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Formação Econômica

do Brasil

Profª. Andréa Oliveira Hopf Diaz


Profª. Josélia Elvira Teixeira

2019
Copyright © UNIASSELVI 2019

Elaboração:
Profª. Andréa Oliveira Hopf Diaz
Profª. Josélia Elvira Teixeira

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

D542f
Diaz, Andréa Oliveira Hopf
Formação econômica do Brasil. / Andréa Oliveira Hopf Diaz;
Josélia Elvira Teixeira. – Indaial: UNIASSELVI, 2019.

183 p.; il.


ISBN 978-85-515-0254-9

1.Brasil – Condições econômicas – Brasil. I. Teixeira, Josélia Elvira. II.


Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

CDD 330.981

Impresso por:
Apresentação
Seja bem-vindo a nova jornada que iniciaremos com o nosso livro de
estudos da Disciplina Formação Econômica do Brasil.

É imprescindível para a compreensão da história e desenvolvimento


econômico do Brasil que tomemos conhecimento das condições sociais,
econômicas e políticas presentes em cada etapa de consolidação do país,
desde o contexto de descobrimento, o período colonial e sua participação
nos processos seguintes de desenvolvimento econômico e posteriores
consequências.

Como futuro profissional da área da economia, ter conhecimento da


gênese de nosso país em relação a esses aspectos o capacitará a relacionar,
elucidar e articular os acontecimentos, inclusive, com aqueles associados
a transformações externas, quanto à cultura, a interesses e à dinâmica dos
efeitos na formação de uma sociedade.

Pense nos seguintes questionamentos: qual a influência europeia


na formação da economia brasileira? Quais as raízes ou os fundamentos
do nosso processo de industrialização? Como este contexto se relaciona
diante do processo de redemocratização e dos nossos problemas? Serão estes
nossos problemas econômicos estruturais? Isto é, relacionados justamente a
condições de formação política de nosso país?

Tranquilize-se, pois vamos apresentar uma série de episódios que


certamente colaborarão para elucidar essas e outras questões que surgirão
ao longo da leitura e da realização das autoatividades! Serão inúmeras
descobertas! Vamos lá!?

Na Unidade 1, será apresentado o contexto de expansão europeia


e a colonização. Para que a leitura e o ensino a distância sejam mais bem
aproveitados, os conteúdos das unidades foram organizados em três tópicos.
Veja os tópicos desta unidade: as grandes navegações; os fundamentos da
colonização: formação e expansão econômica no período colonial; e o modelo
primário exportador no Brasil. Em cada momento, podemos perceber a
cronologia de eventos que vai, aos poucos, dando certa identidade e cultura,
também produtiva ao nosso país.

Na Unidade 2, é apresentada a introdução do processo de


industrialização brasileiro. Para isso, a divisão também em tópicos, o auxiliará
a relacionar os acontecimentos, diante de inúmeros interesses e desafios do
país, que nem sempre convergem, mas que são dinâmicos e requerem uma
atenção mais especial. Enquanto o Tópico 1 trata das origens do capitalismo

III
no século XIX; o Tópico 2, destaca o desenvolvimento da indústria no início
do século XX; seguido do processo de substituição de importações, iniciado
na década de 1930, assunto que continua na unidade a seguir, mas que já
ganha destaque aqui, no Tópico 3 desta unidade.

Finalmente, a última unidade do livro de Formação Econômica


do Brasil foi organizada para que você compreenda e reflita sobre o
desenvolvimento da economia brasileira entre as décadas de 1950 e 1990. Deste
modo, iniciaremos com a revisão de alguns conceitos elementares a respeito
do Plano de Metas com o propósito de trilhar o caminho do planejamento
econômico brasileiro até o final da década de 1980.

O Tópico 1 é denominado “industrialização e desenvolvimento” e no


qual se procura conhecer a importância do planejamento para a economia
da década de 1950 por meio do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek.
Além deste tema, ainda neste tópico estudaremos a participação do capital
estrangeiro na economia brasileira com a atuação de grandes oligopólios. No
Tópico 2, “milagre econômico”, a ênfase estará na análise relativa à década
de 1970, período de forte crescimento da economia e de um projeto de
desenvolvimento posto em prática para o país. Entretanto, este tópico parte da
crise interna brasileira dos 1960 e do importante avanço com o Plano Trienal.
Por fim, o livro é concluído com o Tópico 3, reservado ao exame da crise
econômica dos anos 1980, com foco na dívida externa e na desestruturação
interna. Deste modo, são revisadas as principais medidas utilizadas para
conter o processo de hiperinflação com os planos de estabilização econômica
e o processo de redemocratização trazido pelas eleições diretas no Brasil.

Fique atento, que ao final de cada tópico, presente em cada unidade,


são propostas autoatividades que contribuirão para a reflexão e aprendizado
dos assuntos abordados. A leitura complementar, um texto a parte presente
no livro de estudos, tem como objetivo trazer algo inédito e permitir a relação
com o que foi abordado ao longo dos estudos. Qualquer dúvida, não hesite!
Busque os tutores!

Esperamos que este estudo se converta em uma etapa de grande


avanço em seu conhecimento, e vá ao encontro de suas aspirações, sejam
pessoais e profissionais.

Desejamos uma excelente jornada de estudos! Grande abraço!

IV
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO.......................................................... 1

TÓPICO 1 – AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV............................ 3


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 3
2 A EUROPA NO FINAL DA IDADE MÉDIA.................................................................................... 4
3 POR QUE AS ESPECIÁRIAS ERAM IMPORTANTES NO SÉCULO XV?................................ 6
4 POR QUE PORTUGAL FOI O PRIMEIRO PAÍS A DAR INÍCIO
ÀS GRANDES NAVEGAÇÕES DO SÉCULO XV?........................................................................ 7
5 ESPANHA NAS DESCOBERTAS MARÍTIMAS DO SÉCULO XV............................................ 13
6 MUDANÇAS E CONSEQUÊNCIAS DA EXPANSÃO MARÍTIMA DO SÉCULO XV.......... 20
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 23
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 24

TÓPICO 2 – FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO


E EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL...................................... 27
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 27
2 INÍCIO DA OCUPAÇÃO PORTUGUESA NO BRASIL............................................................... 28
3 O INÍCIO DAS ATIVIDADES ECONÔMICAS NO BRASIL...................................................... 32
3.1 A EXPLORAÇÃO DO PAU-BRASIL E O POVOAMENTO DA COLÔNIA........................... 32
3.2 O POVOAMENTO E O FORTALECIMENTO DE ATIVIDADES
ECONÔMICAS NA COLÔNIA...................................................................................................... 33
3.3 A CULTURA DO AÇÚCAR NA COLÔNIA................................................................................ 35
3.4 O CICLO DA MINERAÇÃO (SÉCULO XVIII)............................................................................ 42
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 46
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 47

TÓPICO 3 – O MODELO PRIMÁRIO EXPORTADOR NO BRASIL............................................ 49


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 49
2 A INSTALAÇÃO DA FAMÍLIA PORTUGUESA NO BRASIL
E AS TRANSFORMAÇÕES NO BRASIL......................................................................................... 49
3 O CULTIVO DO CAFÉ E A CONSOLIDAÇÃO DO MODELO
PRIMÁRIO-EXPORTADOR................................................................................................................ 50
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 55
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 56

UNIDADE 2 – A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE


INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO...................................................................... 57

TÓPICO 1 – A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE


INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO.......................................................................... 59
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 59
2 REPÚBLICA VELHA: AMBIENTE POLÍTICO E ECONÔMICO................................................ 60
2.1 A DINÂMICA DE INTERESSES..................................................................................................... 60

VII
2.2 A ECONOMIA MONETÁRIA INCIPIENTE................................................................................ 64
3 A BASE ECONÔMICA CAFEEIRA................................................................................................... 70
3.1 AS CONDIÇÕES DE OCORRÊNCIA E MERCADO ................................................................. 70
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 81
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 82

TÓPICO 2 – O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX......... 83


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 83
2 A QUESTÃO DO TRABALHO NA CAFEICULTURA.................................................................. 83
2.1 IMIGRAÇÃO E DINAMISMO ECONÔMICO............................................................................ 84
3 O DESENVOLVIMENTISMO E NACIONALISMO ECONÔMICO ........................................ 91
3.1 OS PRECEDENTES DE UM PROJETO MAIOR.......................................................................... 91
3.2 O POPULISMO COMO VIA ECONÔMICA................................................................................ 96
RESUMO DO TÓPICO 2...................................................................................................................... 104
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 105

TÓPICO 3 – O PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES (SI):


A PARTIR DE 1930........................................................................................................... 107
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 107
2 A CRISE E O CRESCIMENTO ECONÔMICO.............................................................................. 107
3 AS CONDIÇÕES E O DECORRER DO PROCESSO (SI)........................................................... 113
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 118
RESUMO DO TÓPICO 3...................................................................................................................... 121
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 122

UNIDADE 3 – A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX.................................................... 123

TÓPICO 1 – INDUSTRIALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO................................................... 125


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 125
2 A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO ECONÔMICO........................................................ 126
3 JUSCELINO KUBITSCHEK E O PLANO DE METAS (1956-1961)............................................ 130
4 PARTICIPAÇÃO DO CAPITAL ESTRANGEIRO E OLIGOPÓLIOS ..................................... 135
RESUMO DO TÓPICO 1...................................................................................................................... 139
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 140

TÓPICO 2 – MILAGRE ECONÔMICO............................................................................................. 141


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 141
2 A CRISE INDUSTRIAL ENDÓGENA NO INÍCIO DA DÉCADA DE 1960........................... 141
3 CRESCIMENTO ECONÔMICO NO GOVERNO JOÃO GOULART (1961-1964):
CRISE POLÍTICA E O PLANO TRIENAL DE CELSO FURTADO........................................... 144
4 GOLPE MILITAR DE 1964 E O MODELO DEPENDENTE E ASSOCIADO.......................... 148
5 PROGRAMA DE ACELERAÇÃO ECONÔMICA DO GOVERNO (1964-1967):
ESTABILIZAÇÃO E MUDANÇAS INSTITUCIONAIS.............................................................. 149
6 O PROJETO NACIONAL-DESENVOLVIMENTISTA DO GOVERNO MILITAR............... 154
RESUMO DO TÓPICO 2...................................................................................................................... 158
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 160

TÓPICO 3 – REDEMOCRATIZAÇÃO E INFLAÇÃO..................................................................... 161


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 161
2 A CRISE ECONÔMICA DOS ANOS 1980: DÍVIDA EXTERNA
E DESESTRUTURAÇÃO INTERNA............................................................................................... 161

VIII
3 ESTAGNAÇÃO E INFLAÇÃO BRASILEIRA: OS PLANOS DE
ESTABILIZAÇÃO ECONÔMICA.................................................................................................... 165
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 174
RESUMO DO TÓPICO 3...................................................................................................................... 176
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 177

REFERÊNCIAS........................................................................................................................................ 179

IX
X
UNIDADE 1

EXPANSÃO EUROPEIA E
COLONIZAÇÃO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• entender como se encontrava a estrutura política, econômica e social nos


fins do século XIV;
• compreender como nasceu a ideia das navegações marítimas no século XV;
• entender por que as especiarias eram importantes para o comércio
europeu;
• observar as fases da expansão marítima portuguesa;
• analisar como a Espanha entrou como concorrente de Portugal na expansão
marítima do século XV;
• entender o que foi o Tratado de Tordesilhas;
• analisar quais foram fatores que levaram ao declínio da Espanha;
• entender as mudanças e consequências da expansão marítima no século XV;
• compreender o processo histórico das grandes navegações e os fatores
econômicos que determinaram a busca por novos territórios;
• entender como as grandes navegações mudaram a economia, a sociedade
e a política da Europa;
• analisar como se deu a colonização do Brasil e se estabeleceram as
primeiras atividades econômicas;
• identificar os principais ciclos econômicos na formação econômica do
Brasil e suas consequências no desenvolvimento;
• compreender por que a Inglaterra foi beneficiada com a vinda dos
portugueses para o Brasil;
• analisar o que foi a Abertura dos Portos;
• entender que tipo de economia foi se propagando no Brasil colônia;
• relacionar economia e trabalho no período monárquico no Brasil;
• entender por que a abolição foi extinta;
• analisar as vantagens das oligarquias cafeeiras do café no Brasil.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

TÓPICO 2 – FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E


EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

TÓPICO 3 – O MODELO PRIMÁRIO EXPORTADOR NO BRASIL


1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

1 INTRODUÇÃO
Este tópico tem como proposta entender os motivos que levaram os reinos
como (Portugal, Espanha, Inglaterra, França e Holanda) a buscar por novas rotas
de comércio por mares até então desconhecidos como o Oceano Atlântico e
Índico. Veremos que estes reinos estavam em busca das especiarias na África e
Ásia para comerciarem na Europa, pois o comércio era de domínio dos genoveses
e venezianos pelo mar Mediterrâneo.

As Grandes Navegações do século XV foram impulsionadas desde os


fins do século XIV, em decorrência das Cruzadas, que estimularam os europeus
perseguirem novos e mais rápidos acessos a Jerusalém. Além disso, o contato com
outras mercadorias do Oriente criou novas demandas para os povos europeus,
que viram oportunidades de comércio desses produtos. Surgia, assim, uma classe
social burguesa que almejava prosperar por meio da inovação comercial, que
posteriormente deu início a Revolução Comercial.

Portugal também passava por conflitos internos, conhecidos como a


Reconquista, que também foi um dos fatores que o levaram a lutar pela sua
autonomia política formando um só reino. Portugal apareceu como o primeiro
país a se lançar aos mares. A sua posição geográfica favorável, o comércio
pesqueiro, a ideia de divulgar o cristianismo, a conquista de novas terras e metais
preciosos, que estavam escassos na Europa, foram os principais fatores que
impulsionam o pioneirismo português nas grandes navegações e colonização. No
entanto, a Espanha após a sua unificação por meio dos reinos cristãos e retomada
dos territórios do domínio dos mouros voltou-se para as explorações marítimas,
concorrendo com Portugal pelo domínio de outros territórios, como África e Ásia.

Desta forma, caros acadêmicos, vamos discutir especialmente as grandes


navegações lideradas por Portugal e Espanha. Assim, poderemos compreender
os primórdios da formação econômica das Américas e, especialmente, como
a colonização irá marcar historicamente e ditar os rumos da economia e
desenvolvimento do Brasil pelos outros séculos. Vamos voltar às raízes da
formação econômica brasileira, que será fundamental para você analisar como
esse percurso influencia até os dias correntes a posição do Brasil no comércio
internacional, na formação estrutural da economia agrário-exportadora e de
como os traços dos primeiros colonizadores ainda prevalecem como herança
cultural no povo brasileiro.

3
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

2 A EUROPA NO FINAL DA IDADE MÉDIA


Para compreender como nasceu a ideia de navegar para outros lugares do
mundo no século XV, é importante retroceder no tempo para analisar como os
europeus viveram e estavam vivendo na Alta e Baixa Idade Média, período que
corresponde aos séculos V ao XV, buscando relacionar a forma da organização
social, política e econômica conhecida como feudalismo.

Na Idade Média, a economia feudal era autossuficiente, o comércio


praticamente não existia e as trocas ocorriam por meio de poucos produtos
necessários para a manutenção dos feudos. O poder político era descentralizado,
impedia a organização da arrecadação fiscal, o que impossibilitava a formação
de um exército ou de polícia, bem como estruturar canais de comercialização de
excedentes produtivos. As estradas eram muito precárias, de difícil trânsito. Cada
feudo tinha suas próprias regras, pois eram independentes e utilizavam as mais
variadas formas de pesos, medidas e moedas, impossibilitando a monetização da
economia. A sociedade feudal não possibilitava mudanças de classe social, quem
nascia em uma determinada classe era difícil de obter ascensão. A economia
baseava-se na produção de subsistência. A forma de organização do trabalho era
compulsória. O servo estava obrigado a produzir para o seu sustento, de sua
família e ainda para o senhor feudal que era o dono da terra (MENDONÇA;
PIRES, 2002).

Todavia, é no final da Idade Média que começaram a surgir as feiras que


impulsionaram o comércio. Portanto, percebe-se que essa organização social,
econômica e política não era adequada para o modelo de expansão comercial
que estava surgindo com o apoio da burguesia e que tinha grande interesse em
aumentar os seus negócios.

Na transição da Idade Média de 1453 para a Idade Moderna, em 1789,


muitos acontecimentos importantes ocorreram na Europa como: a queda de
Constantinopla, a Revolução Francesa, descobrimentos marítimos, Renascimento
e a Reforma Protestante. A ascendência ao capitalismo com a queda do feudalismo,
o poder é centralizado nas mãos dos reis e o absolutismo substituiu os senhores
feudais. As descobertas de novas terras em busca de metais preciosos e o domínio
de novos continentes como Ásia, África e as Américas também serão fundamentais
para as transformações que estavam ocorrendo para sistema de Economia Mundo.
No entanto, os países como Inglaterra, França, Holanda também se aventuraram
nos mares no século XV, mas os que mais se destacaram nesta fase das Grandes
Navegações foram Portugal, que já havia se consolidado como nação monárquica,
e, em seguida, a Espanha após resolver conflitos existentes com a reconquista de
seus territórios que eram dominados pelos mouros (SANTOS,1984).

4
TÓPICO 1 | AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

FIGURA 1 – AS GRANDES NAVEGAÇÕES NO SÉCULO XV

FONTE: <https://image.slidesharecdn.com/asgrandesnavegaes-150330144711-conversion-
gate01/95/as-grandes-navegaes-1-638.jpg?cb=1427744902>. Acesso em: 14 jul. 2018.

NOTA

VOCÊ SABIA?

“Portugal se afirmava no conjunto da Europa como um país autônomo, com tendência
a voltar-se para fora. Os portugueses já tinham experiência, acumulada ao longo dos séculos
XIII e XIV, no comércio de longa distância, embora não se comparassem ainda a venezianos e
genoveses, a quem iriam ultrapassar. Aliás, antes de os portugueses assumirem o controle de
seu comércio internacional, os genoveses investiram na sua expansão, transformando Lisboa
em um grande centro mercantil sob sua hegemonia. A experiência comercial foi facilitada
também pelo envolvimento econômico de Portugal com o mundo islâmico do Mediterrâneo,
onde o avanço das trocas pode ser medido pela crescente utilização da moeda como meio
de pagamento. Sem dúvida, a atração para o mar foi incentivada pela posição geográfica
do país, próximo às ilhas do Atlântico e à costa da África. Dada a tecnologia da época, era
importante contar com correntes marítimas favoráveis, e elas começavam exatamente nos
portos portugueses ou nos situados no sudoeste da Espanha.

Por último, lembremos que, no início do século XV, a expansão correspondia aos
interesses diversos das classes, grupos sociais e instituições que compunham a sociedade
portuguesa. Para os comerciantes era a perspectiva de um bom negócio; para o rei era
a oportunidade de criar novas fontes de receita em uma época em que os rendimentos
da Coroa tinham diminuído muito, além de ser uma boa forma de ocupar os nobres e
motivo de prestígio; para os nobres e os membros da Igreja, servir ao rei ou servir a Deus
cristianizando "povos bárbaros" resultava em recompensas e em cargos cada vez mais
difíceis de conseguir, nos estreitos quadros da Metrópole; para o povo, lançar-se ao mar
significava sobretudo emigrar, tentar uma vida melhor, fugir de um sistema de opressões.
Dessa convergência de interesses só ficavam de fora os empresários agrícolas, para quem
a saída de braços do país provocava o encarecimento da mão de obra. Daí a expansão ter-
se convertido em uma espécie de grande projeto nacional, ao qual todos, ou quase todos,
aderiram e que atravessou os séculos”.

FONTE: FAUSTO, Boris. História do Brasil: história do Brasil cobre um período de mais de
quinhentos anos, desde as raízes da colonização portuguesa até nossos dias. São Paulo: Edusp,
1996. Disponível em: <http://www.intaead.com.br/ebooks1/livros/hist%F3ria/12.Hist%F3ria%20
do%20Brasil%20-%20Boris%20Fausto%20(Col%F4nia).pdf>. Acesso em: 21 jul. 2018.

5
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

Percebe-se que a economia europeia no século XV encontrava-se em


expansão pressionado pela nova classe burguesa das cidades e por outro lado um
aumento demográfico, mas havia entraves para o desenvolvimento das atividades
ligadas ao comércio. Portugal e Espanha buscavam novas rotas para atingirem o
comércio com Oriente e a África em busca das especiarias, tais como cravo, noz-
moscada, pimenta, gengibre, canela, açafrão, artigos de luxo como porcelanas,
tecidos de seda marfim, ouro e outros para vender na Europa que eram fonte de
muita riqueza na época (SOUTO MAIOR, 1976).

3 POR QUE AS ESPECIÁRIAS ERAM IMPORTANTES


NO SÉCULO XV?
O comércio de especiarias existia deste a Antiguidade, mas foi ampliada
no período das Cruzadas na Idade Média. Eram importantes para conservar e
melhorar o sabor dos alimentos, inclusive utilizadas como perfume, afrodisíaco,
incenso etc. Elas tinham longa durabilidade, suportavam meses de viagem sem
perder sua qualidade aromática e medicinal. Ocorreu uma corrida de países
europeus em busca nas regiões tropicais do sul e sudeste da Ásia pelas especiarias
(figura a seguir):

FIGURA 2 – AS PRINCIPAIS ESPECIARIAS COMERCIALIZADAS NO SÉCULO XV


Canela Gengibre

Pimenta

Noz Moscada

FONTE: <http://4.bp.blogspot.com/-6MHcINfEpTY/TrLwu-20GgI/AAAAAAAAA6M/lY0vMUK50Vw/
s400/Especiarias.png>. Acesso em: 20 jul. 2018.

“A emulação que as riquezas italianas produziam e o espírito


aventureiro que se apossou de Portugal com a chegada dos carregamentos
de malagueta, ouro, marfim e escravos, foram consolidando a política
marítima traçada pelo Infante D. Henrique” (REZENDE, 2007, p. 39).

6
TÓPICO 1 | AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

Segundo Fausto (1996, p. 14), “ouro e especiarias foram bens sempre muito
procurados nos séculos XV e XVI, mas havia outros, como o peixe, a madeira,
os corantes, as drogas medicinais e, pouco a pouco, um instrumento dotado de
voz – os escravos africanos”. Portugal assumiu o comércio da pimenta que era
monopólio de Veneza, considerada, na época, a especiaria mais cara da Índia,
produto que passou a dar muito lucro para os portugueses (SIMONSEN,1967).

Podemos observar, na figura a seguir, a rotas das especiarias no século XV.

FIGURA 3 – ROTAS DAS ESPECIARIAS NO SÉCULO XV

Rota das Especiarias no Século XV

FONTE: <https://image.slidesharecdn.com/aula01antecedentesdaproduodoespaobrasileiro-
150219171925-conversion-gate01/95/antecedentes-da-produo-do-espao-brasileiro-18-638.
jpg?cb=1424388101>. Acesso: 14 jul. 2018.

Para Rezende (2007) os metais preciosos, os alimentos e as especiarias foram


a mola propulsora para o desenvolvimento da expansão marítima de Portugal,
porque os turcos haviam bloqueados o Mediterrâneo Oriental, então passaram a
buscar outras rotas para trazer direto da fonte. Essa pode ser considerada uma
hipótese para a exploração de Portugal no Golfo da Guiné em 1473, denominada
Costa do Ouro.

4 POR QUE PORTUGAL FOI O PRIMEIRO PAÍS A DAR


INÍCIO ÀS GRANDES NAVEGAÇÕES DO SÉCULO XV?
As melhorias nas técnicas de navegação proporcionaram o abandono da
navegação por cabotagem para percursos mais longos.

7
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

Na Idade Média no período do feudalismo, a estrutura política, econômica e


jurídica não era adequada a expansão comercial. No entanto, com o desenvolvimento
do comércio, surgiu uma classe social que era a burguesia que compactuava
com as novas ideias que passaria a romper com as antigas estruturas feudais
aliando-se ao poder monárquico. Consequentemente, a centralização política
ocorreu sucessivamente por meio de financiamento de exércitos mercenários. Em
compensação, os reis passaram a garantir os meios para a expansão do comércio,
planejando as grandes navegações com objetivo de obtenção de novos mercados
e as novas fontes fornecedoras de metais preciosos (MENDONÇA; PIRES, 2002).

O objetivo principal da expansão ultramarina, do século XV, estava


relacionado ao desejo de conquistar os metais preciosos que a Europa almejava
desde o século XIII. Percebe-se que em 1415 as rotas de exploração de ouro foi
Ceuta no norte da África e também produtor de trigo. Como Portugal sobreviveu
a várias crises a expansão ultramarina, seria um estímulo para reerguer a sua
economia (REZENDE, 2007).

No início do século XV Portugal tornou-se o pioneiro nas Grandes


Navegações, por vários motivos. Entre eles, a luta ente cristãos contra os mouros
pela reconquista dos territórios dominados pelos árabes e também pela posição
geográfica que favorecia o desenvolvimento do comércio no litoral lusitano desde o
século XII, surgindo uma classe de pessoas ligadas ao comércio. Porém, esse grupo
de burgueses não tinham controle sobre o poder político e o conflito perdurou de
1140 até 1383 quando Portugal tornou-se uma monarquia centralizada com o auxílio
de uma classe mercantil que obteve benefícios como terras e títulos de nobreza ao
ajudar no financiamento do exército (MENDONÇA; PIRES, 2002).

Neste momento, a sociedade europeia portuguesa passa a ter uma


mobilidade de servos que passam a ser colonos ou artesãos e até pequenos
proprietários, e os antigos senhores feudais começaram a fazer a transferência
de renda para essa classe mercantil. Isso deveu-se à guerra da Reconquista,
que permitiu a Portugal, a partir do início do século XV, o denominado périplo
africano, que se estendeu por toda a costa da África, construindo feitorias e
comercializando produtos que tinham demanda para os consumidores europeus
(MENDONÇA; PIRES, 2002).

Então os portugueses descobriram as ilhas de Açores, Madeira, Cabo


Verde e desenvolveram técnicas de cultivo e refino com as quais passaram a
produzir açúcar em grande escala, especiaria com muito demanda e com mão de
obra escrava. Portanto, no século XV, percebe-se que Portugal vivia um processo
de desenvolvimento comercial que resultaria na organização das grandes
navegações, o qual tinha o objetivo de acordo com Mendonça e Pires (2002):

• a expansão do comércio;
• obter metais preciosos pela escassez para a cunhagem de moedas;
• terras para produção de alimentos;
• busca das especiarias na Ásia e África;
• igreja católica tinha grande influência religiosas.

8
TÓPICO 1 | AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

Para levar mercadorias do mar Mediterrâneo para o norte da Europa


eram utilizados os portos de Portugal. Com o poder centralizado, após a crise
feudal, a burguesia começou a investir em instrumentos náuticos como a bússola,
o astrolábio, o quadrante (figura a seguir) para fazer longas viagens navegando
pelos oceanos, o que favoreceu para serem o primeiro país europeu a fazer
viagens por oceanos desconhecidos (SANTOS, 1984).

FIGURA 4 – INSTRUMENTOS NÁUTICOS

Esfera armilar Ballestilla Cuadrante

Brujula Astrolabio Nocturlabio Reloj de arena


FONTE: Adaptado de: <file:///C:/Users/07608717955/Desktop/download%20(1).jpg>.
Acesso em: 18 jul. 2018.

Portugal possuía a Escola de Sagres, que formava navegadores e que


proporcionou um avanço tecnológico naval na época como a construção das
caravelas. Entre outras embarcações de maior ou menor porte, ocorreu entre os
séculos XV e XVI (SANTOS, 1984).

UNI

ESCOLA DE SAGRES

Para navegar, os portugueses foram os pioneiros no uso duplo da vela quadrada e


da vela latina, que puderam usar os ventos alísios, instrumentos náuticos que contribuíram
para o comércio ao longo da costa com os indígenas e assim é que foram buscar ao sul
do Saara a pimenta malagueta, o marfim, o ouro e escravos, ameaçando o monopólio de
Veneza (SIMONSEN, 1967).

9
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

No entanto, havia muitos mitos sobre águas do oceano Atlântico para


fazer comércio com o oriente, pois se tornara um desafio para os portugueses
que lideraram a expansão marítima no decorrer do século XV. João de Santarém
e Pedro de Escobar seriam os incumbidos por Afonso V, de descobrirem novas
terras, e, de fato, alcançaram boa parte da costa da África Ocidental, a partir
da cronologia de descobrimentos a partir de 1400. Bartolomeu Dias chegou até
o Cabo das Tormentas; isto é, foi o primeiro europeu a cruzar o Cabo da Boa
Esperança, ao sul da África, contornando parte do continente africano, conforme
observamos na figura a seguir (SOUTO MAIOR, 1976).

FIGURA 5 – PÉRIPLO AFRICANO

FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/21/Caminho_maritimo_para_a_
India.png>. Acesso: 18 jul. 2018.

O quadro a seguir apresenta as principais fases da expansão marítima


portuguesa.

QUADRO 1 – FASES DA EXPANSÃO MARÍTIMA PORTUGUESA – SÉCULO XV

Período Fase
Conquista de Ceuta – localizado no Estreito de Gibraltar –
1415 dominado pelos muçulmanos – ponto de partida para chegar ao
litoral da África.
1434 Gil Eanes ultrapassou o Cabo do Bojador.

10
TÓPICO 1 | AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

Período Fase
Bartolomeu Dias dobrou o Cabo da Boa Esperança, no extremo
1488
sul da África.
Vasco da Gama chegou a Calicute, na Índia, realizando um novo
1498
caminho para o Oriente.
1500 Pedro Álvares Cabral chegou ao Brasil.

FONTE: Adaptado de Santos (1984)

Quando Vasco da Gama aportou nas Índias em 1498, ao voltar para


Portugal, trouxe muitas especiarias, possibilitando lucros extraordinários para
os investidores. Ele abriu caminho para os portugueses erguerem as feitorias
que tinham a função de entrepostos comerciais. Portugal utiliza-se de feitorias
para defender o litoral das terras colonizadas dos seus concorrentes. Ele temia
invasões de outros povos como os franceses, ingleses e holandês (SANTOS, 1984).

NOTA

Antes de partir, Cabral manteve vários encontros com Vasco da Gama. O


descobridor da Índia redigiu instruções náuticas detalhadas para o futuro descobridor do
Brasil. Esse documento – que Cabral levou consigo a bordo – sobreviveu aos séculos e
o rascunho dele está preservado na torre do Tombo, em Lisboa. Depois de 44 dias de
viagem, no entardecer de 22 de abril de 1500, quando a frota, por motivo nunca plenamente
compreendido, encontrava-se muito mais a oeste do que o necessário para contornar o
cabo da Boa Esperança (a última ponta da África), Cabral e seus homens vislumbraram um
morro alto e redondo, que batizaram de monte Pascoal. Esse morro fica no sul da Bahia. Foi
a descoberta oficial do Brasil pelos portugueses. Os fatos e desdobramentos da jornada de
Cabral estão narrados em detalhes no livro A viagem do descobrimento, primeiro volume
da Coleção Brasilis.

FONTE: BUENO, Eduardo. As primeiras expedições brasileiras: náufragos, traficantes e degredados.


Disponível em: <http://www.esextante.com.br/media/upload/livros/Naufragostraficantesdegredados_
Trecho.pdf>. Acesso em: 24 jul. 2018.

De acordo com Souto Maior (1976) Portugal atingiu o auge quando passou
a colonizar o Brasil. Nesse período, Portugal possuía outras colônias, como
podemos observar na figura a seguir. Dessa forma, as novas colônias fomentavam
a economia portuguesa com os produtos extraídos e comercializados no mercado
europeu por Portugal.

11
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

FIGURA 6 – PRINCIPAIS FEITORIAS E POSSESSÕES PORTUGUESAS NA ÁFRICA

FONTE: <file:///C:/Users/07608717955/Desktop/download%20(2).jpg>. Acesso em: 22 jul. 2018.

NOTA

O que era a feitoria?

Uma Feitoria é um lugar ou estabelecimento, que pode ou não ser fortificado, geralmente
situado junto a um porto, e que funcionava como um entreposto comercial para as trocas
comerciais com os naturais da região ou com os mercadores que aí se deslocavam. Muito do
comércio português nos territórios descobertos na época dos Descobrimentos era efetuado
através das feitorias aí fundadas. A primeira dessas feitorias foi a Feitoria de Arguim na costa
africana. No Golfo da Guiné foi fundada uma outra feitoria, a Feitoria da Mina, na qual se
desenvolvia o comércio de escravos, marfim, malagueta e ouro. No Oriente foi fundada
uma extensa rede de feitorias que permitiram a Portugal tornar-se o mais poderoso Estado
mercantil do mundo.

Disponível em: <https://www.sohistoria.com.br/dicionario/palavra.php?id=57>. Acesso em:


22 jul. 2018.

Em uma das viagens para a América, portugueses e espanhóis estavam


navegando juntos, e Américo Vespúcio descreveu, em uma de suas cartas, o
novo mundo: “Pode-se dizer que não encontramos nada de proveito”. Porém,
observaram na costa brasileira uma espécie vegetal que era o pau-brasil do qual
era extraído um corante que poderia tingir tecidos. Denominaram esse vegetal
de Caesalpinia Echinata (PRADO JR, 1994). Apesar das primeiras impressões
sobre as novas terras não serem muito boas, pois buscavam especialmente ouro e
prata, logo começaram a extração de outros produtos e a implantar a agricultura
(produção de açúcar), o que fortaleceu a economia de Portugal e Espanha.
12
TÓPICO 1 | AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

5 ESPANHA NAS DESCOBERTAS MARÍTIMAS DO SÉCULO XV


Assim como os portugueses, os espanhóis passaram a concorrer em busca
de novas terras e riquezas que encontrassem o além-mar. Com a unificação dos
reinos no século XV e a união matrimonial de Fernando, do Reino de Aragão, e
Isabel, do Reino de Castela, a economia passa por um processo de transformação
que culminará no esplendor de riquezas espanholas. Porém, continuaram
utilizando o sistema de irrigação implementado pelos mouros na agricultura nas
produções de trigo, frutas, laranjas, cana-de-açúcar, azeite das oliveiras. Eram
famosas as manufaturas de couro de Córdoba, as armas, lãs e sedas de Toledo, as
luvas de Ocana, os panos de Saragoça, Barcelona e Valença (SIMONSEN, 1967).

Observe na figura a seguir as principais rotas estabelecidas pelos espanhóis


e portugueses.

FIGURA 7 – MAPA DAS ROTAS PORTUGUESAS E ESPANHOLAS (SÉC. XV E XVI)

ROTAS DAS VIAGENS MARÍTIMAS PORTUGUESAS E ESPANHOLAS DOS SÉCULOS XV E XVI

FONTE: <https://images.slideplayer.com.br/6/5652141/slides/slide_2.jpg>.
Acesso em: 18 jul. 2018.

Cristóvão Colombo foi para Castela, em 1486, e apresentou o seu projeto


para os reis católicos Fernando e Isabel que colaboraram com a realização de
Colombo. Cristóvão Colombo era um homem do mar e desde sua adolescência se
tornou conhecedor de geografia, náutica, física e cartografia por meio das viagens
que realizou como navegador. Ele casou-se com Felipa Moniz Perestrello, filha
de um navegador e governador português Bartolomeu Perestrello, um exímio
cosmógrafo. Estudiosos dizem que por meio de relatos, a esposa de Bartolomeu
Perestrello, foi que entregou ao genro cartas náuticas que pertenciam ao seu
13
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

esposo falecido o que levou a curiosidade de Colombo a desvendar outras terras


desconhecidas. Para financiar sua viagem, Colombo pediu ajuda ao rei de Portugal,
apresentando um projeto de que poderia chegar às Índia pelo Ocidente, porém,
não foi aceita, conforme observamos na figura a seguir (SOUTO MAIOR, 1976).

FIGURA 8 – DESCOBRIMENTO DA AMÉRICA

D epois de recusados por Portugal, Cristóvão


Colombo apresentou seus planos aos reis
da Espanha.
MAJESTADE,
ANTES DE TUDO,
QUERO EXPLICAR
UMA COISA:
A TERRA É
REDONDA!
GRANDE
NOVIDADE:
DESCOBRIU A
AMÉRICA!

NÃO!
ISSO AINDA
NÃO FIZ!

PARA PROVAR O QUE EU DISSE, SABE


PLANEJO VIAJAR PELO OCIDENTE COMO É?
ATÉ CHEGAR ÀS ESTOU MEIO
ÍNDIAS, NO DURO E
ORIENTE! PRECISO
DE UM
FINANCIAMENTO!

E EU
COM
ISSO?

CERTO, CRISE!
VOU ASSINAR ESTE CARAVELAS
CHEQUE PARA A USADAS
COMPRA DAS
CARAVELAS! SANTA
PINTA
MARIA
NIÑA

FEZ UM
VOU LEVAR
ESSAS TRÊS! ÓTIMO
NEGÓCIO!

FONTE: <http://www.cartunista.com.br/descobrimento1.html>. Acesso em: 19 jul. 2018.

14
TÓPICO 1 | AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

O objetivo dos reis espanhóis Fernando e Isabel era de investir em Colombo


sempre pensando na procura de uma rota acessível ao comércio das especiarias
que, até aquele momento, pertenciam e enriqueciam os venezianos. As especiarias
(pimenta, gengibre, o cravo, noz-moscada, a canela e o sal que era um produto
mais barato), eram importantes porque utilizadas como conservantes para não
apodrecer os alimentos e tinham um valor econômico importante (SIMONSEN,
1967). Os projetos de Colombo visavam encontrar novas rotas para chegar ao
Oriente, ele acreditava que navegando sempre em direção ao Ocidente baseando-
se no princípio da esfericidade da Terra chegaria às Índias.

Assim, com apoio de Pinzón, partiram no dia 3 de agosto de 1492 do Porto


de Palos, com três caravelas: Santa Maria, Pinta e Nina, e em 12 de outubro de 1492,
somente mais tarde, descobriram que era um novo continente que posteriormente
se chamaria América, terras essas que ele denominou de San Salvador e eram
chamadas pelos indígenas de Guanaani. Ao explorar outras ilhas do arquipélago
como Cuba, acabou homenageando D. João com o nome da ilha de Juana e no
Haiti com o nome de Hispaniola (SOUTO MAIOR, 1976).

UNI

As Viagens de Colombo

Conforme relato da primeira viagem, Colombo alcançou e tomou posse de ilhas


nos arquipélagos das Bahamas e das Antilhas, como Colba (Cuba) e Espanhola (Haiti e
República Dominicana), a partir das quais explorou as costas do norte, banhadas pelo mar
das Bahamas. Acreditava ter chegado às ilhas orientais que fariam parte da Ásia. Construiu
o forte La Navidad e encontrou algum ouro em Espanhola. A rebeldia de Martin Alonso e a
perda da Santa Maria não obscureceram o sucesso dessa viagem.

A segunda expedição, segundo Colombo, havia sido organizada para responder


às grandes expectativas de expansão territorial e de busca de riquezas; reuniu 17 navios
abastecidos para seis meses de viagem e uma tripulação de 1.200 membros, entre marinheiros,
militares e colonos. Colombo tomou posse de novas ilhas do arquipélago das Antilhas e deu
sequência à exploração de Cuba e de Espanhola, pelas costas do sul, no mar do Caribe;
iniciou a construção do assentamento de La Isabela, em Espanhola, e encontrou minas
de ouro (aluvião). Contudo, os problemas desse amplo empreendimento se ampliariam,
exacerbando confrontos entre os próprios viajantes e a exploração dos nativos.

A frota da terceira viagem era formada por seis navios, divididos em dois grupos.
Colombo modificou a rota para uma latitude mais próxima da linha equinocial, descobriu a ilha
de Trinidad e o delta do Orinoco, na atual Venezuela, tendo sido o primeiro europeu a avistar
terras continentais do novo mundo na sua porção sul. Dirigiu-se para o estabelecimento de
Santo Domingo, Espanhola, para defrontar-se com uma situação de guerra entre os próprios
castelhanos e de extermínio e sujeição dos nativos a trabalhos forçados para produção
de alimentos e mineração do ouro. As desavenças entre os colonizadores resultaram na
destituição de Colombo, que retornou como prisioneiro à Espanha.

FONTE: VELOSO FILHO, Francisco de Assis. A expansão europeia dos séculos XV e XVI:
contribuições para uma nova descrição geral da terra. Revista Equador (UFPI), v. 1, n. 1, p.
4-25, jun./dez., 2012, p. 7-8.

15
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

Colombo, depois que retornou à Espanha, efetuou ainda outras três


viagens nas terras que havia encontrado com apoio de Isabel, porém quando
ela faleceu, Fernando não quis mais ajudá-lo. No entanto, só descobriram que
não eram as Índias quando outro navegador fez o mesmo trajeto de Colombo
e concluiu que era uma nova terra e, como reconhecimento, recebeu o nome
América (SOUTO MAIOR, 1976).

Alguns estudiosos dizem que Colombo morreu sem saber que havia
chegado em um novo continente pela rota que havia traçado. A divulgação de
um novo caminho fez com que os portugueses ficassem preocupados, levando a
estabelecer direito de posse das terras encontradas (SOUTO MAIOR, 1976).

Primeiramente em 4 de maio de 1493 foi elaborado um documento


com o nome de Bula Inter Coetera assinado pelo papa Alexandre VI,
no qual ficava estabelecida a divisão de 100 léguas a oeste das Ilhas de
Cabo Verde para a Espanha e a leste para Portugal, porém esse acordo
não foi firmado, porque a Espanha teria muitas vantagens em relação
a Portugal. Então em 1494 Portugal e Espanha passaram a disputar a
posse das terras e acordaram um novo acordo conhecido como Tratado
de Tordesilhas o qual ficou estabelecido Tratado de Tordesilhas que
determinava a divisão das terras sendo pertencentes à Espanha 370
léguas oeste, e à Portugal 370 léguas a leste da ilha de Cabo Verde em
que outros países ficariam exclusos da partilha (RAINER, 2018, s.p.).

Com o Tratado de Tordesilhas (1494) firmado por Espanha e Portugal,


o Brasil seria de domínio português. O rei Francisco I, da França ironizou o
Tratado, questionando sobre onde estaria a cláusula do testamento de Adão, que
delegasse somente a Portugal e Espanha a posse das novas terras descobertas
(PRADO JÚNIOR, 1984).

NOTA

Bulas

Durante os séculos XV e XVI, o poder não se restringia aos reis, figurando como
sujeito no âmbito internacional, o Papa. Época em que o Sumo Pontífice exercia através do
seu poder temporal e espiritual significativa influência e interferência nos conflitos ocorridos
entre os Estados, quadro que começaria a ser modificado somente no século XVII, pelo
Tratado de Paz de Westfália (1648), quando os Estados passariam a ter menos influência do
Catolicismo

Interesses não só divididos entre os países ibéricos católicos, como compartilhado


com a Santa Sé, que ao mesmo tempo em que Portugal e Espanha avançavam em suas
conquistas, expandia junto dela sua jurisdição fora da Europa, com a conversão dos povos
não cristãos através de sua aculturação.

Desta forma, representou à intervenção papal a primeira base ou fundamento da


exploração, ocupação e colonização de terras ultramarinas por países da Europa, de maneira
a legitimá-la sob o ponto de vista religioso.

16
TÓPICO 1 | AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

Ainda nesse período é marcante a influência do papa como autoridade eclesiástica,


usando de seu poder, que se manifestava ou se exteriorizava, através dessas bulas que faziam
expedir.

Bula, palavra cujo conceito se faz necessário elucidar. A palavra bula significa,
etimologicamente, medalha ou selo. Como, porém, desde a antiguidade, fora empregada
para designar o selo de chumbo ou de ouro, que normalmente pendia das escrituras solenes
imperiais ou pontificiais, o seu âmbito de significado passou a compreender também os
próprios documentos selados [...].

FONTE: PONTIN, Rafael de Almeida Leme. As bulas e tratados dos séculos XV, XVI e XVIII na
história do direito brasileiro: seus reflexos na América portuguesa. Disponível em: <http://
www.salesianocampinas.com.br/unisal/downloads/art07cad04.pdf>. Acesso em: 22 jul. 2018.

O Tratado de Tordesilhas estabelecia que 370 léguas ao Oeste das Ilhas de


Cabo Verde pertenceriam à Espanha e a 370 léguas ao Leste seriam de Portugal.
Na figura a seguir, observa-se o novo acordo, firmado em Tordesilhas sobre a
distribuição dos territórios encontrados.

FIGURA 9 – TRATADO DE TORDESILHAS – 1494

FONTE: <https://i0.wp.com/files.professor-leandro.webnode.com.br/200000227-82a2284978/
cabral2.png>. Acesso em: 19 jul. 2018.

17
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

Depois de Colombo, outras viagens marítimas ocorreram. O navegador


Vicente Pinzón descobriu a foz do rio Amazonas em 1500; Vasco Nunes de Balboa
atingiu o Oceano Pacífico em 1513; Fernão Magalhães iniciou a primeira viagem
de circunavegação da Terra em 1519 e só foi completada em 1521 por Sebastião
d’el Cano (SOUTO MAIOR, 1976).

Para Mendonça (2002), assim como Portugal, a Espanha teve interesse


em conquistar novas terras. Com o poder centralizado, pode-se lançar ao mar
em busca de novas terras e metais preciosos, explorando o México (1519) e o
Peru (1532) e mais tarde as minas de Potosí (Bolívia). No século XVI, tornou-se
a maior potência europeia, obteve benefícios com os conhecimentos marítimos
proporcionados pelo pioneirismo de Portugal, a expansão marítima.

Após o anúncio das terras da América, os espanhóis só se ocuparam


com a política colonial quando as riquezas dos incas e astecas começaram a ser
saqueadas. Portugal lutava a mão armada contra os asiáticos, enquanto que os
espanhóis viam os povos na América como povos atrasados e que poderiam
explorar sem usar armas. Retiravam de suas colônias como México e Peru, a
partir de 1541, cerca de 300 toneladas de prata com facilidade (SIMONSEN, 1967).

Em Potosi, na Bolívia (1545 e 1558), foram descobertas minas de prata e as


Zacatecas e Guanajuato no México. Em meados do século XVII, a prata englobava
mais de 99% das exportações da América hispânica (GALEANO, 1989).

UNI

Relato sobre o tesouro extraído da América pelos espanhóis


“[...] nossos espanhóis descobriram, percorreram, converteram enormemente terras em
sessenta anos de conquista. Nunca nenhum rei e nenhuma nação percorreram e subjugaram
tantas coisas em tão pouco tempo, como nós fizemos, nem fizeram nem mereceram o
que nossas gentes fizeram e mereceram pelas armas, pela navegação, pela pregação do
Santo Evangelho e pela conversão dos idólatras. É por essa razão que os espanhóis são
perfeitamente dignos de louvor. Abençoado seja Deus que lhes deu essa graça e esse poder”
(MENDONÇA; PIRES, 2002, p. 22).

Segundo Mendonça (2002), os metais extraídos da América espanhola não


ficaram somente na metrópole, pois mesmo antes de 1530 tiveram que enviar
como forma de pagamento para outros países, inclusive para os Países Baixos.

O modelo de colonização que permeou as colônias espanholas na América


foi de exploração com mão de obra escrava, que se viu vitoriosa pelos milhares de
toneladas de metais preciosos e frágil diante de outras nações concorrentes como
Holanda, Inglaterra e a França.

18
TÓPICO 1 | AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

Caro acadêmico, na figura a seguir, você pode observar a divisão dos


territórios na América entre as nações europeias.

FIGURA 10 – DIVISÃO DOS TERRITÓRIOS ENTRE OS IMPÉRIOS COLONIAIS

FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:European_Empires.svg>. Acesso em: 19 jul. 2018.

