o cumprimento de uma série de atos, de
porque caracterizados por um déficit psíquico adquirido, devido
atividades e, de qualquer modo, na possibilidade de desenvol-
a motivos traumáticos ou patológicos do desenvolvimento.
ver adequada e livremente, isto é, normalmente, a personali-
11
I'
Situações subjetivas existenciais 165 I
164 Capítulo sétimo
!
sões de vida ~~e, .enc~ntrando fu~damento no status personae
107. Justificação constitucional dos institutos de proteção. - A
e no status ClVztatzs, sejam compatíveis com a efetiva situação
tutela do menor em sentido amplo, em particular da sua dig-
psicofisica do sujeito. ~on~r~ e.ssaargumentação não se pode
nidade de homem e de cidadão, representa uma tarefa primária
alegar - sob pe~a. de I1egtuml?a.d: do remédio protetivo ou
e histórica (arts. 2, 3, !3!3 1 e 2, 32, 38, !3 3, Const.). Os valores
do ~e~ u~o - a ~gt?ez das prOlblçoes nas quais se substancia
consUtucionais, sobre os quais é possível reconstruir o sistema
a dIsCIplma do msUtuto da interdição, tendente à exclusiva
de tutela do menor em sentido psicofisico, representam não
proteção do sujeito: a excessiva proteção traduzir-se-ia em uma
somente valores políticos, simbólicos e paradigmáticos, mas,
terrível tirania. Isso mostra, por um lado, a necessidade de
também, parâmetros normativos idôneos para avaliar os com-
supera: .a ~endê~cia, dificil de morrer, pela qual não seria
portamentos e para interpretar adequadamente os institutos
necessano mter~Itar ~ enfermo mental que não possui bens,
". de proteção e de tutela disciplinados pelo Código Civilde 1942.
por outro, a penculosIdade de um uso indiscriminado do ins-
Todo homem é, como tal, titular de situações existenciais re-
ti.tuto co~o .remédio quase exclusivo para a proteção do defi-
presentadas no status personae, das quais algúmas, como o di-
CIente pSIqUlCOpermanente.
reito à vida, à saúde, ao nome, à própria manifestação do Curatela e
. Nem 'par~ce ~ue se possa aceitar a interpretação tendente ,
pensamento, prescindem das capacidades intelectuais, ou, pelo assistên da
menos, de algumas formas de inteligência comumente enten-
a ~e?UZlro msututo da curatela do inabilitato à assistência do não somen- .J
SUjeIto?a administração dos bens e, na espécie, ao controle
"
te:patrimo-
A tutela dida. O estado pessoal patológico ainda que permanente da prevenUvo ~m todos os atos de extraordinária administração, niál
não deve pessoa, que não seja absoluto ou total, mas graduado e parcial,
exaurir-se não se pode traduzir em uma série estereotipada de limitações, com exclusao do tratamento da pessoa. A enfermidade mental,
em meras mesmo se menos grave, pode produzir no inabilitato a necessi- ."
limitações proibições e exclusões que, no caso concreto, isto é, levando
~;
II
Interdição,
inabilitazil>-
dade para exercer atividades patrimoniais e a enunciação de
tema, superável somente com a individuação de uma artificiosa
ne e ga •..• m- proibições relativamente a algumas significativas escolhas exis- i.
tia do status tenciais (tome-se, como exemplo, o casamento (arts. 85 e 119
lacuna fundada no pressuposto de que enfermidade menos
grave signifique somente incapacidade de realizar sozinho atos J
Cód. Civ.) e o reconhecimento de filho natural (art. 266 Cód.
de natu!eza patrimonial de extraordinária administração e vice-
Civ.)], permite reconstruir a interdição e a inabilitazion;e em
,
modo mais adequado ao seu fundamento constitucional. E pre-
ciso, ao contrário, privilegiar sempre que for possível, as esco-
lhas de vida que o deficiente psíquico é capaz, concretamente,
11
1 !
versa: ~ incontestável, ao contrário, que existem formas de
enfermIdade nas quais o sujeito, mesmo sabendo administrar
be~ os próprios interesses financeiros, não é capaz de realizar
1
11
i
'1
de exprimir, ou em relação às quais manifesta notável propen-
são. A disciplina da interdição não pode ser traduzida em uma
l.'.....•...
-I-
I
sozmho outros interesses para os quais tem direito à assistência
e, portanto, ao controle. A extensão da noção de tratamento
do inabilitato que a melhor doutrina, ainda que em relação ao
li\ incapacidade legal absoluta, em uma "morte civil". Quando
;1 :
menor. emancipado, não deixou de assinalar, apresenta-se I,,.
l\i\ concretas, possíveis,mesmo se residuais, faculdades intelectivas
como um~ nece~idade. ~eja dentro do_sistema codicístico seja,
':i e afetivas podem ser realizadas de maneira' a contribuir para
em manelra maIS declSlva, em relaçao a uma sua releitura
i o desenvolvimento da personalidade, é necessário que sejam
coordenada com o princípio constitucional çle tutela da pessoa.
I garantidos a titularidade e o exercício de todas aquelas expres-
;.'
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i~1v':.j .
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.'ti,' I
I~ '111;' ,I
166
Capítulo sétimo
. :;
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. . Situações subjetivas existenciais 167
sua incapacidade, A declaração judicial de interdição, ao de- mtelec~vas. forem gravemente comprometidas poderá; real-
terminar a extensão e os limites da incapacidade, o regime de J
>: mente, Justificar-se a introdução de limites ao direito do idoso
tutela e de proteção, poderá, por exemplo, reconhecer tanto de concluir negócios; ainda mais que se considera necessária
uma idoneidade para realizar os atos da pequena e quotidiana uma verificação direta, e não presumida, dessas eventuais in-
J ~
administração, ou pelo menos alguns deles, quanto uma ido-
l-
capacid~~es. No ,estudo da tutela do idoso, o jurista está preso
r a uma ~sao que Ignora os aspectos relativos à pessoa como tal,
neidade para a realização de atos de natureza existencial: 7/ {
Isto naturalmente não exclui a intervenção a posteriari do
I~'.
fora e lt.tdependentemente do perfil patrimonial. Falar da tu-
juiz, isto é, depois da realização do fato; essa intervenção tende tela do Idoso somente em termos de capacidade de exerCÍcio
Capítulo sétimo Situações subjetivas existenciais 169
168
e particularidades parecem responder à lógica ~o "quem ~stá mento tipicamente" individualista" e evidencia a sua idonei-
dentro fica dentro e quem está fora fica de fora . Quanto ISSO dade para tutelar até mesmo os interesses sociais protegidos
seja coerente com o direito ao trabalho é bem discutível. Nem pela Constituição. O art. 844, como a ação de nunciação em
se deve esquecer que a República é fundada no trabalho (art. defesa da situação real e da posse (art. 1.170 ss. Const.), pode
1 Const.) e que o art. 4 reconhece a todos os cida~ãos o direito também traduzir-se em um indireto meio de tutela da salubri-
ao trabalho. Dificilmente é compreensível a razao pela qual dade dos lugares e portanto da saúde; isto não significa que
~ma pessoa que deseja trabalhar não possa fazê-Io porque su- ele constitua um instrumento para a tutela da pessoa (o art.
perou uma certa idade. ." . 844 não tutela a pessoa, mas a propriedade: o seu pressuposto
Discurso análogo vale para a aposentadona com Idade ngtda; é a propriedade do "terreno"; tutela, portanto, somente indi-
sem falar na disparidade de tratamento entre homem e mulher, reta da saúde: o sujeito é protegido não como pessoa, mas
desta vez a favor da mulher, e na possibilidade reservada so- como proprietário). Não faltam no sistema - como se demons-
mente a algumas categorias de empregados de continuar no trou - normas e princípios nos quais a saúde é protegida como
emprego público ou no trabalho privado. por ~m ~eríodo ul- valor em si.
terior à normal idade para a aposentadona. DIspandades que Em presença de uma possível ou efetiva lesão à saúde é ~~o inibi.
não parecem justificáveis com base no princípio da igualdade. obrigatório reconhecer uma tutela cautelar" em via de urgên- tona
cia", sobretudo através de medida cautelar (azione inibitoria)
A saúde tu- 111. Instrumentos individuais e coletivos de tutela da saúde. - A (art. 700 Cód. Proc. Civ.), como remédio preventivo previsto
telada atra-
vés do pa-
saúde não pode ser protegida através da utilização de normas para a defesa de qualquer situação de natureza absoluta. L 'a-
trimônio: inspiradas por uma exclusiva lógica patrimonial, nem. a sua zione inibitoria constitui um remédio geral contra os ilícitos" de
crítica tutela pode exaurir-se em um critério ou em um corretIvo do tipo iterativo e continuativo" e não pressupõe a existência de
juízo de harmonização entre exigências prop~etári~ e aquelas um dano atual, nem a imputabilidade a título de culpa do
da produção. Não há dúvidas de que a funçao socIal da pr<: comportamento, sendo suficiente uma objetivasituação de con-
priedade e a utilidade social d~ e~presa no ord~namento VI- traste com um bem ou valor, individual ou não, de um ou mais
gente assumiram conteúdos sohdanstas_e p~rsonahstas (ar~.4~, sujeitos.
~ 2, Const.). Propriedade e empresa nao sao ~ertamente .mstI- Deve ser redimensionada a disputa entre quem pretende Tutela cole-
tutos nos quais a pessoa assume o papel de mteresse d!reta- apresentar a tutela da saúde em chave exclusiva de direito tiva: interes-
se difuso
mente protegido; são apenas meios indiretos de realizaçao de subjetivo individual e quem, na tentativa de limitar a tutela
tal interesse. individual, acaba por supervalorizar aquela coletiva ou associa-
Imissôes e Emblemática, a propósito, é a longa e apaixonada disputa cionista reconhecendo na saúde predominantemente um in-
saúde do
sobre a normativa relativa à imissões (art. 844 Cód. Civ.: Immi- teresse difuso. Entender a saúde como interesse difuso teria
• proprietá-
rio" sionz), caracterizada por alternadas sortes e por contestadas como conseqüência confiar a sua tutela exclusivamente às en-
aplicações: daquelas inspir~das_pela r~strita depend~ncia da tidades que em qualquer modo representam tal interesse: a
decisão à simples harmomzaçao dos mteresses estritamente ação em juízo seria própria da entidade que representa a co-
proprietários e produtivos, àquelas pelas quais "o ponto de letividade e não poderia ser exercida pelo indivíduo.
apoio real" constitui apena:' u~ p~etexto formal. pa~ qu~ o A imediata operatividade das normas constitucionais não Interesse in-
art. 844 "realize os seus efeItos ImbIdores nas fattzspeeze lesIvas exprime uma lógica individualista. O interesse individual pode dividual ai.
truísta
da esfera personalíssima dos sujeitos" . Ainda que por opostos realizar um interesse não-egoístá; o interesse difuso e aquele
motivos, considera o art. 844 inoperante ou limitadamente legítimo podem encontrar nas normas constitucionais um fun-
operante também quem propõe a sua utilização como instru- damento mais qualificante. Nem se pode pensar que o alcance
Capítulo séti1TW Situações subjetivas existenciais 173
172
inovador do ditame constitucional possa ser individuado e in- na qual ~ cultura tenta desligar-se das concepções estatalistas,
terpretado à luz da legis.lação ordinária (tome-se, como exem- a normatIva sobre o ambiente (art. 18 lei n 349 de 8 de' Ih Q
rias" . E se a primeira pode prestar-se à especulação do indivíduo VIdoe desenvolvem uma atividade para a sociedade sem dúvida
e ao isolamento" de uma controvérsia que em termos subs-
U
n~erece.do~ade tutela. Tais críticas encontram uma confirma-
tandais é comum a mais pessoas, a segunda pode ser distorcida çao _ naJu nspru dA' .
_~nCla e, em partIcular, naquela constitucional.
de forma a reduzir o organismo coletivo a objeto ativo ou Nao p~rece legttIma nem mesmo a solução pela qual a ação é
passivo de instrumentalização e a exaurir a legitimação proces- eXclus~vado Estado e do seu aparato. Se o ambiente é aspecto
sual eJ;l1uma máscara formal, muito ou muito pouco praticada. essenCIaldo desenvolvimento da pessoa, e se cada um no seu Direito in-
Resta o risco de que as ações de grupo degenerem em ações statu: personae, tem direito a um habitat que garanta a q~alidade dividuai.
populares, que o fenômeno associativo se preste a fáceis abusos
da ~da, deve-s~ recol~hecer a cada um o direito de agir para ambientar
e que a oligarquia ao _interno do grupo sufoque a liberdade
qu~ lS~Ose realIze. O mteresse é juridicamente protegido pelo
de ação do indivíduo. E um bem que as duas lógicas (individual
Com pre- e coletiva) coexistam - propno Texto Con~titucional.. Além da tutela do patrimônio
do mesmo modo que a jurisdição
Sença da tu- do Estado,. a proteçao .do.amblente refere-se à tutela da quali~
tela indivi-
ordinária e administrativa - e, combinadas entre elas, consti-
dade da VIda como dlreIto que se relaciona diretamente ao'
duai e cole- tuam um sistema complexo e articulado. Diversamente, insistir
tiva na exclusiva legitimação por categorias e na qualificação da
status persanae. ~
A A. tentativa de reconstruir a problemática do ambiente n'~
saúde em termos pelo menos processuais de interesse difuso,
~bI.tO de um dano unitário não parece corresponder às exi- .
poderia prejudicar formas' de tutela individuais que tenham
gencIas de uma metodologia pós-dogmática que repudia con- dPludrah~-
como fundamento normas ordinárias e constitucionais e tra- .t . , . - . e e mte-
ceI os umt<lnos e ngtdos. O art. 18 lei n 349 de 8 de julho de
Q
resses rele-
duzir-se-ia em um injustificado atraso na adequação dos insti-
1986, de um la~o, ~ o ar~. 2.043 Cód. Civ., do outro, juntó~ vantes e de
tutos clássicos do direito civil às novas exigências.
com outras fatttspeae preVIStasno Código e nas leis especiais, danos
represen~ uma problemática unitária, mas não justificam â
112. Direito à qualidade da vida e do arnhiente. - A concepção
reconstruçao de um dano visto de um ponto de vista unitário.
Ambiente
patrimonial ou realista do problema ecológico considera o
e pessoa ambiente como habitat das coisas; a escolha personalista, ao
ll~ . .Da~o à pessoa. - A qualificação da situação subjetiva, a
revés, configura o' ambiente como instrumento privilegiado sua tItulandade, exclusiva ou não, tem notável relevância no
para o desenvolvimento da pessoa. O art. 2 Consto é o ponto problema d~ resp~ms~bilidade civil, em particular no an e no
de partida para a solução do problema. O art. 9 Consto que quantum da mdemzaçao e do ressarcimento Dano con-
tutela a paisagem, o art. 32 que tutela a saúde, o segundo Prescin~ind? da tormentosa questão acer~a da possibilidade tratual e ex-
'parágrafo do art. 41 que fala de controle da iniciativa econô- de, ressarCIr o mter:sse legítimo, é oportuno evidenciar que a tracontra-
mica privada em função da liberdade, da dignidade e da segu- tual
saude pod~ sofrer nao apenas um dano injusto extracontratual,
rança do homem, e as normas sobre a propriedade (art. 42 ~as tambem um dano no âmbito das vicissitudes de uma rela-
ss.) não podem ser compre~ndidos se não forem lidos à luz çao com conteúdo determinado. Nesta última hipótese -
deste valor primário. Seria oportuno abandonar a lógica do tom~-se, como exemplo, a tutela da saúde do trabalhador no
ressarcimento e da patrimonialização do dano 'e privilegiar a ambrente de trabalho (art. 2.087 Cód. Civ.; art. 9 Estatuto dos
função de reintegração de quanto foi violado. Em uma época Trabalhadores) - o dano sofrido pode constituir ~olação de
Capítulo sétimo Situações subjetivas existenciais 175
174
uma obrigação" específica" com conseqüente responsabilidade tar tratamentos diferenciados e exclusivos, encontra o limite
contratual e ressarcibilidade em relação ao requerente. da relevância constitucional das situações subjetivas constitu-
Atipicidade Particularmente atuai apresenta-se a hipótese na qual a saúde cionalmente garantidas. A jurisprudência constitucional e
do ilícito da pessoa sofra um dano mesmo na falta de "uma obrigação aquela de legitimidade [Gane di Cassazione] admitem sem som-
específica" de comportamento entre a parte que danifica e bras de dúvida que a saúde tutelada no Texto Constitucional
aquela danificada. As orientações que se foram formando são adquire relevância "também nas relações entre particulares";
diversificadas e particularmente significativas de uma evolução de maneira que não se pode duvidar da existência de um ilícito
orientada à investigação de aceitáveis ~ustes, à espera de re- na hipótese de sua violação e conseqüentemente da qualifica-
formas que possam prever técnicas de tutela mais atuativas dos ção do dano à saúde como, por definição, "injusto" (em relação
valores constitucionais. ao art. 2.043).
Avaliação Digna de atenção é a estrada escolhida pela jurisprudência O dano à saúde, como dano à pessoa, tem sempre sua au- Responsabi-
eqüitativa
de alguns Tribunais que, reafirmando ora a necessidade de t.onomIa e encon trafiun d amento nos pnnclplOs
. ,. '.
constItUCIonais lidade civil
e seguran-
ressarcir o dano físico ou moral como tal, ora a autonomia - particularmente no art. 2 - que reconhecem na pessoa o ça social
conceitual do dano à saúde, evidencia a oportunidade de uma valor central do ordenamento à luz do qual se deve reler a
liquidação eqüitativa. Esta tem a vantagem da flexibilidade e normativa ordinária, incluindo todas as disciplinas sobre a res-
da maior adequação às exigências e às circunstâncias da jatti- ponsabilidade civil. Nesta perspectiva, deve-se constatar a ina-
speeie concreta, mas, para evitar aplicações distorcidas, tem de dequação deste último instituto e a necessidade, de um lado,
ser especificada. Ela não pode consistir em uma operação ar- de adequar as suas técnicas - por exemplo excluindo cada
bitrária, mas em uma avaliação discricionária que leve em con- vez mais a liquidação do dano una tantum -, do outro, de
sideração as particularidades existenciais da pessoa, isto é, aque- utilizar com maior decisão sistemas de segurança social, reali-
las exigências conaturais à sua personalidade e atinentes ao zando assim, em um modo mais tangível - com exclusão de
seu livre desenvolvimento e às suas intrínsecas manifestações. qualquer possibilidade de especulação - o princípio da soli-
Desse modo, a avaliação eqüitativa (art. 1.226 Cód. Civ.) é dariedade constitucional.
fortemente personalizada, individualizada, superando-se qual-
quer critério rígido e mecânico de avaliação em contraste com 114. Inseminação artificial e manipulação genética. - Para uma
o art. 3, ~ 2, Consto que postula tratamentos diferentes em eventual disciplina normativa da inseminação artificial, é pre-
presença de condições desiguais. Assim, especial será o dano "ferível a técnica legislativa por princípios àquela de tipo regu-
ao ouvido de um esportista ainda que não profissional que ama lamentar. Todavia, é duvidoso que também uma lei formulada
nadar ou para quem se dileta a ouvir música; assim como será por princípios seja útil, na medida em que os princípios rela-
especial o dano na perna de quem mora em um dos últimos tivos aos problemas da pessoajá encontram completa expressão
andares de um edifício sem elevador. A avaliação. eqüitativa no Texto Maior. Não se pode, certamente, afirmar que no
prescinde do rendimento indiVidual ou pro eapitee concentra-se ordenamento a regra seja a inseminação artificial, e a união
nas conseqüências que o dano produz nas manifestações da homem e mulher, a exceção. Considerar o recurso à insemi- "Excepcio-
pessoa como mundo de costumes de vida, de equilíbrios e de nação artificial como excepcional não equivale a exprimir um nalidade"
realizações interiores. juízo negativo sobre a mesma. A qualificação de excepcional do remédio
Tutela significa que o emprego de tal técnica é possível somente quan-
Quanto à tentativa de qualificar o dano à pessoa como não
constitucio-
nal: dano patrimonial e, portanto, circunscrito somente às hipóteses le- do se torna instrumento que não pode ser eliminado, ou que
"injusto" gais típicas, segundo o texto do art. 2.059 Cód. Civ., deve-se é muito útil ao pleno desenvolvimento da pessoa; nesta hipótese
(2.043 ela realiza principalmente o direito à saúde e insere-se na
dizer que a discricionariedade do legislador ordinário, ao ado-
Cód. Civ.)
Capítulo sétimo Situações subjetivas existenciais 177
176
assistência sanitária nacional. Em presença de esteri.li~~de in- O menor tem o direito de conhecer as próprias origens não Direito ao
curável, de riscos de traq.smissão de doenças. here~hta~as, ~e somente genéticas, mas culturais e sociais. O patrimônio gené- conheci-
mento do
razões de ordem psicológica, o problema da_mseI~ll~~ça~n.ao tico - de acordo com a concepção pela qual a estrutura se patrimônio
se coloca mais em termos discricionários. Nao eXIsUradIreIto adapta à função - não é totalmente insensível no seu futuro genético
à prestação sanitária gratuita somente qu~n~~ o recurso à in- às condições de vida nas quais a pessoa opera. Conhecê-lo
seminação for motivado por escolhas arbltranas. . significa não apenas evitar o incesto, possibilitar a aplicação da
Consenti- A atividade médico-cirúrgica que assiste o procedImento de proibição de núpcias entre parentes, mas, responsavelmente,
mento in- inseminação deveria levar em consideração o perfil do consen- estabelecer uma relação entre o titular do patrimônio genético
formado,
timento: consentimento informado, responsável, livre. Os atos e quem nasce. Pode-se objetar que essa solução comporta a
responsá-
de natureza pessoal são sempre, por definição, revogáveis.Iss? atribuição ao menor de um status diverso daquele legítimo (se
vel, revogá-
vel não significa que a revogabilidade não possa, em algumas hI- não fosse consentido o anonimato do doador do sêmen, resul-
taria que o marido da mulher que deu à luz não é o pai da
póteses, comportar responsabilidade, m~.este asl?e~tose refere
criança: ela não poderia, portanto, ser considerada filho legí-
a um plano diverso e não coloca em duvrda o dlre.lto de ~evo-
timo); objeção ligada a uma concepção que acredita que o
gação. Não se pode excluir a ~os~ibili~ade ~ue eXistamars de status de legítimo seja privilegiado em relação àquele de filho
uma mãe e que a figura do paI nao se ld~n~~que com .aquela natural: isso não é mais respondente nem ao ditame constitu-
do genitoL Estas situações indu~em a mdIvrd~ar o ,upo de cional nem à legislação ordinária, na qual desapareceu qual-
relevância que elas têm em relaç~~ ao ~eno~. E possIve~que quer discriminação. Poder-se-ia pensar em um especial tipo de
uma mulher solteira se submeta a msemmaçao com o semen filiação natural para aqueles sujeitos nascidos mediante o em-
de um homem e este, em um segundo tempo, reconh~ç~ o prego da técnica da inseminação artificial. Dúvidas surgem
filho. Nesta hipótese, justamente enquanto existe um JUIZO sobre a possibilidade de o doador reconhecer o nascido so-
favoráveldo ordenamento sobre a recorrência da dupla fi.gu~ mente para fins patrimoniais e sucessórios, mas sempre deverá
genitorial, no interesse do menor tomar-se-á oportuno atnbUIr lhe ser atribuído o direito ao reconhecimento.
ao genitor a qualificação de pai. .' _ Sobre as técnicas de inseminação artificial e de manipulação Ilicitude
Responsabi-
Diversa é a situação do filho que nasce por msemmaçao genética é preciso exprimir um juízo não apenas de licitude da comer-
lidade do
marido e artificial heteróloga em um casal, casado ou não (tem-se i~se- mas também de valor (meritevolez.za). O problema está na indi- cialização
do doador minação heteróloga quando o doador do sême.né u~, tercelr~: viduação dos valores com base nos quais exprimir esse juízo.
se o sêmen provém do marido - ou do convrvente , de fa~o Não se pode aceitar a comercialização, a patrimonialização
_ a inseminação é chamada homóloga), quando e POSSIVel destes fenômenos. Deve-se distinguir a satisfação da necessida-
que se determine um conflito ~nt:e. a posi5~0 do_marido e de de procriar do interesse patrimonial.
aquela do doador, titular do patnmomo geneuco. Nao se pode Uma coisa é o discurso sobre o an da inseminação, outra, é
excluir que se o pai - genitor legal - morrer, o d~~dor - aquele sobre as suas conseqüências. Estas não podem ser igno-
genitor genético - possa assumir ~gumas responsablhdades, radas pelo jurista. Mesmo se o an não fosse conforme ao or-
mesmo de tipo educativo, em relaçao ao filho. denamento, as conseqüências deveriam ser previstas de todo
Proibição Deve-sedissentir das propostas que prevêm' o anonimato do jeito, de maneira a não prejudicar o nascido.
de anoni- doador do sêmen. As perplexidades sobre a eliminação do Já foi lembrado o papel de uma série de normas constitu- Experimen-
mato anonimato não podem representar uma contra-indicaç~o .à
cionais (arts. 2, 29 e 31 Const.) como parâmetros de juízo que tação gené-
inseminação artificial. Não tutelar o anonimato, antes, atnbUIr não consentem a licitude da clônação, da hibridação. Uma tica e tera-
responsabilidades a quem doa, com o seu sêm:n, a vida, per- conhecida sentença da Corte constitucional (n2 27 de 18 de pia
sonalizar a doação, significa evitar a especulaçao. fevereiro de 1975) considerou o embrião como pessoa.
Capítulo sétimo Situações subjetivas existenciais 179
178
Quanto à manipulação genética, nem .se.mpre é possív~l, ao função instrumental para a melhor realização dos interesses
revés, excluir a sua licitl}-de.Quando eXIstIruma necessIdade afetivos e existenciais de seus componentes. As "razões' da fa-
terapêutica, relacionada à ratio do art. 3, ~ 2, Const., .c?mo mília" não têm autonomia em relação às razões individuais.
limitação física ou psíquica eliminável e que de fato condICIOne Não se poderia nem mesmo pensar que a titularidade dos
o pleno desenvolvimento da pessoa, e a situação for relevante direi tos em vez de pro eapite possa com petir aos ramos nos quais
nos termos dos arts. 2 e 32 Const., a manipulação genética a família é subdividida.
deverá ser feita, e com coragem, se conseguir evitar um dano A atribuição do direito não é a título de quota; cada um tem Titularida-
de plena,
certo e grave e possibilitar o desenvolvimento normal, se não a sua plena disponibilidade, com implícita impossibilidade de não por co-
otimal, da pessoa e sempre que existir a certeza, de um ponto que ela seja de fato negada aos outros titulares. Freqüentemen- tas
de vista científico, de alcânçar um resultado positivo. Causa te, não existe conflito de interesses, mas se existisse, a solução
perplexidade a legitimação de uma intervençã~ de. manipula- seria ditada por critérios diversos daqueles da comunhão pa-
ção genética no embrião toda vez que for POSSIVel mtemr no trimonial: seria necessário recorrer ou ao princípio da priori-
homem. É preferível legitimar apenas aquelas intervenções qu<; dade ou ao critério da avaliação objetiva. O interesse dessa
servem a remover graves impedimentos físicos ou psíquicos. E perspectiva de estudo afunda as suas raízes na particularidade
oportuno evitar qualquer tipificação legislativa. A manipulação da" formação social" família, na sua função constitucionalmen-
não pode chegar à reprodução de seres otimais, nem a novas te relevante e na peculiar solidariedade que caracteriza as suas
concepções da raça. Isso significaria dar um passo para trás na vicissitudes internas, inspiradas na igual dignidade moral e
história. jurídica dos seus componentes e à unidade familiar, entendida
como comunhão - ainda que não mais atual- de sentimentos
Situações 115. Situações individuais e familiares. - Algumas situações e de afetos, isto é, de vida e de história.
fundadas existenciais têm em comum uma estrita conexão entre titula-
no status
pers01llU ridade, seu exercício e razões familiares, ao ponto que o status
116. Nome e sobrenome entre exigências do Registro Civil e tutela
jamiliae - passado, atual ou potencial do sujeito - constitui
da personalidade. - Em relação ao nome, a doutrina, apesar de Sobreno-
o pressuposto legitimador. A referência é à<].uelassituações.q~e
ter advertido para a oportunidade" de uma reconstrução global me e grupo
têm em comum a função de tutela de razoes que, na maIOna
das vezes, transcendem o interesse existencial do indivíduo, da relação que liga o sujeito aos grupos sociais nos quais se
envolvendo aquele do grupo na sua história, também futura. insere e da função que efetivamente o nome exerce nesta
Cada componente é legitimado também processualmente ao perspectiva" , não evidenciou a particularidade da relação entre
exercício destes direitos, realizando um interesse que é próprio pessoa e família, que, certamente, não pode ser equiparada
e também comum aos outros sujeitos pertencentes ao mesmo àquela existente, mais genericamente, entre a pessoa e qual-
grupo. Este interesse não exclusivo ora resta individual, ora quer tipo de grupo social intermédio do qual faz parte. Não
Interesse in-
dividual e assume o papel de interesse coletivo, no sentido de realizar adquirem importância apenas razões de sangue, de parentesco,
coletivo diretamente a tutela dt; todos ós componentes da família. Em de estreita, às vezes suposta, comunhão de vida; parte do nome
uma e em outra hipótese, a titularidade do direito compete da pessoa, o sobrenome, é também potencial meio de identi-
aos membros da família e não à família como tal. Esta:não é ficação de qualquer componente da família. O sujeito, por
uma pessoa jurídica, nem pode ser concebida como um sujeito outro lado, é legitimado ao uso do nome e do sobrenome
com direitos autônomos: ela é formação social, lugar-eomuni- fainiliar (que é parte do primeiro); ele, como componente do
dade tendente à formação e ao desenvolvimento da persona- grupo, tem um interesse tutelado (arts. 6 e 7 Cód. Civ.) de
lidade de seus participantes; de maneira que exprime uma requerer que cesse qualquer fato lesivo ao "nome" familiar.
Capítulo sétimo ,, . Situações subjetivas existenciais 181
180
R i
dade, na expressão da sua personalidade. Mesmo sendo a tutela Tais parentes não podem transmitir este direito, que lhes deriva , I
do nome de igual relevância para todos, assume a cada vez ex lege, aos herdeiros. Trata-se de um interesse não patrimonial 'I
I'
i
conteúdo e extensão diversos, adquirindo só raramente uma pelo qual somente impropriamente se pode falar de transfe- f: I
[
estrita autonomia. Para a perspectiva que aqui interessa, deve-se rência (transferibilidade). A avaliação do prejuízo entre o de
evidenciar que todo nome é sempre expressão de um giupo cuius e cada parente legitimado pode ser, em concreto, diversa,
familiar que tem a sua história e a sua r~pu~ção. De f~~a podendo cada um deles exprimir exigências e motivaçôes não
que não é possívelindividuar a esfera de ~phcaçao da relevancla coincidentes. Todos, porém, exercem um papel de interpreta-
do nome e do grupo familiar sem levar em conta todas as ção das razões do grupo familiar, na maior parte das hipóteses
Capítulo sétimo Situações subjetivas existenciais 183
182
-.i
fundado no ius sanguinis e, principalmente para a família nu- precípua em relação ao lugar-comunidade dos afetos. Na mais
clear, no ius nominis, Ouseja, na unidade da família. Agir, então, ampla problemática da privacidade, assume um papel inde-
torna-se além de um direito, um dever que afunda as raízes na pen~~nte a tu.tela da intimi~ade da vida privada do grupo
solidariedade familiar. Isto não significa que o parente não aja ~an~Il~ar,e~peClalmente do nucleo convivente. A situação do
como titular de um próprio interesse. Trata-se de um interesse mdIvIduo e complexa, comporta tanto direitos como deveres
pessoal e familiar voltado a tutelar a personalida~e ~o autor e em relação aos componentes do núcleo familiar, uns e outros
a verdade da manifestação do seu pensamento e, mdIretamen- f~nd~d~s .na unidade e na solidariedade familiar e nas obriga-
te também a honra e a reputação do grupo familiar ao qual çoes~ur:dIcamente relevantes nas especiais r~lações (conjugal,
p~rtence. É um direito i.ndividual e não exclusivo para 05 que de fihaçao) reforçadas pela convivência. A tutela da intimidade
fazem parte das categorias dos parentes; é exclusivo, ao con- é ,ligada à 'p.essoa não como tal, mas como componente do
trário em favor do autor durante a sua vida. nu~l~o famIhar. Cada um tem o direito, em relação aos parentes
Nã~ obstante a expressão" cônjuge e filhos" contida na lei, pro~llnos, ~ que fatos e comportamentos de natureza exist-
Direito in-
dividual de onde o "e" poderia dar a impressão de atribuir cOl~untamente e~lcIal,relativos a ele e à sua família em sentido lato, não sejam
agir a ambos o direito de agir, pelo fundamento da norma, pela dIvulgados ao extemo. A intimidade da vida familiar é uma
particularidade da situação de cada componente da família e condição para o livre desenvolvimento da pessoa (arts. 2, 3, ~
pela diversa avaliação dos interesses en~jo~o - be~n po~~ndo 2, 13, 14 e 15 Const.).
somente um deles ser herdeiro dos dIreItos patnmol1laIs de A privaci~a~e do grupo familiar em relação à ingerência de
utilização da obra de engenho - a opinião mais fundada é terceIros, SUjeItospar?cular~s e, ainda mais, públicos, apresen-
aquela que atribui singulannente..a cada component~ do nú- i
I ta-se co~o .uma mal1lfestaçao de respeito da mais qualificada
cleo familiar o direito de agir. Nao se trata de um mteresse e. CO~lStituclOnalmenteprivilegiada formação social, além da
coletivo; a sua natureza existencial exclui que sobre ele possa I dI?"l1l?adedas pessoas que dela fazem parte (art. 29 S5.Const.).
ter razão a maioria, ao ponto de impedir a um qualquer dos Nao e possível, nesta sede, eXaIllinar com detalhes a extensão Tutela ini-
componentes do grupo o efetivo exercício. d<;> direito ..E isso, e ~ n~odalidades desta tutela. Basta relevar que o interesse à bitória
com mais razão, se pondera-se que a maIona pode na estar pn~cIdade pe.sso~l_e fam.ilia: ~m relação a terceiros pode tra-
condicionada por interesses de natureza patrimonial e heredi- dUZIr-sena atnbUlçao ao mdIvIduo de um direito de requerer
tária: o interesse pessoal acabaria por ficar sem tutela em favor que cesse a ilícita interferência, atual.ou potencial.
de interesses patrimoniais (por exemplo, nas hipóteses pouco
ortodoxas nas quais os parentes são obrigados a não manifes-
, 119. Tutela da imagem, solidariedade familiar e direitos do indi-
tarem a própria vontade); o que certaJIlente seria em contraste
vzduo. - Em tema de tutela da imagem (art. 10 Cód. Civ.;art.
com os princípios do ordenamento. Quando os titulares do
direito são menores, eles, se são conscientes e maduros sufi- 97, ~ .1, ~einº 663 de 22 de a~ril de 1941) ou do retrato (art.
96, leI n- 663 de 1941), a noçao de família é bem limitada. A
cientémente, poderão manifestar a vontade de exercer esse
direito e não poderão ser contrastados pelo seu representante autoridade judiciária poderá ordenar a cessação do abuso o
legal. Além de tudo são situações existenciais, de natureza valor do ressarcimento e qualquer outra possível disposiçã~ a
personalíssima e indisponível, cujo exercício é idône<;>. com~ "pedido do interessado" (art. 10 Cód. Civ.). ' j-' ,
\:" ~
.i
nalizada por .fora, por objetivos determinados pe IO IegIs . 1ad or Atividade
. .
respeito da sua dignidade e com o uso de formas e de meios para atender mteresses gerais mas é condicionad d mformatlva
que não sejam traumáticos e, portanto, de per si deseducativos. ,. -' a por entro, e função
pe I.a propna
_ razao
_ profunda do seu reconheciment o: contn-. promOCIO" .
Depois da morte do autor ou do destinatário, à falta de bUlr.a promoçao, à formação e informação, isto é, ao desen- na! da pes-
válidas disposições por parte deles, o interesse dos parentes é VOIVlmentod~ personalidade dos consociados, sem excluir soa
similar àquele já examinado em outras fattispecie. aqueles ,q~e sao objeto de crônica ou de crítica. Os valores
deontologIcos da lealdade e da boa-fé e o respeito à verdade
121. Liberdade de imprensa como função e exercício de um direito substancial dos fatos não representam ordem interna aos jor-
Informa-
individual. - A informação, em uma sociedade democrática, nalistas, mas se traduzem em deveres de comportamento. Con-
ção e for- representa o fundamenlo da participação do cidadão na vida tra. a inadimplência deles é possível reagir com as técnicas e
mação do do País e, portanto, do próprio correto funcionamento das
cidadão ?s.l1~s~~me_ntos civilísticos, daqueles cautelares e propriamente
instituições. A qualidade e a eficácia do comunicar, todavia, mIbItonos .aq.ueles reparadores em sentido amplo.
dependem sempre da formação de quem informa e dos desti- A pecuhandade do exercício da liberdade de imprensa é
natários da mensagem; e a formação destes é o resultado da provada pela própria presença de institutos de tutela ou de
liberdade da manifestação do pensamento (art. 21 Const.), autotutela como a retificação e o acesso individual e coletivo
daquela da arte, da ciência e de seus ensinos (art. 33, ~ 1), além às fontes de informação.
da autonomia das instituições de alta cultura (art. 33, ~ 6).
