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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE ARQUITETURA
FACULDADE DE BELAS-ARTES

MULHERES NO DESIGN GRÁFICO:


O Passado e o Presente – Uma análise comparada entre
Brasil e Portugal

Alice Dornelles Hetzel

Dissertação
Mestrado em Práticas Tipográficas e Editoriais Contemporâneas

Dissertação orientada pelo Prof. Doutor Jorge dos Reis

2016
II

DECLARAÇÃO DE AUTORIA

Eu, Alice Dornelles Hetzel, declaro que a presente dissertação de mestrado


intitulada “Mulheres no Design Gráfico: Passado e Presente”, é o resultado
da minha investigação pessoal e independente. O conteúdo é original e
todas as fontes consultadas estão devidamente mencionadas na bibliografia
ou outras listagens de fontes documentais, tal como todas as citações dire-
tas ou indiretas têm devida indicação ao longo do trabalho segundo as nor-
mas académicas.

O Candidato

Lisboa, 16 de Dezembro de 2016


III

Resumo

A presente dissertação, desenvolvida no âmbito do Mestrado em Práti-


cas Tipográficas e Editoriais Contemporâneas, tem como objeto de estudo as
mulheres no mercado do design gráfico, com foco no contexto de Portugal e
Brasil. Consiste no estudo da cronologia de inserção das mulheres neste âmbi-
to desde o início do Século XX, passando pela institucionalização do design a
nível mundial, na Bauhaus, e aspectos específicos da institucionalização da
profissão no Brasil e em Portugal, assim como uma análise crítica da situação
atual da profissão de designer gráfico: o que já foi conquistado, características
do contexto atual e os desafios para o futuro. Seu objetivo é compreender o
papel da mulher no desenvolvimento da profissão e sua situação atual no de-
sign gráfico no Brasil e em Portugal para que, ao final, seja possível propor
estratégias que permitam a evolução da profissão de forma mais igualitária.
Para que estes objetivos fossem alcançados com sucesso, a investigação foi
dividida em duas partes principais: a revisão da literatura – a fim de compreen-
der historicamente o papel da mulher nesta área e levantar dados sobre a
situação atual do mercado – e os inquéritos e entrevistas, que tiveram grande
importância na validação da investigação, na busca por informações mais es-
pecíficas de cada ambiente e em uma compreensão mais profunda das infor-
mações já coletadas nas primeira etapa. Na etapa de inquéritos foi consultado
um grupo de Brasileiras e Portuguesas, de distintas faixas etárias e formas de
trabalho – sócias de empresas próprias, funcionárias de grandes empresas,
profissionais autônomas, etc. – que responderam questões sobre o seu percur-
so acadêmico e profissional e suas percepções acerca das questões de gênero
neste meio. Espera-se que esta investigação contribua para um maior reco-
nhecimento e visibilidade das mulheres neste meio e uma compreensão mais
profunda do cenário no qual estão inseridas, para que, cada dia mais, o design
gráfico seja um ambiente de igualdade de gênero.

Palavras Chave: design gráfico; gênero; trabalho feminino; Brasil; Portugal.


IV

Abstract

The present dissertation, developed within the scope of the Master in


Contemporary Typographical and Editorial Practices, has as object of study the
women in the graphic design market, focusing on the context of Portugal and
Brazil. It consists of the study of the chronology of insertion of women in this
profession, since the beginning of the 20th Century, through the institutionaliza-
tion of the design world-wide, in the Bauhaus, and specific aspects of the insti-
tutionalization of the profession in Brazil and Portugal, as well as a critical
analysis of the current situation of the field: what has already been achieved,
the characteristics of the current market and the challenges for the future. Its
objective is to understand the role of women in the development of the profes-
sion and its current situation in graphic design in Brazil and Portugal so that, in
the end, it is possible to propose strategies that allow the evolution of the pro-
fession in a more egalitarian way. In order for these objectives to be successful-
ly achieved, the research was divided into two main parts: the literature review
– in pursuance of historically understand the role of women in this area and to
gather data on the current market situation – and the surveys and interviews,
which had great importance in the validation of the investigation, in the search
for more specific information of each environment and in a deeper understand-
ing of the information already collected in the first phase. In the survey stage, a
group of Brazilian and Portuguese designers were consulted, with different age
groups and work forms – partners of their own companies, employees of large
companies, autonomous professionals, etc. – who answered questions about
their academic and professional background and their perceptions about gen-
der issues in this environment. It is hoped that this research will contribute to a
greater recognition and visibility of women in this environment and a deeper
understanding of the setting in which they are inserted, so that, every day,
graphic design is a gender equality environment.

Key Words: graphic design; gender; female work; Brazil; Portugal.


V

Índice de Figuras

Figura 1. Oficina de composição da Copeland-Chatterson Company,


1905 ........................................................................................................... 21
Figura 2. Tapeçaria de Gunta Stölzl em cadeira. Co-criação com Marcel
Breuer, 1921. ............................................................................................. 26
Figura 3. Conjunto de café e chá projetado por Marianne Brandt,1924. .......... 28
Figura 4. Design de exposição de Lina Bo Bardi, 1957-68, MAM, São
Paulo.......................................................................................................... 30
Figura 5. Catálogos da 1ª e da 2ª Exposição de Design Português ................. 34
Figura 6. Imagem de divulgação dos convidados do DiaTipo São Paulo
2015 ........................................................................................................... 49
Figura 7. Imagem de divulgação dos oradores do 7º Encontro de
Tipografia (2016) ....................................................................................... 50
Figura 8. Verbete “List of graphic designers” na Wikipedia, 2016 .................... 53
VI

Índice de Gráficos

Gráfico 1. Representação de gênero em recentes conferências de


tipografia. ................................................................................................... 47
Gráfico 2. Respostas a “As figuras de destaque apresentadas em aula
foram...”. .................................................................................................... 76
Gráfico 3. Respostas a “Seus chefes foram...”. ................................................ 78
VII

Índice de Tabelas

Tabela 1: Questões Básicas da Entrevista ....................................................... 70


Tabela 2: Questões Específicas da Entrevista ................................................. 71
Tabela 3: Participantes dos Inquéritos.............................................................. 73
VIII

Índice Geral

Introdução ......................................................................................................... 1
Âmbito e Propósito ......................................................................................... 1
Metodologia .................................................................................................... 3
Estado da Arte ................................................................................................ 4
Quadro Conceptual......................................................................................... 5
Estrutura da dissertação ................................................................................. 6

Capítulo 1 - Gênero ...................................................................................... 8


As Diversas Interpretações do Conceito de Gênero ...................................... 9
Doing Gender ............................................................................................... 13

Capítulo 2 - A Mulher e o Design Gráfico: Revisão Histórica ................ 18


O Papel da Mulher no Desenvolvimento do Design como
Profissão no Início do Século XX ................................................................. 18
A Consolidação da Profissão no Século XX: As Mulheres na
Bauhaus........................................................................................................ 23
A Institucionalização do Design no Brasil e em Portugal ............................. 29

Capítulo 3 - Análise do Cenário Atual ...................................................... 37


As Conquistas............................................................................................... 37
Reflexões para o Presente e para o Futuro.................................................. 45
Considerações para a Fase Seguinte .......................................................... 65

Capítulo 4 - Inquéritos e Entrevistas ........................................................ 67


Seleção de Participantes .............................................................................. 67
Inquérito Inicial – Triagem ............................................................................ 68
Inquérito Principal ......................................................................................... 68
Entrevistas .................................................................................................... 70

Capítulo 5 - Resultados e Discussões ..................................................... 72


IX

A Amostra ..................................................................................................... 72
Padrões Verificados nos Inquéritos .............................................................. 74
Análise do Processo, dos Resultados e Inferências..................................... 79
Estratégias Propostas................................................................................... 80

Conclusão ........................................................................................................ 84

Referências Bibliográficas ............................................................................. 86


1

Introdução

For the study of women and men in graphic design, remaining cognizant of the
double truth that women and men in graphic design are the same and that
women and men in graphic design are different will result in a more inclusive
understanding of past and contemporary graphic design production.

—Martha Scotford, Messy History vs. Neat History:


Toward a expanded view of women in graphic design, 2012

Âmbito e Propósito

O mercado de trabalho nem sempre foi um espaço aberto às mulheres.


A sua ocupação foi – e ainda é – um processo longo de reconhecimento e
apropriação dos seus direitos. Hoje, porém, pode-se afirmar que a situação da
mulher no mercado de trabalho já atingiu um patamar inimaginável há 50 anos.
O mercado criativo pode ser considerado um dos mais abertos às mu-
lheres na atualidade. Breuer e Meer (2012), analisam de forma otimista o con-
texto atual de inserção das mulheres neste âmbito, no qual, em sua opinião, as
mulheres já conquistaram um espaço relevante. Esta análise pode ser compro-
vada estatisticamente. Na Alemanha, segundo as autoras, a percentagem de
mulheres autônomas no mercado criativo em 2008 era entre 40 e 44%, muito
acima da média do país para o mercado de trabalho em geral, de 7%. No con-
texto Brasileiro os números também são favoráveis. Segundo a ADG Brasil
(Associação dos Designers Gráficos), em 2012 40% dos seus associados eram
mulheres, enquanto 60% eram homens. Entre os mais jovens, a proporção era
ainda mais equilibrada – 46% de mulheres e 54% de homens. Nos Estados
Unidos, em 2015, a AIGA (American Institute of Graphic Design) registrou que
55% dos seu membros eram mulheres. (Hagmann, 2005).
Os desafios, porém, ainda existem. Breuer e Meer ressaltam a ambiva-
lência entre a participação em um mercado que exige dedicação integral e o
equilíbrio entre a vida pessoal e familiar e a questão da visibilidade neste meio,
no qual “[...] as estrelas da cena do design são predominantemente homens”
2

(2012, p. 42)1. As autoras aponta, também, o fato de que, atualmente, as de-


signers dão a impressão de que ser associada ao feminismo seria um tabu, por
desviar a atenção da qualidade dos seus trabalhos. Stavro, porém, argumenta:

Even if women have been garnering attention in spheres of activities hitherto


the exclusive preserve of men, gender inequalities still exist in graphic design
as much as in other professional fields. It seems that our collective willingness
to ‘move on’ (ie. demystify the gender issue once an for all) is as strong as our
pressing need to advancing solutions to the problem on a daily basis. (2012,
p. 361)

Conscientes da evolução recente do mercado de trabalho e atentando,


neste momento, a questões mais específicas que a sua abertura a profissionais
mulheres, propõe-se a abordagem de temas mais atuais como a visibilidade
feminina no mercado e na história do design e a persistência de papéis de
gênero tradicionais contraposta à evolução na inserção feminina nos ambientes
de trabalho.
Conhecer aquelas que obtiveram êxito em suas áreas de atuação, des-
cobrir as dificuldades pelas quais passaram e o que fizeram para superá-las,
sua visão do mercado e opiniões sobre o que é preciso ser feito no futuro será
o ponto de partida para a proposição de estratégias para a redução das desi-
gualdades que ainda existem.

1
Tradução nossa. No original: “[…] the stars of the design scene are predominantly male.”
2
“[...] o sistema sexo/gênero é um conjunto de arranjos através dos quais uma sociedade transforma a
sexualidade biológica em produtos da atividade humana, e na qual estas necessidades sexuais
transformadas são satisfeitas.” (Tradução nossa.)
3
A corrente filosófica pós-estruturalista tem como principais características a desconstrução, a negação
3

Objetivos

Geral
• Elaborar um panorama completo sobre a participação feminina do
mercado do design gráfico no Brasil e em Portugal, identificando
dificuldades e desenvolvendo estratégias para sua solução.

Específicos
• Compreender os aspectos históricos da inserção das mulheres no
mercado do design gráfico tanto em contexto mundial quanto no
âmbito específico de Brasil e Portugal;
• Conhecer a situação atual as mulheres no mercado do design
gráfico, em contexto geral e específico (Brasil e Portugal);
• Identificar as principais dificuldades encontradas pelas designers
durante sua trajetória acadêmica e profissional;
• Formular estratégias para dirimir estas dificuldades.

Metodologia

Foi utilizada metodologia não-intervencionista de pesquisa, com base


qualitativa. Os métodos de pesquisa utilizados foram a revisão da literatura e a
pesquisa por inquéritos e entrevistas.
A partir da revisão da literatura foi desenvolvida uma análise crítica do
estado da arte, contrapondo informações das diversas áreas do conhecimento,
a fim de desenvolver as hipóteses a serem validadas nas etapa seguinte – de
inquéritos e entrevistas. Os inquéritos e entrevistas foram analisados de forma
qualitativa e seus resultados comparados às inferências feitas ao final da fase
anterior, de maneira a responder as perguntas de investigação e validar as
hipóteses.
4

Estado da Arte

O estudo das Mulheres no design gráfico vem sendo abordado, sob di-
versos pontos de vistas, por diversas autoras – tanto designers quanto pesqui-
sadoras das ciências humanas e sociais. Na Alemanha, Gerda Breuer e Julia
Meer desenvolveram um extenso trabalho de investigação sobre o tema, o que
resultou no livro Women in Graphic Design 1890-2012, uma das principais
referências bibliográficas deste trabalho. A publicação contém textos e entre-
vistas de designers gráficas de todo o mundo, como Ellen Lupton, Astrid Stavro
e Martha Scotford, que abordam desde aspectos históricos da inserção das
mulheres na profissão até discussões sobre a situação atual. O livro também
conta com uma série de biografias curtas de designers que trabalharam duran-
te todo o período compreendido pela investigação.
O estudo histórico das mulheres no design gráfico é extenso. Autoras
como Martha Scotford e Cheryl Buckley têm sua produção científica voltada a
este tema. Scotford contribui com dois artigos em Women in Graphic Design
1890-2012, enfatizando os processos historiográficos que causaram a sub-
representação das mulheres na história do design gráfico. As Espanholas Ro-
salía Torrent e Marisa Vadillo, entre outras, são autoras de diversas publica-
ções sobre as mulheres na Bauhaus, etapa importante da história do design, e
analisam as relações de gênero que ocorreram na referida escola e seu impac-
to no desenvolvimento da profissão.
No campo sociológico, estudos qualitativos e quantitativos vem sendo
conduzidos sobre a inserção da mulher no mercado de trabalho e as relações
de gênero neste âmbito. Este tema também é abordado sob os pontos de vista
de direitos trabalhistas, de economia e de administração de empresas. Grande
parte dos estudos tem como objeto de estudo a conciliação da vida familiar e
profissional na conjuntura atual de inserção feminina no mercado de trabalho,
aspecto importante analisado neste trabalho.
5

Percebe-se que há abundante produção científica nos distintos tópicos


que sustentam esta investigação, o que propicia um cenário favorável para o
desenvolvimento mais aprofundado destes conteúdos, com foco no contexto
específico de Brasil e Portugal.

Modelo Teórico

Para o estudo dos conceitos de gênero foram consultadas as principais


autoras sobre o tema. A antropóloga Gayle Rubin, autora de um dos principais
textos sobre gênero, The Traffic in Women: Notes on the 'Political Economy' of
Sex (1975), a primeira a utilizar o conceito de sistema sexo/gênero; A historia-
dora Joan Scott, que aborda o gênero como ferramenta analítica em seu artigo
“Gender: A Useful Category of Historical Analysis”, publicado em 1986; Judith
Butler, uma das principais teóricas de gênero da atualidade, cujo trabalho re-
sulta na criação da teoria queer, essencial para uma análise interseccional de
gênero, e Candace West e Don Zimmerman, criadores do conceito de doing
gender, muito utilizado na análise de relações de gênero em ambientes de
trabalho.
No âmbito da inserção feminina na profissão de design gráfico, a pes-
quisadora feminista Cynthia Cockburn é referência na análise do período inicial
deste processo – o trabalho feminino nas imprensas no início do Século XX. Os
estudos das pesquisadoras Espanholas Rosalía Torrent e Marisa Vadillo con-
tribuíram para o entendimento da situação das mulheres na Bauhaus. Marcos
Braga e Rafael Cardoso são os principais autores consultados no contexto da
consolidação da profissão no Brasil, assim como Victor Almeida para o mesmo
período em Portugal.
O livro Women in Graphic Design 1890-2012, organizado por Gerda
Breuer e Julia Meer, é a principal publicação consultada para o desenvolvimen-
to desta investigação, por conter textos de diversas autoras sobre os mais
variados contextos da situação da mulher na produção. As principais autoras
6

colaboradoras desta dissertação são Martha Scotford, Astrid Stavro e Ellen


Lupton.

Quadro Conceptual

História do Design
- Como se desenvolveu
- Como é contada

Inserção da Mulher
no Mercado de Ensino do Design
Trabalho GÊNERO (Desenvolvimento
das profissionais)
(Contexto histórico)

Relações de Trabalho
- Oportunidades profissionais
- Visibilidade
- Evolução da carreira

Estrutura da dissertação

Esta investigação está dividida em seis Capítulos. A revisão da literatu-


ra divide-se nos Capítulos 1, 2 e 3. Mais especificamente, no Capítulo 1 trata-
remos do conceito de gênero sob a ótica das principais pesquisadoras do tema
nos Séculos XX e XXI e a teoria doing gender, de West & Zimmerman (1987),
de extrema importância para a análise das relações de gênero. No Capítulo 2
abordaremos a participação feminina na história do design gráfico, desde o
surgimento da profissão no início do Século XX, passando pela Escola da Bau-
7

haus – símbolo da consolidação do design a nível mundial, até a institucionali-


zação da profissão no Brasil e em Portugal, na segunda metade do século XX.
O Capítulo 3 compreende diversos pontos de vista sobre a situação atual das
mulheres no mercado do design gráfico, tanto no contexto global quanto espe-
cificamente no Brasil e em Portugal.
Na fase de pesquisa, o Capítulo 4 engloba os Inquéritos e Entrevistas,
descrevendo o processo de seleção das participantes e o desenvolvimento dos
inquéritos e dos roteiros de entrevistas. O Capítulo 5 é composto pela análise
dos dados obtidos e seu cruzamento com as informações obtidas por meio da
revisão da literatura, descrição dos padrões verificados, dos questionamentos
originados desta análise e das estratégias propostas.
8

Capítulo 1 - Gênero

São dois os conceitos principais a serem estudados nesta investigação:


o gênero – a fim de explicitar do quê se fala quando se diz “mulher” – e o mer-
cado do design. O primeiro conceito será abordado neste capítulo a partir das
principais teorias antropológicas, psicológicas e sociais de gênero. O segundo,
no Capítulo 2 - , através da análise histórica do surgimento do design como
profissão e da inserção da mulher neste contexto.
O termo gênero passou a ser emprestado da gramática (do inglês gen-
der) no início da segunda metade do Século XX por autores e autoras de lín-
gua inglesa. Porém foram psicólogos norte-americanos dos anos sessenta que
sistematizaram a utilização funcionalista do termo a fim de, no processo de
tratamento de seus pacientes, distinguir sua identidade da sua sexualidade – a
hoje chamada identidade de gênero – criando, desta forma, uma denominação
ao fenômeno de construção cultural e social do ser homem ou ser mulher (Car-
valho, 2011).
Hoje, o gênero tem imensurável importância nos estudos das relações
sociais humanas e nas discussões feministas. Como consequência, são diver-
sos os autores e autoras que o estudam, conceituam e, em algumas ocasiões,
tentam defini-lo – cada um utilizando seus referenciais e pontos de vista. Uma
definição única de gênero, portanto, seria impossível de ser criada.
Por este motivo, e visando a construir uma visão completa sobre o te-
ma que irá basear esta investigação, neste capítulo estudaremos as aborda-
gens aos conceitos de gênero das seguintes pesquisadoras dos séculos XX e
XXI: Gayle Rubin, Joan Scott e Judith Butler. Finalizaremos esta seção com a
análise de Linda Nicholson e suas sugestões em relação a melhor abordagem
do termo mulher do ponto de vista das discussões feministas. Ainda neste
capítulo, introduziremos a teoria de doing gender, de Candace West e Don
Zimmerman e sua aplicabilidade em ambientes de trabalho.
9

As Diversas Interpretações do Conceito de Gênero

Uma das pioneiras no uso do termo gênero em discussões feministas


foi a antropóloga Gayle Rubin. Com o objetivo principal de desnaturalizar as
desigualdades de gênero, Rubin procurou entender sua origem, ou seja, a
relações que transformam fêmea (sexo) em uma mulher oprimida e domestica-
da (gênero), para, então tentar revertê-las. Para isto, focou-se nos principais
teóricos da antropologia e da psicanálise, como Claude Lévi-Strauss, Sigmund
Freud e Jacques Lacan.
É em sua primeira publicação, The Traffic in Women – Notes of the
‘Political Economy’ of Sex (1975), que se discute o sistema sexo/gênero, no
qual, em explicação breve, considera-se o gênero um produto da matéria-prima
sexo, ou seja:

a “sex/gender system” is the set of arrangements by which a society trans-


forms biological sexuality into products of human activity, and in which these
transformed sexual needs are satisfied. (Rubin, 1975, p.159)2