Frente às riquezas encontradas pelos espanhóis de ouro e prata nas


Américas, quais as causas que levaram a Espanha entrar em decadência? Uma
das causas que pode ser elencada para essa decadência são os metais preciosos
que chegavam continuadamente até a Espanha e que abasteciam as colônias de
dominação espanhola que eram repassados para as indústrias de outros países.
Outra causa é que mesmo que a Espanha, assim como Portugal, tenha sido uma
das primeiras nações a explorar as Américas, também apareceram nesse cenário
outras nações que passariam a ser concorrentes da Espanha (SIMONSEN, 1967).

Simonsen (1967, p. 42) elencou alguns fatores que contribuíram para a


decadência da Espanha:

• Concorrência comercial: Holanda, Inglaterra e França.


• A Igreja tinha forte influência religiosa.
• Expulsão dos mouros e judeus que acabou atingindo o trabalho de produção
industrial e agrícola.
• Aumento de uma classe de nobres que não trabalhavam.
• Empréstimos adquiridos com banqueiros italianos e alemães para pagar
dívidas de guerras.

Nota-se que dois países ibéricos não conseguiram manter o monopólio


das Américas sem a interferência de outros países concorrentes.

19
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

A descoberta de novos caminhos para o Oriente e para as Américas fez


com que outras nações europeias passassem a disputar e se apropriar das terras
em busca do lucro do comércio mercantilista. Enquanto a tão poderosa Espanha
perdia seus domínios, a sua concorrente Portugal continuou com seu império
colonial.

6 MUDANÇAS E CONSEQUÊNCIAS DA EXPANSÃO


MARÍTIMA DO SÉCULO XV
As grandes navegações do século XV foram propulsoras de nações
europeias como Portugal e Espanha que passaram por várias mudanças nas
estruturas econômicas, sociais, políticas, religiosas e culturais. Primeiramente
com a implantação de uma tecnologia náutica que puderam fazer longas viagens
dominando mares desconhecidos para chegar em outros continentes conhecidos
como: Ásia e África em busca das chamadas especiarias, que eram fonte de
riqueza naquela época e que ajudaram a restabelecer a economia dessas nações.

Em relação à sociedade, ocorreu uma união entre a classe burguesa e o


rei por interesses econômicos, extinguindo o poder dos senhores feudais. Estava
nascendo, com essa nova visão econômica, a revolução comercial com um
governo centralizado, moeda única e interesses em outros lugares que passaram
a ser suas colônias. E, consequentemente, os povos nativos dessas regiões foram
explorados, as suas riquezas foram extraídas e a eles foi imposto mão de obra
escrava. No século XV, a economia da Europa estava em expansão, impulsionada
pela burguesia das cidades. A população estava em crescimento. Todavia, havia
muitos obstáculos à expansão das atividades comerciais. Esses obstáculos foram
os fatores de natureza econômica dos descobrimentos.

No século XV, a economia da Europa estava em expansão, impulsionada


pela burguesia das cidades. A população estava em crescimento. No entanto,
havia muitos obstáculos à expansão das atividades comerciais. Esses obstáculos
foram os fatores de natureza econômica dos descobrimentos. O quadro a seguir
apresenta as principais motivações que induziram estes reinos a lançarem-se ao
oceano e consequências.

20
TÓPICO 1 | AS GRANDES NAVEGAÇÕES MARÍTIMAS NO SÉCULO XV

QUADRO 2 – FATORES MOTIVADORES DAS GRANDES NAVEGAÇÕES E CONSEQUÊNCIAS

Fatores Interesses e consequências


Econômicos • descobrir novas rotas de comércio, pois
o Mediterrâneo estava dominado pelos
muçulmanos;
• descobrir novas terras para a agricultura;
• abrir novos mercados fornecedores de
matérias-primas, sobretudo de produtos
alimentícios;
• ampliar o mercado consumidor para os
produtos fabricados na Europa;
• adquirir metais preciosos para fortalecer as
moedas nacionais europeias.
Políticos O fortalecimento do poder real, que pôde
assim ajudar os comerciantes nas viagens
marítimas.
Sociais O enriquecimento dos comerciantes e artesãos,
que formavam a burguesia comercial.
Religiosos O interesse da Igreja e dos monarcas cristãos
da Europa em difundir o Cristianismo entre os
povos das novas terras descobertas.
Culturais Os progressos técnicos, com o desenvolvimento
dos estudos da Astronomia, e a descoberta de
novos instrumentos de navegação (bússola
e astrolábio), a construção de embarcações
apropriadas para as longas viagens e a
fabricação de armas de fogo, que facilitavam
a dominação dos povos primitivos.

FONTE: Santos (1984, p. 144-145)

É importante salientar que as nações como Portugal e Espanha dominaram


a expansão ultramarina do século XV, levando o comércio europeu a navegar
novas rotas como o oceano Atlântico e o Índico para o acesso às Índias, à África
e ao novo mundo, as Américas, conquistando novas terras, metais preciosos e
aculturando povos que ali encontraram.

21
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

DICAS

Assista ao vídeo intitulado Grandes navegações, que relata as tecnologias na


Era das Navegações. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=lS_UYBPSTds>.
Acesso em: 16 jul. 2018.

NOTA

Para saber mais sobre a Era das Navegações, na Espanha, assista ao filme
A Conquista do Paraíso de 1492, que narra toda a viagem do navegador genovês
Cristóvão Colombo e a descoberta da América em 1492, e o primeiro contato os índios.
Colombo conhece uma pessoa que poderá conseguir uma audiência com a rainha Isabel,
da Espanha e viabilizar sua expedição. Por meio do filme, você poderá analisar o papel
social dos banqueiros no contexto das Grandes Navegações. Disponível em: <https://www.
youtube.com/watch?v=ip9H_2MjWJY>. Acesso em: 14 jul. 2018.

22
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:

• Como era a estrutura econômica, social e política na Europa no final do século


XIV, conhecida como sistema feudal.

• Como Portugal e Espanha conseguiram encontrar novas rotas para o comércio


das especiarias além do mar Mediterrâneo, atingindo os continentes África e
Ásia, pelos oceanos Atlântico e Índico.

• Como Portugal se tornou o primeiro país a conquistar as navegações marítimas


por encontrar-se numa localização privilegiada e em um poder político
centralizado.

• O que foi o Périplo africano em que Bartolomeu Dias chegou até o Cabo das
Tormentas; isto é, o caminho para se chegar as Índias foi contornado pelo
continente africano.

• Que os espanhóis também passaram a concorrer em busca de novas terras


e riquezas que encontrassem além-mar por um caminho ao contrário dos
portugueses chegando as índias pelo Ocidente.

• A importância do Tratado de Tordesilhas para os espanhóis e portugueses no


qual ficou estabelecido que o limite de 370 léguas ao oeste da ilha de Cabo
Verde na África ficaria para a Espanha e 370 léguas ao leste da ilha de Cabo
Verde ficaria para Portugal.

• Os fatores que levaram ao declínio da Espanha foram: a concorrência comercial


com outras nações vizinhas como a Holanda, Inglaterra e França; o poder da
Igreja Católica sobre o trabalho e como a expulsão dos mouros e judeus atingiu
a produção industrial e agrícola na Espanha.

23
AUTOATIVIDADE

1 Explique por que Portugal foi o primeiro país a dar início às Grandes
Navegações.

2 Qual foi o interesse dos europeus nas Índias? E por quê?

3 Explique por que Portugal não aceitou a Bula Inter Coetera e foi estabelecido
um novo acordo conhecido como Tratado de Tordesilhas.

4 Explique por que as especiarias eram tão importantes para o mercado


europeu no século XV.

5 O que levou a Espanha, no século XV, a entrar na corrida das Grandes


Navegações Marítimas?

6 Descreva como os espanhóis chegaram ao novo mundo.

7 Elabore um texto sobre as principais características das grandes navegações


portuguesas no século XV, seguindo o mapa conceitual.

8 Leia o trecho do diário de Colombo e em seguida analise como ele viu os


povos ao chegar no novo continente.

Trechos do diário da descoberta da América por Cristóvão


Colombo ao encontrar outros povos.

“O que se segue são palavras textuais do Almirante, em seu livro


sobre a primeira viagem e descobrimento dessas Índias: Eu – diz ele –,
porque nos demonstraram grande amizade, pois percebi que eram pessoas
que melhor se entregariam e converteriam à nossa fé pelo amor e não
pela força, dei a algumas delas uns gorros coloridos e umas miçangas que
puseram no pescoço, além de outras coisas de pouco valor, o que lhes
causou grande prazer e ficaram tão nossos amigos que era uma maravilha.
Depois vieram nadando até os barcos dos navios onde estávamos, trazendo
papagaios e fio de algodão em novelos e lanças e muitas outras coisas, que
trocamos por coisas que tínhamos conosco, como miçangas e guizos. Enfim,
tudo aceitavam e davam do que tinham com a maior boa vontade. Mas
me pareceu que era gente que não possuía praticamente nada. Andavam
nus como a mãe lhes deu à luz; inclusive as mulheres, embora só tenha
visto uma robusta rapariga. E todos os que vi eram jovens, nenhum com
mais de trinta anos de idade: muito bem-feitos, de corpos muito bonitos e
cara muito boa; os cabelos grossos, quase como o pelo do rabo de cavalos,
e curtos, caem por cima das sobrancelhas, menos uns fios na nuca que

24
mantêm longos, sem nunca cortar. Eles se pintam de preto, e são da cor dos
canários, nem negros nem brancos, e se pintam de branco, e de encarnado,
e do que bem entendem, e pintam a cara, o corpo todo, e alguns somente
os olhos ou o nariz. Não andam com armas, que nem conhecem, pois lhes
mostrei espadas, que pegaram pelo fio e se cortaram por ignorância. Não
tem nenhum ferro: as suas lanças são varas sem ferro, sendo que algumas
têm no cabo um dente de peixe e outras uma variedade de coisas. Todos,
sem exceção, são de boa estatura, e fazem gesto bonito, elegantes. Vi alguns
com marcas de ferida no corpo e, por gestos, perguntei o que era aquilo
e eles, da mesma maneira, demonstraram que ali aparecia gente de outras
ilhas das imediações com a intenção de capturá-los e então se defendiam. E
eu achei e acho que aqui vêm procedentes da terra firme para levá-los para
o cativeiro. Devem ser bons serviçais e habilidosos, pois noto que repetem
logo o que a gente diz e creio que depressa se fariam cristãos; me pareceu
que não tinham nenhuma religião. Eu, comprazendo a Nosso Senhor, levarei
daqui, por ocasião de minha partida, seis deles para Vossas Majestades, para
que aprendam a falar. Não vi nesta ilha nenhum animal de espécie alguma,
a não ser papagaios”. Todas as palavras que acabo de transcrever são do
Almirante e nelas se refletem as impressões que colheu no primeiro contato
com os índios”.

FONTE: COLOMBO, Cristóvão. Diários da descoberta da América: as quatro viagens e o


testamento. Disponível em: <http://www.lpm.com.br/livros/Imagens/diarios_da_descoberta_
da_america.pdf>. Acesso em: 21 jul. 2018.

25
26
UNIDADE 1
TÓPICO 2

FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E


EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

1 INTRODUÇÃO
As condições em que o Brasil foi ocupado são decorrentes das
transformações históricas que se consolidaram entre o século XV e XVI e que
derivou a denominação de economia-mundo europeia. Para Wallerstein, a
economia-mundo era algo diferente, um sistema mundial, não porque englobava
todo o mundo, mas incluía impérios, cidades-Estado e as nações-estado. Nesse
sentido, a colonização é inerente a este sistema mundial que se configurava
(MENDONÇA; PIRES, 2002). Como se viu no tópico anterior, todos estavam
interessados no comércio além do continente europeu, o que permitiu o
desenvolvimento da expansão ultramarina.

Então, você já pensou por que foram os portugueses que colonizaram o


Brasil?

O pioneirismo português se deu em decorrência do fechamento do


Mediterrâneo pelos turcos que dominaram Constantinopla, em 1453. Portugal,
devido a sua condição geográfica, da centralização do poder monárquico, foi
privilegiado na corrida por novas rotas de comércio com o oriente (MENDONÇA;
PIRES, 2002). De acordo com Prado Júnior (1976), o termo colonizar como era
visto antes da colonização da América sofreu alterações. Isto se explica pelo
fato de porque o novo continente não apresentava uma população que oferesse
produtos para fins mercantis, além disso, eram terras hostis e primitivas. Neste
sentido, decorreu a necessidade de povoar o novo mundo, fundar povoamentos
capazes de administrar as benfeitorias, administração e armada.

Neste tópico discutiremos como os portugueses foram pioneiros e iniciaram


a ocupação e quais os principais objetivos econômicos que se estabeleceram para
o novo mundo que estava sendo desbravado.

27
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

DICAS

Indicação de filme: A colonização, disponível em: <https://www.youtube.


com/watch?v=zpNr6KKH8d8&t=432s>. Acesso em: 15 jul. 2018. Resumo: o documentário
apresenta os costumes dos primeiros colonos portugueses e sua interação com os povos
nativos, bem como os desdobramentos econômicos de suas atividades.

2 INÍCIO DA OCUPAÇÃO PORTUGUESA NO BRASIL


O pioneirismo português em colonizar novas terras já havia se
apresentado em ilhas do Atlântico, ainda no século XVI. Os novos desafios se
apresentavam em como estabelecer a fonte mais segura de rendimentos dos
novos territórios conquistados. A princípio, o extrativismo é a primeira fonte
de recursos, como a extração do pau-brasil, metais preciosos, entre outras
atividades extrativas (PRADO JÚNIOR, 1976). Esta ocupação só seria viável se os
portugueses encontrassem meios de acumular riquezas. Portanto, expedições de
franceses e holandeses constituiam-se numa ameaça permanente, o que restava
aos portugueses era a ocupação como meio de preservar o domínio da colônia e
monopólio dos recursos do seu território (MENDONÇA; PIRES, 2002).

Logo, é fácil compreender porque a colonização se alicerçou primeiro no


extrativismo e a primeira cultura que foi incentivada foi a de cana-de-açúcar, pela
questão dos altos lucros gerados pelo açúcar no mercado europeu. De acordo
com Furtado (1980), o fato dos primeiros exploradores não terem encontrado
metais preciosos frustrou-os, mas Cabral teve o cuidado de assegurar a posse das
Terras de Vera Cruz (denominação dada para o Brasil inicialmente), deixando
alguns exploradores para conviver com os nativos, e assim aprender o idioma e os
costumes, para facilitar a vinda das próximas esquadras. Várias outras expedições
vieram entre os anos de 1501 a 1503, quando Américo Vespúcio atracou na Bahia
de Todos os Santos, e construíram um forte.

Entretanto, o Brasil não apresentava condições iniciais para a exploração


de metais preciosos e estabelecer comércio, como era com o Oriente, posto que
os nativos ainda viviam em condições da era pré-neolítica (FURTADO, 1980).
Então, como o Brasil entra nos jogos do interesse da Coroa Portuguesa, que havia
se transformado em um dos principais atores mais arrojados do capitalismo
comercial?

28
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

UNI

Roland Mousnier assim descreveu os habitantes do território brasileiro antes da


chegada dos portugueses: “Desde a Venezuela até o Rio da Prata encontravam-se dispersas
tribos Tupis-Guaranis. As mais conhecidas eram as dos Tupinambás que, no século XVI e
no começo do século XVII, ocupavam a costa oriental do continente americano, desde
a foz do Amazonas até a do Rio da Prata [...] Os Tupis-Guaranis encontravam-se num
estágio do neolítico anterior ao dos Maias. Ignoravam o metal, salvo o ouro, mas este fora
introduzido por via comercial. Serviam-se de machados de pedra azul-negra, de gume
semicircular, fabricados todos os meses, no primeiro dia de quarto crescente. Durante o
trabalho, suas mullheres e filhas dançavam e cantavam à luz da lua. Assim, acreditavam que
seriam invencíveis. Fabricavam facas de pedra. Dentes de pecaris ou de roedores serviam
como buris ou conzeis. A concha de caracóis desempenhava muito bem o papel de plainas.
Espinhos recurvados funcionavam como anzois. O chuço endurecido ao fogo era o único
instrumento agrícola. Sua arma preferida era a maçã. Utilizavam também grandes arcos com
ponta de osso, de dente de tubarão ou cauda de arraia. Usavam escudos redondos, feitos de
couro de tapir, de madeira leve ou de casca de árvores ou construíam, com cascas, canoas
para 30 a 60 homens, nas quais remavam em pé. Eram hábeis navegadores [...] O essencial
de sua alimentação era-lhes fornecido pela agricultura. Praticavam a cultura da queimada,
na floresta. Cultivavam mandioca, milho, batata da Índia, feijão, amendoim, pimenta, abacaxi,
fumo, banana e cana-de-açúcar. Possuíam árvores de fruto, tais como caju, manga, mamão,
cabaceira. Acrescentavam a isto o produto de caça e da pesca”.

FONTE: MOUSNIER, Roland. As civilizações indígenas à chegada dos europeus. Apud


MENDONÇA, Marina Gusmão de; PIRES, Marcos Cordeiro. Formação econômica do Brasil.
São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002, p. 32.

A organização tribal desses povos indígenas os permitia viver do


extrativismo e de uma agricultura rudimentar. Não trabalhavam com os metais e
não atendiam às ambições do descobridor. Além disso, Portugal dispunha de uma
população de um milhão de habitantes no início do século XVI, o que dificultava
o envio de recursos humanos para povoar os novos territórios conquistados.
Entretanto, entre 1493 a 1520, o comércio do ouro foi intenso, bem como a
comercialização de produtos como tecidos, lenços e mantas por ouro, marfim,
escravos, goma-arábica entre outros, na costa africana como Canárias, Açores e
Cabo Verde, pois essas ilhas ofereciam a produção de açúcar, que tinha demanda
crescente no mercado europeu. Além do promissor comércio com o Oriente,
logo o Brasil estava num plano secundário (FURTADO, 1980). Assim, somente a
produção de um artigo tão demandado na Europa como o açúcar justificaria os
riscos e o custo do transporte oceânico, poderia gerar a lucratividade necessária
para os portugueses (PIRES, 2010).

29
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

DICAS

Para saber mais sobre o assunto, leia o artigo intitulado Imagens do Brasil: o
século XVI, que aborda as percepções dos primeiros exploradores do Brasil sobre os costumes
dos nativos no século XVI. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0103-40141990000300005>. Acesso em: 16 jul. 2018.

Para facilitar sua compreensão dese período histórico, observe a síntese


no quadro a seguir com os principais acontecimentos que marcaram as fases da
colonização portuguesa e a ocupação no Brasil. De acordo com Furtado (1980), a
partir de 1808, o Brasil pode ser considerado independente economicamente de
Portugal, devido à mudança da monarquia portuguesa para o Brasil.

QUADRO 3 – FASES DA ECONOMIA PORTUGUESA


Período Fases
Período áureo do comércio e do poderio
1500 - 1580
português que, de fato, se estendeu até 1595.
Período filipino em que Portugal esteve
1580 - 1640 submisso à Coroa Espanhola, ocorrendo a
fragmentação de sua economia.
Período que se caracteriza pelas concessões
comerciais feitas pela Coroa portuguesa às
1640 - 1668
grandes potências, principalmente à Inglaterra,
para manter seu império.
Período em que ocorreu a restauração
1668 - 1777
econômica de Portugal.
1777 – 1808 Período em que o comércio floresceu.

FONTE: Furtado (1980, p. 10)

Cabral enviou ao Rei D. Manuel I amostras do pau-brasil das novas terras


e o apresentou como a única mercadoria de valor que poderia gerar demanda
dos mercadores portugueses, devido ao interesse por substâncias tintoriais. A
expedição de 1501 retornou a Portugal com um carregamento dessa madeira,
e D. Manuel tornou o pau-brasil monopólio da Coroa. Além disso, D. Manuel
arrendou a D. Fernão de Loronha (um rico mercador), que parece que teve vários
associados (SIMONSEN, 1967).

O que parece certo é que de fato esse arrendamento, feito inicialmente


por três anos, foi com ele ou com outros renovado por algumas vezes;
que, por exigência do arrendatário, o soberano português concordou
em suprimir a importação do Brasil asiático e, que, por sua vez, o
arrendatário ou, mais tarde, o arrendatário, porque parece que Fernão
de Loronha teve posteriormente vários associados, se obrigaram
a mandar anualmente três naus à terra de Santa Cruz, a descobrir
300 léguas de costa e pagar 1/5 do valor da madeira ao soberano

30
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

português. Obrigaram-se, ainda, a instalar fortalezas para a defesa dos


novos territórios (SIMONSEN, 1967, p. 53).

A exploração do pau-Brasil seria conveniente para a Coroa portuguesa, e


os comerciantes reconheceram o valor do que encontraram em abundância nas
terras de Santa Cruz .

UNI

Curiosidade sobre o Rei de Portugal e 1º Rei do Brasil: Quem era D. Manuel I?

Décimo quarto rei de Portugal, nono filho do infante D.


Fernando e de D. Brites. 
“Filho adotivo do príncipe D. João II, devido à morte do seu irmão D.
Diogo, o conduziu a que fosse aclamado rei em Alcácer do Sal (27 de
outubro de 1495). Realizou três casamentos, o primeiro em 1497 com D.
Isabel (viúva de D. Afonso), o segundo em 1500 com a infanta D. Maria
de Castela e o terceiro em 1518, com D. Leonor, irmã de Carlos V. 
Como político, teve sempre em conta o interesse nacional.
Recebeu o governo exatamente no momento em que a Nação
se preparava para alcançar a mais elevada projeção. Os vinte e seis
anos do seu reinado conheceram grande atividade nos domínios
da política interna, da política ultramarina e da política externa. 

1) O poder que viera parar às suas mãos era forte, centralizado e o seu governo tendeu
abertamente para o absolutismo. Com efeito reuniu cortes logo quando subiu ao trono,
em Montemor-o-Novo e só mais três vezes, em 1498, 1499 e 1502, e sempre em Lisboa,
o que é significativo. Nas cortes de Montemor-o-Novo, toma medidas no sentido duma
centralização mais profunda de toda a administração pública: mandou confirmar todos
os privilégios, liberdades e cartas de mercê, pelos principais letrados do reino que elegeu,
reforma os tribunais superiores e toma uma política de tolerância em relação aos nobres
emigrados por razões políticas e judeus castelhanos que D. João II reduzira à escravatura.
Pelo decreto de 1496 obriga todos os judeus que não se quisessem batizar a abandonar o
país no prazo de dez meses, sob pena de confisco e morte. Pela lei de 4 de maio de 1497,
proibiu que se indagasse das crenças dos novos convertidos e, por alvará de 1499, dificulta
a saída do reino aos conversos. O objetivo era agradar aos Reis Católicos e ao mesmo
tempo, evitar que os judeus continuassem a ser um todo independente dentro do reino.
Pelas Ordenações Afonsinas, deixa de reconhecer individualidade jurídica aos judeus; faz a
reforma dos forais, com o fito económico de atualizar os encargos tributários e para eliminar
a vida local; em 1502 saiu o regimento dos oficiais das cidades, vilas e lugares (Livro dos
Ofícios); em 1509 o das Casas da Índia e Mina e em 1512 saiu o novo regimento de sisas.
Por outro lado, com D. Manuel inaugura-se o Estado burocrático e mercantilista, mandando
cunhar índios, o português ou escudo de prata. 
2) D. Manuel herdou o impulso dos descobrimentos. Partiu para a índia (8 de julho de 1497) a
armada de Vasco da Gama, que chegou a Calecut em 20 de maio de 1498. Em 1500 uma
armada comandada por Pedro Álvares Cabral, com o objetivo da Índia, rumou intencionalmente
(opinião atual) para sudoeste, atingindo a Terra de Santa Cruz. Soube D. Manuel em matéria de
política externa, usar de grande habilidade e diplomacia. No aspecto cultural, reconheceu o
atraso do ensino universitário, mandando promover a reforma da universidade, estabelecendo
entre 1500 e 1504 novos planos de estudo e uma nova administração escolar.

FONTE: O PORTAL DA HISTÓRIA. História de Portugal. Disponível em: <http://www.arqnet.


pt/portal/portugal/temashistoria/manuel1.html>. Acesso em: 17 jul. 2018.

31
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

3 O INÍCIO DAS ATIVIDADES ECONÔMICAS NO BRASIL


Entendido alguns aspectos relevantes da base da colonização, como sua
formação e expansão neste período, podemos avançar agora, para o contexto
de desenvolvimento das atividades econômicas iniciais e que determinaram os
rumos e a cultura produtiva por um longo período.

Começamos pela exploração do pau-brasil e suas relações com o


povoamento da colônia, em seguida, vamos apresentar como se deu a cultura do
açúcar e suas vantagens, e por fim, as atividades de mineração no século XVIII.

3.1 A EXPLORAÇÃO DO PAU-BRASIL E O POVOAMENTO


DA COLÔNIA
A exploração do pau-brasil no início da ocupação foi a mais relevante no
início da ocupação portuguesa do Brasil, mas como caracterizou Simonsen (1967),
pode-se dizer que foi uma destruição das florestas. O pau-brasil conhecido como
arabutã era cortado em grandes quantidades. Mas pode-se apontar, ainda, a
exploração de outras espécies vegetais como o ibirapitanga, que também fornecia
tintura e fornecia madeira para carpintaria. Também destacava-se o jacarandá. O
principal trecho de exploração da madeira tintorial era o Cabo de São Roque (RN)
e Cabo Frio (RJ), e entre Cabo de Santo Agostinho e o Rio Real. Prado Jr. (1976)
reforçou a destruição das florestas, por meio do tráfico tanto português como dos
franceses que se aproximavam da costa brasileira para carregar seus navios de
pau-brasil, e também contavam com os indígenas que traziam a mercadoria em
troca de objetos e ferramentas.

No entanto, a rentabilidade da mercadoria pau-brasil era baixa se


comparada com os outros produtos comercializados do Oriente. O interesse
em comercializar o produto começou a diminuir, quando o pau-brasil começou
a extinguir-se na costa e aumentou seu custo de exploração. Mas, como já
mencionado, havia outras riquezas vegetais que poderiam ganhar aceitação no
mercado europeu, e Portugal não podia deixar essas terras abandonadas com
seus arrendatários e sem defesa. Assim, decorrem as feitorias (FURTADO,
1980). De acordo Com Prado Jr. (1997), o que se fala de colonização nada mais é
do que a instalação das feitorias comerciais, estabelecendo um povoamento.

As feitorias foram definadas por Furtado (1980) como:

As feitorias eram construções rústicas, erguidas por grupos reduzidos


de homens – na maioria degredados, desertores e náufragos – sediados
no litoral e encarregados da derrubada e transporte de toros para a
praia, normalmente em local de fácil atracação das naus. O serviço era
executado com a colaboração dos indígenas, na base do escambo, pelo
qual recebiam quinquilharias que os deslumbravam. A feitoria tornava-
se, assim, um posto de resgate de toros de madeira com os indígenas,
que os derrubavam a machado e, muitas vezes, os carregavam de 15 a

32
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

20 léguas (90 a 120 quilômetros). Acumulada a madeira nas feitorias,


com a chegada das naus, os nativos transportavam os toros para
bordo, quando o serviço não era executado pela tripulação. Na falta
de feitoria, a tripulação das naus realizava o abatimento, o transporte
e o carregamento dos troncos” (FURTADO, 1980, p. 13).

As feitorias foram relevantes no processo de povoamento e colonização da


colônia. Em algumas feitorias ocorreram as primeiras tentativas de agroindústrias
açucareiras. Além disso, observou-se a intensa miscigenação entre portugueses e
indígenas (FURTADO, 1980).

O espírito aventureiro do português, a sua ânsia por prosperidade material


rápida o traria às terras brasileiras. Entretanto, embora as condições do novo
mundo se apresentaram muito difíceis para o habitante da Ibéria, os portugueses
se demonstraram capazes de aprender com os nativos e se adaptar às condições do
clima, geográfica e alimentação para melhor sobreviver (HOLANDA, 1995). Essa
índole aventureira e a capacidade de adaptação acrescida da expectativa dos lucros
impuslsionaram os colonos para desbravar as terras do Novo Mundo, o Brasil.

3.2 O POVOAMENTO E O FORTALECIMENTO DE


ATIVIDADES ECONÔMICAS NA COLÔNIA
Em 1530, D. João III (1521-1557) permitiu que uma expedição com o
objetivo de colonizar fosse comandada por Martim Afonso de Sousa. Este fez
reconhecimento do litoral ao sul, e fundou na ilha de São Vicente, a primeira
vila no Brasil, em 1532. Dessa forma, seu trabalho colonizador deixou espécies
de plantas, gado e até mesmo escravos da Guiné em vários lugares do litoral,
especialmente em São Vicente. Entretanto, a Coroa portuguesa, neste momento,
não tinha como fazer grandes investimentos na colonização de tão extensas
terras e uma ampla costa marítima, assim surgem as donatarias. As donatarias já
haviam sido adotadas pelos portugueses nas ilhas atlânticas (FURTADO, 1980).
Os portugueses também tinham medo da invasão dos franceses, a ocupação
da colônia por meio de doações de terra seria uma solução para o povoamento
(MENDES, 2012).

No Brasil os territórios seriam doados e divididos entre a iniciativa


privada (FURTADO, 1980):

A área do Brasil de então, estimada em cerca de 80.000 léguas


quadradas (480.000 km2), foi dividida em 14 lotes de 50 léguas de
costa em paralelas perpendiculares à linha de Tordesilhas. E esses
lotes foram doados – entre 1534 e 1536 – a doze donatários ou capitães,
aos quais eram delegados poderes para governar soberanamente,
administrar justiça e mobilizar recursos para lutar contra o eventual
invasor. Eram, na maioria fidalgos, e muitos, financiados por capitais
estrangeiros. O total das áreas doadas abrangia, de modo geral, um
terço do atual território brasileiro. Foram criadas, posteriormente,
outras donatarias, pela expansão da fronteira política e pelo valor
econômico adquirido por certas regiões (FURTADO, 1980, p. 16).

33
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

Desses doze donatários, indivíduos de pouca expressão econômica e


social, apenas dois tiveram êxito, sendo um amplamente auxiliado pelo Rei, os
demais fracassaram e alguns perderam tudo e até mesmo a vida na colonização
(PRADO JÚNIOR, 1976). Os donatários tinham direito de deixar suas terras aos
seus sucessores, fez com que as capitanias também tivessem a possibilidade de
serem hereditárias. A receita da Coroa Portuguesa advinha das condições que
foram impostas nestas cartas de doação e que também lhes concediam direitos
aos donatários (quadro a seguir):

QUADRO 4 – DIREITOS DOS DONATÁRIOS

Imposições da Coroa Portuguesa


Uso efetivo de 20% das terras da donataria, sendo que os 80% restantes deveriam ser divididos
em sesmarias entregues aos cristãos que as requeressem para cultivar, mediante o pagamento
de tributo.
Exploração das marinhas de sal, moendas de água e quaisquer engenhos, não podendo, inclusive,
outra pessoa instalá-las sem sua prévia licença e sem lhes pagar o foro devido.
Escravização dos indígenas em número limitado e autorização para a venda de uma certa
quota – em média, 19 indígenas –, por ano, no mercado de Lisboa.

Recebimento de 50% do valor do pau-brasil e do pescado, que eram monopólio da Coroa


portuguesa.

Cobrança de impostos, principalmente da redízima que correspondia a 10% da dízima recolhida


pelo Tesouro Real.

FONTE: Furtado (1980, p. 16)

UNI

VOCÊ ENTENDEU O QUE ERAM AS DONATARIAS?

A Coroa Portuguesa dividiu em lotes as terras e doou para 12 donatários ou capitães. Assim,
a Coroa assegurava-se do apoio da iniciativa privada para iniciar o processo de colonização,
com pouco investimento e além de tudo, conseguiria estabelecer novas receitas.

Os direitos e deveres dos donatários eram, de acordo com Simonsen (1967,


p. 83):

1º) obrigaram-se, com sua gente, filhos, agregados ou escravos a servir com o
capitão em caso de guerra;
2ª) pagarem ao alcaide-mor das vilas e povoados os foros, direitos e tributos que
se pagavam no reino, de acordo com as ordenações (para fazer mercê aos
colonos e donatários, comprometia-se El-Rei a não consentir em que houvesse,
em tempo algum, na capitania, direitos de sisa, nem de saboaria, nem tributo
de sal, nem outro algum, além dos que se consignavam no foral);
34
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

3ª) direito de pedir e receber sesmarias sem maiores ônus que o dízimo devido ao
Mestrado de Cristo;
4ª) o serviço de culto, pago por El- Rei.

A vantagem para os donatários é que podiam enviar qualquer produto aos


mercados estrangeiros sem pagar impostos (com exceção de artigos estabelecidos
pela Coroa). Os navios dos senhores que viessem do reino ao Brasil também
estavam isentos de impostos, contanto que tivessem pago nas alfândegas do
reino. O comércio entre os capitães e os moradores de outras capitanias também
estava isento de impostos. E os navios não podiam ser carregados sem a licença
dos capitães (SIMONSEN, 1967).

O colono era um colono branco que buscava recursos para a produção


de bens e produtos de valor comercial e o trabalho era recrutado por meio da
escravidão, seja do negro africano ou dos nativos indígenas (PRADO JÚNIOR,
1997). De acordo com Mendonça e Pires (2002), o perfil dos colonizadores que
desbravaram as terras brasileiras não valorizava o trabalho manual. Os poucos
artesãos que vieram para a colônia não se mantinham por muito tempo em seu
ofício. Esse desprezo pelas atividades manuais somado com as crenças da Igreja
Católica para manter a ordem feudal em Portugal resultaram na fraca instalação
da indústria de manufaturas em Portugal e se estendeu essa condição para a
colônia. A falta de sucessão nos negócios impedia o aumento da produtividade
e desenvolvimento produtivo. A falta de interesse pelos trabalhos manuais
e a percepção católica são fatores apontados como impeditivos ao progresso
econômico e desenvolvimento da indústria manufatureira no Brasil.

Como veremos na sequência, o Brasil colônia fortaleceu sua economia


pautado em ciclos econômicos. A agricultura de monocultura de grande
propriedade rural apresentava um problema que desde os primeiros colonos que
vieram para o Brasil já identificaram, a necessidade de abastecimento. No entanto,
vejamos primeiro como se estabeleceu a plantation de cana-de-açúcar para depois
discutirmos os problemas de abastecimento.

3.3 A CULTURA DO AÇÚCAR NA COLÔNIA


A orientação da Coroa portuguesa em povoar a Colônia e utilizar-se dos
donatários com seus investimentos próprios para tal fim marca a virada de uma
economia coletora para uma economia voltada para a produção de gêneros que
tivessem interesse mercantil na Europa, neste caso surgem as plantações de cana-
de-açúcar. Dessa forma, há a intensificação do tráfico negreiro como mão de obra
escrava para a produção de açúcar no Brasil.

O Brasil nasce como elo colonial inserido no modo de produção


capitalista. Desde o início da nossa formação econômica, política, social
e cultural nos realizamos como sistema produtor de mercadorias para
a exportação. Superada a fase coletora e extrativa, passamos a produzir
uma especiaria, o acúcar, para remunerar o capital comercial investido

35
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

nas plantations – grandes propriedades rurais monocultoras, baseadas


no trabalho escravo, cujo destino do produto era o mercado externo
(BORGES apud REGO; MARQUES, 2003).

A produção do açúcar foi marcante na formação econômica do Brasil.


Assim, o Brasil torna-se uma economia agroexportadora no mercado internacional,
fato que até hoje prevalece. Segundo Mendonça e Pires (2002), foi o cultivo da
cana-de-açúcar que fez com que Portugal mantivesse seu domínio sobre essas
terras por tanto tempo. A reorganização da produção em larga escala (Plantation)
da cana-de açúcar pelos portugueses até a implantação da indústria açucareira no
Brasil, garantiu altos lucros para a Coroa.

O açúcar era usado pelos europeus com fins medicinais e até o sec. XIV
era produzido em pequenas quantidades e a Europa importava como artigo de
luxo. O barateamento da produção por meio de novas técnicas de plantio de cana-
de-açúcar e produção possibilitou que atingisse mercados mais abrangentes.
Os portugueses contribuíram com o seu barateamento aumentando no século
XV a oferta do produto. Em 1496, o rei D. Manuel I teve que baixar decretos
para diminuir a produção, para tentar impedir que o preço da mercadoria caísse
(MENDONÇA; PIRES, 2002).

Devido ao clima brasileiro, já se esperava que essa cultura de cana-


de-açúcar prosperasse, além disso, o solo também apresentou-se propício.
Inicialmente, a costa brasileira se demonstrou com solos e clima favoráveis ao
seu cultivo. Destacou-se o extremo-nordeste, na planície litorânea (atualmente
é o Estado de Pernambuco), e a costa da baía de Todos os Santos. O sistema de
donatarias se estabeleceu mediante a doação de grandes extensões de terra, o que
determinou o tipo de propriedade no Brasil, de grandes senhores e latifundiários.
Assim, a cultura de cana-de-açúcar se estabeleceu em grandes propriedades o
que tornava a produção inviável para pequenos produtores. O latifúndio e
a monocultura serão os pilares da organização produtiva no Brasil. Assim, o
trabalho escravo tornou-se uma necessidade. Primeiro, pela diminuta população
portuguesa, segundo porque os portugueses não eram afeitos aos trabalhos
manuais e os colonos portugueses não emigrariam para o Novo Mundo com o
interesse de realizar trabalhos assalariados do campo (PRADO JÚNIOR, 1976).

Data de 1534 o primeiro engenho que produziu grandes quantidades de


açúcar no Brasil. Este engenho fundado por Martim Afonso de Souza, em São
Vicente. O primeiro engenho de Pernambuco tem registro de 1539 e o da Bahia,
de 1546. Por volta de 1560, aproximadamente 57 engenhos estavam produzindo no
Brasil, enquanto outros cinco estavam sendo construídos (MENDONÇA; PIRES,
2002). No Brasil, devido aos altos custos das instalações coloniais, devido à questão
da proteção e segurança, transporte e embarque, que os engenhos deveriam desde o
início de porte médio, produzindo acima de três mil arrobas anuais, que pudessem
chegar à produção acima de 10 mil arrobas (SIMONSEN, 1967).

Em 1548, estavam constituídas no litoral do Brasil 16 vilas e povoados que


exportavam para Portugal algodão, açúcar, fumo, pau-Brasil e outros produtos

36
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

da agricultura. Com a finalidade de garantir maior segurança ao trabalho dos


donatários devido à agressividade dos ataques indígenas e propiciar maior
cooperação entre as donatarias, o governo português criou, em 1549, o Governo
Geral do Brasil e Tomé de Sousa foi nomeado o primeiro Governador Geral do
Brasil (SIMONSEN, 1967).

A princípio, os colonos investiram na escravidão dos indígenas, mas não


foi sem luta. Por vezes, os indígenas tomavam de assalto os estabecimentos dos
colonos e destruíam tudo. A carta régia, datada de 1570, estabelecia que os nativos
poderiam ser aprisionados e escravizados se oferecessem resistência aos colonos
ou fossem agressivos. A escravidão indígena foi inteiramente sumplantada no
século XVIII. O processo da substituição da mão de obra indígena pela negra
foi feito até o fim do tempo colonial (PRADO JÚNIOR, 1976). Assim, constituiu-
se a estrutura da produção na colônia: monocultura, propriedade latifundiária e
trabalho escravo.

Os dados da demografia na época colonial são muito imprecisos “não


apenas o seu tamanho durante os mais de três séculos iniciais da formação
econômica brasileira, mas também os seus componentes regionais e sua dinâmica
e padrão de crescimento” (REGO; MARQUES, 2003, p. 14). Não se sabe com toda
segurança quando os africanos escravizados chegaram ao Brasil. Ao que tudo
indica podem ter aportado pela primeira vez nessas terras, na primeira expedição
oficial de povoadores de 1532 (PRADO JÚNIOR, 1976). A tabela a seguir apresenta
uma estimativa no século XVII de escravos africanos no Brasil, apresentadas por
autores diferentes de história econômica.

TABELA 1 – TRÁFICO DE ESCRAVOS AFRICANOS/SÉCULO XVII

Autores Estimativa
Roberto Simonen 350.000
Maurício Goulart 550.000
Philip Curtin 560.000

FONTE: Rego e Marques (2003, p. 15)

COMO ERA O NAVIO NEGREIRO?

O navio negreiro – ou “tumbeiro” – foi o tipo de cargueiro usado para


trazer mais de 11 milhões de africanos para serem escravizados na América.

“Em caravelas ou barcos a vapor, europeus, americanos e até mesmo


negros se metiam no “infame comércio”. Os traficados eram, na maioria,
meninos e jovens de 8 a 25 anos. Isso mudou nos últimos anos do tráfico.
“Tudo quanto se podia trazer foi trazido: o manco, o cego, o surdo, tudo;
príncipes, chefes religiosos, mulheres com bebês e mulheres grávidas”, disse o
ex-traficante Joseph Cliffer, em depoimento ao Parlamento Britânico, em 1840.

37
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

Como não havia fabricação de navios apenas para o comércio de escravos,


até hoje já foram identificados pelo menos 60 tipos de embarcações adaptadas
como tumbeiros. Se houve uma regra, é que eles ficaram menores e mais
velozes no século XIX, à medida que o tráfico se tornou ilegal e passou a ser
perseguido pela política antiescravista dos ingleses a partir da aprovação da
lei Bill Aberdeen, em 1845”.
FONTE: PARRON, Tâmis. Como era um navio negreiro na época da escravidão? 22 jun. 2010.
Revista Superinteressante. Disponível em: <https://super.abril.com.br/mundo-estranho/como-
era-um-navio-negreiro-da-epoca-da-escravidao/>. Acesso em: 19 jul. 2018.

A utilização do trabalho escravo de povos africanos resolvia o problema


de produção para o mercado doméstico e solucionava as necessidades de atender
ao principal mercado que era o externo. Além disso, o baixo custo para mantê-
los, em troca de subsistência, submetidos aos colonos por meios atrozes. Outro
aspecto era a rentabilidade que o tráfico negreiro gerava, pois consistiam numa
mercadoria que enriqueceu os comerciantes das principais cidades das capitanias
e províncias (PIRES, 2010). De acordo com com Prado Jr. (1976), o problema do
tráfico negreiro era a mortalidade devido às condições precárias de higiene que
estes vinham nos navios negreiros (figura a seguir). Em média, apenas 50% dos
escravos africanos chegavam vivos ao Brasil, e assim mesmo, em condições de
saúde complicadas. Desta forma, o seu valor era elevado, e somente as regiões
mais ricas poderiam aceder a sua compra.

FIGURA 11 – NAVIO NEGREIRO – QUADRO DE JOHAN MORITZ RUGENDAS

FONTE: <https://historiadesaopaulo.files.wordpress.com/2010/12/navionegreiro_poro_thumb.
jpg?w=452&h=278>. Acesso em: 5 dez. 2018.

Na tabela a seguir, podemos observar que o tráfico de escravos da África


não cessou, o que reforça a ideia de que o tráfico apresentava rentabilidade. No
período entre 1531 a 1820, a estimativa foi de 2.859.200 pessoas que desembarcaram
no Brasil escravizadas.

38
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

TABELA 2 – ESTIMATIVAS DE DESEMBARQUE DE AFRICANOS NO BRASIL (1531 – 1820)

PERÍODO TOTAL MÉDIA ANUAL


1531 - 1575 10.000 222
1576 - 1600 40.000 1.600
1601 - 1625 100.000 4.000
1626 - 1650 100.000 4.000
1651 -1670 185.000 7.400
1671 - 1700 175.000 7.000
1701 - 1710 153.700 15.370
1711 -1720 139.000 13.900
1721 - 1730 146.300 14.630
1731 - 1740 166.100 16.610
1741 - 1750 185.100 18.510
1751 - 1760 169.400 16.940
1761 - 1770 164.600 16.460
1771 - 1780 161.300 16.130
1781 - 1790 63.100 16.090
1786 - 1790 97.800 19.560
1791 -1795 125.000 23.370
1796 - 1800 108.700 21.740
1801 - 1805 117.900 24.140
1806 - 1810 123.500 23.580
1811 - 1815 139.400 32.770
1816 - 1820 188.300 37.660

FONTE: IBGE (1990 apud PIRES, 2010, p. 19)

DICAS

Para fixar melhor os conteúdos, assista aos seguintes documentários:

• A escravidão no Brasil. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=KC2Hiw


3wG4c>.Acesso em: 19 jul. 2018.

Documentário feito pela BBC aborda desde o início da colônia, os ciclos econômicos
e enfatiza o sistema produtivo e de trabalho escravo imposto pelos portugueses no Brasil.

Com a alta geral dos preços das mercadorias, devido ao fluxo de ouro e prata
encontrado pelos espanhóis, o preço do açúcar também acompanhou o mercado
internacional. Portugal, desde meados do século XV, já apresentava supremacia

39
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

na produção do açúcar no mercado internacional. Com o estabelecimento do


governo geral, Portugal estimulou a ascenção da indústria açucareira no Brasil.
Portugal tomou medidas de estímulo como na Capitania Real de São Salvador,
em que isentou de impostos por 10 anos os novos engenhos e também concedia
privilégios de nobreza aos senhores de engenho (SIMONSEN, 1967).

O engenho era a fábrica, compreendendo as instalações para o manuseio


e fabricação do açúcar. O nome de engenho foi utilizado posteriormente
também para designar a propriedade, suas terras e plantações, assim, engenho
e propriedade canavieira tornaram-se sinônimos. Entretanto, nem todas as
propriedades possuíam engenhos, devido ao custo das instalações necessárias.
Geralmente, nos engenhos, se produzia o açúcar e as destilarias produziam a
aguardente (PRADO JÚNIOR, 1976).

UNI

Como era o engenho?

“[...) O engenho é um estabelecimento complexo, compreendendo numerosas


construções e aparelhos mecânicos: moenda (onde a cana é espremida), caldeira, que
fornece o calor necessário ao processo de purificação do caldo; casa de purgar, onde se
completa essa purificação. Além de outras, o que todas as propriedades possuem é, em
regra, a casa-grande, a habitação do senhor; a senzala dos escravos; e instalações acessórias
ou suntuárias: oficinas, estrebarias, etc. Suas terras, além dos canaviais, são reservadas
para outros fins: pastagens para animais de trabalho; culturas alimentares para o pessoal
numeroso; matas para fornecimento de lenha e madeira de construção. A grande propriedade
açucareira é um verdadeiro mundo em miniatura em que se concentra e resume a vida toda
de uma pequena parcela da humanidade” (PRADO JÚNIOR, 1976, p. 38).

Nos engenhos poucos trabalhadores eram livres, a maioria era composta


pelo trabalho escravo, e para ser considerado um bom engenho geralmente tinha
entre 80 a 100 escravos. O emprego do trabalho escravo cresceu e se tem notícias
no século XVIII de engenhos com mais de 1000 escravos (PRADO JÚNIOR, 1976).

Durante o século XVII, a Companhia das Índias Ocidentais contribuiu,


financiando o plantio e comercialização do açúcar, o que decorreu na ocupação
efetiva das terras brasileiras. A produção do açúcar não chegou a desaparecer,
mesmo com outros ciclos se iniciando, como apresenta a tabela a seguir.

40
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

TABELA 3 – BRASIL: PRODUÇÃO DE AÇÚCAR – DADOS SELECIONADOS (1570 – 1760)

Número de
Ano Arrobas Valor em libras
engenhos
1570 60 180.000 270.406
1580 118 350.000 528.181
1600 200 2.800.000 n/d
1600 400 4.000.000 n/d
1630 n/d 1.500.000 2.454.140
1640 n/d 1.800.000 3.598.860
1650 n/d 2.100.000 3.765.620
1670 n/d 2.000.000 2.247.920
1710 650 600.000 1.726.230
1760 n/d 2.500.000 2.379.710

FONTE: Linhares (1996 apud PIRES, 2010, p. 15)

UNI

Você sabia...

