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Considerações iniciais
Este texto busca problematizar o uso didático do cinema e sua a importância para a
disciplina História da Educação. A problematização permeia as relações entre cinema
educativo e Escola Nova, uso do cinema pelo governo de Getúlio Vargas e ascensão atual do
cinema como fonte histórica e recurso metodológico-didático para desenvolver a disciplina.
Também se apoia em dados levantados, em 2010, no Congresso Luso-brasileiro de História
da Educação em São Luís, Maranhão, para uma pesquisa que objetivou verificar a
metodologia de trabalho de docentes de História da Educação em sala de aula. A discussão
desses tópicos associada com o levantamento partiu da indagação a seguir e por ela se guia:
professores e professoras da disciplina História da Educação usam o cinema como fonte
histórica para construir o conhecimento histórico em educação? A pergunta se mostra
pertinente como problematização porque o cinema está na sala de aula universitária do
presente como recurso didático.
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morais e éticos?) Além disso, ideais positivistas demarcaram as políticas educacionais como
mola propulsora do progresso e ideias liberais predominaram, em consonância com a
expansão do capital industrial e a luta interna pela unidade nacional.
Também nos anos 20 e 30 as reformas educacionais ganharam força, embasadas no
ideário do movimento escola nova. Mais que promover um novo modelo escolar, esse
movimento apresentou metodologias para educar nas escolas públicas da primeira metade do
século passado, sob os princípios elementares da valorização de manifestações cívicas e
patrióticas, da alfabetização e da difusão da escola pública. Segundo Carvalho (1998), a
escola nova associava a pedagogia com a ideia de eficiência; e isso fica patente em passagens
dos textos das reformas, por exemplo, a de Fernando de Azevedo, que deixa entrever não só
certa ênfase no caráter técnico, mas também certo desejo de educar integralmente a criança —
cuja educabilidade seria desenvolvida respeitando-se a natureza infantil.
Ainda na compreensão de Carvalho (1998, p. 32), um entusiasmo pela educação
caracterizou esse momento histórico. E mesmo que a falta da educação fosse
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correntes pedagógicas, além de outros como interesse/disciplina e
ação/pensamento.
É provável que o desejo de buscar outro referencial pedagógico que pudesse evitar a
dualidade espírito–corpo — marcante na pedagogia — tenha motivado a política educacional
do país nos anos 20 a prever uma pedagogia auxiliada por técnicas novas, por exemplo, o uso
didático do cinema. Conforme Morettin (1995, p. 13),
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criou o Instituto Nacional do Cinema Educativo (INCE), órgão ligado ao Ministério da
Educação e Saúde Pública. O instituto produzia filmes com temáticas do meio rural, do
folclore e das riquezas naturais, assim como biografias e outros estilos para distribuir nas
escolas.
Morettin (1995) esclarece que o INCE contratou, como diretor-técnico, Humberto
Mauro: cineasta então bem conceituado que fez filmes educativos populares para exibição
pública. Contudo, mais que produzir filmes, ―O Instituto se propunha a manter-se
informado sobre os filmes educativos existentes e disponíveis e as escolas que mantinham
projetores‖; assim como a sistematizar informações dispersas — mediante a ―[...]
formação biblioteca especializada e publicação de uma revista [...] e coordenar o
movimento‖ (MORETTIN, 1995, p. 17). O INCE deu lugar, em 1967, ao Instituto Nacional
de Cinema, que ―[...] abandona a proposta de produzir e distribuir filmes educativos‖
(NASCIMENTO, 2008, p. 4).
Essa paralisação do uso do cinema como ferramenta didático-escolar não esfriou o
animo no meio acadêmico quanto ao uso educacional do filme. No fim da década de 80,
talvez por ―[...] influência da historiografia francesa, em especial, e pelo alargamento dos
meios de comunicação de massa no país [...]‖, conforme afirma Nascimento (2008, p. 5), o
cinema passou a ser objeto da reflexão pedagógico; e tal reflexão foi verbalizada em eventos
acadêmicos, em livros, em revistas científicas e em ações e programas de órgãos públicos
ligados à educação. Além de o cinema se firmar no debate teórico-epistemológico sobre
procedimentos didáticos para ensinar história da educação, as transformações e os avanços na
tecnologia midiática ampliaram a discussão sobre o uso educativo do cinema; a ponto de
estendê-la a novos espaços para tal ensino, a exemplo da escola fundamental e média, regida
pelos Parâmetros Curriculares Nacionais/PCN (BRASIL, 1998).