A abordagem proposta por Rubin – cuja ideia principal foi mantida pe-
las principais teóricas de gênero até os anos 80 – é o que Linda Nicholson
(2000), autora de Interpretando o Gênero, denomina fundacionalismo biológico.
Diferente (porém não oposto) ao determinismo biológico, “o fundacionalismo
biológico permite que os dados da biologia coexistam com os aspectos de
personalidade e comportamento” (Nicholson, 2000, p.12).
Esta concepção permitiu a compreensão de gênero como um organis-
mo mutável, dependente da cultura e da história humana e, portanto, pauta

2
“[...] o sistema sexo/gênero é um conjunto de arranjos através dos quais uma sociedade transforma a
sexualidade biológica em produtos da atividade humana, e na qual estas necessidades sexuais
transformadas são satisfeitas.” (Tradução nossa.)
10

importante das lutas feministas. O aspecto biológico, porém, seguiu tendo


grande importância nas discussões, visto que este conceito – o do sistema
sexo/gênero – pressupõe uma base natural (o sexo) sobre a qual os significa-
dos culturais são constituídos (Nicholson, 2000).
Ainda nos anos 80, outra contribuição importante para os estudos de
gênero foi feita pela historiadora Joan Scott. Em artigo intitulado “Gender: A
Useful Category of Historical Analysis”, publicado em 1986 na revista The Ame-
rican Historical Review e posteriormente, em 1988, incluído no livro de sua
autoria Gender and the Politics of History, a historiadora aborda, sob uma
perspectiva pós-estruturalista3, o gênero como ferramenta analítica. Partindo
de uma crítica à utilização descritiva do gênero – apenas como forma de dife-
renciação e sem pretensão de explicar ou interpretar os fenômenos e realida-
des das relações de gênero – Scott introduz uma nova perspectiva à dualidade
sexo versus gênero, a qual explica mais objetivamente no prefácio da publica-
ção de 1988:

[...] gênero é a organização social da diferença sexual. O que não significa


que gênero reflita ou implemente diferenças físicas fixas e naturais entre ho-
mens e mulheres mas sim que gênero é o saber que estabelece significados
para as diferenças corporais. (1994, p.13)

Scott acrescenta, ainda, que o gênero é um modo primeiro de significar


as relações de poder (1986, pp.1072-1073). Com esta abordagem, a autora
nega o status invariável do corpo, atrelando-o a uma interpretação cultural – e,
consequentemente, de poder – visto que, em sua visão, não é possível com-

3
A corrente filosófica pós-estruturalista tem como principais características a desconstrução, a negação
de conceitos fixos e verdades absolutas e a análise histórica em detrimento à descritiva. Seus principais
representantes são Michel Foucault, Jacques Derrida, Gilles Deleuze e Jean-François Lyotard.
11

preender o corpo fora da cultura. Assim, homem e mulher deixam de ser cate-
gorias fixas e transformam-se em perguntas.
Um rompimento significativo com as teorias de Rubin e Scott origina-se
da abordagem de Judith Butler. A filósofa pós-estruturalista Estadunidense é
atualmente considerada uma das principais teóricas do feminismo e da teoria
queer. Sua principal obra, Gender Trouble: Feminism and the Subversion of
Identity (1990), busca compreender a possibilidade de se questionar, além do
gênero, também o sexo – até o momento considerado uma estrutura fixa e
isenta de questionamentos – em função da sua materialidade, demonstrando
alguma similaridade com a teoria de Joan Scott, porém rompendo com o con-
ceito binário de sexo/gênero.
A teoria de gênero de Judith Butler é centrada na ideia de performativi-
dade. O termo, muito presente em suas publicações, se refere ao ato imposto
de repetir normas de gênero, reiterando-as com o tempo, a fim de cumprir a
coerência de sexo/gênero/desejo, obrigatoriamente heterossexual. Nas pala-
vras da autora,

gender is the repeated stylization of the body, a set of repeated acts within a
highly rigid regulatory frame that congeal over time to produce the appearance
of substance, of a natural sort of being. (Butler, 1990, p.33)4.

Butler procura dissolver a teoria sexo x gênero e desmontar a obrigatoriedade


entre sexo, gênero e desejo, denunciando a existência de uma ordem compul-
sória que desumaniza aqueles que não se encaixam nas oposições binárias
impostas (homem/mulher, macho/fêmea, etc.), marginalizando-os na socieda-

4
Na versão em Português (BUTLER, 2008, p.59): “Gênero é a estilização repetida do corpo, um conjunto
de atos repetidos no interior de uma estrutura reguladora altamente rígida, a qual se cristaliza no tempo
para produzir a aparência de uma substância, de uma classe natural de ser.”
12

de. Ao romper com as teorias anteriores baseadas no sistema sexo/gênero,


Butler afirma:

As a result, gender is not to culture as sex is to nature; gender is also the dis-
cursive/cultural means by which “sexed nature” or “a natural sex” is produced
and established as “prediscursive”, prior to culture, a politically neutral surface
on which culture acts. (1990, p.7)5

A teoria queer, por romper com os conceitos binários e heteronormati-


vos de gênero previamente estabelecidos, torna-se importante na inclusão de
transgêneros e pessoas não-binárias nas discussões de gênero, indivíduos
estes que não eram considerados pelas teorias baseadas no sistema se-
xo/gênero.
Nicholson faz uma análise crítica destas diferentes interpretações do
gênero, finalizando com uma proposta. A principal crítica feita pela autora às
teorias de gênero fundamentadas no que ela chama de fundacionalismo bioló-
gico é a sua impossibilidade em explicar a historicidade dos seus próprios
insights, nem considerar as possíveis falhas do sistema que os produziu. Em-
bora a autora afirme que há verdades nas afirmações da teoria, considerando o
fato de que a maioria das culturas tem interpretações binárias similares do
sexo, considera que

um problema que se manifesta nas teorias anteriores, citadas por tantos co-
mentaristas, é que “um feminismo da diferença” tende a ser “um feminismo da
uniformidade”. Dizer que “as mulheres são diferentes dos homens desse ou
daquele jeito” é dizer que as mulheres são “desse ou daquele jeito”. (2000,
p.28)

5
“(...) gênero não está para cultura assim como sexo está para natureza; gênero também são os meios
discursivos/culturais pelos quais a “natureza sexuada” ou o “sexo natural” é produzido e estabelecido
como “pré-discursivo”, anterior à cultura, uma superfície politicamente neutra na qual a cultura age.”
(Tradução nossa.)
13

O desafio criado por esta concepção – e pelo rompimento completo


com o determinismo biológico – está na necessidade imposta de uma definição
clara da palavra mulher. Para justificar sua ideia de que esta definição não é
necessária, Nicholson (2000) cita Wittgenstein (1953) e seu exemplo da pala-
vra “jogo”:

Se você examiná-los [os procedimentos que chamamos de “jogos”] você não


vai ver alguma coisa comum a todos, mas semelhanças, relações e toda uma
série de correspondências. (...) Veja, por exemplo, os jogos de tabuleiros,
com suas inúmeras e diversas relações possíveis. Agora passe para os jogos
de cartas: aqui você encontra muitas correspondências com o primeiro grupo,
mas muitos aspectos comuns se perdem, e outros aparecem. Quando vamos
aos jogos com bola, muito do que é comum permanece, mas muito também
se perde. (...) E o resultado desses exames é: vemos uma complicada rede
de similaridades se sobrepondo e se cruzando; às vezes similaridades glo-
bais, às vezes no detalhe. (pp.34-35)

A partir deste exemplo, a autora sugere que a mesma interpretação seja feita
para o sentido de “mulheres”: através da elaboração de uma rede de caracte-
rísticas, e não pela busca de uma ou mais características comuns a todas. O
corpo, neste caso, não desaparece, mas se torna uma variável dependente do
contexto histórico no qual é analisado.

Doing Gender

Doing gender, ou o fazer do gênero6 é uma teoria utilizada principal-


mente em estudos sociológicos de gênero. Criada por Candace West e Don

6
A expressão fazer do gênero, será utilizada nos parágrafos seguintes como substituta de doing gender,
de forma a simplificar a leitura e o entendimento do conteúdo.
14

Zimmerman no final dos anos 70, mas publicada somente em 1987, parte da
definição de três importantes conceitos: sexo, categorias de sexo (ou categori-
as sexuais) e gênero:

Sex is a determination made through the application of socially agreed upon


biological criteria for classifying persons as females or males.' The criteria for
classification can be genitalia at birth or chromosomal typing before birth, and
they do not necessarily agree with one another. Placement in a sex category
is achieved through application of the sex criteria, but in everyday life, catego-
rization is established and sustained by the socially required identificatory dis-
plays that proclaim one's membership in one or the other category. In this
sense, one's sex category presumes one's sex and stands as proxy for it in
many situations, but sex and sex category can vary independently; that is, it is
possible to claim membership in a sex category even when the sex criteria are
lacking. Gender, in contrast, is the activity of managing situated conduct in
light of normative conceptions of attitudes and activities appropriate for one's
sex category. Gender activities emerge from and bolster claims to member-
ship in a sex category.7 (West & Zimmerman, 1987, p.127)

A teoria baseia-se na afirmação de que o gênero é constituído através


da interação. Para isto, West e Zimmerman (1987) buscam a definição de gen-
der display (ou exibição de gênero), formulada por Goffman no final da década

7
“O sexo é uma determinação feita através da aplicação de critérios biológicos socialmente acordados
para classificar as pessoas como fêmeas ou machos. Os critérios de classificação podem ser genitais no
nascimento ou tipagem cromossômica antes do nascimento, e eles não necessariamente concordam um
com o outro. A colocação em uma categoria de sexo é conseguida através da aplicação dos critérios de
sexo, mas na vida cotidiana, a categorização é estabelecida e sustentada pelas exposições
identificatórias socialmente necessárias que proclamam a adesão a uma ou outra categoria. Nesse
sentido, a categoria de sexo de alguém presume o sexo de alguém e se posiciona como proxy para ele
em muitas situações, mas categoria de sexo e sexo podem variar independentemente; Ou seja, é
possível reivindicar a adesão a uma categoria de sexo, mesmo quando faltam critérios de sexo. O gênero,
em contraste, é a atividade de gestão de condições situadas à luz de concepções normativas de atitudes
e atividades apropriadas para a categoria de sexo. As atividades de gênero surgem e reforçam as
reivindicações de pertencimento a uma categoria de sexo.” (Tradução nossa.)
15

de 1970, que a descreve como a representação convencionalizada dos gêne-


ros. Para Goffman (1976), citado por West e Zimmerman (1987), esta expres-
são é opcional, ou seja, apesar de existir uma convenção social de como deve
ser a expressão de cada gênero, os indivíduos podem escolher como querem
expressar-se durante suas interações. Estas escolhas, porém, têm consequên-
cias, principalmente se vão de encontro às convenções sociais.
Os autores, enfim, definem o conceito de doing gender como:

Doing gender means creating differences between girls and boys and women
and men, differences that are not natural, essential, or biological. Once the dif-
ferences have been constructed, they are used to reinforce the "essential-
ness" of gender. (West & Zimmerman, 1987, p.137)

Um dos exemplos dados é o caso da segregação por gênero das casas


de banho nos Estados Unidos (e aparentemente em todo o mundo ocidental).
Separadas entre ladies e gentlemens, possuem diferenças de mobiliário como
a existência de mictórios para os homens e instalações de higiene mais confor-
táveis para mulheres, embora se saiba que, na prática, ambos alcançam os
mesmos fins – o alívio das necessidades fisiológicas – pelos mesmos meios
(vide a não existência desta segregação em ambientes de habitação familiar).
Segundo as autoras, Goffman afirma que esta segregação não é consequência
natural da diferença entre os sexos, e sim uma maneira de validar esta diferen-
ça. (West & Zimmerman, 1987)
A divisão do trabalho por gênero é uma das principais maneiras pelas
quais o fazer do gênero pode ser percebido. A maneira como as tarefas do-
mésticas, por exemplo, são executadas predominantemente por mulheres na
grande maioria dos lares, expõe o papel convencionalizado de homem e mu-
lher, ou de marido e esposa.

It is not simply that household labor is designated as "women's work," but that
for a woman to engage in it and a man not to engage in it is to draw on and
exhibit the "essential nature" of each. What is produced and reproduced is not
merely the activity and artifact of domestic life, but the material embodiment of
16

wifely and husbandly roles, and derivatively, of womanly and manly conduct.
(West & Zimmerman, 1987, p.144)8

Além do ambiente social e familiar, outro ambiente em que o fazer do


gênero tem especial influência é no ambiente de trabalho. A existência das
divisões de trabalho baseadas no gênero podem ser facilmente percebidas
quando precisamos utilizar um indicador de gênero ao se referir a uma profis-
são, como por exemplo enfermeiro homem ou médica mulher. Os indicadores
estão presentes para indicar que aqueles indivíduos são exceções à suposta
regra. (West & Zimmerman, 1987)
No decorrer desta investigação, teremos em consideração as seguintes
questões, levantadas pelos pesquisadores previamente citados:
• As categorias de sexo, apesar de terem ligação com as
manifestações biológicas de sexo, não são necessariamente
determinadas por estas;
• O fazer do gênero é produto de práticas diárias sociais e de
comportamentos que codificam e manifestam feminilidade ou
masculinidade e, por estarem diretamente relacionados à interação
humana, não é possível evitar fazê-lo;
• O gênero – assim como seus papéis – como construções sociais,
são passíveis de mudanças advindas de alterações culturais e
comportamentais;
• Não há características comuns a todas as mulheres e, por isto, sua
caracterização deve ser concebida através de redes de

8
“Não é simplesmente que o trabalho doméstico é designado como ‘trabalho das mulheres’, mas que
para uma mulher se engajar nele e um homem não se envolver nela é atrair e exibir a ‘natureza essencial’
de cada um. O que é produzido e reproduzido não é meramente a atividade e o artefato da vida
doméstica, mas a encarnação material dos papéis de esposa e de marido e, consequentemente, da
conduta feminina e masculina” (Tradução nossa.)
17

características, e não pela busca de um ou mais trato comum a


todas.
18

Capítulo 2 - A Mulher e o Design Gráfico: Revisão Histórica

Neste capítulo faremos um recorrido histórico pelo desenvolvimento da


profissão de designer, com foco no papel da mulher neste percurso. Neste
momento, será tratado do design como um todo – tanto gráfico quanto industri-
al – visto que é de extrema importância, para analisar o cenário atual do design
gráfico, compreender a sua gênese e a sua relação com as outras áreas de
criação. Não há pretensão de discorrer sobre a história do design em um con-
texto amplo, e sim atentar aos pormenores que incluem a participação feminina
neste processo.
Falaremos sobre o papel da mulher no início do Século XX, período do
desenvolvimento inicial da profissão. Passaremos pela consolidação da profis-
são, com foco na escola da Bauhaus. Finalizaremos com uma análise mais
específica da institucionalização do design em Portugal e no Brasil, na segunda
metade do Século XX.

O Papel da Mulher no Desenvolvimento do Design como Profissão no


Início do Século XX

A comunicação visual, em seu sentido mais amplo, tem uma longa história.
Quando o homem primitivo, ao sair à caça, distinguia na lama a pegada de
um animal, o que ele via ali era um sinal gráfico. (Hollis, 2001, p.1)

O ser humano, desde a época primitiva, utiliza-se de mecanismos de


comunicação visual. Dos sinais gráficos encontrados em cavernas às primeiras
edições impressas, as ferramentas de comunicação desenvolvidas pelo ser
humano permitiram que, hoje, a história da civilização seja contada, produtos
sejam vendidos e a comunicação seja eficaz.
A sistematização desta comunicação, seu uso comercial e, finalmente,
o surgimento da profissão de designer gráfico, porém, são muito mais recentes.
No final do Século XIX, o desenvolvimento da impressão litográfica e o envol-
vimento cada vez maior dos chamados artistas comerciais na produção de
19

cartazes, catálogos, livros e periódicos foi o ponto de partida para o desenvol-


vimento do design gráfico.

Quando os artistas, em vez de utilizar caracteres tipográficos, desenhavam


eles mesmos as letras dos textos, e quando se responsabilizavam por cada
elemento no design que deveria ser reproduzido pela máquina, estavam pra-
ticando aquilo que mais tarde ficou conhecido como design gráfico. (Hollis,
2001, p.11)

Ainda que estas mudanças nos métodos de produção e na abordagem


da comunicação gráfica marquem o início de uma nova era, é unanimidade
entre os principais historiadores do design que é o início do Século XX que
marca o surgimento da profissão de designer como conhecemos hoje, como
afirma Hollis:

O design gráfico, como profissão, só passou a existir a partir de meados dos


século XX; até então, os anunciantes e seus agentes utilizavam os serviços
oferecidos pelos “artistas comerciais”. (2001, p. 2)

Em comum entre as principais publicações sobre história do design


gráfico, além do consenso entre a época do surgimento da profissão, é a falta
de informação sobre o papel das mulheres neste período. Dos nomes citados
como figuras principais, senão todos, a grande maioria são homens. Quando
citadas, mulheres acompanham os nomes de seus maridos ou mestres, com
papel coadjuvante. Para obter informações mais precisas sobre o que estariam
fazendo as mulheres naquela época, é necessário recorrer a publicações mais
específicas, que se ocuparam de contar a história do design com foco na parti-
cipação feminina.

As Mulheres na Impressão. Ellen Thomson (1994) busca explicar a


ausência das mulheres nos livros que contam a história do design pela ênfase
dada pelos historiadores à história da impressão. Segundo a autora, além de
remover o design de seu contexto cultural, excluiu as mulheres da história,
20

visto que as imprensas, consideradas pelos historiadores do design como o


“embrião” do design gráfico, não eram um espaço aberto às mulheres.
Cockburn analisa a divisão sexista do trabalho na impressão sob um
ponto de vista relacional entre o capital e o poder político-social masculino.
Segundo a autora, o argumento para a exclusão das mulheres daquele meio
de que “meninas não eram fortes o suficiente, o chumbo [material utilizado nos
tipos móveis] era prejudicial à gravidez, o ambiente social poderia ser desmora-
lizador” (1981, p. 46)9 era uma forma de garantir o espaço aos trabalhadores
que dependiam daqueles empregos e que buscavam, de todas as formas,
controlar o número de trabalhadores no mercado, a fim de manter seu poder de
barganha de salários. O argumento da força física, principal motivo pelo qual
se defendia a exclusão das mulheres daquele mercado, prova-se falacioso
considerando que:
• Muitos homens naquela profissão, principalmente os mais velhos,
tinham dificuldades com o esforço físico de carregar matrizes, tanto
que mão de obra menos qualificada era frequentemente contratada
para fazer este tipo de serviço;
• Após 1859 foram abertas diversas imprensas por entidades
filantrópicas feministas, nas quais mulheres puderam provar sua
capacidade – ainda que contando com a mesma ajuda menos
qualificada para o levantamento e carregamento de pesos.
(Cockburn 1981)
Ainda de acordo com a autora, a associação entre a capacidade física, o aces-
so aos ambientes de prática e aprendizado, e o poder político masculino permi-
tiu que o mercado da impressão fosse, por muito tempo, ambiente ao qual
mulheres tinham acesso restrito. Entre 1909 e 1910, por exemplo, uma campa-

9
Tradução nossa.
21

nha organizada pela união entre compositores artesanais e os trabalhadores


não-qualificados da imprensa conseguiu um acordo para banir mulheres do
acesso aos postos de aprendiz e naturalmente reduzir o número de mulheres
compositoras e operadoras. (Cockburn, 1981)

Figura 1. Oficina de composição da Copeland-Chatterson Company, 1905


Fonte: Copeland-Chatterson Company, loose-leaf systems factory composing room, Brampton,
Ontario ca. 1905. (2016). Flickr. Acesso em 1 de Novembro de 2016, disponível em:
https://www.flickr.com/photos/43021516@N06/4210654981

Durante o desenvolvimento da impressão, avalia Cockburn (1981), os


avanços tecnológicos, que poderiam reduzir as desigualdades ao eliminar
barreiras físicas, mantiveram o status-quo, reforçando o poder masculino, não
22

somente político quanto econômico e tecnológico, visto que os responsáveis


pelo design do maquinário eram predominantemente homens.