“Na Idade Média, em Portugal, a palavra ´negro´ tornara-se quase sinônimo de


escravo, e com certeza no século XVI ainda tinha implicações de servilismo. Seu uso para
qualificar os índios patenteia o modo como os portugueses encaravam os africanos e os
indígenas, não tanto com respeito à cor da pele, mas à sua posição social e cultural em
relação aos portugueses. No decorrer do século XVI, o emprego comum de termo ´negro
da terra` desapareceu gradualmente à medida que aumentou o número de africanos
introduzidos na colônia. Esse desaparecimento foi, na verdade, concomitante à extinção da
escravidão indígena".

FONTE: MENDONÇA, Marina Gusmão de; PIRES, Marcos Cordeiro. Formação econômica
do Brasil. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002, p. 66.

Além do açúcar, iniciou-se a cultura do tabaco no começo do século XVII.


O tabaco era uma planta indígena e teve bastante aceitação na Europa. O tabaco
também servia de escambo na costa da África para o tráfico de escravos.

Basicamente, a economia da colônia estava centralizada na produção de


larga escala do açúcar e um pouco menos relevante de tabaco, e a cultura de
subsistência. Na economia de subsistência entrava a pecuária, que apresentava, na
época, baixa produtividade. Mas com rapidez as fazendas foram multiplicando-
se pelo crescente consumo no litoral (PRADO JÚNIOR, 1976). O gado brasileiro
colonial tem origem das raças ibéricas, e foram trazidos pelo portugueses,
“acréscido dos contingentes do Vice-reinado do Peru, via Paraguai, dos da região

41
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

platina, via Missões, Colônia do Sacramento e, finalmente, da contribuição


holandesa e francesa, durante a permanência destes europeus no Brasil”
(SIMONSEN, 1967, p. 165).

O problema da monocultura era a falta de alimentos para abastecer


os povoamentos na costa, desde o início da colônia um grave problema de
abastecimento teve que ser enfrentado pelos portugueses, inclusive pela
legislação, pois a maioria dos colonos apresentavam subnutrição. Os colonos que
chegaram estavam preocupados em construir instalações e gerar lucros, então,
não tinham tempo de se ocuparem com a agricultura de subsistência. Como os
nativos já praticavam a agricultura, houve um aprendizado e assimilição dos
costumes alimentares dos nativos. A agricultura de subsistência foi pautada nos
produtos que os próprios indígenas já cultivavam, como a mandioca, depois o
milho que também servia de forragem para a criação dos animais. Além disso, o
arroz e feijão começaram a ser cultivados pelos colonos europeus e as verduras
não tinham grande apreciação, mas a quantidade e variedade de frutas nativas
começaram a ser introduzidas na alimentação diária como a banana e a laranja
(PRADO, 1976).

No século XVIII, com o aumento da população nos povoamentos, o


problema do abastecimento alimentar começou a ficar mais grave o que levou a
serem estabelecidas medidas legislativas para obrigar os senhores de engenho a
produzir mandioca e gêneros alimentícios. As melhores terras, certamente, estavam
distribuídas para os grandes senhores de engenho que não se interessariam em
produzir gêneros para a subsistência e sim, dedicavam a empresa à produção de
açúcar que lhes conferia grande rentabilidade. Logo, o problema de alimentação
não seria resolvido facilmente, mesmo com leis (PRADO, 1976).

3.4 O CICLO DA MINERAÇÃO (SÉCULO XVIII)


A mineração contribuiu para povoar o interior do país. O número de
trabalhadores que se exigia para tal atividade, criava aglomerações e assim foram
fundadas várias cidades e vilas.

A mineração requisitava artigos para o consumo e sobrevivência dos


mineiros e construção de instalações, deste modo, o transporte com muares
também foi utilizado como facilitador inclusive para os carregamentos de ouro.
Dessa forma, a figura do tropeiro com a utilização de mulas seria um elemento
de ligação e comunicação entre o interior e a costa. No entanto, as minas de ouro
somente começaram a ser encontradas no Brasil e tomar importância econômica
para Portugal no início do século XVII. Portugal, após várias guerras estava se
refazendo e recém tinha conseguido sua independência do domínio do Reino de
Castela e incentivava a encontrar o metal precioso nas terras da África e Brasil.
Os primeiros achados massivos de produção de ouro foram em São Paulo e
Minas Gerais, a produção foi aumentando com a participação de Mato Grosso e
Goiás, a partir de 1720 a 1726 (SIMONSEN, 1967). Ademais do ouro, também, na

42
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

mesma época, foram encontrados diamantes, sendo o Brasil o primeiro grande


produtor moderno, tornando monopólio brasileiro no século XVIII. A atividade
mineradora sofreu, desde as primeiras descobertas, forte fiscalização e controle
da Coroa Portuguesa, o que gerou as primeiras tentativas de independência da
colônia (PRADO JÚNIOR, 1976).

A Coroa portuguesa cobrava como tributo a quinta parte de todo o ouro


extraído. Em 1702, foi criado o “Regimento dos superintendentes, guarda-mores
e oficiais deputados para as minas de ouro”. Ou seja, esta lei criava a Intendência
de Minas, com a administração de um superintendente em cada capitania que
se encontrasse ouro, seria criada uma dessas intendências, e se subordinava
diretamente ao governo metropolitano de Lisboa. Os achados de jazidas deveriam
ser comunicados à intendência da capitania respectiva (PRADO JÚNIOR, 1976).

Os rendimentos da Coroa portuguesa foram garantidos no século XVIII


pelo quintos do ouro e também pelas jazidas de diamantes, que se tornaram
monopólio do Estado. Houve aumento dos preços dos produtos de exportação
do Norte e Nordeste, e assim aumentou-se o dízimo ao Rei. Além disso, com o
aumento da população aumentou o tráfico de africanos escravizados, refletindo
nas taxas alfandegárias, o monopólio do tabaco, do sal e do sabão e outras rendas
auferidas devido ao imposto de circulação das mercadorias no interior da colônia,
aumentava o rendimento da Coroa portuguesa. O século XVIII foi de fartura
para a Coroa e a reconstrução de Lisboa foi paga com rendas advindas do Brasil
colônia (SIMONSEN, 1976).

A tabela a seguir apresenta o apogeu e o declínio do ciclo da mineração


do ouro. Observe que no final do século XVIII a produção de ouro já começa a
diminuir.

TABELA 4 – BRASIL – PRODUÇÃO DE OURO (1691-1820)


Período Nº anos Total kg Média anual kg
1691-1700 10 15.000 1.500
1701-1720 20 55.000 2.750
1721-1740 20 177.000 8.850
1741-1760 20 292.000 14.600
1761-1780 20 207.000 10.350
1781-1800 20 109.000 5.450
1801-1810 10 37.500 3.750
1811-1820 10 17.600 1.760
1821-1830 10 22.000 2.200
1831-1840 10 30.000 3.000
1841-1850 10 24.000 2.400

FONTE: Simonsen (1967, p. 298)

43
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

A decadência do ciclo observa-se já em meados do século XVIII, dá-se,


fundamentalmente, porque o ouro encontrado nas jazidas começou a se extinguir,
devido às próprias características geológicas do ouro brasileiro que é de aluvião
e se encontrava nos leitos dos rios ou próximo as suas margens. A outra questão
era a técnica problemática de exploração e retirada do ouro das rochas matrizes,
faltava conhecimento técnico (PRADO JÚNIOR, 1976).

Desde o início da colonização faltaram moedas metálicas para as transações


comerciais. Com a diminuição dos preços do açúcar e do tabaco, os colonos foram
obrigados a pagar em moeda, pois os comerciantes da metrópole passaram a
rejeitar pagamentos em mercadorias. Dessa forma, o governo português resolveu
criar uma moeda para a colônia. Com a mineração e extração do ouro, o governo
português criou a Casa da Moeda do Brasil para poder fundir e criar moedas
de ouro e prata para resolver o problema dos meios de pagamento na colônia. O
papel-moeda só foi criado na colônia em 1771. Entretanto, o problema de escassez
de moedas ainda foi totalmente resolvido na colônia (FURTADO, 1980).

Para você fixar melhor os principais acontecimentos relacionados aos


ciclos econômicos, o quadro a seguir apresenta sintetizado cada período e suas
principais influências.

QUADRO 5 – RESUMO DOS CICLOS ECONÔMICOS NO BRASIL COLÔNIA (1500-1808)

Período Ciclo Fatos


A extração dessa madeira avermelhada utilizada no
tingimento de tecidos, consistiu na primeira atividade
1500-1532 Pau-brasil exploratória dos portugueses na colônia, que instalaram um
sistema de feitorias e utilizaram a exploração do trabalho
indígena ou o escambo para a obtenção da mercadoria.
O açúcar de cana, em meados do século XVI, obteve preços
no mercado europeu o que possibilitou a sua produção e
comercialização pelos portugueses no litoral brasileiro. A
1532-meados unidade produtiva era o engenho. O sistema administrativo
Açúcar
do século XVII da colônia era composto por um conjunto de capitanias
hereditárias, sob as formas produtivas do latifúndio e
da monocultura. O eixo da colônia estabeleceu-se no
Nordeste.
Contribuiu para o povoamento no interior do Brasil. Entre
1709 a 1721, finalmente, foram encontradas riquezas
Século XVIII Mineração minerais, como ouro, prata e pedras preciosas na capitania
de São Paulo e Minas Gerais. O esgotamento das jazidas
daria o fim desse ciclo no final do século XVIII.

FONTE: Pires (2010, p. 14-16)

Paralelo ao ciclo do ouro, outras atividades regionais tiveram importância,


como por exemplo a produção e a exportação do algodão no Maranhão no final
do séc. XVII e início do séc. XIX, a produção do charque na região Sul, no século
XVIII e XIX (PIRES, 2010).

44
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DA COLONIZAÇÃO: FORMAÇÃO E EXPANSÃO ECONÔMICA NO PERÍODO COLONIAL

UNI

Você sabe quando foi fundada a Casa da Moeda do Brasil?

“A Casa da Moeda do Brasil (CMB) é uma empresa pública vinculada ao Ministério


da Fazenda. Fundada em 8 de março de 1694, acumula 322 anos de existência. Foi criada no
Brasil Colônia pelos governantes portugueses para fabricar moedas com o ouro proveniente
das minerações. Na época, a extração de ouro era muito expressiva no Brasil e o crescimento
do comércio começava a causar um caos monetário devido à falta de um suprimento local
de moedas. Um ano após a fundação, a cunhagem das primeiras moedas genuinamente
brasileiras foi iniciada na cidade de Salvador, primeira sede da CMB, permitindo, assim, que
fossem progressivamente substituídas as diversas moedas estrangeiras que aqui circulavam.
Em 1695, foram cunhadas as primeiras moedas oficiais do Brasil, de 1.000, 2.000 e 4.000
réis, em ouro, e de 20, 40, 80, 160, 320 e 640 réis, em prata, que ficaram conhecidas como
a “série das patacas”. Desde então, por meio da produção de moedas e, posteriormente,
também de cédulas e outros produtos de segurança, a história da CMB se confunde com a
própria história do Brasil. Em 1843, utilizando técnicas “intaglio”, a Casa da Moeda imprimiu
o selo “Olho de Boi”, o primeiro das Américas e o terceiro do mundo. Após alguns anos
de atividade no nordeste do Brasil e em Minas Gerais, a CMB foi transferida para o Rio de
Janeiro. Operou em instalações provisórias e, mais tarde, em amplo prédio construído no
Campo de Santana, atual Praça da República, inaugurado em 1868 e hoje pertencente ao
Arquivo Nacional. Essa planta foi modernizada no período de 1964 a 1969, com o propósito
de assegurar ao país a autossuficiência na produção de seu meio circulante”.

FONTE: CASA DA MOEDA DO BRASIL. História da casa da moeda. Disponível em: <http://
www.casadamoeda.gov.br/portal/socioambiental/cultural/historia-da-cmb.html>. Acesso
em: 21 jul. 2018.

45
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Os portugueses quando chegaram no Brasil (Terra de Santa Cruz) encontraram


nativos que viviam em tribos nômades, praticavam a agricultura, mas em meio
a tanta abundância de fontes naturais de alimentação, a agricultura não era
essencial para a sobrevivência.

• A expansão marítima dos portugueses se deu com a finalidade de encontrar


produtos com valor e demanda no mercado europeu que justificassem tamanha
empresa e custos para cruzar o oceano.

• As buscas por ouro e prata pelos portugueses no início da colonização foram


frustradas e a primeira atividade econômica que gerou rentabilidade para
os portugueses foi a extração do pau-brasil, que era usado no tingimento de
tecidos.

• A organização da colônia a princípio se deu por meio das feitorias, que também
foram responsáveis por organizar o comércio e estabelecer o povoamento.

• O estabelecimento da produção do açúcar se deu por razões do aumento do


preço no mercado europeu e aumento pela demanda desta mercadoria. O
clima e solo no litoral brasileiro favoreciam o cultivo da cana-de-açúcar. Para
estimular o desenvolvimento da atividade, o Governo português estabeleceu
um modelo de donatarias que mais tarde seriam hereditárias também. Este
modelo estimulou o investimento privado e o povoamento na colônia. O
desenvolvimento do ciclo do açúcar pautou-se em monocultura, produção em
escala, grande propriedade e trabalho escravo.

• O declínio do ciclo do açúcar e os achados de metais preciosos em Minas Gerais


e São Paulo direciona as atividades econômicas para a mineração. A mineração
contribuiu para a interiorização do povoamento no Brasil. O trabalho escravo
ainda permanecia. A Coroa portuguesa buscava enrigecer o controle das
atividades de mineração desde o início, cobrando tributos, criando medidas de
controle.

46
AUTOATIVIDADE

1 Descreva as principais motivações que trouxeram os primeiros colonos para


o Brasil.

2 Explique como foi a estratégia de ocupação das terras brasileiras e quais os


principais produtos que tornaram-se alvo para o comércio externo.

3 Por que a Coroa portuguesa estabeleceu as donatarias na colônia? Como


foram organizadas?

4 Por que o cultivo da cana-de-açúcar cresceu na colônia e o engenho


transformou a economia colonial?

5 Discorra sobre a importância da mineração no Brasil colônia para as rendas


da Coroa Portuguesa e como as descobertas de ouro evoluíram no período
colonial?

6 Quais foram os motivos que levaram ao declínio da exploração da mineração


no Brasil?

47
48
UNIDADE 1
TÓPICO 3

O MODELO PRIMÁRIO EXPORTADOR NO BRASIL

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, você entenderá como se deu o modelo primário exportador
no Brasil no período do século XVIII ao XIX. Primeiramente é importante saber
como estava a política e a economia da França, Inglaterra e de Portugal neste
período e que influência tiveram para a economia do Brasil.

Portanto, a Europa passava por uma crise política, na qual Napoleão


queria ter o domínio, como alguns países não aceitaram essa imposição, inclusive
Portugal que era aliado da Inglaterra acabou quebrando a assinatura do Bloqueio
Continental firmado por Napoleão Bonaparte. Este é um dos motivos que fez
com que os portugueses viessem para o Brasil escoltados pelos ingleses. Portugal
determinou o fechamento de oficinas manufatureiras, porém, quando Dom João
chega ao Brasil, uma das medidas foi a abertura dos portos, o que facilitou o
comércio para os ingleses que obtiveram benefícios.

Muitas transformações ocorreram com a chegada de Dom João ao Brasil


como: sociais, econômicas, políticas e culturais. Outro embate é como foi a política
econômica no governo monárquico no Brasil, que passou por várias crises políticas,
sociais e econômicas. Retornando a Portugal, Dom João deixou seu filho D. Pedro I
para governar o Brasil e posteriormente D. Pedro II. A política econômica do Brasil se
deu por luta pela independência contra a Metrópole. O Brasil obteve as suas fontes de
riqueza desde a colonização com a produção da cana-de-açúcar, depois a mineração
e, com o esgotamento, passaram a investir em outros cultivos como o café, que foi um
dos maiores produdores. Outro aspecto que contribuiu para o desenvolvimento do
Brasil foi a utilização da mão de obra barata que foi a escravidão.

2 A INSTALAÇÃO DA FAMÍLIA PORTUGUESA NO BRASIL E


AS TRANSFORMAÇÕES NO BRASIL
Portugal, sob a administração de Pombal, assinou a Carta Régia de 1766,
que determinava o fechamento das oficinas dos ourives no Rio de Janeiro, que
acabou por prejudicar o desenvolvimento de outras atividades manufatureiras no
Brasil (FURTADO, 1980). A vinda do Regente D. João e a corte portuguesa para o
Brasil marcou profundamente a história e encerramento da colônia e propiciou a
independência deste da metrópole. Tão logo de desembarcar no Brasil, o regente
assinou o decreto que abriu os portos da calônia para todas as nações.

49
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

Além disso, revogou o alvará de 1785, que proibiu as atividades industriais


na colônia. Como a metrópole estava sob domínio napoleônico, a abertura dos
portos brasileiros era uma providência momentânea para não isolar-se do comércio
internacional. A Inglaterra acabou tornando-se a grande beneficiária dessa mudança
do Regente português ao Brasil. Pois um comandante inglês liderarou a retomada
de Portugal libertado das tropas francesas em 1809 (PRADO JÚNIOR, 1976).
Basicamente, a Inglaterra exportava para o Brasil artigos de algodão e lã, porcelanas,
metais brutos e trabalhados, produtos alimentícios e instrumentos náuticos. A
Inglaterra comercializava também diretamente os produtos primários brasileiros,
como o algodão em rama, tabaco, charque, couros, peles, baunilha, cachaça, anil,
cacau, madeiras, café, arroz, azeite de baleia, entre outros (FURTADO, 1980).

Enquanto a Inglaterra vivia a expansão do capitalismo industrial,


seguida por França, Bélgica, Holanda e Estados Unidos, os países ibéricos ainda
estavam atrelados aos princípios mercantilistas-colonialistas. O desenvolvimento
industrial daqueles países fez com que eles importassem mais produtos primários
em grande escala de países como o Brasil (FURTADO, 1980).

Portugal passou a ser insignificante no comércio brasileiro, após assinar o


decreto para a sua aliada Inglaterra, em 1810. O Brasil passaria por uma série de
mudanças econômicas e administrativas com a corte portuguesa instalada aqui.
O Rio de Janeiro tornou-se sede política, administrativa, econômica e financeira
da monarquia (PRADO JÚNIOR, 1976).

A continuidade do modelo econômico primário exportador se mantém após


1808, mas agora com o cultivo do café. Neste caso, inicia-se o ciclo do café pelos
mesmos motivos da produção do açúcar, os ganhos devidos à alta do preço nos
mercados europeus e americano. O Brasil também chegou a ocupar a hegemonia no
comércio internacional do café. O café passou a liderar o crescimento das exportações
brasileiras. Na segunda metade do século XIX, verificou-se uma forte expansão do
produto. Como consequência, estradas de ferro começaram a ser construídas, iniciou-
se a imigração estrangeira (a abolição dos escravos gerou necessidade de nova mão
de obra), o telégrafo, a fundação de casas bancárias, aumentou o mercado doméstico
e o número de aglomerações urbanas na parte Sul do país, tudo isso motivado para
atender à prosperidade da cultura do café que foi desencadeada (PIRES, 2010). No
começo da década de 1820, o engenho, apesar de decadente, continuava sendo a
principal atividade econômica. O café começava a despontar como uma atividade
importante, fundamentalmente no estado do Rio de Janeiro, em alguns lugares de
São Paulo e no Vale do Paraíba (REGO; MARQUES, 2003).

3 O CULTIVO DO CAFÉ E A CONSOLIDAÇÃO DO


MODELO PRIMÁRIO-EXPORTADOR
Em 1822, a Independência da metrópole foi proclamada. Entretanto, os
laços com a metropóle não permitiria uma mudança transformadora do cenário
brasileiro. Os latifundiários escravistas, que contribuíram para o rompimento
50
TÓPICO 3 | O MODELO PRIMÁRIO EXPORTADOR NO BRASIL

com a metrópole, tinham interesses divergentes entre D. Pedro I e esta classe


vitoriosa, fato que levou à instabilidade política do regente que abdicou do
Império. Estes fatos também contribuíram para a substituição do controle político
de Portugal do Brasil pela subordinação dos interesses da Inglaterra. Desta forma,
a perpetuação da exportação primária brasileira atendeu aos interesses britânicos,
como o mercado potencial brasileiro constituído por grande parte de escravos.
No entanto, D. Pedro II reinou mantendo por mais meio século a escravidão e
conservando o modelo agrário exportador (PIRES, 2010).

UNI

Você lembra dessa fase da história do Brasil?

“As  revoltas  ocorridas no  Período Regencial  preocupavam os


proprietários de escravos e terras. Temia-se que a anarquia levasse o
Império à desintegração. Liberais e conservadores, com medo de perder
o controle político da nação e em nome da preservação da unidade
nacional, concordavam que somente D. Pedro de Alcântara poderia
pacificar e unir o Império brasileiro”... Tivesse o país um Imperador e
a ordem se implantaria providencialmente..." A solução, portanto, era
antecipar da maioridade do Príncipe herdeiro, conseguida por uma
mudança na Constituição, permitindo que um adolescente de catorze
anos de idade assumisse o trono do Brasil. O Governo pessoal de D.
Pedro II foi o mais longo da nossa história – 1840-1889.

FONTE: PREFEITURA DA CIDADE RIO. SECRETARIA DA EDUCAÇÃO. Disponível em: <http://


www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo02/gov_dpedro.html>. Acesso em: 22 jul. 2018.

O modelo escravocrata tinha sido abolido pelo Império Britânico e o


tráfico havia sido proibido desde 1807. Os ingleses passaram a tentar impedir
o tráfico e a vigiar e impor limites para outros países, inclusive ao Brasil. Em
1817, a Inglaterra conseguiu o direito de inspecionar os navios portugueses e os
brasileiros que pudessem estar com carregamentos de escravos. Após a declaração
da independência, o reconhecimento inglês impôs a condição do Brasil abolir o
tráfico. Em 1831, foi proibido o tráfico no Brasil de escravos, o que na prática não
se concretizou. O tráfico de africanos escravizados seguiu devido ao crescimento
da lavoura cafeeira até 1850. As restrições inglesas ao tráfico fizeram com que os
escravos fossem mais valorizados (REGO; MARQUES, 2003).

51
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

FIGURA 12 – GRUPO DE ESCRAVOS TRABALHANDO NO CULTIVO DO CAFÉ

FONTE: <http://www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo02/exp_cafeeira.html>.
Acesso em: 22 jul. 2018.

Os fazendeiros escravocratas brasileiros reclamavam que as imposições


da Inglaterra abalavam a soberania do país, e consideravam a utilização da mão
de obra escrava um assunto da política interna do Brasil. Em 1845, o parlamento
inglês enrigesseu mais as leis, autorizando a inspeção e confisco dos navios
detectados sendo utilizados pelos traficantes de escravos. No Brasil, em 1850, a
Lei Eusébio de Queirós, ministro da Justiça na época, propôs a eliminação do
tráfico de escravos. A população escrava começou a declinar após a proibição
do tráfico. Sob a perspectiva dos fazendeiros do café, que possuíam uma cultura
escravocrata, os negros escravizados nada mais eram que um investimento em
capital fixo, que lhe confereria lucros por meio de seu trabalho (REGO; MARQUES,
2003). Portanto, embora tenha reduzido o número de escravos, a escravidão não
havia sido extinta ainda após a metade do século XIX.

A tabela a seguir mostra estimativas da população realizada pelos


bispados do Brasil. Observe que no início do século XIX, embora o número de
pessoas livres fosse maior, o contingênte de escravos e índios era muito grande.
Nesse sentido, a produção voltava-se para o mercado exteno e não para atender
o mercado doméstico.

TABELA 5 – ESTIMATIVA DOS BISPADOS DA POPULAÇÃO DO BRASIL


NO INÍCIO DO SÉCULO XIX

  População
Soma
  Livre Escrava
Pará 121.246 51.840 173.086
Maranhão 261.220 201.176 462.396
Pernambuco 455.248 192.559 647.807
Bahia 419.432 173.476 592.908
Rio de Janeiro 505.543 200.506 706.049
São Paulo 269.379 122.622 392.001
Mato Grosso 33.806 13.280 47.086

52
TÓPICO 3 | O MODELO PRIMÁRIO EXPORTADOR NO BRASIL

Goiás 21.250 16.000 37.250


Minas Gerais 456.675 165.210 621.885
Total da população conhecida 2.543.799 1.136.669 3.680.468
Índios ou selvagens     800.000
Total da população do Brasil     4.480.468

FONTE: Simonsen (1967, p. 450)

Em 13 de maio de 1888 foi decretada a Lei Áurea, que abolia a escravidão


no Brasil, quase sem oposição. Entretanto, com o crescimento da cultura do café,
a força de trabalho deveria ser substituída imediatamente para não tornar-se um
impeditivo à produção cafeeira. Desde a Independência, o Brasil já experimentara
algumas práticas de imigração, como em 1824, que teve início a imigração alemã
especialmente para o sul do país. A política do Império era atrair homens brancos
e livres com o propósito de serem proprietários de terras no Brasil. Outras
experiências para atrair imigrantes europeus também foram tentadas no decorrer
do século (REGO; MARQUES, 2003).

A tabela a seguir apresenta a crescente importância da exportação de café


como atividade econômica para o Brasil. O aumento do preço do café e a crescente
oferta do produto contribuiu para a expansão econômica e desenvolvimento do
Brasil.

TABELA 6 – EXPORTAÇÃO DO CAFÉ DO BRASIL (1873-1878)

Ano Sacos de 60 kg 1873=100


1873 2.774.000 100
1874 3.853.000 139
1875 3.407.000 123
1876 3.553.000 128
1877 3.843.000 139
1878 4.904.000 177
FONTE: Pires (2010, p. 40)

As estruturas fundamentais da economia do Brasil colônia não se


modificaram com a independência. O Brasil constituiu-se de oligarquias de
grandes proprietários que praticavam a monocultura para obter lucros por meio
dos preços das mercadorias no mercado internacional (ciclos produtivos de
acordo com a demanda do mercado externo), e sustentavam sua lucratividade
com a produção em escala. O modelo agroexportador consolidou-se como a
estrutura de manutenção de uma elite e, assim, definiu-se a forma de inserção do
Brasil no comércio internacional, ora dependente da metrópole, ora dependente
do Império Britânico.

53
UNIDADE 1 | EXPANSÃO EUROPEIA E COLONIZAÇÃO

A tabela a seguir evidencia a estreita relação comercial que o Brasil


desenvolveu com a Grã-Bretanha e, consecutivamente, o mercado norte-
americano também foi se expandindo e tornando-se em um dos principais
parceiros comerciais do Brasil já no século XIX. Observa-se que a participação de
Portugal era muito insipiente.

TABELA 7 – BRASIL: DISTRIBUIÇÃO DAS IMPORTAÇÕES E EXPORTAÇÕES POR PAÍS (EM MILHÕES)

Exportações Importações
País 1853-1854 1870-1871 1853-1854 1870-1871
1857-1858 1872-1873 1857-1858 1872-1873
Grã-Bretanha 32,90 39,40 54,80 53,40
Estados Unidos 28,10 28,80 12,70 12,20
França 7,80 7,50 6,30 7,00
Alemanha 6,00 5,90 5,90 6,50
Portugal 5,90 5,80 7,00 5,40
Bélgica 1,80 1,00 2,00 2,50
Espanha 0,90 0,80 1,10 1,60
Países Escandinavos 3,70 0,70 0,40 0,80
Estados Austríacos 1,60 0,00 0,70 0,20
Itália 1,40 0,50 0,70 0,50
Diversos 9,90 9,60 8,80 9,90
Total 100,00 100,00 100,00 100,00

FONTE: Relatório do Ministério da Fazenda – 1854 e 1880 (apud PIRES, 2010, p. 31)

O cultivo do café se assentou no século XIX sobre o trabalho escravo,


após a abolição já no final do século, a participação do trabalho dos imigrantes
europeus foi importante para a continuidade do ciclo. O declínio do café veio
somente com a crise de superprodução por volta de 1930.

54
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• A vinda da monarquia portuguesa para o Brasil marca o fim do Brasil colônia,


mas a estrutura da economia brasileira mantém-se em atividades primárias,
voltadas para a exportação, com trabalho escravo e latifúndios e marcadamente
dependente da metrópole ou das relações com a Grã-Bretanha. O café torna-se
um produto importante para a exportação do Brasil, que em 1840 se torna o
principal exportador do produto no mundo.

• Que o governo de Pombal assinou a Carta Régia de 1766 que determinava


o fechamento das oficinas dos ourives no Rio de Janeiro, que prejudicou as
atividades manufatureiras.

• D. João se instala no Brasil e abre o comércio para outras nações por meio
da abertura dos portos e a Inglaterra acaba se tornando a grande beneficiária
dessa mudança do Regente português ao Brasil.

• A Inglaterra exportava para o Brasil artigos de algodão e lã, porcelanas, metais


brutos e trabalhados, produtos alimentícios e instrumentos náuticos. Ela vivia
a expansão do capitalismo industrial, seguida por França, Bélgica, Holanda
e Estados Unidos, os países ibéricos ainda estavam atrelados aos princípios
mercantilistas-colonialistas.

• Portugal passa a ser insignificante no comércio brasileiro, após assinar o decreto


para a sua aliada Inglaterra, em 1810.

• O Brasil também chegou a ocupar a hegemonia no comércio internacional do


café. O café passou a liderar o crescimento das exportações brasileiras. Como
consequência, estradas de ferro começaram a ser construídas, iniciou-se a imigração
estrangeira (a abolição dos escravos gerou necessidade de nova mão de obra).

• Em 1822, a Independência da metrópole foi proclamada, entretanto, os laços


com a metropóle não permitiria uma mudança transformadora do cenário
brasileiro.

• Em 1850, a Lei Eusébio de Queirós propôs a eliminação do tráfico de escravos, mas


em 13 de maio de 1888, foi decretada a Lei Áurea, que aboliu a escravidão no Brasil.

• O crescimento da cultura do café, a força de trabalho deveria ser substituída


para não tornar-se um impeditivo à produção cafeeira.

• As estruturas fundamentais da economia do Brasil colônia não se modificaram


com a independência. O modelo agroexportador consolidou-se como a
estrutura de manutenção de uma elite.
55
AUTOATIVIDADE

1 Quais foram os impactos da mudança da família real para o Brasil?

2 Por que mesmo com a independência da metrópole, o Brasil não teve uma
ruptura das estruturas estabelecidas na fase colonial?

3 Como explicaria a permanência do trabalho escravo no Brasil mesmo com a


pressão da Grã-Bretanha?

4 Construa argumentos favoráveis ou contrários sobre a utilização da mão de


obra escrava no sistema capitalista.

5 Por que a Inglaterra se beneficiou do comércio com o Brasil após a vinda da


família real para o Brasil?

6 Como se explica o crescimento do cultivo do café do Brasil?

7 Quais são os fatores que levaram o Brasil a manter uma economia


agroexportadora?

56
UNIDADE 2

A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE
INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você será capaz de:

• apresentar as origens do Capitalismo Brasileiro no Século XIX, através da


apresentação do sistema político-econômico republicano e seu ambiente
de conflitos de interesses e o café como a base econômica predominante;

• entender como avançou o processo de desenvolvimento industrial no


início do século XX, a questão do trabalho na cafeicultura e as práticas
políticas baseadas no pensamento desenvolvimentista, através do modelo
de gestão populista nacionalista;

• relacionar os objetivos alcançados, sob a perspectiva do Processo de


Substituição de Importações (SI) a partir de 1930, as transformações
econômicas em andamento e os desafios do processo de industrialização,
que permanecem e continuarão a serem abordados no estudo dessa
disciplina.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado

TÓPICO 1 – AS ORIGENS DO CAPITALISMO NO SÉCULO XIX

TÓPICO 2 – O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO


SÉCULO XX

TÓPICO 3 – O PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES (SI) A


PARTIR DE 1930

57
58
UNIDADE 2
TÓPICO 1

A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE
INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

1 INTRODUÇÃO
Olá, estimado acadêmico! Na continuidade desta jornada de conhecer o
processo de formação econômica do Brasil, vamos agora ingressar nas origens
do Processo de Industrialização Brasileiro, partindo dos contextos ou cenários
históricos a partir da instauração da República em 1889.

Para relembrarmos o conhecimento recente, na Unidade 1, conhecemos


como se deu a expansão europeia e a colonização, como parte de um processo
maior de ampliação do poder econômico de certos países. As consequências desse
período, permaneceram até os dias de hoje, e ainda influenciam as conduções e
desfechos do processo de desenvolvimento econômico de nosso País.

Você já refletiu sobre a origem de muitos de nossos problemas econômicos,


políticos e sociais? Ou porque possuímos determinadas vantagens ou “vocações”
de certas culturas, produtividades, atores sociais ou setores?

Ou ainda, por que as políticas públicas sempre promoveram beneficiar


determinados interesses?

Enfim, se você ainda não fez esses questionamentos, talvez seja o momento
oportuno de fazê-los! Convido você a isso!

Para auxiliá-lo nesse desafio, o Tópico 1 apresentará as origens do


capitalismo brasileiro no século XIX, através do resgate de características do
sistema político-econômico Republicano e sua dinâmica de interesses, a qual,
diante da base econômica cafeeira, revelou os elementos, entraves, desafios e as
possibilidades possíveis para a formação e desenvolvimento econômico brasileiro
até o período atual.

Desejamos uma experiência excelente de leitura e aprendizado! E fique


atento às dicas e notas destacadas ao longo do tópico, bem como, a realização da
autoatividade ao final, imprescindível para o alcance dos seus resultados nesta
disciplina! Vamos lá!

59
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

2 REPÚBLICA VELHA: AMBIENTE POLÍTICO E


ECONÔMICO
Neste subtópico, apresentaremos o ambiente da República Velha, isto é,
quais condições e cenários políticos e econômicos atuaram como desafios para
a implantação da República, desde os interesses em jogo até as dificuldades das
políticas monetárias internas. Vamos lá!

2.1 A DINÂMICA DE INTERESSES


O processo de transição do Brasil colônia para sua independência (1808-
1822) se deu diante da crise do sistema colonial mercantilista, pode-se dizer,
diante da superação da etapa de acumulação de capital primitiva, precedente ao
sistema capitalista, logo, compreensível enquanto sua inevitabilidade.

De acordo com Gremaud, de Saes e Junior (1997), a acumulação primitiva


de capital é a situação na qual o capital começa a se dirigir às mãos de uma classe
social, no caso a burguesa, que passa, a partir de seus interesses, a generalizar as
relações mercantis, inclusive aquelas com a força de trabalho, embora gradual. Aí
estão a base capitalista no tocante as condições econômicas principais.

No caso brasileiro, ficou evidente a existência de inúmeros interesses internos


e externos, quanto ao processo de independência. A Inglaterra, grande protagonista,
atuou no sentido de influenciar e financiar esse processo que, na prática, ainda
submeteu o Brasil a certa colonização por parte dos interesses ingleses.

Apesar da Independência do Brasil não ter modificado de imediato a


prática escravista da produção colonial, “ela permitiu mudanças [...]. Embora o
novo Estado estivesse sujeito a limitações políticas e financeiras, ele passou a ter
um novo referencial para sua atuação (que não é mais o interesse da metrópole)”
(GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1997, p. 25). Era a perda do exclusivo-comercial.

Sob esse novo referencial, as classes sociais agora despertavam novos


interesses, mais diversificados, diante de dificuldades quanto à formação inicial de
um sistema administrativo autônomo e endividado externamente, incentivando
a mobilização e expansão mercantil interna da economia cafeeira, como solução
para construção de uma base econômica exportadora.

Assim, sob as condições adversas, que impediam durante o período


imperial, qualquer projeto de desenvolvimento industrial, foi então o café,
acompanhando os benefícios da Revolução Industrial, que promoveu as
condições para a formação de um mercado integrado e abrangente, quanto aos
seus objetivos econômicos classistas.

Sobre o período do Império precedente à República (1822-1889), Costa


(2007), chama a atenção à estagnação e mínima exploração do potencial brasileiro
60
TÓPICO 1 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

em muitos quesitos. A monocultura do açúcar bem-sucedida por longo tempo


não apresentava mais os mesmos sinais de vitalidade, essa circunstância seria
amenizada pela economia do ouro e o novo fôlego dado por ele à colônia.

Apesar desse potencial, o Brasil perdeu durante o Império a maior


oportunidade da nossa história de alcançar os países abastados
na geração de riqueza. A principal razão foi a resposta inadequada
e insuficiente do Império à explosão do capitalismo industrial.
Este gerou, ao longo do século XIX, crescimento econômico sem
precedentes na história da humanidade, ao mesmo tempo em que
aumentou como nunca a diferença entre países ricos e países pobres.
As respostas do império foram insuficientes, tanto na gestão do
crescimento populacional quanto na escolha do modelo econômico
(COSTA, 2007, p. 95).

O autor ressalta que, em 1820, por exemplo, a população brasileira era


metade da população americana, num momento em que o trabalho era um dos
fatores mais relevantes, deixou-se de promover uma mão de obra urbana e rural
qualificada e as atividades voltadas exclusivamente ao setor primário exportador,
afastando-nos de um projeto industrial. “Em termos absolutos, o PIB brasileiro
despencou de 23% do norte americano, em 1820, para apenas 7% em 1870. A
consequência mais grave [...] foi que se tornou progressivamente mais difícil
eliminar o atraso da economia brasileira” (COSTA, 2007, p. 97).

Os primeiros anos após a República (1889) foram desafiadores para a


estrutura da economia brasileira, entre tantas propostas em pauta, as principais
estavam associadas ao processo de transição do escravismo e do Império, para
um sistema que pudesse oferecer liberdade política e econômica para as classes
da cafeicultura administrarem seus negócios aos fins do século XIX.

A figura a seguir apresenta os presidentes republicanos nesse período,


comprovando a alteridade de atores e interesses político pelo poder.

FIGURA 1 – OS PRESIDENTES DA PRIMEIRA REPÚBLICA BRASILEIRA (1889-1930)

1889 1891 1894 1898 1902


Mal. Deodoro Mal. Floriano Prudente de Campos Sales Rodrigues Alves
da Fonseca Peixoto Morais

61
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

1906 1909 1910 1914 1918


Afonso Pena Nilo Peçanha Mal. Hermes da Venceslau Brás Rodrigues Alves
Fonseca

1918 1919 1922 1926


Moreira da Costa Epitácio Pessoa Artur Bernardes Washington Luís
FONTE: <https://pt.slideshare.net/RicardoJatahy/presidentes-do-brasil-repblica-velha>.
Acesso em: 7 jun. 2018.

NOTA

“Em 15 de novembro de 1889 foi instaurado o regime republicano e, juntamente,


o fim da soberania de D. Pedro de Alcântara, Pedro II. Tudo aconteceu no Rio de Janeiro, por
meio de um golpe militar liderado pelo Marechal Deodoro da Fonseca. Uma vez que ele era
o líder, tornou-se o primeiro chefe de estado do Brasil acompanhado de seu vice, Floriano
Peixoto. O ocorrido se deu onde hoje é a Praça da República, no Rio de Janeiro. Na mesma
época, houve a publicação de uma ata da proclamação, chamada de Decreto nº 1, em que
se estabeleciam as regras governamentais que entrariam em vigor. Inaugurou-se em 1891,
último ano de governo de Marechal Deodoro”.

FONTE: <http://presidentes-do-brasil.info/>. Acesso em: 23 jul. 2018.

Também, neste link, você encontra as principais ações políticas e econômicas de cada
Presidente Brasileiro desde a Velha República.

Diante de um contexto político efervescente, a abolição da escravatura,


em 1888, representaria mais uma inevitável ação cedendo à pressão inglesa por
ampliação do mercado e substituição, mesmo que gradual, por mão de obra livre,
62
TÓPICO 1 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

do que uma iniciativa social ou de consciência humanitária, embora houvesse


também interesses internos nesse sentido.

Admite-se que, a “escravidão tinha mais importância como base de um


sistema regional de poder do que como forma de organização da produção.
Abolido o trabalho escravo, em nenhuma parte houve modificações de real
significação na forma de organização da produção e mesmo da distribuição de
renda [...]” (FURTADO apud GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1997, p. 32). Assim,
sob esse viés, representava um entrave ao desenvolvimento econômico do país.

Os processos de fim da escravatura e proclamação da república, enquanto


episódios sequenciais, representaram um movimento de classes. Enquanto o
primeiro, inicialmente equivaleu a uma perda ao setor cafeeiro, também serviu
de pretexto para esta mesma classe se organizar e buscar intervir no aparelho
do Estado, a favor de seus interesses, enquanto o segundo processo, com a
conformação da classe burguesa, contribuiu para a realização de um Estado que
lhe servisse via uma democracia presidencial federalista.

Sob o advento da República pelas classes médias emergentes, os autores


identificam como o “abolicionismo republicano” da classe média, assim,

O fim do escravismo transformaria todos os trabalhadores em


trabalhadores livres e iguais (juridicamente), [...]. A República, ao
destruir o direito escravista do Estado Imperial, abriria as portas
do Estado aos membros da classe média, por exemplo, pelo fim do
voto censitário (comprovação de renda para poder ser eleito) ou pela
instituição de critérios burocráticos (pelo mérito) para ingresso no
serviço público (em lugar de apadrinhamento). Nesta perspectiva,
torna-se mais fácil entender a participação ativa da classe média
urbana no Movimento Abolicionista e também seu papel proeminente
(principalmente pelos militares) na derrubada do Império e nos anos
iniciais da República (GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1997, p. 36).

Entretanto, apesar das transformações que seguiram de cunho político


e social, em relação a herança colonial no período Republicano, a economia
brasileira continuaria mantendo a base exportadora primária. Isso dificultou o
desenvolvimento do trabalho assalariado e a atualização da cultura de trabalho.

NOTA

A abolição da escravatura segue uma cronologia de eventos, desde 1815, que vão
culminar de fato no episódio em 1888, com a Lei Áurea. Com base em interesses nacionais e
internacionais, promoveu a libertação, mas sem indenização, pouca ou nenhuma preocupação
com direitos ou inserção social. Para saber mais, leia o texto “A abolição da escravatura
brasileira”, acessando o link : <http://www.politize.com.br/abolicao-da-escravatura-brasileira/>.

63
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

2.2 A ECONOMIA MONETÁRIA INCIPIENTE


Mesmo com o advento da Primeira República, a economia seguiria
dependente de mercado externo, e, consequentemente, vítima das variações
cíclicas externas, que afetavam fortemente sua política monetária e cambial,
inviabilizando ainda mais uma inversão desse padrão na economia internacional.

A fim de iniciar um planejamento em torno da política macroeconômica


do país, a primeira República tratou de estabelecer prioridades quanto à busca de
equilibrar as contas externas e priorizar os interesses oligárquicos.

Em relação à abertura comercial, observou-se quase nenhuma melhoria,


porém, em relação ao investimento internacional, sua participação era substancial,
cerca de 30% do total da América Latina. No período de 1913, por exemplo,
esse indicador contribuiria para o crescimento também da dívida externa, já
promovida desde a independência do país.

Esse cenário comprovou a importância dos mercados financeiros


internacionais, inclusive para a primeira década do século XX. As dificuldades
inerentes à área econômica, referiram-se, predominantemente, a desvalorizações
do câmbio, cujas depreciações provocaram déficits de conta corrente seguidos e
promovedores de crises (FRANCO, 1990). As pioras dos termos de troca entravavam
as importações e agravavam os choques comerciais decorrentes das flutuações do
preço do café, associada a políticas fiscais ou monetárias expansionistas.

Importante também ressaltar os efeitos da monetização da economia por


conta do avanço do trabalho assalariado, mesmo que não muito significativo
nesse primeiro momento, Franco (1990, p. 16-17) destaca o impacto monetário
dessa ocorrência,

[...] o pagamento de salários multiplicaria em muitas vezes, por


exemplo, a necessidade de capital de giro na atividade agrícola,
com isso, elevando o grau de monetização e a demanda por moeda
na economia [...]. Argumentava-se nesse sentido que as demandas
sazonais de crédito associadas às safras (de café, açúcar etc.) poderiam
agora [...] ter sérias consequências no tocante à liquidez, caso não
fossem implementados esquemas destinados a prover acomodação
para essa elevação once and for all (uma vez por todas) da procura da
moeda [...]. Esquemas nesse sentido encontraram diversos tipos de
obstáculos. De um lado, o incipiente desenvolvimento do sistema
bancário [...] a baixa propensão do público para reter moeda sob
forma de depósitos bancários impunha uma limitação estrutural a
capacidade dos bancos em expandir seus empréstimos.

Essa questão remeteu ao compromisso dos Estados em ampliar essas


ofertas monetárias, e a discussão do padrão ouro tomou força, juntamente com
linhas de créditos para os compensar as perdas agrícolas.

A figura a seguir demonstra a política monetária de emissão de moeda


decorrente da necessidade na economia, nos primeiros governos.
64
TÓPICO 1 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

FIGURA 2 – EMISSÃO DE MOEDA E AGREGADOS (1888-1900)

OBS.:
MO (Base Monetária = Papel Moeda emitido) = 1ª Linha (próximo ao eixo).
M1 (Papel Moeda em Poder do Público, mais Depósitos a vista) = 2ª Linha (do meio).
M2 (M1 + Depósitos Remunerados, Títulos e afins) = 3ª Linha (de cima).

FONTE: <https://financasfaceis.wordpress.com/2010/05/16/brasil-republica-ii/>.
Acesso em: 5 jun. 2018.

O que se observa acima foi a expansão da moeda, isto é, política monetária


expansionista, em que se amplia a base monetária (MO). Assim, o M1 (papel
moeda em poder do público mais depósitos à vista) e M2 (M1 mais depósitos
remunerados, títulos e afins) repercutem esse aumento e também o avanço nas
atribuições dos bancos e diversificação dos serviços.

Definitivamente, o trabalho assalariado em fase de crescimento, exigiu o


aumento de necessidade e oferta de moeda, inclusive de serviços relacionados a
essa ocorrência na economia.

Franco (1990) destaca resumidamente em dois pontos, as políticas


econômicas nessa primeira década da República:

1) A Lei Bancária em 1890, visando garantir um lastro de emissões bancárias


baseado em um lastro de dívidas públicas. Controle da especulação e mercado
de câmbio.
2) O Plano de Refinanciamento de dívida externa, em meados de 1892, o Funding
Loan, baseado em controle ou saneamento fiscal em monetário interno, em
troca de negociação das dívidas.

De forma geral, a década de 1890 registrou um cronograma de políticas


conservadoras, que influenciariam a condução nos próximos anos.
65
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

NOTA

O Funding Loan representou uma medida econômica na atuação de Campos


Sales (1889), originada em uma viagem à Europa, a fim de buscar soluções para o problema
de disponibilidade de moedas tanto interna como externamente. Via folgas, prazos e
garantias, na modalidade de empréstimo, concedidos pelos Ingleses, a fim de cobrir juros
e montante de empréstimos anteriores. Para saber mais detalhes desse Fundo, consulte
o Texto “FUNDING LOANS (1898, 1914 e 1931)”, no Link <https://cpdoc.fgv.br/sites/default/
files/verbetes/primeirarepublica/FUNDING%20LOANS.pdf>, que apresenta as condições de
uso desse fundo nos principais cenários econômicos do período.

Fritsch (1990) considera esses problemas como estruturais, graças aos


desequilíbrios externos, associado ao quadro institucional da época, pós-guerra
e quedas generalizadas de investimento. Uma das consequências de se ter uma
economia primária-exportadora era a forte vulnerabilidade externa.

Essa vulnerabilidade, por um lado, representou efeitos das variações


repentinas da oferta do café e sua baixa elasticidade, que afetavam os ganhos
decorrentes do comércio internacional, por outro lado, representaram efeitos
nos fluxos de capital e de demanda internacional, que tenderiam novamente a
reduzir-se como resposta a esse contexto.

As principais ações do governo mantiveram-se nos ajustes cambiais


internos, no padrão ouro, no endividamento externo e no controle direto do
preço do café.