Q
Verdade O ordenamento da profissão de jornalista (lei n 69 de 3 de . 122. Direito à retificação. - Os institutos da retificação de Imprensa e
dos fatos e fevereiro de 1963), no art. 2 - com a significativa rubrica ImprenSa e da retificação rádio-televisiva são disciplinados res- ~diO"televi-
dignidade
da pessoa "Direitos e deveres" -, precisa que "É direito insuprimível pectivamente pelo art. 8 da lei n 47 de 8 de fevereiro de 1948
Q
sao
dos jornalistas a liberdade de informação e de crítica, limitada (na nova versão disposta pelo art. 42 da lei n 416 de 5 deQ
pela observância das normas de lei ditadas para tutelar a personalidade agosto de 1981) e pelo art. 10, ~ 2, lei n 223 de 6 de agosto
Q
de terceiros, e é obrigação inderrogável deles o respeito à verdade de 1990, que substituiu o art. 7 da lei n 103 de 14 de abril de
Q
substancial dos fatos, observados sempre os deveres impostos 197?: l!m obriga o responsável a fazer inserir no jornal ou no
pela lealdade e pela boa-fé". É importante notar que as normas pe~odIco ou na agência de imprensa "as declarações ou as
de lei ditadas para a tutela da pessoa não podem esgotar-se retIficaçõe~ dos sujeit~s ~os quais foram publicadas imagens
certamente naquelas penais, mas se identificam, sobretudo, o~ aos quaISforam atnbmdos atos ou pensamentos ou afirma-
com os princípios fundamentais e, em particular, com as nor-
•. ~oes que eles consideraram lesivos à própria dignidade ou contrárias
mas contidas nos arts. 2 e 3 Consto Nesta perspectiva, deve ser a verdade, desde que as declarações ou as retificações não te-
apreciada a orientação que, mesmo em presença da verdade nha~ conteúdo suscetível de incriminação penal"; o outro,
dos fatos, configura como ilícita a sua crônica e a sua valoração relatIvo ao. rádio e à televisão, dispõe que "Qualquer pessoa
quando elas forem realizadas com inútil lesão à dignidade da que se ~ar::stderete,s~da ,nos seus interesses materiais ou morais por
pessoa. Mesmo o condenado à prisão perpétua tem direito ao tr~nsmtssoes .c~trarzas a verdade, tem o direito de pedir [...] que
seJa transmItIda u~a retificação ad hoc, desde que esta última
respeito como homem. Se é verdade que a liberdade ex art. 21
nao tenha conteudo que possa comportar responsabilidade
Cons. é garantida não somente em relação ao interesse de
penal" .
quem utiliza o meio de difusão, mas também em relação àquele
É evidente a disparidade de pressupostos e de tratamento Dignidade
do destinatário da comunicação, é também verdade que tal entre as duas jattispecie nas quais, para fins de retificação, se ou verdade
atividade de informação deve ser exercida respeitando o valor
requer ora somente a lesão à dignidade mesmo em presença
da pessoa. A informação realizada desse modo não é funcio-
Capitulo sétimo Situações subjetivas existenciais 189
188
da verdade das declarações, ora que as transmissões seja~ ~on- em~ede de resp~sta, mesmo quando estas eram presentes no
trárias à verdade e, por.tanto, lesivas a interesses ,matenalS ~ escnto em questao, cal~ular n~ trinta linhas, dentro das quais
morais. Esta disparidade não encontra um fundamento razoa- conter a resposta, ~bem os utulos e as premissas da obrigação
vel. b' - quando, na realIdade, a resposta, e particularmente a sua
Disparida- A disparidade juridicamente injustificada se estende tam em extensão, deveria ser proporcionada à entidade das declarações
deÍ1~ustifi-
cada ao tratamento e às modalidades de atuação. Enquant:> que e. das retific~ções, se~a~ela quantidade, seja pela sua comple-
declarações e retificações - preste-se bem atenção, n.ao s_o- Xldade -, nao contnbUl para realizar efetivamente um direito
mente retificações - devem ser publicadas, pelos jornms, nao huma~o fund~ental e para atuar, sem hipocrisias, o equiva-
além de dois dias daquele,no qual foi feito o pedido, "no alt~ l~~te u!fo.rmauvo, de .maneira. a informar corretamente a opi-
da página e colocada na ~esma.?á~na d~ jor~al na qual fOI mao publIca, :onsenun,do, assu~, uma consciente participação
publicada a notícia"; para os penodlCos, nao alem do ~egu~do de t.odos na Vidado paIS.A releItura da disciplina ordinária, a
número sucessivo à semana na qual chegou o pedIdo, na ~uamterpretação combinada com os princípios constitucionais, ~~~c:ãO
mesma página na qual foi publicada a notíci.a à qual s~ refere"; lx,tduzema não conside~r. a retificação um instrumento excep- contraos
para os programas de rádio e televisão é preVistogenencame~te clOnal a ser a~uado r~stnuvamente, nem necessariamente que "poderes
que as retificações sejam efetu~das "d~ntro de quaren~ e,Olto deva ser relaCIOnado a natureza pública do sujeito editorial. O privados"
horas da recepção do respecuvo pedIdo, na mesma ~al:caho- art. .1 O, ,~. 2 esclarece que a obrigação de retificação é do coÍlt
rária e com o realce correspondente àquele da transmlssao que c:ssIOnano do serviço, seja privado ou público. A retificação
deu origem à lesão aos interess~s" . S~mente para a i~prensa, nao. en~ontra o seu correspectivo na subvenção pública, direcl:
por fim, se especifica que as reuficaçoes e as declaraçoes,. mes- ou mdlreta,mas se apresenta como um indispensável instni"i:
mo tendo que fazer referência ao escrito que as d~termmou, menta de tutela da pessoa.
"devem ser publicadas inteiramente, desde que conuda: ~entr? Mais de ~m as?ec~o par~cular ~a disciplina ordinária em Duvidosa_
dos limites de trinta linhas, com as mesmas caractensUcas u- tema. de ~eu~~aç~o e suspe~to de mconstitucionalidade, sej«;lco~stitucio-
pográficas, pela parte à qual se referem diretamente as afirma- ~or Vl<~l:ça?mJusuficad~ da Igualdade de tratamento, seja pela nahdade
ções contestadas" . . . msuficlenCla das modalidades atuativas do direito de respostá',
Enquanto que o art. 8 da lei de imp,:ensa ~ c~m a.slgmfi- que, mesmo quando é formalmente reconhecido, corre o risc6"
cativa rubrica "Respostas e retificações - atnbUl_ao .m~eres- de se realizar çom formas inadequadas."
sado um verdadeiro direito de resposta porque na? hmlta~o
Uma tendência à unidade pode também ser individuada na
somente à mera retificação (eliminação de um erro, l.?tegraç.ao
nova indicação acerca do âmbito de aplicação da tutela que,
da notícia, etc.), mas estendido a qualquer declaraçao rel~uva
quando faz referência à avaliação pessoal do requerente, tende
ao conteúdo do escrito em questão, o art. 10, ~. 2 da leI de
a se ca~cte,rizar ~or uma mais marcada valência subjetiva da ,I
I
disciplina do sistema de rádio e televisão público. e pri~do 11
pretensao. E sufiCIente que o requerente "considere" imagens,
parece literalmente referir-se à retificação em ~en.udo estnto: ~.
Disparidades, também essas não justificadas, p.nn~lpalmente ~ atos, pensameIitos, afirmações a ele atribuídas como lesivos à
luz da qualificação, por parte da Corte ConsUtucIOnal, do dI- sua dignidade; ampIia~se desse modo a legitimação, também I:
!
reito de retificação como direito humano fundamental ex art. pr?cesSual, além do dificil e discricional limite da lesão objetiva i
2 ConstoAo contrário, partindo da importante qu&ifica~ã?, é e mtroduz-se, portanto, os pressupostos para titna colocação f,
Interpreta-preciso reler as precedentes disposições ampliando ã0~axI~0 relativista. Neste contexto; não se pode, portanto, continuar a
çãosistemá-
ticae ade- o conteúdo desse direito sem aviltá-lo com interpretaçoes hte- afi~ar q~e entre a retificaçãode imprensa e aquela rádio-te-
quadorarais e restritivas. Assim, excluir o direito de publicar imagens leVislvaeXlstauma diferença qualitativa.
T ''"'
.
190
Capítulo sétimo .,I ',' Situações subjetivas existenciais 191
municação ,I
pessoa objeto direto ou indireto da mesma informação. Neste estn~ente relacionadas. A liberdade de educação não sejoga Educação
contexto pode-se também qualificar a notícia como bem que lig ao mvel apenas escolástico, mas na lealdade da transmissão e formação
concorre a formar a personalidade; a sua correta atuação cons-
titui uma das passagens cruciais da reconstrução do sistema.
é
A atividade informativa nunca é culturalmente neutra nem
atividade em função de si mesma, mas é sempre constitucio-
I tanto dos fatos quotidianos, quanto dos problemas culturais
uns. ~ outros igu~mente carregados de valores pedagógicos:
POSItiVOS o~ ne~tIvos, segundo as modalidades e os tempos da
Arts. 21 e
J sua comum caça0. ,O problema da liberdade de educação deve
2 Const. nalmente garantida para que contribua, do mesmo modo que
ser prop~sto, por~nt.o, e co~ particular atenção, em relação
qualquer outra atividade, para o desenvolvimento do homem ~os canaI~ e as tecmcas da mformação, que cada vez mais
e para sua efetiva participação na vida comunitária. O direito 1Ovade~,~Iteralmente,pessoas e famílias,acabando por achatá-las
de manifestar o próprio pensamento e a liberdade de imprensa
na ~~ona das vezes sensibilizando-asa valores efêmeros qu~
não são posições autônomas que têm justificação exclusiva no
condiaonam o des~nvo.lvim~ntoda pessoa e a sua formação.
art. 21 Const., mas se apresentam estritamente relacionadas
Em te~os conStItu~lOnaIS,o tema da educação não implica, Sistema
aos direitos invioláveis e aos deveres inderrogáveis (art. 2 constitucio-
nem em ViapreferenCIal e nem mesmo exclusiva, os arts. 33 e nal
Const.). 34 Const., sobre os quais de regra se concentra a atenção, mas
Para a exoneração da responsabilidade do jornalista não é
Limites in- envol~esobretudo aquelas norm~ que caracterizam o sistema.
ternos do
necessário, nem de outra parte é sempre suficiente, a verdade
EspeCIalmente os arts. 2 e 3 sobre direitos e deveres do homem
poder dos fatos: é preciso a honestidade da sua investigação e de seu
e sobre o princípio de solidariedade e de igualdade, que assu-
controle, a exaustão das circunstâncias; em outros termos, são
mem .~ papel central e incidem seja sobre a interpretação
necessárias lealdade e diligência profissional. Todo poder,
do p~nc~plOde ~~: cada um tem" o dever de exercer, segundo
constitucional ou não - e aquele da informação não é o menos
as propnas p~ssIbIhdades e as próprias escolhas, uma atividade
relevante -, deve ter limites internos. A violação de tais limites
ou uma funçao que concorra ao progresso material ou espiri-
concretiza um dano extracontratual à pessoa, injusto e, como
tu~ da socie~ade" (art. 4, ~ 2), seja, e principalmente, sobre
tal, ressarcível (cfr. retro, ~ 113). a mterpretaçao da solene enunciação pela qual a "República
É preciso prever técnicas, regulamentos e controle para que
Necessida-
a informação de per si útil, seja respeitosa da dignidade da pessoa
,?
pro_m~ve desenvolvimento da cultura e da pesquisa científica
de de con- e tecmca._ (a:t. ~, ~ .1), ex~lici~ente proclamando que "A
frontação e realmente pluralista. E seria de auspício que isso se realizasse
arte e a c~encIasao hvres e hvre e o seu ensino" (art. 33, ~ 1),
também no âmbitó de cada cabeçalho para que, sem perder a
de ma~eIra que sela. de modo peculiar seja a liberdade de
sua fisionomia, garantam no seu interno a "confrontação" com
expr~ssao.(art. 21) seja aquela de associação (arts. 18 e 19).
os outros e, em particular, com aqueles dos quais tenham
_Ate aqUi o quadro de referência normativo volta-se às rela- Famüia e
di.retamente ou indiretamente falado.
çoesgeti,lis entre a República e a instituição escolar entre a educaç~o
Somente desse modo o poder de informação, não funciona-
República e o cidadão. A angulação seria parcial e' punitiva
lizado a razões de Estado ou de grupos de pressão, pode eo-
I
I
'Ii,
194 Capítulo sétimo Situações subjetivas existenCiais 195
para o papel da família cama" sa.cieda?e nat~ral:' (art. 29, ~ fase da adquirida cansciência, da própria discente. A fimilidade
1). Em particular deve-se evidenCiar a lIlJ-partancla de alguns educativa da manifestação. da pensamento. implica uma maiar
princípios canstitucianais pelos quais: "E dever e direito. das respansabilidade das sujeitas, mesma cansideranda que tal
genitares manter, instruir e educar as filhas, mes~a nas~ldos finalidade representa não. a expressão.de um mera direita, mas
fora do matrimônio" (art. 30, ~ 1); "Nas casas de zncapaculadl! antes a realização.de um afícia canstitucianalmente relevante.
dos genitores, a lei providencia para que sejam cumpridas as O mesma discente é titular de um direito-dever que se realiza
suas tarefas" (art. 30, ~ 2); "A República facilita com medidas cam a atuação. de um adequada nível de instrução.idônea para
econômicas e autras dispasições a farmaçãa da família e o cantribuir para a pragressa material e espiritual da saciedade.
cumprimento das tarefas relativas" (art. 31, ~ 1). Estas normas A liberdade na educação., que atém aas canteúdas e aas mé-
Poder jurí- relacionam o ofício. educativo à pracriaçãa, carregando-o de tadas não. pade ser canfundida cam a)iberdade de educação.
dico dos ge- responsabilidades morais e jurídicas. Se aas genitares é reco-
nitores e nem para as sujeitas encarregadas de Jexercer a função., nem
Escola nhecido a priaritária direito e dever de instruir e educar os para as prataganistas-destinatárias da relação. pedagógica.
filhos"":" e isso não. significa somente a abrigação de manuten- A individuação. de um carreta sistema educativa deve ser Pluralismo
cultural e
ção nos estudos -, o cumprimento dessa complexa função canfarme, superando. canteúda e métadas dagmáticas, ao.plu- organizativo
educativa não se pade cancretizar em uma mera delegação à ralismo. cultural e arganizativa. .
Escola sem que sejam envolvidos em moda respansável. A edu- Se a liberdade de escalha na educação. pastula um pluralismo
cação não. se esgata nas horas de trabalha escolar, mas se arganizativa, de canteúda e metadalógica, apresentam-se ne-
apresenta de forma mais ampla e arejada, incluindo. de um cessariamente algumas saluções aas mais graves prablemas.
lado os comportamentas - cama exemplas e testemunhas -:-' Primeira: a Esco.la em tadas as suas ardens e graus deve
da autra tada uma atividade cultural, espiritual e recreativa representar a pluralismo. público-particular, c?ma expr~ssãa
que não. é passível cansiderar delegada ~,Escala. Na ~ais ~as de um mais ampla e canstitucianalmente prategIda pluralismo.,
vezes a abrigaçãa de manutenção. cama suparte patnman~al sem nenhum manapólia.
das deveres de instrução e de educação." - mesma em relaçaa Segunda: na Escala particular é precisa que as canteúdas e
às circunstàncias cancretas pessaais e familiares e à adequada, as métadas, isto.é, a filasafia da ensina, sejam caerentes cam
indispensável inserção. na mundo pradutiva e da trabalha - a inspiração. laica au religiasa da instituto. edu~acianal, s~m
não. se extingue cam a maiaridade das filhas, mas cantinua transgressões que em última análise representanam uma VIO-
até que sejam campletadas as estudas que representam a atua- lação. da liberdade de escalha das usuárias.
ção. de seu "prajeta educativa" . Terceira: a escala estatal, au mais amplamente pública, deve
garantir na seu interiar um pluralismo. metadalógica, de ma-
Liberdade
126. Liberdade de ensino e liberdafÚ! di!manifestação do pensamento. neira a cansentir a "livre acesso." e as "livres escalhas" par
e responsa- - É necessária calacar em evidência a periculasidade da can- parte das usuárias.
bilidade do cepçãa que recanhece a liberdade de ensina indistintamente
ensino
cama liberdade de expressão. sem sublinhar as peculiaridades 127. Nonnativa escolástica e igualdade di!garantias: prioridadl! do Escola pú-
de funções e de respansabilidade. Não. é carreta limitar-se ao.
estrita relacianamenta entre as liberdades de ensina e de ma-
nifestação. da pensamento.: quando. esta tiver função. educatiVa
projeto educativo pessoal e familiar. - De um panta de vista nar-
mativa deveria estar superada a pasiçãa de quem adverte que
em relação. ao. respeita à persanalidade da menar a escala
:~~~de
blica e par-
de garantias
deve ser submetida ao. cantrale de cangruidade cam a pensa- estatal afereceria maiares garantias. Tal pasiçãa encerra a
mento. e a filasafia de quem primariamente é parte substancial maior insídia na pressupasta que diyersas paderiam ser as
da ensina, isto.é, em primeira lugar das genitares e depais, na garantias para a menar na escala particular em relação. àquela
-~
, I
Capítulo sétimo Situações subjetivas existenciais 197
196 \I
pública, não levando em consideração que o ple~o de.se~vol- filho pod~ ~ão consistir somente em aspectos patrimoniais;
vimento da pessoa - em respeito às suas natUraIS apudoes e nem d<:> Patno Poder dos genitores é possível excluir os aspectos
às escolhas familiares - encontra garantia no art. 2 Const., educativos. Ao contrário, o maior prejuízo para o filho" rela-
que caracteriza todo o si~te~a. . . ciona-se, por ordem hierárquica dos valores privilegiados pela
Instrução A dicotomia escola publIca-escola parttcular expnme uma Constituição, principalmente à esfera pessoal, e, portan'to, às
escolástica
posição concorrente e não antinô~ica. ~im, concorrentes ~ situações existenciais" .
i'rí
,.'. Ii.l.!'.. e familiar
f não-antinômicas apresentam-se a mstruçao confiada ao.s gem-
lq tores e aquela confiada ao sistema educacional; na medida em 128. Escola particular ou pública: pluralismo efetivo. - Quanto "Interesse
'I'. :
~'~
que, porém, o poder jurí<;lico (potestà) de e~ucar, que c~rac,te- à escola particular, o discente e os seus pais são titulares de à tendên-
:',' I
riza aquela dos genitores fundada na relaçao pr,?creauva ~ a um interesse juridicamente relevante a que na escola escolhida cia"
I.: ;
matriz de 'qualquer outra, a mais ampla. A funçao educauva, o ensino seja conforme às orientações e às metodologias pró-
representando um projeto formativo peculiar e culturalmente prias da escola. ,
pessoal, deve prevalecer sobre qualquer outro direito de tipo Quanto à escola pública, o pluralismo que a caracteriza nem Pluralismo
burocrático e dogmático, destinado como é a enfraquecer-se sempre se realiza na prática; à pluralidade das vozes freqüen- da escola
somente em relação às escolhas do menor à medida que ele se temente se substitui uma unidade de endereço de todo o ins- pública
encaminha para a maturidade e a capacidade de disc~rnimen~o. tituto ou pelo menos do ano ou da classe à qual o aluno é
Todavia, o Estado não tem somente uma tarefa mtegrattva destinado, acabando assim com ser lesado o direito dos pais e
e instrumental em relação ao prioritário direito-dever dos ge- dos alunos de dar-se um projeto formativo e também o direito
nitores de instruir os filhos, de maneira a "criar ou disciplinar
de incidir sobre as escolhas metodológicas. Estas são totalmente
os instrumentos através dos qu.ris os genitores podem cumprir
subtraídas à pessoa interessada e a quem tem a responsabili-
a tarefa que lhes foi confiada" . Programas e matérias ~ão, pelo 1
! dade moral e jurídica por sua educação.
menos para fins de controle de mérito e do consequente re- ..
O sistema educacional nesta ótica não é liberal e deve ser Necessida- ':""' '
conhecimento oficial do título escolástico, subtraídos ao poder
reformado. O aluno e os pais não têm instrumentos substanciais de de pode-
jurídico (potestà) dos genitô1'es,ainda que, principalmente para res de con-
os estudos de 2l! grau e universitários, sejam fortemente pre- nem remédios jurídicos adequados para subtrair-se a um ensino trole
dispostos no âmbito da autonomia das instituições de alta cul- não conforme o próprio modo de conceber a vida e capaz, por
tura - cada vez mais reivindicadas no tempo presente - e conseguinte, de suscitar problemas de incompreensão muito
das opções dos estudantes. _'. . i graves para a formação do aluno. É necessário que na escola
;
Inviolabili- O sistema tem uma articulação e diversificaçao nas disuntas i pública exista não apenas pluralismo das ocasiões mas também
dade do va- fases da formação do homem mesmo em respeito ao seu valor 1 a possibilidade de uma escolha culturalmente fundada e não
lor indivI- ~ arbitrária, que espelhe as convicções dos protagonistas da edu-
duai
fundamental que não pode ser subordinado a razões superio~es r
do Estado ou a qualquer outra razão superior de fato opre~lva ," cação, sem pensar no aluno como um objeto de conquista e
do pleno e livre desenvolvimento da pessoa como valor lrre~ i'
"
de endoutrinamento independentemente e contra a sua adesão
nunciável e indisponível. Indisponível mesmo por parte do.s 1
convicta e a convicção dos genitores. O direito ao estudo im-
genitores para os quais, no caso de inadi~plime~to das o~n- l, plica também que os métodos do ensino sejam conformes à
,I
gações de educação em relação aos filhos, sao preV1s~~~ç~es ;; visão pessoal do mundo e da vida ou pelo menos aceitos por
:,I
penais (art. 731 Cód. Pen.) e disposições de natureza oV1h~~,~' quem é destinado a receber os seus efeitos. Não basta a facul-
que vão da perda do Pátrio Poder ao ,afas~ento d?s ;fi1hQs , dade de escolha de planos alternativos, é preciso também a
da residência familiar (arts. 330 e 333 Cód. Civ.). O preJUlz~'c1~ faculdade de escolha de cursos alternativos.
~
"
Capítulo sétimo Situações subjetivas existenciais 199
198
Análogas considerações poderiam ser feitas com referênci~ 47, ~ 2, Odireito à moradia se realiza nesta perspectiva mediante
aos livros de texto. Se alguns livros de texto ~orem, pelo~ me- técnicas administraúvas e civilísticas.
todos e pelos conteúdos, orientados ideologIcam~nte, nao se Interessantes são os instrumentos uúlizados, e valeria a pena Perfis (e
pode excluir qualquer intervenção tendente ~ p~dIr a sua subs- analisá-los a fundo, para realizar uma proporcionalidade entre apoios) pú-
blicos e pri-
útuição. A pluralidade dos livros de texto: pn~Clpalmente nos construção civil privada e pública. Estes instrumentos podem vados
primeiros anos, isto é, durante a fase maIS dehcada. de forma- contribuir para realizar a distribuição eqüitaúva entre público
ção, pode ser não teórica, somente ~e for eX"press~o~e uma e privado em cada ordem territorial, evitando favorecer alguns
consciente escolha por parte dos gemtores. Nao sena congruo proprietários de áreas e alimentar o clientelismo. É preciso
em um insútuto parúcl!lar o uso de um texto ~ota_l~ente em superar o esquema da expropriação e a sua lógica autoritária
contraste. com a orientação da escola, com lesa0 a hberdade e autoritaÚva. Entre os instrumentos negociais um papel par-
da Escola, como organização global que a Consútuição enten- úcular exerce o mútuo de escopo. Interessantes técnicas de
deu garanúr. Problema que para a_escol~ pública s~ apr~senta financiamento, de úpo não-privatísúco, são aquelas previstas
em relação ao ano ao qual o filho e desunado. Desunaçao que pelo Estado, pelas Regiões e pela Comunidade internacional:
envolve também o direito-dever de vigilância e de controle por a técnica de financiamento primária é sempre o financiamento
parte dos genitores sobre o projeto formaúvo para o filho. do Estado com contribuições eapitale o in conto interessi.
Nesta perspecúva a lei sobre o equo canone apresenta dúvidas £quo cancme
Direito pa- 129. Do chamado direito à moradia. - O tema complexo, atual, de inconsútucionalidade quando prevê privilégios para a pro-
trimonial e angusúante" do direito à moradia é certamente. um ideal
lO priedade desúnada a uso não residencial (tome-se, como exem-
existencial
ponto de verificação dos princípios, dos valores, do_smt~resses. plo, a prelação). Esta disparidade de tratamento entre locações
De direito à moradia pode-se falar em duas ace~ço~s dlVer~as: para uso residencial e aquelas para uso diverso não responde
segundo se entenda colocar o direito em relaçao as relaçoes à lógica personalista da Consútuição.
econômicas (para esclarecer melhor, aos arts. 41, 42, 43 e 47
Const.) ou (lido em relação ao art. 3, ao art. 4, ao art. 47, ao
art. 14 sobre a liberdade pessoal, ao art. 31, ~ 1, ao art. 36, ~
1, Const.) como aspecto de um unitário valor normaúvo que
é a tutela da pessoa.
O direito à moradia é da pessoa e da familia; isso tem con-
Realização
diferencia-
seqüências notáveis no plano das relações mesmo civilísúcas,
da por exemplo em tem~ d~ ~ocação, ~e equo canon~, .e, nas coo- ..
peraúvas de construçao clVIl,.d~ submgresso ~o SOCI~defunto.,
O direito à moradia como dIreIto ao acesso a propnedade da
moradia é um dos instrumentos, mas não o único, para realizar
o gozo e a uúlização da casa. Como direit~ eXistencial pode-:se
saúsfazertambém prescindindo da propnedade d~ moradIa;
por isso incide, em maneira decisiva, sobre as relaçoes de uso,
de moradia e de aluguel.
Garanúdo não é apenas o acesso à casa mediante a poupan~a,
porque ela tutelaria somente aqueles qu~ ~m um~ perspecuva
fisiológica podem poupar. Além do remedlO preVIsto pelo art.
-'j,:
Capitulo oitavo
130. o direito comum das situações patrimoniais. - 131. Situações reais e'~
de crédito. - 132. Situações que têm como referência as res. - 133. Crise:"'
da obrigação como categoria a-histórica. 134. Perspectiva dinâmica efuncio-<"
nal das obrigações. - 135. Potencialidades expansivas do modelo creditício:
e daquele proprietário: as modernas formas de pertinência (appartenenza).
- 136. Obrigações naturais e aplicabilidade da normativa respondente à
moral social. - 13 7. Situações naturais creditórias e debitórias e suas vicis-
situdes. - 138. Correlação ,entre situações reais. - 139. Objeto, sujeitos e
estatutos proprietários. - 14iJ:7rrupriedadee empresa. - 141. Propriedade.
como situação subjetiva e como relação. - J¥-2,. Poderes de gozo, de utilização
e de disposição. - 143. Teoria dos limites . .:;...144: Poder de controle. --,--'
145. Função social da propriedade e utilidade social da empresa. - 146.
Conformação e ablação (ablazione) dós estatutos proprietários. O controle
de legitimidade. -147. Merecimento de tutela (meritevolezza) dos estatutos
privados e reserva de lei. - 148. Conteúdo mínimo e propriedade. - 149.
Limites e servidão. - 150. Atos emulativos. - 151. A informação como
bem. - 152. Bens exclusivos e bens a gozo múltiplo.-153. Bens corpóreos
e incorpóreos, {nformação como obra de engenho, e informação-notícia. -
154. A informação como ponto de referência de atos e de atividades. - 155.
Desmaterialização das atividades humanas ..
Nexos siste-
130. O direito comum das situações patrimoniais. - Das situações máticos en-
subjetivas patrimoniais é possível apresentar uma elaboração uni- tre obriga-
tária mesmo que não-sistemática, considerando que ainda deve ções e dir.
reais
I,
202 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 203
ser reconstruída uma disciplina comum da relação patrimonial. entre a situação e a coisa: a situação real é aquela que grava
Esta não pode ser ident;ificada com aquela das obrigações nem sobre uma res determinada, específica. A situação creditória,
com aquela dos direitos reais. Nenhuma das duas disciplinas não tendo uma relação de inerência ou de imanência com
constitui, de forma exclusiva, o direito comum das relações e uma res, se realiza mediante o adimplemento e o alcance do
das situações patrimoniais que possa ser concebido como a resultado. Característica saliente é o comportamento devido:
síntese da disciplina de todas as relações patrimonais. Neste a prestação. Na situação dita real a utilidade, o alcance do
contexto, o art. 833 Cód. Civ. é norma que não se exaure em resultado útil para o titular se identifica na relação de imedia-
tema de propriedade ou no âmbito das relações reais, mas tidade entre situação e utilidade oferecida pela res, sem que,
refere-se a todas as situações subjetivas patrimoniais; assim, as normalmente, seja necessária a intervenção por parte de um
cláusulas gerais de lealdade e de diligência (arts. 1.175 e 1.176 terceiro; na situação dita creditória o interesse a favor do titular
Cód. Civ.) não se referem exclusivamente às situações creditá: se realiza exclusivamente mediante a atividade, o comporta-
rias e à noção de adimplemento, mas têm relevância geral. E mento do sujeito obrigado. Característica única e essencial do
preciso, a cada vez, referir-se a esta ou àquela norma, segundo direito de crédito é a intermediação mediante a prestação;
a sua compatibilidade com o interesse precípuo no qual se intermediação que, quando está presente nas situações reais,
substancia cada situação patrimonial. A esse fim é útil o apro- assume um papel complementar.
fundamento da natureza dos interesses que até hoje justificam Estas observações levaram a considerar a presença de um Dever gené-
j •. rico ou es-
'1. as diversidades e as classificações, as quais devem ser conside- dever genérico como característica da situação real. Ao direito
pecífico
d radas orientadoras e problemáticas, e que dificilmente podem dito real contrapor-se-ia uma posição de dever por parte da
se distinguir por precisas linhas de demarcação e de confim. generalidade dos sujeitos; na situação dita creditória somente
um sujeito, o devedor, seria titular da obrigação de comporta-
131. Situações reais e de crédito. - As situações patrimoniais mento devido. A contraposição entre dever genérico e dever
reguladas pelo Código Civil e pelas leis especiais geralmente específico não responde à disciplina de todas as situações ditas
se distinguem em situações reais e obrigacionais ou de crédito: reais: se é possível configurar um dever genérico na hipótese
por um lado, a propriedade privada em todas as suas formas, típica de direito real, que é a propdedade nas suas diversas
os chamados direitos reais de gozo (arts. 952 ss., 1.021 ss. Cód. formas e acepções, isso não é possível na maior parte das outras
Civ.), os direitos reais de garantia (art. 2.784 ss. Cód. Civ.) - situações reais. De regra, nas situações reais ditas de gozo, ao Situações
reais e de-
e, em certos aspectos, os privilégios (art. 2.745 ss. Cód. Civ.) lado do dever genérico por parte de terceiros, existe também veres espe-
-, por outro, as relações obrigacionais, definidas quase em via uma relação entre um centro de interesses (usufruto, enfiteuse, cíficos
residual relativamente às relações reais. Estas últimas seriam direito de servidão) e um outro já individuado (nua-proprie-
típicas, constituiriam um número fechado. dade, propriedade do concedente, direito do prédio serviente).
Tipicidade Ao número fechado das relações reais se contrapõe uma O usufruto, de fato, é situação subjetiva de gozo sobre um bem
dos direi- escolha residual das relações obrigacionais. A contraposição, que pertence a um outro, o nu-proprietário. As relações que
tos reais e
situações
todavia, vai perdendo os seus precisos confins. Existem situações existem entre a nua-propriedade e o usufruto são recíprocas.
"'mistas" mistas que têm caráter típico e tradicional dos direitos reais O usufruto não exaure a sua relevância em relação a terceiros.
(realità) e das relações obrigacionais. Tome-se, como exemplo, Nos arts. 981~1.000do Código Civilitaliano encontram-se uma
o arrendamento rural, a locação de uma habitação e as situações série de direitos e de obrigações que o usufrutuário tem em
em geral que são qualificadas como pessoais de gozo. relação ao nu-proprietário e este último em relação ao primei-
Imediatida- A noção de situação real deriva da relação não só de depeil- , ro, que consentem ao usufrutuário a realização do próprio
de ou inter- dência, mas também de inerência, entre o direito e o seu objeto, interesse: o gozo do bem e o apropriar-se dos frutos que o bem
mediação
204 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 205
é capaz de produzir. Na relação de usufruto estão presentes podem ser feitas em relação ao pretenso caráter do direito de
obrigações específicas, comportamentos tais que impossibili- preferência (o qual seria, além disso, próprio não de 'todos os
tam que estas situações.se esgotem na perspectiva tão-somente direitos reais, mas somente daqueles reais de garantia: penhor
do dever genérico. Análogas considerações podem ser feitas a e hipoteca). O direito do credor de fazer expropriar o bem
propósito da enfiteuse e das servidões prediais. A enfiteuse colocado à garantia de seu crédito e de satisfazer-se sobre o
atribui ao enfiteuta o direito de gozo de um imóvel com a valor da venda com preferência sobre todos os outros credores
obrigação de pagar um preço, dito foro, ao senhorio - de se encontra não só no penhor e na hipoteca, mas também nos
regra, o proprietário - e de melhorar o imóvel (art. 960 Cód. privilégios (art. 2.745 ss. Cód. Civ.), cuja característica de direito
Civ.). Também nesta situação real existe uma faixa de obriga- real (realità) é objeto de discussão.
ções específicas, de obrigáções que integram e qualificam o Em síntese, nem a seqüela, nem a preferência são suficientes Parãmetros
instituto. Assim, nas servidões (art. 1.027 Cód. Civ.) é possível para inspirar uma distinção entre situações reais e de crédito. p~ra um
colher uma relação existente entre dois centros de interesses: Defronte
'.
de uma situação concreta ' mais que rotulá-la a 1". Imari JUIZO em
concreto
neles é possível, por lei ou com base no título (art. 1.030 Cód. real ou obngacional, é necessário analisá-la caso a caso nas suas
Civ.), que existam prestações acessórias, isto é, obrigações ç:om peculiaridades e, especificamente, individuar: 1) a existência
conteúdo específico que integram a disciplina da situação real. a q~alidade, a quantidade da cooperação que um sujeito é
Dificil dis- Portanto, as situações reais não se reduzem ao exclusivo obngado a dar para o alcance do resultado que constitui o'
tinção en- dever genérico de abstenção por parte de terceiros; elas, espe- conteúdo da situação subjetiva; 2) a existência da seqüela; 3)'
tre situa-
cialmente aquelas limitadas de gozo, caracterizam-se pela pre- a presença da preferência.' ;,
ções reais
e de crédito sença de obrigações específicas integrativas. Não existe, por-
tanto, uma precisa separação entre situações creditórias e reais: 132. Situações que têm como referência as res.- Para fins da
freqüentemente situações obrigacionais integram-se com inte- qualificação real ou creditória de uma situação, não importa
resses mais amplos e constituem situações complexas (cfr. retro, que ela tenha o ponto de referência objetivo na res. Isso é -,
capo 6, S 94). confirmado p~lo art. 810 Cód. Civ., o que define "bens" aS
Seqüela e
Os dois tradicionais critérios discretivosdo direito de seqüela coisas que podem formar objeto de direitos, sejam reais, sejam " '~
preferência edo direito de preferência, tidos como característicos das si- de crédito. Existem situações não-reais que têm como ponto ::
tuações reais, não podem ser utilizados para fins de distinção. de referência também coisas materiais. O proprietário de unf ',''1.-
. ..•.
li;
Em virtude do direito de seqüela, inerente ao bem, qualquer terreno pode conceder a favor do proprietário do terreno
circulação do bem, qualquer mudança de titular, não teria vizinho um direito de servidão de passagem (arts. 1.027 ss., Servidão
influência na sobrevivência da situação real (reconhece-se na 1.058 sS.Cód. Civ.). Nasce uma situação subjetiva que incide, de passa-
hipoteca um ex~mplo típico: art. 2.808 Cód. Civ.). Todavia, também em relação à seqüela, sobre a res de modo tal que se gem
encontra-se a seqüela também e~ situações que a opinião co- o proprietário vender o terreno a um terceiro, este será obri-
mum assinala solidamente no campo dos direitos relativos: gado a manter aquele direito de servidão de passagem (arts.
basta pensar na disciplina da locação, a qual prevê que a trans- 2.643, n2 4, 2.644 Cód. Civ.). O direito é oponível aos terceiros
ferência da propriedade do imóvel não influi na relação de adquirentes, aos sucessores a título particular ou universal do
locação, que continua com o novo proprietário (art. 7, 1. n2 proprietário do terreno gravado pela servidão.,
392 de 27 de julho de 1978; é bom lembrar também que na Análogo conteúdo - direito de passagem - encontra-se Direito pes-
soal de pas-
locação ultranovenal a relação apresenta uma tal estabilidade também em uma situação creditória: o proprietário pode con- sagem
que comporta o ônus da transcrição, como para as situações sentir, mas a título pessoal, a passagem sobre o seu terreno a
reais: art. 2.643, n2 8 Cód. Civ.). Observações não diversas favor do vizinho. Na hipótese de alienação do terreno por parte
206 Capítulo oitavo Situações SUbjetivas patrimoniais 207
,
I.
208 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 209
I
como variável arbitrária e subjetiva, mas como dependente da ção de relação jurídica tomando como exemplo a obrigação e
;:';! natureza e dos interesses relevantes na concreta relação, em excluir, depois, a propriedade da problemática relacional por-
"
j'
particular, individuando as situações que estão na base dos atos que não entra naquela noção prefigurada, é operação concei-
,,'; ~ de autonomia. Credor e devedor ou terão o poder de pactuar tual que, partindo de uma determinada experiência também
a produção do efeito individuado, ou o mesmo efeito será histórica e, portanto, de uma análise limitada, tem a pretensão
." .
de ter valência geral; quando, ao contrário, a operação herme- .
realizável unilateralmente, ou mediante o consentimento de
" terceiros qualificados" . A estrutura da fattispecie produtora de nêutica a ser realizada está na ampliação das experiências,
uma vicissitude modificativa ou extintiva dependerá da ordem incluindo aquela proprietária, e na configuração de uma noção
de interesses da preexistente relação obrigacional e - quanto de relação idônea para resumi-las e exprimi-las.