Thus the appropriation of bodily effectivity on the one hand and the design of
machinery and processes on the other have often converged in such a way as
to constitute men as capable and women as inadequate. Like other physical
differences, gender differences in average bodily strength is not illusory, it is
real. It does not necessarily matter, but it can be made to matter. Its manipula-
tion is socio-political power play. (Cockburn, 1981, p.51)

De acordo com Hagmann (2005), enquanto as oficinas de impressão


abrigavam praticamente somente homens, outros ambientes eram destinados
às mulheres. Não coincidentemente, eram aqueles mais ligados às artes deco-
rativas e manuais, como a cerâmica, a caligrafia e oficinas têxteis.
Hoje, pode-se observar que houve não somente uma divisão de gênero
baseada no estereótipo do feminino e do masculino, mas também uma abertu-
ra controlada, com o objetivo de não tomar o espaço de poder masculino, como
conclui Thomson:

Women graphic designers were allowed to work at jobs that took advantage of
their culturally defined sex-specific skills. [...] They were encouraged to partici-
pate in those careers in which they did not threaten male economic ad-
vantage. Whey they ventured beyond those limits they were belittled, vilified,
or “disappeared” from history. (1994, p.47)10

A visão geral de que as mulheres não eram capazes de produzir traba-


lhos criativos e a desvalorização das áreas nas quais se envolviam fica clara

10
“Mulheres designers gráficas eram autorizadas a trabalhar em empregos que tirassem vantagem nas
suas capacidades específicas de sexo culturalmente definidas. […] Elas eram encorajadas a participar
naquelas carreiras nas quais não ameaçavam a vantagem económica masculina. Quando se arriscavam
fora destes limites, eram diminuídas, difamadas ou ‘desapareciam’ da história.” (Tradução nossa.)
23

em diversos comentários registrados na história da arte e do design. Meer


(2012) cita Scheffler (1908), em uma das críticas mais assertivas – e chocantes
– do crítico de arte alemão, que em livro intitulado Die Frau und die Kunst (As
Mulheres e a Arte), afirma:

Women are completely incapable of possessing the power of imagination, nei-


ther in the creation nor in the appreciation of art, because they lack the driving
force behind it: a fanatical will for advancement. (p.389)11

Nas décadas seguintes estas ideias se mantiveram, ainda que mais ve-
ladas. A seguir, falaremos sobre as distinções de gênero que ocorreram na
Bauhaus, já no Século XX.

A Consolidação da Profissão no Século XX: As Mulheres na Bauhaus

A Bauhaus, fundada em 1919, resultado da fusão da Escola de Artes e


Ofícios de Weimar com a Academia de Artes da mesma cidade, é hoje consi-
derada um ícone do design. Por sua importância na história do ensino e da
criação em design, cabe nesta investigação um estudo mais aprofundado na
participação feminina na instituição, o que contribuirá para uma maior compre-
ensão dos fatores que influenciaram na situação atual desta área.
Concebida como uma escola de arquitetura com o objetivo de formar o
artesão ideal, a Bauhaus buscou aglutinar as principais disciplinas artísticas em
seu currículo (Vadillo, 2009). O manifesto publicado em jornais alemães, do
primeiro diretora de escola, Walter Gropius (1919), citado por Megg’s & Purvis
(2012) deixa clara a filosofia da Bauhaus:

11
“Mulheres são completamente incapazes de possuir o poder de imaginação, nem na criação nem na
apreciação da arte, porque lhes falta a força motriz por tras disso: um desejo fanático pelo avanço.”
(Tradução nossa.)
24

The complete building is the ultimate aim of all the visual arts. Once the no-
blest function of the fine arts was to embellish buildings; they were indispen-
sable components of great architecture. Today the arts exist in isolation. ...
Architects, painters, and sculptors must learn anew the composite character of
the building as an entity. ... The artist is an exalted craftsman. In rare moments
of inspiration, transcending his conscious will, the grace of heaven may cause
his work to blossom into art. But proficiency in his craft is essential to every
artist. Therein lies the prime source of creative imagination. (p.326)12

A Escola, que surgiu com o discurso idealista e revolucionário de união


da arte e da tecnologia em prol de um fim social e conclama os jovens a se
envolverem neste projeto, logo surpreendeu-se com a grande adesão feminina.
A reação imediata foi a limitação no acesso pelas mulheres e a manipulação do
seu percurso acadêmico – caso conseguissem entrar. Graças ao seu sistema
pedagógico, que se baseava em um currículo preliminar de um semestre, após
o qual o aluno poderia ser admitido ou não ao restante do curso, e ao fato de
que, após este semestre, os mestres “sugeriam” aos aprovados a que área
deveriam dedicar-se, a Bauhaus segregou as alunas às oficinas13 que conside-
rava adequadas ao seu gênero. (Vadillo, 2009)
Com a interferência dos mestres, que orientavam as mulheres princi-
palmente à oficina têxtil da Bauhaus, tornando-a o refúgio feminino da escola,
foi criada uma cultura de que esta área era a mais adequada às capacidades

12
“O edifício completo é o objetivo final de todas as artes visuais. Uma vez que a função mais nobre das
belas-artes era embelezar edifícios; Eram componentes indispensáveis da grande arquitetura. Hoje as
artes existem isoladamente. (...) Arquitetos, pintores e escultores devem aprender de novo o caráter
composto do edifício como uma entidade. (...) O artista é um exaltado artesão. Em raros momentos de
inspiração, transcendendo sua vontade consciente, a graça do céu pode fazer com que seu trabalho
floresça em arte. Mas a proficiência em seu ofício é essencial para cada artista. Aí reside a principal fonte
de imaginação criativa.” (Tradução nossa.)
13
A palavra “oficina” será utilizada como tradução a workshop (inglês) e taller (espanhol), em designação
aos espaços de criação e trabalho prático da Bauhaus.
25

(ditas como femininas) das alunas e mantido o status segregatório existente


desde o início da profissão.

De hecho, algunas de las mujeres de la Escuela llegaron a interiorizar que


ese era el mejor lugar para desarrollar su trabajo, como pone de manifiesto
los testimonios de Helene Nonné-Schmidt, quien afirma (sin duda condiciona-
da por las opiniones de sus maestros) que las mujeres tienen mayores posibi-
lidades en la elaboración de objetos bidimensionales (por tanto en textil) que
en los tridimensionales, auto-negando sus propias posibilidades y las de otras
mujeres. (Torrent, 2008, p.228)14

Apesar das dificuldades enfrentadas na instituição, deve-se assinalar o


excelente desempenho da oficina têxtil, o que a tornou uma das mais exitosas
e duradouras da Escola (Vadillo, 2009). Sob a supervisão da ex-aluna Gunta
Stözl, que retornou em 1925 à nova sede do centro, em Dassau, a investigação
da oficina têxtil passou a ter caráter mais técnico, com estudos de novos mate-
riais e o foco na fabricação de materiais competitivos para a indústria, dando à
oficina especial importância dentro da Escola e “desmontando velhas teorias
existencialistas” (Torrent, 1995, p.64).

14
“Efetivamente, algumas das mulheres da Escola vieram a interiorizar que este era o melhor lugar para
fazer o seu trabalho, como evidenciado pelo testemunho de Helene Nonne-Schmidt, que diz (sem dúvida,
influenciada pela opinião de seus professores) que as mulheres são mais propensas a desenvolver
objetos bidimensionais (portanto, têxteis) do que tridimensionais, auto-negando suas próprias
possibilidades de e as de outras mulheres.” (Tradução nossa.)
26

Figura 2. Tapeçaria de Gunta Stölzl em cadeira. Co-criação com Marcel Breuer,


1921.

Fonte: Chair with Colourful Woven Seat. (2016). Guntastolzl.org. Acesso em 22 de Novembro
de 2016, disponível em: http://www.guntastolzl.org/Works/Bauhaus-Weimar-1919-1925/Chairs-
with-Marcel-Breuer/i-d5BVrvz

A presença de mulheres em outros espaços considerados masculinos,


porém, não foi totalmente evitada. Isto deve-se a dois motivos em particular: o
status de alunas da Bauhaus permitiu assistir àquelas da oficina têxtil assistir
às aulas como alunas ouvintes e, desta maneira, participar como intrusas per-
mitidas em outros ambientes da Escola. Houve também aquelas que, mesmo
enfrentando muitas dificuldades, desafiaram as escolhas dos seus mestres a
frequentaram oficinas tradicionalmente masculinas (Vadillo, 2009).
27

Fue sin duda en la tejeduría donde las mujeres jugaron un papel más impor-
tante dentro de la Escuela, pero también se destacaron, de forma individual,
en otros. Poco a poco, enfrentándose al orden establecido, haciendo valer
sus derechos, las mujeres lograron expandir su radio de acción más allá del
taller de tejidos. En concreto, en el de metalistería nos encontramos con la fi-
gura definitiva de Marianne Brandt, mientras que en el de mobiliario Alma
Busher y Benita Otte diseñaron interesantes objetos. (Torrent, 1995, p.65)15

O nome de Marianne Brandt é, possivelmente, um dos mais importan-


tes entre as mulheres da Bauhaus. Sua audácia não só a colocou como aluna
na oficina de metais como também chegou a dirigi-la por um curto período de
tempo. É hoje um talento reconhecido internacionalmente no desenho industri-
al, com objetos (Figura 3) que até hoje se comercializam (Vadillo, 2009). O
início, porém não foi fácil. Segundo Torrent (2008), além da dificuldade em ser
aceita na oficina de metais, Marianne teve que criar seu espaço em um ambi-
ente majoritariamente masculino, sendo muitas vezes encarregada de tarefas
desinteressantes, que a entediavam. A autora define, metaforicamente, a rela-
ção da Bauhaus com as mulheres:

[...] podemos decir que entreabrieron las puertas al trabajo profesional de las
mujeres dentro de un sector que, por su vinculación industrial, está tipificado,
salvo en algunos sectores, como «masculino». Puertas entreabiertas tan sólo,
a la espera, como en tantos otros campos, de poder ser abiertas de par en
par. (Torrent, 2008, p.69)16

15
“Foi sem dúvida na tecelagem onde as mulheres tiveram um papel mais importante na Escola, mas
também de destacaram, de forma individual, em outros. Pouco a pouco, enfrentando a orden
estabelecida, fazendo valer seus direitos, as mulheres conseguiram expandir seu raio de ação para além
da oficina têxtil. Em concreto, no de metal encontramos com a figura definitiva de Marianne Brandt,
enquanto no de mobiliário Alma Busher e Benita Otte projetaram interessantes objetos.” (Tradução
nossa.)
16
“[…] podemos dizer que entreabriram as portas ao trabalho profissional das mulheres dentro de um
setor que, por sua vinculação industrial, está tipificado, salvo em alguns setores, como “masculino”.
28

Figura 3. Conjunto de café e chá projetado por Marianne Brandt,1924.

Fonte: Coffee and Tea Set : Bauhaus100. (2016). Bauhaus100.de. Acesso em 22 de Novembro
de 2016, disponível em: https://www.bauhaus100.de/en/past/works/design-classics/kaffee-und-
teeservice/

Portas entreabertas tão somente, a espera, como em tantos outros campos, de poder ser abertas uma a
uma.” (Tradução nossa.)
29

A Institucionalização do Design no Brasil e em Portugal

Neste tópico abordaremos o período de institucionalização do design


no Brasil e em Portugal. Note-se que não se trata do seu surgimento, e sim da
sua institucionalização, ou seja, da “consciência do design como um conceito,
profissão e ideologia” (Cardoso, 2005, p.7). Segundo o autor:

Perdura na consciência nacional o mito de que o design brasileiro teve sua


gênese por volta de 1960. Como todo mito, trata-se de uma falsidade histórica
patente. Como todo bom mito de origem, trata-se também de uma verdade
profunda, para além dos limites de nossas vãs metodologias. O que ocorreu,
sem dúvida alguma, foi uma ruptura. Para uns, um novo ponto de partida; pa-
ra outros, um desvio de rumo. (Cardoso, 2005, p.7)

Brasil. O design teve seu processo de institucionalização iniciado na


década de 50. Já neste período, a forte influência modernista, o crescimento da
indústria nacional iniciado durante a Segunda Guerra e a política desenvolvi-
mentista de governo de Juscelino Kubitschek fomentaram iniciativas na produ-
ção industrial e o consumo.

O estilo moderno deixa de ser privilégio de uma restrita burguesia e já se po-


de distinguir faixas de diferentes níveis no mercado consumidor. É bom lem-
brar que o mercado interno que se forma na década de 1950 é constituído
principalmente por uma parcela do que podemos denominar classe média. A
grande maioria da população brasileira não estava incluída economicamente
nesse mercado consumidor incipiente. Entretanto, ele foi suficiente para esti-
mular a abertura de empresas comerciais ou produtoras de bens materiais,
que, por sua vez, auxiliaram a consolidação do campo publicitário e instiga-
ram variados profissionais a tentar trabalhar com o design moderno e indus-
trial nos anos 1950. (Braga, 2016, p.32)

Durante este período inicial foi a indústria gráfica que teve mais cres-
cimento. A forte concorrência exigiu que as marcas investissem em comunica-
ção, publicidade, embalagem e produtos editoriais. Incentivos do governo
30

permitiram que equipamentos mais modernos fossem adquiridos pelas gráfi-


cas, incentivando a evolução desta indústria. É neste contexto, em 1951, que
são criados no MASP (Museu de Arte de São Paulo) o curso de design indus-
trial do IAC (Instituto de Arte Contemporânea) e a Escola de Propaganda.
(Braga, 2016) Entre os primeiros docentes do IAC, na sua maioria arquitetos,
estava Lina Bo Bardi, arquiteta italiana que vivia em Salvador (Bahia), figura
importante no desenvolvimento da profissão no Brasil (Figura 4), e esposa do
fundador da Escola, Pietro Maria Bardi. O curso, porém, não teve o sucesso
esperado e é fechado em 1953, dando indícios de que “o mercado para o de-
sign de produto não estava maduro para absorver esses profissionais” a Escola
de Propaganda, por sua vez, nunca deixou de funcionar e foi transformada, em
1971, na ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) autônoma
(Braga, 2016, p.35).

Figura 4. Design de exposição de Lina Bo Bardi, 1957-68, MAM, São Paulo

Fonte: Afterall • Journal • ‘This Exhibition Is an Accusation’: The Grammar of Display According
to Lina Bo Bardi. (2016). Afterall.org. Acesso em 22 de Novembro de 2016, disponível em:
http://www.afterall.org/journal/issue.26/this-exhibition-is-an-accusation-the-grammar-of-display-
according-to-lina-bo-bardi1
31

Em 1963, já em um contexto de industrialização mais concretizado, é


fundada a Escola Superior de Desenho Industrial (ESDI)17, primeiro curso su-
perior em design, e considerado o marco do design moderno no Brasil. Seus
primeiros docentes eram predominantemente ex-alunos da Escola de Ulm, na
Alemanha: Karl Heinz Bergmiller, Alexandre Wollner e o suíço Paul Edgard
Decurtins, substituído em 1966 por Daisy Igel. Também lecionaram na institui-
ção Aloisio Magalhães, Orlando Luis de Souza Fragoso Costa, Flávio de Aqui-
no, Euryalo Cannabrava, Edgar Duvivier, Flávio de Aquino, José Almeida de
Oliveira, entre outros. Em 1967, a ex-diretora-executiva adjunta do MAM/RJ,
Carmen Portinho, assume a diretoria. (Braga, 2016)
Carmen Portinho, engenheira, urbanista e militante feminista, foi a pri-
meira mulher formada em Urbanismo no Brasil. Estagiou em Londres junto às
comissões de reconstrução e remodelação das cidades inglesas destruídas
pela guerra. Foi diretora adjunta do MAM-RJ (Museu de Arte Moderna do Rio
de Janeiro) e segunda diretora da ESDI, durante um dos períodos mais duros
da instituição, em plena ditadura militar, sob o AI-518. Promoveu a primeira
renovação no corpo docente da entidade e permaneceu na diretoria por 20
anos, até a incorporação da Escola à UFRJ (Universidade Federal do Rio de

17
Não haviam mulheres na primeira diretoria da ESDI. De acordo com a Ata da primeira reunião do
Conselho Consultivo, estavam presentes: “Maurício Roberto, presidente do Conselho e Diretor da Escola;
Flávio de Aquino, coordenador do Setor I - Integração Cultural; Aloísio Sérgio de Magalhães, coordenador
do Setor II - Meios de Representação; Alexandre Wollner, coordenador do Setor III - Metodologia Visual;
Euryalo Cannabrava, coordenador do Setor IV - Introdução à Lógica; Carl Heinz Bergmiller, coordenador
do Setor V - Oficinas; Raul Guenther Vogt, representante do corpo discente e Ceres Albuquerque,
representando o Chefe da Seção de Administração, cargo vago até a presente data no quadro de
funcionários desta Escola. Estiveram presentes, ainda, o Professor Zuenir Carlos Ventura e o aluno
Claudius Sylvius Petrus Ceccon.” Fonte: [http://www.esdi.uerj.br/arquivos/p_ata2.shtml] Acesso em 14 de
Setembro de 2016.
18
O Ato Institucional Número Cinco (AI-5), emitido em 13 de Outubro de 1978 pelo então presidente Artur
da Costa e Silva, durante a ditadura militar, se sobrepunha à Constituição Federal e às Estaduais, dando
poderes extraordinários ao Presidente e suspendendo direitos constitucionais da população. Durante a
vigência do AI-5, a censura à imprensa, à música, ao teatro e ao cinema foi endurecida e as
manifestações políticas perseguidas.
32

Janeiro). Foi casada com o arquiteto francês Affonso Eduardo Reidy, respon-
sável pelo projeto do MAM-RJ, falecido em 1964.
Também de grande importância para a institucionalização do design no
Brasil, a Associação Brasileira de Desenho Industrial (ABDI) foi fundada no
mesmo ano da ESDI, 1963. Participaram da sua fundação: Décio Pignatari,
Ruben Martins, Karl Heinz Bergmiller, Leib (Léo) Seincman, Luiz Roberto Car-
valho, João Rodolfo Stroeter, Lucio Grinover, Abraão Sanovicz, Willys de Cas-
tro, João Carlos Cauduro, Candido Malta Campos Filho, Julio Roberto Katinsky,
Alexandre Wollner, Fabrizio Fabriziani e Modesto de Barro (Braga, 2016). Ne-
nhuma mulher assinou a ata de fundação.
Percebe-se que, nas poucas mulheres citadas neste período, existem
alguns aspectos em comum: relações próximas – casamento, parentesco ou
amizade – com profissionais da área, nascimento e/ou experiência no exterior:
Lina Bo Bardi, italiana, foi casada com o arquiteto Pietro Maria Bardi; Daisy
Igel, filha de austríacos, estudou na New Bauhaus do Illinois Institute of
Technology, em Chicago, onde foi aluna de Mies Van der Rohe. Carmen Porti-
nho foi casada com o arquiteto Affonso Eduardo Reidy. Estas relações contri-
buíram para que, em um período em que as mulheres tinham muito menos
acesso ao mercado de trabalho, elas não somente pudessem exercer a sua
profissão, mas também obter merecido reconhecimento por isto.19

Portugal. Considera-se o ano de 1959 como marco de início do pro-


cesso de institucionalização design em Portugal. Neste ano, foram lançadas as
revistas Almanaque e o livro fasciculado Lisboa, Cidade Triste e Alegre de
Victor Palla e Costa Martins. Também em 1959 foi criado o INII (Instituto Naci-

19
É importante ter em consideração que somente em 1962 o Estatuto da Mulher Casada permitiu, no
Brasil, que as mulheres casadas pudessem trabalhar sem pedir autorização aos seus maridos. (Canezin,
2004)
33

onal de Investigação Industrial), cujo objetivo era fomentar a produção industri-


al do país, através de novas tecnologias. Almeida aponta quatro fatores impor-
tantes à institucionalização:

(1) das acções do Estado inseridas, seja nas suas políticas de modernização,
seja na vontade de se “mostrar” moderno no exterior; (2) do trabalho obstina-
do de um conjunto de designers que tentaram impor uma actividade nova
num mercado dominado por artistas plásticos e por arquitectos; (3) do traba-
lho de um conjunto de empresários que tornou possível a implementação, em
Portugal, dos pressupostos de organização empresarial e de modernização
da produção que observavam nos seus contactos com o exterior; e (4) da
oportunidade que alguns jovens tiveram não só de frequentar cursos de de-
sign em escolas no estrangeiro como também de estarem atentos aos casos
tornados paradigmáticos da modernidade europeia e americana, através de
contextos críticos especiais. (2009, p.137)

Nos anos 60, ainda sob o regime Salazarista, a maior parte das mulhe-
res tinha seu espaço limitado ao lar, e poucas eram aquelas que tinham a opor-
tunidade de trabalhar fora deste âmbito. Entretanto, o aumento da imigração,
as Guerras da África e a falta de mão de obra exigiram a introdução de mão de
obra feminina na indústria. O processo de inserção da mulher no mercado de
trabalho, porém, ainda estava no seu início. Apesar disto, nomes femininos
importantes são lembrados na história:
• A escultora Maria Helena Matos, que dirigiu o Núcleo de Arte e
Arquitetura Industrial (NAAE) e organizou a 1ª Exposição de
Design Português em 1971;
• Alda Rosa, licenciada em pintura pela Escola Superior de Belas
Artes de Lisboa. Estudou em Londres como bolsista da
Fundação Gulbenkian entre 1960/61 e, ao retornar, juntou-se a
Maria Helena Matos no NAAE e dedicou-se às artes gráficas;
• Cristina Reis, também licenciada em pintura pela Escola
Superior de Belas Artes de Lisboa. Estudou em Londres entre
34

1966 e 1970. Trabalhou no INII até 1974. Dedicou a maior parte


de sua carreira à cenografia e figurinos de teatro.
Alda Rosa e Cristina Reis foram as responsáveis pelo catálogo da 1ª Exposi-
ção de Design Português, em 1971. A publicação apresentava cinquenta e
nove nomes de designers, dos quais dez eram mulheres. Na exposição seguin-
te, o número total de designers subiu, assim como a participação feminina.