NOTA

O que temos até agora, é uma conjunção de fatores, que tornaram mais
relacionados entre si os problemas econômicos que viriam a revelar-se nas próximas
décadas, confirmando o caráter estrutural. Isto é, a migração para uma mão de obra livre,
o aumento da mobilização ou demanda por moeda e a forte dependência ao mercado
externo do café, que ocorreram sem uma política adequada ou antecipada, que amenizasse
efeitos sociais e econômicos consequentes.

Entretanto, o período descrito como a era de Ouro (1900-1913),


representou um alívio em todos os sentidos, tanto de crescimento, como de
ênfase ao padrão ouro. Esse período, anterior à primeira guerra, possibilitou que
o país experimentasse um crescimento sem igual, com o início de uma formação
de capital na indústria, grandes investimentos em infraestrutura, obras públicas
e certa estabilidade de preços.
66
TÓPICO 1 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

Esse crescimento foi atribuído ao dinamismo das exportações de Borracha


e dos investimentos europeus internamente, ocorridos no Governo de Rodrigo
Alves. Por outro lado, a situação do câmbio ainda permanecia preocupante e
sua desvalorização, prejudicava ainda mais os cafeicultores, que sofriam com a
ocorrência de safras abundantes.

A tabela a seguir apresenta a forte relação entre as taxas de câmbio e


os preços do café, comprovando que as desvalorizações cambiais promoviam
prejuízos ao preço externo do produto e, consequentemente, ao mercado
exportador desse item.

TABELA 1 – TAXA DE CÂMBIO (PENCE/MIL RÉIS) E PREÇOS DO CAFÉ, 1889-1898

Ano Taxa Cambial Preço Interno Preço Externo


1889 26 7/16 100 100
1890 22 9/16 120 113
1891 14 29/32 171 90
1892 12 1/32 201 87
1893 11 19/32 276 103
1894 10 3/32 290 92
1895 9 15/16 262 91
1896 9 1/16 252 69
1897 7 23/32 180 47
1898 7 3/16 163 41

FONTE: IBGE (apud TORELLI, 2007, p. 2)

O debate sobre a reforma monetária tomaria ainda força, junto com a


criação da Caixa de Conversão em 1906 e do Convênio de Taubaté. Entretanto,
uma série de crises internacionais afetaram a eficácia dessas políticas, inclusive a
descrença no padrão ouro, insistentemente mantida, frente à crise de liquidez e
inevitável recessão iminente (FRITSCH, 1990, p. 40).

A Guerra se aproximava, mas seus efeitos já eram sentidos. Os fluxos de


recursos de todo tipo se restringiram e, consequentemente, toda indústria e a
receita com tributação. A prática de medidas, consideradas de emergência, como
o fechamento da Caixa de Conversão e emissão de notas de Tesouro e títulos
federais a longo prazo, viriam a mitigar, porém, temporariamente os danos,
inclusive nas importações.

Essas foram as medidas adotadas, tanto nos anos da Primeira Guerra e


entrada na década de 1920, sob um contexto de crises de fluxos internacionais,
restrição do crescimento industrial interno e do comércio internacional. O
sistema bancário ineficiente continuava não dando conta da demanda de moeda,
diante agora, do grande entesouramento praticado pela população envolvida nas

67
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

atividades comerciais remuneradas. Não havia crédito suficiente, e essa situação


se estendeu em todas as atividades econômicas, urbanas ou não.

Nesse período, o Banco do Brasil cresceu em atribuições e expectativas,


contribuindo para amenizar a crise de liquidez, ajudando o Brasil a adaptar-se às
mudanças e consequências originadas diante de um cenário externo fortemente
afetado e ameaçador, sem previsões de normalidade.

Entre 1927-1930, a ênfase ao padrão ouro pelo Presidente Washington Luís


relevaria a política econômica cedendo a pressões das oligarquias na busca pela
estabilização da moeda. Criou-se a Caixa de Estabilização, com a mesma função
da anterior Caixa de Conversão, que buscaria ampliar a reserva de ouro no país
até ser possível a conversibilidade plena das notas, criando o Cruzeiro (em 1942)
com mesma paridade do mil-réis, cedida ao controle do Banco do Brasil.

A figura a seguir traz a imagem da moeda emitida no período de vigência


da Caixa de Estabilização.

FIGURA 3 – PAPEL MOEDA BRASILEIRO NO VALOR DE 5 MIL RÉIS

FONTE: <http://www.dplnumismatica.com.br/cd%20reis/r100c%20f1.jpg>.
Acesso em: 31 jul. 2018.

E
IMPORTANT

Você sabia que a Caixa de Conversão e a Caixa de Estabilização (1906-1913 e


1926-1930) foram instrumentos que buscavam permitir a emissão de títulos com lastros em
ouro ou moeda nacional ou estrangeira? E também recolher ouro em barra e trocar por
moeda papel!

Isto representava a busca por alternativas em ampliar a oferta de moeda na economia, o


que era vital para o funcionamento das atividades, inclusive de comércio exterior. Na esfera
política foi o Convênio de Taubaté, com o acordo entre São Paulo, Minas Gerais e Rio de
Janeiro em ampliar o preço do café, que buscou contribuir para essa missão.

68
TÓPICO 1 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

Os efeitos expansionistas beneficiaram os preços das comoditties e atraíram


novamente investimentos externos, junto à ociosidade da base industrial, segundo
Fritsch (1990, p. 58).

O autor, entretanto, admite,

A exuberante recuperação de 1927-28 sustentava-se em bases


frágeis, já que dependia crucialmente da manutenção de condições
econômicas internacionais extremamente favoráveis verificadas desde
1926. Como a experiência antes da Guerra havia demonstrado, dada
a instabilidade de fluxos financeiros para a periferia, normalmente
variando em sincronia com os preços internacionais de produtos
primários, a adoção de padrão ouro em ciclos de endividamento
externo aumentava a vulnerabilidade do equilíbrio macroeconômico
doméstico. Isto porque, como as condições favoráveis de balanço de
pagamentos que induziriam a adoção do padrão ouro podiam reverter-
se abruptamente, a perda de reservas automaticamente submeteria
economia a violentas pressões deflacionarias (FRITSCH, 1990, p. 58).

Nenhuma das políticas teria alcançado algum êxito, mesmo que


temporário, diante da forte instabilidade internacional e nossa vulnerabilidade,
se não houvesse o que ficou reconhecido como “pacto oligárquico”. Isto é, todas
as discussões ocorriam sob um cenário político determinante, composto pelo
governo central e os demais interesses estaduais, permitindo a estabilidade de um
parlamento, submisso ao Presidente da República, que criara elevadas condições
de governabilidade.

Sob esse pacto, admite-se que se caracterizou por uma forma de governar
centralizado na figura do Presidente, o qual conseguiu aglutinar interesses
de classes políticas produtivas, donos de capital, especialmente destinadas à
produção do café.

Entretanto, a partir da segunda década, começaram a ocorrer divergências


entre as elites de São Paulo, Minas Gerais e os Estados com menores poderes
políticos. Aliado a isso, acrescenta-se o descontentamento de outras classes sociais
que ampliavam suas demandas e interesses.

Finalmente havia o protesto insistentemente veiculado por uma


minoria de políticos dissidentes, intelectuais e setores de imprensa
independente, contra a natureza antidemocrática e centralizadora
do regime, que encontrou crescente ressonância nas classes médias
urbanas emergentes e nas camadas mais jovens da oficialidade das
forças armadas, especialmente nos anos 20. Este descontentamento
foi, de fato, a fonte de recorrentes crises políticas e, juntamente com
as profundas divergências entre os estados dominantes durante a
sucessão presidencial de 1930 e o impacto devastador do início da
Grande Depressão, contribuiu de forma decisiva para o colapso da
Primeira República (FRITSCH, 1990, p. 36).

É evidente que a partir desse momento, as crises se tornariam também


políticas e contaminariam pensamentos, formas de conduzir e representar

69
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

o país através dos múltiplos interesses. Passada a sucessão de crises desse


período e marcados pelos desequilíbrios externos e mudanças sociais internas,
desencadeados na Revolução de 30, persistentes e novos e desafios políticos e
econômicos estariam por vir.

Estes desafios, cenários e seus desfechos serão abordados na continuação


desta unidade e no decorrer da nossa disciplina. Agora vamos continuar e finalizar
o Tópico 1 com o próximo assunto!

3 A BASE ECONÔMICA CAFEEIRA


Neste momento, seguiremos com a apresentação das bases produtivas
internas, no momento da República, que, predominantemente agrícolas e atreladas
aos desafios de mão de obra e mercado, contribuirão para uma economia com
fortes vulnerabilidades externas. Vamos lá!

3.1 AS CONDIÇÕES DE OCORRÊNCIA E MERCADO


Até agora já vimos os principais efeitos econômicos de acontecimentos políticos
e sociais, que na tentativa de encaminhar o rumo da República, sejam nos objetivos
econômicos ou de desenvolvimento, começaram a despertar as áreas de interesses
produtivos no país, que ora se tornarão entraves, ora impulsionarão objetivos.

É importante relembrar que num sistema econômico vão se destacar


objetivos, coincidentes com as especialidades produtivas que se sobressaem, isto
é, de acordo com a disponibilidade de fatores ou habilidades de uma nação. Essas
são as bases produtivas de uma sociedade, que lhe proporcionarão ganhos de
escala comparados a outras sociedades com habilidades diferentes.

É assim que nossa base produtiva também se desenvolveu, desde o século


XVI. Como já foi apresentado na Unidade 1 desta disciplina, nossa vocação
agrícola desde esse século, conformou uma estrutura espacial com diferentes
culturas em diferentes espaços, mas todas elas, moldando fortemente grande
parte de nossas estruturas sociais e econômicas até os dias de hoje.

Cano (2009) destaca a gênese da “agricultura itinerante”, decorrente da


grande disponibilidade do fator terra, diferente da população livre, combinação
ideal para a promoção de alta concentração fundiária e agricultura mercantil-
exportadora, entretanto, sem abandonar a de subsistência, abastecida pelas crises
de atividades ou culturas (por exemplo, a mineração e açucareira), e exclusão de
mão de obra provocada, sobretudo, pelo fim da escravidão.

Esse contexto foi responsável pelo baixo nível técnico na zona rural e
reforçou ainda mais a economia de subsistência e a miséria nesse período anterior
ao café.

70
TÓPICO 1 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

Entretanto, a agricultura cafeeira, a partir de 1880, especificamente


na região de São Paulo, mais dinâmica e abastecida, destacar-se-ia de outros
processos, por apresentar,

[...] além da fronteira móvel – por indução da ferrovia –, uma “oferta


elástica” de mão de obra imigrada do exterior e facilmente submissível
ao trabalho, graças ao não acesso à propriedade da terra. Expandiu-se,
incorporando novas terras, mão de obra, infraestrutura, gerando nível
mais alto de produtividade e diversificando a estrutura produtiva (a
partir da primeira metade do século XX) ao estimular o surgimento
de uma dinâmica mercantil (alimentos e matérias primas) na mesma
região. Finalmente, ao avançar sua urbanização (CANO, 2009, p. 28).

A cultura cafeeira, neste momento, viria a amenizar o declínio das culturas


de algodão e açúcar no século XIX. O desenvolvimento de economias e mercados
promissores, como os Estados Unidos, acelerou o desenvolvimento do sudeste
do Brasil através dessa produção e possuía todos os requisitos de ascensão:
um mercado externo promissor e uma classe com capital disposta a investir,
amparado politicamente em um Estado, também disposto a coordenar todo tipo
de política monetária e fiscal, a fim de valorização do negócio.

O único empecilho inicial foi na disponibilidade de mão de obra escrava.


Com a limitação do mercado de escravos, primeiro externo, depois interno, embora
o fim da escravidão de fato, só ocorreria após algumas décadas, o problema viria
a ser superado com a mão de obra imigrante que ganhava gradualmente espaço,
confiança e qualidade em suas atribuições.

Uma situação favorável à economia cafeeira teria sido a sua capacidade de


rapidamente se monopolizar e aglutinar condições que favoreciam sua cultura.
Associado a condições de mão de obra e terras de boa qualidade, a oferta se
converteria em elástica, sem grandes dificuldades. E “devida a relativa estabilidade
de salários [...], a taxa de lucro da cafeicultura era bastante elevada, alimentando a
constante acumulação e decorrente expansão da lavoura” (FURTADO, 2009, p. 84).

Assim, diante de um contexto que favoreceu o setor produtivo cafeeiro, e


aliado à influência política da República do “café-com-leite”, dado o predomínio
de São Paulo e Minas Gerais nos círculos de poder, essa cultura se fortaleceu e
desenvolveu status de produto e commodity de grande atratividade de capital e
influência política em todos os cenários de crises e recuperações.

É reconhecido que essa produção foi determinante por aproximadamente


quatro décadas para economia brasileira, dado, principalmente, sua enorme
participação no cenário de comércio internacional (40% a 80% chegaram a
representar as exportações na velha república).

Ademais, produtos como borracha, açúcar, algodão, fumo, entre outros,


também gradativamente avançaram sua produção, entretanto, voltadas agora
mais para a demanda interna, em plena ascensão. Aliás, demanda essa, também
resultante de um efeito multiplicador da dinâmica cafeeira, cuja indústria
pioneira, inevitavelmente viria a contribuir para o processo de urbanização.
71
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

A tabela a seguir apresenta os principais produtos que compunham a pauta


de exportações brasileiras nas primeiras décadas republicanas, destacando que,
apesar das dificuldades externas, o café apresentava forte e crescente dinamismo
no mercado internacional.

TABELA 2 – PRINCIPAIS PRODUTOS AGRÍCOLAS DE


EXPORTAÇÃO DO BRASIL (1889-1933)

Participação (em %) na Receita das Exportações


Couro
Período Café Açúcar Cacau Mate Fumo Algodão Borracha Outros
e Pele
1889-1897 67,6 6,6 1,5 1,1 1,2 2,9 11,8 2,4 4,9
1989-1910 52,7 1,9 2,7 2,7 2,8 2,1 25,7 4,2 5,2
1911-1913 61,7 0,3 2,3 3,1 1,9 2,1 20,0 4,2 4,4
1914-1918 47,4 3,9 4,2 3,4 2,8 1,4 12,0 7,5 17,4
1919-1923 58,8 4,7 3,3 2,4 2,6 3,4 3,0 5,3 16,5
1924-1929 72,5 0,4 3,3 2,9 2,0 1,9 2,8 4,5 9,7
1930-1933 69,1 0,6 3,5 3,0 1,8 1,4 0,8 4,3 15,5

FONTE: <https://www.slideshare.net/marpim/histria-do-brasil-da-repblica-a-era-vargas>.
Acesso em: 9 jun. 2018.

A atividade cafeeira teria iniciado no Rio de Janeiro e percorrido solos


brasileiros, seguindo para o sul de Minas Gerais e para o Vale do Paraíba, em São
Paulo, e o seu interior. A fertilidade do solo era o fator determinante, por isso sua
qualificação itinerante, a fim de suprir suas exigências de condições.

Em relação à contribuição dessas regiões na produtividade, estima-se


que, em meados de 1880, a região do Rio de Janeiro produziu em torno de 60% do
total da produção brasileira, enquanto São Paulo destinou-se a suprir o restante,
porém, ao longo da primeira década republicana, essa situação se inverteria.

Conforme quadro a seguir, é verificado a mudança do impulso produtivo,


decorrente das condições não apenas do produto, mas também sociais e
econômicas, que apresentaremos mais adiante.

QUADRO 1 – BRASIL: PRODUÇÃO TOTAL DE CAFÉ E PARTICIPAÇÃO DO ESTADO DO RIO DE


JANEIRO E DE SÃO PAULO, 1884 – 1899 (QUANTIDADE EM 1000 SACAS DE 60 KG)

ANO BRASIL RIO DE JANEIRO (%) SÃO PAULO (%)


1884/85 6.206 70,2 29,8
1885/86 5,565 68,6 31,4
1886/87 6.078 65,7 34,3
1887/88 3.033 64,0 36,0
1888/89 6.827 63,6 36,4

72
TÓPICO 1 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

1889/90 4.260 61,6 38,4


1890/91 5.358 56,45 43,6
1891/92 7.397 64,4 45,6
1892/93 6.202 52,3 47,7
1893/94 4.309 51,2 48,8
1894/95 6.695 48,1 51,9
1895/96 5.476 47,9 52,1
1896/97 8.860 45,5 54,5
1897/98 10.462 43,7 56,3
1898/99 8.771 40,3 59,7
1899/00 8.959 39,5 60,5
FONTE: Gremaud, Saes e Júnior (1996, p. 45)

Assim, essa inversão se daria não só pelo caráter dinâmico dessa cultura,
decorrente da exaustão do solo, mas também, por outras razões de ordem histórica.
Ainda, no que tange a outras condições, no Oeste Paulista, [...] cujas terras eram
muito mais planas e extensas, permitindo a cultura em maior escala [...] devido
sua topografia mais favorável, também se prestava melhor para infraestrutura
ferroviária [...] (FURTADO, 2009, p. 83).

A abolição da escravidão acarretou efeitos bem menores na região paulista,


onde a imigração já se sentia presente, anterior ao processo, fortalecendo a oferta
de mão de obra para esse setor. De certa forma, o fim da escravidão propôs uma
nova redistribuição produtiva do café, impactando negativamente áreas que
dependiam em maioria da mão de obra escrava para a realização.

Como ressalta Furtado (2009, p. 83),

O grande problema para a expansão desse sistema produtivo residia


na disponibilidade de mão de obra escrava. Desde o início do século
XIX, como foi visto, o Brasil enfrentava o boicote britânico ao tráfico
de escravos. A partir da metade daquele século, o governo do País
finalmente proibiu [...]. As fazendas de café começam a enfrentar
crescentes problemas de mão de obra, e, durante algum tempo,
chegou-se a acreditar que o sistema de produção da plantation tropical
não conseguiria sobreviver ao final da escravidão.

De fato, esse risco era real, mas a possibilidade da substituição pela mão
de obra imigrante europeia preencheu essa lacuna de forma eficaz, conforme
veremos mais profundamente no tópico seguinte.

Existia uma grande reorganização, inclusive do Estado, a fim de promover


e financiar a vinda, e de certa forma, as condições mínimas de permanência dos
imigrantes no país, custeando suas necessidades, inclusive de transportes, até
que fosse alocado no mercado de trabalho, no caso, os cafezais em fazendas (tema
que voltaremos mais adiante). Essa era a função por exemplo, das hospedarias

73
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

dos imigrantes em São Paulo e Rio de Janeiro. A figura a seguir nos dá uma ideia
de como era a estrutura física de suporte a chegada do Imigrante em São Paulo
nesse período.

FIGURA 4 – HOSPEDARIA DO IMIGRANTE – SP

FONTE: <http://museudaimigracao.org.br/hospedaria-de-imigrantes-de-sao-paulo-tudo-
comecou-ha-130-anos/>. Acesso em: 23 jul. 2018.

Quanto ao financiamento e disponibilidade do fator capital para a produção


do café, chama-se a atenção para a eficácia do processo comercial do negócio do café,
dado que a formação das plantações e o processamento exigiam recursos, os quais
as volatilidades externas do capital e dificuldades do desenvolvimento das relações
bancárias com os fazendeiros acarretou ao comerciante a prática dessa função.

Assim, atribuiu-se à comercialização do produto o mecanismo principal


de realização dos lucros, e a forma de captar recursos diretos para sua reprodução.
Na cafeicultura, não ocorreu o autofinanciamento, prática comum ao sistema
capitalista por exemplo. A dinâmica era a seguinte: nessa cultura, o comerciante
(ou comissários) tinha uma função ou status superior. Primeiramente, o caráter de
longo prazo desde seu plantio até a colheita exigiria o investimento com retornos
também a longo prazo. Outro fator importante para a ocorrência da necessidade
de capital durante a produção de café, era a manutenção da qualidade do produto,
que deveria sujeitar-se às especificidades da demanda internacional para a
garantia de sua produtividade final. Contribuindo então para a necessidade
de capital, estavam a mão de obra remunerada e, consequentemente, o elevado
capital de giro para o negócio (LACERDA et al., 2000).

Ainda conforme os autores,

[...] deve ser destacada a ênfase no relacionamento entre o comerciante


e o fazendeiro: não se tratava simplesmente de uma intermediação
comercial, e sim de uma relação complexa na qual a função financiadora
do primeiro adquiria relevo essencial. Cabia ao comerciante a função
de prover ao fazendeiro os recursos necessários para a formação
da lavoura e para o trato do cafezal e a colheita do café. Em outras
palavras, cabia ao comerciante fornecer os recursos para a formação do

74
TÓPICO 1 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

capital fixo e dos giros da produção. Era o comerciante, o “banqueiro”


da lavoura. Na ausência de um sistema bancário, público ou privado,
ligado diretamente à produção, o comerciante de café chamava para si
o papel fundamental de suprir o crédito necessário. Em contrapartida,
exigia reciprocidade do fazendeiro, pois a produção era entregue aos
seus cuidados, que consistia no preparo e na venda do café, ganhando
uma comissão que na época era fixada em 3% do valor da venda. O
comerciante fornecia o crédito ao fazendeiro; em troca, adquiria um
cliente cativo. Não era, contudo, um “cativeiro” tão difícil de suportar
(p. LACERDA et al., 2000, p. 34).

NOTA

“As relações transcendiam os limites comerciais. Ao dar-se crédito aos escritos


da época, as relações entre o fazendeiro e o comissário, durante longo tempo, não
apenas eram amistosas, mas transcendiam os limites dos negócios. Ao objetivo do lucro,
fazendeiros e comissários mesclaram uma forte dose de sentimentalismo das relações de
família, do viver patriarcal que levavam. O comissário não se limitava a ser o comerciante
incumbido da venda do café do fazendeiro e o seu fornecedor de capitais; era também o
mentor, o parente ou amigo mais avisado que lhe impunha moderação nas despesas e o
assistia nas principais emergências da vida com seus conselhos e seus recursos. Achou-
se assim, assumir funções que por muito tempo manteve, de regulador da atividade dos
lavradores, disciplinando-os na exploração das lavouras já existentes e estabelecendo-lhes
a justa medida na expansão de novas culturas. [...] A ação assim do comissário com relação
ao fazendeiro ultrapassava, pois, os limites comerciais. Além do fornecimento de crédito e
da venda do café por ele produzido, o comissário encarregava-se da prestação de inúmeros
serviços pessoais aos fazendeiros [...] evidentemente, as relações de amizade encontravam
viabilidade e fundamento nas bases de interesses comerciais comuns”.

FONTE: Lacerda et al. (2000, p. 34).

Com a expansão dos serviços bancários entre 1910 e 1920, os comissários


ou comerciantes tiveram mais acessos ao crédito bancário, em lugar dos
fazendeiros, mais distantes dos grandes centros. Assim, passaram a ter maior
representatividade no meio financeiro, como meio de assegurar os ganhos e
lucros, para todos os envolvidos, principalmente para estes comissários.

Na “[...] comercialização que se realizavam os grandes negócios,


acumulavam-se fortunas e prosperavam as empresas. [...] evidentemente
proporcionava lucros ao fazendeiro, mas, seguramente, menores que aqueles que
se auferiram na sua comercialização” (LACERDA, et al. 2000, p. 37).

Entretanto, essa prática foi comum até a introdução do trabalho livre na


fazenda, que eliminou gradativamente a necessidade de recursos anteriores para
inclusive aquisição de mão de obra escrava. Ademais, o esgotamento da relação, que
nos períodos de crise desencadeou desconfiança na relação entre os comissionados
comerciantes e fazendeiros, quanto às negociações com os exportadores, que carecia
de maiores registros e detalhes da transação, quanto a custos, volumes e valores.
75
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

NOTA

Foi então a expansão do negócio do café que gerou o aparecimento das Casas
Comissionadas, que atuavam como instituições bancárias. Estas tinham acesso ao crédito e
podiam estocar o produto até regularizar o preço da oferta, isto é, atuavam como um regulador
de preços e ofertante no mercado. Entretanto, sua função foi relevante até a atuação das Casas
Exportadoras, que então passaram a representar intermediários no mercado, representantes
de empresas internacionais. Para saber mais sobre essas atividades, também comerciais, leia o
texto O fazendeiro de café como representante de uma casa comissionada.

Disponível em: <https://periodicos.fclar.unesp.br/perspectivas/article/viewFile/1492/1196>.


Acesso em: 23 jul. 2018.

Assim, alguns efeitos também indiretos da expansão do crédito para o


setor começam a despontar “[...] a partir da Reforma Bancária [...] no começo da
República, que forneceu recursos relativamente fáceis [...]. O mesmo efeito teve a
expansão ferroviária: a extensão das linhas férreas em São Paulo cresceu de cerca
de 1.600 km em 1885 para 3.300 km em 1900 [...]” (GREMAUD; SAES; JÚNIOR,
1997, p. 47). Sem dúvida, o fator custo de transportes era decisivo para esse negócio.

Em relação ao preço desse produto no mercado externo, no período de


1885 a 1890, este cresceu rapidamente acompanhando a demanda, mesmo diante
do elevado montante de entrada de recursos externos decorrentes de empréstimos
e só não ocasionou inflação interna neste momento, dado a valorização da moeda,
consequência favorável das tentativas de estabilização buscada pelo Governo
vista anteriormente.

O quadro apresentado a seguir demonstra determinados indicadores


econômicos produtivos de 1910 a 1929, em que as variações constatadas
nesse período, em todos os setores da economia, confirmam que os efeitos se
propagaram de forma aproximada, em todos os setores, às variações do comércio
internacional. A ênfase maior se deu para as exportações, com destaque para
o produto agrícola, que apresentou, em muitos momentos, variações opostas
ao industrial, contribuindo para resultados predominantemente positivos na
Balança Comercial.

QUADRO 2 – TAXAS DE VARIAÇÕES DE INDICADORES ECONÔMICOS PRODUTIVOS (1910-1929)


PRODUTO PRODUTO
PRODUTO PRODUTO BALANÇA
ANO INTERNO DE EXPORTAÇÕES IMPORTAÇÕES
INDUSTRIAL AGRÍCOLA COMERCIAL
BRUTO SERVIÇOS
1910 7,3 4,4 4,7 7,5 307,3 201,1 106,2
1911 0,4 9,0 -7,4 4,2 325,0 220,9 104,1
1912 10,6 10,7 11,0 11,9 363,3 261,0 102,3
1913 1,6 0,9 -2,2 -0,3 318,9 273,6 45,3

76
TÓPICO 1 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

1914 1,3 -8,7 6,7 -9,3 228.6 146,0 82,5


1915 -1,2 12,9 -0,9 3,7 256,8 115,1 141,7
1916 4,4 11,4 4,2 8,8 269,4 148,3 121,1
1917 5,4 8,7 3,6 3,2 300,1 158,6 141,5
1918 2,0 -1,1 3,0 0,3 291,6 193,9 97,7
1919 5,9 14,8 -1,3 14,4 580,6 280,4 300,3
1920 10,1 5,2 13,4 11,2 408,2 381,8 26,4
1921 1,9 -1,8 4,1 -4,2 224,2 201,1 23,1
1922 7,8 18,8 0,5 9,8 366,1 231,5 134,6
1923 8,6 13,3 3,9 19,4 336,6 207,7 129,0
1924 1,4 -1,1 1,0 4,5 422,7 282,7 140,0
1925 0,0 1,1 -3,2 2,3 496.9 359,3 137,6
1926 5,2 2,4 3,2 1,8 458,1 339,6 118,5
1927 10,8 10,8 10,8 9,2 431,2 335,4 95,8
1928 11,5 7,0 18,4 12,0 473,9 388,8 85,2
1929 1,1 -2,2 0,3 -0,9 460,4 367,7 92,8

FONTE: Adaptado de Abreu (1990, p. 393)

Toda conjuntura comercial foi atrelada a condições favoráveis ou não do


câmbio em períodos anteriores recentes, gerando efeitos nesses indicadores. Em
meados de 1890, a início de 1900, por exemplo, a situação favorável se inverteria,
quando os preços externos passam a entrar em queda, enquanto os preços internos,
a subirem, frente à desvalorização crescente da moeda interna ao longo da década.

A desvalorização do mil réis seria consequência dos seguintes eventos, a


saber: “aumento do meio circulante em função da política monetária implementada
na República, saldos comerciais reduzidos em vários anos e limitado volume
de empréstimos externos, provocando acentuado declínio do valor da moeda
nacional diante da libra esterlina” (GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1997, p. 48).

Era uma conjunção de eventos de forma que, quando o preço externo


do café rebaixava, mesmo que se fosse constatado um aumento do seu preço
no mercado interno, esta condição por si só não era suficiente para sustentar o
setor. Acumulou-se a isso o evento de supersafra, ou seja, quando as colheitas
provenientes de anos atrás, dado o tempo de plantação e colheita, apresentaram
resultados bem-sucedidos, mas que infelizmente, encontraram o mercado externo
em condições bem diferentes.

As medidas nesse cenário exigiram políticas monetárias e fiscais restritivas,


diante da incapacidade de cumprir amortizações externas, gerando ainda mais
endividamento. Alguns efeitos destas medidas promoveram certa recuperação
do câmbio, mas o mercado do café não seria mais o mesmo. Diante de um cenário
com produção e preços crescentes, aliado à valorização da moeda consequente, a
crise de superprodução se consolidaria.

77
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

É nesse momento que se estabeleceu o Convênio de Taubaté, uma


intervenção dos governos de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, a fim
de evitar o agravamento dessa questão, como já mencionado anteriormente na
apresentação do ambiente político, mas que aqui, agora, se contextualiza sua
atuação. Como apresenta Gremaud, de Saes e Júnior (1997, p. 49), as medidas
baseavam-se

Na compra do excedente da safra de café pelo (s) governo (s), 2.


Obtenção de empréstimos externos para gerar os recursos para compra
do excedente, 3. Cobrança de um imposto, em ouro, sobre cada saca
de café exportado a fim de captar recursos para o serviço da dívida
externa incorrida para a compra do excedente; 4. Proibição de novas
plantações de café naqueles Estados; e 5. Para evitar a valorização
da moeda (em decorrência da entrada de volumosos empréstimos
externo), seria estabelecida a Caixa de Conversão. Este seria um órgão
emissor de moeda, com base no lastro de divisas representado pelos
capitais externos que entravam no país (sob a forma de investimentos
diretos). Esta emissão (e conversão do papel moeda em divisas) se
faria a uma taxa fixa de cambio, impedindo assim a valorização da
moeda nacional (e, consequentemente, a perda de receita em mil-réis
do produtor de café).

Entretanto, todas as tentativas pareceram só reafirmar a tese de que


economias primárias exportadoras tendiam a investir cada vez mais nas suas
atividades, dado o caráter de abundância de recursos para esse fim.

E
IMPORTANT

Justamente nesse ponto estaria seu estrangulamento: um produto com


baixa elasticidade renda, e que, de certa forma, seus aumentos produtivos sempre seriam
proporcionalmente maiores, por mais que as demandas crescessem, só poderia reafirmar
seu limite de crescimento!

Assim, o controle de safras foi a única alternativa de impedir sua


desvalorização ininterrupta e amenizar os danos ao lucro do setor, que além
dos seus problemas, também teve que lidar a partir da década de 1930, com
o crescimento da concorrência internacional do produto e os efeitos da crise
americana de 1929, que dificultou principalmente a possibilidade de obtenção de
empréstimos para compra dos excedentes de café.

O quadro a seguir apresenta a evolução da produção de café, sua


exportação e os preços no mercado internacional no período de 1900-1929.
Constata-se que até esse período, o aumento da produção teria sido acompanhado
com o aumento das exportações do produto, mesmo que com menos dinamismo,
mas o suficiente para manter a elevação crescente dos preços, aliado às políticas

78
TÓPICO 1 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

de câmbio. Só a partir de 1930, o excedente passou a ser comprado, como política


de valorização do preço do produto, exigindo cada vez mais recursos, captados
inclusive externamente, ademais as crises externas.

QUADRO 3 – BRASIL: PRODUÇÃO, EXPORTAÇÃO E PREÇO


INTERNACIONAL DO CAFÉ, 1900 – 1929

PRECO
ANO PRODUÇÃO (I) EXPORTAÇÃO (II)
INTERNACIONAL (III)
1900/01 13.845 9.155 7,05
1901/02 15.076 14.760 6,94
1902/03 13.640 13.157 6,54
1903/04 11.217 12.927 6,8
1904/05 11.159 10.025 7,55
1905/06 11.652 10.821 8,35
1906/07 20.607 13.966 8,25
1907/08 11.604 15.680 7,75
1908/09 13.945 12.658 7,55
1909/10 15.567 16.881 7,7
1910/11 11.543 9.724 9,1
1911/12 14.031 11.258 11,8
1912/13 13.515 12.080 13,55
1913/14 13.754 13.268 12,45
1914/15 15.151 11.270 10,35
1915/16 15.773 17.061 9,6
1916/17 13.891 13.069 9,85
1917/18 15.606 10.606 9,55
1918/19 11.781 7.433 11,55
1919/20 8.870 12.963 19,5
1920/21 17.116 11.525 19,5
1921/22 14.276 12.369 10,7
1922/23 14.289 12.673 12,9
1923/24 15.862 14.466 13,5
1924/25 14.801 14.226 17,5
1925/26 15.997 13.482 22,3
1926/27 18.348 13.751 21,6
1927/28 27.848 15.115 18,5
1928/29 16.275 13.881 21,3
1929/30 29.179 14.281 20,4

OBS.: I e II: quantidades em mil sacas de 60 kg.


III: Preço em centavos de Dólar por libra-peso.

FONTE: Gremaud, Saes e Júnior (1997, p. 51)

79
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

De fato, o desfecho da economia cafeeira esteve subordinado a causas


externas e não internas, dado que as condições desde fatores de produção
apresentavam considerável disponibilidade (terra, mão de obra e custos dos
processos ou técnicas produtivas). É possível que essas vantagens, com o tempo,
possam também terem contribuído para as dificuldades sim, já que tendia a
mobilizar cada vez mais recursos para a expansão da produção e não melhoria
de técnicas ou gestão comercial.

As dificuldades foram, predominantemente, decorrentes das flutuações


de demanda externa do produto no mercado internacional. A elasticidade-renda
dos produtos agrícolas eram muito baixas e se agravavam em situações de crises
internacionais, como nos Estados Unidos, grande consumidor do café brasileiro.

Essa condição de baixa elasticidade-renda interferiu “de forma que a


demanda dele tendia a aumentar menos do que a oferta local, que era muito
elástica a preços. Como resultado [...] havia uma tendência muito forte para que
os preços do café caíssem [...] (FURTADO, 2009, p. 85).

E
IMPORTANT

Sob esse ponto de vista, admite-se que a expansão da economia cafeeira era
bem menos um problema de condições estruturais internas, mas sim, majoritariamente,
decorrente de um desajuste ou descompasso, com o mercado internacional, principal
cenário do produto e do capital financeiro. Toda decisão interna dependia do setor externo
sobre esse produto, o que era um fator positivo para nosso mercado (um produto líder), ao
mesmo tempo atuava como ameaça e estrangulamento para a nossa economia.

Por fim, com a introdução da mão de obra assalariada, esta viria a representar
uma oportunidade real de certa recuperação do negócio, na medida em que vai
contribuir para a consolidação de um mercado interno, bastante promissor, não só
para o café, mas para todos os produtos agrícolas do setor exportador ou não, além
do projeto de desenvolvimento industrial que viria na sequência.

80
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• O início da República foi marcado por uma série de acontecimentos sociais e


ampliação dos interesses políticos relacionados a esses acontecimentos. Como
por exemplo a Abolição da Escravatura.

• A transição para mão de obra livre e uma economia incipiente voltada para o
setor agrícola de exportação submeteram as decisões econômicas a interesses
também externos, consequentemente, a uma vulnerabilidade a cenários
internacionais.

• Políticas monetárias e cambiais, via desvalorizações da moeda, monetização


da economia e padrão-ouro, foram os instrumentos mais utilizados para
amenizar os prejuízos gerados pela forte dependência das condições políticas
e econômicas externas.

• O café destacou-se como a principal base produtiva, devido a vantagens de


origens estruturais, políticas, comerciais e específicas do produto. São Paulo foi
a região com maior destaque, dado requisitos de várias ordens.

• A ameaça persistente do câmbio, as dificuldades de financiamento e crédito, o


evento da supersafra, aliada às crises e guerra internacionais, foram dificuldades
que colocaram em risco o lucro do setor cafeeiro.

• A economia do café, com forte dinamismo exportador, mesmo diante das


adversidades do mercado, contribuiu para o crescimento urbano, de demais
serviços e produtos, favorecendo o desenvolvimento econômico do País.

81
AUTOATIVIDADE

1 Já nos primeiros anos de República no Brasil foi possível constatar uma


diversidade e predominância de interesses que influenciaram os rumos dos
governos desse período. Comente essa constatação.

2 Em final do século XIX, a coincidência de problemas relacionados à área monetária


e cambial com os desafios de ampliar a oferta dos bens e serviços na economia,
dado o desenvolvimento do mercado interno, embora ainda em fase inicial, já
promoveria a adoção de medidas de política econômicas mais diretivas.

Diante dessa afirmação e as medidas adotadas, classifique V para as sentenças


verdadeiras, e F para as sentenças falsas:

( ) A necessidade de monetização da economia, decorrente, inclusive do


crescimento da mão de obra assalariada, contribuiu para a adoção de
políticas expansionistas, com o aumento da emissão de moeda, a partir da
base monetária (MO).
( ) Por outro lado, essa monetização da economia se deu sob um processo
de saneamento interno e externo, no tocante às dívidas públicas. Para
isso, a medida do Funding Loan atuou favoravelmente, via negociações e a
promoção de maior liquidez.
( ) O Padrão Ouro chegou a ser cogitado como medida de segurança, em
meados de 1900, afins de propiciar ajustes cambiais internos. Porém, diante
de um inesperado crescimento econômico anterior à primeira Guerra, a
medida não chegou a ser aplicada.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – V.
b) ( ) V – V – F.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

3 Explique em que consistiam as funções da Caixa de Conversão (1906) e da


Caixa de Estabilização (1926), enquanto medidas econômicas na primeira
República.

4 A partir de meados de 1890, a expansão da produção cafeeira na região de


São Paulo passa a frente da produção do Rio de Janeiro, “essa inversão se
daria não só pelo caráter dinâmico dessa cultura [...] mas também, por outras
razões de ordem histórica” (Unidade 2, Tópico 1 em: A base econômica
cafeeira). Justifique essa afirmação:

5 Apresente, de forma sintetizada, em que consistia a política de valorização


do café a partir de 1929.

82
UNIDADE 2 TÓPICO 2

O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO
INÍCIO DO SÉCULO XX

1 INTRODUÇÃO
Olá! Tudo bem até aqui? Vamos dar continuidade a nossa exploração
sobre a Formação Econômica do Brasil! No Tópico 1, apresentamos as origens
do capitalismo no século XIX, sob os contextos de formação e consolidação de
elementos da República Velha.

Para isto, consideramos a dinâmica e efeitos de múltiplos interesses de


classes, aliados à economia do Café e a suas condições de mercado, nem sempre
favoráveis aos objetivos dos agentes econômicos envolvidos, porém, na medida
em que esclarecemos muitos questionamentos, abrem-se espaços para outros! E
para isso, nessa etapa de nossos estudos, vamos avançar para o período onde já
constatamos o início do processo de desenvolvimento da indústria, já no século XX.

No Tópico 2 aprofundaremos um pouco mais as condições que


possibilitaram, não só para a economia do café, mas também para o avanço da
própria industrialização, como a resolução para a questão de mão de obra e suas
consequências na reestruturação dos mercados.

Em seguida, avançaremos em acontecimentos e governos econômicos


que se destacaram diante do desafio de aplicar e implementar um modelo
desenvolvimentista e nacionalista, na perseguição de metas de crescimento e
industrialização brasileira.

Vamos juntos adiante novamente! Boa jornada!

2 A QUESTÃO DO TRABALHO NA CAFEICULTURA


Neste subtópico, será abordada um pouco mais a questão da mão de
obra, referente à ocorrência da imigração e como essa mudança no fator trabalho
atingiu os planos de desenvolvimento econômico e seu curso, no decorrer da
República, promovendo um dinamismo com múltiplos efeitos.

83
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

2.1 IMIGRAÇÃO E DINAMISMO ECONÔMICO


A mão de obra escravista no Brasil foi determinante no período colonial,
especialmente no século XVIII. Todo o desenrolar do processo de fim do Império
a instauração da República, bem como, as decisões de pautas de reivindicações
e interesses, estão relacionados, de alguma forma, a questões do tipo de mão de
obra empregada.

Razões como a amplitude do território brasileiro, as necessidades de


colonização, os benefícios do negócio de tráfico de escravos, o interesse em
manter a grande propriedade nas mãos de grandes latifundiários e a própria
economia brasileira agrícola exportadora, eram algumas das principais razões de
manutenção do esquema escravocrata.

A figura a seguir apresenta o elevado crescimento de escravos no Brasil,


entre 1831-1953, comprovando a relevância desse tipo de mão de obra, facilmente
absorvido em nossa economia.

FIGURA 5 – DESEMBARQUE DE ESCRAVOS AFRICANOS NO BRASIL (1831-1853)

Ano Escravos Ano Escravos


1831 138 1844 22.849
1835 745 1845 19.453
1836 4.966 1846 50.234
1837 35.209 1847 56.172
1838 40.256 1848 60.000
1839 42.182 1849 54.061
1840 20.796 1850 22.856
1841 13.804 1851 3.287
1842 17.435 1852 800
1843 19.095 1853 ---

FONTE: <http://olhonahistoria.blogspot.com/2011/07/atividades-de-historia-do-brasil_20.html>.
Acesso em: 15 jun. 2018.

Entretanto, o republicanismo trouxe em suas proposições de mudanças,


também a intenção de mudanças sociais, garantias e distribuição de direitos, nos
quais a mudança econômica foi inadiável, a fim de acomodar todos os interesses
econômicos de todas as classes, inclusive dos proprietários de terras e escravos.

Os entraves ou inviabilidade da escravidão começariam a dar sinais na


primeira metade do século XIX e levariam a sua extinção, na metade seguinte. “O
esgotamento do ciclo do ouro, a decadência da exportação dos produtos agrícolas
devido à concorrência movida por outras áreas coloniais, além da sistemática
oposição da maior potência capitalista da época – a Grã-Bretanha – ao tráfico de
escravos [...]” (OLIVEIRA, 2012, p. 48).
84
TÓPICO 2 | O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

O processo de acomodação das classes defendido pelo republicanismo,


justamente necessitava de uma economia com mão de obra livre. Essa condição
já era presente na Europa e, além das questões de ordem moral ou religiosas, que
condenavam essa prática, existia um ambiente que favoreceria essa defesa.

Esse ambiente seria promovido pela Revolução Industrial, que, sob um


sistema capitalista e industrial crescente, exigiu a ampliação dos mercados,
especialmente, os internacionais.

Cabe notar que o crescimento demográfico e a generalização das


relações capitalistas de trabalho nos países mais avançados e suas
colônias disseminavam-se cada vez mais em face da crescente
disponibilidade de mão de obra livre, que acentuava as vantagens
desta frente aos escravos. Afinal, a aquisição de escravos sempre
foi custosa e seu tempo de vida produtiva imprevisível [...]. Já o
trabalhador assalariado, numa conjuntura histórica em que inexistiam
quaisquer direitos trabalhistas, além de receber um rendimento ínfimo
que mal cobria suas necessidades básicas de subsistência, podia ser
dispensado sempre que houvesse uma queda na demanda dos artigos
que produzia (OLIVEIRA, 2012, p. 49).

Não foi uma tarefa fácil, embora sob inúmeras justificativas, o processo
abolicionista no Brasil seria árduo e longo. A pressão da Inglaterra foi intermitente,
várias medias e dificuldades comerciais e políticas foram acirradas com o Brasil.
Havia um grande desinteresse por parte dos latifundiários que mais se beneficiavam
com a escravidão, em adotar a tendência mundial. Entretanto, após o esvaziamento
do debate em torno do futuro da oferta dessa mão de obra, em 1888, a Lei Áurea
daria um fim irreversível à escravidão com já foi apresentado em tópico anterior.

Certamente, o fim da escravidão representa uma necessidade de se adaptar


à nova necessidade do país, de desenvolvimento econômico, a fim de desenvolver
a indústria. Até procura-se justificar que essa mão de obra não seria útil, dado as
habilidades exigidas pela industrialização ou processos mais elaborados.

Furtado apud Furtado (2009, p. 82) sobre a introdução da mão de obra


europeia, destaca que,

[...] seu sucesso estava na sua efetiva integração aos circuitos comerciais
da economia mundial em gestação a partir da Revolução Industrial. O
êxito da imigração não estava na economia de subsistência, mas na sua
efetiva inserção dentro dos fluxos monetários e comerciais da economia
global [...]. No Brasil, a inserção da imigração europeia ocorreu de uma
forma singular, por meio do trabalho assalariado nas grandes plantações
de café, durante a metade do século XIX. Constitui-se um caso inédito
em que a imigração europeia foi direcionada para a produção agrícolas
tropicais [...]. Nesse contexto, de mudança de relações de trabalho, [...]
a Abolição da escravatura não trouxe melhoras significativas para a
população trabalhadora, mais pobre na maior parte do país.

É importante estar atento para uma questão já apresentada, que é um fator


decisivo para a alternativa da imigração europeia sob o contexto de expansão da
produção cafeeira na metade do século XIX. Esse contexto custou o pagamento

85
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

de salários, para a manutenção da lógica cafeeira e promoveu a integração dos


setores exportadores com o mercado interno em crescimento.

A tabela a seguir apresenta o dinamismo da imigração, já anterior a


República, com destaque para a década de 1920, decorrente, principalmente, da
economia do café e indústria (mesmo que incipiente), com destaque aos italianos.

TABELA 3 – IMIGRAÇÃO LÍQUIDA: BRASIL, 1881 – 1930 ( EM MILHARES)

Chegadas Portugueses Italianos Espanhóis Alemães Japoneses


1881-1885 133,4 32 47 8 8 –
1886-1890 391,6 19 59 8 3 –
1891-1895 659,7 20 57 14 1 –
1896-1900 470,3 15 64 13 1 –
1901-1905 279,7 26 48 16 1 –
1906-1910 391,6 37 21 22 4 1
1911-1915 611,4 40 17 21 3 2
1916-1920 186,4 42 15 22 3 7
1921-1925 386,6 32 16 12 13 5
1926-1930 453,6 36 9 7 6 13
3.964,3 29 36 14 5 3
FONTE: <http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos20/CafeEIndustria/Imigracao>.
Acesso em: 15 jun. 2018.

Não bastasse essas necessidades, as crises de desequilíbrio externo na


década de 30 promoveram o recondicionamento do foco ao mercado externo, ao
foco ao mercado interno, como alternativa de desenvolvimento. Sem dúvidas,
esse momento foi a gênese da tomada de consciência de que a industrialização
seria a meta de crescimento a partir desse momento. O que veremos mais adiante.

A região de maior assimilação da mão de obra livre, inicialmente imigrante,


foi a região Sudeste. “Em fins do século XIX, os imigrantes representavam cerca
de metade da população adulta de São Paulo e mais de 10% do país” (LACERDA
et al., 2000, p. 42).

NOTA

Uma investigação parcial dos recursos de mão de obra efetuada em 1882


demonstrou que de cerca de 5 milhões de pessoas na idade de 13 a 45 anos que viviam nas 6
maiores províncias do país – Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Bahia, Pernambuco e Ceará
–, 651 mil, ou 13% eram escravos. O número de pessoas livres que se dedicavam a qualquer
trabalho era igual a 1,4 milhão, ou 29%. As demais 2,9 milhões, ou 58% de toda população apta
ao trabalho, foram qualificadas como “indivíduos sem ocupação certa” (LACERDA et al., 2000).