à vicissitude constitutiva - da normativa que caracteriza as Este assunto visa a evidenciar a necessidade de um enfoque Teoria ge-
situações iniciais (a avaliação jurídica, para cada uma das partes, que supere as barreiras entre a parte geral das obrigações e as raI das obri-
gações: crí-
do estado de fato anterior à constituição da relação) que não partes chamadas especiais relativas às fattispecie creditórias, en- tica
podem faltar como justificativa do próprio ato de autonomia. tre a análise da obrigação e aquela das outras relações com
conteúdo patrimonial. Neste prisma, a parte chamada geral
135. PotencialidO.des expansivas do modelo creditício e daquele pro- das obrigações peca por defeito e por excesso.
Prospectiva "
relacional prietário: as modernas formas de pertinência (appartenenza). - A Por defeito, porque deve necessariamente ser integrada não Importân-
separação conceitual e normativa entre o setor das obrigações somente com normas e princípios contidos na disciplina geral cia das nor-
mas sobre
e as outras relações com conteúdo patrimonial e, em particular, do contrato e naquelas especiais das obrigações e dos contrat6s contrato e
i'._.:'J1'~,.i:
a propriedade, mais que se apresentar como conquista defini- ),'
típicos, mas também com os estatutos dos direitos reais e da proprieda-
tiva, representa um dos pontos mais problemáticos que encon- ~: propriedade. Tome-se, como exemplo, o alcance geral da proi- de
,,'o, .'
tra as duas primeiras desmentidas: ora na tendência adquirida bição dos atos emulativos contida na disciplina geral da pró-
.,,~
a superar a distinção das situações patrimoniais em absolutas "'.l;. priedade que deve ser estendida a todas as situações patrimo-
t
e relativas (cfr. retro, capo 6, S 94) e a propor um estudo de ,!. niais, incluindo aquelas' de crédito. Por defeito, ainda, porque
I. forma unitária e compreensiva, ora na ampliação daquela parte inspirada prevalentemente na obrigação pecuniária ou, em
I;; !
I
da doutrina disposta a conceber não somente os chamados
direitos reais limitados, mas a própria propriedade em uma
-1. sentido mais amplo, de dar, como instrumento para a aquisição
da propriedade.
perspectiva relacional (cfr. infra, S 141). E isso pode-se admitir ;A.~.
/ri'
Por excesso, porque nem todas as normas contidas na cha- Perigo de
.,
, .'
como possível ainda mais se se configunlr a noção de relação mada parte geral das obrigações e na conseqüente elaboraçao qualquer
como estatuto, "ordenanlento do caso concreto" , de interesses da teoria geral se adaptam a todos os tipos e casos de obrigações. generaliza-
variadamente correlativos, cada um dos quais individuável na
sua relevância jurídica somente em relação aos outros e não t
",l'
Assim, o instituto da mora do credor (art. 1.206 ss. Cód. Civ.)
não encontra aplicação nas obrigações potestativas ex parte cr~
ção
tanto para fins delimitativos e de confins, mas de recíproca '1 ditoris;ditadas no exclusivo interesse do credor, onde o devedor
coexistência funcional. A perspectiva relacional diz respeito à
própria concepção do direito modenlO chamado a romper
esquemas'e conceitos individualistas para acentuar a atenção
'j não é titular nem de um direito subjetivo ao adimplemento,
nem de um interesse jurídico à liberação mediante adimple-
mento. Utilizar a aplicabilidade ou a inaplicabilidade de parte
naqueles mais Ídôneos para exprimir exigências de socialidade
e de solidariedade. Mais que recusar conceitos, é necessário I. da disciplina geral das obrigações como argumento válido para
excluir a relação da noção de obrigação demonstra, em forma
renová-los em conformidade com a realidade sócio-normativa,
em função serviente a ela, com figuras instrumentais flexíveis,
\. evidente, o erro metodológico. Para cada ordem de interesses
idôneas para compreender as diversidades. Construir uma no-
'i",-
. I. deve ser individuada, sem preconceitos, a normativa a ser apli-
210 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 211
cada mediante um autônomo e unitário procedimento de in- das situações subjetivas protegidas pela reserva de lei, prescin-
terpretação e de quali.ficação ?o fato causati,:o, ?os seus efeito~~ dindo das excogitadas construções formais, creditórias ou reais.
voluntários ef ou legaIS,respeItando as pecuhandades e os reaIS A diversificação dos interesses deduzidos na relação obriga- Complexi-
dade das si-
interesses e valores envolvidos. cional, com a evidenciação também daquelas não-patrimoniais
tuações de-
Mais que sublinhar a transferência de uma privilegiada aten- destinadas a caracterizar a concreta ordem, postula, por um bitórias e
Proprieda-
de e nOVdS ção da propriedade ao primado do crédito, que também acaba lado, a reconstrução do crédito e do débito como situações ~reditórias
formas de por se exprimir em formas de pertinência (appartenenza), é subjetivas complexas nos conteúdos - identificados variada-
circulação importante evidenciar que o ponto incontrovertível é o adqui-
mente em poderes, obrigações, faculdades, ônus -, e por
da riqueza
rido deslocamento da centralidade da direta propriedade imo- outro, a apresentação de uma noção de obrigação sensível aos
biliária e rústica (jondiaria) a formas modernas de pertinência valores e aos princípios fundamentais e, portanto, orientada a
(appartenenza), nas quais o. mecanismo do crédito encontra atuar-se em função constitucional. O mito da neutralidade do
novas e interessantes aplicações. Falar de centralidade da pro- conceito está definitivamente destinado a romper-se. A inci-
priedade em relação às obrigações não tem alcance técnico e dência constitucional se realiza em vários modos: não apenas
pode provocar alguns equívocos. As formas jurídicas creditórias na individuação dos conteúdos das cláusulas gerais como a
(por exemplo, as obrigações conversíveis em ações: art. 2.420 diligência, a boa-fé, a lealdade, o estado de necessidade, etc.,
bis Cód. Civ.) ou aquelas participativas e acionárias, que, toda- mas, sobretudo, na releitura orientadaaxiologicamente de toda
via, envolvem também situações proprietárias imobiliárias, re- a disciplina em que consiste a relação e, em particular, no
presentam bens em sentido amplo mobiliários que de per si - controle de valor (meritevolezza) das ordens de interesses repre-
sem uma atenta análise econômica - não significam.necessa- sentadas pelo título (cfr. retro, capo 6, S 96) e na relevância que Interesse
não-patri-
riamente deslocamento da centralidade da propriedade ao cré~ a peculiaridade deste último tem condições de produzir na monial
dito, mas apenas, novas formas e modalidades de titularidade estrutura formal da relação. Resulta evidente a utilidade de
e de circulação da riqueza (experimente-se aproximar a situa- aprofundar a influência que o interesse não-patrimonial pode
ção de quem seja proprietário de um imóvel àquela de quem ter sobre o título como aspecto autônomo, mas não separado,
seja o maior ou único acionista de uma S.A. que seja proprie- em relação à problemática da patrimonialidade da prestação.
tária do mesmo imóvel; ou, então, compare-se a situação de Assim, as obrigações contraÍdas.no interesse da família, as obri-
quem retira a própria riqueza dos aluguéis de imóveis dos quais gações alimen1:<lres,etc. assumem papéis paradigmáticos.
seja proprietário com aquela de quem seja sócio de uma socie- Do mesmo modo deve ser individuada a incidência das qua- Incidência
Reservd de dade proprietária de um hotel). A conseqüência é que a reserva lidades subjetivas ora sobre o título, sobre o objeto, ora, pelo das qualida-
lei e gozo de lei como garantia constitucional da propriedade (art. 42 menos, sobre as modalidades da relação, como regulamento. des subjeti-
"nãcrpro- vas
Const.: é a "lei" que determina "os modos de aquisição, de Sujeito público, profissionalidade do sujeitO, dimensões do su-
prietário.
de bens gozo e os limites" do direito de propriedade), principalmente jeito, escopo da pessoa jurídica são aspectos destinados a inci-
se lida com referência à solene afirmação da tutela da poupança dir, em diferentes medidas e segundo as hipóteses, sobre a
(art. 47 Const.), não se esgota na direta "pertinência" (appar- função e sobre a disciplina da relação com uma variabilidade
tenenza) dos bens imóveis, mas estende-se também às diversas de conteúdos das situações subjetivas. A passagem a ser reali-
formas de "pertinência" (appartenenza) da poupança e dos zada é de uma concepção da obrigação rígida e dogmática, a
créditos - destinados pela sua natureza a produzir frutos -, uma, casuística e problemática, que não se reduza a mera praxe,
como indireta participação proprietária. Daqui a suspeita vali- que não recuse a contribuição de conceitos, mas os elabore de
dade e o suspeito merecimento de tutela (meritevolezza) das forma renovada, com rigor fantasioso, no justo equilíbrio entre
intervenções da autonomia negociaI sobre a regulamentação elaboração teórica e experiência fática, com base em um mé-
.'
212 Capítulo oitavo ,Situações subjetivas patrimoniais 213
todo que, apoiando-se.na ipdissolubilidade forrria-subs~ncia, obrigação finalizada à realização de uma exigência da pessoa,
evidencie a unidade na diversidade, mas sem fazer violências como podem sê-lo as obrigações assumidas no interesse da
às peculiariedades dos fenômenos. Apenas o consciente respei- família, outra coisa são as obrigações assumidas por uma so-
to às diversidadespode justificar o esforço em relação à unidade ciedade por ações a escopo de lucro.
da noção (de relação obrigacional) como instrumento para
uma leitura mais fácil da realidade. 136. Obrigações naturais e aplicabilidade da normativa respondente E~cácia.li:
Classifica-
ções da
Asmesmasclassificaçõesdas prestações, e dos bens que cons- à moral sociaL - De especial interesse, para a determinação da :l~~~i~i:
prestação
tituem o seu ponto de referência objetivo,são proponíveis não
em abstrato masem relação ao contexto normativo da concreta .:.
relevância da obrigação natural, é a proposição legislativa pela d;
qual, além da irrepetibilidade de quanto espontaneamente
relação; de maneira que fungibilidade ou infungibilidade, ge-
pago, os deveres morais e sociais" não produzem outros efeitos"
nericidade ou especificidade não são qualidades intrínsecas
(art. 2.034 Cód. Civ.). Na fase que precede o adimplemento,
dos bens como tais, estaticamente considerados, mas somente
é totalmente ausente a obrigação jurídica das partes de com-
avaliações em relação a uma peculiar ordem de interesses. O
mesmo bem pode ser considerado ora fungível ora infungível portar-se em boa-fé, segundo lealdade, de não fazer nada que
segundo seja deduzido em obrigação em uma forma ou em possa comprometer a possibilidade do adimplemento. Ao lado
outra. A avaliaçãonaturalmente não é remetida ao arbítrio das da impossibilidade para o credor natural de agir para o adim-
partes, mas depende do regulamento normativo no _qual con- plemento, existe a impossibilidade de pretender medio tempar,?;
siste a obrigação: regulamento autônomo, em relaçao ao que em vista do eventual adimplemento, um comportamento coU::
foi predisposto pela autonomia privada nos limites a ela con- dizente do devedor. Portanto, a obrigação natural não pode' Obrigalção
- Ilauua e
cedidos, e heterônomo em relação ao disposto pelo ordena- ser inserida sic et simpliciter no gentIS da obrigação inexigível,já obrigação '". - .•.• t
mento, mediante procedimentos de integração, de substituição que esta é, ao contrário, caracterizada por uma série de obri- inexigível
e, em sentido amplo, de qualificação. gações preliminares; nem poderia ser considerada uma relação
Relação de A obrigação não se identifica no direito ou nos direitos do preliminar, ainda que de origem condicional, porque - pre~
cooperação
credor; ela configura-se cada vez mais como uma relação de cindindo do fato de que ela seria condicionada potestativamen~
cooperação. Isto implica uma mudança radical de perspectiva te ex parte debitoris (art. 1.355 Cód. Civ.) - também esse tiP9
de leitura da disciplina das obrigações: esta última não deve de relação é um vínculo caracterizado por uma série de obri,: '-- ---:,..
ser considerada o estatuto do credor; a cooperação, e um gações de conteúdo positivo ou negativo, de caráter típico e/ou '.J<t'
determinado modo de ser, substitui a subordinação e o credor atípico (cfr. retro, capo 6, ~ 99).
se torna titular de obrigações genéricas ou específicas de coo-
peração ao adimplemento do devedor. Também o terceiro 'j ':
,. A proposição legislativa, pela qual a obrigação natural não Vicissitudes
pode produzir efeitos além da irrepetibilidade, não significa compatí,
veis com a
I
encontra-se envolvido neste novo clima de colaboração e de que ela não possa ser modificada ou extinta. Deve-severificar irrepetibiJi-
responsabilidade, e o crédito assume cada vezmais a fisionomia , . como e em quais termos a limitada relevância jurídica da obri- dade
de um "bem" autônomo sobre o qual, em. modo evidente, gação natural seja sensível às vicissitudes que normalmente
incidem direitos de terceiros qualificados (to~e-se, como caracterizam a vida daquelas civis. Apresenta-se não tanto um
exemplo, o usufrutuário e o credor pignoratício de ,créditos: problema de compatibilidade de disciplinas, mas a necessidade
arts. 2.800sS.,2.025, 1.250, 1.254 Cód. Civ.) e que os terceiros de analisar quais formas modificativas ou extintivas - prescin-
são obrigados a respeitar. . ,
dindo da coerção jurídica aqui ausente - são logicamente
Nesta perspectivaé um pseudoproblema falar de favar credi-
concebíveis, contribuindo para a autonomia e para a ampliação
toris ou de javar debitoris; é preciso distinguir: uma coisa é a
do estudo da teoria das vicissitudes.
214 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 215
Morae mo- o ordenamento reserva à obrigação natural uma limitada que tal relação tenha relevância jurídica somente no momento
dificaçõesrelevância que a torna incompatível com grande parte da dis- da eventual, espontãnea execução. Já antes desse momento,
daobrigo
nato ciplina das obrigações civis (Livro IV, Título I, Cód. Civ.). O a~nda que eI~ ~s~ do ~~implemento, existe por parte do le-
devedor natural não tem nenhuma forma de responsabilidade ~sla?o~ u~. JUlZO_ ImphcIto de valor. A relação adquire rele-
pelo inadimplemento, nem o respectivo credor tem direito de vanCIa JU!ldICa, nao no momento do adimplemento, mas sim
exigir a prestação, de colocar em mora o devedor, etc. Todavia, em funçao de tal adimplemento, com o qual ela se realiza e
não se pode excluir que o comportamento do devedor possa se atua. Diversamente, interpretar-se-ia em forma ab-rogante o
ser, segundo a moral social, fonte de agravamento da obrigação art. 2.034: este não configuraria uma norma de ação ou de
natural in executada ou até mesmo motivo do nascimento de conduta, nem uma norma de relação idônea a fazer nascer um
uma nova obrigação natural. Algumas normas eqüitativas con- vínculo obrigacional; a norma teria o mesmo conteúdo do art. Distinção
tidas na disciplina do inadimplemento - por exemplo, o art. 2.035 que também dita a irrepetibilidade. Todavia, enquanto com a irre-
petibilida-
1.227 Cód. Civ. - podem encontrar aplicação, ainda que em que no art. 2.034 o quanto prestado é dado em conformidade de ex art.
chave puramente social ou moral, também na obrigação natu- com o direito e, portanto, bem dado, no art. 2.035 a irrepeti- 2.035 Cód.
ral. Muitos são os pontos de confluência entre a moral social bilidade é somente uma sanção para quem executou a presta- Civ.
e a eqüidade e muitas normas têm caráter eqüitativo; elas, no ção para um escopo que é não conforme ao direito e constitui
seu substancial conteúdo, não podem ser consideradas inapli- ofensa ao bom costume. Na hipótese do art. 2.034, antes do
cáveis à obrigação natural. adimplemento existe uma relação cronológica e 'logicamente
precedente, não contrária a um dos princípios de ordem pú-
Relevância 137. Situações naturais creditórias e debitórias e suas vicissitudes. blica; pelo contrário, é justamente com fundamento na socia-
jurídica - Não há dúvidas de que o fenômeno da obrigação natural lidade e na moralidade da relação que precede o adimplemen-
tem, no aspecto estrutural, os elementos que caracterizam a to que a prestação é bem executada e não é repetível. Do
noção de relação. Esta constitui uma ligação (relazione) entre contrário, seria jurídica somente a norma dotada de coação.
a situação do credor, isto é, de quem socialmente pode receber A juridicidade da norma, ao contrário, é devida à juridicidade
e reter a "prestação", e aquela do devedor que socialmente é do ordenamento ao qual pertence (cfr. retro, capo 7, ~ 101). O
obrigado a efetuá~la. Tal ligação (relazione), mesmo não sendo respeito às relações tidas como morais e sociais pela coletivi-
uma obrigação no sentido pleno, é relação que "pode ter dade tem uma avaliação positiva também jurídica. Deve preva-
efeitos jurídicos" e que tem uma atual avaliação jurídica. O lecer quem teve quanto socialmente lhe era devido e deve
art. 2.034, ditando a irrepetibilidade, mesmo antes do adim- sucumbir quem, mesmo não sendo juridicamente constrangi-
plemento reconhece duas posiçôes subjetivas: aquela do credor do, prestou quanto era socialmente devido: é interesse do or-
à qual falta a pretensão de exigir a prestação ou o comporta- denamento que as regras sociais sejam concretamente atuadas.
mento condizente à sua possível execução, mas que se carac- A falta de coercibilidade da obrigação natural não é de per ArelevJn-
teriza pelo poder de receber e de reter legitimamente quanto si motivo para excluir a sua relevância jurídica. A obrigação ciaprescin-
lhe foi espontaneamente prestado; aquela do devedor, livre de
comportar-se p.e modo a comprometer também a execução
1I natural é suscetível de sofrer todas aquelas vicissitudes que são d.e.d.acoer-
o • 1. . d 1
compatlvels com a ImIta a re evância jurídica a ela reconhe-
Clb.hdade
.----I
AAfU, 41'4 .....,_
I
216 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 217
mente da teoria da jattispecie, na medida em que uma e outra 138. Correlação entre situações reais. - A relação real não se Incidência
dos direi-
sejustificam em função recíproca. A compatibilidade da te<?ria identifica com a Tes; ela justifica-se em um âmbito mais com- tos não so-
das vicissitudes com a obrigação natural exprime a exigência, plexo e concreto como relação entre situações. Um bem pode bre a res,
muito mais definida, de considerar autonomamente o fenôme- ser contextualmente ponto de referência de várias situações mas sobre '
no avaliando-o na sua esfera típica, aquela da moral e do de cOflteu'd o d'lVerso:propriedade (art. 832 ss. Cód. Civ.), usu- 'de
sua utilida-
costume. É nesta esfera que se deve verificar se a jattispeeie fruto (art. 978 ss. Cód. Civ.), superficie (art. 952 ss. Cód. Civ.)
concreta é idônea para a constituição, modificação ou ,extinção e de uma pluralidade de situações da mesma natureza. Alguns
da obrigação natural; para o direito, as conseqü~ntes viCissitu- direitos reais, os chamados direitos reais limitados, originam-se
des têm relevância somente em chave de irrepetibilidade de quase sempre de uma situação real preexistente. O titular do
quanto foi prestado. Assim, reconhecer que a obrigação natural direito de superficie pode conceder um usufruto sobre o mes-
possa sofrer algumas vicissitudes em forma juridicamente rele- mo direito, o usufrutuário pode gravar o direito de usufruto
vante ton1a-se uma necessidade moral e social. com uma hipoteca (art. 2.808 ss. Cód. Civ.), e assim por diante.
Exemplifi- Analise-se o seguinte exemplo. Imagine-se que Fulano tenha O titular da propriedade, naturalmente, pode conceder todos
cação uma obrigação natural de pagar uma quantia a Sicrano, pela os direitos reais limitados. Essas situações subjetivas se entrela-
qual Sicrano, ainda que não possa constranger Fulano, possa çam a tal ponto que uma se ton1a causa que justifica o nasci-
legitimamente reter a quantia espontaneamente paga. Fulano mento da outra, a qual por sua vez é estritamente ligada à vida .~
e Sicrano poderiam estipular um acordo, na hipótese mais do direito e da situação que ocasionou a sua constituição. No "
simples, pelo qual a extinção cl<!- obrigação natural se fará me- direi to de servidão o con teúdo do direi to, que pode ser variado, 'i
diante a transferência da propriedade de um bem de Fulano é ligado à existência do direito que permitiu o nascimento da 1-
a Sicrano, em vez do pagamento da soma devida. Um acordo servidão: o direito terá como ponto de referência a res, mas
desse tipo pode receber duas qualificações (sempre que em não a res abstratamente considerada, antes, aquela utilidade
concreto seja idôneo para a eficácia segundo uma avaliação que constitui o conteúdo do direito e que permitiu o nasci-
moral e social): ele constitui uma novação (art. 1.230 Cód. Civ.: mento da servidão. Se o usufrutuário de um terreno concede '"
vicissitude extintiva) se se extingue a obrigação de pagar em a um terceiro um direito de servidão, a relação que nasce será -Correlação
função do nascimento da obrigação de transferir a proprieda- definida real não porque estritamente relacionada à res (o ""'de deriva-
de; tratar-se-á, ao contrário, de uma datio in solutum (art. 1.197 prédio), mas porque dependente e inerente à situação subjetiva ;£ão e~1tre
Cód. Civ.:vicissitude modificativa), se a obrigação de transferir . ,
rea I - na hIpotese, usu fruto - eXIstente
. no pre'd'10. Nas ser- relaçoes
não extingue aquela de pagar, mas coloca-se ao seu lado, com vidões, o prédio dominante e o prédio serviente não são as res,
a conseqüência de que o devedor terá a faculdade de escolher mas as situações reais a favor e a cargo das quais se instaura a
entre extinguir a dívida com o pagamento da soma ou com a relação. A problemática não é sem conseqüências. Considere-se
transferência do bem (é um caso de obrigação com faculdade a hipótese de perecimento do edifício construído pelo super-
: , alternativa). Amb~s as vicissitudes são compatíveis com a obri- ficiário, sobre o qual grava uma servidão de não-sobrelevação.
"
I':
I
gação natural, mesmo tendo de respeitar o limite da relevância Se essa servidão a favor do edifício vizinho gravasse efetivamen-
r: jurídica que lhe é própria. Portanto, também a obrigação de te sobre a res, perecida ela que fosse, dever-se-ia extinguir tam-
transferir será i1atural: depois do acordo, Sicrano não poderá bém a relação de servidão. O código prevê, ao contrário, que
pretender, mas poderá reter o bem que Fulano espontanea- o direito de superficie, apesar do perecimento do edifício, não
mente lhe transferiu (a obrigação natural pode ser novada - se extingue automaticamente, mas depois de um certo número
ou modificada - em outra obrigação natural, não em obriga- de anos (art. 954, ~~ 3 e 4): continua a existir o direito de
ção civil). superficie, salvo se, decorrido um determinado termo, não for
Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 219
218
feita a construção (prescrição do direito, art. 2.934 ss. Cód. Consto no qual se estabelece que a propriedade privada é re-
Civ.). Se o direito de superfície continuar a existir, o mesmo conhecida e garantida pela lei que determina os seus modos
acontecerá com a servidão. A relação de servidão permanece de aquisição, de gozo e os limites, com o objetivo de assegurar
pelo período de vinte anos (v. também art. 1.074 Cód. Civ.) a a sua função social e de possibilitar que seja acessível a todos.
cargo e a favor, não da res, que não existe, mas da situação real O art. 44, na primeira parte, quando preceitua que, para fins
com base na qual a relação foi constituída, isto é, o direito de de conseguir a racional exploração do solo e de estabelecer
superfície. Em relação a uma res podem existir, contextualmen- justas relações sociais, a lei impõe obrigações e vínculos à pro-
te, várias situações reais e entre elas podem estabelecer-se cor- priedade da terra privada, etc., fixa dois pontos fundamentais,
relações tais que as vicissitudes de uma são ligadas àquelas das dos quais o primeiro poderia também se identificar com a
outras. exigência produtivista (art. 838 Cód. Civ.) , enquanto que o
Complexi- segundo é expressão da função constitucional da propriedade.
A recusa a uma precisa contraposição entre situação real e
dade da dis-
ciplina creditória permite individuar, ao lado das situações reais ditas Para estabelecer equânimes relações sociais a lei impõe obri-
típicas, outras ditas atípicas, que unem à natureza real um gações e vínculos à propriedade rústica privada, fixa limites à
notável conteúdo de obrigatoriedade. A essas situações poder- sua extensão de acordo com as regiões e as zonas agrárias,
se-á aplicar parte da normativa típica das obrigações (lealdade, promove e impõe a transformação do latifúndio, etc. Mais que
diligência, alguns aspectos do inadimplemento, etc.). As figuras garantir a pequena propriedade, a Constituição limita a grande;
subjetivas, como obrigações, direitos, poderes, faculdades, ela, todavia, dispõe que a lei "ajuda a pequena e a média
ônus, unem-se nas combinações mais diversas e, tornando-se propriedade", reconhecendo a relevância do aspecto quanti-
parte de um regulamento mais amplo, assumem um colorido tativo (art. 44). No acesso à poupança popular, na propriedade
segundo a situação subjetiva (complexa) da qual fazem parte da habitação e naquela do pequeno produtor (diretta coltivatri-
e segundo o interesse que são destinadas a realizar. ce), o aspecto quantitativo torna-se também qualitativo (art.
47). A propriedade pessoal, portanto, no aspecto quantitativo
139. Objeto, sujeitos e estatutos proprietários. - Em geral, com é uma propriedade limitada, que não tem sempre como objeto
base nas razões de ordem qualitativa, propõe-se uma distinção exclusivo os chamados bens de consumo.
entre os vários regimes de propriedade em relação ao diverso O outro aspecto para o qual se justifica uma visão pluralista Importân-
cia das qua-
Bens de bem que é seu objeto. Esse é um perfil que pode ser aceito, da propriedade é o sujeito. Também o aspecto subjetivo deve
lidades do
consumo e ser estudado em chave funcional: não basta afirmar que a
de produ- mas que deve ser correlacionado, integrado com outro de proprietário
ção natureza quantitativa. A disciplina da propriedade ao nível propriedade é privada se é de um particular, e é pública se
constitucional - mas já para o Código Civil - é diversa se- pertence a um ente público, como aparentemente a própria
gundo esta incida sobre um bem de consumo ou de produção; Constituição afirma (art. 42). Esse critério discretivo não é
a distinção, de natureza econômica, tem relevância também totalmente satisfatório já que mesmo se normalmente a pro-
jurídica (arts. 43 e 44 Const.). A disciplina do bem varia se- priedade que pertence a um ente público é "pública" e aquela
gundo a titularidade da faculdade de gozo sobre ele pertença de um particular é "privada", pode acontecer que a proprie-
a um particular que exerça, ou não, uma atividade empresarial. dade de um bem produtivo que exerce uma função de interesse
Proprieda- Também o limite quantitativo é elemento importante para nacional ou de utilidade geral, apesar de pertencer a um par-
des "peque- ticular, seja submetida a uma disciplina publicista (art. 43
nas" e a individuação do regime de propriedade. A distinção quanti-
"grd.ndes" tativa é relevante ao nível constitucional. Colocada em relação Const.). Que uma situação compita ou pertença a um sujeito
ao parágrafo segundo do art. 3 Const., assume um expressivo não é de per si suficiente. Para algumas situações justificar-se-ão
significado aquela disposição do parágrafo segundo do art. 42 incentivos, privilégios, para outras, idênticas de um ponto de
220 Capítulo oitavo
Situações subjetivas patrimoniais 221
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222 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 223
tário e terceiros, entre proprietário e vizinhos, entre proprie- trata mais de utilização do bem através de pes~oas que direta-
tário e Estado, entre proprietário e entes públicos, existe rela- mente exerce~ a faculdade de gozo daquele bem.
ção - não de subordinação -, mas de cooperação. O regu- O gozo frequentemente comporta o consumo do bem como Bens consu-
lamento da propriedade às vezes dá prevalência ao interesse nas ~i~óteses em ~que a mesma propriedade do bem 'é, por míveis
do proprietário, outras vezes àqueles de outros sujeitos: tome- defimçao, temporanea; tome-se, como exemplo, a propriedade
se, como exemplo, o enxame de abelhas (art. 924 Cód. Civ.), dos bens de consumo - v.g., os alimentos -, que são desti~
as imissões de fumo (art. 844 Cód. Civ.) e outras atividades que nados a se exaurir no tempo: gozo e propriedade têm uma
o vizinho, no âmbito da tolerância, de uma cooperação solidá- relação de interdependência recíproca e conatural que não
ria, tem o direito de realizar, ou, pelo menos, é autorizado a consent: aproximar ess.a forma de gozo a todas as outras que
realizar. pressupoem uma relaçao constante entre o bem e o sujeito;
sejam as que se consideram formas de gozo das pessoas físicas,
Faculdade, 142. Poderes de gozo, de utilização e de disposição. - O "direito ou aquelas que se consideram formas de utilização das pessoas
não situa-
de gozar" e o "direito de dispor" (art. 832 Cód. Civ.) não são jurídicas. Nas formas de propriedade de bens consumíveis e,
ção autôno-
ma direitos autônomos, mas sim, faculdades ou poderes ínsitos na portanto, de propriedade, por definição, temporânea, qual-
situação proprietária. Existem hipóteses, como aquela da venda quer limitação por parte do ordenamento ao seu gozo consti-
de bem de outrem (art. 1.478 Cód. Civ.), na qual a faculdade tuiria manifestação de umjuízo de não-valor (non meritevolezza)
de disposição do bem parece completamente separada e autô- do mesmo direito de propriedade, já que um Estado que pu-
noma da titularidade do direito disposto e da titularidade da sesse limites ou VÍnculos ao gozo destes bens, substancialmente,
mesma propriedade, na evé-itualidade que fosse disposta a negaria tutela à sua propriedade,
propriedade. Existem propriedades nas quais são ausentes cer- O poder de disposição do proprietário não é limitado ao Vicissitudes
tas formas de gozo e outras nas quais falta uma faculdade de poder de constituir direitos reais (por exemplo, usufruto, ser- derivativo-
constitutivas
disposição; disposição e gozo, ainda que sejam características vidão) , mas inclui aqueles atos de autonomia que o proprietário
normais da propriedade, não são essenciais e típicas do direito. pode realizar e que são, em sentido amplo, dispositivos, isto é,
Gozo e uti. O poder de gozo é conceito não-unívoco e homogêneo, mas aqueles atos com os quais ele cria situações subjetivas favoráveis
lização variável, de conteúdo fungível: existe, por exemplo, uma subs- a terceiros, incluindo as situações pessoais de gozo.
tancial diversidade entre o gozo da propriedade por parte de O poder de disposição, visto no sentido de escolha da des- Disposição
uma pessoa física e de uma pessoa jurídica; ali, o gozo é estri- tinação a ser dada ao bem, adquire uma relevância especial, e iniciativa
econômica
tamente ligado à imediatidade da situação com o sujeito físico principalmente pela sua atualidade, enquanto constitui a con-
titular, enquanto que nas pessoas jurídicas mais que de gozo fluência entre o problema das situações estaticamente consi-
trata-se de "utilização" do bem, a qual freqüentemente se re- deradas e a iniciativa econômica: o proprietário que se põe o
gula, se autodetermina, se autolimita. Tome-se, como exemplo, problema da escolha da destinação a ser dada a um bem não
o objeto social de uma sociedade por açôes, que é, por defini- é somente proprietário, mas é, o mais das vezes, também em-
ção, limitado; os bens que fazem parte do patrimônio da so- presário.
ciedade podem ser utilizados, mas esta forma de gozo, ou Por "disposição" pode-se entender não somente um ato Disposição
melhor, de utilização do bem é limitada àquelas que são as negociaI ou voluntário, mas também um "ato de disposição material
características institucionais da pessoa jurídica que se autolimi- material" , preparatório, quando muito, de uma disposição ju-
tou no momento em que estabeleceu que o patrimônio deve rídica. De maneira que não surge o problema se o ato de
ser voltado a um escopo determinado. Assim, não tem sentido disposição material, a transferência de um bem de um lugar a
falar de gozo por interposta pessoa, quando, na realidade, se outro seja ou não negocial; normalmente não o é. Trata-se de
•••
224 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 225
um ato que não é nem de gozo em sentido técnico, nem de ressarcimento do dano - ao qual é obrigado qualquer sujeito
utilização, nem de disposição jurídica; é, ao contrário, ato de devedor inadimplente -, mas, ao contrário, pode adquirir
disposição material. relevância para fins da própria existênCia do direito.
Separabili- Entre gozo e disposição não existe uma correlação necessá-
dade de
gozo e dis-
ria: se é verdade que a propriedade pode ser definida - e é 144. Poder de controle. - Alguns órgãos (art. 2.397 Cód. Civ.; Controle
sobre pro-
posição definida pelo Código - como faculdade ou poder de gozar e art 5, ~ 2,d.P.R. nl! 136 de 31 de março de 1975) ou alguns priedade e
de dispor, é também verdade que em mais de uma hipótese sujeitos (arts. 2.409,2.489 Cód. Civ.;art 11, ~ 5, 1. n 904 de 16 empresa
Q
encontra-se uma dissociação, uma separação entre estes dois de dezembro de 1977) controlam o exerCÍcio da propriedade
poderes, a tal ponto que alguns são titulares do gozo e outros ou a atividade e o exerCÍcio da empresa. Nos órgãos das socie-
do poder de disposição. Sob outro perfil, esta dissociação se dades anônimas, o poder de controle típico cabe ao conselho
apresenta no sentido de que nem sempre o proprietário tem fiscal (collegio sindacale). Análogo poder pode-se encontrar em
o poder de dispor do bem, de criar situações subjetivas favo- certas formas de incapacidade dos sujeitos, aos quais deixa-se
ráveis a terceiros, nem aquele de dispor materialmente da .' uma liberdade de exerCício, ainda que controlada (arts. 344,
propriedade nem aquele de escolher livremente a destinação 383 e 384 Cód. Civ.), às vezes preventivamente, outras sucessi-
econõmico-social do bem. Nesta atividade de disposição o po- vamente (arts. 374,375 e 1.444 Cód. Civ.).A autorização suces-
der às vezes é controlado, às vezesé integrado pela participação sivaé uma forma de controle, que freqüentemente compor.ta ,~.
~
de outros, de maneira que a faculdade de disposição não é um juízo de mérito sobre a decisão tomada pelo sujeito titular
absoluta, nem muito menos arbitrária. do poder de disposição. O poder de controle pode ser ditado Controle
Também no âmbito da noção de gozo pode-se constatar uma no próprio interesse do proprietário e é atribuído a quem, por no interes-
se próprio ..
dissociação: o fenômeno jurídico e socialdo desmembramento definição, deveria ter o poder de disposição e o poder de gozo, ou de ou-
,~
(da figura unitária) da propriedade teve uma notável evolução mas que, mesmo continuando a ser proprietário, é privado trem
até chegar a uma situação de extrema variedade também por quer de um, quer do outro. Apesar de a propriedade no Código
causa da mudada realidade econômica. Discute-se se o man- Civilser definida como faculdade de gozar e de dispor, existem
datário sem representação, uma vez que adquiriu o bem, tem formas de propriedade que, perdendo os poderes característi-
o direito, ou de qualquer modo, o poder de gozo em relação cos, são tuteladas na forma do poder de controle. É um ampl<;>
ao bem. espaço reservado à teoria dos poderes de controle: dos contro-
les administrativos e judiciários àqueles privados sobre o patri-
Limites in-
143. Teoria dos limites. - Não se pode sustentar que os limites mônio de outrem. Seria útil, nesta perspectiva, aprofundar a
ternos e di- temática da responsabilidade no campo das obrigações: a res- Responsabi-
reitos so- e as obrigações não fazem parte do direito de propriedade;
bre coisa fatos externos são o ônus real, a servidão, o peso imposto pelo ponsabilidade patrimonial do devedor se explica justamente lidade patri-
monial
de terceiros exterior e que, portanto, não fazem parte da estrutura da si- como atribuição ao credor do poder de controlar o andamento
tuação subjetiva-propriedade. A opinião oposta se explica tam- patrimonial do devedor (ainda que o credor não seja o pro-
bém com uma razão de ordem lógico-formal, isto é com o prietário dos bens do devedor). Quando se diz que o devedor
preconceito, de caráter dogmático, que a propriedade seja um é responsável com todos os seus bens presentes e futuros pelas
direito subjetivo tout court. A propriedade é, ao revés, uma dívidas que ele assumiu em relação ao credor (art. 2.740 Cód..
situação subjetiva complexa. Colocar em evidência as obriga- Civ.), dá-se a este último, mediante os meios de conservação
I ~,
ções, os ônus, os vínculos, os limites, etc., é importante na da garantia patrimonial (art. 2.900 ss. Cód. Civ.), um poder
medida em que, se de tal situação tem-se uma concepção uni- privado de controle sobre o patrimônio de outrem.
tária, a inadimplência de um deles se reflete sobre toda a Não é suficiente afirmar, portanto, que a propriedade é o
situação. Essa inadimplência pode não comportar somente o poder de gozar e de dispor, mas é também necessário indivi-
226 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 227
duar, com referência a cada ordem de interesses, a cada cir- elas não podem ser arbitrárias, mas devem assegurar a função
cunstância concreta, quem tem o poder de controle. social e o acesso a todos (art. 42 Const.). A função se apresenta
como causa de legitimação ou de justificação das intervenções
Atuação de 145. Função social da propriedade e utilidade social da empresa. legislativas que devem ser sempre submetidas a um controle
princípios - Falar hoje de "função social" em relação à propriedade e
constitucio- de conformidade constitucional. Toda lei deve realizar também
nais de "utilidade social" em relação à iniciativa econômica privada a função social da propriedade, salvo se for atuativa de institutos
significa falar de alguma coisa especial. Se, de fato, estrutura ablativos como a expropriação ou a nacionalização, para os
e função representam, de um ponto de vista metodológico, a
quais o discurso seria diverso. Enquanto que a função social
natureza de qualquer noção, para a propriedade assim como
atribui ao legislador um controle de conformidade (em termos
para a iniciativa econômica o problema não é apenas metodo-
de idoneidade, coerência, razoabilidade), a ablação sanciona-
lógico e meramente classificatório, mas se configura como in-
tória é chamada em causa somente na hipótese patológica,
terpretativo e atuativo de fórmulas contidas em normas (arts.
como conseqüência da não atuação da função social. Razões
42 e 41) de nível constitucional.
externas, legislativamente circunstanciadas, ditadas pela neces- Expropria-
Função so- A função social predeterminada para a propriedade privada ção
cial como sidade ou exigências primárias, podem comprimir, tempora-
não diz respeito exclusivamente aos seus limites. A letra do art.