Figura 5. Catálogos da 1ª e da 2ª Exposição de Design Português

Fonte: 1ª Exposição de Design Português. (2015). Constantino, guardião de sonhos.... Acesso


em 22 de Novembro de 2016, disponível em
https://joaoconstantinoblog.wordpress.com/2015/12/30/1a-exposicao-de-design-portugues/

Não diretamente ligada ao design gráfico em si, a publicação, por Maria


Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, de As Novas Car-
tas Portuguesas, foi uma das ações que demonstraram a força e a influência
cultural feminina no início dos anos 70.
35

O panorama geral sofreu mudanças drásticas – e visivelmente positi-


vas – após a Revolução de Abril de 1974, não somente no contexto político-
social mas também cultural. Segundo Almeida,

O desenvolvimento de uma “cultura jovem”, após a Revolução de Abril, cons-


truída por uma geração de jovens quase isentos do serviço militar e que adia
a entrada no mercado de trabalho; que permanece nas escolas secundárias e
nas faculdades; que participa activamente na política partidária por via do di-
reito ao voto aos 18 anos (desde 1976), e que, como nenhuma outra, sabore-
ará a liberdade. (2015, p. 42)

É neste cenário de liberdade, de crescimento econômico e de aumento


no consumo causado pelos reflexos da Revolução de Abril que se inicia a se-
gunda fase da institucionalização do design em Portugal. Em 1976 foi fundada
a APD (Associação Portuguesa de Designers). Entre os 50 fundadores, 12
eram mulheres: Salette Tavares, Madalena Figueiredo, Assunção Cordovil,
Teresa Amado, Beatriz Alçada, Guilhermina A. Campos, Alda Rosa, Filipa Neto
Tainha, Amaryllis Figueira, Maria Helena Matos, Ana Avelar Santos e Elsa S.
Pinheiro.20
Embora tenham tido papel importantíssimo na institucionalização do
design em Portugal, a trajetória destas pioneiras não foi fácil. Alda Rosa, em
entrevista a Almeida, relembra um dos obstáculos que enfrentou por ser mulher
em pleno período do Estado Novo:

Mas antes disso já tinha ido para o Barreiro ensinar. E foi aí que tive aquele
embate engraçado e sempre animador que foi embora ter concorrido em
igualdade de circunstâncias geográficas com os meus colegas, os colegas
homens ficaram todos em Lisboa e eu fui para o Barreiro. Fui ao Ministério

20
Fundadores da APD | Associação Portuguesa de Designers. (2016). APD. Acesso em 10 de Novembro
de 2016, disponível em http://www.apdesigners.org.pt/associacao/fundadores-da-apd/
36

para saber se havia algum engano porque a minha nota era superior à deles
e apareceu-me o director de serviços a dizer “não se importa de ir ali à minha
sala” e explicou-me: “Vai custar-lhe imenso ouvir isto mas as mulheres só po-
dem ser colocadas depois dos homens terem sido todos colocados primeiro”
(Almeida, 2009, p.94)

O ensino público formal, porém, não acompanhou a institucionalização


do design. Segundo Almeida, havia “desinteresse do Estado em relação à
integração do design no ensino superior como área fundamental de estudos”
(2009, p.32). Por isto, até 1974, o ensino de design deu-se pelas ações de
formação do núcleo especializado do INII e em esferas privadas, como no
IADE (Instituto de Arte e Decoração), a partir de 1969, e no Ar.Co, a partir de
1973. Somente em 1974 foi integrado “provisoriamente” o curso de design na
Escola Superior de Belas Artes de Lisboa, posteriormente reconhecido em
1983 e incluído oficialmente na Universidade das Escolas de Belas-Artes de
Lisboa e do Porto em 1992 e 1994, respectivamente.

Entre Brasil e Portugal pode-se verificar algumas diferenças-chave no


processo de institucionalização do design:
• A raiz: enquanto no Brasil o design tem uma raiz industrial e mais
ligada à engenharia e à arquitetura, em Portugal os movimentos
artísticos – pintura, escultura, etc. – tiveram muito mais influência no
desenvolvimento da profissão;
• As influências: a influência do modelo alemão da Bauhaus e de Ulm
no design Brasileiro contrasta à influência Britânica sofrida pelos
precursores do design Português;
• Os interesses governamentais: o incentivo ao ensino do design no
Brasil foi um fator importante para a institucionalização da profissão,
enquanto em Portugal o ensino foi, até os anos 70, mais
independente – em cursos livres, workshops e escolas
independentes.
37

Capítulo 3 - Análise do Cenário Atual

Neste capítulo, abordaremos a situação atual das mulheres no merca-


do do Design Gráfico. Iniciaremos falando dos desafios que já foram alcança-
dos e avançaremos a reflexões sobre as questões mais atuais, como a
visibilidade da mulher no mercado e as influências dos papeis de gênero tradi-
cionais na sua vida profissional. A seguir, no capítulo “Resultados e Discus-
sões” (p. 72), os dados bibliográficos aqui apresentados serão contrapostos
com os resultados dos inquéritos e entrevistas (p. 67).

As Conquistas

Como visto no capítulo anterior, a situação das mulheres no mercado


de trabalho vem evoluindo com o passar do tempo. Com esta evolução, algu-
mas conquistas podem ser percebidas. Seu reconhecimento é de grande im-
portância para uma análise do contexto atual e, principalmente, para que se
inicie uma nova fase de reflexão sobre o tema, visto que com novas conquistas
surgem novos desafios. A seguir, abordaremos as duas principais conquistas
que pudemos perceber: a evolução da legislação do trabalho em relação ao
trabalho feminino e o aumento progressivo na inserção da mulher no mercado
e no ambiente acadêmico criativo.

Legislação do Trabalho. A legislação trabalhista é uma importante fer-


ramenta protetiva do trabalhador. No caso específico das mulheres, uma legis-
lação que garanta sua igualdade de direitos em relação ao homens respeitando
as especificidades de sexo e gênero é determinante para a justa e correta
inserção das mulheres no mercado de trabalho. A seguir, serão descritos os
principais progressos da legislação trabalhista no Brasil e em Portugal.
No Brasil, segundo Melo (2011), o primeiro projeto de Código do Traba-
lho, de 1912, apresentava propostas sobre questões específicas à mulher,
como a sua liberdade para trabalhar sem autorização do marido, jornada de
trabalho de no máximo 8 horas e licença antes e depois do parto. Este docu-
38

mento, porém, após discutido durante mais de trinta anos, não foi aprovado,
por acreditar-se que desonraria os maridos e poderia tornar a gravidez algo
rentável, em função dos adicionais que seriam pagos neste caso. Em 1932, um
decreto proibiu o trabalho noturno para mulheres e regulamentou pausas para
amamentação nos primeiros seis meses de vida dos filhos.
Em 1932, foi promulgada a primeira Constituição Brasileira a tratar so-
bre os direitos do trabalho da mulher. Entre outras questões, legislava sobre a
proibição da discriminação das mulheres quanto ao salário, a proibição do
trabalho de mulheres em ambientes insalubres, o direito de repouso antes e
depois do parto sem prejuízo ao salário e outras medidas voltadas à saúde e
proteção da gestante. Na Constituição seguinte, de 1934, outras medidas pro-
tetivas foram adicionadas, como o salário maternidade e a licença maternida-
de. Até o final do Século XX, três outras constituições foram promulgadas,
sendo duas delas resultados de golpes de estado: a constituição de 1937, fruto
do golpe de Getúlio Vargas, e a de 1967, do golpe militar de 1964 (Melo, 2011).
A supressão da necessidade de autorização do marido para trabalhar aconte-
ceu em 1962, com a publicação do Estatuto da Mulher Casada.
Hoje, graças à Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), promulgada
em 1943, e à Constituição de 1988, diversos direitos trabalhistas das mulheres
são protegidos, entre eles:
• Direito à licença gestante de 120 dias, sem prejuízo do emprego ou
salário;
• Realização de ações que visassem a proteção do trabalho da
mulher;
• Proibição de diferenças de salários;
39

• Estabelecimento de critérios de admissão e exercício de função em


função do gênero;
• Igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres;
• Regulamentação da duração, das condições do trabalho e da
discriminação contra a mulher, do trabalho noturno21, dos períodos
de descanso, dos métodos e locais de trabalho, da proteção à
maternidade, das penalidades. (Melo, 2011)

Em Portugal, de acordo com Guimarães (1986), o primeiro Código Civil


Português, de 1887, declarava a igualdade civil entre homens e mulheres,
porém enumerava diversos casos de negação de direitos em razão do sexo,
mantidos desde o período anterior ao documento. De acordo com este Código,
a mulher casada era completamente dependente do marido e proibida de prati-
car qualquer ato sem a sua autorização.
Em 14 de Abril de 1891, após a Conferência de Berlim, na qual foi o
trabalho feminino em espaços industriais e em minas foi regulamentado, foi
publicado um decreto regulamentando o trabalho de menores e mulheres nes-
tes ambientes. O decreto abordava a idade mínima de admissão, a proibição
de trabalhos penosos ou perigosos, duração máxima do trabalho, etc. (Graça,
1999). Em 1893, um novo Decreto aborda algumas questões relacionadas à
maternidade:
• “Cada uma das fábricas em que trabalhem mais de 50 mulheres por
dia, terá uma creche com as acomodações e condições higiénicas
que os regulamentos determinem. A distância da creche à fábrica
não será superior a 300 metros” (art. 21º).

21
Em 1944 a CLT foi alterada, permitindo o trabalho noturno para mulheres maiores de 18 anos em
algumas atividades.
40

• “A mulher não será admitida a trabalhar nos estabelecimentos


industriais nas quatro semanas após o parto” (artigo 22º).
• “A mãe poderá ir à creche amamentar o filho à hora e pela forma
determinada nos regulamentos” (artigo 23º).22

Baptista (2013) salienta, porém, a contradição desta lei, que proibia o


trabalho feminino no período pós-parto porém não previa remuneração alguma,
o que impactava negativamente na economia familiar das trabalhadoras, tra-
zendo mais prejuízos que benefícios.
Ainda segundo a autora, com a proclamação da República em 5 de
Outubro de 1910, alterações na legislação foram sendo feitas gradualmente.
No ponto de vista civil, não foi imediata a eliminação das restrições de ação
das mulheres23. No contexto trabalhista, em 1911, as mulheres obtiveram per-
missão para trabalhar em funções públicas. No mesmo ano, um decreto proibiu
o trabalho noturno de mulheres na indústrias onde houvessem mais de 10
empregados e empregadas. Esta restrição, apesar de ser considerada “proteti-
va”, aumentou ainda mais a exploração das mulheres, que, por não terem mais
acesso aos trabalhos melhor remunerados (os noturnos), eram obrigadas a se
submeter a situações exploratórias de trabalho. Baptista (2013) cita Guimarães
(1937), que afirma:

Até aqui julgava-se que esta regulamentação representava o sistema ideal


para a mulher - tanto que as associações feministas a incluíram nos seus
programas…. Sustentam elas (trabalhadoras) que sobre a sua aparente be-
nevolência, as restrições impostas ao trabalho feminino prejudicam as mulhe-

22
Diário do Governo nº 88, 22 de Abril de 1891, 4ª feira, p. 882
23
Somente em 1930 o Código Civil foi atualizado e o texto referente a estas questões foi retirado
integralmente, podendo ser este considerado um marco do final do dever de obediência da mulher ao
marido. (GUIMARÃES, 1986)
41

res dificultando-lhes o exercício da sua actividade e as lançam numa miséria


cujas consequências são mais funestas ainda do que as do trabalho livre (p.5)

Apesar de Portugal ter sido membro fundador da Organização Interna-


cional do Trabalho em 1919, até o início da ditadura, em 1927, poucas medidas
em relação ao trabalho da mulher foram postas em prática.
Durante o período Salazarista tampouco foram adotadas medidas pro-
tetivas ao trabalho da mulher, pelo contrário: ainda mais restrições foram im-
postas à participação feminina no mercado de trabalho, visto que as mulheres
eram consideradas pilares do lar. A Constituição de 1933 consagra a igualdade
dos cidadãos perante a lei, com exceção feita às mulheres tendo em vista "as
diferenças inerentes à natureza e também os interesses da família".

Verificou-se nos anos 30, não apenas em Portugal, mas também por quase
toda a Europa, a adesão aos princípios do totalitarismo, que, ao contrário do
liberalismo anterior, punha a colectividade acima do indivíduo e, neste caso
específico, a família, como um todo, acima dos direitos dos seus membros.
Era o retorno ao sistema patriarcal. (Guimarães, 1986, p.567)

Ainda segundo a autora, o Código Civil de 1966 restaurou o poder marital (do
marido – chefe da família – sobre a esposa), mas simultânea e contraditoria-
mente aumentou os direitos das esposas. A partir deste momento, passou a
ser permitido que as esposas exercessem profissões liberais ou fossem funcio-
nárias públicas sem a necessidade de consentimento do marido, assim como
publicar obras literárias e expor trabalhos artísticos – direito que as mulheres
solteiras já tinham desde 1927, mas era negado às mulheres casadas. Tam-
bém foi estabelecida a capacidade da esposa de receber ela mesma pelo seu
trabalho.
Somente após o fim da ditadura, em 1974, com o novo Código Civil de
1978, as novas leis que estabeleciam a igualdade entre homem e mulher no
mercado de trabalho e a criação da Comissão para a Igualdade no Trabalho e
no Emprego, mudanças importantes passaram a vigorar:
42

• O reconhecimento do valor econômico do trabalho da mulher no


lar;
• Aprovação da licença maternidade de 90 dias;
• Permissão de acesso às mulheres à magistratura, ao serviço
diplomático e a certas posições na administração local, antes
proibidas;

Em 1984, a Lei da Maternidade estabelece licença maternidade de 98


dias, o direito à dispensa de trabalho para consultas pré-natais e amamenta-
ção. São também exigidas nos locais de trabalho condições especiais de segu-
rança para trabalhadoras grávidas, puérperas e lactantes. Somente em 1992 a
jornada de trabalho noturno deixa de ser proibida às mulheres, exceto durante
a gravidez.

Inserção no mercado e no ambiente acadêmico criativo. O final do


Século XX foi de grandes mudanças não somente no contexto geral do design
gráfico mas na inserção da mulher nos mercados de trabalho como um todo. A
industrialização, o aumento no consumo e a explosão dos movimentos feminis-
tas a partir dos anos 70 foram aspectos que contribuíram para uma maior pre-
sença feminina nos ambientes criativos e corporativos. Especialmente em
países como Brasil e Portugal, que vivenciaram períodos duros de ditaduras no
Século XX (entre 1964 e 1985 e entre 1933 e 1974, respectivamente), o perío-
do compreendido entre o início dos anos 80 e a primeira década dos anos
2000 representou um curto espaço de tempo no qual importantes mudanças
socioeconômicas sucederam. Segundo Lupton:

During the last quarter of the twentieth century, women played a central role in
building the discourse of graphic design. During this period the profession
came of age both as a recognized business and as a field of study in universi-
ty art and design programs, including at the graduate level. Women were no
minority among the educators, critics, editors, and curators who defined the
theoretical issues of the time. Schools and museums provided accessible plat-
43

forms from which women could influence the direction of graphic design.
(2012, p.81)24

Atualmente, em decorrência de mudanças políticas, sociais e culturais


e, principalmente, da luta feminista e das mulheres como um todo, pode-se
verificar equidade numérica entre homens e mulheres, tanto nos ambientes de
ensino quanto no mercado de trabalho. Breuer e Meer, na introdução em inglês
de seu livro Women in Graphic Design 1890-2012, afirmam:

Students and young academics are used to having female teachers and pro-
fessors; they have been raised by feminist mothers. Women have asserted
their place not only in the realm of education, but also in the worlds of politics
and finance, as well as the legislative and judicial arenas. (2012, p.39)25

As autoras analisam de forma ainda mais otimista o contexto atual de


inserção das mulheres no mercado criativo, no qual, em sua opinião, as mulhe-
res já conquistaram um espaço relevante. Na Alemanha, exemplificam, a per-
centagem de mulheres autônomas no mercado criativo é de entre 40 e 44%, de
acordo com estatísticas de 2008. Em comparação, a média geral de mulheres
autônomas na Alemanha é de somente 7%, muito inferior ao cenário específico
do mercado criativo (Breuer & Meer, 2012).
Nos Estados Unidos, de acordo com Hagmann (2005), estima-se que
as mulheres sejam a maioria dos profissionais de design gráfico. Um dos indi-
cadores que corroboram com este fato é que, em 2015, 55% dos membros do

24
“Durante o último quarto do século vinte, as mulheres tiveram um papel central na construção do
discurso do design gráfico. Durante este período a profissão atingiu maturidade tanto como negócio
reconhecido e como campo de estudo em programas universitários de arte e design, inclusive em nível de
graduação. Mulheres não foram minoria entre os educadores, críticos, editores e curadores que definiram
as questões teóricas daquele tempo. Escolas e museus disponibilizaram plataformas acessíveis pelas
quais mulheres puderam influenciar as direções do design gráfico.” (Tradução nossa.)
25
“Estudantes e jovens acadêmicos estão habituados a ter professoras e mestres mulheres; eles foram
criador por mães feministas. Mulheres afirmaram seu lugar não só no âmbito da educação, mas também
nos mundos da política e das finanças, assim como nas arenas legislativas e judiciais.” (Tradução nossa.)
44

AIGA (American Institute of Graphic Design) – entidade cuja presidente atual é


a designer Su Mathews Hale – eram mulheres.
No Brasil, a ADG Brasil (Associação dos Designers Gráficos) estimou,
em 2012, que 40% dos seus associados são mulheres, enquanto 60% são
homens. A distribuição muda para 46% de mulheres e 54% de homens entre
pessoas de 21 a 25 anos, demonstrando que há maior igualdade de gênero
entre as parcelas mais jovens dos profissionais (ADG Brasil, 2012).
Nos ambientes acadêmicos, também pode-se observar esta igualdade
numérica. Na University of the Arts London, uma das principais escolas de
design do mundo, em 2012, 72.5% dos alunos do sexo feminino26, enquanto no
Reino Unido, a média é de 61,7% de alunos do sexo feminino nas áreas de
Artes Criativas e Design.27 No Brasil, de acordo com dados do Censo de Edu-
cação do Inep/Deed, 57,5% dos estudantes que concluíram cursos nas áreas
de Humanidades e Artes – grande área na qual estão incluídos os cursos de
design e programação visual – eram do sexo feminino.28
Apesar do quadro otimista que os números fazem transparecer, a
igualdade numérica percebida no meio acadêmico e no mercado de trabalho
não significa a inexistência de desigualdades de gênero. Nos tópicos a seguir
serão abordadas questões atuais sobre as discrepâncias que ainda existem no
mercado de trabalho, mesmo após décadas de lutas e conquistas das mulhe-
res na área, assim como questionamentos que surgiram no decorrer desta
investigação.

26
Infelizmente, as estatísticas ainda utilizam sexo, e não gênero, como parâmetro. Por isto, não é
possível afirmar com certeza a proporção de mulheres – sejam elas cis ou trans.
27
Fonte: HESA 2014-15 (Higher Education Statistics Agency).
28
Fonte: Censo da Educação Superior Inep/Deed.
45

Reflexões para o Presente e para o Futuro

Representatividade, visibilidade e reconhecimento profissional.


Aspectos como a representatividade – tanto em publicações quanto em confe-
rências e outros meios de comunicação – e o acesso a projetos de maior mag-
nitude ainda não podem ser considerados igualitários. Neste contexto, Lupton –
que tende a ser deveras otimista em relação à participação feminina no merca-
do de trabalho do design – afirma:

Yet despite the fantastic successes documented here, women remain minority
players. It is striking how many successful women designers in the twentieth
century worker in partnership with powerful male practitioners (Elaine Bass,
Zuzana Licko, Laurie Haycock Makela). Such connections to established
power are not inconsequential. It is easy to young designers today to discount
the importance of the pioneering women who entered a less open field; it also
is easy to assume that the balance of male and female students in schools of
art and design insures an equal balance in the workplace. Although women
represent a large part of the design profession, they still do not predominate at
the very top, in terms of income or access to large-scale commissions. (2012,
p.85)29

A seguir, analisaremos dois casos: o da visibilidade em eventos, pre-


miações em convenções, com foco no Século XXI e em Brasil e Portugal, e a
representatividade na história contada do design de um modo geral. Inicialmen-

29
“No entanto, apesar dos fantásticos sucessos documentados aqui, mulheres seguem sendo
personagens minoritários. É impressionante como muitas profissionais designers mulheres bem
sucedidas do século XX, trabalharam em parceria com poderosos praticantes do sexo masculino (Elaine
Bass, Zuzana Ličko, Laurie Haycock Makela). Tais conexões de poder estabelecidas não são
inconsequentes. É fácil de jovens designers hoje descontar a importância das mulheres pioneiras que
entraram um campo menos aberto; também é fácil supor que o equilíbrio de alunos e alunas nas escolas
de arte e design garante um equilíbrio igual no local de trabalho. Embora as mulheres representam uma
grande parte da profissão do design, eles ainda não predominam no topo, em termos de renda ou de
acesso a altas comissões.” (Tradução nossa.)
46

te, traremos informações numéricas sobre os últimos eventos, buscando expli-


cações para as discrepâncias encontradas. A seguir, analisaremos sob o ponto
de vista feminista os diversos fatores que influenciam na baixa representativi-
dade das mulheres na história do design.