86
TÓPICO 2 | O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

Aqui constatamos, no gráfico a seguir, a procedência dos imigrantes


majoritariamente italiana, com maior destino a São Paulo, diante do impulso à
economia e urbanização atuante, que promoveu e acomodou, cada vez mais, o
processo imigratório em seu desenvolvimento.

GRÁFICO 1 – PROCEDÊNCIA DOS IMIGRANTES NA VELHA REPÚBLICA


São Paulo recebeu o maior número de
imigrantes (57%), devido à expansão
cafeeira e incentivo do governo à
imigração.
23%
33% Italianos
Portugueses
Espanhóis
Outros
15%

Alemães, japoneses, sírios-libaneses,


29% russo, lituanos e austríacos, entre
outros.

OBS.: 33% Italianos, 29% Portugueses, 23% Outros e 15% Espanhóis.

FONTE: <https://www.slideshare.net/marpim/histria-do-brasil-da-repblica-a-era-vargas>.
Acesso em: 15 jun. 2018.

Havia certa preferência por imigrantes com algum tipo de qualificação e


os brasileiros eram mais estabelecidos em atividades mais tradicionais, sempre
em condições ainda piores de contratação. Admite-se que seu custo, apesar de
todo aparato, podia ainda ser inferior à manutenção de um escravo. Associação
de total descaso econômico com desinteresse social, tanto com a situação dos ex-
escravos, quanto aos brasileiros natos não escravos, que subsistiam num sistema
ainda mais miserável de exploração.

DICAS

Assista ao vídeo-documentário, “A imigração italiana em São Paulo”. Disponível


em:<http://www.kinemafilmes.com.br/video-documentario/video-documentario-
imigracao-italiana-em-sao-paulo>, que apresenta um pouco mais sobre essa história, parte da
formação econômica do Brasil, a partir do acervo de vídeos e fotos do Museu do Imigrantes.

Ademais, à ausência de condições de desenvolvimento da força de


trabalho assalariada acrescenta-se o agravamento da monopolização das terras e
baixa distribuição ou ausência de direitos a propriedades, a ponto de não restar
outra alternativa, a não ser a submissão a um sistema prejudicial e explorador da
mão de obra livre nascente.
87
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

Sob o cenário de formação de mercado interno, uma necessidade diante


dos desafios impostos no cenário externo para nossa base primária exportadora, o
surgimento do trabalho assalariado e livre do imigrante europeu na lavoura cafeeira,
foi um marco na criação de consumidores e desenvolvimento das forças produtivas.

A figura a seguir demonstra um cenário de colheita do café, já realizada por


Imigrantes ou colonos. Parte deles foi absorvida na produção agrícola, especialmente
nos cafezais, embora a justificativa inicial fosse para abastecer as fábricas nas regiões
mais urbanizadas, em pleno processo de extensão internamente.

FIGURA 6 – COLHEITA DO CAFÉ – SÃO PAULO

FONTE: <http://www.familiavaccaro.com.br/historia-da-familia-vaccaro.php>.
Acesso em: 23 jul. 2018.

Detalhado em um contrato, fazendeiros e colonos definiam valores


monetários e de produção. Isto é, uma quantidade da plantação ou lote de
terra aos cuidados do colono, e valores correspondentes por produtividade
colhida posteriormente. De certa forma, havia uma pequena margem para uma
atividade extra de subsistência, na própria terra destinada ao café, cujas maiores
necessidades eram adquiridas via o consumo no mercado urbano local.

Por mais limitado e precário que fosse esse trabalho remunerado em parte,
porém livre, ele ainda assim permitiu a ocorrência de efeitos multiplicadores de
movimentação de mão de obra rural para urbana, certa dinâmica de comércio e
produção de manufaturados, mobilização de recursos para esfera das cidades e
atividades relacionadas, mobilizadas por necessidades das famílias de bens de
consumo, só alcançadas graças a disponibilidade do dinheiro ou renda.

Ademais a grande atratividade que tinha o colono em desenvolver vínculos


com a terra, e dela, juntamente com seu trabalho, tirar o máximo que pudesse para
sua subsistência, deixando o comércio como alternativa última de suprir suas
necessidades. Questiona-se, inclusive, se o trabalho assalariado, de fato, chegou a
se implantar na economia brasileira agrícola no Brasil neste período, dado as suas
singularidades. “Além do colonato, na área cafeeira, predominaram formas de
parceria (como a meação, onde se adquire direitos por uso compartilhado) ou de
clara dependência entre proprietário e trabalhador (como chamado “morador”)
(GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1997, p. 56).
88
TÓPICO 2 | O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

E
IMPORTANT

“Colonato é o nome que se dá a um sistema de exploração de grandes


propriedades entre diversos colonos ou meeiros, que ficam incumbidos de cultivar uma
determinada área e entregar parte da produção ao proprietário, conservando outra parte
para seu próprio consumo. Ao longo da história, temos vários exemplos do emprego do
regime de colonato, quase sempre ligados a uma crise ou escassez de mão de obra escrava”.

FONTE: <https://www.infoescola.com/agricultura/colonato/>. Acesso em: 23 jul. 2018.

Sobre os fluxos migratórios, chama-se a atenção ao fato de que,

[...] se modificaram nas primeiras décadas do século XX. Redução da


imigração subvencionada e aumento da imigração espontânea que, com
frequência, busca os centros urbanos e não o trabalho agrícola; redução
da parcela de imigrantes representada por italianos com crescimento da
imigração portuguesa, espanhola e japonesa, intenso fluxo de saída de
imigrantes em certos períodos (por exemplo, de 1902 a 1910, apesar da
entrada de 330 mil imigrantes, o fluxo líquido, ou seja, descontadas as saídas,
foi de apenas 17 mil); aumento das migrações internas para São Paulo a partir
de 1920, fazendo com que nos anos 30 essa fonte de mão de obra já fosse
maior do que a imigração [...] (GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1997, p. 56).

Diante disso, fica evidente a complexidade desse trabalhador, que atraído por
inúmeras razões, mesclou-se ao contingente local brasileiro, na busca por oportunidades
de subsistência. Fica claro que existiu uma certa dependência maior por parte dos
contratantes, ou fazendeiros, nesse momento, na medida em que estes eram proprietários
e, consequentemente, controlavam a maior parte do processo de produção.

NOTA

Certamente muitos de nós somos descendentes, decorrente de algum laço


familiar, de um ou mais imigrantes! Com nosso histórico de colônia, é inevitável nossa
identificação como imigrantes. Nossa cultura, hábitos, preferências, habilidades, dificuldades,
desafios, e objetivos, inclusive pessoais, podem estar associados a essa condição! Pense nisso!

Entretanto, as condições internas da economia voltadas para a exportação


se alteraram nas primeiras décadas do século XX, com a queda dos produtos
primários na pauta das exportações, conforme demonstra o quadro a seguir.

89
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

QUADRO 4 – BRASIL: PARTICIPAÇÃO DOS PRINCIPAIS PRODUTOS NO VALOR DAS


EXPORTAÇÕES 1889-1929 (%)
COUROS
PERÍODO CAFÉ AÇÚCAR CACAU MATE FUMO ALGODÃO BORRACHA OUTROS
E PELES
1889-1897
67,6 6,5 1,1 1,2 1,7 2,9 11,8 2,4 4,8

1898-1910 52,7 1,9 2,7 2,7 2,8 2,1 25,7 4,2 5,2
1911-1913 61,7 0,3 2,3 2,3 1,9 2,1 20,0 4,2 4,4
1914-1918 47,4 3,9 4,2 4,2 2,8 1,4 12,0 7,5 17,4
1919-1923 58,8 4,7 3,3 3,3 2,6 3,4 3,0 5,3 16,5
1224-1929 72,5 0,4 3,3 3,3 2,0 1,9 2,8 4,5 9,7

FONTE: Adaptado de Gremaud, Saes e Júnior (1997, p. 57)

Embora o café ainda se manteve como produto de maior exportação, foi


notória a perda de dinamismo como já vimos anteriormente, inclusive dos demais
produtos, seguido da borracha (Amazônia e Pará), cuja competitividade com a
produção do Oriente após a Guerra, aplacariam sua produtividade. Esses efeitos,
além de representarem reduções nos níveis produtivos, afetaram fortemente o
fluxo de migração interna e condições de vida dessas comunidades.

Em relação ao açúcar, por exemplo, ademais as crises que afetariam


em vários momentos do final do século XIX, seja por questões de redução de
demanda pela guerra, competitividade com outros fornecedores, problemas com
financiamento externo e afins, essa produção, manteve-se em destaque, graças ao
contexto de expansão do mercado interno, incentivado ainda mais pela imigração
e urbanização crescente.

O resgate de certo dinamismo decorrente dos mercados regionais também


foi constatado no cacau e no fumo (na Bahia), no mate (Paraná e Mato Grosso),
no algodão (interior do Nordeste), e no couro e peles (dissipados no país, com
destaque ao Rio Grande do Sul).

A mesma tendência a produção para o mercado interno também


se verificou na agricultura paulista. Wilson Cano identificou, já na
segunda década do século XX, uma clara diversificação da produção
agrícola paulista que, ao lado da exportação de café, passava a dirigir
para o mercado interno do próprio Estado de São Paulo ou de outras
regiões uma série de produtos alimentares. Esta caracterização da
produção primária na Primeira República – que buscou ressaltar a
diversidade da produção exportável e a expansão da produção para
o mercado interno – não deve, no entanto, fazer-nos esquecer o papel
preponderante do café na dinâmica da economia brasileira desse
período (GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1997, p. 61).

Gradualmente, a mão de obra, que por um lado causou, também por


outro lado, sofreu com os efeitos decorrentes dessas mudanças do dinamismo
produtivo interno.

90
TÓPICO 2 | O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

As relações de trabalho, consequentemente, foram se adaptando e


tornando-se mais elaboradas, com maiores atribuições diante de novas exigências
de um mercado e sistema industrial crescente, que exigiu uma reorganização do
Estado, a qual veremos mais adiante, deliberada sobre novos atores e cenários
econômicos atuantes.

3 O DESENVOLVIMENTISMO E
NACIONALISMO ECONÔMICO
Na sequência, este subtópico vai apresentar a efervescência política,
social e econômica, na qual o país é influenciado quanto à condução de seu
projeto de desenvolvimento. O conflito e a diversificação de interesses e
atividades serão os cenários mobilizadores da política populista, seus alcances
e desfechos. Vamos adiante!

3.1 OS PRECEDENTES DE UM PROJETO MAIOR


Entender o processo de industrialização brasileiro incorre em buscar
conhecer os acontecimentos que contribuíram para o declínio de uma forma de
governar que caracterizava a velha República, através de políticas oligárquicas
que favoreciam os interesses da política do café com leite, como já verificamos.

São inúmeros acontecimentos políticos nesse período que revelam


insatisfações, que foram além da abolição da escravatura. Revoltas regionais,
militares ou federalistas, saudosistas do modo imperial, defensores de ideários
sociais, oposições a política cafeeira, insatisfações com as políticas centralistas e
autoritárias de muitos presidentes, além das demandas que cresciam, na medida
em que se diversificava a lógica econômica e avançava a demanda das populações
urbanas nas grandes cidades.

NOTA

As revoltas nesse período foram inúmeras. Algumas delas como a Guerra de


Canudos (1896-1897) e a Guerra do Contestado (1912-1916), eram movimentos de cunhos
sociais, populares e regionalistas, que buscavam promover uma organização política e
social, ignorando a autoridade e atribuições da República, assim como o tenentismo. Esse,
entretanto, era um movimento liderado pelos oficiais das forças armadas e possuía uma
representatividade mais associada às classes médias que desejavam o poder.

Já a Revolução de 30 foi um movimento organizado pelos Estados de Minas Gerais, Paraíba


e Rio Grande do Sul, contra o Presidente, na época de Washington Luís, também com
aspirações de poder, via um golpe e o fim da Velha República.

91
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

DICAS

Que tal saber mais sobre cada um desses movimentos históricos com
detalhes? O livro, “Histórias não (ou mal) contadas. Revoltas, golpes e revoluções
no Brasil”, de Rodrigo Trespach, Editora Harper Collins, 2017, é uma excelente dica!

FIGURA 7 – CAPA DO LIVRO

FONTE: <https://bit.ly/2SU0vw1>. Acesso em: 25 out. 2018.

Entretanto, é nesse contexto, no Governo Rodrigo Alves (1902-1906), que


se inicia o projeto de modernização das cidades, o que coincide com o declínio da
política café com leite, graças ao excesso de oferta do produto café no mercado,
ocasionando as pressões pela compra e armazenamento seguinte.

De qualquer forma, a política de imigração com alternativa no governo


de Afonso Pena (1906-1909) e Nilo Peçanha (1909-1910) encontraria melhor
desempenho no breve desenvolvimento no governo de Wenceslau Brás (1914-
1918), com o início do processo de substituições de importações, o qual veremos
mais adiante (COSTA, 2007).

E
IMPORTANT

As Indústrias MATARAZZO, assim como o Grupo Votorantin, são exemplos de


grandes investimentos de empresários – imigrantes que contribuíram para consolidação da
indústria em nosso País.

O que eles têm em comum??

Espírito empreendedor! O que contribuiu para o entendimento de que investir em todo o


processo de produção e a diversificação dos produtos seria a base para a acumulação de
capital e ampliação de sua competitividade a longo prazo!

92
TÓPICO 2 | O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

NOTA

“Francisco Matarazzo chegou ao Brasil em 1881. Tinha instrução superior, alguma


experiência comercial e o desejo de enriquecer. Estabeleceu-se inicialmente em Sorocaba-SP,
onde se empenhou no comércio de porcos e de toucinho. Cerca de nove anos depois já havia
conseguido acumular um capital de cerca de 4,5 mil libras esterlinas e mudou-se à capital do
estado, onde fundou uma firma comercial especializada na importação de farinha de trigo e de
toucinho. Nos dez anos seguintes, isto é, até 1900, aumentou ainda mais as suas propriedades
e estabeleceu relações de amizade que o ajudaram, em particular, a obter crédito do British
Bank of South America [...]. Em 1904, Matarazzo fundou uma fábrica têxtil, com o objetivo de
produzir suas próprias necessidades de tecidos para confeccionar os seus sacos. Mais tarde,
construiu uma fábrica de tecidos finos. A fim de adquirir matérias-primas sem intermediários,
Matarazzo criou nas regiões algodoeiras uma rede de empresas de beneficiamento de algodão
[...]. A seguir, fundou fábricas de fósforos, de massas, de círios, de conservas, serrarias, uma
empresa de caixas de madeira, uma tipografia, assim como fábricas de seda artificial, de ácido
sulfúrico, de cerâmica, de porcelana etc. Adquiriu vários navios e construiu uma doca própria,
assim como uma fábrica de fundição e uma oficina mecânica para consertar os equipamentos
de suas numerosas empresas [...]” (LACERDA et al. 1997, p., 87).

Em 1929, a crise internacional, que fez o preço e as exportações do


café baixarem, demarcou o ápice da desestabilização econômica e política, no
Governo de Washington Luís (1926-1930), o qual seria substituído por Getúlio
Vargas, sob um processo de golpe de Estado. Nesse momento, encerra-se de vez
o ciclo da República Velha e o país é lançado em um novo ciclo de transformações
e desenvolvimento.

Toda lógica dos acontecimentos econômicos a partir desse momento


ocorreu sob o Pensamento Desenvolvimentista, uma forma de compreender as
causas de uma mudança de rumo do desenvolvimento que terminou por justificar
determinadas ações e resultados, com influências até os dias de hoje.

UNI

Sobre o Desenvolvimentismo, “[...] foi uma resposta aos desafios e oportunidades


criados pela Grande Depressão dos anos 1930. Os projetos nacionais de desenvolvimento
e industrialização na periferia nasceram no mesmo berço que produziu o keynesianismo
nos países centrais.  A onda desenvolvimentista e a experiência keynesiana tiveram o seu
apogeu nas três décadas que sucederam o fim da Segunda Guerra. O clima político e social
estava saturado da ideia de que era possível adotar estratégias nacionais e intencionais de
crescimento, industrialização e avanço social. Os resultados, ainda que desiguais, não foram
ruins. Comparada a qualquer outro período do capitalismo, anterior ou posterior, a era
desenvolvimentista e keynesiana apresentou desempenho muito superior em termos de taxas
de crescimento do PIB, de criação de empregos, de aumentos dos salários reais e, no caso
de países como o Brasil, ficou devendo a universalização dos direitos sociais e econômicos”.

FONTE: O Desenvolvimentismo. <http://www.centrocelsofurtado.org.br/interna.php?ID_S=72>.


Acesso em: 23 jul. 2018.

93
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

Logo, teríamos um conjunto de elementos que ajudariam a compor os


requisitos para o desenvolvimento do Brasil via modernização e industrialização.

A defesa dos interesses do setor exportador de café implicou a


revalorização frequente desse produto, mesmo que sob desvalorizações de nossa
moeda. Enquanto isso, a valorização das importações junto com o processo
de urbanização crescente estimulou o mercado interno e industrial de bens de
consumo populares como têxteis e alimentos. Aliado a esses eventos, a Primeira
Guerra Mundial mais a crise de 1929 completariam o quadro que pressionou a
renovação do parque industrial brasileiro (GENNARI; OLIVEIRA, 2009). Assim,

A crise de 1929, as respostas adotadas pelas nações à crise no


decorrer da década de 1930 e a Segunda Guerra Mundial provocaram
transformações profundas na evolução da indústria no Brasil. No
decorrer de 15 anos, as relações de troca internacionais sofreram um
abalo gigantesco [...]. A grande instabilidade do mercado mundial
fortaleceu a convicção, entre todas as nações, de que a continuidade
de desenvolvimento passava, necessariamente, por um esforço
de mobilização nacional. [...] No Brasil, [...] catalisou os conflitos
intraoligárquicos e produziu uma convergência entre várias classes e
grupos sociais que se opunham tanto às práticas políticas das frações
oligárquicas lideradas por São Paulo e Minas Gerais quanto ao modelo
agroexportador que submetia o conjunto da nação às necessidades de
reprodução do capital vinculado ao negócio cafeeiro. [...] encararam
esse momento político como uma oportunidade de tirar o setor
industrial do papel de coadjuvante no cenário econômico nacional.
Coube à Getúlio Vargas a habilidade política para articular esse
conjunto de interesses [...] (GENNARI; OLIVEIRA, 2009, p. 334).

Coube então ao Estado Novo, em 1927, a nova atribuição de associar ao


nacionalismo vigente uma nova rota de desenvolvimento, focada no pensamento
desenvolvimentista.

Segundo Simonsen (apud GENNARI; OLIVEIRA, 2009), isto é, Roberto


Cochrane Simonsen (1889-1948), grande industrial brasileiro e um dos primeiros
defensores do desenvolvimentismo brasileiro, a consciência nacional deveria ser
mobilizada com o objetivo de promover a industrialização plena no Brasil. Isso só
seria possível, a partir da formação de uma forte indústria de bens de consumo,
de capital e de base.

Dessa forma, o intervencionismo, o protecionismo e o planejamento seriam


eficazes, coincidentemente e sem representar ameaça alguma à democracia.
Nessa mesma linha, dever-se-ia incrementar a industrialização inclusive no setor
agrícola, comprovando que até nesse meio, a modernização traria ainda mais
benefícios, porém, refutando a posição mundial brasileira de acomodação apenas
como fornecedor de matérias-primas.

Uma abordagem interessante ainda do autor, refere-se à defesa de que,

[...] a industrialização contribuía para atenuar os efeitos das crises


externas, pois a expansão das atividades assalariadas urbanas criava
um mercado alternativo para a produção agrícola nacional [...]

94
TÓPICO 2 | O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

identificou uma tendência de queda na produção per capita exportada


comparativamente às necessidades de consumo via importação,
que cresciam ininterruptamente, abrindo a possibilidade de crises
cambiais [...] também defendeu o controle do comércio exterior, pela
restrição de aquisições de bens de consumo em troca de facilidades
para a importação de bens de capital necessários ao desenvolvimento
nacional (GENNARI; OLIVEIRA, 2009, p. 337).

Outro grande defensor, Roberto de Oliveira Campos (apud GENNARI;


OLIVEIRA, 2009) argumentou a impossibilidade da coincidência entre
desenvolvimento econômico e redistribuição de renda. Assim, a prioridade seria
o desenvolvimento econômico, que com o tempo, levaria a melhoria em termos
de bem-estar social. Se a escolha fosse diferente, ou seja, a prioridade fosse a
redistribuição de renda, teríamos na verdade, uma redistribuição da pobreza.

Para Campos (apud GENNARI; OLIVEIRA, 2009, p. 349) em relação ao


nível de industrialização no Brasil em meados de 1950, o autor admitiu ser um
momento decisivo de mobilização,

[...] os requisitos econômicos da arrancada seriam, primeiramente,


a criação de infraestrutura, principalmente no setor de transportes,
em seguida, um surto na produção agrícola capaz de financiar a
industrialização, em terceiro lugar, um nível de poupança de no
mínimo 10% a 12% ao ano, em quarto lugar, a existência da capacidade
de importar, seja mediante exportações, seja mediante o influxo
de capital, para aquisição de equipamentos e matérias-primas, em
quinto lugar, a emergência de setores de vanguarda “que deflagrem o
processo de modernização”. Pressupõem-se, ainda, a existência de um
núcleo empresarial capaz de absorver tecnologia.

DICAS

Para saber mais sobre as biografias desses autores defensores do


desenvolvimentismo, acessar: <http://biografias.netsaber.com.br/biografia-3011/biografia-de-
roberto-de-oliveira-campos> e <http://biografias.netsaber.com.br/biografia-3009/biografia-
de-roberto-cochrane-simonsen>. Boa leitura!

Diante dessas posições, ficaria claro que um projeto desenvolvimentista estaria


de acordo com os objetivos brasileiros de crescimento econômico e desenvolvimento,
através da superação de dificuldades estruturais, subjacentes aos modelos até agora
enfatizados. Esse projeto será viabilizado, como veremos a seguir.

95
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

3.2 O POPULISMO COMO VIA ECONÔMICA


Sobre o ambiente político, inflamado pelo pensamento desenvolvimentista,
foi Getúlio Vargas (1930-1954) o responsável por deliberadamente instituir na
prática o discurso e a era do populismo no Brasil. A figura a seguir é da imagem
de um presidente que marcaria para sempre a governabilidade das políticas
públicas dos Estados.

FIGURA 8 – PRESIDENTE GETÚLIO DORNELLES VARGAS (1882-1954)

FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Get%C3%BAlio_Vargas#/media/File:Getulio_Vargas_
(1930).jpg>. Acesso em: 23 jun. 2018.

Sua base política era composta por militares, aliado a oligarquias estaduais,
que por usa vez, possuíam como apoiadores, intelectuais e técnicos preocupados
em modernizar a economia e todos os objetivos de crescimento do país, ou seja,
colocar em ação os planos nacionalistas.

Admite-se que além do centralismo e autoritarismo clássico dos governos


da era Republicana, Vargas possuía o apoio das populações urbanas, nas cidades
que cresciam e que se qualificavam tanto pelas indústrias nascentes, como nos
atores políticos e demandas sociais cada vez mais diversas.

DICAS

Mas o que caracteriza um governante populista?

“Trata-se daquele líder que dá a entender, por seus discursos e propagandas, que sua gestão é
para o bem de todos, tanto para os que lhe são próximos como para as diferentes partições que
formam o povo que governa. Além disso, esse tipo de governante centra seus discursos em uma
lógica em que todas as mazelas de seu governo são frutos daqueles que são contra ele e, por
consequência, são contra o povo. Todavia, geralmente, o que esse líder realmente busca é a
manipulação do ambiente sociopolítico para se fortalecer no poder” (BRAGA; SILVA, 2016, p. 179).

96
TÓPICO 2 | O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

O presidente, chegando ao poder, atuou de maneira autoritária, encerrando


o congresso, assembleias e câmaras, removendo governadores e, arbitrariamente,
escolhendo e nominando outros indivíduos de confiança para essas funções.
Admite-se que esse presidente teria sido o primeiro a trabalhar com a mídia da
comunicação, de forma a contribuir e divulgar suas ações e objetivos políticos
(COSTA, 2007).

Foi um governo que concentrou nos trabalhadores urbanos o suporte


de seu regime político, na medida em que, em caráter de populista, atendia a
reinvindicações dos sindicatos, ao mesmo tempo em que os subordinavam ao
Ministério do Trabalho, controlando seu alcance e ações.

NOTA

“A CLT surgiu pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1 de maio de 1943, sancionada pelo


então presidente Getúlio Vargas, unificou toda legislação trabalhista existente no Brasil (...).
A Consolidação das Leis do Trabalho, cuja sigla é CLT, regulamenta as relações trabalhistas,
tanto do trabalho urbano quanto do rural”.

FONTE: A Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT Guia Trabalhista”. <www.guiatrabalhista.


com.br/tematicas/clt.htm>. Acesso em: 1 ago. 2018.

As bases oligárquicas também ficariam subordinadas a esse Governo.


Políticas agrícolas e cafeicultores, agora teriam no governo seu principal regente.

A crise gerada pela brusca queda das exportações em 1929 propiciou


ao governo controlar as importações e centralizar o câmbio no Banco
do Brasil, aumentando o controle do governo sobre empresários de
diversos setores de atividade. Em 1933, pela primeira vez, o produto
industrial superou o produto agrícola, em decorrência da brutal queda
nos preços agrícolas em 1929 e do controle das importações, que
funcionava como um incentivo a expansão industrial. A partir desse
momento a indústria passou a ser o setor predominante na economia
(COSTA, 2007, p. 15).

A crise no café, devido à grande depressão, desaqueceu a economia


com base agrícola de exportação e atraiu capitais à indústria, em sintonia com o
crescimento do mercado interno, inclusive para os próprios produtos agrícolas,
o que também contribuiu para o câmbio, valorizando nossa moeda. Entretanto,
isso ocorreu, até as importações aumentarem consideravelmente, como em 1937,
quando a escassez de divisas levou o governo a adotar o monopólio cambial
como forma de controle.

As oportunidades de aumento de produção industrial interna nesse período


foram pemitidas, primeiramente, dado à ociosidade interna de capacidade, e em

97
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

seguida, pela oferta acessível desses bens de capitais no mercado externo. Uma
terceira razão seria a necessidade de produtos industriais no comércio externo,
dado a desorganização do setor nesse ambiente, ocasionado pelo contexto das
guerras. Em 1941 então, alcancaríamos situacões mais frequentes de balanças
comerciais favoráveis.

Dessa forma, diante da gradual reducão do papel da produção cafeeira


no cenário econômico, sua participação política enquanto interesses passou a
submeter-se à descentralização republicana e à organização de um projeto de
desenvolvimento econômico maior.

Historiadores econômicos defendem que,

[...] nos processos de industrialização no século XX, período do


capitalismo monopolista, com predomínio das grandes coorporações,
as escalas técnicas e financeiras requeridas para o avanço da
industrialização estavam muito acima das forças capitalistas locais. Por
outro lado, somente após a segunda Guerra, o movimento de expansão
mundial das multinacionais se intensificaria. Assim, na década de
30, os capitais privados nacionais eram frágeis [...]. Portanto, a única
possibilidade de implantar grandes projetos de indústria de bens de
produção residia na ação estatal, o que era exatamente a proposta de
Vargas (LACERDA et al., 2000, p. 75).

A tabela a seguir apresenta as taxas de crescimento da economia na década


de 1920 e 1930, comprovando a inversão da lógica produtiva, isto é, crescimento
da indústria e redução da atividade agrícola.

TABELA 4 – BRASIL – TAXAS MÉDIAS ANUAIS DE CRESCIMENTO DA ECONOMIA 1920-1939

1920-29 1929-33 1933-39


(%) (%) (%)
Produção agrícola 4,0 2,5 1,6
Produção agrícola de exportação 7,5 3,7 1,1
Produção Industrial 2,8 4,4 11,2
Produto Físico 3,9 2,9 4,9

FONTE: <http://periodicos.ses.sp.bvs.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-
76342006000100003&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt>. Acesso em: 23 jun. 2018.

Entretanto, o autoritarismo não agradava aos liberais, e as tentativas de


retirar Getúlio Vargas do poder, apenas aguçava ainda mais o seu interesse em
permanecer, contribuindo inclusive, para a promulgação da Constituição de
1937 e da ditadura do Estado Novo. Foram inúmeros os momentos de impasse e
grande agitação política, até a destituição de Vargas em 1934, conhecido como o
Golpe Comunista.

98
TÓPICO 2 | O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

NOTA

Em que consistiu o ESTADO NOVO?

“Com a promulgação da Constituição de 1934, chegou ao fim o chamado governo provisório,


instaurando uma Assembleia Nacional Constituinte, introduziu no país uma nova ordem
jurídico-política que consagrava a democracia, com a garantia do voto com a vitória da
Revolução de 1930. A nova Constituição elaborada por voto direto e secreto, da pluralidade
sindical, da alternância no poder, dos direitos civis e da liberdade de expressão dos cidadãos.
Particularmente para as mulheres, a Constituição de 1934 representou uma enorme
conquista: pela primeira vez, tornavam-se eleitoras e elegíveis. No entanto, a Constituição
durou pouco. Três anos depois, antes mesmo que a primeira eleição que elegeria o novo
presidente se realizasse, Getúlio Vargas deu um golpe para manter-se no poder e instaurou
uma ditadura, conhecida como Estado Novo”. 

FONTE: <https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/FatosImagens/EstadoNovo>. Acesso em: 26


jul. 2018.

FIGURA 9 – CONSTITUIÇÃO DE 1934

FONTE: <https://www.sohistoria.com.br/ef2/eravargas/p1.php>. Acesso em: 25 out. 2018.

Vargas manteve sua política de aproximação com a classe trabalhadora e


buscou ampliar relações com as indústrias e com as tradicionais classes agrárias,
via instrumentos ou órgãos políticos que firmavam políticas nacionais e regionais
que alcançavam a todos.

“[...] essa teia de relações [...] com o apoio das forças armadas, garantiu
ampla dominação [...] a ausência de mecanismos formais de representação [...]
o caráter ditatorial [...] – era foco de permanente insatisfação de vários grupos
sociais [...]” (GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1996, p. 102). Insatisfação essa, sempre
relacionada com a insuficiente participação política sob esse regime.

É sob essa insatisfação que seu apoio popular sofreu instabilidade, quando
em 1945 é deflagrada sua saída antes mesmo de eleições previstas, encerrando seu
99
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

primeiro ciclo de poder. De 1930 a 1934, como chefe de governo provisório dada
a Revolução de 30, como presidente constitucionalmente eleito de 1934 a 1937 e
até 1945 como ditador do Estado Novo, assumindo a partir desse momento, o
General Eurico Gaspar Dutra, com o apoio do próprio Presidente Vargas.

Ainda assim, o esforço ideológico de perseguir o desenvolvimento via


indústria, mais a sobrevalorização do poder do governo, seriam prerrogativas
mantidas. Ademais, apresenta-se a Constituição de 1946, com prerrogativas ainda
mais includentes, abordando temas como igualdade, liberdade e direitos individuais.

DICAS

Para saber mais sobre esta e todas as demais constituições brasileiras


promulgadas, consulte o link <http://www.politize.com.br/>.

Após a guerra, a política adotada estabelecia os princípios liberais, na


crença de que uma política liberal de câmbio se ajustaria às necessidades dos
mercados, beneficiando o país, atraindo capitais e equilibrando nossa balança. As
intervenções e restrições aos fluxos e mercado seriam gradualmente retirados, com
breves retomadas enquanto política fiscal e monetária de ajustes em momentos
de escassez de divisas (dólares), coincidente com aumento de importações de
máquinas e matérias-primas (LACERDA et al., 2000).

A conjugação de uma taxa de câmbio sobrevalorizada com controle


cambial, a partir de 1947, produziu um triplo efeito em benefício
da industraialização substitutiva de importações: um subsídio às
importações de bens de capital e bens intermediários, protecionismo
contra a importação de bens competitivos; e aumento da rentabilidade
da produção do mercado interno (LACERDA et al., 2000, p. 77).

O processo de substituição das importações seria apresentado como a


continuação de um objetivo a perseguir do crescimento da indústria brasileira.

Durante o governo Dutra houve algum esforço em coordenar gastos


públicos em políticas sociais, mas nada muito significativo em termos de ações.
Entretanto, criou-se a Comissão do Vale de São Francisco e a Superintendência do
Plano de Valorização Econômica da Amazônia, concluída em 1953.

Getúlio Vargas voltaria ao governo em 1950, logo após o Governo de


Dutra, sob um ambiente conflitivo quanto a uma desconfiança de que sua forma
de governar ainda conseguiria manter controle sob os trabalhadores e amenizar
os conflitos pelo poder, agora sob mais partidos políticos.

Seu retorno no cenário econômico, sob eleições diretas, foi marcado pela defesa
da indústria pesada, base do processo de substituição de importações, que veremos no
próximo tópico, só dificultado pelos episódios de estrangulamentos cambiais.
100
TÓPICO 2 | O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

Em 1950, o cenário externo era marcado pela Guerra Fria, os demais países da
América Latina, inclusive o Brasil, estavam livres ou abandonados para desenvolver
seus projetos desenvolvimentistas. No caso brasileiro, a defesa do nacionalismo
político, o projeto da Petrobras, que garantiu o monopólio do petróleo a esta empresa
estatal, contrariando as grandes companhias de petróleo internacionais.

Entre outros projetos iniciados neste período, segue: a Companhia


Siderúrgica Nacional, a Eletrobrás e a criação da BNDE (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico).

Quanto à Petrobras,

Esse projeto era, do ponto de vista do nacionalismo, mais radical


[...], indicando o apelo popular que havia alcançado a campanha
“o petróleo é nosso”. Paralelamente, Vargas foi levado a acirrar sua
postura nacionalista, pois a negociação de financiamentos junto
ao governo norte-americano viu-se crescentemente prejudicada,
limitando investimentos em infraestrutura planejados para a época
(GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1996, p. 103).

A proposta foi de expandir o nacionalismo ao financiamento do


desenvolvimento, isto é, foram as próprias altas taxas de lucros das atividades
industriais, favorecidas pelas políticas de valorização do câmbio (Instrução 70 da
SUMOC – Superintendência da Moeda e do Crédito, em 1953) e a transferência de
recursos para o setor, que financiaram o desenvolvimento.

Entretanto, essa tentativa enfrentou crescentes conflitos entre as classes


sustentadoras de seu governo, trabalhadores industriais e a burguesia nacional.

Os trabalhadores, sua mais firme base de sustentação, aumentaram suas


reivindicações, buscando participar dos ganhos de produtividade decorrentes
do avanço da industrialização. Os empresários, mesmo os beneficiados
direta e indiretamente por Vargas, mostrariam o seu descontentamento
com a instrução 70, em função do aumento dos custos das importações que
a valorização cambial provocava. A nova crise que enfrentaria a agricultura
cafeeira também seria creditada ao governo, e seria capitalizada politicamente
pela oposição (LACERDA et al., 2000, p. 83).

NOTA

A Instrução 70 instituía um sistema de taxas múltiplas de câmbio, isto é, livre,


sem auxílios governamentais, e esperava-se com isso, estimular as exportações brasileiras
tornando-as mais acessíveis ao mercado externo, reduzir as importações, e controlar a
balança comercial protegendo a indústria interna.

Para detalhes na íntegra, sobre essa ou outras instruções ao longo da formação econômica
no Brasil, o Banco Central do Brasil apresenta toda a instrução. Disponível em: <https://www.
bcb.gov.br/?id=SUMOCINST&ano=1953>.

101
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

Esse contexto acirrou oposições dentro do próprio governo, na medida em


que existiam aliados a favor e contra o financiamento externo, limitando a ação do
nacionalismo nessa área. Um grande levante da imprensa e de acontecimentos,
inclusive fatídicos de atentados envolvendo o governo, culminaram na retirada
de muitos aliados nesse período, inclusive das forças armadas.

O quadro a seguir apresenta as variações das taxas de câmbio, durante a


vigência da Instrução 70 (1953-1954), comprovando certa eficácia, que diante da
ocorrência ou aumento das taxas, elevou o custo das importações, “forçando” sua
substituição por produtos produzidos internamente.

QUADRO 5 – BRASIL: TAXAS MÉDIAS DE CÂMBIO SOB O


REGIME DA INSTRUÇÃO 70 (CR$7US$)
VALORES TAXAS 1953 1954
Taxa Oficial 18,82 18,82
Taxa de Mercado Livre 43,32 62,18
Leilões de Importação
Categoria I 32,77 39,55
Categoria II 32,18 44,63
Categoria III 44,21 57,72
Categoria IV 52,13 56,70
Categoria V 78,90 108,74
Taxa de Exportação
Café –––– 23,36
Demais Produtos –––– 28,36
OBS: As categorias referem-se a modalidades de produtos. Quanto maior a taxa, maior o objetivo
de restringir a importação desse bem.

FONTE: Adaptado de Lacerda et al. (2000, p. 84)

E
IMPORTANT

Ainda sobre a Instrução 70 da SUMOC:

“[...] Foi extinto o controle seletivo de importações e instituído o regime de leilões de divisas
para importação, criando-se cinco categorias de bens importados definidas de acordo com
critérios de essencialidade. A cada uma destas categorias correspondia uma taxa cambial
estabelecida em leilão em função da demanda de bens de cada categoria e da decisão
do governo relativa à oferta de cambiais para o leilão de cada categoria. Quanto menos
“essencial” determinada importação, maior a restrição de oferta de divisas por parte do
governo e mais desvalorizada a taxa cambial [...]”.

FONTE: <http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/instrucao-70>. Acesso


em: 10 ago. 2018.

102
TÓPICO 2 | O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

Entretanto, apesar da condução, em maioria bem-sucedida


economicamente das medidas e resultados de crescimento do país, uma crise
política conturbada, culminaria no suicídio de Vargas em 1954, concluindo a era
Vargas e inserindo seus governos em uma prerrogativa política maior, diante do
lamentável desfecho.

DICAS

Um vídeo com base documental política intitulado O suicídio de Getúlio Vargas,


disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=yIYKiT_Tl-s>, acesso em: 25 jul. 2018,
apresenta em cinco episódios o enredo desse momento tão marcante para a política do
país, em 24 de agosto de 1954.

FIGURA 10 – MANCHETE DA MORTE DE GETÚLIO VARGAS,


NA CAPA DO JORNAL “ÚLTIMA HORA"

FONTE: <http://memorialdademocracia.com.br/card/getulio-se-mata-com-um-tiro-no-peito>.
Acesso em: 25 jul. 2018.

As sucessões seguintes foram marcadas por tentativas de gerenciar


conflitos no plano político, renúncias, pressões, apoios e segmentos populares
crescentes, até 1964, quando João Goulart aceita sua deposição por militares.
Entretanto, o processo de SI continua a ser implementado, como veremos no
Tópico 3 a seguir.

103
RESUMO DO TÓPICO 2
Nesta unidade, você aprendeu que:

• A ênfase na economia do café e também na industrialização iminente exigiu


soluções para suprir a carência de mão de obra, diante do fim da escravidão,
porém, esse evento teria sido dado sob um processo com objetivos mais
econômicos do que sociais.

• A imigração europeia conciliou seus objetivos com os objetivos da economia


brasileira na época, diante da necessidade de trabalhadores a baixo custo e a
formação de mercado interno, junto com outras mudanças sociais consequentes,
como a urbanização. São Paulo e Rio de Janeiro destacaram-se inicialmente.

• O contexto de crises internacionais persistiu, a vulnerabilidade e as ações ou


medidas econômicas também. As crises internas políticas exerciam pressão
crescente aos governos na busca pela defesa de seus interesses, marcado por
revoluções e revoltas. Foi preciso repensar um novo rumo para a economia,
sob novos paradigmas.

• Surge no ambiente de governabilidade e ações práticas, o Nacional


Desenvolvimentismo, na defesa de um projeto que assegurasse ao país, maior
independência e segurança, financeira e política, para que possibilitasse o
crescimento com desenvolvimento econômico a longo prazo.

• O populismo de Getúlio Vargas destacou-se pelo seu autoritarismo carismático


e nacionalista, que idealizou e colocou em curso o projeto Desenvolvimentista,
via investimentos em infraestrutura, indústrias de base e medidas que deram
início ao processo de Substituição de Importações, o qual se fortaleceria a partir
desse momento.

104
AUTOATIVIDADE

1 Ademais as necessidades internas de mão de obra, diante dos desafios de


suprir a economia e mercado internamente, atribui-se que a adoção da
política imigratória representava também, a inserção de nossa economia em
fluxos monetários e comerciais da economia global. Explique essa afirmação:

2 É possível identificar, no processo de imigração brasileiro, características


que se assemelham, às vezes, a um modo de produção medieval, e outras
características, as quais o identificam com o capitalismo, diante de seus
elementos de reprodução e sistema. Diante dessa constatação, marque
a alternativa que melhor qualifica essa modalidade de mão de obra no
contexto brasileiro:

( ) Não encontraram suporte ou apoio por parte dos governantes ou


empresários em sua chegada no início do século XX. Geralmente, não
possuíam habilidades na atividade agrícola.
( ) Era uma mão de obra livre, com custos baratos. Acomodavam-se em
Regimes de Colonatos, e muitos deles destacaram-se, trazendo a essência
do empreendedorismo em suas culturas.
( ) O maior fluxo de imigrantes foram os espanhóis, destinando-se a região
sul do país. Não possuíam habilidade alguma, além daquelas voltadas
para as atividades agrícolas.
( ) A imigração não contribuiu para a ampliação do mercado interno, na
medida em que seus salários eram apenas de subsistência, e substituíram
os gastos ocasionados com a escravidão.

3 No início do século XX, impactados e entusiasmados com os resultados


da grande Revolução Industrial, era necessário elevar o papel da indústria
internamente, porém, sempre com o desafio de conciliação dos interesses
de grupos e classes. Diante disso, “coube ao Estado Novo em 1927, a
nova atribuição de associar ao nacionalismo vigente uma nova rota de
desenvolvimento, focada no pensamento desenvolvimentista aplicada
na industrialização” (Unidade 2 – Tópico 2 em: Desenvolvimentismo e
nacionalismo econômico).

Considerando essa afirmação, apresente exemplos dessa nova atribuição do


Estado a partir desse período.

4 Umas das grandes estratégias de poder, utilizada na promoção do projeto


Desenvolvimentista no Brasil e pelo Governo Getulista, foi o populismo.
Explique o que significa governar, com base no populismo.

105
106
UNIDADE 2 TÓPICO 3

O PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES (SI):


A PARTIR DE 1930

1 INTRODUÇÃO
Olá, novamente! Vamos dar mais um passo em direção ao nosso último
tópico, em busca do entendimento sobre a formação econômica do Brasil!

No Tópico 2, apresentamos as origens do capitalismo no século XIX, sob


os contextos da imigração e sua relação econômica com a cafeicultura, em um
cenário da República Velha em transição para um Estado Moderno.

Para isto consideramos a inserção da proposta Desenvolvimentista, na


adoção de políticas e medidas que se converteram em impulso à industrialização
brasileira, através do Governo, identificado como populista, de Getúlio Vargas.
Apesar dos inúmeros desafios, persistiu esse ideal.

Porém, na medida em que avançamos em direção à efetivação desse projeto


de desenvolvimento econômico, identificamos sua materialização, em práticas e
resultados que confirmam êxito, mas por outro lado, revelam novos desafios diante
dos persistentes problemas estruturais. Para melhor compreendermos esse momento,
nessa etapa de nossos estudos, vamos avançar por mais algumas décadas adentro.

No Tópico 3, apresentaremos o momento em que, experimentando


um ambiente de crises e episódios de crescimento, mesmo assim, a economia
brasileira avança no projeto de substituições de importações, que se desenvolve
diante de um impasse político marcante para sua continuidade.

Por agora, essa unidade será concluída neste último tópico. Todavia, em
continuação, na próxima Unidade 3, promoveremos a complementação da SI,
na qual novas necessidades e propostas surgirão, tornando essa jornada ainda
mais emocionante! Além do mais, ajudando-nos a compreender, principalmente
a nossa realidade nos dias de hoje, em relação às condições de crescimento e
desenvolvimento econômico brasileiro. Então, vamos adiante!

2 A CRISE E O CRESCIMENTO ECONÔMICO


É possível verificar, a partir de 1930 até aproximadamente três décadas
depois, coincidente com o término do Governo Vargas, a clara centralização do
Estado, porém, com crescente participação política popular; enquanto no cenário
econômico, o crescimento industrial, associado à resposta favorável de contextos
internacionais e internos, decorrente da urbanização.
107
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

No período que compreendeu o Governo Provisório (de 1930-1934) tivemos


a predominância do cenário clássico externo, de queda do preço das exportações,
redução das reservas internacionais e deterioração dos termos de intercâmbio.

As medidas em relação à política cambial foram liberais, mais no discurso


do que na prática, pois a aplicação de moratórias seguidas em relação às dívidas
em moedas estrangeiras era comum e o monopólio cambial do Banco do Brasil
voltaria com o agravamento da situação: desvalorização superior a 50% da moeda
nacional (o mil réis). Tivemos assim, um momento de grandes dificuldades,
associado a eventos internos e externos, que restringiu o capital das firmas
brasileiras gerando falências, e a transferência de investimentos.

Furtado (apud Abreu 1990) admite que a origem da crise nesse momento
foi clássica, dado a sustentação da demanda agregada por gastos públicos como a
aquisição do café para controlar o preço e as políticas de renegociação de dívidas
dos cafeicultores, entre outros. Havia o desafio permanente de administrar
um conflito entre os interesses cafeeiros e a indústria nascente, que também se
beneficiava de políticas expansionistas, como as restrições às importações.

As medidas tomadas, ora política fiscal, ora política monetária, ou ambas


coincidentemente, confundiram os verdadeiros objetivos do Governo. Entretanto,
destaca-se que toda e qualquer ação tinha sempre um propósito determinante,
por exemplo, “[...] os déficits planejados tornaram-se usuais e os déficits realizados
resultavam de gastos adicionais e não de más estimativas de receita” (ABREU,
1990, p. 80). Esses gastos trariam benefícios à economia, especialmente, os gastos
em relação ao café, pois eram financiados por taxações das exportações, afetando
mais os consumidores, do que os exportadores de fato.

Assim, a recuperação do saldo do balanço comercial seria decorrente


da desvalorização e controle cambial, o que coibia a importação de bens não
essenciais. Estas medidas, aplicadas devido ao desequilíbrio do balanço de
pagamentos, terminaram por beneficiar a produção interna, graças a uma
reordenação da demanda vigente.

A partir de 1937, o Estado Novo representou o amadurecimento das


convicções anteriores, além da normatização da centralização do poder, via as
agências governamentais reguladoras da economia, que passaram a desenvolver
acesso e a provisão de bens e serviços, isto é, asseguraram um nível ideal da
balança, o que permitiu administrar a política cambial e de preços, a favor dos
objetivos de crescimento industrial do período.

A Segunda Guerra Mundial e as pressões dos rearranjos do comércio


internacional, redirecionariam uma nova política cambial, a fim de garantir
pagamento mínimo de dividas e remessas de lucros, sem que prejudicasse as
exportações e a disponibilidade de reservas para objetivos de capital.

108
TÓPICO 3 | O PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES (SI): A PARTIR DE 1930

Assim,

A política monetária, que havia sido moderadamente apertada entre o fim


de 1938 e o fim de 1939, tornou-se expansionista, [...] ratificando as pressões
inflacionárias associadas aos desequilíbrios provocados pela guerra e
pelas políticas do governo no terreno fiscal e creditício [...]. As pressões
inflacionárias foram estimuladas pela expansão dos saldos na balança
comercial, associados às restrições ao acesso a importações e a competição
entre consumo doméstico e exportações [...] (ABREU, 1990, p. 95).

Admite-se que, na prática, não havia uma definição clara em relação à


entrada de capitais estrangeiros no Brasil. Havia, sim, a crise cambial que limitava
a saída ou remessas de lucros, dividendos e dívidas públicas, mas um vazio de
políticas em relação a firmas estrangeiras internamente.

