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Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro


Vigésima Sétima Câmara Cível

Agravo de Instrumento nº 0029952-24.2020.8.19.0000

Agravante: Antonio José da Costa Nazareth


Agravado: Itaú Unibanco S.A.
Relatora: Des. Maria Luiza de Freitas Carvalho

ACÓRDÃO
Agravo de Instrumento. Decisão que indeferiu a tutela
antecipada requerida em caráter antecedente. Pretensão
de suspensão de cobrança referente aos empréstimos
contratados, bem assim de cancelamento do contrato de
abertura de crédito vinculado à conta corrente do autor.
Pandemia do Covid-19. Não há dúvida de que a
pandemia afetou ambos os contratantes e reflete
momento de excepcionalidade social e econômica e que
a boa-fé, como verdadeira regra de conduta, estabelecida
no art. 422 do Código Civil, impõe aos contratantes o
dever de cooperar para que a relação não seja fonte de
prejuízo ou decepção para uma das partes. De se
ressaltar, ademais, que, a par da cooperação mútua e do
dever de lealdade negocial, há que se levar em
consideração a teoria da imprevisão, incorporada pelo
art. 317 do diploma civil, que dispõe sobre a adequação
das prestações contratuais nos casos de acontecimentos
imprevisíveis, que possam gerar onerosidade excessiva a
uma das partes. Na espécie, não obstante a ocorrência
de fato imprevisível, não se vislumbra, ao menos em
sede de cognição sumária, vantagem desmedida por
parte da instituição financeira agravada. Proposta feita
pela instituição bancária rejeitada pelo autor.
Plausibilidade do direito não evidenciada. Art. 300 do
CPC. Súmula n.º 59, do TJRJ. Decisão mantida.
RECURSO DESPROVIDO

Vistos, relatados e discutidos, nestes autos de agravo de instrumento nº


0029952-24.2020.8.19.0000, em que figura como agravante Antonio José da Costa
Nazareth.

ACORDAM os Desembargadores da VIGÉSIMA SÉTIMA CÂMARA


CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, por
UNANIMIDADE, em desprover o recurso, nos termos do voto da relatora.

Secretaria da Vigésima Sétima Câmara Cível


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MARIA LUIZA DE FREITAS CARVALHO:16078 Assinado em 08/10/2020 16:14:09


Local: GAB. DES(A) MARIA LUIZA DE FREITAS CARVALHO
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Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Vigésima Sétima Câmara Cível

Agravo de Instrumento nº 0029952-24.2020.8.19.0000

Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão proferida


pelo MM. Juiz de Direito da 6ª Vara Cível da Comarca de Niterói que indeferiu a tutela
antecipada, requerida em caráter antecedente, nos seguintes termos:

“1. Defiro a gratuidade de justiça requerida pelo autor, bem


como a prioridade no processamento do feito. Anote-se onde
couber.2. Requer o autor a tutela provisória de urgência em
caráter antecedente para que seja determinado ao réu que,
diante do não pagamento dos débitos mantidos pelo autor
junto à instituição financeira, se abstenha de praticar atos de
cobrança. Decido. De acordo com o artigo 303 do Código de
Processo Civil, nos casos em que for contemporânea à
propositura da ação, a petição inicial pode se limitar ao
requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de
tutela final, com a exposição da lide, do direito que que busca
realizar, e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do
processo. Busca o requerente a suspensão dos pagamentos
devidos em razão do contrato de empréstimo firmado com o
requerido e a abstenção do credor de praticar atos de
cobrança. Verifica-se que evidente a relação contratual
existente entre as partes, sendo que justamente em razão dela
busca o requerente a tutela provisória em caráter antecedente,
observando-se que o seu pleito final é de reconhecimento de
inexigibilidade de tais pagamentos durante o período de curso
da pandemia (COVID-19). É fato público e notório que vivemos
um período excepcional na história da humanidade, em que o
isolamento social é recomendado como forma de sobrevivência
da espécie humana frente à possibilidade de colapso dos
sistemas de saúde mundiais e tal medida extrema tem
inafastáveis e graves efeitos na economia, que já são sentidos
por todos. O caso em tratamento versa exatamente sobre a
questão, posto que pretende o requerente suspender e evitar
atos de cobrança do credor durante o período. Nesse momento
é fundamental que as partes envolvidas na relação contratual
rediscutam os seus termos, a fim de que seja resguardado o
equilíbrio contratual, em observância, inclusive, ao disposto no
artigo 422 do Código Civil, que estabelece que as partes
devem guardar a boa-fé tanto na conclusão quanto na
execução do contrato. A inobservância de tal comando pode
gerar demandas visando à revisão do contratual, mas é preciso
que se observe se há abuso da parte credora quanto à
negativa, em especial quando se trata de avaliar requerimento
de tutela sem sua oitiva. No caso em questão, a fim de
corroborar sua pretensão em sede de tutela cautelar, o

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requerente acostou o documento de fls. 24 e 25 no qual


comunicava ao requerido, seu credor, a suspensão dos
pagamentos, não havendo comprovação a respeito de eventual
negativa. Não houve debate entre as partes a respeito da
melhor maneira de conduzir as tratativas, mas mera
comunicação do devedor de que suspenderia os pagamentos,
o que aparentemente não foi aceito. Registre-se que se de um
lado o devedor está encontrando dificuldades para honrar suas
obrigações, de outro também está o credor que depende do
recebimento dos valores para saldar seus próprios
compromissos, de modo que não há como se prestigiar o
direito invocado pelo autor quando o do seu credor se afigura
legítimo. Não há demonstração de esgotamento de tratativas e
de eventual inobservância pelo credor do princípio da boa-fé na
execução do contrato, constatando-se que a recusa do credor
em aceitar as condições impostas pelo credor é legítima, na
medida em que também tem os seus compromissos a honrar.
Desse modo, não está comprovada nos autos a probabilidade
do direito invocado, razão pela qual indefiro a tutela requerida
em caráter antecedente. Intime-se o requerente na forma do
artigo 303, §6º, do Código de Processo Civil.”