Visibilidade em eventos e premiações. Apesar de concordarmos que


a participação frequente em eventos e a alta visibilidade em publicações não é
pressuposto para o sucesso, é essencial considerar a sua importância, visto
que a visibilidade está intimamente relacionada com o reconhecimento
profissional, como afirma Brighenti:

Recognition is a form of social visibility, with crucial consequences on the rela-


tion between minority groups and the mainstream. [...] For racial and sexual
minorities, being invisible means being deprived of recognition (2007, p.329).30

A representatividade feminina em conferências, convenções, premia-


ções e demais eventos no âmbito do design gráfico tem sido um parâmetro
importante para mensurar a desigualdade de gênero que ainda existe na pro-
fissão. Embora os números nos mostrem que, tanto no ambiente acadêmico
quanto no ambiente de trabalho, exista uma equidade numérica, as conclusões
que podem ser tiradas pelos números relativos à participação das mulheres em
eventos são muito diferentes. Lizá Ramalho, designer em Portugal, afirma a
Stavro, que “a igualdade de gênero já foi debatida por um longo tempo, existe a
consciência do problema. Houve uma melhora, mas ainda estamos insuficien-
temente representadas, exceto quando as mulheres são o tema central” (2012,

30
“Reconhecimento é uma forma de visibilidade social, com consequências cruciais na relação entre
grupos minoritarios e a corrente principal. Para minorías raciais e sexuais, ser invisível é ser privado de
reconhecimento.” (Tradução nossa.)
47

p.370) 31 A seguir, analisaremos algumas estatísticas que demonstram a situa-


ção atual da visibilidade feminina nestes eventos.
No cenário mundial, analisaremos a participação feminina nos
principais eventos de tipografia. Hagmann (2005, p. 187) aborda estas
discrepâncias e ilustra, no Gráfico 1, a inequidade na participação nas
principais conferências internacionais sobre o tema nos anos de 2003 e 2004:

Gráfico 1. Representação de gênero em recentes conferências de tipografia.

Segundo Dechant (2012), na TypoBerlin de 2009, apenas 5% dos ora-


dores eram mulheres. Na ATypl deste mesmo ano, a proporção era de 15%,
não demonstrando evolução em relação aos dados de 2003 e 2004 analisados
por Hagmann.
No contexto Brasileiro verifica-se a mesma discrepância. Entre os 12
oradores convidados do DiaTipo São Paulo 2015 (Figura 6), um dos principais
eventos de tipografia do país, apenas cinco eram mulheres – duas delas parti-
cipantes de um coletivo, juntamente com dois colegas. No mesmo ano, no

31
Tradução nossa. Em inglês, no original: “Gender equality has been debated for a long time now; there’s
been an awarness of the problema. There’s been an improvement, but we are still poorly represented,
except when women are the central issue.” (Stavro, 2012)
48

DiaTipo Campinas, todos os cinco convidados eram homens, e no DiaTipo


Porto Alegre, apenas uma mulher foi convidada, em um total de nove. Nas
principais premiações do país a situação não é diferente: Entre os jurados do
5º Prêmio Bornancini de Design, em 2014, organizado pela Associação dos
Profissionais em Design do Rio Grande do Sul, somente 15 dos 53 jurados
eram mulheres. Na 11ª Bienal Brasileira de Design Gráfico, em 2015, os dois
curadores eram homens e somente 13 dos 40 jurados eram mulheres.
Em Portugal o cenário parecer ser mais equilibrado. Em 2014, no 5º
Encontro de Tipografia, apenas uma mulher participou como convidada, em um
total de sete profissionais. Entre os painéis a proporção foi de sete apresenta-
doras mulheres em um total de 19 – aproximadamente 37%32. Em 2015, no 6º
Encontro de Tipografia, a proporção entre os convidados foi mais equilibrada,
de 2 mulheres para 3 homens – uma delas, apresentando seu trabalho em
parceria com seu sócio33, assim como em 2016, no 7º Encontro de Tipografia,
em que a proporção foi mantida (Figura 7). Entre os jurados do Prêmio Sebas-
tião Rodrigues 2015, que premia alunos finalistas de Design de Comunicação,
três dos cinco jurados são mulheres, reforçando a constatação de que, no país,
há maior participação feminina neste âmbito.

32
Fonte: 5º Encontro de Tipografia [http://web.ipca.pt/5et] Acesso em 19 de Agosto de 2016.
33
Fonte: 6º Encontro de Tipografia [http://6et.web.ua.pt] Acesso em 19 de Agosto de 2016.
49

Figura 6. Imagem de divulgação dos convidados do DiaTipo São Paulo 2015

Fonte: DiaTipo São Paulo - Timeline | Facebook. (2016). Facebook.com. Acesso em; 1 de
Novembro de 2016, disponível em:
https://www.facebook.com/DiaTipo/photos/a.482862988421000.108373.470935936280372/109
9929183381041/?type=3&theater
50

Figura 7. Imagem de divulgação dos oradores do 7º Encontro de Tipografia


(2016)

Fonte: 7º Encontro de Tipografia - Oradores. Acesso em 01 de Novembro de 2016, disponível


em: http://7et.fa.ulisboa.pt/index.php/pt/conferencia2/oradores

É difícil definir uma causa para a falta de visibilidade feminina nestes


eventos. Atribuir a um ou outro fator específica presumiria uma unidade que
não existe naturalmente entre as mulheres e excluiria aspectos pessoais de
cada uma, da região em que vive e da sua história. É possível, porém, aferir os
aspectos socioculturais que podem influenciar no contexto geral das diferenças
verificadas.
Um deles, como sugere Paula Scher entrevista a Stavro, é a dificulda-
de de conciliar a vida familiar, em especial a maternidade, com este tipo de
compromisso profissional:

Designers get famous by speaking at conferences. Many women have chil-


dren and don’t have the time for this. [...] Most men who are speakers have
their wives stay home with the kids. (2012, p. 369)34

34
“Designers ficam famosos falando em conferências. Muitas mulheres tem filhos e não têm tempo para
isto. […] A maioria dos homens que são conferencistas tem suas esposas em casa com os filhos”
(Tradução nossa.)
51

Obviamente, esta é uma conclusão simplista – e, considerando princi-


palmente ser vinda de uma designer sem filhos, pode ser ponto de partida para
uma longa discussão. Apesar de ser realidade o fato de que mulheres lidam
com maiores responsabilidades em relação à maternidade que os homens com
a paternidade, este é apenas uma parte de um problema de mais complexo.
A dificuldade encontrada por mulheres em atingir cargos de chefia, a
predominância de homens nas organizações de eventos e, possivelmente,
aspectos culturais que influenciam negativamente na ambição e na autoconfi-
ança das mulheres, como sugere Lizá Ramalho, em entrevista a Stavro, tam-
bém devem ser considerados fatores de influência na falta de visibilidade:

It would make sense that women were more insecure about their capabilities.
History and society itself forgets, ignores and undervalues women; in contrast,
the heroes are always men. (2012, p.364)35

De fato, uma possível causa desta insegurança seria, como sugere Li-
zá Ramalho, a influência social – com papéis de gênero muito definidos e es-
trutura patriarcal – que espera a introversão feminina em contraste com a
extroversão masculina, impactando na autoconfiança principalmente das pro-
fissionais mais jovens. Este tópico é abordado com mais profundidade a partir
da página 63.

Visibilidade na história contada do design. Outra questão de suma


importância é a representatividade feminina na história contada do design, um
dos fatores influenciadores da suposta insegurança abordada anteriormente.
Não é necessária uma observação muito profunda dos livros de história do

35
“Faria sentido que as mulheres fossem mais inseguras sobre as suas capacidades. A história e a
própria sociedade esquece, ignora e subestima as mulheres; em contraste, os heróis são sempre
homens.” (Tradução nossa.)
52

design para perceber que há sub-representação das designers mulheres, tanto


no campo do design gráfico quanto no design industrial. Scotford (2012) anali-
sa, na teoria e na prática, esta questão, e exemplifica: a primeira edição de um
dos principais livros de história do design, “A History of Graphic Design”, de
Philip Meggs, menciona apenas quinze mulheres e reproduz o trabalho de
nove. A segunda edição, por sua vez, menciona trinta e uma e reproduz o
trabalho de vinte e três – em comparação com centenas de designers homens.
O autor tampouco aborda a questão das mulheres designers, assim como de
designers negros.
A autora Cheryl Buckley aborda esta questão de um ponto de vista fe-
minista, afirmando que a crítica feminista à história do design deve confrontar o
problema do patriarcalismo e dirigir-se à exclusão das mulheres nos métodos
historiográficos utilizados pelos historiadores do design. Para a autora, os mé-
todos utilizados são tendenciosos em relação às mulheres, privilegiando o
grupo dominante – ou seja, o patriarcado:

These methods, which involve the selection, classification, and prioritization of


types of design, categories of designers, distinct styles and movements, and
different modes of production, are inherently biased against women and, in ef-
fect, serve to exclude them from history. (1986, p.3)36

Um exemplo que expõe o reflexo desta exclusão é o verbete List of


Graphic Designers da Wikipedia (Figura 8), que exibe, entre os 137 profissio-
nais listados, apenas 27 mulheres. A plataforma colaborativa não pode ser
considerada uma fonte acadêmica, porém seu aspecto de construção coletiva

36
“Esses métodos, que envolvem a seleção, classificação e priorização de tipos de design, categorías de
designers, diferentes estilos e movimentos e diferentes modos de produção, são intrínsecamente
tendenciosos contra as mulheres e, na realidade, servem para excluí-las da história.” (Tradução nossa.)
53

e a possibilidade de que qualquer pessoa insira informações demonstra que há


pouco conhecimento – ou interesse – no trabalho de figuras femininas.

Figura 8. Verbete “List of graphic designers” na Wikipedia, 2016

Fonte: Reproduzido de wikipedia.org. Acesso em 3 de Novembro 2016, disponível em:


https://en.wikipedia.org/wiki/List_of_graphic_designers
54

A seguir, nos aprofundaremos em algumas das abordagens equivoca-


das que contribuem para esta inequidade nos registros da história do design.

A mulher instintiva e o homem habilidoso. Buckley (1986) defende


que um dos principais reflexos do patriarcalismo é a criação de um estereótipo
feminino, que define os comportamentos considerados adequados para as
mulheres, papéis sociais e ideais físicos e intelectuais aos quais podem aspirar.
No contexto da história do design, o patriarcalismo se revela na desvalorização
de atividades “femininas” – como o design têxtil – e supervalorização de ativi-
dades “masculinas”, como o design industrial. Meer (2012) atenta também às
tentativas – por vezes bem intencionadas – de criar uma imagem da designers
como “mais envolvidas em causas sociais, com maior identificação com os
clientes e seus projetos e com maior capacidade de entender e empatizar com
seus clientes”, reforçando os estereótipos de gênero ao criar um modelo unidi-
mensional de profissional.
O estereótipo de mulher e a existência da ideia de que existem caracte-
rísticas e habilidades naturalmente femininas impacta na forma como a história
do design é contada a partir do momento em que criações feitas por mulheres
são frequentemente consideradas fruto de um instinto natural, enquanto aque-
las feitas por homens são valorizadas formal e cientificamente como habilida-
des intelectuais. Um exemplo citado por Buckley (2012) é de Sonia Delaunay,
pintora e designer, e seu marido Robert Delaunay. Embora trabalhassem em
parceria, Sonia é notada por historiadores por seu sentido “instintivo” das co-
res, enquanto seu marido é citado como o criador de uma teoria das cores.
Ortner lista os possíveis motivos desta associação:

(1) woman’s body and its functions, more involved more of the time with “spe-
cies life,” seem to place her closer to nature, in contrast to man’s physiology,
which frees him more completely to take up the projects of culture; (2) wom-
an’s body and its functions place her in social roles that in turn are considered
to be at a lower order of the cultural process than man’s; and (3) woman’s tra-
ditional social roles, imposed because of her body and its functions, in turn
55

give her a different psychic structure, which, like her physiological nature and
her social roles, is seen as being closer to nature. (1974, pp. 73-74)37

Sob o ponto de vista do mercado design gráfico, Meer (2012) argumen-


ta que as descrições restritivas das mulheres como feminina as limitam em
duas maneiras: 1) designers mulheres são reduzidas a um traço de personali-
dade específico, não sendo assim tratadas como iguais, e 2) uma avaliação
mais positiva do estilisticamente feminino pode influenciar aquelas que aspiram
pelo sucesso a tentarem corresponder a estas expectativas.
Ainda sobre a questão da subvalorização da produção criativa femini-
na, Scotford também atenta à questão da abordagem dada à mulheres relacio-
nadas a homens criativos, frequentemente eclipsadas pelos seus parceiros,
aos quais muitos dos seus méritos são creditados:

As feminist art and design historian have pointed out, for centuries talented
and creative women, connected by blood or marriage to creative men, have
been denied a historical place based on their own accomplishments for a vari-
ety of reasons to do with male power to define what is of value and to control
access and information. (2012, p.172)38

O discurso que naturaliza as aptidões femininas e valoriza a cientifici-


dade das criações masculinas pode ser considerado um dos principais respon-
sáveis pela falta de representatividade das mulheres na história do design.

37
“(1) o corpo da mulher e suas funções, mais envolvidas na maior parte do tempo com a "vida da
espécie", parecem colocá-la mais próxima da natureza, em contraste com a fisiologia do homem, que o
libera mais completamente para assumir os projetos da cultura; (2) o corpo da mulher e suas funções a
colocam em papéis sociais que, por sua vez, são considerados em uma ordem inferior do processo
cultural do que os do homem; E (3) os papéis sociais tradicionais da mulher, impostas por seu corpo e
suas funções, por sua vez, lhe dão uma estrutura psicológica diferente, que, como sua natureza
fisiológica e seus papéis sociais, é vista como mais próxima da natureza.” (Tradução nossa)
38
“Como historiadoras de arte e design feministas tem apontado, durante séculos, mulheres talentosas e
criativas, ligadas por sangue ou casamento a homens criativos, têm sido negadas um lugar histórico
baseado em suas próprias realizações por uma variedade de razões que têm a ver com o poder
masculino de definir o que é de valor e de controlar o acesso e a informação.” (Tradução nossa.)
56

Reconhecer as aptidões como resultado de um esforço contínuo e não somen-


te de um “dom natural” é essencial para uma abordagem justa da contribuição
das mulheres ao longo da história do design, como defende Ortner:

Woman is not “in reality” any closer to (or further from) nature than man – both
have consciousness, both are mortal. [...] The result is a (sadly) efficient feed-
back system: various aspects of woman’s situation (physical, social, psycho-
logical) contribute to her being seen as closer to nature, while the view of her
as closer to nature is in turn embodied in institutional forms that reproduce her
situation. The implications for social change are similarly circular: a different
cultural view can only grow out of a different social actuality; a different social
actuality can only grow out of a different cultural view. (1974, p.87)39

Este tema está intimamente ligado com a próxima questão que aborda-
remos: a definição, pelos historiadores de o que é design e, ainda mais impor-
tante, o que é bom design, e a influência das questões de gênero na
construção destas definições ao longo da história.

O que é design e o que é bom design. O processo de historicização


do design parte da delimitação do objeto de estudo, ou seja, de o que é design.
Embora existam diversas definições publicadas e amplamente divulgadas, este
ainda é um tema que merece atenção, como relatam Breuer e Meer, autoras
de Women in Graphic Design 1890-2012:

39
“A mulher não está "na realidade" mais próxima (ou mais longe) da natureza do que o homem - ambos
têm consciência, ambos são mortais. [...] O resultado é um sistema de feedback (tristemente) eficiente:
vários aspectos da situação da mulher (física, social, psicológica) contribuem para que ela seja vista como
mais próxima da natureza, enquanto a visão dela como mais próxima da natureza é por sua vez
encarnado em formas institucionais que reproduzem sua situação. As implicações para a mudança social
são igualmente circulares: uma visão cultural diferente só pode surgir de uma realidade social diferente;
Uma realidade social diferente só pode crescer a partir de uma visão cultural diferente.” (Tradução nossa.)
57

The problem of describing the occupation of the female graphic designer is,
therefore, characterised in part by the indeterminate identity of this field of
study, both in terms of its narrative and disciplinary affiliations. (2012, p.43)40

Uma das principais prerrogativas que estes conceitos impõem a um ob-


jeto de design - tanto gráfico quanto industrial, é sua relação com a indústria e
a produção em massa, como coloca Tomás Maldonado (1961), em uma das
principais definições de design, feita em uma conferência titulada Education for
design:

Design é uma atividade projetual que consiste em determinar as propriedades


formais dos objetos a serem produzidos industrialmente. Por propriedades
formais entende-se não só as características exteriores, mas, sobretudo, as
relações estruturais e funcionais que dão coerência a um objeto tanto do pon-
to de vista do produtor quanto do usuário.41

Segundo Buckley (1986), estas definições baseadas na industrialização


vêm sido contestadas por historiadoras feministas, pois apenas consideram
que a natureza do design está ligada a somente um meio de produção, e ex-
cluem a produção artesanal, consequentemente deixando de fora da história as
criações de muitas mulheres que, por muito tempo, não tiveram acesso a mei-
os industriais nem a escolas de design – e mesmo assim produziram design de
diversas outras maneiras. A autora defende, ainda, que não somente é impor-
tante ampliar o espectro de o que é design, mas também observar a imposição
de uma definição de “bom design”, baseada exclusivamente na estética – des-
considerando, assim, questões ligadas ao consumo e à produção do design.

40
“O problema de descrever a ocupação do designer gráfico feminino é, portanto, caracterizado, em
parte, pela identidade indeterminada desse campo de estudo, tanto em termos de sua afiliação narrativa
quanto disciplinar.” (Tradução nossa.)
41
Esta definição foi aceita pelo International Council of Societies of Industrial Design (ICSID) em 1969 e
utilizada pela Organização até 1971, quando deixou de utilizar qualquer definição de design de forma
oficial.
58

Esta definição, criada, difundida e imposta por grupos dominantes, serve aos
interesses destes e é difundida como sob a máscara da “universalidade”.
A estética dominante, no caso do design, é fruto do modernismo, que
enfatizou a inovação e a experimentação como fatores de diferenciação no
design, e que esteve (e está) diretamente ligado ao capitalismo, à produção e
ao consumo em massa, como afirma Buckley:

Although designers now operate in a postmodernist context, many design his-


torians unconsciously adopt modernist criteria when deciding what should en-
ter the history books. The concept of differentness is still privileged by histori-
historians, thus revealing the structural relationship between historians and the
designs they promote within capitalism. (1986, p.13)42

A revisão nestes conceitos permitiria a inclusão nos escritos do design


e, consequentemente, no ensino do design, daquelas que, apesar de estarem
restritas aos ambientes privados, utilizaram sua criatividade e habilidades artís-
ticas na criação de objetos de design.

O foco na autoria e a simplificação do processo projetual. Segundo


Scotford (2012), historiadores atualmente centralizam no autor e em caracterís-
ticas formais o significado de um objeto, ignorando componentes importantes
de significado, como as interações entre usuário e objeto, o contexto social, a
co-criação, etc. A autora argumenta que esta perspectiva exclui as mulheres e
suas contribuições, visto que sua escrita, feita pelo ponto de vista predominan-
temente masculina, ignora as diversas interações que ocorrem durante o pro-
cesso de criação e que tem grande importância na formação da vida

42
“Embora designers agora operam em um contexto pós-modernista, muitos historiadores do design
inconscientemente adotam critérios modernistas ao decidir o que deve entrar nos livros de história. O
conceito de ‘ser diferente’ ainda é privilegiado pelos historiadores, revelando assim a relação estrutural
entre os historiadores e os projetos que promovem dentro do capitalismo.” (Tradução nossa.)
59

profissional das mulheres, como entre o núcleo profissional e o pessoal, e o


privado e o público. São, também, indiferentes aos diversos caminhos trilhados
pelas mulheres, à natureza das colaborações entre colegas e os papéis políti-
cos e sociais incorporados por estas profissionais.
Buckley (1986) afirma que o design é um processo coletivo e, por isto
seu significado pode ser determinado pela análise da interação entre indiví-
duos, grupos e organizações dentro de estruturas sociais específicas.
Uma abordagem menos focada na autoria e mais comprometida com a
análise do contexto geral dos projetos daria mais visibilidade histórica, por
exemplo, a:
• Designers que trabalham em parcerias e co-criam entre si;
• Designers que trabalham em ambientes não-corporativos;
• Designers que produzem em grandes escritórios, sob a assinatura
dos mesmos;
• Outras infinitas possibilidades de se criar design, que não pelos
meios tradicionais.