COl1Íunto
42 Consto estabelece que a lei determina" os modos de aquisi- riamente ou a tempo indefinido, a tutela da propriedade pri-
dos limites: vada, salvo a indenização, como instrumento de imputação à
crítica ção, de gozo e os limites com o objetivo de assegurar a sua
função social", de maneira que esta última concerne o conteú- coletividade do sacrifício imposto ao indivíduo.
do global da disciplina proprietária, não apenas os limites. A Mediante o juízo de conformidade da lei ordinária à função Constitucio-
função social, construída como o cOl~unto dos limites, repre- social se realiza o controle de legitimidade constitucional. Este nalidade e
razoabilida-
sentaria uma noção somente de tipo negativo voltada a com- tende a verificar se o órgão legislativo, ao realizar uma avaliação
de
primir os poderes proprietários, os quais sem os limites, fica- dos fins de utilidade geral e dos meios para realizá-los, não
riam íntegros e livres. Este resultado está próximo à perspectiva tenha sido orientado "por critérios ilógicos, arbitrários e con-
tradicional. Em um sistema inspirado na solidariedade política, traditórios"; ou que a avaliação dos fins "se manifeste em evi-
econômica e social e ao pleno desenvolvimento da pessoa (art. dente contraste com os pressupostos de fato", ou, enfim, que
2 Const.) o conteúdo da função social assume um papel de os meios predispostos sejam" absolutamente inidôneos ou con-
tipo promocional, no sentido de que a disciplina das formas trastantes com o escopo que ela (a avaliação) deveria conse-
de propriedade e as suas interpretações deveriam ser atuadas guir" , ou idôneos para realizar uma finalidade diversa daquela
para garantir e para promover os valores sobre os quais se que a normativa constitucional indica. Esta última, apoiando-se
funda o ordenamento. E isso não se realiza somente finalizando no "escopo de assegurar", impõe ao legislador ordinário não
a disciplina dos limites à função social. Esta deve ser entendida apenas a predisposição de um estatuto que não conceda ao
não como uma intervenção" em ódio" à propriedade privada, titular poderes supérfluos ou contraproducentes em relação
mas torna-se "a própria razão pela qual o direito de proprie- ao interesse positivamente tutelado, mas também um estatuto
A função
social é a
dade foi atribuído a um determinado sujeito", um critério de que, em positivo, conceda ao titular aqueles poderes necessá-
razão da ação para o legislador, e um critério de individuação da nor- rios para perseguir o interesse - determinável a cada vez e -
atribuição mativa a ser aplicada para o intérprete chamado a avaliar as
do direito
constitucionalmente relevante.
situações conexas à realização de atos e de atividades do titular. A função social é também critério de interpretação da dis-
Critério de
interpreta-
Legislação ciplina proprietária para o juiz e para os operadores jurídicos. ção
ordinária e 146. Conformação e ablação (ablazione) dos estatutos proprietá- O intérprete deve não somente suscitar formalmente as ques-
função so-
rios. O controle de legitimidade. - Quanto às mudanças legislativas, tões de duvidosa legitimidade das normas, mas também propor
cial
--
228 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 229
uma interpretação conforme os princípios constitucionais. A que não podem assumir aprioristicamente a qualificação de
Operativi- função social é operante também à falta de uma expressa dis- excepcionais e de número fechado, exaltando a elasticidade e,
dade incon- posição que a ela faça referência; ela representa um critério portanto, a absoluta liberdade dominical que acaba de eman-
dicionada de alcance geral, um princípio que legitima a extensão em via cipar-se da escravidão daS limitações.
analógica daquelas normas, excepcionais no ordenamento pré- A ausência de atuação da função social, portanto, faz com Dúvidas 50-
.bre a im-
constitucional, que têm um conteúdo que, em via interpreta- que falte a razão da garantia e do reconhecimento do direito prescritibili-
tiva, resulta atuativo do princípio. . de propriedade. Que da falta prolongada e injustificada do dade
Igualmente, o mesmo princípio legitima a desaplicação das exercício do direito não resulte a sua perda por prescrição é
Desaplica- disposições legislativas nascidas como expressões de tipo indi- solução legislativa acreditada há muito tempo, mas gravemente
ção das vidualista ou atuativas de uma função social de natureza diversa
normas in-
suspeita de inconstitucionalidade - fundada, como é, no ar-
compatíveis daquela constitucional (inspirada, por exemplo, na máxima tigo que dita a imprescritibilidade da ação de reivindicação
produção e na auto-suficiência [autarcia] econõmica). (art. 948 Cód. Civ.), duvidoso no fundamento e no significado
Autonomia Também para o proprietário, a função social assume uma - e certamente em estridente contraste com a concepção
privada e
função so- valência de princípio geral. A autonomia não é livre arbítrio: dinâmica (attivistica) e social da propriedade.
cial os atos e as atividades não somente não podem perseguir fins
anti-sociais ou não-sociais, mas, para terem reconhecimento 147. Merecimento de tutela (meritevolezza) dos estatutos privados Reserva de
jurídico, devem ser avaliáveis como conformes à razão pela e reserva de lei. - A competência da lei para estabelecer" os lei
qual o direito de propriedade foi garantido e reconhecido. A modos de aquisição, de gozo e os limites" significa que não se
autonomia não se contrapõe ao controle. Aqui, os nexos com pode atribuir sic et simpliciter nem ao ato administrativo, nem
a disciplina da empresa tornam-se muito estreitos. Assim, a aos atos de autonomia privada e coletiva o poder de incidir
atividade de gozo e de disposição do proprietário - segundo sobre a destinação e, em geral, sobre o estatuto proprietário,
o art. 41, ~ 2 Consto - não pode ser exercida "em contraste a não ser nas hipóteses e nas formas previstas pela lei. A ativi- Atividade
com a utilidade social ou de modo a provocar dano à segurança, dade administrativa e aquela negociaI e contratual para ter da A.P.
à liberdade, à dignidade humana". O exercício da empresa, validade deverão ser atuativas de normas e de princípios que
atuado de acordo com o máXimo de coordenação possível, isto tenham força de lei formal. Assim, os instrumentos urbanísticos
é de programação (art. 41, ~ 3, Const.), evitaria, v.g., em termos poderão mudar a destinação dos solos; o ato administrativo,
de "segurança" , comprometer a saúde dos homens, o ambiente respeitando os pressupostos, poderá mudar o uso, de habitação
e, em geral, o equilíbrio ecológico (tome-se, como exemplo, ou não, de um apartamento. Todavia, nem o ato administrativo
o tema da economia de energia e as proibições contra as po- nem aquele negociaI dos particulares poderá conter limites à
luições e as sofisticações). Mais marcada deve ser, também no propriedade fora daqueles admitidos pela lei, ora porque lesi-
intérprete, a consciência de que o crescimento econõmico e o vos da reserva de lei que caracteriza a propriedade, ora porque
conseqüente bem-estar (benessere) quando não preservam a qua- não-merecedores de tutela na medida em que são limitativos
lidade de vida, ou seja, a "liberdade" e a "dignidade humana" , ou impeditivos da função social ou da acessibilidade a todos,
não são progresso e desenvolvimento social e constitucional- da propriedade. Nesta perspectiva, muitos estatutos privados, Regulamen-
mente vaioráveis, mas se traduzem, antes ou depois, em um principalmente em tema de condomínio e de multiproprieda- tos de con-
mal-estar para todos. Com esta sensibilidade devem ser enqua- de, esperam ainda um reexame completo, em termos de vali- domínio e
multipro-
dradas as problemáticas do ilícito e da responsabilidade, do dade e de merecimento de tutela. E a esfera de influência da priedade
abuso do direito e do excesso de poder e as análises das nu- função social é destinada a alargar-se,já que a garantia contida
merosas proibições e dos limites à atividade do proprietário, no art. 42 Consto não pode ser circunscrita à propriedade, mas
230 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 231
deve interessar tüda e qualquer fürma de pertinência. (appar- mü. Se .os estatutüs prüprietáriüs sãü diversüs em relaçãü aüs
tenenza) da riqueza, cümü em mais de uma ücasiãü a própria übjetüs, aüs sujeitüs, às destinações e mesmü aüs patrimõniüs
Cürte Cünstituciünal cülücüu em evidência. Este é ainda um e às circunstâncias cüncretas, nãü existe um cünteúdü mínimü
campü a ser aradü e que püderia dar algum desprazer a praxes; da prüpriedade; existem, sim, .os cünteúdüs mínimüs de cada
cümpürtamentais .ou negüciais, atuadas nas relações patrimo- estatutü prüprietáriü que é necessáriü individuar através de '
niais cüm püuca sensibilidade para cüm .os valüres cünstitucio- uma análise atenta. A prüpriedade, nãü impürta que aspectü
nais. tenha, nãü se püde exaurir em uma mera fürma, mas necessita
Extensão
A afinnaçãü pela qual "sümente .os bens prüdutivüs têm uma de um cünteúdü. Uma cüisa é .o problema da cünfürmaçãü dü
al6n das
atividades funçãü sücial" é desmentida pela própria letra da dispüsiçãü estatutü prüprietáriü, .outra é aquele da expropriaçãü. O art.
i, produtoras cünstituciünal que" nãü prevê exceções à regra da funçãü sücial 42, ~ 3, dispõe que a propriedade privada püde ser, nüs casüs Conforma-
i'
I da propriedade privada" . Dü cüntráriü, seria übrigatóriü reser- previstüs pela lei, e salvü indenizaçãü, expropriada pür mütivüs ção e ex-
I propriação
var à funçãü sücial uma interpretaçãü pela qual .o sücial se de interesse geral; nãü é püssível, pürtantü, chegar a prüpür
cüntrapõe aü pessüal-individual, prevalecendü assim uma püs- um estatutü proprietáriü cünfünnativü que seja substancial-
tura ecünõmica e prüdutivista, ainda que atenuada, relativa- mente expropriativü (fala-se de" cünfünnaçãü" da propriedade
mente àquela codicística, pela referência à atuaçãü das equâ- privada quandü .oslimites legais nãü tücam .ocünteúdü mínimü,
nimes relações süciais e à nüçãü de sülidariedade sücial. A de "exprüpriaçãü" nü casü üpüstü). A cünclusãü pela qual é
Proprieda- afinnaçãü generalizada de que a prüpriedade privada tem fun- precisü falar de cünteúdüs mínimüs da prüpriedade deve ser
de e inte-
r~sses exis- çãü sücial nãü cünsente discriminações e übliga .o intérprete interpretada não em chave jusnaturalista, mas em relaçãü à
tenciuis a individuá-la em relaçãü à particular .ordem de interesses ju- reserva de lei prevista na Cünstituiçãü, a qual garante a pro-
ridicamente relevantes. Assim, tem funçãü sücial nãü sümente priedade atribuindü à lei a tarefa de detenninar .os müdüs de
a prüpriedade da empresa mas também a da casa de habitaçãü l: aquisiçãü, de güzü e .os limites, cüm .o übjetivü de assegurar a
e düs bens móveis que ela cüntém, a da .oficina artesã e da
I
funçãü sücial e de türná-Ia acessível a tüdüs (art. 42, ~ 2). O
prüpriedade dü pequenü produtür (diretta coltivatrice), a düs estatutü nünnativü, em relaçãü a determinadüs sujeitüs e às
utensíliüs prüfissiünais e düs animais e düs instrumentüs de particularidades que .o caracterizam, deve ter um mínimü, .o
trabalhü da empresa. Cada uma cüm uma diversa intensidade seu mínimü, istü é, .o seu cünteúdü. Nesta perspectiva deve ser
de utilidade geral e individual, sem que entre elas devam en- exercidü .o cüntrüle sübre a atividade dü prüprietáriü, sübre .os
cüntrar-se lacerantes cüntrastes, cüm a cünsciência de que seus cümpürtamentüs. A funçãü sücial nãü püde em casü al- Função so-
cial e con-
püde-se realizar a funçãü sücial, cümü em tüdas as hipóteses
de prüpriedade ditas pessüais, aü satisfazer exigências merece-
düras de tutela, nãü necessariamente e exclusivamente dü mer-
r.
..
gum, cüntrastar .o cünteúdü mínimü: funçãü sücial e cünteúdü teúdo míni-
mínimü sãü aspectüs cümplementares
priedade.
e justificativüs da pro- mo
que atua urna limitação prevista pelo Código Civil tem-se não quem provoca o dano deve substanciar-se em um comporta-
urna autolimitação, mas urna heterolimitação. mento positivo. O comportamento comissivo do titular da si-
Esclarecida a noção de limites e as possíveis classificações, tuação patrimonial em sentido amplo, do qual pode derivar
SeIVidão:
relação s0- com base nos diversos critérios discretivos (a fonte, o interesse), um dano a um terceiro, deve-se substanciar em urna conduta
bre situa- é necessário então individuar os vínculos, com tutela específica, material, e não, simplesmente, em urna atividade conforme a
ções subjeti- situação subjetiva, corno, por exemplo, urna ação judiciária.
vas que possibilitam a criação de situações subjetivas autônomas e
em especial modo, as servidões (art. 1.027 Cód. Civ.). Enquanto Não se pode aplicar a proibição quando o sujeito age emjuízo
que o limite genérico não cria urna relação autônoma, a ser- somente com o objetivo de provocar um dano a um outro
vidão, ao contrário, é urna autônoma relação: o peso, para urna sujeito, porque esse comportamento não se encaixa nos limites
situação, é estritamente relacionado com a vantagem, a utili- das situações subjetivas. Comportamento, portanto, comissivo
dade para urna outra situação. Esta correlação é tão essencial e necessariamente material.
que desaparecendo a vantagem ou a possibilidade de vantagem, . Sobre os outros dois elementos ainda se discute: a falta de "Ausência"
vantagem para 6 proprietário e o prejuízo da vítima. Há quem de valHa-
desaparece a razão da existência do peso. Não se conseguiria gem
compreender o fenômeno da servidão se se insistisse na con- considera suficiente, para que não seja configurável um ato
cepção pela qual a servidão é relação entre prédios vistos de emulativo, a existência de urna mínima vantagem, ainda que
um ponto de vista material. Seria mais difícil distinguir a ser- subjetiva e indireta, para o proprietário. Desse modo, a inter-
vidão do limite, porque este também incidiria sobre o prédio. pretação do pressuposto da falta de vantagem para o proprie-
A servidão é relação jurídica que tem corno pontos de corre- tário torna praticamente inoperante a proibição geral dos atos
lação as situações subjetivas que podem verter sobre prédios, emulativos. Na prática, o proprietário poderá sempre demons-
vistos de um ponto de vista material. As servidões não gravam trar que o ato realizado lhe traz urna vantagem direta ou indi-
sobre o prédio, rrias sobre as situações subjetivas (cfr. retro, ~ 132). reta, mesmo que seja mínima.
Com referência ao prejuízo da vítima, a própriajurisprudên- Prejuízo
Vínculos Além das servidões, existem os vínculos com conteúdo po-
sitivo que se referem ao objeto do comportamento devido: cia, hoje não mais prevalente, insiste nos aspectos quantitativos,
assim, a cargo do proprietário são configuráveis vínculos de no sentido de se falar de prejuízo somente quando este seja
dar e vínculos de fazer. efetivamente, de um ponto de vista econômico, amplamente
relevante: um modesto prejuízo não seria suficiente para con-
Elementos 150. Atos emulativos. - Podem-se individuar os elementos da siderar o ato corno emulativo e, portanto, proibido. Coloca-se
~.. em evidência que a falta de vantagem para o proprietário e o
.::t ' jattispecie da proibição dos atos emulativos (art. 833 Cód. Civ.)
no comportamento do titular da situação, na qualidade ou tipo prejuízo da vítima não são 'completamente autônomos, mas
de comportamento, na falta de vantagem para o titular da devem ser considerados um em relação ao outro. Deve ser
situação, no prejuízo, desvantagem ou dano que sofre um outro condenado todo ato voltado exclusivamente a causar um dano,
prescindindo de urna avaliação quantitativa; e a vantagem para
sujeito.
Compona- O c:omportamentoé. por definição, não omissivo, antes po- r o proprietário deve ser direta, de urna certa relevância social,
objetivamente avaliável. Entre a falta de vantagem para o pro-
sitivo, isto é, urna conduta que se substancia em um jacere. Se
I
menta co--
missivo prietário (mas a argumentação pode ser utilizada em relaçâo
Fulano, proprietário, tem a faculdade de construir e não cons-
trói (ou não reconstrói) e provoca dessa maneira um dano a a qualquer situação) e o prejuízo da vítima, deve existir urna
um outro sujeito, o comportamento (negativo ou omissivo)
1 certa proporcionalidade. Em urna perspectiva solidarista e fun-
i
não pode se encaixar na proibição dos atos emulativos na I cional, o proprietário não pode realizar um ato que lhe dê
I
medida em que, por tradição e por ratio, o comportamento de um;:l vantagem mínima para criar urna grande desvantagem ou
1
j
;1
1.
234 Capítulo oitavo Situações subjetivas patrimoniais 235
é variável relativamente, independentemente do custo de pro- do arquivo (comercial, estatística, fiscal, de segurança pública,
dução e da sua raridade e novidade. __ etc.) .
Contratos Merece particular atenção a análise da atividade negociaI Entre o segredo e a informação, um ordenamento que tende Excepciona-
típicos e que tenha a informação como próprio conteúdo; seja para os
atípicos a realizar um "Estado de cultura" deve optar pela informação !idade do
contratos típicos, seja para aqueles atípicos. A transferência de e pela sua livre circulação. O segredo, portanto, justifica-se segredo
conhecimento pode ser com exclusividade de uso ou sem ex- somente com base nas razões específicas, que a cada vez, ainda
clusividade, com ou sem possibilidade de disposição sem limites mais que a informação, condicionam a atuação dos valores
de tempo ou de lugar, também mediante sucessivas transferên- jurídicos fundamentais. À falta dessas razões específicas, a
cias a favor de terceiros. A relevância econômica e jurídica da maior massa de informação à disposição torna-se uma condição
informação é ligada principalmente à sua disponibilidade em de vantagem, uma utilidade, um bem, às vezes pressuposto
um determinado lugar ou em um determinado momento; nes- essencial para a própria atuação dos valores primários do or-
se aspecto a informação não é um bem consumível, ainda que denamento. Como testemunho dessa afirmação pode-se obser-
se trate de uma informação conhecida: ela depende do sujeito var a vasta gama de pedidos de infonnações sobre pessoas para
que tem interesse em obtê-la e das circunstâncias. fins de atuar disposições (provvedimentz) de natureza pessoal,
Bancos de As aplicações mais relevantes referem-se aos bancos de dados, seja no interesse delas, seja a favor de terceiros. Tome-se, col).10
dados em especial modo onde os dados não são somente recolhidos,
exemplo, as disposições (provvedimenti) sobre adoção ou a (ie-
mas também elaborados, de maneira que combinando mais claração de consentimento dos pais, etc., ainda que essasjn-
informações, selecionado-as com base nos critérios ou exigên- formações, na maior parte dos casos, sejam recolhidas e con-
cias diversas produz-se uma informação-resultado suscetível de fidencialmente transmitidas em cumprimento de um ofício
ser colocada no mercado para os usos mais variados possíveis incumbido de colaborar com a Justiça.
(v<'tia-seaimportância, para as empresas especializadas~m ven-
-das-pár correspol1dência, das carteiras da clientela selecionadas 155. Desmaterialização -das atividades humanas. - Portanto, Furto de in_
com base no rendimento ou nas preferências). Em relação a pode-se afirmar que não é herética a conclusão pela qual t<tm- formações ., ..
- .~ ';.
tais procedimentos apresenta-se uma vasta série de problemas, bém a informação, examinada independentemente do seusu-
ligados, sobretudo, à tutela da privacidade (riseroatez:z:a). Entre porte material é suscetível de apropriação indébita, de recep-
os aspectos de maior relevância recorda-se: o direito do sujeito tação, de furto ou de fraude (truffa). Orientação que responde
de conhecer se informações que a ele se relacionam estão a um difundido fenômeno de "desmaterialização" da atividade
recolhidas em um arquivo eletrônico; a possibilidade de reti- h umana e a uma reconsideração da esfera de operatividade
ficar informações que se reputam inexatas ou de fazer cancelar dos crimes que se referem à apreensão fraudulenta e aos atos
informações reservadas; a necessidade de disciplinar a moda- de pirataria. Certamente, não é possível chamar em causa os
lidade de acesso aos arquivos; a presença, em alguns casos, da crimes contra o patrimônio para a informação tout court; isso
obrigação de não utilizar as infonnações para finalidades di- é possível somente para aquelas informações que respondem
versas daquelas que justificaram o seu recolhimento; a eventual a características tais que, mesmo não se identificando com
proibição de comercializar as infonnações; a obrigação, quan- aquelas necessárias para o reconhecimento da propriedade
do for consentido extrair e publicar documentos do arquivo, intelectual, permitem hipoteticamente uma apreensão fraudu-
de fazer resultar tal proveniência; a disciplina da responsabili- lenta normativamente prevista. Hipótese que resta problemá-
dade no caso em que a informação arquivada resulte inexata tica mas que pode verificar-se facilmente em presença de uma
ou incompleta. Problemas não simples, cuja solução depende informação precisa e original, confidencial e exclusiva.
dos interesses e valores envolvidos e, portanto, da finalidade
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1Ili Capitulo nono
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Aspectos das relações familiares,
i pessoais e patrimoniais
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nidade humana: ainda que diversas possam ser as suas moda- este último às vezes casado novamente ou convivente. As rela-
lidades de organização, ela é finalizada à educação e à promo- ções familiares na fase fisiológica parecem desprovidas de re-
ção daqueles que a ela pertencem. _ , levância jurídica, mas isso seria possível somente se liberdade
Liberdade. A concepção que aqui se apresenta nao corr~spon.de ~ .exal- e atividade conforme os valores fossem qualificados como ju-
responsabi- tação de perspectivas anarquistas ou de mesqumho
lidade. soli-
mdIVldua- ridicamente irrelevantes (em sentido contrário retro, capo 5, S 62).
dariedade lismo. O reconhecimento nonnativo, contido no art. 2 Const., Os direitos atribuídos aos componentes da família garantem, • Interesse
do primado da pessoa e o reconheciment? das f~rmações so- tutelam e promovem diretamente exigências próprias da pessoa familiar";
ciais como sendo colocadas ao seu exclusIvO servIço acompa- e não de um distinto organismo, expressão de um interesse crítica
nham-se à contextual afirmação dos deveres de solidariedade. coletivo superior, fundamento de direitos e deveres. A família
Nesse sentido, subsiste uma dignidade originária entre liber- não é titular de um interesse separado e autônomo, superior
dade e responsabilidade. A liberdade na família encontra na àquele do pleno e livre desenvolvimento de cada pessoa. Devem
unidade e nos relativos deveres não tanto o limite, mas, sim, a ser rechaçadas, portanto, as várias teorias que discorrem sobre
função, o fundamento da sua própria titularidade. um "interesse familiar" superindividual, de tipo público ou
Comunhão O sanrrue e os afetos são razões autônomas de justificação corporativo. Afirmou-se precedentemente a compresença da
espiritual e
de vida
para o m~mento constitutivo da família, mas o perfil consen~ual responsabilidade na liberdade individual: nesta base insere-se
e a affeetio constante e espontânea exercem ca?a vez m~I~ o a exigência de colaboração, de solidariedade e da reciprocida-
papel de denominador comum de. qu~lqu~r nucle.o famI1la~. de, sem que elas cheguem a constituir um separado interesse
O merecimento de tutela da famílIa nao dIZ respeIto exclusI- familiar que possa ser oposto àquele individual. Pode-se ima-
vamente às relações de sangue, mas, sobretudo, àquelas afetivas ginar o interesse individual de cada familiar, além disso; so-
que se traduzem em uma comunhão espiritual e de vida. Pa!a mente em relação àquele dos outros familiares: diante da co-
tornar possível a participação também aos menores que nao munhão material e espiritual, o interesse de cada um torna-se,
tenham tido ou tenham perdido a possibilidade de uma estável 'em diferentes medidas, o interesse dos outros; a convivência '."~"-
comunhão de afetos, o ordenamento prevê a constituição, com (e as necessidades que o seu desenrolar manifesta) é iute-
a mesma dignidade em relação à família iu:e sanguinis, de u:na riorizada. A harmonização das exigências individuais, a consi-
formação social onde convivem pessoas lIgadas por relaçoes deração das recíprocas interferências, a comunhão ou o <;:.on-
conjugais c/ ou de filiação, origine-se esta última da geração curso de interesses podem, freqüentemente, fazer com que
no casamento, daquela natural, da legitimação, das adoções. mais de uma situação subjetiva pareça de natureza, antes que
Se o dado unificador é a comunhão espiritual e de vida, deve individual, coletiva e familiar (o fenômeno foi examinado retro,
ser evidenciado como ela se manifesta em uma pluralidade de capo 7, S 115).
articulações, em relação aos ambientes e ao diverso grau sócio- A função serviente da família deve ser realizada de forma Função ser-
cultural: da família nuclear sem filhos à grande família. Cada aberta, integrada na sociedade civil, com uma obrigatória co- viente: de-
Pluralida- forma familiar tem uma própria relevância jurídica, dentro da laboração com outras fonnações sociais: não como uma ilha, senvolvi.
de de for- comum função de serviço ao desenvolvimento mento da
da pessoa; não mas como um autônomo território, que é parte que não pode personalida-
Jnas falnilia-
rcs 111t:rect:-
se pode portanto afirmar uma abs5rat~ superioridade do m?- ser eliminada de um sistema de instituições civis predispostas para de dos fa-
doras ele tu- delo da família nuclear em relaçao as outras. A comunhao um escopo comum; todas essas formações sociais serão merece- miliares
teia material e espiritual que identifica cada família continua mes- doras de tutela se a regulamentação interna for inspirada no
mo na presença de eventos que marcam a separação de alguns respeito da igual dignidade, na igualdade moral e jurídica dos
de seus componentes: por exemplo, os filhos que prosseguem componentes e na democracia. Valores que representam, junta-
a convivência com O cônjuge supérstite ou divorciado, sendo mente com a solidariedade, o pressuposto, a consagração e a
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I 246 Capítulo nono Aspectos das relaçõesfamiliares, pessoais e patrimoniais 247
qualificação da unidade dos direit?s e dos deve~es n<;> âmbito de um lado, a f~ília e os seus direitos originários e invioláveis,
da família.A delineada função servIente da famílIa, asSImcomo do o~tro, os dIreItos d~ ~essoas que compõem o núcleo, de
a de qualquer outra formação social, explica o papel da inter- maneIra a prop<;>ra pnmeIra como elemento que condiciona
venção do Estado na comunidade familiar. Ela se traduz, em os segund~s ou ,:ce~versa:tome-se, como exemplo, as discussões
geral, na necessidade de que seja respeitado o valor da pessoa acerca ~a mfluencI~ 9ue "razões de família" podem exercer
na vida interna da comunidade familiar. Isso não por um mo- sobre alI~erdade rehgIosa ou de opinião política de um cônjuge
tivode Estado, nem" de família" , isto é, por uma razão superior em relaça~ ao outro ou, ainda, soore escolhas políticas, religio-
ao interesse das partes, mas porque a comunidade familiar sas ou afetivas do menor em contraste com a tradição familiar.
Desse modo, atribui-se valor primário e prevalente ora aos
deve inspirar-se, como qualquer formação social, no princípio
direito~ da família ora àqueles dos seus componentes, fazendo,
de democracia. A família se caracteriza pela igualdade e pela
Princípio unidade garantidas pelo art. 29 Const.: igualdade significa de- respectivamente, prevalecer razões de seriedade, de solidarie-
de democra- dade ou de liberdade. O problema, a bem ver, não está na
ticitá mocracia, participação com igual título na condução da vida d~te.rminação dos fatores de conformação deste ou daquele
familiar. O discurso envolve também a posição dos filhos. Exis- dIreIto fundamental, mas, antes, em tonlar conciliáveise com-
te, portanto, um nexo específico, como escolha cultural e como patíveis, na mesma formação social, exigências idênticas e/ou
dever constitucional, entre exigência de democracia - e aque- diversas, principalmente quando poucos são os instrumentos
la, estritamente conexa, de pluralismo -, que é própria, de para a satisfação delas. A validade da composição deve ser
uma parte, de todas as comunidades intermédias ~nt~e.o indi- extraída sempre da mesma tábua de valores constitucionalIhen-
víduo e o Estado e, da outra, a igualdade moral e JundIca dos te relevantes. Nessa ótica, discorrer no âmbi to da família somen- A contrapo-
Garantia cônjuges e a igual dignidade dos filhos. Na passage~ do en- te sobre direitos fundamentais é limitativo sob vários ângulos e sição pes-
promocio- quadramento da problemática da família na perspectIva a~en_ta soa-família
pode g~rar equívocos. Na realidade, o problema é aquele de é redutora
nal para os
"menores
exclusivamente à relação entre os cônjuges a uma avahaçao determmar o papel global da pessoa na família, não em uma
em sentido estendida a todos os seus componentes, de maneira que cada perspectiva apriorística ou dogmática, mas, sim, fundada no
amplo" um tenha, ainda que no respeito às peculiares circunstâncias acordo, respeitando as peculiariedades intelectivas, as inclina-
subjetivas,igual dignidade, é evidente a necessidaqe ~e garantia ções, os temperamentos individuais e reavivadospela comunhão
e de promoção dos direitos dos menores em sentIdo amplo dos afetos e pela efetiva e duradoura "vontade de plena união".
(menores de idade, deficientes, anciãos). Faz-senecessária uma Em síntese, exprimir a problemática dos direitos fundamen-
releitura crítica de qualquer reproposição da família nuclear tais na família em termos de contraposição entre exigências
em uma ótica exclusiva e eficiente, como se esta fosse voltada originariamente irreduzíveis, como se a família fosse um corpo
somente ao perfil econômico, à maximização da capacidade autônomo, supraordenado e potencialmente repressivo, cor-
de renda de cada componente. Afirma-se, depois de tantas responde a um enfoque inadequado. O valor central de refe-
incertezas, o direito do menor à família e, ainda mais em geral, rência é sempre a pessoa (art. 2 Const.); à sua tutela é voltada
o direito de qualquer pessoa de ter uma família.A importância a avaliação normativa da família e também o reconhecimento
desse reconhecimento assume o papel de pressuposto jurídi- dos direitos fundamentais (que devem ser entendidos - como
co-cultural para a solução do problema da família e dos direitos se viu retro capo 7, ~ 100, em relação aos chamados direitos da
fundamen tais. personalidade - como categoria necessariamente aberta, não
Direitos No âmbito dá relevância do núcleo familiar na sociedade limitada a previsões legislativas típicas). .
fundamen-
tais na fa- civil,assume específica importância o tema dos.direitos funda-
maia mentais da pessoa. Normalmente, o ângulo visual a partir do 157. Relações familiares, status personae e controle. _ A reali- Status persa-
qual ele é proposto é aquele de apresentar em formas separadas, zação dos direitos fundamentais vistos como atuação do status ~::ee famÍ-
Capítulo nono Aspectos das relaçõesfamiliares, pessoais e patrimoniais 249
248
personae configura-se, portanto, ~?mo a própria razão da ga- justifica-se se e na medida em que for feito em função da
rantia e da tutela das formas famIlIares. O status personae, como garan tia dos direi tos fundamen tais, a ser realizado por iniciativa
síntese unitária dos direitos e dos deveres do homem, das suas ora dos próprios interessados ou supostos tais, ora pelo Minis-
razões existenciais juridicamente relevantes (efr retro, capo 6, ~ tério Público, ainda que solicitado em via oficiosa ou institu-
89), completa-se e especifica-se pela assunção de um papel cional. Na solidariedade e no sacrificio pessoal como atos de
familiar, ou, querendo, de um status jamiliae que - na sua fase amor, quando carentes do significado da reciprocidade, podem
fisiológica - é coincidência de valoIes e de interes:e~ de vid~, se esconder os. perigos da sujeição e da submissão integral até
reciprocidade ou conexão de relaçoes longe de 10gIcas retn- a to~ anul::çac:> da vontade e da personalidade dos sujeitos
butivas ou de lucro e onde prevalece o "bem" de cada um, (plagzo). A dlgmdade humana nestas hipóteses representa um
como escopo a ser perseguido e, ao mesmo tempo, como jus- limite inviolável no plano do comportamento e, ao mesmo
tificação da constituição e da conservação do núcleo familiar. tempo, um valor indisponível em formas juridicamente impor-
A cláusula geral de promoção da pessoa (art. 2 Const.) coor- tantes. Nesta perspectiva, por exemplo, deve ser considerada
dena-se com o pluralismo ideológico e cultural, de maneira a a utilidade do controle de valor sobre os conteúdos do acordo
apresentar a necessidade~ po~ um lado, dos núcl~os familiare.s sobre a direção familiar (art. 144 Cód. Civ.).
Correla-
diversamente fundados e msplrados por valores laICOSe/ou relt- Se o tema dos direitos fundamentais na família concerne ções entre
giosos, e recusando, por outro lado, a concepção das. re~a~ões aos direitos do homem como tal (isto é, o status personae) erião status
familiares como insusceptíveis de qualquer controle aXlOlogIco. àqueles do cidadão (isto é, o status civitatis), é também verd!í.de
A necessidade desse controle resulta clara por contraste, que, às vezes, apresentam-se algumas correlações entre os 00n-
"Imunida- teúdos destes diferentes status. Eles são configuráveis, erttre
de": crítica diante das doutrinas que sustentaram a "imunidade" da família
outras coisas, na consideração da prioridade do adimplemento . -;'-"
e que são ligadas em vários mod~s àquelas ant~s c.riticadas
dos deveres de sustento e de assistência dos componentes do
porque orientadas a afirmar um autonomo e supe~lOrmteres~e
núcleo familiar colocado na base da justificação da derrogação
da família. "Imunidade" significaria uma tendenClal sub traça0 ".-~,
devem sofrer aqueles arral~os e modificações necessanos à variam sensivelmente segundo o variar das relações entre os
atuação dos preeminentes deveres pessoais e familiares, expres- membros da família, e especialmente entre os cônjuges. Uma
sões, por vezes, de verdadeiros oficios de direito civil. Tome-se, coisa é a unidade como expressão e resultante de relações
como exemplo, o filho deficiente que necessita de cuidados hierárquicas e piramidais, outra é a unidade como síntese de
por parte do genitor. Nesta perspectiva, é possível limitar a iguais posições jurídicas, distintas quando muito pela potencial
influência publicista-estatal nas relações pessoais e familiares e inClinação a realizar funções parcialmente diversas (art. 29, !3
realizar a preeminência da pessoa sobre as razões externas 2, Canse). A história vai a caminho da igualdade; o problema
inspiradas por interesses e valores diversos. atual é aquele de verificar como e até que ponto é possível
conciliar a unidade da família e a igualdade dos cõnjuges.
Igualdade 158. "Unidadedajamília': - o art. 29, ~ 2, Consto estabelece Excluir uma conciliação entre tais termos seria apriorístico.
moral_ed~u-
n lca
que "o casamento é ordenado sobre a igualdade moral eJ.urí- Freqüentemente a unidade exprime seja uma relação substan-
. dica dos cônjuges, com os limites da lei como garantia da cialmente de igualdade (aquela entre cõnjuges) ou uma rela-
unidade familiar" . A relevância da unidade da família, na letra ção formalmente de igualdade (aquela entre genitores e filhos
da norma constitucional, parece limitada, na medida em que menores), o que confirma que um diverso discurso deve ser
é colocada como limite à igualdade dos cônjuges: a unidade feito para a unidade da família composta somente pelos côn-
da família tem~um sentido completo mesmo em presença de juges, para aquela na qual são presentes também os filhos
dissolução do casamento. A expressão "unidade da família" , menores ou, enfim, para aquela reduzida somente aos filhos
que pode assumir conteúdos e relevância múltiplos, deve ser lnenores.
analisada com atenção. É nec-essário colocar em evidência que" unidade da família" Distinção
Pluralida-
•i de de mo-
A família como conceito legislativo não é absolutamente não deve ser confundida nem com" indissolubilidade do casa- da indisso-
Iubilidade
delos fami- unitária e, altenladamente, o legislador propõe ora uma noção mento" neln com "unidade do casamento". COln reservas de ou unida-
liares e uni- restrita (cônjuge e filhos ou mesmo somente cÔI~uges e filhos maiores aprofundamentos a seguir (sobre o divórcio cfr. infra, de do casa-
dade
menores), ora uma ampla (cõnjuge, afins, parentes até um S 164), pode-se dizer que a função serviente da família como mento
determinado grau), até um conceito mais amplo que com- fonnação social implica o não merecimento de tutela do seu
preende todos aqueles que vivem no âmbito de um núcleo prosseguimento quando se ponha, enl concreto, em insanável
familiar. O problema da unidade da família deveria ser apre- contraste com o desenvolvimento da personalidade de um de
sentado distintamente com referência a cada uma de suas pos- seus membros. Não pode, além disso, identificar-se com a
síveis noções, e a mesma noção de "unidade" teria sentido "unidade do casamento" , já que a unidade da família tem um
completo em imediata relação com determinadas jattispecie con- papel também extramatrimonial: ela se concretiza não somente
cretas de família. A pluralidade de modelos familiares, o fato 1 na constância do casamento, mas também em fonnas diversas,
.-1 ....
de que a sua organização não se esgote nas restritas formas de ".:: na hipótese de dissolução do casamento ou de separação pes-
uma família nuclear, o fenômeno das reagregações de parentes '4. soal. É mesmo nesta última hipótese que a igual dignidade
I;..