Esse documento ressalta a relevância da linguagem midiática para ensinar História e
trabalhar com temas transversais como possibilidade de integrar saber escolar com memória e
raciocínio, imaginação e estética etc. Nesse caso, ao ser uma mediação pedagógica, o cinema
criaria condições para promover a reflexão discente mediante uma leitura histórica do filme
que possibilitasse produzir conhecimentos à luz de culturas diversificadas, conforme o tempo
e o espaço de dada época e num processo de construção e reconstrução de conceitos. Na
história escolar, o uso didático do cinema poderia se aliar aos temas transversais para oferecer
aos alunos uma realidade — a fílmica — que lhes proporcionasse parâmetros para refletir
sobre sua realidade social e se preparar para eventuais transformações que afetam a vida em
sociedade. O cinema como recurso didático tem de ―[...] levar à superação da compreensão
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do documento como prova do real, para entendê-lo como documento figurado, como ponto
de partida do fazer histórico na sala de aula‖, como postula Schmidt (1998, p. 62). Nas
palavras dessa autora (SCHMIDT, 2005, p. 225):
Se assim o for, então a análise histórica do filme supõe buscar subsídios em estudos
e outras fontes para construir um conhecimento do passado que seja útil como parâmetro
para compreender o presente; sobretudo o presente resultante de transformações do passado
que a produção humana registrou e daquelas cujos registros resultam mais da ação da
natureza — que o homem interpreta. Além disso, o uso didático do cinema — assim como de
outros recursos — exige planejamento e preparação. É preciso que as atividades sejam
desenvolvidas de modo que o filme seja analisado em relação ao conteúdo curricular e sem
perder de vista o valor documental duplo do filme: o olhar do diretor e o olhar do espectador
com base em sua experiência social.
Pode-se inferir que explorar o cinema como recurso didático-pedagógico e fonte para
a história da educação requer abordagens e métodos; logo, se o cinema se projetou na didática
de professores universitários, então convém verificar seus métodos. Com esse intuito, em
2010 propusemo-nos, com o pesquisador Sauloéber Tarso de Souza, a compreender mais a
metodologia e os recursos usados para lecionar História da Educação mediante levantamento
de dados no congresso de história da educação. Tal proposta se alinha a investigações afins do
grupo de estudos e pesquisa sobre a disciplina História da Educação na Universidade Federal
de Uberlândia, cujo objetivo é promover e estimular reflexões sobre o perfil do professor e
sua metodologia de trabalho.
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Os professores que responderam às perguntas de tal pesquisa somam quase 33
pessoas que lecionam História da Educação em 15 estados através das cinco regiões. A
distribuição aleatória dos questionários mostrou proporcionalidade numérica de Instituições
de Ensino Superior: Sudeste, Nordeste e Sul, regiões mais populosas, foram mais
representativas. A pesquisa considerou ainda o critério idade — média de 45 anos — e o
tempo de docência superior — duas décadas. No caso de História da Educação I, a
disciplina reflete um aspecto geral da História da Educação: experiência docente de quase
oito anos para 88% dos entrevistados que a ministraram.
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respostas às questões levantadas‖ (SAVIANI, 2006, p. 30). Daí ―[...] o empenho em
preservar os materiais de que nos servimos, seja como educadores, seja como pesquisadores,
tendo em vista sua possível importância para estudos futuros [...]‖, quando tais objetos
poderão ser, eventualmente, vistos como fontes úteis a quem quer ―[...] compreender o
passado e o presente‖ (SAVIANI, 2006, p. 31).
Se as ponderações de Saviani (2006) apontam as fontes como possibilidades de
construir o conhecimento da História da Educação, também permitem enquadrar o cinema
porque, como produção humana que registra a vida em dado momento, o filme é passível do
exame do historiador. Mais que isso, o uso do cinema como fonte na história da educação
avança de uma perspectiva metodológica tradicional para uma visão dialética. Aceitar o ―[...]
cinema como fonte histórica indica uma mudança de estatuto do historiador na sociedade,
assim como mostra a nova utilidade que certas fontes passam a ter em função de sua nova
missão‖, conforme afirma Morettin (2003, p. 21).