A influência dos papeis de gênero tradicionais. Apesar da evolução


nos direitos das mulheres e a de sua progressiva inserção no mercado de
trabalho, as profissionais ainda esbarram em uma questão com grande influên-
cia no seu dia-a-dia e em sua evolução profissional: a influência dos papeis de
gênero tradicionais, as expectativas da sociedade em relação a si e as barrei-
ras impostas pela divisão sexual do trabalho.
A seguir, abordaremos duas questões relativas à influência dos papeis
de gênero no trabalho feminino: o conflito entre a carreira e a vida pessoal e a
influência dos papéis de gênero na percepção de sucesso, fama e ambição
entre as mulheres.

Carreira versus vida pessoal. À primeira vista a discussão pode pa-


recer ultrapassada, porém a distribuição desigual dos trabalhos domésticos e,
principalmente, de criação dos filhos, assim como a pressão social pela mater-
60

nidade, ainda têm grande influência no desenvolvimento profissional das mu-


lheres. Pereira de Melo, Considera e Di Sabbato afirmam que:

Embora essa trajetória do “progresso feminino” seja mensurada pelas Ciên-


cias Sociais através de indicadores econômicos e sociais relacionados à esfe-
ra pública e aponte para as transformações em curso, estas nada dizem a
respeito das funções tradicionais que as mulheres exercem secularmente e
que permanecem como encargo específico feminino. (2007, p. 436)

Sorj, Fontes e Machado (2007) analisam dados estatísticos e formulam


um panorama da situação do trabalho feminino no Brasil, de acordo com a
estrutura familiar. Entre suas conclusões, podemos destacar:
• Há um declínio nas taxas de fecundidade e no número de filhos por
família, igualando as estatísticas aos países desenvolvidos (p.578);
• O acesso a creches e pré-escolas ainda é limitado. “[...] apenas em
39% dos domicílios com crianças até seis anos elas freqüentavam
creches e pré-escolas” (p.576);
• Houve queda no número de famílias com filhos e parentes, o que
pode indicar que “as soluções privadas para a conciliação entre
trabalho e cuidados familiares, que se assenta no apoio dos
parentes, sobretudo das avós, pode estar hoje menos disponível do
que no passado” (p.580);
• Enquanto as famílias compostas somente por mulher e filhos
apresentam o maior percentual de pobres 43 no país (35,4%),
aquelas que contam também com parentes tem uma queda
considerável na proporção de pobres (27,5%), o que aponta para a

43
“A pobreza foi definida como pessoas vivendo em famílias com renda per capita inferior à linha da
pobreza. A linha da pobreza é o dobro da linha de indigência, que é definida pelos custos de uma cesta
básica alimentar que contemple as necessidades de consumo calórico mínimo de um indivíduo. A linha da
pobreza foi estimada, em setembro de 2005, em 163 reais.” (Sorj et al., 2007, p.581)
61

possibilidade de que outros membros da família estejam, de alguma


forma, compensando a ausência do marido;
• Em comparação às cônjuges44 sem filhos, aquelas com filhos têm
menor participação no mercado de trabalho;
• A renda é maior entre mulheres que vivem sozinhas e sem filhos
dependentes.
No contexto de Portugal, Matias, Andrade, & Fontaine (2012) afirmam
que o modelo dominante de papéis de gênero segue sendo tradicional, no qual
o homem é considerado o provedor principal da família e a mulher é responsá-
vel pelas tarefas domésticas e o bem-estar emocional. Os autores acrescentam
que, do ponto de vista do doing gender, estes papéis tendem a ser ativados
após o casamento ou a paternidade/maternidade, situações nos quais as iden-
tidades de gênero são mais salientes.
As dificuldades encontradas pelas mulheres em função da incoerência
entre a evolução do trabalho feminino e a persistência dos modelos familiares
tradicionais, que seguem colocando-as como principais responsáveis pelo
cuidado da casa e da família e pressionando-as a em direção à maternidade
podem ter diversas consequências, como a redução da carga horária de traba-
lho, a preferência pelo trabalho autônomo e o home office e até o abandono
total da carreira após a maternidade.
Rivas e Rodríguez afirmam:

[La doble participación] obliga a las mujeres a una práctica constante de paso
de un trabajo a otro, de unas características específicas de la actividad fami-
liar a unos horarios y valores del trabajo asalariado, de una cultura del cuida-
do a una cultura del beneficio, que les exige interiorizar tensiones, tomar

44
Os autores utilizam a palabra (a) cônjuge para identificar as mulheres que vivem com seus
maridos/companheiros.
62

decisiones y hacer elecciones a las que los varones no están obligados.


(2008, p. 57)45

As autoras defendem, ainda, que é falso o dilema entre decisões voluntárias e


não voluntárias em relação a forma de trabalhos preferidas. Nas relações de
gênero patriarcais, as mulheres – determinadas por sua situação no lar e pelas
demandas das empresas – não têm o poder de escolher livremente a duração
e extensão da sua jornada (Rivas & Rodríguez, 2008).
Stavro (2012) busca, em “Beyond the glass ceiling – an open discussi-
on”, reunir depoimentos de diversas designers acerca das questões de gênero
no âmbito do design gráfico. Entre as contribuições, podemos destacar os
seguintes aspectos citados como importantes para a conciliação entre materni-
dade e carreira:
• A divisão da responsabilidade com o parceiro:

“My husband – also a graphic designer – works (and struggles) as much as I


do. Besides running our separate practices, we are both active in the lecture
circuit and sit in jury panel; we systematically take turns to do this.” 46 (p.365)

• Iniciativas de suporte no ambiente de trabalho:

“While it’s true that maternity leave gives a bit of security, when working for a
large company, the financial support is quite minimal. The fact that I have my
job waiting when I’m ready to come back is great.” 47 (p.366)

45
“[A dupla participação] obriga as mulheres a uma prática constante de transição de um trabalho ao
outro, de características específicas da atividade familiar aos horários e valores do trabalho assalariado,
de uma cultura de cuidado para uma cultura de lucro, que exige que interiorizem tensões, tomem
decisões e façam escolhas as quais os homens não estão obrigados.” (Tradução nossa.)
46
Depoimento de Astrid Stavro: “Meu marido – também um designer gráfico – trabalha (e se esforça),
tanto quanto eu. Além de administrar nossos negócios separados, soms ambos ativos no circuito de
conferências e fazemos parte em paineis de júri; nós sistematicamente nos revezamos para fazer isso."
(Tradução nossa.)
63

• Políticas governamentais que promovam a igualdade de gênero:

“The English government could help by giving fathers more paternity rights – it
would make a more lot sense if you could share this responsability” 48 (p.366)

“Some countries offer more government support – where they don’t expect
people to work late hours, which isn’t the case in Portugal […] Some women
quit their practice mainly because of lack of support and resources for moth-
ers” 49 (p.366)

É necessário, porém, fazer o recorte social adequado e considerar que


grande parte das profissionais do design gráfico estão em uma classe privilegi-
ada, que tem acesso a estruturas de apoio – creches e escolas privadas, em-
pregadas domésticas e cuidadoras – o que possibilita que a conciliação entre o
trabalho e o cuidado doméstico seja facilitada. Além disto, a alta escolaridade é
o fator de influência em uma divisão dos trabalhos domésticos mais igualitária
(Torres, 2008). Esta não é, portanto, uma realidade uniforme: enquanto profis-
sionais com maior experiência e poder aquisitivo têm maiores condições de
conciliar a vida pessoal com a profissional, jovens profissionais são as que
enfrentam maiores dificuldades.

Sucesso, fama, ambição e ego. Entre os traços de personalidade


mais estudados nas investigações de gênero está a ambição. Segundo Homer
(1972), citado por Miller e Garrison (1982), mulheres prevêem uma rejeição

47
Depoimento de Sonya Dyakova: “Embora seja verdade que a licença de maternidade dá um pouco de
segurança, quando se trabalha para uma grande empresa, o apoio financeiro é mínimo. O fato de eu ter
meu trabalho esperando quando estiver pronta para voltar é ótimo.” (Tradução nossa.)
48
Depoimento de Kirsty Cartner e Emma Thomas, co-fundadoras do estúdio “A Practice for Everyday
Life”: “O governo inglês poderia ajudar dando aos pais mais direitos de paternidade – faria muito mais
sentido se pudéssemos dividir essa responsabilidade." (Tradução nossa.)
49
Depoimento de Lizá Ramalho: “Alguns países oferecem mais apoio governamental – onde não
admitem trabalho até horas tardias, o que não acontece em Portugal [...] Algumas mulheres abandonam a
sua prática principalmente devido à falta de apoio e de recursos para as mães." (Tradução nossa.)
64

social ao terem sucesso em carreiras atípicas para seu gênero, o que é inter-
pretado como motivo para evitar o sucesso. Embora pesquisas subsequentes
não tenham confirmado diferenças de gênero no medo do sucesso, este é um
fator a ser considerado ao observar diferenças nas aspirações profissionais
sob o ponto de vista de gênero.
Stavro aborda esta questão a partir da discussão com profissionais,
como Mia Frostner, que associa a maior visibilidade de designers homens à
sua socialização, que os encoraja mais a se expor:

There seem to be more famous male graphic designers without a doubt. From
an early age boys are more encouraged to be seen and heard more than girls.
Also, stereotypical male qualities are often seen as more desirable. I think ce-
lebrity in itself is not desirable and shouldn’t be mixed up with success. (2012,
p.363)

Lizá Ramalho faz a mesma associação, ao afirmar que “sentia que meu
nível de ambição era algo sobre o qual eu deveria ser discreta, quase como se
fosse rude para uma mulher ser abertamente ambiciosa” e que “a história e a
própria sociedade esquecem, ignoram e subvalorizam as mulheres; em con-
traste, os heróis são sempre homens” 50 (p.364).
Bruce e Lewis colocam como uma das barreiras enfrentadas pelas mu-
lheres em busca de sucesso profissional51 o fato de serem orientadas à tarefa
(task-oriented) ao invés de orientadas à carreira (carreer-oriented), e afirmam:

If the organizational culture is male dominated, women get the subtle mes-
sage that they are not really expected to do those things, or at least to do

50
Traduções nossas. No original: “I felt that my level of ambition was something that I had to keep quiet
about, almost if it was rude for a woman to be openly ambitious” / “History and society itself forgets,
ignores and undervalues women; in contrast, the heroes are always men.”
51
No contexto do texto, os autores associam “sucesso” a visibilidade e acesso a altos escalões.
65

them well. They may react by withdrawing from competition and working even
harder at their design tasks. (1990, p.119)52

Considerando a diferenças de socialização entre homens e mulheres e


sua consequências, Vienne (2012) concebe o design gráfico como uma possi-
bilidade de manifestar-se livremente sem a necessidade de falar em público. A
autora cita Cindy Jennings, designer de comunicação corporativa, que afirma
que “atrás do véu do mundo impresso, mulheres podem encontrar sua voz [...]
a expressão gráfica exige menos que estar em um pódio ocupando o tempo de
todos”53. Vienne acrescenta que a maior crítica feita por mulheres à bienal de
design AIGA em Miami, além de ser dominada por homens, é que foi terrivel-
mente chata, e conclui:

Access to printed world gives graphic designers an aura of authority. While


men in the communication field are quite comfortable with this state of affairs,
women tend to be critical of speakers who do not take advantage of this fortui-
tous situation to address important environmental, social or community issues.
(2012, p.337)54

Considerações para a Fase Seguinte

Os capítulos apresentados até este momento foram baseados na revi-


são da literatura e de sua análise crítica através do contraponto entre informa-
ções provenientes de diversas áreas do conhecimento. Com base nesta

52
“Se a cultura organizacional é dominada pelo sexo masculino, as mulheres recebem a sutil mensagem
de que elas não são realmente esperadas para fazer essas coisas, ou pelo menos fazê-las bem. Eles
podem reagir retirando-se da competição e trabalhando ainda mais em suas tarefas de design.”
(Tradução nossa)
53
Tradução nossa.
54
“O acesso ao mundo impresso dá aos designers gráficos uma aura de autoridade. Enquanto os
homens no campo da comunicação estão bastante confortáveis com este estado de coisas, as mulheres
tendem a ser críticas a oradores que não aproveitam esta situação fortuita para lidar com importantes
questões ambientais, sociais ou comunitárias.” (Tradução nossa.)
66

análise, foi possível ter maior conhecimento sobre a história da inserção da


mulher na profissão de designer gráfica e da produção científica já desenvolvi-
da sobre o tema. Esta fase permitiu, também, conhecer aspectos importantes
da situação atual da mulher neste contexto a partir de estudos científicos sobre
o tema.
A seguir, a partir do Capítulo 4, será apresentada a etapa de Inquéritos
e Entrevistas, parte importante desta investigação, que buscará validar as
informações apresentadas até então, conduzindo à conclusão deste trabalho.
67

Capítulo 4 - Inquéritos e Entrevistas

Em seguimento à investigação teórica foi desenvolvido um inquérito,


aplicado a designers gráficas Brasileiras e Portuguesas de diferentes faixas
etárias, áreas de atuação e posições hierárquicas. Após a aplicação do inquéri-
tos, buscou-se entrevistar as participantes que demonstraram maior interesse
com o tema, assim como aquelas que forneceram respostas inesperadas ou
que exigiam um maior aprofundamento.
A seguir, descreveremos o processo de seleção das participantes e de
construção do inquérito e das entrevistas, assim como os objetivos das ques-
tões apresentadas.

Seleção de Participantes

É importante ter em consideração que a heterogeneidade do grupo traz


variáveis que tem tanto impacto positivo nos resultados – opiniões de pessoas
de diversas vivências enriquece a investigação – quanto impacto negativo – é
maior a dificuldade em identificar padrões em um grupo heterogêneo. Tendo
isto em conta, foi decidido utilizar um grupo com indivíduos de características
variadas, a fim de focar em experiências individuais, e separá-lo em subgrupos
com uma característica em comum, a fim de buscar padrões de experiências.
As características consideradas na seleção das participantes foram:
• Faixa etária e tempo no mercado de trabalho: procurou-se ter
contribuições de mulheres de diferentes faixas etárias, a fim de criar
um grupo heterogêneo que permitisse a observação das variáveis
temporais dos assuntos abordados;
• Localização: foram selecionadas participantes de diversos estados
do Brasil, assim como participantes de diferentes regiões de
Portugal;
Com o objetivo de levantar os dados necessários para a criação do
grupo de estudo e dos subgrupos, um inquérito inicial foi aplicado em 54 desig-
ners gráficas, nos dois países estudados.
68

Inquérito Inicial – Triagem

O inquérito inicial55 teve como objetivo a coleta de dados básicos das


participantes, a fim de criar os subgrupos de análise – de acordo com a nacio-
nalidade e o tempo no mercado e ocupação atual. Nesta etapa, foi utilizado
somente um modelo de inquérito para todas as participantes. Os dados solici-
tados foram:
• Nome Completo56;
• Idade;
• Escolaridade;
• Área(s) de Atuação;
• Titulação;
• Tempo de atuação no mercado do Design;
• Local de trabalho atual;
• Cargo/ocupação atual;
• Posição hierárquica na empresa em que trabalha;
• Porte da empresa em que trabalha/é sócia;
• Cidade de atuação.

Inquérito Principal

Para uma análise mais focada, o inquérito principal foi dividido em dois
modelos: um deles aplicado à designers com menos de dez anos de atividade
no mercado de trabalho (G1) e outro aplicado àquelas que já estão há mais de
dez anos no mercado (G2). No segundo, em função do maior tempo de atua-

55
A íntegra do inquérito pode ser consultada no Anexo I.
56
Os nomes das paticipantes serão citados somente nos casos em que a identificação foi autorizada. Nos
casos contrários, serão utilizadas as iniciais de nome e sobrenome.
69

ção no mercado, a experiência profissional das participantes foi avaliada em


duas etapas: os primeiros cinco anos de trabalho e os anos seguintes. Partici-
para desta etapa as profissionais que manifestaram interesse no Inquérito
Inicial e que dispunham de tempo para colaborar, selecionadas de forma a
manter um número similar de participante em cada grupo e subgrupo.
O principal objetivo desta etapa foi avaliar a percepção57 das partici-
pantes em relação à influência do seu gênero e de outras questões ligadas ao
gênero na sua trajetória acadêmica e profissional, além de levantar dados
sobre a experiência pessoal de cada uma delas. A obtenção destes dados e o
cruzamento das respostas das participantes de cada grupo, assim como a
análise das diferenças verificadas entre os dois grupos de análise, permitiu a
identificação de padrões que contribuem para uma melhor compreensão do
cenário da investigação.
Três aspectos principais foram analisados neste inquérito:
• Reconhecimento do gênero como aspecto de influência no
desenvolvimento acadêmico e profissional – padrões entre grupos
etários e/ou geográficos;
• Influência da representatividade e da visibilidade (ou da percepção
destas) no desenvolvimento acadêmico e profissional;
• Influência das expectativas e pressões do núcleo familiar e da
sociedade como um todo em relação à mulher no desenvolvimento
acadêmico e profissional;
Nos Anexos II e III podem ser consultadas as questões que compu-
nham cada um dos inquéritos, assim como seus objetivos.

57
Considerando que as respostas das participantes são influenciadas não somente pelas suas
experiências mas também por outros fatores pessoais, os resultados podem apenas refletir as
percepções das mesmas em relação aos fatos, e não os fatos em si.
70

Entrevistas

As entrevistas, programadas para serem realizadas após os inquéritos,


tiveram como objetivos principais levantar dados mais específicos sobre as
profissionais em questão, tirando dúvidas surgidas nos inquéritos e validar as
principais conclusões da investigação.

Roteiro básico de entrevistas. Os roteiros das entrevistas foram divi-


didos em quatro subgrupos: Brasileiras com menos de 5 anos de mercado (G1-
BR), Portuguesas com menos de 5 anos de mercado (G1-PT), Brasileiras com
mais de 10 anos de mercado (G2-BR), e Portuguesas com mais de 10 anos de
mercado (G2-PT). As questões básicas desenvolvidas para cada grupo estão
descritas abaixo, na Tabela 1.

Tabela 1

Questões Básicas da Entrevista

G1-BR G1-PT G2-BR G2-PT

Percebi, durante a Percebi, durante a Percebi, durante a Percebi, durante a


investigação, que há investigação, que há investigação, que há investigação, que há
um certo "tabu" entre um certo "tabu" entre um certo "tabu" entre um certo "tabu" entre
as profissionais em as profissionais em as profissionais em as profissionais em
posicionar-se como posicionar-se como posicionar-se como posicionar-se como
"mulher designer". "mulher designer". "mulher designer". "mulher designer".
Como vês esta Como vês esta Como vês esta Como vês esta
situação? situação? situação? situação?

Qual a sua opinião Qual a sua opinião Qual a sua opinião Qual a sua opinião
sobre a visibilidade sobre a visibilidade sobre a visibilidade sobre a visibilidade
feminina no Design feminina no Design feminina no Design feminina no Design
Gráfico no Brasil? Gráfico em Portugal? Gráfico no Brasil? Gráfico em Portugal?
71

G1-BR G1-PT G2-BR G2-PT

A designers com *Não foi feita a Durante sua trajetória Durante sua trajetória
menor tempo de questão equivalente profissional, houve profissional, houve
mercado – grupo no às profissionais decisões que tiveste decisões que tiveste
qual está incluída, Brasileiras pois a de tomar que crês de tomar que crês
tendem a expressar tendência à que seus que seus
de forma mais crítica expressar-se de companheiros companheiros
sua percepção nas forma mais crítica não homens não homens não
desigualdades de foi verificada neste enfrentaram? enfrentaram?
gênero. O que pensas grupo.
que mudou?

Para cada entrevistada, foram feitas também questões relativas às su-


as respostas ao Inquérito Principal, a fim de levantar informações mais especí-
ficas sobre a experiência pessoal da entrevistada e/ou tirar dúvidas relativas a
comentários feitos no inquérito. As variações consideraram aspectos como:
forma de atuação profissional da entrevistada (empresa própria, freelancer,
acadêmica, etc.) e também respostas ao inquérito principal correspondentes a
“pontos fora da linha” ou inesperadas, além da receptividade da entrevistada
ao tema. Na Tabela 2 podem ser consultadas as questões específicas.