(como resposta em tennos de contatos humanos, educação e
assistência dos menores, e de conveniência econômica, a uma ,
;! .. social e a igualdade dos cÔl~uges podem encontrar um corre-
tivo na unidade da família (se for o caso, no interesse dos
sociedade fortemente industrializada) não devem ser ignorados filhos).
na análise jurídica. A unidade da família exprime o momento essencial da co- Comunida-
de e res-
Concilia- Maiores e mais insidiosas dúvidas se aninham no substantivo munidade, é o que torna" comum" (justamente no sentido de pOl1sabilida-
ção com a "unidade" , principalmente se referido à família entendida em
igualdade "unitária", não certo de "ordinária") a vida de cada com po- de
sentido estrito. Também para esta unidade, significado e valor nente do grupo familiar. Desse modo não se corrói a função
252 Capítulo nono Aspectos das relaçõesfamiliares, pessoais e patrimoniais 253
serviente da formação social, mas antes se evidencia o momento infra, S 163). No âmbito da família, portanto, as relações não
da responsabilidade, o fato de que o interesse individual de são de fato, mas têm relevância jurídica; às vezes as partes
cada um encontre o fundamento no próprio livre desenvolvi- podem também não se valer desta juridicidade. Tais relações Perfil regu~
mento, em constante reciprocidade com os interesses dos ou- deveriam ser ulteriormente aprofundadas: não somente as obri- lamentar
tros conviventes. A unidade tem uma própria relevância seja gaçôes no interior da família, mas também as obrigações de
no momento fisiológico seja naquele patológico da vida fami- comportamento, de lealdade, etc. Seria necessário estudá-las
liar, isto é, enquanto existir uma comunidade, ainda que ma- sob o perfil seja da exigibilidade seja da coercibilidade, em
terialmente separada (a comunhão entre os cônjuges é "ma- maneira diversa daquela na qual normalmente tais problemá-
terial e espiritual"), que deve prosseguir a função social à qual ticas foram estudadas referentemente às obrigações. Não se
é destinada (o desenvolvimento da personalidade dos compo- trata somente de obrigações genéricas, mas de obrigações com
nentes que ficaram unidos), ainda que de forma reduzida. A conteúdo específico, ou melhor, que assumem conteúdo espe-
unidade torna-se o mais genuíno instrumento para a atuação cífico segundo as circunstâncias concretas, o ambiente, a cul-
do respeito, pleno e integral, da personalidade dos cônjuges e tura, a mentalidade dos sujeitos interessados.
da prole: o fundamento no qual se inspirar para uma interpre-
tação moderna das exigências e da tutela do sujeito no âmbito . 160. Afamília não-fundada no casamento. - Váriascausas, aqui Convivên-
da comunidade familiar. não indagadas, estão na base da formação de relações familiàres cias típicas
e atípicas
fora do modelo estruturado pela organização estatal ou pela
Relações ju-
rídicas não-- 159. Família e relação jurídica. - A noção de unidade da Igreja. Assim nascem as convivências espontâneas: as de çon-
conflimais família delineada acima induz a reconstruir a família como teúdo e funções atípicas como aquelas entre homossexuais e
uma relação de tipo, abstratamente, não conflitual. Também as que, mesmo instaurando-se por uma exigência típica e ex-
nos institutos de direito de família está presente a noção de plicitamente considerada merecedora de tutela (como a união
relação jurídica, não necessariamente conflitual, de contrapo- entre um homem e uma mulher), realizam-se prescindindo do
sição; podendo ela existir entre situações que tutelam o mesmo ato oficial e sacramental que é o casamento, insubstituível e
interesse e que quando muito podem divergir na sua interpre- indefectível ato constitutivo da relação conjugal (arts. 82,.SS.,
tação, sem se colocar em aberto conflito com a outra. A comu- 143 Cód. Civ.). .}
É oportuno distinguir a união livre, mas estável, entre.-um Família de
nidade familiar mostra-se, nessa ótica, como um conjunto de fato e famí-
relações jurídicas mesmo depois da sua dissolução. Por exem- homem e uma mulher como única e substitutiva do casamento lia ilícita
plo, as obrigações de privacidade (riservatezza), de respeito da da outra que se configura como adicional à união matrimonial.
intimidade (privatezza) e de não-divulgação têm talvez maior
importância depois da dissolução do que durante a vida ma-
trimonial ou a vida familiar. Pode-se construir o direito de
I IA convivência estável e séria entre um homem e uma mulher
(fala-se de "família não-fundada no casamento" ou, menos
I apropriadamente, de "família de fato": cfr. retro, capo 6, S 95),
família recorrendo à noção de relação e de prestação, mesmo (sem que nenhum deles seja ligado por um precedente vínculo
não-patrimonial. Não é por acaso que o Código Civil, quando )matrimonial, é um fenômeno de liberdade que não se põe em
define o contrato, discorre sobre relação jurídica patrimonial !contraste com precedentes e oficiais assunções de responsabi-
(art. 1.321 Cód. Civ.). Isso significa que existem também rela- ! lidade e que não pode certamente colorir-se com as qualifica-
ções jurídicas não-patrimoniais, obrigações de comportamento, ''-ções de ilegitimidade ou de ilicitude./ Ilícita, ao contrário, é a
de conduta, para as quais é sempre possível reconhecer o convivência que se estabelece quando um dos conviventes seja
inadimplemento, com relevância, por exemplo, em tema de ligado por um precedente casamento (quando, entende-se, o
imputação (addebito ) da separação (art. 151, S 2, Cód. Civ.: casamento não tenha sido dissolvido por divórcio ou não tenha
254 Capítulo nono Aspectos das relaçõesfamiliares, pessoais e patrimoniais 255
sido declarado nulo). A atenção será reservada a partir de agora vivência fora do casamento, como ocasião e lugar de realização
à relevância jurídica da família não-fundada no casamento, das pessoas conviventes. Afirmar a irrelevância jurídica da con-
lícita. vivência more uxorio significa mesmo desin teressar-se de quan-
Desenvolvi- O estatuto da livre e estável convivência, não importa qual to nela acontece, renunciando a medir-se com esta realidade Recusa de
mento da
personalida-
ele seja, para os fins de sua validade jurídica, deverá ser con- e assumindo um comportamento aristocrático e formalista qualquer
formalismo
de dos con. forme os valores constitucionais, de maneira a representar um que ao juiz moderno seria imputável como comportamento
viventes idôneo. instrUmento para a sua atuação. Na sua concreta ma- de denegação de justiça (art. 99 Cód. Proc. Civ.). O juízo de
nifestação, a vida de relação - e de qualquer relação associativa irrelevância acaba por exprimir somente a falta 'de típica
- deve substancialmente ser respeitosa dos princípios; dos previsão e impossibilidade de proceder segundo o método
valores inderrogáveis e de ordem pública que estão - não à clássico da subsunção do fato à norma. Se a realidade é
base deste ou daquele setor do ordenamento, mas - na base unitária e não existe o jurídico primeiro e o social depois, mas,
do ordenamento, na sua unidade e globalidade. A família não- ao contrário, a normativa é dada justamente pela constante
fundada no casamento é portanto ela mesma uma formação dialética fato-norma, é forçoso rechaçar comoimproponível a
social potencialmente idônea para o desenvolvimento da per- qualificação de irrelevante jurídico a um fato que incide em
sonalidade de seus componentes e como tal orientada pelo modo assim determinante sobre os status personarum que repre-
ordenamento a perseguir esta função. sentam o esqueleto, a justificação dos ordenamentos contem-
Recusa de A intervenção do legislador neste setor deve ser evitada; não porâneos.
posturas di-
rigísticas somente porque a reflexão .da doutrina e da jurisprudência b) Teoria da plena equiparação: uma segunda orientação, to-
sobre o tema ainda não está madura, mas também porque a talmente em contraposição à precedente, atribui à convivência
mesma concepção da família não-fundada no casamento exige fora do casamento uma relevância jurídica totalmente idêntica
liberdade em relação a um enfoque dirigístico que freqüente- àquela reservada à família legítima. A teoria deve ser rechaçada
mente configura, para os direitos da pessoa e p~ra as liberdades porque não considera o autônomo significado da convivência
pessoais, vínculos que não são necessários para uma correta; extramatrimonial (ainda uma vez não se estaria levando em
normal e civil convivência. consideração as específicas particularidades do fato: cfr. retro,
A problemática suscitada pela família não-fundada no casa- capo 5, S 67), frustrando a originária conotação subjetiva da
mento deu vida a uma pluralidade de concepções que serão affectio dos conviventes que, em plena consciência, decidiram
examinadas a seguir, recolhidas em quatro orientações. viver fora do casamento. Reduzir ou reconduzir a união livre
a) Teoria da irrelevância jurídica: segundo uma primeira teoria, à união matrimonial acaba por aviltar em modo totalmente
a convivência fora do casamento seria um fato juridicamente il~ustificado seja a conotação da espontaneidade e da liberdade
irrelevante; a indiferença do ordenamento' pareceria a única que originam a convivência more uxorio - que, ao contrário,
resposta coerente para um casal que tenha deliberadamente na sua genuína expressão, gostaria de representar fantasia e
decidido viver fora do esquema típico (o casamento) previsto imaginação também diante das instituições - seja a sacra e a
pela lei. A teoria não pode ser aceita. Reduzir um fenômeno pública, consciente, querida assunção de responsabilidade que
associativo, caracterizado pela seriedade e pela estabilidade, à representam o concentrado do. casamento como ato e como
','.,
irrelevância jurídica é operação que se funda em uma falsidade relação. Existe portanto uma não-identidade de ftinção entre Não identi-
metodológica. É impossível admitir que um ordenamento so- as duas formas de convivência e isso proíbe de assimilá-las no dade de
função es-
cialmente caracterizado e inspirado pelo máximo respeito às tratamento jurídico. Não-identidade de função no específico, pecífica
comunidades intermédias, onde de qualquer modo se desen- já que ambas, ao contrário, se encaixam, como já foi dito, no
rola a vida humana, possa ficar indiferente em relação à con- quadro e na função geral próprios de cada fonnação social: o
Aspectos das relações familiares, pessoais e patrimoniais 257
256 Capítulo nono
Controle
desenvolvimento da personalidade de seus componentes. A mento, que se caracteriza pela promoção social e pela garantia sobre to-
particularidade que à convivência more uxoriofalte um ato ofiCial da pessoa, deve ser submetido a um controle normativo de dos os atos
sobre o qual se basa e que se esgote exclusivamente no fato valor, a uma valoração positiva. A essa valoração não se subtrai de autono-
mia
continuativo e, portanto, em uma avaliação a posteriori, não o acordo entre os conviventes de fato seja no momento cons-
somente tira a característica da certeza que o ato matrimonial titutivo, seja naquele modificativo e extintivo: uma solução con-
é idôneo a dar, mas, o que é mais importante, representa um trária teria como conseqüência, em concreto, o sacrifício do
efeito (a convivência) não separável, no desenrolar do tempo; cônjuge econômica ou afetivamente mais frágil, e, por isso,
Incidência do próprio fato da convivência. Ainda que possa parecer sin- com menor força" contratual" .
do fato con-
tinuativo
gular, é o prolongar-se no tempo de alguns comportamentos
na qualifi- de um casal que faz a um certo ponto pronunciar o juízo que 161. A família não-fundada no casamento como valor atuativo dos
cação aquele casal de conviventes, que aquela série de fatos indivi- princípios constitucionais. - Seria extremamente difícil com-
duais de vida em comum representa um unitário fato conti- preender o papel social e jurídico de um aspecto individual
nuativo chamado "convivência fora do casamento"; o juízo deste sistema de relações sem inseri-lo no complexo fenômeno
sobre a existência de uma família de fato é portanto possível da comunidade de vida e de história que caracteriza também
somente a posteriori. Daqui a impressão de um fato que seja a família não-fundada no casamento. É necessário ter a cons- Não "a",
mas "as" fa-
causativo de si mesmo. ciência de que existem diversos modelos de família não;~Í1m- mílias de
c) Teoria da aplicação analógica: uma terceira orientação ex- dada no casamento. As razões colocadas na base da famíli.a de fato
primiu-se no seJ]tjdodaaplicacão 2nalógica à família de fato fato são várias: razões ideológicas, contestadoras do sistema,
Limites à
da porrndúva prevista para a família legítima. Este enfoque, ligadas a situações econômicas de abandono cultural, a falta
analos:r;'" apreciável mas que peca por excessos, vai de encontro a um de confiança. É da máxima importância notar que estas razões
duplo erro. Em primeiro lugar, considerada a não-identidade não equivalem a simples motivos, irrelevan tes para a construção
de função, não é possível generalizar a possibilidade da analo- dos modelos, mas cada uma delas, radicadas em um particular
gia e, em segundo lugar, não se pode limitar o discurso somente contexto social e moral, responde a uma própria função. Cada
à disciplina prevista para a família legítima, porque deve ser I.
modelo de família não-fundada no casamento acaba po!,'ser Pluralida-
atentamente considerada a inteira disciplina das relações pes- único, expressão de determinadas instâncias morais e soéiais. de de cau-
soais e patrimoniais (a chamada disciplina de direito comum). No respeito ao enfoque metodológico que concede relevância sas \não
Vários princípios e regras, ainda que não deduzidos do direito jurídica aos deveres morais e sociais (retro, capo 8, S 136), não JUS
m°tifi~vosd)
lca o-
de família, podem ser utilizados na disciplina da família não- se pode relegar ao papel de motivos, razões que caracterizam ras
fundada no casamento. o modelo e que representam não os seus motivos, mas sim, as
d) Teoria da regulamentação exclusivamente remetida à autonomia
causas.
privada: uma quarta orientação imaginou traduzir a exigência Valor mere-
A família não-fundada no casamento, quando responde à
de liberdade que a escolha de conviver fora do vínculo matri- cedor de
exigência educativa dos filhos e de desenvolvimento das pessoas tutela
monial exprime remetendo a regulamentação à autonomia
que dela fazem parte, representa um valor merecedor de tutela.
privada. Toda exigência de tutela feita por um dos conviventes
E um problema de costume e não somente de leis. Diante de
encontraria resposta se e somente se os conviventes tivessem
uma mudaru:.a.,nD costume - que todavia continua dentro do
preventivamente, através de negócios jurídicos, disciplinado tal
.-'t'"'a-dI"O'-êõi1stitucional - representaria um comportamento ve-
exigência. A autonomia privada, deve-se replicar, não é um
.!.-.-~' leitário e perdedor (por parte) do legislador, cristalizar um
valor em si mesmo. Todo ato e portanto toda relação, para ter _
va1~damente ingresso na juridicidade~_I}_atlltela do ~...cl",~~
••- -"
costume já mudado ou superado.
258 Capítulo nono Aspectos das relações familiares, pessoais e patrimoniais 259
Relativida-
Calcular os conviventes no número dos familiares para fins mente relevante: o Pátrio Poder existe em presença da mera Múnus fun-
de históri-
ca e cultu- de atribuição da casa, por exemplo, não é um fato inconstitu- convivência dos genitores naturais com os filhos (art. 317 bis dado na fi-
ml cional ou contrário à ordem pública, porque representa uma liação
Cód. Civ.) e, que caiba a um ou a ambos os genitores (art. 155,
exigência considerada em modo positivo por parte do ordena- S 3, Cód. Civ.), de qualquer jeito perdura nas diversas formas
mento. Muito menos pode-se dizer que a exclusividade da de separação e até mesmo na hipótese de casamento dissolvido
I família legítima representa um parâmetro para a avaliação em por qualquer motivo, especialmente pelo divórcio.
i termos de civilização de um ordenamento. Isso certamente não O papel primário na satisfação da necessidade-direito à edu- Papel do
é verdade e os históricos-comparatistas poderiam demonstrá-lo. cação é portanto do casal. As intervenções, entre as quais as- casal
f Muitos ordenamentos civis, Inesmo pertencentes ao passado, sume um especial significado aquela do juiz, em via subsidiária,
constntíram relações familiares e pessoais em modo diverso são orientadas a facilitar o normal andamento da família e a
daqueles adquilidos pela civilização clistã. É preciso respeitar eliminar, por outro lado, os obstáculos, os abusos, os desvios.
11 aquilo que o direito é, isto é, expressão de uma-realidade Nas relações genitores-filhos é particularmente útil o recurso
j~ histórica e cultural.
aos arts. 330 e 333 Cód. Civ., não tanto pelo seu perfil sancio-
g natório, que pode até culminar na perda do Pátrio Poder,
Função 162. PátTio Poder (potestà) dos genitores e liberdade dos menores. quanto pela promoção do interesse do menor em qualquer Interesse
educativa
11 - No .respeito ao princípio de igualdade e à exigência de ~ituação na qual possa emergir um conflito. Essa intervenção do menor
li garantia da unidade familiar, devem-se enquadrar as complexas assume ca.da vez mais o papel de garantia em relação ao não e interven-
.!:
'I
-fi
re laçoes .
entre 1Ihos e gemtores entre o exercício dos direitos correto exercício do ofício (Pátrio Poder) e ao próprio capri- ção do juiz
I fundamentais e o cumprimento da "função" do Pátrio Poder cho e arbítrio do menor. O ..e;xerckio do Pátrio Poder se con-
I (art. 315 ss. Cód. Civ.). O esquema do Pátrio Poder, visto como centro. exclusivamente no interesse dõ-~Iu.teresse exis-
poder-sltieição, está em crise, porque não há dúvidas de que, .~ tencial, mais que patrimonial, que deve ser indiviCfUãn~
em uma concepção de igualdade, participativa e democrática fZ; relação às circunstâncias concretas, no respeito à historicidade'-',,-_.
da comunidade familiar, a sujeição, entendida tradicionalmen- l Y da família. Na individuação desse interesse, a avaliação do juiz,
te, não pode continuar a realizar o mesmo papel. A relação {i;- , vista aqui, como em nenhuma outra hipótese, como um "juízo
educativa não é mais entre um sujeito e um objeto, lUas uma 1": de valor" , deve ser expressa com prudência e equilíbrio, iden-
correlação de pessoas, onde não é possível conceber um sujeito '.(.}:' tificando-se na situação de fato, à luz de valores não-subjetivos
subjugado a outro. V e arbitrários, mas sim, emergentes do personalismo constitu-
A insuprimível dialética entre auto-avaliação e heteroavalia- J~1.. cional.É indispensável que o interesse do menor se realize não
ção exige posições equilibradas, que não mortifiquem o Pátrio somente com a intervenção do juiz, mas sobretudo com uma
Poder dos genitores e não anulem a escolha significativa e de 1(: organização da comunidade, através de instituições pluralisti-
cultura representada pela participação do menor no processo ',' camente entendidas, idôneas para constituir suportes destina-
educativo. O Pátrio Poder dos genitores assume mais uma .,;.. dos a realizar uma intensa atividaae de colaboração e prevenção
função educativa que propriamente de gestão patrimonial, e ., que facilite o cumprimento das complexas tarefas familiares e
é ofício finalizado à promoção das potencialidades criativas dos i" contribua a remover os obstáculos que mesmo de fato impeçam
filhos. Ao atribuir o Pátrio Poder a ambos os genitores, o 11 a sua atuação (arts. 3, S 2 e 31, S 1, Const.).
ordenamento exalta a filiação com a relativa responsabilidade O interesse do menor identifica-se também com a obtenção Finalidade
em relação à manutenção, a irrstru-ção~-a"""d .•.•.
ca:Ç,ão.Este Pátrio I de uma autonomia pessoal e de juízo e pode concretizar-se da educa-
ção
Poder se desancora do ato matrimonial e da mesri'l:a":re-~<;ii-o também na possibilidade de exprimir escolhas e propostas 0.1-
corüugal para elevar-se a ofício fundado na filiação juridic'à--::------...:::.:....:.~=i.:z.::c: ternativas que possam ter relação com os mais diversos setores,
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260 Capítulo nono Aspectos das relações familiares, pessoais e patrimoniais 261
dos interesses culturais àqueles políticos e afetivos, desde que ato importante como o casamento, encontra confirmação tam-
seja salvaguardada a sua integridade psicofísica e o global cres-: bém em outras hipóteses (art. 250, S 5, Cód. Civ.; art. 6, lei nº
cimento da sua personalidade. 194 de 22 de maio de 1978; art. 7, lei nº 184 de 4 de maio de
Irrelevân- É necessário superar a rígida separação, que se traduz em 1983). Nem existem razões para reconhecer ao menor essa
cia da capa-
cidade de
uma fórmula altemativa jurídica, entre minoridade e maiori- possibilidade em relação às situações patrimoniais (arts. 2, S 2,
exercício dade, entre incapacidade e capacidade (retro, capo 7, S 1l0). A e 231 Cód. Civ.) e não em relação àquelas existenciais, para as
para atos contraposição entre capacidade e incapacidade de exercício e quais a titularidade do direito deveria ser colocada em relação
não-patri-
maniais
entre capacidade e incapacidade de entender e de querer, estritamente ao exercício do próprio interessado e onde o
principalmente nas relações não-patrimoniais, não correspon- binômio, ou a cisão, entre capacidade de direito e capacidade
de à realidade: as capacidades de entender, de escolher, de de exerCÍcio não tem uma justificação constitucional. O tema Direito
querer são expressões da gradual evolução da pessoa que, como da legitimação processual e mais em geral do poder de acionar constitucio-
nal de ação
titular de direitos fundamentais, por definição não-transferíveis um mecanismo de tutela tem fundamento na aplicação direta
a terceiros, deve ser colocada na condição de exercê-los para- do art. 24 Const.: "A todos é assegurado o acesso emjuízo para
lelamente à sua efetiva idoneidade, não se justificando a pre- a defesa dos seus direitos e interesses legítimos." Trata-se de
sença de obstáculos de direito e de fato que impedem o seu realizar instrumentos e técnicas que possam de fato convencer ~
exercício: o gradual processo de maturação do menor leva a sobre a necessidade de uma participação do menor como ci-;
um progressivo cumprimento a programática inseparabilidade dadão, para a defesa de seus direitos existenciais: o art. 2 Const. ;.
entre titularidade e exercício nas situações existenciais. discorre sobre o homem e não justifica a identificação da ca- >
Legitima- Nesta perspectiva, problema central é aquele da legitimação pacidade de exerCÍcio (que o menor não tem, mas trata-se de
ção proces- processual do menor. Negar ao menor a possibilidade de re- um instituto de relevo tipicamente patrimonial, estranho à
sual
querer por si mesmo a intervenção da autoridade judiciária lógica das situações existenciais) com a legitimação processual,
para garantir o próprio livre desenvolvimento constituiria uma indispensável para a tutela de escolhas de tipo existencial como:
grave limitação, ir~justificável na ordem constitucional dos va- o credo religioso, o tipo de instrução, a operação cirúrgica:
lores. Não faltam possibilidades, de um modo ou de outro, de urgente e grave.
solicitar a justiça e de qualquer modo de acionar o mecanismo
em maneira mais direta do que aquela consistente em dirigir-se 163. Pressupostos da separação judicial: "intolerabilidade da con-
ao Ministério Público para pedir uma medida ou para denun- vivência" ou "prejuízo dos filhos': - Segundo o art. 151, SI, Cód. In tolerabili-
ciar uma situação patológica. Civ., "a separação pode ser pedida quando se verificam, mesmo dade ou
Hipóteses O art. 84, S 2, Cód. Civ., por exemplo, prevê a propósito do independentemente da vontade de um ou de ambos os cônju- prejuízo
legislativas
casamento do menor, que "o Tribunal pode, a pedido do inte- ges, fatos tais que tornem intolerável o pros~eguimento da
ressado (portanto do próprio menor), verificada a sua maturi- convivência ou que possam causar grave prejuízo à educação
dade psicofísica e o fundamento dos motivos alegados, ouvido da prole". Para a norma o que releva não é sempre a intole-
o Ministério Público, os genitores, ou o tutor, com provimento rabilidade da convivência. Poderia verificar-se uma hipótese na
judicial (decreto) emitido sem audiência das partes (in camera di qual a convivência seja tolerável para os cÔl~uges, mas de grave
consiglio), admitir por graves m?tivos ao casamento quem tenha prejuízo à educação dos filhos; a separação poderia ser disposta
completado dezesseis anos". E indicativo que nesta norma o justamente no interesse dos filhos. Não é por acaso que o
acertamento da maturidade psicofísica não seja condicionado legislador usou a fórmula disjuntiva" ou" .
pela vontade do genitor ou de outros sujeitos. Existe, portanto, A existência dos pressupostos legais da separação induz a Não auto-
uma tendência no ordenamento que, sendo relevante para um matismo
excluir que no atual contexto normativo se possa reconhecer
262 Capítulo nono Aspectos das relaçõesfamiliares, pessoais e patrimoniais 263
um tipo de automatismo para a separação. Para se ter separação Presc~n~indo da ~ificuldade de imputar estes fatos (objetivos
não é suficiente o pedido, mas é necessário provar os fatos e subjetIvos, relatIvos àquela determinada comunidade fami-
alegados que incidem negativamente sobre o prosseguimento liar) ao comportamento de um sujeito, seria necessário verifi-
da convivência. A família é um valor para o ordenamento car se aquele comportamento é o efeito ou a causa, isolando
vigente, de maneira que antes de qualquer intervenção nesta aquele fato do contexto da vida em comum e realizando um
comunidade organizada deve ser feita uma avaliação, que na exame preliminar complexo para ad}nitir a legitimação pro-
separação dos cônjuges tem por objeto a intolerabilidade da cessu~. 0. fato pode p~recer exterior e diretamente imputável
convivência ou o grave prejuízo dos filhos. Na pronúncia de (addebztabz'!) a um sUjeIto enquanto que na realidade, indireta
separação, a intolerabilidade deve ser adequadamente moti- e substancIalmente, poderia ser imputável ao outro. Daí deriva
Imputabili-
dade °
vada.
re fi'd
en o art. 151 prossegue no segun d o paragra
' fio:. "O
a. <:portunidade de distinguir o perfil da ação daquele da de-
Clsao.
juiz, pronunciando a separação declara, quando se apresenta- . A. imp~ta~ilidade como noção objetiva fundada na grave Guarda
rem as circunstâncias e quando for pedido, a qual dos cônjuges madlmplenCla pode ter relevância e reflexos também em'outros dos filhos
a separação é imputável (addebitabile), em consideração do seu
comportamento contrário aos deveres que derivam .do casa-
mento". É necessário indagar o significado de "imputabilida-
(affidamento) dos filhos. °
institutos de direito familiar como, por exemplo, a guarda
juiz, quando deve decidir sobre a
guarda (affidamento) ou quando procede à homologação da
de" . Imputabilidade é noção objetiva e não se esgota somente separação consensual, avalia de fato o comportamento das par-
em uma grave ofensa ao outro cônjuge. Quando há uma ina- te sobretudo em relação à prole (art. 155, ~ 1, Cód. Civ.). A
dimplência de um dever que caracteriza a. relação conjugal, imputabilidade na separação, enfim, releva para fins patrimo-
uma inadimplêiicia constante, contínua, ocorrem os pressu- niais (arts. 548, S 2, e 585, ~ 2, Cód. Civ.).
postos da imputação (addebito), independentemente de existir
ou não uma ofensa. A imputabilidade pode ser reconduzida à 164. Divórcio e princípio de conservação da família. - No nosso Solidarieda-
inadimplência dos deveres, ainda que de caráter não-patrimo- ordenamento não existe em sentido abstrato nem um princípio de familiar
nial, que se tem em relação ao cônjuge, aos filhos, à família. e responsa-
de ordem pública de dissolução nem de indissolução do casa-
bilidade
Na hipótese de inadimplência dos deveres para com os filhos, me~I~o. Toda f~rmação social responde a uma função que é
causando um grave prejuízo à prole, indiretamente causa-se-o pOSItIva,garantIda pela Constituição e, portanto, goza de uma
....
I~p\llabili-
também ao pai ou à mãe.
Não se pode negar a um cônjuge a possibilidade de agir em
, .. tutela constitucional. O problema não deve. ser colocado em
termos de princípio de conservação, de estabilidade ou de
~ade e pe-
dldo de se-
pamção
juízo, com base nos fatos a ele imputáveis (addebitabilz), para
b .. - . d. 'al N d . h
O ter uma separaçao jU ICI . em po er-se-la c egar a uma r indissolução. O discurso é outro: se a formação social" família"
é em abstrato útil, ou melhor, necessária ao desenvolvimento
diversa avaliação, considerando que tais fatos foram realizados das pesso~s que a compõem deveria prevalecer o princípio de
com a intenção de chegar ao divórcio ou somente para fins de conservaçao. Também as liberdades individuais são temperadas
uma separação. O pedido de separação com imputação (adde- por deveres de solidariedade econômica, política e social; e
bito) cabe ao cônjuge como ~l, prescindindo do fato de que a certamente a solidariedade na família é dever de lealdade
impossibilidade da convivência seja imputável (addebitabile) ao assunção de responsabilidades em relação a todos e especial~
recorrente. O art. 151 Cód. Civ. na primeira parte é claro e mente aos filhos e aos filhos menores. Na dúvida, é preciso
exprime um princípio fundamental: "A separação pode ser garantir de especial modo a conservação de uma fonnação
pedida quando se verificam mesmo independentemente da von- social que possa tutelar e desenvolver a pessoa em vez de chegar
tade de um ou de ambos os cônjuges" estes determinados fatos. ao oposto princípio do favor divortii. É necessário mais do que
i
i'
I
J
Capítulo nono Aspectos das relaçõesfamiliares, pessoais e patrimoniais 265
264
outra coisa, aceitar a idéia de que, quando falta o afeto e a casamento já extinto. Continuam os deveres de manter ins-
comunhão espiritual, a família "não existe". A partir de uma truir, educar os filhos nascidos ou adotados durante o 'casa-
legislação ordinária indissolutista chegou-se a uma normativa mento, até mesmo na hipótese de passagem a novas núpcias
mais respeitosa das liberdades civis que qualifica o casamento de um ou de ambos os genitores (art. 6, S 1, 1. do divórcio,
resolúvel, não indiscriminadamente ou arbitrariamente, nem assim como substituído pelo art. 11, S 1 da lei n!! 74 de 1987).
por declaração unilateral, mas depois de um controle da de-
sacrreo-ação da comunhão espiritual e material, que como tal 165. Função autônoma da separação. - A relação entre sepa-
"l~ão bpode ser mantida ou reconstituída" por livre consenti- ração e divórcio não é tanta que possa reduzir a disciplina de
mento (art. 4, ~ 13,1. nº 898 de 1 de dezembro de 1970, assim uma e do outro a uma unidade sistemática porque, apesar da
como substituído pelo art. 8 da 1. nº 74 de 1987). Na concepção utilização que na prática ocorre, a separação tem uma função
nonnativa, desagregação não é a causa da dissolução do vínculo autônoma em relação ao instituto do divórcio. A autonomia
matrimonial, mas é o seu efeito. Ainda que de um ponto de da função da separação é sufragada pela escolha não-casual do
vista sociológico ou tipológico ou ético se possa opinar diver- legislador que predispõe, requerendo tempos e modalidades, Favor para
a reconci-
samente, é necessário ater-se àquela que é a vontade da lei. De um espaço de reflexão, índice de respeito aos sentimentos e
liação
acordo com o art. 1 da lei de 1970 o juiz deve certificar-se que aos afetos .. Outras normas (arts. 708 e 711, ult. S, Cód. Proc. ""
.;:::..~.
Comunhão a comunhão espiritual e material entre os cÔl~uges não pode Civ.; 4, S 2 e 7, 1. n!! 898 de 1970, assim como substituído pelo
material e ser mantida ou reconstituída pela presença de uma das causas art. 8, .S 7 da lei n!! 74 de 1987) tendem a favorecer a reconci-
espiritual liação, a reconstituição da comunhão espiritual e material/em
previstas no art. 3 (assim como modificado pelos arts. 1-7 da lei
n!!74 de 1987). Não é sufidenteyerificar a existência de uma das atuação do preceito constitucional emergente sobretudo 'dos
causas, mas é preciso também indiViôuar que estas tenham efe- arts. 2, 29, última parte e 31, S 1, Consto
tivamente provocado o fim da comunhão. Pode-se formular a A separação pode ter uma autônoma função de respeito a
hipótese de que, apesar da presença de uma das causas, a concepções de vida para as quais a suspensão, e não a extinção
comunhão espiritual possa subsistir mesmo a despeito da ine- da relação, encontra umajustificação. Nem se deve excluir que
xistência daquela material. Não se pode excluir, por exemplo, a fase de separação possa encontrar uma razão autônoma tam-
que exista um condenado à prisão perpétua que, apesar de bém por outros motivos: razões ideológicas, pessoais, religiosas
amar imensamente a mulher e os seus filhos, queira pedir o podem fazer com que as pessoas separadas não requeiram o
divórcio porque não considera justo que a mulher viva sozinha; divórcio, que é um direito, mas não um dever.
o juiz, se verifica que a comunhão de afetos de uma e de outra Em termos de vicissitude jurídica, a separação, ainda que
parte existe, cometeria um abuso se concedesse o divórcio. com diversa intensidade, constitui uma mera modificação da
É necessário que concorram ambos os pressupostos, deven- disciplina da relação conjugal, atenuando e limitando o seu
Controle
em concre. do-se precisar que poderia ocorrer uma das causas individuadas alcance. A separação não comporta a suspensão total da relação Vicissitude
11 conjugal. Medio tempore continuam aquelas situações que não modificati-
i' to sem que ela tenha na hipótese concreta, produzido a desagre-
va da rela-
gação. O ordenamento considera a sociedade familiar mere- são incompatíveis com a ausência de convivência e, em parti- ção
cedora de tutela desde que ela seja efetivamente idônea para cular, alguns deveres, quer derivantes dos preceitos constitu-
realizar as próprias tarefas em relação aos seus membros. O cionais, como se pode deduzir dos arts. 2 e 30, quer presentes
.; divórcio acaba com a avaliação positiva do vínculo, o extingue; na legislação ordinária (arts. 143 e 147 Cód. Civ.). A esse pro-
mas pelo princípio da auto-responsabilidade, típico de um or- pósito pode-se mencionar a obrigação de colaboração no in-
denamento evoluído, e particularmente para o interesse dos teresse da família. A violação destes deveres tem relevância,
filhos, continuam os efeitos que se ligam ao fato histórico do como se deduz, por exemplo, dos arts. 155, S 3, última parte,
']
I
!
I
J_
266 Capítulo nono
Aspectos das relaçõesfamiliares, pessoais e patrimoniais 267
Cód. Civ. e 710 Cód. Proc. Civ. Ás vezes o comportamento de
um cô~uge pode, em pendência da separação, adquirir rele- da atuação da igual dignidade e da igualdade moral e jurídica.
vânçia para a perda de direitos, como na hipótese de uso do Daqui a conseqüência do reconhecimento a ambos os cônjuges
sobrenome (art. 156 bis, Cód. Civ.) que remoilta à relação do poder de iniciativa atuativo da direção da vida familiar (art.
suspendida mas não extinta. 144, S 2, Cód. Civ.), prescindindo seja da pessoal situação
patrimonial seja do particular regime patrimonial, legal ou
Dever de
166. Regime primário das relações patrimoniais familiares. - A convencional, entre eles existentes. O dever de contribuição
contribui- afasta-se do dever de manutenção recíproca também porque
ção concepção das relações pessoais inspiradas na igualdade moral
e jurídica dos cÔl"Úuges,na igual dignidade dos componentes considera relevante não somente a contribuição direta mas
do grupo familiar, na unidade da família devem incidir sobre também aquela indireta de cada cônjuge, no sentido de que,
a configuração de seu regime patrimonial (art. 159 ss. Cód. para fins da proporcionalidade contributiva, dever-se-á levar
Civ.). O conjunto das relações patrimoniais entre os cônjuges em consideração, na avaliação patrimonial, também o trabalho
e também entre os componentes do grupo familiar caracteri- doméstico.
za-se por um regime primário fundamental e inderrogável que Deve-se precisar a esfera de operatividade objetiva do dever Necessida-
encontra a sua justificação na normativa constitucional (arts. de contribuição, ou seja, a noção de necessidades da família des da fa-
• 1,.2, 3, 4, 29,30,36 Const.) e nas normas que explicitamente (art. 143, S 3, Cód. Civ.). Estas não são individuáveis em abs-
mília
II
i individuam direitos e deveres inderrogáveis mesmo em sede
patrimonial (arts. 143 sS., 160, 210Cód. Civ.) e atribuem obri-
trato; mas relativamente a cada componente do grupo. As ne-
cessidades de cada um, os seus interesses úteis para o seu livre
gações de assistência e de colaboração (art. 143, S 2, Cód. Civ.)
Ii fundadas na capacidade de contribuição (art. 143, S 3) e na
igualdade de poder de atuação da direção' (pactuada) da vida
i.:.
desenvolvimento em' termos de instrução, profissão, etc., tra-
duzem-se em necessidades de_Jodos os componentes do grupo
e portanto da .família. O problema torna-se aquele de indivi-
i familiar (art. 144). Em particular, o dever de contribuir para
duar o necessário corretivo. Este deve ser individuado na mes-
I! as "necessidades da família" é proporcional às "substâncias" e
ma solidariedade interna familiar e em um juízo de congrui-
"I- à capacidade de trabalho profissional ou doméstico de cada
r:
um dos cô~uges (art. 148, S 1, Cód. Civ.) e às "substâncias" e dade com as condições patrimoniais da família, incluídas aque-
i:
l- las dos filhos conviventes.
I' Trabalho à renda do filho convivente (art. 315 Cód. Civ.).
,-I; profissio- A solidariedade familiar, longe de apresentar-se como ex- Para a hipótese de inadimplência do dever de contribuição
i' Remédios
I,
i;
nal ou do- pressão de uma concepção publicista ou como fundamênto da existem instrumentos de natureza diversa. Em chave civilística contrà a
méstico
Ho. família como célula produtora, traduz-se em uma nova solida- devem ser mencionados o art. 146, S 3, Cód. Civ., que configura inadimplên-
cia
I
I.
riedade econômica fundada não somente na propriedade mas, uma função cautelar e ao mesmo tempo de garantia orientada
"
i.
sobretudo, no trabalho dos componentes, que legitima uma a solicitar o adimplemento; art. 148, S 2, Cód. Civ., que, em
i. mais justa proporcionalidade no cumprimento do dever de "l::"
tema de concurso nos ônus, "a pedido de quem tenha interes-
contribuição. Os cônjuges devem contribuir também em rela- se", consente ao presidente do Tribunal ordenar que uma cota
ção à própria capacidade de trabalho, levando em consideração
das rendas do obrigado, no respeito ao princípio de propor-
que para eles o trabalho é um dever; o filho deverá contribuir
cionalidade, seja versada diretamente ao outro cônjuge ou, de
também com a própria renda, mas somente ,se a tiver; se con-
vivente, o trabalho deve ser considerado eventual. qualquer modo, a quem tenha de fato suportado a despesa; o
Contribui- O dever de contribuição (art. 143, S 3,Cód. Civ.) não se art. 193, S 2, Cód. Civ., que prevê a pronúncia de separação
ção e ma-
identifica com o dever de manutenção recíproca: ele se carac- judicial dos bens na hipótese de desordem nos negócios ou de
nutenção
teriza pelo valor instrumental que assume para fins da garantia conduta perigosa para os interesses do indivíduo, do outro
cônjuge ou da família .