A pesquisa aqui relatada, cujos dados advêm de respostas de professores
participantes de um congresso de História da Educação, detectou que os docentes que
recorrem ao filme como recurso didático têm uma formação diversa — a saber, Filosofia,
Psicologia, Ciências Sociais, Letras, Direto, Física e Educação Física; mais que isso,
mostra que têm usado o filme mais como ilustração, e menos para problematizar
historicamente a educação. Exemplificam isso certas falas sobre os objetivos do emprego
do cinema nas aulas de História da Educação, as quais revelam uma tendência geral a usar
o filme com o:
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na pesquisa sobre artes visuais e na história da arte. Munir-se de tais procedimentos
permite ao docente buscar ―[...] compreender determinado fenômeno [...]‖ recorrendo a
filmes que vão ser ―[...] mais adequados [...]‖ à medida que proporcionar mais discussões
(FRANCO, 1993, p. 29).
Últimas considerações
Como se viu, as relações entre cinema e educação remontam aos anos 1920 e se
mantêm vivas. Através dos anos, o uso pedagógico do filme compôs propostas de mudança
na educação como uma inovação metodológica — sugerida por estudiosos que refletiram
sobre a educação escolar segundo princípios da chamada escola nova. Igualmente, entre
aquela década e o presente o cinema permeou as políticas educacionais do governo
autoritário de Getúlio Vargas como instrumento para incutir valores morais, patrióticos e
disciplinadores do corpo e da alma de crianças mediante a distribuição escolar de filmes
produzidos com fins pedagógicos. Tais relações se fortaleceram — é provável — com os
postulados da historiografia francesa, mais aberta ao uso de fontes que não as oficiais para a
pesquisa histórica; daí a projeção do cinema na educação — elementar e superior.
Essa influência teórica se nota nas justificativas dos PCN para recomendar o uso
didático de objetos audiovisuais para construir o conhecimento histórico na educação de nível
fundamental e médio. Todavia, na educação superior a influência parece se dissipar um
pouco. Quando usado didaticamente na construção do conhecimento histórico acadêmico por
professores (de História da Educação), o filme serve mais a fins ilustrativo-contextuais, e
menos à problematização histórica do passado. Isso vale para a prática docente de professores
de regiões distintas e formação variada.
Ao permear a didática de docentes com formação diversa, o filme ajuda a renovar
a metodologia do ensino de História da Educação. Inversamente, a heterogeneidade pode
fragilizá-la ao secundarizá-la aos poucos no currículo dos cursos de Pedagogia. Mais
instigante, porém, é a tendência a usar o filme só ilustrativa e contextualmente. De fato,
esse emprego tem valor didático-cognitivo — porque se adapta bem a objetivos de
aprendizagem e procedimentos metodológicos de ensino; mas esse valor nos parece pouco
no campo dos estudos histórico-acadêmicos, porque a historiografia (da educação) se
constrói não só pelo uso do filme como ilustração, mas também — e sobretudo — pela sua
problematização como fonte: pela leitura crítica, pela análise teórico-metodológica e pela
interpretação contextualizada.
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Referências
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trabalho no projeto da Associação Brasileira de Educação (1924–1931). Bragança Paulista:
EDUSF, 1998.
CARVALHO, Marta Maria Chagas de. A escola e a República e outros ensaios. Bragança
Paulista: EDUSF, 2003.
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MORETTIN, Eduardo Victorio. O cinema como fonte histórica na obra de Marc Ferro.
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NOMA, Amélia Kimiko. Visualidades da vida urbana: Metrópolis e Blade Runner. 1998.
Tese (Doutorado em História Social) — Faculdade de História da Pontifícia Universidade
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SOUZA, Sauloéber Társio de; RIBEIRO, Betânia de Oliveira Laterza. Ensino de história da
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VALDEMARIN, Vera Teresa. Os sentidos e a experiência: professores, alunos e métodos de
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Bibliografia
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