Tabela 2
Questões Específicas da Entrevista

Grupo Pergunta

Professoras em Como professora, vocês percebe entre suas alunas um maior


Cursos de Design interesse em questões de gênero?
Gráfico
Qual a sua opinião sobre a visibilidade feminina no ensino do Design
– em bibliografias, referências, estudos de caso, etc.?

Sócias em estúdios Qual a proporção atual entre homens e mulheres na sua empresa, em
de Design Gráfico posições hierárquicas mais baixas (Estagiárias, Designers Jr., etc.)?
Esta é uma questão consciente ou aleatória?
Como empreendedora e, agora, chefe de outras mulheres, de alguma
maneira te vês responsável, juntamente com as tuas sócias, na
motivação e inspiração das tuas funcionárias?

Designers em Parece haver preferência entre as mulheres ao trabalho freelancer ou


Estúdios Individuais / empresas próprias de pequeno porte. Este foi o caminho que
Freelancers escolheste. Tens ideia do que a levou a esta escolha?
72

Capítulo 5 - Resultados e Discussões

A seguir, destacaremos os resultados obtidos após o desenvolvimento


da fase de inquéritos e entrevistas, por meio da análise das respostas recebi-
das, tanto as questões objetivas quanto os comentários58 opcionais.

A Amostra

Na fase de aplicação dos inquéritos obteve-se três respostas no G2-PT


e três respostas no G1-PT, um número abaixo do esperado. Destas, duas de
cada grupo aceitaram ser contatadas novamente e nenhuma fez qualquer
comentário, tornando difícil a análise destes grupos. Entre as Brasileiras, foram
recebidas oito respostas no G2-BR e treze respostas no G1-BR. Entretanto, foi
possível perceber uma maior dificuldade entre as designers mais experientes.59
Tendo em consideração a amostra, reitera-se que os padrões que puderam ser
verificados não são suficientes para chegar a conclusões finais, pois represen-
tam a visão de apenas parte de um grupo – majoritariamente designers Brasi-
leiras. Porém foi possível fazer inferências por meio de comparação entre os
grupos consultados e em casos de respostas unânimes ou de maioria massiva.
Espera-se que os pontos aqui apresentados contribuam ponto de partida para
investigações mais aprofundadas. Na

Tabela 3 estão descritas todas as participantes dos inquéritos, o país


onde vive, tempo no mercado de trabalho, área de atuação profissional e cida-
de onde atua.

58
Alguns comentários transcritos neste capítulo foram editados por questões de ortografia, clareza, ou
para proteger a identidade das participantes.
59
Esta questão é analisada mais detalhadamente a partir da página 74.
73

Tabela 3
Participantes dos Inquéritos

Tempo no Identificação da
País mercado Nº Participante Área de Atuação Cidade

Empregada em empresa Rio de


1 K.F.
de até 9 funcionários Janeiro

Empregada em empresa
2 R.R. Porto Alegre
de 10 a 49 funcionários

Empregada em empresa
3 G.P. de mais de 100 São Paulo
funcionários

Empregada em empresa
4 G.G. Porto Alegre
de até 9 funcionários

5 M.G. Freelancer Porto Alegre

Sócia de empresa de até


6 C.C. Porto Alegre
9 funcionários

Menos de Empregada em empresa


7 B.R. Florianópolis
dez anos de 10 a 49 funcionários
(G1-BR)
Bolsista de Mestrado em
8 M.W. Florianópolis
Brasil Universidade

9 H.A. Freelancer Porto Alegre

Empregada em empresa
10 G.L. Porto Alegre
de 10 a 49 funcionários

Empregada em empresa
Rio de
11 R.B. de mais de 100
Janeiro
funcionários

Empregada em empresa
12 N.L. São Paulo
de 50 a 99 funcionários

Empregada em empresa
13 C.L. de mais de 100 Curitiba
funcionários

Mais de Sócia em empresa de 10


1 T.K. Porto Alegre
dez anos a 49 funcionários
(G2-BR)
Sócia em empresa de Rio de
2 F.S.
até 9 funcionários Janeiro
74

Rio de
3 M.L. Freelancer
Janeiro

4 C.P. Freelancer Curitiba

Sócia em empresa de 10
5 V.Q. São Paulo
a 49 funcionários

Sócia de empresa de até Rio de


6 J.H.
9 funcionários Janeiro

Sócia de empresa de 10 Rio de


7 A.C.
a 49 funcionários Janeiro

Freelancer / Belém / Rio


8 F.M.
Universidade de Janeiro

Empregada em empresa
1 M.F. Lisboa
de 10 a 50 funcionários
Menos de
dez anos Atuando fora do
2 T.M. Lisboa
(G1-PT) mercado do Design

Empregada em empresa
3 S.G. Lisboa
Portugal de até 9 funcionários

1 M.B. Universidade Tomar


Mais de
dez anos 2 J.C. Universidade Lisboa
(G2-PT)
Sócia em empresa de
3 R.A. Lisboa
até 9 funcionários

Padrões Verificados nos Inquéritos

A diferença na percepção das questões de gênero entre grupos etários


foi um dos principais pontos percebidos. Tanto nas respostas objetivas quanto
nos comentários, participantes com menor tempo de mercado (G1) expressa-
ram de maneira mais crítica sua percepção das desigualdades de gênero.
Embora nenhuma das participantes, em nenhum dos grupos, tenha considera-
do que seu gênero teve influência positiva na sua trajetória profissional, a maior
parte das participantes do G2 – designers com mais de dez anos de mercado –
considerou que seu gênero não influenciou na trajetória profissional e poucas
responderam que houve influência negativa. Entre as participantes do G1 tam-
75

bém houve uma maior percepção de que o gênero não influenciou, mas o nú-
mero de participantes que respondeu que houve influência negativa foi consi-
deravelmente superior em comparação ao G2.
Ao analisar os comentários das participantes, foi possível reconhecer
ainda melhor as diferenças na percepção das desigualdades. Por serem opcio-
nais, não somente o conteúdo dos comentários pôde ser analisado, mas tam-
bém o interesse das participantes em aprofundar a questão. Enquanto as
participantes do G2 abstiveram-se de fazer comentários ou destacaram a moti-
vação causada pela diferença e a repercussão positiva na sua carreira, as
profissionais do G1, que estão no início da sua trajetória profissional, reconhe-
cem as diferenças como negativas, em um posicionamento mais crítico, com-
partilhando mais experiências pessoais de desigualdade de gênero. A seguir,
dois exemplos que ilustram a diferença percebida:

Eu nunca me senti menos capaz que homem nenhum na minha área, e sem-
pre estive muito confortável com esse sentimento. (F.S., participante do G2,
Rio de Janeiro, Brasil)

Como mulher, sinto que me cobro muito mais para ter tanto sucesso na car-
reira, nos relacionamentos, manter contato com amigos e família, fazer
networking etc. em comparação com os homens com quem mais interajo.
(G.P., participante do G1, São Paulo, Brasil)

O contato com figuras inspiradoras durante a trajetória acadêmica e


profissional foi considerado como uma influência positiva por ambos os grupos.
Por sua vez, a ausência deste contato foi interpretado de distintas maneiras
pelas profissionais: como fator de influência negativa, como fator sem influên-
cia e, surpreendentemente, uma minoria considerou como fator de influência
positiva sob o argumento de que a percepção desta falta as estimulou a mudar
o cenário. Novamente, percebeu-se a abordagem mais crítica vinda das profis-
sionais com menor tempo de mercado. A seguir, transcrevemos dois comentá-
rios que exemplificam esta diferença:
76

A influência da ausência de figuras femininas foi positiva por me incentivar a


criar e fomentar tais referências. No entanto, não acho positiva a ausência de
figuras femininas. (A.C., participante do G2, Rio de Janeiro, Brasil)

Enquanto passamos nossa graduação lendo Ellen Lupton sem nem nos dar-
mos conta que ela é mulher, temos predominantemente referenciais masculi-
nos, dando a impressão de que somente há bons designers homens. (R.B.,
participante do G1, Rio de Janeiro, Brasil)

Seguindo com a comparação por faixas etárias, pôde-se verificar que


as profissionais do G1 – de formação mais recente – foram mais expostas a
referências de figuras inspiradoras no âmbito acadêmico. Entretanto, a grande
maioria relata que as referências apresentadas ainda são majoritariamente
masculinas. Esta evolução pode ser considerada um fator positivo e uma opor-
tunidade a ser considerada na criação de estratégias para a redução nas desi-
gualdades de gênero.

100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
G1 - Menos de 10 anos G2 - Mais de 10 anos
Majoritariamente homens 73% 94%
Em proporção semelhante
18% 6%
entre homens e mulheres
Majoritariamente mulheres 9% 0%

Gráfico 2. Respostas a “As figuras de destaque apresentadas em aula


foram...”.
77

A seguir, alguns depoimentos sobre esta questão:

Em um momento da minha formação surgiu o questionamento com outras


meninas da graduação sobre 'quem são as mulheres que atuam no mercado
de design?' porque em toda nossa formação grande parte dos profissionais e
acadêmicos citados em aula são homens e tornam-se (de forma obrigatória)
nossas referências durante o trajeto. (K.F., participante do G1, Rio de Janeiro,
Brasil)

No meu curso de design havia uma quantidade similar entre homens e mulhe-
res, mas quando se tratava da literatura e história, certamente havia muito
mais homens sobre quem aprendemos nos livros. Na época não reparava
pois achava que havia um balanço na turma que compensava ("estávamos
mudando a história"), mas hoje vejo como isso faz toda a diferença. Prova-
velmente pelo fato de os homens culturalmente se imporem mais profissio-
nalmente, eles acabaram ficando mais registrados. (G.P., participante do G1,
Porto Alegre, Brasil)

No contexto do ambiente de trabalho, em ambos os grupos verificou-se


que a maior parte das participantes tem ou teve recentemente chefes homens.
Há diferença, porém, na percepção da influência deste aspecto entre os gru-
pos. As participantes do G1, em sua maioria, consideram que as diferenças de
gênero no ambiente de trabalho tiveram influência negativa ou não tiveram
influência na sua trajetória. Em contraposição, as participantes do G2 não con-
sideram que este aspecto tenha influência negativa, afirmando que não ouve
influência ou houve influência positiva. Também é perceptível que uma parcela
considerável das participantes do G2 deixou de ter chefes – por terem aberto a
própria empresa, passado a trabalhar como autônomas ou em universidades –
no decorrer de suas carreiras.
78

90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
G2 (Primeiros 5 G2 (Últimos 5
G1
anos de carreira) anos de carreira)
Majoritariamente homens 56% 82% 45%
Em proporção semelhante
31% 9% 18%
entre homens e mulheres
Majoritariamente mulheres 13% 9% 0%
Não se aplica / Não tive
0% 0% 36%
chefes

Gráfico 3. Respostas a “Seus chefes foram...”.

Entre os depoimentos, diversos relatos de situações de machismo fo-


ram registrados. No G2, os relatos se referem principalmente a situações pas-
sadas que mudaram o rumo das carreiras das participantes – por exemplo,
fazendo-as escolher trabalhar como autônomas ou abrirem escritórios próprios.
No G1, os relatos referem-se a situações atuais com as quais convivem diaria-
mente nos seus ambientes de trabalho.

Me demiti de emprego quando descobri que o designer que entrou depois de


mim ganhava mais do que eu. Não foi a primeira vez. Depois disso abri minha
empresa. Poderia dizer que foi positivo! (F.M., participante do G2, Belém,
Brasil)

[...] sempre passei por situações nos locais de trabalho em que os chefes,
que sempre foram homens, se prevaleciam pelo fato de serem homens. Ex-
plico: o tratamento com funcionárias mulheres era sempre mais agressivo, ou
menos cordial, do que com os homens. E, em umas das empresas em que fui
estagiária, presenciei diversos momentos em que os sócios da empresa fazi-
am comentários sobre aparência física das mulheres entrevistadas ou de cli-
entes. (G.G., participante do G1, Porto Alegre, Brasil)
79

Onde eu trabalho existem determinadas posições hierárquicas que são ocu-


padas por homens e mulheres de forma igualitária – porém somente no senti-
do numérico. Existem editores de arte homens e mulheres em igual número,
entretanto o peso e a visibilidade de cada um é completamente diferente. As
mulheres apenas editam as peças e fazem ajustes menores, enquanto as de-
cisões criativas ficam a cargo dos editores homens. (R.B., participante do G1,
Rio de Janeiro, Brasil)

Em geral, a percepção de diferenças na representatividade de gênero –


no ambiente acadêmico, na história do design, no ambiente profissional – foi
verificada em todos os grupos. Algumas diferenças foram percebidas entre
grupos etários, porém a predominância de homens tanto entre as figuras de
destaque, quanto entre professores e chefes, foi relatada pela maioria das
participantes. Não é unânime, entretanto, a percepção de que estas diferenças
tenham impacto negativo na trajetória profissional, apesar da quantidade con-
siderável de relatos de situações de desigualdade de gênero.

Análise do Processo, dos Resultados e Inferências

O processo de aplicação dos inquéritos e entrevistas e as particulari-


dades que surgiram neste contexto têm tanta importância para os resultados
desta investigação tanto quanto os dados apresentados no tópico anterior. A
dificuldade encontrada em obter respostas de determinados grupos e a falta de
aprofundamento às questões pode estar relacionada com o “tabu” citado por
Gerda Breuer e Julia Meer (2012), que relataram as mesmas dificuldades du-
rante o desenvolvimento do livro “Women in Graphic Design 1890-2012”. O fato
de que foi percebida menor abertura ao tema entre as designers Portuguesas
pode, também – e principalmente se considerados os dados obtidos nos capí-
tulos 2, 3 e 4 – corroborar com a ideia de que existe, neste âmbito específico,
uma situação mais favorável a mulheres neste país, em comparação ao Brasil,
o que reduz o interesse deste grupo geográfico pelo tema.
Outro fator importante a ser analisado é a diferença de percepção das
desigualdades de gênero entre os grupos etários, assim como a análise mais
80

crítica vinda das designers com menor experiência no mercado, ambos aspec-
tos constantes nas respostas analisadas. Tendo em vista que grande parte das
respostas analisadas são de designers Brasileiras, e que o contexto político-
social atual do Brasil vem fortalecendo as discussões de gênero, encabeçadas
por grupos jovens, podemos inferir que o contato das profissionais menos ex-
perientes com estas discussões colabora para que estas tenham posições
mais críticas em relação ao tema. As profissionais com maior experiência, por
sua vez, além de terem menor contato com as discussões atuais de gênero,
tendem a considerar positivos todos os fatores que contribuíram para seu su-
cesso, inclusive as dificuldades encontradas no percurso, além de transparece-
rem ter autoconfiança mais elevada das em comparação às mais
inexperientes.

Estratégias Propostas

O processo de conquista da igualdade de gênero depende de mudan-


ças culturais profundas nas diversas esferas sociedade. Mudanças estas que
exigem tempo, trabalho constante e diálogo. Estratégias pontuais, porém, po-
dem contribuir de forma tangível em questões específicas de desigualdade de
gênero, fortalecendo as discussões e motivando para que a evolução seja
constante.

Ações no ambiente acadêmico. Por ser, em geral, o primeiro espaço


no qual as futuras designers têm contato com a profissão, o meio acadêmico
tem grande importância na formação de profissionais que reconheçam seu
valor no mercado e seu potencial, no combate à discriminação de gênero e à
divisão sexual do trabalho e no incentivo ao livre debate acerca do tema. Por
este motivo, deve-se começar a “plantar” igualdade neste ambiente.
Um fator de grande importância no desenvolvimento do perfil
profissional de jovens designers é a exposição a figuras inspiradoras durante
sua formação. Reconhecer-se nos profissionais de sucesso apresentados em
aula reforça a autoconfiança do estudante ao demonstrar que é possível atingir
81

seus objetivos independentemente de seu gênero, raça, orientação sexual ou


qualquer outra característica individual. Por isto, é essencial que a figuras
apresentadas como referência no meio acadêmico representem a pluralidade
presente nas salas de aula, permitindo a auto-identificação de todos os
estudantes. Considerando o contexto específico desta investigação, propõe-se
um esforço maior por parte das professoras e professores na difusão do
trabalho de profissionais mulheres, que muitas vezes são preteridas em
benefício de designers homens por decorrência dos diversos fatores históricos
e culturais já discutidos nesta investigação.
O incentivo às discussões de gênero, além de cumprir com a função
social do design, é essencial tanto para colaborar na mudança cultural em
curso no que tange os comportamentos machistas no ambiente acadêmico e a
desvalorização do trabalho feminino, quanto para a criação de uma consciência
coletiva entre as próprias estudantes, da qual podem surgir ainda mais
discussões e ações pela igualdade de gênero no âmbito acadêmico.

Ações no ambiente profissional. Entre os comentários das profissio-


nais consultadas nesta investigação, diversos foram os relatos de chefes (em
geral, mulheres) como figuras de inspiração, contribuindo para seu crescimen-
to, assim como adversidades encontradas com chefes homens – entre eles a
desvalorização do trabalho da profissional, silenciamento e assédio –, que
causaram desgaste e desmotivação. Os ambiente de trabalhos devem ser alvo
de ações constantes que reforcem a igualdade de gênero, tanto em nível teóri-
co-crítico quanto prático.
Bruce e Lewis sugerem ações – com foco na educação e na mudança
nas culturas organizacionais – que podem contribuir para a redução da divisão
sexual do trabalho no design:

All designers should be encouraged to take management training, which


should include gender issues and stereotyping. The design institutions and
their journals should show more awareness of the problem and ensure that
employers realize how much potential talent may be lost through the discour-
82

agement of creative women. Such suggestions are of a cultural nature, chal-


lenging perceptions about women's roles with the hope that these would lead
to more profound structural changes, in terms of opportunities for women ac-
tually changing. (Bruce & Lewis, 1990, p. 119-120)

Embora concordemos que a maternidade não é tema comum entre to-


das as mulheres – há aquelas que não querem ou não podem ter filhos, de
forma natural ou não – é importante reconhecer que, neste grupo heterogêneo,
há uma parcela considerável que segue o caminho da maternidade, por esco-
lha ou não. Tendo isto em consideração, há de se criar ações que permitam
que se possa conciliar carreira e maternidade sem que haja prejuízo na esfera
familiar nem na esfera profissional. Ações governamentais no âmbito dos direi-
tos relativos a maternidade, como a ampliação da licença parental masculina,
são de suma importância principalmente no Brasil, onde ainda há muito desi-
gualdade 60 . No contexto corporativo, a criação de ambientes favoráveis à
igualdade de gênero depende de ações em diversos contextos, entre eles a
cultura organizacional e o ambiente físico do trabalho. A flexibilização dos horá-
rios de trabalho, por exemplo, pode ter impacto positivo na carreira das profis-
sionais que têm filhos, assim como a implementação de creches e outros
sistemas de suporte em grandes empresas.
Muitas são as ações que podem ser postas em prática, desde peque-
nas atitudes em grupos de alunos a mudanças significativas na estrutura orga-
nizacional de grandes empresas. O reconhecimento do problema, a tomada de
consciência do poder da coletividade e o desenvolvimento de estratégias que

60
No Brasil, a licença parental remunerada é de 120 dias para a mãe e de apenas 5 dias para o pai – que
aumentam para 20 se a empresa participar do programa governamental Empresa Cidadã – tanto para
filhos biológicos quanto adotivos. Em Portugal, a licença parental pode ser compartilhada entre pai e mãe,
chegando a um máximo de 180 dias.
83

considerem as especificidade de cada ambiente são o ponto de partida para a


construção de ambientes cada vez mais igualitários.
84

Conclusão

É indiscutível que, com o passar do tempo, as diferenças de gênero


são cada vez menores. No contexto do design gráfico, podemos afirmar que o
acesso ao mercado de trabalho pelas mulheres já é uma realidade há pelo
menos duas décadas, o ambiente acadêmico de design apresenta perceptível
equivalência de gênero e cada vez mais mulheres têm visibilidade na área. As
desigualdades, atualmente, são sutis e exigem uma análise mais aprofundada
tanto do contexto atual quanto do desenvolvimento histórico da profissão. A
escolha por este tema teve em consideração este contexto de evolução contí-
nua das relações de gênero e, por isto, buscou uma percepção global do tema,
com o reconhecimento dos desafios enfrentados pelas mulheres desde o sur-
gimento da profissão, das conquistas já alcançadas e dos aspectos que ainda
carecem de resoluções.
No decorrer deste trabalho, buscou-se levantar dados não somente so-
bre as desigualdades existentes, mas também sobre suas causas. A revisão da
literatura, o estudo dos conceitos de gênero, das relações de gênero, da histó-
ria da inserção feminina na profissão e dos aspectos atuais deste mercado,
permitiram compreender a participação feminina no processo de desenvolvi-
mento da profissão de designer gráfico, contribuindo para o entendimento da
gênese das diferenças de gênero que ainda existem no Século XXI. Ademais,
o cruzamento dos dados coletados na revisão de literatura e na etapa de in-
quéritos e entrevistas possibilitou perceber os contrastes entre Brasil e Portugal
no que se refere ao processo de institucionalização do design e seus persona-
gens principais, fato que tem grande influência na participação feminina no
mercado, nas referencias históricas e na cultura do design de cada um deste
países. A pesquisa por inquéritos e entrevistas, seus resultados e, principal-
mente, seu processo e as dificuldades encontradas, contribuíram para o co-
nhecimento da situação atual das designers Brasileiras e Portuguesas, sua
percepção das desigualdades de gênero e seu interesse no tema.
85