•
Aspectos das relações familiares, pessoais e patrimoniais 269
268 Capítulo nono
o dever de contribuição constitui um regime primano e tru~ão e pela educação dos filhos e por qualquer outra ob '_
"Ultra-ativi-
dade" inderrogável, relevante em todos os regimes patrimoniais da ?açao contraída p.elos cônjuges, mesmo separadamente, ~
família, dotado, por assim dizer, de ultra-atividade. Ele é rele- mteresse da famílIa (art. 186, let ., c Co'd . C'IV., )' e tam b'em
vante não somente durante a vida fisiológica da relação fami- verdade
" . que eles respondem por toda obrigaça-o con t'd raI a
liar, mas também nas suas fases patológicas, e especialmente conJu?~mente l?:los ~ôI~uges" (art. 186, let. d, Cód. Civ.).
quer nas separações (art. 155 Cód. Civ.) quer no divÓrcio (art. Nesta ultIma ~reVIsao nao se requer que a obrigação assumida
5 I. nº 898 de 1 de dezembro de 1970, assim como modificado responda ao mteresse da família ou à direção acord d d
" .d f: '1' " a a a
pelos arts. 9 e 10 da I. nº 74 de 1987) e quer nas fases de VI a a~l~a:, pode~do a obrigação ser contraída também
para arbItranas e capnchosas . escolhas . de ambos A.
os conJuges.
dissolução também por morte (arts. 279, 580 e 594 Cód. Civ.).
Na mesma filosofia parece mspIrada a disciplina contid Patrimônio
art. 189- queA'no parágrafo 2,. sempre_ e somente para a garan a ~o imperfeita-
tIa mente de
167. Aspectos da comunhão legaL - Ter individuado no dever A
nal. Ele, além disso, de fato representa um regime espúrio e garantI~ para os conJ.ug~s também e sobretudo no momento
da gestao. -Esta . garantIa
. e realizada particularmente por aque Ia
misto: espúrio, porque é limitado às aquisições (art. 177, let.
parte d e_regime mderrogável que é comum não somente à
a), Cód. Civ.) e não concerne aos bens possuídos precedente-
comunhao legal mas também àquela convencional. Não
mente ao casamento e a todos os bens pessoais indicados no
pode constituir esta última (art . 210 ,;:;,R 1 Co'd . CI'V)
. me d'Iantese
art. 179 Cód. Civ.; misto, porque com o regime de comunhão
pactos em contraste seja com as normas inderrogáve'
legal, de qualquer modo e sempre, coexiste um regime de . 'd ~ que
seJ,am c~nsI er~das comuns aos regimes patrimoniais (art. 160
separação para os frutos dos bens pessoais e dos rendimentos
Cod..
CIV.) - amda
d - que topograficamente colocadas n a d'ISCI '_
da atividade separada (art. 177, let. b e c).
Comunhão p 1ma a co~unhao legal-: seja,com a.quelas certamente típicas
Geralmente a comunhão legal é considerada o regime pa-
e paridade da comU1?hao .legal, _r~latIvas a admmistração dos bens (art.
econômica
trimonial mais idôneo para a atuação dos interesses da família.
180 ss. Cod. CIV.) . ..e a Igualdade
. das cotas, limitadament e aos
Talvez o instituto, mais que se apresentar como o instrumento
b ens que constItumam objeto da comunhão legal (art. 210 S
natural para a melhor realização das necessidades familiares,
3, Cód. Civ.). ' Irrenuncia-
configura-se como tendente a garantir a igualdade econômica
. Um~ cláusula q.ue estabel~cesse uma derrogação à propor- bilidade do
dos cônjuges. Se é verdade que os bens que entram na comu-
CIOnalIdade devena ser conSIderada nula: principalmente na poder de
nhão legal respondem pela manutenção da família, pelains- iniciativa
270 Capítulo nono
Aspectos das relaçõesfamiliares, pessoais e patrimoniais 271
família não são possíveis pactos leoninos (art. 2.265 Cód. Civ.). sobre a dissolução da comunhão legal somente se não existirem
Do mesmo modo, não poderia ser considerada me~ecedora de filhos (art. 171, ~ 4, Cód. Civ.). .
tutela uma cláusula que se propusesse a exautoraçao do poder
A característica constante do fundo patrimonial é a consti- Vínculode
de iniciativa atuativo da direção acordada da vida familiar. O
tuição de um vínculo de destinação sobre um ou mais "bens" destinação
art. 144, ~ 2, que constitui parte integrante e qualificante da
pa~ "~ necessidades da família" , vínculo que se extingue com
disciplina dos direitos e dos deveres que nascem do casamento, o termll10 do casamento (art. 171, ~ 1, Cód. Civ.) ou por razões
representa uma norma ~e ~a~ureza.inderrogável enqua?t~ ~a- de qualquer modo ditadas no interesse de membros da família
nifesta aplicação do pnnClpIO de Igualdade m0:at e Jund~ca (art. 171, ~~ 2 e 3). Na normativa pode-se sem dúvida reconhecer
dos cônjuges (art. 29, ~ 2, Co~st.~. A nonna p:eve que o pnn- u~ favor para, a consti:uição d~ fundo patrimonial. Este favor
cípio pode sofrer somente os hmltes estabelecld~s pel~ leI (re: al~~ de. tudo e expressa0 do mars geral favor familiae na acepção
serva de lei: não certo por parte da autonomIa pnvada) a pnVllegIada que lhe foi atribuída pela normativa constitucional
rrarantia da unidade familiar. E esta não se garante certamente (art. 29 ss. Const.). Apesar destas particularidades a doutrina
~om a exclusão, lesiva da dignidade, do poder de iniciativa de Diversida-
é induzida a equiparar o negócio constitutivo do fundo patri- de da doa-
um dos cônjuges (naturalmente o mais frágilcontratuahnente). monial à doação e em particular à doação propter nuptias (art. ção
785 ~ód. Civ.), ;stendendo portanto a aplicação da proibição
Funçãopa- 169. Fundo patrimonial como patrimônio no interesse familiar. - O pre.Vls~ no paragrafo 1 do art.771 (doação de bens futuros)
trimonial fundo patrimonial (art. 167 ~s. CÓ? Civ.) se apr~senta c?mo ?
conlunitária ao lI~StItuto em exame. Essa qualificação contrasta a disciplina
regime patrimonial legal maIS estntamente relacIOnado a rea!l- contIda na reforma do direito de família e é fundada em du-
zação dos interesses familiares, tanto que assume uma funçao vidosas - e nem mesmo constantes - afinidades estruturais
patrimonial claramente_co~~nitária. EI~ se aprese,nr: como .um e na presença exterior do evento matrimonial. Ela rotularia de
patrimônio de destinaçao ngIdame~t~ vll1culado as .necessld~- form~ antiquad~ e discu~íveI uma realidade nova e complexa,
des da família", de maneira a constItUIr, entre os regimes patn- mortIficando o Impulso 1l10vador que não se identifica com a
moniais, o mais restritivo da liberdade de disposição dos côruu- vontade de confirmação da função sócio-jurídica realizada no
ges, especialmente se for excluída a p~ssibi.lidade de "alienar" , art. 785. Não há quem não advirta a insufiCiência de um silo-
em sentido amplo, os bens (art. 169 Cod. CIV.).
gismo que postule como premissa maior a identificação entre Inaplicabili-
A função do fundo é propriamente aquela de "fazer frente doação e doação propter nuptias, como premissa menor a iden- dadedo
às necessidades da família" (art. 167, ~ 1, Cód. Civ.); os frutos tificação - não somente a equiparação _ entre doação propter art. 771
dos bens que constituem o fundo "são empregados para as nuptiase negócio constitutivo de fundo patrimonial e, portanto,
necessidades da família" (art. 168, ~ 2, Cód. Civ.); a execução deduza a aplicabiligade da proibição contida no art. 771 ao
. :
dos bens do fundo e de seus frutos não pode acontecer para fund~ patrimoni~. E necessário verificar os limites de aplicação
as dívidas que o credor sabia terem sido contraídas "para es- ~be~ ?,e uIten~res normas que constituem a disciplina das
copos estranhos às necessidades da família" (art. 170 Cód. Civ.) . doaçoes , as quaIS, em vez de serem consideradas em forma
Interesse Que o fundo patrimonial seja ditado .não tanto no interesse
dosfilhos absoluta e generalizada como partes integrantes da normativa
dos cônjuges quanto e sobretudo no ll1teresse dos ~lhos (e ~o fundo patrimonial, devem ser examinadas de um ponto de
portanto da família) .é fá:il deduzir ~e ~od~ a no~a?va e em VlStada sua compatibilidade individual com o concreto negócio
particular da detenmnaçao da duraçao at~ 9ue o ul~~o filho c~~stitutivo .de fundo patrimonial, que pode dar origem, de
atinja a maioridade" (art. 171, ~ 2); da pn~vlsao que o JUIZpode vanas maneIras, a relações patrimoniais familiares.
atribuir aos filhos, em gozo ou em propnedade, uma cota dos Objeto:
Quanto ao objeto, é necessário precisar que ele não é o bem "bens:',
bens (art. 171, ~ 3, Cód. Civ.); da aplicação das disposições
entendido na sua materialidade, mas o bem jurídico, ou seja não "coi-
sas"
I
~
272 Capítulo nono 'Aspectos das relaçõesfamiliares, pessoais e patrimoniais 273
a situação jurídica que existe ou que espera ser constituída. da obrigação não depende de um juízo a posteriori sobre o
Situações reais de gozo- sobre bens imóveis ou móveis regis- resultado prático e efetivo conseguido.
trados também presentes - constituídas com termo inicial, Na hipótese de inadimplência, a responsabilidade alarga-se
enquanto situações existentes, ainda que não exigíveis, poderão ao outro cônjuge que não se obrigou pessoalmente, com fun-
certamente ser objeto de um negócio de destinação e portanto damento no comum dever de contribuição para a realização
constitutivo de fundo patrimonial. O problema conflui naquele das necessidades da família.
mais amplo da individuação da esfera de operatividade do Algumas obrigações são qualificáveis in re ipsa como contraí- Responsabi-
lidade fun-
instituto e em particular da possibilidade de que as situações das no interesse da família enquanto devidas em cumprimento
dada no de-
reais diversas da "propriedade" possam ser compreendidas na de deveres inderrogáveis e constitucionalmente relevantes. ver de con-
Tome-se como exemplo os deveres de instruir, educar e manter tribuição
fórmula "bens imóveis ou móveis inscritos em registros públi~
a prole e à assunção da obrigação de pagar os livros de escola
cos" do art. 167, ~ 1, Cód. Civ. Pelas considerações já expressas
para os filhos. Outras obrigações, ainda que abstratamente não-
não parece que se possa excluir esta hipótese, já que objeto de
qualificáveis como contraídas no interesse familiar, adquirem
disposição são os vários e complexos interesses jurídicos que
essa configuração quando são contraídas em atuação da direção
sobre bens ou em relação aos bens se dirigem. Com a consti-
familiar. Também em relação a elas a responsabilidade alargada
tuição do fundo patrimonial vincula-se a destinação de uma encontra fundamento no dever de contribuição. Se o funda-
l ou mais situações jurídicas existentes sobre coisas, não as coisas. mento da responsabilidade alargada reside no regime primãjlo,
,
é preciso delinear o amplo campo de aplicação, que não po'de
170. Obrigações no interesse da família. - Ao regime patrimo- ser limitado somente à comunhão legal, no âmbito da quatse
nial da família interessa também o aspecto dinâmico, ou seja, insere todavia o art. 186, letra c. -'j"
tido estrito: o contrato, como negócio patrimonial, não exaure essa conformação do ordenamento que impõe um tratamento
a área de relevância da liberdade dos particulares (mas é me- diversificado para atos e atividades que em modo diferenciado
lhor a esse ponto dizer: a liberdade da pessoa), Ao contrário, tocam'esse valor e regulamentam situações ora existenciais, ora
não somente ela se exprime também em matérias onde dire- patrimoniais, ora umas e outras jun~A necessidade da má-
tamente são envolvidas situações subjetivas existenciais, mas, xima aderência às particularidades de cada fattispecie (cfr. retro,
sobretudo, a abordagem do ordenamento não pode ser abstrata capo 5, S 67) modula a resposta que o sistema dos valores
quando a autonomia (o poder de colocar regras) investe pro- fundamentais do ordenamento oferece a cada uma delas.
Contrato e
fundamente o valor da pessoa.\.Q ordenamento não pode for- A doutrina da autonomia privada não corresponde à teoria autonomia
malisticamente igualar a manifestação da liberdade através da geral do contrato, ainda que as aquisições alcançadas nesta privada
qual se assinala, profundamente, ~ iden,ti~ade do indiví?uo matéria devam ser consideradas em toda a sua importância;
com a liberdade de tentar persegrur o maxlmo lucro POSSIVe]jJ superou-se o dogma do caráter sacro e inviolável do poder de
à intuitiva diferença entre a venda de mercadori<;lS- seja ou autonomia e colocaram-se em evidência os limites à extensão
não especulação profissional- e o consenti~e~to a u~ trans- desse poder (e o sentido dessa limitação). À regulamentação
plante corresponde uma diversidade de avallaç~es. n_omtemo manifestada pelo sujeito no negócio flanqueia-se a normativa
da hierarquia dos valores colocados pela ConStltUlçao.(6 pre- prevista pela" lei" (vale dizer, pelas normas: regras ou princí-
valência do valor da pessoa impõe a interpretação de cada ato pios, também constitucionais) ou, à falta, pelos "usos e pela
ou atividade dos particulares à luz desse princípio ~nd~ental..J eqüidade" (art. 1.374 Cód. Civ.); existe, portanto, um concurso
LOs atos de autonomia têm ~ortant~ fundame,nt.os dlverslficad~s de fontes (voluntária, legal, eqüitativa) na regulamentaçãopo
e não devem ser reconduZIdos umcamente a lIberdade econo- contrato: quando, além disso, a lei exclui o particular do poder
mica garantida pelo art. 41 Const. (desde que, con:o já recor- de incidir sobre a regulamentação, reservando-Ihe unicamente
dado, seja harmonizada com a utilidade social, a lIberdade, a a escolha entre concluir um ato (escolha por sua vez inexistente
nos casos de obrigação legal de contratar: art. 2.597 Cód. Civ.)
segurança e a dignidade humana: art. 41, S ~ qua~do a.n.e-
gociação diz respeito às situações subjetivas nao-patnmomaIs, e não concluí-lo, o ato de autonomia reduz-se a mero ato de
os atos de autonomia se relacionam diretamente ao art. 2 Consto iniciativa (cfr. retro, capo 2, S 11).
A fenomenologia nessa matéria é ampla e digna de ate.nta o autonomia privada não é um valor em si e, sobretudo, não Crítica da
autonomia
";;::
consideração: tomem-se, como exemplo, as escolhas relatlvas representa um princípio subtraído ao controle de sua corres-
como valor
à saúde (transplante, aborto, inseminação artificial), à vida pondência e funcionalização ao sistema das normas constitu- em si
familiar (acordo sobre a direção [indin~olf~rI1Íliar: art. 144 cionai~ Também o poder de autonomia, nas suas heterogêneas
CúU. Giv.; reconhecimento do filho natural, "assenso" do filho manifestações, é submetido aos juízos de licitude e de valor,
i.
;, menor com mais de dezesseis anos ao reconhecimento eU con- através dos quais se determina a compatibilidade entre ato e
sentimento" do outro cônjuge que já tenha efetuado o reco- atividade de um lado, e o ordenamento globalmente conside-
nhecimento: art. 250 Cód. Civ.; "consentimento" dos pais à rado, do outro. Antes de proceder mais além, é oportuno
guarda (affidamento) do menor e "consentimento" do menor reservar algum aceno crítico às argumentações que foram adu-
com mais de quatorze anos à adoção: arts. 4, SI, e 7, S 2, l. zidas como justificação da autonomia privada como dogma e
como valor. Uma primeira argumentação apóia-se na necessi- Não corres-
nº 184 de 1983) t, também, à participação nas formações sociais pondência
(atividade política, sindical ou cultural em sentido amplo). dade de preservar a igualdade formal. Sustenta-se que somente entre auto-
Variedade com a garantia da auto-regulamentação concedida a cada um,
de explica-
l.Não é possível, portanto, um discurso unitário sobre a auto- nomia e
mera igual-
abstratamente considerado, prescindindo das condições ou das
ção de um nomia privada: a unidade é axiológica, porque unitário é o dade for-
valor ulliú'Í- ordenamento centrado no valor da pessoa, mas é justamente circunstâncias individuais seria possível manter a igualdade de mal
rio
278 Capítulo décimo
Ato e atividade privada 279
tratamento. A opinião é desmentida pela atual.kgislação social lei. Além do .mai~ ass~ste-se a cada. dia - também e especial-
e intervencionista que recusa a igualdade formal e, com base mente na legIslaçao dIta especial - à contínua intervenção do
na desigualdade substancial de fato existente entre os sujeitos, Estado e de outr~ entidades na contratação privada: como,
tende - através de uma regulamentação que não é devida à
por exemplo, o fenomeno da contratação coletiva que se reflete
vontade das partes, mas, .sim, à intervenção do Estado ou de nos contratos individuais de trabalho.
um poder de qualquer modo estranho àquele dos sujeitos _
a privilegiar a parte mais frágil em relação à outra ~ais fort~
172. juízo ~e ~icit~de (liceità) e de valor (meritevolezza) do ato.
~e se deixasse a possibilidade de auto-regulamen.taçao aos su- Os chamados lzmztesa autonomia privada. - O ato de autonomia
jeitos interessados, provavelmente o resultado sena oposto, no privada não é um valor em si; pode sê-lo, e em certos limites,
sentido de que seria mais favorável ao contraente forte: o legis- se e enquanto responder a um interesse digno de proteção por
lador intervém para estabelecer uma desigualdade de tratamento part.e do ordenamento. Isso deve ser verificado, a cada vez,
a favor do contraente mais frágil com a intenção de colocar os certIficando-se depois, se possa ser, ainda que parcialmente,
sujeitos em um plano de igualdade substancial de direito (cfr. :e~lado .?o~ fonte que não seja a lei. Assim, por exemplo, a Redução
retro, capo 3, S 30l) Exemplos significativos têm-se nos setores Junsprude~cIa reduz, quando for excessiva, a penal estabeleci- da penal
onde a autonomia se reduz, como foi dito antes, à iniciativa .. ' da convencIOnalmente (art. 1.382 ss. Cód. Civ;). Por esta estrada
É oportuno recordar, outrossim, quanto foi previsto pela lei chega-se a apresentar uma pluralidade de regimes contratuais
nº 756 de 15 de setembro de 1964, que exclui a atipicidade concernentes cad.a. rela:ão, de acordo com o seu objeto, de
dos contratos agrários: a previsão de um rígido mecanismo de acordo com o sUjeIto tItular das situaçôes subjetivas e o am-
tipicidade dos contratos relativos a uma matéria determinada biente no qual se desenrolam.
tenciona proteger o contraente mais frágil, impedindo a con- Falou-se de profanação da autonomia privada devida à pre- Nulidade
clusão de contratos atípicos favoráveis ao mais forte, o único ~ença .de normas como o art. 1.339 Cód. Civ., que prevê a parcial,
com a força contratual (vale dizer, econômica) de impô-Ios. substitui.
mse~çao ~utomática de cláusulas nos contratos, o art. 1.419, S ção auto-
Crítica do Uma segunda argumentação extrai-se do pretenso (e já cri-
paralelis- ~, C~d. CIV.,pelo qual a nulidade 'parcial de uma cláusula não mütica, in-
mo das fon- ticado: retro, capo 6, S 96) dogma do paralelismo das fontes, mvalIda o contrato se ela puder ser substituída automatica- tegração
tes pelo qual o que nasceu por contrato, por livre vontade das
mente. Estas disposiçôes são expressôes da limitação da auto-
partes, só pode ser modificado ou extinto pela vontade igual- regulamentação mediante a inserção automática de uma regra
mente livre e comum das próprias partes. Notou-se, então, que externa em um contrato n~o corretamente autodisciplinado,
a estrutura de um negócio modificativo ou extintivo (recorda-se que resp~nde ao 1!lais aIliplo fenômeno da integração contra-
o exemplo da remissão: retro, capo 5, S 63) não depende da tu~l meci.~_~Iltenormas, usos e eqüidade segundo o _ªrt. ..L374
estrutura do ato que constituiu a situação a ser regulada ou Cod.-CiV. As fontes da relação CÕIitratual'üaõ-estão só no
extinta, mas da avaliação da ordem de interesses, de maneira 'Eóntrato, mas também na lei, nos usos, na eqüidade; e tal
que por vezes.uma só das partes tem o poder - se em concreto circunstância não autoriza a falar de profanação da auto-regu-
isso seja imposto pela função - de modificar ou extinguir. lamentação.
Além dessas consideraçôes, são numerosas as hipóteses de in- Constitui um limite positivo à autonomia privada a previsão Obrigação
tervenção de fontes diversas da vontade das partes na formação da execução específica da obrigação de contratar. O art. 2.932 de contra-
do regulamento contratual. Iluminante, a propósito, é o ditado Cód. Civ. coloca como pressuposto de sua aplicação não so- tar
do art. 1.339 Cód. Civ., o qual dispô e que algumas cláusulas mente o adimplemento, mas também a simples inadimplência
predispostas pelas partes, se disformes da previsão legal, sejam das partes ou de uma delas. Se esta, por exemplo, encontra-se
autonomaticamente substituídas por aquelas predispostas pela na impossibilidade, por justa causa, de concluir o negócio, a
Capítulo décimo Ato e atividade privada 281
280
outra pode pedir a execução específica, a fim de obter uma tiva na concatenação dos atos e se o ato e os instrumentos Merecimen-
to de tute-
sentença que" produza os efeitos" do negócio. Com o art. 2.932 usados para alcançar o resu~t~do perseguido são adequados. la em con-
chega-se ao resultado concreto perseguido pelo contrato, mes- Tome-se, como exemplo, a atiVidade complexa e articulada das creto
mo se a outra parte não pode ou não quer mais concluí-lo. empresas.
A disposição específica, realmente decisiva, é o art. 2.597 Nesta per~pec~va, deve ser conduzido o exame paralelo en-
Cód. Civ. (v. também o art. 1.679 Cód. Civ.). A norma foi tre ~utonomIa pnvada e autonomia coletiva. A auto-regulamen-
aplicada de maneira restrita, na convicção de que a obrigação ta~a?, que em uma visão individualista tinha sido atribuída ao
legal de contratar ocorra somente em presença de um monO- sluelto como tal, ao poder da vontade individual, refere-se ao
pólio legal. Operou-se, assim, uma interpretação formal ,da poder do grupo (não somente sindical, como freqüentemente
se crê) organizado como instrumento, como formação social
situação de predomínio, de maneira a desaplicar o princípio
para tornar possível a participação de todos na vida do país ~
em presença de um monopólio de fato: também nessa hipótese
favorecer o pleno desenvolvimento da pessoa.
o sujeito que exerce um determinado serviço pode ser obrigado
a contratar, ainda que contra a sua vontade. Na mesma pers-
173. Autonomia coletiva. '~"'Existe um vasto campo, típic~ 'inas
pectiva, coloca~se o art. 1.341 Cód. Civ. em tema de condições
I~ão exclusi~o do direito d~ trabalho, regulado por atos cole-
gerais de contrato.
tIVOSque nao concernem a relação de trabalho, mas dizem
As normas em questão são harmonizáveis com os princípios
resp~it~ ao "ambiente": a problemas de reformas, à atuaç'ão Contntto
constitucionais. No atual contexto, estas normas não são o
instrumento para atuar uma maior produtividade, favorecendo
coletivo de
d.e d.lreltos fundaI~entals .como o direito ao estudo. A imp'Çj-r-tntbalho .:~
.,.''t!i.
tanCla da autonomia coletIva - apesar da norma constituciOlfal ~ -."";
Despatrimo- Da perspectiva que se propõe, podem-se encontrar indica- e à sua variabilidade atuada no respeito ao princípio da eco-
nialização ções unívcicas de natureza não-excepcional e, portanto, susce-
nomia dos atos, é útil lembrar o enfraquecimento da inde-
tíveis de interpretação analógica, nas mais recentes interven-
pendência das esferas jurídicas, principalmente patrimoniais,
ções legislativas; estas podem representar válidos pontos de
devido à utilização sempre maior de poderes formativos legais
partida para operar uma despatrimonialização da teoria do
que tendem a reconhecer e a garantir a determinados sujeitos,
negócio e a sua definitiva emancipação da função de troca e
titulares de situações particularmente merecedoras de tutela,
meramente retributiva. Uma adequada valorização do conteú-
a faculdade unilateral de aquisição, de modificação e de extin-
do não-patrimonial do testamento, como referência objetiva
suficiente; uma reflexão mais madura sobre o fenômeno asso- ção de relações sem que o destinatário da vicissitude tenha a
ciativo, seja no momento constitutivo, seja naquele das vicissi- possibilidade jurídica de se opor. Um interesse prevalente está
tudes modificativas e extintivas da relação; uma mais meditada na base deste mecanismo. Também o interesse público isto é
reconsideração sobre o valor dos atos de natureza familiar, aquele preeminente em absoluto e no contexto relativo a~
excessivamente sacrificados por uma ainda imperante concep- regulamento predisposto, acaba por incidir sobre a negociação.
ção publicista da familia e da conseqüente tímida explícita E essa prevalência deve responder a um juízo de valor que tem
necração dos negócios familiares; e, outrossim, uma releitura o seu parâmetro na tábua constitucional dos interesses e dos
mais atenta da literatura e das inovações legislativas e jurispru- valores. A incidência do interesse sobre a determinação da
denciais sobre os mais disparatados contratos, daqueles ditos estrutura do negócio foi várias vezes lembrada (retro, capo 5, ~ Variabilida-
de tratamento (médico) e cirúrgicos àqueles estipulados pela 63). Assim, funções negociais como, por exemplo, aquela tran- de da estru-
tura
ou para a Administração Pública poderiam representar uma sativa do crédito, de regra realizada com o consentimento do
seiva vital para uma renovação dos estudos sobre o negócio em cedente e do cessionário, exigem, às vezes por lei, a aceitação
uma abordagem moderna e pós-dogmática sem a veleidade de do devedor cedido, quando este for a Administração Pública.
uma superação dos conceitos, mas sem, também, a responsa- A avaliação dos interesses e a sua graduação induzem ora a
bilidade de assumi-los como a-históricos e desprovidos de con- simplificar a estrutura negociaI típica (tome-se, como exemplo,
teúdos. Esgotada a fase caracterizada pela reflexão sobre a o caso da remissão unilateral defronte da estrutura bilateral
disciplina do contrato em geral e sobre sua capacidade expan- prevista no art 1.236 Cód. Civ.), ora a torná-Ia mais complexa
siva (art. 1.324 Cód. Civ.) para a elaboração de uma teoria do (cessão do crédito com estrutura trilateral em relação à fatti-
negócio, figura-se a oportunidade de uma análise das discipli- specie bilateral do art. 1.260 Cód. Civ.) ..
nas específicas dos atos de iniciativa, com a intenção de propor
uma articulação mais flexível e idônea para realizar conteúdos 179. Incidência direta e indireta do interesse público sobre a causa Incidência
e valores diversos, destinada a reajustar aquelas tentativas vol- do negócio. Alguns exemplos. - Mais linear é a individuação da sobre a [un-
tadas a elaborar figuras como as declarações a qualquer anô- incidência do interesse público sobre a causa do negócio. O ção
nimo (dichiarazione alia generalità), ou as declarações não-nego- interesse pode faz3J!arte diretamente da função do contrato:
ciais com peculiaridades que bem poderiam conciliar-se com isso a~ quand-o '" ~""'e6cio con.te.L'.hO. ~-'-o,-_.-uuuçn-
uma concepção negociaI não-dogmática e rígida: uma variabi- _.....-- ---a:,'ííã previsão legal o interesse público dentro da função, seja
lidade destinada a modificar e a adequar o papel dos mesmg~_ . .- quando o esquema negociaI típico é adaptado e vinculado
requisitos clássicos do contrato, elevados, n().l"II!almC11u:,-ã
re- inderrogavelmente a um interesse específico (interesse não
quisitos do negócio. - presente na função do negócio típico originário). Fala-se de
incidência indireta quando o interesse incida diretamente so- Incidência
178. Interesse público e estrutura do negócio. - Com referência bre um outro requisito do negócio, como por exemplo, o sobre o oh-
à estrutura do negócio, se unilateral, bilateral ou plurilateral, objeto, e somente indiretamente sobre a função, sobre a causa. Jeto
Ato e atividade privada 289
288 Capítulo décimo
Flanqll"'.~_-: ..,es.ta,última modalidade de incidência as hipó- prestação pedida e respectivamente devida for, não somente
teses nas quaIs o mte~t"~r-~rede_ª negociação - tome-se, compatível com os 'ordinários meios empresariais' [...], mas
como exemplo, a obngaçao de contratar--~"''':''cand9 con- ""-t.aIl!.l:>ém
desvinculada de qualquer avaliação, caso por caso, da
seqüências a diversos níveis na predisposição da disciplmaé, peSSOã"Ub~Teqll!êE~nte" , isto é, quando a "prestação for efetuável
em geral, nas vicissitudesmodificativas e extintivas da relação. em relaçao a quiilqucr-pessQq, sem que tenham relevância os
Exemplos de predisposição originária do interesse público requisitos subjetivos do beneficiái:io da prestação" . A tendência
no interno da função do contrato podem-se verificar na locação a ampliar a obrigação legal de contratar responde, portanto,
para uso residencial, na constituição de sociedade cooperativa, à exigência de "subtrair à álea do jogo da procura e da oferta
portanto com escopo mutualístico (art. 2.511 Cód. Civ.), no aqueles bens e serviços que, em número sempre crescente, são
contrato de transporte público de pessoas (art. 1.676 ss. Cód. destinados a satisfazer exigências essenciais do indivíduo" . As-
Civ.). Hipóteses de incidência direta através da introdução do sim, deduziu-se diretamente dos princípios constitucionais con-
interesse em um esquema negocial- cuja disciplina legal não tidos nos arts. 3 e 41 hipóteses singulares de" obrigações legais
o previa no interno da função - podem-se extrair do vasto de contratar" no casos eIll que "a recusa se demonstre, nas
setor das leis de incentivo às pessoas e às empresas. Tome-se, circunstâncias de cada caso, lesiva à dignidade humana e à
como exemplo, o mútuo para a habitação ou para o início da efetiva igualdade e liberdade".
atividade de trabalho. A função do mútuo prevista pelo art. A incidência mais imediata do interesse público sobre a Licitude e .;.~..'"
1.813 Cód. Civ. não se refere a nenhuma destinação especial negociação se realiza mediante o controle de licitude e de vªJor merecimel~:" . _'
to de tutela ' .~.
!.i_~~;i
da soma transferida, limitando-se a prever a obrigação de res- do negócio e, em particular, com a verificação da não contra- ~,.
tituição. Fala-se, ao contrário, de mútuo de escopo nos casos riedade a normas imperativas, à ordem pública e ao bomços-
em que uma normativa especial discipline particulares fattispecie tume. Controles de licitude e de valor distintos, mas não se,pa-
de mútuo em consideração do escopo para o qual a soma é ráveis,interessam tanto a causa e o objeto, quanto as condições
atribuída: a soma - e as relativas facilitações - justificam-se e os requisitos de eficácia negociaI em geral.
em consideração à avaliação positiva que o escopo recebe da Ulterior manifestação de incidência do interesse público - Impossibili- ''-.1-
dadejurídi-, "-,,
lei. Aqui o escopo legal representa, não um acessório acidental, à qual se reserva apenas um aceno - é o emprego da categoria ca -~':::-.'r\;'~
~.,
mas uma parte integrante da função negociaI, a tal ponto que da impossibilidade jurídica do objeto (e não a sua ilicitude) ~.~""~
caracteriza também a sua execução. como fundamento da nulidade prevista, pela vigente legislação,
Interesse para alguns entre os negócios que têm por objeto edificios'ou
O interesse público do usuário é cronologicamente prece-
público e
atividade dente à negociação e representa a sua justificação. Ele pode parte deles, desprovidos da concessão para construir (art. 17 l.
de empresa se referir a qualquer tipo de função contratual sem mudar, n2 47 de 1985).
nem mesmo minimamente, as suas características. Sempre que A impossibilidade jurídica não constitui uma simples dupli-
existir uma atividade de empresa coadunada e regulada pelo cação do conceito de ilicitude: é suficiente pensar que em um
ordenamento em função da satisfação do interesse do usuário caso, e não no outro, é permitido utilizar a disciplina predis-
pelo gozo dos resultados daquela atividade, pode-se aplicar a posta pelo art. 1.347 Cód. Civ. (possibilidade sobrevinda do
regra do art. 1.679 Cód. Civ., independentemente daquela objeto).
atividade qualificar-se,ou não, como serviçopúblico em sentido
técnico. Isso expliça o uso do instituto da obrigação legal de 180. Pretensa natureza excepcional das prescrições sobre as formas
contratar que a doutrina propõe também com referência a legais. - Uma área do Direito Civil à qual por longo tempo
serviços e atividades que até então ficaram isentas. GomO,por ficou estranha qualquer consideração funcional e axiológica é
exemplo. o setorbancai:iõ"e-aque"!asoperações nas quais "a representada pela disciplina da forma legal e voluntária do
290 CapítuÚJ décimo
~I .r Ato e atividade privada 291
negócio. É necessário, portanto, submeter esse enfoque a uma ,:~' ~ ~: exemplo, a alternativa entre nulidade e anulabiliJ:b..r.l--~"""""".
análise, para evitar que se crie uma não-justificada zona franca;",i' .~ tamento por vício de forma no_s~---õ'-a;rõS âo art. 606
d_esobr.evivên~i~_de.concepções da autonomia privada que não
sao maIS conclhavels com o atual ordenam. e~to..
~~l'
-: .: .. -
Cód. Civ.); mas.._sohr~-p-oslçao
-'l_é l11apu.ffiãlluma
deve ser rechaçada por-
concepção mecânica da norma inderro-
Excepciona-
lidade: críú-
S o b re a natureza excepCIOnal,.
. al a~_J?F~'
d es d as f<ormas • .- . gável, como norma à qual seja inerente a nulidade. De fato,
ca legais, a doutrina, apes~das ..~ncias pela concepção es-
trUtural ou P-OT aqueiã funcional da forma,'é praticamente
unânime. Essa concepção, de regra, é entendida no mais das
lt
....
~
); mais que - como seria obrigatório - interrogar-se sobre a
finalidade e sobre o fundamento da norma no sistema dos
valores, prefere-se partir da previsão da nulidade para identi-
vezes como derrog~ção ao p~ncípio d~ liberdade. ~as f~rmas
que, por sua vez, e expressa.o do maIs amplo pnnclplO da .
l'~~\
,?,
ficar a inderrogabilidade;
a inderrogabilidade
ao contrário, do mesmo modo como
representa não o dado inicial, mas o re- Resultado,
autonomia privada. Assim, voz abalizada releva que "a discipli- 1.' sultado da interpretação, assim a detenninação da sanção (nu- não premis-
na da fc:rma ad substanti~m ~o?stitui .uma derrogação penetran- i~ lidade - e diversa graduação das suas conseqüências -, anu-
sa, dojuízo
te - nao somente ao pnnClplO de lIberdade da forma, que no !. labilidade ou ineficácia) é o resultado de uma atenta conside-
ordenamento é certamente presente, mas - à própria auto- k: . ração dos valores e interesses envolvidos: a função da nonlla
nomia, já que a fonna não somente condiciona o surgimento I~~: não se extrai da "sanção" nulidade, mas é a nulidade que deve
do ato, mas impede, também, que as partes possam executá-lo, i:~':
.. ser justificada com base na função (pré-individuada) da norma.
confirmá-lo ou controlá-lo. O sistema por isso deveria ser en- ,. A segunda das asserções a ser avaliada criticamente, à qual Não-indife-
rença cons-
tendido como verdadeiramente excepcional, de modo que não se acenava antes, é a afinnada indiferença das prescrições de titucional
se deveria abandonar à tendência de estendê-lo além dos casos
! 0.
dizer que ele tenha tido êxito. Antes de tu,!o, o vício de abor- a garantia da forma escrita para a despedida individual (reco-
dagem está na superavaliação da matriz ~iberalista.da Co~sti- nhecida também pela Corte Constitucional) e, em geral, a
tuição e, ainda mais, em concentrar - amda que InconSCIen- normativa _especial, na qual a função da prescrição de forma
temente - a atenção somente nas relações econômicas e nos - absolutamente não-excepcional- justifica-se em razão da
seus princípios, dispersando a matriz personalista e solidarista finalidade de proteção de uma ou de ambas as partes do ne-
que representa o proprium do ordenamento vigente. A autono- gócio, particularmente quando os interesses sejam não-patri-
mia negociaI não tem um fundamento único e além do mais moniais.
identificado com a iniciativa econômica privada, mas afunda O programa constitucional, portanto, não é aquele" de uma
as suas raízes em princípios diversos também de relevância absoluta liberdade das formas negociais" . Estas recebem uma
constitucional, segundo o alcance e o conteúdo do ato (per- diversa, variegada avaliação segundo os interesses sobre os quais
sonalíssimo, de natureza familiar, patrimonial, etc.). se fundam sejam mais ou menos constitucionalmente relevan-
Funcionali-
Em segundo lugar, configura-se a autonomia negociaI como tes, mas sem generalizações. Não há espaço nem para quem
zação um valor em si, e tudo o que é destinado a especificá-lo como manifesta simpatias para com obsoletas formas legais - des-
um limite externo, além de tudo excepcional. As modalidades gastadas porque previstas para tutelar interesses não mais emer-
que concorrem a individuar o conteúdo do ato de iniciativa gentes e prevalentes - nem para quem quisesse improvisada-
representam, ao contrário, limites internos da mesma autono- men te esposar a cruzada an tiformalista, considerando qualquer
mia, que é positivamente avaliávelsomente enquanto for exer- forma como" obsoleto rigorismo". Em vez de acrescenta! la-
cida em conformidade com as modalidades predispostas pela mentos a "lamentos contra as formas" é necessário, portanto,
lei e, de qualquer modo, se responderem a um juízo de valor
do ordenamento. Os chamados limites não são necessariamen-
propor um seu "estudo racional" e crítico. 1
Ausência
te explícitos, unívocos e taxativos e bem podem ser deduzidos 181. Do princípio de liberdade das formas. - É oportuno con- de uma
pelas circunstâncias as mais disparatadas, como a natureza do siderar, agora, uma posição que negou a excepcionalidade das norma ge-
ral sobre a _...
bem, a peculiaridade dos sujeitos, etc. . _ . normas sobre as formas, mas com base em opções de método forma
Papel pro- Em terceiro lugar é unilateral a apresentaçao da forma vm- diversas daquelas delineadas no texto. A opinião tradicional
mocional e
de garantia culada por lei como um liame da autonomia, quand?, n~ ver- não seria aceitável, já que ---:'sustenta-se - a única norma: em
."--,-.f':;.~
dade, a função da prescrição sobre a forma pode ser msplrada matéria é o art. 1.325, n2 4, Cód. Civ., o qual prescreve a nuli- - ...