Insurge-se o agravante contra a decisão aduzindo, em síntese, que em


virtude das consequências econômicas geradas pela pandemia do Coronavírus, faz-se
necessário o deferimento da tutela de urgência para que a parte ré se abstenha de
proceder qualquer ato de cobrança referente aos empréstimos contratados, bem como
seja compelida a cancelar o contrato de abertura de crédito vinculado à conta corrente
n.º 01313-1, agência 9287, no prazo de 48 horas.

Ausência de contrarrazões certificada em fl. 21.

É O RELATÓRIO

VOTO

Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu a


tutela de urgência requerida pelo ora agravante ao fundamento de que incomprovada a
probabilidade do direito alegado, aliado ao fato de que não demonstrado o
esgotamento das tentativas de acordo extrajudicial e de eventual inobservância, por
parte da instituição financeira ré, do princípio da boa-fé na execução do contrato.

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Assevera o agravante que, em virtude das consequências econômicas


advindas da pandemia do Coronavírus, não tem condições de pagar as próximas
parcelas dos contratos de empréstimo celebrados com a instituição financeira
agravada, sem que comprometa sua subsistência.

Sabe-se que a concessão da tutela de urgência pressupõe a demonstração


dos requisitos insertos no artigo 300 do Código de Processo Civil, quais sejam, a
probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

No caso, o autor, profissional autônomo (advogado), alegou possuir cinco


contratos de empréstimo com o Itaú Unibanco junto ao banco réu, os quais totalizavam,
a época em que aforou o procedimento de tutela antecipada antecedente, R$
59.806,56 (cinquenta e nove mil, oitocentos e seis reais e cinquenta e seis centavos)
somado à fatura em aberto do cartão de crédito no valor de R$ 4.905,82 (quatro mil,
novecentos e cinco reais e oitenta e dois centavos). Alega que, em virtude da queda
abrupta de seus rendimentos ocasionada pelo surto pandêmico, não será possível o
pagamento de tais débitos.

Não há dúvida de que a pandemia afetou ambos os contratantes e reflete


momento de excepcionalidade social e econômica e que a boa-fé, como verdadeira
regra de conduta, estabelecida no art. 422 do Código Civil, impõe aos contratantes o
dever de cooperar para que a relação não seja fonte de prejuízo ou decepção para
uma das partes.

De se ressaltar, ademais, que, a par da cooperação mútua e do dever de


lealdade negocial, há que se levar em consideração a teoria da imprevisão,
incorporada pelo art. 317 do diploma civil, que dispõe sobre a adequação das
prestações contratuais nos casos de acontecimentos imprevisíveis, que possam gerar
onerosidade excessiva a uma das partes.

Na mesma linha, o art. 478 do Código Civil possibilita a revisão de contratos


de execução continuada, na hipótese em que determinado evento imprevisível,
extraordinário e superveniente torna a prestação de uma das partes excessivamente
onerosa e da outra extremamente vantajosa.

Na espécie, não obstante a ocorrência de fato imprevisível, não se


vislumbra, ao menos em sede de cognição sumária, vantagem desmedida por parte da
instituição financeira agravada.

Por outro lado, justamente em decorrência da pandemia, os bancos têm


oferecido a seus clientes formas de renegociação de contratos.

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Na espécie, o ora agravante teria enviado notificação extrajudicial ao banco


Itaú exigindo a suspensão dos descontos e o cancelamento da abertura de crédito
vinculada a sua conta corrente, nos seguintes termos:

te

Não obstante, infere-se de tal notificação que o agravante não formulou


qualquer proposta de renegociação.

Conforme bem destacado pela decisão hostilizada, o agravante não trouxe


qualquer documento, ou mesmo mera alegação, que comprove ter tentado renegociar
os contratos de empréstimo antes de ingressar com o presente procedimento,
limitando-se a comunicar a impossibilidade de pagamento, além de exigir a interrupção
das cobranças.

Ademais, conforme por ele próprio informado, em 11/05/2020, a instituição


financeira apresentou proposta de revisão contratual, na qual ofereceu taxas de juros
reduzidos e novas datas de vencimento das parcelas, o que foi recusado (fls. 03/04 do
anexo).

Desse modo, em que pese o notório colapso econômico instaurado no país


em decorrência da crise sanitária enfrentada, não se mostra razoável, neste momento
processual, estender proteção excessiva ao devedor em detrimento do credor,
considerando que este último buscou solucionar a questão de maneira conveniente
para ambas as partes.

Assim, em se considerando a excepcionalidade do momento vivenciado e


tendo em vista que os contratos firmados pelo ora agravante foram pautados na
autonomia da vontade, não se evidencia a plausibilidade do direito invocado, requisito
imprescindível à concessão da medida pretendida, devendo ser mantida a decisão tal
qual lançada, tanto mais que, consoante entendimento consubstanciado no verbete
sumular nº 59, “somente se reforma a decisão concessiva ou não da antecipação de
tutela, se teratológica, contrária à Lei ou à evidente prova dos autos”.

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Ante o exposto, VOTO pelo DESPROVIMENTO DO RECURSO.

Rio de Janeiro, 07 de outubro de 2020.

Desembargadora MARIA LUIZA DE FREITAS CARVALHO


Relatora

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