Os Estados Unidos, sob guerra, beneficiaram-se da diminuição europeia


no mercado brasileiro, tanto na demanda do café, quanto nos investimentos na
indústria de transformação. Entretanto, na medida que a paz se aproximava,
ficou mais nítida a perda de influência política nesse contexto.

No campo da normatização, como afirma Abreu (1990), a Constituição


de 1934 e 1937 até limitaram o campo de atuação de capitais não nacionais
quanto a áreas ou setores entendidos como estratégicos, nacionalizando o
direito à exploração de recursos hidráulicos, petróleo, minérios e indústrias de
transformação e utilidade pública, por exemplo. Em relação à nacionalização dos
bancos e instituições financeiras, essas restrições seriam mais flexíveis.

O período que compreende 1946-1951 foi a fase de ajuste no pós-guerra,


no qual então buscou-se acomodar a visão multilateralista de uma reconstrução
econômica, tanto sob o ponto de vista dos americanos, quanto dos europeus.
Nesse momento, sobressaiu-se a defesa da formação de Estados Modernos fortes,
porém, empreendedores, com visão estratégica e aglutinadores, com interferência
mais de influência ou inspiração do que pelo poder imposto no livre mercado.

O governo Dutra deveria se ajustar aos preceitos liberais de Bretton Woods


e aos controles administrativos no comércio exterior, baseado em convenções
que até trouxeram alguma expectativa à fase que a economia brasileira teria que
ingressar: de grande conversibilidade da moeda e descentralização de controles
como do padrão-ouro e o combate à inflação.

Nesse momento, políticas fiscais e monetárias contracionistas buscaram


sanar as dificuldades decorrentes, de modo que,

as autoridades monetárias e cambiais, tornaram-se vítimas de uma


espécie de “ilusão de dívidas que apoiava-se sobre três pontos: (1)
o país parecia estar em situação bastante confortável com relação
às suas reservas internacionais; (2) julgava-se credor dos Estados
Unidos da América pela colaboração oferecida durante a Segunda
Guerra Mundial, e (3) acreditava que uma política liberal de câmbio
seria capaz de atrair significativo fluxo de investimentos diretos
estrangeiros, dando solução duradoura para o potencial desequilíbrio
do balanço de pagamentos (VIANNA, 1990, p. 108).
109
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

NOTA

Definitivamente, o pós-guerra revelou a fragilidade de políticas tomadas durante


a sua vigência. O reajuste das economias exigiu maior competitividade frente ao mercado
internacional, diante dos acontecimentos:

1) Aumento de concorrentes, decorrente do aumento de demanda e


2) inevitável aumento dos preços das importações, principalmente de itens de base para
indústria interna.

Era a conjunção de elementos que alimentariam um processo inflacionário interno crescente,


de forma que a perda de competitividade das exportações brasileiras foi verificada.

Em 1947, estava explícito o processo de controle das importações, com


fins de combater o desequilíbrio externo, procurando realocar da melhor forma,
o fundo de moedas estrangeiras, e construindo, para um projeto maior, a
industrialização brasileira.

Através da manutenção da taxa de câmbio sobrevalorizada associada a


crescentes medidas discriminatórias, as importações de bens de consumos duráveis
principalmente, não essenciais e com oferta internamente, serviram de estímulo à
criação de uma indústria para esses bens e fortalecimento daquelas que já existiam.

O quadro a seguir apresenta a evolução dos saldos das finanças públicas


no Brasil, entre 1944 a 1954, comprovando os déficits cada vez mais persistentes
e maiores, certamente como consequências também, do elevado custo dessas
políticas, para a União e Estados.

QUADRO 6 – BRASIL: FINANÇAS PÚBLICAS, 1944-54 (Cr$ Milhões)


UNIÃO ESTADOS
ANOS RECEITA DESPESA DEFICIT (–) RECEITA DESPESA DEFICIT (–)
SUPERAVIT SUPERAVIT
(+) (+)
1944 8.311 8.399 –88 5.766 5.491 275
1945 9.845 10.939 –994 6.380 7.042 –662
1946 11.570 14.203 –2.633 8.256 8.576 –320
1947 13.853 13.393 460 8.968 10.416 –1.448
1948 15.699 15.696 3 11.193 12.375 –1.182
1949 17.917 20.727 –2.810 13.923 14.850 –927
1950 19.373 23.670 –4.297 16.375 18.540 –2.165
1951 27.428 24.609 2.819 22.905 24.336 –1.431
1952 30.740 28.461 2.790 25.337 30.801 –5.464
1953 37.057 39.926 –2.869 30.477 35.894 –5.417
1954 46.539 49.250 –2.711 39.206 44.783 –5.577
FONTE: Adaptado de Abreu (1990, p. 120)

110
TÓPICO 3 | O PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES (SI): A PARTIR DE 1930

O processo então de retomada de crescimento sob processo inflacionário


com preocupante desequilíbrio do setor público só foi amenizado com as
expectativas de crescimento das exportações, especialmente se beneficiando de
melhorias no preço do café e continuidade dos processos de industrialização,
com os custos subsidiados.

O período entre 1951-1954, com o retorno de Vargas ao poder, seria


marcado por dois momentos, o primeiro pela busca pela estabilização econômica
com a prática de políticas monetárias restritivas, e o segundo momento, com
a efetivação de empreendimentos e projetos via financiamentos alcançados no
âmbito da CMBEU (Comissão Mista Brasil-Estados Unidos).

E
IMPORTANT

Você sabe o que era a Comissão Mista Brasil-Estados Unidos?

FIGURA 11 – ASSEMBLÉIA DO BANCO MUNDIAL, MÉXICO, 1952

FONTE: <https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas2/artigos/EleVoltou/
ComissaoMista>. Acesso em: 25 jul. 2018.

“Formada no âmbito do Ministério da Fazenda, e integrada por técnicos brasileiros e norte-


americanos, a Comissão Mista Brasil-Estados Unidos para o Desenvolvimento Econômico
foi resultado das negociações entre Brasil e Estados Unidos iniciadas em 1950, durante
o governo Dutra, visando ao financiamento de um programa de reaparelhamento dos
setores de infraestrutura da economia brasileira. A Comissão foi criada oficialmente em
19 de julho de 1951 e encerrou seus trabalhos em 31 de julho de 1953. Era parte do plano
norte-americano de assistência técnica para a América Latina conhecido como Ponto IV,
tornado público em 1949, quando se formou no Brasil uma comissão [...] encarregada
de estudar as prioridades para um programa de desenvolvimento do país. Essa comissão
acabou estabelecendo como prioridades os setores de agricultura, energia e transporte,
sem formular, contudo, um projeto específico de financiamento. [...]”.

FONTE: <https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas2/artigos/EleVoltou/ComissaoMista>.
Acesso em: 25 jul. 2018.

111
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

O primeiro momento guiou-se pela busca de um saneamento econômico,


porém, malsucedido, dado o afrouxamento por parte da grande saída de capitais via o
balanço comercial (principalmente através de fretes de venda e compra de produtos)
e as licenças para importações, decorrentes da melhoria da situação externa.

Em 1952, uma crise cambial novamente se instalou, com origem justamente


nesse afrouxamento do controle sobre o comércio exterior, devido à defasagem
entre a concessão das licenças e a efetivação, mas também a acontecimentos
ligados à crise mundial da indústria têxtil, que rebaixou as exportações de algodão
e outras (com exceção do café), o influxo do capital estrangeiro e a elevação de
importações de itens essenciais por situações extraordinárias (por exemplo, o
trigo dos EUA dado a quebra da produção Argentina).

Não restaria outro caminho, a não ser reduzir as despesas do setor público
e pressionar a elevação da receita dos Estados e municípios. Entretanto, a política
creditícia seguiu caminho contrário, no quesito empréstimos do Banco do Brasil
ao Tesouro Nacional e ao sistema bancário comercial. Essa situação favoreceu
os investimentos privados em detrimento ao público em atividade ligadas ao
desenvolvimento e à industrialização.

Sobre os gastos públicos, uma fonte de grande pressão foram as obras


necessárias à infraestrutura econômica do país ao crescimento industrial, como
“os gastos com a ampliação da capacidade de produção de energia elétrica.
Pode-se estimar em cerca de 1 milhão de KW o déficit de capacidade de geração
existente em princípios de 1953 (VIANNA, 1990, p. 143)”. Assim, a política
monetária contracionista afetaria também esses investimentos, mas acreditava-
se que a inflação estaria mais associada a questões das desvalorizações cambiais,
dado a Instrução 70 da SUMOC, do que aos próprios gastos do governo.

Em 1954, outra necessidade de expansão de crédito destacou-se nesse


contexto já preocupante de gastos, mas agora, não por conta de uma política
expansionista, mas sim, pela expansão do salário mínimo em 100%, decorrente
de política populista, que afetou fortemente a indústria do café. Houve grande
crítica por parte das classes produtivas e de militares, sinalizando um tempo
novamente ruim para o setor (aumento de preço, queda do consumo novamente),
disseminando dificuldades também para outras exportações.

Assim, o desfecho do plano de estabilização foi colocado em risco, a


austeridade foi novamente ameaçada com a pressão por crédito e recursos. A
base política populista de Vargas, baseado nos trabalhadores, demonstrou-se
frágil, diante de tantos desafios e demandas a suprir interesses.

Mais complexa, e muito mais importante, era a posição da indústria. Como


já vimos, a Instrução 70 desagradava ao setor, pois as desvalorizações
cambiais implicavam elevação de seus custos. Comparada à situação
anterior, quando a proteção a indústria doméstica era garantida pelo
controle de importações e suas próprias compras no exterior realizadas
pela taxa de câmbio oficial, a mudança foi claramente desfavorável.

112
TÓPICO 3 | O PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES (SI): A PARTIR DE 1930

Incomodava a indústria, ainda, a redução do crédito do Banco do Brasil


às atividades econômicas. O momento decisivo para o ingresso do setor
numa posição de franca hostilidade ao governo, entretanto, foi a fixação
do salário mínimo (VIANNA, 1990, p. 149).

Havia crescente descontentamento e frustração também das camadas


médias urbanas, submetidas aos danos da inflação e suscetíveis à campanha
oposicionista, baseada nesses temas e denúncias de corrupção no governo. O
isolamento de Vargas cresceu até culminar em seu suicídio, nas circunstâncias já
apresentadas anteriormente.

A tabela a seguir, sobre determinados indicadores econômicos no segundo


governo de Vargas, demonstra o avanço da inflação e mais uma vez destaca os
déficits orçamentários.

TABELA 5 – INDICADORES MACROECONÔMICOS DO SEGUNDO GOVERNO VARGAS


Ano PIB Inflação/ Receita da União Despesa da Déf. ou Sup. Balança Balanço de
(var.%) IGP-DI (Cr$ bi de 1950)* União (Cr$ bi de 1950)* Comercial Pagamentos
(var.%) (Cr$ bi de 1950)* (US$ milhões) (US$ milhões)
1950 6,8 12,4 19,37 23,67 -4,30 425 52
1951 4,9 12,3 23,17 20,78 2,38 68 -291
1952 7,3 12,7 23,75 21,99 1,76 -286 -615
1953 4,7 20,6 25,16 27,11 -1,95 424 16
1954 7,8 25,8 24,86 26,31 -1,45 148 -203

FONTE: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71402005000200004>.
Acesso em: 23 jun. 2018.

Posteriormente, outros desafios políticos surgiram, com novos atores, na


defesa dos objetivos em andamento, da democracia e da ordem constitucional,
o que será abordado na próxima unidade. Por agora, em nosso último tópico,
vamos aprofundar um pouco mais nesses desafios, sob a perspectiva do processo
de Substituições de Importações. Vamos lá!

3 AS CONDIÇÕES E O DECORRER DO PROCESSO (SI)


Em relação ao Processo de Substituição de Importações iniciado nesse
período, admite-se que teria sido favorecido pela existência de uma capacidade
ociosa considerável nas primeiras décadas em questão. As importações de
máquinas e complementos de capital vieram a se tornar alternativas somente após
o esgotamento dessa ociosidade. Esta era a única exceção para as importações.
Num segundo momento, após a instalação de certa base, a produção interna de
bens de capitais seria possível.

Dessa forma, verificou-se um ciclo, no qual os recursos viabilizados


pelas exportações se converteram em novos recursos, sob a modalidade de

113
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

investimentos, para a promoção da importação ou então a produção dos bens de


capitais necessários, além do crescimento da economia sob esse processo. E assim
esse ciclo se repetiu.

Entende-se então que esse processo foi inevitável para o desenvolvimento


de um dinamismo, que apenas com o setor exportador de produtos agrícolas
não seria possível alcançar, diante das novas exigências de competitividade
do mercado internacional. Embora a experiência exportadora brasileira tivesse
promovido uma indústria incipiente de produtos relacionados, o crescimento
ainda permaneceria vulnerável demais às condições de demanda externas, cada
vez mais adversas diante da crescente convergência de conflitos de interesses
nesses cenários.

Assim, sob esse contexto, a crise generalizada dessas primeiras décadas se


transformou em uma oportunidade de o país voltar-se para dentro, e promover
o desenvolvimento de mecanismos que aumentassem a renda interna, via
medidas de restrição de comércio exterior, controle de taxa cambial e excedentes
exportáveis. Manter a demanda interna, com essas restrições, inevitavelmente,
alimentou o processo de SI, na medida em que aumentou os preços das
importações, e estimulou a produção interna (GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1997).

Oliveira (2012) destaca que esse impulso se manifestou de forma


temporária diante das circunstâncias das guerras mundiais, e que se tornaria
definitiva diante do contexto da Crise de 1929. Ambas situações contribuíam
para um desabastecimento do mercado mundial, seja para exportação, seja para
importação, gerando novas oportunidades e desafios.

A passagem da Primeira República ou República Velha para o Governo


Vargas abriu caminho para a discussão e prática de soluções aos problemas de
abastecimento no âmbito de SI. “Livre de constrangimentos impostos pela prática
e pelo pensamento Liberal, o regime de Vargas buscou [...] um novo padrão
de intervenção estatal, [...] que gradualmente passou a se dedicar à busca da
autossuficiência industrial” (OLIVEIRA, 2012, p. 103).

O desenvolvimento de uma ampla ação, que se baseava em desde leis até


instituições públicas e empresas voltadas à retomada do crescimento, comprovou
a adoção do Estado de bem-estar social, sustentadas no Projeto Nacional de
Desenvolvimentismo, já apresentado anteriormente.

No período dentre o início e final da segunda Guerra (1939-1945), o Brasil


alcançou uma grande expansão industrial, autossuficiência em muitos produtos
de bens não duráveis e implantação de indústrias de base, porém, sem ainda
o dinamismo na indústria de bens de consumo duráveis, que se importavam
amplamente, pressionando déficits nos balanços comerciais e desequilíbrios
externos.

114
TÓPICO 3 | O PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES (SI): A PARTIR DE 1930

Assim,

De nada adiantava o país ser autossuficiente na produção de produtos


de plásticos, por exemplo, se o preço dessa autonomia era a contínua
e crescente importação de máquinas de fabricação de objetos de
plásticos e matéria-prima correspondente. Ou seja, se o processo
de industrialização por substituição de importações efetivamente
eliminava a necessidade de se importar alguns bens, por outro lado,
acabava criando outras necessidades de importação. Para completar
o quadro, inexistia uma burguesia industrial capitalizada o suficiente
para investir nos setores relacionados à indústria pesada e de bens de
capital (OLIVEIRA, 2012, p. 105).

Diante dos desafios, destaca-se a importância do investimento Estatal nas


indústrias de base, eliminando dessa forma, muitos pontos de estrangulamento
do processo de industrialização, como o abastecimento de energia, combustíveis,
comunicações, matérias-primas industriais e afins.

Todavia, foi no governo de Juscelino Kubitschek (1956 – 1961),


abordado na próxima unidade, que a produção de bens de consumo duráveis
foi definitivamente impulsionada e consolidada, através da abertura comercial
a empresas multinacionais. Mesmo que sob estratégias de protecionismo da
modernização da indústria nacional.

NOTA

O Estado do bem-estar ou Welfare State, no caso do Brasil, nesse período,


qualificou-se pela presença de um Estado que buscava garantir e subsidiar políticas sociais e
econômicas que se convertessem em ganhos sociais. Entretanto, dificuldades relacionadas a
um Estado muito centralizador, com certa ineficiência em coalizar interesses entre os setores
produtivos e o excesso de burocracia, contribuiu para um modelo pouco redistributivo em
relação aos ganhos.

Quanto aos riscos submetidos a SI que poderiam se agravar com seu


avanço, Tavares (apud GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1997, p. 113) destacam,

[...] Como a prévia distribuição de renda era bastante desigual,


delineava-se um mercado de dimensões reduzidas e cuja demanda
era constituída por classes de renda mais elevada. O resultado dessa
conjugação de fatores era uma indústria bastante diversificada que,
atendendo a mercado restrito, tendia à concentração e/ou a não
usufruir dos ganhos de escala. Na ausência de competição externa,
tendia-se à produção com custos elevados, em particular quando
a tecnologia utilizada se destinava a atender mercados de massas
dos países desenvolvidos, cuja escala ótima era substancialmente
mais elevada do que a praticada nos países latino-americanos. [...]
a adoção de tecnologias importadas conduzia a outras ordens de

115
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

problemas: intensivas em capital e poupadores de mão de obra, [...]


em claro desacordo com a disponibilidade de fatores dos países latino-
americanos [...].

A autora ainda destaca que o estrangulamento externo, enquanto


motivador do processo de SI, estaria limitado à circunstância em que a demanda
interna contida não mais existisse, isto é, a demanda por bens de consumo
importados fosse substituída, gerando por sua vez, novo crescimento da demanda
por outros produtos, e assim, novo estrangulamento e novas substituições.

Isso se daria, até o ponto em que as empresas alcançariam maturidade e


reduziriam as possibilidades de produtos a substituir. Essa situação, seria um limite ao
modelo, diante de uma discussão sobre a temporalidade de seus benefícios.

Entretanto, a autora ainda admitiria que, a partir da década de 50, com


a definitiva implantação de segmentos produtivos como de bens de produção,
indústria pesada e de bens de consumo duráveis, o padrão de acumulação
então passaria a se modificar, partindo de elementos endógenos, determinados
internamente sob um processo clássico capitalista de diversificação industrial,
com ciclos saudáveis e esperados de expansão e retração pertinentes (TAVARES
apud GREMAUD; SAES; JÚNIOR, 1997).

Isso representaria que, uma vez estabelecido os três setores de produção


(agrícola, industrial e serviços), a dinâmica interna de crescimento passaria a
ocorrer e ajustar-se sob a dinâmica desses três setores ou segmentos, não mais
articuladas apenas com interesses classistas e vinculados a produtos ou setores
específicos dependentes de condições externas.

O quadro a seguir apresenta o produto interno bruto no período já


assumido pela prática do processo de SI, em que se verifica a inversão do enfoque
produtivo (do agrícola para indústria e serviços) e seu crescimento. Logo se percebe
o declínio da participação da agricultura no PIB, expressando a transformação
que a economia estava passando e ainda continuaria a experimentar.

QUADRO 7 – BRASIL: PRODUTO INTERNO BRUTO POR CLASSES DE ATIVIDADE ECONÔMICA,


1947-1963 (PARTICIPAÇÃO % MÉDIA)

PERÍODO AGROPECUÁRIA INDÚSTRIA SERVIÇOS TOTAL


1947/49 22,4 24,7 52,9 100,0
1950/54 24,2 24,9 50,9 100,0
1955/59 20,1 29,0 50,9 100,0
1960/63 17,7 32,6 50,4 100,0

FONTE: Gremaud, Saes e Júnior (1997, p. 119)

Em seguida, o quadro que segue apresenta e comprova essa transformação


da estrutura industrial nesse mesmo período aproximado, detalhando as

116
TÓPICO 3 | O PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES (SI): A PARTIR DE 1930

categorias e seus produtos, cujas dinâmicas de crescimento são específicas dentro


de cada indústria pertinente ao processo.

QUADRO 8 – BRASIL: ESTRUTURA INDUSTRIAL, 1919, 1939, 1949, 1959


(EM % DE PRODUÇÃO A PREÇOS CORRENTES)

CATEGORIAS 1919 1939 1949 1959


Bens de consumo não
83,62 75,06 67,77 51,10
duráveis:
Têxtil 25,20 20,61 18,69 12,54
Vestuário e calçados 7,70 6,20 4,34 3,41
Alimentos 37,75 36,17 32,02 24,15
Bebidas 4,40 2,24 31,13 2,37
Fumo 3,34 1,53 1,38 1,12
Editorial e gráfica – 3,15 2,83 2,28
Couros e peles 2,35 1,95 1,52 1,08
Farmacêutica 0,76 1,44 1,93 1,95
Perfumaria e sabões 2,52 1,77 1,73 1,52
Plásticos – – 0,20 0,68
Bens de consumo
duráveis e/ou bens de 2,54 5,62 6,97 15,46
capital
Material de transporte 1,20 2,54 2,31 6,79
Material elétrico 0,07 0,91 1,60 2,85
Mecânico – 0,79 1,40 3,98
Mobiliário 1,27 1,38 1,66 1,84
Bens intermediários 13,10 18,54 24,28 32,15
Metalurgia 3,18 5,41 7,60 10,53
Minerais não metálicos 2,55 3,52 4,51 4,52
Química 2,02 4,59 5,18 8,96
Madeira 4,04 2,41 3,39 2,64
Papel e papelão 1,19 2,11 1,99 2,97
Borracha 0,12 0,50 1,61 2,53
Diversos 0,74 0,80 1,43 1,29

FONTE: Gremaud, Saes e Júnior (1997, p. 138)

Além dos dados de crescimento da produção por setores, destacando


as áreas vinculadas à produção de bens de produção e bens de consumo não
duráveis, embora a importação ainda se fazia presente em produtos que ainda
eram precários de certos insumos internos, os dados apontam a expansão
significativa diante dos desafios da época.

117
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

São muitas as teses de defesa e crítica ao processo de SI no Brasil, como


a possibilidade de pressão na balança de pagamentos, os benefícios aos lucros
maiores em detrimento aos salários e às tensões sociais subsequentes.

Estas e outras abordagens do SI voltarão a serem apresentadas, tanto


nessa disciplina ainda, como em outras e no decorrer do curso de ciências
econômicas. Entretanto, prevalecem os resultados, superiores às possibilidades
de esgotamento do modelo, com novos impulsos de crescimento no final dos
anos 1960.

Esperamos que você tenha conseguido compreender um pouco mais


sobre essa etapa do processo de formação econômica do Brasil, e esteja mais
entusiasmado, mas principalmente, mais apto para continuar essa jornada!

LEITURA COMPLEMENTAR

Brasil e Estados Unidos: paradigmas de desenvolvimento em confronto

[...] Por que algumas economias lograram o desenvolvimento, e outras


não, se repete ao longo de diversos textos de Furtado. O autor levanta a questão
de por que se industrializaram os Estados Unidos no século XIX, enquanto o
Brasil evoluía no sentido de transformar-se, no século XX, numa vasta região
subdesenvolvida? A argumentação de Furtado vai muito além de questões
relativas a políticas protecionistas, ausentes no Brasil e (supostamente) presentes
nos Estados Unidos nas épocas de suas respectivas conquistas de independência
política. É preciso recordar, antes de tudo, que o Brasil, em fins do primeiro
quartel do século XIX, enfrentava severos desajustes em sua economia. Não havia
polo dinâmico na nação que recém adquirira a independência; a grande lavoura
açucareira encontrava-se em crise, dada pela queda dos preços internacionais
resultante da forte concorrência das colônias antilhanas; o ciclo mineiro já se
havia exaurido, e o café só viria a ganhar maior relevância pelo menos um par
de décadas mais tarde. Nessa economia – na prática, de matriz ainda colonial –
incapaz de gerar as indispensáveis divisas para seu desenvolvimento, sobreveio
o problema adicional, para o já combalido Tesouro Público, das crescentes
despesas inerentes ao processo de consolidação da independência – inclusive
aquelas destinadas ao financiamento das incursões militares organizadas para
sufocar revoltas e movimentos secessionistas. Em tais condições, conclui Furtado,
a pressão exercida por esses fatores – crise do setor exportador e déficits públicos
crescentes – teria de se resolver, como de fato ocorreu, mediante uma forte
depreciação cambial. O impacto desta teria sido de tal ordem que “se se houvesse
adotado, desde o começo, uma tarifa geral de 50% ad valorem, possivelmente
o efeito protecionista não tivesse sido tão grande como resultou ser com a
desvalorização da moeda” (FURTADO, 1976, p. 99-100). Analisando a economia
norte-americana, argumenta Furtado que, em fins do século XVIII e início
do XIX, está ainda se encontrava fortemente vinculada à economia europeia,

118
TÓPICO 3 | O PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES (SI): A PARTIR DE 1930

sendo, portanto, equivocado associar seu desenvolvimento a medidas internas


protecionistas. Com efeito, “o protecionismo surgiu nos EUA, como sistema
geral de política econômica, em etapa já bem avançada do século XIX, quando
as bases de sua economia já se haviam consolidado” (FURTADO, 1976, p. 100).
Minimizada a relevância de políticas protecionistas, Furtado examina então certas
condições estruturais que determinaram a formação da sociedade e da economia
dos Estados Unidos, contrapondo-as à experiência brasileira. Em essência, o
argumento explora a forma de colonização empreendida na América do Norte,
em particular na Nova Inglaterra, e o tipo de atividade econômica dominante até
o século XVII, que favoreceram o estabelecimento da pequena propriedade de
base familiar em larga escala. As comunidades formadas com tal característica,
embora apresentassem produtividade média inferior à das colônias baseadas na
grande propriedade exportadora, possuíam, em contrapartida, uma estrutura
distributiva mais homogênea, além de estarem desvinculadas do compromisso
de remunerar vultosos capitais a elas externos. [...] E, em contraste com as colônias
de grandes plantações, onde renda e consumo se concentravam numa reduzida
classe de proprietários que se satisfazia com importações, “nas colônias do norte
dos EUA os gastos de consumo se distribuíam pelo conjunto da população, sendo
relativamente grande o mercado dos objetos de uso comum” (FURTADO, 1976, p.
30). Desta forma, o comportamento dos grupos sociais dominantes dos dois tipos
de colônia deveria ser necessariamente diferente, correspondendo às distintas
estruturas econômicas. [...] Pode-se, pois, perceber que a alteridade estrutural
das economias brasileira e norte-americana, no fim dos seus respectivos ciclos
coloniais, está no cerne da argumentação furtadiana. Segundo Furtado (1976,
p. 101), a classe dominante no Brasil era formada por grandes agricultores
escravistas, enquanto nos Estados Unidos, esta era formada por proprietários
rurais de pequeno porte e grandes comerciantes urbanos, o que implicava
marcantes diferenças sociais, apesar de serem as duas populações semelhantes,
em ordem de grandeza. [...] A economia norte-americana já possuía bases próprias
para uma expansão da sua produção interna. Havia uma robusta indústria naval,
além da aludida distribuição de renda relativamente pouco desigual, o que lhe
adjudicava maiores potencialidades para o mercado interno. [...] Aponta Furtado
(1976) que justamente como exportadores de matéria-prima os Estados Unidos
assumiram, desde os primórdios, a posição de “vanguarda” da Revolução
Industrial. Uma vez que a Revolução Industrial consistiu fundamentalmente,
em seu princípio, na transformação da indústria têxtil por meio de: i) mecanizar
processos manufatureiros; e ii) substituir a lã pelo algodão, assim Furtado (1976)
constata que a Inglaterra introduzia os processos de mecanização, ao passo
que os Estados Unidos forneciam as gigantescas quantidades de algodão que
permitiam, em pouco tempo, transformar a oferta de tecidos em todo o mundo.
As bases do processo de desenvolvimento norte-americano resultariam, portanto,
de uma combinação de múltiplos fatores, entre eles: uma estrutura econômica e
social mais homogênea (principalmente nas colônias do Norte) e o consequente
aparecimento de agentes e instituições políticas aptas a vocalizar os interesses
nacionais; [...] Assim, Furtado (1976) interpreta que na primeira metade do século
XIX a atuação do Estado foi fundamental no desenvolvimento estadunidense.
Apenas a partir da segunda metade do mesmo século, em que a influência dos

119
UNIDADE 2 | A INTRODUÇÃO DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRO

grandes negócios cresce largamente, é que a ideologia da não intervenção do


Estado na economia passaria a prevalecer. Por sua vez, no Brasil, mais do que
a ausência do mercado interno de base técnica e de uma classe dinâmica de
dirigentes, faltaram aqueles estímulos externos. Os motivos estruturais para a
conformação desse quadro se encontram em processos de formação de renda e
acumulação de capital do sistema econômico escravista, da economia açucareira
e, em seguida, na mineira.

FONTE: VIANNA, Salvador Teixeira Werneck; LEITE, Marcos Vinicius Chiliatto. A questão da Lei de
Say e o retorno à teoria de subdesenvolvimento de Celso Furtado. In: ARAÚJO, Tarcisio P.; VIANNA,
Salvador T.; MACAMBIRA, Junior (Orgs.). 50 anos de Formação Econômica do Brasil: Ensaios sobre a
obra clássica de Celso Furtado. RJ: IPEA, 2009. Disponível em: <http://ipea.gov.br/agencia/images/
stories/PDFs/livros/livros/Livro50AnosdeFormacao_Salvador_WEB.pdf>. Acesso em: 25 jul. 2018.

120
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• O período posterior à crise de 29 e pós-Segunda Guerra contribuiu para a


instabilidade e crise no Brasil, problemas esses, relacionados principalmente,
aos elevados gastos públicos, aos desequilíbrios na Balança Comercial e
consequente processo inflacionário.

• A adoção de políticas monetárias (ora contracionistas, ora expansionistas) e


cambiais (via desvalorizações ou sobrevalorizações) continuavam a serem
aplicadas, no intuito de amenizar os efeitos internos das crises, diante de
aumento crescente da concorrência e competitividade internacional.

• A defesa das exportações, em detrimento das importações, foi majoritária.


Porém, foi necessário desenvolver setores, principalmente aqueles produtivos
de bens de consumo duráveis, para isso cresceu a presença e investimento
estatal em ações voltadas a esse propósito.

• Durante o processo de investimento estatal, confirmou-se então, o projeto


maior de industrialização e autossuficiência produtiva, diante das necessidades
internas e externas de dinamizar os mercados. Por outro lado, as pressões
sociais aumentaram frente a interesses múltiplos por ganhos econômicos e
políticos no decorrer das manobras governamentais.

• Foi colocado em prática o início do Processo de Substituição de Importações,


como via de crescimento e desenvolvimento econômico. Uma via sem volta,
em que mesmo diante de limites ou inúmeros desafios, promoveu ao país
maturidade e ganhos de escala em todas muitas perspectivas.

121
AUTOATIVIDADE

1 Muitas das dificuldades que contribuíram para os episódios de crises na


economia brasileira no período de 1930 a 1950 estavam relacionadas em
nível de capital internacional e a um certo reordenamento político externo,
em relação à condução das questões econômicas pelos Estados.
Diante dessa constatação, apresente em que se basearam nossos principais
problemas econômicos nesse período.

2 Algumas medidas no âmbito da política monetária e cambial tinham como


objetivos interferir diretamente no mercado, e de fato, conseguiram, ademais
a temporalidade de seus fins ou alcances. Sob essa afirmação, explique em que
consistia a “Instrução 70” da SUMOC (Superintendência de Moeda e Crédito).

3 Em relação ao processo de Substituições de Importações, facilmente


compreendido como uma estratégia para o alcance ao desenvolvimento
e fortalecimento da indústria interna, inicia-se um debate acerca de sua
aplicabilidade e alcance de seus objetivos.

Sobre essas questões, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Considera-se que o Processo de SI encontrou vantagens relacionadas à


capacidade ociosa existente no setor industrial, inicialmente. Somente
após certo período, as importações de máquinas viriam a ocorrer.
( ) Os recursos oriundos das exportações não poderiam ser convertidos
em capital para o investimento no processo de SI, dado o grande
entesouramento por parte das classes produtivas.
( ) Umas das condições essenciais para o êxito do processo de SI seria que sua
dinâmica continuasse vinculada a interesses classistas e não aos setores
produtivos na economia.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

( ) V – F –V.
( ) F – V – F.
( ) F – V – V.
( ) V – V – F.

4 Atribui-se que para que a consolidação do processo de SI fosse bem-


sucedida, ele deveria iniciar-se pela indústria de bens de consumo duráveis.
Essa defesa possui importante justificativa econômica. Apresente-a.

122
UNIDADE 3

A ECONOMIA BRASILEIRA DO
SÉCULO XX

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• conhecer a importância do planejamento para a economia por meio do


Plano de Metas de Juscelino Kubitschek e a participação do capital estran-
geiro na economia brasileira;

• analisar o período relativo ao “milagre” da economia brasileira e o projeto


de desenvolvimento para o país;

• examinar a crise dos anos 1980 e as medidas utilizadas para conter o pro-
cesso de hiperinflação.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você en-
contrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – INDUSTRIALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

TÓPICO 2 – MILAGRE ECONÔMICO

TÓPICO 3 – REDEMOCRATIZAÇÃO E INFLAÇÃO

123
124
UNIDADE 3
TÓPICO 1

INDUSTRIALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico! Chegamos à terceira e última unidade do livro de
Formação Econômica do Brasil. Nas páginas seguintes, você descobrirá de que
forma se estruturou a economia brasileira durante o século XX, sobretudo entre
a década de 1950 e 1990. Estudaremos desde os conceitos mais elementares a
respeito do planejamento econômico do Plano de Metas até os planos de
estabilização econômica ao final da década de 1980.

A economia brasileira ao longo do século XX passou por diferentes


abordagens econômicas, ritmos de crescimento e políticas para o desenvolvimento.
Tivemos governos eleitos diretamente pelo povo, um regime militar com forte
autoritarismo, e uma retomada do processo democrática com um cenário
econômico conturbado. Mesmo assim, nosso crescimento econômico chegou a
um dos maiores do mundo, com a formação de uma indústria nacional muito
bem integrada.

Desta forma, cabe-nos perguntar: em que momento o planejamento


econômico passa a ser uma peça fundamental para a organização da atividade
econômica? Até que ponto há vantagens na participação do capital estrangeiro
na economia nacional? Qual é o impacto do golpe militar de 1964 para o
desenvolvimento econômico e social do Brasil? Por que a década de 1980 ficou
conhecida como a década perdida? Por que as políticas contra o processo
inflacionário até 1990 falharam?

A fim de responder a estas e a outras perguntas, a Unidade 3 do presente


livro conterá uma leitura fácil e dinâmica, com páginas que contam com figuras,
tabelas, quadros, informações adicionais e dicas para você poder aprofundar o
seu estudo.

No Tópico 1 iremos estudar a industrialização e o desenvolvimentismo


a partir do estudo dos conceitos de planejamento, do Plano de Metas e da
participação do capital internacional.

Desejamos ótimos estudos!

125
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

2 A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO ECONÔMICO


É muito provável que você já tenha ouvido falar ou lido em algum
periódico sobre o planejamento econômico e/ou a respeito do planejamento
governamental. Pois bem, mas será que planejar a economia foi um objetivo que
sempre existiu nos países? Ou ainda: desde que momento o ato de planejar o
crescimento econômico tornou-se uma atribuição dos estados nacionais?

Planejamento é um conceito que pode expressar a diferença mais


primitiva entre os homens e os demais seres vivos. Os modos pelos quais ações são
executadas por diferentes espécies, isto é, as formas pelas quais homens e outros
seres vivos utilizam sua força de trabalho para transformar matérias naturais
em valores que sirvam para satisfazer necessidades próprias, nem sempre são
diferentes.

Vejamos a analogia para o planejamento quanto ao caso da aranha e de


um tecelão; da abelha e do arquiteto.

FIGURA 1 – HABILIDADES DAS ARANHAS E DAS ABELHAS

FONTE: <https://bit.ly/2TQ0ZmN; https://bit.ly/2VQCyY2>. Acesso em: 8 nov. 2018.

“Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha


envergonha mais de um arquiteto humano com a construção de suas colmeias”.
Pois, “o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele
construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em cera” (MARX, 1985a, p.
149). O homem não apenas modifica o meio natural, mas, realiza, ao mesmo tempo,
seu objetivo – aquilo que já existia em sua imaginação idealmente e planejado.

E
IMPORTANT

Tanto os homens quanto os animais executam tarefas que requerem muita


habilidade. A grande diferença dos humanos está no ato de planejar suas ações. Com o
planejamento adequado, podemos atingir objetivos previamente determinados.

126
TÓPICO 1 | INDUSTRIALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

O que podemos começar a entender é que planejar tem a ver com a definição
de objetivos que serão alcançados em futuro de curto, médio ou longo prazo.

Embora diferentes possíveis definições do termo planificação, ou


planejamento, cada qual com sua especificidade, levem a fins semelhantes, tais
como alcançar o futuro, as divergências no conceito apontam para variados
caminhos, por exemplo:

1) incertezas e complexidades inerentes aos processos de planejar


(MELO, 2001), pois “seu cálculo é nebuloso e sustenta-se na
compreensão da situação” (MATUS, 1991, p. 28);
2) metodologias de aplicação a projetos, uma vez que o planejamento
“estabelece objetivos, define linha de ação e planos detalhados”
(LOPES, 1990, p. 24);
3) modelos sistemáticos de compreensão, ao atuar “através de um
controle de vastas redes de órgãos e instituições interdependentes”
(LOPES, 1990, p. 24);
4) análises de futuro, a partir do entendimento que muitas das formas
de planejamento buscam inserir-se no futuro e, ao mesmo tempo,
vivenciar este futuro (GUILLEZEAU, 2002).

Além dos diferentes significados por meio dos quais o planejamento


foi sendo caracterizado, do ponto de vista de sua classificação, um sistema de
planejamento pode ser dividido entre as escolas ou modelos, substantivo e
procedimental de planejamento, que, respectivamente, dizem respeito: (i) ao
fenômeno que se aplica o processo de planejamento, e (ii) aos processos, métodos
e às técnicas das etapas de sua execução.

E
IMPORTANT

O planejamento possui muitos entendimentos através de seus variados


conceitos. De forma mais simples, podemos separar entre o planejamento substantivo (que
se interesse pelo contexto social e econômico, de fato) e o planejamento procedimental
(aquele que se preocupa com as técnicas e as metodologias de planejamento).

Visto de outra forma, o planejamento pode, também, ser elaborado


em diferentes graus, abrangendo partes ou a totalidade de uma economia. “O
planejamento global procura dar uma visão ampla do desenvolvimento da
economia, fixando objetivos a atingir e procurando assegurar a consistência entre
a oferta e a demanda de bens em todos os setores” (LAFER, B., 1975, p. 16).

Pode ainda, limitar-se a determinados setores, como é o caso do


planejamento setorial voltado para o investimento em infraestrutura, educação,
saúde. Aí, os desequilíbrios entre oferta e demanda podem ser superados de
maneira planejada mesmo quando os objetivos mais gerais (crescimento de renda
ou emprego) ainda não foram fixados.
127
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

Mas, afinal, de que forma e quando o planejamento começa a ser utilizado


pelos países do mundo?

Quanto à difusão do conceito de planejamento, é preciso dizer que se iniciou


a planejar de maneira mais abrangente e de forma mais explícita no início do século
XIX na Europa. Naquele momento e lugar, as cidades passaram a conviver com o
caos urbano provocado, sobretudo, pelo avanço do capitalismo – e agravado pela
Revolução Industrial do século XVIII – que alterou a disposição das regiões urbanas.

O planejamento e a ciência do urbanismo surgiram como tentativa de


solucionar as questões relativas ao grande crescimento populacional nas cidades
industriais que, por sua vez, resulta, em grande medida, da chamada acumulação
primitiva (MARX, 1985b, p. 261), cuja dinâmica retira dos trabalhadores do campo
seus meios de produção, tornando-os trabalhadores assalariados no interior das
fábricas localizadas nas cidades.

As bases da formação de um planejamento urbano para as recém-criadas


grandes cidades europeias estavam nos funcionários públicos municipais e
reformadores, cujas preocupações, primeiramente, eram de regular os sistemas
de saúde, obras públicas e saneamento.

Um segundo movimento em que o planejamento é difundido pelos


países é relativo ao problema da pobreza. Já no século XX, na Europa e em países
periféricos, a administração da pobreza faz surgir uma ampla área de intervenção
a partir do Estado que ficou conhecida por “social”, cuja valorização de questões
sociais e urbanas dá origem a uma ênfase à intervenção crescente e direta tanto de
profissionais especializados em temas como pobreza, saúde, educação, saneamento,
desemprego, como do próprio Estado em nome da promoção do bem-estar social.

A estreia do planejamento social na Europa, refere-se ao momento em


que o estado assume a tarefa de levar “progresso” para a sociedade por meio de
“um corpo de leis [...] cujo objetivo era regulamentar as condições de trabalho e
tratar questões relacionadas com acidentes, com idosos, com o trabalho feminino,
e com a proteção e educação de crianças” (ESCOBAR, 2000, p. 213), nivelando
conjuntamente as condições de trabalho nas fábricas, educação nas escolas,
regras para os hospitais e conduta nos presídios. Ao passo que a participação do
Estado se tornava mais intensa em busca de soluções, a sociedade deveria viver
e reproduzir aquilo que lhe havia sido “planejado” (VARGAS, 2013).

Com base nestes contextos históricos, podemos compreender a importância


do planejamento para o funcionamento das economias mundiais entre os séculos
XIX e XX. Tanto a formação e o crescimento acelerado das cidades propriamente
urbanas, quanto as condições sociais são elementos que explicam a transformação
do papel do Estado na economia.

A intervenção do Estado na condução da economia como promoção de


desenvolvimento se dissemina no início do século XX nas políticas dos governos e nas
ações dos Estados, regulando o direcionamento político das iniciativas econômicas.

128
TÓPICO 1 | INDUSTRIALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

Isto ocorre porque as forças do mercado (o livre mercado), com pouca


intervenção do Estado, mostravam-se incapazes de cumprir com objetivos
econômicos e sociais esperados. Era o caso tanto dos países considerados
mais desenvolvidos quanto dos menos desenvolvidos. Assim, no século XX, a
instabilidade do sistema econômico, a nova ênfase no desenvolvimento econômico
e a luta contra a miséria “[...] levaram à elaboração de modelos racionais de
política econômica, que permitissem dominar as forças econômicas em direção à
alocação ótima dos recursos” (LAFER B., 1975, p. 12).

O primeiro país a planejar sua Economia foi a partir do caso da União


Soviética com a utilização de planos econômicos de longo prazo. A partir da
década de 1920 já se iniciava um processo de organização centralizada na União
Soviética: o número de funcionários do Estado passou de pouco mais de 100.000
para crescentes 5.880.000. Entre 1928 e 1933, vigora o Primeiro Plano Quinquenal
global soviético (aprovado em maio de 1929, pelo V Congresso dos Sovietes da
URSS), cujo processo abarca todo o sistema econômico, mas exclui formalmente
os mecanismos usuais de mercado e formação de preços, esmiuçando o processo
produtivo em função de metas nacionais estabelecidas pelo Estado visando uma
rápida industrialização (MIGLIOLI, 1997).

Era o momento em que praticamente todas as economias mundiais


enfrentavam a crise econômica, ou a grande depressão, resultado da quebra da bolsa
de valores de Nova Iorque em 1929. No entanto, enquanto as economias capitalistas
iam de mal a pior no período, a participação da indústria nacional soviética aumentou
de 5% em 1929 para 18% em 1938 (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Tais resultados deixaram políticos e técnicos dos governos de diversos


países impressionados, fazendo com que os termos ligados ao planejamento
fossem rapidamente utilizados nos debates econômicos até mesmo dos países
capitalistas – cujas economias não eram centralmente planificadas. Com a
divulgação da macroeconomia keynesiana e com o avanço dos modelos de
crescimento econômico, o planejamento estatal passou a ser utilizado como uma
técnica econômica em todo o mundo (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

NOTA

Relembrando: as economias de mercado são aquelas nas quais os problemas


econômicos são resolvidos e organizados pelo próprio mercado, tendo o Estado um papel
limitado. Nas economias planificadas, a economia é organizada integralmente pelo Estado,
com base em mecanismos de planejamento e intervenção econômica.

Rapidamente, as técnicas e métodos do planejamento a partir do Estado


foram sendo aperfeiçoadas com a programação linear, os modelos econométricos,
as matrizes insumo-produto e, após a Segunda Guerra Mundial, o planejamento
129
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

foi levado aos países do “Terceiro Mundo” como forma de alcançar o progresso e o
desenvolvimento. Assim, foi possível desenvolver-se não apenas o planejamento
global, mas também o regional e microrregional, e o planejamento setorial,
chegando à elaboração de projetos muito bem especificados.

Estas economias ditas menos desenvolvidas almejavam uma


industrialização rápida e o aumento da renda per capita, notadamente, nas
décadas de 1950 e 1960 – bem como se apresenta o caso do desenvolvimento
brasileiro. O incentivo ao crescimento econômico para estabelecer um processo
de desenvolvimento serviu de orientação para um novo sistema de planos
nacionais de desenvolvimento (ESCOBAR, 2000).

3 JUSCELINO KUBITSCHEK E O PLANO DE METAS


(1956-1961)
As alterações ocorridas nas economias capitalistas após a década de
1930 também atingem o Brasil, sendo que é neste período que se tem uma forte
evolução do sistema político e econômico. Com o governo de Getúlio Vargas,
entre 1930 e 1945, o Estado brasileiro passa a desempenhar funções cada vez mais
complexas na economia nacional.

Há uma crescente participação e atuação do Estado na política econômica


tanto para promover o desenvolvimento como para estabilizar crises econômicas.
E dando continuidade a este processo de planejamento a partir do Estado, na
década de 1940, inicia-se a estruturação de certo aparato científico e corpo técnico
propriamente para se pensar o planejamento no Brasil (MIRANDA NETO, 1981).

Um exemplo está na Missão Cooke, que foi um dos casos de cooperação


técnica formada com o objetivo de captar recursos financeiros, sobretudo, dos
Estados Unidos, para a formulação de projetos econômicos no Brasil. Estas
comissões de trabalho procuravam fazer um balanço da situação econômica da
época e definir prioridades para os investimentos públicos. O Plano SALTE (sigla
do Plano voltado para as áreas de saúde, alimentação, transporte e energia) teve
origem a partir destas cooperações e foi submetido à apreciação do Congresso em
1948 (FURTADO, 1985, p. 43).

E
IMPORTANT

Entre 1951 e 1953 foi constituída a Comissão Mista Brasil-Estados Unidos


(CMBEU) que tinha como objetivo elaborar projetos a serem financiados pelo Banco de
Exportação e Importação dos Estados Unidos (EXIMBANK) e pelo Banco Internacional de
Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

130
TÓPICO 1 | INDUSTRIALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

Já em 1953 formou-se uma comissão mista de técnicos da CEPAL


(Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) e do recentemente criado
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), cuja chefia ficará a
cargo do importante economista brasileiro Celso Furtado. A principal ideia do
Grupo Misto BNDE-CEPAL era a de difundir no Brasil a Técnica de Planificação
que se vinha desenvolvendo no interior da CEPAL (FURTADO, 1985).

Uma vez que a CEPAL e a comissão interna organizada no Brasil


procuravam pensar uma via de desenvolvimento para o país, o Plano de Metas
de Juscelino Kubitschek teve amplo apoio desses estudos para formular em tempo
recorde as metas do Governo, embora o principal objetivo fosse a construção da
nova capital do país em Brasília (ver figura a seguir) (FURTADO, 1985).