;:
em razões de garantia e de promoção de interesses e de valores dade por violação de uma forma ad substantiam; não subsistiria,
mesmo se diversos da genérica e formal liberdade. A mesma ao revés, nenhuma norma da qual extrair a liberdade de forma.
iniciativa econômica não pode ser exercida "de maneira a Dado que não é possível individuar uma norma que exprima
provocar dano à segurança, à liberdade, à dignidade humana" a geral liberdade da forma, não se poderia gualificar o art.
(art. 41, S 2, Const.). 1.325, n2 4 como excepcional, porque faltaria o termo de con-
Isso permite afirmar a unilateralidade das opiniões que em frontação (é importante notar desde já que para essa teoria,
cada prescrição de forma vêem um obstáculo à proteção d~s "norma" é somente a regra e não também o princípio: para a
sujeitos frágeis. Da constatação que" as forças produtoras maIS contrária opinião no sentido que também os princípios são
hábeis preferem" - não certo no exclusivo interesse dos con- normas cfr. retro, capo 2, S 9).
Relação en-
sumidores ou dos cidadãos - "que sejam reduzidas ao mínimo Pressupondo que a relação regra-exceção seria uma" relação tre duas
as regras formais" , extrai-se a constatação de que as prescrições entre duas normas", e que "nenhuma norma é, em si e per si, normas
de forma, que devem ser avaliadas caso por caso, são idôneas regra ou exceção", não seria possível - no direito positivo
para exercer uma função de garantia: tome-se, como eJi:emplo, italiano - individuar, em matéria de forma, a norma regular
294 Capítulo décimo Ato e atividade privada 295
e a norma excepcional: a norma sobre a forma seria "úniCa e lógic.o l?gico-cognoscitivo -, nem muito menos com uma regra
exclusiva" (art. 1.325, n2 4, Cód. Civ.). A norma contida no e~px:mIV,elna contraposição positivo-negativo, presença-ausên-
art. 1.325, nº 4 seria, como qualquer outra, "suscetível de apli- CIa, Isto e, em um dado exclusivamente estrutural e descritivo.
cação analógica e capaz de exprimir princípios gerais do or- Excepcional é aq~ela norma que assim se apresenta no con-
denamento jurídico do Estado" . Princípios gerais a serem sem- texto das regras gerazs e das outras leis isto é do inteiro ordena-
pre extraídos "das nonnas sobre a fonna" e não em relação ~e.nto historica~~nte condicionad;. Não, 'simplesmente, uma
"a uma nebulosa e ilimitada liberdade das partes" . ngxda contraposlçao entre uma fattispecie normativa e uma ou-
Crítica O sugestivo enfoque em exame tem, mais do que qualquer tra, mas em confronto entre a singular previsão e o ordena-
mento.
outro, o mérito de ter dado uma sacudida na conhecida indis-
criminada natureza excepcional das nonnas que estabelecem
fonnas legais negociais. Se é verdade que a análise de tais 182. Variabilidade da forma e da estrutura do negócio. - A na-
tureza regular ou excepcional da disciplina desta ou daquela Disciplina
normas não deve ser conduzida em exclusiva confrontação, ou dos concre-
até mesmo contraposição, com a liberdade da fonna como forma legal do negócio não deve ser proposta tanto em relação tos negó-
a.o art. 1.325, nº 4, de per si" fragmento de fattispecie' , e exclu- cios
expressão de autonomia, é também verdade que a confronta-
SIvamente ao princípio da liberdade da forma (ou seja ao prin-
ção em objeto não se pode exaurir entre a previsão contida
cípio da autonomia privada), quanto eni. relação a cada previsão
no art. 1.325, nº 4 e os 'princípios gerais' elaborados em relação
formal,
•
juntamente à disciplina dos concretos neaócios
b ,
indi-
aos" critérios extraíveis sobre as normas sobre a forma" sem
VIduando de um lado as "exigências" ou interesses que justifi-
recorrer aos "altos cUlnes do ordenamento".
cam a sua previsão e verificando, do outro, se é merecedora
Os princí- O dissenso diz respeito ao método e às técnicas jurídicas. É
pios são
d~ tutela, se é adequada, compatível e coerente com hipóteses
incontestável que as nonnas não são somente aquelas de tipo dIVersas, segundo que, nestas como naquelas, tenham relevân-
normas
casuístico ou regulamentar, caracterizadas por uma bem defi- cia os. valores,. principalmente aqueles fundamentais, que ca-
nida fallispecie abstrata nas quais pretender subsumir a fallispecie ractenzam o SIstema. .
concreta: nonnas são também princípios. Os comportamentos Pluralida-
Esta análise pressupõe a individuação de cada "razão sufi- de de ra-
não expressamente regulados não' são por isso juridieamente ciente" da prescrição de forma. Diversificação e variabilidade zões justifi-
irrelevantes, na medida em que a própria liberdade para o das formas afundam a sua justificação em perfis diversos da cadoras da
direito não é neutra e indiferente; toda figura de obrigação ou a?vidade: .a! das p.róprias legitimação, capacidade e qualifica- forma
de dever coloca-se, em uma relação jurídica, sempre relativa- çao do sUjeIto (seja ou não empresário, menor ou interdito,
mente a outra situação subjetiva; as normas sobre a forma não pessoa física ou pessoa jurídica, ente privado ou público); b)
representam um corpo distinto ou separado do ordenamento da função negociaI (causa donandi, mortis causa); c) do objeto
do qual são partes integrantes. De maneira que considerada a (bens imóveis ou móveis, créditos ou coisas móveis diversas dos
unidade do ato, da sua forma e do seu conteúdo (ou seja dos crédi tos, coisas materiais ou energias de trabalho).
seus requisitos ou elementos), a disciplina da 'fonna' só pode ser A forma pode ser relacionada a um ou mais perfis, cumula- Função da
conhecida e aplicada no contexto da disciplina do 'conteúdo' do tivamente ou alternativamente, segundo a ratio da norma que forma
ato singular e do ordenamento globalmente considerado. a estabelece. Individuar esse fundamento é indispensável para
Excepcio- Se a norma excepcional se define na relação com as "regras proceder a uma interpretação que não seja separada de sua
nalidade
em relação
gerais" e "com as outras leis" (art. 14 dispo prel. Cód. Civ.) isso valoração. Isso, inelutavelmente, significa que toda forma ne-
ao ordena- significa que essa qualificação não se pode exaurir na exclusiva gociaI tem ~ecessariamente uma função, ainda que heterogê-
mento confrontação com um só princípio ou regra - esta quando ~1ea.Nem se pode alegar em contrário que o art. 1.325, nº 4,
muito pode representar uma primeira fase no critério metodo- mdica a forma dos atos substanciais" como simples elemento
'. -
296 Capítulo décimo Ato e atividade privada 297
de estrutura". A estrutura como" totalidade recolhida ~m si" . A liberdade da forma, ela também, expressão da ,liberdade Formas vo-
luntárias
não seria legitimada pelos fins externos. Todo" como" do di- de iniciativa, reside não tanto na norma que dita a forma legal
g reito tem sempre um "porquê" juridicamente relevante: o art. e a nulidade do ato na hipótese de sua ausência (art. 1.325,
1.325, nº 4, é somente uma fragmentação de normas que se nº 4,- Cód. Civ.), quanto naquela que concede à parte ou às
integra a cada vez com a disciplina de cada ato. O porquê (a
1I, função) extrai-se não da previsão da "sanção" nulidade, mas
partes a escolha da forma (art. 1.352 Cód. Civ.), regulando esta
última seja nas fattispecie negociais com pluralidade de formas
do necessário fundamento da previsão normativa. (escolhendo - quando for permitido - uma entre as formas
11 possíveis ou excluindo uma delas), seja naquelas com forma
183. Unidade de forma e conteúdo. Necessidade de um juízo de indefinida. A liberdade da forma assume um caráter não so-
11 Forma e valor (meritevolezza) sobre as/armas. - A recusa de análises mente negativo, mas de interesse positivo a ser concretizado
11
ij conteúdo somente estruturais da forma, ligadas a uma inadmissível neu- em negócios ou cláusulas negociais que tendem a regulamentar
I,
tralidade relativamente à Constituição, e a necessidade de uma a forma. Esta torna-se função negocial, submetida, -portanto,
il atenta avaliação da função de cada prescrição formal (com a ao controle de valor. O acordo sobre a forma não é, por con-
conseqüente recusa seja de uma apriorística excepcionalidade, seguinte, um pacto nu e, como tal, arbitrário e neutro.
seja de uma também apriorística regularidade: a natureza ex- Para interpretar o pacto sobre a forma ou a norma sobre a Interpreta-
cepcional ou regular acerta-se son::e~te. c~o por caso, em, r~- forma é necessário individuar a história e a função. A forma é ção da dis-
lação à normativa sobre a forma e a dIsCIplIna de cada negocIO inseparável do conteúdo e o próprio negócio não pode~ ser ciplina so-
em confronto com o ordenamento globalmente considerado) bre a forma'~':,
relegável ao plano da estrutura, da fattispecie e de seus requi!itos
conduzem a concluir pela necessária unidade de forma e con- mecanicamente descritos, mas deve ser considerado como or-
teúdo. Se o acordo (e também a declaração unilateral) é uni- denamento do caso concreto, um valor a ser integrado e lser d~
dade de forma e conteúdo, não se pode subtrair também a coadunado com o sistema do ordenamento, como uma pàrte
,~'<.tJ.':.-:-~
acordo e se a forma é perfil essencial do acordo e, portanto, renascimento do formalismo presente na legislação espe'i:ial
do conteúdo, a forma não pode faltar ou ficar insensível aos mais recente, que privilegia as vicissitudes da relação exaSpe-
aspectos funcionais da ordem negociaI. O problema da forma rando o regime dos atos unilaterais, solenizando-os (tome-se,
não se esgota na nulidade do ato (retro, ~ 180), nem na forma como exemplo, o recesso do inquilino: art. 4, lei nº 392 de 27
legal. Ao lado das fattispecie negociais com forma legal rígida de julho de 1978 ou a denúncia nell' affitto a coltivatore direito):
ou exclusiva ou daquelas relativamente variáveis (como, por (art. 4, ~ 2, 1. nº 203 de 3 de maio de 1982). A garantia da
ou.ornplo. o testamentó: are 'ôOTSS:Gúd-.Civ.),col2sam-se..fat- parte e a certeza da vicissitude - que representam o interesse
tispecie com forma absolutamente hvre, com forma voluntaria- _prevalente - são conseguidas "mediante as técnicas do forma-
mente rígida, com forma relativamente variável. Para estas duas lismo". A utilização da forma legal responde a uma política do
últimas apresenta-se a relevância jurídica do acordo ou da direito que, tantd nas vicissitudes constitutivas quanto naquelas
declaração sobre a forma voluntária (art. 1.352 Cód. Civ.), modificativas, regulamentares ou extintivas da relação, tende
como expressões de autonomia regulamentar dos sujeitos e, a garantir, tutelar e promover interesses mais merecedores de
assim, submetidas ao controle de valor (art. 1.322 Cód. Civ.). tutela; principalmente se respondem às eXigências de sujeitos
'''I
que no âmbito do sistema têm um estatuto de favor eem pessoa, não como vontade de realizar-se libertariamente, mas
relação aos quais justifica-se ainda mais a atenção do legislador como valor a ser preservado também no respeito de si mesma.
ordinário. Desse modo, não é suficiente constatar a existência Isso incide sobre os atos de disposição a serem realizados Licitude e
ou a inexistência da forma, mas é necessário, também, pergun- (art. 5 Cód. Civ.) ou sobre as autorizações a serem concedidas rnerecirncn-
tar-se a que serve. - .• d . fi' to de tute-
em re Iaçao seja a mu ança PSICOlSlca da pessoa, seja ao tema la do con-
Direito à
da retirada dos órgãos e dos transplantes. O simples consenti- sentimento
184. Atos de disposição do frrófrrio corpo. - Muito importante mento de quem tem o direito não é suficiente para tornar lícito
saúde
é a individuação da licitude e merecimento de tutela em ma-
o que para o ordenamento é objetivamente ilícito, nem pode
téria de atos relativos à saúde. Alguns àspectos do problema já
- sem um retorno ao dogma da vontade como valor - repre-
foram examinados em tema de consentimento ao tratamento
sentar um ato de autonomia de per si merecedor de tutela (art.
médico, incluindo o tratamento psiquiátrico (retro, capo 7, ~
1.322, ~ 2, Cód. Civ.). Autonomia não é arbítrio: o ato de auto-
105), enquadrados no âmbito da avaliação constitucional do
chamado direito à saúde (retro, capo 7, ~ 103). Aqui, é suficiente nomia em um ordenamento social não se pode eximir de rea-
recordar que não devem ser acolhidas nem a leitura do art. 32 lizar um valor positivo. A licitude da retirada de órgãos de seres
Consto como norma que exprimiria prevalentemente o dever vivos, para escopo de transplante ou experiência, deve ser con-
de cada um de preservar a própria saúde no interesse exclusivo siderada de forma mais ou menos ampla, segundo se reconheça
da coletividade (e, portanto, legitimaria um poder público de no ordenamento uma maior ou menor presença das concep-
intervenção além das previsões do mesmo art. 32, ~ 2, e do art. ções utilitaristas, individualistas ou coletivistas da vida.
Disposição
23 Const.), nem a oposta concepção que acentua exclusiva- Seja o gesto de generosidade de autorização para a retirada de um va-
mente o momento individual e estende a previsão sobre <i do sangue, seja a colaboração pedida para o tratamento sani- lor exis-
inviolabilidade pessoal (art. 13 Const.), transfigurando-a no tário obrigatório, realizados com respeito à dignidade, teste- tencial
direito à ilimitada e ilimitável disponibilidade do próprio corpo
j
-_ munham a superação quer da instância meramente voluntaris-
e da própria psique, até postular um indiscriminado direito à --------.ta~.ro:~!::~ncepções do direito da personalidade visto como
própria extinção em analogia a concepções" proExietárias" do I d_ir~itoso?re 0~~<'H;~~~~ _de!;og~eúdo proprie-
tano. A dlsposlçao de um valor eXlstenclàl-rra:o-p~~_
direito subjetivo. Esta contraposição mostra a ambigüidade, de
Direito cada no mesmo plano do ato de disposição de uma situação
subj. e dis-
um lado, de leituras não-sistemáticas da Constituição e revela,
ponibilida- do outro, como é forte a tentação de reconhecer como co-na- patrimonial. As difé'renças são substanciais. 1) O consentimento
de tural ao direito subjetivo - neste caso o ••direito" de dispor não pode ser presumido, mas deve ser efetivo e pessoal, espon-
a
- um ilimi~do poder, que inclua também licitude da própria tâneo e consciente. 2) Co-natural às situações existenciais, con- Consenti-
rnento e
dissolução. E ainda a antiga concepção do direito subjetivo por seqüentemente irrenunciáveis, é o ius poenitendi como expressão adimple-
excelência, a propriedade, a operar a sugestão da licitude da de uma revogabilidade sem limites. Especial é a relação entre mento
destruição da coisa própria como extrema manifestação da consentimento e adimplemento, quando este último, mais que
liberdade do proprietário; trata-se de concepções que pode- ! normal ato executivo, ~~ume_o_papel de elemento de aperfei-
riam sobreviver somente se se rechaçasse a necessidade de uma L ---y~tlare1ãçáõ negociaI. Sobre 1l1l<'tLUreza - e;-portanto,
profunda reflexão sobre o sentido do sistema constiJ1,lcionm.-;- I sobre a validade - do ato de disposição incide, além do objeto
sobre o seu papel na hierarquia das fontes-enaTnterpretação, - mais propriamente a situação subjetiva que constitui a razão
na combinação de liberdade e responsabilidade. As situações legitimadora do ato -, a função gratuita ou de lucro que este
existenciais exprimem-se não somente em termos de direitos, entende perseguir (por exemplo, venda ou doação de um rim);
mas, também, de deveres: no centro do ordenamento está a cai por terra qualquer justificação de uma construção geral,
l?t: ...
em sede negociai, da figura do poder de disposição e da con- particularmente para o fim de estabelecer.as garantias do pro-
seqüente atividade dispositiva. . cedimento disciplinar, e, especialmente, a adoção da preventiva
contestação da imputação, e também com o objetivo de evi-
Ausência
185. Da exclusão de um associado de uma associação não-reconhe- denciar a inviolabilidade, por parte da mesma autonomia as-
de cen trali.
dade do cida. - A liberdade de associação (art. 18 Const.) constitui sociativa, das garantias de tutela do indivíduo em relação às
art. 18 uma especificação da cláusula geral de tutela da pessoa (art. 2 associações, com derrogação da cláusula dita de exoneração
Const.
Const.) e da necessária garantia do "livre desenvolvimento" de da justiça estatal (também para estas formações socIais, assim
sua personalidade (art. 3, S 2). Todavia, o art. 18 não tem um como para a família, é necessário resistir à tentação de propor
papel central e autônomo relativamente ao art. 2, que continua doutrinas de "imunidade": retro, capo 9, S 157). O direito de
o ponto de referência normativo para todo o fenômeno asso- se associar prescinde de autorizações; ele, todavia, além de
ciativo. conhecer o limite de escopos não proibidos pela lei penal (art.
Tutela dos Esta premissa é necessária para avaliar a respOsta do orde- 18, SI, Const.), deve ser atuado em respeito à dignidade e aos
associados namento diante dos contrastes entre as manifestações de au- direitos invioláveis das pessoas associadas. A associação é me-
nas asso- recedora de tutela enquantO for idônea para consentir a for-
ciações
tonomia associativa e a tutela dos associados: tomem-se, como
exemplo, os estatutos de associações que prevêem uma disci- mação e o desenvolvimento dos seus associados que, quando
plina da relação associativa lesiva à dignidade dos inscritos, as alcançam o escopo associativo, realizam a si mesmos. Também Liberdade [:c-
uma área subtraída ao primado da pessoa. Nesta perspectiva, denamento intemo. O art. 36 Cód. Civ. (pelo qual" o ordena- in terno -i. '~;
mento interno e a administração das associações não recónhe- _"£O:~
a função da autonomia associativa esta inteiramente compreen-
cidas são reguladas pelos acordos dos associados") não pode ser ~~. ~::
dida na função atribuída às formações sociais pelo art. 2 Consto
!~-'-"
Controle
A formação social se apresenta como um lugar-comunidade lido como arbitrária expressão do princípio voluntarista. Se é
sobre as
tendencialmente aberto à pessoa, e as suas vicissitudes internas verdade que o escopo da associação deve ter importância na
cláusulas e
sobre os devem caracterizar-se pelo respeito aos direitos dos indivíduos, sua organização interna, é também verdade que não se justifica
procedi-
da sua dignidade, sem ostracismos injustificados e qualquer a possibilidade incontestável de exclusão do sócio alegarldo o -'~
mentos
tipo de prevaricação. Nesta ótica, deveriam ser lidas as cláusulas temor de que o controle da Autoridade judiciária possa tom- ~...3
~.~~~
estatutárias, muitas das quais poderiam não superar esta prova prometer a autonomia associativa. A atenção concentra-seine-
de resistência, por manifesta diversidade com os princípios de vitavelmente sobre a vida interna do grupo, sobre as modali- '~.~".
ordem pública constitucional. O prejuízo para o sócio pode dades de seu exercício. O controle torna-se ajustificação mesma
tanto derivar da cláusula estatutária - que mesmo se pactuada da liberdade associativa, a garantia que o escopo prefixado
ou de qualquer modo conhecida poderia ser não merecedora possa de fato ser alcançado sem arbitrárias dicriminações, com
de tutela e, portanto, nula -, quanto da ilegitimidade das igualdade de tratamento e com respeito aos princípios de or-
modalidades deliberativas de exclusão do órgão associativo. A dem constitucional. Seja as cláusulas que regulam o acesso, seja
ingerência no campo dessas formações, "com o objetivo de aquelas que regulam a exclusão, mais do que fundar-se no
tutelar o indivíduo na própria associação e não contra ela", "incontestável juízo" do conselho diretor ou da assembléia,
Democra-
cia, dir. de realiza-se invocando seja o princípio de democracia, que tam- devem estas encontrar uma apreciável justificação e 'motivação
defesa, san- bém tem relevância constitucional (arts. 1, 2, 29, S 2, 49 e 52, no correto funcionamento da associação. A incompatibilidade
ções disci-
S 3), seja o direito de defesa (arts. 24 e 111 Const.). Isso não pode ser fundada no arbítrio, nem deduzida dos interesses
plinares
302 Capítulo décimo Ato e atividade privada 303
da maioria, mas deve ser avaliada caso por caso no interesse os princípios de ordem constitucional. O acordo sobre a dire-
das pessoas associadas, ou que querem associar-se, em relação ção familiar torna-se típica expressão, ponto de confluência
ao escopo associativo e ao papel que ele exerce para a realização entre exigências existenciais e patrimoniais.
da personalidade dos indivíduos. Resta a ser especificada a natureza da direção familiar. A Nalllrcza
Interven-
ção da au- A luz dessas considerações perde importância o debate sobre tese prevalente exclui que o acordo em objeto tenha natureza negociaI
toridade ju- a aplicabilidade direta ou analógica, nos casos de exclusão do negociai, não se tratando de pacto destinado a constituir, mo-
diciária associado da associação não reconhecida, do art. 24, ~ 3, Cód. dificar ou extinguir um ou mais direitos patrimoniais dos côn-
Civ. (o qual, ditado para as associações reconhecidas, permite juges,já que as situações familiares nascem diretamente da lei.
a exclusão do associado somente se subsistirem" graves motivos" O acordo não modificaria o direito, mas se traduziria em uma
e ressalvada a possibilidade de recorrer à autoridade judiciária modificação da dinâmica interna da relação sem relevância
para contestar a legitimidade da exclusão). Superam-se asdis- externa, de modo que a sua estrutura essencial não sofre alte-
cussões sobre o âmbito de aplicação do referido art. 24, ~ 3, ração; seria sempre o conteúdo de um poder e de um dever
Cód. Civ. se se reconhece a direta aplicação das normas consti- existentes na lei. Tratar-se-ia, portanto, de uma declaração 'plu-
tucionais (cfr. retro, cap: 2, ~ 9):a tutela do associado contra rissubjetiva não negociaI à qual seria inaplicável a anulação por
exclusões injustificadas ou atuadas com modalidades lesivas à vícios e a disciplina da capacidade de exercício. Negócio, po-
sua dignidade é garantida pelos arts. 2, 3, ~ 2, 18 e 24 Consto rém, é também aquele simplesmente modificativo da disciplina
de uma relação, ainda que a modificação diga respeito a uma
Acordo s0- 186. Direção (indirizzo)jamiliar: regra do aeardo. - Expressão
bre a dire- modalidade objetivamente acessória. A função regulamentar
ção familiar de liberdade é o poder reconhecido aos cônjuges de acordar é, entre outras coisas, expressamente prevista na definição do
a direção da vida familiar interpretando as exigências de ambos contrato (art. 1.321 Cód. Civ.). Que as situações subjetivas sobre Regulamen"
e da família (art. 144 Cód. Civ.). O acordo assume o papel de tação sobre
as quais o ato de autonomia é destinado a incidir sejam de sitll:lções
regra e de instrumento de realização do princípio de igualdade origem legal, não significa que o ato criado relativamente a de fonte k~
moral e jurídica e, ao mesmo tempo, relativamente à natureza elas não possa ser negociaI: requisito necessário e suficiente é 1r,,1
e aos conteúdos da direção fixada, quando possível e enquanto que o ato seja juridicamente possível, merecedor de tutela e,
conhecida, também a função de garantia e de proteção da portanto, idôneo para realizar o efeito que se propõe. Pela
Incidência
confiança (affidamento) para os terceiros. importância da matéria sobre a qual o acordo pode e entende
sobre aspec- O objeto do acordo rião diz respeito somente a aspectos de incidir não se justifica, justamente para a garantia das partes,
tos tam- direta relevância patrimonial, mas, ao contrário, caracteriza-se a sua exclusão da disciplina tradicionalmente negociaI, como
bém não-
patrimo-
prevalentemente pelas escolhas de vida dos indivíduos e do aquela sobre a capacidade ou ausência de vícios. Com a queda
niais grupo, com incidência sobre questões que se referem à moda- da concepção publicista ,da família, a dúvida, em geral, em
lidade da existência. Uma autolimitação que se justifica pela relação ao negócio familiar e em relação à aut~nomia regula-
affeetio que une os cônjuges e pela particular natureza das mentar na família não tem mais razão de ser. E fundamental
relações familiares. Significativa a propósito é a determinação avaliar, à luz dos valores constitucionais e das nonnas inderro-
da chamada residência familiar, à qual acena explicitamente gáveis, o merecimento de tutela das cláusulas e das modalidades
o próprio art. 144. nas quais sé substancia o acordo.
A autonomia no campo familiar, e ainda mais naquele que A autonomia tem relevo também na chamada família de fato Autonomia
se refere ao exercício das relações pessoais, concilia-se com na famnia
(para o enquadramento do papel da autonomia nesse âmbito: de fato
uma concepção não publicista da instituição familiar; ela, opor- retro, capo 9, ~ 160, sub d). Em relação ao acordo sobre os
tunamente, reaflora hoje e encontra atuação em harmonia com alimentos, por exemplo, confirmando que a autonomia nego-
304 Capítulo déci'f(lo
1) Ablação (abla7lcne,
De um ponto de vista terminológico, o termo ablação implica
aquele de subtração. No CanlPO do procedimento administra-
tivo, o termo indica todos aqueles atos com os quais a Admi-
nistração Pública, em virtude de seus poderes de autoridade,
subtrai aos particulares faculdades, poderes, direitos perten-
centes à sua esfera jurídica, adquirindo as vantagens finalizadas
à realização de interesses públicos. As ablações administrativas
têm a função fundamental de permitir à administração servir-se
de utilidades de natureza diversa sem recorrer ao instrumento
contratual.
A doutrina italiana operou uma subdivisão da matéria em
três categorias: 1) a das ablações reais, que incidem sobre as
situações possessórias de direito real (expropriação, imposição
de servidão pública, superlície coativa, ocupação de terrenos,
requisições em uso ou em propriedade); 2) a das ablações
pessoais, que investem direitos da personalidade, limitando os
direitos da pessoa relativanlente ao quid, ao quarrwdo ou ao
quando, sem, contudo, suprimir ou extinguir tais direitos. Tra-
tando-se, de fato, de valores jurídicos absolutos, esses direitos
podem ser comprimidos por razões superiores de interesse
público, mas, sucessivamente, devem poder expandir-se e ad-
quirir a originária dimensão; 3) a das ablações obrigacionais,
que subtraem ou impõem direitos a prestações: fala-se de pres-
306 Notas da 1'radutQTa Notas da 1'radutora 307
tação imposta porque é a lei que de forma autoritária impõe respondente ao tenno português" autarquia" , é a capacidade
a constituição de uma relação obrigacional entre a Adminis- dos entes públicos, principalmente territoriais (v. enti locali),
tração Pública e o particular. As prestações distinguem-se em de administrar os próprios interesses como exercício de po-
patrimoniais (detenninam uma diminuição no patrimônio do deres públicos. No texto, o tenno usado pelo autor reflete o
devedor: por exemplo, os impostos, a requisição de serviços primeiro significado, e, sendo o seu correspondente em por~
sem indenizaçãà, a entrega obrigatória de exemplares para as tuguês pouco utilizado, preferiu-se explicar o sentido da pala-
bibliotecas, as cinematecas, etc.) e pessoais (consistem no dis- vra, colocando-a entre parênteses.
pêndio de energias físicas ou intelectuais por via coativa: por
exemplo, o serviço militar).
4) Coltivatore diretto (pequeno produtor)
A expressão" coltivatore diretto" corresponde, na linguagem
2) Aceitação de herança com benefício de inventário (a£n:t- jurídica brasileira, ao pequeno produtor.
taziale cal b6le6do ci'inventaria art. 490 Cód. Civ. it.) Na It:ilia, de acordo com o art. 2083 Cód. Civ., o" coltivatore
É a limitação legal da responsabilidade patrimonial do her- diretto" é um pequeno empresário e, segundo a doutrina, essa
deiro em relação às dívidas hereditárias e aos legados até o figura deve ser individualizada fazendo referência ao art. 2135
valor da herança recebida. Uma conseqüência desse benefício (que define o empresário agrícola em geral) globalmente con-
é a separação do patrimônio hereditário em favor dos credores siderado, e não somente em relação à atividade de cultura do
da herança e dos legatários em relação aos credores.do her- terreno. No sistema do Código Civil italiano, o "coltivatore
deiro. O benefício de inventário. depende da escolha do cha- diretto" identifica-se, com base no art. 1647, exclusivamente
mado, que tem o ônus de especificar, no ato de aceitação, que com o pequeno arrendatário (assim, por exemplo, C. Castro-
tem intenção de se valer desse benefício. A aceitação da herança novo, C.A. Graziani), mas a proliferação de leis especiais que
com benefício é obrigatória quando se tratar de herança de- concernem a essa figura levou a doutrina a afinnar a impossi-
volvida a incapazes e a pessoas jurídicas que não sejam socie- bilidade de se interpretar o Código separadamente da legUla~ão
dades. Se o chamado não estiver na posse dos bens hereditários,' extravagante, a qual, sendo mais aderente ~ realidade, oferece
a aceitação com benefício de inventário não é sujeita a prazos chaves de leitura mais adequadas, ainda que mais complexas.
especiais. Enquanto conservar o direito de aceitar a herança, Essa legisÍação alargou a noção de "coltivatore diretto", unifi-
o chamado poderá aceitar sempre e utilmente também com cando nessa figura categorias que precedentemente o legislador
benefício de inventário. Se o chamado estiver na posse dos considerava em separado (pequenos proprietários, enfiteutas,
bens, ele tem o ônus de renunciar ou de aceitar formalmente usufrutuários e, também, meros possuidores e precaristas).
com benefício de inventário até 40 dias a partir da realização
do inventário. Transcorrido inutilmerlte este prazo, o chamado 5) Corte Constitucional (O:rte ca;titwicnalt!)
será considerado herdeiro puro e simples, a não ser que se À Corte Constitucional italiana compete, além dojuízo sobre
trate de incapaz. as controvérsias relativas à legitimidade constitucional das leis
e dos atos, do Estado e das Regiões, com força de lei, também
3) Autarquia e Autarcia o juízo sobre os conflitos de atribuições entre os poderes do
O tenno autarchia, na Itália, tem dois significados. O primei- Estado, entre o Estado e as Regiões e entre as Regiões, o juízo
ro, correspondente ao termo português "autarcia", é uma auto- sobre acusações contra o Presidente da República e o juízo de
suficiência econômica tal que permita a um País produzir .in- admissibilidade do referendum ab-rogativo.
ternamente tudo aquilo de que necessita, pondo fim, desse A Lei Constitucional n. 1 de 1948 excluiu o recurso direto
modo, à dependência econômica do exterior. O segundo, cor- à Corte Constitucional por parte de quem alega a lesão de uma
308 Notas da Tradutora Notas da Tradutora 309
situação jurídica subjetiva por parte de um particular ou por suspender o juízo e remeter a questão â Corte Constitucional
parte de um poder público, devida a uma lei tida como cons- com uma ordinanza onde indicará os termos e os motivos do
titucionalmente ilegítima. O interessado deverá, portanto, di- requerimento com o qual foi suscitada a questão, as disposições
rigir-se a um juiz, ordin?-rio ou especial. O art. 1 da Lei Cons- da lei ou do ato equiparado do qual se denuncia a inconstitu-
titucional n. 1 de 1948 dispõe que a questão de legitimidade cionalidade e as disposições constitucionais que se crêem vio-
constitucional de uma lei ou de um ato com força de lei da ladas. A ordinanza deverá ser publicada no Diário Oficial e,
República, levantada ex oficio ou suscitada por uma das partes quando for o caso, no Boletim Oficial das Regiões interessadas.
d uran te um juízo e considerada não manifestamente infunda- No caso de recusa da questão, a respectiva ordinanza deverá ser
da, é remetida à Corte Constitucional para a sua decisão; a "adequadamente motivada" (art. 24, lei n. 87 de 1953).
questão de legitimidade pode ser suscitada, mediante requeri- Tipos de sentença: a) sentença que acolhe a questão (sentenza
mento, no curso de uma ação proposta perante uma autoridade di accoglimento), quando a Corte declara a ilegitimidade cons-
jurisdicional, entendendo-se por autoridade jurisdicional, não titucional da disposição legislativa; b) sentença que rejeita a
somente os juízes ordinários e especiais, mas também qualquer questão (sentenza di rigetto), quando a questão é declarada in-
autoridade que exerça uma função qualificável como jurisdi- fundada. A eficácia destes dois tipos de sentença é diversa.
cional, ainda que somente sob o perfil formal e processual a) Nós termos do art. 136 Const., combinado com o art. 1
(interpretação dada pela própria Corte Constitucional). A Cor- da lei. n. 1 de 1948 e art. 30, parágrafo III da lei 87 de 1 953-ta
te interpretou o tenno "juízo" também de modo amplo, en- sentença di accoglimento determina a perda de eficácia ex tti~c
tendendo que seja suficiente que ocorra, ou o requisito subje- da norma em questão, entendida tal perda de eficácia no seJi-.
tivo; consistente no fato de que o procedimento seja feito na tido de não aplicação da norma. A eficácia desse tipo de decis~,o
presença ou sob a direção do ~tular de um ofício jurisdicional, é. erga omnes. A eficácia retroativa da sentença não afeta as
QU 'O -"Qq.uisito--übjçJi"yQ
do exercício de funçõesjudicantes para relações já regulamentadas de modo definitivo pela lei decla-
a objetiva aplicação da lei,põY parte de-ã:l'gMs.ainda que rada inconstitucional (com exceção das normas penais incri-
estranhos à organização dajurisdição e institucionalmente des- minatórias: art. 30, parágrafo IV da lei n. 87 de 1953). A COIje
tinados a funções de natureza diversa, que sejam, a tal fim, Constitucional pode, todavia, limitar no tempo a eficáci3l¥e-
colocados em posição super partes. troativa quando circunstâncias especiais o requererem. E rj;~-
O juiz perante o qual foi suscitada a questão deve pronun- cessário levar em conta a chamada ilegitimidade constitucioqal
ciar-se sobre ela, e, a tal fim, deverá verificar: 1) a chamada conseqüente, que se dá quando a sentença di accoglimento de-
relevância da questão, isto é, se o juízo não pode ser definido clara quais são as outras disposições legislativas cuja ilegitimi-
independentemente da resolução da questão. O juiz deverá dade deriva como conseqüência da decisão adotada. A Corte
examinar se a questão foi suscitada em relação a uma lei ou Constitucional inclui nessa hipótese o problema da repristina-
ato equiparado que ele considere ter de aplicar para poder ção das normas ab-rogadas pelas normas declaradas constitu-
definir o juízo; e 2) que a questão não seja manifestamente infun- cionalmente ilegítimas. Compete à Corte verificar, com base
dada. Não se trata de verificar se a questão é fundada ou in- nas mesmas avaliações que levaram à declaração de ilegitimi-
fundada, porque isso é tarefa da Corte Constitucional, mas dade das normas que as ab-rogaram, se estas normas não apre-
somente se a questão não é manifestamente infundada, isto é, sentam aspectos de ilegitimidade parcial.
que prima facie não seja totalmente sem fundamento jurídico. Deve-se lembrar, também, que a Corte pode emanar a cha-
Se for privada de qualquer fundamento jurídico, o juiz deverá mada sentença di accoglimento parcial, isto é, sem alterar o texto,
recusar a questão; se, ao contrário, ela não for manifestamente a Corte declara a ilegitimidade constitucional de normas ou
infundada, deverá aceitar a questão. Nesse último caso, deverá fragmentos de normas dele desumíveis por via interpretativa.
310 Notas da Tradutora
Notas da Tradutora 311
b) As sentenças di rigetto são aquelas 'com as quais a Corte
declara infundada a questão. Esse tipo de sentença não impede, timidade constitucional, salvando, desse modo, o texto legisla-
de qualquer modo, que a mesma questão seja proposta nova- tivo. Não existe concordância na doutrina sobre a eficácia desse
mente pelas mesmas partes ou por outras, no curso de um tipo de sentença em relação ao juiz de quo. A orientação domi-
outro juízo em via acidental ou, se a sentença foi pronunciada nante é no sentido de que existe somente um vínculo negativo
em um juízo em via de ação, que a questão seja proposta por para o juiz, vale dizer que a sentença proibiria o juiz de inter-
via acidental, o que significa que essa sentença não tem eficácia pretar o texto no sentido que foi desatendido pela Corte, mas
de "julgado". Na prática, a Corte Constitucional, em geral, o deixaria livre para atribuir-lhe outra interpretação.
declara" manifestamente infundada" as questões de legitimi- A sentença interpretativa diz-se di accoglimento quando a Cor-
dade c011stitucional propostas nos mesmos tennos de outras te declara, nos termos e nos limites indicados na motivação, a
sobre as quais já se pronunciara com uma sentença di rigetto. ilegitimidade constitucional de um texto se e enquanto dele
A eficácia desse tipo de sentença não é, logicamente, erga omnes, se extrair uma detenninada nonna, salvando-se, desse modo,
já que vale somente em relação ao juízo de quo, ou seja, o juiz todas as outras p,ossíveisinterpretações do texto.
será obrigado a aplicar a lei relativamente à qual tinha sido Sentenças aditivas são aquelas com as quais a Corte declara a
formulada a questão. ilegitimidade de um texto na parte em que não diz alguma coisa,
Se o objeto do juízo era uma.lei de uma Região ou de uma quando por exemplo declarou a ilegitimidade constitucional
Província impugnada por via ,de ação, a .eficácia da sentença do art. 5 Cód.'Pen. na parte em'que não excluía da inexcusabi-
significa que será não' só possível, mas antes, obrigatória a lidade da ignorância dalei penal a ignorância inevitável.
promulgação e a publicação da lei e, portanto, a sua entrada Sentenças restritivas, ao contrário, são aquelas com as quais a
em vigor. Corte declara a ilegitimidade constitucional de um texto na
Além desses dois tipos de sentença, a Corte, por assim dizer,
criou um terceiro tipo:
c) As sentenças interpretativas, que podem ser di accoglimento
parte em que diz alguma coisa.
