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Capitulo 1 – Relâmpago Negro

Centro de Belo Horizonte, uma manhã agitada de segunda, sete e quinze.

Um homem anda pela calçada com pressa e expressão preocupada, está atrasado, depois de
muito tempo cumprindo seus horários em dia, seguindo sua rotina diária, hoje estava
atrasado. Ele olha compulsivamente para o relógio no pulso, está quase chegando ao grande
edifício onde trabalha, já são mais de 20 anos assim, ele não pode perder a importantíssima
reunião que já começou.

Tanta pressa o faz imprudente, o impedindo de observar que um caminhão está passando pela
rua neste momento. Ele tenta atravessar aceleradamente e quando menos percebe, há uma
grande sombra a menos de um metro dele, seus pensamentos paralisam, ele mal sabe que
com aquela velocidade e o porte do veículo, ele estará morto antes de tocar o solo. Nesse
momento tudo paralisa, os nervos vão as alturas, a adrenalina dispara. Tudo fica preto.

De olhos fechados o homem estranha o fato de sua morte estar durando tanto.

“- A morte é assim?! Ou não morri? – Ele pensa, enquanto lentamente abre seus olhos. Ele vê
alvoroço nas ruas, pessoas correndo na sua direção e passando por ele, observa que está do
outro lado da rua e não há ferimentos em seu corpo. “O que aconteceu? ”, novamente ele
pensa. Ao olhar para trás observa o caminhão parado bem onde estaria seu corpo, se algo
tivesse lhe acontecido. Várias pessoas ao redor do caminhão, algumas olhando embaixo
enquanto outras estão confusas olhando a frente, nenhuma delas percebeu o deslocamento
que fez até o outro lado, é justo, afinal nem ele mesmo havia percebido. Porém uma pergunta
fica no ar.

- O que aconteceu? – Dessa vez ele fala alto. Faz o sinal da cruz, atribuindo a Deus o seu
milagre, como qualquer homem religioso e caminha para dentro do prédio, com as pernas
fracas e bambas, mas feliz por estar vivo.

Cerca de 30 metros de onde o homem foi deixado, uma estranha figura o observa, com
expressão de felicidade e capuz, um jovem que de repente já não está mais lá. Sumindo em
meio à multidão.

Norte de Belo Horizonte, naquela mesma manhã.

Patrícia acaba de acordar, ela está cansada ainda, foi um duro plantão no hospital, porém ela
sabe que é figura maternal da casa, sem ela os outros dois simplesmente nem abririam os
olhos. Ela se levanta rapidamente e vai ao quarto de Roberto.

Como previsto, lá está ele “jogado” pela cama, coberta no chão e uma grande bagunça para
todos os lados. Seu telefone está despertando mais uma vez e ele nem esboça reação de
acordar. Ela dá um tapa em suas nádegas ao mesmo tempo em que grita bem alto: “-Acorda
vagabundo! Já passou da hora de levantar! ”. O susto é grande, ele salta da cama numa grande
velocidade, mas ao observar que é a sua irmã, só consegue dizer: “- De novo Pat, eu já te falei,
desse jeito não, poxa, quer me matar do coração? Já vou descer. ”

Satisfeita com o resultado, ela parte então para a próxima vítima. Seu primo Maxwell, a quem
tem como um irmão mais novo. Ao abrir a porta, observa que está tudo arrumado e que ele já
não está mais ali, nem sua bolsa.
“- Que estranho, ele foi para a escola e eu nem acordei? Devo estar bem cansada mesmo!

Escola xxxx

Todos os dias, durante nossa vida inteira, apenas movimentamos a grande engrenagem da
vida. Apesar de ser uma metáfora, não é um bom pensamento. O movimento das engrenagens
é repetitivo, desgastante e uniforme, não havendo nada que mude ou se sobressaia, exceto
quando alguma se danifica e deve ser troca. Não há glória em ter uma vida normal, porém
também não há glória se você é bom naquilo que já esperavam que fosse. É por isso que me
dedico, não com tanto afinco, é claro, porém desvio a minha atenção a danificar engrenagens,
de modos engenhosos e imperceptíveis, para que a ordem natural mude, evolua, saia da rotina
e previsibilidade.

E por isso essa manhã é particularmente importante para mim.

Jorge Boaventura é apenas mais executivo, igual a todos os outros que dedicam suas vidas e
movimentar engrenagens, nunca sai da rotina. Apesar de odiar a rotina e movimentadores de
engrenagem tão domesticados, não é por esse motivo que arquitetei a morte de Jorge. Apesar
de tudo ainda preciso me vestir, comer e morar, então sim, para quem pensou que fosse por
dinheiro. É isso que faço, sou bom em muitas coisas, mas isso é o que me diverte.

Contudo, foi nessa manhã que achei algo mais interessante, algo muito mais interessante.

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