FIGURA 2 – CONSTRUÇÃO DA NOVA CAPITAL DO BRASIL DURANTE A DÉCADA DE 1950

FONTE: <http://www.jws.com.br/2018/02/documentario-sobre-a-construcao-de-brasilia/>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

O trabalho do grupo misto BNDE-CEPAL foi realizar um levantamento


dos principais pontos de estrangulamento da economia brasileira, com ênfase nos
setores de transporte, energia e alimentação. Outro objetivo era identificar as áreas
industriais cuja demanda era reprimida e que não poderiam ser satisfeitas a partir
das importações. Com base em todos estes diagnósticos, caberia às comissões
propor projetos e planos específicos para a resolução destes problemas, sendo
um destes a consideração da criação de novos ramos industriais, como a indústria
automobilística (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Portanto, é em meados da década de 1950 que o planejamento no Brasil


toma uma forma mais definida. O período de 1956 a 1961, correspondente
ao Plano de Metas, deve ser interpretado com maior especificidade, pela
complexidade de suas formulações, quando comparado com as tentativas
anteriores de investimento apenas na infraestrutura do país, e pela profundidade
de seu impacto, principalmente em virtude do sistema político vigente. Por estas
peculiaridades o Plano de Metas pode ser considerada a primeira experiência
brasileira de planejamento governamental, embora ainda não se trate de um
planejamento global da economia (ALMEIDA, 2004; LAFER, C., 1975).
131
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

Todavia, os grupos de trabalho que foram formados a partir do governo


de Kubitschek não conseguiam ter a mínima capacidade necessária de atuação.
Paradoxalmente, a construção de Brasília avançava rapidamente. A “questão
nordestina”, por exemplo, tornava-se um problema ao grande projeto nacional de
Kubitschek, pois o forçava a redirecionar seu foco político. O importante Grupo
de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), formado a fim de
estudar essa situação, não contava com pessoas de fato capazes de articular os
problemas do desenvolvimento nacional e regional; seus estudos partiam do zero.
Em verdade, todas as iniciativas que surgissem neste âmbito seriam paliativas
por falta de investimentos regionais, uma vez que a construção de Brasília era
prioridade (FURTADO, 1989).

Apenas com a criação da Superintendência do Desenvolvimento do


Nordeste (SUDENE), em 1959, como novo grupo de trabalho, é que os planos
tomam forma definida de crescimento e melhoria da qualidade de vida de uma
população. Não é à toa que essa experiência viria a servir de referência a vários
programas e planos regionais por todo o Brasil (BARROS, 1975).

No entanto, a política voltada à industrialização, do Plano de Metas de


Kubitschek, após certa euforia nacional devido a altas taxas de crescimento do
PIB, foi a grande responsável pelo início do surto inflacionário e estagnação
econômica a partir de 1962, mesmo com os esforços do plano de estabilização
monetária (1958-1959) implementado no fim de seu mandato (MACEDO, 1975).

Desta forma, o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek é um marco para a


industrialização e o desenvolvimento econômico do Brasil por conter um conjunto
de 31 metas amplas para a economia, incluindo a meta-síntese: a construção
de Brasília. Este ambicioso plano de desenvolvimento contava com objetivos
setoriais que convergiam à industrialização sólida da economia brasileira e que
se referia a uma decisão importante na história econômica do país, convergindo
ao processo de substituição de importações em andamento (LACERDA; REGO;
MARQUES, 2000).

FIGURA 3 – JUSCELINO KUBITSCHEK E O PLANO DE METAS

FONTE: <http://pensamentojk.blogspot.com/2011/05/3-o-plano-de-metas.html>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

132
TÓPICO 1 | INDUSTRIALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

Os setores da economia que receberam maior parte dos investimentos


foram os de energia, transporte, siderurgia e refino de petróleo. Além disso,
foram oferecidos subsídios e estímulos econômicos à expansão e diversificação
de todo o setor secundário, atingindo indústrias produtoras de equipamentos e
insumos de alta intensidade de capital.

Assim, para que o Plano pudesse ser executado, foram criados novos
grupos executivos de trabalho, congregando representantes públicos e privados
para que a formulação de políticas industriais pudesse ocorrer de forma conjunta.
Os grupos mais conhecidos e atuantes foram o Grupo Executivo da Indústria
Automobilística (GEIA), da Construção Naval (GEICON), de Máquinas Agrícolas
e Rodoviárias (GEIMAR), de Indústria Pesada (GEIMAP), de Exportação de
Minério de Ferro (GEMF), de Armazenagem (Comissão Consultiva de Armazéns
e Silos), e de Material Ferroviário (GEIMF) (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

O Plano de Metas trouxe uma atuação fortíssima do Estado na economia


brasileira, representando uma forte ruptura do modelo de crescimento até então
vigente. A política econômica do Plano dava especial atenção ao capital estrangeiro
(tema que será visto com mais especificidade no próximo item), contando com
fontes externas de captação de recursos.

Além desta, uma outra medida característica do Plano foi o financiamento


dos gastos públicos e privados por meio da expansão dos meios de pagamento, ou
seja, por meio de uma política monetária que aumentava a quantidade de moeda
em circulação. Mas, também, este financiamento ocorria via empréstimos do
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) e de bancos localizados
no exterior.

NOTA

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) foi criado em 1952


pela Lei nº 1.628, de 20 de junho, com o objetivo de ser o órgão formulador e executor
da política nacional de desenvolvimento econômico. Na década de 1980, como marca da
integração das preocupações sociais com as econômicas, o banco recebeu a letra S em
sua sigla, gerando a atual denominação Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social, o BNDES.

FONTE: <https://www.bndes.gov.br/wps/portal/site/home/quem-somos/nossa-historia>. Acesso


em: 8 nov. 2018.

O aumento do acesso ao crédito privado foi estimulado a partir do Banco do


Brasil por meio de empréstimos de curto prazo, sobretudo, para garantir o capital
de giro das empresas nacionais. Medida econômica que ocasionou uma pressão
ainda maior no déficit público oriundo da execução das ações do Plano de Metas.

133
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

A tabela a seguir apresenta algumas das atuações do Estado com o Plano


de Metas, revelando a previsão de realização de determinada ação, bem como a
quantidade, de fato, realizada. Leia os dados da tabela:

TABELA 1 – AÇÕES DO PLANO DE METAS: PREVISÃO E RESULTADOS (1957-1961)

Meta Previsão Realizado %


Energia Elétrica (1.000 kw) 2.000 1.650 82
Carvão (1.000 ton.) 1.000 230 23
Petróleo-Produção (1.000 barris/dia) 96 75 76
Petróelo-Refino (1.000 barris/dia) 200 52 26
Ferrovias (1.000 km) 3 1 32
Rodovias-Construção (1.000 km) 13 17 138
Rodovias-Pavimentação (1.000 km) 5 – –
Aço (1.000 ton.) 1.100 650 60
Cimento (1.000 ton.) 1.400 870 62
Carros e caminhões (1.000 un.) 170 133 78
Nacionalização (carros – %) 90 75 –
Nacionalização (caminhões – %) 95 74 –

FONTE: Lacerda et al. (2000, p. 31)

Entre o período dos anos de 1951 e 1961, o Produto Interno Bruto (PIB)
brasileiro cresceu a uma taxa anual de 8,2%, resultando em um aumento da
renda per capita (PIB per capta) de 5,1% – variações que superaram até mesmo os
objetivos do Plano de Metas.

O aumento do PIB e do PIB per capita são atribuídos à implantação do


Plano, uma vez que as projeções de crescimento da economia para os próximos
cinco anos, a partir de 1951, eram bastante pessimistas quando foram divulgadas
pelo Grupo Misto BNDE-CEPAL.

Analisando os dados da tabela anterior com maior atenção, pode-se ver


que as metas setoriais do Plano também alcançaram excelentes resultados com
relação às previsões. Pois, por exemplo, dos 2 milhões de kw de geração de energia
elétrica previstos com a execução do Plano de Metas, 1,65 milhão de kw passaram
a ser gerados no Brasil, ou seja, 82% do previsto. Outras metas importantes foram
a produção de petróleo, que atingiu 76% do esperado, chegando a 75.000 barris
por dia, e a produção de carros e caminhões, com 133.000 unidades produzidas,
representando 78% do previsto pelo Plano. Por fim, a meta que mais se destaca é
aquela referente à construção de rodovias, cuja quantidade executada ultrapassa o
previsto: dos 13.000 km planejados, foram construídos 17.000 km – 138% da meta.

O que se pode perceber é que muitas áreas da economia passam a receber


incentivo direto do Estado, garantindo que seu desenvolvimento possa ocorrer.
Portanto, pode-se ver que grandes áreas produtivas, como é o caso do petróleo, do
134
TÓPICO 1 | INDUSTRIALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

carvão e do aço, são privilegiadas pela ação do Estado. Já uma segunda frente de
atuação é a partir de grandes obras de infraestrutura, no que diz respeito às rodovias,
ao cimento e à energia, com a construção de novas usinas hidrelétricas. Os últimos
três itens da tabela revelam que a indústria também recebe especial atenção, com a
produção de carros e caminhões, além do movimento de nacionalização da produção.

4 PARTICIPAÇÃO DO CAPITAL ESTRANGEIRO E


OLIGOPÓLIOS
O crescimento econômico durante o Plano de Metas foi muito expressivo com
relação aos períodos anteriores. Quando analisados os setores econômicos de forma
separada, é possível melhor visualizar estes reflexos. Os departamentos da economia
produtores de bens de capital e de bens de consumo duráveis, por exemplo, foram os
mais relevantes: entre 1955 e 1962, as taxas de crescimento anual médias chegaram a
26,4% e 23,9%, respectivamente (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Na indústria de transformação, o crescimento foi a uma taxa média anual


de 22% no período de 1955 e 1959. A economia como um todo pôde fortalecer-
se a partir dos investimentos realizados em diversas áreas, como é o caso dos
subsetores de material elétrico, com crescimento de 38% ao ano neste mesmo
período, de material mecânico, com 43% de crescimento ao ano, e de material de
transporte, cujos investimentos aumentaram em 80% ao ano.

Estes três subsetores são muito representativos no interior das atividades


produtoras de bens duráveis e, portanto, o aumento dos investimentos industriais
nestas áreas resultou em um aumento de três vezes de sua participação no
investimento conjunto da indústria, passando de 12% para 38% de participação
(LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Contudo, o crescimento observado desde o início do governo de Juscelino


Kubitschek estava estruturado a partir do tripé formado por empresas estatais,
capital privado estrangeiro e, em menor medida, capital privado nacional. E o
objetivo exposto no Plano de Metas de implantar rapidamente o Departamento II
da economia brasileira, bem como de desenvolver plenamente o Departamento
I, apenas será possível com uma expressiva participação do capital estrangeiro.

NOTA

A partir de Karl Marx, dois grandes departamentos econômicos são distinguidos.


O Departamento I, refere-se à produção de bens de capital e intermediários, ou seja, bens de
produção; o Departamento II, restrito aos bens de consumo. Este último está subdividido entre
bens de consumo dos capitalistas (bens de consumo de luxo ou bem duráveis) e bens de consumo
dos trabalhadores (bens simples ou não duráveis) (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

135
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

A dinâmica resultante desta organização econômica financiada pelo


capital externo trouxe uma oligopolização da economia brasileira durante a
segunda metade da década de 1950. Assim, os principais ramos industriais no
Brasil eram controlados por poucas e grandes empresas – reproduzindo aquilo
que ocorrera no final do século XIX nos países considerados desenvolvidos
(LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Um fator que contribui à formação deste cenário econômico foi uma


mudança interna nas grandes empresas estrangeiras, cujas estratégias de
investimento avançavam sob a indústria manufatureira, revelando um movimento
de transnacionalização de suas operações. Logo, a concorrência entre grandes
oligopólios mundiais como os americanos, europeus e japoneses estendia-se até
mesmo sob o espaço dos países subdesenvolvidos.

NOTA

Os oligopólios são formados quando apenas algumas empresas são


responsáveis pela produção de determinado produto. Estas empresas não compõem
um número expressivo, mas, trata-se de grandes corporações. Uma vez que dominam o
mercado de certo produto, acabam formando uma barreira natural contra a entrada de
novas empresas no setor, possibilitando que regulem os preços de mercado dos produtos
que comercializam.

O contexto do Brasil, que havia consolidado seu mercado interno a


partir da política de substituição de importações, refletia-se num importante
espaço de ampliação do capital estrangeiro por meio da instalação de empresas
multinacionais (EMN).

Mas quais eram os países que investiam no Brasil? Os primeiros capitais


internacionais eram oriundos de multinacionais europeias e japonesas. Apenas
após a instalação destes grupos é que o capital norte-americano se engajaria na
produção industrial brasileira. Isso ocorria mesmo em empresas dos Estados
Unidos que já atuavam há muitos anos no Brasil com centros de montagem e
distribuição de estoques, tal como é o caso da Ford e da General Motors.

Aliás, neste período inicial da entrada do capital estrangeiro, os Estados


Unidos tiveram pouca participação. Importantes setores da economia brasileira
não contaram com capitais norte-americanos: a indústria da construção naval
foi possível a partir de capitais japoneses, holandeses e brasileiros; a indústria
siderúrgica brasileira contou basicamente com capitais do BNDE (portanto,
estatais nacionais) e japoneses; e a indústria automobilística, que foi montada
com o apoio de capitais alemães (tais como os da Volkswagen e Mercedez-Benz),
franceses (Simca) e nacionais (DKW).

136
TÓPICO 1 | INDUSTRIALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

Veja o potencial do capital nacional brasileiro a partir da indústria


automobilística no período da industrialização a partir das figuras a seguir.

FIGURA 4 – FÁBRICA DA DKW-VEMAG EM SÃO PAULO (1945)

FONTE: <http://www.saopauloantiga.com.br/vemag-uma-fabrica-que-agoniza-no-tempo/>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

DICAS

Assista ao vídeo institucional da fábrica da DKW-Vemag no Brasil, produzido em


1964 pelo cineasta Jean Manzon. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=K-
efbGiDYuE>. Acesso em: 8 nov. 2018.

FIGURA 5 – LINHA DE MONTAGEM DO FISSORE NA DKW-VEMAG (1945)

FONTE: <http://www.saopauloantiga.com.br/vemag-uma-fabrica-que-agoniza-no-tempo/>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

137
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

NOTA

A Vemag foi uma empresa brasileira fundada em 1945 que atingiu seu auge nas
décadas de 1950 e 1960 a partir da produção de veículos sob licença da fábrica alemã DKW. O
parque fabril brasileiro tinha mais de dois milhões de metros quadrados e produziu ao longo
de 11 anos de operação junto à DKW pouco mais de 115.000 unidades de veículos, tornando-
se um império automotivo da década de 1960 no Brasil. Com relação à política econômica
do período, vale destacar que a Vemag foi a primeira empresa a receber incentivos fiscais do
governo para a implantação de empresas de automóveis oriundos do Grupo Executivo da
Indústria Automobilística (GEIA). Em 1966 a empresa é adquirida pela alemã Volkswagen e,
então, tem suas atividades encerradas em 1967.

FONTE: <http://www.saopauloantiga.com.br/vemag-uma-fabrica-que-agoniza-no-tempo>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

Ancoradas em investimentos estrangeiros de diversas áreas, as empresas


multinacionais dominaram amplamente a produção industrial brasileira. Veja os
dados a seguir:

• Levando em conta as 1.000 maiores empresas do país por volume de vendas em


1974, 2/3 delas eram empresas industriais. Todavia, as empresas multinacionais,
que correspondiam a 12% do total, tinham 50% do valor das vendas e 43% do
estoque de capital.
• Em 1970 as empresas multinacionais eram responsáveis por 85% das vendas da
produção de bens duráveis de consumo; e 57% das vendas de bens de capital.
• No subsetor de bens de consumo não duráveis, que era controlado basicamente
por empresas privadas nacionais, a participação das empresas multinacionais
nas vendas era de 43%.
• E mesmo no subsetor produtor de bens intermediários, no qual havia forte
participação de empresas estatais, as empresas multinacionais abarcavam 37%
das vendas.

Uma vez que o Brasil passou a contar com uma indústria com escala
produtiva bastante alta e intensa em capital, foram inevitáveis a entrada e a
supremacia do capital externo, que dominava amplamente os setores mais
dinâmicos da economia brasileira. Assim, cabia ao capital privado nacional o
papel de fornecedor de insumos e componentes, como é o caso da relação entre o
setor automobilístico e o setor de autopeças.

Caro aluno, estamos nos aproximado do final de mais um tópico de estudos.


No próximo, estudaremos o período relativo ao chamado “milagre econômico”.
Antes disso, leia os itens do Resumo e realize as questões de Autoatividade do
livro da disciplina.

138
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• Os diferentes conceitos de planejamento levam ao fim semelhante de alcançar


o futuro, por meio de incertezas, metodologias, modelos de compreensão e
análises próprias.

• As vertentes do planejamento econômico podem ser separadas entre o


planejamento substantivo e o planejamento procedimental.

• O planejamento é importante para a compreensão do funcionamento da


economia mundial entre os séculos XIX e XX, tanto devido ao crescimento das
cidades quanto às questões sociais.

• Após a década de 1930, o Estado brasileira passa a desempenhar forte atuação


na economia para estabilizar crises e promover o desenvolvimento.

• O Plano de Metas é considerado a primeira experiência brasileira de


planejamento governamental, entre 1956 e 1961.

• Além de 31 metas amplas para o desenvolvimento da economia brasileira, o


Plano de Metas tinha como meta-síntese a construção da nova capital do país
em Brasília.

• As ações do Plano de Metas levaram ao desenvolvimento de importantes setores


da economia como o da energia elétrica, extração de minérios, produção de aço
e cimento, além do investimento em obras de infraestrutura.

• O crescimento econômico no início do governo de Kubitschek estava apoiado


no tripé formado por empresas estatais, capital privado estrangeiro, capital
privado nacional.

• Na segunda metade da década de 1950, a economia brasileira encontrava-se


amplamente oligopolizada.

• No início do processo de industrialização brasileira, os capitais estrangeiros


eram oriundos de países europeus e do Japão. Somente após um momento de
consolidação é que o capital norte-americano aumenta sua participação.

139
AUTOATIVIDADE

1 Após a Segunda Guerra Mundial, as técnicas de planejamento a partir do


Estado que vinham sendo aplicadas nos países desenvolvidos foram trazidos
para países do “Terceiro Mundo”. Qual é o objetivo em iniciar a planejar a
economia brasileira?

2 Escreva sobre a importância do Plano de Metas para o crescimento e


desenvolvimento planejado da economia brasileira.

3 O capital nacional não foi suficiente para estruturar um cenário de


crescimento sustentado da economia durante o Plano de Metas. Qual é a
relevância do capital estrangeiro para este contexto?

140
UNIDADE 3
TÓPICO 2

MILAGRE ECONÔMICO

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, o tópico que você estudará a partir de agora é muito
importante para todo o estudo da disciplina de Formação Econômica do Brasil.

De maneira mais ampla, procuraremos estudar o período do chamado


“milagre econômico” brasileiro, que se refere às dinâmicas de intenso crescimento
econômico industrial na década de 1960.

Este tópico está divido em seis itens ao longo de suas páginas. Além desta
introdução, no item 2 estudaremos a crise que a economia brasileira atravessa
logo no início da década de 1960.

No item 3, os dados econômicos revelam a atividade econômica durante


o governo de João Goulart, entre 1961 e 1964, bem como a atuação do Estado por
meio do Plano Trienal.

O golpe militar de 1964 será analisado sob o ponto de vista econômico ao


longo do item 4. E, neste também veremos o modelo dependente e associado ao
capital externo formado pela economia brasileira.

O item 5 foi reservado ao Programa de Ação Econômica do Governo, o


importante PAEG, uma vez que traz mudanças institucionais fortíssimas ao país.

Por fim, estudaremos com maior especificidade, os Planos Nacionais de


Desenvolvimento, que são outras políticas econômicas muito importantes para o
crescimento econômico do Brasil.

Tenha uma boa leitura!

2 A CRISE INDUSTRIAL ENDÓGENA NO INÍCIO DA DÉCADA


DE 1960
O período subsequente à execução do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek,
com intenso crescimento do PIB, é marcado por uma desaceleração da economia que
perdurou até 1967. Um dos dados mostra que entre 1962 e 1967 a taxa média do
crescimento do PIB caiu para a metade quando comparada com o período anterior.

141
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

A formação bruta de capital fixo, que permite perceber o crescimento


interno da indústria, já havia caído em 1962 e tornou-se negativa em 1963, o que
também ocorreu com a produção industrial. O índice de inflação também subiu,
chegando a 90% em 1964. Pois, mesmo para os padrões elevados de inflação
do período era considerado um alto nível de aumento generalizado dos preços
(LACERDA; REGO; MARQUES, 2000), portanto, a economia brasileira vinha
apresentado indicadores negativos de crescimento, mas quais eram os motivos?

Em parte, a resposta estava no momento complicado que a economia


brasileira procurava desenvolver-se, com questões econômicas estruturais e
políticas econômicas conjunturais que pouco convergiam, em um contexto de
constante acirramento de conflitos políticos e sindicais que antecederam o golpe
militar de 1964.

Para José Serra e Maria Conceição Tavares, o problema inseria-se em


uma típica crise cíclica, ocasionada pelo volume imenso de investimentos
realizados pelo Plano de Metas. Pois, após a inserção deste gigantesco pacote
de investimentos, a economia levaria algum tempo até absorvê-lo (LACERDA;
REGO; MARQUES, 2000).

NOTA

A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) é um indicador que mede quanto


as empresas aumentaram os seus bens de capital, ou seja, aqueles bens que servem para
produzir outros bens. São basicamente máquinas, equipamentos e material de construção.
Ele é importante porque indica se a capacidade de produção do país está crescendo e
também se os empresários estão confiantes no futuro.

FONTE: <http://desafios.ipea.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=204
5:catid=28&Itemid=23>. Acesso em: 8 nov. 2018.

Na análise de Nathaniel Leff havia uma grande capacidade produtiva


inaproveitada no setor de bens de capital no Brasil. Situação percebida na
indústria automobilística, em que a capacidade ociosa chegou a 50%. Sobretudo,
neste período, houve uma subestimação da capacidade de competição das
empresas já instaladas e em operação no Brasil, bem como uma superestimação
das dimensões do mercado nacional (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

O Brasil do início da década de 1960 convivia com os avanços industriais


trazidos pela política econômica do período anterior, mas, ao mesmo tempo,
enfrentava e procurava vencer um cenário de desajustes econômico-industriais.

142
TÓPICO 2 | MILAGRE ECONÔMICO

FIGURA 6 – PRAÇA RAMOS, SÃO PAULO, 1960

FONTE: <https://noticias.bol.uol.com.br/fotos/bol-listas/2015/08/09/100-fotos-que-vao-fazer-voce-
querer-ter-vivido-no-brasil-de-antigamente.htm?fotoNav=54#fotoNav=67>. Acesso em: 8 nov. 2018.

Outro motivo defendido para o baixo crescimento econômico brasileiro ao


início da década de 1960 diz respeito ao setor de bens de consumo duráveis, cuja
demanda não crescia de maneira satisfatória. A demanda reprimida que o Plano de
Substituição de Importações buscou a atender esgotou-se rapidamente, resultando
em uma renda per capita também decrescente e uma elevada concentração de
renda no Brasil. Além disso, a falta de mecanismos para o financiamento de longo
prazo da demanda trazia ainda mais dificuldades e limitações para a demanda.

Já a partir de Francisco de Oliveira é possível compreender que a queda


dos investimentos foi resultado do aumento da atividade sindical e política dos
trabalhadores, dinâmica que em todo o período anterior populista havia sido os
pilares do processo de acumulação industrial brasileira.

Uma posterior interpretação de Francisco de Oliveira para a crise de


crescimento brasileiro pós 1962 levava em conta as contradições de um modelo de
acumulação baseado na produção de bens de consumo duráveis (departamento
II) e as fracas bases internas do setor produtor de bens de produção (departamento
I), uma vez que ambos os departamentos eram controlados pelo financiamento e
pelo próprio capital estrangeiro (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

E
IMPORTANT

Uma explicação mais abrangente sobre a crise de 1962 certamente deveria


considerar os vários aspectos abordados nas análises anteriores. Tratou-se efetivamente
de uma crise cíclica, agravada pelo aumento da instabilidade política e pelas políticas de
estabilização recessivas, como o Plano Trienal, num primeiro momento, e o próprio PAEG
[Programa de Ação Econômica do Governo], a partir de 1964. Some-se a isso o fato de que
era uma economia que se industrializara mantendo enorme dependência com relação ao
setor externo, o que provocava frequentes crises cambiais.

FONTE: Lacerda; Rego; Marques (2000).

143
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

Desta forma, a participação do capital estrangeiro resultava em um


grande paradoxo para a economia nacional brasileira, pois, para que o Plano de
Metas pudesse ser colocado em prática, e rápido, a entrada de um grande volume
de capitais era fundamental. Contudo, a dependência externa criada a partir do
momento em que as decisões econômicas passam a ser predominantemente
estrangeiras não cria suporte para que o Estado brasileiro elabore um projeto
mais amplo de crescimento e desenvolvimento para a economia.

3 CRESCIMENTO ECONÔMICO NO GOVERNO JOÃO


GOULART (1961-1964): CRISE POLÍTICA E O PLANO
TRIENAL DE CELSO FURTADO
As eleições de 3 de outubro de 1960 elegem Jânio Quadros como presidente
e João Goulart como vice-presidente, para o mandato de 1961 a 1965. Cabia a
Jânio, portanto, realizar uma política econômica para enfrentar os problemas
herdados do governo de Juscelino Kubitschek: aumento das taxas de inflação,
déficit fiscal e pressão sobre o balanço de pagamentos.

FIGURA 7 – CHAPA JAN-JAN: JÂNIO QUADROS E JOÃO GOULART

FONTE: <https://dougnahistoria.blogspot.com/2016/08/o-governo-janio-quadros-1961.html;
https://seuhistory.com/hoje-na-historia/joao-goulart-destituido-da-presidencia-do-brasil>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

Uma das medidas ocorreu em março de 1961 por meio de uma reforma
cambial que desvalorizava em 100% o chamado câmbio de custo, que era aplicado
às importações preferenciais, tal como o petróleo, e o papel de imprensa. O
objetivo era diminuir a pressão dos subsídios cambiais sobre o déficit público.

Nos meses de maio e junho, o governo consegue obter sucesso na


renegociação dos débitos com os credores externos e com organismos financeiros
internacionais, com o fim de adiar os prazos de vencimento das dívidas externas
do período entre 1961 e 1965 (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

144
TÓPICO 2 | MILAGRE ECONÔMICO

Contudo, em agosto de 1961, por motivos políticos e pessoais, Jânio


Quadros envia uma carta ao Congresso Nacional explicitando seu pedido de
renúncia ao mandato de Presidente da República do Brasil. A abrupta saída do
governo interrompe a continuidade de sua política econômica.

Jango, como ficou conhecido João Goulart, assume a presidência em


setembro de 1961 de forma conturbada. A Constituição do período, assim como
a atual, mencionava que o vice-presidente deveria assumir o Governo em casos
de renúncia, mas a classe dos militares se opunha a sua posse. Embora a classe
política e o Congresso Nacional como um todo defendiam o cumprimento da
legalidade em Jango assumir, os militares não retrocediam. Assim, o acordo
conciliatório possível foi transformar o sistema político brasileiro em um regime
parlamentarista. O vice-presidente tomaria possa, preservando a legalidade
constitucional, mas parte de seu poder seria transferido para um primeiro-
ministro, chefe de governo. Desta forma, Tancredo Neves, ministro do Governo
Vargas, foi nomeado primeiro-ministro do Brasil em 1961.

NOTA

Existem diversas formas de organizar os sistemas políticos dos países, tendo


suas características definidas pelos sistemas presidencialista e parlamentarista. No
presidencialismo, o presidente da república é escolhido pelo povo e acumula as funções de
chefe do Estado e Chefe do Governo, desempenhando funções mais amplas do Estado e de
políticas econômicas. No parlamentarismo, há um presidente (nem sempre escolhido pelo
povo), que recebe a função de chefe do Estado (nas monarquias esta figura é representada
por um/a rei/rainha), e há o cargo do primeiro-ministro, definido, na maior das vezes, pelo
próprio parlamento.

O fato é que entre setembro de 1961 e janeiro de 1965 houve três gabinetes
parlamentares diferentes no governo de Jango. O quadro de indefinição política
impossibilita a implementação de uma política econômica consistente e de longo
prazo. A taxa de inflação sobe de 33,2% em 1961 para 45,5% em 1962. O regime
parlamentarista manteve-se apenas até janeiro de 1963, após a convocação de um
plebiscito.

Ao fim do ano de 1962, uma resposta foi dada à crise político fiscal e
econômica brasileira por meio da apresentação do Plano Trienal. O economista
responsável pelo Plano Trienal foi Celso Furtado, então ministro extraordinário
para Assuntos do Desenvolvimento Econômico. O plano procurava conter a
aceleração do aumento das taxas de inflação e a deterioração econômica causada
pela dívida externa para promover o desenvolvimento econômico do país.

145
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

FIGURA 8 – CELSO FURTADO (À FRENTE), IDEALIZADOR DO PLANO TRIENAL

FONTE: <https://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/imagens/dossies/nav_jgoulart/fotos/Modulo6/
PNBFOTO007_s.jpg>. Acesso em: 8 nov. 2018.

NOTA

Celso Monteiro Furtado nasceu em Pombal (PB) no dia 26 de julho de 1920 e foi
um dos mais importantes economistas brasileiros. Suas ideias enfatizavam o desempenho do
papel do Estado na economia para a promoção do desenvolvimento econômico. Realizou
sua tese de doutoramento na Universidade de Paris-Sorbonne em 1948 sobre a economia
brasileira no período colonial. Foi integrante da Comissão Econômica para a América Latina
(CEPAL) e junto a Raúl Prebisch fizerem desta instituição o centro de debates sobre o
desenvolvimento latino-americano no século XX. Sua principal obra foi publicada em 1959,
sob o título “Formação Econômica do Brasil”, mas foi autor de cerca de 30 livros sobre teoria,
política e história econômica. Além da carreira acadêmica, ocupou cargos no Governo
Federal, tal como no Ministério do Planejamento e na Superintendência de Desenvolvimento
do Nordeste (SUDENE). Celso Furtado faleceu em 2004, no Rio de Janeiro.

FONTE: <http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/celso-monteiro-furtado>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

O Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social (1961-1965)


foi elaborado por uma equipe liderada por Celso Furtado (redesignado como
Ministro do Planejamento), cuja proposta passou a orientar a política econômica
do Governo João Goulart dali em diante. Procurava-se recuperar o ritmo de
desenvolvimento do período anterior e conter a progressiva dinâmica do processo
inflacionário.

Criado em apenas seis meses, o Plano foi um esforço ainda inicial de


implantar-se o planejamento econômico no Brasil e, para tanto, buscou-se a
“hierarquização de problemas, a fim de criar condições para que, dentro de uns
poucos anos, [pudessem] ser introduzidas técnicas mais eficazes de coordenação
das decisões” (MACEDO, 1975, p. 54).

146
TÓPICO 2 | MILAGRE ECONÔMICO

Portanto, embora o plano tenha tido o sucesso econômico esperado, foi


responsável por abrir caminhos para outras propostas e modelos econômicos
para o enfretamento das dificuldades econômicas. É com o Plano Trienal que se
criam e iniciam as chamadas reformas de base, que são medidas econômicas e
sociais com caráter nacionalista, em que o Estado passa a ter uma intervenção
mais específica na economia. Neste caso, a atuação do Estado incluía os setores
da educação, da política fiscal, agrário, urbano e bancário, com o fim de superar a
condição de subdesenvolvimento e garantir menores desigualdades sociais para
o Brasil.

“O Plano Trienal não alcançou realmente seus objetivos de promover o


desenvolvimento e vencer a inflação. Mas sua contribuição foi ponderável na
parte em que ele se propôs a intensificar o esforço de planejamento no país”
(MACEDO, 1975, p. 68).

Um dos motivos para o insucesso do Plano Trienal foi que devido ao


escasso conhecimento sobre o processo inflacionário não se pôde efetuar um
correto diagnóstico. Além de outras causas, a falha no diagnóstico é a principal
causadora do fracasso do Plano, bem como a que trouxe maiores consequências
à economia nacional. Sem haver capacidade de controlar os níveis de inflação, o
nível geral de preços, obviamente, se eleva gradativamente e o Produto Interno
Bruto cresce a taxas inferiores das passadas. O incentivo ao desenvolvimento
econômico, mesmo com a indústria interna renovada, não tem sucesso nem
parcialmente. Deste ponto adiante, os planos políticos e econômicos precisam
combinar a situação passada, isto é, as consequências ocasionadas pelo governo
anterior, com o momento presente (MACEDO, 1975; MARTONE, 1975).

As medidas anti-inflacionárias adotadas, comparadas com outras


desenvolvidas ao longo da história, foram consideradas bastante ortodoxas no
sentido em que procuravam conter os gastos públicos e diminuir a liquidez.
Rapidamente, as reivindicações das classes sindicais e políticas se impuseram
contra a política de governo, com a recusa dos assalariados em suportar mais
uma vez todo o peso do ajuste anti-inflacionário como havia sido nos períodos
anteriores.

Os dados econômicos relativos ao PIB per capita revelam um crescimento


negativo: enquanto em 1962 a economia cresceu 6,6%, em 1963 o crescimento foi
de apenas 0,6%, sendo que a meta de crescimento do Plano era de 7%. Com relação
aos níveis de inflação, a meta estabelecida pelo Plano era de 25%, mas os índices
mostraram uma inflação anual de 83,25%. (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000;
MACEDO, 1975).

O déficit de caixa do Tesouro Nacional, que havia sido programado para


alcançar no máximo 300 bilhões de cruzeiros antigos, chegou a 500 bilhões. Quanto aos
meios de pagamento, sua expansão que era prevista de 34% foi a 65%, impulsionada
pela expansão do déficit do Tesouro e do crédito ao setor privado. O crédito ao setor
privado também teve uma notável expansão, crescendo 54% os empréstimos do
Banco do Brasil ao setor privado não bancário (MACEDO, 1975, p. 61).
147
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

Em julho 1963, Celso Furtado deixa a pasta do ministério e retorna à


Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE). O acirramento
dos conflitos sindicais e políticos, em um cenário de desestabilização interna
devido ao baixo crescimento e alto nível de inflação, além do contexto de crise
externa, prejudicam novamente a implementação de qualquer tipo de política com
uma gestão mais articulada com diferentes ministérios e setores governamentais.
O resultado é um cenário com taxas de inflação ainda maiores e o fim do governo
do presidente democraticamente eleito, João Goulart, por meio do Golpe Militar
brasileiro de 1º de abril de 1964.

4 GOLPE MILITAR DE 1964 E O MODELO DEPENDENTE


E ASSOCIADO
Com a tomada do poder pelos militares em 1964, o Brasil colocou fim ao
chamado populismo. Os governos populistas foram aqueles que incorporaram
amplas massas urbanas ao processo político do qual haviam sido excluídos há
muitos anos. Tal movimento ocorreu em diversas economias latino-americanas,
como foi o caso da Argentina, com Perón e do Brasil, com Vargas.

Foi a partir deste contexto que a economia brasileira realiza a transição de


predomínio do setor agroexportador para o urbano-industrial, pois o Processo
de Substituição de Importações avançou com maior facilidade nos governos
populistas, devido ao papel que os Estados nacionais assumiram em apoio a este
processo.

Contudo, os governos populistas eram acusados pelo pensamento


econômico mais conservador de produzirem políticas excessivamente
redistributivas, buscando distribuir uma renda ainda inexistente. Segundo a
crítica conservadora, o populismo econômico geraria pressões inflacionárias e
dificultaria o processo de acumulação do capital.

Entretanto, todas as evidências empíricas sobre o caso brasileiro


desmentem esse raciocínio: o salário mínimo, instituído em 1940,
somente garantia condições indispensáveis à sobrevivência do
trabalhador e de sua família, longe, portanto, de embutir qualquer
política redistributiva ou que incorporasse os ganhos de produtividade
(LACERDA; REGO; MARQUES, 2000, p. 103).

Ademais, se formos analisar historicamente, o salário mínimo não


apresentou mudanças em seu valor real, quando descontada a inflação. Já o
crescimento da atividade industrial e do PIB, entre 1930 e 1990, levou a quintuplicar
o PIB per capita do país. O Brasil foi o país do mundo que teve maior crescimento
do PIB entre 1870 e 1987. Considerando o aumento populacional, o aumento da
renda per capita só foi superado pelo Japão no mesmo período. Já entre 1950 e
1987, momento fundamental do Processo de Substituição de Importações, o Brasil
apresentou o terceiro maior crescimento do PIB per capita do mundo, superado
apenas pelo Japão e pela China (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

148
TÓPICO 2 | MILAGRE ECONÔMICO

Uma síntese do período militar, após 1964, revela que os militares


eleitos de forma indireta tiveram uma postura tecnocrática-modernizante e
comprometida em superar as políticas consideradas atrasadas e ultrapassadas de
João Goulart. Entretanto, o novo regime manteve o discurso desenvolvimentista,
comprometido com o crescimento econômico.

A prioridade foi a normalização das relações com os organismos


financeiros internacionais como forma de captação de recursos financeiros
para o desenvolvimento econômico. Todas as ações militares propunham uma
integração com países capitalistas mais desenvolvidos, principalmente com os
Estados Unidos como forma de orientação econômica.

O Brasil assume, então, uma clara subordinação aos interesses


internacionais norte-americanos que levava a um aprofundamento do modelo de
capitalismo dependente e associados aos capitais estrangeiros – já predominante
desde o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek.

Como resultado tem-se o aumento da internacionalização da economia


brasileira frente aos capitais externos e a consolidação da oligopolização das
empresas, com elevada participação das empresas multinacionais (LACERDA;
REGO; MARQUES, 2000).

Desta forma, com o aumento da dependência externa para a execução das


políticas econômicas e o consequente aumento do PIB, a dívida externa brasileira
teve um enorme aumento (interessante apenas para os países mais desenvolvidos)
– fato que se torna determinante para o desenvolvimento da economia brasileira
até a atualidade.

5 PROGRAMA DE ACELERAÇÃO ECONÔMICA DO


GOVERNO (1964-1967): ESTABILIZAÇÃO E MUDANÇAS
INSTITUCIONAIS
No sentido de interpretar o desenvolvimento brasileiro do período e, mais
precisamente, as inconsistências que conduziram ao processo inflacionário, o
governo militar que assume após o golpe de abril de 1964 formula o Plano de Ação
Econômica do Governo (PAEG). O governo Castelo Branco (1964-1966) prioriza
uma política de combate específico à progressiva elevação de preços, capaz de
eliminar os estrangulamentos que bloqueavam a economia (MARTONE, 1975).

A elaboração do PAEG ficou a cargo do recém-criado Ministério do


Planejamento e da Coordenação Econômica. A equipe era liderada por Roberto
Campos, ministro do Planejamento, e por Octávio Gouvea de Bulhões, ministro
da Fazenda (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

149
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

O PAEG preocupava-se ainda com duas questões mais pontuais: primeiro,


atenuar as desigualdades regionais através da concessão prioritária aos investimentos
para as regiões Norte e Nordeste, por meio de uma política de isenção fiscal a estas
regiões. Segundo, incentivar as exportações para que um nível mínimo de importações
não impedisse o crescimento da produção interna (MARTONE, 1975).

A hipótese do PAEG era de que, contida ou eliminada a inflação, o


crescimento econômico seria uma consequência. Entretanto, os dados estatísticos
de crescimento do PIB para o período mostram que o pressuposto se confirma
apenas em parte. O PIB cresce, mas os padrões fora do previsto, e os preços se
elevam em níveis muito superiores ao esperado. Todavia, se levarmos em conta os
índices de inflação desde 1964, há uma melhora significativa (ver tabela a seguir).

TABELA 2 – TAXAS DE CRESCIMENTO DO PIB E DOS PREÇOS (1964-66)

1964 1965 1966


Taxas de crescimento
Prev. Real Prev. Real Prev. Real
PIB 6,0 3,1 6,0 3,9 6,0 4,4
Preços 80,0 93,3 25,0 28,3 10,0 37,4

FONTE: Martone (1975, p. 80).

Objetivos primordiais, com o desenvolvimento econômico, perderam


total sentido frente à necessidade de pôr fim à inflação. O processo retroalimentar
da inflação obriga constante atuação do Estado via políticas governamentais
econômicas. O Governo buscava meios de intervenção, e esta “participação”
aumenta após a intervenção militar (MARTONE, 1975).

“Essas tensões [reajuste de preços de bens de consumo das empresas,


aumento da carga tributária, gigantismo do setor público], acumuladas ao lado
dos custos, [...] geraram a recessão econômica que caracterizou particularmente o
ano de 1965” (MARTONE, 1975, p. 85, grifo nosso), com o decréscimo da produção
industrial e o baixo crescimento do PIB. Este quadro também não trouxe posição
econômica motivadora a novos investimentos, tampouco nas regiões objetivadas
– Norte e Nordeste – nem substancialmente ao restante do território.

FIGURA 9 – CASTELO BRANCO DISCURSANDO EM BRASÍLIA DURANTE O PAEG

FONTE: <http://www.historialivre.com/imagens/paeg5005.jpg>. Acesso em: 8 nov. 2018.

150
TÓPICO 2 | MILAGRE ECONÔMICO

O aspecto mais importante do PAEG foram as transformações


institucionais impostas ao país, relativas às reformas bancárias e tributárias, e na
centralização, por meio do autoritarismo militar, do poder econômico e político.
O regime político permitiu ao governo executar uma política econômica voltada
ao investimento privado, incentivando ainda mais o processo de oligopolização
da economia brasileira (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Para a execução do PAEG, um diagnóstico econômico da situação brasileira


também foi realizado, mas como foi embasado pela perspectiva ortodoxa
monetarista, concluiu que o excesso de demanda era causado pela monetização
dos déficits públicos, pela expansão do crédito às empresas e pelos aumentos
salariais superiores ao aumento da produtividade. O único elemento que se
enquadrava em uma proposta ortodoxa era que a estabilização seria alcançada
de forma gradual com a redução do déficit público e da inflação, este último com
previsão de 10% em 1967 – índice que resultou em 30% naquele ano.

Veja as principais ações implementadas pelo PAEG que buscavam


controlar as contas pública, aumentar as receitas e reduzir as despesas:

Foi uma executada uma política monetária restritiva, com controle


de emissão monetária e do crédito; e, especialmente, foi implementada
uma dura política de contenção salarial. Essa política – uma derrota
política dos trabalhadores e assalariados em geral – acabou provocando
um efetivo arrocho [aperto] salarial, somente possível em um regime
autoritário (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000, p. 105, grifo nosso).

NOTA

A política monetária apresenta dois movimentos básicos: um de expansão da


atividade econômica e outro de contração da atividade econômica. Enquanto o primeiro
procura aumentar a quantidade de moeda em circulação na economia para promover
crescimento; o segundo, privilegia a diminuição da circulação monetária com o fim de
controlar os índices de inflação e conter a aceleração da economia.

Entretanto, as políticas monetárias e fiscais foram aplicadas de forma


intercalada ao longo do tempo, alternando entre períodos de expansão da moeda e
do crédito e período com forte contração monetária, resultando em uma dinâmica
econômica baste difícil para o setor privado que provocou falências, concordatas
e no aumento do desemprego (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Voltando aos aspectos institucionais do Plano de Ação Econômica do


Governo, cabe mencionar que a reforma bancária de 1965 foi responsável por
criar a estrutura básica do Sistema Financeiro Nacional (SFN) que temos até
a atualidade, instituindo o Banco Central do Brasil (BACEN) e o Conselho
Monetário Nacional (CMN).
151
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

Com um Sistema Financeiro Nacional estabelecido, o Brasil pode formar


uma divisão entre instituições financeiras (com objetivo de financiar bens de
consumo duráveis), bancos comerciais (que atendem o público físico e jurídico), e
bancos de investimento (para o investimento privado e a especulação financeira).
Além disso, criou-se a chamada correção monetária, que atualizava valores de
toda a economia com base na inflação, o que permita convivência com altos
níveis de inflação. Toda esta estrutura monetária serviu de estímulo para um
forte movimento sem precedentes no Brasil de fusões e aquisições nacionais
e estrangeiras. O resultado é de um sistema financeiro cada vez mais forte e
competitivo economicamente, dinâmica que, obviamente, acirra ainda mais a
formação de capitais oligopolizados.

FIGURA 10 – CONSTRUÇÃO E ATUAL EDIFÍCIO-SEDE DO BANCO CENTRAL DO BRASIL

FONTE: <https://www.bcb.gov.br/pre/Historia/HistoriaBC/historia_BC.asp>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

NOTA

O Edifício-Sede do Banco Central, inaugurado em 1981, em Brasília. O dobrão


do Império, de 1725, serviu de inspiração para o projeto arquitetônico do Edifício-Sede.
O arquiteto Hélio Ferreira Pinto modificou geometricamente as pontas da haste de Cruz
de Cristo gravada na moeda e conferiu-lhe formas mais quadradas: daí surgiu a forma do
prédio. Já a ideia das torres, que abrem espaço para os elevadores, nasceu dos quatro cantos
da cruz. A área da plataforma para baixo do prédio é maior que a da plataforma para cima.
Os seis subsolos ocupam a projeção total do terreno, de cerca de 10 mil m². Os 21 andares
superiores têm área construída em torno de 1,8 mil m² cada.

FONTE: <https://www.bcb.gov.br/pre/Historia/HistoriaBC/historia_BC.asp>. Acesso em: 8


nov. 2018.

152
TÓPICO 2 | MILAGRE ECONÔMICO

FIGURA 11 – DOBRÃO DO IMPÉRIO (1725)

FONTE: <https://bit.ly/2M8s562>. Acesso em: 8 nov. 2018.

Em conjunto com a estruturação do Sistema Financeiro Nacional, criou-


se o Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e o Banco Nacional da Habitação
(BNH), que possibilitaram o fomento extraordinário da construção habitacional e
do saneamento básico nas cidades brasileiras por meio da utilização dos recursos
das cadernetas de poupança e do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
(FGTS) (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Por sua vez, a Reforma Tributária de 1967 criou o sistema tributário


vigente na atualidade, que aumentou a arrecadação e deu centralidade às contas
nacionais do governo, pois, além dos impostos mais organizados, deu grande
importância a fundos como o FGTS, o Programa de Integração Social (PIS) e o
Programa de Assistência ao Servidor Público (PASEP).

Por fim, a avaliação do PAEG como um programa de estabilização


econômica foi positiva, apesar dos custos gerados para uma parcela significativa
da população. Os índices de inflação anuais reduziram para a casa dos 20% e o
conjunto de transformações institucionais foram fundamentais para o crescimento
econômico que se seguiria.

Contudo, as críticas ao Plano apontam para erros no diagnóstico da


inflação de demanda, o que resultou em medidas de política monetária com
altos custos sociais para a população. Conforme a análise (LACERDA; REGO;
MARQUES, 2000, p. 106): “A política monetária restritiva praticada em 1966
foi equivocada, na medida em que a ameaça da retomada do crescimento
inflacionário devia-se a pressões dos preços agrícolas, consequência da quebra
de safra por causa da seca”.

Além disso, outras críticas são dirigidas ao autoritarismo na implementação


das transformações institucionais e na execução da política de estabilização. O
regime militar trouxe crescimento econômico por meio do liberalismo econômico,
mas em descompasso com o liberalismo político e democrático representativo
(LACERDA; REGO; MARQUES, 2000). O projeto militar levado a cabo com o golpe
de 1964 levou ao fortalecimento dos grandes oligopólios predominantemente
estrangeiros, aumento da dependência externa e forte desnacionalização da
economia – dinâmicas que interferiram na implementação de um modelo de
desenvolvimento economicamente viável e socialmente justo.

153
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

6 O PROJETO NACIONAL-DESENVOLVIMENTISTA DO
GOVERNO MILITAR
Antes do cessar do mandato de Castelo Branco é instaurada uma nova
Constituição, em 1967, que de certa forma, delineia as ações do governo de
Marechal Costa e Silva. As novas linhas de atuação foram apresentadas de forma
demasiada genéricas quando tratavam dos problemas de política econômica,
“versando somente sobre o homem, a humanização do desenvolvimento etc.”.
(ALVES; SAYAD, 1975, p. 92).