órgãos. Sob a ótica das funções exercidas, somente os primeiros uma representação indireta ou, mais precisamente, a uma in-
são verdadeiros órgãos judicantes, enquanto que os outros as- terposição real de pessoa. A posição que o mandatário assume
sumem o papel de uma parte processual, ainda que qualificada é sempre de poder, já qüe o mandatário é autorizado a incidir
como" parte pública" ou "parte imparcial", e têm, portanto, na esfera jurídica do mandante, que tem a obrigação, além do
poderes análogos àqueles dos órgãos de defesa. Sob a ótica da direito, de recepcionar os efeitos do ato autorizado. No caso
estrutura organizadora, ambos os órgãos apresentam caracteres de mandato sem representação, o contrato é estipulado pelo
comuns em relação à seleção do pessoal e o seu status; ambos mandatário em nome próprio e é com ele que se constitui a
são, portanto, administrados pelo Conselho Superior de Ma- relação contratual (mesmo que o terceiro soubesse da existên-
gistratura e u'sufruem das mesmas garantias. cia do mandato) relativamente à qual o mandante deve se
Os juízes são funcionários que têm uma relação de serviço considerar estranho. O mandante não é nem parte fonual,
com o Estado. Eles administram a justiça" em nome do povo" nem parte substancial do contrato. Alguns efeitos do contrato
(art. 101 Const.), mas não são elei tos pelo povo e nem são seus estipulado pelo mandatário, todavia, se produzem diretamente
represen tan teso na esfera jurídica do mandante, como, por exemplo, os bens
Com o termo Ministério Público indica-se um complexo de móveis e os créditos adquiridos pelo mandatário em nome'
.:;:;~
ofícios públicos a quem compete fazer valer o interesse da próprio: Nesse caso, o mandante pode reivindicá-los como P[9-
~".~
coletividade, propondo ações judiciárias ou intervindo em pro- prios e o seu direito cede somente diante da aquisição fe-ria
cessos promovidos pelos particulares. O modelo mais impor- por terceiros de boa-fé, segundo a regra da "posse vale títuIQi>. .::.~
tante de Ministério Público é o que exerce as suas funções Em relação aos bens imóveis, ou móveis registrados, a titula"~- 0_0"*
.....<~
diante da autoridade judiciária ordinária e que é constituído dade passa ao mandante depois de um ato fonual de transTe-
por uma rede de ofícios denominados" procuradorias da Re- rência por parte do mandatário, que é obrigado a efetuá-la.
pública" ou "procuradorias gerais da República" e enquadra- No caso de inadimplência, o mandante poderá requerer a
dos na Magistratura ordinária. execução em forma específica.
O exercício das funções de Ministério Público perante as
Cortes, os Tribunais e as preture é entregue a específicos ofícios 14) Recurso por cassação (ricorso per cassazÍl:ne: art. 360
constituídos perante os mesmos e compostos por magistrados Cód. PrOCe Civ. it.) '":
pertencentes à ordem judiciária com igual título daqueles que O recurso por Cassação é um meio de impugnação ordiná-
exercem funções judicantes. A passagem dos magistrados dos rio, sem efeito devolutivo, vale dizer qué não pode ser consi-
ofícios judicantes àqueles requerentes e vice-versa requer so- derado um terceiro grau de juízo, sem efeito suspensivo. Com
mente uma genérica avaliação de idoneidade a ser feita pelo esse recurso podem-se argüir somente" erros" in procedendo ou
Conselho Superior de Magistratura (art. 29 do Decreto do in judicando; por conseguinte o juízo' introduzido com esse meio
Presidente da República n. 449 de 22 de setembro de 1988). de impugnação é limitado ao exame da subsistência ou não
dos erros argüidos pelo recorrente. O exame dos erros denun-
13) Mandato sem representação (mandato senza rappresen- ciados constitui umjuízo rescindente na medida em que tende
taI1Zl:art. 1705 Cód. Civ. it.) à eventual" cassação" , no sentido de cancelamento, da sentença
O mandato é sem representação quando o mandatário age impugnada e, normalmente, exaure a atividade de juízo em
em nome próprio. A escolha entre mandato com ou sem re- sede de cassação para deixar o eventual juízo rescisório a outro
presentação é do mandante que, em geral, opta pela segunda juiz - o juiz de remissão, que é "de grau igual àquele que
hipótese quando prefere ficar oculto perante terceiros. Nesse pronunciou a sentença cassada" (art. 383, n. 1 Cód. Proc. Civ.)
caso, tradicionalmente, afirma-se que o mandato dá lugar a -, em uma nova fase chamada" de remissão" . O art. 384 Cód.
318 Notas da Tradutora Notas da Tradutora 319
Proc. Civ. no novo texto introduzido pela Lei n. 353 de 26 de Tratando-se, ao contrário, de erro in procedendo, o art. 383, ~
novembro de 1990 atribuiu excepcionalmente à Corte de Cas- 3!!, Cód. Proc. Civ., dispõe a remissão ao primeiro juiz. Nesse
sação o poder de decidir a causa no mérito quando não forem caso a remissão é entendida em sentido impróprio, com um
necessários outros acertamentos de fato. O recurso por cassação alcance somente restitutório; por conseguinte, a restituição não
é, portanto, essencialmente umjuízo de legalidade, de direito, se dá por designação da Corte, mas de acordo com as normas
orientado a controlar a correta aplicação da lei pelos juízes do processo. Nesse tipo de remissão, os limites que derivam da
que, desse modo, são os primeiros e diretos destinatários do sentença da Cassação ao juiz de remissão são muito menores
controle de legalidade. Esse juízo de controle é confiado a um porque se reduzem àquelas diretrizes de direito processual que
juiz que está no vértice do ordenamento judiciário e que é a Corte verificou terem sido violadas pela sentença cassada.
único no território do Estado: a Corte de Cassação que, de
acordo com o art. 65 do ordenamento judiciário em vigor,
assegura "a exata observância e a unifonne interpretação da
lei, a unidade do direito objetivo nacional, o respeito dos limites
das diversas jurisdições". As decisões da Corte de Cassação
constituem precedentes que, apesar de não serem vinculantes
para os juízes de juízos futuros, acabam por orientá-los sobre
as orientações da Corte. No caso em que as partes não possam
mais propor recurso por Cassação, por decurso do prazo ou
por renúncia, é prevista uma figura de recurso - "recurso no
interesse da lei" - que pode ser proposta somente pelo Mi-
nistério Público. A decisão proferida com esse recurso não
exerce mais influência nas relações entre as partes, sendo pro-
vocada somente com o objetivo de determinar uma pronúncia
com função de guia da jurisprudência.
Com referência ao juízo de remissão, deve-se evidenciar que,
tratando-se de errar in judicando, isto é, cassação por violação'
ou falsa aplicação de normas de direito, a Corte de Cassação,
no momento em que releva o erro de direito, tem condições
de formular o juízo definitivo, ou seja, a formulação definitiva
da regra de direito que deve ser aplicada ao caso concreto. Isso
significa que a Cassação pode e deve vincular o juiz de remissão
(designado pela Corte) àquela determinada interpretação do
direito que ela, corrigindo o erro do juiz que pronunciou a
sentença cassada, entende ser justa. De fato, o art. 384 Cód.
Proc. Civ. dispõe que a Corte, quando acolhe o recurso por
violação ou falsa aplicação de normas de direito, "enuncia o
princípio ao qual o juiz de remissão deve se uniformizar". O
princípio é, portanto, a normajurídicajá interpretada e adap-
tada ao caso concreto.
Artigos da Constituição Italiana
citados na obra
trabalho. ..c,~
A soberania pertence ao povo, que a exerce nas formas e
nos limites da Constituição.
art. 2 A República reconhece e garante os direitos invioláveis
do homem, quer como indivíduo, quer nas formações sociais
onde desenvolve a sua personalidade e exige o cumprimeri.,!o
.. '~'
Só é permitida a apreensão por meio de ato motivado da Ninguém pode ser submetido a medidas de segurança a não
autoridade judicial no caso de delitos por causa dos quais a lei ser nos casos previstos na lei.
de imprensa expressamente a autorize e no caso de violação
das nonnas que a própria lei prescreva para a indicação dos art. 29 A República reconhece os direitos da família como
responsáveis. sociedade natural fundada no casamento.
Nesses casos quando houver absoluta urgência e não for O casamento fundamenta-se na igualdade moral e jurídica
possível a intervenção oportuna da autoridade judicial, a dos cônjuges, com os limites estabelecidos pela lei para a ga-
rantia da unidade familiar.
apreensão da imprensá periódica pode ser feita por agentes
da polícia judiciária que devem imediatamente e nunca além art. 30 É dever e direito dos pais manter, instruir e educar
das vinte e quatro horas seguintes, comunicar o fato à autori- os filhos, mesmo os nascidos fora do casamento.
dade judicial. Se esta não o validar dentro de vinte e quatro. Nos casos de incapacidade dos pais, a lei dispõe sobre o
horas, a apreensão considerar-se-á revogada e sem efeito. modo de realização dessas tarefas.
A lei pode estabelecer, com nonnas de caráter geral, que A lei assegura aos filhos nascidos fora do casamento toda a
sejam conhecidos os meios de financiamento da imprensa pe- proteção jurídica e social compatível com os direitos dos mem-
riódica. bros da família legítima. +
São proibidas as publicações impressas, os espetáculos e to- A lei prescreve as regras e os limites da investigação t;.da
das as outras manifestações contrárias aos bons costumes. A lei paternidade.
estabelece as providências adequadas par<lprevenir e reprimir art. 31 A República facilita, através de medidas econômitas
as transgressões. . e de outras providências a formação da família e o cumpri- ..
~< ...: • .r
art. 22 Ninguém pode ser privado, por motivos politicos, da mento dos deveres que lhe competem, com especial atenção ., ;.
É prescrito um exame do Estado para a admissão às várias Aos sindicatos não pode ser imposta outra obrigação além
ordens e graus de escolas ou para a conclusão deles e para a do seu registro nos serviços locais ou centrais, nos termos da
habilitação ao exercício profissional. lei.
As instituições de alta cultura, universidades e academias É condição para o registro que oS,estatutos dos sindicatos
têm o direito de dar-se ordenamentos autônomos nos limites consagrem um ordenamento interno de caráter democrático.
estabelecidos pelas leis do Estado. Os sindicatos registrados têm personalidade jurídica. Repre-
sentados unitariamente na proporção dos seus filiados, podem
art. 35 A República tutela o trabalho em todas as suas formas
estipular contratos coletivos de trabalho com eficácia obriga-
e aplicações.
tória para todos os pertencentes às categorias a que se refere
Cuida da fonnação e da elevação profissional dos trabalha- o contrato.
dores.
Promove e favorece os acordos e as organizações in te n'laci o- art. 40 O direito de greve se exerce no âmbito das leis que
nais voltados a fortalecer e regulamentar os direitos do traba- o regulam.
lho. art. 41 É livre a iniciativa econômica privada.
Reconhece a liberdade de emigração, com ressalva-dos de- Não pode desenvolver-se em contraste com a utilidade social
.:."".
veres estabelecidos pela lei no interesse geral e tutela o trabalho ou de modo a causar dano à segurança, à liberdade ou à
italiano no estrangeiro. dignidade humana.
art. 36 O trabalhador tem direito a uma retribuição propor- A lei determina os programas e os meios de fiscalização
destinados à direção e coordenação da atividade econômic3,
cional à quantidade e qualidade do seu trabalho e de qualquer
pública e privada, para fins sociais.
modo suficiente para lhe assegurar e à sua família uma exis-
tência livre e digna. art. 42' A propriedade é pública ou privada. Os bens econô-
A duração máxima do dia de trabalho é estabelecida por lei. mitos pertencem ao Estado, a entes ou a particulares.
O trabalhador tem direito ao descanso semanal e a férias A propriedade privada é reconhecida e garantida pela lei,
anuais retribuídas. Este direito é irrenunciável. a qual prescreve os respectivos modos de aquisição e de gozo
e os limites a que está sl~eita, a fim de se realizar a sua função
art. 38 Todo cidadão inapto ao trabalho e desprovido dos
social e de se tornar acessível a todos.
meios necessários para viver tem direito à manuten_ção e à
assistência social. A propriedade privada pode ser, nos casos previstos na lei
e mediante indenização, expropriada por motivos de interesse
Os trabalhadores têm direito a que sejam providos e assegu-. geral.
rados os meios adequados às suas exigências de vida em caso
A lei estabelece as nonnas e os limites da sucessão legítima
de infortúnio, doença, invalidez, velhice e desocupação invo-
e testamentária e os direitos do Estado sobre as heranças.
luntária.
Os inaptos e os deficientes têm direito à educação e à ativi- art. 43 Para fins de utilidade geral, a lei pode reservar ori-
dade profissional. ginariamente ou transferir, mediante expropriação com inde-
As tarefas previstas neste artigo serão providas por órgãos e nização, ao Estado, a entes públicos ou a comunidades de
institutos predispostos ou integrados pelo Estado. trabalhadores ou de usuários, determinadas empresas ou cate-
A assistência privada é livre. gorias de empresas que concernem serviços públicos essenciais
ou fontes de energia ou situações de monopólio e tenham
art. 39 A organização sindical é livre. caráter de proeminente interesse geral.
328 Artigos da Constituição Italiana citados na obra Artigos da Constituição Italiana citados na obra 329
art. 44 A fim de obter o aproveitamento racional do solo e art. 50 Todos os cidadãos podem dirigir petições às Câmaras
estabelecer relações sociais eqüitativas, a lei impõe deveres e para demandar disposições legislativas ou para expor necessi-
vinculações à propriedade da terra, fixa limites à sua extensão dades comuns.
segundo as regiões e zonas agrícolas, promove e impõe o me-
art. 51 Todos os cidadãos de u~ ou do outro sexo podem
lhoramento das terras, a transformação do latifúndio e a re-
ter acesso aos ofícios públicos e aos. cargos eletivos em condi-
constituição das unidades produtivas; ajuda a pequena e a
ções de igualdade, segundo os requisitos estabelecidos pela lei.
média propriedade.
A lei pode, para a admissão aos ofícios públicos e aos cargos
A lei estabelece disposições a favor das zonas de montanha. eletivos, equiparar aos cidadãos os italianos não pertencentes
art. 45 A República reconhece a função social da cooperação à República.
com caráter de mutualidade e sem fins de especulação privada. Quem é chamado para funções públicas eletivas tem o direi to
A lei promove e favorece o seu incremento com os meios mais de dispor do tempo necessário ao seu cumprimento e de con-
idôneos e assegura, com os oportunos controles, o seu caráter servar o seu trabalho.
e finalidades. art. 52 A defesa da Pátria é um dever sagrado do cidadão.
art. 46 Para fim da elevação econômica e social do trabalho O serviço militar é obrigatório nos limites e nos modos"es-
e em harmonia com as exigências da produção, a República tabelecidos pela lei. O seu cumprimento não prejudica a "f>Q-
reconhece o direito dos trabalhadores a colaborar, nos modos sição de trabalho do cidadão, nem o exercício dos direi'tos
e nos limites estabelecidos pelas leis, à gestão dos fundos de políticos. ~:
comércio. O ordenamento das Forças Annadas ajusta-se aos princípIos
democráticos da República.
art. 47 A República encoraja e tutela a poupança em todas
as suas fonnas; disciplina, coordena e controla o exercício do art. 53 Todos são obrigados a concorrer para as despesas
crédito. públicas em razão da própria capacidade contributiva. ~
Favorece o acesso da poupança popular à propriedade da O sistema tributário segue critérios de progressividade. f:
habitação; à propriedade direta da terra e ao investimento art. 54 Todos os cidadãos têm o dever de fidelidade à Re-
direto e indireto, por meio de ações, nos grandes complexos pública e de observância da Constituição e das leis."
produtivos do País. Os cidadãos a quem são confiadas funções públicas têm o
dever de cumpri-las com disciplina e honra, prestando jura-
art. 48 São eleitores todos os cidadãos, homens e mulheres,
mento nos casos estabelecidos pela lei.
que tenham alcançado a maioridade.
O voto é pessoal e igual, livre e secreto. O seu exercício é art. 70 A função legislativa é exercida coletivamente pelas
dever cívico. nUdS Câmaras.
O direito de voto só pode ser limitado por incapacidade civil art. 75 É admitido o referendum popular para deliberar a
ou por efeito de sentença penal irrevogável ou nos casos de ab-rogação total ou parcial de uma lei ou de um ato que tenha
indignidade moral indicados pela lei. valor de lei, quando o requererem quinhentos mil eleitores ou
art. 49 Todos os cidadãos têm o direito de se ~dóciar livre- cinco Conselhos regionais.
mente em partidos para concorrer de Ill".J<J democrático para Não é admitido o referendum para as lei tributárias e de
determinar a política n",r.;~~al; orçamento, de anistia e de indulto ou de autorização para
ratificar tratados intemacionais.
330 Artigos da Constituição Italiana citados na obra Artigos da Constituição Italiana citados na obra 331
Têm direito a partICIpar do referendum todos os cidadãos art. IH Todos os provimentos jurisdicionais devem ser mo-
chamados a eleger a Câmara dos Deputados. tivados.
A proposta sujeita a referendum é aprovada se participou na Contra as sentenças e contra os provimentos sobre liberdade
votação a maioria dos que têm direito a voto e se tiver sido pessoal, pronunciados pelos órgãos jurisdicionais ordinários
alcançada maioria dos votos expressos validamente. ou especiais, é sempre admitido o recurso em Cassação por.
A lei detennina as modalidades de atuação do referendum. violação de lei. Pode-se derrogar essa norma somente em re-
lação às sentenças dos tribunais militares em tempo de guerra.
r
art. 101 A justiça é administrada em nome do povo.
Os juízes são sujeitos somente à lei. Contra as decisões do Conselho de Estado e do Tribunal de
Contas o recurso em Cassação é admitido somente por motivos
art. 104 A magistratura constitui uma ordem autônoma e inerentes à jurisdição.
independente de qualquer outro poder.
art. 134 A Corte Constitucional julga:
O Conselho superior da magistratura é presidido pelo Pre-
sidente da República. sobre as controvérsias relativas à legitimidade constitucional
da lei e dos atos com força de lei do Estado e das Regiões;
Dele fazem parte de direito o primeiro presidente e o pro-
sobre conflitos de atribuição entre os poderes do Estado e
curador geral da Corte de cassação.
sobre aqueles entre o Estado e as Regiões e entre as Regiões;
Os outros componentes são eleitos por dois terços por todos
sobre as acusações promovidas contra o Presidente da Re-
os magistrados ordinários entre os pertencentes às várias cate- pública, nos tennos da Constituição.
gorias e por um terço pelo Parlamento em sessão comum entre
professores titulares de universidade em matérias jurídicas e art. 136 Quando a Corte declara a ilegitimidade constitucio-
advogados depois de quinze anos de serviço. nal de uma nonna de lei ou de ato com força de lei, a nOIDla
O Conselho elege um vice-presidente entre os componentes deixa de ter eficácia no dia seguinte à publicação da decisão.
designados pelo Parlamento. A decisão da Corte é publicada e comunicada às Câmaras e
Os membros eletivos do Conselho duram no cargo quatro aos Conselhos regionais interessados para que, se acharem
anos e não são imediatamente reelegíveis. necessário, provejam nas fonnas constitucionais.
Não podem, enquanto estiverem no cargo, estar inscritos art. 138 As leis de revisão da Constituição e as outras leis
nas ordens profissionais, nem fazer parte do Parlamento ou de
constitucionais são adotadas por cada Câmara com duas suces-
um Conselho regional.
sivas deliberações, com intervalo não inferior a três meses e
art. 107 Os magistrados são inamovíveis. Só podem ser dis- são aprovadas por maioria absoluta dos membros de cada Câ-
pensados ou suspendidos do serviço, destinados a outras sedes mara na segunda votação.
ou funções depois de uma decisão do Conselho superior da As mesmas leis são submetidas a referendum popular quando,
magistratura, adotada ou pelos motivos e com as gaTh.'Q.tias
de nos três meses posteriores à sua publicação, o solicitem um quinto
defesa estabelecidas pelo ordenamento judiciário, ou com "'" dos membros de uma Câmara ou quinhentos mil eleitores ou
consentimento deles. cinco Conselhos regionais. A lei submetida a referendum não será
O Ministro da Justiça tem faculdade de promover a ação promulgada se não for aprovada pela maioria dos votos válidos.
disciplinar. Não se realiza referendum se a lei for aprovada na segunda
Os magistrados se distinguem entre eles somente pela diver- VOlà.,.q>Q.porcada uma das Câmaras por maioria de dois terços
de seus mt-.~t:Q~. .
sidade de funções.
O Ministério Público goza das garantias estabelecidas em art. 139 A forma reP~an_ª não pode constituir objeto de
relação a ele pelas normas sobre o ordenamento judiciário. revisão constitucional. .._-_
------------------.
Demais normas citadas na obra
-.,'~
Código Civil italiano ~
..k~1~
Disposições preliminares ," ~-~~,,~~
dições de reciprocidade e salvas as disposições contidas nas leis art. 10 Abuso da imagem de outrem -..,.-Quando a imagem
especiais. de uma pessoa ou dos genitores, do cônjuge ou dos filhos
Esta disposição vale também para as pessoas jurídicas estran- forem expostas ou publicadas fora dos casos em que a exposição
geiras. ou a publicação é consentida por lei, ou com prejuízo do
decoro ou da reputação da pessoa ou dos referidos parentes
Reforma do sistema italiano de direito internacional privado prôximos, a autoridade judiciária, a pedido do interessado,
- lei n. 218 de 31 de maio de 1995 pode dispor que cesse o abuso, ressalvado o ressarcimento dos
(esta lei ab-rogou a disciplina do direito internacional pri- danos. _ -
vado italiano e entrou em vigor no dia I!!de setembro de 1995.
Para o que aqui nos interessa - a referência feita pelo autor art. 24 Recesso e exclusão dos associados - A qualidade
à ordem pública -, será mencionado somente o artigo 16). de associado não é transmissível, a menos que a transmissão
seja consentida pelo ato constitutivo ou pelo estatuto.
art. 16 Ordem pública. - 1. A lei estrangeira não é aplicada O associado pode sempre desligar-se da associação se não
se os seus efeitos forem contrários à ordem pública. tiver assumido a obrigação de dela fazer parte por um tempo
2. Nesse caso aplica-se a lei indicada mediante outros crité- detenninado. A declaração de recesso deve ser comunicada
rios de conexão eventualmente previstos para a mesma hipôtese por escrito aos administradores e tem efeito com o vencimento
normativa. À sua falta, aplica-se a lei italiana. do ano corrente, desde que seja feita pelo menos três meses
antes.
A exclusão de um associado não pode ser deliberada pela
Código civil assembléia a não ser por graves motivos; o associado pode
recorrer à autoridade judiciária até seis meses a contar do dia
em que lhe foi notificada a deliberação.
art. 1 Capacidade de direito - A capacidade de direito se Os associados que tenham se desligado da associação ou
adquire no momento do nascimento. tenham sido excluídos ou que de qualquer modo tenham ces-
Os direitos que a lei reconhece a favor do concebido são sado de pertencer à associação não podem repetir as contri-
subordinados ao evento do nascimento. buições dadas, nem têm qualquer direito sobre o patrimônio
da associação.
art. 2 Maioridade. Capacidade de exercício - A maioridade
é fixada no décimo oitavo ano. Com a maioridade se adquire art. 143 Direitos e deveres recíprocos dos cônjuges - Com
a capacidade de realizar todos os atos para os quais não é o casamento o marido e a mulher adquirem os mesmos direitos
estabelecida uma idade diversa. e assumem os mesmos deveres.
Ficam ressalvadas as leis especiais que estabelecem uma idade Do casamento deriva a obrigação recíproca de fidelidade,
inferior em matéria de capacidade para prestar o prôprio tra- de assistência moral e material, de colaboração no interesse da
balho. Nesse caso o menor é habilitado ao exercício dos direitos família e da coabitação. ._
e das ações que dependem do contrato de trabalho. Ambos os cônjuges sãooEiigádos, cada um em relação às
próprias substâncias e à própria capacidade de trabalho pro-
art. 5 Atos de disposição do próprio corpo - Os atos de fissional ou doméstico, a contribuir para o suprimento das
disposição do próprio corpo são proibidos quando causarem necessidades da família.
uma diminuição permanente da integridade fi'sica, ou quando
forem igualmente contrários à lei, à ordem pública ou aos bons art. 144 Direção da vida familiar e residência da família -
costumes. Os cÔl~uges acordam entre eles a direção da vida familiar e
Demais normas citadas na obra 337
336 Demais normas citadas na obra
fixam a residência da família segundo as exigências de ambos atribuição do exercício do pátrio poder sobre eles e as dispo-
e aquelas preeminentes da família. sições relativas à medida e às modalidades da contribuição.
A cada cônjuge compete o poder de concretizar a direção art. 161 Referência genérica a leis ou aos usos. Os esposos
concordada. não podem pactuar de modo genérico que as suas relações
patrimoniais sejam em tudo ou em parte reguladas por leis às
art. 155 Disposições em relação aos íllhos - O juiz que
quais não são submetidos ou pelos usos, mas devem enunciar
pronuncia a separação declara a qual dos cônjuges caberá a
de modo concreto o conteúdo dos pactos com os quais enten-
guarda dos filhos e adota todas as disposições relativas à prole,
dem regular estas suas relações.
com exclusiva referência ao seu interesse moral e material.
O juiz estabelece, especialmente, a medida e o modo como art. 162 Forma das convenções matrimoniais. As convenções
o outro cônjuge deve contribuir para a manutenção, a instrução matrimoniais devem ser estipuladas por ato público sob pena
e a educação dos filhos e também as modalidades de exercício de nulidade.
de seus direitos nas relações com eles. A escolha do regime de separação pode também ser decla-
O cÔl~uge, em cuja guarda estejam os filhos, salvo diversa rada no ato de celebração do casamento.
disposição do juiz, tem o exercício exclusivo do pátrio poder As convenções podem ser estipuladas em qualquer tempo,
sobre eles, devendo se ater às condições detenninadas pelo respeitadas as disposições do artigo 194. £
juiz. A não ser que seja .estabelecido diversamente, as decisões As convenções matrimoniais não podem ser opostas a ter-
de maior interesse para os filhos são adotadas por ambos os ceiros quando à margem do ato de casamento não estiverém
cÔl~uges. O cônjuge em cuja guarda não estejam os filhos tem anotadas a data do contrato, o tabelião que redigiu o ato eas
o direito e o dever de fiscalizar sua instrução e educação c generalidades dos contraentes, ou a escolha referida no pará-
pode recorrer ao juiz quando crer que tenham sido tómadas grafo segundo.
decisões prejudiciais aos interesses deles.
art. 167 Constituição do fundo patrimonial. Cada um ou
A moradia na casa familiar compete de preferência, e quan-
ambos os cÔI~uges, por ato público, ou um terceiro, tambéin
do for possível, ao cônjuge ao qual foi confiada a guarda dos
por testaniento, podem constituir um fundo patrimonial, des-
filhos. tinando detenninados bens, imóveis ou móveis inscritos úos
O juiz estabekce disposições acerca da administração dos
registros públicos, ou títulos de crédito, para fazer frente-às
bens dos lIIhos e, na hipótese em que o exercício do pátrio
necessidades da família.
poder seja confiado a ambos os genitores, o concurso dos A constituição do fundo patrimonial por atos entre vivos,
mesmos ao gozo do usufruto legal. efetuada por tecceiro, se aperfeiçoa com a aceitação dos côn-
Em todo caso, o juiz pode, por graves motivos, ordenar que juges. A aceitação pode ser feita com ato público sucessivo.
a prole seja confiada a uma terceira pessoa ou, na impossibili- A constituição pode ser feita também durante o casamento.
dade, a um instituto de educação. Os títulos de crédito devem ser vinculados, tornando-os no-
Ao emanar as disposições relativas à guarda dos filhos e à minativos com anotação do vínculo ou com qualquer outro
contribuição para a sua manutenção, o juiz deve levar em conta modo idôneo.
o acordo entre as partes: as disposições podem ser diversas em
art. 171 Cessação do fundo. A destinação do fundo termina
relação aos pedidos das partes ou ao seu acordo e determinadas
com a anulação, a dissolução ou a cessação dos efeitos civis do
depois da aquisição dos meios de prova indicados pelas par~t;.~.-
casàrnenlo;
ou dispostos de ofício pelo juiz. _
Os cônjuges ~êmp.p; •.~;._dcTco •.•~ icmqualquer tempo Se existirem filhos menores, o fundo dura até que o último
a revi c;: _ -- ,;l1~pOSlçoescollcernentes a guarda dos filhos, a filho se tome maior de idade. Nesse caso, o juiz, a pedido de
338 Demais normas citadas na obra
Demais normas citadas na oúra 339
pessoa interessada, pode ditar normas para a administraçã9 do
fundo. a) por todos os pesos e ônus que os gravam no momento
da aquisição;
Consideradas as condições econõmicâs dos genitores e dos
b) por todos os encargos da admiriistração;
filhos e qualquer outra circunstância, o juiz pode também
atribuir aos filhos, em exercício ou em titularidade, uma cota c) pelas despesas para a manutenção da família e ?ara_ a
dos bens do fundo. instmção e a educação dos filhos e por qualquer obngaçao
Se não existirem filhos, aplicam-se as disposições sobre a contraída pelos cÔl"Úuges,mesmo separadamente, no interesse
dissolução da comunhão legal. da família;
d) por qualquer obrigação contraída pelos cÔl"ÚugesCOl"Úun-
art. 177 Objeto da comunhão. Constituem objeto da comu- tamente.
nhão:
a) as aquisições feitas pelos dois cônjuges COl"Úuntaou sepa- art. 210 Modificações convencionais da comunhão legal dos
radamente durante o casamento, com exclusão daquelas rela- bens. Os cÔl"Úugespodem, mediante convenção estipulada nos
tivas aos bens pessoais; tenllOS do art. 162, modificar o regime da comunhão legal dos
b) os fmtos dos bens próprios de cada um dos cÔl"Úuges, bens, desde que os pactos não sejam contrários às disposições
percebidos e não consumidos no momento da dissolução da do art. 161.
comunhão; Os bens indicados nas letras c), d) e e) do art. 179 não podem
c) proventos da atividade separada de cada um dos cÔl"Úuges ser compreendidos na comunhão convencion_al. .
se, no momento da dissolução da .comunhão, não tiverem sido Não são derrogáveis as normas da comunhao legal relativas
consumidos; à administração dos bens da comunhão e à igualdade das cotas
d) os fundos de comércio geridos por ambos os cÔl"Úugese limitadamente aos bens que constituiriam objeto da comunhão
legal.
constituídos depois do casamento;
Se se tratar de fundos de comércio pertencentes a um dos art. 315 Deveres do íJ1ho em relação aos genitores. O filho
cÔl"Úugesanteriormente ao casamento mas geridos por ambos, deve respeitar <lSgenitores e deve contribuir, em relação _às
a comunhão referir-se-á somente aos úteis e aos incrementos. próprias substância:> e ao próprio rendimento, à manutençao
da família enquanto com ela conviver.
art. 179 Bens pessoais. Não constituem objeto da comunhão
e são bens pessoais do cônjuge: art. 330 Perda do pátrio poder. - 0iuiz pode pronunciar
(omissis) a perda do pátrio poder quando o genitor viôla-<:.~ negligen-
c) os bens de uso estritamente pessoal de cada um dos ciar os deveres a ele inerentes ou abusar dos relatIvà3poderes
cÔl"Úugese os seus acessórios; com grave prejuízo aos filhos.
. d) os bens que servem ao exercício da profissào do cÔl"Úuge, Nesse caso, por graves motivos, o juiz pode ordenar o afas-
exceto aqueles destinados à condução de um fundo de ,omér- tamento do filho da residência familiar.
cio que faça parte da comunhão; art. 333 Conduta do genitor prejudicial aos íJ1hos. - Quan-
e) os bens obtidos a título de ressarcimento de dano e tam- do a conduta de um ou de ambos os genitores for tal que não
bém a aposentadoria relativa à perda total ou parcial da capa- possa comportar a pronúncia da perda do pátrio poder prevista
cidade de trabalho; no art. 330, mas parece de qualquer modo prejudicial ao filho,
(omissis) o juiz, segundo as circunstâncias, pode adotar as providências
_.----_ ..,,_._--~---_.. _.cQEyenientes e pode também dispor o seu afastamento da
art. 186 Obrigações que gravam sobre osbens-aacomuDhãO:- r~Sl o"el-.-cl-...{"Q.~iji~r.
Os bens da comunhão respondem: Essas proVldenC1<>~ __ r_v.QlciY.ej~ qualquer momento.
-------- ---------
..
.
.... "-
...
340 Demais normas citadas na obra Demais normas citadas na obra 341
art. 357 Funções do tutor. O tutor cuida da pessoa do. menor, dentro dos limites e com a observância das obrigações estabe-
o representa em todos os atos civis e administra os seus bens. lecidas pelo ordenamento jurídico.
art. 360 Funções do pró-tutor.O pró-tutor representa o .. art. 833 Atos emulativos. O proprietário não pode praticar
menor nos casos em que o interesse deste estiver em oposição atos que não tenham outro escopo que não seja o de prejudicar
com o interesse do tutor.
ou causar moléstia a outros.
Se também o pró-tutor se encontrar em oposição de interesse
com o menor, o juiz de menores nomeará um curador especial. art. 844 Imissões. O proprietário de um terreno não pode
O pró-tutor é obrigado a promover a nomeação de um novo impedir as imissões de fumo ou de calor, as exalações, os
tutor no caso em que o tutor vem a fal tar ou abandona o ofício. nllnores, os abalos e irradiações similares derivantes do terreno
Nesse meio tempo ele cuida da pessoa do menor, o representa do vizinho, se não superam a normal tolerabilidade, levando
e pode realizar todos os atos conservativos e os atos urgentes também em consideração as condições do lugar.
de administração. Ao aplicar esta nonna a autoridade judiciária deve equilibrar
as exigências da produção com as razões da propriedade. Pode
art. 771 Doações de bens futuros. A doação só pode com- levar em conta a prioridade de um detenninado uso.
preender os bens presentes do doador. Se compreender bens
futuros é nula em relação a estes, a não ser que se trate de art. 1140 Posse. A posse é o poder sobre a coisa que. se
manifesta em uma atividade correspondente ao exercício;~da
fnltos ainda não separados. . .
propriedade ou de outro direito real. ':
Quando o objeto da doação for uma universalidade de coisas .. ~~
Pode-se possuir diretamente ou por meio de outra pess"ba, ,-
I
I
meios.
A decisão é obrigatória em todos os seus elementos para os
destinatários designados por ela. _ _ .
! As recomendações e os pareceres nao sao VInculantes.
Constituição Italiana:
.~
.
1: 34; 35; 40; 41; 42; 43; 45; 139; 170; 266; 281; 300.
2: 18; 19; 28; 39; 41; 43; 45; 46; 47; 54; 84; 92; 11; 121; 135; 137; 142;
143; 154; 155; 157; 159; 164; 172; 175; 177; 178; 183; 186; 188; 192; 193;
196; 226; 243; 244; 247; 248; 261; 265; 266; 276; 280; 284; 289; 300; 302.
3: 39; 43; 44; 45; 46; 47; 48; 49; 50; 51; 52; 54; 92; 11; 138; 139; 142; 159;
.'.\
164; 166; 174; 178; 183; 193; 198; 218; 259; 266; 280; 291; 300; 302 .
4: 37; 139; 154; 170; 193; 198; 266.
8: 40.
9: 172; 193; 236.
10: 73.
11: 14.
12: 34.
13: 16; 34; 90; 135; 154; 161; 183; 298.
14: 183; 198.
15: 183; 185.
16: 90; 16l.
18: 45; 193; 300; 301; 302.
19:135; 154; 193.
21: 90; 135; 154; 186; 192; 193.
22: 135; 166.
23: 76; 135.
24: 135; 154; 156; 157; 261; 300; 302.
25: 76; 135.
29: 19; 40; 177; 183; 194; 243; 246; 250; 251; 265; 266; 270; 271; 300.
30: 194; 265; 266.
31: 11; 17~ 194; 198; 25~ 265.
32; 135; 154; 156; 159; 161; 162; 164; 166; 172; 178; 298.
33: 186; 193.
348 Índice das fontes normativas Índice das fO'ntes normativas 349
789: 111.
321: 132. 799: 290.
330: 196; 259. 810: 205; 234; 236.
333: 196; 259. 827: 100.
334: 129. 832: 217; 222.
344: 225. 833: 84; 122; 202; 203; 234.
357: 106; 129. 834: 53.
360: 129; 132. 838: 53; 219.
362: 129. 843: 92.
367: 129. 844: 122; 170; 171; 222.
374: 225. 874: 123.
375: 225. 924: 92; 222.
377: 129. 925: 92.
382: 129. 948: 220; 229.
383: 225. 952: 202.
384: 225. 954: 217.
392: 129. 959: 110.
414: 139; 166. 960: 204.
415: 139. 978: 217.
418: 140. 979: 110.
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