Ao concluir esta investigação, fica a convicção da necessidade de uma


discussão mais crítica e menos individualista das diferenças de gênero, envol-
vendo diferentes gerações, considerando os desafios do grupo como um todo e
colocando em prática estratégias que contribuam para uma maior liberdade e
visibilidade da mulher neste meio. Da mesma forma, é importante a manuten-
ção e o fortalecimento da luta feminina por políticas organizacionais e gover-
namentais que tornem os ambientes de trabalho cada vez mais justos para
mulheres, erradicando discriminações, respeitando as suas escolhas pessoais
em relação a família e maternidade e renovando os modelos de trabalho que,
criados sob a ótica masculina, não se adaptam às necessidades e aspirações
das mulheres. A busca pela visibilidade como fator de reconhecimento não
deve seguir sendo um caminho tortuoso no qual as mulheres são obrigadas a
abrir mão de outras partes importantes da sua vida para se adaptarem a ambi-
entes desenhados por e para homens.
Finalizamos este trabalho com a proposta de que trabalhemos coleti-
vamente para criar ambientes de trabalho e modelos de sucesso que simulta-
neamente respeitem as aspirações profissionais das mulheres e deem ao seu
trabalho a visibilidade merecida e necessária para inspirar futuras profissionais.
86

Referências Bibliográficas

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90

Anexos

Anexo I: Inquérito Modelo 1

Inquérito Modelo 1 – Menos de cinco anos de mercado

Questão Objetivo
Avalie a influência dos seguintes aspectos na
sua trajetória como designer:

• Seu Gênero*
• Sua Personalidade*
• A presença de figuras femininas ins-
piradoras (na história do Design, no
ambiente acadêmico ou profissio-
nal)**
• Apoio familiar à construção de uma
carreira***
• Expectativas da sociedade em rela-
ção a você* Levantar dados sobre as experiências
• O ambiente em que cresceu/ se de- individuais de cada participante;
senvolveu*
Compreender a percepção da participante
* Opções de resposta: Influenciou negativa- sobre o tema;
mente | Não influenciou Influenciou positiva-
mente | Não sei responder Verificar padrões entre os grupos e sub-
** Opções de resposta: Houve contato e grupos para posterior análise.
influenciou negativamente | Houve contato e
influenciou positivamente | Houve contato e
não influenciou | Não houve contato e in-
fluenciou negativamente | Não houve contato
e influenciou positivamente | Não houve
contato e não influenciou | Não sei responder
*** Opções de resposta: Não houve apoio e
isto influenciou negativamente | Não houve
apoio porém isto não influenciou | Houve
apoio e isto influenciou positivamente | Houve
apoio porém isto não influenciou | Não sei
responder
91

Inquérito Modelo 1 – Menos de cinco anos de mercado

Em relação a sua formação:


• Seus professores foram*
• Seus colegas de classe/aula foram*
• As figuras de destaque apresentadas
em aula (em disciplinas de História,
Levantar dados sobre as experiências
Cultura Visual, etc.)*
individuais de cada participante;
• Como as questões acima influencia-
ram na sua trajetória acadêmica?** Compreender a percepção da participante
sobre o tema;
* Opções de resposta: Verificar padrões entre os grupos e sub-
Majoritariamente homens | Majoritariamente grupos para posterior análise.
mulheres | Em proporção semelhante entre
homens e mulheres
** Opções de resposta: Influenciaram negati-
vamente | Influenciaram positivamente | Não
influenciaram | Não sei responder

Em relação à sua vivência no mercado de


trabalho:
• Seus chefes foram*
• Seus colegas de trabalho (em mes-
mo nível hierárquico) são/foram**
• As figuras com maior visibilidade na
sua área de atuação são/foram***
• Como as questões acima influencia-
ram na sua trajetória profissional?****

* Opções de resposta: Levantar dados sobre as experiências


Majoritariamente homens | Majoritariamente individuais de cada participante;
mulheres | Em proporção semelhante entre
homens e mulheres | Não se aplica/Não tive Compreender a percepção da participante
chefes sobre o tema;
** Opções de resposta:
Majoritariamente homens | Majoritariamente Verificar padrões entre os grupos e sub-
mulheres | Em proporção semelhante entre grupos para posterior análise.
homens e mulheres | Não se aplica/Não tive
colegas de trabalho
*** Opções de resposta:
Majoritariamente homens | Majoritariamente
mulheres | Em proporção semelhante entre
homens e mulheres | Não se aplica/Não sei
responder
**** Opções de resposta: Influenciaram
negativamente | Influenciaram positivamente |
Não influenciaram | Não sei responder
92

Inquérito Modelo 1 – Menos de cinco anos de mercado

Indique o seu grau de concordância com as


afirmações a seguir:
• "Parece haver mais designers gráfi-
cos homens famosos, sem dúvidas.
Desde muito cedo meninos são mais
encorajados a serem vistos e ouvidos
que meninas."
• "Designers ficam famosos falando
em conferências. Muitas mulheres
tem filhos e não têm tempo para isto.
Compreender a percepção da participante
A maior parte dos palestrantes ho-
sobre o tema;
mens têm suas esposas para ficar
em casa com as crianças. É assim
Verificar padrões entre os grupos e sub-
que eles ficam famosos."
grupos para posterior análise.
• "Um designer não tem que ser uma
celebridade para ser talentoso e in-
Validar hipóteses levantadas na revisão da
fluente. Fama e sucesso são coisas
literatura.
diferentes"
• "A ambição parece ser um papel de
gênero culturalmente associada a
homens."

Opções de resposta: Concordo plenamente |


Concordo parcialmente | Não concordo nem
discordo | Discordo parcialmente | Discordo
plenamente
93

Anexo II: Inquérito Modelo 2

Inquérito Modelo 2 – Mais de cinco anos de mercado

Questão Objetivo
Avalie a influência dos seguintes aspectos na
sua trajetória como designer:

• Seu Gênero*
• Sua Personalidade*
• A presença de figuras femininas ins-
piradoras (na história do Design, no
ambiente acadêmico ou profissio-
nal)**
• Apoio familiar à construção de uma
carreira***
• Expectativas da sociedade em rela-
ção a você* Levantar dados sobre as experiências
• O ambiente em que cresceu/ se de- individuais de cada participante;
senvolveu*
Compreender a percepção da participante
* Opções de resposta: Influenciou negativa- sobre o tema;
mente | Não influenciou Influenciou positiva-
mente | Não sei responder Verificar padrões entre os grupos e sub-
** Opções de resposta: Houve contato e grupos para posterior análise.
influenciou negativamente | Houve contato e
influenciou positivamente | Houve contato e
não influenciou | Não houve contato e in-
fluenciou negativamente | Não houve contato
e influenciou positivamente | Não houve
contato e não influenciou | Não sei responder
*** Opções de resposta: Não houve apoio e
isto influenciou negativamente | Não houve
apoio porém isto não influenciou | Houve
apoio e isto influenciou positivamente | Houve
apoio porém isto não influenciou | Não sei
responder
94

Inquérito Modelo 2 – Mais de cinco anos de mercado

Em relação a sua formação:


• Seus professores foram*
• Seus colegas de classe/aula foram*
• As figuras de destaque apresentadas
em aula (em disciplinas de História,
Levantar dados sobre as experiências
Cultura Visual, etc.)*
individuais de cada participante;
• Como as questões acima influencia-
ram na sua trajetória acadêmica?** Compreender a percepção da participante
sobre o tema;
* Opções de resposta: Verificar padrões entre os grupos e sub-
Majoritariamente homens | Majoritariamente grupos para posterior análise.
mulheres | Em proporção semelhante entre
homens e mulheres
** Opções de resposta: Influenciaram negati-
vamente | Influenciaram positivamente | Não
influenciaram | Não sei responder

Em relação à sua vivência no mercado de


trabalho nos primeiros 5 anos de carreira:
• Seus chefes foram*
• Seus colegas de trabalho (em mes-
mo nível hierárquico) são/foram**
• As figuras com maior visibilidade na
sua área de atuação são/foram***
• Como as questões acima influencia-
ram na sua trajetória profissional?****

* Opções de resposta: Levantar dados sobre as experiências


Majoritariamente homens | Majoritariamente individuais de cada participante;
mulheres | Em proporção semelhante entre
homens e mulheres | Não se aplica/Não tive Compreender a percepção da participante
chefes sobre o tema;
** Opções de resposta:
Majoritariamente homens | Majoritariamente Verificar padrões entre os grupos e sub-
mulheres | Em proporção semelhante entre grupos para posterior análise.
homens e mulheres | Não se aplica/Não tive
colegas de trabalho
*** Opções de resposta:
Majoritariamente homens | Majoritariamente
mulheres | Em proporção semelhante entre
homens e mulheres | Não se aplica/Não sei
responder
**** Opções de resposta: Influenciaram
negativamente | Influenciaram positivamente |
Não influenciaram | Não sei responder
95

Inquérito Modelo 2 – Mais de cinco anos de mercado

Em relação à sua vivência no mercado de


trabalho nos últimos 5 anos:
• Seus chefes foram*
• Seus colegas de trabalho (em mes-
mo nível hierárquico) são/foram**
• As figuras com maior visibilidade na
sua área de atuação são/foram***
• Como as questões acima influencia-
ram na sua trajetória profissional?****

* Opções de resposta: Levantar dados sobre as experiências


Majoritariamente homens | Majoritariamente individuais de cada participante;
mulheres | Em proporção semelhante entre
homens e mulheres | Não se aplica/Não tive Compreender a percepção da participante
chefes sobre o tema;
** Opções de resposta:
Majoritariamente homens | Majoritariamente Verificar padrões entre os grupos e sub-
mulheres | Em proporção semelhante entre grupos para posterior análise.
homens e mulheres | Não se aplica/Não tive
colegas de trabalho
*** Opções de resposta:
Majoritariamente homens | Majoritariamente
mulheres | Em proporção semelhante entre
homens e mulheres | Não se aplica/Não sei
responder
**** Opções de resposta: Influenciaram
negativamente | Influenciaram positivamente |
Não influenciaram | Não sei responder

Indique o seu grau de concordância com as


afirmações a seguir:
• "Parece haver mais designers gráfi-
cos homens famosos, sem dúvidas.
Desde muito cedo meninos são mais
encorajados a serem vistos e ouvidos
que meninas."
• "Designers ficam famosos falando
em conferências. Muitas mulheres Compreender a percepção da participante
tem filhos e não têm tempo para isto. sobre o tema;
A maior parte dos palestrantes ho-
mens têm suas esposas para ficar Verificar padrões entre os grupos e sub-
em casa com as crianças. É assim grupos para posterior análise.
que eles ficam famosos."
• "Um designer não tem que ser uma Validar hipóteses levantadas na revisão da
celebridade para ser talentoso e in- literatura.
fluente. Fama e sucesso são coisas
diferentes"
• "A ambição parece ser um papel de
gênero culturalmente associada a
homens."

Opções de resposta: Concordo plenamente |


96

Inquérito Modelo 2 – Mais de cinco anos de mercado

Concordo parcialmente | Não concordo nem


discordo | Discordo parcialmente | Discordo
plenamente
97

Anexo III: Entrevista Titha Kraemer (Porto Alegre, Brasil)

P: Percebi, durante a investigação, que há um certo "tabu" entre as pro-


fissionais em posicionar-se como "mulher designer". Como vês esta situ-
ação?
R: Nunca senti tabu algum por ser mulher e ser designer, sempre senti orgulho
e fui respeitada.

P: Qual a sua opinião sobre a visibilidade feminina no Design Gráfico no


Brasil?
R: Conheço várias designers que admiro e tem grande visibilidade: Margø
Takeda, Ana Couto, Heloisa Crocco...

P: Durante sua trajetória profissional, houve decisões que tiveste de to-


mar que crês que seus companheiros homens não enfrentaram?
R: Acredito que não especificamente por ser designer, mas talvez por ser mu-
lher, quase pedi demissão por desrespeito.

P: Dás bastante importância às mulheres inspiradoras que fizeram parte


da sua trajetória. Poderias dar algum exemplo de situações nas quais este
tipo de contato teve impacto positivo ou citar alguma das mulheres que
fez diferença na sua carreira?
R: Não foram especificamente designers, mas Lucia Bastos, minha ex-diretora,
Naile Rocha Santos, atual diretora do Iguatemi, foi uma grande colega inspira-
dora, Mara Bussolin, Tita Laurent foram grandes inspiração de mulheres bata-
lhadoras, determinadas e guerreiras.

P: Qual a proporção atual entre homens e mulheres na Bendito, em posi-


ções hierárquicas mais baixas (Estagiári@s, Designers Jr., etc.)? Esta é
uma questão consciente ou aleatória?
98

R: Somos em 28 pessoas: 17 mulheres e 11 homens e todos atuam nas dife-


rentes áreas, inclusive o nosso “recepcionisto” é homem. As posições são
totalmente aleatórias, são de acordo com seus talentos.

P: Como empreendedora e, agora, chefe de outras mulheres, de alguma


maneira te vês responsável, juntamente com as tuas sócias, na motivação
e inspiração das tuas funcionárias?
R: Claro! Adoro motivar a todos, não somente as mulheres!

P: Deixas bastante clara a tua discordância com as citações colocadas


em discussão, considerando-as "ultrapassadas". Como mãe, tens algum
comentário específico sobre esta de Paula Scher - que não tem filhos?
"Designers ficam famosos falando em conferências. Muitas mu-
lheres tem filhos e não têm tempo para isto. A maior parte dos
palestrantes homens têm suas esposas para ficar em casa com
as crianças. É assim que eles ficam famosos."

R: Sou casada e tenho um casal de filhos maravilhosos, o Fred com 11 anos e


a Estela com 7. Me considero uma mulher que faz uma grande "ginástica" para
poder conciliar tudo, cuidar da família, da vida profissional, dos amigos e de
mim! Não sou palestrante profissional, mas viajo bastante a trabalho além de
dar algumas aulas e palestras pelo Brasil e nunca minha família me impediu...
No nosso dia-a-dia faço questão de levar meus filhos na escola, de almoçar-
mos juntos, de fazermos as tarefas da escola e etc. e de nos divertirmos inven-
tando o que fazer nos finais de semana.
As vezes cansa conciliarmos tudo ao mesmo tempo mas o amor que esta en-
volvido nisso tudo faz valer muito a pena!
99

Anexo IV: Entrevista Gabriela Landeira (Porto Alegre, Brasil)

P: Percebi, durante a investigação, que há um certo "tabu" entre as pro-


fissionais em posicionar-se como "mulher designer". Como vês esta situ-
ação?
R: Acredito que não há na nossa categoria esse posicionamento, talvez por
medo de que possam pensar que uma mulher só vai desenvolver trabalhos
"bonitinhos", "fofinhos", por isso as mulheres acabam não se afirmando como
mulheres designers. Vejo isso no escritório que trabalho (que é composto ape-
nas por mulheres) quando desenvolvemos trabalhos que não são "queridos" os
clientes acabam se espantando por sermos só mulheres e ~~conseguirmos~~
fazer trabalhos "sérios".

P: Qual a sua opinião sobre a visibilidade feminina no Design Gráfico no


Brasil?
R: Acredito que está começando a aumentar, visto que tenho conhecido mais
mulheres designers que anteriormente, inclusive em função de prêmios recebi-
dos!

P: A designers com menor tempo de mercado – grupo no qual está incluí-


da, tendem a expressar de forma mais crítica sua percepção nas desi-
gualdades de gênero. O que pensas que mudou?
R: Acredito que temos mais a cultura de que: não é por que sou mulher que
devo ser tratada diferente, pois sou tão ou mais competente que os homens.
No meu caso, sempre trabalhei com mulheres que eram muito mais competen-
tes que os homens (em ambientes mistos), então nunca tive que me rebaixar
por ser mulher, nem me sujeitaria a isso por ser mulher, pois se estudei o
mesmo que os homens posso executar o mesmo trabalho.
100

Anexo V: Entrevista Helena Agra (Porto Alegre, Brasil)

P: Percebi, durante a investigação, que há um certo "tabu" entre as pro-


fissionais em posicionar-se como "mulher designer". Como vês esta situ-
ação?
R: Não sei dizer porque isso acontece, mas me parece fazer bastante sentido.
Estou num processo de me reconhecer/afirmar como mulher em uma série de
atividades, mas principalmente no esporte que pratico (roller derby, é um es-
porte de contato sobre patins e é majoritariamente feminino e muito inclusivo
na questão de gênero) e nas outras atividades físicas que faço, e também na
rua, tentando ocupar e aproveitar esse espaço para mostrar que ele também é
das minas. Porém, em relação ao design como profissão, não costumo ter essa
posição, talvez por não saber como fazer, pois senti diversas vezes um pouco
de preconceito por ser uma mulher pequena, que aparenta menos idade do
que tem, e não segue o "padrão feminino" (uso roupas largas, sempre de tênis,
cabelo curto, nada de maquiagem, muitos piercings e algumas tatuagens).

P: Qual a sua opinião sobre a visibilidade feminina no Design Gráfico no


Brasil?
R: Pergunta difícil, a primeira resposta seria "não sei", o que diz muito, né? A
visibilidade é quase nula, considerando que tanto na academia quanto no mer-
cado de trabalho estuda-se e busca-se muito pouco referência de designers
brasileiros, de designers mulheres brasileiras muito menos então.

P: A designers com menor tempo de mercado – grupo no qual está incluí-


da, tendem a expressar de forma mais crítica sua percepção nas desi-
gualdades de gênero. O que pensas que mudou?
R: Acredito que tem forte relação com a questão de empoderamento feminino,
vejo as mulheres cada vez mais ocupando seu espaço na sociedade e bus-
cando mostrar o quanto o gênero não influi na qualidade do trabalho, por
exemplo.
101

Anexo VI: Entrevista Marianne Gaspary (Porto Alegre, Brasil)

P: Percebi, durante a investigação, que há um certo "tabu" entre as pro-


fissionais em posicionar-se como "mulher designer". Como vês esta situ-
ação?
R: Pelo menos no meu caso, a falta de posicionamento como "mulher designer"
é por não sentir necessidade em vincular o gênero à designação profissional.
Eu pelo menos nunca me deparei com profissionais do sexo masculino que
apresentam o posicionamento "homem designer" e até acharia meio estranho e
machista se visse algum se posicionando desta forma.

P: Qual a sua opinião sobre a visibilidade feminina no Design Gráfico no


Brasil?
R: Acho que ainda temos pouca visibilidade aqui no Brasil, mas aos
poucos o pessoal está se movimentando e fazendo reflexões/estudos sobre o
assunto (como a tua dissertação). Então, acho que esse movimento de enga-
jamento e de divulgação das mulheres do design gráfico brasileiro está aumen-
tando e dentro de 5 ou 10 anos acho que vai ter bem mais força e mais
reconhecimento.

P: A designers com menor tempo de mercado – grupo no qual está incluí-


da, tendem a expressar de forma mais crítica sua percepção nas desi-
gualdades de gênero. O que pensas que mudou?
R: Acho que a geração de novas designers está procurando fazer mais refle-
xões sobre as desigualdades e diferenças, com isso aparece esta questão de
desigualdade de gênero. Pela minha percepção também acredito que esta
geração é um pouco menos acomodada com as situações que são considera-
das um pouco como "tabu", então o pessoal tem procurado formas de articular
uma mudança, para esta e para as gerações futuras.
102

Anexo VII : Entrevista Maíra Woloszyn (Porto Alegre, Brasil)

P: Percebi, durante a investigação, que há um certo "tabu" entre as pro-


fissionais em posicionar-se como "mulher designer". Como vês esta situ-
ação?
R: Acredito que, pela profissão adotar o nome americano "designer", e não
haver uma correspondência de gênero para a palavra (como acontece na mai-
oria das profissões: professor, professora, médico, médica, arquiteto, arquite-
ta), não é comum posicionar-se como "mulher designer". Penso que se o termo
proporcionasse a distinção, facilitaria o posicionamento das mulheres.

P: Qual a sua opinião sobre a visibilidade feminina no Design Gráfico no


Brasil?
R: Já temos grandes profissionais mulheres atuando na área de Design no
Brasil, entretanto, na minha opinião, ainda é possível perceber um destaque
maior para os profissionais do sexo masculino.

P: A designers com menor tempo de mercado – grupo no qual está incluí-


da, tendem a expressar de forma mais crítica sua percepção nas desi-
gualdades de gênero. O que pensas que mudou?
R: Acredito que profissionais com menor tempo de mercado tem mais fôlego
para estas questões, bem como são de gerações mais novas, que dão mais
valor à luta pela igualdade de gênero.

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