Em verdade, o Plano Estratégico de Desenvolvimento (PED/1968-1970)


estava amparado sob herança do Plano Decenal de Desenvolvimento Econômico
e Social, cujo texto foi elaborado na última fase do governo Castelo Branco,
pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), e seria um roteiro de
desempenho para o Governo seguinte. Tratava-se, especificamente, de um estudo
prospectivo global: uma análise macroeconômica para dez anos; e um conjunto
de diagnósticos setoriais, para um período de cinco anos (ALMEIDA, 2004).

Em julho de 1967 foram definidas as Diretrizes de Política Econômica.


Desta, surge ideia mais geral do que viria a ser o Plano Trienal do Governo,
para o período de 1968 a 1970, no qual o PED estava inserido (o Plano Trienal
resume-se no conjunto de medidas prioritárias apresentadas no PED). O PED foi
constituído, essencialmente, em: “Objetivos Básicos, Diretrizes Gerais de Política
Econômica, Programa Estratégico de Desenvolvimento, Diretrizes Setoriais
e Desenvolvimento Regional” (ALVES; SAYAD, 1975, p. 93). O objetivo geral
do plano, que condicionaria toda a política nacional, era o desenvolvimento
econômico e social. Pretendia ser um “plano nacional de desenvolvimento” e
“demonstrar a viabilidade do caso brasileiro”. Os movimentos de estabilização
dos preços e o fortalecimento do mercado interno e da infraestrutura permanecem,
mas de forma menos ortodoxa (ALVES; SAYAD, 1975; MIRANDA NETO, 1981).

A metodologia do PED é proveitosa. O ponto de partida do plano


deu-se pela realização de um diagnóstico da economia brasileira no período
de 1964 a 1966, criticando, em grande parte, a política econômica de combate
à inflação apresentada pelo PAEG. Percebe-se certa preocupação com a
continuidade da política anterior ou, minimamente, uma tentativa de ultrapassar
os erros cometidos, com vistas no longo prazo. A orientação metodológica
reconhecia “o esgotamento [...] das oportunidades de substituir importações e
a crescente participação do setor público na economia” (ALVES; SAYAD, 1975,
p. 94-95), através de certa concentração de investimentos em áreas dadas como
estratégicas, apesar destas ainda resumirem-se em infraestrutura. Uma tradição
de planejamento governamental formava-se: as autoridades governamentais já
tinham plena consciência da necessidade de se planejar a vida econômica da nação.
As preocupações que surgiam eram com relação à execução e implementação dos
planos, aspectos típicos destas operações e recentes às experiências brasileiras.

154
TÓPICO 2 | MILAGRE ECONÔMICO

Com relação aos resultados obtidos, podemos dizer que esses foram
atingidos em parte. O nível geral de preços cresceu a uma taxa inferior ao
período passado. Entretanto, a principal causa foi à nova forma de distribuição
e financiamento do déficit público. As despesas foram distribuídas ao longo
do ano, e o financiamento era realizado com recursos ociosos das autoridades
monetárias, reduzindo a participação inflacionária oriunda do déficit do Governo
(ALVES; SAYAD, 1975).

O governo seguinte, de Emílio Médici (1969-1974), apostava no


crescimento rápido do país. A partir do segundo ano deste governo, em outubro
de 1970, o Ministério do Planejamento divulga o Programa de Metas e Bases para
o Governo para o período de 1970-1973. As diretrizes deste se completavam com
o novo orçamento plurianual – 1971-1973; e com um primeiro Plano Nacional de
Desenvolvimento (I PND), previsto para ser implementado entre 1972 e 1974. O
ingresso do Brasil num mundo desenvolvido até o final do século era o objetivo
básico do Programa de Metas e Bases para o Governo. Quatro áreas foram
definidas como prioritárias: a) educação, saúde e saneamento; b) agricultura e
abastecimento; c) desenvolvimento científico e tecnológico; d) fortalecimento do
poder de competição da indústria nacional. Entre as metas econômicas elencava-
se: elevar níveis de crescimento, expansão do emprego, inflação decrescente e
elevação do investimento público (ALMEIDA, 2004; MIRANDA NETO, 1981).

O I PND objetivava elevar a economia nacional à categoria de “nação


desenvolvida”. Para tanto, acreditava-se que a região centro-sul do país – Rio de
Janeiro, São Paulo e Minas Gerais – fosse polo gerador e propulsor da economia,
“capaz de assegurar a expansão das indústrias, com o aporte científico e tecnológico
nacional decorrente de um sistema educacional avançado” (MIRANDA NETO,
1981, p. 127).

Além de não se confirmar, esta prospecção acarretou processo contrário;


um “polo gerador e propulsor” de massiva concentração de capital e capacidade
produtiva, aumentando as desigualdades regionais. Nessa época foram
implementados grandes projetos de integração nacional, como de transportes e
de telecomunicações. A ambição clara do Plano – criar um modelo brasileiro de
desenvolvimento; uma nação desenvolvida – dava destaque aos insumos básicos
devido, em maior parte, à primeira crise do petróleo (1973): indústria nuclear,
pesquisa do petróleo, programa do álcool, construção de hidrelétricas (Itaipu) e o
investimento em novas tecnologias (ALMEIDA, 2004; MIRANDA NETO, 1981).

155
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

FIGURA 12 – CONSTRUÇÃO DA HIDRELÉTRICA DE ITAIPU – 1975

FONTE: <https://ecivilufes.wordpress.com/2011/06/14/2-usina-hidreletrica-de-itaipu/>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

Em termos metodológicos, corresponde a um período de ascensão


do planejamento governamental no Brasil, via forte participação do Estado,
pois, não se restringia mais à simples elaboração de planos e à regulação geral
da economia. Instituições públicas passaram a controlar amplos setores da
economia e diversas políticas regionais, como planos financeiros e creditícios
(bancos de desenvolvimento, de habitação e regionais, financiamentos a setores
privilegiados); produtivos; de desenvolvimento regional e projetos de grande
porte (ponte Rio-Niterói, rodovia Transamazônica, hidrelétrica Três Marias,
barragem de Itaipu, Central Nuclear de Angra dos Reis) (ALMEIDA, 2004).

O II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), já no governo de


Ernesto Geisel (1974-1979), dedicou-se ao investimento em indústrias de base,
sobretudo, siderúrgica e petroquímica. Alongava-se, portanto, além do Plano
Decenal estabelecido com fim em 1976. Tratava a economia brasileira como
grande potência mundial: em 1979 a renda per capita seria o dobro da década
anterior. Em 1977, o PIB global do país conferiria ao Brasil o patamar de oitavo
mercado mundial. Seriam desenvolvidos, paralelamente, dois planos básicos de
desenvolvimento científico e tecnológico e o primeiro plano nacional de pós-
graduação (ALMEIDA, 2004).

Acreditava-se que a crise e os transtornos mundiais eram passageiros e


que as condições de financiamento eram favoráveis. Com efeito, tem-se a famosa
estratégia da “fuga para frente”. Assumia-se o risco de aumentar os déficits
comerciais e a dívida externa, a favor de superar a crise e o subdesenvolvimento,
hipoteticamente, pela estrutura industrial avançada que estava sendo construída
– via transformações estruturais, ao invés das tradicionais medidas econômicas.
Grande parte do financiamento para investimentos produtivos, em grande
medida estatais (Eletrobrás, Petrobrás, Siderbras, Embratel), deveria vir de
fontes externas, aumentando, consequentemente, o volume da dívida externa.
O crescimento do PIB se eleva até 1979, mas com desequilíbrios nas transações
correntes e aumento constante da dívida externa (ALMEIDA, 2004).

156
TÓPICO 2 | MILAGRE ECONÔMICO

O II PND altera o rumo da industrialização brasileira, até então


centrada no consumo de bens duráveis. Contemplava investimentos nas áreas
de (ALMEIDA, 2004): a) insumos básicos: metais não ferrosos, exploração de
minérios, petroquímica, fertilizantes e defensivos agrícolas, papel e celulose;
b) infraestrutura e energia: ampliação da prospecção e produção de petróleo,
energia nuclear, ampliação da capacidade hidrelétrica (Itaipu) e substituição dos
derivados de petróleo por energia elétrica e pelo álcool (Proálcool), expansão
das ferrovias e a utilização de carvão; c) bens de capital: mediante garantias de
demanda, incentivos fiscais e creditícios, reservas de mercado (lei de informática)
e política de preços.

A figura a seguir organiza de forma temporal os principais planos


econômicos e de desenvolvimento do Estado brasileiro vistos até este momento.
Consulte sempre que precisar!

FIGURA 13 – PLANOS ECONÔMICOS E DE DESENVOLVIMENTO SELECIONADOS

1950
Plano de Metas (1956 – 1961) / Juscelino Kubitschek (1951 – 1960)

Plano Trienal (1963 – 1965) / João Goulart (1961 – 1964)


PAEG (1964 – 1966) / Castelo Branco (1964 – 1967)

1960
Plano Decenal (1966 – 1976) / Castelo Branco (IPEA)
Plano Trienal do Governo (1968 – 1970) / Costa e Silva (1967 – 1969)
Programa de Metas e Bases (1970 – 1973) / Emilio Médici (1969 – 1974)

I PND (1972 – 1974) / Emilio Mèdici (1969 – 1974


1970

II PND (1974 – 1979) / Ernesto Geisel (1974 – 1979)


III PND (1979 – 1985) / João Figueiredo (1979 – 1985)

FONTE: Adaptado de Vargas (2014, p. 45)

Caro acadêmico, chegamos ao fim de mais um tópico de estudos relativo


à formação econômica do Brasil. Não deixe de visualizar o resumo e realizar as
questões de autoatividade logo a seguir!

157
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Após o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek, com intenso crescimento do


PIB, a economia nacional foi marcada por uma desaceleração da economia que
perdurou até 1967.

• No início da década de 1960, o país beneficiava-se com os avanços industriais


trazidos pela política econômica aplicada, mas, ao mesmo tempo, enfrentava
um cenário de desajustes econômico-industriais.

• Outro problema dizia respeito ao setor de bens de consumo duráveis, cuja


demanda não crescia de maneira satisfatória.

• Com a renúncia de Jânio Quadros em 1961, João Goulart assume a presidência


do país de forma conturbada, uma vez que a classe dos militares não apoiava
seu governo.

• A crise política fez com a taxa de inflação subisse de 33,2% em 1961 para 45,5%
em 1962.

• Com o Plano Trienal de Celso Furtado criaram-se as chamadas reformas de


base, com medidas econômicas e sociais com caráter nacionalista.

• Em 1964 o cenário da economia brasileira revelava-se com um alto nível de


inflação e chegou ao fim o governo do presidente democraticamente eleito,
João Goulart, por meio do Golpe Militar brasileiro de 1º de abril.

• Na segunda metade da década de 1960, a economia brasileira realizou a


transição de predomínio do setor agroexportador para o urbano-industrial.

• Alguns dos resultados do período do golpe militar foram o aumento da


internacionalização brasileira frente aos capitais externos e a oligopolização
das empresas com elevada participação das empresas multinacionais.

• Em 1964 foi elaborado o Plano de Ação Econômica do Governo, o PAEG, que


priorizava uma política de combate específico à progressiva elevação de preços.

• A reforma bancária de 1965 foi responsável por criar a estrutura básica do


Sistema Financeiro Nacional (SFN).

158
• O I Plano Nacional de Desenvolvimento (I PND, 1972-1974) dava destaque
aos insumos básicos da economia: indústria nuclear, pesquisa do petróleo,
programa do álcool, construção de hidrelétricas (Itaipu) e o investimento em
novas tecnologias.

• O II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND, 1974-1979) dedicou-se ao


investimento em indústrias de base, sobretudo, siderúrgica e petroquímica.

159
AUTOATIVIDADE

1 Cite um motivo pelo baixo dinamismo da economia brasileira ao início da


década de 1960.

2 Celso Furtado foi um economista brasileiro com respeitável contribuição


para o desenvolvimento da economia nacional. Comente sobre a participação
dele nas políticas econômicas da década de 1960.

3 O Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG), executado durante o


governo de Castelo Branco (1964-1966), além de enfocar em questões
econômicas, trouxe importante mudanças institucionais para o Brasil. Qual
é a contribuição do PAEG quanto à reforma bancária?

160
UNIDADE 3
TÓPICO 3

REDEMOCRATIZAÇÃO E INFLAÇÃO

1 INTRODUÇÃO
A década de 1980 imprimiu marcas tanto na economia quanto na
população brasileira. Do ponto de vista econômico, passamos por dificuldades
nunca vistas com baixíssimo crescimento do Produto Interno Bruto e altíssimo
níveis de inflação. Para a população, representou o fim de uma ditadura militar
extremamente autoritária que durou 20 anos.

É a partir deste contexto histórico que iremos compreender os principais


motivos da crise econômica da década de 1980, os quais causaram um forte
aumento da dívida externa e uma desestruturação interna no Brasil.

O processo inflacionário precisa ser visto com muito cuidado devido as


suas especificidades, pois as causas da inflação nem sempre foram as mesmas.
Nos anos 1980 houve diversas políticas que procuraram estabilizar a economia
atacada pelo monstro da inflação, fato que abstraiu políticas mais amplas para o
alcance de um desenvolvimento economicamente viável e socialmente justo.

Fique atento às dicas ao longo do tópico e bons estudos!

2 A CRISE ECONÔMICA DOS ANOS 1980: DÍVIDA EXTERNA


E DESESTRUTURAÇÃO INTERNA
O segundo choque do petróleo, em 1979, acarreta uma forte regressão
do alto desempenho econômico até então apresentado, bem como o declínio da
própria ideia de planejamento econômico a partir do Estado. Pouco depois, a
partir de 1982, a crise da dívida externa faz o país mergulhar numa longa fase
de baixo crescimento e inflação elevadíssima, que persiste em certa medida até o
Plano Real, em 1994. A fase final do regime militar, na década de 1980, cria uma
atmosfera de turbulência econômica e política em virtude das eleições diretas
para a Presidência da República.

A política econômica adotada no final do ano de 1980 e ao longo de


1981 seguiu a perspectiva ortodoxa: controle das despesas públicas e dos gastos
das empresas estatais; aumento da arrecadação com o Imposto de Renda e do
Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nas operações de câmbio; e uma
violenta contração da liquidez real e do crédito, com exceção do setor agrícola
(LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).
161
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

Na tabela a seguir dois períodos são apresentados: o primeiro, de 1970 a


1973, considerado o período do “milagre econômico”, em virtude do crescimento
do PIB e decréscimo da taxa de inflação; o segundo, de 1981 a 1984, conhecido
como a “década perdida”, correspondente à crise da dívida externa: os níveis do
PIB se reduzem e as taxas de inflação sofrem aumento. Os montantes da dívida
externa elevam-se ano a ano. São nítidos os contrastes entre os dois períodos.

TABELA 3 – INDICADORES ECONÔMICOS, BRASIL, PERÍODOS SELECIONADOS

Crescimento do PIB Dívida externa (US$ Taxa de inflação


Ano
nominal (%) milhões) (%)
1970 10,4 5.295 19,5
1971 11,3 6.622 20,3
1972 12,1 9.521 17,3
1973 14,0 12.572 14,9
(...) (...) (...) (...)
1981 –3,1 61.411 109,9
1982 1,1 70.198 95,5
1983 –2,8 81.319 154,5
1984 5,7 91.091 220,6

FONTE: Almeida (2004)

Os dados sobre o setor externo também trazem uma leitura da realidade


econômica do período (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000, p. 135). A balança
comercial brasileira (diferença entre as exportações e as importações) que havia
apresentado déficit de US$ 2,8 bilhões em 1980, registrou superávit de US$ 1,2
bilhão em 1980. As exportações alcançaram 8,5% do PIB em 1981, aumentando
0,5% em relação a 1980. Já as importações caíram 1,2%, passando de 9,2% do PIB
em 1980 para 8,0% em 1981.

Contudo, as taxas de juros internacionais aumentaram em quase 4% em 1981,


aumentando em US$ 3 bilhões as despesas brasileiras com juros da dívida externa.

Para 1982, os indicadores econômicos são ainda mais dramáticos devido


à pressão na balança de pagamentos ocasionada pela moratória mexicana. O
superávit reduziu-se para US$780 milhões, em função de uma redução de US$ 3
milhões na quantidade de exportações e de US$ 2,7 nas importações.

As despesas com os juros da dívida externa saltaram para US$ 11,4


bilhões e o déficit em conta corrente para US$ 14,8 bilhões. Com a dificuldade de
financiamento do déficit, as reservas líquidas brasileiras tornaram-se negativas
em mais de US$ 2 milhões.

Em 1983 a situação econômica é ainda mais grave devido ao aumento


dos índices de inflação. A política econômica implementada continuava

162
TÓPICO 3 | REDEMOCRATIZAÇÃO E INFLAÇÃO

com a contração da demanda como meio de conter a inflação. Contudo, a


maxidesvalorização cambial de 30% efetuada em fevereiro de 1983, em conjunto
com um choque agrícola, acelerou a inflação ao nível de 155% ao ano! O aumento
da inflação, aliado à desindexação parcial dos salários, provocou uma queda de
15% no poder de compra dos assalariados.

Ainda, em 1983 a queda do PIB em 2,8% e do produto industrial em 5,2%


provocam uma taxa de desemprego de 7,5% entre aqueles ligados à produção. Este
histórico estatístico permite conhecer um pouco melhor os prejuízos econômicos
no início da década de 1980. A recessão entre 1981 e 1983 provocou uma perda
de 11% na renda per capita do Brasil, situação que somente havia sido enfrentada
durante a depressão econômica mundial da década de 1930 (LACERDA; REGO;
MARQUES, 2000).

TABELA 4 – INDICADORES ECONÔMICOS AGREGADOS PARA OS


ANOS 1970 E 1980, BRASIL (EM PERCENTUAL)
1971 – 1980 1981 – 1990
Crescimento do PIB real 8,5 1,5

Crescimento do PIB real por habitante 5,9 – 0,4

Inflação (deflatores do PIB) 40,9 562,9

FONTE: Almeida (2004, p. 25)

Por fim, os dados da tabela anterior trazem um outro agrupamento de


dados para as décadas de 1970 e 1980. A taxa média de crescimento do PIB real
diminui drasticamente durante a década de 1980, bem como o crescimento do PIB
per capita, chegando a um crescimento negativo de 0,4%. Já a variação mediana da
inflação dá um salto gigantesco. Se na década de 1970 a inflação se manteve na
taxa de 41%, nos anos 1980 a média da taxa chega a 563%.

FIGURA 14 – REMARCADOR DE PREÇOS: A MÁQUINA DA INFLAÇÃO, 1980

FONTE: <https://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,fotos-historicas-a-maquina-da-
inflacao,11211,0.htm>. Acesso em: 8 nov. 2018.

163
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

NOTA

A figura anterior remete a uma cena comum no comércio antes do controle dos
altíssimos níveis de inflação brasileiros: ver um gerente ou um funcionário com uma “arma”
em punho circulando entre prateleiras e clientes. A “arma” era a máquina de remarcar preços,
usada quase que diariamente em uma época de inflação fora de controle. O remarcador
tornou-se o símbolo desta época, assim como a falta de mercadorias e o arrocho do crédito.
Para fugir da ação da maquininha, as pessoas corriam ao supermercado para comprar de
manhã antes que os preços subissem ou as mercadorias se esgotassem.

FONTE: <https://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,fotos-historicas-a-maquina-da-inflacao,
11211,0.htm>. Acesso em: 8 nov. 2018.

Em 1984 há um movimento de retomada do crescimento econômico no


país, embora o indicador de inflação continue revelando resultados preocupantes.
Neste período, a recuperação econômica dos Estados Unidos fui muito importante
para a economia brasileira. Em função de uma forte alta nos preços dos produtos
primários, houveram bons níveis de exportações a partir do Brasil, repercutindo
em um crescimento da renda agrícola e em compras de insumos e maquinários.

Acompanhe o crescimento econômico de diferentes setores em 1984:

• Indústria de transformação: 6,1%.


• Indústria extrativa mineral: 27,3%.
• Produção industrial como um todo: 7%.
• Indústria de bens de consumo duráveis: -7,5%
• Indústria de bens não-duráveis: 2,5%
• Bens de capital: 14,8%

O setor de extrativismo mineral cresceu, sobretudo, em função da


expansão contínua do petróleo. Em 1981, a participação do petróleo nacional no
consumo era de 21%; em 1984, era de 42%.

TABELA 5 – VARIÁVEIS MACROECONÔMICAS INTERNAS, 1978-1985, BRASIL (%)


Ano PIB Investimento/PIB IGP-DI Déficit público
1978 4,8 22,2 40,5 5,7
1979 7,2 23,0 77,2 8,3
1980 9,1 22,5 110,2 6,7
1981 –3,1 21,0 95,2 6,0
1980 1,1 20,4 99,7 7,3
1983 –2,8 16,1 211,0 4,4
1984 5,7 15,5 223,8 2,7
1985 8,4 16,7 235,1 4,3
FONTE: Lacerda, Rego e Marques (2000, p. 138)

164
TÓPICO 3 | REDEMOCRATIZAÇÃO E INFLAÇÃO

Conforme podemos visualizar na tabela anterior, o PIB teve um


crescimento de 5,7% após um período de instabilidade. A produção agrícola
também foi favorável, com aumento de 7,9% e um grande aumento na produção
de alimentos para o mercado interno. A inflação, mesmo com todos os demais
indicadores, saiu de 211% para 224% de taxa anual de inflação.

Por meio da tabela fica bastante evidente certo crescimento do PIB


brasileiro em 1984 e 1985 quando comparado com os anos anteriores. Contudo,
o grande vilão das políticas econômicas deste período, a inflação, seguia com
indicadores bastante problemáticos.

DICAS

Não deixe de assistir ao documentário “Laboratório Brasil - 15 anos do Real”.


A partir deste material produzido pela TV Câmara em 2007, você poderá ter uma ideia de
como foi conviver com altíssimos níveis de inflação e a complicada série de tentativas de
acabar com ela nas décadas de 1980 e 1990.

FONTE: <https://youtu.be/3LHH7nigO6A>. Acesso em: 8 nov. 2018.

3 ESTAGNAÇÃO E INFLAÇÃO BRASILEIRA: OS PLANOS DE


ESTABILIZAÇÃO ECONÔMICA
Como vimos, durante a década de 1980, considerada “perdida”, a
economia passa por um período de estagnação, com aumento gradual dos níveis
de inflação. O planejamento governamental que tinha se visto até então, segue
descontinuado. O III PND, por exemplo, permanece no papel.

Ao longo deste período, as únicas ações a partir do Estado ocorreram


a partir de planos de estabilização da inflação. Medidas econômicas que, em
verdade, “estabilizavam” os níveis de inflação a um patamar muito alto, gerando
muitos prejuízos econômicos e sociais. Durante o governo de José Sarney (1985-
1990) põem-se em prática quatro principais planos (ALMEIDA, 2004):

• Plano Cruzado (fevereiro de 1986), congela os níveis de preços, tarifas e


câmbio, e implanta a moeda “Cruzado”; estabelece um “gatilho” salarial para
os salários serem reajustados em cada momento que a inflação atingisse o nível
de 20% (que se tornou cotidiano).
• Plano Cruzado 2 (novembro de 1986), aumento de tributos e impostos, elevação
da taxa de juros.
• Plano Bresser (junho de 1987), congela preços, salários e alugueis, desativa-se o
“gatilho”, aumentam-se os tributos.

165
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

• Plano Verão (janeiro de 1989), congela salários e tarifas, efetua-se corte de três
zeros do Cruzado, altera-se o nome da moeda para Cruzado Novo.

Observando-se a tabela a seguir, percebe-se que todos os planos “Sarney”


não são nem paliativos para conter a dinâmica inflacionária, pois os índices de
crescimento caem e os de inflação sobem ainda mais.

TABELA 6 – INDICADORES ECONÔMICOS, GOVERNO SARNEY


Crescimento do PIB
Ano Taxa de desemprego Taxa de inflação (%)
Real (%)
1985 7,9 5,3 235
1986 8,0 3,6 65
1987 3,6 3,7 416
1988 –0,1 3,8 1.038
1989 3,3 3,3 1.783
FONTE: Almeida (2004)

Se olharmos para um contexto mais amplo, percebemos que o cenário


de crise, e com prospecções nada boas em que Sarney assumiu o Governo, é
revigorado para um contexto ainda mais turbulento quando assume o Governo
de Fernando Collor de Mello. Como medida instantânea após a sua entrada
na Presidência da República, o chamado Plano Collor promove o choque mais
brutal que a economia e a sociedade brasileira puderam conhecer: a nova reforma
monetária confisca todas as aplicações financeiras e estipula um limite aos saques
à vista. É ainda estabelecida nova moeda, o “Cruzeiro”.

A inflação é logo controlada para uma média de 3%. Entretanto, em seis


meses, volta ao patamar de 20%. Foi determinado novo congelamento – o Plano
Collor 2 – o que gerou novo e potencializado surto inflacionário em pouco tempo.

Agora, de volta aos planos de estabilização, cabe-nos entender um pouco


melhor cada um deles.

Plano Cruzado

Em 28 de fevereiro de 1986 é lançado o programa brasileiro de estabilização,


mais conhecido como Plano Cruzado, cujas propostas promoveram uma reforma
monetária que estabeleceu o Cruzado (Cz$) como novo padrão monetário
nacional, com o corte de três zeros em substituição a antiga moeda Cruzeiro.

O objetivo principal ali era criar uma moeda nova, com estabilidade,
que pudesse eliminar a memória inflacionária. Contudo, não foram esclarecidas
e estabelecidas metas para as políticas fiscais ou monetárias de médio prazo,
devendo ficar a cargo dos condutores do plano.

166
TÓPICO 3 | REDEMOCRATIZAÇÃO E INFLAÇÃO

FIGURA 15 – PLANO CRUZADO: REMARCAÇÃO DAS CÉDULAS E PRESIDENTE SARNEY

FONTE: <https://veja.abril.com.br/blog/cacador-de-mitos/da-veja-ao-pt-todos-elogiaram-o-
plano-cruzado>; <https://www.youtube.com/watch?v=TOdzFViggrU>. Acesso em: 8 nov. 2018.

A conversão dos salários em cruzados tomou como base o poder de


compra médio dos seis meses anteriores. A fórmula de conversão levava em conta
o poder de compra médio entre setembro de 1985 e fevereiro de 1986 em valores
correntes, ou a preços de fevereiro. Admitiu-se que os salários eram pagos no
último dia mês e gastos integralmente por ocasião de seu recebimento. Assim foi
concedido um abono salarial de 8% a todos os trabalhadores assalariados. Esta
decisão de cunho mais político procurava promover uma redistribuição de renda
em favor dos assalariados, tornando-se a decisão “pela média” mais aceitável por
parte dos trabalhadores (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Para favorecer ainda mais as classes mais baixas, o salário mínimo foi
definido em Cz$ 804,00, valor que significava um abono de 16% em relação ao
poder de compra médio dos seis meses anteriores.

Os salários também não foram congelados com o Plano Cruzado. As datas


dos dissídios anuais coletivos foram todas restauradas. Devido aos dissídios,
os salários seriam automaticamente corrigidos com base em 60% da variação
acumulada do custo de vida. Além dos reajustes anuais, os salários passariam a ser
corrigidos de acordo com uma escala móvel – o chamado gatilho salarial – sempre
que a taxa de inflação acumulasse 20% (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Entretanto, os preços ao consumidor foram congelados por tempo


indeterminado nos níveis que se encontravam em 27 de fevereiro de 1986. Não
houve qualquer compensação pela inflação anterior. Assim, os preços públicos,
congelados, encontravam-se defasados em relação aos custos de produção. E,
também não havia uma determinação da forma em que o descongelamento iria
ocorrer no futuro.

O Plano Cruzado foi considerado um sucesso, pois no curto prazo, as taxas


de inflação caíram muito. Assim, o Plano obteve um sucesso popular tremendo,
dando origem aos “fiscais do Sarney” integrados por cidadãos que de forma
autônoma procuravam fiscalizar os preços congelados do presidente Sarney. O
congelamento se tornou, assim, no elemento mais popular do Plano, o que levaria
o governo a sustentá-lo de todas as formas possíveis, sobretudo, tratando-se do
ano eleitoral.
167
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

O resultado, porém, não foi conforme o planejado. O aumento do poder de


compra dos salários e o consumo reprimido pela alta inflação dos anos anteriores
levou à despoupança da população e a uma explosão de consumo. Com o
impacto da elevada demanda na economia real, a continuidade do congelamento
de preços tornava-se uma tarefa muito difícil frente a uma oferta que não poderia
acompanhar a demanda.

Ademais, alguns preços, sobretudo, de tarifas públicas encontravam-se


defasados por não terem sido alinhados antes do congelamento. Com o passar
dos meses, o setor privado contestava o congelamento, pois alegava que os preços
não cobriam os custos de produção, levando ao descumprimento da regra por
meios ilegais.

FIGURA 16 – AGENTES DA POLÍCIA FEDERAL FISCALIZAM O


SUPERMERCADO CB NO RIO DE JANEIRO, 1987

FONTE: <https://acervo.oglobo.globo.com/incoming/plano-bresser-21461686>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

Após as eleições com vitória esmagadora aos partidos do governo, foi


anunciado um pacote mais integrado de combate aos desequilíbrios, o chamado
Cruzado II. Houve aumentos nos impostos diretos sobre produtos como cigarros,
bebidas e automóveis e reajuste dos preços públicos, resultando em uma perda
do poder de compra dos salários e uma retração da demanda agregada.

A taxa de juros também foi elevada em um cenário de incertezas


econômicas e queda do salário real. Os antigos conflitos de distribuição de
renda voltam a aparecer, uma vez que a memória inflacionária não havia sido
eliminada. Em decorrência das políticas monetárias e fiscais executadas, o país
declara moratório aos credores internacionais em fevereiro de 1987 (LACERDA;
REGO; MARQUES, 2000).

Plano Bresser

Com a saída de Dílson Funaro em fevereiro de 1987 do ministério da


Fazenda, Bresser Pereira assume o comanda da pasta e lança já no mês de junho
o Plano de Estabilização Econômica, conhecido como Plano Bresser.

168
TÓPICO 3 | REDEMOCRATIZAÇÃO E INFLAÇÃO

Levando em conta os resultados do Plano Cruzado, o novo Plano une


elementos ortodoxos e heterodoxos. O Plano não visava atingir inflação zero, mas
controlar os índices de preços para que não se estabelecesse uma hiperinflação.
Para tanto, o gatilho salarial foi extinto e procurou-se reduzir os gastos do governo.
As taxas de juros foram mantidas elevadas com o fim de inibir o consumo de bens
duráveis.

Os salários e os aluguéis foram novamente congelados ao patamar que


se encontravam em 12 de junho. O indexador utilizado para os ajustes salariais
a partir de setembro foi a Unidade de Referência de Preço (URP). Embora os
preços terem sido novamente congelados, houve um alinhamento prévio antes
do congelamento para que não ocorressem pressões inflacionárias futuras. Os
contratos financeiros pós e pré-fixados foram respeitos por meio de uma correção,
garantindo a continuidade do investimento. E o IPC teve sua base alterada para
evitar que o índice do mês de julho sofresse com a inflação anterior ao Plano
(LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Deste modo, este conjunto de medidas econômicas delineados pelo


Plano Bresser procurava aparar muitas das arestas econômicas que haviam
ficado soltas com a execução do plano de estabilização anterior.

FIGURA 17 – MÁRIO COVAS, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, BRESSER PEREIRA, ULYSSES


GUIMARÃES, LUIZ HENRIQUE E CARLOS SANT’ANNA NA APRESENTAÇÃO DO NOVO
MINISTRO EM ABRIL DE 1987

FONTE: <https://acervo.oglobo.globo.com/incoming/plano-bresser-21461686>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

Quanto às políticas econômicas fiscal e monetária, houve um


comprometimento em praticá-las de forma rigorosa, reduzindo o déficit público
e assegurando a independência do Banco Central do Brasil. O Plano era mais
consistente e flexível que o Cruzado, conseguindo atingir alguns de seus objetivos
tal como a redução parcial da inflação, do déficit público e propiciar a expansão dos
saldos comerciais entre exportação e importação e a renegociação da dívida externa
com os credos financeiros internacionais, suspendendo a moratória da dívida.

Contudo, ao longo do tempo, a política ia perdendo apoio popular


uma vez que o histórico do congelamento de preços no longo prazo não trazia
boas lembranças ao comércio e aos consumidores. No médio prazo, a inflação

169
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

permanecia elevada, levando que o governo aumentasse os preços de forma


emergencial antes do prazo de 3 meses mencionado no Plano. Em dezembro de
1987 a taxa de inflação mensal atingiu 14,14% e antecipou o pedido de demissão
de Bresser Pereira.

Maílson da Nóbrega: da política do feijão com arroz ao Plano Verão

O sucessor de Bresser Pereira no ministério da Fazendo foi Maílson da


Nóbrega, cuja política econômica aplicada ao longo de 1988 foi bastante tímida,
gradual e pouco intervencionista, por isso, denominada política do feijão com
arroz.

O objetivo era cortar o déficit operacional de 8% para 4% e reter a inflação


aos 15% ao mês. Entre as medidas para estabilizar a inflação e desaquecer a
economia estava a suspensão temporária dos reajustes do funcionalismo público
e o adiamento dos aumentos dos preços administrados.

Contudo, tais medidas não tiveram sucesso e, em julho de 1988, a inflação


já ultrapassava os 24%. Os preços públicos foram reajustados e emitiu-se moeda
para cobrir os superávits da balança comercial. Com a nova Constituição emitida
em 1988, os gastos orçamentários da União ficaram ainda mais amarrados,
dificultando a redução dos gastos públicos de forma rápida.

Em 15 de janeiro de 1989 foi anunciado o Plano Verão. Tratava-se mais


uma vez de um plano misto entre diversas medidas. Seria o terceiro choque
econômico e a segunda reforma monetária do governo Sarney – cuja imagem já
estava bastante prejudicada.

Foi criada uma nova unidade monetária, o Cruzado Novo (NCz$),


equivalente a mil cruzados. O dólar foi cotado a NCz$ 1,00, após uma
desvalorização da moeda nacional.

FIGURA 18 – CRUZADO NOVO, MAÍLSON DA NÓBREGA E ZÉLIA CARDOSO DE MELO

FONTE: <http://www.panoramamercantil.com.br/entrevista-com-mailson-de-nobrega/>.
Acesso em: 8 nov. 2018.

170
TÓPICO 3 | REDEMOCRATIZAÇÃO E INFLAÇÃO

Seguindo os objetivos dos planos de estabilização da década de 1980, por


meio do Plano Verão procurava-se contrair a demanda agregada e promover a
queda nos níveis de inflação. Mantiveram-se altas as taxas reais de juros, o crédito
ao setor privado foi restrito, houve desindexação e promessa de ajuste fiscal.

Outra vez, os preços eram congelados a partir da data de publicação da


política, com o realinhamento de alguns preços que se encontravam defasados.
Já os salários, foram corrigidos pelo poder de compra dos últimos 12 meses e
reajustados em 26,1%. Com a extinção da Unidade Real de Valor (URV), caberia
ao Congresso Nacional a decisão a respeito da política salarial.

E novamente não houveram resultados positivos. A inflação de 3% em


fevereiro salta para 7% já em abril. O governo teve que elevar ainda mais a taxa
de juros, descumprindo a promessa de redução do déficit público naquele ano.
Os preços tiveram que ser descongelados e reajustados devido à desvalorização
da moeda. Em setembro de 1989, o governo suspende novamente o pagamento
da dívida externa.

Veja na tabela a seguir alguns indicadores econômicos do período do


governo Sarney que revelam um pouco mais sobre a realidade econômica em que
o Brasil atravessava na segunda metade da década de 1980.

TABELA 7 – INDICADORES ECONÔMICOS, GOVERNO SARNEY, 1985-1989

PIB, valor e crescimento Poupança % Taxa de Taxa de


Ano
US$ milhões % real do PIB inflação desemprego
1985 211,1 7,9 20,3 235 5,3
1986 257,8 8,0 18,0 65 3,6
1987 282,4 3,6 22,7 416 3,7
1988 305,7 –0,1 25,7 1.038 3,8
1989 415,9 3,3 27,1 1.783 3,3
FONTE: Almeida (2004, p. 26)

Os últimos meses do governo Sarney foram marcados por um verdadeiro


caos político e econômico. A credibilidade do governo era baixíssima após tantas
tentativas, e todas fracassadas, de estabilização da economia. Mesmo com três
planos executados – Cruzado, Bresser e Verão – os níveis de inflação eram ainda
mais preocupantes do que no período da hiperinflação.

Em 1989, a inflação anual foi de 1.764,86%, e as taxas mensais nos


primeiros meses de 1990 foram de 64,17% em janeiro, 73,21% em fevereiro, e
85,12% na primeira quinzena de março! (LACERDA; REGO; MARQUES, 2000).

Com este cenário econômico trágico, em 15 de março de 1990, Fernando


Collor de Melo assumia a presidência da República com o anúncio de um novo
plano de estabilização econômica.
171
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

Após estudarmos tantas transições econômico-políticas ao longo da


formação econômica do Brasil, sugerimos que você organize estas informações
históricas de forma cronológica para facilitar os estudos. O quadro a seguir pode
ser um ponto de partida, no qual apresentamos, de forma sucinta e objetiva, todos
planos explícitos de governo desde os anos 1950 até a década de 1990, bem como
suas principais medidas, metas e objetivos.

QUADRO 1 – SÍNTESE SOBRE OS PLANOS DE GOVERNO, BRASIL, 1956-1994

Plano Governo Período Medidas/Metas/Objetivos


Planejamento em nível
setorial: energia; transportes;
Juscelino Kubitschek
Plano de Metas 1956-1961 alimentação; indústrias de
(1956-1961)
base e educação. Processo de
substituição de importações.
Recuperação do ritmo de
Plano Trienal de desenvolvimento; contenção
João Goulart (1961-
Desenvolvimento 1963-1965 do processo inflacionário.
1964)
Econômico e Social Implantação do planejamento
econômico.
Plano de Ação
Castelo Branco 1964- Crescimento econômico;
Econômica do
(1964-1967) 1966 combate à elevação dos preços.
Governo
Plano Decenal de
Castelo Branco Roteiro de desempenho para o
Desenvolvimento 1966-1976
(IPEA) período 1967-1976.
Econômico e Social
Plano Trienal do Aceleração do desenvolvimento
Governo – Plano Costa e Silva (1967- 1968- e contenção da inflação;
Estratégico de 1969) 1970 objetivo de implantação de um
Desenvolvimento plano nacional.
Diretrizes para o I PND: educação;
Programa de Metas e Emilio Médici (1969-
1970-1973 agricultura; desenvolvimento de
Bases para o Governo 1974)
C&T; competição industrial.
Primeiro Plano Projetos de integração nacional;
Nacional de Emilio Médici 1972-1974 planos de desenvolvimento
Desenvolvimento regional.
Fortalecimento às indústrias
Segundo Plano
Ernesto Geisel (1974- de base; planos básicos de
Nacional de 1974-1979
1979) desenvolvimento de C&T; plano
Desenvolvimento
nacional de pós-graduação.
Descontinuado por motivo de
Terceiro Plano
João Figueiredo crise econômica após longo
Nacional de 1979-1985
(1979-1985) período de planejamento para
Desenvolvimento
o desenvolvimento.
Congelamento de preços,
José Sarney (1985- Fev./1986- salários, tarifas e câmbio, e
Plano Cruzado
1990) Nov/1986 troca de moeda; “Gatilho”
salarial.

Nov./1986- Aumento de tributos e impostos;


Plano Cruzado II José Sarney
Jun/1987 elevação da taxa de juros.

172
TÓPICO 3 | REDEMOCRATIZAÇÃO E INFLAÇÃO

Congelamento de preços,
Plano Bresser José Sarney Jun./1987 salários e aluguéis; desativa-se
o “gatilho”.
Congelamento dos salários
Plano Verão José Sarney Jan/1989 e tarifas; corte de três zeros;
Cruzado Novo.
Nova reforma monetária,
Fernando Collor de Mar/1990- confisco de aplicações
Plano Collor
Mello (1990-1992) Fev/1991 financeiras e limites aos saques
das contas à vista.

Conclusão

Fernando Collor de Novo congelamento e


Plano Collor II Fev./1991
Mello “confisco”.
Completa reforma monetária,
Itamar Franco (1992-
Plano Real 1993-1994 com substituição do meio
1994)
circulante pelo Real.

Caro acadêmico! Esperamos que sua jornada ao longo da disciplina de


Formação Econômica do Brasil tenha sido muito proveitosa. Os temas aqui
discutidos são extremamente importantes para a compreensão da economia
brasileira na atualidade.

Acompanhe a leitura complementar a seguir e realize as questões de


autoatividade para completar ainda mais esta etapa de ensino!
FONTE: Adaptado de Vargas (2009, p. 48-49)

173
UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA DO SÉCULO XX

LEITURA COMPLEMENTAR

Plano Real: o fim de mais uma grande inflação


Roberto Ellery Jr.
Diretor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da
Universidade de Brasília (FACE/UnB)

Quando a inflação sai de controle é criado um processo de distribuição


de renda dos que têm rendas fixas para os que podem reajustar livremente suas
rendas. Também ocorre um aumento da volatilidade da economia, fazendo com
que empresários demandem maiores taxas de retorno para seus investimentos do
que aceitariam em condições normais. Por construção, a maioria dos modelos de
macroeconomia não consegue explicar essas questões.

A dificuldade em modelar moeda e inflação faz com que existam poucas


teorias tratando de como reduzir altas taxas de inflação, fenômeno que assolou
o Brasil nas décadas de 1980 e 1990. Foi a época dos choques heterodoxos, que,
normalmente, recorriam a congelamento de preços e controle de salários. Em
1994, apareceu o Plano Real que, de saída, rejeitou o congelamento de preços.
Começou com uma tentativa de criar uma unidade de valor que conquistasse a
confiança da população, a Unidade Real de Valor (URV).

A ideia era que a população passasse a ter a URV como unidade de valor
confiável enquanto o valor da URV em termos de cruzeiros reais, a moeda da
época, era modificado todos os dias. Esse mecanismo permitiu o ajuste dos
preços a uma nova referência sem obrigar o Banco Central a abrir mão da política
monetária por meio de uma dolarização ou de uma caixa de conversão. A transição
por meio da URV foi inspirada em uma proposta de moeda indexada elaborada
pelos economistas Pérsio Arida e André Lara Rezende. Tal engenharia econômica
permitiu que o Brasil ficasse livre do câmbio fixo. Em vez disso, adotamos um
regime de bandas em que era admitida alguma flutuação, de forma a acomodar
a política monetária.

Feita a transição para a nova moeda, o resto era seguir o proposto


por Thomas Sargent em um dos poucos artigos dedicados ao combate de
hiperinflações: The Ends of Four Big Inflations. O início da conclusão desse texto
resume bem o que era preciso ser feito para que a inflação não contaminasse
o real: “The essential measure in ending hyperinflation in each of Germany, Austria,
Hungary and Poland were, first, the creation of an independent central bank that was
legally committed to refuse the government’s demand for additional unsecured credit,
and, second, a simultaneous alteration in the fiscal police regime”.

Na ausência de câmbio fixo, sem uma autonomia formal do Banco Central


e com a necessidade de expandir o gasto para atender às demandas sociais da
Constituição, seguir as recomendações de Thomas Sargent não seria uma tarefa
simples.

174
TÓPICO 3 | REDEMOCRATIZAÇÃO E INFLAÇÃO

Para conseguir dar credibilidade ao Banco Central e estruturar uma


política fiscal capaz de conciliar as demandas sociais e a necessidade de minimizar
os prejuízos à política monetária, que precisava estar acima de qualquer suspeita,
o presidente Fernando Henrique Cardoso montou uma equipe econômica de
altíssimo nível, da qual destaco Pedro Malan, ministro da Fazenda, e Gustavo
Franco, presidente do Banco Central. Garantir a estabilidade do Real forçou
uma trajetória crescente da carga tributária, a elevação da dívida pública e
a necessidade de conviver com altíssimas taxas de juros. O aumento da carga
tributária e da dívida pública foi a forma de atender às demandas sociais sem
recorrer ao financiamento inflacionário. Os juros altos eram o preço a pagar pela
credibilidade de um Banco Central sem autonomia formal.

Mesmo com as dificuldades e os custos citados anteriormente, o Plano


Real conseguiu manter a estabilidade seguindo as linhas inicialmente propostas
até 1999. Naquele ano, a combinação de gastos altos, dívida pública crescente,
juros altos e câmbio já praticamente fixo não resistiu à crise dos países emergentes
e o Brasil se viu forçado a realizar mudanças radicais na condução da política
econômica. Foi naquela época que, já com Armínio Fraga na presidência do Banco
Central, apareceu o tripé macroeconômico. O tripé consistiu na combinação de
câmbio flexível, regime de metas de inflação e busca por superávits primários nas
contas do governo. Mas essa é outra história.

“A dificuldade em modelar moeda e inflação faz com que existam poucas


teorias tratando de como reduzir altas taxas de inflação, fenômeno que assolou o
Brasil nas décadas de 1980 e 1990”.

FONTE: ELLERY JR., Roberto. Plano Real: o fim de mais uma grande inflação. Desafios do
Desenvolvimento, ano 10, 80. ed., 2014. Disponível em: <http://desafios.ipea.gov.br/index.
php?option=com_content&view=article&id=3055&catid=29&Itemid=34>. Acesso em: 23 nov. 2018.

175
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• O segundo choque do petróleo, em 1979, acarretou uma forte regressão do alto


desempenho econômico do período.

• A política econômica entre 1980 e 1981 seguiu a perspectiva ortodoxa:


controle das despesas públicas e dos gastos das empresas estatais; aumento da
arrecadação com o Imposto de Renda e do Imposto sobre Operações Financeiras
(IOF) nas operações de câmbio; e uma violenta contração da liquidez real e do
crédito.

• O início da década de 1970 é considerado como “milagre econômico” e a


década de 1980 como “década perdida”.

• Na década de 1970 a inflação manteve-se na taxa de 41%; nos anos 1980 a média
da taxa chega a 563%.

• Em 1984 houve uma retomada do crescimento econômico brasileiro com o


aumento da produção em setores como o agrícola.

• As políticas econômicas da década de 1980 podem ser resumidas em políticas


de estabilização econômica em função da inflação.

• Os quatro planos (entre 1986 e 1989) do Governo Sarney não trouxeram


resultados positivos quanto a sua capacidade de combater a inflação.

• O Plano Collor promoveu um choque na economia ao confiscar todas as


aplicações financeiras e estipular um limite aos saques à vista. É criada a moeda
“Cruzeiro”.

176
AUTOATIVIDADE

1 Embora a economia brasileira tenha atravessado uma recessão no início


da década de 1980, provocando um nível de desemprego de 7,5% entre os
trabalhadores ligados à produção, em 1984, há um movimento de retomada
do crescimento econômico do país. Comente sobre a situação da economia
brasileira em 1984.

2 Com o Governo Sarney (1985-1990) ocorre uma forte mobilização em torno


dos planos de estabilizaçao econômica em decorrência dos altos níveis de
inflação. Quais as principais do primeiro plano, o Plano Cruzado?

3 Após a execução dos Planos Cruzados I e II, Dílson Funaro deixa a pasta
do ministério da Fazenda para Luis Carlos Bresser Pereira, e declara a
moratória aos credores internacionais. Como podemos compreender o
período subsequente, em que é executado o Plano Bresser?

177
178
REFERÊNCIAS
ABREU, Marcelo de Paiva. Crise, crescimento e modernização autoritária: 1930-
1945. In: ABREU, Marcelo de Paiva. A ordem do progresso: cem anos de política
econômica republicana 1889-1989. 26. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 1990.

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